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SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENGENHARIA NAVAL 46 anos 22º Congresso Nacional de Transporte Aquaviário, Construção Naval e Offshore Metodologia para otimização do nível de utilização dos recursos nas oficinas de montagem de blocos em um estaleiro João Stefano Luna Cardoso Pesquisador do Centro de Estudos em Gestão Naval Mestrando da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo David Joshua Krepel Goldberg Pesquisador do Centro de Estudos em Gestão Naval Mestrando da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo Prof. Dr. Marcos Mendes de Oliveira Pinto Coordenador do Centro de Estudos em Gestão Naval Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da USP 1. Resumo O presente trabalho apresenta uma metodologia para determinação do nível de utilização dos recursos (máquinas e trabalhadores) nas oficinas de montagem de blocos de um estaleiro, que auxiliará na programação da produção dessa oficina visando à melhor utilização destes recursos sob a ótica financeira. Foram analisadas para tanto as demandas de cada recurso para a produção de um nível de demanda fixado, que gerava um custo em função da disponibilidade do recurso. A demanda foi fixada com base num nível de produção esperado, de cinco navios por ano, e suas oscilações de baixa freqüência foram niveladas com a utilização da Transformada de Fourier para eliminação das oscilações diárias, que foram consideradas administráveis pela própria gestão das oficinas. Como resultado, obteve-se uma estrutura de recursos considerada adequada para atender a essa demanda, resultando num modelo teórico que pode ser base para aplicações em casos práticos, algo oportuno no atual momento de retomada dos investimentos no setor naval. 2. Abstract This paper shows a methodology to determine the level of utilization of resources (work force and machinery) in the block assembly sections of a shipyard, which will help in the production programming seeking the best financial performance. The demand for the main resources was studied for a determined level of production, resulting in a cost associated for this operation. Demand was determined for a likely level of five ships per year, and its oscillations in low frequencies were equalized using the Fourier Transform to eliminate de high-frequency-oscillations. These daily oscillations could be administrated by the shop managers. A certain structure of resources was considered adequate to attend this demand, resulting in an academic model that may be applied to real cases, something useful in this

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SOCIEDADE BRASILEIRA DE ENGENHARIA NAVAL 46 anos

22º Congresso Nacional de Transporte Aquaviário, Construção Naval e Offshore

Metodologia para otimização do nível de utilização dos recursos nas oficinas de montagem de blocos em um estaleiro

João Stefano Luna Cardoso Pesquisador do Centro de Estudos em Gestão Naval

Mestrando da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

David Joshua Krepel Goldberg Pesquisador do Centro de Estudos em Gestão Naval

Mestrando da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

Prof. Dr. Marcos Mendes de Oliveira Pinto Coordenador do Centro de Estudos em Gestão Naval

Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da Escola Politécnica da USP

1. Resumo

O presente trabalho apresenta uma metodologia para determinação do nível de utilização dos recursos (máquinas e trabalhadores) nas oficinas de montagem de blocos de um estaleiro, que auxiliará na programação da produção dessa oficina visando à melhor utilização destes recursos sob a ótica financeira.

Foram analisadas para tanto as demandas de cada recurso para a produção de um nível de demanda fixado, que gerava um custo em função da disponibilidade do recurso.

A demanda foi fixada com base num nível de produção esperado, de cinco navios por ano, e suas oscilações de baixa freqüência foram niveladas com a utilização da Transformada de Fourier para eliminação das oscilações diárias, que foram consideradas administráveis pela própria gestão das oficinas.

Como resultado, obteve-se uma estrutura de recursos considerada adequada para atender a essa demanda, resultando num modelo teórico que pode ser base para

aplicações em casos práticos, algo oportuno no atual momento de retomada dos investimentos no setor naval.

2. Abstract

This paper shows a methodology to determine the level of utilization of resources (work force and machinery) in the block assembly sections of a shipyard, which will help in the production programming seeking the best financial performance.

The demand for the main resources was studied for a determined level of production, resulting in a cost associated for this operation. Demand was determined for a likely level of five ships per year, and its oscillations in low frequencies were equalized using the Fourier Transform to eliminate de high-frequency-oscillations. These daily oscillations could be administrated by the shop managers.

A certain structure of resources was considered adequate to attend this demand, resulting in an academic model that may be applied to real cases, something useful in this

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moment of growing Brazilian ship construction industry.

3. Introdução

O dimensionamento das oficinas de um estaleiro traz um grande problema à direção da empresa: qual o nível ótimo de recursos para atender a sua demanda, considerando os custos de ociosidade e de subcontratação?

No trabalho de Pinto (2007d), os autores concluem que nas diferentes etapas da construção de um navio, diferentes abordagens devem ser dadas à programação da produção.

As oficinas de blocos de um estaleiro têm comportamento característico de um job shop, definido por um processo de produção intermitente, com baixo volume de produção, exigência de equipamentos flexíveis em seqüência não linear, diferentes operações de produção e, conseqüentemente, um grande número de opções de produção que devem ser avaliadas.

Já nas oficinas de painéis, quando a demanda por painéis semelhantes é média a alta, os autores recomendam utilizar o modelo flow-shop, ou seja, produção intermitente repetitiva (Pinto, 2007d)

Diferentemente da programação das oficinas, no dique a abordagem mais adequada é por projeto e a programação deve ser feita em modelo de rede.

Neste trabalho foi utilizado um software de MRP (Material Requirement Planning) para auxiliar na programação da produção das oficinas, que envolvem um grande número de subprodutos atendendo aos deadlines impostos pela programação do dique. Entretanto, o MRP só considera o instante da demanda do bloco no dique e o lead-time1 de produção do componente, incluindo o tempo entre a liberação do pedido e a entrega do produto acabado, mas sem considerar a indisponibilidade de recursos devido a obras simultâneas ou a possibilidade de antecipação dos serviços em períodos de baixa quantidade de trabalho.

Conseqüentemente, ele resulta numa demanda por recursos extremamente 1 Lead time de fabricação e compra: tempo em que um item estará disponível, dado que todos os itens por ele requeridos estejam disponíveis, incluindo os tempos de processamento, transporte, fila, etc.;

desbalanceada, tanto no curto prazo (em escala de dias) quanto no médio e longo prazos (em escala de semanas e meses).

A metodologia proposta possui duas etapas: filtragem da demanda e a análise do impacto da variação da demanda nos custos. Ela não visa à garantia de que toda a demanda seja atendida pela capacidade instalada no próprio estaleiro, mas sim que o gasto com subcontratação seja menor que o custo de ociosidade que a ampliação de recursos adicionais implicaria.

A filtragem da demanda é realizada para eliminar as grandes oscilações em curtos períodos de tempo, uma vez que o excedente não suportado em um pico de necessidade pode ser tratado na ociosidade verificada no vale vizinho. O ferramental matemático para esta filtragem é a Transformada de Fourier, que permite descartar os termos com freqüência associada a baixos períodos.

O impacto da variação da demanda nos custos é mensurado associando um custo de ociosidade e um de sobrecarga ao recurso.

O objetivo deste estudo é propor uma metodologia para otimização da disponibilidade dos recursos produtivos a fim de se balancear sobrecarga e ociosidade dos recursos e possibilitar uma melhor programação das atividades da oficina, resultando em uma maior eficiência operacional com um alto e constante nível produtivo.

Para tanto, foi preciso planejar e programar a produção de um navio de forma simplificada, considerando como premissa a disponibilidade de um típico estaleiro brasileiro, conforme será descrito a seguir.

4. Navio e estaleiro considerados

Para desenvolver e realizar a análise da utilização dos recursos de um estaleiro foi feita a quebra de um navio da classe suezmax, cujas dimensões principais encontram-se na

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Tabela 1.

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Tabela 1: Dimensões principais do navio utilizado

Comprimento 245m

Boca 48,3m

Pontal 25,1m

Calado 16,8m

DWT2 132.000t

Como a descrição do processo de definição da estrutura de produto a ser construída não é tema desse trabalho, sua metodologia não será descrita. Sname, 2003 e Park, 2005 trazem importantes conceitos que aproximam a solução utilizada, formalizada por Pinto, 2007b.

Foram também adotadas algumas premissas simplificadoras, tais como:

• A seção mestra foi estendida para todo o comprimento do navio, mesmo popa e proa que são reconhecidamente bastante diferentes do corpo paralelo médio;

• Para essas regiões, supôs-se que a diferença de tamanho compensa a diferença de complexidade entre uma e outra;

• As seções tinham todas o mesmo comprimento, de forma que a programação da construção dos blocos de uma seção poderia ser replicada às demais seções.

A Tabela 2 mostra alguns números que dão idéia da complexidade do problema abordado. Algum detalhamento será dado sempre que for necessário.

Tabela 2: Número de itens da estrutura de um navio Suezmax

Item Quantidade

Reforçadores 10.340

Chapas 5.936

Painéis 1.632

Sub-blocos 297

Blocos 110

Total 18.315

Para programar a produção de todas essas partes era necessário calcular o lead time de produção de cada uma. Foram assumidos os

2 Deadweight (DWT): capacidade de carga do navio.

ativos encontrados num estaleiro de porte típico brasileiro, descritos na Figura 1.

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Recurso OficinasEdificação

• 1 de 350 x 65 x 8 m • Não aplicávelDique

Guindaste/ Ponte rolante • 2 guindastes de 300 ton

• Guindastes para sub-blocos e pontes rolantes para painéis

• Disponibilidade a ser determinada

Caldeireiro• 2 equipes composta de:

– 2 caldeireiros– 1 soldador – 2 ajudantes

• Disponibilidade a ser determinada

Soldador• 2 equipes composta de:

– 4 soldadores – 4 ajudantes

• Disponibilidade a ser determinada

Linha de painéis • Não aplicável • Disponibilidade a ser

determinada

Maquina de corte

• Não aplicável • Disponibilidade a ser determinada

Cabine de Jateamento e

Pintura

• Não aplicável • Disponibilidade a ser determinada

• 2 frentes de trabalho simultâneas

Velocidades

• Bloco: 2 h + caldeiraria• Sub-bloco: 40 min/unid• Painel: 20 min/unid

• 1,75 m*/h

3 estações simultâneas:• Chapa: 21,85 m*/h• Reforço: 42,75 m*/h• Reforço (web): 42,75 m*/h

• 2,4 m/min

• Jateamento: 67,5 m2/h• Pintura: 67,5 m2/h

• Chapa:50 m*/h • Reforço: 25 unid/h ou

12,5 unid/h (subbloco)

* Extensão em metros de peça a ser soldada Figura 1: Descrição dos recursos do estaleiro utilizado para o exercício

5. Programação da edificação

Com base na estrutura de produto definida conforme citado no item anterior, utilizou-se o software Microsoft Project para cadastrar as atividades da edificação dos blocos e suas precedências. Com as produtividades dos guindastes, equipes de caldeireiros e equipes de soldadores, foram calculados os tempos de união dos blocos, possibilitando a construção do diagrama de rede representado na Figura 2.

Figura 2: Diagrama de rede para o projeto –

ilustrativo

Essa programação visa apenas atender às datas necessárias para edificar os blocos na ordem correta, gerando uma demanda desequilibrada nos recursos do dique, como se pode observar na Figura 3. Nela são mostradas as demandas dos guindastes, dos

soldadores, dos caldeireiros e do dique. As barras superiores, em vermelho, mostram a super-alocação.

Figura 3: Demanda desnivelada dos recursos

O próprio Microsoft Project tem uma ferramenta que faz nivelamento de recursos, alterando as datas programadas dentro da margem permitida pelos deadlines do projeto. Ela resolve uma parte dos desníveis, mas ainda restam muitos picos de demanda.

Como o prazo necessário para a construção do navio estava em dois meses e dez dias, a solução encontrada e considerada viável foi flexibilizar a data de término do projeto. Assim, uma atividade só seria iniciada quando houvesse disponibilidade do recurso exigido por ela. Com isso, o prazo de

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construção foi estendido em duas semanas - conforme pode ser conferido na Figura 4, que apresenta o resultado após esse nivelamento para os mesmos recursos: guindaste, soldador, caldeireiro e dique.

Figura 4: Demanda dos recursos após

nivelamento

6. Programação das oficinas de blocos e painéis

Para programar as ordens de fabricação nas oficinas, usando um software de MRP, era necessário definir uma série de parâmetros para cada item que compõe a estrutura do navio: matéria-prima e elementos confeccionados3, recursos utilizados4, lead-time de fabricação e compra, política de formação de lote, e data de utilização dos blocos no dique – definidas após a programação do dique descrita no item anterior.

Como a necessidade líquida de blocos é oriunda da edificação, as ordens de fabricação dos mesmos podem encontrar-se muito concentradas, exigindo uma velocidade de construção muito alta. Para atender essa demanda de blocos, o estaleiro teria que possuir uma alta capacidade de processamento nas oficinas, necessitando de alto investimento. Normalmente os estaleiros evitam esse sobre-custo iniciando as atividades nas oficinas antecipadamente, estocando os blocos e seus componentes em seus pátios.

Existem inúmeras combinações nas antecipações das ordens de produção que possibilitam ao estaleiro distribuir suas horas de trabalho. A implementação de heurísticas que auxiliam na escolha dessas opções pode

3 Quantidade de itens intermediários: bloco A é composto por sub-blocos B e C, sub-bloco C é composto por painéis D e E, etc. 4 Quantidade e roteirização dos processos

trazer grandes melhorias, mas não será feita nesse relatório, que se limitará em um exemplo ilustrativo.

Para o desenvolvimento desse exemplo de espaçamento de pedidos (ordens de fabricação), classificaram-se as seções quanto a dois critérios: geometria (predominantemente plana ou curva) e data de pedido original (a partir do Project).

A partir de então, anteciparam-se os pedidos dos blocos planos de forma que ficassem espaçados de 2 em 2 dias5, mantendo a ordem do pedido original. Logo após, distribuiu-se a fabricação dos blocos de seções curvas no mesmo período ocupado pelo primeiro grupo, originando aproximadamente uma ordem a cada 4 dias.

Note-se na Figura 5 (resposta do software de MRP) como esse sistema simples consegue diminuir significativamente os picos dos recursos. Na linha de painéis planos, recurso ilustrado, o sistema diminuiu a média de horas necessárias por dia em 42%.

5 O espaçamento de 2 em e dias foi considerado viável, mas não é ótimo. Uma análise de sensibilidade da variação desse intervalo pode revelar espaçamentos ainda mais eficientes.

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Figura 5: Comparação do espaçamento de pedidos para a linha de painéis planos

Foram feitas ainda simulações de pedidos em lotes, pois a existência de lotes dá outra dinâmica à programação. Lotes com tamanho fixo em 50 unidades, por exemplo, permitem ter estoque limitado, mas possíveis sobras de material. Lotes com período fixo em 30 dias permitem estoque de tamanho variável e eliminam as sobras. A inexistência de lote implica em não formar estoques e não ter sobras. A vantagem de se trabalhar com lotes é a diminuição do lead-time por redução do tempo de setup dos recursos e homogeneização de processos. Uma desvantagem é o aumento do desbalanceamento na oficina devido ao aumento da quantidade de trabalho por pedido (lote), uma vez que todas as unidades do lote serão tratados, mesmo os que não são necessários no momento.

A saída do MRP só não pode ser considerada a própria programação das oficinas porque o software considera apenas as datas de necessidade dos itens, esquecendo a capacidade dos recursos do estaleiro. É necessário então discutir formas de tratar essas demandas para determinar o nível ótimo de recursos para que um estaleiro atenda à sua demanda. Isso será feito segundo a metodologia a seguir.

7. Metodologia

O estudo inicia-se a partir desta curva de demanda de serviços. A Figura 6 representa uma curva genérica de demanda do recurso x tempo (em dias). As grandes oscilações na demanda produzem a falsa ilusão da necessidade superior de recursos.

Dias

Dem

anda

[h]

0

10

20

30

40

50

0 50 100 150 200 250 300 350

Demanda diária do recurso

Figura 6: Demanda de recursos diários pelo

MRP

Para definir a quantidade ótima de recursos necessários, a metodologia aplicada divide-se em duas partes: tratamento da curva de demanda e avaliação da variação dos recursos disponíveis pelo custo total despendido.

Tratamento da curva de demanda – Transformada de Fourier

A transformada de Fourier é um processo matemático utilizado extensamente no tratamento de dados. Através deste é possível decompor uma curva em uma combinação linear de várias funções sinusoidais (senos e cossenos) de freqüências e amplitudes conhecidas.

Este processo de discretização foi aplicado sobre a curva de demanda por serviços com objetivo de filtrar apenas a oscilação de maior influência, ou seja, considerar oscilações de períodos maiores – no caso, superior a 10 dias – sem sofrer o efeito das oscilações diárias.

As oscilações de maior freqüência representam a demanda por serviços de períodos menores, dias por exemplo. Em um intervalo de tempo curto, como uma semana, as variações de demanda por serviços

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podem ser niveladas com a execução de uma boa programação de atividades, antecipando atividades em dias de menor demanda para aliviar dias de maior demanda.

1 semana

Demanda de recursos, em horas

Programação: antecipar atividades

Figura 7: Correção dos desequilíbrios diários

da oficina através da programação

Para intervalos de tempo maiores como semanas ou meses, as oscilações de demanda sofrem influência de freqüências de períodos maiores, como mostrada na Figura 8, cuja programação apresenta maior grau de complexidade. A nivelação de serviços para este cenário requer, além da programação das atividades, o planejamento estratégico de produção do estaleiro representado, no presente estudo, pelo nível de utilização dos recursos das oficinas.

Influência em períodos pequenos

Influência em períodos grandes

Figura 8: Discretização em freqüências

Por tais razões, identificadas as diferentes freqüências da curva de demanda, foram descartadas as freqüências de baixo período e consideradas apenas as de períodos maiores. Aplica-se então a Transformada Inversa de Fourier para recompor a demanda com um resultado mais contínuo.

Determinação do nível ótimo de recursos

Em posse da demanda por serviços apresentada em uma curva mais

homogênea, é possível estimar o nível ótimo de recursos a serem disponibilizados.

A curva é descrita por picos de demanda devido ao acúmulo de serviços e datas de entrega coincidentes seguida por vales de ociosidade. Como a estimativa gerada pelo MRP é baseada sobre 100% da disponibilidade dos recursos do estaleiro modelo, há a necessidade de limitação destes, uma vez que várias atividades acontecem simultaneamente.

Horas acumuladas de utilização do recurso no tempo

Original Filtrado por Fourier Figura 9: Exemplo de filtragem de

freqüências por Fourier

Para tal objetivo, adotou-se um custo de ociosidade e sobrecarga de recurso por hora. Calcula-se o custo total da atividade, dependendo do balanço entre recurso disponível e demanda por serviço. Variando a quantidade de recursos disponíveis, tem-se diferentes custos totais associados a horas extras e ociosidade. A partir do ponto mínimo da curva de custos totais em função dos recursos, encontra-se o nível ótimo de recursos necessários.

Horas diárias disponíveis de

recursos

Cus

to u

nitá

rio d

a ho

ra

01.0002.0003.0004.0005.000

0 5 10 15 20 25 30Predominância de ociosidade

Predominância de hora-extra

Custo de produção em função da disponibilidade de recurso (máquina de corte)

Horas extras

Ociosidade+

Figura 10: Curva de custo da produção em

função da disponibilidade do recurso

Esta metodologia não visa garantir o atendimento de toda a demanda pela capacidade instalada no estaleiro, mas sim que o gasto com subcontratação seja menor que o custo de ociosidade proveniente da ampliação de recursos adicionais.

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8. Resultados

Dado que a edificação do navio dura 83 dias, a construção dos blocos desse navio prolonga-se 160 dias e há uma folga de segurança de 50 dias entre o término de ambas as atividades e que o dique deve estar sempre ocupado, ou seja, sempre haverá um navio sendo edificado no dique,

haverá períodos em que as oficinas estarão produzindo os blocos de dois navios, impactando fortemente na demanda. Para avaliar esse impacto, será avaliada a programação da produção das oficinas na construção de uma seqüência de embarcações. A Figura 11 ilustra esta situação.

Figura 11: Demanda da máquina de corte na produção de um e de cinco navios

É possível notar no gráfico a repetição de uma seqüência periódica. Com a filtragem das oscilações de alto período, é possível analisar a tendência global e fazer uma programação de mais alto nível. Como foi dito na seção de metodologia, as oscilações em altas freqüências podem ser ignoradas, pois são tratadas alocando-se o excesso de

demanda no vale que surge imediatamente antes ou após o pico.

Neste caso, o limite de corte da Transformada de Fourier utilizado foi de período inferior a 10 dias. A Figura 12 mostra o resultado da filtragem na linha mais escura. Pode-se observar que a demanda é muito mais bem comportada.

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Figura 12: Demanda da máquina de corte antes e após a filtragem

Para determinar a disponibilidade adequada da máquina de corte, utiliza-se o procedimento descrito no item “Por tais razões, identificadas as diferentes freqüências da curva de demanda, foram descartadas as freqüências de baixo período e consideradas apenas as de períodos maiores. Aplica-se então a Transformada Inversa de Fourier para recompor a demanda com um resultado mais contínuo.

Determinação do nível ótimo de recursos”.

Para determinar o custo associado à máquina de corte, buscou-se penalizar a ociosidade adotando um custo de oportunidade igual a 100% do custo da hora trabalhada. Já para a falta de capacidade, adotou-se um custo de horas-extras igual a 150% da hora trabalhada.

Ao variar a capacidade disponível de um recurso (no caso, da máquina de corte) no estaleiro, determina-se graficamente que é adequado dispor de aproximadamente 13 horas de disponibilidade, como se pode observar na Figura 13.

Porém, por tratar-se de uma máquina, a disponibilidade é de no mínimo 16 horas, caso ela não seja alugada ou compartilhada. Dependendo dos turnos de operação do estaleiro, pode chegar ao máximo de 24 horas diárias.

Fazendo-se a mesma análise para os demais recursos (cabine de jateamento, cabine de pintura, linha de painéis planos, linha de painéis curvos, ponte rolante, guindaste, caldeireiro e soldador), chega-se ao resultado expresso na Figura 14.

Figura 13: Custo associado para uma máquina de corte

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Figura 14: Síntese dos resultados do dimensionamento de ativos necessário

9. Conclusão

Esta ferramenta é simples e útil para estaleiros novos ou que passam por uma reformulação de suas oficinas, situações que serão comuns nos próximos anos com o aumento da demanda na indústria naval brasileira.

A ociosidade de equipamentos está associada, em geral, a investimentos mal calculados ou cenários que não se confirmaram, devendo ser quase sempre evitada.

Na prática, entretanto, possuir falta de capacidade pode ser pior que possuir ociosidade para o estaleiro, pois além do aumento de gastos (custo de ociosidade não implica em gastos), existe a dificuldade de encontrar pessoas e empresas tecnicamente capacitadas. Por isso, alguns estaleiros preferem trabalhar com ociosidade a realizar subcontratações, abrindo mão dos benefícios financeiros que a metodologia propõe.

A existência de recursos não utilizados na indústria naval brasileira e a falta de volume de produção verificados até recentemente (Pinto, 2007a) puderam conviver com baixa produtividade e obsolescência de equipamentos. Entretanto, o novo horizonte

que surge, com forte demanda nacional e retomada da participação da indústria brasileira no aquecido mercado naval mundial, deverão justificar tais investimentos.

Este trabalho mostra que é possível quantificar os diferentes níveis de demanda dos recursos e buscar uma solução que minimize uma função objetivo satisfatoriamente, podendo ser base para estudos de casos práticos e, conseqüentemente, com maior riqueza de detalhes.

10. Referências

COLIN, Emerson C. 2007. Pesquisa Operacional: 170 aplicações em estratégia, finanças, logística, produção, marketing e vendas. Rio de Janeiro, Brasil, LTC.

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International Group of Authorities, 2003. Ship Design and Construction, Volume I. SNAME (Society of Naval Architects and Marine Engineers), New Jersey.

MORTON, Thomas; PENTICO, David W. 1993. Heuristic Scheduling Systems: With

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Applications to Production Systems and Project Management. New York, USA, ETM.

PARK, K. 1996. Modeling and Solving the Spatial Block Scheduling Problem in a Shipbuilding Company. United Kingdon, Elsevier Science.

PINTO, Marcos M. O; COLIN, Emerson C. (orgs.); AKAO, Daniel R. P. de Lima. 2007a. Acesso às Práticas de Planejamento, Programação e Controle da Produção e Estoques de Estaleiros Brasileiros e Asiáticos Selecionados. São Paulo, Brasil, Centro de Estudos em Gestão Naval - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

PINTO, Marcos M. O; COLIN, Emerson C. (orgs.); STUPELLO, Bruno; ANDERSON, Valdir L.; MARZOUK, Sophia. 2007b. Metodologia para definição de estrutura de produto para um navio. São Paulo, Brasil, Centro de Estudos em Gestão Naval - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

PINTO, Marcos M. O; COLIN, Emerson C.; SANTORO, Miguel Cezar (orgs.); CARDOSO, João S. L. 2007c. Aplicação e Análise de um Protótipo de Sistema de Planejamento Operacional de um Estaleiro. São Paulo, Brasil, Centro de Estudos em Gestão Naval - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

PINTO, Marcos M. O; COLIN, Emerson C.; SANTORO, Miguel Cezar (orgs.); GOLDBERG, David J. K.; FAVARIN, Júlio V.; BARROS, Tiago; OURA, Fernando. 2007d. Planejamento, Programação e Controle da Produção e Estoques na Construção Naval. São Paulo, Brasil, Centro de Estudos em Gestão Naval - Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.