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CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO EM JORNALISMO ALANA PEREIRA VENCATO A ARQUITETURA DO TEXTO: OS PERFIS JORNALÍSTICOS DA REVISTA FLORENSE CAXIAS DO SUL 2016

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CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL – HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

ALANA PEREIRA VENCATO

A ARQUITETURA DO TEXTO: OS PERFIS JORNALÍSTICOS DA REVISTA FLORENSE

CAXIAS DO SUL 2016

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UNIVERSIDADE DE CAXIAS DO SUL CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO EM JORNALISMO

ALANA PEREIRA VENCATO

A ARQUITETURA DO TEXTO: OS PERFIS JORNALÍSTICOS DA REVISTA FLORENSE

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de Bacharel em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul Orientador (a): Paulo Ribeiro

Caxias do Sul

2016

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ALANA PEREIRA VENCATO

A ARQUITETURA DO TEXTO: OS PERFIS JORNALÍSTICOS DA REVISTA FLORENSE

Trabalho de Conclusão de Curso para obtenção do grau de Bacharel em Jornalismo, da Universidade de Caxias do Sul

Aprovado em ___/___/2016

Banca Examinadora _______________________________ Prof. Dr. Paulo Ribeiro Universidade de Caxias do Sul – UCS _______________________________ Profª. Dra. Alessandra Rech Universidade de Caxias do Sul – UCS _______________________________ Prof. Me. Marcell Bocchese Universidade de Caxias do Sul – UCS

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, à minha mãe Jocélia Pereira, pelo apoio

incondicional em todas as etapas da minha vida. Não poderia deixar de citar

também a paciência e o auxílio no decorrer da minha trajetória acadêmica. Agradeço

também à minha avó, Marlene Nicoletti, por ouvir os relatos dos meus estudos e por

me fazer acreditar no meu potencial. À ela, meu muito obrigada, ainda, por despertar

em mim o gosto e a paixão pela literatura, tema essencial para o estudo deste

trabalho.

Quero reconhecer, também, a dedicação de meu orientador Paulo Ribeiro.

Obrigada por todas as dicas que foram fundamentais na execução desta monografia

e por toda a experiência transmitida. Além disso, agradeço ao editor da revista

Florense, Renato Henrichs, que disponibilizou tempo e conhecimento para a

realização deste trabalho.

Agradeço, ainda, aos meus padrinhos, Irinês Zanetti e Cleber Pereira, por

estarem sempre ao meu lado. Um muito obrigada também às amigas Camila

Valentini e Márcia Guidini pela amizade e companheirismo nesse período de estudo.

Por fim, mas não menos importante, agradeço à prima Letícia Cardoso e à amiga

Lisiane Zago pelo auxílio neste trabalho.

Vocês contribuíram para meu crescimento pessoal, acadêmico e profissional,

além de deixar minha trajetória mais leve e agradável. A todos, o meu muito

obrigada.

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É um trabalho de um verdadeiro arquiteto literário, preocupado em

construir, ou reconstruir, os interiores e exteriores em que as cenas se

passam, de um modo quase cinematográfico [...]

Antônio Olinto

Jornalismo e Literatura

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RESUMO

Esta monografia busca compreender o jornalismo literário, estilo que tem como principais características riqueza de detalhes e humanização de histórias. Assim, este estudo acadêmico identifica as estratégias de composição de linguagem do gênero, por meio de cinco perfis da revista Florense, procurando assim, evidenciar o jornalismo literário. Com base em pesquisa bibliográfica, haverá uma aproximação com obras que relacionam o jornalismo com a literatura e também com o New Journalism. A metodologia utilizada é o estudo de caso no método hipotético-dedutivo, segundo Laurence Bardin. Palavras-chave: Jornalismo Literário. Revista Florense. New Journalism. Revista. Reportagem. Perfil jornalístico.

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ABSTRACT

This paper seeks to understand the literary journalism, a style that has as main features rich details and humanizing stories. Thus, this academic study identifies the language composition strategies of this genre through five profiles of Florense magazine, searching so, appreciate the literary journalism. Based on literature search, there will be an approach to pieces that relate journalism to literature and also with the New Journalism. The methodology used is the case study on the hypothetical-deductive method, according to Laurence Bardin. Keywords: Literary. Journalism. Florense Magazine. New Journalism. Magazine. Article. Journalistic Profile. .

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 9 2 JORNALISMO E LITERATURA: EMBATES E CONSENSOS ....................... 12 2.1 O PERCURSO DA IMPRENSA E O JORNALISMO DO COTIDIANO ......... 18 2.2 O NEW JOURNALISM .................................................................................. 22 2.3 JORNALISMO LITERÁRIO: TRAZENDO VIDA AO TEXTO ......................... 24 2.4 OS GÊNEROS E A MISTURA DE ELEMENTOS ......................................... 27 3 A REVISTA NO BRASIL ................................................................................. 32 3.1 O TEXTO EM REVISTA ............................................................................... 36 3.2 O SURGIMENTO DA REVISTA NO BRASIL................................................. 39 3.3 O CRUZEIRO................................................................................................ 44 3.4 OUTRAS PUBLICAÇÕES QUE FIZERAM HISTÓRIA.................................. 46 4 A REVISTA FLORENSE .................................................................................. 51 4.1 FLORES DA CUNHA: CIDADE EMPREENDEDORA .................................. 51 4.2 A FÁBRICA DE MÓVEIS FLORENSE .......................................................... 54 4.3 UMA REVISTA DE VARIEDADES ............................................................... 56 4.4 ALGUMAS EDIÇÕES DA FLORENSE ......................................................... 62 5 OS ALICERCES DA ARQUITETURA ............................................................ 65 5.1 O MÉTODO DA ARQUITETURA .................................................................. 66 5.2 OS CINCO ARQUITETOS ............................................................................ 68 5.2.1 O estilo singular de Ruy Othake ............................................................. 68 5.2.2 O traçado de Oscar Niemayer ................................................................. 72 5.2.3 O talento de Paulo Mendes da Rocha .................................................... 76 5.2.3 Os contornos de Daniel Libeskind ......................................................... 81 5.2.4 As curvas de Zaha Hadid ......................................................................... 85 5.3 A PÓS- ANÁLISE DA ARQUITETURA ......................................................... 88 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 90 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 93 ANEXOS ............................................................................................................. 96 ANEXO A – PERFIL RUY OTHAKE ………………………………………………. 97 ANEXO B – PERFIL OSCAR NIEMAYER ......................................................... 98 ANEXO C – PERFIL PAULO MENDES DA ROCHA ......................................... 99 ANEXO D – PERFIL DANIEL LIBESKIND ........................................................ 100 ANEXO E – PERFIL ZAHA HADID .................................................................... 101

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1 INTRODUÇÃO

Esta monografia tem como tema “A arquitetura do texto: os perfis jornalísticos

da revista Florense”. A revista Florense é produzida em Flores da Cunha e trata de

assuntos atemporais que vão desde tendências e estilo de vida até moda e

decoração. Além de ser referência em qualidade, o conteúdo também é reconhecido

pelos arquitetos e designers não só da região, mas de todo o Brasil. Em cada

edição, a revista publica um perfil de profissionais renomados. A forma de escrita

recheada de detalhes e a narrativa cronológica e coerente lembram o jornalismo

literário. Assim, esta pesquisa terá como questão norteadora: Os perfis de arquitetos

publicados pela revista Florense se aproximam do jornalismo literário?

Desse modo, o objetivo geral deste trabalho é analisar os elementos do

jornalismo literário, valorizando uma publicação elaborada na Serra Gaúcha. Com

base no estilo de texto dos perfis divulgados na revista, procura-se também estudar

as diferenças e semelhanças entre jornalismo e literatura; identificar as estratégias

de composição e da linguagem utilizada em um perfil jornalístico e valorizar o

jornalismo literário, procurando estudar e caracterizar a narrativa do gênero.

Para compreender o estilo de texto trabalhado na revista, serão utilizados

como base os perfis de cinco arquitetos: Ruy Othake, Oscar Niemayer, Paulo

Mendes da Rocha, Daniel Libeskind e Zaha Hadid. Obras grandiosas, mas também

humanistas, permeiam o mundo de cor e arte desses profissionais. É isso que a

linguagem das reportagens, sempre recheada de detalhes, ressalta. Assim, os

jornalistas que elaboraram as matérias conseguem no papel a mesma qualidade e

excelência que esses arquitetos conseguem no concreto.

É desse modo que o jornalismo literário trabalha. No universo de agilidade

das redações, é comum que a informação chegue ao leitor fragmentada e

superficialmente. Assim, surge a necessidade de um jornalismo com uma linguagem

detalhista para contrapor a objetividade do jornalismo tradicional. Além de facilitar a

compreensão dos fatos, a linguagem com elementos literários também enriquece a

matéria.

Diante disso, as seguintes hipóteses foram construídas:

1 A escolha dos perfilados se deve ao público-alvo da revista;

2 A linguagem, apesar de ser um veículo ligado ao design, é próxima da

literatura;

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3 É privilegiado o estilo de vida de cada um dos perfilados;

4 A experiência profissional se articula com o texto de natureza literária.

Portanto, esta pesquisa fará um estudo de análise de conteúdo a partir do

método hipotético-dedutivo de Laurence Bardin (1997). Como o objetivo do trabalho

é aprofundar o conteúdo, será realizada uma análise qualitativa.

De acordo com Bardin (1977), a pesquisa possui três fases. No projeto desta

monografia já foi realizada a pré-análise, ou seja, a procura por materiais a serem

analisados. Desse modo, este trabalho busca explorar os perfis da revista Florense.

É a etapa da constituição do corpus, ou seja, o objeto de estudo.

Por fim, ocorrerá a interpretação e o tratamento dos resultados obtidos.

Assim, os perfilados serão aproximados do jornalismo literário, tendo como base o

objetivo principal de uma análise de conteúdo que é levantar inferências.

Para tanto, a presente pesquisa percorrerá o seguinte caminho:

O capítulo 2 será sobre o jornalismo literário. Com o nome de Jornalismo e

Literatura: Embates e Consensos, busca-se compreender as diferenças e

semelhanças entre os dois gêneros, por meio de autores como Antônio Olinto,

Felipe Pena, Marcelo Magalhães Bulhões e Sérgio Vilas Boas. Assim, alguns estilos

que representam a confluência entre jornalismo e literatura também serão

abordados, bem como o New Journalism (Novo Jornalismo), prática que ganhou

destaque nos anos 1960 por misturar a veracidade do jornalismo com a estética

literária.

Para o terceiro capítulo, o tema é jornalismo de revista. Chamado A Revista

no Brasil, o capítulo contará a trajetória das publicações, através de fatos que

marcaram a história do país. Também será debatido o estilo de escrita de uma

revista e as suas diferenciações em relação aos jornais. As autoras Marília Scalzo e

Maria Celeste Mira são essenciais para a composição do assunto.

Nesse ritmo, o quarto capítulo tratará, especificamente, da Revista Florense.

Por meio de uma entrevista com o editor da publicação, Renato Henrichs, será

possível conhecer um pouco do surgimento do periódico, bem como o estilo

diferenciado de cada reportagem.

Por fim, o último capítulo, denominado de Os Alicerces da Literatura, tem

como meta analisar a aproximação do jornalismo e da literatura, através dos perfis

dos cinco arquitetos. A linguagem de cada texto ressalta a genialidade de obras de

arte dos profissionais e traz mais vida para as reportagens. Ao final da análise,

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pretende-se apresentar algumas inferências, objetivo principal de uma análise de

conteúdo, a partir do que foi estudado no decorrer de toda a monografia.

Este trabalho propõe mostrar que é possível ir além do jornalismo

convencional e objetivo. A literatura deixa qualquer linguagem mais bela e também

privilegia a imaginação. Desse modo, esta monografia destacará que, com uma

dose de criatividade, o jornalismo também pode produzir obras de arte. Além disso,

este trabalho traz, pela primeira vez, para âmbito acadêmico o estudo e valorização

da revista Florense.

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2 JORNALISMO E LITERATURA: EMBATES E CONSENSOS

O debate sobre literatura e jornalismo é algo que cada vez ganha mais pauta

para os profissionais do assunto. Há quem diga que os gêneros não se misturam.

Porém, é inegável que muito de seus elementos são os mesmos.

Antonio Olinto (2003) no livro Jornalismo e Literatura, ressalta que a palavra é

a base tanto para o jornalismo quanto para a literatura. “O artista da palavra sente a

atração de sua própria familiaridade com a palavra e gosta de repetir o que foi

elemento seu de criação.” (OLINTO, 2003, p. 74).

O livro Jornalismo e Literatura: A Sedução da Palavra, de Alex Galeno e

Gustavo de Castro (2002), pode ser utilizado como base para a análise do gênero. O

livro reúne jornalistas, escritores e comunicadores em geral que buscam explorar

tanto as divergências quanto os pontos em comum dos dois gêneros.

Independentemente do estilo textual, a palavra é o eixo central de toda e qualquer

comunicação. Por meio dela, o escritor ou o jornalista busca atrair e conquistar o

seu leitor. Na publicação, Juremir Machado da Silva (in CASTRO; GALENO, 2002)

procura definir o ato de escrever.

O que escrever quer calar? O conteúdo. Escrever é antes de tudo dar forma. Mas escrever é também, sobretudo peneirar. Cala mais aquele que escreve melhor. Para calar muito, às vezes, é necessário uma forma inesperada, algo que tire o conteúdo da denotação, tomando um desvio conotativo, para enfim, calar, profundamente no sentido denotativo, deixado temporariamente de lado. (MACHADO DA SILVA in CASTRO; GALENO, 2002, p. 50)

Assim, o autor explica os gêneros jornalístico e literário. “A literatura é uma

forma de dizer o mesmo com outras palavras. O jornalismo é um conteúdo dito de

forma que se perca o mínimo.” (MACHADO DA SILVA in CASTRO; GALENO, 2002,

p. 50)

Além de Machado da Silva (in CASTRO; GALENO, 2002) e Olinto (2003),

outros autores entram no debate de gêneros. Para Marcelo Magalhães Bulhões

(2007), em Jornalismo e Literatura em Convergência, os dois profissionais possuem

trajetórias diferentes. Segundo o autor, a convergência entre as profissões de

jornalismo e letras é formada por impasses e conflitos.

Manuel Ángel Vásquez Medel (in CASTRO; GALENO, 2002) tem opinião

parecida. O escritor ressalta que jornalismo e literatura possuem relações variadas e

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desde o romantismo os dois gêneros têm andado de mãos dadas. “Jornalismo e

literatura são práticas discursivas verbais que mantém um falso contencioso

baseado no prestígio de uma ou outra atividade que, apesar dos elementos comuns,

mantêm técnicas diferencias.” (MÉDEL in CASTRO; GALENO, 2002, p. 16) O autor

ressalta também que para a literatura o destaque em um fato é o que há de

importante, enquanto para o jornalismo é o que é urgente.

Sérgio Vilas Boas também questiona a polêmica relação do gênero

jornalístico com a literatura nos livros Literatura e Jornalismo – Mistérios da Criação

Literária (2003) e O Estilo Magazine – O Texto em Revista (1996). O autor ressalta

que, de certa forma, os meios de comunicação impressos acabaram tomando o

lugar do livro.

Há estudos acadêmicos relevantes, sérios e “desideologizados” sobre as relações do jornalismo e literatura. Alguns me dizem que jornalismo e literatura são água e óleo, que não misturam; outros argumentam que são nutrientes da mesma porção de terra, ou algo como os dedos desiguais de uma mesma mão. (VILAS BOAS in BRITO, 2007, p. 19)

De um lado, o repórter busca transmitir a realidade dos acontecimentos ao

seu leitor. Do outro, o escritor trabalha com ficção e fantasia. Vilas Boas (1996)

salienta que na literatura é possível, por exemplo, acrescentar uma projeção

pessoal, pois a linguagem pode servir para fins teóricos ou estéticos. Já no

jornalismo, os personagens são fato.

Para o redator, a linguagem é puro instrumento do pensamento, um meio de transmitir realidades. Para o escritor, ao contrário, a linguagem é um lugar dialético, em que as coisas se fazem e se desfazem. Ou seja, o discurso literário está fundado na possibilidade de traduzir diferentes matizes do real. Sendo assim, a liberdade é total, inclusive para reinventar a própria linguagem. O jornalismo não. A base do discurso jornalístico é a simplicidade [...] (VILAS BOAS, 1996, p. 59)

O autor ainda completa que, no texto literário, não há nada que seja

exclusividade, pois qualquer conteúdo pode ser englobado. Enquanto isso, no

jornalismo o principal é informar.

Enquanto a literatura é uma viagem, o jornalismo precisa dos pés no chão.

Essa é a analogia que o jornalista Bernardo Ajzenberg (in CASTRO; GALENO,

2002) faz no livro Jornalismo e Literatura: A Sedução da Palavra. Para o autor, os

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recursos estilísticos e linguísticos de sedução do jornalismo não são os mesmos da

literatura.

O autor Cosson (in CASTRO; GALENO, 2002) faz uma comparação diferente

para os dois estilos.

Trata-se da apropriação ficcional da realidade que é, obviamente, diferente da apropriação factual demandada pelo jornalismo. Essa diferença capital entre os dois discursos está representada pelas próprias metáforas com que os denominamos. Desse modo, se o jornalismo é império dos fatos, a literatura é o jardim da imaginação. (COSSON in CASTRO; GALENO, 2002, p. 58)

O autor ressalta, ainda, que a literatura é um ideal a ser atingido por todo

jornalista. Porém, nem sempre foi assim. Bulhões (2007) destaca que, inicialmente,

havia uma clara separação de estilos, pois enquanto ser escritor literário significava

prestígio, ser jornalista era sinônimo de “ralé”.

Gustavo de Castro (in CASTRO; GALENO, 2002) argumenta que enquanto o

jornalismo pretende oferecer uma visão objetiva e fiel aos fatos, a literatura

apresenta um recorte verossímil. Mas há um jornalismo praticado com efeitos

tendenciosos e falsos, com fatos inventados em suas reportagens.

O texto jornalístico permite que várias pessoas (além do repórter ou redator) possam nele intervir, alterando-o tantas vezes queiram, sendo por fim, o resultado de uma produção coletiva. O texto literário permite, diversos níveis de relação no interior do próprio texto, produzindo metanarrações, explorando diversas camadas de significação, criando efeitos de realidade. (CASTRO in CASTRO; GALENO, 2002, p. 80)

Dessa forma, os conceitos para literatura e jornalismo são diversos. Menezes

(1997), também entra no debate de gêneros em Jornalismo e Literatura.

Se dissermos que a literatura é a transposição do real, enquanto o jornalismo é a realidade em si mesma; se argumentamos que na literatura há o sentido de permanência, ao passo que o jornalismo se prende ao quotidiano, ao efêmero; se afirmarmos que o jornal não dura, e o livro sim; se ponderamos que o escritor cria e expressa seus próprios pensamentos, enquanto o jornalista exprime os sentimentos, as reivindicações da comunidade – ao mesmo tempo em que verificamos essas distinções constatamos numerosos pontos de afinidade entre jornalismo e literatura. (MENEZES, 1997, p. 20)

O autor acredita que o surgimento de novos meios de comunicação auxiliou

no desaparecimento das fronteiras entre os gêneros. Para Menezes (1997), o

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jornalismo está ligado às formas de transmitir os acontecimentos, enquanto a

literatura “é a arte que se exprime por meio da palavra falada ou escrita”.

Dessas definições poderemos deduzir as diferenciações existentes entre jornalismo e literatura. Mas, a rigor, não há uma fronteira delimitando ambos, um divisor de águas entre jornalismo e literatura. Demarcação rígida, nítida, entre os dois, possivelmente não existe. (MENEZES, 1997, p. 19)

Apesar disso, são inegáveis as diferenças entre os profissionais. Bulhões

(2007, p. 18) observa que a literatura não utiliza um atributo essencial do jornalismo:

a contemporaneidade. Afinal, uma obra literária passa a valer no momento em que

a leitura é realizada.

A literatura parece viver, portanto, uma eterna condição paradoxal, ao mesmo tempo em que é instância de liberdade pelo poder criativo e transformador da linguagem, fornece marcas identificadoras que a conectam a uma determinada época. Ela é autônoma, mas sempre carrega alguma etiqueta que fornece ao leitor sinais de identificação do tempo em que foi produzida. (BULHÕES, 2007, p. 28)

Diferentemente do escritor, o repórter possui objetivos diferentes. Bulhões

(2007, p. 11) acredita que o jornalista é uma espécie de historiador da vida

contemporânea e sua natureza está na apuração dos fatos, de forma que a

linguagem é o meio e não fim.

O jornalista de talento, que tenha algo a dizer e que seja capaz de criar um estilo, de formar um mundo diferente feito de palavras comuns, é tão raro como o poeta de talento. Porque jornalismo é ato de criação, é contínuo bater pensamento sobre a massa informe da linguagem, no esforço de lhe dar a essência da humanidade necessária a sua perpetuação. (OLINTO, 2003, p. 76)

Castro (in CASTRO; GALENO, 2002) tem opinião parecida a de Bulhões

(2007).

O jornalista traz quotidianamente o mundo para dentro do texto escrito. Põe no papel fatos, cenas, realizações, eventos os mais variados, num movimento em que extrai do mundo a matéria-prima necessária para transformá-la em narração. Para o escritor, o movimento é inverso. (CASTRO in CASTRO; GALENO, 2002, p. 73)

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Segundo o autor, o escritor pode buscar na sua própria subjetividade toda a

sua literatura. Apesar de ser diferente em muitos fatores, é possível dizer que o

jornalista também deve contar uma história, pois o profissional tem como objetivo

fazer o leitor compreender a situação.

Pena (2006) afirma que a natureza da profissão está no medo e na

curiosidade de buscar os fatos. “É um trabalho de um verdadeiro arquiteto literário,

preocupado em construir, ou reconstruir, os interiores e exteriores em que as cenas

se passam, de um modo quase cinematográfico [...]”. (OLINTO, 2003, p. 39).

Para isso, Bulhões (2007, p. 23) afirma que o jornalista tem que ir atrás dos

acontecimentos, muito mais do que coletar apenas opiniões.

O jornalista, que tem a vocação do jornal, é um escritor, no sentido exato dessa palavra. Aperfeiçoa a sua linguagem e, tendo de fazer uma reportagem, coloca nela o melhor de seu talento e seus esforços. (OLINTO, 2003, p. 29)

Assim, apesar das divergências, é inegável as semelhanças ou fatores em

comum entre os dois gêneros, pois ambas profissões acabaram se

complementando.

Os jornalistas, como os escritores, precisam ouvir, ler, escrever, compreender e interpretar, exercer sua sensibilidade, saber e conhecer através dos escritos e ditos dos outros. Mas precisam sobretudo dar vida nova ao leitor que está morrendo. (DRAVET in CASTRO; GALENO, 2002, p. 90)

De acordo com Pena (2006, p. 28), a influência da literatura na imprensa

iniciou entre os séculos XVIII e XIX, quando os escritores de prestígio tomaram

conta das redações dos jornais.

Héris Arnt (2001), também destaca essa intervenção do gênero literário no

jornalismo. A autora observa que a presença dos escritores contribuiu para deixar o

jornal mais informativo e atraente. Mas a literatura também recebeu influência das

redações. No século XIX, os escritores passaram a tratar de questões sociais e

temas do cotidiano.

Assim, muitos escritores iniciaram com o jornalismo ou vice-versa. Pode-se

citar como exemplo, Manuel Antônio de Almeida, Machado de Assis e José de

Alencar.

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O fato de muitos jornalistas estarem atualmente escrevendo romances é uma decorrência dessa união do homem de jornal com o fato, com aquilo que acontece a seres humanos, com os dramas, as comédias e os desesperos da vida cotidiana. (OLINTO, 2003, p. 41)

Moacir Scliar (in CASTRO; GALENO, 2002) é um dos autores que defende

que a literatura contribui para a forma de escrita do jornalismo, despertando também

a imaginação tanto do profissional, quanto do leitor.

Agora: acho, sim, que a literatura pode ensinar algo ao jornalismo. Em primeiro lugar, a cuidar da forma, a escrever e a reescrever. Também ensina a privilegiar a imaginação – mas não demais: realidade é realidade, ficção é ficção. O novo jornalismo foi uma experiência interessante, mas exagerou muito. Há sim, uma fronteira entre jornalismo e ficção. Mas é uma fronteira permeável, que permite uma útil e amável convivência. (SCLIAR in CASTRO; GALENO, 2002, p. 14)

Juremir Machado da Silva (in CASTRO; GALENO, 2002) também acredita

que o jornalismo não pode viver sem a consciência da literatura. Entre os principais

problemas do jornalismo contemporâneo destacados pelo autor está que o jornalista

quer informar sem utilizar a literatura. Para ele, o jornalismo encontra-se com a

literatura quando toma consciência do silêncio das palavras. Dessa forma, o

jornalista precisa ser expressivo.

Ambos profissionais da escrita, escritor e jornalista, produzem textos

narrativos, ou seja, que contam uma sequência de fatos ao longo do tempo

(BULHÕES, 2007, p. 40). Para Olinto (2003, p. 41), contos e ensaios são os estilos

que mais se aproximam da literatura. Mas é possível encontrá-la também na

reportagem e na informação.

Em termos mais práticos, a busca da confluência entre jornalismo e literatura, no que tange a narratividade, acaba por atingir os gêneros narrativos, em prosa. No caso da literatura, os gêneros convocados são, fundamentalmente, o romance e o conto. No caso do jornalismo, a notícia é a reportagem. (BULHÕES, 2007, p. 41)

Dessa forma, a reportagem é uma forma desenvolvida da notícia. Com estilos

que se misturam entre si, muitos autores como Olinto (2003) consideram o

jornalismo como uma forma de literatura.

O jornalismo já foi chamado de "literatura sob pressão". Pressão do tempo e pressão do espaço. Em todo o mundo, a cada instante, os cultores desse

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tipo de literatura lançam palavras sobre o papel, com a preocupação do tempo que passa e do espaço que é limitado. As frases ajustam-se a um tamanho, o pensamento é obrigado a trabalhar depressa. (OLINTO, 2003, p. 13)

Olinto (2003, p. 13) completa ainda que o jornalismo tenha as mesmas

possibilidades que a literatura, de produzir obras de arte. Vilas Boas (1996) tem

opinião parecida nesse sentido. O autor explica que tanto a literatura quanto o

jornalismo precisam de inspiração para escrever, ou seja, exercitar a criatividade.

Literatura se alimenta de enfoques contemporâneos ampliados. Além disso, é arte. Mas nada impede que a reportagem, a interpretação, a análise, o editorial se convertam em expressões de arte. Porém, o que o jornalismo expressa tem estilo e conduta próprios. Por isso, ele está pronto para sacrificar as virtudes da linguagem em nome da clareza, surpresa, síntese, consenso, impacto, novidade, efeitos etc. (VILAS BOAS, 1996, p. 63)

Dessa forma, no jornalismo é preciso escrever em menos tempo, mas não

impede que o jornalista produza suas próprias obras. Para isso, portanto é preciso

gostar de escrever.

2.1 O PERCURSO DA IMPRENSA E O JORNALISMO DO COTIDIANO

Informação e opinião. Essas são as palavras-chaves definidas por Arnt

(2001), sobre o percurso da imprensa.

O jornalismo informativo pretende ser isento e objetivo, suprindo as necessidades básicas da informação da sociedade. O jornalismo de opinião é crítico, marcado pela tomada de posição e defesa de ideias políticas e filosóficas. (ARNT, 2001, p. 15).

Vilas Boas (1996) reforça esse ponto ao lembrar que no jornalismo diário ao

escrever uma notícia é preciso sempre levar em conta uma hierarquia de

importância e de atualidade. Além disso, há um padrão para o formato de texto

também, como parágrafos curtos, frases diretas e termos simples. Tudo para facilitar

a compreensão do leitor.

A fórmula do lead pode ser considerada uma marca do texto informativo. Ao

responder logo no primeiro parágrafo as perguntas “O quê?”, “Quem?”, “Quando?”,

“Onde?”, “Como?” e “Por quê?”, o jornalista introduz a notícia e confere objetividade

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para a matéria. Conforme Bulhões (2007), o lead foi destaque na imprensa dos

Estados Unidos desde 1900.

Carlos Peixoto (in CASTRO; GALENO, 2002) lembra que existem algumas

características que o jornalista Dantom Jobim atribui à narrativa jornalística, como

rapidez, exatidão e visibilidade. Falta de leveza, restrições à multiplicidade,

impossibilidade de constância são considerados pontos de falhas.

A partir dessas particularidades, o que seria o principal para o jornalismo?

Para Vilas Boas (1996), estilo é a resposta, pois pode ser o ângulo que o jornalista

ou o veículo se coloca. Segundo ele, o estilo jornalístico se resume em padronizar e

racionalizar.

O jornalista é o homem de ponta dessa padronização e racionalização. Geralmente, é ele quem apura e redige as notícias, seguindo a maneira de ser do veículo onde trabalha e o seu próprio estilo. No entanto não basta ser jornalista para ter estilo. Mas é preciso o inverso: ter estilo pra ser jornalista. (VILAS BOAS, 1996, p. 40)

O autor explica, ainda, que os principais aspectos do estilo jornalístico são

ritmo, jeito, equilíbrio, linguagem, apresentação, símbolos, ética e personalidades.

Tratando-se especificamente de texto, o jornalismo está esteticamente ligado à

literatura.

Nanami Sato (in CASTRO; GALENO, 2002) relata que o jornalismo é fazer

história do cotidiano e destaca também a importância da combinação com a

literatura.

Apesar da vocação para o “real”, o relato jornalístico sempre tem contatos ficcionais: ao causar a impressão de que o acontecimento está se desenvolvendo no momento da leitura, valoriza-se o instante que se vive, criando a aparência do acontecer em curso, isto é, uma ficção. (SATO in CASTRO; GALENO, 2002, p. 32)

A ligação dos dois gêneros também ficou evidente na década de 1970,

quando o jornalismo sofreu a censura da ditadura militar. Cosson (in CASTRO;

GALENO, 2002) observa que na época a ditadura devastou a produção cultural

brasileira, provocando a prisão e o exílio de artistas e censurando os meios de

comunicação. Assim, os jornalistas foram forçados a buscar em outros locais o

espaço que era negado nos jornais. Como tinha baixas tiragens e era praticamente

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restrita à elite, a literatura assumiu o papel de denunciar e revelar as verdades

omitidas.

Considerado como uma produção cultural específica de sua época, o romance-reportagem seria o resultado ou subproduto da censura da repressão do regime ditatorial no campo do jornalismo. Essa origem, de cunho mais geral e por isso mesmo assimilada a uma tendência da década de 1970, toma como ponto de partida a estreita relação temática e formal atestada na época entre literatura e jornalismo. (COSSON in CASTRO; GALENO, 2002, P. 61)

Mas nem sempre a literatura é utilizada no jornalismo. Como já dizia Olinto

(2003), o jornalismo se trata de uma “literatura sob pressão”. A principal meta das

redações é divulgar notícias com rapidez e abranger o maior número de assuntos, o

jornalismo é atingido facilmente pela rotina, utilizando-se de uma linguagem fácil,

mas pouco atrativa para o leitor. “O que interessa a qualquer leitor de jornal é o que

de novidade possa o escritor ter descoberto no mundo. O dilema, perigoso e sutil,

que o jornalista tem de enfrentar, é da atualidade e da permanência.” (OLINTO,

2003, p. 42).

E isso não é de hoje. Nos anos 1950, com o padrão de escrita americano, a

notícia passou a ater-se apenas ao principal e excluir recursos estilísticos, utilizados

pela literatura (Bulhões, 2007, p. 136). Nessa época, havia a delimitação clara entre

literatura e jornalismo. A crônica era a única exceção para a confluência de gêneros

no jornal.

Na década de 1950, com as transformações estilísticas e gráficas dos jornais, a mudança já está consolidada. A objetividade e a concisão, substituem as belas narrativas. A preocupação com a novidade e os faist drivers assumem a função principal na pauta. A Literatura é apenas um suplemento. (PENA, 2006, p. 40)

Como um marco na história do jornalismo, Bulhões (2007, p. 45) ressalta a

Guerra da Secessão ou Guerra Civil dos Estados Unidos (1861 – 1865). A guerra

mobilizou correspondentes descrevendo o cenário cruel da batalha. Já Homero

pode ser considerado como o primeiro repórter por causa das descrições dos

combates de Aquiles e de Heitor.

Para Arnt (2001), o destaque na história da imprensa foi o século XIX. Nessa

época, o jornalismo europeu viveu o aumento do número de leitores, por causa do

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acesso da população à alfabetização. Assim, os jornais passaram a ter grandes

tiragens, pois o livro ainda era muito caro para ser adquirido.

Quando o desenvolvimento industrial tornou possível o aumento das tiragens dos jornais e o barateamento dos custos, havia por trás disso uma forte pressão popular das gerações recentemente alfabetizadas, ávidas por leitura, o que permitiu também o aumento da circulação. A publicação de obras literárias propiciou a integração da nova camada da população ao circulo de leitores. (ARNT, 2001, p. 45)

Mas um jornal não se faz sozinho. Muitos são os papéis dentro da redação,

entre editores, articulistas, cronistas e outros. Para Olinto, (2003, p. 29), o repórter

de rua ao informar o leitor sobre um determinado assunto, contando o que viu, o que

ouviu e o que sentiu, é o profissional que mais cumpre o seu papel dentro da

redação.

O repórter de rua, o jornalista que sai ao encontro do acontecimento, vê os lugares, que às vezes lhe são familiares, sob um aspecto dramático [...] Nesse contato direto com as pessoas envolvidas em acontecimentos, nesse penetrar nos dramas de uma cidade, nesse ouvir pessoas de mais diferentes tipos falarem de seus desejos, de suas culpas, de seus sonhos desfeitos ou reerguidos, o repórter de rua atinge um plano que o homem comum desconhece. (OLINTO, 2003, p. 36)

Assim, o essencial é manter reservas de emoção para escrever. Repleto de

elementos, entre fontes, cores, cheiros e outros detalhes, o jornalista torna-se apto a

escrever uma reportagem, gênero mais consagrado do meio jornalístico.

Na dilatação do evento noticioso, a reportagem pode estender-se como uma realização descritiva, na composição astuciosa de um personagem ou na colocação de um cenário. Ou desdobrar-se plenamente em narratividade, em que estão implicados personagens em mudança de estado. É desse modo que ela ensaia alguma proximidade com realizações da prosa de ficção ou transporta marcas da própria literalidade. (BULHÕES, 2007, p. 45)

A revista Realidade teve grande importância para a valorização da

reportagem como uma atividade jornalística. Conforme Bulhões (2007), a revista

surgiu em 1966 e explorou diversos temas polêmicos como seca, aborto e

prostituição. A publicação foi um dos maiores exemplos do movimento conhecido

como New Journalism (Novo Jornalismo) no Brasil.

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2.2 O NEW JOURNALISM

De acordo com Bulhões (2007), o New Journalism não foi exatamente um

movimento, mas uma atitude sobre a prática textual que habitava o jornalismo dos

anos 1960. Entre os percursores do novo estilo, estava Gay Talese, em 1962. Ele

publicou uma reportagem-perfil sobre o ex-boxeador Joe Louis na revista Esquire.

Com um texto mais leve e agradável, a matéria se tornou referência para o New

Journalism.

Aos poucos, outros nomes também passaram a adotar esse estilo de escrita.

Tom Wolfe foi outro nome que também imergiu no estilo. Radical Chique e o Novo

Jornalismo é o livro do próprio Wolfe (2005) que reúne artigos narrados em primeira

pessoa sobre o New Journalism.

Não é com frequência que se encontra um estilo novo, ponto final. E se um estilo novo fosse criado pela via do romance, nem do conto, nem da poesia, mas pela via do jornalismo – acho que isso pareceria excepcional. Foi provavelmente essa ideia – mais que qualquer recurso específico, como o uso de cenas e diálogo em estilo “romanesco” – que começou a me dar ideias sobre um Novo Jornalismo. (WOLFE, 2005, p. 39)

Como ninguém sabia que a reportagem teria também uma dimensão estética,

as pessoas não tinham consciência do estilo chamado “Novo Jornalismo”. Apesar

disso, a expressão ficou conhecida em 1966, sem uma origem definida.

E, no entanto, no começo dos anos 60, uma curiosa ideia nova, quente o bastante para inflamar o ego, começou a se insinuar nos estreitos limites da statusfera das reportagens especiais. Tinha um ar de descoberta. Essa descoberta, de início modesta, na verdade, reverencial, poderíamos dizer, era que talvez fosse possível escrever jornalismo para ser.. lido com um romance. (WOLFE, 2005, p. 19)

Mas Wolfe (2005) conta que a chegada desse novo estilo de jornalismo

causou pânico na comunidade literária, pois eles haviam se acostumado a uma

estrutura estável. Os romancistas eram considerados os únicos escritores criativos,

os únicos artistas.

Eles estavam indo além dos limites convencionais do jornalismo, mas não apenas em termos de técnica. O tipo de reportagem que faziam parecia muito mais ambicioso também para eles. Era mais intenso, detalhado e sem dúvida mais exigente em termos de tempo do que qualquer coisa que

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repórteres de jornais ou revistas, inclusive repórteres investigativos, estavam acostumados a fazer. (WOLFE, 2005, p. 37)

A ideia era fazer com que as reportagens fossem mais intensas, detalhadas e

também contar sobre a vida subjetiva ou emocional dos personagens. O estilo

autobiográfico também era muito usado. Para isso, os repórteres passaram a

adquirir o hábito de ficar algum tempo com as pessoas sobre as quais escreviam, de

forma a ir além dos limites do jornalismo do cotidiano.

Parecia absurdamente importante estar ali quando ocorressem as cenas dramáticas, para captar o diálogo, os gestos, as expressões faciais, os detalhes do ambiente. A ideia era dar a descrição objetiva completa, mais alguma coisa que os leitores sempre tiveram de procurar em romances e contos: especificamente, a vida subjetiva ou emocional de personagens. (WOLFE, 2005, p. 37)

Conforme Wolfe (2005), aos poucos outros começaram a parodiar o estilo

iniciado por ele. Outra característica dos textos era o uso de pontos, travessões,

pleonasmos, entre outros recursos, que se tornaram constantes.

Era a descoberta de que é possível na não-ficção, no jornalismo, usar qualquer recurso literário, dos dialogismos tradicionais do ensaio ao fluxo de consciência, e usar muitos tipos diferentes ao mesmo tempo, ou dentro de um espaço relativamente curto... para excitar tanto intelectual quanto emocionalmente o leitor. (WOLFE, 2005, p. 28)

Pena (2006) dedica um capítulo de Jornalismo Literário, especialmente para o

estilo. O autor ressalta que na década de 1960, os profissionais da imprensa

americana estavam insatisfeitos com as regras de objetividade do jornalismo,

expressas principalmente pela fórmula do lead.

A ideia básica, do Novo Jornalismo americano, ainda nas palavras de Wolfe, é evitar o aborrecido tom bege pálido dos relatórios que caracteriza a tal “imprensa objetiva”. Os repórteres devem seguir o caminho inverso e serem mais subjetivos. Não precisam ter a personalidade apagada e assumir a encarnação de um chato de pensamento prosaico e escravo do manual da redação. (PENA, 2006, p. 54)

Pena (2006) ainda finaliza explicando sobre como deve ser um texto nos

padrões do New Journalism.

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O texto deve ter valor estético, valendo-se sempre de técnicas literárias. É possível abusar das interjeições, dos itálicos e da sucessão de pontuações. Uma exclamação, por exemplo, pode vir após uma interrogação para apresentar uma pergunta incisiva. Por que não?! (PENA, 2006, p. 54)

Há alguns recursos básicos do New Journalism, como registrar hábitos e

outras características do personagem, reconstruir a história cena a cena e registrar

diálogos completos (WOLF in PENA, 2006, p. 54). Para isso, é necessário

habilidade do jornalista ao entrevistar as fontes de forma a arrancar o máximo de

informações possíveis. Dessa forma, será possível construir um texto com

profundidade e detalhes. Pena (2006) ressalta também que é interessante que o

repórter passe vários dias com os seus personagens para retratar, assim, os vários

pontos de vista. Porém, isso só será viável se o repórter tiver a sensibilidade de lidar

com o assunto.

Pena explica ainda que o atual movimento de recriação estilística nos Estados

Unidos ressalta o “novo” até no nome: New New Journalism (Novo Jornalismo

Novo). O objetivo? Explorar as situações do cotidiano de forma informal, se

aproximando da atmosfera retratada e assumindo um perfil ativo.

2.3 JORNALISMO LITERÁRIO: TRAZENDO VIDA AO TEXTO

E hoje, como seria o “Novo Jornalismo”? Muitos autores ressaltam que para o

jornalismo se reformular é necessário acrescentar um pouco de literatura. Florence

Dravet (in CASTRO; GALENO, 2002) é um deles. Ela salienta que a literatura é a

esperança da comunicação.

Através da literatura, o homem exerce a sua singularidade, de forma universal. Porque ela é uma forma de expressão oral ou escrita que atravessa os tempos da história humana, que cruza as fronteiras e as nações. [...] Porém, através da literatura, o homem também exerce de forma singular a sua universalidade. (Dravet in CASTRO; GALENO, 2002, p. 89)

Isso é o que também afirma Alex Galeno (in CASTRO; GALENO, 2002).

A literatura, especialmente, deverá ser o fermento para desobstruir a imaginação jornalística e um meio de evitar que ela se transforme em mero exercício retórico do cotidiano. Jornalismo e literatura ao deixarem de ser praticadas como áreas fatiadas do conhecimento, gramáticas herméticas e específicas, convocam escritores e jornalistas a se soltarem dos mastros do dogmatismo e da arrogância, permitindo-se escutar cantos de boas novas e

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suspender as infra-estruturas tácitas de conceitos ao dialogarem com o contraditório, o antagônico e o diferente. (GALENO in CASTRO; GALENO, 2002, p. 107).

Mas o que seria esse gênero que reúne dois estilos tão parecidos e tão

diferentes ao mesmo tempo? Tantos falam sobre o assunto, mas há quem não saiba

do que trata o tal estilo que mistura jornalismo com literatura, atualidade com ficção,

informação com entretenimento. Felipe Pena (2006) explica com exatidão no livro

Jornalismo Literário. Para o autor, o jornalista literário não ignora o que aprendeu e

sim desenvolve as técnicas do jornalismo diário. Tudo isso sem deixar de lado

alguns princípios como a apuração rigorosa, a observação atenta, a abordagem

ética, a capacidade de se expressar claramente, entre outros.

Assim, o jornalismo literário quebra características básicas do jornalismo do

cotidiano: a periodicidade, a atualidade e também a fórmula do lead. Dessa forma, o

jornalista não está preso ao deadline, ou seja, a hora de fechamento do jornal ou

revista. Fagundes de Menezes conclui assim, que a liberdade é característica

essencial a toda criação artística e, por que não, ao jornalismo literário. “Verificamos,

facilmente, que o jornalismo, sendo um gênero literário, é uma atividade intelectual

inseparável de um clima de liberdade.” (MENEZES, 1997, p. 27).

A preocupação do Jornalismo Literário é contextualizar a informação de forma mais abrangente possível – o que seria muito mais difícil no exíguo espaço de um jornal. Para isso, é preciso mastigar as informações, relacioná-las com outros fatos, compará-las com diferentes abordagens e, novamente, localizá-las em um espaço temporal de longa duração. (PENA, Felipe, 2006, p. 14)

Outra característica marcante do gênero é que todo texto jornalístico literário

não pode ser superficial. Dessa forma, é necessária uma construção de todo o

enredo da matéria. Assim como um livro luta pela permanência, Pena (2006)

ressalta que o objetivo é não deixar que a reportagem seja esquecida.

Assim, defino Jornalismo Literário como linguagem musical de transformação expressiva e informacional. Ao juntar os elementos presentes em dois gêneros diferentes, transformo-os permanentemente em seus domínios específicos, além de formar um terceiro gênero, que também segue pelo inevitável caminho da infinita metamorfose. (PENA, Felipe, 2006, p. 21)

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Entre as características do gênero citadas pelo autor estão: imersão do

repórter na realidade, voz autoral, estilo, precisão de dados e de informações, uso

de símbolos, digressão e humanização. Assim, Pena (2006) também compara o

estilo à música, destacando que é preciso deixar o texto fluir, pois combina

elementos de ambos os gêneros.

Não se trata da dicotomia ou ficção da verdade, mas de uma verossimilhança possível. Não se trata da oposição entre informar e entreter, mas sim de uma atitude narrativa em que ambos estão misturados. Não se trata de Jornalismo, nem de Literatura, mas de melodia. (PENA, Felipe, 2006, p. 21)

Vilas Boas (in BRITO, 2007) faz uma comparação diferente para a união de

estilos. O autor afirma que o jornalismo literário pode ser considerado um casamento

que combina os métodos de reportar jornalísticos com técnicas de expressão

literárias. Segundo o autor, um dos principais objetivos do gênero é detalhar as

informações e retratá-las com arte.

Héris Arnt (2001) destaca que o jornalismo literário é um estilo que se

desenvolveu no século XIX e se caracterizou pelo surgimento de escritores e pela

publicação de crônicas, contos e folhetins.

O jornalismo literário desenvolve-se na Europa com os escritores assumindo funções de articulistas, cronistas e autores de folhetim. Na imprensa, eles melhoraram a qualidade do texto, levando os jornais a aumentarem as tiragens e criando um público para a literatura. (ARNT, 2001, p. 13)

A autora também ressalta que no Brasil o jornalismo literário foi importante,

até mesmo mais do que na Europa, pois os jornais eram o meio de divulgação das

obras literárias. Quase todos os escritores, de uma maneira ou de outra passaram

pela imprensa, tais como Manuel Antonio de Almeida, José de Alencar, Euclides da

Cunha e Machado de Assis. “Se jornalismo literário determinou e moldou a evolução

do próprio jornalismo, ele também mudou os rumos da literatura. Com os escritores

que passaram pela imprensa há algo em comum: eles não deixam de observar a

vida. “(ARNT, 2001, p. 51)

Para a autora, o período no Brasil pode ser delimitado pela publicação do

folhetim Memórias de um Sargento de Milícias, nos anos 1952 e 1953, e as

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primeiras décadas do século XX, quando surgiu o jornalismo empresarial e a

literatura começou a diminuir.

A participação de escritores na vida cotidiana dos jornais foi um fenômeno generalizado, e no Brasil deixou um legado de cultura, trazendo para o público diversas obras literárias. Contudo, esse fenômeno, aqui, não contava com a participação da massa da população que, condenada ao analfabetismo, não tinha acesso à cultura letrada. (ARNT, 2001, p. 47)

Assim, nas palavras da autora, o jornalismo literário reflete a efervescência

cultural de uma época. Foi um período em que o Brasil viveu intensamente, pois as

dificuldades editoriais e os altos custos dos livros levavam os escritores a preferirem

os jornais para publicarem suas obras.

Mas, ainda há resultados da combinação de gêneros até os dias atuais. Hoje,

os escritores podem dar um novo perfil ao jornal moderno, misturando assim notícia,

opinião, divertimento e cultura.

2.4 OS GÊNEROS E A MISTURA DE ELEMENTOS

Constatou-se, anteriormente, que a literatura pode estar presente no

jornalismo de diversas formas. Porém, há alguns gêneros e estilos jornalísticos que

merecem destaque. Como um dos maiores representantes da confluência entre

jornalismo e literatura, está o folhetim, gênero que surgiu no francês Journal des

Débats.

Héris Arnt (2001) explica que o termo designa a seção que vem ao pé da

página contendo os romances elaborados em capítulos especialmente para os

jornais. Assim, o mérito do folhetim está na força da narrativa. “O poder de

envolvimento entre público e obra torna-se a principal característica do estilo. O

folhetim inaugurou, portanto, o primeiro movimento de cultura de massa.” (ARNT,

2001, p. 53). A autora destaca ainda que na época os livros tinham preço elevado e

o jornal passou então a preencher essa lacuna.

Felipe Pena (2006) completa que os romances deveriam seduzir e despertar

a curiosidade do leitor para que este comprasse o jornal no dia seguinte.

E foi justamente no século XIX que a influência da Literatura no Jornalismo tornou-se mais visível. O casamento entre imprensa e escritores era

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perfeito. Os jornais precisavam vender e os autores queriam ser lidos. Só que livros eram muito caros e não podiam ser adquiridos pelo público assalariado. A solução parecia obvia: publicar romances em capítulos na imprensa diária. (PENA, 2006, p. 32)

O autor também comenta que nas décadas de 1830 e 1840 foi possível

perceber que as narrativas literárias provocavam um crescimento das vendas no

jornal e diminuição dos preços. Além disso, os escritores ganhavam também

visibilidade. Foi nessa época que surgiram os maiores destaques na área, como

Honoré de Balzac e Victor Hugo, na França e Charles Dickens e Walter Scott, na

Inglaterra.

Pena (2006) observa que as histórias tinham como objetivo arrancar lágrimas

e o riso do leitor, de forma que eram sempre interrompidas no “instante chave”,

parecido com as telenovelas. É a característica que chamamos de ponto de virada

do roteiro, ou plot. No Brasil, o termo folhetim misturava-se com a crônica. Assim,

Machado de Assis foi o maior representante local para o que chamaram de “cronista

folhetinesco”.

Entretanto, há algumas características específicas do folhetim que lhe garantem a exclusividade narrativa. Para começar, ele era dirigido a um público muito vasto, de todas as classes. Portanto, a linguagem deveria ser simples e acessível. Além disso, para facilitar a compreensão, eram utilizados recursos de homogeneização cultural, como estereótipos, clichês e estratégias correlatas. (PENA, Felipe, 2006, p. 29)

Conforme reforça Candido (1992) no artigo A vida ao rés-do-chão do livro A

Crônica, sua fixação e suas transformações no Brasil, lentamente o folhetim foi

sofrendo transformações até chegar a crônica dos dias de hoje.

Antes de ser crônica propriamente dita foi “folhetim”, ou seja, um artigo de rodapé sobre as questões do dia – políticas, sociais, artísticas, literárias [...] Aos poucos o “folhetim” foi encurtando e ganhando certa gratuidade, certo ar de quem está escrevendo à toa, sem dar muita importância. Depois, entrou francamente pelo tom ligeiro e encolheu de tamanho, até chegar ao que é hoje. (CANDIDO, 1992, p. 15)

Assim, a crônica passou a deixar a intenção de informar e comentar, para

somente divertir. A linguagem também sofreu mudanças e se tornou mais leve e

descompromissada. Candido (1992) observa também que a crônica não nasceu

propriamente com o jornal, mas apenas quando ele se tornou acessível e cotidiano.

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Foi em 1930, que a crônica moderna se consolidou no Brasil, década em que se

afirmaram cronistas como Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Carlos Drummond

de Andrade e Rubem Braga.

Neles todos, e alguns outros, como por exemplo, Raquel de Queiroz, há um traço comum: deixando de ser comentário mais ou menos argumentativo e expositivo para virar conversa aparentemente fiada, foi como se a crônica pusesse de lado qualquer seriedade nos problemas. (CANDIDO, 1992, p. 17)

Candido (1992) defende ainda que há crônicas que são diálogos, outras que

se aproximam do conto e até mesmo da exposição poética ou biografia lírica.

Parece às vezes que escrever crônica obriga a uma certa comunhão, produz um ar de família que aproxima os autores acima da sua singularidade e das suas diferenças. É que a crônica brasileira bem realizada participa de uma língua geral lírica, irônica, casual, ora precisa e ora vaga, amparada por um diálogo rápido e certeiro, ou por uma espécie de monólogo comunicativo. (CANDIDO, 1992, p. 17)

O livro possui também outros colaboradores que ressaltam ainda as origens,

outros traços característicos do estilo e os tipos de crônica. Entre humorísticas,

mundanas, teatrais e visuais e diversos escritores, a crônica se consolida como

mistura de gêneros e cumpre o objetivo de entreter o leitor.

Margarida de Souza Neves (1992) é uma das autoras que dedica o artigo

Uma escrita no tempo: memória, ordem e progresso nas crônicas cariocas ao

assunto. Ela destaca que a crônica é reconhecidamente um “gênero menor” utilizada

por grandes intelectuais e todos aqueles que aspiravam viver das letras.

Diferentemente da crônica, a biografia ou os chamados perfis para quem vive

no meio das redações, tem foco exclusivo no mundo real. Pena (2006) ressalta que

o estilo é um dos mais vendidos no mundo e mistura Jornalismo, Literatura e

História.

A biografia, portanto, é a parte do jornalismo literário que trata da narrativa de um determinado personagem. Ele é o fio condutor de todo enredo. Os acontecimentos, por mais importantes que sejam, são apenas satélites. Tudo gira em torno da história de uma vida. (PENA, Felipe, 2006, p. 70)

O autor observa que a maioria das biografias está sendo escrita por

jornalistas. Para ele, a situação é um problema, pois o jornalista é espremido pelos

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deadlines e chefes de reportagem, assim não teria tempo para refletir sobre

elementos necessários na composição de uma biografia. Pena (2006) também

destaca que o sucesso de uma biografia está relacionado à reconstrução de um

passado de uma vida, sempre baseado em elementos da literatura.

O retrato biográfico, na maioria das vezes, tenta ordenar os acontecimentos de uma vida de forma cronológica, na ilusão de que eles formem uma narrativa autônoma e estável, ou seja, uma história com princípio meio e fim, formando um conjunto coerente. (PENA, Felipe, 2006, p. 72)

O romance-reportagem tem função parecida. Conforme o autor, o estilo busca

a representação do real por meio da contextualização e interpretação de

determinados acontecimentos. Assim, é necessário que o jornalista não só informe,

mas também explique, oriente e até mesmo opine.

Cosson (in CASTRO; GALENO, 2002) define que o romance-reportagem é

pouco mais que uma reportagem alongada que, ao invés de sair das páginas de um

jornal, foi conduzida para a forma de um livro.

Desse modo, é da técnica e da temática com a reportagem que provêm a preocupação com a objetividade, a adesão a formas de narrativa policial, a veiculação de conteúdos proibidos pela censura, uma suposta transparência de linguagem, a denúncia social e uma certa recuperação da tradição documental da literatura brasileira. (COSSON in CASTRO; GALENO, 2002, p. 66)

O autor complementa que o romance-reportagem é sucessor do naturalismo

do século XIX e do naturalismo da década de 1930, representando assim um

terceiro movimento da estética e da ideologia naturalista no Brasil. Na década de

1970, inicialmente o romance-reportagem foi o título de uma coleção da Civilização

Brasileira e pretendia ocultar apenas um conjunto de obras baseadas em episódios

reais em uma narrativa com traços de ficção.

Graças ao grande sucesso de vendas do segundo título da coleção, Lúcio Flávio, o passageiro da agonia, de José Louzeiro, o qual vendeu em quatro meses cerca de dez mil exemplares, a expressão se vulgariza rapidamente e passa a ser denominação tanto de um tipo particular de narrativa que mistura literatura e jornalismo, quanto uma das tendências dominantes na ficção brasileira da década de 1970. (COSSON in CASTRO; GALENO, 2002, p. 60)

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Assim, os autores de romance-reportagem da década de 1970 eram

jornalistas que encontravam dificuldades para se adaptar as exigências da ditadura

militar e decidiram se tornar escritores a partir das experiências nos jornais.

Desse modo, o espaço que o romance-reportagem concretizou nos anos 1970 já existia potencialmente nos intercâmbios que a literatura e o jornalismo sempre mantiveram entre si enquanto discursos distintos, mas profundamente interligados. [...] Instalando-se na fronteira entre o jornalismo e a literatura, o romance-reportagem terminou configurando um “novo lugar” e essa, talvez, seja a maior contribuição do gênero para a cultura brasileira. (COSSON in CASTRO; GALENO, 2002, p. 60)

Cosson (in CASTRO; GALENO, 2002) conclui afirmando que o romance-

reportagem é um gênero hibrido e, portanto, é preciso aceitá-lo não como um limite,

mas sim como um território de trânsito entre o jornalismo e a literatura.

Hoje, a reportagem narrativa é um dos gêneros mais importantes do

jornalismo e provavelmente, o que mais aproxima o jornalismo da literatura. É o que

afirma Vilas Boas (1996). Para escrever essa reportagem, o jornalista não deve ter

medo de ser literário e ser sensível jornalisticamente.

Então, ser expressivo significa, dentre outras coisas, que sua reportagem narrativa tem a obrigação de informar sempre do modo mais transparente. Por outro lado, ser literário significa, grosso modo, narrar com efeito, com beleza e imaginação. Sem perder de vista os fatos. (VILAS BOAS, 1996, p. 60)

Vilas Boas (1996) compara ainda o conto e a reportagem, afirmando que

existem pontos em que os dois gêneros são parecidos e divergem entre si ao

mesmo tempo.

As duas formas em muito se assemelham. O conto é a forma mais curta da narrativa literária. A reportagem é a forma mais longa em jornalismo. Com certo cuidado, podemos afirmar que a reportagem está para o jornalismo como o conto está para a literatura. (VILAS BOAS, 1996, p. 65)

Assim, tanto o conto como a reportagem precisam de força, clareza,

condensação e novidade. É necessário ainda acrescentar o suspense para

conquistar o leitor e fazer com que ele chegue ao final da narrativa.

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32

3 A REVISTA NO BRASIL

Com objetivo de informar e entreter ao mesmo tempo, as revistas são

conhecidas por ser uma prática jornalística diferenciada e única. Para isso, o gênero

permite uma grande variedade de assuntos e estilos, por meio uso de recursos que

atraiam a atenção do leitor.

Marília Scalzo (2001), em Jornalismo de Revista define que as revistas são um

veículo de comunicação que mistura jornalismo e entretenimento. A autora também

destaca a relação de amor da revista com os seus leitores, falando diretamente com

ele e tratando-o por “você”.

Para começar, atire a primeira pedra quem não tem dó de jogar revistas fora, quem nunca guardou uma publicação, quem nunca pensou em colecionar um título. É isso: em primeiro lugar, revistas são objetos queridos, fáceis de guardar e de colecionar. São também boas de recortar, copiar: vestidos, decorações, arrumações de mesa, receitas de bolo, cortes de cabelo, aulas, pesquisas de escola, opiniões, explicações... (SCALZO, 2004, p. 12)

Scalzo (2004) observa que a revista é um encontro de identificação entre um

editor e o leitor. Assim, enquanto o jornal ocupa o espaço público a revista

estabelece uma relação de intimidade com o seu leitor. Outra diferença entre os dois

meios é que os jornais já nasceram engajados e ligados a partidos políticos e as

revistas se destacam na complementação da educação, ligadas à ciência e a

cultura.

Revista une e funde entretenimento, educação, serviço e interpretação, dos acontecimentos. Possui menos informação no sentido clássico (“as notícias quentes”) e mais informação pessoal (aquela que vai ajudar o seu leitor em seu cotidiano, em sua vida prática). Isso não quer dizer que não busquem exclusividade no que vão apresentar a seus leitores, ou que não façam jornalismo. (SCALZO, 2004, p. 14)

Mas os jornais já tentaram se aproximar das revistas. A autora conta que na

década de 1990, tentaram se parecer tanto nos cadernos, na linguagem e nos

temas, mas não obtiveram o efeito desejado. Os jornais descobriram que

precisavam, assim, criar suprimentos para cada tipo de público. Já para as revistas a

segmentação faz parte da essência do veículo. Outro diferencial das publicações é a

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sua durabilidade, tanto que são as preferidas nos consultórios de médicos e

dentistas.

Um ponto que diferencia visivelmente a revista dos outros meios de comunicação impressa é o seu formato. Ela é fácil de carregar, de guardar em uma estante e de colecionar. Não suja as mãos como os jornais, cabe na mochila e disfarçada dentro de um caderno, na hora da aula. Seu papel e impressão também garantem uma qualidade de leitura – do texto e da imagem – invejável. (SCALZO, 2004, p. 39)

A periodicidade das revistas também é um marco de particularização.

Geralmente as publicações são semanais, quinzenais ou mensais, o que também

diferencia no trabalho do jornalista. Para Scalzo (2004), quem trabalha em jornal, TV

ou rádio está condicionado a responder mais rápido aos fatos.

E as revistas? Não dá para imaginar uma revista semanal de informações que se limite a apresentar ao leitor, no domingo, um mero resumo do que ele já viu e reviu durante a semana. É sempre necessário explorar novos ângulos, buscar notícias exclusivas, ajustar o foco para aquilo que se deseja saber, conforme o leitor de cada publicação. (SCALZO, 2004, p. 41)

Além do texto, a revista possui a imagem e o design, sendo assim, uma

prática diferenciada e compreendendo uma ampla variedade de estilos. “Design em

revista é comunicação, é informação, é arma para tornar a revista e as reportagens

mais atrativas, mais fáceis de ler.” (SCALZO, 2004, p. 67)

A autora salienta que nesse meio é preciso acompanhar as tendências, mas

também cuidar com modismos, para as publicações não parecerem umas com as

outras. Mas a fotografia também é essencial para ilustrar as reportagens.

Quando alguém olha para uma página de revista, a primeira coisa que vê são

as fotografias. Antes de ler qualquer palavra, é a fotografia que vai prendê-lo àquela

página ou não. Fotos provocam reações emocionais, convidam a mergulhar em um

assunto, a entrar em uma matéria. Por isso, ter fotos boas em mãos é fundamental.

(SCALZO, 2004, p. 71)

Reunindo imagem, design e texto em um só forma-se a capa, principal meio

de seduzir o leitor, de acordo com Scalzo (2004). Assim, cada capa precisar trazer o

resumo de cada edição.

Em qualquer situação, uma boa imagem será sempre importante – e é ela o primeiro elemento que prenderá a atenção do leitor. O logotipo de revista

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também é fundamental, principalmente quando ela é conhecida e já detém uma imagem de credibilidade junto ao público. Afinal quando você vê na banca duas revistas com a mesma notícia na capa, você compra aquela na qual confia mais. Para completar, as chamadas devem ser claras e objetivas. (SCALZO, 2004, p. 63)

A revista também é mais artística quanto aos usos estéticos da palavra e

recursos gráficos, precisando de um amplo planejamento editorial e gráfico. Vilas

Boas (1992) afirma que a “embalagem” da revista é mais atraente, podendo tornar-

se um artigo de coleção assim como o livro. Desse modo, a revista tem a função de

ser um ponto de entretenimento e relaxamento. Os jornais diários são lidos por

necessidade de informação, enquanto a revista pode ser até uma distração.

Talvez o maior prazer na leitura de uma revista se deva exatamente a esta “ruptura” com o imediatismo do jornal. Alcança-se uma certa estabilidade emocional em relação ao fato, pois é possível o leitor programar a hora de leitura ou simplesmente deixar que surja um horário vago para fazê-lo, independentemente do quando. (VILAS BOAS, 1996, p. 82)

Enquanto para o jornal o principal é a tradição, para as revistas é necessário

contemporaneidade e atualidade. Os assuntos escolhidos devem ser recorrentes no

noticiário ou ter importância histórica, de forma que não perderão valor até a revista

chegar às mãos dos leitores.

Em tese, uma revista tem obrigação de acompanhar o fato e ir além dele. Tem de municiar o leitor com informações sobre o tal fato está indicando, que tipos de mudanças e o que ele realmente significa. Não pode, por isso, ter a pretensão de dar a palavra final. Deve dar pistas ou até mesmo mais uma interpretação dos acontecimentos. É preciso fugir da cobertura a reboque, que o jornal e a TV tem que fazer. (VILAS BOAS, 1996, p. 74)

A especialização de uma revista é outro ponto debatido por Vilas Boas (1996).

Ela pode ser temática ou depender da segmentação dos leitores.

Quanto mais amplo e mais de massa for o público pretendido por uma revista, mais o repertório linguístico usará formas tradicionais, confirmadas socialmente. O estilo gráfico e a linguagem tentem para uma gramática própria do gênero revista. Na escolha dos significados, além do habitual estilo formal- coloquial do jornalismo, a revista toma expressões da literatura e as transpõe para o uso corrente. Da mesma forma o faz com expressões populares (jargões, neologismos, coloquialismos etc). Daí se pode ter uma outra forma de expressão, ao mesmo tempo criativa e erudita. (VILAS BOAS, 1996, p. 72)

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Outra característica do jornalismo de revista é a interpretação. Segundo Vilas

Boas (1996), a reportagem individual e investigativa está inserida no jornalismo

interpretativo, que deve ser um trabalho coordenado. Assim, o jornalista deve captar,

analisar e selecionar a informação. É preciso identificar a notícia de valor absoluto,

que despertam interesse a todos os leitores.

A revista desenrola o novelo dos fatos, busca testemunhos e solta a palavra. Narra e reporta. Por essa razão, costuma deixar algo “no ar” ou nas entrelinhas. Isto não significa que as revistas sejam infiéis ao fato reportado. E sim que, ao soltar as amarras da padronização, pode haver o risco de conduzir o leitor a um certo “juízo de valor”. Portanto, é importante separar o jornalismo interpretativo qualquer visão localizada, absolutamente pessoal. (VILAS BOAS, 1996, p. 102)

Mas é preciso permitir que o leitor também interprete o fato. Enquanto os

jornais buscam a menor ambiguidade, as revistas deixam lacunas para que o leitor

as preencha. Assim, Vilas Boas (1996) alerta que a construção do texto é mais

complexa, pois está sujeita a duplas interpretações. Conforme Beltrão (in VILAS

BOAS, 1996, p. 78), no Brasil, o gênero interpretativo foi sendo abandonado, pois os

grandes jornais optam por informar sem comprometer-se.

Em jornalismo, submeter os dados recolhidos a uma seleção crítica e depois transformá-los em matéria significa interpretar. Jornalismo interpretativo é o esforço de determinar o sentido de um fato, por meio da rede de forças que atuam nele. Quando, inversamente, existe uma atitude de valorizar o fato ou seu sentido, já não é mais jornalismo interpretativo, e sim opinativo. (VILAS BOAS, 1996, p. 77)

Porém, nem todo jornal é completamente diferente do estilo seguido pelas

revistas. Os cadernos de cultura se aproximam do estilo magazine, de acordo com

Vilas Boas (1996). As chamadas segundas-seções costumam conciliar as técnicas

jornalísticas com crítica, analisando a obra e o fato. Para se diferenciarem as

revistas ainda acrescentam um conteúdo complementar ao texto ou uma posição

mais específica.

Nos cadernos de cultura, os jornais são mais ensaísticos e opinativos. A regra da padronização não é bíblia desses cadernos. O texto é mais solto, com tendência a absorver coloquialismos e neologismos de todo tipo. O texto de um caderno de cultura tem estilo e público muito bem definidos. (VILAS BOAS, 1996, p. 95)

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Atualmente, as revistas concorrem diretamente com outros meios como

cinema e televisão. Segundo Scalzo (2004), o mercado de revistas, bem como da

imprensa em geral tem sofrido uma grande crise nos últimos anos.

3.1 O TEXTO EM REVISTA

Para as matérias de revistas é frequentemente utilizado o jornalismo literário.

Para isso, as reportagens devem ser criativas e leves, permitindo humanização de

histórias e outras características que combinam com o estilo literário.

Vilas Boas (1992) reafirma que a revista possui uma cobertura diferenciada em

relação ao jornal, a televisão e ao rádio. O jornal e o telejornalismo têm como

principal meta dizer o que está acontecendo, tratando com imediatismo e sem

destacar suas consequências. Já as revistas fazem uma contextualização do

assunto, abordando-o de maneira mais ampla.

As revistas exigem de seus profissionais textos elegantes e sedutores. Considerados os valores ideológicos do veículo, não há regras muito rígidas. Há isto sim, uma conciliação entre as técnicas jornalística e literária. [...] Mas a técnica literária é perfeitamente compatível com o estilo jornalístico. O estilo magazine, por sua vez, também guarda suas especificidades, na medida em que pratica um jornalismo de maior profundidade. Mais interpretativo e documental do que o jornal, o rádio e a TV; e não tão avançado e histórico quanto o livro-reportagem. (VILAS BOAS, 1992, p. 9)

A escolha da pauta também é outra grande diferença. Scalzo (2004) explica

que, enquanto para os jornais o destaque são os acontecimentos do cotidiano, para

as revistas é preciso tentar novos enfoques e maneiras originais de abordar o

assunto. É preciso, assim, buscar equilíbrio para as pautas.

São esse equilíbrio e essa coerência editorial da pauta, bem como o orçamento das seções, colunas, entrevistas especiais, etc. que definirão a personalidade de uma revista. A cada edição o leitor pode encontrar, ao mesmo tempo, variedade e algumas marcas de identidade que o permitirão reconhecer e manter uma relação de familiaridade com sua revista predileta. (SCALZO, 2004, p. 66)

Dessa forma, a linguagem de cada revista é definida a partir do tipo de leitor

que se quer atingir, como lembra Vilas Boas (1992). O jornalismo busca uma

linguagem ideal, para ser assimilada por todos da sociedade.

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Toda revista segue o mesmo preceito dos jornais diários. O fundamental é fazer com que a linguagem seja de fácil assimilação pelo leitor. Quase sempre, as revistas tentam conciliar o domínio da técnica jornalística com a improvisação. O estilo jornalístico consiste exatamente em transformar a informação bruta em notícia legível e compreensível. Se não fosse assim, o jornal diário – principalmente – estaria reservado apenas a uma elite cultural privilegiada. (VILAS BOAS, 1996, p. 39)

Scalzo (2004) observa que independente do meio, o jornalista deve oferecer

uma visão livre de preconceitos e um olhar crítico, sempre tentando contribuir para

uma imprensa mais ética.

Os princípios básicos do jornalismo são iguais para qualquer tipo de veículo: o esforço para apurar os fatos corretamente, o compromisso com a verdade, ouvir todos os lados que envolvem uma questão, mostrar diversos pontos de vista na tentativa de elucidar histórias, o respeito aos princípios éticos, a busca constante da qualidade da informação, o bom texto. Qualquer que seja o jornalismo que se vá fazer, esse é o dever básico – seja em televisão, rádio, internet, jornal ou revista. (SCALZO, 2004, p. 54)

Sobre o jornalista de revista especificamente, Scalzo (2004) explica que ele

deve prestar um serviço do que apresentar um furo de reportagem. Vilas Boas

(1996) ressalta que escrever em uma revista exige habilidade com as palavras. Para

este meio é necessário jornalistas que não só possuam técnica, mas também

inspiração e criatividade. A qualidade do texto é um diferencial, pois está relacionada

com um conteúdo bem elaborado e criterioso.

Lembre-se de que, no conjunto, o texto de qualquer revista – não importando o estilo – esconde uma tendência. A tendência de uma revista é a inclinação de seus leitores. Então, é adaptar-se a eles. Os diagnósticos apresentados na interpretação de um fato também não estão imunes às tendências. A imparcialidade, por excelência, também não existe nas revistas semanais de informação. (VILAS BOAS, 1996, p. 86)

Na cobertura jornalística, a reportagem tem destaque. A narração, estilo mais

utilizado na reportagem, possui um foco, ou seja, um ponto de vista. Conforme Vilas

Boas (1996, pg. 101), ela precisa se desenvolver com ritmo, beleza, refinamento e

liberdade, ou seja, improvisação. Desse modo, a revista se aproxima de formas

literárias e constrói um jornalismo que diagnostica, investiga e interpreta.

A boa reportagem é aquela que consegue apresentar a notícia em profundidade, com objetividade e padrão ético. Em revista informativa-geral,

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o importante é puxar o cordão dos fatos, desamarrar o fio dos eventos, oferecer diferentes ângulos de visão da situação, complementando com históricos, depoimentos, dados estatísticos, documentário fotográfico, enquadramentos ideológicos e prognósticos. (VILAS BOAS, 1996, p. 78)

Assim, conforme Oswaldo Coimbra (in VILAS BOAS, 1996) há o narrador-

testemunha, que apenas testemunha os fatos; o narrador- protagonista, que envolve

todas as percepções e sentimentos desse narrador; e o narrador-onisciente, que

conhece os acontecimentos e pensamentos dos demais envolvidos da reportagem e

se aproxima da narrativa literária.

A reportagem é uma notícia, mas não uma notícia qualquer. É uma notícia avançada, na medida em que sua importância é projetada em múltiplas versões, ângulos e indagações. Ao valorizar a notícia, a reportagem revitaliza o estilo jornalístico, soltando um pouco as amarras da padronização. Uma boa reportagem não deve abrir mão da pesquisa, sob pena de alterar o espírito de investigação, curiosidade, desafio e surpresa, que estão acima de tudo. (BOAS, 1996, p. 41)

Vilas Boas (1996) analisa que o que conquista o leitor na reportagem são as

aberturas. A forma de abertura é um dos principais diferenciais em relação aos

jornais. O lead não é necessário e nem as informações principais sobre o fato

devem vir nas primeiras linhas.

Uma história contada sem o lead deve ter começo, meio e fim. E se puder ser cortada é porque está mal escrita. O lead, ao contrário, existe para que a matéria resista a um corte no pé, sem prejuízo do texto. Nesse aspecto, o texto da revista informativa geral requer planejamento e talento. Uma espécie de conciliação entre arte e técnica. (VILAS BOAS, 1996, p. 45)

Dessa forma, o autor também salienta que é preciso criar uma narrativa

climática seguida do primeiro tópico frasal. É necessária uma estrutura baseada em

antíteses: o fato e sua causa, sua circunstância e sua consequência, criando uma

motivação para leitura.

É preciso relembrar que seu texto deve ter unidade. Por isso, o fecho mais original deve coincidir com a escolha da forma de abertura do texto de sua reportagem. Aliás, a escolha da melhor forma de abrir a matéria integra seu projeto de texto, sem o qual dificilmente a unidade será obtida. E como tudo que deve ser levado em conta num roteiro de texto, a linguagem de abertura segue a angulação, o tom, o ponto de vista, a natureza do assunto, etc. (VILAS BOAS, 1996, p. 47)

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Assim, para o fechamento da matéria, Vilas Boas (1996) observa que o texto

não deve conter um resumo da narrativa e sim, propiciar uma satisfação ao leitor, de

uma forma envolvente.

3.2 O SURGIMENTO DA REVISTA NO BRASIL

Conforme Scalzo (2004), as revistas já nasceram para entreter, trazendo

gravuras e fotos para despertar o imaginário dos leitores. Além disso, as revistas

ajudaram na formação e educação de quem não podia dedicar-se aos livros.

A autora aponta que, no século XIX, a revista ganhou espaço e ditou moda

principalmente na Europa e nos Estados Unidos.

Com o avanço técnico das gráficas, as revistas se tornaram o meio ideal, reunindo vários assuntos em um único lugar e trazendo belas imagens para ilustrá-los. Era uma forma de fazer circular diferentes informações concentradas sobre os novos tempos a nova ciência e as possibilidades que se abriam para uma população que começava a ter acesso ao saber. A revista ocupou, assim, um espaço entre o livro (objeto sacralizado) e o jornal (que só trazia o noticiário ligeiro) (SCALZO, 2004, p. 20)

Segundo Scalzo (2004), a história das revistas no Brasil mistura-se com a

história econômica e da indústria do país.

As revistas chegaram por aqui no início do século XIX junto com a corte portuguesa – que vinha fugindo da guerra e de Napoleão. Quer dizer, chegaram com o assunto de que iriam tratar e com os meios para serem feitas. Antes disso, proibida por Portugal, não havia imprensa no Brasil. (SCALZO, 2004, p. 27)

Assim, em 1812, surgiu a primeira revista: As Variedades ou Ensaios de

Literatura, em Salvador, na Bahia. Scalzo (2004) observa que, como outras, na

época ela tinha cara e jeito de livro. A partir daí surgiram outras publicações, todas

com vida curta, pois sofriam com falta de assinantes e recursos.

O livro ilustrado A Revista no Brasil, da Editora Abril (2000), conta a trajetória

da revista no país, por meio de fatos que marcaram a história local. Entre eles, o

surgimento das primeiras publicações brasileiras.

Muito tempo seria necessário para que a descendência de As Variedades ganhasse a feição atual e se enraizasse na vida do país. As primeiras revistas brasileiras pouca importância tiveram para a sociedade. Não se

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preocupavam em refleti-la: eram publicações eruditas, não noticiosas. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 18)

Em O leitor e a banca de revistas: a segmentação da cultura no século XX,

Mira (2001) ressalta que não é possível caracterizar rigorosamente as revistas do

século XIX. É estimado também um público minúsculo, pois a leitura só fazia parte

de uma pequena elite culta e rica.

De acordo com Mira (2001), no século XIX, surgiram publicações ilustradas

pelas técnicas de xilografia, litografia ou zincografia, misturando belezas do país e

do mundo. Em 1854, surge a Ilustração Brasileira e no ano consecutivo chega às

bancas a publicação Brasil Ilustrado.

Já o primeiro desafio jornalístico para as revistas ficou por conta da cobertura

da Guerra do Paraguai (1864-1870), segundo a Editora Abril (2000). Inicialmente, os

jornais apenas faziam transcrições do campo de batalha.

A cobertura do embate começou a ganhar expressão em 1865, na Semana Ilustrada, periódico de Henrique Fleuiss, desenhista alemão radicado no Brasil. Na redação da revista, no centro do Rio, Fleuiss recebeu certo dia um grupo de oficiais prestes a partir para o front. Convenceu-os a enviar relatos exclusivos da guerra para a Semana e ensinou-lhes os princípios de uma técnica ainda precariamente aproveitada, a fotografia, a partir da qual eram aproveitadas as ilustrações. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 44)

Assim, surgiu um novo gênero jornalístico no Brasil: a fotorreportagem. Após,

a Editora Abril (2000) conta que a fotografia tornou-se essencial para a reportagem e

quem melhor soube aproveitá-la na época foi a Revista da Semana, de 1900.

Seus editores mandavam fotografar, em estúdio, simulações de crimes para alimentar as páginas policiais. Mas também se saia à rua para fazer reportagens fotográficas. As únicas imagens conhecidas da Revolta da Vacina, em 1904, reação popular à decisão que impôs a vacinação obrigatória contra a febre amarela, no Rio, foram publicadas na Revista da Semana. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 44)

Após, a Revista da Semana influenciou muitas outras. Para as reportagens, a

nova fase foi marcada pelo jornalista e escritor carioca Paulo Barreto, que respondia

pelo pseudônimo de João do Rio. Conforme a Editora Abril (2000), antes dele, o

texto apenas complementava a ilustração e também não era comum os jornalistas

brasileiros saírem a procura de pautas nas ruas.

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O que João do Rio fazia em Kósmos, revista de cultura criada em 1904, não era ainda a reportagem tal como existiria décadas mais tarde. Não havia, por exemplo, preocupação com a objetividade. Mas a narrativa trazia já um indispensável ingrediente do gênero, a fiel observação da realidade, além da disposição do autor de contar o Brasil aos brasileiros. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 41)

Mas a passagem do século trouxe outras transformações para a imprensa

diária. Mira (2001) salienta que o século XX marcou o início das revistas que

começaram a ter vida longa no Brasil. Conforme Nelson Werneck Sodré (in MIRA,

2001, p. 19), nessa época as colaborações literárias passaram a ser separadas nas

páginas dos jornais e surgiram seções de crítica de rodapé.

Para que uma revista possa existir, é necessário que haja leitores

interessados em suas publicações. Porém, apesar de terem diversos tipos de

públicos, em geral as revistas estabelecem uma forte relação com o público

feminino. Scalzo (2004) conta que as revistas femininas existiam desde o

nascimento da revista.

Elas começaram a aparecer aqui e ali sem muito alarde, geralmente feitas e escritas por homens. Traziam as novidades da moda, importadas da Europa, dicas e conselhos culinários, artigos de interesse geral, ilustrações, pequenas notícias e anedotas. Esse modelo foi repetido, com pequenas diferenças, durante todo século XIX e a primeira metade do século XX. (SCALZO, 2004, p. 33)

A autora observa que no mesmo período começaram a surgir publicações

feitas por mulheres preocupadas com sua posição na sociedade e seus direitos.

Porém a maioria delas teve vida curta.

Mira (2001) também comenta sobre a formação do público feminino. Na

época também foram criados O Jornal das Senhoras e o Jornal das Moças Solteiras,

ressaltando a divisão do material para donzelas e mães de família. As revistas

tinham como característica a valorização do aspecto familiar e mistura de elementos

de entretenimento com outros mais nobres.

Essa é, na verdade, uma característica mais geral da imprensa da época, na qual jornalismo e literatura estão ligados por laços tão estreitos que levarão toda metade do século seguinte para se desatarem. Num momento em que nenhum escritor pode viver dos livros que escreve, “os homens de letras buscavam nos jornais o que não encontravam no livro: notoriedade, em primeiro lugar, um pouco de dinheiro, se possível.” (MIRA, 2001, p. 19)

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Conforme Mira (2001), a revista é a mídia mais feminina, enquanto o jornal é

masculino. A revista Manequim, lançada em 1959, foi a primeira no Brasil com foco

exclusivo na moda.

Inicialmente recebida com descrença pelos anunciantes, aos poucos a revista foi ganhando credibilidade, principalmente quando os desenhos de roupas foram substituídos por moldes. Na ocasião, dirigia-se às costureiras e às mulheres que costuravam em casa para a família, bem mais raras hoje em dia. Com o avanço posterior da indústria de confecções, passou a ser mais utilizada por profissionais da moda. (MIRA, 2001, p. 50)

As fotonovelas também eram destaque para o público feminino nos anos

1950 e 1960. Scalzo (2004) explica que elas eram histórias românticas, que não

estavam preocupadas em mudar a sociedade. De acordo com Mira (2001), a

publicação Grande Hotel, marcou o início das fotonovelas no Brasil, em 1951. Após,

em 1952, é lançada a Capricho, revista de fotonovelas de maior sucesso.

A revista das publicações sentimentais acrescentava à fotonovela mais alguns ingredientes da imprensa feminina, como moda, beleza, culinária, seções de cartas, horóscopo e depoimentos dos ídolos de massa. Tanto as histórias como os conselhos e a vida dos astros vinham sempre carregados pela moral rígida da época, pela valorização da renúncia, do sofrimento, da virgindade, do casamento. A marca melodramática delimitava o público do gênero: essencialmente femininas, as revistas de fotonovelas eram lidas pelas mulheres das camadas sociais e das faixas etárias mais baixas.

(MIRA, 2001, p. 36)

Essas publicações passaram a entrar em declínio nos anos 1970, de acordo

com Mira (2001). Ainda assim, na década de 1980, alguns títulos continuavam em

circulação. Para as leitoras houve um desinteresse pela narrativa, que passou a ser

considerada ingênua. Do mesmo modo, na época as radionovelas também tiveram

declínio de público. A decadência dos dois meios está relacionada com a ascensão

das telenovelas, mais modernas e realistas.

Apesar disso, nessa época houve um aumento de interesse do público

feminino. Nos anos 1970, com a entrada da mulher no mercado de trabalho, há um

crescimento das revistas femininas em geral.

Uma das maiores polêmicas sobre as revistas femininas – e graças a ela é que existem estudos sobre a imprensa feminina no Brasil – travou-se em torno do feminismo. As revistas femininas foram vistas, sob a ótica do movimento feminista, como veículos que ajudavam na conservação dos

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valores tradicionais e, portanto, das ideologias que garantiam a submissão das mulheres. (MIRA, 2001, p. 58)

Scalzo (2004) lembra que nessa época as mulheres não são tratadas apenas

como simples donas de casa, mas como profissionais em busca de realização.

Hoje, o segmento feminino representa a maior parte do mercado. Para a autora, as

grandes revistas femininas seguem mais ou menos o mesmo modelo, apesar de

cada um ter o seu próprio tipo de público, afinal há revistas para noivas, mães,

adolescentes e etc.

Apesar de as revistas femininas ainda serem a maioria, as masculinas

também tem os seus adeptos. Para os homens geralmente o foco é mexer com o

imaginário trabalhando o lado erótico. Segundo Scalzo (2004), as revistas

“galantes”, como eram chamadas, desapareceram do mercado nos anos 1930 por

conta da moral conservadora da época. Ainda assim, elas eram vendidas

clandestinamente.

Nos anos 1960 surgem as revistas masculinas que traziam fotos de mulheres

nuas e conteúdo de qualidade. Em 1969 é lançada a revista Ele e Ela, que tratava

de temas polêmicos para a época e chegou a vender mais de 700 mil exemplares.

Uma das revistas masculinas mais conhecidas é a Playboy, que nasceu em 1976,

inicialmente com o título de Homem. (SCALZO, 2004)

Com o abrandamento da censura a partir de meados dos anos 70, as polêmicas revistas eróticas viveram um momento de grande expansão, com uma infinidade de produções nacionais e, mais tarde, estrangeiras amontoando-se nas bancas de revistas e disputando a preferência dos leitores. De certa forma, as “revistas de mulher pelada” ocuparão entre os homens a mesma posição das revistas femininas em relação às mulheres. (MIRA, 2001, p. 99)

Esportes também ocupam a preferência na escolha dos homens por uma

publicação. Apesar disso, de acordo com Scalzo (2004), ainda não tem nenhuma

predominante. Placar, lançada em 1970 pela Editora Abril e com foco no futebol foi a

mais bem sucedida, mas teve altos e baixos em sua trajetória. Para revistas que

tratem de outros esportes o público geralmente é pequeno, mas fiel.

Nas décadas de 1960 e 1970 foi identificada uma população em uma faixa

etária intermediária que também precisava de atenção, ou seja, os jovens. Scalzo

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(2004) conta que, assim, começaram a surgir publicações ligadas à cultura pop,

sobre gêneros musicais, moda, arte e consumo.

Mira (2001) ressalta que a partir dos anos 80, o processo de segmentação de

mídia se acelera de uma maneira geral em todos os meios.

Na TV, a segmentação da programação já existente nas redes se aprofundará na década de 90 com a introdução dos canais pagos, cada qual calcado num tipo de emissão, captando públicos específicos. Nos jornais aparecem mais cadernos especializados. No meio revista, segmentado por definição, esse processo é ainda mais intenso. (MIRA, 2001, p. 147)

A autora observa que nessa época começaram a surgir várias editoras de

pequeno porte e revistas categorizadas. Com a década de 1980, nasceram revistas

sobre a preocupação em cuidar do corpo, decoração e arquitetura. Conforme Scalzo

(2004), essas revistas passaram a se subdividir em diversas categorias menores,

visando alcançar públicos ainda mais específicos.

3.3 O CRUZEIRO

Mas uma revista em especial fez história para o jornalismo. Vilas Boas (1996)

salienta que O Cruzeiro teve muito importância para sua época. Segundo ele, a

revista chegou a tirar 720 mil exemplares em época que o Brasil tinha um pouco

mais de 50 milhões habitantes. Para o autor, o segredo do sucesso foi a utilização

de um jornalismo ágil, investigativo e polêmico.

De acordo com a Editora Abril (2000), O Cruzeiro foi lançada em 1928, por

Assis Chateaubriand e consagrou a reportagem.

Capitaneadas por O Cruzeiro, as revistas ingressaram numa era em que a reportagem teria peso cada vez maior. O jornalista deixou o fundo da redação, ganhou a rua, passou a criar matérias para além do ramerrame. Esporte, política, artes e espetáculos, consumo, modos de vida – nenhum meandro da realidade brasileira deixou de ser desde então frequentado pelo olhar atento das publicações, muitas das quais pagaram preço alto por essa

intromissão. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 22)

Segundo Scalzo (2004), O Cruzeiro estabeleceu uma nova linguagem na

imprensa nacional, por meio grandes reportagens e com destaque para o

fotojornalismo. Mira (2001) complementa que a publicação realizou a transição entre

as revistas criadas em um momento que jornalismo e literatura se confundiam.

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Nos anos 30, 40 ou 50, quando se buscava numa revista informação, cultura ou entretenimento, lia-se muito provavelmente O Cruzeiro, publicação dos Diários Associados que reinou três décadas sobre suas fracas concorrentes no mercado. O Cruzeiro trazia um pouco de tudo e se dirigia a todos, homens e mulheres, jovens ou não, longe da preocupação hoje obrigatória de descobrir as preferências de cada um, seus gostos, expectativas ou estilos de vida. Era a revista da família brasileira. (MIRA, 2001, p. 13)

Conforme Mira (2001), a revista foi criada como componente da campanha

que levou Getúlio Vargas ao poder. Apesar de inicialmente ser um empreendimento

político, a revista tornou-se uma de maior vendagem para a história do país. O

Cruzeiro chegou a passar de 700 mil exemplares em uma edição histórica sobre o

suicídio de Vargas. A publicação também chegou a ser exportada para a América

Latina.

Em sua longa trajetória, a revista atravessa as décadas de 30 a 60 como veículo nacional responsável pela crônica social, política e artística não apenas do Brasil, mas do mundo, contando para tanto com correspondentes estrangeiros, fato até então inédito no Brasil. Vários elementos que hoje caracterizam o mercado de revistas já aparecem no ousado empreendimento: marketing, investimento técnico, preocupação com o padrão visual e esquema de distribuição. (MIRA, 2001, p. 23)

Mira (2001) também observa que a revista era atraente visualmente, pois era

elaborada em papel couché e repleta de fotografias com artistas variados e anúncios

de produtos em uma época que o mercado consumidor estava em crescimento.

Tendo introduzido a dupla repórter-fotógrafo, a revista mudou o padrão adotado até então, no qual predominava o texto. Toda matéria era, antes de mais nada, imagem. Em geral, uma grande reportagem era aberta com uma fotografia de página inteira, o título e os nomes de dois de seus realizadores. [...] Do ponto de vista dos profissionais, O Cruzeiro foi uma espécie de escola para muitos deles: jornalistas, fotógrafos, ilustradores, humoristas, repórteres ou escritores. (MIRA, 2001, p. 24)

Apesar de tantas conquistas, O Cruzeiro não era modelo de ética. De acordo

com a Editora Abril (2000), a revista apresentou uma fotomontagem sobre discos

voadores como sendo uma imagem verdadeira. Mais tarde, O Cruzeiro precisou

encarar a concorrência de Manchete, lançada em 1952, por Adolph Bloch.

Em meados da década de 1950, Manchete circulava com caprichada impressão em cores – enquanto O Cruzeiro seguia usando papel de má

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qualidade e tinta sépia, o que lhe dava uma aparência envelhecida. Ainda assim, a revista de Chateaubriand continuava a cravar recordes, como os 720 mil exemplares sobre o suicídio do presidente Getúlio Vargas, em agosto de 1954. (EDITORA ABRIL, 2000, p. 53)

Enquanto Manchete já utilizava a impressão em cores, O Cruzeiro tinha

aparência envelhecida por causa da tinta sépia utilizada. A principal ênfase nas

coberturas da Manchete eram as fotografias. Entre uma de suas reportagens

destaque estava à construção de Brasília, quando JK era presidente.

Assim, por causa da concorrência com outras publicações e também de uma

má administração, O Cruzeiro passou a declinar entre os anos 1960 e 1970,

deixando de circular em 1975.

3.4 OUTRAS PUBLICAÇÕES QUE FIZERAM HISTÓRIA

Não foi apenas O Cruzeiro que contribuiu para a história do jornalismo de

revista brasileiro. Nomes como Claúdia, Quatro Rodas e Veja tiveram destaque nos

anos 1960. Conforme Mira (2001), essas publicações representaram o início da

segmentação das revistas, em que buscavam um público mais específico.

As quatro revistas relacionam-se a um ou mais aspectos da modernização da sociedade brasileira no período. Claudia (1961) se desenvolve junto com a constituição da chamada sociedade de consumo no país, constantemente tensionada pelas causas feministas e imbricadas com elas. Quatro Rodas (1960) liga-se de maneira indissolúvel e consciente à implantação das indústrias automobilística e de turismo. Realidade (1966) será vitimada pelo novo modelo, não sobrevivendo ao seu caráter autoritário e conservador. Veja (1968) refletirá o fenômeno de aceleração do tempo que o modernizar sempre implica. (MIRA, 2001, p. 41)

A revista Cláudia destacava a moda e a cozinha para a mulher brasileira. Já

Quatro Rodas tinha o objetivo de traçar um mapa físico do Brasil, nas palavras de

Mira (2001). Realidade queria mostrar um país diferente do que já era desvendado

pelos noticiários comuns. E Veja tinha a informação acima de tudo.

Trata-se de um momento em que a preocupação com a questão da identidade nacional ainda é muito forte. As revistas se baseiam em modelos estrangeiros, mas procurando sempre abrasileirar suas formas. Assim, criarão recursos para, aos poucos, deixar apenas de copiar as revistas estrangeiras ou simplesmente traduzi-las. O fato refletirá no mercado jornalístico, elevando seu grau de profissionalização. (MIRA, 2001, p. 42)

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Para o mercado de revistas feminino, a revista Cláudia é o destaque. A

publicação, surgida em 1961, que tinha como meta acompanhar a vida da mulher e

o surgimento da indústria de eletrodomésticos. Scalzo (2004) salienta que no início a

revista pertencia ao modelo tradicional, com artigos de moda, receitas, conselhos de

beleza e ideias de decoração.

Aos poucos, começa a traduzir em suas reportagens as transformações da

vida da mulher, por meio de seções como saúde, orçamento doméstico e sexo. A

coluna “A Arte de Ser mulher”, da jornalista e psicóloga Carmen da Silva, foi uma

das pioneiras ao quebrar tabus com temas como machismo, trabalho feminino e

seus problemas sexuais.

Com Cláudia nasce também a produção fotográfica de moda, beleza, culinária e decoração no Brasil. Fotos desse tipo até então (no começo da vida de Cláudia também) eram todas importadas. Logo, a equipe da revista descobre que é necessário fazer uma publicação mais brasileira e, para isso, percebe que é preciso fotografar o estilo, a comida, a casa e, principalmente, a mulher brasileira. (SCALZO, 2004, p. 34)

Mira (2001) complementa que Cláudia foi crescendo com o mercado de

consumo e contribuiu muito para profissionalização do jornalismo de serviços. A

autora também conta que a revista acabou ficando mais próxima da leitora de 30 a

40 anos e que apesar de tratar de diversos temas, o perfil editorial adotado por

Cláudia ainda é mais voltado para o lar. Assim, a revista Claúdia tornou-se a revista

feminina mais vendida do país e a segunda entre todas as revistas.

Diferentemente de Cláudia, Quatro Rodas é voltada para o mercado de

revistas masculino, com foco na indústria automobilística.

Nos seus 37 anos de existência, Quatro Rodas acompanhou todo processo de nacionalização da indústria automobilística, comemorando cada componente de veículo nacionalizado. Em suas páginas, os fabricantes de carros e auto-peças proclamam com orgulho: “Inaugura-se a primeira indústria nacional especializada em volantes”. (MIRA, 2001, p. 63)

No quarto número, a revista teve que aumentar a tiragem inicial de 63 mil

exemplares para 90 mil e também contratar novos jornalistas, devido ao grande

sucesso. De acordo com Mira (2001), as matérias passam a abordar também a

problemática relacionada ao automóvel, como questões sobre poluição. A revista

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lança em 1966, o Guia Quatro Rodas, que se tornaria uma “bíblia do turismo

brasileiro”.

De fato, como no caso de Cláudia, o jornalismo de serviço será profissionalizado por Quatro Rodas. Se examinarmos a história da imprensa automobilística no Brasil, perceberemos que até então muitos repórteres do setor eram os próprios pilotos, apaixonados pelo automobilismo que corriam nas pistas e depois davam eles mesmos as notícias. (MIRA, 2001, p. 65)

Além disso, conforme Mira (2001), a revista também deu origem à cadeia de

hotéis Quatro Rodas e se estabilizou nos guias turísticos, de ruas e serviços em

geral.

Uma das publicações mais conceituadas de todos os tempos foi a revista

Realidade, segundo Scalzo (2004). A revista, lançada em 1966 e fechada em 1976,

tinha foco no jornalismo investigativo e na reportagem.

Conforme Mira (2001), a revista retratava as contradições vividas no Brasil e

no mundo na época do domínio do regime militar. A publicação nasceu dois anos

após o golpe, em um momento em que a censura não era tão rígida e as

publicações de esquerda começavam a crescer. Um grupo de jornalistas da Editora

Abril decidiu criar um encarte para ir aos domingos e após eles foram reaproveitados

para construir a revista.

Se alguma revista atingiu a unanimidade de aprovação, essa revista foi Realidade. Apreciada pelo público, que chegou a comprar quase meio milhão de cópias, ela fazia os editores sorrirem com quase uma centena de páginas de publicidade por edição. Valorizada pelos intelectuais pela profundidade de suas matérias, era o paraíso dos jornalistas, que não tinham hora para chegar nem manual de redação. (MIRA, 2001, p. 69)

De acordo com a Editora Abril (2000), Realidade foi uma mistura de ousadia

nos temas, investigação aprofundada, texto elaborado e ensaios fotográficos

marcantes, oferecendo ao leitor um padrão diferente do que eles estavam

acostumados.

Com o Brasil sob regime militar, não era tarefa simples. Um número dedicado à mulher brasileira, em 1967, em 1967, para o qual foram feitas mais de 1200 entrevistas, consumiu três meses de investigação. Nele se falava desinibidamente de liberação sexual, frustração no casamento e sonhos de independência. (Editora Abril, 2000, p. 57)

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Assim, os repórteres tinham mais liberdade para fazer suas reportagens, sem

limitações de tempo e dinheiro. Como explica Mira (2001), o nome Realidade foi

inspirado na revista francesa Realité e a periodicidade era mensal.

Com um estilo parecido com O Cruzeiro e Manchete, de revista ilustrada, a

proposta era tratar os temas de forma mais detalhada. Dessa forma, os assuntos

eram discutidos em uma reunião de pauta e após, passavam pela mão de

especialistas, fazendo com que cada reportagem envolvesse a todos na redação e

levasse cerca de dois meses para ficar pronta.

Dessa forma, o esquema repórter-fotógrafo foi acionado para discutir a realidade brasileira, levantando problemas, informações ou polêmicas como a questão indígena, o drama do menor abandonado, o racismo, as drogas, a emancipação da mulher, a modernização da Igreja Católica, entre tantos outros. (MIRA, 2001, p. 71)

A revista fechou em 1976, com uma tiragem de apenas 120 mil exemplares e

chegou a ganhar sete prêmios Esso de Jornalismo. Após o fechamento, a Editora

Abril investiu em Veja.

De acordo com Mira (2001), Veja foi lançada com uma grande campanha

publicitária e desde então exigiu um esquema especial de impressão e distribuição

para fazer com que a revista chegue aos pontos de venda e na casa de assinantes

na segunda-feira.

A Editora Abril (2000) salienta que Veja foi criada nos moldes da americana

Time. Além disso, oferecia reportagens exclusivas e um texto impessoal, que era

novidade na época.

Lançada à poucas semanas que o AI-5 inaugurasse a fase mais violenta da censura a imprensa, Veja teve seu trabalho dificultado pelo regime militar até meados dos anos 1970. Edições foram multiladas ou apreendidas. A política sempre esteve entre as suas prioridades, mas a revista celebrizou-se também pelas reportagens de interesse geral. (Editora Abril, 2001, p. 60)

Mas, apesar de ter se tornado uma das mais vendidas, inicialmente a

publicação não agradou muito os leitores. O motivo, segundo Mira (2001) é que a

Veja tinha foco exclusivo no texto e poucas preocupações visuais. Aos poucos, a

revista introduziu mais fotografias e cores e melhorou seu projeto gráfico.

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Veja tem sido, ao longo dos anos, a porta-voz da linha econômica e política da Editora Abril, a única revista diretamente ligada ao seu presidente, Roberto Civita. Por isso, seu papel ideológico nesses campos é crucial. Através de suas matérias, procura-se “mudar a cabeça das pessoas”, como disse Roberto Civita. Sem nos aprofundarmos na questão, poderíamos dizer que, grosso modo, os próprios criadores da revista veem nela uma publicação que, no início, foi mais combativa em relação ao regime militar. (MIRA, 2001, p. 79)

Atualmente, conforme Scalzo (2004), as assinaturas da revista correspondem

a 85% das vendas de cerca de 1,1 milhão de exemplares semanais.

Veja é hoje a revista mais vendida e mais lida no Brasil, o único título semanal de tal situação. Em outros países, revistas semanais de informação vendem bem, mas nenhuma é a mais vendida. Lançada em 1968, nos moldes da norte-americana Time, Veja lutou com dificuldade, durante sete anos, contra os prejuízos e contra a censura do governo militar, até acertar sua fórmula. (SCALZO, 2004, p. 31)

Mira (2001) avalia que a atuação política de Veja, ao longo dos anos, a fez

uma publicação de amplitude nacional que conquistou o mercado.

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4 A REVISTA FLORENSE

Entre as diversas publicações que encontramos hoje no Brasil, destaca-se, na

região da Serra Gaúcha, a Florense, pela qualidade das reportagens e por ter vida

longa. Nas suas páginas coloridas, os assuntos tratados vão desde tendências e

estilo de vida até moda e decoração.

A revista é publicada pela fábrica de móveis de mesmo nome, localizada em

Flores da Cunha, e até junho de 2016 teve sua 49ª edição lançada. O local é

denominado como o maior produtor de vinhos e espumantes e também do setor

moveleiro. Os moradores do município são chamados carinhosamente de florenses,

de onde se origina o nome da revista e da fábrica de móveis local.

Apesar de ser trimestral, a Florense é reconhecida pelos arquitetos e

designers em todo o país. Em entrevista com o editor da Florense, Renato Henrichs,

ele destacou que a revista surgiu em 2004 para fazer a divulgação da empresa.

A Florense possui um trabalho de marketing diferenciado. Ela é bem situada no mercado moveleiro, mas é uma empresa familiar e não tem muito recursos para investir em publicidade. Então, uma das formas encontradas para vender a marca Florense foi a publicação de uma revista. (HENRICHS, 2016)

Henrichs também conta que é muito comum que grandes marcas tenham

suas próprias publicações e que isso motivou a Florense a publicar a sua revista.

Grandes montadoras de automação como a Audi, a Volkswagen, a Mitsubishi têm revistas próprias como uma forma de manter uma boa relação com os parceiros e com os clientes da empresa. A revista surgiu basicamente a partir disso, porque a Florense trabalha muito com arquitetos. (HENRICHS, 2016)

Dessa forma, o editor explica que a publicação auxiliaria a manter acesa a

chama da relação com o arquiteto e também com o cliente, além de reforçar uma

marca.

4.1 FLORES DA CUNHA: CIDADE EMPREENDEDORA

Tanto a fábrica de móveis quanto a revista tem sede em Flores da Cunha.

Conforme Baggio (2014) em sua monografia Fé, cultura e trabalho nas páginas do

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Jornal O Florense, a Fábrica de Móveis Florense é a maior e a mais representativa

empresa da cidade, seguida pela Keko Acessórios e pela Fante Indústria de

Bebidas.

O município é conhecido por ter sido colonizado por italianos. A autora

salienta ainda que a base para a cidade é a agricultura, o que fez de Flores da

Cunha como “o maior produtor de vinhos do país”.

Em Flores da Cunha, considerada a décima quinta légua da Colônia de Caxias, as primeiras famílias chegaram em 1876. No ano seguinte, se estabeleceram mais de 30 famílias com 77 dependentes e, em 1878, mais uma leva significativa de imigrantes, alguns casados, outros viúvos e muitos com familiares na Itália, povoaram a localidade. O município de Flores da Cunha é rodeado de antigas histórias, relatos estes que são contados de avô para neto e assim por diante. A antiga Nova Trento, que já foi chamada de segundo distrito de Caxias do Sul, não tem só o nome com origem italiana. Boa parte de seus moradores tem ligação com a Itália. (BAGGIO, 2014, p. 27)

Camila Baggio (2014) explica que apesar de ser famoso pela produção de

uva, o município também é conhecido ainda como a “Terra do Galo”.

O apelido já virou lenda e ainda causa divergências – alguns dizem que o fato nunca ocorreu, outros juram que é verdadeiro. O caso tem sua versão mais conhecida datada da década de 1930. Não há dados concretos, mas dizem que certo dia um mágico muito esperto chegou a então Nova Trento chamando a população para um show considerado ‘extraordinário’. Ele faria um galo cantar após cortar-lhe a cabeça para depois colocá-la novamente no lugar. Dezenas de pessoas apareceram e, logo após degolar a cabeça do galo, o mágico teria pedido um minuto para buscar a poção mágica para que o animal voltasse a cantar. O esperto ilusionista teria fugido da cidade com o dinheiro do espetáculo e deixado o povo a ver navios. (BAGGIO, 2014, p. 31)

Mas só mais adiante a cidade viria a se chamar Flores da Cunha.

Anteriormente, após uma briga entre dois povoados, o local foi “batizado” de Nova

Trento.

Na futura Flores da Cunha foram fundados dois povoados, o de São José e o de São Pedro. Foi neste último que a cidade começou a se desenvolver. Com o fortalecimento do povoado, decidiram dar-lhe um nome que lembrasse a terra natal. Houve discórdia entre os moradores, porque uns queriam Nova Tirol, outros sugeriram Nova Cremona e assim por diante. Numa manhã após uma assembleia, sem que o povo fosse consultado, surgiu pendurado em um alto pinheiro da praça uma enorme tabuleta com o nome Nova Trento, escrito com carvão. Não se sabe se por respeito ou por medo de escalar a planta, ninguém tirou a tabuleta e assim o nome foi mantido. (BAGGIO, 2014, p. 27)

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Anos mais tarde, o nome Nova Trento enfim foi substituído por Flores da

Cunha após o líder político Heitor Curra expedir um decreto municipal oficializando a

mudança. O nome escolhido era uma homenagem ao general José Antônio Flores

da Cunha.

José Antônio Flores da Cunha era conhecido por ter ajudado nos preparativos da Revolução Constitucionalista de 1932 e líder que dava atenção aos setores ferroviário e rodoviário. Foi neste contexto que uma das mudanças mais significativas de Nova Trento foi ocasionada: a troca do nome. A história gerou polêmica e virou um divisor de águas. Para os moradores do município, o nome nunca teve muito sentido. Embora Flores da Cunha tenha sido uma grande personalidade na política nacional, nunca visitou Flores da Cunha e nem ao menos os munícipes conheciam sua história. (BAGGIO, 2014, p. 27)

Aos poucos, a cidade foi crescendo e potencializando áreas como saúde e

educação. A partir da década de 1950, foram construídas as Escolas Frei Caneca e

São Rafael e o Hospital Nossa Senhora de Fátima. E nos anos 2000 alcançou um

nível de desenvolvimento econômico desejado.

Já os anos de 1990 e 2000 trouxeram o desenvolvimento econômico que Flores precisava. Além do setor de bebidas, o município passou a ser conhecido como polo moveleiro e industrial. De acordo com os dados do Perfil Socioeconômico de Flores da Cunha 2013, atualmente o setor mais representativo do município é o de vinhos e bebidas. Em seguida dos móveis e madeira e, em terceiro lugar, o comércio. Outros setores se mostram importantes, como a mecânica e metalúrgica, embalagem e gráfica e plásticos. Em valores gerais, as 20 maiores indústrias representam aproximadamente 50% do valor adicionado do município, o que demonstra que Flores da Cunha redefiniu sua vocação, agora é industrial (BAGGIO, 2014, p. 31).

No mercado de bebidas, Flores da Cunha se destaca na produção de

destilados, de refrigerantes e também das cervejas. Mas apesar de ter sido fundada

na agricultura, a cidade tem fama também no setor moveleiro.

Responsável por 37,65% da riqueza produzida em Flores da Cunha, o setor de móveis local experimenta um processo de crescimento ao longo dos anos. Pesados investimentos e abertura de novos mercados no exterior garantem a manutenção de uma das marcas do município, que é a produção de móveis. Além da força econômica, existe muito de social por trás disso tudo. São 2.096 pessoas que sobrevivem e geram riqueza com os salários oriundos do ramo de móveis na cidade, correspondendo a 41,17% dos empregos diretos do município. A palavra de ordem do setor é expandir, principalmente para os grandes mercados externos (BAGGIO, 2014, p. 90)

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Segundo Baggio (2014), os móveis fabricados no município em geral são

conhecidos por sua qualidade e inovação. Além disso, o destaque para Flores da

Cunha é a exportação.

Tradicionais empresas da cidade como a Toigo e a Florense há muito negociam com o exterior, encontrando neste mercado garantias que muitas vezes o interno não oferece. No caso específico dos Móveis Florense, cerca de 30% da produção e do faturamento geral da empresa correspondem a vendas no Mercosul, Canadá e Estados Unidos. Nestes mercados, o que vale é a qualidade e a especificidade do produto (BAGGIO, 2014, p 90).

Assim, a autora também afirma que o mercado moveleiro na cidade

conquistou o Brasil e outros países devido a qualidade e certificações como a ISO

9001, 9002 e 14000. Com base em uma reportagem do Jornal O Florense, Baggio

(2014) observa que, em três anos, o setor moveleiro disponibilizou 185 novos

empregos e um faturamento de mais de R$ 45 milhões.

4.2 A FÁBRICA DE MÓVEIS FLORENSE

A Fábrica de Móveis Florense é uma das mais sólidas empresas de móveis

de Flores da Cunha. Mas, além disso, ela é representativa em todo mundo. Desde a

sua fundação, a empresa sempre teve preocupação com a qualidade de seus

produtos. Com o objetivo de trazer inovações, a Florense conta ainda com

tecnologia de última geração e possui um dos maiores e mais avançados centros de

acabamentos de móveis do Brasil. Assim, a fábrica é referência internacional no

mercado moveleiro. Atualmente, a Florense possui franquias nos Estados Unidos

Chile, Guatemala, México, Nova Zelândia, Paraguai, República do Panamá e

Uruguai.

Identificada com os procedimentos de perfeita adequação das matérias-primas à sua correta aplicação em cada componente dos móveis, a Florense utiliza todos os tipos de materiais e padrões de acabamento da indústria moveleira, seguindo a escala europeia: madeira natural, MDP, MDF, laminados decorativos, melamina, alumínio de diversas cores, vidros italianos com desenhos florais e canelados, espumas, tecidos, pintura microtextura e o sofisticado acabamento high gloss, cujo nível de brilho, reflexão e resistência não tem similar no Brasil. Isso tudo soma pontos e encanta os consumidores de qualquer lugar do Brasil. (FLORENSE, 2009, p. 43)

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Grandes conquistas fazem parte da trajetória da Florense. Representando o

compromisso com os clientes, em 1997, a empresa foi a primeira no segmento de

móveis a receber o Certificado de Qualidade ISO 9001. Além disso, a fábrica se

preocupa com a preservação do ambiente e conquistou também o Certificado de

Gestão Ambiental ISO 14001.

Pioneira na conquista do certificado de gestão ambiental ISO 14001, a Florense adotou procedimentos que vão desde o controle da origem, forma de extração e produção das matérias-primas até a destinação final dos resíduos (100% reaproveitados em outros segmentos industriais). Equipamentos com menor consumo de energia, cabines e robôs de pintura com captação e depuração de solventes e uma estação própria de tratamento de efluentes, que permite tratar toda água utilizada na fábrica e devolvê-la ao meio ambiente em sua forma pura, estão entre os inúmeros cuidados que fazem da Florense uma green company. (FLORENSE, 2009, p. 43)

Porém, quem conhece a fábrica hoje não imagina que no início era apenas

uma pequena marcenaria e as vendas ocorriam nas casas dos moradores locais. De

acordo com dados no site da Florense, a empresa foi criada em 1953, por Lourenço

Darcy Castellan, Ângelo Corradi, Décio José Castellan e Valentino Carpeggiani. Aos

poucos, a Florense começou a ampliar suas instalações e, em 1960, passou a

produzir móveis em série para atender todo o Brasil. Pouco tempo depois, em 1980,

a fábrica passou a exportar também para os Estados Unidos e lançou as cozinhas

planejadas, dando início aos projetos personalizados.

Quer mais? Que tal uma tradição de 56 anos de história, pautada pela qualidade dos produtos e serviços e pelo respeito ao cliente? Esta, aliás, sempre foi o ponto de honra da empresa. E o mundo inteiro leva isso muito a sério. Ter a certeza de ser atendido em todas as suas expectativas e que seus móveis serão instalados em qualquer continente, exatamente do jeito que foram aprovados no projeto, com total garantia de qualidade, dá tranquilidade a qualquer pessoa, fale o idioma que falar. (FLORENSE, 2009, p. 43)

O cuidado com o design é percebido até mesmo no desenvolvimento da

página da empresa na web. Em seu site, a Florense brinca com cores e estilos,

trazendo destaque também para as fotos. Como a fábrica exporta para diversos

países, o site conta com versões em português, inglês e espanhol. Além de trazer

toda sua linha de produtos, a empresa conta ainda com um blog sobre as novidades

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no mercado moveleiro. É possível conferir também toda a história da Florense,

desde a sua fundação até os dias atuais, em ordem cronológica de acontecimentos.

4.3 UMA REVISTA DE VARIEDADES

Assim, com a meta de promover a empresa e toda a sua linha de produtos, foi

criada a revista Florense. A história da publicação começou a ser escrita a partir de

uma simples conversa entre Henrichs e um colega. O editor explica que a grande

inspiração para a Florense foi uma publicação da Varig, que se chamava Ícaro.

A Florense tornou-se revista que eu tinha na cabeça. Mas ela é originária do tempo que a Varig tinha uma revista chamada Ícaro, que tratava de amenidades e misturava diferentes temas, com uma abordagem mais leve e mais atraente. Pelo menos a maior parte das revistas customizadas no Brasil tem um pezinho naquela. (HENRICHS, 2016)

Conforme Henrichs (2016), a Florense têm se firmado como um trabalho

diferenciado, pois o objetivo dela não é mostrar as pessoas visitando a loja. A revista

passou a explorar o diferente em suas matérias, trazendo assuntos não tão

utilizados no jornalismo tradicional, porém ainda assim atuais. Alguns temas até

mesmo inusitados ganham pauta, como, por exemplo, a criatividade humana, pratos

estranhos e a história do chapéu no cinema. Reconhecendo a variedade de

conteúdo, a publicação geralmente traz ainda matérias sobre turismo e gastronomia.

Dessa forma, a revista valoriza nem sempre o que está na moda, mas sim o

que tem mais história para contar. Conhecidas cantoras da MPB, mas que nem

sempre estão na mídia como Maria Rita, Gal Costa e Maria Betânia já tiveram seus

perfis traçados pela Florense. Dificilmente serão encontradas matérias sobre

badalados cantores do gênero sertanejo ou de funk na publicação.

Essa característica marcante seguiu firme ao longo dos anos e das

transformações sofridas. O texto trabalhado em cada reportagem também rompe

com uma característica essencial do jornalismo diário: a fórmula do lead, procurando

sempre contextualizar os fatos de forma mais abrangente possível.

Atualmente, a publicação é distribuída nas franquias em diversas cidades,

nesse esquema de parceria com os clientes. Além disso, ela é enviada para um

mailing com cerca de 16 mil contatos de todo Brasil.

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A Florense é uma revista de entretenimento, mas também apresenta bons textos, boas ilustrações e boas fotos. Não temos exatamente a pretensão de fazer uma revista cultural, mas ela aborda questões culturais, além de lazer, turismo, que formam um mix. Assim, procuramos atingir não apenas um tipo específico de cliente. (HENRICHS, 2016)

Para que o conteúdo conquiste os leitores é necessário ter uma boa equipe.

A base da revista é formada pelo editor, pelo diretor geral e por duas pessoas na

direção de arte. Os jornalistas são na verdade colaboradores e não há nenhum fixo.

Segundo Henrichs, essa era a única maneira de viabilizar o projeto, pois é a nova

realidade do mercado de jornalismo. Hoje, o profissional não está mais vinculado

diretamente a uma empresa e acaba tornando-se também uma pequena empresa,

ou seja, um funcionário terceirizado.

Mas são esses colaboradores que constroem as matérias, sempre com

preocupação com os detalhes e narrativa cronológica. Apesar do custo alto dos

profissionais, Henrichs acredita que valha a pena, pois reforça a divulgação da

empresa. O editor ainda ressalta que o grande trunfo da publicação é contar com

grandes nomes do jornalismo e, até mesmo, da literatura brasileira.

Desde o início, profissionais conceituados como Ruy Castro, Sérgio Augusto,

Ana Maria Bahiana e Luiz Antônio Giron contribuem com as matérias da revista.

Outros escritores renomados como Martha Medeiros, José Clemente Pozenato e

Moacyr Scliar também já deixaram a sua marca e seus textos na revista. Além disso,

há reportagens que são elaboradas por correspondentes no exterior.

A ideia é trabalhar com gente que tenha algo a contribuir. Como queremos reforçar a marca Florense, reforçamos também alguns jornalistas que são quase uma marca, com trabalho reconhecido e admirado. Hoje o mercado sofre assim um processo de estagnação e mediocrização, no sentido que as publicações estão perdendo cada vez mais qualidade e espaço. Pelo menos podemos dar espaço e fazer com que essas pessoas mostrem todo o conhecimento, toda a qualidade que eles têm. (HENRICHS, 2016)

Além da preocupação com os profissionais, há um grande cuidado com a

qualidade das reportagens. De acordo com Henrichs, os temas são debatidos em

uma reunião de pauta por mês, já que a Florense é trimestral. O costume é fazer

uma combinação com questões do cotidiano, datas específicas que merecem serem

ressaltadas, sugestões de leitores e dos próprios autores das matérias.

Ainda assim, como a fábrica que deu origem à revista é moveleira, o

favoritismo é pela área de arquitetura. Matérias sobre decoração nas mais variadas

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formas e estilos são sempre encontradas nas páginas da Florense. Conforme

Henrichs, apesar de ser mais viável a opção por arquitetos comerciais, a equipe

prefere apresentar ao público nomes novos.

Costumamos intercalar, mas sempre tivemos preferência para os grandes nomes da arquitetura. Ruy Otake foi o primeiro, depois tivemos Oscar Niemeyer, Paulo Mendes da Rocha, Zaha Hadid, entre outros. Seria muito fácil para a revista fazer uma matéria sobre um arquiteto que trabalha conosco. A ideia é reconhecer mesmo o trabalho de alguém que faz algo diferenciado. Assim, temos a oportunidade de mostrar o trabalho de muitos profissionais renomados, mas que não são conhecidos. (HENRICHS, 2016)

A publicação mais marcante, na visão de Henrichs, não trata sobre um

arquiteto. Para ele, o destaque foi a capa em que a modelo Gisele Bündchen

participou. O editor observa que as pessoas acharam que a modelo tivesse cobrado

para aparecer na revista, mas o único custo foi da jornalista que fez a reportagem. A

irmã de Gisele, que é sua agente, se interessou pelo estilo adotado pela Florense e

a convenceu a fazer a matéria.

Apesar disso, Henrichs (2016) salienta que as edições variam muito e eles

costumam destacar personalidades de diferentes áreas, como atores, cantores e

arquitetos nas capas da Florense. Essas personalidades são ressaltadas também

em um perfil recheado de detalhes sobre suas histórias de trabalho e vida nas

páginas da revista. Nomes como Glória Kalil, Marília Pera, Walter Salles e até

Neymar já foram capa da Florense.

Mas às vezes um determinado assunto também vira matéria de capa, como

no caso da edição especial sobre a cidade de Nova York, destacando lugares,

literatura e arquitetura e celebridades da Big Apple. “A capa é definida em função do

que se reuniu na edição para ver o que vale mais a pena. Depende muito da

questão mercadológica, mas, às vezes, é porque a gente tem um bom material

sobre o assunto.” (HENRICHS, 2016).

Outra edição interessante, na visão de Henrichs (2016), tratou sobre

importância da ecologia. Na capa, o escolhido foi o compositor Gilberto Gil, que

sempre teve preocupação com essas questões. A partir dessa edição, a Florense

começou utilizar um papel ecologicamente correto e participar de diversas

iniciativas. Entre elas, o programa Carbon Free, que tem como objetivo compensar

as emissões de gases de efeito estufa com restauração florestal. Assim, hoje a

Florense conta com a certificação do projeto em suas edições.

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Mas essa não foi a única mudança que a publicação sofreu ao longo dos

anos. A Florense também aumentou o tamanho, para que chamasse a atenção dos

leitores.

A Florense aumentou de tamanho também para fazer algo diferenciado. O tamanho inicial para efeito de postagem era mais tranquilo, mas era muito fácil. Porém, entendemos que tínhamos que fazer algo que provocasse mais impacto. O próprio logo antes era menor também. A ideia foi realmente de aprimorar para que a revista se tornasse visualmente mais atraente. (HENRICHS, 2016)

O editor também salienta que no início a diagramação era mais carregada.

Hoje, o objetivo é fazer algo mais limpo, mais suave, mais leve e mais atraente.

Segundo Henrichs a parte visual da revista também é bem importante. Desde a

primeira edição, os diagramadores não têm medo de utilizar as cores para causar

ainda mais repercussão. Porém, há determinadas matérias em que é trabalhado

com preto e branco para ter efeito diferenciado.

Além disso, as fotografias acompanham os textos e têm destaque nas

páginas das revistas. Mas dependendo da reportagem, há a dificuldade em

conseguir fotos. Nesse caso, eles costumam procurar alternativas diferentes, como

até mesmo ilustrações, pois sabem da importância das imagens para compor as

reportagens. A revista também é produzida em um material resistente, o que

contribui para guardar e colecionar as edições.

A Florense trabalha com móveis e tem uma preocupação grande com design e acabamento. É uma fábrica que restaura e tem cuidado com cada produto e de certa forma isso se transfere para as páginas da revista. Procuramos fazer algo bem feito também com a publicação, para não ferir a própria meta da empresa, de fazer algo arrojado e de padrão internacional. (HENRICHS, 2016)

Não poderia ser diferente com as últimas edições da Florense. O cuidado

com o design é percebido da primeira até a última página da penúltima edição, de

número 47. Para traduzir o estilo clean da revista, o fundo de quase todas

reportagens é branco. Porém, para dar um pequeno destaque, algumas matérias

estão em amarelo claro, causando um efeito diferenciado. Além disso, a qualidade

nas fotos, marca registrada da revista, também está presente nesta edição.

Principalmente nas reportagens sobre o turismo no Peru e sobre o trabalho do

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fotógrafo Tuca Vieira, as imagens ganham destaque pela composição e efeitos,

juntamente com muita cor e belas paisagens.

Como de costume, a arte pauta a publicação. Museu der Dinge, refinamento

no mobiliário e o perfil do arquiteto, antropólogo e escritor Lauro Cavalcanti são

alguns dos temas abordados. A reportagem principal fica por conta da décima

edição da Bienal do Mercosul, em Porto Alegre. Na capa, a edição traz de uma

forma minimalista a obra Tropicália, de Hélio Oiticica, uma das atrações do evento.

Variedade é palavra de ordem na revista. A trajetória do automóvel no cinema

e as bonecas como obras de arte são transformadas em matérias coerentes e

recheadas de detalhes. Além disso, apesar de contar com uma reportagem na capa,

a Florense segue explorando perfis. Nesta edição, o destaque fica com o roqueiro

carioca Renato Russo e com o jornalista e escritor Gay Talease, percursor inclusive

do jornalismo literário, estilo trabalhado nos textos da publicação.

Na última edição, do verão de 2016, a revista também utiliza principalmente

um assunto e não uma personalidade. Para a publicação, o tema escolhido é às

Olimpíadas no Rio de Janeiro. A capa traz uma composição diferente e interessante

com vários elementos ligados ao evento. Além disso, ao longo das 105 páginas da

revista, diversas matérias são dedicadas ou as Olimpíadas ou ao Rio de Janeiro,

formando assim, uma edição especial.

Logo no início, o destaque fica por conta de uma matéria sobre a dimensão

histórica da cidade carioca. A foto com a visão de uma escada e prédios coloniais

ocupando duas páginas chama a atenção. Mas ela não é a única. Não faltam

fotografias bonitas e realistas sobre um outro lado do Rio de Janeiro, talvez pouco

conhecido e mostrado aos turistas. Além disso, belas imagens de museus

estampam uma reportagem sobre os centros de cultura no Rio de Janeiro,

destacando a relação tanto da cidade quanto da própria revista com a arte.

Mas nem só a capital carioca ganha visibilidade. Em uma matéria sobre a

volta das categorias de golfe e rúgbi para as Olímpiadas, as imagens nas páginas

centrais representam com excelência cada modalidade. A foto com foco para o taco

e a bola de golfe mostra o cuidado e atenção que é preciso ter no jogo. Já a imagem

com a silhueta de um jogador de rúgbi correndo em meio ao fundo borrado salienta

a rapidez do esporte. O texto, com depoimentos de jogadores, completa a impressão

causada pelas fotografias ao contar um pouco da história dos jogos junto às

Olimpíadas.

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Dessa vez, quem ganha um perfil são os designers cariocas Frederico Gelli,

Evelyn Grumach e Ana Luísa Escorel. Ele assina a concepção das marcas dos

jogos olímpicos e paraolímpicos e também participa da direção criativa das

cerimônias de abertura e encerramento dos paraolímpicos. Já elas não possuem

vínculo direto com o evento, mas sim com a história da cidade. Ambas matérias

constroem as trajetórias dos profissionais, sempre com elementos literários .

Além disso, a Florense ainda traz depoimentos de diversas personalidades

sobre o que é a cara da cidade e faz até uma playlist com canções cariocas de todos

os estilos e épocas. Definitivamente, uma edição especial para ninguém colocar

defeito.

Todo esse cuidado e preocupação têm gerado um bom resultado e

repercussão. De acordo com Henrichs (2016), hoje a tiragem da revista é de cerca

de 28 mil exemplares.

É uma bela tiragem para um trabalho assim. Por ela ser uma revista trimestral, o tempo ajuda a planejar. Embora os trabalhadores sejam profissionais completos há exceções que tem que se adaptar. Acaba sendo um trabalho quase artesanal, pois tudo é bem pensado, formulado e encaminhado. (HENRICHS, 2016)

Além da revista impressa, a Florense também conta com uma versão online.

Porém, Henrichs afirma que a publicação virtual não causa a mesma repercussão

que o contato com a revista.

Como é algo para manter um vínculo com as pessoas, esse vínculo não pode ser virtual. Ele tem que ser físico, é uma relação diferente. Como a revista existe há quase doze anos acredito que estou certo. Mesmo que modestamente, temos preocupação de fazer algo de qualidade. (HENRICHS, 2016)

Ainda assim, a revista tem uma boa receptividade. Henrichs observa que as

pessoas costumam interagir, mandando e-mails contando o que gostaram e fazendo

sugestões. Essas manifestações trazem uma satisfação grande, segundo ele.

Apesar do público da Florense ser bem específico, ele é formador de opinião,

diferenciado e bem informado.

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4.4 ALGUMAS EDIÇÕES DA FLORENSE

Essa monografia busca analisar alguns perfis de arquitetos renomados

encontrados em cinco edições específicas da Florense. Apesar da evidencia para o

aspecto visual, o texto é essencial e na revista ele é sempre bem trabalhado. Em

todas as matérias da Florense, o estilo de escrever lembra muito o jornalismo

literário. Cada reportagem parece contar uma história, porém com fatos reais.

Entre as revistas trabalhadas está a primeira edição, que trazia o arquiteto

Ruy Othake na capa, em 2004. Novidade na Serra Gaúcha, em nenhum momento

os produtores queriam deixar dúvida sobre a qualidade da publicação. Desde o

início, o papel acetinado, as cores vibrantes e as fotografias procuravam conquistar

e chamar a atenção desse público tão específico de leitores.

Na maioria de suas matérias, a Florense tenta abordar de alguma forma sobre

design, ainda que não sejam esses os focos das matérias. Além da história de

Othake, a publicação também faz uma grande reportagem sobre o estilo de vestir e

de vida de Carmen Miranda e sobre a urbanidade de Curitiba. Mas gastronomia e

turismo seguem na pauta, com matérias sobre o chef curitibano Celso Freire e as

belezas de Fernando de Noronha. Ao final da edição, a revista traz as sessões sobre

novidades em tecnologia, filmes e livros.

Outra edição que será trabalhada é a número 3, que traz o arquiteto Oscar

Niemayer na capa e segue um estilo ainda muito próximo da primeira revista. As

cores são utilizadas sem moderação, conforme as fotografias escolhidas em cada

página. Porém, não há um equilíbrio entre elas e fica faltando um toque de leveza e

um padrão.

A revista ainda não havia descoberto o seu estilo próprio na diagramação e

iria passar por algumas transformações visuais ao longo dos anos. Na própria

reportagem sobre Niemayer, alguns espaços em branco entre o texto e as

fotografias deixam dúvida sobre o efeito que os diagramadores buscavam. Mas a

preocupação em trazer um texto rico em detalhes e coerente era evidente desde a

primeira página.

A reportagem principal tratava sobre as obras de Niemayer. Além disso,

matérias como o mercado de lâmpadas, a funcionalidade do alumínio e a rotina de

um designer de joias deixava claro que o foco da revista acompanhava o foco da

empresa, ou seja, design, decoração e arquitetura. Porém, a publicação também

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incluía matérias sobre o turismo em Florianópolis e o trabalho de direção de arte,

mesclando com sessões sobre tecnologia e livros, que destacavam a ansiedade de

conquistar um outro lado desse leitor.

A edição 18, que também será avaliada nessa monografia, teve uma grande

mudança se comprarmos com as outras duas edições. O tamanho aumentou e a

revista passou a utilizar um papel ecologicamente correto e, assim, conter o selo da

Carbon Free. Além disso, é possível notar transformações desde a primeira página.

Até mesmo o sumário, antes reduzido, agora passa a ocupar duas páginas,

chamando a atenção dos leitores.

Nesta edição, a Florense passa a adotar um estilo mais “suave”, com

destaque para as fotografias. As cores parecem ter sido escolhidas a partir de um

padrão, com tons menos vibrantes e neutros. Em uma matéria sobre a madeira na

decoração, a foto destaque utiliza apenas texturas que lembram o material. A

reportagem principal, com o arquiteto Paulo Mendes da Rocha, deixa esse detalhe

ainda mais evidente. Utilizando uma escala de cinza, as fotos ganham a página

inteira, deixando o texto como acompanhante.

Ainda assim, as tonalidades mais efusivas são utilizadas estrategicamente,

como em uma reportagem sobre a Grécia em que o destaque fica para uma pintura

imitando os desenhos gregos antigos e a cor laranja ao fundo. Seguindo a linha de

variedades, a revista traz ainda matérias sobre um designer contemporâneo, uma

homenagem a Cartola e até sobre o perigo de extinção do relógio de pulso. A seção

sobre tecnologias é extinta, mas ainda há novidades sobre livros, filmes e músicas

ao final da edição.

Com o arquiteto Daniel Libeskind, a edição 22 segue o mesmo padrão da

edição 18. As fotos em alta qualidade e grandes tamanhos chamam a atenção. Em

uma matéria sobre padarias italianas em São Paulo, a imagem com doces, pães e

outras guloseimas ocupa duas páginas. Na reportagem principal, as obras de

Libeskind ganham destaque.

Porém, algumas vezes as fotografias são substituídas por ilustrações, como

no caso da matéria sobre o significado da cor vermelha, em que um desenho de

uma chama e um coração é a evidência. As cores também seguem buscando efeitos

interessantes. Na mesma reportagem o título, em vermelho desperta o interesse dos

leitores. Além disso, foi utilizado um retângulo vermelho ao invés da palavra

designando a cor, ferramenta diferenciada e criativa.

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O uso do cinza também pauta uma matéria sobre a própria Fábrica de Móveis

Florense. Apesar de ela não ser o foco da revista, a edição traz uma reportagem

sobre as qualificações da empresa, ressaltando as franquias em todo o mundo.

Sempre com o estilo de narrativas, a publicação conta ainda com matérias sobre

música em disco, o ator Wagner Moura e o crescente aparecimento dos vampiros

em histórias.

Mas mudanças sempre fizeram parte da trajetória da Florense. Na edição

41, a revista aumentou mais uma vez o tamanho, ficando próximo a um padrão A3.

Apesar de chamar ainda mais a atenção, a transformação pode dificultar na hora de

carregar a revista na bolsa ou até para guardar. O fundo branco e o cuidado com os

espaçamentos, bastante utilizado neste número, auxiliam na imagem de “revista

clean”. Tudo parece ter sido muito bem pensado e calculado, como, por exemplo,

uma grande imagem de uma estante com ângulos diferentes estampa uma

reportagem sobre novas percepções na decoração. Outra transformação ocorre

com as tradicionais seções sobre filmes, livros e música. Elas passam a conter

menos temas, mas de forma com que os mesmos são ainda mais aproveitados.

A arquitetura continua sendo a chave de tudo e, assim, o estilo de Zaha Hadid

é a matéria principal. Mas pautas culturais também buscam agradar os diferentes

estilos e perfis dos leitores da revista. A atriz internacional Scarlett Johansson ganha

um perfil só dela, bem como o ator nacional Marcelo Serrado e o artista Cristopher

Becker. Repletas de detalhes, as reportagens traçam a trajetória de vida e arte das

três personalidades.

E nem só o que está na moda entra na edição. A revista também costuma

valorizar algumas pautas diferentes e por que não dizer inusitadas. No número 41, o

detetive mais famoso, Sherlock Holmes, a história de Charles Chaplin e até uma

região pouco explorada da França ganham reportagens próprias, mostrando

também que a Florense quer abordar toda a diversidade de assuntos possíveis.

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5 OS ALICERCES DA ARQUITETURA

Esta monografia tem como finalidade estudar a aproximação do jornalismo

com a literatura. A união dos dois gêneros, chamada de jornalismo literário,

enriquece e traz vida para o texto. Para isso, o jornalista trabalha livremente, sem

padrões ou regras estilísticas, fazendo com que a reportagem não seja apenas uma

informação, mas sim uma história com fatos reais.

Assim, o objetivo principal deste trabalho é analisar os elementos do

jornalismo literário presente em perfis divulgados na revista Florense, valorizando

uma publicação elaborada na Serra Gaúcha. Além do design inovador, a Florense é

conhecida pela qualidade de suas matérias, que abordam assuntos ligados à

decoração e também culturais.

Para estudar as estratégias de composição e de linguagem do jornalismo

literário, este trabalho utiliza como base os perfis de cinco arquitetos divulgados em

edições diferentes da Florense. Entre tantas personalidades já trabalhadas na

revista, os perfis foram escolhidos por se tratarem de arquitetos renomados, que

muitas vezes não têm o seu trabalho reconhecido. Assim, será realizada uma leitura

da “arquitetura” do trabalho de construção de um texto, simbologia que origina o

tema desta monografia: “A Arquitetura do Texto: Os Perfis Jornalísticos da Revista

Florense”.

Com base nesse contexto, se busca responder a questão norteadora: os

perfis de arquitetos publicados pela revista Florense se aproximam do jornalismo

literário?

Entre as hipóteses, está que a escolha dos perfilados se deve ao público-alvo

da revista. Apesar de ser definida como uma publicação de variedades, a Florense

destaca principalmente matérias de decoração, design e arquitetura, pois ela é

distribuída para clientes e parceiros da fábrica de móveis. Outra hipótese é de que a

linguagem, apesar de ser um veículo ligado ao design, é próxima da literatura. Com

muitos elementos literários, a revista busca construir a história de trabalho desses

profissionais.

Além disso, é privilegiado o estilo de vida de cada um dos perfilados,

constituindo-se também uma hipótese. Apesar de alguns nomes serem conhecidos

apenas por profissionais da área de arquitetura, eles são renomados e já

construíram grandes obras por todo Brasil. Porém, talvez a principal hipótese seja

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mesmo que a experiência profissional desses arquitetos se articula com o texto de

natureza literária. Com todo cuidado com as palavras, os jornalistas elaboraram as

reportagens de forma a se parecer com um conto, porém com fatos reais.

5.1 O MÉTODO DA ARQUITETURA

Com base no método hipotético-dedutivo, esta monografia é um estudo de

análise de conteúdo. No livro Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação,

Wilson Correa da Fonseca Júnior (in BARROS; DUARTE, 2005) destaca que a

análise de conteúdo é essencial. Na mesma obra, Krippendorff (1990 in. FONSECA

JÚNIOR in BARROS; DUARTE, 2005, p. 280) salienta que “a Análise de Conteúdo

(AC), em concepção ampla, se refere a um método das ciências humanas e sociais

destinado à investigação de fenômenos simbólicos por meio de várias técnicas de

pesquisa.”.

Já Bardin (1977, p. 38), em Análise de Conteúdo, afirma que “a análise de

conteúdo aparece como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, que

utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das

mensagens”.

Bauer (in BAUER; GASKELL, 2002, p.192), no livro Pesquisa Qualitativa com

Texto, Imagem e Som: Um Manual Prático salienta que “a AC nos permite

reconstruir indicadores e cosmovisões, valores, atitudes, opiniões, preconceitos e

estereótipos e compará-los entre comunidades. Em outras palavras, a AC é

pesquisa de opinião pública com outros meios.”.

Conforme Fonseca Júnior (in BARROS; DUARTE, 2005), foi no final do

século XIX que surgiram as primeiras pesquisas em análise de conteúdo sobre o

sensacionalismo nos Estados Unidos. Logo, outras áreas incluíram as técnicas de

análise de conteúdo. A partir dos anos 1990, essas técnicas passaram a ganhar

visibilidade com a possibilidade de acesso a mídias on-line e programas de

televisão.

(...) a análise de conteúdo possui atualmente três características fundamentais: (a) orientação fundamentalmente empírica, exploratória, vinculada a fenômenos reais e de finalidade preditiva; (b) transcendência das noções normais de conteúdo, envolvendo as ideias de mensagem, canal, comunicação e sistema; (c) metodologia própria, que permite ao investigador programar, comunicar e avaliar criticamente um projeto de

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pesquisa com independência de resultados. (KRIPPENDORFF, 1990, in FONSECA JÚNIOR in BARROS; DUARTE, 2005, p. 286)

O desenvolvimento da análise de conteúdo logo se expandiu para outras

regiões da Europa e América Latina. De acordo com Fonseca Júnior (in BARROS;

DUARTE, 2005), a AC valoriza os aspectos qualitativos e quantitativos dependendo

do interesse do pesquisador. Se houver muitos materiais, a análise deve ser

quantitativa; se o objetivo for aprofundar o conteúdo, precisa-se optar por uma

análise qualitativa.

Desde modo, a análise de texto faz uma ponte entre um formalismo estatístico e a análise qualitativa dos materiais. No divisor quantidade/ qualidade das ciências sociais, a análise de conteúdo é uma técnica híbrida que pode mediar esta improdutiva discussão sobre virtudes e métodos. (BAUER in BAUER; GASKELL, 2002, p. 190).

Quando o assunto são as ações iniciais da análise, há algumas divergências

entre os autores. Para Krippendorff (1990 in FONSECA JÚNIOR in BARROS;

DUARTE, 2005), primeiramente é preciso encontrar o objetivo da pesquisa. Bardin

(1977) acredita que a primeira atividade da análise de conteúdo é a leitura flutuante,

ou seja, a procura por materiais a serem analisados, que levam à escolha do tema,

referencial teórico, formulação do problema, hipóteses e objetivos. Após essa

definição, o próximo passo é a escolha de materiais para a análise, chamado de

constituição do corpus.

A análise de conteúdo é uma construção social. Como qualquer construção viável, ela leva em consideração alguma realidade, neste caso o corpus do texto, e ela deve ser julgada pelo seu resultado. Este resultado, contudo, não é o único fundamento para se fazer uma avaliação. Na pesquisa, o resultado vai dizer se a análise apresenta produções de interesse e que resistam a um minucioso exame; mas bom gosto pode também fazer parte da avaliação. (BAUER in BAUER; GASKELL, 2002, p. 203).

De acordo com Fonseca Júnior (in BARROS; DUARTE, 2005), o momento

mais fértil da análise de conteúdo são as inferências, pois seu objetivo é concentrar-

se nos fatos implícitos.

Na análise de conteúdo, a inferência é considerada uma operação lógica destinada a extrair conhecimentos sobre os aspectos latentes da mensagem analisada. Assim, como o arqueólogo e o detetive trabalham com vestígios, o analista trabalha com índices cuidadosamente postos em evidência, tirando partido do tratamento das mensagens que manipula, para

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inferir (deduzir de maneira lógica) conhecimentos sobre o emissor ou sobre o destinatário da comunicação (BARDIN, 1988, in. FONSECA JÚNIOR, 2005, p. 284)

Esses processos constituem as três fases da análise de conteúdo, segundo

Bardin (1977). O primeiro momento e o mais importante é a pré-análise, que trata do

planejamento do trabalho e serve de apoio para as etapas seguintes. “Se as

diferentes operações da pré-análise foram convenientemente concluídas, a fase de

análise propriamente dita não é mais do que a administração sistemática das

decisões tomadas”. (Bardin, 1977, p. 101). Assim, na análise, é realizada a

exploração do material e constituição do corpus. Por fim, a última etapa é a

interpretação e o tratamento dos resultados obtidos, com o objetivo de torná-los

válidos e significativos.

5.2 OS CINCO ARQUITETOS

Ruy Othake, Oscar Niemayer, Paulo Mendes da Rocha, Daniel Libeskind e

Zaha Hadid. Esses são os renomados arquitetos que ganharam um perfil biográfico

em edições diferentes da Florense e escolhidos para esta monografia, conforme pré-

análise.

Todos os perfis têm algo em comum: tratam da história profissional desses

arquitetos, ressaltando a grandiosidade de suas obras, muitas até desconhecidas.

Detalhes não faltam na construção desses textos, facilitando também a

compreensão do leitor.

Além disso, as reportagens rompem ainda com a atualidade do jornalismo

tradicional, por se tratarem de assuntos atemporais.

5.2.1 O estilo singular de Ruy Othake

Diferenciação poderia ser a palavra utilizada para descrever Ruy Othake,

arquiteto escolhido para a primeira edição da revista Florense, de 2004. Com o

nome de “Ruy Othake: precisão e surpresa”, a matéria escrita por Luís Antônio

Giron, destaca obras criativas e com formatos diversos desde a imagem inicial.

Muito além de jornalista, Giron também é um escritor e crítico gaúcho, mas

radicado em São Paulo. O autor tem conhecimento no jornalismo cultural, sendo

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contribuidor da Florense desde a primeira edição. Além da revista gaúcha, já

trabalhou como repórter e editor especial no jornal Folha de São Paulo, revistas Veja

e Época. Mas a literatura também está no seu sangue. Entre seus livros publicados

estão: Ensaio de Ponto (1998), Mário Reis, o fino do samba (2001), Até nunca mais

por enquanto (2004), Minoridade crítica: folhetinistas diletantes nos jornais da corte

(2004), Teatro de Gonçalves Dias (2005) e Crônicas Reunidas de Gonçalves Dias

(2013).

Dessa forma, Giron soube colaborar com excelência para a matéria que

constrói a figura de Ruy Othake, fazendo com que literatura e jornalismo se

encontrem também no desenho da reportagem. O escritor já construiu o perfil do

sambista Mário Reis e para a terceira edição da Florense soube retratar todas as

linhas e formas de expressão do arquiteto.

Ocupando duas páginas, a imagem principal da matéria conta com Othake

observando uma de suas criações (anexo A). Mas a criatividade não é percebida

apenas nas produções do arquiteto. A reportagem lembra, muitas vezes, um conto

desde o seu início.

O drama do arquiteto acontece entre o projeto e sua realização. Muitas vezes um e outra são linhas paralelas que jamais se cruzam. E todo arquiteto que se preze tem um pouco de artista e visionário. Ruy Othake, um dos mais admiráveis arquitetos do Brasil, levou muito tempo até ver suas ideias materializadas: prédios, hotéis, móveis e, mais recentemente, áreas reurbanizadas em comunidades carentes. (FLORENSE, 2004, p. 23)

Vilas Boas (1996) ressalta as semelhanças entre os dois estilos no livro O

Estilo Magazine – O Texto em Revista. Da mesma forma que o conto, a reportagem

precisa de força, clareza, condensação e novidade. Para conquistar o leitor, é

preciso suspense, de forma a fazer com que ele chegue ao final do texto. E isso é

percebido desde as primeiras frases. Podemos notar, assim, que o texto não lembra

nem de perto o jornalismo do cotidiano, tradicional e engessado. Assim, a forma de

escrita é criativa e consegue se aproximar ainda mais do leitor.

Nas páginas que seguem, imagens internas e externas do prédio

acompanham o texto que descreve com exatidão detalhes da chamada “obra da

vida do arquiteto”: o Othake Cultural.

Os contornos de seus sonhos estão alterando a paisagem da maior metrópole sul-americana (...). O novo edifício de Othake consiste em uma

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torre oblonga de alumínio e vidro que ostenta cores fortes – faixas que revezam negro e sobretons de azul e turquesa, distribuídas em 29 andares. Um platô construído no topo projeta sombra na ala oeste. No interior, 58 salas de 340 metros quadrados cada começam a ser ocupadas por escritórios. Os primeiros três andares comportam o Instituto Tomie Othake, que dispõe de áreas de exposição e projeção, lojas, livrarias, restaurante – e um teatro que acaba de ser inaugurado, com dois palcos e capacidade para 750 espectadores. (FLORENSE, 2004, p. 23)

Mais uma vez, a revista utiliza o recurso da descrição, destacando ainda

sobre o estilo diferenciado das obras de Othake. O trecho conta ainda com um início

poético, ao fazer a simbologia com o trabalho do arquiteto. Segundo Olinto (2003),

essa é mesmo a natureza da profissão. Para o autor, o jornalista deve trabalhar

como um arquiteto literário, sempre preocupado em desenvolver todo o ambiente em

que as cenas se passam.

Além do Othake Cultural e seus 29 andares, o texto ressalta outras de suas

obras exóticas. Nas fotografias espalhadas pela matéria, imagens de móveis e

outros prédios com formatos imprevistos. Assim, sempre como uma narrativa, a

reportagem conta com a opinião de Othake sobre suas obras e ressalta o Hotel

Unique, outro trabalho do arquiteto que possui uma forma estilizada.

Os croquis e desenhos de Othake são repletos de cores e podem passar por obras de arte. Seu traço é firme, mesmo quando explica os projetos no quadro-negro que ocupa uma parede inteira no escritório. Redesenha em giz o hotel Unique, inaugurado há um ano no centro da capital paulista: uma gigantesca estrutura em forma de arco virado pra cima, com seis andares e vãos livres sustentados apenas por duas colunas. (FLORENSE, 2004, p. 25)

Observa-se que a explicação do jornalista é essencial para retratar e qualificar

os procedimentos utilizados por Othake. Apesar de estar ligado diretamente à

arquitetura, o texto consegue fazer o leitor realmente imergir na história, de forma

que se aproxima da literatura. Esta é a hipótese 2. Segundo Vilas Boas (1996), ser

literário significa, narrar com efeito, com beleza e imaginação.

E isso não falta para a reportagem. Para os profissionais da área, a matéria é

muito informativa e a contextualização dos fatos, essencial. De forma minuciosa, o

jornalista ainda narra o início da carreira de Othake. Vilas Boas (1996) também

observa que para escrever uma reportagem, ser sensível, não ter medo de ser

literário e ser sensível jornalisticamente.

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Começou fazendo sofás e bancadas, e logo se deu conta que o concreto era um material moldável capaz de criar formas implausíveis em móveis de madeira. Do concreto, passou às chapas de aço e o acrílico e construiu mesas em forma de origami. Do metal, enveredou pelo aglomerado MDF. Descobriu que esse material sintético e elástico podia produzir sinuosidades e elipses, e tratou de construir em formatos imprevistos – curvas como um velário de caravela, circulares, piramidais, fractais. (FLORENSE, 2004, p. 25)

Registrar hábitos e características do personagem é um recurso básico do

New Journalism, conforme Tom Wolfe (apud PENA, 2006). Assim, da mesma forma

que Othake teve preocupação com sua obra, a linguagem constrói interiores e

exteriores sobre o trabalho do arquiteto. O texto flui para contar que a inspiração

para a arte surgiu desde quando o arquiteto era criança, reconstruindo o seu

passado. Hoje, ele utiliza seu dom para fazer também trabalhos voluntários.

Apesar de ter foco em suas obras, o estilo de texto lembra muito um perfil ou

biografia. Conforme Pena (2006), a biografia trata da narrativa de um personagem e

conduz todo enredo. Os acontecimentos são apenas parte da história. O

personagem, para Giron, é que é o centro de tudo.

A matéria ressalta ainda o Centro Cultural Adamastor, em Guarulhos, uma

das realizações mais vistosas de Othake. Além disso, cita também um prédio de 19

andares na Avenida Paulista que possui formato de microfone. Assim, podemos

observar que o trabalho do arquiteto é algo particular e distinto, merecendo destaque

na revista. Ao final da reportagem, uma foto de Othake em tons de cinza ilustra a

opinião dele sobre os desafios da arquitetura e seu estilo de trabalhar.

Ruy Othake costuma trabalhar com um olho na prancheta e outro no panorama dos prédios da cidade que se estende diante de sua janela. Gosta de parar e pensar antes de lançar qualquer outra ideia no papel. “Quando penso no que eu já fiz, fico feliz, embora me dê conta que ainda tenho muito que trabalhar”, constata. Seus projetos, claro, resultam sempre mais numerosos que a possibilidade de materializá-los. É ali que mora o drama e a sua alegria de continuar. (FLORENSE, 2004, p. 28)

Assim, a reportagem se encerra fugindo de qualquer padrão estabelecido

pelas regras do jornalismo do cotidiano. Notamos que o perfil de Giron possui

enredo completo, com início, meio e fim, podendo ser comparado a uma história.

Porém, a forma livre e criativa com que ele é trabalhado destaca ainda mais a

proximidade com a literatura.

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Giron utiliza da sua liberdade como escritor para construir a trajetória do

renomado arquiteto com uma riqueza de detalhes admirável, fundindo arte,

arquitetura e literatura em uma só reportagem. A matéria-prima para a construção da

obra não poderia ser outra: Ruy Othake e a beleza de seus projetos.

Dessa forma, o cotidiano e a arquitetura se intercalam em um perfil muito bem

escrito e nada superficial, destacando o estilo de viver e projetar de Othake. Apesar

de pouco conhecido para quem não é arquiteto ou designer, as produções do artista

são grandiosas e exuberantes. Foi ele que trouxe destaque para obras como Hotel

Renaissansse, em São Paulo, e Brasília Shopping and Towers, em Brasília. Suas

características principais são o uso de cores e curvas, o que fez com que ele

assinasse o seu nome como representante da arquitetura moderna.

Em contraponto, o arquiteto realiza trabalhos humanitários. Entre eles, as

ruas de Heliópolis, principal comunidade carente de São Paulo. Com cores

vibrantes, Othake pintou a fachada das habitações, alegrando a vida dos moradores.

Além disso, foi ele que sugeriu a construção de uma biblioteca local. Para escrever

literatura também é preciso ser humanitário. Dessa forma, Othake e suas formas, e

Giron e sua linguagem, estão ainda mais unidos na arte de transformar e emocionar

outras pessoas, cada um a sua maneira.

5.2.2 O traçado de Oscar Niemayer

Uma fotografia em alta qualidade do Museu da Arte (anexo B), em Niterói, no

Rio, estampa a reportagem “Uma cidade no caminho de Niemayer”, da terceira

edição da revista Florense, lançada em 2004. O texto foi elaborado pela jornalista

carioca Claudia Fernandes. Especializada na área de arquitetura e decoração, ela já

trabalhou como editora nos cadernos Casa&Decoração e Imóveis do JB e também

como repórter no jornal O Globo e na revista Domingo.

Uma demonstração de um trabalho do grande arquiteto introduz o assunto

principal da matéria:

Da Baía de Guanabara já é possível avistar verdadeiras obras de arte assinadas por Oscar Niemayer. O conjunto arquitetônico de curvas sinuosas, traços livres e formas assimétricas, projetado por um dos maiores nomes da arquitetura mundial, vai transformar a antiga capital do Estado do Rio na segunda cidade do mundo com o maior volume de obras do arquiteto, superado apenas por Brasília. O Caminho Niemayer, que deverá

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estar todo concluído até 2006, reúne 10 construções ao longo de 3,5 km da orla central de Niterói. (FLORENSE, 2004, p. 21)

Fugindo do jornalismo tradicional e da regra do lead, a Florense traz para a

matéria um abre criativo e livre de qualquer padrão estilístico. Conforme lembra o

autor Rildo Cosson (in CASTRO; GALENO, 2002), a literatura é um objetivo a ser

alcançado por todo jornalista. Ele também explica que enquanto jornalismo é império

dos fatos, a literatura é jardim da imaginação. Assim, o texto busca narrar a trajetória

da construção do Caminho Niemayer, de forma que a abertura é digna de um conto.

De acordo com Sérgio Vilas Boas (1996), o conto é a forma mais curta da literatura,

assim como a reportagem é a mais longa do jornalismo. Dessa forma, os dois estilos

têm muito em comum.

Podemos observar também que o assunto trabalhado e também a linguagem

utilizada são voltados principalmente para o público-alvo da revista, ou seja, os

designers e arquitetos. Esta é a hipótese número 1. A reportagem é retrancada e

apresenta uma parte que não condiz com o propósito desta monografia. Porém, as

demais, como veremos, trazem exemplos muito fortes da aproximação do jornalismo

com a literatura.

As imagens também são o grande destaque para a reportagem. Fotografias

das estátuas de bronze de Niemayer e do ex-presidente Juscelino Kubitschek, dos

engenheiros que coordenam o Grupo Executivo Caminho Niemayer, em frente ao

Teatro Popular de Niterói, e também da construção da Fundação Oscar Niemayer,

entre outras, trazem um pouco de cor e vida ao texto.

Na matéria principal, a jornalista prossegue salientando que está sendo

estudada a implantação de um oceanário ao projeto original e destaca a primeira

obra concluída: o Museu de Arte Contemporânea. A reportagem ressalta também

como surgiu a ideia do projeto e finaliza afirmando que a rede hoteleira está sendo

expandida, juntamente com outros negócios, devido à quantidade de turistas atraída

pelo Caminho Niemayer.

A partir das páginas seguintes o estilo de escrita começa a se transformar. A

matéria apresenta uma descrição recheada de detalhes das construções que

compõem o Caminho Niemayer, entre elas, a Estação das Barcas de Charitas.

Em forma circular, apresenta um salão central para embarque e desembarque e espaço destinado a lojas e serviços. Uma rampa conduz ao

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andar superior, onde localiza-se o restaurante, revestido em vidro para permitir a vista da bela paisagem da baía e no qual também pode ser admirado painel com desenhos de Niemayer. Uma passarela coberta, que avança para o mar numa extensão de 73 metros, realiza a ligação da estação aos barcos, a ser complementada por um flutuante. Quando de sua operação plena, três barcos (240 lugares cada) farão o transporte, em um fluxo estimado de 5000 usuários/dia. (FLORENSE, 2004, p. 26)

A descrição é uma forma narrativa que é uma técnica da literatura, no qual

escritores como Ernest Hemingway a usavam muito. Segundo Pena (2006), o

jornalismo literário não pode ser superficial, sendo necessária uma construção de

todo o enredo da matéria. Dessa forma, a função estética do texto predomina.

Uma pequena ilustração de como são as obras acompanha a matéria. Outra

criação de Niemayer realçada no texto é a Catedral Batista. Na matéria, a jornalista

constrói em minúcia toda a parte interna dos ambientes.

Com uma arquitetura arrojada, o prédio tem um dos maiores vãos livres do mundo: 80 metros. Com capacidade para abrigar cerca de cinco mil pessoas na nave principal, conta ainda com um palco para 600 pessoas. Toda em concreto, ela ganhará um vitral assinado por Mariane Perret. No prédio anexo há três pavimentos, totalizando uma área construída de oito mil metros quadrados, destinados ao atendimento comunitário. (FLORENSE, 2004, p. 27)

Podemos observar que não faltam detalhes que ajudam o leitor a visualizar

cada uma das obras. O uso de adjetivos também auxilia a qualificar e destacar as

produções. Assim, o Teatro Popular também ganha uma descrição bem peculiar e

individual.

Um teatro aberto para o mar. Assim Niemayer concebeu o espaço, que se transforma em dois ambientes. No interior da construção funcionará um teatro para espetáculos de música e dança com capacidade para 400 pessoas sentadas nas cadeiras sobre os degraus da arquibancada de concreto. Com paredes de vidro que ressaltam a paisagem e vãos livres que se misturam às curvas sensuais do projeto, o teatro vai receber um enorme painel de azulejos amarelos com desenhos do criador. Na visão externa, o portão de aço que se serve de fundo para o palco se recolhe, voltando o teatro para a praça, que ganhará esculturas do próprio arquiteto. (FLORENSE, 2004, p. 27)

Com um início bem literário, o texto salienta a principal característica do

teatro: a vista para o mar. Mas esse não é o único recurso utilizado pela jornalista,

como podemos observar na descrição sobre o Centro Petrobrás de Cinema.

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Lembrando um enorme rolo de filme, o complexo de cinco salas de exibição, shopping cultural, centro de memória do cinema nacional e auditório, tem 8300 metros quadrados, e está localizado próximo à Universidade Federal Fluminense (sede do mais antigo curso de cinema do país). O Centro é dividido em dois blocos: o primeiro, com três andares, é revestido de vidro e tem forma cilíndrica e vai abrigar o museu com acervo do museu brasileiro; no segundo ficarão as cinco salas de cinema com capacidade entre 110 e 200 lugares cada uma em um auditório. (FLORENSE, 2004, p. 27)

Assim, o Centro de Cinema é relacionado com um rolo de filme. A

comparação é uma figura de linguagem utilizada pela literatura, tornando a

mensagem mais expressiva.

Separadamente dos outros projetos, o Museu da Arte Contemporânea,

inaugurado em 1966 e cartão postal de Niterói, ganha ainda uma pequena matéria

própria. No início de maio, o Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural decidiu pela

inclusão da obra na relação dos monumentos protegidos como patrimônio cultural

brasileiro, em homenagem ao centenário de Niemayer.

Uma imagem da parte interna do museu, em que é possível ter uma visão da

praia pelas amplas janelas do monumento ilustra o texto “Uma escultura em forma

de museu”.

No primeiro piso fica a recepção e a administração. O salão de exposições, com mil metros quadrados, está localizado no segundo pavimento. Em seu contorno, há uma varanda panorâmica envidraçada de onde se tem a vista deslumbrante da Baía de Guanabara. Seis salas menores dividem o espaço do mezanino. No subsolo, há um auditório para 60 pessoas e um local reservado para o restaurante. (FLORENSE, 2004, p. 29)

Observa-se que é possível ter um vislumbre do ambiente apenas pela

descrição. A linguagem não poupa detalhes, para fazer com que o leitor se sinta

parte integrante da matéria. O local é descrito como “um disco voador, solto no ar”.

Não faltam particularidades e refinamento, tanto para a obra, quanto para o texto.

Lembrando um disco voador, solto no ar, o MAC foi projetado para suportar um peso equivalente a 400 kg/m² e ventos com velocidade de até 200 km/h. A iluminação externa conta com 34 faróis de avião instalados sob o espelho d’ água – com 817 metros quadrados de superfície – que cerca a base. O jogo de luzes cria um efeito especial que ressalta ainda mais a sinuosidade da obra – símbolo da cidade. (FLORENSE, 2004, p. 29)

Mais uma vez, a comparação é utilizada com o objetivo de facilitar a

compreensão da mensagem. Ao final da reportagem, a publicação conta ainda uma

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entrevista com Niemayer, trazendo uma biografia resumida do arquiteto. Ao lado,

uma fotografia do arquiteto em tons de cinza.

Carioca, 97 anos, Oscar Niemayer completou 70 anos de arquitetura com mais de 500 projetos assinados no mundo. Lançou recentemente o livro Minha Arquitetura - 1937-2004 (editora Revan) onde analisa seus projetos, fala do seu trabalho, dos amigos e companheiros de profissão. O arquiteto do século 20 revolucionou a arquitetura com obras como o conjunto da Pampulha, em 1940, e as construções de Brasília, a partir de 1957. (FLORENSE, 2004, p. 30)

Assim, descrição poderia resumir toda reportagem. O texto tem foco na

escultura monumental que é referência para arquitetos e estudantes da área, mas

apenas na parte final fala-se do renomado arquiteto.

Porém, não se pode discutir a qualidade de seu trabalho. Pode-se afirmar que

Oscar Niemayer é um das mais importantes personalidades para o desenvolvimento

da arquitetura moderna. Famoso por idealizar Brasília, ele também foi eleito como o

9º maior gênio vivo e recebeu os maiores prêmios da área. Entre seus projetos

arquitetônicos, estão monumentos do Parque Ibirapuera e a Passarela do Samba do

Rio. Assim, não restam dúvidas de que o estilo de vida do arquiteto mereceu

destaque na Florense.

A qualidade do traçado de Niemayer se encaixa perfeitamente com a

proposta da revista e combina com as formas adotadas pela jornalista Cláudia

Fernandes. A riqueza de detalhes ressalta e traz mais vida e emoção para a matéria,

fazendo com que a linguagem se aproxime muito da literária.

Para arquitetos, designers e profissionais da área, a reportagem ilustra cada

monumento que compõe a belíssima paisagem arquitetônica que é cartão postal de

Niterói. Mas até mesmo quem não é da área se interessa pelas formas descritas

com grande profundidade e intensidade, que fazem o leitor literalmente (ou

literariamente) imergir em cada traçado de Niemayer. Portanto, da mesma maneira

que as obras são referência de arte, o texto é referência em sua linguagem, ao

valorizar o majestoso monumento da cidade.

5.2.3 O talento de Paulo Mendes da Rocha

O terceiro perfil de nossa análise contempla o arquiteto Paulo Mendes da

Rocha. É um profissional singular, destaque na arquitetura contemporânea

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brasileira. Entre suas obras estão a reforma da Pinacoteca, o Museu de Língua

Portuguesa e a Casa Butantã, todos em São Paulo, local onde maior parte de suas

obras está. Como um verdadeiro artista, Mendes da Rocha não poderia deixar de

ser também humanitário. Seus projetos arquitetônicos contribuem não só para a

estética, mas também para as necessidades sociais.

Recentemente, o arquiteto tornou-se o primeiro brasileiro a vencer o Leão de

Ouro, pelo conjunto de seu projeto na Bienal de Arquitetura de Veneza. Além disso,

há dez anos ele recebeu o Pritzker, maior prêmio da área. Em entrevista divulgada

no dia 06 de maio para o site da Folha de São Paulo, Mendes da Rocha fala sobre o

significado do prêmio e os resultados de seu trabalho.

Não há prêmio mais encantador, mais sedutor. Não tenho mais condições de fazer o papel de modesto. Estou muito alegre com o prêmio. Eu nunca trabalhei sozinho, por tanto faço disso uma forma de abraçar todos aqueles que já trabalharam comigo, engenheiros e arquitetos, o Mackenzie onde me formei e a FAU. [...] Minha arquitetura é oportuna, e a vida nunca é igual. É importante considerar isso sem que a arquitetura seja espantosa, novidadeira. É por aí mesmo. As transformações da nossa vida é que são permanentes. (MARTI, 2016)

Apesar de ser lançada em 2008, a reportagem de nome “Paulo Mendes da

Rocha: lições de arquitetura” já destacava o prestígio conquistado pelo arquiteto.

“Paulo Mendes da Rocha não para. O arquiteto que ganhou o Pritzker 2006, o mais

importante prêmio internacional de arquitetura, continua trabalhando e dando sua

contribuição cultural ao debate sobre a arquitetura e a cidade.” (FLORENSE, 2008,

p. 16).

É assim, despertando a curiosidade do leitor sobre a figura de Paulo Mendes

da Rocha, que o jornalista Beto Rodrigues introduz a matéria. Fagundes de

Menezes (1997) já afirmava que o jornalismo, como gênero literário, é inseparável

de um clima de liberdade. Como imagem para ilustrar o texto, apenas o perfil do

arquiteto surge no canto das páginas banhadas de cinza (anexo C). Mas a

reportagem inicia mesmo na descrição de uma palestra ministrada pelo arquiteto.

Acaba mais uma palestra da Bienal de Arquitetura e Paulo Mendes da Rocha sai apressado do auditório do Porão das Artes, no subsolo do prédio da exposição. Não estava atrasado para nada. Apenas aflito para fumar um cigarro, após quase duas horas sentado, falando em um ambiente fechado. Entre uma baforada e outra, atende aos vários pedidos de autógrafos e posa para fotos ao lado de estudantes de arquitetura da FAU. (FLORENSE, 2008, p. 17)

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A imersão de Rodrigues é visível pelos detalhes em que a reportagem

apresenta. Segundo Tom Wolfe (2005), essa era exatamente uma característica que

o New Journalism deveria apresentar. Era preciso ir além dos limites convencionais

do jornalismo, de forma que as reportagens deveriam ser mais intensas e

detalhadas. É exatamente desse modo que o texto segue descrevendo a reação de

Mendes da Rocha e dos estudantes que acompanhavam a palestra.

Excitados em seus 20 e poucos anos, os meninos e meninas da escola de arquitetura da USP sonham em conseguir ao menos uma pequena parcela do reconhecimento que o professor alcançou. Aos 79 anos, Mendes da Rocha goza hoje, no Brasil, de um enorme prestígio. Ele não é fã de entrevistas, nem costuma falar aquilo que se esperaria dele (pelo script convencional). Na palestra, havia criticado duramente iniciativas que geraram situações como a da Avenida Paulista. (FLORENSE, 2008, p. 17)

A sensibilidade do jornalista em lidar com o assunto e transmitir as reações,

atitudes, falas e emoções de seus personagens é o grande destaque de todo o

texto. De acordo com Wolfe (in PENA, 2006), registrar hábitos e outras

características do personagem, reconstruir a história cena a cena e registrar

diálogos completos são recursos adotados pelo New Jornalism. Ou seja, puro

jornalismo literário.

Também conforme Wolfe (2005), isso é possível quando os repórteres

passam algum tempo com as pessoas sobre as quais escreviam, de forma a ir além

dos limites do jornalismo do cotidiano.

Do lado de fora da sala, questionado sobre uma solução sobre o problema que acabara de apontar, responde, de supetão: “Não sei. E você, sabe? Algum jeito tem que ter. Isso é pergunta que se faça?”. E vira-se contrariado, para depois relaxar com mais uma baforada de cigarro. Gênios são assim, imprevisíveis. E Paulo Mendes da Rocha é um deles. (FLORENSE, 2008, p. 17)

Podemos perceber também que o jornalista deixou a imaginação e a

criatividade fluir, mas sempre com foco na veracidade dos acontecimentos. Alex

Galeno (in CASTRO; GALENO, 2002) observa que a literatura deve ser o fermento

para liberar a imaginação jornalística e um meio de evitar que ela se transforme em

mero exercício retórico do cotidiano. Portanto, a cena reproduzida com exatidão

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junto ao comportamento de Mendes da Rocha traz mais profundidade e emoção à

matéria.

Assim, a reportagem segue com opiniões de outras personalidades da área

que conviveram com o arquiteto. Todos, sem exceção, ressaltam seu talento e seus

conhecimentos na arte de projetar. Marcante é a palavra utilizada para descrever

algumas de suas obras, como o Centro de Tecnologia da Cidade de Vigo, na

Espanha e o Museu da Escultura, em São Paulo. Nas imagens, podemos ter uma

amostra de vários de seus projetos arquitetônicos.

Segundo Antônio Olinto (2003), é preciso manter a emoção para escrever, por

meio dos elementos, entre fontes, cores, cheiros e outros detalhes. É desse modo

que o jornalista torna-se apto a escrever uma reportagem, gênero mais consagrado

do meio jornalístico.

E nessa reportagem em questão os elementos não faltam, pois o jornalista

procura envolver o leitor ao adentrar no mundo e na arte de Mendes da Rocha. Ao

abordar o Poupatempo de Itaquera, a matéria salienta que apesar de ser um projeto

pouco discutido ele inclui características essenciais do trabalho do arquiteto: belo e

útil, mas também cidadão e integrado com a cidade. E isso também é percebido no

texto. Fagundes de Menezes (1997) já dizia que a literatura “é a arte que se exprime

por meio da palavra falada ou escrita”. Arte essa observada tanto na linguagem

quanto no trabalho de Mendes da Rocha.

Valorizando essas qualidades da arquitetura, Paulo Mendes já ocupou um escritório no Conjunto Nacional, estando hoje instalado no edifício-sede do IAB. Também morou no edifício Copan, época que frequentava a piscina do Othon Hotel, para tomar um gim tônica e fumar um cigarrinho antes do almoço. (FLORENSE, 2008, p. 20)

Assim, abrigando características essenciais do jornalismo, o texto procura

informar e entreter ao mesmo tempo, valorizando uma linguagem mais estética.

Além disso, a humanização dos fatos, de forma a se aproximar do leitor é essencial.

A reportagem destaca também que foi Mendes da Rocha quem elaborou um

complexo plano arquitônico-urbanístico para acolher as Olimpíadas de 2012, quando

o Brasil disputou à candidatura como sede esportiva. Após o processo, o arquiteto

teve seu projeto exposto na 7ª Bienal de Arquitetura, do qual foi homenageado ao

lado de Oscar Niemayer, únicos brasileiros a ganhar o Prêmio Pritzker.

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Ao final da reportagem, a jornalista Cláudia Rodrigues dos Santos

complementa o texto de Beto Rodrigues escrevendo uma pequena biografia sobre o

arquiteto, de forma a resumir um pouco da sua trajetória.

Capixaba de Vitória, Paulo Archias Mendes da Rocha se mudou para São Paulo ainda menino. Formou-se arquiteto no início da década de 1950 e construiu grande parte de uma das obras mais importantes do cenário da arquitetura brasileira – e, pode-se mesmo dizer, internacional. O diploma foi da Universidade Mackenzie, mas a formação teve complementação na convivência com o arquiteto Vilanova Artigas, na FAU- USP, aonde veio também a ensinar. (FLORENSE, 2008, p. 25)

Dessa maneira, com o mesmo cuidado que Mendes da Rocha tem com seus

projetos, Cláudia encerra a reportagem. Assim, não restam dúvidas de que o

trabalho do arquiteto é notável e valorizado na revista. Essa é a hipótese 3.

E sempre – seja no desenho de uma cadeira ou de uma pequena célula familiar, seja em projetos complexos para edifícios públicos, comerciais ou religiosos – é preciso destacar o essencial diálogo poético que ele estabelece com o lugar. Diálogo que pode até tomar a forma de discurso inflamado quando defende o direito a cidades mais dignas, mais justas, mais bonitas. Generosidade nos traçados, generosidade nos espaços: generoso arquiteto Paulo Mendes da Rocha. (FLORENSE, 2008, p. 25)

Observa-se que a jornalista utiliza da beleza estética literária para trazer um

final poético à reportagem. Neste trecho, pode-se perceber o que Antônio Olinto

(2003) quis dizer quando afirmou que o jornalismo tem as mesmas possibilidades

que a literatura de produzir obras de arte.

Obras de arte produzidas com todo talento de Paulo Mendes da Rocha. Hoje,

ele alcançou prestígio e é reconhecido como o maior arquiteto vivo. Assim, seus

trabalhos servem de inspiração para estudantes e outros profissionais de arquitetura

e urbanismo.

De forma nada objetiva, a reportagem busca seduzir e conquistar o leitor por

meio de cada palavra. É possível perceber que o processo de construção da

reportagem exigiu muita pesquisa e observação. As entrevistas de alunos, colegas

arquitetos e outras pessoas que conviveram com Mendes da Rocha ajudam ainda

mais a projetar cada linha do personagem. Não são poucas as obras do arquiteto. A

matéria salienta principalmente o ginásio do Clube Paulistano e também o Museu da

Escultura, ambos em São Paulo. Mas o que destaca é o jeito único e humilde de

Mendes da Rocha em lidar com a vida.

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Isso é possível graças à contextualização dos fatos e o envolvimento de

Rodrigues com o mundo do arquiteto. Desse modo, como Antônio Olinto (2003)

ressalta, o jornalista torna-se também um escritor, pois coloca o melhor de seu

talento e seus esforços em seu texto. O início da reportagem poderia muito bem se

tratar de uma história literária, devido aos detalhes e a leveza com que eles são

abordados. Isso faz com que o leitor visualize, de certa forma, todo o ambiente em

que ocorre a palestra. É possível ter noção, inclusive, de sentimentos e hábitos de

Mendes da Rocha, destacando também sua personalidade marcante.

E o final de Cláudia Rodrigues traz mais beleza à matéria e ajuda a perceber

quem é o intenso arquiteto que recebeu diversos prêmios. Intensidade na

construção, intensidade na personalidade, intensidade nas palavras. De Paulo

Mendes da Rocha e da reportagem.

5.2.4 Os contornos de Daniel Libeskind

O polonês Daniel Libeskind é o personagem escolhido para a vigésima

segunda edição da Florense. O arquiteto tem uma história de vida interessante,

principalmente, por ter presenciado o Holocausto quando era criança. Por ser judeu

e não fazer parte do Partido Comunista, o arquiteto e sua família sofreram

agressões.

Entre suas obras mais impactantes está o Museu Judaico, em Berlim. Mas

Libeskind não costuma trabalhar em apenas um lugar. De Milão, passando por Las

Vegas, Varsóvia, Dublin e chegando até a Coréia do Sul. Foi assim que o arquiteto

percorreu cidades com sua arte e alcançou prestígio e reconhecimento em todo o

mundo.

O perfil retrata um pouco de cada episódio da história de Libeskind, bem

como suas lições de arquitetura e de vida. A matéria ganha cor pelas mãos de

Eduardo Graça, jornalista que já trabalhou como repórter de cultura no Jornal do

Brasil, O Estado de São Paulo e Valor Econômico. Além disso, ele foi também

editor, roteirista e repórter dos canais televisivos Multishow e Brasil. No momento,

Graça é correspondente da Florense e de outros jornais e revistas brasileiros em

Nova York, nos Estados Unidos.

Apesar de ser uma reportagem pequena, em relação aos outros perfis, ela

traz algumas referências de literatura. De acordo com Sérgio Vilas Boas (1996),

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isso é comum em textos de revistas. A revista utiliza termos da literatura e as

transpõe para o uso corrente, podendo ter outra forma de expressão, ao mesmo

tempo criativa e erudita. Assim, formas, curvas, arte, jornalismo e beleza procuram

traduzir um pouco do estilo de Daniel Libeskind.

A frase “Tudo está interligado. Esta é a beleza da arquitetura”, na fotografia

de Libeskind observando uma maquete com muitos prédios, introduz e deixa claro o

foco da matéria (anexo D). Conforme Scalzo (2004) ressalta, quando alguém olha

para uma página de revista, a primeira coisa que vê são as imagens. Dessa forma,

fotos provocam reações emocionais, convidam a mergulhar em um assunto, a entrar

em uma matéria. E não há convite melhor, feito pelas próprias obras do personagem

principal.

O texto inicia destacando que Libeskind é um dos principais ícones da

arquitetura mundial, ao lado de Zaha Hadid e Frank Gehry. Mais uma vez, é possível

ter uma ideia disso pelas fotografias. Imponentes construções com a assinatura do

arquiteto ressaltam a beleza de suas obras. Uma delas se trata do projeto de

restauração do chamado Ground Zero, no qual o prédio Freedom Tower ganha o

traçado de Libeskind. A outra é a Torre New York, em meio a um edifício residencial

em Manhattan.

Na semana em que a reportagem da Florense passou uma tarde ensolarada de primavera ao lado do simpaticíssimo Daniel Libeskind, a ilha de Manhattan se debatia com o anúncio de que os construtores responsáveis pelos projetos de reurbanização do chamado Ground Zero, originalmente ocupado pelas Torres Gêmeas do World Trade Center, não queriam comercializar o prédio principal, projetado pelo arquiteto, com o nome de Freedom Tower ou Torre da Liberdade. (FLORENSE, 2009, p. 16)

Pode-se perceber que o jornalista fugiu de responder as tradicionais

perguntas “O quê?”, “Quem?”, “Quando?”, “Onde?”, “Como?” e “Por quê?” no

primeiro parágrafo. Ele preferiu, dessa maneira, ressaltar a comercialização do

Freedom Tower, de uma forma mais criativa.

Vilas Boas (1996) lembra que o que, justamente, conquista o leitor na

reportagem são as aberturas, pois é um dos principais diferenciais em relação aos

jornais. O lead não é necessário e nem as informações principais sobre o fato

devem vir nas primeiras linhas.

Utilizando muitos adjetivos para qualificar cada detalhe do texto, a matéria

prioriza a descrição, técnica do jornalismo literário. Conforme vimos no capítulo 2,

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Vilas Boas (in BRITO, 2007) destaca que um dos principais objetivos do gênero é

detalhar as informações e retratá-las com arte.

Dessa forma, o jornalista tenta transferir um pouco da arte de Libeskind para

as páginas da revista em forma de linguagem.

Consideravam o nome, cunhado pelos familiares das vítimas do ataque terrorista de 11 de Setembro, pouco comercial. Este é mais um capítulo de uma novela que se arrasta há seis anos, um dos projetos com maior carga política e emocional do norte-americano de origem polonesa que é uma das grandes estrelas da arquitetura contemporânea. (FLORENSE, 2009, p. 16)

Assim, a triste história de vida de Libeskind junto ao Holocausto se intercala

com o projeto do arquiteto para o prédio que era originalmente ocupado pelas Torres

Gêmeas, derrubadas por ataque terrorista.

Responsável por edifícios icônicos como o Museu Judaico de Berlim, na Alemanha, Libeskind, que aparenta ter menos de 62 anos, estava de malas prontas para sua segunda viagem no Brasil, desta vez a São Paulo, para apresentar uma palestra sobre a linguagem da arquitetura, para além de luzes, curvas e traços, um meio de comunicação que fala “tanto para a mente quanto para a alma”, nas palavras do arquiteto. (FLORENSE, 2009, p. 16)

Com uma combinação com poesia, vida e arte do arquiteto se associam

perfeitamente com a literatura. Essa é a hipótese 4. Isso é destacado por Vilas Boas

(in BRITO, 2007). O autor afirma que jornalismo literário pode ser considerado um

casamento que combina os métodos de reportar jornalísticos com técnicas de

expressão literárias.

Um de seus objetivos na viagem, com escala no Rio de Janeiro, é uma visita demorada ao Palácio Gustavo Capanema, o antigo prédio-sede do Ministério da Educação, projetado em 1936 por Lúcio Costa, Oscar Niemayer e Affonso Eduardo Reidy, com consultoria de Le Corbuiser, no centro do Rio. “É um dos grandes prédios do século 20, naquela que, muito provavelmente, é a cidade mais bela, geograficamente e musicalmente, do planeta”, diz Libeskind. (FLORENSE, 2009, p. 16)

Dessa forma, a música citada por Libeskind também é utilizada por Felipe

Pena (2006) para fazer uma comparação com jornalismo e literatura. Segundo ele, é

necessário melodia para misturar os dois estilos, pois o jornalismo literário não trata

apenas da oposição entre informar e entreter.

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Assim, a reportagem traz ainda uma entrevista com o renomado arquiteto.

Libeskind fala de sua rotina, de seus desafios e de suas influências de arte. Para

ele, uma parte importante do trabalho é feita com pesquisa. Porém, para os projetos

do Museu Judaico e do Ground Zero, o arquiteto afirma que não fez nenhuma

reflexão histórica. As duas construções são, em suas palavras, uma extensão dele,

de forma que ele tentou deixar impressas suas emoções e memórias.

É dessa forma, com diálogos marcantes, que Libeskind transmite ainda sua

opinião sobre a arquitetura:

Arquitetura, para mim, é a arte das artes, é a arte cívica. Para mim, é a expressão da luz, da liberdade, do horizonte, da conquista, de novos espaços, do entendimento do passado e da busca do futuro. (...) Mas cada projeto tem suas limitações e esta é a beleza da arquitetura, tudo está interligado. Nunca fiz um projeto que fosse todo concebido em minha torre de marfim, afastado do interesse público. De certa forma, o resultado do que faço vem de um consenso mais público do que privado. Acredito piamente em arquitetura participativa, não são só palavras. Não desenho para mim mesmo. (FLORENSE, 2009, p. 20)

O arquiteto afirma ainda que a arquitetura está sempre mudando e dialogando

com o que existe, mostrando que é possível encontrar literatura e poesia também

nas palavras de Libeskind. Tanto o texto quando o trabalho do arquiteto possuem

humanismo, liberdade e criatividade. Ao final da entrevista, Libeskind ressalta sua

passagem pelas cidades brasileiras e o carinho que sente pelo país.

Assim, a matéria sintetiza um pouco do momento vivido pelo arquiteto, entre o

anúncio da comercialização do chamado Ground Zero e a preparação para a

segunda viagem ao Brasil. Os questionamentos sobre a trajetória de vida e arte de

Lisbeskind são respondidos na entrevista.

Mas isso não significa que a reportagem seja mal-escrita. Pelo contrário.

Conforme Vilas Boas (1996) explica no terceiro capítulo, a revista costuma deixar

algo “no ar” ou nas entrelinhas. Enquanto os jornais buscam a menor ambiguidade,

as revistas deixam lacunas para que o leitor as preencha.

Ainda assim, são os detalhes que permitem uma contextualização dos fatos e

um panorama de tudo que permeia o mundo de arte de Lisbeskind. Dessa maneira,

é possível enxergar algumas expressões de literatura e de liberdade. Tanto no texto

quanto no próprio arquiteto.

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5.2.5 As curvas de Zaha Hadid

A iraquiana Zaha Hadid foi a escolha para o quinto e último perfil desta

monografia. Inimitável e ousada, nas palavras descritas na quadragésima primeira

edição da Florense, Zaha também foi a primeira mulher a receber o Prêmio Pritzker,

pelo conjunto de sua obra, em 2004. Em 2016, faleceu vítima de um infarto ao ser

internada em um hospital para tratar de uma bronquite.

Mas seu trabalho inovador deixou marcas em todo mundo. É Zaha que assina

o Museu Nacional das Artes do Século 21, em Roma, a estação de trem de Afragola,

em Napólis, e o distrito de CityLife, em Milão. Mas talvez a arquiteta tenha ficado

conhecida realmente pelo centro aquático das Olímpiadas de 2012.

E as suas curvas não poderiam deixar de passar pela Florense, juntamente

com parte de sua trajetória. A reportagem é da jornalista, escritora e historiadora

Cyntia Garcia. Ou seja, uma profissional digna da arte de Zaha Hadid.

Nas imagens de abertura da matéria, uma foto de perfil da arquiteta (anexo E)

ao lado do inusitado lustre Vortex, cujo desenho é assinado por Zaha e ganhador

dos prêmios Lights of the Future, em 2006 e if-Award, em 2007. O texto inicia

ressaltando que, desde 1993, Zaha vem ficando seu estilo futurista em várias partes

do planeta.

O ano de 1993 foi marcante na carreira de Zaha Hadid. Finalmente, seu primeiro projeto fora erguido – a Casa dos Bombeiros, situada na Suíça, no Vitra Campus da respeitada marca de design internacional. O prédio de serviço, hoje um museu, removeu o estigma de projetos impossíveis de realizar que até então rondava o nome da profissional nascida em Bogotá, capital do Iraque. Zaha tinha 43 anos. (FLORENSE, 2014, p. 14)

Podemos perceber que desde o início a jornalista tenta prender a atenção do

leitor por meio de uma linguagem leve, agradável e criativa. Dessa forma, ela

prossegue ressaltando a quantidade de projetos inaugurados pelo Zaha Hadid

Architetics, escritório com sede em Londres. Além disso, há destaque também para

o fato de que a arquiteta já figurou entre as pessoas mais influentes das revistas

Forbes e Time e foi agraciada com o título de “dame” pela Rainha Elisabeth.

Mas não é só a elite que idolatra a diva da arquitetura pop. Em Clerkenwell, bairro no East End londrino, onde vive em um apartamento reformado por ela, sem cozinha (“tirei porque saio o tempo todo”), a poucos minutos de seu estúdio, o grafiteiro Greg Shapter homenageou-a com um grande retrato aerografado de seu rosto em um paredão local. Também no ano

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passado, a mídia brasileira anunciou com alarde que a arquiteta projetará sua primeira obra no país, um hotel de luxo na Avenida Atlântida, no Rio de Janeiro, com inauguração prevista para as Olímpiadas. (FLORENSE, 2014, p. 14)

Observa-se que Cynthia utiliza de sua experiência como escritora para

decorar o prestígio que Zaha alcançou. São os detalhes que colorem as cenas em

que a trajetória da arquiteta é construída.

Segundo Vilas Boas (1996), a boa reportagem é aquela que consegue

apresentar a notícia em profundidade, com objetividade e padrão ético. Para as

revistas é preciso oferecer diferentes ângulos de visão da situação,

complementando com históricos, depoimentos, dados e outras estatísticas. Dessa

forma, a jornalista ainda conta sobre a família de Zaha.

Se fosse a vontade de seus dois irmãos, a caçula Zaha teria sido astronauta. Inteligente, curiosa, sempre com uma pergunta na ponta da língua, ela nasceu em berço de ouro, de família do norte do Iraque – seu pai, Mohammed Hadid, um democrata progressista, foi Ministro da Economia de seu país; sua mãe, uma mulher fina e esclarecida, ensinou a menina a desenhar. No golpe de estado de 1963, os bens da família foram congelados. (FLORENSE, 2014, p. 15)

É por meio da descrição que a matéria estabelece uma relação mais próxima

com o leitor. Scalzo (2004) lembra que a revista é um encontro de identificação entre

um editor e o leitor. Assim, enquanto o jornal ocupa o espaço público a revista

estabelece uma relação de intimidade com o seu leitor.

Apelidada pelo jornal inglês The Guardian de “rainha das curvas”, essa mulher durona, ditadora, temperamental, que chama a atenção por onde passa, não deixa por menos. Gosta de homens bonitos e de se vestir com a moda da estilista alemã Elke Walter, única que consegue no tecido o que sua mais famosa cliente consegue no concreto. (FLORENSE, 2014, p. 15)

Podemos perceber que não faltam adjetivos para qualificar quem é Zaha

Hadid. Desse modo, a jornalista também foi a fundo em suas pesquisas sobre a

arquiteta. Conforme vimos no capítulo 2, Pena (2006) afirma que registrar hábitos e

outras características do personagem é uma marca do New Jornalism.

O perfil ainda ressalta que o estilo inovador das obras da arquiteta rendeu

comentários maldosos de um jornalista. Ele fez uma comparação vulgar do estádio

de Al Wakrah projetado para a Copa do Mundo de 2022, com a pintura de

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sensualidade feminina de Georgia O’Keeffe. O ato rendeu uma resposta furiosa de

Zaha na revista Time, destacando assim sua personalidade forte.

A sensualidade futurista é a marca de Dame Zaha Hadid. Está imantada nas mais de 40 obras extraordinárias de arquitetura que levam sua assinatura ao redor do globo, em seus projetos de decoração, no seu design de mobiliário, em sapatos (já desenhou um para a Melissa), na bolsa que criou para a Louis Vuitton, em suas jóias, iates, esculturas e instalações, como a que fez para a Chanel em parceria com Karl Lagerfeld. (FLORENSE, 2014, p. 15)

Podemos notar que o texto concilia técnicas jornalísticas e literárias ao

mesmo tempo. Isso é uma característica do texto de revista, conforme lembra Vilas

Boas (1992). Assim, o autor também afirma que as revistas exigem um conteúdo

sedutor e elegante. E isso é, definitivamente, uma marca registrada do perfil.

No final, Zaha faz ainda um parecer de seu trabalho. As páginas ao longo de

toda a reportagem refletem sua arte inovadora e ousada. Para a arquiteta, cada

projeto é uma descoberta, algo mágico, despontando também uma confiança no

futuro.

Seu trabalho demonstra um raro grau de conhecimento de geometria e matemática, chegando a um nível de sensibilidade quase espiritual, porém não doutrinária, energizada pela constante surpresa inerente à sua obra, que parece manipular, desconstruir, fragmentar e curtir com a teoria do caos. (FLORENSE, 2014, p. 15)

A reportagem ainda traz uma entrevista com a arquiteta. Nas palavras de

Cynthia, Zaha é considerada “a mulher que está desenhando o amanhã”. E ela

prova isso. Em suas respostas, a arquiteta explica um pouco sobre seu processo

criativo, as barreiras que existem para as mulheres na arquitetura e também sobre

sua formação de arte e quem a influenciou.

De acordo com Vilas Boas (1996), para as revistas é necessário jornalistas

que não só possuam técnica, mas também inspiração e criatividade. A qualidade do

texto é um diferencial, pois está relacionada com um conteúdo bem-elaborado e

criterioso. Regra seguida à risca por Cynthia.

Dessa forma, a trajetória de arquiteta se desenvolve com ritmo, beleza e

liberdade, ou seja, com uma certa improvisação. Observa-se que seguindo as regras

de uma boa reportagem, a matéria tem começo, meio e fim. A reportagem atrai a

atenção desde o início e ao final, termina de uma forma ainda mais envolvente.

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Podemos perceber que a influência que a jornalista recebeu da literatura a

ajudou completamente a construir esse perfil. A matéria provavelmente exigiu muita

pesquisa. Mas o que adianta essas informações se não há talento? São as

expressões literárias que permitem compreender todas as curvas da arquiteta. Essa

é a hipótese 4. O texto apresenta também uma conciliação de arte e técnica, de

forma que cada acontecimento é tão bem construído que faz com que o leitor

conheça realmente Zaha Hadid. A personagem é digna de destaque: mulher forte,

competente e brilhante.

A morte de Zaha é uma perda terrível para a arquitetura moderna. Porém,

suas curvas, suas cores, seus desenhos e seu talento estão registrados em cada

uma de suas obras e em cada linha da reportagem. Assim, a “arquiteta do futuro”,

está marcada na linguagem da arte. No ontem, no agora e no amanhã.

5.3 A PÓS- ANÁLISE DA ARQUITETURA

De acordo com o método de Laurence Bardin (1977), a análise de conteúdo

tem como objetivo levantar inferências. Assim, é possível observar algumas

características em comum no perfil dos cinco arquitetos da revista Florense.

A primeira dedução que podemos perceber é a descrição literária. Sempre

constante nas matérias, a descrição traz profundidade e enriquece a linguagem. São

os detalhes que ajudam a compor o cenário das histórias. Cores, cheiros, texturas e

outros elementos inserem intensidade em cada linha das reportagens.

Outro fator que colabora para isso é a valorização humanitária. Todos os

arquitetos possuem uma relação bem próxima com trabalhos humanistas. Mas a

qualidade não se restringe aos profissionais. A linguagem humanitária também

auxilia na aproximação com o leitor, de modo que os jornalistas responsáveis

precisaram de muita observação e expressão para trazer significado às reportagens.

É dessa maneira que a arquitetura do texto também merece destaque. A

forma de escrita é primordial para chamar atenção de um leitor. Narrar com beleza e

sofisticação deixa a linguagem mais expressiva, além de facilitar o entendimento.

Assim, o discurso bem trabalhado e criativo de cada perfil traduz em diferentes

formas várias faces da realidade.

Mas o que seria de uma história sem seus personagens? São os arquitetos

que trazem vida para cada reportagem, de forma que eles podem ser considerados

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personagens do jornalismo. As matérias são trabalhadas como um verdadeiro conto

literário, fazendo cada profissional se transformar no personagem de sua própria

história.

Nessa sequência, a sedução da linguagem jornalística também pode ser

apontada como uma inferência. Independentemente do estilo textual, a palavra é o

eixo central de toda e qualquer comunicação. Por meio dela, o escritor ou o

jornalista busca atrair e conquistar o seu leitor. E isso é realizado com excelência

em todas as reportagens.

Portanto, é possível inferir ainda que cada um desses elementos auxilia ainda

mais na aproximação do jornalismo com a literatura, fazendo com que os textos

sejam exemplos de qualidade de escrita jornalística.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo estudo efetuado percebeu-se como o jornalismo pode se aproximar da

literatura. Depois de um semestre de muita pesquisa e dedicação, pode-se afirmar

que o objetivo inicial desta monografia foi preenchido. Através deste trabalho, foi

possível perceber o quanto a estética do texto contribui para chamar a atenção do

leitor.

Cada capítulo foi essencial para realização da análise e na composição desta

monografia. Autores como Marília Scalzo, Felipe Pena e Sérgio Vilas Boas ajudaram

a compreender mais sobre a linguagem de uma boa reportagem jornalística e a

identificar os elementos textuais literários.

Para isso, o assunto foi trabalho em seis capítulos, incluindo introdução e

considerações finais. Em Jornalismo e Literatura: embates e consensos foi

apresentado as características dos dois gêneros, entre semelhanças e divergências.

Além disso, um subcapítulo tratou especificamente do jornalismo literário e da

importância da proximidade com a literatura para deixar o texto mais leve e

agradável.

No capítulo seguinte, identificamos as principais características de uma

revista, entre texto, fotografias, design e outros componentes, destacando suas

diferenciações em relação ao jornal. Além disso, também foi abordada a trajetória da

revista no Brasil, citando a história de algumas publicações que marcaram época.

Com esses elementos, para o quarto capítulo só restou estudar a evolução da

Revista Florense, desde a primeira até a última edição. O capítulo analisou estilo de

texto, imagem e design do periódico.

Assim, o caminho percorrido por este trabalho facilitou o estudo dos perfis dos

cinco arquitetos para a análise. Todos os profissionais pertencem à arquitetura

moderna e possuem grandiosas obras de arte no histórico de suas carreiras. E essa

arte foi percebida ainda em cada texto, fazendo com que as hipóteses fossem

comprovadas. É possível notar que os jornalistas responsáveis construíram as

reportagens com o mesmo cuidado que é preciso ter com obras de arte.

Portanto, a definição dos personagens foi de extrema importância. A escolha

dos perfilados se deve ao público-alvo da revista e é a primeira das hipóteses

validadas. Apesar de ter sido citada apenas na reportagem de Oscar Niemayer, essa

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hipótese abrange todos os perfis. Afinal, os cinco profissionais são arquitetos e estão

diretamente relacionados com área de decoração, principal foco da Florense.

Sendo assim, a linguagem, apesar de ser um veículo ligado ao design, é

próxima da literatura. Essa é a segunda hipótese constatada. Criatividade, liberdade

e intensidade poderiam ser citadas como as principais qualidades das matérias.

Devido às descrições, os textos lembram, em muitos momentos, um verdadeiro

conto literário.

Desse modo, é privilegiado o estilo de vida de cada um dos perfilados. São os

detalhes que constroem com exatidão a trajetória profissional desses arquitetos.

Percebeu-se como o estilo de projetar as obras de arte de cada um é destacado nas

linhas do texto, de forma com que os arquitetos são transformados em personagens

de uma história.

Portanto, é possível constatar também que a experiência profissional se

articula com o texto de natureza literária. A veracidade do jornalismo, juntamente

com a trajetória dos cinco arquitetos se intercala com exatidão com a criatividade e a

liberdade da literatura.

Assim, pode-se deduzir as seguintes características nos textos: descrição

literária, valorização humanitária, arquitetura do texto, personagens do jornalismo e

sedução da linguagem jornalística. Todas as inferências ajudaram a construir

reportagens com a mesma qualidade que os cinco arquitetos constroem suas obras.

Arte no papel e no concreto.

A sensibilidade dos jornalistas em reportarem cheiros, falas, atitudes e,

principalmente emoções, é um traço característico do jornalismo literário e

humanista, fazendo com que cada perfil também se transformasse em exemplo de

uma boa reportagem. Essa é apenas uma das diversas características que

contribuiu para que a questão norteadora fosse satisfatoriamente comprovada.

Podemos afirmar que as reportagens se aproximam do jornalismo literário, visto que

o gênero destaca um estilo de escrita criativo e detalhado. Portanto, os objetivos

também foram alcançados. Por meio das reportagens, foi possível analisar os

elementos do jornalismo literário e também valorizar uma publicação elaborada na

Serra Gaúcha, mais precisamente em Flores da Cunha.

Além disso, as diferenças e semelhanças entre jornalismo e literatura foram

devidamente estudadas e as estratégias de composição e da linguagem utilizadas

em um perfil jornalístico também foram identificadas, de forma com que o gênero do

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jornalismo literário teve destaque. Dessa forma, os objetivos específicos também

ficaram evidentes.

Assim, pode-se observar que os perfis foram elaborados de acordo com os

princípios de Olinto (2003), ao reconstruir interiores e exteriores de cada cenário,

misturando a arte da arquitetura e da literatura.

E isso também é possível perceber com este trabalho. Espera-se que este

estudo sirva de exemplo de como a literatura deve ser o ingrediente principal para o

bom jornalismo. É preciso descobrir novas alternativas para não deixar o jornalismo

diário cair na rotina e no tradicional. E a literatura, juntamente com a arte da palavra,

está entre elas.

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ROCHA, Paulo Mendes da. Anual Design. Disponível em:< http://www.anualdesign.com.br/saopaulo/profissionais/paulo-mendes-da-rocha/>. Acesso em: 30 maio 2016.

SERAPIÃO. Fernando. Prêmio a Paulo Mendes da Rocha coroa carreira sempre inovadora. Folha de São Paulo. São Paulo, 6 maio de 2016. Disponível em:< http://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2016/05/1768547-premio-italiano-pouco-mudara-a-rotina-de-paulo-mendes-da-rocha.shtml>. Acesso em: 30 maio 2016.

SCALZO, Marília. Jornalismo de revista. São Paulo: Contexto, 2004.

SILVA. Vânia. Como o acaso levou Ruy Ohtake a se unir à comunidade da maior favela de São Paulo e realizar projeto voluntário por moradia digna. Au Pini.

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Setembro, 2004. Disponível em:< http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/126/habitacao-23194-1.aspx>. Acesso em: 25 maio 2016.

WOLFE, Tom. Radical chique e o novo jornalismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

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ANEXOS

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ANEXO A - PERFIL RUY OTHAKE

Fonte: Florense. Ed.nº 1, ano 2004.

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ANEXO B - PERFIL OSCAR NIEMAYER

Fonte: Florense. Ed.nº 3, ano 2004.

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ANEXO C - PERFIL PAULO MENDES DA ROCHA

Fonte: Florense. Ed. nº.18, ano 2008.

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ANEXO D - PERFIL DANIEL LIBESKIND

Fonte: Florense. Ed. nº 22, ano 2009

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ANEXO E - PERFIL ZAHA HADID

Fonte: Florense. Ed. nº. 41, ano 2014.