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EMERSON PENHA MALHEIRO FABRÍCIO DE SAIS CONCEIÇÃ
São Paulo 2009
CENTRO UNIVERSITÁRIO DAS FACULDADES METROPOLITANAS UNIDAS
FACULDADE DE DIREITO
CONTRATOS ELETRÔNICOS NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
ALEXANDRA CAZUE NISHIMI AMARAL R.A n.º 503.846/4 TURMA: 3209C
FONE: 5581-4247 E-MAIL: [email protected]
São Paulo 2009
CONTRATOS ELETRÔNICOS NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas, como exigência parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito, sob a orientação da Professora Cinira Gomes Lima Melo.
São Paulo 2009
BANCA EXAMINADORA:
Professora Orientadora: ___________________________ Cinira Gomes Lima Melo
Professor Argüidor: ___________________________
Professor Argüidor: ___________________________
Agradeço aos meus pais por todas as condições de estudo que me foram dadas. Agradeço à Maria Lúcia pela ajuda na conclusão do trabalho. Agradeço à Isildinha pelos conselhos nos momentos de dificuldade. Agradecimento especial a Luís Otávio por me ensinar a aproveitar a vida novamente.
“Tudo tem seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu”. (Eclesiastes, 3:1)
Sinopse
Trata dos principais aspectos dos contratos eletrônicos em razão da falta de legislação específica regulamentando-os. Discute as características essenciais dos contratos em geral e verifica os pontos convergentes e distintos entre estes e os contratos eletrônicos. Aprecia a possibilidade da perfeita aplicação da legislação civil anteriormente existente aos contratos com formação virtual. Utiliza a metodologia de compilação agrupando as diferentes posições doutrinárias destacando, ao final, a majoritária, e a partir desta, tecendo considerações finais.
Palavras-chave: Contratos eletrônicos. Contratos tradicionais. Ambiente virtual.
Sumário
Introdução ...................................................................................................................
1. INTERNET ..........................................................................................................
1.1. Antecedentes .......................................................................................
1.2. Origem da Internet ...............................................................................
1.3. Da Arpanet à Internet ..........................................................................
1.4. A Internet..............................................................................................
1
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2. CONTRATO ELETRÔNICO.................................................................................
2.1. Conceito de contrato.......................................................................................
2.2. Princípios .......................................................................................................
2.2.1. Princípio da equivalência funcional......................................................
2.2.2. Princípio da neutralidade das normas..................................................
2.2.3. Princípio da inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos...............................................................................................
2.2.4. Princípio da boa-fé................................................................................
2.2.5. Princípio da autonomia da vontade......................................................
2.2.6. Princípio da força obrigatória dos contratos.........................................
2.3. Requisitos ......................................................................................................
2.3.1. Requisitos subjetivos............................................................................
2.3.2. Requisitos objetivos..............................................................................
2.3.3. Requisito formal....................................................................................
2.4. Formação dos contratos eletrônicos...............................................................
2.4.1. Forma escrita........................................................................................
2.4.2. Forma tácita..........................................................................................
2.4.3. Pelo silêncio..........................................................................................
2.5. Momento da formação....................................................................................
2.5.1. Momento da formação entre presentes................................................
2.5.2. Momento da formação entre ausentes.................................................
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3. LOCAL E PROVA DO CONTRATO ELETRÔNICO............................................
3.1. Local de formação..........................................................................................
3.2. Contrato eletrônico como meio de prova........................................................
3.3. Segurança ......................................................................................................
3.3.1. Criptografia...........................................................................................
3.3.2. Assinatura digital..................................................................................
3.3.3. Cartório eletrônico e certificação digital................................................
3.3.4. Esteganografia .....................................................................................
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44
4. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL E FORO COMPETENTE.........................................
4.1. Legislação aplicável aos contratos nacionais.................................................
45
47
4.2. Foro competente............................................................................................. 50
5. CONCLUSÃO ................................................................................................ 52
6. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 55
1
INTRODUÇÃO
A escolha do tema estudado deu-se em virtude da relevância dos
contratos eletrônicos na realidade brasileira e com o propósito de delinear suas
principais características.
Primeiramente se verificará o surgimento da rede mundial de
computadores, principal meio de comunicação responsável pela difusão da forma de
contratação virtual.
Constatar-se-á que apesar de ter sido criada há trinta anos, com o
propósito inicial de interligar entidades governamentais e instituições de ensino
norte-americanas, a Internet adentrou no cotidiano das pessoas para a realização de
atividades rotineiras, como a celebração de contratos.
Será observada também a posição doutrinária quanto à natureza jurídica
dos contratos eletrônicos, podendo compreender se constituem nova categoria de
negócio jurídico ou se são contratos tradicionais, possuindo como diferencial o
ambiente que a vontade é proferida.
Dessa forma é necessário que sejam feitas prévias considerações sobre o
conceito de contrato, os princípios que o norteiam, bem como os elementos
indispensáveis para que tenha validade do mundo jurídico: os requisitos objetivos,
subjetivos e formais.
Será estudado também se o documento eletrônico, por ser celebrado
virtualmente, pode ser aceito como meio de prova no sistema processual brasileiro e
se este tem equivalência funcional de um documento celebrado por partes presentes
fisicamente.
As mais importantes discussões doutrinárias ficam a cargo do momento,
local de formação e da legislação aplicável.
2
Tratando-se do momento de formação, a divergência reside na
classificação da formação dos contratos entre presentes e entre ausentes e quais as
diferentes teorias adotadas.
Será estudada a problemática quanto à determinação do local de
formação dos contratos, isto é, se o contrato se forma no domicílio do proponente,
do aceitante ou do local onde está situado o provedor de acesso.
Essa última questão implica necessariamente na definição da legislação
aplicável, ponto pouco conflitante quando se trata dos contratos eletrônicos
nacionais, o objeto de nosso estudo, pois serão regulados pela lei brasileira. Apesar
disso, por não existir até o momento legislação específica para regulamentar os
contratos eletrônicos, há algumas teorias com posições opostas sobre a
possibilidade plena de utilização da legislação já existente ou a necessidade de
criação de normas próprias.
Por fim, mas não menos importante, serão tecidos comentários acerca do
foro competente para dirimir eventuais lides provenientes da contratação virtual.
Pode-se verificar, portanto, que o trabalho realizado objetiva estruturar as
características básicas dos contratos eletrônicos na sociedade brasileira, dando
relevância aos pontos conflitantes na doutrina.
3
1. INTERNET
1.1. Antecedentes
Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) a Europa, que antes era
tida como o centro de referência mundial em civilização e desenvolvimento,
encontrava-se destruída. Durante o conflito mundial ficou demonstrada sua fraqueza
ao não conseguir, sozinha, derrotar o bloco dos intitulados Países do Eixo, composto
por Alemanha, Itália e Japão. A libertação da Europa somente se deu em
decorrência da forte aliança entre Estados Unidos e União Soviética.
Este pacto estabelecido no final da II Guerra Mundial fortaleceu o
crescimento da União Soviética, que avivou a propagação do socialismo no mundo,
e a consolidação dos Estados Unidos como potência capitalista. Nesta perspectiva
os dois países passam a competir pela hegemonia militar, política e econômica no
mundo. Instaura-se a Guerra Fria, uma competitividade que não se desenvolvera
mediante um confronto militar convencional, já que as duas superpotências estavam
de posse de uma tecnologia militar responsável pela modificação de suas relações
bélicas, mas que introduzia um dado novo: o conflito no campo ideológico.1
Na verdade, uma expressão explica muito bem este período: a existência
da Paz Armada. As duas potências envolveram-se numa corrida armamentista,
espalhando exércitos e armamentos em seus territórios, bem como nos países
aliados a cada um deles. Enquanto houvesse um equilíbrio bélico entre as duas
potências, a paz estaria garantida, pois haveria o medo do ataque inimigo.2
1 Luiz Koshiba; Denise Manzi Frayse Pereira, História do Brasil, p. 301. 2 Anônimo. Guerra Fria. Disponível em:< http://www.suapesquisa.com/guerrafria> Acesso em: 21/02/2009.
4
1.2. Origem da Internet
No auge da Guerra Fria, aos 4 de outubro de 1957, a União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas lançou ao espaço o primeiro satélite da história, o
Sputnik, que era capaz de realizar uma volta ao redor da órbita da Terra em noventa
minutos.
Como reação a este avanço tecnológico russo, o presidente dos EUA,
Eisenhower, criou, em Outubro de 1957, a ARPA – Advanced Research Project
Agency -. O objetivo principal da ARPA era o desenvolvimento de programas
referentes aos satélites e ao espaço.3
Todavia, um ano após o surgimento da ARPA, em 1958, foi criada a
National Aeronautics & Space Administration - NASA-, uma entidade americana
pautada no estudo e desenvolvimento de assuntos concernentes ao ambiente
espacial, bem como responsável por estudos técnicos acerca de foguetes e
satélites.
Este acontecimento causou uma certa estranheza e inquietação aos
funcionários e membros da ARPA, visto que, com a definição do campo de atuação
da NASA, a ARPA perdera a base da sua existência. Felizmente, em 1961, com a
doação de um computador para a Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, a
ARPA retomou suas atividades, mas com um novo enfoque: a Informática.
Para que os pesquisadores pudessem se comunicar de forma rápida,
eficaz e sem interrupções, era necessário criar uma espécie de rede de
comunicação- Network-. Desse modo, a própria equipe de investigação da ARPA foi
designada para tal tarefa.4
3Breve histórico da Internet. Disponível em: < http://www.piano.dsi.uminho.pt/museu/INTERNET.PDF>. Acesso em 04/05/2007. 4Ibid.
5
Neste período já havia diversas redes de computadores desenvolvidas
pelos diferentes fabricantes, entretanto, a linguagem utilizada por cada um deles era
incompatível entre si, visto que buscavam a hegemonia da linguagem de
programação.5
A solução apresentada pela equipe para essa situação foi a elaboração e
o desenvolvimento de um protocolo de comunicações que regulasse o intercâmbio
de mensagens entre as máquinas dos diversos fabricantes. Surgiram assim, alguns
protocolos de linguagem universal, dentre os quais podem ser destacados o Telnet -
ligação interativa de um terminal com um computador remoto-e o FTP, sigla de File
Transfer Protocol.6
Além da criação de uma linguagem eletrônica universal, esteve a cargo
da ARPA o aprimoramento da segurança nas comunicações, ou seja, a mensagem
enviada careceria chegar intacta ao receptor, qualquer que fosse o acidente
encontrado no trajeto entre o emissor, e o receptor.
O recurso proposto para tal situação compreendia a utilização de redes
do tipo distribuído, nas quais era possível conectar um receptor e um emissor,
utilizando vários percursos; se um nó da rede avariasse a mensagem, a mesma
continuaria seu percurso utilizando outro caminho disponível. Para aliviar o trabalho
dos computadores - emissor e receptor - denominados host, foi decidido construir
computadores intermediários que processassem o trabalho de routing; cada
computador ficaria então conectado à rede através de um computador intermediário
denominado IMP - Interface Message Processor -.7
A Universidade UCLA em Los Angeles, o Stanford Research Institute, a
Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e a Universidade de Utah foram as
pioneiras no uso da rede, cuja interconexão permitia que os pesquisadores na área
5 Breve histórico da Internet. Disponível em: < http://www.piano.dsi.uminho.pt/museu/INTERNET.PDF>. Acesso em 04/05/2007. 6 Ibid. 7 Ibid.
6
acadêmica, governamental e de negócios se comunicassem.8 Estudantes destas
quatro universidades criaram um grupo de trabalho, o qual auto-intutularam
Network Working Goup - NWG - e, dentre eles, estava Vinton Cerf, que mais tarde
se tornaria o pai da Internet.
1.3. Da Arpanet à Internet
No dia 1º. de dezembro de 1969 o projeto ARPA converteu-se em projeto
ARPANET, alterado em 1972 para projeto DARPANET. O acréscimo da letra D –
defense - à sigla deu-se em virtude da dependência financeira que a ARPANET
tinha em relação ao Pentágono, órgão de segurança americano que financiava os
investimentos para pesquisas.
Este sistema foi dividido em dois grupos: a MILNET, que possuía as
localidades militares e a nova ARPANET, que possuía as localidades não militares.9
Apesar da separação ambas eram controladas e financiadas pelo Departamento de
Defesa.
Todavia, o grande acontecimento ocorreu no ano de 1973 quando Vinton
Cerf, do Departamento de Pesquisa Avançada da Universidade da Califórnia e
responsável pelo projeto, registrou o Protocolo de Controle de Transmissão/
Protocolo Internet (protocolo TCP/ IP). 10
Finalmente em 1977, Vinton Cerf e Robert Kahn realizaram uma
demonstração do protocolo TCP/IP utilizando três redes ARPANET – RPNET -
STATNET. Essa manifestação é considerada o abrolhar da Internet.11
8 Rede nacional de pesquisa. Disponível em: <http://www.rnp.noticias/imprensa/2002/not-imp020219.html.>. Acesso em 04/05/2007. 9 Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Origem _da_internet>. Acesso em 5/5/2007. 10 Liliana Minardi Paesani, Direito e Internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil, p. 25. 11Breve histórico da Internet. Disponível em:< http://www.piano.dsi.uminho.pt/museu/INTERNET.PDF>. Acesso em 04/05/2007.
7
1.4. A Internet
Em 1990 a ARPANET foi desmantelada pelo Departamento de Defesa
dos Estados Unidos, e substituída pela NSFNET que ficou conhecida mundialmente
como Internet.
Numa abordagem técnica, a Internet consiste na interligação de milhares
de redes de computadores do mundo inteiro, através de protocolos IP- Internet
Protocol-. Essa trama somente é possível porque todos os computadores utilizam
um mesmo padrão de transmissão de dados, onde a ligação física é feita por meio
de linhas telefônicas, fibras ópticas, satélites ou rádio. A conexão do computador
com a rede pode ser direta ou por outro computador, conhecido como servidor, que
pode ser próprio ou, no caso dos provedores de acesso, de terceiros.12
Não obstante, a Internet como conhecemos hoje, com sua interatividade,
como arcabouço de redes interligadas de computadores, e seus conteúdos de
multimídia, só existe pela contribuição do cientista Tim Berners-Lee ao CERN,
Conseil Européen pour Recherche Nucléaire - Centro Europeu de Pesquisas
Nucleares, que criou o www- World Wide Web-, inicialmente interligando sistemas de
pesquisas científicas e, mais tarde acadêmicas, conectando universidades.13
O www é composto de hipertextos, ou seja, documentos cujo texto,
imagem e sons são evidenciados de forma particular e podem ser relacionados com
outros documentos. Com um clique no mouse o usuário pode ter acesso aos mais
variados serviços, sem necessidade de conhecer os inúmeros protocolos de
acesso.14
Esses avanços tecnológicos tornaram mais fácil o acesso à rede,
aproximando as pessoas dos computadores e tornando a Internet mais presente nas
12 Patrícia Peck, Direito Digital, p. 14. 13 Wikipédia. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Origem _da_internet>. Acesso em 5/5/2007. 14 Liliana Minardi Paesani, op.cit., p. 26.
8
atividades cotidianas de seus usuários, merecendo destaque o setor da
comunicação.
Neste setor o computador eliminou as barreiras que de algum modo
dificultavam a troca de informações de forma célere, fosse de dados, de sons ou de
imagens, estabelecendo uma maneira virtual e instantânea de comunicação,
independente da localização do emissor e receptor.15 É o chamado meio virtual,
onde não há a presença física dos participantes.
Esse ambiente de interação atraiu grande número de pessoas que
discerniram na Internet uma forma rápida e eficiente de auferir ganhos financeiros,
realizando negócios jurídicos sem grande demanda de capital.
Vale lembrar que os contratos eletrônicos podem ser celebrados por
meios que não a Internet, entretanto, não resta dúvida de que é pela rede mundial
de comunicação que os contratos virtuais encontram sua maior disseminação. 16
15 Ronaldo Alves de Andrade. Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 13. 16Ivette Senise Ferreira; Luiz Olavo Baptista, Novas fronteiras do direito na era digital, p. 88.
9
2. CONTRATO ELETRÔNICO
O contrato eletrônico não é um novo tipo de contrato, sua diferenciação
acontece quanto ao ambiente em que se dá a formação: ele não acontece pelas vias
tradicionais, ocorre pelo meio virtual.
Assim sendo é forçoso fazer, preliminarmente, um intróito conceitual,
definindo o significado jurídico da palavra contrato e suas características básicas,
para compreender os elementos, o momento de formação e a força probante dos
contratos eletrônicos.
2.1. Conceito de Contrato O surgimento dos contratos ocorreu com o propósito de que as partes
pactuantes cumprissem com seus deveres. 17
A definição de seu conceito decorre de uma longa evolução histórica, que
pode ser dividida em três períodos, conforme a classificação de COELHO.18
O primeiro período foi marcado pelo modelo liberal, no qual prevalecia a
livre vontade das partes. Teve como momento mais importante o limiar da
Revolução Francesa de 1789, no qual foi elaborado o Código Napoleônico,
massivamente influenciado pelas idéias liberalistas dos líderes revolucionários, de
cunho essencialmente econômico, que pregava a igualdade entre os homens
perante a lei, deixando para trás qualquer distinção social ou patrimonial. Dos
pensamentos liberais surgiu o princípio do pacta sunt servanda, comumente
traduzido pela expressão “o contrato faz lei entre as partes”. 19
17 Contratos e sua evolução. Disponível em: < http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/827/Contratos-e-sua-evolucao>. Acesso em: 09/01/2009. 18 Fábio Ulhoa Coelho, Curso de direito comercial, vol. III p.7. 19Ronaldo Alves de Andrade, op.cit., p. 21.
10
Não se indagava: sobre o custo e a justiça do contrato nem sobre o desequilíbrio das obrigações contratuais, e tampouco acerca da lesão que do seu descumprimento pudesse resultar para alguma das partes contratantes; a única coisa que importava e tinha valor era o efetivo cumprimento do contrato, sempre sob o auspício da idéia de que todas as pessoas eram iguais e tinham liberdade para contratar ou não contratar, sendo, portanto, natural que o contrato devesse ser cumprido conforme o acordado.20
Justamente por ter toda essa liberdade obrigacional, na hipótese de o
sujeito não cumprir com sua parte no acordo, se sujeitava à coerção do Estado.21
Apesar de fazer lei entre as partes, o contrato jamais foi considerado lei,
pois apesar de ser uma fonte imediata ou primária das obrigações, somente o é
porque a lei, fonte mediata ou primária das obrigações, lhe atribui esta eficácia.22
Na segunda metade do século XX deu-se o segundo período após a
verificação de que na grande maioria dos contratos celebrados, não havia a
autonomia da vontade, uma vez que existia desigualdade entre as pessoas,
permitindo que o mais forte estabelecesse de forma unilateral as cláusulas do
contrato, restando ao outro fazer adesão às condições impostas. O Estado,
verificando este quadro de desequilíbrio, passou a intervir nos negócios realizados
entre particulares, protegendo a camada economicamente mais fraca da sociedade,
marcando o período do dirigismo estatal.23 Deste modo, “a tecnologia jurídica foi
forçada a formular um novo modelo para o direito contratual”.24
Tem início o chamado modelo neoliberal, onde foi retomada a idéia
romana da revisão judicial dos contratos- rebus sic stantibus- que previa a
20 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 21. 21 Fábio Ulhoa Coelho, op.cit., p.10. 22 Carlos Roberto Gonçalves. Direito Civil Brasileiro, vol. III, p. 2. 23 Ronaldo Alves de Andrade, op. cit., p. 22. 24 Fábio Ulhoa Coelho, op. cit., vol. III p.12.
11
possibilidade de revisão das cláusulas abusivas inseridas na elaboração do contrato,
feita por parte do estipulante.25
Impulsionado pela globalização o Estado sintetiza os dois períodos
anteriores e ingressa no momento reliberalizante, ainda em elaboração na doutrina,
prestigiando a tutela do economicamente mais fraco, ao mesmo tempo em que volta
a reafirmar a importância da autonomia da vontade.26
Esses períodos, em especial os dois primeiros, contribuíram
enormemente para que os doutrinadores brasileiros pudessem traçar o conceito da
palavra contrato, e os elementos formadores de sua definição.
Para GONÇALVES27 o contrato é um negócio jurídico bilateral ou
plurilateral, dependendo da participação de pelo menos duas partes, resultante de
um consenso mútuo.
Conforme PECK28:
contrato é o acordo de vontades entre duas ou mais pessoas com a finalidade de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir direito.
Em síntese, a definição de contrato pode ser dada como o acordo de
vontades com a qualidade de gerar efeitos no mundo jurídico. 29
As mesmas definições valem também para os contratos eletrônicos, pois
estes não despontam como nova figura contratual, e tampouco possuem uma
natureza jurídica distinta da dos contratos em geral.30 Os contratos eletrônicos
possuem certas particularidades, alguns elementos que os diferenciam dos
contratos ordinários, sendo o mais importante o meio em que são celebrados: o
25 Fábio Ulhoa Coelho, op. cit., vol. III p.12. 26 Ibid, p. 17. 27 Carlos Roberto Goncalves, Direito Civil Brasileiro, vol. III, p. 2. 28 Patricia Peck Pinheiro. Contratos eletrônicos. Disponível em <HTTP://www.patriciapeck.com.br/addons>. Acesso em 11/1/2009. 29Ivette Senise Ferreira; Luiz Olavo Baptista, Novas fronteiras do direito na era digital, p. 90. 30 Ronaldo Alves de Andrade, op.cit., p. 32.
12
meio virtual. As pessoas são reais, o objeto do acordo também é real, assim como a
própria realização do negócio jurídico, entretanto, o ambiente no qual é feito o
contrato é virtual. 31
Dessa forma, da mesma maneira que o comércio eletrônico, o e-
commerce, os contratos eletrônicos devem ter seu conceito definido em razão do
meio em que são realizados, e não em virtude dos seus sujeitos, ou do seu objeto.32
Assim: o contrato eletrônico é celebrado por meio de transmissão eletrônica de dados. A manifestação de vontade dos contratantes (oferta e aceitação) não se veicula nem oralmente nem por documento escrito, mas pelo registro em meio virtual (isto é, despapelizado). 33
PECK34 segue a mesma linha interpretativa estabelecendo que o contrato
eletrônico é todo aquele celebrado por meio virtual, podendo, ao final do processo,
ser armazenado de forma digital ou física, como é o caso da impressão.
Desta forma, qualquer tipo de contrato pode ser celebrado em espaço
virtual, desde que observe as normas legais atinentes aos contratos, como momento
de sua formação, prova do contrato, responsabilidade em caso de inadimplemento,
os requisitos de sua formação e os princípios a eles aplicáveis.35
Não existe exceção nem mesmo para os contratos solenes, aqueles para
os quais a lei prescreve forma que deve ser observada, sob pena de ser declarado
nulo, como preceitua o art. 166, IV do Código Civil. A formalidade não impossibilita
nem mesmo a alienação de imóveis com valores superiores a trinta salários
mínimos, negócio jurídico para o qual a lei exige a escritura pública (art. 108, CC).
31 Ronaldo Alves de Andrade, op.cit., p. 32. 32 Ivette Senise Ferreira; Luiz Olavo Baptista, op.cit,, p. 90. 33 Fábio Ulhoa Coelho, op.cit., p.37. 34 Patricia Peck Pinheiro. Contratos eletrônicos. Disponível em <HTTP://www.patriciapeck.com.br/addons>. Acesso em 11/1/2009. 35 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 31.
13
Disponível em 17 estados brasileiros a escritura pública eletrônica permite
a compra a venda de imóveis sem qualquer tipo de deslocamento físico, recebendo
o documento pelo e-mail. Não obstante, a escritura pública possibilita o
reconhecimento de firma, ou a obtenção de segunda via de uma certidão.36
2.2. Princípios Por seu conceito não se distanciar por completo do conceito atribuído aos
contratos em geral, os princípios que regem os contratos tradicionais são também
aplicáveis aos contratos celebrados eletronicamente.
2.2.1. Equivalência funcional
Em 1996, na elaboração da Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico
(UNCITRAL), feita pela Comissão de Direito Comercial Internacional da ONU, o
maior instrumento normativo internacional existente, foi formulado um conceito
importante, com a finalidade de dar maior eficácia e exigibilidade aos contratos
eletrônicos: o princípio da equivalência funcional.37
Conforme estabelece este princípio, o suporte eletrônico realiza as
mesmas funções atribuídas ao papel, não podendo ser considerado inválido ou
ineficaz pelo simples fato de ter sido celebrado por um meio virtual.38
COELHO39 afirma que:
36Disponível em: < https://www.certisign.com.br/certinews/banco_noticias/2007/04/escritura-publica-eletronica-ja-e-realidade-em-17-estados> Acesso em: 18/02/2009. 37Ivette Senise Ferreira; Luiz Olavo Baptista, Novas fronteiras do direito na era digital, 90. 38 Ibid, p.91 39 Fábio Ulhoa Coelho, Curso de direito comercial, vol. III p.40.
14
Do princípio da equivalência funcional decorre a regra de que nenhum ato jurídico pode ser considerado inválido pela só circunstância de ter sido celebrado por transmissão eletrônica de dados. O suporte virtual, em outros termos, não pode servir à invalidação do contrato, porque não aumenta as eventuais incertezas apresentadas por determinado negócio jurídico.
ALMEIDA40 afirma, acompanhando a opinião de CRUZ e TUCCI que
diante da regra geral que estabelece a forma livre na realização de contratos, o
princípio da equivalência funcional é perfeitamente aplicável ao direito brasileiro.
Sendo assim, não há qualquer obstáculo no que diz respeito à celebração
de contratos por meios eletrônicos, exceto a incredulidade de alguns quando o
assunto é a segurança na rede. DE LUCCA41 ressalta que ainda existe certa
dificuldade em conceber um contrato ou um texto, de uma norma jurídica, sem que
seja por meio de um pedaço de papel.
2.2.2. Princípio da neutralidade das normas A adoção do princípio da neutralidade das normas no estudo dos
contratos celebrados pela via eletrônica dá-se em razão da grande rapidez na
mudança da tecnologia, o que permite o surgimento quase cotidiano de novos
softwares, hardwares, sistemas de segurança e equipamentos eletrônicos.
A existência de grandes avanços tecnológicos em pouco espaço de
tempo faz com que as normas elaboradas para a aplicação no ambiente digital se
tornem rapidamente ultrapassadas. Neste sentido, as normas devem ser neutras,
não constituindo obstáculos na realização de negócios jurídicos em ambiente virtual,
não fazendo menção a meios eletrônicos, ou qualquer outra forma tecnológica.42
40Ivette Senise Ferreira; Luiz Olavo Baptista, op. cit., p. 92. 41 Newton de Lucca apud Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 20. 42 Sheila Cercal Rocio dos Santos Leal, Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via Internet, p. 91.
15
Isto revela que as normas reguladoras dos contratos eletrônicos
abrangem não só a tecnologia existente até o momento em que foram promulgadas,
mas também os futuros textos normativos, sem a necessidade de serem submetidos
a algum de tipo de modificação ou adaptação, pois a grande preocupação é evitar
que as leis se tornem obsoletas, quando tiverem de ser aplicadas a novas
tecnologias.43
Um exemplo é a Internet, que hoje é o meio de comunicação mais
utilizado mundialmente, mas que no futuro poderá tornar-se ultrapassada, e ser
substituída por um novo meio de comunicação mais moderno, completo e eficaz. 44
2.2.3. Princípio da inalterabilidade do direito existente sobre obrigações e contratos
A natureza jurídica das relações contratuais firmadas por meio virtual não
foi alterada substancialmente, pois o contrato formado em ambiente eletrônico
possui características semelhantes dos contratos tradicionais. Significa dizer que o
contrato realizado com a utilização de computadores ligados à Internet não deixa de
ser contrato de compra e venda, de locação, etc., sujeitando-se às regras
estabelecidas no Código Civil e, quando se tratar de questões de consumo, do
Código de Defesa do Consumidor.45
LAWAND46 assegura que:
podemos afirmar com base no quanto foi explicado, de que os elementos essenciais do negócio jurídico- consentimento e objeto, assim como suas manifestações e defeitos, além da própria tipologia contratual preexistente não sofrem alteração significativa quando o
43 Jorge José Lawand, Teoria geral dos contraltos eletrônicos, p. 45. 44 Ibid, mesma página. 45 Sheila Cercal Rocio dos Santos Leal, op. cit., p. 91. 46 Jorge José Lawand, op.cit., p. 47.
16
vínculo jurídico é estabelecido na esfera do comércio eletrônico.
O princípio da inalterabilidade do direito previamente existente norteia
todos os operadores do direito e estabelece que as leis que surgirem para regular os
contratos eletrônicos não modificarão as normas jurídicas disciplinadoras dos
contratos já existentes.
Seria impensável realizar a alteração de normas já existentes e aplicáveis
ao contrato comum em razão do surgimento de leis específicas dos contratos
eletrônicos, visto que a diferenciação entre eles pode ser resumida ao ambiente em
que ocorre sua formação, um local virtual onde é possível que duas pessoas
localizadas em regiões longínquas possam se encontrar.
2.2.4. Princípio da boa-fé O princípio da boa-fé biparte-se em boa-fé subjetiva conhecida como a
concepção psicológica da boa fé, e a boa-fé objetiva chamada de concepção ética
da boa-fé. A boa-fé subjetiva se refere ao conhecimento ou ignorância da pessoa no
que tange à existência de certos fatos, é um estado de consciência, estado
psicológico ou convicção íntima. A boa fé objetiva, prevista no Código Civil
expressamente é uma forma de comportamento pautado na honestidade com a
outra parte, no que diz respeito à não omissão de informações importantes do
negócio jurídico.47
O Código de Defesa do Consumidor, Lei n. 8.078 de 11 de setembro de
1990, foi o primeiro ordenamento jurídico a trazer a previsão do vocábulo boa-fé de
forma expressa, em seu art. 4º, III.
O Código Civil de 1916 não mencionava de maneira literal este princípio;
porém o atual Código Civil, no seu art. 422, trouxe uma inovação ao preceituar, que
47 Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil brasileiro, vol. III, p. 34.
17
tanto na execução do contrato como em sua conclusão, os contratantes são
obrigados a guardar dois princípios: o da probidade e o da boa-fé. Este último
princípio, objeto de nosso estudo, refere-se ao dever das partes de agir de forma
correta, evitando prejudicar o outro contratante.
Sua importância é tamanha que a Lei Modelo da UNCITRAL para o
Comércio Eletrônico determina, em seu art. 3º, que a boa-fé deve ser observada na
interpretação da mesma, além de atentar para a sua natureza internacional, e para a
necessidade de promoção da uniformidade na sua aplicação.48
De acordo com este princípio, as partes devem se comportar de forma
honesta, não só durante as tratativas, mas também na fase da formação, do
cumprimento e após a extinção do contrato. A boa-fé guarda relação com o princípio
de direito venire contra factum proprium, que estabelece que ninguém pode se valer
da própria torpeza, proibindo assim um comportamento contraditório.49
A aplicação da boa-fé na celebração de contratos em ambiente virtual traz
segurança jurídica às partes, evitando desfazimento de negócios jurídicos e, quando
unida aos sistemas de segurança de dados como senha e criptografia, torna a
Internet um local mais seguro de contratar do que o ambiente real.
2.2.5. Princípio da autonomia da vontade A autonomia da vontade permite a ampla liberdade de contratação,
deixando que as partes fixem de modo livre as regras, desde que seus interesses
individuais não colidam com o interesse da sociedade.
Essa liberdade faz com que as pessoas contratem apenas se desejarem,
com quem quiserem, escolhendo o objeto livremente, podendo também estabelecer
as cláusulas negociais.
48 Jorge Jose Lawand, Teoria geral dos contratos eletrônicos, p.49. 49 Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil brasileiro, vol. III p. 34.
18
Ao estabelecerem suas próprias cláusulas, as partes podem gerar um
contrato atípico ou inominado, não regulado pelo ordenamento jurídico, mas que
apesar disso, terá validade. Isto é possível porque as partes tem poder de auto
regulamentar seus interesses.50
A autonomia da vontade não é um preceito absoluto, sofrendo limitações,
pois não pode ferir normas de ordem pública- aquelas impostas à sociedade
limitando a liberdade dos indivíduos- nem os bons costumes- condições de
moralidade social-.51
Sendo assim: O contrato, na verdade, passou a atender sua função social, cabendo-lhe conciliar os interesses individuais com os da coletividade, sem afastar a função individual a que se propôs. O legislador, sob este aspecto, começou a admitir a revisão contratual nos contratos bilaterais e unilaterais, por motivo de onerosidade excessiva e ainda a anulação dos negócios jurídicos que desrespeitarem os parâmetros legais de validade e existência.52
Quando uma das partes for hipossuficiente poderá o Estado intervir na
relação contratual privada, buscando garantir a igualdade material dos contratantes,
hipótese de dirigismo contratual. Isto ocorre porque o Estado busca evitar abusos e
desigualdades na ordem econômica, além de tentar impedir que interesses privados
prevaleçam sobre interesses coletivos. Em hipótese alguma há negação da
liberdade de contratar, apenas a vontade do legislador de evitar abusos
econômicos.53
O Código Civil em seu art. 421 trouxe este princípio de forma expressa,
prevendo a liberdade de contratação desde que observados os limites da função
social do contrato.
50 Carlos Roberto Gonçalves. Direito civil brasileiro, vol. III p. 21. 51 Caio Mário da Silva Pereira. Instituições de direito civil, p. 29. 52 A teoria da imprevisão e a revisão contratual no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5240> Acesso em 18/02/2009. 53 Caio Mário da Silva Pereira. op. cit., mesma página.
19
Por ser elemento indispensável a qualquer contrato, a Lei Modelo da
UNCITRAL em seu art. 4.1 permite que as partes envolvidas no acordo possam
alterar as condições contratuais através de acordos, garantindo a liberdade de
contratação.54
2.2.6. Princípio da força obrigatória dos contratos Pelo princípio antes estudado, da autonomia da vontade, nenhuma
pessoa está obrigada a contratar com outra, sendo livre para tomar a decisão que
melhor lhe aprouver. Contudo, aqueles que se obrigarem, devem cumprir o
avençado, e caso não o façam, responderão por perdas e danos.55
O princípio da força vinculante dos contratos determina que o contrato faz
lei entre as partes, isto é, pacta sunt servanda, desde que celebrado respeitando
todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade. Não cabe ao juiz
intervir no pactuado, pois foram as partes que livremente, chegaram a um consenso,
só sendo possível a extinção ou modificação do contrato de forma bilateral,
ressalvadas as hipóteses de caso fortuito, e força maior previstas no art. 393 do
Código Civil.
Esta era a regra rígida que tornava os contratos intangíveis. Em razão de
acontecimentos extraordinários houve uma grande mudança neste entendimento.
Após a Primeira Guerra Mundial muitas situações não puderam mais ser
sustentadas por gerarem, a uma das partes, onerosidade excessiva, revelando
injustiça na utilização do princípio de forma absoluta.56
Em decorrência desse fato houve mudança na postura adotada,
aceitando em situações excepcionais a intervenção judicial pelo Estado, o que não
54 Jorge José Lawand, op.cit,. p. 52 e ss. 55 Carlos Roberto Gonçalves, op.cit., p. 28. 56 Orlando Gomes, Contratos, p. 37.
20
significa o desaparecimento do princípio, apenas a sua flexibilização, em certos
casos.
2.3. Requisitos Para que o contrato eletrônico tenha validade no mundo jurídico deve
preencher os requisitos dispostos no art. 104 do Código Civil, visto que a existência
destes é essencial para a validade dos contratos em geral. A inobservância de
algum deles torna o negócio jurídico inválido, não produzindo os efeitos jurídicos
almejados, podendo ser anulado ou declarado nulo.
As condições de validade dos contratos são de três ordens: requisitos
subjetivos, objetivos e formais.
2.3.1. Requisitos subjetivos Os requisitos subjetivos dizem respeito à capacidade das partes, à
ausência de impedimentos e ao consentimento.
A capacidade das partes exige que o negócio jurídico seja celebrado por
duas ou mais pessoas capazes, tratando-se de negócio jurídico bilateral ou
plurilateral, respectivamente.
O contrato nada mais é do que um negócio jurídico e, para formação,
demanda a observância da capacidade das partes.
Caso não seja observada essa condição os contratos serão declarados
nulos, tratando-se de incapacidade civil absoluta, ou anuláveis, na hipótese de a
incapacidade das partes ser relativa. Sendo a incapacidade relativa, esta poderá ser
suprida pela assistência.
21
A capacidade exigida para a celebração de contratos é a capacidade de
fato e sua falta pode estar relacionada à menoridade da parte, à impossibilidade de
expressão de sua vontade, ou à falta de discernimento para a prática de atos
negociais, conforme art. 3º e 4º do Código Civil.
Nem todos os atos praticados por um incapaz são passiveis de serem
questionados no Judiciário, como é o caso de compra e venda de um lanche por um
absolutamente incapaz. Subentende-se que a realização da compra ocorreu com a
autorização dos seus responsáveis. O fato de não haver demanda judicial de
pequeno valor não significa ausência de vigência da lei; a norma está em vigor,
contudo pelo desinteresse do titular do direito deixa de ser comumente usada.57
Aquele que celebra o contrato deve ser legalmente capaz, no momento da
declaração de vontade.
A ausência de impedimento para contratar é o segundo requisito, e
representa a exigência de uma condição especial para a celebração de
determinados contratos, mais específica do que a normal. Diz respeito à falta de
impedimento legal, ou à falta de legitimação da pessoa. É o caso do art. 496 do
Código Civil, ao exigir o consentimento do cônjuge, e dos descendentes para a
venda a outro descendente.
O consentimento nada mais é do que o acordo de vontade entre os
contratantes, abrangendo o objeto e as cláusulas do negócio jurídico. Deve ser livre
e ocorrer de forma espontânea, de maneira que não seja afetado pelos vícios do
consentimento como o erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão e fraude, não
importando se a manifestação ocorra de forma expressa ou tácita.58
57 Sérgio Iglesias Nunes de Souza, Lesão nos contratos eletrônicos na sociedade da informação: teoria e prática da juscibernética ao Código Civil, p. 59. 58 Carlos Roberto Gonçalves, Direito civil brasileiro, vol. III, p. 14.
22
2.3.2. Requisitos objetivos Os requisitos objetivos se referem ao objeto do contrato que conforme
disposição do Código Civil deve ser lícito, possível, determinado ou suscetível de
determinação futura.
A licitude diz respeito ao objeto que não atente contra a lei, a moral ou
aos bons costumes.
Quanto à possibilidade do objeto, esta pode ser física ou jurídica; sendo
impossível o objeto do contrato, ele será declarado nulo. A impossibilidade física
deve ser absoluta, isto é, atingir a todos. Será impossível juridicamente tudo o que a
lei proíbe, como ocorre com o contrato que tem como objeto herança de pessoa
viva, com redação dada pelo art. 426 do Código Civil brasileiro.59
A determinação do objeto deve estar presente no momento de formação
do vínculo contratual ou, ao menos, ser passível de determinação posterior. É o que
preconiza o art. 243 do Código Civil ao tratar da venda de coisa incerta, definida
apenas pelo gênero e quantidade, sendo sua qualidade indicada no momento de
execução do contrato.
2.3.3. Requisito formal O requisito formal se refere à forma dos contratos que deve ser prescrita
ou não proibida pela lei.
A forma dos contratos não se confunde com o meio de prova do negócio
jurídico; esta representa o meio para demonstrar sua existência, como um CD-ROM,
59 Carlos Roberto Gonçalves, op.cit., p. 16- 17.
23
uma homepage ou a impressão do arquivo em uma lauda de papel, aquela é o meio
de exteriorização da vontade.
No Brasil a regra é a forma livre, podendo as partes celebrar o contrato
por escrito público, ou particular e também verbalmente, ressalvados os casos em
que a lei exije a forma escrita. No direito brasileiro o consensualismo é a regra, e o
formalismo a exceção.
Não há qualquer óbice quanto à celebração de contratos por meio
eletrônico, vez que o Código Civil de forma expressa, dispõe em seu art. 107, a não
dependência de forma especial a declaração da vontade, exceto nos casos em que
a lei expressamente a exigir.
A declaração nos contratos formados pela Web pode se externalizar com
um simples clicar do mouse, com o preenchimento da oferta com os dados pessoais
do aceitante e envio para o proponente, ou até mesmo no enviar de uma aceitação
ao proponente pelo correio eletrônico.
2.4. Formação dos contratos eletrônicos A manifestação da vontade é elemento indispensável quando se trata dos
contratos com formação tradicional e, pelo fato de o contrato eletrônico não ser um
instituto jurídico com grande número de características díspares daqueles, tem
também, como importante requisito de sua existência a manifestação da vontade
das partes.
A condição de os contratantes demonstrarem real interesse na celebração
do contrato é imprescindível, como em todo o negócio jurídico.
24
ANDRADE60 observa que:
A única distinção reside na maneira como a vontade é manifestada, uma vez que no contrato eletrônico a vontade dos contratantes é exteriorizada por meio de um instrumento tecnológico de informática e transmitida de um computador a outro, de modo que a vontade de contratar, tanto do policitante- quem faz a proposta de contratar – como do oblato- a quem é dirigida a proposta de contratar -, não é transmitida diretamente à outra parte contratante, mas para um computador.
A importância desse assunto encontra-se no fato de que a vontade uma
vez manifestada obriga o contratante, pois a formação do contrato tem início com a
oferta. Antes de ser realizada a proposta, na fase das tratativas, há apenas
sondagem de informações, não existindo ainda uma oferta em concreto. Não
obstante essa consideração o contrato se forma apenas quando, após a oferta do
policitante, ocorre a resposta com a aceitação do oblato. Desta maneira o vínculo
contratual se forma com a convergência de vontades manifestadas pelas partes.
Em princípio a declaração da vontade se apresenta nas seguintes
conformidades:61
2.4.1. Forma escrita Dá-se quando o policitante oferta por e-mail ou Messenger, e o oblato
manifesta sua concordância por meio de uma resposta, ou até mesmo quando em
determinada página da Internet a pessoa expressa seu interesse, preenchendo um
formulário com seus dados pessoais, no qual indica a aceitação da proposta
realizada pelo ofertante; é denominada forma expressa. Em outras palavras, a
declaração da vontade pela forma escrita é aquela em que não há dúvida quanto ao
interesse da celebração do contrato, pois o aceitante deixa grafado o seu interesse
no negócio jurídico.
60 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 31. 61 Classificação adotada por Valéria Elias de Melo Gregores, na obra Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 41.
25
2.4.2. Forma tácita
O exemplo clássico que ilustra esta forma de declaração de vontade na
criação do vínculo contratual é a oferta de utilização gratuita de software. Ao entrar
no site, é oferecida ao visitante a opção de clicar no ícone da tela, e ao pressionar o
botão do mouse o mesmo aceita a utilização o programa. Vale dizer que a mera
utilização do software demonstra a vontade de adquirir o programa, sem que haja a
necessidade da expressa manifestação de vontade por parte do aceitante.
Entretanto, é valioso pontuar outro entendimento doutrinário. Conforme
ANDRADE62, mesmo nas situações em que a aceitação é externada por um simples
clique do mouse, ato que ele denomina de point and click ou clickwrap acceptance,
esta será expressa, pois o fato de apertar o botão equerdo do mouse, concordando
com a utilização do software, demonstra a expressão de vontade do aceitante.
2.4.3. Pelo silêncio
GREGORES63 apresenta uma terceira forma de exteriorização da
vontade na criação de contratos, citando como exemplo a hipótese de o policitante
deixar à disposição da pessoa a realização do download de um software na íntegra,
e não apenas parte dele, com a ressalva de que, se ao final do prazo estipulado o
oblato não manifestar desinteresse pela continuidade da utilização do programa, seu
silêncio será interpretado como aceitação do produto.
No entanto, o exemplo acima citado não pode ser aplicado às relações
consumeristas, diante o disposto no art. 39, inc. III do Código de Defesa do
Consumidor, que proíbe expressamente o envio ou entrega ao consumidor, por
parte do fornecedor, de qualquer produto ou serviço sem solicitação prévia. Caso
62 Ronaldo Alves de Andrade, op.cit, p. 39. 63 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 42.
26
isto ocorra, o fornecimento será considerado como amostra-grátis, não onerando o
consumidor ao pagamento de qualquer quantia.64
Verifica-se que nos contratos eletrônicos a manifestação da vontade pode
ocorrer da mesma maneira que nos atos jurídicos em geral, restando somente
verificar o momento da conclusão do negócio.65
2.5. Momento de formação
A importância da formação do vínculo contratual encontra sua explicação
no art. 427 do Código Civil, o qual estabelece que a proposta gera obrigação àquele
que a realizou, exceto se o contrário constar de seus termos, da natureza do
negócio jurídico ou, até mesmo, das circunstâncias do caso. Desse modo, se não
forem respeitadas as condições estabelecidas, aquele que não as observou
responderá por perdas e danos.
O Código Civil não estabelece quando a proposta passa a ser obrigatória,
prevendo apenas a partir de qual momento a proposta deixa de vincular o
proponente. A doutrina diante desta lacuna, e com base no que é aplicável aos
contratos em geral estuda os contratos eletrônicos observando o momento de
formação entre presentes e ausentes.
Apesar da sustentação de DINIZ66 afirmando que o contrato eletrônico é
uma modalidade de negócio entre ausentes ou realizado à distância, prevalece o
entendimento doutrinário de que, o contrato virtual pode ser tido como celebrado
entre ausentes, como também entre presentes.
64 Valéria Elias de Melo Gregores, op.cit. p. 42. 65 Ibid, p. 42 e ss. 66 José Rogério Cruz e Tucci apud Maria Helena Diniz, Curso de direito civil brasileiro, vol. III. : teoria das obrigações contratuais e extracontratuais, p. 757.
27
Verifica-se que:
Entre partes presentes não haverá qualquer dificuldade em conhecer o exato momento da fusão ou da convergência de vontades, isto é, da formação do contrato, uma vez que esse evento ocorrerá no instante em que, respondendo à oferta manifestada pelo ofertante ou policitante, o oblato ou aceitante manifestar sua vontade de contratar, quer tacitamente, quando, por exemplo, no supermercado uma pessoa apanha um produto exposto na prateleira e dirige-se ao caixa para efetuar o pagamento, ou quando o comprador adquire algum produto em máquina automática, hipótese em que a mera inserção da moeda representa a aceitação, quer expressamente, quando as partes firmam um contrato de compra e venda exprimido em documento escrito.67
Quando as partes estão ausentes há uma real dificuldade em determinar,
a partir de qual instante já existe vínculo obrigacional, pois aqui a manifestação da
vontade é feita de forma indireta, sendo necessária a contratação de um
mensageiro, um entregador que fará a ligação entre policitante e oblato, podendo
ser também por meio do computador ligado à rede mundial de comunicação, a
Internet.68
2.5.1. Momento de formação entre presentes Para que o contrato seja celebrado entre presentes é necessário que as
pessoas estejam conversando diretamente, sem qualquer tipo de intermediação, em
conversa on line em tempo real, permitindo aos participantes conhecer da oferta, e
da aceitação ao tempo em que são formuladas.
Toda vez que as partes estiverem conectadas em uma mesma “sala de
bate papo”, em um mesmo site, ou em um programa de chat como ICQ, Messenger,
Google Talk etc., onde for possível que proposta e aceitação sejam feitas de forma
67 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 32 68 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 43.
28
imediata, estaremos diante de contratos eletrônicos firmados entre presentes,
apesar da existência de um computador como meio intermediário.69
O art. 428, parte final do inc. I do Código Civil considera contratação entre
presentes, a realizada pelo telefone, ou meio de comunicação semelhante, porque
há a possibilidade do imediato conhecimento da oferta e da aceitação.
A comunicação on line se assemelha em muitos aspectos com a
contratação feita pelo telefone, visto que permite que pessoas localizadas em pontos
diferentes possam interagir trocando informações, como se estivessem uma ao lado
da outra. Pela Internet, a comunicação telemática simultânea on line é ainda mais
completa do que a realizada pelo telefone, pois permite visualizar a pessoa com
quem se fala, por meio de web cam, enviar, e receber arquivos ou fotos.70
Não obstante: Também configura contratação entre presentes a decorrente de oferta pública feita em site, pois nesse caso o site funciona como um estabelecimento virtual, que dispõe em um catálogo produtos e serviços com dupla função: a primeira, de publicidade, pois quem acessa o site obrigatoriamente visualiza o produto ou serviço; a segunda, de oferta pública, uma vez que os produtos ou serviços constantes do catálogo eletrônico podem ser adquiridos, bastando para aperfeiçoamento do contrato a aceitação manifestada pelo oblato. Note que se trata de contrato entre presentes porque a aceitação pode ser imediatamente recebida pelo ofertante, já que, nesse tipo de relação jurídica, os computadores estão simultaneamente conectados”71.
2.5.2. Momento de formação entre ausentes Os contratos virtuais, assim como os contratos de um modo geral, podem
ser firmados entre ausentes. Isto ocorrerá sempre que o computador do oblato não
69 Valéria Elias de Melo Gregores. Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 46. 70 Ronaldo Alves de Andrade. Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 39. 71 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 41.
29
estiver conectado à rede de comunicação, quebrando a instantaneidade no envio da
mensagem feita pelo policitante.
A falta de comunicação imediata entre as partes impede que o oblato
receba a proposta enviada pelo ofertante em tempo real, ao mesmo tempo em que
este não poderá conhecer a aceitação daquele livre de interrupções temporais.
Esse tipo de contratação em muito se assemelha aos contratos
celebrados por correspondência convencional em que há a intermediação de um
serviço de correio ou telégrafo. O EDI – Eletronic Data Interchange- que de acordo
com a definição da Modelo de Lei da UNCITRAL é um meio eletrônico de
transferência de informações de um computador para outro, e o e-mail podem ser
citados como serviços de comunicação que permitem constituição de negócio
jurídico entre ausentes no mundo virtual.
O eletronic mail – e-mail – por exemplo permite que uma pessoa envie
uma proposta a alguém, não sendo necessário que o mesmo esteja on line. Uma
vez realizada a oferta, ela será encaminhada ao destinatário podendo ser
armazenada no computador deste ou de um terceiro, para posterior acesso. Em
geral, pessoas físicas, por não possuírem equipamento com configuração moderna
para receber e armazenar mensagens eletrônicas enquanto seus computadores não
estão conectados à rede, contratam o serviço de um terceiro que, com o
equipamento adequado, poderá armazenar a correspondência até um posterior
acesso. Esse serviço de armazenagem é feito, na maioria das vezes, por provedores
de acesso à Internet com a função de intermediar o processo de envio e
recebimento de mensagens eletrônicas, tarefa que pode ser comparada ao serviço
realizado por empresa de correios. 72
Diante dessa problemática surgiram algumas teorias73 com o intuito de
determinar, com exatidão, o momento em que os contratos eletrônicos se formam
entre ausentes, gerando obrigação para as partes no cumprimento do mesmo.
72 Ronaldo Alves de Andrade, op. cit., p. 43. 73 A esquematização adotada por este trabalho é a apresentada por Valéria de Melo Gregores, Caio Mário da Silva Pereira, Carlos Roberto Gonçalves e Ricardo L. Lorenzetti.
30
A primeira é denominada de teoria da informação ou da cognição.
Estabelece que o contrato entre ausentes tem sua formação no momento em que o
proponente toma conhecimento da resposta do aceitante; tem o inconveniente de
deixar ao arbítrio do proponente a decisão de tomar, ou não, conhecimento da
aceitação, não bastando a entrega da correspondência.
A segunda teoria é conhecida como teoria da recepção, que considera
como o momento de celebração do contrato aquele em que o proponente recebe a
resposta, não importando o fato de tê-la lido, ou não. Exige-se aqui que o policitante
tenha recebido a resposta enviada pelo oblato.
A teoria da declaração ou da agnição estabelece que o vínculo contratual
se forma ao tempo em que o oblato informa a sua resposta como positiva. Este
entendimento não pode ser aceito, porque além de haver dificuldade em comprová-
lo, a aceitação continua restrita ao oblato, que pode muito bem não enviá-la.
Por fim temos a teoria da expedição, que aponta como momento da
formação do contrato aquele em que é expedida a aceitação contendo como
resposta uma afirmação, saindo a mensagem do alcance do oblato.
Para os civilistas brasileiros esta é considerada a melhor teoria, pois evita
a incerteza quanto ao instante em que ocorreu a formação do vínculo jurídico,
afastando dúvidas de caráter probatório, embora não seja perfeita.
Esta última teoria é a adotada pelo nosso Código Civil brasileiro, em seu
art. 434, ao dizer que os contratos entre pessoas ausentes tornam-se perfeitos a
partir da aceitação ser expedida, ressalvados os casos de retratação,
extemporaneidade na resposta pelo oblato, nos casos em que são estabelecidos
prazos, ou quando o proponente se compromete a aguardar a resposta; todos
previstos nos incs. I, II e III do mencionado art. 434 do Código Civil.74
74 Ronaldo Alves de Andrade, op. cit., p. 37.
31
Entretanto, para a questão dos contratos eletrônicos esta teoria não é tida
como a melhor adoção, sendo considerada inconveniente; o correto seria adotar a
teoria da recepção.
Uma tendência majoritária que se propõe a estabelecer padrões
semelhantes na economia global se inclina para a adoção da teoria da recepção. 75
BARCELÓ76 sustenta que a adoção da teoria da recepção faz uso de uma
regra objetiva, ou seja, a necessidade de ingresso da resposta na esfera de acesso
do policitante, não sendo requisito que este tome conhecimento do conteúdo. Se
conhecer a mensagem fosse aspecto relevante, o ofertante poderia aguardar o
melhor momento econômico para admitir conhecimento da mensagem, com a
intenção de tirar vantagem da situação.
A comunicação entre pessoas ausentes poderia ser interpretada como
toda aquela em que não há contato físico entre as pessoas, até porque o Código
Civil não define o que é ausência, apenas fazendo uma menção ao termo quando
trata da obrigatoriedade da proposta no art. 428. Entretanto, o conceito de ausente
não tem qualquer tipo de relação com o local ou a distância física entre as pessoas,
e sim ao meio de comunicação utilizado na forma de contratar.77
É o que se entende analisando o inciso I do artigo antes mencionado, que
considera presente aquele que contrata por telefone ou outro meio de comunicação
que a ele se assemelhe, ou seja, ainda que o diálogo pelo telefone ocorra entre duas
pessoas localizadas em diferentes continentes, a contratação será considerada
como feita entre presentes. A ausência é, portanto, resultado da impossibilidade de
contato imediato, e não da falta de contato físico, o que permite a existência da
previsão legal no sentido de ser entre presentes a oferta e a aceitação feita pelo
telefone, uma vez que a proposta e a aceitação são conhecidas ao mesmo instante
em que formuladas, sem qualquer distância temporal.78
75 Ricardo L. Lorenzetti. Comércio eletrônico, p. 323. 76 Rosa Barceló apud Ricardo L. Lorenzetti. op.cit., p. 324. 77 Ibid, p. 41 78 Ronaldo Alves de Andrade, op.cit., p. 36.
32
Para alguns doutrinadores, como FRAN MARTINS79e LORENZETTI80 , a
classificação entre ausentes e presentes é realmente inadequada, vez que não
transmite, nem de forma gramatical nem logicamente, a significação das palavras,
propondo a eliminação dessa classificação.
FRAN MARTINS81 sugere a classificação da formação dos contratos
como constituídos por declarações consecutivas e intervaladas, não existindo
naqueles lapso temporal entre as duas fases contratuais, ao contrário da presença
do intervalo temporal nestes.
LORENZETTI82 adota a classificação de contratos celebrados
instantaneamente, e contratos não instantâneos. O primeiro grupo abrange todos os
contratos formados sem lapso temporal relevante, entre a oferta e a aceitação,
sendo considerado entre presentes, independentemente de estarem fisicamente no
mesmo lugar. A segunda categoria se refere aos contratos em que há um
considerável intervalo na declarações de vontade do policitante e do oblato, não
importando a presença física das partes.
Verifica-se que independentemente da nomenclatura usada ao classificar
a formação dos contratos eletrônicos, a idéia adotada é sempre a mesma: a da
instantaneidade ou não da comunicação entre as pessoas, isto é, a mesma
transmitida pelo Código Civil. Dessa maneira os contratos eletrônicos devem ser
analisados caso a caso, pois é perceptível que eles não possuem uma única
formação, podendo ser celebrados tanto entre ausentes como entre presentes, de
acordo com a existência ou não de interrupção na comunicação entre as pessoas.
79 Fran Martins. Contratos e obrigações comerciais, p. 72. 80 Ricardo L. Lorenzetti. Comércio eletrônico, p.321. 81 Fran Martins, op.cit., p.72 82 Ricaro L. Lorenzetti, op.cit., p. 321.
33
3. LOCAL E PROVA DO CONTRATO ELETRÔNICO
3. 1. Local de formação
O estudo do local de formação dos contratos eletrônicos é indispensável,
pois com base nele será fixada a competência para dirimir eventuais lides,
determinada a lei aplicável, bem como feita a interpretação da lei de acordo com os
usos e costumes locais.
Conforme a redação do art. 435 do Código Civil, o contrato tem-se como
celebrado no lugar onde foi proposto, independentemente de ter sido celebrado
entre ausentes ou entre presentes, desde que as partes sejam residentes ou
domiciliadas no Brasil, sujeitando-se à legislação nacional.83
Para os contratos em que oblato e policitante estejam em países distintos,
sendo um deles o Brasil, aplica-se o art. 9º caput combinado com seu parágrafo 2º,
ambos dispositivos da Lei de Introdução ao Código Civil, cujos textos dispõem que
para reger as obrigações será aplicada a lei do país em que se constituírem, e para
os contratos tem-se como constituída a obrigação no local em que reside o
proponente. Em resumo, para os contratos celebrados entre pessoas situadas em
diferentes países será considerado como local de formação, a residência do
ofertante.84
SANTOLIM85 afirma que:
Assim como é a aceitação que determina o momento da conclusão do contrato, é a oferta elemento decisivo na fixação do lugar do contrato, o que é relevante ante o que dispõe o art. 9º da Lei de Introdução ao Código Civil.
83 Guilherme Magalhães Martins, Formação dos contratos eletrônicos de consumo via Internet, p. 125. 84 Ibid, mesma página. 85 Cesar Viterbo Matos Santolim. Formação e eficácia probatória dos contratos por computador, p. 17.
34
Tanto no Código Civil como na Lei de Introdução ao Código Civil, o
entendimento é de que o contrato tem-se como concluído no lugar onde se encontra
o computador do proponente.
É valida e correta a posição doutrinária de que essas duas normas da
legislação pátria vão de encontro à teoria da expedição, adotada pelo Código Civil
quanto à formação dos contratos, visto que no local em que foi expedida a resposta
é que se forma o contrato, e não onde este foi proposto. Contudo, o legislador
brasileiro, quando da elaboração do Código Civil, optou por estabelecer como lugar
de celebração do contrato aquele onde é formulada a proposta.86
Não obstante essas relevantes considerações há uma particularidade
quanto à aplicação dessa regra aos contratos virtuais, em virtude de alguns meios
de comunicação serem de tecnologia móvel, como laptops, celulares, palmtops, etc.,
característica que permite o envio e o recebimento de mensagens de diferentes
lugares. Seria no mínimo duvidoso afirmar que o espaço aéreo internacional é o
local de formação de um contrato, por ser nesta área que o policitante se encontrava
na hora do envio da oferta.87
A problemática quanto à determinação do local de formação dos contratos
eletrônicos estende-se ainda à possibilidade de alguns sites terem como lugar
jurídico um nome de domínio que não corresponda ao lugar real em que o policitante
está localizado.88 Esta situação implicaria na obrigação de o aceitante verificar o
lugar real onde foi efetivada a proposta, o que muitas vezes é impossível. 89
Afirma LORENZETTI90 que:
O lugar não está vinculado com a empresa que disponibiliza o Web site nem onde este possa ser acessado, mas sim onde se desenvolve a atividade econômica; se existirem vários estabelecimentos, se
86 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 47. 87 Ibid, p. 48. 88 Ricardo L. Lorenzetti. Comércio eletrônico, p. 326. 89Nmrusso. A validade dos Contratos Eletrônicos. Disponível em:< http://guia.mercadolivre.com.br/validade-contratos-eletrnicos-19260-VGP> Acesso em: 27/02/2009. 90 Ricardo L. Lorenzetti apud Jorge José Lawand, Teoria geral dos contratos eletrônicos, p. 150.
35
determinará aquele onde se presta um serviço concreto ou onde o prestador tenha seu centro de atividades.
Para evitar estes conflitos, a Lei Modelo da UNCITRAL, no texto de seu
art. 15.4 indica como local de conclusão da contratação, aquele no qual o remetente
exerce atividade comercial. Será a mensagem considerada recebida no lugar onde o
destinatário tem o seu negócio. Caso tenha mais de um endereço comercial ter-se-á
o local de formação aquele onde se realiza o negócio principal. Caso o policitante
não possua endereço de serviço definido será considerado o logradouro residencial.
Nas hipóteses de contratos firmados por meios de comunicação móveis,
estes nada mais são do que uma extensão de sua residência. Portanto, entende-se
que é como se ali estivessem, de tal maneira que os efeitos do negócio jurídico
serão produzidos no domicílio dos respectivos contratantes, seja pessoa física ou
pessoa jurídica.91
A melhor solução para esta questão é a fixação do local de formação dos
contratos eletrônicos pelas partes, elegendo o foro de eleição, uma faculdade
atribuída pela lei, de maneira a evitar maiores dúvidas quanto ao lugar de formação
para o aceitante.
3.2. Contrato eletrônico como meio de prova A prova é uma utilizada com a finalidade de convencer o magistrado
sobre um fato ocorrido. Originária do latim probatio, a palavra prova significa
examinar, persuadir e demonstrar, buscando obter a convicção do magistrado.92
No mundo jurídico o ato praticado pelas partes é provado por um
documento, pois é ele que confere eficácia probante em juízo, para a demonstração
dos fatos alegados.
91 Ricardo L. Lorenzetti apud Jorge José Lawand, op.cit., p. 150. 92 Vicente Greco Filho. Direito processual civil brasileiro, volume 2, p. 196.
36
O contrato eletrônico pode ser usado como documento pois é possível
sua inserção em suporte físico. O conceito de documento eletrônico é semelhante
ao empregado para o documento tradicional, com a diferença de aquele ser
produzido em meio eletrônico, podendo, posteriormente, ser armazenado em
suporte material.93 Seu uso é feito com o objetivo de representar fatos mencionados
perante o magistrado, não importando o suporte material usado para sua fixação,
que pode ser uma folha de papel, um CD, uma fotografia, etc.
Para ANDRADE94 o contrato eletrônico tem que necessariamente estar
fixado em um suporte magnético para que sua existência seja considerada válida.
Complementa que, quando não for realizada a fixação, não se poderá falar em
contrato eletrônico, pois nesse caso estar-se-á bastante próximo do contrato verbal,
visto que nas duas situações não há base física da formalização negocial.
A lei brasileira não impõe impedimentos quanto à admissibilidade do
documento eletrônico como meio de prova, ao contrário, o art. 383 do Código de
Processo Civil, Lei n. 5.869 de 1973, prevê que:
qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, cinematográfica, fonográfica ou de outra espécie faz prova dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade.
Vale dizer que pode ser usado como prova qualquer documento,
reprodução mecânica ou de outra espécie. Verifica-se que a legislação brasileira
possibilita ampla liberdade dos meios probatórios, o que é de grande valia, pois em
direito, deve-se utilizar todos os meios de prova pertinentes, permitindo à parte
liberdade de prova quando da inexistência de normas proibitivas ou restritivas; mas
não a negativa de sua utilização perante o Judiciário.95
O Código Civil em seus arts. 212 a 232 regula a matéria da prova, dando
subsídios para a aceitação do documento eletrônico como meio probatório, uma vez
93 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 64. 94 Ronaldo Alves de Andrade, op.cit., p.89. 95 Valéria Elias de Melo Gregores, op. cit., p. 69.
37
que, no art. 107 do mesmo dispositivo, existe a previsão da liberdade de forma na
declaração de vontade, não dependendo de forma especial, ressalvados os casos
exigidos pela lei.
A admissibilidade de documentos eletrônicos como forma de prova está
prevista na Lei Modelo sobre Comércio Eletrônico da UNCITRAL, em seu art. 9.1,
que proíbe a aplicação de regras de comprovação que contestem a aceitação de
mensagem de dados como elementos de prova, a não ser que exista indícios de não
ser uma mensagem de dados ou sendo, não esteja na sua forma original.
Como visto, o contrato eletrônico possui valor probante apesar de a
vontade ser proferida em ambiente virtual desde que, na sua formação, tenham sido
observados os requisitos de segurança da rede, em especial no que se refere à
verdadeira identificação das partes, e à manifestação livre de vontade.96
3.3. Segurança
A discussão da admissibilidade do documento eletrônico como meio de
prova tem origem na insegurança da Web, ambiente no qual é possível alterar um
documento original inserindo ou suprimindo palavras, não obstante a problemática
da real identificação das partes, e da verdadeira intenção na manifestação de
vontade.
A segurança é a grande preocupação daqueles que utilizam a Internet
como meio de comunicação, trocando informações importantes, enviando propostas
e aceitando ofertas, digitando dados pessoais, como senhas bancárias e números
de cartões de crédito.
Para aqueles que praticam atos contratuais em ambiente eletrônico é
essencial que façam uso de equipamento dotado de sistema antivírus, bem como se
96 José Rogério Cruz e Tucci, op. cit., p. 315.
38
assegurem de que o site visitado possui softwares de segurança, impedindo a
invasão da máquina, e o roubo de informações por piratas eletrônicos, os hackers.
Entretanto, observar o nível de segurança do site associado à utilização
de programa antivírus é insuficiente para evitar a interceptação de informações; é
preciso existir uma conscientização dos usuários para que façam download de sites
confiáveis, e abram apenas e-mails de remetentes conhecidos.97
Nos contratos eletrônicos a atenção é voltada à identificação das partes,
atraindo investimentos para pesquisas e desenvolvimento de técnicas modernas e
adequadas para garantir maior confiabilidade e segurança na rede, como a
criptografia, a assinatura digital, o certificado digital, o cartório virtual e a
esteganografia.
3.3.1 Criptografia
A criptografia é um sistema bem antigo e um dos mais seguros para
proteger mensagens e informações eletrônicas. É uma espécie de codificação e
consiste em embaralhar os dados inseridos no documento, ou seja, cifrar a
mensagem em códigos objetivando que esta não seja lida por terceiros. Falar em
criptografia significa dizer que há codificação na mensagem.
Em um primeiro momento a informação será transformada da forma
compreensível para a forma incompreensível, fase da encriptação e, quando chegar
ao destinatário, será descodificada, fase da descriptação, podendo então ser lida.98
Este sistema, desde que possua um alto nível de segurança, não será quebrado e
invadido por hackers, garantindo que as informações não sejam violadas durante o
transitar pela Web. Ele permite ainda a identificação do remetente e destinatário,
possibilitando apenas aos mesmos o acesso à mensagem.
97 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 73. 98 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via Internet, p. 160.
39
GREGORES99 afirma que uma das técnicas criptográficas usadas para
verificar se a mensagem não foi alterada é aquela em que o remetente atribui valor
correspondente à letra do texto, informando ao destinatário a soma de todas elas.
Se ao receber a mensagem este verificar que a somatória final não corresponde ao
valor informado, restará comprovada a adulteração do conteúdo.
Há dois sistemas de criptografia: a simétrica e a assimétrica.
Na criptografia simétrica a mensagem é cifrada por uma chave privada,
uma senha, e decifrada com a utilização da mesma chave, de forma que tanto o
destinatário como o remetente possuem o mesmo código, logo não serve para
provar a identidade das partes. A utilização da mesma senha por ambas as partes
torna fácil a alteração do texto, sendo a segurança do método construída na
confiança entre elas. 100
A criptografia assimétrica, também conhecida por criptografia de chave
pública, faz uso de duas chaves: uma pública e outra privada. A chave privada fica
em poder exclusivo de seu proprietário, enquanto a chave pública, como sugestão
do próprio nome, fica acessível a todos com quem o particular mantém contanto.
Tanto a chave privada quanto a pública podem ser usadas para cifrar, e decifrar
mensagens. Assim a mensagem codificada pela chave pública será decifrada
somente pela privada, e vice-versa.101
Pelo fato de a chave privada se encontrar apenas em poder do particular,
ele não poderá questionar a autenticidade do documento até porque, após cifrada, a
mensagem só poderá ser descodificada pelo detentor da outra chave, o que permite
a identificação do remetente, e do destinatário.102
99 Valéria Elias de Melo Gregores, op. cit., p. 83. 100 Ibid, p. 85. 101 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, op.cit., p. 160. 102 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 86.
40
3.3.2 Assinatura digital Nos contratos convencionais é comum que as partes utilizem sua
assinatura autógrafa, colocando o nome por inteiro ou abreviado, com a finalidade
de identificá-los e comprovar a veracidade de seu conteúdo.
Esta prática decorre da exigência legal da manifestação da vontade na
celebração de negócios jurídicos, pressuposto essencial para sua existência.
Utilizando a assinatura, o autor estará manifestando sua concordância, além de se
identificar.103
Como fator de segurança na identificação das partes, o uso da assinatura
é imprescindível também na contratação virtual, o que deu ensejo ao
desenvolvimento da assinatura eletrônica.
A assinatura digital permite que seja identificada a origem de um ato na
rede mundial de comunicação, identificando o usuário, além de permitir o acesso
deste a transações restritas. Pode ser citado como exemplo o uso desta tecnologia
em empresas com redes de computadores interligados, possibilitando o acesso a
determinadas áreas da empresa com a utilização da senha de segurança.
Transpondo esta situação para o mundo físico, é como se apenas alguns
funcionários tivessem acesso às chaves da porta de departamentos exclusivos.104
Existem três espécies deste gênero:105
O Código Secreto ou password é a primeira espécie, no qual existe um
código alfanumérico, isto é, composto por letras e números, para acesso das
informações.
103 Miguel Pupo Correia, apud Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, op.cit., p. 163. 104 Patricia Peck. Direito digital, p. 87. 105 Valéria Elias de Melo Gregores, op.cit., p.91.
41
A segunda espécie se aproxima de uma cópia reprográfica da assinatura
autógrafa, é a chamada assinatura digitalizada, que consiste em copiar a assinatura
do papel, e reproduzi-la na tela do computador utilizando o scanner.
A última espécie é a assinatura digital, realizada por técnicas
criptográficas simétricas e assimétricas.
Pode-se dizer que:
A assinatura eletrônica é, portanto, uma chave privada, ou seja, um código pessoal e irreproduzível que evita os riscos de fraude e falsificação. Para o Direito Digital, uma chave criptográfica significa que o conteúdo transmitido só pode ser lido pelo receptor que possua a mesma chave.106
Não há qualquer intenção de que a assinatura digital substitua a
autógrafa, mas apenas o objetivo de trazer maior segurança na formação de
contratos virtuais, vez que permite a identificação das partes nos meios eletrônicos.
3.3.3. Cartório eletrônico e certificação digital
Buscando diminuir a probabilidade de adulteração de documentos e
aumentar a certeza quanto à identificação das partes contratantes, foram criados os
certificados digitais. Surgiram com a finalidade de afirmar a titularidade de uma
chave pública no sistema de criptografia.
O certificado digital exerce nos documentos eletrônicos função de
assinatura eletrônica, atestando que o conteúdo do documento não foi alterado. A
certificação é realizada por uma instituição de reputação notável, que transmite
segurança e exerce uma função similar a de um Cartório Eletrônico. A certificação
106 Patricia Peck. op.cit., p. 86.
42
digital assegura que os três pilares da comunicação segura – autenticidade,
privacidade e inviolabilidade - estejam presentes na Web, gerando confiabilidade
naqueles que a utilizam como meio para contratação. Significa dizer que documento
virtual elaborado por quem possui certificado digital não permite alteração de seu
conteúdo, tampouco dúvida quanto a sua autenticidade, transmitindo a mesma
credibilidade que possui a assinatura de punho em uma lauda de papel.107
O cartório eletrônico, também conhecido por autoridade certificadora, atua
elaborando, emitindo e publicando os certificados criados, além de divulgar as listas
de revogação daqueles que não são mais utilizados, e fazer a manutenção dos
arquivos de segurança contendo as informações dos certificados.108
O cartório eletrônico, ao contrário do que muitos imaginam, não utiliza
carimbos nem trabalha sob o regime de concessão governamental, apesar disso
emite certificados e carteira de identidade digital, de maneira semelhante aos
cartórios convencionais. Apesar de ser um órgão independente deve observar os
requisitos legais para o exercício de sua função.109Foi criado com função de agrupar
as informações necessárias para a identificação do portador da chave privada, e da
chave pública. O cartório virtual cria um par de chaves criptográficas, dando
publicidade às chaves públicas, e disponibilizando a chave privada apenas ao
proprietário. 110
Para disponibilizar as chaves deve ser feita a aferição da identidade do
usuário pelo meio físico; feita a confirmação, as chaves são liberadas para uso.
Caso perca a chave o proprietário deve solicitar a revogação ao cartório
eletrônico, que realizará o cancelamento do antigo código, emitindo um novo. Não
obstante a realização desse procedimento, o detentor da chave privada deve tornar
público este fato para evitar prejuízo a terceiros.
107 Disponível em <https://www.icpbrasil.gov.br/duvidas/faq/como-funciona-um-certificado-digital> Acesso em 04/02/2009. 108 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via Internet, p. 166. 109 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 95. 110 Valéria Elias de Melo Gregores, op. cit., p. mesma página.
43
No Brasil, de acordo com a Medida Provisória 2.200-2/2001, o serviço de
certificação pode ser feito em entidades públicas e empresas privadas. A ICP-
Brasil, autoridade certificadora da Infra Estrutura de Chaves Públicas Brasileira,
entidade pública nacional está capacitada para emitir certificados digitais, garantindo
comunicação segura e autenticação de documentos que circulam virtualmente. Ao
documento certificado por entidades que não forem credenciadas ao ICP – Brasil
será atribuído valor probante inter-partes, não produzindo efeitos perante terceiros.
O parágrafo 1º. do art. 10 MP 2.200-2 dispõe que presumem-se
verdadeiras todas as declarações contidas em documentos de formação eletrônica,
feitos com uso do processo de certificação digital disponibilizado pela ICP- Brasil,
em relação aos signatários. Este parágrafo atribui presunção de veracidade às
declarações feitas em meio virtual com o uso de assinatura digital, desde que esta
tenha sido disponibilizada por uma das autoridades certificadoras credenciadas pela
ICP- Brasil.111
Essa presunção é relativa- iuris tantum- ou seja, permite prova em
contrário e, enquanto esta não for realizada, presume-se verdadeiro o documento
quanto à sua autoria- autenticidade-, valendo como prova em relação ao signatário
quanto à sua declaração de vontade em produzir efeitos jurídicos.112
A validade de que gozam os documentos com certificação digital feita
pelos cartórios eletrônicos é tão grande que no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª.
Região, no Rio Grande do Sul, foi implantado o Sistema de Peticionamento
Eletrônico, pioneiro no país. Os documentos eletrônicos com certificação da ICP-
Brasil - são considerados como documentos originais, o que libera o advogado do
ônus de realizar envio posterior do original em papel, como ocorre quando a petição
é enviada por fax.113
111 Fabiano Menke. Assinatura eletrônica no direito brasileiro, p. 136-137. 112 J. M de Carvalho Santos apud Fabiano Menke. op. cit., p. 138. 113 Valéria Elias de Melo Gregores, op. cit., p. 96.
44
Verifica-se a presença flagrante do princípio da equivalência funcional,
pois as assinaturas digitais obtidas no âmbito da ICP- Brasil são equiparadas à
assinatura manuscrita.
GREGORES114 afirma ainda que no Brasil, tratando-se de certificação
eletrônica feita por tabelião de notas, não há necessidade de edição de lei
autorizando a prática desse ato, pois conforme redação dada pelo art. 41 da Lei n.
8.945 de 1994, é incumbência dos notários e oficiais de registro exercer todos os
atos previstos em lei necessários à realização de suas atividades,
independentemente de autorização, podendo adotar também sistemas de
computação, microfilmagem, disco ótico e outros meios de reprodução.
Se o notário pode fazer uso de qualquer outro meio de reprodução para
redigir, formalizar e autenticar com fé pública os atos de sua incumbência, pode
também realizar a certificação digital. E isto já acontece em 17 estados brasileiros,
onde é possível obter a escritura pública relativa à compra de imóveis de forma
eletrônica, sem qualquer deslocamento físico. 115
3.3.4. Esteganografia
Por fim, temos a esteganografia, modalidade de criptografia, que além de
criptografar o documento, insere uma espécie de marca d’água eletrônica, uma
identificação sobreposta à mensagem, sendo sua falta interpretada como
adulteração do documento.
114 Valéria Elias de Melo Gregores, op. cit., p. 99. 115Disponível em: <https://www.certisign.com.br/certinews/banco_noticias/2007/04/escritura-publica-eletronica-ja-e-realidade-em-17-estados> Acesso em: 10/02/2009.
45
4. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL E FORO COMPETENTE O interesse em estabelecer o local de formação dos negócios jurídicos
realizados virtualmente pode ser explicado por gerar efeitos quanto à fixação da
competência de eventuais conflitos entre as partes, à classificação dos contratos
como nacionais ou internacionais, e à lei aplicável.
A problemática da lei aplicável às relações jurídicas celebradas na
Internet encontra raiz nos contratos internacionais, conforme veremos a seguir. Não
resta dúvida de que a legislação que regulará os negócios eletrônicos nacionais será
a brasileira independentemente de ser o Código Civil disciplinador das relações civis
e comercias, ou de ser o Código de Defesa do Consumidor a fonte primária das
obrigações quando se tratar de relações envolvendo consumidor e fornecedor.
Em razão desta característica surge dúvida quanto aos litígios oriundos
dos contratos internacionais celebrados eletronicamente, pois podem ser regidos por
sistemas jurídicos internos distintos, ou por leis resultantes de tratados
internacionais.
O contrato internacional integra o Direito Internacional Privado, sendo
característica de sua internacionalidade a presença de um elemento que o ligue a
dois ou mais ordenamentos jurídicos. Para tanto é necessário que uma das partes
seja domiciliada em um país estrangeiro, ou que um contrato seja celebrado em um
país para ser cumprido em outro.116
Do mesmo modo como ocorre com os contratos internacionais em geral,
os conflitos decorrentes dos contratos eletrônicos de caráter internacional devem ser
solucionados pela utilização do Direito Internacional Privado, aplicando-se um
conjunto de regras que determinam a competência das várias normas
potencialmente aplicáveis às relações privadas.
116 Nadia de Araújo. Direito Internacional Privado: teoria e prática brasileira, p. 346.
46
A lei permite que as partes escolham o local de celebração do contrato
internacional, elegendo também a legislação aplicável; em caso de omissão das
partes, valem as regras do Direito Internacional Privado. 117
Na legislação brasileira, a Lei n. 4.657 de 1942 em seu art. 9º. permite
que a norma estrangeira seja aplicada, admitindo a extraterritorialidade, dispondo
que para regular as obrigações resultantes de contratos, seja aplicada a lei do país
em que se constituírem, reputando-se constituídas no local em que residir o
proponente.118
LEAL119 afirma que:
A problemática não se exaure, pois o art. 1º, caput e parágrafo 1º. da Lei de Introdução ao Código Civil dispõem que a obrigatoriedade da lei brasileira nos Estados estrangeiros depende de sua admissão expressa. Portanto, em relação aos contratos internacionais, a matéria está cingida à problemática de eficácia extraterritorial das leis e exige exame específico. Neste aspecto, parece justificável a sugestão de norma supranacional que estabeleça regras mínimas e de caráter geral para o comércio eletrônico no mundo virtual.
Para os que entendem ser necessário o desenvolvimento de uma lei que
atinja todas as relações de maneira geral, não importando o país de origem das
partes, nem mesmo o local em que elas se encontrem, podem fazer uso das
orientações traçadas na Lei Modelo da UNCITRAL.120
117 Jorge José Lawand, Teoria geral dos contratos eletrônicos, p. 149. 118 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via Internet, p. 122. 119 Ibid, mesma página. 120 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 140.
47
4.1. Legislação aplicável aos contratos nacionais
Quando se fala em legislação aplicável é necessário ter em mente que a
lei é a fonte das obrigações por excelência.121
Entretanto o desenvolvimento de leis específicas a serem aplicadas nas
relações virtuais é praticamente inexistente, ao contrário do avanço e
desenvolvimento tecnológico que, a todo o momento, permitem a criação e
melhoramento dos aparatos eletrônicos.
Nesta hipótese trata-se de lacuna da lei, não significando a
impossibilidade jurídica de solucionar o caso concreto. De acordo com o texto do art.
4º da Lei de Introdução ao Código Civil, ao julgador, em caso de omissão da
legislação, cabe utilizar a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
Não obstante essa previsão legal, o art. 126 do Código de Processo Civil dispõe que
o juiz não pode deixar de julgar uma demanda alegando obscuridade, silêncio ou
insuficiência da lei.122
No que se refere aos contratos eletrônicos há três correntes doutinárias
buscando a melhor solução para regulamentar a situação da legislação aplicável. 123
A primeira delas defende a desnecessidade de regulamentação
específica desse novo ambiente. Essa corrente utiliza como argumento o fato de as
relações surgidas da Web possuírem características semelhantes às das
contratações tradicionais já existentes.
Para eles, as contratações realizadas no mundo virtual apenas se
distinguem dos negócios jurídicos com formação tradicional no que diz respeito ao
meio utilizado, não criando nova relação jurídica. Por conseqüência, as relações
121 Valéria Elias de Melo Gregores, op.cit., p. 136. 122 Regina Ribeiro (org.), E-dicas: o direito na sociedade da informação, p. 34. 123 Alessandra A. Calvoso Gomes Pignatari apud Regina Ribeiro (org.), E-dicas: o direito na sociedade da informação, p. 35 e ss.
48
provenientes desse sistema são as mesmas existentes antes da evolução
tecnológica.124
Conforme posicionamento de GREGORES125:
não há que se falar em regulamentação própria ou específica, quanto às relações efetivadas por pessoas domiciliadas e residentes em nosso país, porque entendemos que a legislação existente abarca todas as relações decorrentes da rede.
É esse o entendimento que vem seguindo a jurisprudência brasileira nas
relações oriundas das contratações eletrônicas, que acaba por aplicar o direito
existente às relações virtuais.126
A segunda corrente segue a tendência de necessidade de criação de leis
específicas para reger as relações cibernéticas. Conforme MATEUCCI e
PIGNATARI127 esse é a posição adotada por DE LUCCA e LORENZETTI.
Para seus defensores, apesar da legislação existente ser aplicável a
certos casos virtuais, há necessidade de elaboração de normas regulamentando as
relações eletrônicas de maneira especial. Seu fundamento pauta-se na existência de
diversos projetos de lei visando à regulamentação dos contratos eletrônicos, como o
Projeto de Lei n. 4.906 de 2001 e o Projeto de Lei n. 7.093 de 2002.
Segundo BASSO128 é necessário que o Brasil comece a legislar sobre os
assuntos eletrônicos, não precisando que a lei seja minuciosa e queira regular de
uma única vez todas as relações, dada a constante evolução dos meios eletrônicos.
Afirma ainda que é sempre importante ter em mente que uma lei consistente é
aquela que traça características gerais, trazendo reconhecimento dos efeitos
jurídicos de um evento, gerando às partes segurança jurídica nas transações
efetuadas.
124 Valéria Elias de Melo Gregores, Compra e venda eletrônica e suas implicações, p. 138. 125 Ibid, mesma página. 126 Regina Ribeiro (org.), E-dicas: o direito na sociedade da informação, p. 34. 127 Ibid, p. 36. 128 Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1803> Acesso em:11/02/2009/
49
Por fim, existem os adeptos à idéia de auto-regulamentação do ambiente
virtual, os quais sustentam que os usos e costumes determinarão regras próprias do
ciberespaço, não devendo ser influenciado pelos impedimentos legais nacionais.129
Essa classificação permite esquematizar as diferentes visões existentes
quanto às normas que regulamentam a contratação virtual.
Para a aplicação da lei aos contratos celebrados entre pessoas
domiciliadas em solo pátrio brasileiro, esta classificação é dispensável, pois a lei
aplicada será a nacional, ou seja, a legislação específica da compra e venda, do
mandato, de prestação de serviço, etc., pois o contrato eletrônico é unicamente uma
forma de contratação.130 Ademais, não há até o momento no Brasil legislação
específica regulamentando as contratações eletrônicas.
Há também a possibilidade de as partes escolherem o local de celebração
dos contratos eletrônicos, o foro de eleição, implicando na determinação da
legislação aplicável, hipótese pouco remota, mas não impossível de ocorrer na seara
dos contratos firmados entre residentes no Brasil.131
LORENZETTI132 defende a validade desta cláusula apenas nos contratos
celebrados de forma consensual, mais freqüente entre empresas, diferentemente
das relações de consumo, onde é vista como abusiva se lesionar o direito à
jurisdição.
Dessa maneira, aplica-se aos contratos virtuais avençados entre pessoas
residentes no Brasil o Código Civil de 2002.
Ocorre que, quando da entrada em vigor do Código Civil brasileiro foi
revogada a primeira parte do Código Comercial de 1850, unificando o direito
129 Regina Ribeiro (org.), E-dicas: o direito na sociedade da informação, p. 36. 130Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 57. 131 Jorge José Lawand, Teoria geral dos contraltos eletrônicos, p. 149. 132Newton de Lucca; Adalberto Simão Filho (coords.), Direito & Internet vol. II- Aspectos Jurídicos Relevantes, p. 578.
50
obrigacional. Passou a vigorar, a partir de 2002, o mesmo ordenamento jurídico para
as obrigações civis e mercantis. Esse agrupamento, entretanto, não retirou a
autonomia do direito empresarial, até porque este possui seus próprios princípios.133
Além de princípios específicos, requisito determinante para a autonomia
jurídica, as contratações empresariais possuem características distintas das
realizadas na esfera civil. Conforme afirma Teixeira134, os negócios civis, em regra,
são realizados de forma isolada e em velocidade reduzida, em posição contrária aos
negócios empresariais, que são em grande parte firmados de forma reiterada e em
ritmo acelerado, vez que a demanda do mercado exige dinâmica nas atividades.
Apesar das peculiaridades dos contratos mercantis e civis, o Código Civil
regula as duas espécies de contrato e, quando identificada a relação, devem ser
aplicados os princípios a cada uma delas referentes.135
Caso a realização do negócio eletrônico envolva pessoa consumidora,
aquela que adquire ou faz uso de produto ou serviço como destinatária final,
conforme redação do art. 2º caput, da Lei n. 8.078 de 1990, aplicar-se-á o Código de
Defesa do Consumidor, e será tido como local de celebração o domicilio do
consumidor, de acordo com o disposto no art. 6º da mesma lei.
4.2. Foro competente
É necessário que não haja confusão entre legislação aplicável e foro
competente.
LEAL136 assegura que o foro competente para dirimir os litígios surgidos
da contratação eletrônica será aquele eleito pelas partes, conforme preceitua o art.
133 Tarcisio Teixeira, Direito eletrônico, p. 112. 134 Ibid, p. 114. 135 Ibid, p. 115. 136 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via Internet, p. 124.
51
111 do Código de Processo Civil. Não existindo foro de eleição, será aplicada a
regra geral do Código Processual Civil que em seu art. 94 traz que a ação fundada
em direito pessoal será proposta no domicílio do réu. Na ação em que se exigir o
cumprimento de obrigação, o foro competente é o do local onde a obrigação deva
ser satisfeita, conforme texto do art. 100, inc. IV, letra d do código anteriormente
mencionado.
Tratando-se de contrato de consumo, o art. 6º do Código de Defesa do
Consumidor determina a facilitação da defesa de seus direitos como um dos
princípios básicos e, no art. 101 estabelece que em casos de responsabilidade civil
do fornecedor a ação poderá ser proposta no domicílio do consumidor, parte
hipossuficiente na relação. 137
137 Sheila do Rocio Cercal Santos Leal, op.cit., mesma página.
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CONCLUSÃO Depois de realizada a pesquisa e os estudos do tema abordado, pode-se
afirmar que é pacífico o entendimento de que os contratos eletrônicos não têm
natureza jurídica diversa dos contratos em geral. Os contratos eletrônicos nada mais
são do que contratos tradicionais com o diferencial da ambientação em que ocorre a
formação do vínculo negocial.
Sendo assim, o contrato eletrônico pode ser conceituado como negócio
jurídico realizado por meio de mensagens eletrônicas pela Internet, entre duas ou
mais pessoas, a fim de adquirir, resguardar, modificar ou extinguir relações jurídicas
de cunho patrimonial.138
O regime jurídico do contrato com formação virtual, portanto, será o do
contrato representado, podendo ser de compra e venda, aplicação financeira, etc.139
Por não existir, até o momento, legislação específica regulando a matéria,
aplicam-se aos contratos eletrônicos as regras dos contratos tradicionais. Os
contratos formados na Web devem observar os princípios contratuais ordinários e os
requisitos do art. 104 do Código Civil, quanto ao objeto, às partes e à forma.
Esta última, como regra é livre, não implicando em exigências quanto a
solenidades. A formalidade será exigida somente nos casos previstos em lei, o que,
todavia, não impede que documentos eletrônicos tenham equivalência funcional de
documentos físicos.
Como visto, tudo isto é possível em razão das técnicas de segurança
desenvolvidas para dar maior credibilidade e confiabilidade às contratações
eletrônicas. Por serem de alto padrão tecnológico, formas de segurança como a
criptografia e a certificação digital garantem certeza quanto ao conteúdo e à pessoa
138 Jorge José Lawand, Teoria geral dos contraltos eletrônicos, p. 87. 139 Ronaldo Alves de Andrade, Contrato eletrônico no novo Código Civil e no Código do Consumidor, p. 31.
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com quem se contrata. Pode-se dizer que há maior dificuldade na alteração de
documentos eletrônicos do que em laudas de papel com conteúdo grafado de
próprio punho.
Em decorrência do princípio da equivalência funcional, os documentos
eletrônicos podem ser usados como meio de prova de fatos alegados em juízo, uma
vez que o Código de Processo Civil, em seu art. 332, admite como prova todos os
meios legais, ainda que nele não estejam expressamente previstos.
Com a MP 2.200-2, todos os documentos certificados pela ICP- Brasil têm
presunção de veracidade de seu conteúdo, sendo aceitos até mesmo por tribunais
brasileiros e permitindo contratações eletrônicas solenes, como já ocorre com a
escritura pública digital.
O fato de os contratos eletrônicos ainda não serem regulamentados por
lei específica não os desmerece. Como observado, há diferentes teorias quanto à
legislação aplicável as contratações virtuais e, é notável que, apesar de o Código
Civil possuir perfeita aplicabilidade às negociações na Web, faz-se necessária a
elaboração de norma próprias.
Contudo, a lentidão legislativa brasileira é contrária à velocidade com que
são desenvolvidos novos aparatos tecnológicos, deixando lacunas a serem
preenchidas pelo doutrinador.
É o que ocorria também quanto ao momento de formação dos contratos
eletrônicos e se este se dava entre presentes ou entre ausentes. Hoje é majoritário o
entendimento que da mesma maneira que ocorre com os contratos civis, podem os
eletrônicos ser celebrados entre presentes ou ausentes, de acordo com a existência
ou não de relevante lapso de tempo entre as negociações.
Em alguns casos, nem mesmo a doutrina conseguiu preencher os vazios
legislativos, como na determinação do local de celebração. O Código Civil adota
quanto à formação dos contratos a teoria da expedição, formando-se o vínculo
54
negocial com a resposta do oblato, isto é, onde este se localiza. Entretanto, em
contradição ao seu próprio texto, estabelece como local de formação onde o
contrato foi proposto.
Para este caso não há entendimento uníssono quanto à fixação do local,
sendo mais aconselhável que as partes, ao contratarem, elejam a legislação
aplicável e o foro competente, evitando maiores conflitos.140
140 Jorge José Lawand, op. cit., p.156.
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