celso ribeiro bastos - curso de direito constitucional - 1999 - 20a ed

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CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL Celso Ribeiro Bastos Advogado. Professor de Ps-GraduaO de Direito Constitucional e de Direito das Relaes Econmicas InternacionaiS da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Diretor-Geral do Instituto Brasileiro de Direito Constitucional - IBDC. Ex-Procurador do Estado de So Paulo. 1. Direito constitucional NOTA 2.EDIO Aps a Constituio de 1988, evidentemente, tivemos de atualizar a obra de acordo com a nova Carta. Isto, contudo, foi feito sem que a Constituio tivesse sido comprovada na realidade e, em conseqncia, sofrido as interpretaes doutrinrias e jurisprudenciais que vm merecendo dos tribunais e dos julgadores. Hoje, sentimo-nos em condies de levar a efeito sua reestruturao com dois objetivos. Primeiro, trazer para o Texto Constitucional no apenas a nossa opinio, mas tambm a da jurisprudncia, assim como a de outros juristas que tratam proficientemente do tema. Segundo, dar um tratamento a certos captulos da Constituio de 1988, que mais tm que ver com a lei ordinria do que propriamente com a Magna Carta. No entanto, a prtica tem demonstrado que essas matrias, s pelo fato de estarem reguladas na Constituio, repercutem intensamente na vida do nosso direito. No h quase demanda judicial que possa ser travada sem que esteja presente alguma faceta da prpria Constituio. Conhec-la, pois, no exclusivo de alguns especialistas, mas obra que se impe a todos que lidam com o direito. Da a razo de ser do alargamento dispensado a diversos captulos, o que acabou por encorpar de forma sensvel o texto original. Esperamos, assim, ter melhorado nosso modesto curso. De qualquer forma, quem o dir o leitor, com cuja opinio gostaramos enormemente de contar para continuarmos aperfeioando o trabalho no futuro. Agradecemos a Dra. Patrcia de Castro e Colher Coeli pelas pesquisas que levou a efeito com grande afinco. NDICE GERAL PARTE I TEORIA DO ESTADO E DA CONSTITUIO TTULO I NOES DE TEORIA DO ESTADO CAPTULO I CONCEITO E NATUREZA DO ESTADO 1. Sociabilidade do homem 1.1. Fatores que levam o homem a socializar-se 2. O poder e a sociedade 3. Estado-governo e Estado-sociedade 4. Pressupostos ou elementos integradores do Estado CAPTULO II O PODER 1. Poder social 2. Poder poltico 3. Direito e poltica 4. O Estado se subordina inteiramente ao direito? 5. Estado e soberania CAPTULO III O PODER CONSTITUINTE 1. Legitimidade e legalidade 2. O pensamento poltico-jurdico de Sieys 3. Natureza e titularidade do poder constituinte 4. Espcies de poder constituinte: originrio e derivado

5. Exerccio do poder constituinte 6. Limitaes ao poder de reforma constitucional 6.1. Clusulas ptreas 7. Modernas tendncias TTULO II TEORIA DA CONSTITUIO CAPTULO I CONSTITUIO 1. Conceito 2. Constituio em sentido muito amplo 3. Constituio em sentido material 4. Constituio em sentido substancial 5. Constituio em sentido formal 5.1. Posio hierrquica superior das normas constitucionais em relao s infraconstitucionais 6. Existncia, ou no, de Constituio em todos os Estados, conforme a acepo, substancial ou formal, que se atribua ao vocbulo 7. Critrio mais relevante para o direito na conceituao de Constituio: o formal 8. Constituies escritas e costumeiras 9. Constituies rgidas e flexveis 10. Direito Constitucional CAPTULO II CONSTITUIO COMO UM SISTEMA DE PRINCPIOS E NORMAS 1. O papel dos princpios 2. Espcies de princpios 3. Espcies de normas CAPTULO III INTERPRETAO. INTEGRAO. APLICAO 1. Interpretao 1.1. Interpretao conforme a Constituio 1.2. Singularidade das normas constitucionais do ngulo da sua interpretao 2. Integrao 2.1. Lacunas no direito constitucional 3. Interpretao e integrao: realidades lgicas distintas 4. Aplicao 4.1. Aplicao das normas constitucionais no tempo 4.1.1. A nova Constituio e o direito constitucional anterior 4.1.2. Direito constitucional novo e direito ordinrio anterior 4.2. Aplicao das normas constitucionais no espao CAPTULO IV CONSTITUIES ORGANICAS E IDEOLGICAS 1. Normas programticas 1.1. A crise das normas programaticas 2. Graus de determinabilidade das normas constitucionais 3. O cotejo entre as normas-fins e os princpios 4. Relao da norma programtica com os seus destinatrios 5. At que ponto lcito a uma Constituio ser mais diretiva e menos organizacional? TTULO III HISTRICO DAS CONSTITUIES BRASILEIRAS CAPTULO I CONSTITUIO DE 1824 1. Antecedentes histricos 2. Ideologia da Constituio Imperial 3. Aspectos principais da Constituio de 1824 3.1. Diviso dos poderes polticos 3.2. Semi-rigidez da Constituio Imperial

CAPTULO II CONSTITUIO DE 1891 1. Fatores determinantes 2. O Decreto n. 1 e suas principais mudanas CAPTULO III CONSTITUIO DE 1934 1. Pontos principais 2. Constituio democrtica e social CAPTULO IV CONSTITUIO DE 1937 1. O golpe de 37 2. Inaplicabilidade da Constituio de 1937 CAPTULO V CONSTITUIO DE 1946 1. Principais influncias 2. Aspectos fundamentais CAPTULO VI CONSTITUIO DE 1967 1. A Revoluo de 1964 2. Os governos na vigncia da Constituio de 1967 2.1. O governo Mdici 2.2. O governo Geisel 2.3. O governo Figueiredo 2.4. O governo Sarney CAPTULO VII CONSTITUIO DE 1988 1. Instalao e funcionamento da Assemblia Nacional Constituinte 2. Histrico da Constituinte PARTE II DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO TTULO I DOS PRINCPIOS FUNDAMENTAIS CAPTULO NICO PRINCPIOS E OBJETIVOS DO BRASIL, NA ORDEM INTERNA E NA INTERNACIONAL 1. Princpios constitucionais 1.1. Repblica 1.2. Federao 1.2.1. Histrico 1.2.2. Princpio federativo 1.2.3. Caractersticas da federao 1.3. Estado Democrtico de Direito 2. Fundamentos da Repblica Federativa do Brasil 3. Tripartio dos poderes 4. Objetivos fundamentais 5. O Brasil na ordem internacional 5.1. O Mercosul e a nova ordem mundial TTULO II DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS CAPTULO I DOS DIREITOS INDIVIDUAIS CLSSICOS AOS MODERNOS DIREITOS SOCIAIS 1. Liberdades pblicas 2. A Declarao Francesa 3. A Declarao Americana 4. Novas perspectivas dos direitos individuais 5. Evoluo dos direitos individuais 6. Os direitos individuais sob a gide da Constituio de 1967 7. Situao atual dos direitos individuais 8. A Declarao Universal dos Direitos do Homem 8.1. Contedo da Declarao

8.2. Eficcia da Declarao CAPTULO II ALGUNS DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS E COLETIVOS 1. Destinatrio dos direitos individuais 2. Princpio da isonomia 2.1. Igualdade substancial 2.2. Igualdade formal 2.3.Contedo jurdico da isonomia 2.4. A nova redao do princpio da isonomia 2.5. O princpio da igualdade entre os particulares 3. Princpio da legalidade 4. Liberdade de pensamento 5. Liberdade religiosa 5.1. Liberdade de conscincia e de crena 5.2. Liberdade de culto 5.3. Liberdade de organizao religiosa 6. Direito intimidade, vida privada e honra 6.1. Dano moral 7. Inviolabilidade do domiclio 8. Inviolabilidade da correspondencia 9. Liberdade de profisso 10. Direito de locomoo 11. Direito de reunio e associao 11.1. Liberdade de associao 12. Direito propriedade 12.1. Funo social 12.2. Desapropriao 13. Acesso amplo ao Judicirio 14. Direito adquirido. Ato jurdico perfeito. Coisa julgada 14.1. Limites da retroao da lei na Constituio 14.2. Direito adquirido 14.2.1. Verificao da ocorrncia de direito adquirido 14.2.2. Sntese conclusiva 14.3. Ato jurdico perfeito 14.4. Coisa julgada 15. Direito ao jri 16. Direito no-extradio 16.1. Brasileiro 16.2. Estrangeiro 17. Direito ao devido processo legal 18. Direito ao contraditrio e ampla defesa 18.1. A prova obtida por meio ilcito 19. Priso em flagrante 20. Garantias constitucionais 20.1. Habeas corpus 20.1.1. Histrico 20.1.2. Habeas corpus no nosso pas 20.1.3. Habeas corpus preventivo e suspensivo 20.1.4. Teoria brasileira do habeas corpus 20.1.5. Legitimidade ativa 20.1.6. Sujeio passiva 20.1.7. Objeto 20.2. Mandado de segurana 20.2.1. Introduo 20.2.2. Surgimento da medida 20.2.3. Direito lquido e certo 20.2.4. Medida liminar 20.2.5. Mandado de segurana coletivo 20.3. Mandado de injuno 20.3.1. Legitimidade ativa 20.3.2. Objeto do mandado de injuno

20.3.3. Competncia para julgar o mandado de injuno 20.3.4. Distino entre mandado de injuno e a inconstitucionalidade por omisso 20.4. Ao popular 20.4.1. Conceito 20.4.2. Requisitos 20.4.3. Lesividade, ilegalidade e imoralidade 20.4.4. Iseno de nus 20.5. Habeas data 20.6. Ao civil pblica 20.6.1. Interesses coletivos e difusos 20.6.2. Aspectos fundamentais da ao civil pblica 20.6.2.1. Legitimao ministerial CAPITULO III DOS DIREITOS SOCIAIS 1. Noes gerais 2. Trabalhador 2.1. Trabalhador temporrio 2.2. Trabalhador rural 2.3. Trabalhador domstico 3. Direitos dos trabalhadores 3.1. Despedida arbitrria ou sem justa causa 3.2. Salrio mnimo 3.3. Participao nos lucros 3.4. Liberdade sindical 3.5. Greve 3.6. Outros direitos CAPTULO IV DA NACIONALIDADE 1. Nacionais e estrangeiros 1.1. Excees 2. Critrios para atribuio da nacionalidade: jus sanguinis e jus soli 2.1. Excees 3. Perda da nacionalidade 4. Reaquisio da nacionalidade CAPTULO V DOS DIREITOS POLTICOS 1. Caractersticas gerais 2. Distino entre nacional e cidado 3. Democracia semidireta 4. Direitos polticos ativos e passivos 5. Suspenso e perda dos direitos polticos CAPTULO VI DOS PARTIDOS POLTICOS 1. Conceito 2. Partidos polticos no Brasil 3. Fidelidade partidria TTULO III DA ORGANIZAO DO ESTADO CAPTULO I A FEDERAO 1. A importncia do princpio federativo 2. Funcionamento da federao 3. Autonomia e soberania 4. Federao e democracia 5. Vederao como processo 6. A estrutura do Estado federal 7. Traos comuns a toda federao 8. Federao americana 9. A teoria dos poderes implcitos 10. A federao no direito positivo brasileiro

11. A federao na Constituio de 1988 12. Repartio de competncias constitucionais CAPTULO II DA UNIO 1. Natureza jurdica da Unio 2. Competncias da Unio 2.1. Uma viso crtica de suas competncias 3. Bens da Unio CAPTULO III DOS ESTADOS FEDERADOS 1. Natureza jurdica dos Estados-Membros 2. Competncias estaduais 3. Os Estados federados perante a ordem externa 4. Autonomia dos Estados 4.1. Poder constituinte estadual 5. Interveno do Estado nos Municpios 6. Os tributos nos Estados 7. Uma viso crtica dos Estados federados CAPTULO IV DOS MUNICPIOS 1. O Municpio na estrutura federativa brasileira 2. Conceito 3. Competncia municipal: o critrio de interesse local 3.1. Outras competncias municipais 4. Criao e organizao municipal 5. Organizao poltica 6. Fiscalizao financeira e oramentria dos Municpios CAPTULO V DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITRIOS FEDERAIS 1. Natureza jurdica do Distrito Federal 2. Governo do Distrito Federal 3. Atribuies legislativas do Distrito Federal 4. Poder Judicirio do Distrito Federal 5. Histrico dos Territrios 6. Situao atual dos Territrios CAPTULO VI DA INTERVENO FEDERAL 1. Noes gerais 2. Efetivao da interveno 3. Requisitos da interveno 4. Efeitos da interveno CAPTULO VII DA ADMINISTRAO PBLICA 1. Administrao Pblica 1.1. Administrao direta e indireta 1.1.1. Autarquias 1.1.2. Sociedades de economia mista e empresas pblicas 1.1.3. Fundaes 1.2. Princpios constitucionais da administrao pblica 1.2.1. Princpio da legalidade 1.2.2. Princpio da impessoalidade 1.2.3. Princpio da moralidade 1.2.4. Princpio da publicidade 1.2.5. Princpio da eficincia 2. Agentes pblicos 3. Regies CAPTULO VIII RESPONSABILIDADE PATRIMONIAL DO ESTADO 1. Conceito 2. Surgimento da responsabilidade do Estado 3. Teoria do risco

4. Fundamentos da responsabilidade do Estado TTULO IV DA ORGANIZAO DOS PODERES CAPTULO I TRIPARTIO DAS FUNES ESTATAIS: LEGISLATIVA, EXECUTIVA E JUDICIRIA 1. Tripartio de funes e no-tripartio de poderes 2. Funes e fins do Estado 3. As trs funes estatais: legislativa, executiva e judiciria 4. A importncia da teoria de Montesquieu 4.1. Aspectos ideolgicos da teoria da separao de poderes 4.2. Sua aplicao atual 5. Classificao das atividades do Estado 6. A tripartio das funes estatais na Constituio brasileira CAPTULO II DO PODER LEGISLATIVO 1. Estrutura do Poder Legislativo 1.1. Sua estrutura e funcionamento no Brasil 2. Funes legislativas 2.1. Funo fiscalizadora 2.1.1. O Tribunal de Contas 3. Atribuies do Congresso Nacional 3.1. Atribuies da Cmara dos Deputados e do Senado Federal 4. Imunidades e vedaes parlamentares 5. Reunies 6. Comisses 6.1. Comisso Parlamentar Permanente 6.2. Comisso Parlamentar Temporria ou Especial 6.3. Comisso Parlamentar de Inqurito 6.4. Comisso Parlamentar Representativa SEO I ESPCIES NORMATIVAS 1. Emendas Constituio 2. Leis complementares Constituio 3. Lei ordinria 4. Medidas provisrias 4.1. Urgncia e relevancia 4.2. Abrangncia material 4.3. Aprovao e eficcia 4.4. Possibilidade de reedio 4.5. Controle jurisdicional das medidas provisrias 5. Leis delegadas 6. Decretos legislativos 7. Resolues SEO II PROCESSO LEGISLATIVO 1. Fases do processo legislativo 2. Discusso e votao 3. Sano e veto 4. Promulgao 5. Publicao CAPTULO III DO PODER EXECUTIVO 1. Funo do Executivo 1.1. A faculdade regulamentar 1.1.1. Tipos de regulamentos 2. Estrutura do Poder Executivo 2.1. Chefe de Governo e chefe de Estado 2.1.1. Formas de governo: monarquia e repblica 3. O presidencialismo brasileiro: os Ministros de Estado 4. O crime de responsabilidade: o impedimento do Presidente da Rep-

blica 5. Eleio do Presidente da Repblica 6. Conselho da Repblica e Conselho de Defesa Nacional CAPTULO IV DO PODER JUDICIRIO 1. Funo jurisdicional 1.1. Funes atpicas 2. Estrutura do Poder Judicirio 3. Garantias constitucionais da magistratura 4. Vedaes aos magistrados 5. Garantias do Poder Judicirio 6. Supremo Tribunal Federal 6.1. Composio 6.2. Competncia 7. Superior Tribunal de Justia 7.1. Composio 7.2. Competncia SEO I DO CONTROLE DA CONSTITUCIONALIDADE DAS LEIS 1. Introduo 1.1. Fundamento e hierarquia das normas jurdicas 1.2. Inexistncia da lei inconstitucional 1.3. Competncia para aferir a validade constitucional da norma de direito 1.4. A especial validade assumida pelas leis inconstitucionais e o processo especial para a sua revogao 1.5. Concluses 2. Pressupostos do controle da constitucionalidade das leis 2.1. Adequao das leis Constituio e distino entre leis constitucionais e leis ordinrias 2.2. Processo especial de elaborao das leis constitucionais: rigidez constitucional 2.3. rgo encarregado do controle da constitucionalidade 2.4. Impossibilidade do exerccio do controle da constitucionalidade pelo Poder Legislativo 3. Sistemas de controle da constitucionalidade das leis 3.1. Limites bsicos inerentes a qualquer sistema eficaz de controle da elaborao legislativa 3.2. Sistema de controle poltico 3.3. Sistema de controle judicial 3.4. Vias de defesa e de ao 4. Evoluo do controle da constitucionalidade das leis no Brasil 4.1. Constituio de 1824: inexistncia do controle 4.2. Constituio de 1891: introduo do controle 4.3. Constituio de 1934: aperfeioamento do sistema 4.4. Constituio de 1937: retrocesso 4.5. Constituio de 1946 4.6. Emenda Constitucional n. 16, de 1965: plenitude do sistema 4.7. Constituio de 1967 e Emenda Constitucional n. 1, de 1969 5. O controle da constitucionalidade na nova ordem jurdica 6. Diferentes tipos de inconstitucionalidade 7. O controle no direito positivo 7.1. Inconstitucionalidade por ao 7.2. Inconstitucionalidade por omisso 7.3. Legitimidade para propor ao direta de inconstitucionalidade 7.4. Papel do Procurador-Geral da Repblica e do Advogado-Geral da

8. 9.

CAPTULO V DAS FUNES ESSENCIAIS JUSTIA 1. Ministrio Pblico 2. Advocacia Pblica 3. Advocacia 3.1. Histrico 3.2. O papel do advogado na atual Constituio 4. Defensoria Pblica TTULO V DA DEFESA DO ESTADO E DAS INSTITUIES DEMOCRTICAS CAPTULO NICO DO ESTADO DE DEFESA E DO ESTADO DE STIO 1. Estado de defesa 2. Estado de stio 3. Foras Armadas 4. Segurana pblica TTULO VI DA TRIBUTAO E DO ORAMENTO CAPTULO I DO SISTEMA TRIBUTRIO NACIONAL 1. Noo de tributo 1.1. Definio de tributo no Cdigo Tributrio Nacional 2. Modalidades de tributos 2.1. Impostos 2.2. Taxas 2.2.1. Espcies de taxas 2.3. Contribuies de melhoria 2.3.1. Distino entre contribuio de melhoria e taxa 2.4. Outras contribuies 2.5. Emprstimos compulsrios 3. Princpios Constitucionais Tributrios 3.1. Princpio da igualdade 3.2. Princpio da estrita legalidade 3.3. Princpio da anterioridade 3.4. Princpio da irretroatividade 3.5. Princpio da uniformidade geogrfica 3.6. Princpio da no-cumulatividade 4. Limitaes constitucionais ao poder de tributar 5. Impostos da Unio 6. Impostos dos Estados e do Distrito Federal 7. Impostos dos Municpios 8. Repartio das receitas tributrias CAPTULO II DAS FINANAS PBLICAS E DOS ORAMENTOS 1. Atividade financeira do Estado 2. Oramento 3. Despesas pblicas 4. Receitas pblicas 5. Crdito pblico 6. Dvida pblica 6.1. Regime constitucional da dvida pblica brasileira 7. Processo legislativo 8. Restries Administrao TTULO VII DA ORDEM ECONMICA E FINANCEIRA

Unio 7.5. Via de exceo ou defesa Ao declaratria de constitucionalidade 8.1. Efeito vinculante Controle da constitucionalidade em nvel estadual 9.1. Legitimao para agir

CAPTULO I DOS PRINCPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONMICA 1. O Estado enquanto agente normativo 2. O Estado planejador 3. Interveno do Estado no domnio econmico 3.1. Evoluo constitucional 3.2. Limites atuao do Estado na Magna Carta 4. Livre iniciativa 4.1. Excees 4.1.1. O monoplio do petrleo 5. Livre concorrncia 5.1. O abuso do poder econmico 5.1.1. A legislao antitruste nos EUA 5.1.2. A legislao antitruste no Brasil CAPTULO II DA POLTICA URBANA 1. Poltica urbana 1.1. Plano diretor 1.2. Usucapio urbano constitucional CAPTULO III DA POLTICA AGRCOLA E FUNDIRIA E DA REFORMA AGRRIA 1. Poltica agrcola e fundiria e reforma agrria 1.1. Desapropriao para fins de reforma agrria 1.1.1. Indenizao prvia e justa 1.1.2. Ttulos da dvida agrria 1.2. Usucapio rural constitucional CAPTULO IV DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL 1. O Sistema Financeiro Nacional TTULO VIII DA ORDEM SOCIAL CAPTULO I DA SEGURIDADE SOCIAL 1. Noes gerais 2. Sade 3. Previdncia Social 4. Assistncia social CAPTULO II DA EDUCAO, DA CULTURA E DO DESPORTO 1. Educao 2. Cultura 3. Desporto CAPTULO III DA CINCIA E TECNOLOGIA 1. Cincia e tecnologia CAPTULO IV DA COMUNICAO SOCIAL 1. Comunicao social CAPTULO V DO MEIO AMBIENTE 1. Noo de meio ambiente 2. Tratamento constitucional dado ao meio ambiente 3. Obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradao ambiental CAPTULO VI DA FAMLIA, DA CRIANA, DO ADOLESCENTE E DO IDOSO 1. Famlia 2. Criana e adolescente 3. Idoso

CAPTULO VII DOS INDIOS 1. ndios 2. Terras indgenas 2.1. Aspectos histricos e jurdicos das terras indgenas no Brasil 2.2. As terras indgenas luz da Constituio Federal de 1988 3. Sntese conclusiva PARTE I TEORIA DO ESTADO E DA CONSTITUIO TTULO I NOES DE TEORIA DO ESTADO CAPTULO I CONCEITO E NATUREZA DO ESTADO SUMRIO: 1 Sociabilidade do homem. 1.1. Fatores que levam o homem a socializar-se. 2. O poder e a sociedade. 3. Estado-governo e Estado-sociedade. 4. Pressupostos ou elementos integradores do Estado? 1. SOCIABILIDADE DO HOMEM um trusmo afirmar-se que o homem um animal social. Com efeito, tem sido esta sua situao em todos os tempos, a de viver em sociedade. Nada obstante isto, os autores se esforam em procurar explicaes para a formao desta, para o que teria levado o homem a abandonar uma situao de vida individual a fim de entrar numa forma qualquer de organizao social. Quer-nos parecer que nunca ser possvel identificar uma razo especfica para a formao da sociedade. Ela se confunde com o prprio evoluir do homem, perdendo-se, portanto, nas origens da prpria espcie humana. No entanto, h um outro aspecto a salientar: na medida em que foram surgindo essas comunidades, por menores que fossem, elas davam lugar - necessariamente ao surgimento de desafios consistentes em resolver os problemas da prpria comunidade. possvel, reconhecemos, que num primeiro momento esses problemas da sobrevivncia coletiva tenham primado sobre os da prpria individualidade. Mas inegvel que, tornando-se os homens responsveis no s pela sobrevivncia pessoal mas tambm pela resoluo dos problemas que permitissem a manuteno e a sobrevivncia do grupo social, deu-se lugar a a uma funo voltada aos interesses da coletividade, resoluo dos problemas que ultrapassam os indivduos, os problemas transpessoais, os problemas coletivos enfim. Trata-se do aparecimento do poltico. Com o surgimento do problema do poder emerge tambm o daqueles que vo desempenhar a funo poltica. Por mais simples que fossem ainda as comunidades primitivas, e por mais que se conferisse primazia a formas coletivas de resoluo desses problemas, o certo que a histria e a antropologia no do conta da existncia de sociedade em que no houvesse a diferena entre os homens no que diz respeito ao desempenho dessa funo poltica. O que parece mais certo que desde cedo se fizeram valer as diferenas pessoais, de aptido, de vocao, de disposio para o exerccio do mando, de tal sorte que alguns sempre se sobressaram, ou, optativamente, exerceram alguma forma de liderana na conduo dos fenmenos sociais. certo que nessa poca se poderia estar muito longe da institucionalizao do poder tal como conhecido no mundo moderno; o processo do exerccio do poder afigurava-se entremeado com outros aspectos da vida social, por exemplo, o aspecto guerreiro e o aspecto religioso. No se havia ainda ganho a autonomia do poltico. Mas o fato de ele no ter nessa poca se destacado plenamente de outras funes no quer dizer que j no existisse

uma funo poltica. 1.1. Fatores que Levam o Homem a Socializar-se A discusso que ainda tem lugar em boa parte da doutrina, acerca de quais fatores teriam levado o homem a viver em sociedade, tem de ser diferenvel daquela que se preocupa com os fatores que teriam determinado a apario do Estado. Em outras palavras, um Estado no seno uma modalidade muito recente na forma de a humanidade organizar-se politicamente. Antes do Estado o homem passou por estruturas bastante diferentes de organizao do poder poltico. Mas, j aqui, no h que se falar em formao da sociedade, uma vez que esta j estava formada e j trazia dentro de si o prprio fenmeno poltico. interessante notar, contudo, que a idia do poltico se mantm relativamente imutvel atravs dos tempos. O poltico como prprio do coletivo, do geral, do comum a todos, presente at os nossos dias. 1. Paolo Biscaretti di Ruffia, Direito constitucional, p. 33 e 34: "Todos ns temos uma noo emprica do ente social Estado, no sentido de que o vocbulo suscita, sem mais, na memria, este ou aquele agregado estatal do passado ou do presente. Por outro lado, mister aprofundar um pouco tal conceito, to genericamente possudo, e, antes de tudo, parece ser necessario precisar ainda que seja necessrio precisar - ainda que seja apenas em suas linhas gerais - qual seria a noo satisfatria que dele oferece a cincia juspublicista contempornea. Resulta, na prtica, como axioma de grande aceitao a constatao de que o Estado: " um ente social que se forma quando, em um territrio determinado, um povo se organiza juridicamente, submetendo-se autoridade de um governo". Disto se deduz que o Estado, ao apresentar-se como "um ente social com uma ordenao estvel e permanente , pode, concomitantemente, ser considerado - segundo a teoria institucional do direito, mais acima resumida sinteticamente em seus enunciados principais - uma instituio ou uma ordenao jurdica (ainda mais: a mais aperfeioada e eficiente dentre todas do mundo contemporneo), que abraa e absorve, em sua organizao e estrutura, todos os elementos que o integram, adquirindo, em relao a eles, vida prpria e formando um corpo independente, que no perde sua identidade, pelas sucessivas e eventuais variaes de seus mesmos elementos". Desta existncia de uma atividade poltica surge a distino que se pode fazer entre governantes e governados, tambm persistente ao longo da vida humana. Na medida em que alguns assumem o controle de um poder suficiente para resolver as questes que afetam a todos, assumem uma posio diferenciada dentro da sociedade, uma posio de mando que implica, por parte de seus destinatrios, uma posio de obedincia. Mister notar-se, por seu turno, que durante longos perodos histricos o poder no esteve necessariamente concentrado nas mos de uma nica pessoa. Perfeitamente aceitvel - para o grau de complexidade daquela sociedade - que determinadas questes fossem resolvidas definitivamente por pessoas diversas das que resolviam problemas de outra natureza. A prpria sociedade medieval seria um exemplo avanado desse tipo de pulverizao do poder por toda uma sorte de pessoas, instituies, ordens, cidades, profisses etc. Fcil notar-se, porm, que essa disperso do poder incompatvel com um exerccio mais amplo do Poder Pblico. Na medida em que comeam a se alargar as esferas de atuao do poder coletivo, ou, em outras palavras, na medida em que a prpria complexidade da vida social comea a demandar uma maior quantidade de decises por parte dos poderes existentes, torna-se necessria a sua concentrao, para que, em

determinado ponto, uma nica autoridade exera o poder. De fato, a conformao efetiva da sociedade em questes importantes s se pode dar uma vez admitida a origem ou a sede do poder num nico rgo; do contrrio, haveria inevitavelmente o conflito de comandos, o que tornaria, mais cedo ou mais tarde, impossveis as medidas de maior profundidade. O Estado - entendido portanto como uma forma especfica da sociedade poltica - o resultado de uma longa evoluo na maneira de organizao do poder. Ele surge com as transformaes por que passa a sociedade poltica por volta do sculo XVI. Nessa altura, uma srie de fatores, que vinham amadurecendo ao longo dos ltimos sculos do perodo medieval, torna possvel - e mesmo necessria - a concentrao do poder numa nica pessoa. esta caracterstica a principal nota formadora do Estado moderno. O poder torna-se mais abrangente. Atividades que outrora comportavam um exerccio difuso pela sociedade so concentradas nas mos do poder monrquico, que assim passa a ser aquele que resolve em ltima instncia os problemas atinentes aos rumos e aos fins a serem impressos no prprio Estado. 2. Maquiavel e Ernst Cassirer, Teoria geral do Estado, p. 23 e 24: "A despeito de existirem todos os antecedentes arrolados, que se empenham em descrever certas caractersticas conducentes a arquitetar, para cada poca histrica, atravs dos sculos, uma idia de Estado, o fato que, somente no sculo XVI, especificamente no chamado perodo do Renascimento, que surge, em sua verdadeira acepo, o que conhecemos atualmente por Estado. E foi precisamente Maquiavel, consoante patenteamos na Introduo acima, que, de modo pioneiro, conferiu palavra Estado seu significado autntico, ao cunh-la e imprimir-lhe essncia e contedo, embora sem apresentar propriamente uma definio. Diz Maquiavel, nas primeiras linhas de O prncipe: "Todos os Estados, todos os governos que tiveram e tm autoridade sobre os homens, foram e so Repblicas ou Principados"". 2. O PODER E A SOCIEDADE O surgimento do poder, no s com a sua caracterstica de unidade mas tambm de institucionalizao, no faz obviamente desaparecer a sociedade. Esta continua a desempenhar e cumprir uma srie de funes que o Estado, mesmo o mais autoritrio, jamais assumiu. Tem variado, de fato, na histria, a quantidade de poderes que o Estado acha por bem assumir. A sociedade, de outro lado, recobrou a sua importncia, sobretudo debaixo do liberalismo, conseguindo reduzir o Estado a suas expresses mnimas, tornando-o competente para o desempenho das atividades absolutamente indispensveis manuteno da ordem e para propiciar as condies para que a prpria sociedade pudesse ento atingir os demais fins. Cuida-se aqui de uma luta que dura at os nossos dias. Existem aqueles que vem no Estado to-somente um ente que deve assegurar condies mnimas para que a sociedade possa - por si mesma atingir os seus fins culturais, econmicos, sociais etc. H aquelas outras correntes que preferem fazer absorver, pelo prprio Estado, o desempenho dessas atividades. De qualquer sorte, a diferena perdura entre o que se chama de Estado-sociedade e o Estado-poder. 3. ESTADO-GOVERNO E ESTADO-SOCIEDADE H, portanto, um Estado cuja demarcao coincide com o aparato burocrtico formado pelos polticos e pelos profissionais que compem o seu quadro organizacional. Mas sabemos que o Estado no se pode resumir ao que na verdade seria mais adequado chamar-se governo. Da porque ser corrente na doutrina a expresso Estado-sociedade, para ento abarcar o Estado na sua

totalidade, compreendendo, portanto, no apenas a organizao governamental, mas tambm a prpria comunidade, que no so entes estanques. bvio que h uma constante interao entre o governo, que exerce a sua influncia conformadora sobre a sociedade, e, de outra parte, a sociedade que torna possvel a existncia desse governo, e, em grande medida, determina-lhe o sentido, o alcance e as diretrizes. 3. Jorge Miranda, Manual de direito constitucional, t. 3, p. 20, 21 e 24: "Falar em Estado equivale, portanto, a falar em comunidade e em poder organizado ou, doutro prisma, em organizao da comunidade e do poder, equivale a falar em comunidade ao servio da qual est o poder, em poder conformador da comunidade e em organizao que imprime carter e garantias de perdurabilidade a uma e outro. As duas perspectivas sobre o Estado que a experincia (ou a intuio) revela - o Estado-sociedade (ou Estado-coletividade) e o Estado-poder (ou Estado-governo ou Estado-aparelho) no so seno dois aspectos de uma mesma realidade; assim como a institucionalizao, sinal mais marcante do Estado no cotejo das sociedades polticas anteriores de poder difuso ou de poder personalizado, corresponde fundamentalmente a organizao. O Estado institucionalizao do poder, mas esta no significa apenas existncia de rgos, ou seja, de instituies com faculdades de formao da vontade; significa tambm organizao da comunidade, predisposio para os seus membros serem destinatrios dos comandos vindos dos rgos do poder. (...) O Estado comunidade e poder juridicamente organizados, pois s o Direito permite passar, na comunidade, da simples coexistncia coeso convivencional e, no poder, do facto instituio. E nenhum Estado pode deixar de existir sob o Direito, fonte de segurana e de justia, e no sob a fora ou a violncia. Mas o Estado no se esgota no Direito. , sim, objecto do Direito, e apenas enquanto estruturalmente diverso do Direito pode ser a ele submetido, por ele avaliado e por ele tornado legtimo. I - Quando se contrapem Estado-comunidade e Estado-poder (ou Estadoaparelho), est-se a raciocinar no interior do fenmeno estadual, com o seu enlace necessrio e dinmico entre comunidade e poder. Quando - contudo - noutra distino no menos clebre e importante - se contrapem Estado e sociedade, j o mbito se exibe diferente e mais largo. Convm evocar esta problemtica quer no plano histrico quer no plano conceitual. II - Durante a Idade Mdia e na transio estamental, o poltico difunde-se e est presente na sociedade e na sua riqussima teia de instituies - as ordens religiosas, as universidades, as obras assistenciais, as corporaes de mesteres, as comunas ou os conselhos etc. Ou antes: na sociedade como expresso integrante de todas as instituies (incluindo a instituio real) que reside o poltico. Pelo contrrio, com o absolutismo, o Estado identifica-se com o poder, com a soberania, com o Rei, e a sociedade - seja naquilo que vem de longe, seja naquilo que traz de

novo - aparece a margem do poltico e sem projeco sobre o poder. Vem a ser apenas na poca liberal que a sociedade volta a afirmar-se, se bem que em termos negativos, abrangendo tudo quanto se pretende que fique subtrado ao do poder. Assim como vem a ser com as concepes contratualistas ento dominantes, primeiro, e, depois, com a passagem democracia, que se toma ou se readquire conscincia da face comunitria do Estado. E, mais tarde, certos regimes polticos afastam-se tanto da vontade e dos interesses dos cidados que o Estado-poder, no limite, se lhes entremostra completamente alheio e exterior. O Estado liberal tem em vista uma sociedade livre da gesto ou direo do poder. O Estado social intervm nela para a transformar. Num caso ou noutro, a sociedade carrega-se de intenes polticas. Num caso ou noutro, a sociedade corresponde ao Estado-comunidade, mas no tem de se lhe assimilar ou de com ele coincidir completamente. III - Se a sociedade civil suporta o Estado-comunidade enquanto conjunto humano, no se confunde com este de um prisma jurdico e institucional, pois guarda sempre um grau maior ou menor de autonomia diante do poder - ela a comunidade desprendida, para efeito de anlise, do poder. No significa isto que no haja pontes ou veculos de passagem, que a sociedade seja indiferente politicamente, sobretudo hoje, ou que ela possa captar-se sem o influxo do poder. Apenas enunciamos a possibilidade de uma considerao da sociedade margem da reduo ao fenmeno estadual (ou poltico). Por outro lado, o Estado-comunidade apresenta-se como uma unidade em razo do poder e da organizao, como uma s sociedade poltica. J a sociedade, a sociedade civil, se apresenta na pluralidade de instituies, estruturas, grupos de natureza vria (cultural, religiosa, socioprofissional, econmica etc.). E esses grupos possuem vocaes ou interesses igualmente diversos, sejam complementares ou antagnicos, a inserir num contexto geral de interdependncia, seno de solidariedade - o que, desta ou daquela forma, prevaleam estes ou aqueles interesses, vem a ser proporcionado pela existncia do Estado". Paolo Barile preleciona: "O primeiro e fundamental problema que se pe ao lado do nascimento de um Estado Moderno (esse no se pe de fato no Estado absoluto se no em modo aproximativo) aquele da correspondncia mais exata possvel entre pas e governo, isto , entre sociedade e organizao, sem a qual a primeira no pode ser uma ordem estvel. Estado democrtico contemporneo tende sempre mais para uma soluo de desdobramento entre Estado-aparato e Estado-comunidade: entendendo-se por Estado-aparato o complexo organizado que realiza o poder supremo, e por Estado-comunidade o complexo organizativo de sujeitos de quem o Estado reconhece um poder autnomo, enquanto expresso direta do organismo social interno da comunidade. Evita-se de confiar ao primeiro (isto , apesar de superestrutura que grava o ato) todo o encargo tpico do Estado, preferindo distribuir entre rgos e instituies do Estado-comunidade (entre instituio menos burocrtica, mas imediatamente vizinha aos homens que vivem no Estado)

um grande nmero de interesses a tutelar. Tal instituio do Estado-comunidade baseia-se num conceito essencial, aquele de autonomia, no mbito do Estado e com respeito aos princpios fundamentais do mesmo" (Istituzioni di diritto pubblico, 4. ed., Padova, CEDAM, p. 9-10) (trad. do Autor). curioso que, embora o homem viva num Estado a todo momento sofrendo sua influncia, no instante de defini-lo encontre grandes dificuldades. No de fato fcil encontrar-se uma definio que agrade a todos. No nosso Curso de teoria do Estado e cincia poltica tivemos o ensejo de definir o Estado como a "organizao poltica sob a qual vive o homem moderno... resultante de um povo vivendo sobre um territrio delimitado e governado por leis que se fundam num poder no sobrepujado por nenhum outro externamente e supremo internamente" (p. 10). No seria o caso aqui de pretendermos elencar todas as concepes que autores de nomeada avanaram sobre o Estado. Parece interessante e oportuna a discusso travada sobre o papel representado pelos chamados elementos do Estado, dado que, na verdade e sobretudo depois da obra de Jellinek, boa parte dos tericos se contentaram em consider-lo como resultante de trs elementos fundamentais: poder, populao e territrio. 4. Santi Romano, Princpios de direito constitucional geral, p. 59, 60 e 61: "O conceito de Estado um dos mais controvertidos da hodierna cincia publicstica, no porque se compreende entre outros no menos incertos, mas tambm, e principalmente, pela sua complexidade, o que dificulta o conhecimento de todas as suas notas essenciais. Esta dificuldade resulta claramente do desenvolvimento da doutrina que a ele se refere, pois esta teve necessidade de uma lenta e rdua integrao para conseguir constru-lo; deriva ainda da prpria terminologia com que aquele conceito s vezes vem expresso, traduzindo-lhe incompleta ou aproximadamente os vrios aspectos. evidente que os gregos referiam-se ao Estado com a palavra (Plis), que, embora utilizada para indicar regies e pases (vide Leopardi, Zibaldone, 4158), comumente significa cidade e, portanto, como o correspondente nome civitas, empregado pelos latinos para designar o Estado, pode-se referir propriamente a um s tipo de Estado, ou seja, quele do Estadocidade, que era ento o mais comum; entretanto, no lhe colocou em relevo, seno o territorial. Os termos latinos respublica, imperi um, populus, indicavam-lhe o governo e particularmente o elemento da populao. O prprio vocbulo "Estado", antes de assumir o sentido pleno que tem atualmente, teve por muito tempo significado restrito. Em latim, status sinnimo de "condio", "posio", "ordem" e , portanto, nome genrico que se fazia acompanhar de qualquer outro termo que lhe especificasse a referncia: status reipublicae, status rei romanae e, mais tarde, status romanus. Em italiano, a palavra "Estado" provavelmente foi empregada outrora no sentido de "terra" ou "territrio", sendo acompanhada apenas de algum complemento de especificao (Estado de Florena, de Gnova etc.); somente aos poucos foi sendo utilizada sem este acrscimo. Tal uso se afirmou inicialmente na Itlia, no sculo XVI, pelo menos na linguagem comum, e logo em seguida na Frana, Inglaterra e Alemanha. Na literatura cientfica, a palavra Estado foi pela primeira vez empregada no sentido coincidente ao do moderno por

Maquiavel, embora alguns tenham julgado que ela indicasse o domnio, o governo, o poder do Estado, o que no exato, como se pode inferir daquelas passagens em que se evidencia o elemento territrio de acordo com o costume que Maquiavel no fez mais que seguir, estendendo-o e integrando-o aos demais elementos ou aspectos que tomou em considerao. Tambm presentemente, no lugar da palavra "Estado" tm sido utilizados os seus sinnimos tanto na linguagem comum como na legislativa. Por exemplo, na terminologia francesa recorre-se, freqentemente, ao termo "nao"; nas relaes internacionais fala-se mesmo em "potncia"; muitas vezes retorna-se antiga tendncia de indicar o Estado com a qualidade de seu soberano ou de seu governo "imprio", "reino", "monarquia", "principado", "ducado", "repblica" etc., e sintomtico que algumas destas palavras continuem a ser empregadas mesmo quando, substituda a forma de governo, aquela seja mais oportuna: assim, a Alemanha continua a ser qualificada como "Imprio". De qualquer modo a evocao variedade de terminologia e s obscuras variaes desta, que so tambm alternaes do conceito, serve para alertar contra o perigo de formular um mesmo conceito, referindo-se s significaes parciais que s vezes so atribudas ao vocbulo correspondente. O problema da definio do Estado no apenas um problema de definio verbal, mas sobretudo jurdico. Isto significa que ele, primeiramente, deve ser colocado e examinado em relao s vrias ordenaes positivas, cada uma das quais, em abstrato, poderia assumir um conceito diverso de Estado. Deve-se considerar, porm, que atualmente estas vrias ordenaes estatais ou no, por exemplo, o direito internacional e o direito cannico, acolheram a noo de Estado comum ou geral, ao menos sob um ponto de vista prtico e concreto: as divergncias so, sobretudo, de ordem doutrinria ou terica e, por sorte, raramente repercutem na linguagem legislativa ou oficial, dando lugar a incertezas de interpretao. Elas, mais que ao conceito, se referem ao desenvolvimento de tal conceito ou aos atributos e qualidades do Estado que so necessrios para individualiz-lo, embora sirvam para esclarecer-lhe a natureza". Gonzalez Casanova fornece excelente explicao sobre o papel representado por esses elementos: " corrente comprovar que, para muitos tericos do Estado e, em especial, para muitos estudiosos do mesmo, Estado e comunidade poltica organizada seriam idias sinnimas. Certas formas primitivas de organizao social, dotadas de um rudimental sistema de governo (as polis gregas, o Imprio Romano, a pluralidade de centros de poder da Idade Mdia europia), seriam tipos ou formas histricas de Estado, tal qual o Estado Moderno. Tem-se falado, portanto, do Estado desptico do antigo Egito, do Estado grego ou romano, do Estado feudal etc. J sabemos, depois de tudo o que vem sido dito em pargrafos anteriores que, em todo caso, a significao da palavra "Estado" tem variado substancialmente, em que pese a sua antigidade semntica. Mas, sobretudo, sabemos que as formas de organizao poltica das sociedades histricas - como exemplo as europias ocidentais - se distinguem, relativamente diferentes - dentro de

um processo que as vincula historicamente umas com as outras -, constituindo-se "modelos" de organizao poltica com traos prprios e diferenados. verdade que em todas elas encontramos alguns elementos comuns: uma populao, um territrio, uma organizao social, um sistema de poderes no que sobressai o de uns indivduos ou grupos dominantes que se apresentam supremos e um sistema de normas deduzido daqueles com capacidade de obrigar mediante a correspondente sano. Mas estes elementos comuns formam em cada caso uma estrutura peculiar. Poderamos dizer que a diferena fundamental entre as diversas formas de organizao poltica no reside nos seus elementos, mas sim na forma de estes acharem-se estruturados. Ainda que sempre encontremos populao social, sistema de poderes, ideologias, normas jurdicas etc., nem sempre a combinao de todos eles d como resultado a mesma estrutura poltica. A populao pode crer em coisas muito distintas com respeito relao que deve existir entre os poderes sociais: o territrio e a populao podem achar-se unidos por laos muito diferentes; as normas jurdicas podem obrigar com maior ou menor eficacia a mais ou a menos a populao e por distintas razes justificadoras. O Estado, portanto, uma formao social histrica, organizada como unidade poltica, que tem uns traos estruturais caractersticos e que vai constituindo a partir da sociedade europia ocidental dos sculos XIII e XIV. Falar, pois, de Estado moderno uma redundncia, j que, por definio, o Estado a forma de organizao poltica da modernidade, se por ela entendermos a poca histrica que se inicia no pr-Renascimento" (Teoria dei Estado e derecho constitucional, p. 74) (trad. do Autor). 4. PRESSUPOSTOS OU ELEMENTOS INTEGRADORES DO ESTADO? Embora o Estado moderno contine a manter essas caractersticas - de fato se desconhece qualquer Estado que no tenha esses trs elementos - preciso reconhecer que uma dilucidao maior cabe, no que tange ao saber se estamos diante de pressupostos ou requisitos para existncia do Estado ou de elementos integradores da sua existncia, e aqui a polmica medra. A diferena fundamental reside no seguinte: h aqueles que no fundo consideram que toda vez que se unir um territrio a um governo e a um povo resulta necessariamente num Estado. Para eles esses seriam no s elementos indispensveis como bastantes existncia do Estado. H no entanto outra corrente, que, sem negar serem esses elementos necessrios, procura enfatizar que de um lado o Estado suplanta esses trs - ao necessitar, por exemplo, de outros no a includos, podendo ser citados, a ttulo exemplificativo, os fins do prprio Estado - e, de outra parte, no ser tambm absolutamente inconcebvel a existncia de Estado com a ausncia de um ou alguns desses elementos. 5. Jorge Miranda, Manual, cit., t. 3, p. 8: "Por outro lado, questo extremamente complexa e controversa saber qual a natureza ou essncia do Estado, saber qual a realidade a que correspondem todos os aspectos mencionados (e, a, evidentemente, Estado e poltico no se distinguem). Cabe tambm referi-la; e - porque se afigura ser questo prvia, pelo menos do modo como levar a cabo aquele exame descritivo - justifica-se, mesmo, comear por ela. Mais para efeitos didticos do que cientficos, grande nmero de autores reconduz o tratamento do Estado ao dos seus trs "elementos": povo, territrio e poder poltico. tese a que no aderimos; quando muito, aceitamos falar em "condies de existncia". Sem embargo e sem seguirmos esse caminho, iremos pelo peso da tradio e por maior facilidade de exposio - dedicar os prximos captulos ao Estado como comunidade poltica (ou povo), cidadania como qualidade de membro de Estado, ao Estado como poder e ao territrio do Estado. Tanto quanto releva das cincias juspublicsticas releva da filosofia o

problema da natureza, da essncia, do ser do Estado; e o debate sobre este ponto anda, desde h muito, bem prximo do debate acerca da formao ou da justificao do poder (ou acerca da legitimidade do poder e dos governantes)". Sobre a questo relativa a pressupostos e requisitos para a existncia do Estado, conferir Paolo Barile, Istituzioni, cit., p. 10: "Allinterno, la sovranit si rende effettiva attraverso tre elementi che, secondo una dottrina tradizionale, compongono lo Stato. Alludiamo al popolo, al territorio e al governo (in senso lato). Si tratta, in realt, di elementi assai eterogenei, per cui giustamente si osservato (Gueli) che essi sono del tutto inadatti a comporre, insieme, il concetto di Stato e che, in fondo, popolo e territorio sono anzitutto presupposti essenziali dello Stato (R. Quadri)". Vejamos melhor: o elemento que tem mais caracterizada sua condio de integrante da essncia do Estado o territrio. Por outra face, no fcil conceber-se como um ingrediente de natureza to diferente dos demais possa integrar o mesmo composto que seria o Estado. O territrio fica muito mais facilmente compreensvel quando admitido como uma mera condio de existncia do Estado. dizer, na situao atual das coisas, o homem um ser preso a Terra, e, para que uma determinada ordem jurdica possa ser exclusiva num determinado espao, ela tem necessariamente de dispor de uma parcela do globo terrestre. Nessas condies, portanto, o territrio importantssimo para que o Estado assuma sua condio atual, a de ser um ordenamento exclusivo numa determinada rea do globo. Mas basta que suponhamos mudanas radicais na realidade tecnolgica - imaginando no futuro ser possvel a manuteno de populaes no espao que circunda a Terra por tempo indefinido - para indagarmos se algo nos impediria de admitir que uma dada populao se erigisse, como uma unidade poltica autnoma, com sede no Espao. Seria perfeitamente possvel, portanto, imaginar-se comunidades soberanas desprendidas do elemento territrio. E a s possibilidade de pensar-se isso, de ser tal hiptese Logicamente admissvel, demonstra que o territrio no um elemento componente, integrante do prprio Estado, no sentido de exprimir-lhe a essncia. Com relao ao povo, j talvez no seja to fcil essa elimino. De fato, todo Estado a organizao juridicamente soberana de um povo. Contudo, ainda assim ficam problemas delicados a serem resolvidos. Supondo-se que num determinado Estado haja uma mudana substancial de uma parcela quase que integral do seu povo, perguntar-se-ia se houve a manuteno da identidade do Estado ou se seria um outro Estado que estaria a surgindo. De qualquer sorte, fica claro que o elemento povo parece mais consubstancial ao Estado do que o territrio, na medida em que o Estado uma expresso desse prprio povo. Ainda assim, quer-nos parecer que a polmica suscitada extremamente til, na medida em que ela serve para demonstrar que o Estado - embora muito impregnado desses trs aspectos que mais nitidamente saltam nossa vista e que sem os quais at os presentes dias no poderamos mesmo admitir a sua existncia - algo que os transcende, no se confunde, no se resume a eles. H sempre algo no Estado - por vezes de difcil apreenso - que permite se aceitem de melhor grado essas teorias que buscam relativizar, ainda que em pequena medida, essa identificao muitas vezes mecnica que se faz entre Estado e esses trs elementos componentes. Ntida a possibilidade de ser essa idia de componentes excessivamente forte, por reduzir o Estado a esses trs ingredientes, quando muito mais compreensvel que na realidade estatal entrem elementos de outra ordem, no mais das vezes - como dissemos - de trabalhosa apreenso, razo pela qual os autores valem-se da simplificao, evitando inclu-los na definio do Estado.

O prprio direito tem a sua importncia decisiva na constituio do Estado. Mais do que o prprio direito, o apelo para uma das suas tcnicas, a da personificao, hoje adotada talvez pela unanimidade dos Estados modernos. Com exceo da Inglaterra, todos os Estados subjetivam, personalizam a sua figura, visando com isto objetivos de ordem racional, facilitando destarte o funcionamento do mecanismo jurdico, como tambm submetendo o Estado mais rigidamente s regras do prprio direito. CAPTULO II O PODER SUMRIO: 1. Poder social. 2. Poder poltico. 3. Direito e poltica. 4. O Estado se subordina inteiramente ao direito? 5. Estado e soberania. 1. PODER SOCIAL Se perguntarmo-nos qual o objeto fundamental com que se defronta uma Constituio vamos encontrar uma s resposta: a regulao jurdica do poder. Na verdade, a configurao que vier a ser imprimida a ele, a sua afetao a estes ou queles detentores, sua maior ou menor concentrao, os controles de que passvel, assim como as garantias dos destinatrios do poder que acabam por conformar o Estado e a sociedade. O poder tido como um dos trs incentivos fundamentais que dominam a vida do homem em sociedade e rege a totalidade das relaes humanas, ao lado da f e do amor, unidos e entrelaados, segundo Lowenstein. O poder social , pois, um fenmeno presente nas mais diversas modalidades do relacionamento humano. Ele consiste na faculdade de algum impor a sua vontade a outrem. O poder no se confunde com a mera fora fsica porque esta suprime no seu destinatrio a prpria vontade, o que no significa dizer que no exerccio do poder no exista coercitividade. Pelo contrrio, ela est sempre presente, embora possam ser muito diferentes as sanes em que pode incidir aquele que enfrenta o poder. Se no houver, contudo, ao menos a virtualidade do exerccio da coero, o que se tem , na verdade, a mera persuaso, na qual predomina a tcnica argumentativa. De outra parte, aquele que se persuade se convence das razes do persuasor, enquanto no poder o que h uma sujeio da vontade do dominado por temor das conseqncias da no-sujeio. Amplamente considerado, tanto poder o exercido pelo pai ao dar ordens aos seus filhos, quanto o do governo ao ordenar aos cidados. 2. PODER POLTICO Assim, com esta extenso, o poder extravasa o campo de interesse de uma Constituio. Para esta, interessa mais diretamente o poder poltico. Para a inteligncia deste, urge lembrar que em toda organizao ou sociedade h de comparecer uma certa dose de autoridade para impor aqueles comportamentos que os fins sociais estejam a exigir. Neste sentido o poder poltico no outro seno aquele exercido no Estado e pelo Estado. H inegavelmente algumas notas individualizadoras do poder estatal. A que chama mais ateno a supremacia do poder do Estado sobre todos os demais que se encontram no seu mbito de jurisdio. A criao do Estado no implica a eliminao desses outros poderes sociais: o poder econmico, o poder religioso, o poder sindical etc. Todos eles continuam vivos na organizao poltica. Acontece, entretanto, que esses poderes no podem exercer a coero mxima, vale dizer, a invocao da fora fsica por autoridade prpria. Eles tero, sempre, de chamar em seu socorro o Estado. Nessa medida so poderes subordinados. 1. Mrio Stoppino, O poder, Jornal da Tarde, 14 jan. 1975: "Em seu significado mais geral, a palavra poder designa a capacidade ou a possibilidade de agir, de produzir efeitos. Tanto pode ser referida a indivduos e a grupos humanos como a objetos e a fenmenos naturais (exemplo: poder

do calor, poder de absoro). Se a entendermos em sentido especificamente social, ou seja, na sua relao com a vida do homem em sociedade, o poder torna-se mais preciso, e seu espao conceitual pode ir desde a capacidade geral de agir at a capacidade do homem em determinar o comportamento do homem: poder do homem sobre o homem. O homem no s o sujeito mas tambm o objeto do poder social. poder social a capacidade que um pai tem para dar ordens aos seus filhos ou a capacidade de um governo de dar ordens aos cidados". 2. Miguel Reale, Teoria do direito e do Estado, p. 320: "Dentro dos limites de seu territrio, ou seja, nos limites reconhecidos pelo Direito Internacional, o Direito do Estado estende-se a todos os setores da vida social e, prima facie, cabe-lhe sempre razo nos entrechoques das competncias. O Estado no precisa legitimar as suas decises, a no ser em um segundo momento, conforme a maior ou menor soma de garantias reconhecidas aos indivduos e aos grupos: "Prima facie em princpio, elas (as regras de direito emanadas do Estado) so direito porque editadas pelo Estado segundo a sua autoridade legislativa. A autoridade do Estado, em virtude de sua essncia mesma, faz presumir a formulao da verdadeira norma jurdica, presuno esta que nenhuma outra autoridade pode invocar". Assim sendo, a soberania o direito do Estado Moderno porquanto s no Estado Moderno se verifica o pleno primado do ordenamento jurdico estatal sobre as regras dos demais crculos sociais que nele se integram e representa a condio essencial da validade prima facie incondicionada das regras de direito estatal". Roque Carrazza, Princpio federativo e tributao, RDP, 71:174: "Atualmente, o Estado a nica instituio soberana, porquanto "superiorem non recognoces". De fato, dentre as vrias pessoas que convivem no territrio estatal, apenas ele detm a faculdade de reconhecer Outros ordenamentos e de disciplinar as relaes com eles, seja em posio de igualdade (na comunidade internacional), seja em posio de ascendncia (por exemplo em relao s entidades financeiras), seja at em posio de franco antagonismo (v.g. com as associaes subversivas). A soberania como qualidade jurdica do "imperium" apangio exclusivo do Estado. Se ele no tivesse um efetivo predomnio sobre as pessoas que o compem, deixaria de ser Estado. Da concluirmos que a soberania inerente prpria natureza do Estado (Giorgio Del Vecchio). Ou, como queira Bluntschili "o Estado a encarnao e personificao do poder nacional. Esse poder, considerando a sua fora e majestade supremas, se chama soberania". E continua este incomparvel mestre: "... a soberania supe o Estado, no podendo estar nem fora, nem acima dele". (...)". Isto fica bem claro quando se estuda o surgimento desta supremacia do poder estatal. Vai-se ver, de resto, que o advento do prprio Estado Moderno coincide, precisamente, com o momento em que foi possvel, num mesmo territrio, haver um nico poder com autoridade originria, vale dizer: sem

ser necessrio chamar o poder de outrem em seu socorro. Na Idade Mdia no existia esta supremacia inconteste de uma pessoa, de uma classe ou de uma organizao. Adversamente, eram mltiplos os entes que reclamavam poderes originrios: o Papa, o Sacro Imprio Romano-Germnico, os reis, a nobreza feudal, as cidades e as corporaes de artes e ofcios, todos pretendiam exercer competncias no derivadas de outrem, o que era o mesmo que dizer que no se reconhecia reciprocamente nenhuma soberania. A partir do sculo XVI um fenmeno muito curioso deu-se na Europa. Os reis, atravs de diversas batalhas e tramas polticas, ganharam uma ascendncia inconteste dentro do territrio de cada reino, excluindo, inclusive, no campo externo, as pretenses temporais do papado e do Sacro Imprio Romano-Germnico. Destarte, formou-se uma sorte de poder que alguns queriam at mesmo diferente daquele vigorante na Grcia e em Roma. De qualquer forma era, sem dvida, completamente diverso do que existiu no milnio compreendido pela Idade Mdia. 3. Reinhold Zippelius, Teoria geral do Estado, p. 55: "A afirmao considerada hoje em dia, as mais das vezes, evidente, segundo a qual todas as autoridades num Estado derivam de um poder estadual unitrio, no foi tida por verdadeira desde sempre. Aquela afirmao o ponto de chegada de uma evoluo histrica acidentada. Houve longas pocas da histria alem durante as quais a nobreza, a igreja e as cidades exerciam autoridades originrias. Havia uma justia autnoma que no derivava do poder real e era mais antiga, historicamente, que a jurisdio real. Aquela era defendida e activada mediante privilgios de imunidade. Tambm escapavam distribudas novas hierarquias nobilirquicas que, como plantas silvestres, no acatavam, pura e simplesmente, a suserania suprema do rei. Nos diversos territrios as competncias estavam divididas j na baixa Idade Mdia, entre, por um lado, os prncipes e por outro a igreja, cavaleiros e cidades. Deparavam-se freqentemente em cada Estado dois verdadeiros Estados: o prncipe e os grupos sociais tinham organizao de grupos sociais. O prncipe e os grupos sociais tinham, tanto um como os outros, tropas, funcionrios, finanas e representaes diplomticas prprias. Governar era ento negociar continuamente de compromisso em compromisso (Mitteis-Lieberich, Cap. 35 III 5; Jellinek, 696 e segs.). O pensamento da concentrao do poder pblico pelos prncipes j progrediu, certamente, na Idade Mdia, como mostra a mxima: "Les rois sont souverains par dessus tous" proclamada inicialmente em Frana por Beaumanoir. O poder principal ou dos prncipes deveria ser independente; o poder papal e o imperial no deveriam ter precedncia. No entanto o poder principal, por sua vez, deveria ter precedncia em relao s competncias prprias dos diversos corpos sociais (Gierke, 381 e segs., 633 e segs., 192 e segs.; Jacoby, 26 e segs.)". 3. DIREITO E POLTICA De outra parte h que se constatar a pretenso do direito em traar as regras sobre as quais se deve dar o jogo poltico. Isto no significa, entretanto, que o direito acabe com a poltica. Esta, bvio, continua a existir mesmo

debaixo do Estado constitucional. O direito , na verdade, uma moldura dentro da qual se considera aceitvel o jogo poltico. Entre ambos, na verdade, surge uma tenso dinmica. Freqentemente a poltica tenta abandonar os parmetros jurdicos. Por outro lado, a Constituio que, desgarrada da razoabilidade, procura ir longe demais querendo enjeitar em si toda a vida poltica futura do Estado. 4. Miguel Reale, Teoria do direito, cit., p. 115: "O poder, por conseguinte, nunca deixa de ser substancialmente poltico, para ser pura e simplesmente jurdico. Quando dizemos que o poder jurdico, fazemo-lo relativamente a uma graduao de juridicidade, que vai de um mnimo, que representado pela fora ordenadamente exercida como meio de certos fins, at a um mximo, que a fora empregada exclusivamente como meio de realizao do Direito e segundo normas de Direito. Isto quer dizer que o poder no existe sem o Direito, mas pode existir com maior ou menor grau de juridicidade. Por outro lado, assim como o poder no existe sem o Direito, o Direito no se positiva sem o poder, um implicando o outro, segundo o princpio da complementariedade, de tanto alcance nas cincias naturais e humanas. De maneira geral no h poder que se exera sem a presena do Direito, mas da no se deve concluir que o poder deva ser puramente jurdico, tal como entendido no "Estado de Direito". A expresso poder de direito o resultado de uma comparao entre os diversos graus de juridicidade do exerccio do poder. No significa - como pensam alguns - que o poder se torna todo substancialmente jurdico (o que equivaleria a identificar Estado e Direito), mas que o poder, em regra, se subordina s normas jurdicas cuja positividade foi por ele mesmo declarada". O Poder Poltico exerce uma funo transcendente desde logo na prpria Constituio do Estado. Este nada mais que uma comunidade transformada pelo exerccio sobre ela do Poder Poltico. O poder constitui o Estado. No pode haver Estado sem Constituio. Esse prprio ato constitutivo, por seu lado, no se desprende nem se desgarra por completo do direito. Embora seja um ato emanado sobretudo da fora, esta no pode, todavia, vir desacompanhada de uma idia de direito, nem deixar de se traduzir logo em seguida em atos de natureza jurdica. O poder no consegue exercer-se dentro do Estado enquanto pura e exclusiva fora bruta; ele h de sempre dizer por que veio e para que veio, tornando-se nesse discurso, necessariamente, jurdico. A vinculao do poder ao direito - frise-se - no ocorre exclusivamente no momento da Constituio do Estado, mas tambm, e com muito maiores razes, por ocasio do seu funcionamento. Implantados os rgos constitudos - assim entendidos todos os que encontram o seu fundamento na Constituio - esses nada mais so que um feixe, um conjunto de competncias; so, destarte, simples definies legais de faculdades que incumbem aos seus agentes. A atuao do Estado no seu processo de promoo do bem-estar coletivo, da segurana, do progresso, se cumpre atravs de atos jurdicos ou de atos materiais que necessariamente aos primeiros se remontam. A complexidade das funes estatais, por sua vez, d lugar a uma complexidade crescente da organizao do prprio Estado. Essa complexidade se traduz na existncia de mltiplos rgos, cada um dotado das suas competncias prprias. A multiplicao de agentes e de rgos tambm criadora de

uma limitao do poder pelo direito. O poder dividido e disseminado sempre um poder mais controlado. 4. O ESTADO SE SUBORDINA INTEIRAMENTE AO DIREITO? Fica sempre no ar, entretanto, uma questo: o Estado se subordina inteiramente ao direito? Podemos falar com procedncia num Estado de Direito? De incio pode parecer muito difcil a aceitao dessa tese, uma vez que, se o prprio Estado que cria o direito, atravs da sua atividade Legislativa; se so, em ltima anlise, rgos dos prprios Estados os incumbidos de aplicar o direito, de sancionar aquele que o descumpre, poder-se-ia de fato sempre acreditar que a submisso do Estado ao direito impossvel. O direito se prestaria dominao dos sditos, mas no se prestaria submisso do prprio Estado. Contudo, no isto que tem prevalecido. Na verdade o Estado moderno, democrtico, tem guardado uma obedincia sensvel ao ordenamento jurdico. A despeito das dificuldades reconhecidamente procedentes de se sancionar o Estado quando ele o descumpridor das suas prprias leis, nem assim tem deixado o Estado de pautar-se pelas regras jurdicas que cria. Tem sido como que uma necessidade lgica de coerncia; ao Estado Moderno no se conferiria legitimidade enquanto estivesse ele voltado exclusivamente a impor normas. O estgio j atingido no processo do avano democrtico presta-se a impedir que, nada obstante, seja o povo o titular da soberania, possa ele sofrer o exerccio de um podr feito de maneira arbitrria ou desgarrada da legalidade. Portanto, o prprio fundamento que em ltima anlise confere ao Estado a prerrogativa de exercer o poder - que a sua capacidade de impor a ordem - impede que ele deixe de sujeitar-se s leis destinadas a ordenar a prpria sociedade. como se essa sua sujeio lei fosse condio para que pudesse ser chamado a legislar, na idia muito precisa e feliz de Radbruch. H algo que parece transcender o prprio Estado, tratando-se, para alguns, de um direito suprapositivo e natural, que obriga o Estado a manter-se sujeito s suas prprias leis, ainda seguindo a lio do mesmo mestre. Alm disso imprescindvel a percepo de dar-se a conteno do poder no s por limitaes de ordem formal - como at agora vnhamos expondo mas tambm pela existncia de limitaes de ordem material, vale dizer, por regras que impedem o Estado de invadir as esferas prprias dos indivduos e dos grupos sociais menores. So, portanto, os instrumentos jurdicos de garantia. certo que o Estado apresenta-se cada vez mais ameaador na medida em que assume um nmero crescente de atividades. curial tambm que essa proliferao de fins do Estado pe em risco a liberdade do indivduo. Da por que se faz hoje importante no s a limitao das atividades do Estado pelo direito, mas tambm a conteno das prprias atividades do Estado. As diversas experincias histricas tm demonstrado a impossibilidade de um Estado ser totalitrio quanto aos seus fins e libertrio quanto aos seus meios. Para que se possa maximizar os seus fins, ou, em outras palavras, levar a cabo um excessivo nmero de atividades com fins sociais, ele tem necessidade de dotar-se de uma fora coercitiva maior, na medida em que muitas vezes o exerccio desses fins no natural ao prprio Estado e ele s pode absorv-los atravs de um processo traumtico e violento sobre a sociedade. De qualquer forma, no se pode conferir um carter absoluto a essa correlao entre poucos fins e liberdade e muitos fins e ausncia de liberdade. inconteste a existncia de Estados que, embora perseguindo poucos fins, no souberam preservar a liberdade. 5. ESTADO E SOBERANIA Na mesma medida em que se consolidou o poder dentro do Estado, surgiu tambm a idia de que se tratava de um poder soberano. De fato, pode-se dizer que so duas construes simultneas. Uma, a do Estado, tal como sado dos sculos XV a XVIII, e outra, a da comunidade internacional, composta de Estados tidos por iguais. Esta regra da igualdade foi o princpio sobre o qual se erigiu o direito internacional. Encontrava-se, assim, inteiramente preservada a noo de soberania. Esta se constituiria na supremacia de poder dentro da ordem interna e no fato de, perante a ordem externa, s encontrar Estados de igual

poder. Essa situao nada mais era, portanto, que a consagrao, na ordem interna, do princpio da subordinao, com o Estado no pice da pirmide, e, na ordem internacional, do princpio da coordenao. Este princpio da coordenao mantm-se vlido, em termos, at hoje, no tendo sido a igualdade dos Estados infirmada do ponto de vista jurdico. Contudo, esta postulao jurdica encontra absoluta ausncia de correspondncia nos campos poltico, econmico, militar, cultural etc. que os Estados tornaram-se de dimenses e de propores muito diferenadas, fenmeno que se tornou ainda mais acentuado com o advento cena jurdica de um grande nmero de Estados tornados independentes pelo fenmeno da descolonizao ocorrido aps a Segunda Guerra Mundial. Perde-se, destarte, a noo do que sejam os requisitos de um Estado. Confere-se essa qualidade a pequenos territrios - s vezes pequenas ilhas; outras vezes nesgas de terras espremidas entre um Estado e o mar; ou mesmo pores pequenas de territrios sem qualquer meio de acesso ao mar, tudo isso dando lugar a um intenso fenmeno de desigualdade entre os Estados, que tem sido objeto j de no poucas preocupaes na Organizao das Naes Unidas (ONU). Encontramos l o surgimento dos fundamentos de um direito internacional compensador dessas fraquezas - da mesma maneira que, no direito interno, houve um direito social voltado aos mais carentes e necessitados. De qualquer sorte, a convivncia na mesma cena internacional de Estados com to grandes diferenas de potencial gera muitas vezes dificuldades na organizao dessa prpria comunidade, sobretudo na medida em que se tem ainda que aceitar a postulao da igualdade formal de todos os Estados. H, portanto, uma forte falta de correspondncia entre os postulados de um direito constitucional clssico e as realidades do mundo moderno. E de outra parte sabido que os Estados, ainda que de fraca expresso, lutam pela sua autonomia e pela sua soberania, porque esta a forma de assegurarem a sua liberdade no contexto internacional. O desafio consiste precisamente em saber como, sem se deixar de respeitar os interesses desses pequenos Estados, poderiam eles continuar a gozar dos benefcios que a soberania lhes confere sem deixar de outra parte de atentar s necessidades de uma atuao mais intensa das organizaes internacionais, do que muito depende a sobrevivncia da prpria humanidade. CAPTULO III O PODER CONSTITUINTE SUMRIO: 1. Legitimidade e legalidade. 2. O pensamento poltico-jurdico de Sieys. 3. Natureza e titularidade do poder constituinte. 4. Espcies de poder constituinte: originrio e derivado. 5. Exerccio do poder constituinte. 6. Limitaes ao poder de reforma constitucional. 6.1. Clusulas ptreas. 7. Modernas tendncias. O Poder Constituinte aquele que pe em vigor, cria, ou mesmo constitui normas jurdicas de valor constitucional. Com efeito, por ocuparem estas o topo da ordenao jurdica, a sua criao suscita caminhos prprios, uma vez que os normais da formao do direito, quais sejam, aqueles ditados pela prpria ordem jurdica, no so utilizveis quando se trata de elaborar a prpria Constituio. certo que, na maior parte do tempo, as regras constitucionais mantmse em vigor e, nessas condies, esse poder no exercitado, remanescendo, em conseqncia, no seu assento normal, que o povo. O Poder Constituinte s exercitado em ocasies excepcionais. Mutaes constitucionais muito profundas marcadas por convulses sociais, crises econmicas ou polticas muito graves, ou mesmo por ocasio da formao originria de um Estado, no so absorvveis pela ordem jurdica vigente. Nesses momentos, a inexistncia de uma Constituio (no caso de um Estado novo) ou a imprestabilidade das normas constitucionais vigentes para manter

a situao sob a sua regulao fazem eclodir ou emergir este Poder Constituinte, que, do estado de virtualidade ou latncia, passa a um momento de operacionalizao do qual surgiro as novas normas constitucionais. 1. LEGITIMIDADE E LEGALIDADE Dos atos jurdicos infraconstitucionais cobra-se a legalidade. Devem eles estar de acordo com o preceituado formalmente e, se for o caso, materialmente em nvel hierrquico superior. Das Constituies, por seu turno, cobrada legitimidade, que vem a ser a maior ou menor correspondncia entre os valores e as aspiraes de um povo e o constante da existente Constituio. Constata-se assim que a Constituio no se contenta com a legalidade formal, requerendo uma dimenso mais profunda, a nica que a torna intrinsecamente vlida!. Assim sendo, uma Constituio no representa uma simples positivao do poder. tambm uma positivao de valores jurdicos. 1. Hermann Heller, Teoria do Estado, p. 327: "A questo da legitimidade de uma Constituio no pode, naturalmente, ser contestada, referindo-se ao seu nascimento segundo quaisquer preceitos jurdicos positivos, vlidos com anterioridade. Em compensao, porm, uma Constituio precisa, para ser Constituio, isto , algo mais que uma relao factcia e instvel de dominao, para valer como ordenao conforme o direito, uma justificao segundo princpios ticos de direito. Contradizendo os seus prprios pressupostos, disse Carl Schmitt que a toda Constituio existente deve atribuir-se legitimidade, mas que uma Constituio, entretanto, s legtima, "isto , reconhecida no s como situao de fato mas tambm como ordenao jurdica, quando se reconhece o poder e (!) a autoridade do poder constituinte em cuja deciso ela se apia". A existencialidade e a normatividade do poder constituinte no se acham, certamente, em oposio, mas condicionam-se reciprocamente. Um poder constituinte que no esteja vinculado aos setores de decisiva influncia para a estrutura de poder, por meio de princpios jurdicos comuns, no tem poder nem autoridade e, por conseguinte, tambm no tem existncia". 2. O PENSAMENTO POLTICO-JURDICO DE SIEYS Poucos meses antes do deflagar da Revoluo Francesa, o abade Emmanuel Sieys publicou um pequeno panfleto intitulado Que o Terceiro Estado?, que foi um dos mais famosos estopins revolucionrios, representando um verdadeiro manifesto de reivindicaes da burguesia na sua luta contra o privilgio e o absolutismo. Para ele, a nao (ou o povo) se identificava com o Terceiro Estado (ou burguesia). Demonstrava isto, afirmando que o Terceiro Estado suportava todos os trabalhos particulares (a atividade econmica, desde a exercida na indstria, no comrcio, na agricultura, e nas profisses cientficas e liberais, at os servios domsticos) e ainda exercia a quase-totalidade das funes pblicas, excludos apenas os lugares lucrativos e honorficos, correspondentes a cerca de um vigsimo do total, os quais eram ocupados pelos outros dois Estados, o clero e a nobreza, privilegiados sem mrito. A classe privilegiada constitua um corpo estranho nao, que nada fazia e poderia ser suprimida sem afetar a subsistncia da nao; ao contrrio, as coisas s poderiam andar melhor sem o estorvo desse corpo indolente. Embora o Terceiro Estado possusse todo o necessrio para constituir uma nao, ele nada era na Frana daquela poca, pois a nobreza havia usurpado os direitos do

povo, oprimindo-O, instituindo privilgios e exercendo as funes essenciais da coisa pblica. Contra essa situao, o Terceiro Estado reivindicava apenas uma parte do que por justia lhe caberia; no queria ser tudo, mas algo, o mnimo possvel, a saber: os seus representantes deveriam ser escolhidos somente entre os cidados pertencentes verdadeiramente ao Terceiro Estado; seus deputados seriam em nmero igual ao das ditas ordens privilegiadas; e os Estados gerais deveriam votar por cabea, no por ordem. 2. Sieys, Que es ei Tercer Estado?, 1. ed., Madrid, Aguilar, 1973. Todo o Captulo I, p. 5-15. 3. Sieys, Que es el Tercer Estado?, cit. No Captulo II, demonstra que o Terceiro Estado nada tinha sido at aquele momento. No Captulo III, p. 25-46, descreve as reivindicaes do Terceiro Estado, mediante os trs pedidos mencionados. Procurando fundamentar essas reivindicaes no direito, Sieys desenvolveu o seu pensamento jurdico nos dois captulos finais do famoso panfleto, partindo da forma representativa de governo para chegar, pela primeira vez, a uma distino entre o poder constituinte e os poderes constitudos. Distinguiu trs pocas na formao das sociedades polticas. Na primeira, h uma quantidade de indivduos isolados que, pelo s fato de quererem reunir-se, tm todos os direitos de uma nao; trata-se apenas de exerc-los. Na segunda poca, reunemse para deliberar sobre as necessidades pblicas e os meios de prov-las. A sociedade poltica atua, ento, por meio de uma vontade real comum. Todavia, por causa do grande nmero de associados e da sua disperso por uma superfcie demasiadamente extensa, ficam eles impossibilitados de exercer por si mesmos a vontade comum. Assim, numa terceira poca, surge o governo exercido por procurao: os associados "separam tudo o que necessrio para velar e prover as atenes pblicas, e confiam o exerccio desta poro de vontade nacional, e por conseguinte de poder, a alguns dentre eles". Aqui j no atua uma vontade comum real, mas sim uma vontade comum representativa. Os representantes no a exercem por direito prprio nem sequer tm a plenitude do seu exerccio. 4. Sieys, Que es ei Tercer Estado?, cit., Captulo V, p. 71-3. A criao de um corpo de representantes necessita de uma Constituio, na qual sejam definidos os seus rgos, as suas formas, as funes que lhe so destinadas e os meios para exerc-las. As leis constitucionais regulam a organizao e as funes dos poderes constitudos (corpos), entre os quais se encontra o Legislativo. Elas so leis fundamentais porque no podem ser tocadas pelos poderes constitudos: somente a nao tem o direito de fazer a Constituio. O poder constituinte , assim, um poder de direito, que no encontra limites em direito positivo anterior, mas apenas e to-somente no direito natural, existente antes da nao e acima dela. Alm disso, o poder constituinte inalienvel, permanente e incondicionado. A nao no pode perder o direito de querer e de mudar sua vontade; no est submetida Constituio por ela criada nem a formas constitucionais; seu poder constituinte permanece depois de realizada a sua obra, podendo modific-la, querer de maneira diferente, criar outra obra, independentemente de quaisquer formalidades. Os poderes constitudos, ao contrrio, so limitados e condicionados; recebem a sua existncia e a sua competncia do poder constituinte; so organizados na forma estabelecida na Constituio e atuam segundo esta. 5. Sieys, Que es ei Tercer Estado?, cit., p. 73-80: "A nao existe antes de tudo, a origem de tudo. Sua vontade sempre legal, a lei mesma. Antes dela e por cima dela s existe o direito natural". "Estas leis so chamadas fundamentais no no sentido de que possam ser feitas independentes da vontade nacional, mas sim porque os corpos que existem e atuam por elas no podem toc-las.

Em cada parte a constituio no obra do poder constitudo, mas sim do poder constituinte." "De qualquer maneira que uma nao queira, basta que queira; todas as formas so boas, e sua vontade sempre a lei suprema." P. 87: "A nao sempre senhora de reformar a sua constituio". "Um corpo submetido a formas constitutivas no pode decidir nada se no segundo a constituio." Em ltima anlise, ao procurar fundamentar juridicamente as reivindicaes da classe burguesa, Sieys foi buscar fora do ordenamento jurdico positivo (que era injusto) um direito superior, o direito natural do povo de autoconstituir- se, a fim de justificar a renovao da mesma ordem jurdica. O seu pensamento desenvolveu-se aprioristicamente nos moldes do racionalismo iluminista, do contratualismo e da ideologia liberal da poca. Construiu um conceito racional de poder constituinte, levantando o problema da sua natureza e da sua titularidade, bem como apresentando a sua soluo. Durante muito tempo a doutrina tradicional desenvolveu os ensinamentos de Sieys. Com o surgimento do positivismo jurdico, nos meados do sculo passado, comeou a ser questionada a natureza jurdica do poder constituinte, uma vez que, admitindo-se a positividade como o nico modo de ser do direito e sendo certo que o poder constituinte anterior ao direito posto, no poderia ele ser um poder jurdico. De qualquer maneira, o problema penetra os estudos jusfilosficos. Assim, vemos que no outro o entendimento do mestre argentino Vanossi: "na noo do Poder Constituinte h elementos perdurveis que mantm a sua total vigncia e outros que requerem um enfoque mais atualizado. Por exemplo, na noo que a partir do Abade Sieys tem-se difundido, evidente que o mais importante o descobrimento da funo do Poder Constituinte. Este conceito aparece nos momentos em que o Racionalismo e os comeos do Constitucionalismo impem a idia da Separao dos Poderes. Era bvio que no podia haver uma distribuio do Poder sem a pressuposio da existncia de um poder superior, que praticasse essa distribuio, isto : para poder falar de diversos poderes, das diversas funes do poder que estavam repartidas e distribudas, havia-se que supor a existncia prvia, lgica e cronologicamente falando, de um poder supremo que realizasse essa repartio, que levasse a cabo essa distribuio; portanto, a noo de Poder Constituinte aparece como algo absolutamente necessrio para poder compreender-se o tema da distribuio do Poder. E se considerarmos que no Estado Constitucional, democrtico, social, contemporneo, necessrio manter a distribuio do Poder, embora com outros alcances, com outras caractersticas, mas mant-la, evidente que tambm temos que conservar o conceito de Poder Constituinte, de tal forma que, a partir do funcionamento deste, poder-se- entender a diviso do Poder. Outro ponto importante que se mantm vigente a distino entre o Poder Constituinte - como funo do ato constituinte, como uma manifestao concreta desse Poder - e a Constituio como produto ou resultado daquele Poder, daquele ato. O Poder Constituinte fundamentalmente uma funo, o que d razo aos que afirmam que, tambm na etapa da reforma da Constituio, existe uma manifestao do Poder Constituinte. Sabemos que h certo setor doutrinrio que reclama a exclusividade da presena do Poder Constituinte que atua em outras oportunidades como instncia de reforma ou emenda. Se ubicarmos o tema no nvel da funo, dizemos que Poder Constituinte aquele que participa da criao e distribuio das competncias supremas do Estado e veremos que cada vez que existe uma redistribuio ou uma reformulao dessas competncias evidentemente mais uma manifestao do Poder Constituinte". 6. Jorge Reinaldo Vanossi, Revista de Direito Constitucional, 1:12-3: "A doutrina tradicional, Prof. Bastos, distinguia unicamente entre o Poder Constituinte Originrio e o Poder Constituinte Derivado. Poder Constituinte Originrio era aquele que atuava, segundo os

autores, originariamente, dizer, atuava ante o ato fundacional e perante a inexistncia de qualquer ordenamento constitucional preexistente. Era o que ditava a primeira Constituio, com a qual juridicamente se organizava o Estado. O Poder Constituinte Derivado era o Poder Constituinte de continuidade, aquele que reformara a Constituio, mas respeitando as previses existentes na prpria normatividade dessa Constituio que at o momento de ser reformada estava vigente. Entretanto, a experincia indica que existe um Poder Constituinte Revolucionrio, que, prescindindo do tema da sua legitimidade, que mais adiante analisaremos, possui obviamente carter de Poder Constituinte, porque altera profundamente a estrutura dos rgos do Poder ou as relaes entre o Poder e a Sociedade. Esse Poder Constituinte revolucionrio tem em comum com o originrio, o fato de no se ajustar com a legalidade preexistente, com a nica diferena de que, enquanto o Poder Constituinte Originrio no reconhece uma legalidade preexistente, porque esta no existiu, porque surge ali, o Poder Constituinte Revolucionrio no reconhece a legalidade constitucional preexistente, porque a derrubou e a destruiu e, portanto, lhe desconhece qualquer virtualidade jurdica. De modo que este Poder Constituinte Revolucionrio o que geralmente assumido e exercido nas instncias denominadas de fato ou revolucionaria ou golpssta ou que com qualquer outra denominao se utilizam em nossos pases da Amrica Latina. Em alguns casos, esse Poder Constituinte Revolucionrio exercido com um carter provisrio e nada mais que para a emergncia, enquanto permanece o Governo de Fato. Seria algo assim como a auto-regulao do Governo de Fato para disciplinar a sua conduta e as competncias de seus rgos, proclamando antecipadamente que essas disposies cessaro no dia em que se produza o trnsito a uma normalidade constitucional baseada numa legitimidade de origem democrtica". 3. NATUREZA E TITULARIDADE DO PODER CONSTITUINTE Poder constituinte significa poder de elaborar uma Constituio. Sendo esta o primeiro documento jurdico do Estado e fundamento de validade de todos os demais, negamos normatiVistas a natureza jurdica desse poder, reconhecendo-lhe a sua faticidade histrica, suscetvel de ser estudada por outros ramos do saber, como fora ou energia social. Autores h, entretanto, que sustentam ajuridicidade do poder constituinte, com base na tese jusnaturalista de que, alm do direito positivo, h um direito superior decorrente da prpria natureza humana, ou, de um modo geral, de que o direito precede ao Estado. O pensamento de Sieys jusnaturalista. Outras posies sero apenas ligeiramente resumidas, tendo em vista que o problema ultrapassa as fronteiras do direito constitucional para constituir objeto da filosofia. 7. Celso Antnio Bandeira de Melo, Revista de Direito Constitucional, 4:69: "A primeira indagao que ocorreria se o Poder Constituinte um Poder Jurdico ou no. Se se trata de um dado interno ao mundo do direito ou se, pelo contrrio, algo que ocorre no plano das relaes polticosociais, muito mais do que no plano da realidade do direito. E a minha resposta que o chamado

Poder Constituinte originrio no se constitui num fato jurdico. Em rigor as caractersticas, as notas que se apontam para O Poder Constituinte, o ser incondicionado, o ser ilimitado, de conseguinte, o no conhecer nenhuma espcie de restrio, j esto a indicar que ele no tem por referencial nenhuma espcie de norma jurdica, pelo contrrio, a partir dele que vai ser produzida a lei suprema, a norma jurdica suprema, o texto constitucional; tem-se concluir que o Poder Constituinte algo pr-jurdico, precede, na verdade, a formao do direito". 8. Luis Recasns Siches, Tratado general del filosofia del derecho, 1. ed., Mxico, Porrua, 1959. Para este autor devem ser colocadas duas questes: 1. Em que consiste o Poder Constituinte. 2.a) A quem deve corresponder o poder constituinte. O primeiro dos temas consiste em perguntar-nos pelo conceito essencial ou puro do poder constituinte. O segundo propriamente um problema de estimativa jurdica ou de filosofia poltica" (p. 305). Referindo-se origem revolucionria de um novo sistema jurdico, comenta: "Isto no pode ser explicado pelo puro jurista, pelo jurista, sensu stricto, porque ele se move dentro do campo imanente de um sistema jurdico positivo vigente; e quando se produz o fato violento que arruna dito sistema, o jurista sente como que fosse destruda a esfera em que morava. Poder transportar-se para a nova esfera, para o novo sistema criado pelo movimento triunfante; mas no poder aduzir para isso razes jurdico-positivas, mas sim outro tipo de razes (histricas, polticas, sempre em conexo com pontos de vista estimativos). Quais sejam estas razes constitui um grave problema para a filosofia do direito" (p. 297-8). Casanova, Teoria del Estado y derecho constitucional, p. 211: "El poder constituyente de la Nacin es tericamente originario. Quiere esto decir que no existe una norma o fuente de derecho anterior que legitime ese poder. En sentido estricto el poder constituyente no es jurdico (mientras no se constituya como poder constituido para la reforma de una Constitucin preexistente), sino politico. Es previo a toda norma jurdica objetiva". Trs so os caracteres essenciais do poder constituinte, segundo Georges Burdeau: inicial, porque nenhum outro poder existe acima dele, nem de fato nem de direito, exprimindo a idia de direito predominante na coletividade; autnomo, porque somente ao soberano (titular) cabe decidir qual a idia de direito prevalente no momento histrico e que moldar a estrutura jurdica do Estado; incondicionado, porque no se subordina a qualquer regra de forma ou de fundo. No est regido pelo direito positivo do Estado (estatuto jurdico anterior), mas o mais brilhante testemunho de um direito anterior ao Estado. Para Burdeau seria paradoxal recusar a qualidade jurdica a um poder mediante o qual a idia de direito se faz reconhecer e, por conseqncia, se impe no ordenamento jurdico inteiramente. 9. Georges Burdeau, Trait de science politique, 2. ed., Paris, LGDJ, 1969, t. 4, p. 184-5. Paulo Barile, Istituzioni di diritto pubblico, p. 239: "La funzione costituente e la sola fra le funzioni dello Stato che sia totalmente libera nel fine, perch non e vincolata da nessunaltra funzione.

Qui lesplicazione della sovranit e piena, totale, mentre lesplicazione della stessa sovranit in constanza di regime e dall art. 1 C. predeterminata nelle forme e nei modi, come gi si disse. La funzione costituente quindi ha questa caratteristica, unica fra tutte le funzioni, di essere, pi che discrezionale, del tutto libera nella causa, perch nessuna regula preesistente la vincola. Prima di essa ce il caos, cio o non vi e una comunit, oppure ve ne una indistinta nellambito di una piO grande, dalla quale non si e ancora distaccata, oppure ancora ve ne una in dissoluzione. Abbiamo gi visto in sede storica come questo procedimento sia confermato, anche qualora lespressione del potere costituente sia previsto dal precedente diritto e si sia in qualche modo cercato di avviarlo su certi binari; questi binari, che possono essere seguiti e possono non esserlo, anche se sono seguiti lo sono spontaneamente, per cui il comportamento che il potere costituente sceglie fra i vari possibili, viene scelto liberamente, non perch ad esso impostogli da un precedente diritto". O problema da titularidade se resolve logicamente a partir da tese de que o poder constituinte legitimado pela prpria idia de direito que ele exprime. Ele perde a sua eficcia no momento mesmo em que essa idia de direito deixa de ser dominante no grupo. Como no existe um poder constituinte abstrato, determinvel a priori, para qualquer sociedade, segue-se que, em cada coletividade, o titular desse poder o indivduo ou grupo no qual se encarna a idia de direito, em um dado momento. Pode ser tambm o povo, como portador direto da idia de direito, na falta de qualquer chefe reconhecido e consentido. 10. Georges Burdeau, Droit constitutionnel et institutions politiques, 16. ed., Paris, LGDJ, 1974, p. 80. Faz referncia ao poder constituinte originrio. O titular do poder constituinte institudo um rgo do Estado: cf. Trait, cit, t. 4, p. 234. Casanova, Teora del Estado, cit., p. 210: "Por el contrario, hay que preguntarse a quien de los miembros de dicha comunidad se le concede el derecho a dictar la norma suprema de organizacin y convivencia; sobre quien hay consentimiento comun o mayoritario; o, simplesmente, quien tiene suficiente poder (material e ideolgico) sobre los dems para reclamar para si el poder constituyente. El poder constituyente y la soberana coinciden, por tanto. Quien es considerado como soberano es quien tiene derecho a crear la Constitucin como ley fundamental. Con todo, la creencia contempornea es unnime: la soberania recae en la Nacin, es decir en el conjunto de los miembros de la sociedad poltica, atravs de unos representantes electos". O poder constituinte vontade poltica na doutrina de Carl Schmitt. Por isso, a validade de uma Constituio no se apia na justia de suas normas (como pretende o jusnaturalismo), mas na deciso poltica que lhe d existncia. A Constituio no abrange todas as normas constantes do documento formal que leva este nome. Em sentido positivo, a Constituio contm somente a determinao consciente da concreta forma de conjunto pela qual se pronuncia ou decide a unidade poltica. Ela contm as decises polticas fundamentais, que, no caso da Constituio de Weimar, so: a deciso a favor da democracia;

a deciso a favor da repblica e contra a monarquia; a deciso a favor da manuteno de uma estrutura de forma federal do Reich; a deciso a favor de uma forma fundamentalmente parlamentar-representativa da legislao e do governo; e a deciso a favor do Estado burgus de direito, com seus princpios consagradores dos direitos fundamentais e da diviso de poderes. Tais decises so