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ORGÃO INFORMATIVO DA COMISSÃO MINEIRA DE FOLCLORE – CMFL – 01-2018– Janeiro - Março - 2018 CARRANCA Comissão Mineira de Folclore: 70 anos rumo ao Centenário

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Page 1: Carranca 01 2018r - Folclore Minas · 2019. 8. 22. · Flausino Rodrigues Vale, Barbacena, conhecido musicólogo e parceiro de Vila Lobus. Franklin Sales, nascido em Santa Luzia,

ORGÃO INFORMATIVO DA COMISSÃO MINEIRA DE FOLCLORE – CMFL – 01-2018– Janeiro

- Março - 2018

CARRANCA

Comissão Mineira de Folclore: 70anos rumo ao Centenário

Page 2: Carranca 01 2018r - Folclore Minas · 2019. 8. 22. · Flausino Rodrigues Vale, Barbacena, conhecido musicólogo e parceiro de Vila Lobus. Franklin Sales, nascido em Santa Luzia,

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EditorialComissão Setuagenária

Antônio de Paiva Moura

Folclore é o objeto primordial da Comissão Mineirade Folclore. Mas não é e não deve ser o único, pois comopontua enfaticamente o presidente José Moreira de Souza,os estudiosos de Folclore devem explicitar o “saber viver dascomunidades”, como um todo. Todos os fundadores do grupode estudiosos da cultura tradicional do povo, que veio achamar-se comissão, exerciam atividades relacionadas coma cultura. Nasceram em cidades que tinham modo de vidaembasado nas tradições locais.

Aires da Mata Machado Filho, Diamantina, neto domédico, conhecido como Conselheiro Mata. Ao invés deseguir a vocação do avô e do pai, estudou humanidades noRio de Janeiro. Angélica Resende Garcia de Paiva, Sabará,pertencia à tradicional família Mota do Vale do Rio Doce,sendo prima do Cardeal Mota; compositora e professora demúsica. Antônio Joaquim de Almeida, Sabará, profundoconhecedor da história de Minas e fundador do museu doouro. Edelweis Teixeira, Umberaba, historiador, grandeconhecedor da cultura tradicional no Triângulo Mineiro.Flausino Rodrigues Vale, Barbacena, conhecido musicólogoe parceiro de Vila Lobus. Franklin Sales, nascido em SantaLuzia, ensaísta historiador. João Camilo de Oliveira Torres,nascido em Itabira, conhecido historiador mineiro. JoãoDornas Filho, nascido em Itaúna, fundador e mantenedordo tablóide conhecido como “Leite Crioulo” que versavasobre a herança cultura dos negros em Minas Gerais. LevindoLambert, nascido em Cambui no Sul de Minas, diretor doConservatório Mineiro de Música em Belo Horizonte. SaulAlves Martins nasceu em Januária, cidade em que vigora omodo tradicional de vida, como ficou patente em seu livro“Os barranqueiros”. Desta forma, todos os demais fundadoresda Comissão Mineira de Folclore estavam com a mão namassa. O que é mais importante é que em todos eles haviauma grande vontade de saber, a ambição do ser e não do ter.Foram todos indivíduos de classe e média que não deixaramfortunas para seus herdeiros, senão o exemplo de conduta navida.

O interesse pelos estudos da cultura popular tradicionalem Minas Gerais não é novo. (Joaquim Felício dos Santos(1828/1895) com a novela “Acaiaca”, valoriza a culturaindígena e a natureza; Bernardo Guimarães 1825/1884) naobra “História e tradições de Minas Gerais”; Afonso Arinos,em “Pelo Sertão” contemplaram os saberes tradicionais emsuas obras literárias. Mas, ainda no século XIX, o sabertradicional do povo ganhou o nome de “Folclore”, que passoua ser empregado e formalizado como disciplina científica.

Houve resistência a esse neologismo, porque é praxe usaro latim ou o grego para determinar a nomenclaturacientífica.

Aires da Mata Machado foi quem melhor registroua passagem dos primeiros folcloristas mineiros, comoAlexina Magalhães Pinto, de São João Del Rei; LindolfoGomes, de Juiz de Fora; Manoel Ambrósio, Januária eLídia Moinhos Plá, de Formiga. Todos eram professorese levaram seus estudos à educação infantil. Alexina estudouna França e escreveu livros sobre a cultura populartradicional. Lindolfo Gomes foi o primeiro a denunciar opreconceito dos radialistas que contavam anedotasridicularizando os habitantes do interior e do meio rural.Pode-se considerar que a atitude de Lindolfo Gomes,continua sendo parâmetro para os folcloristascontemporâneos. Manoel Ambrósio que era professor emJanuária escreveu o livro “Brasil Interior”, registrando neleo linguajar e os costumes do Médio São Francisco. LídiaMoinho Plá descreveu todas as sabedorias nas práticasagrícolas e as formas de organização nas comunidadesrurais.

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Comissão Mineira de Folclore -

septuagenáriaRaimundo Nonato de Miranda Chaves

Dia destes, jornal televisivo mostrou uma cena, no mínimo,

curiosa: Filme, no qual a Mona Lisa, com o sorriso

enigmático, a testa larga e as sobrancelhas ralas, ganha vida,

desce do quadro na parede e reclama da vida solitária,

isolada, sozinha, sem condições de comparecer às festas e

comemorações (mesmo no carnaval ela não vai comparecer,

eu acrescento).

Eu, então, me pergunto: Por que não ver a Comissão Mineira

de Folclore como a imagem de uma mulher atraente, meiga

e faceira. Substituir, só no meu pensamento, aquela carranca

horrível e amedrontadora pela imagem de uma jovem

senhora atemporal. Isto é, a senhora que encantou a todos

no 19 de fevereiro de 1948 continua elegante e bela neste

ano de 2018, sem cabelos grisalhos e sem rugas.

Aceita a sugestão, eu continuo: A Senhora Comissão

encantou ao Mestre Aires, ao Coronel Saul, ao Vaqueiro

Domingos, ao Professor Moura, ao Inovador Tião Rocha,

ao Filósofo Moreira e mais ao Intelectual Lázaro e ao

Jornalista Carlos Felipe. Estes homens foram selecionados

pelos seus pares para exercer a tarefa de guardião da

Senhora Comissão, cada um a seu tempo.

Agora, para esta função, foi escolhida uma mulher: Miriam

Stella Blonski, aliás a segunda mulher a exercer esta

importante função. A primeira foi Kátia Cupertino, em 2004.

Mais uma mulher salienta nesta história, trata-se de Fabiane

Ribeiro que ocupa a posição de guardiã substituta. A escolha

vem comprovar a luta pela autovalorização, o grito de

independência da mulher, que ocorre no mundo todo.

Para completar o grupo de auxílio à guardiã, dois jovens

abnegados: Marcus Vinicius Martins Costa e Daniel de Lima

Magalhães. O Conselho Fiscal, não! Ali só representantes

dos anciãos: Moreira, Moura e Nonato formam um grupo

onde o caçula está próximo dos 80 anos. Todos nascemos

antes da Senhora Comissão, talvez, por isso mesmo, somos

encantados com e por ela e formamos, assim, um conselho

de 300 anos.

Para concluir saliento que a Diretoria Executiva e o

Conselho Fiscal da CMFl compõem-se de mulheres, de

jovens e de idosos, também com representantes da capital

e do interior do Estado. Isto é bom! Exige a participação

de todos os grupos.

Voltando à figura da Senhora Comissão devo lembrar que,

nestes 70 anos, ela sorriu alegre e feliz durante muito

tempo, mas viveu, também momentos de tristeza,

depressão e choro. Agora, a CMFl está pronta para

período de vacas gordas, continuação do período que

viveu sob a liderança do Presidente Moreira. Temos ainda

a acrescentar – componente principal desta história – o

Corpo de Associados, que se encontra renovado, com

muita gente ativa, dedicada e disposta ao trabalho. Temos

fé no comportamento do Corpo de Associados: presente,

questionador, crítico, participativo e com muitas e boas

sugestões.

Editorial

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EditorialAires, o Eficiente VisualCongênito

José Moreira de SouzaA Comissão Mineira de Folclore celebra no dia 19 defevereiro deste ano de 2018 setenta anos de luta pelosaber excluído.É momento de convergir nossa atenção para uma pessoailuminada, excepcionalmente iluminada. Digo de Aires daMata Machado Filho.Atribuo ao menino Aires todos os méritos por haver nascidocom o que chamamos de portar dificuldades visuais. Airesteve um Pai Augusto Aires, no pleno sentido de Aires e deAugusto. Foi com o Pai que aprendeu a ler e escrever antesde ingressar na escola. Na escola, sua tia Eponina escreviana lousa os pontos em letras garrafais adequadas à condiçãodo aluno.Logo em seguida, Aires aprendeu a ler com as pontas dosdedos. Dispensava a visão. Com domínio do sistema Braille,o jovem se matriculou no Instituto Benjamim Constant noRio de Janeiro onde cursou o equivalente ao nível médioatual. Diplomado, eis Aires pleno de habilidades para lidarcom os “cegos” do Instituto São Rafael em Belo Horizonte.Tão logo pode aperfeiçoar o contato com o mundo, ojovem Aires se determinou diretrizes de comunicação:

1. Convocar pessoas de boa vontade paracompreenderem ações adequadas à superaçãodas dificuldades de interpretar o mundoorientadas pela visão. Surge desse modo, em 1931sua primeira obra Educação dos Cegos no Brasil. Éa socialização dos próprios conhecimentos a partirda vivência de 22 anos de ler o mundo com osdedos. Nessa obra, o autor conclui com propostade uma política de universalização da educaçãopara os cegos em todo o território nacional. Hápropostas pioneiras do que se chama, hoje, deeducação inclusiva: “Enquanto esse sistemaeducacional não estiver estabelecido em todasas unidades da Federação, todas as escolasdeverão ser franqueadas a qualquer cegobrasileiro, devendo o Governo de seu Estadonatal custear as despesas de sua viagem até aescola mais próxima.”

2. Estudar com atenção a terra que o viu nascer; suaSão João da Chapada e, por extensão, a terra deseus pais, Diamantina. Desse empenho brota aobra pioneira O Negro e o Garimpo em MinasGerais iniciada em 1929 e publicada em 1942 poruma editora de alcance nacional.

3. Atento aos ao Movimento Modernista, Aires sededica à linguagem e aos processos históricos. Tãologo se funda o Serviço do Patrimônio Histórico eArtístico nacional, Aires é convidado por Rodrigo

Melo Franco de Andrade para elaborar relatóriosobre o Patrimônio de Diamantina. Desse amploestudo surge Arraial do Tijuco: Cidade DiamantinaPublicada em 1945.

4. Chamar a atenção do mundo para os instrumentosque favorecem a comunicação. Esta mensagemsintetiza a pregação pelo exemplo: “Ouvindo,aprende-se muito mais do que vendo. O ouvido émais intelectual do que a vista, porque a audiçãoleva ideias ao cérebro, e os olhos levam imagens.”A atenção para as janelas para o mundo o fazpublicar em 1980 O Caso de Helena Keller - BeloHorizonte, Editora Itatiaia, 1980. Obra que convocao leitor a compreender a pergunta: como as assimchamadas deficiências mesmo as mais profundasnão fecham todas as janelas para o mundo.?

Quero defender que a Comissão Mineira de Folclore nãoencontraria alguém mais genial do que Aires da MataMachado Filho para reunir ao longo do ano de 1948 outros27 companheiros para fundar essa associação.

Segundo a carne, nasci de Augusto Aires daMatta Machado e de Maria Flora de Godoy daMatta Machado, a 24 de fevereiro de 1909, emDiamantina. Teria sido em Sabará, se minhamãe, no oitavo mês, não cismasse de ir para ondeestava a dela. A premonição dessa primeiraviagem - parte de trem e vinte e cinco léguas acavalo - prendeu-me à terra: moro em BeloHorizonte, mas vivo em Diamantina. Por seremprimos os pais, dizem os médicos, o meninotrouxe catarata congênita e atrofia de nervoóptico.Pelo amor, tornei a nascer em 25 de março de1940, quando casei com Maria Solange Mourãode Miranda. Devo-lhe muito, muito. Além domais, dá-me força para vencer a rêmora, queme dificulta a navegação.Fui para a escola já sabendo ler e escrever, graçasa meu pai. O curso primário, onde aprendi o quea curiosidade insaciável procura ampliar eaprofundar todos os dias, eu o devo a Eponinada Mata Machado, extraordinária professoraque escrevia os “pontos”, em letras graúdas,para a fraca visão do aluno, seu sobrinho. Osecundário, já na posse do sistema Braille, queme ensinou outro grande professor e amigo, JoãoGabriel de Almeida, pude fazê-lo no InstitutoBenjamim Constant para cegos, no Rio, onde mediplomei em 1927.Em seguida a conferência, lida perante opresidente Antônio Carlos, no Instituto São

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CARRANCA PÁGINA 5

Relatório

Rafael, que o idealismo e a situação do jovemajudaram a erguer, entregaram-me turma deprimeiras letras que levei, depois como professorde Português, até à formatura.Entrementes, lecionei Português em casa, naresidência dos alunos; Português e Literatura,no Instituto de Educação; Folclore Aplicado nosCursos de Treinamento da Fazenda do Rosário eno Instituto Superior de Estudos Rurais, queorganizei com Gustavo Lessa Filho e HelenaAntipoff; finalmente, com o título oficializado deDoutor em Letras e Bibliografia Filológica eLiterária, na cátedra de Filologia Românica daFaculdade de Filosofia e Letras, mais tardeincorporada à UFMG, de que sou ProfessorEmérito desde 1979, e na cátedra de LínguaPortuguesa da Faculdade de Filosofia “SantaMaria”, hoje integrada na UniversidadeCatólica. Co-fundador dessas duas faculdades,também o fui da Faculdade de Filosofia e Letras,em Diamantina, que dirigi, e onde fui titular deLíngua Portuguesa e Linguística Geral.Na administração pública, exerci os cargos deChefe de Redação no antigo ConselhoAdministrativo do Estado, Chefe de Gabinete naSecretaria do Interior e Justiça, colaborador doCentro de Pesquisas Educacionais, chefe doServiço de Orientação Técnica do Ensino daLíngua Portuguesa, assessor, na Secretaria deEducação. Faço parte do Conselho Estadual deCultura, desde a sua criação, e representei acomunidade no Conselho Universitário daUFMG.Jornalista, desde 1928. Nesse ano, saiu o meuprimeiro artigo no Diário da Manhã, e o segundo,no Minas Gerais, onde me aposentei comoredator, cabendo-me as funções de editor da seçãoMinas Eterna, de editorialista e de um dosfundadores do Suplemento Literário, de cujaprimeira comissão diretora fiz parte. Co-fundador de O Diário e de Folha de Minas, ondeinseri sueltos e artigos assinados, colaborei emoutros jornais e revistas: de Belo Horizonte -Diário de Minas, Correio do Dia, Surto,Mensagem, Revista de Estudos Brasileiros; do Rio- Diário de Notícias, Jornal do Comércio, Boletimde Ariel, Revista do Brasil, Cultura e Política;de São Paulo - O Estado de São Paulo, Folha daManhã, Folha de São Paulo, Arquivo Municipal;de várias folhas de capitais do País, mediantecadeia de colaborações. Em 1933, inventei acoluna de jornalismo gramatical “Escrever

Certo”, no Estado de Minas. Aí, pela forma aomeu limitado alcance, tenho dado vazão aoespírito público, procurando ajudar os que nãopuderam ter escolaridade completa,aprendendo, por minha vez, com as dúvidas queos consulentes me transferem.Dessa matéria, compõe-se grande parte daminha biografia. Consta sempre do meu livromais recente. O primeiro, Educação dos cegosno Brasil, veio a lume em 1931. Assinalaram ocinquentenário o Prêmio “Machado de Assis”,da Academia Brasileira de Letras, o PrêmioFernando Chinaglia a Personalidade Culturaldo Ano da União Brasileira de Escritores, alémde outras homenagens: do Instituto Histórico eGeográfico de Minas Gerais, em sessão especial;da Academia Municipalista de Letras, cujacontribuição o Suplemento Literário do MinasGerais publicou; do Conselho Estadual deCultura, que dedicou ao evento número especialde sua revista.Fui eleito para a diretoria do Sindicato dosJornalistas Profissionais. Deu-se o meu nome aoprêmio que distinguiu o arquiteto vencedor, emconcurso para o projeto do novo edifício da Casado Jornalista.Pioneiro de programa cultural pelo rádio, naGuarani, em 1936, produzi por vinte e quatroanos, na Inconfidência, a partir de 1937, váriosoutros; sucessivamente: “Crônicas Leves”,“Vultos e Fatos de Nossa História”, “Consultasde Linguagem”.Educação dos cegos no Brasil foi o primeiro livropublicado, em obediência ao acordo luso-brasileiro de 1931. Divulguei esse sistema embrochura, como em aulas ministradas aprofessoras primárias e funcionários daSecretaria do Interior e Justiça. Pela indicaçãode Afonso Pena Júnior, colaborei no“Vocabulário Oficial” de 1943, da AcademiaBrasileira. A convite de Antenor Nascente,integrei comissão assessora da Câmara dosDeputados, para o projeto de que resultou a leisimplificadora da acentuação gráfica. Fuiencarregado da revisão linguística do projeto deCódigo de Processo Penal pelo Ministro daJustiça, Ibrahim Abi-Ackel.Pertenço às seguintes instituições culturais:Academia Brasileira de Filologia, SociedadeBrasileira de Antropologia, Sociedade Brasileirade Folclore, Academia Carioca de Letras,

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EditorialAcademia Mineira de Letras, Instituto Históricoe Geográfico de Minas Gerais, AssociaçãoMineira de Imprensa, Sindicato dos JornalistasProfissionais, Comissão Mineira de Folclore, deque fui presidente. Além da láurea maior daAcademia Brasileira de Letras, pelo conjuntoda obra, a mais importante instituição culturaldo País concedeu o Prêmio ‘João Ribeiro’(Filologia e Folclore) a O negro e o garimpoem Minas Gerais, enquanto Crítica de Estilos eLinguística e Humanismo, outros livros meusdevidamente inscritos, receberam o Prêmio“Cidade de Belo Horizonte”.Entre as condecorações recebidas, mencionem-se a Grande Medalha da Inconfidência e aComenda do Infante Dom Henrique.Aposentei-me na UFMG em 1965. Com algumatristeza: aspirava à cadeira de Linguística Geral,que me foi negada. Também, nunca poderiaaturar o terrorismo intelectual. Com poucapaciência e escassez de saliva para lecionar, hojeme limito a conferências encomendadas ealguma tarefa na Faculdade de Letras, de cujacongregação tenho o direito de participar comoProfessor Emérito. Autodidata, acredito maisno aprendizado que no ensino; sempre mantivedúvidas quanto à eficácia do meu. E todavia,não posso negar a fé na educação. Confesso oprazer de encontrar pessoas que se apressamem declarar a sua condição de antigos alunos.A experiência desses últimos anos deeditorialista do Estado de Minas, que mereadmitiu depois do aposentado, faz-me sentir,mais vivamente que antes, a significaçãosingular da profissão. Para até discutir comoutros as ideias que eu mesmo defendo.Apreendo a influência da comunicaçãoimediata. Esse é o privilégio do anonimatojornalístico.

Este é Aires dizendo de si mesmo - Coisa rara! Aires épessoa que cuidou, ao longo de uma curta vida, - faleceutragicamente na BR-040 aos 76 anos -, de ultrapassartodas as condições que lhe limitavam interpretar plenamentea vida.Alguns depoimentos sintetizam o percurso de Aires.Ele já era conhecido em todo o Brasil, quando o vi certodia dobrando a esquina da Rua Professor MagalhãesDrummond em direção à, então, Faculdade de FilosofiaCiências e Letras da Universidade de Minas Gerais. Pelaprimeira vez pude admirar Aires em pessoa. Não tinhaacompanhantes, não usava nenhuma bengalinha branca.Algumas alunas reclamavam de suas aulas, por serem muito

monótonas. Imagino, hoje, que exigiam do professor umaentonação acompanhada de gestos. Algo como aulaespetáculo. Sei, hoje, mais do que antes, que Aires valorizavaa audição. Saber ouvir, para ele, era o valor maior dacomunicação.Imagino que, depois disso, ele se dedicou mais atentamenteaos múltiplos processos de comunicação: como desenvolvero conhecimento a partir do paladar e da degustação; comointerpretar o mundo pelo tato ou pelo olfato. Ou comoconstruir o mundo a partir da pura e absoluta introspecção.Imagino mais. Penso que Aires se inquietava com a ênfaseaos sentidos celebrada, venerada e adorada como DeusSupremo da Modernidade. Mais ainda com o mundotelevisivo. Ao “Nada pode ser entendido sem que antes tenhapassado pelos sentidos”, certamente, Aires insistia nopreceito: “a não ser a própria capacidade de entender einterpretar o que se sente”. Vivi apenas uma vez essamensagem que para ele era dogma: “você não sabeminterpretar o que vem pelo ouvido porque somente interpretamo que é alcançado pelos olhos.” Será a especialização dasinterpretações a partir de um sentido dominante: “No mundotudo depende do olhar; tudo depende do ouvido, tudodepende do olfato, tudo depende do toque, tudo dependedo paladar” como se o interpretar se pudesse dividir empedaços sensoriais que levará Aires a publicar, em 1980sua análise do caso Helena Keller, o qual completa o cicloiniciado em 1934 com a tradução da obra de EduardoClaparede Psicologia da Criança e Pedagogia Experimental.Inúmeros depoimentos de pessoas que conviveram com Airesreforçam a convicção de que Aires se orientava espacialmentesem uso da visão.Francisco Iglésias, após repetir encantado o poema de CarlosDrummond de Andrade – “Oh!, Aires dos Ares Bom!” –declarou:- Fomos a Diamantina. Aires nos levou ao alto do cruzeiroda Serra onde se contempla toda Diamantina. De lá, ele nosapontava com precisão cada lugar e narrava as marcasdesses locais. A Grupiara, o “Alto do Poeira”; “a Casa daGlória”; “o Arraial dos Forros”; “a Palha”, “o Jogo da Bola”.E ele na via nada!Domingos Diniz:- Fui algumas vezes com Aires a Diamantina. Ele dizia: “Aquiposso andar com segurança. Conheço cada pedra de cadarua. Estou em casa.”

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Editorial

Mestre AiresMestre e amigo são dois títulos que cabem ao

professor, linguista e folclorista Aires da Mata MachadoFilho.

Ele lecionava língua portuguesa na Faculdade deFilosofia e Letras Santa Maria que veio a pertencer à, hoje,Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Conheci-o como meu professor em longas aulas deportuguês em que, somados à Gramática da Língua Pátria,permeavam os casos, cheios de humor, de sua cidade natal.

Naquela época, início da década de 1960, semprede terno preto, camisa branca e gravata, apresentava-se,todas as manhãs, na Faculdade. Fizemos, nós mesmos, seusalunos, um programa curricular sobre os assuntos de queprecisávamos e, a cada dia, sugeríamos um tema e, assim,fizemos um bom curso que atendia aos nossos interesses enecessidades, sem desgaste, sem formalidades. O professordominava os assuntos e apresentava-os de forma leve,descontraída e bem humorada, só com conversa, sem outrosrecursos didáticos como os mestres da Antiguidade Clássica.

Ao fim do curso éramos bacharéis em LetrasNeolatinas e o elegemos o Professor Homenageado danossa turma (1963). Nessa ocasião ele, Mestre Aires,ofereceu-nos um almoço em sua casa. Lá, tivemos o prazerde conhecer a sua Solange (Mourão de Miranda) simpatiade pessoa. Conhecemos também sua organizadíssimabiblioteca onde, entre vários e raros compêndios, figuravaa placa da Rua Siderosa, nome antigo da sua Rua ProfessorMagalhães Drumond.

Passaram-se anos. No início da década seguinte,meu marido, Guido Araújo, foi convidado a trabalhar naFaculdade de Letras, recém criada em Diamantina.Aceito o convite, começou a dar aulas de Teoria daLiteratura e de Literatura Portuguesa na Universidade doVale do Jequitinhonha. Toda sexta-feira, lá ia ele “daraulas em Diamantina”. Voltava no sábado, tarde da noite,exausto e feliz. O contato com a cidade, com a moçadada Faculdade e, sobretudo, com os colegas econterrâneos tornava mais fácil o trabalho. E o MestreAires estava lá, cumprindo sua vocação de professor ealargando os horizontes diamantinenses.

Em seu livro “Dias e Noites em Diamantina” (1972 –Editora do Autor) à página 09, ele, comentando agastronomia do restaurante Bororó, cita nominalmente os“companheiros do eito”, os professores da Faculdade deFilosofia. O citado livro é um “roteiro sentimental” em queo Mestre passeia por Diamantina, seu “folclore, turismo,lembranças e sugestões”.

No início da década de 1970, várias vezes tivemoso privilégio de recebê-lo em casa para um uísque amigo.Longos papos rolavam em torno de assuntos filosóficos e

políticos da época. Imperavam, no entanto, as doceslembranças da terra diamantina – turismo, folclore – etambém do progresso da Faculdade recém criada e quecrescia a olhos vistos.

Passaram-se os anos. O Mestre também passou.Foi-se do nosso convívio e da nossa vista. Voltou ao Pai.

Hoje, já velha e cansada, encontro, em evento daComissão Mineira de Folclore, uma paixão antiga: a artepopular, os gestos, os versos, a vida mais pura do povo.Vêm-me à memória as aulas e os assuntos de cinquentaanos atrás. E, então, reencontro o velho Mestre Aires,através do folclore e do apego a Diamantina.

Fica aqui um registro e um louvor a Aires da MataMachado Filho que gostava muito de gritar um “Viva!” àspessoas que admirava. Faço-o eu agora: “Viva a memóriado Mestre Aires!! Viva!

Mariza Lúcia Dias de AraújoBelo Horizonte – MG outubro de 2017

[Informação adicional. Mariza é esposa de Guido de OliveiraAraújo, diretor secretário da extinta AFAGO que acolheu emmomentos de desespero a Comissão Mineira de Folclore noano de 2011 -2012. Além disso, Mariza é irmã do professorJosé Maria Dias, nome de referência à História Administrativade Minas Gerais. José Maria teve sua obra maior aprovadapara publicação pelo Centro de Estudos Mineiros, no ano de1970. Título; O imposto do Quinto em Minas Gerais. Poisbem, a obra foi ter ao Centro de Estudos Mineiros edeterminada sua publicação. A imprensa universitáriaconsumiu algo como uma tonelada de linotipos em liga dechumbo e antimônio – tecnologia da época para formatarlivros -. Fez-se a primeira revisão e faltava apenas ao autorencaminhar as provas da segunda revisão. Mas houve “umapedra no meio do caminho” e José Maria desistiu dapublicação. Tenho notícias de que dará, finalmente, ao públicoessa obra importantíssima, para glória de todos nós eesclarecimentos sobre a “pedra no meio do caminho!”.]

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RelatórioRelatório de Gestão - Período 22 deagosto de 2017 a 19 de fevereiro de2018.Como estava previsto, a gestão empossada no dia 22 deagosto de 2014 encerraria o período de mandato no dia 22de agosto de 2017. Infelizmente, apesar de essecompromisso ser lembrando insistentemente nas reuniõesordinárias e extraordinárias da Assembleia Geral daComissão Mineira de Folclore, não houve membros que se

oferecessem para preencher todos os cargos de Presidente,Vice-presidente, Secretário e Tesoureiro. Desse modo, aAssembleia Geral da Comissão Mineira de Folclore reunidano dia 22 de agosto de 2017 prorrogou o mandato daDiretoria até o dia 19 de fevereiro de 2018, data em que aComissão Mineira de Folclore celebra 70 anos.Desse modo, o presente “Relatório de Gestão” cobre operíodo mencionado acima.A ata apresentada em seguida detalha o que se deliberou.

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CARRANCA PÁGINA 9

Relatório

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RelatórioAgosto na Biblioteca Pública do Estado de MinasGerais celebra a memória de Domingos DinizAs atividades do mês de agosto se iniciaram com a exposição“Folclore: para não esquecer quem somos” criada ecoordenada pela Biblioteca Pública Estadual de MinasGerais. Nesse espaço emblemático de Minas Gerais foidado destaque especial à pessoa e às obras de DomingosDiniz, Presidente de Honra da Comissão Mineira deFolclore, falecido no dia 12 de julho de 2017.

22 de agosto – Sessão solene decelebração do Dia do Folclore.

Estava prevista a eleição da nova diretoria da ComissãoMineira de Folclore para o período 2017 a 2020. Contudo,não houve quem se dispusesse a compor uma chapacompleta. Apenas a prestimosa companheira MercêsAmbrósio se comprometeu a preencher o cargo de Vice-Presidente. Em face ao impasse, a Assembleia Geral daComissão Mineira de Folclore aprovou a prorrogação domandato da atual diretoria até o dia 19 de fevereiro de 2018,

51ª Semana Mineira de Folclore

Dia 21 de Agosto de 2017 -Horário: 19h30Auditório da FMC / PBH Rua da Bahia,888 - Centro BH

Apresentação do Inventário das Manifestações Culturaisde Governador Valadares, num recorte de um projeto maisamplo que é inventariar as manifestações culturais da regiãodo Vale do Rio Doce.Projeto autoria: Edileila Portes, Comissão Mineira deFolclore e Patrícia Falco Genovez Universidade Vale doRio Doce GIT/UNIVALEMesa redonda

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CARRANCA PÁGINA 11

Relatório

oportunidade em que seria eleita e empossada a Diretoriapara o período 2018 a 2020.

22 de agosto – Posse de novos membros daComissão Mineira de Folclore.No dia 22 de agosto, tomaram posse como membrosefetivos e colaboradores da Comissão Mineira deFolclore os seguintes estudiosos:Alba Valéria Freitas Dutra - Almenara MGDébora Maria Salgado Grossi – Psicóloga - BeloHorizonteElídia Rosário Braz - Belo HorizonteElizabete Orestina dos Santos Nascimento - BeloHorizonteFabiane Ribeiro Santos – Pirapora MGFernanda Abbapietro Novaes - Belo HorizonteFernando Magela Frabini - Belo HorizonteJacyara Edwiges Rosa de Araújo - Belo Horizonte

Josélio Socorro Teixeira - Belo HorizonteLais Moreira Fernandino - Belo HorizonteMarcus Vinícius Martins Costa – Administração Pública eDireito - Belo HorizonteMariângela Diniz – Pirapora MGMauro Guimarães Werkema – Jornalista Belo HorizonteRafael Silva da Cruz (Rafael Sol) - Belo HorizonteTiago Araújo - Belo HorizonteVanessa Lorena Anastácio - Belo HorizonteMembros ColaboradoresAdenizo Pereira Argueles – Mestre Linguinha - BeloHorizonteNorberto Fernandes Damasceno – Mestre Beto Onça –VespasianoNorberto Santos de Souza – Mestre Thibau - BeloHorizonte

Lançamento da Revista daComissão Mineira de FolcloreDia 23 de Agosto de 2017: 19h30 HsCasa do JornalistaAv. Álvares Cabral, 400 - Centro BH

A Revista da Comissão Mineira de Folclore teve seu iníciono ano de 1976 com o nome de Boletim Informativo daComissão Mineira de Folclore.Saudando seu aparecimento, Aires da Mata Machado Filhoescreveu:

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Tudo no mundo tem a sua hora. Este se revela omomento de aparecer a publicação o?cial daComissão Mineira de Folclore. Já nãopermanecerão atupetadas de trabalhos inéditosas gavetasdos mais laboriosos. O fato de ter onde publicarconstituirá estímulo a novas pesquisas. Por estecaminho, o folclore em Minas Gerais deixará deser o grande desconhecido que se não conseguedivulgar.

Transformada em Revista da Comissão Mineira deFolclore, essa publicação completa 41 anos marcada deesforços e desa?os de vir à luz em busca de leitores prontospara participar de rodas de conversa.A que se apresenta e será lançada na Casa do Jornalista deMinas Gerais tem como foco as encenações que permeiamnosso cotidiano com o nome popular de “Contos do Vigário”e aos delitos tecnicamente denominados de “estelionato”.E aos incômodos previstos no “Código de Defesa doConsumidor”.

Os artigos são estruturados em eixos de valoresfundamentais do saber viver: alcançar o poder e falsi?car oprestígio; buscar afeto e falsi?car o amor; e comprarmercadorias e usar moeda falsa. A esse conjunto de saberespara obter vantagens nas relações de poder, de afeto e demercado deu-se o título Quanto vale o espetáculo? porqueos autores da fraude envolvem como atores convidadossempre quem vai pagar com submissão, carência afetiva eambição o que é apenas uma quimera e confundir quemrepresenta com quem realiza. O leitor poderá se deliciarcom artigos “Da arte de baldrocar” de Antônio de PaivaMoura; “Trocas, o absoluto e o relativo” de José Moreirade Souza; “Regatear é preciso” de Raimundo Nonato deMiranda Chaves; “A metafísica do absurdo” de LuisSantiago; “Coragem e orgulho aborígene na memória mineira- Pedro Antônio Ramos, “Pedro Caiapó” de Maria José deSouza – Tita; “Lotes na Lua e especulação imobiliária”; “OReino dos Vigaristas”; e “Você já foi ator neste espetáculo?”de José Moreira de Souza

03 e 04 de setembro –Reconhecimento do roteiro inicialde percurso do Rio das Velhas deSabará até JaguaraCom a participação da empresa K&A dirigida peloprofessor doutor Ricardo Figueiredo e adesão devoluntários entendidos em navegação de nossos rios –Rafael G. Bernardes, ex-participante das aventuras doProjeto Manuelzão, e Soren Knudsen, grandeaventureiro em rios da África, Ásia, Europa e América -

, a Comissão Mineira de Folclore aderiu a ensaio deum projeto cujo objetivo era de celebrar os 150 anosde Viagem de Sabará ao Oceano Atlântico relatadosna obra de mesmo nome publicada por Richard Burtonno ano de 1869. A viagem de Canoa teve início nacidade de Sabará no mês de agosto do ano de 1867.Percorreu o Rio das Velhas e prosseguiu pelo Rio deSão Francisco até se encontrar com o Oceano Atlântico.

Os encontros preparatórios para celebrar essa aventurase desdobraram desde o mês de maio, com estudoatento de dois volumes da obra de Richard Burton:Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho e Viagem de

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RelatórioCanoa de Sabará ao Oceano Atlântico. Foram selecionadosnessas obras o detalhamento do capítulo 36 do primeirovolume, no qual o autor discorre sobre “O Mineiro” erecupera relatos de outros viajantes estrangeiros queestiveram em Minas Gerais, e também os capítulo 27 e28 em que se refere a “O Mineiro Branco e o MineiroPardo” cap. 27 e “O Mineiro Preto”, cap. 28. Do volume IIViagem de Canoa de Sabará ao Oceano Atlântico foramselecionados para o primeiro ensaio de recuperação daviagem de Burton, os três primeiros capítulos : “De Sabaráa Santa Luzia”, capítulo I; “De Santa Luzia a Jaguara”,capítulo II e “Jaguara” capítulo III.

Na recuperação dos relatos de Richard Burton cadasegmento de discurso foi distribuído obedecendo aosCódigos de referências 01 localização; 02 descrição fato;03 comparação lugares; 04 comparação técnicas; 05comparação medidas; 06 continuidades; 07 comparaçãovalores.

A questão básica de orientação foi: O que Richard BurtonRegistrou e com qual base de interpretação viu o queviu. Um exemplo a barca ou ajoujo que descreve aoembarcar em Sabará é descrita de acordo com osreferenciais de quem a construiu ou com os referenciaisdas em que viajou no Mississipi ou no Ganges, ou noDanúbio, ou no Reno, ou no Rio Nilo? A base cartográficade que se vale é a de Liais, mas por que ele não empregaa mais recente que é a de Gerber?

A preparação para recuperação da viagem cuidavaportanto de dois aspectos:

1. O que Burton relatou e com quais recursos relatou.O que estava disponível em seu tempo paracompletar os relatos e que se

tornaram áreas de silêncio – o que ele não viuou desprezou – e de onde ele busca ênfasespara destacar o que destaca.

2.Quais os recursos atuais para o “olharinterpretativo” estão disponíveis em 2018 paraSoren Knudsen, Rafael Bernardes e JosélioTeixeira?

A equipe da Comissão Mineira de Folclore se propôs adisponibilizar dois cenários: o primeiro das informaçõesdos registros da Lei de Terras de 1850 com destaquepara os usos predominantes da população ribeirinhados rios das Velhas e São Francisco. Acompanhamentodas atualizações cartográficas dos trechos percorridosaté os dias atuais e a mudança de uso. Orientaçãopara atenção à permanência dos usos narrados porBurton e as representações destacadas e os usosatuais.

Nos dias 03 e 04 de setembro fez-se o primeiro ensaioem campo, partindo de Roça Grande até Macaúbaspara dimensionar a base de apoio terrestre aosnavegantes. Curiosamente, o ajoujo com capacidadepara transportar até 15 pessoas, com mesa deescritório na popa, foi substituído por dois caiaques(???). O escritório por equipamentos de registro de voze imagem além de drones.

A base de sustentação dos navegantes se estabeleceuno povoado de Pinhões, município de Santa Luzia, porficar a meio caminho entre Sabará e Jaguará.

Nesse momento, a equipe já contava com nova parceriaconstituída pela professora doutora Doralice de BarrosPereira do Instituto de Geociências da UFMG.

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Este evento foi anunciado destameneira:

II Colóquio “Natura, Naturans: Natura Naturata.Gostaram do nome? É latim de brincadeira cujatradução é “Natureza naturalizante e Naturezanaturalizada”. O I Colóquio com esse nomeaconteceu no auditório da Faculdade de Letrasda UFMG coordenado por Ricardo Figueiredo eparticipação da FAFICH. Foi aberto peloprofessor doutor Mauro Lúcio Leitão - MauroCondé -, o II Colóquio é coordenado pelaProfessora Doutora Doralice de Barros Pereira,do Instituto de Geociências, o grupo K&A e aComissão Mineira de Folclore. Viajaremos peloRio das Velhas e anotaremos a oposição entreViver do Rio - Natura, naturans - e o Rio quepede socorro - Natura naturata. Vale lembrar acena mais comovente do “Bodas de Sangue” deFederirco Garcia Lorca: “DESPERTE E NOIVANO DIA DE SUAS BODAS””

28 de setembro a 1 de outubro:Comissão Mineira de Folclore atualizaviagem de Richard Burton – De Sabará aoOceano Atlântico - 150 anos após.De Sabará a Santa LuziaDe Santa Luzia a Barreiro do Amaral,Pinhões e MacaúbasDe Macaúbas Das Freiras à Fazenda dasMinhocas e Ao Parque do Sumidouro.Do Parque do Sumidouro em Lagoa Santaaté a Fazenda Velha de Jaguara emMatozinhos

No dia 28 de setembro, com a presença da imprensa, no“porto” de Sabará, iniciou-se a primeira etapa da viagemde canoa de Sabará ao Oceano Atlântico. Nesse primeirodia, partiu-se de Sabará até Roça Grande, de Roça Grande

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até General Carneiro e de General Carneiro até o “porto”de Santa Luzia. No dia 29 de setembro , Soren Knudsen e Rafael Bernardesfizeram o percurso a partir do suposto “Porto” de SantaLuzia até o ancoradouro do Mosteiro de Nossa Senhorada Conceição de Macaúbas, com paradas no povoado doBarreiro do Amaral e Pinhões.No dia 30 foi a vez de realizar o percurso mais longo nummesmo dia com início em Macaúbas, com parada emTaquaraçu de Baixo, Fazenda das Minhocas, Ponte quedivide Lagoa Santa com Jaboticatubas e finalizar o percursono povoado onde se situa o Parque do Sumidouro. Foi umdia muito chuvoso e cheio de obstáculos para a equipe deapoio terrestre. Eu escorreguei e cai por três vezes eencharquei as roupas. Valeu. Essa aventura histórica colocaem contraste a permanência de Macaúbas, as fotos mostrama escolha atenta de Felix da Costa, no ano de 1714 delocalizar o Recolhimento, depois Educandário Feminino e,finalmente, Mosteiro, em lugar preciso. No alto as belíssimasconstruções do século XVIII, em baixo, uma ampla vargempara garantir as condições de subsistência – a VargemGrande - A proximidade do rio favorece o garimpo e apesca. Burton visitou o Educandário e fez registros preciosos:as moças educandas, as freiras, os escravos, as atividadeseconômicas.Beiramos o rio e registramos o encontro do Rio Taquaçucom o Rio das Velhas no povoado de Taquaraçu de Baixoque faz divisa de Santa Luzia com Jaboticatubas.Prosseguimos pela Fazenda das Minhocas e alcançamos aponte da MG10 que faz a divisa de Lagoa Santa comJaboticatubas. Ali, nossa companheira de Comissão Mineirade Folclore, Ione Amaral, nos esperava. Cansados osnavegante estacionaram em um banco de areia,prosseguindo para o fim da jornada do dia para o Parquedo Sumidouro. Mais um momento para sintetizar a históriados atravessamentos da modernidade em Minas. FernãoDias Pais ocupa o centro das conversas.Do ponto de vista da Comissão Mineira de Folclore, estaaventura nos permite fixar os diferentes momentos do SaberViver em Minas Gerais. Partimos de Sabará, passamos porSanta Luzia, chegamos ao ponto alto da formação da Mulherem Minas Gerais, retornamos à aventura das Bandeiras eencerramos com uma história das ações corruptassimbolizadas no “Vínculo da Jaguara”. Burton afirmou:“fomos recebidos pelo Dr. Quintiliano José da Silva, ex-Presidente de Minas (...) que nos apresentou à dona dacasa, Dona Francisca dos Santos Dumont”. Tem passadoe futuro nesse encontro.A história da corrupção é mais saborosa e permanente: “Umcerto Coronel Antônio de Abreu Guimarães ajuntou grandefortuna, com 750 escravos e com esquecimento de pagarao governo os impostos devidos sobre a exportação de

diamantes procedentes de Diamantina e outros lugares. Tinhauma propriedade enorme de 36 léguas quadradas...” É desselugar que Burton nos leva para conhecer Lagoa Santa,Fidalgo, o que é hoje, Pedro Leopoldo e Matosinhos. Porlá ele ficou uma semana e nós encerramos aqui nossopercurso pela Região metropolitana de Belo Horizonte.

ENFIM JAGUARA E O RIO DASVELHASEncerramento da etapa metropolitana.Eram 16:00 horas deste dia 1 de outubro. Soren Knudsene Rafael Bernardes aportaram à Fazenda de Jaguara -Jaguara Velha – após partirem pela manhã para cumprir aúltima etapa da fase metropolitana de Belo Horizonte a partirdo povoado de Sumidouro. Ao longo de quatro dias, a partirde Sabará, pudemos juntar os pedaços dos espelhosquebrados ao longo de cento e cincoenta anos desde queo cônsul da Inglaterra Richard Burton fez o mesmo percursoem uma viagem de exploração.A metáfora do “Espelho Quebrado” é apropriada ao quevivemos. Com efeito, cada pedaço de um espelho reflete otodo que contempla, portanto, juntar pedaços de um espelhoé apenas mostrar que nossa modernidade divide a realidadeem pedaços pensando contemplar pequena parte do todoresistente à divisão.Jaguara sintetiza o passado e o presente. E para nossoespanto, reflete todo o passado no presente e todo opresente no passado.

Lições para avaliarO Percurso Metropolitano pelo Rio das Velhas permitealertar os governos ocupados ou desocupados compolíticas públicas sobre Viver do Rio ou sofrer suasconsequências.Em Sabará, o Rio das Velhas recebe o Rio Sabará. O Rio separece mais um pequeno córrego e apenas pequenosbarcos e caiaques ainda ousam a navegação tão sonhadanos anos de 1830. Logo em seguida, em General Carneiro,dois novos cursos d’água se somam ao poderoso Rio dasVelhas. É o nosso conhecido Arrudas e o ignorado “CórregoMalheiro”. Aí se sente o legado Metropolitano. Um rio deEsgoto. Alguns quilômetro a mais é a vez de acolher asprendas do Ribeirão da Mata e todos os resíduos deVespasiano, Matozinhos e Capim Branco. O rio quaserespira ao acolher o Rio Taquaraçu na divisa de Santa Luziacom Jaboticatubas, mas ainda aguarda as contribuiçõesde Jaboticatubas e Lagoa Santa. A competição de usos comparcelamentos indiscriminados exibem o futuro sombriopara a natureza que estamos criando. Diretrizes depreservação ambiental multiplicam a multidão decapivaras presentes ao longo de todas as margens dorio. E haja carrapatos para infernizar o viver do rio.

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Sem Custo:Só Paixão

Quem se habilitaa financiar agorao percurso res-

tante?

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Participação no Prêmio Afago deLiteratura – 7ª edição – outubrode 2017A Afago – Associação dos Filhos e Amigos deGouveia – apoiou irrestritamente a ComissãoMineira de Folclore nos anos em que se viutotalmente desamparada pelo Governo de Minas.Foi em 2011 que a Comissão Mineira de Folclore seviu sem sede e com seus bens depredados.Em 2017, a Afago como instituição burocráticaencerrou suas atividades e passou a ser apenasmovimento espontâneo. Foi a vez de a ComissãoMineira de Folclore dar continuidade a um dosprincipais programas criados pela Afago.Na oportunidade de participação no Fórum TécnicoSemeando Letras: Plano Estadual do Livro, Leitura,Literatura e Bibliotecas promovido pela AssembleiaLegislativa do Estado de Minas Gerais a Comissão Mineirade Folclore apresentou o texto abaixo:O QUE É?O Prêmio AFAGO de Literatura foi concebido peloConselho Diretor da Associação dos Filhos e Amigos deGouveia no ano de 2009 e iniciado no ano de 2010. Consisteem premiar anualmente os melhores trabalhos escolares dosalunos das escolas municipais e estaduais do municio deacordo com os níveis de escolaridade – fundamental da 6ªà 9ª série e médio do 1º ao terceiro ano.ANTECEDENTESA ideia surgiu da constatação de que as escolas locais desdeo ano de 1935 criaram um pequeno jornal mural que veio aser impresso coordenado pelos próprios alunos quecompunham o “Clube de Leitura”. Dessa experiênciaresultava que a comunidade sempre selecionava os melhoresalunos para saudarem os visitantes e participarem comooradores em todos os eventos solenes da comunidade. Coma disseminação de escolas e ampliação de acesso esseprotagonismo se perdeu.

OBJETIVO.O objetivo é colocar em relevo as atividades escolaresdesenvolvidas pelas professoras e professores das escolasexistentes no município de Gouveia para que toda a cidadetenha ciência do saber dos alunos, o que não é outra coisaque descaracteriza o chamado “Dever de Casa”transformando-o em “Prazer de Casa”.

PROCEDIMENTOS1.Visita às Diretoras e Diretores das escolas para avaliar

a acolhida da proposta de premiação.2.Elaboração de Edital para orientar os procedimentos.

Definição de prazos e dos temas para redação.

3.Seleção pelos professores de cada escola dostrabalhos dos alunos que merecem leitura emcontexto mais amplo.

4.Encaminhamento dos textos selecionados para aDiretoria da AFAGO em Belo Horizonte.

5.Criação de uma comissão leitura pelos membros daAfago residentes em Belo Horizonte e na RegiãoMetropolitana de Belo Horizonte

6.Criação de uma comissão de avaliação daapresentação pública dos três melhores textoselaborados pelos alunos de cada escola separadospor nível de escolaridade.

7.Seleção pela comissão de leitura dos três melhorestextos de cada escola separados por nível deescolaridade e atribuição de nota.

8.Encaminhamento dos 24 melhores textos para acomissão de avaliação pública de apresentação dostrabalhos.

9.Sessão solene de apresentação dos trabalhos, entregade certificados a todos os participantes, alunos eprofessores e premiação dos 8 melhores avaliadospela soma algébrica das notas de qualidade dostextos e excelência da apresentação pública.

10. Publicação no sítio www.afagouveia.org.br e noBoletim Informativo da Afago distribuído em todas asescolas do município.RESULTADOS ALCANÇADOSO Prêmio AFAGO se transformou em atividade apoiadapela Administração Municipal.No ano seguinte, a Secretaria Municipal de Educação crioua Semana Literária e Artística de Gouveia com atividadesem todos os povoados e na sede do município e determinoucomo coroamento da Semana Literária a Sessão dePremiação.Criou-se o Grupo de Poetas de Gouveia que promovem oSarau Poético na noite anterior ao encerramento da SemanaLiterária.A maioria dos pais registra ampliação do empenho dos filhospela leitura e pelo estudo em geral. Depõem que os filhos jáiniciam o ano se preparando para escolher o melhor assuntoque mereça ser lido e divulgado.Organizações dos municípios vizinhos têm se interessadoem visitar Gouveia para acompanhar o sucesso dessaatividade.A Comissão Nacional de Folclore vem divulgando para todoo Brasil o alcance desse atividade.O estudo das obras criadas pelos alunos permite umaavaliação dos valores e dos desafios enfrentados pelo SaberViver na Comunidade.As escolas participam da elaboração do Edital para cadaano e decidem com a comunidade propostas de temas maisimportantes a serem propostos aos alunos.

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Segundo os professores, o maior mérito do programa é dese fazer sempre próximo à comunidade diferentemente deoutros que extraem conhecimento das escolas e não retornampara ela.A cada ano aumenta o número de trabalhos selecionados eencaminhados para avaliação da comissão de BeloHorizonte – 48 no ano de 2010 e 118 neste ano de 2017.

ANEXOTema sugerido pelo corpo de professores em 2017:FamíliaSegue exemplo de texto de um aluno do nono ano dopovoado de Pedro Pereira.

Professora: Geralda da Ap. Silva Miranda

Escola: Municipal Professora Zezé Ribas

Perdas

Vindo de uma família de doze irmãos, semprepresenciei minha mãe trabalhar duro para nos sustentar.

Ainda éramos muito pequenos quando meu pai embusca de uma vida melhor partiu para a cidade grande aprocura de emprego para nos sustentar. Na sua ausência,minha mãe assumiu o papel de pai e mãe, pois perdemos ocontato com ele.

Além da dificuldade financeira, fomos marcados porVárias tragédias. Meu irmão mais velho precisou sair muitocedo de casa para ajudar no sustento da nossa família. Nassuas idas e vindas em sua bicicleta foi vítima de umatropelamento fatal, deixando a minha mãe completamentearrasada, Mas, ela precisava reagir em nome dos onze filhosque precisavam dela.

A responsabilidade de ajudá-la passou para meuirmão que ficou na condição de maisvelho, infelizmente ele convalesceu deum câncer que o levou a morte.

Nossa! Mais um vez minha família estava sem umalicerce! Minha mãe novamente precisou seguir em frente.

O destino nos colocou mais uma vez frente a frentecom a morte. Desta vez foi minha amada irmã mais velhaque veio a falecer devido a uma complicação pós parto.Minha mãe precisou se manter firme, pois ela precisava criaro fruto deixado por aquela que foi morar no céu.

Passamos por tudo isso e meu pai, sabe Deus ondeestava...

Um certo dia, para a nossa alegria papai estava devolta. Pena que ele perdeu a chance de ver seus filhoscrescerem, mesmo em meio a tanto sofrimento. Ficamosfelizes com sua volta, embora ele tenha voltado muitodebilitado devido a uma doença rara que fez com que eleperdesse alguns movimentos do corpo. Minha mãe em umgesto de generosidade o aceitou no convívio de nossa família.

No dia primeiro de setembro deste ano, recebemosem nossa sala o diretor da nossa escola, que nos encorajavaa fazermos a redação para disputar o Prêmio Afago e eupensei... O que vou escrever? Um grande silêncio na sala etodos estavam concentrados num único objetivo.

Com o coração apertado, comecei a escrever asprimeiras linhas.

De repente, fui interrompido, pois o diretor pediupara que eu guardasse meu material, pois minha mãe mechamava em casa. Já me consumia no choro, pois sentiaem meu coração que algo muito grave tinha acontecido.

De longe avistei a multidão em frente à minha casa.Fiquei com o coração acelerado e com as pernas trêmulas,foi ai que deparei com a triste cena.... Meu pai deitadodebaixo de uma goiabeira, aproximei e pude perceber queseu corpo já estava sem vida. Meu Deus! Meu pobre paihavia se enforcado!

Pois é! Hoje poderia estar aqui narrandopara vocês uma história de superação. Noentanto registro aqui mais um final trágico.Não está sendo fácil, tenho certeza quereergueremos, pois somos unidos, temosamigos que nos apoia e sobre tudo, muitafé, algo magnífico, que tem o poder de curarferidas, cortar caminhos solucionarproblemas e moldar corações. Nossa forçaestá em Deus!

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Em Diamantina:Comissão Mineira de Folclore no

FHIST 2017.Ione Amaral

A Comissão Mineira de Folclore foi convidada porAmérico Cesar Antunes a participar do IV Festival deHistória em Diamantina, de 4 a 7 de outubro de 2017. Asatividades desenvolvidas pela CMFl em Diamantina foramcoordenadas por Ione Amaral Cruz.

No dia 4, no mercado velho, Ricardo Evangelistarealizou oficina intitulada “Tropeiros”, revisando raízes ememórias tropeiras. Em seguida lançou livro de sua autoria“Mineiro que é mineiro”.

Dia 5 Teo Azevedo, acompanhado por violeiros ecantadores do Nordeste fez pronunciamento verbal,recitações e cantorias, mostrando a força da literatura decordel e do repente no Norte de Minas e no Nordeste doBrasil. Depois das atividades musicais e literárias, TeoAzevedo autografou livros e discos de sua autoria. AntônioMoura falou em nome da Comissão Mineira de Folcloreressaltando a obra restauradora de Teo Azevedo no amparoe na divulgação da Folia de Reis de Alto Belo, além doapoio a Zé Coco do Riachão;

No dia 6, o presidente José Moreira de Souza,Raimundo Nonato Miranda Chaves, Antônio de PaivaMoura, Luiz Santiago, Frei Chico, Ricardo Evangelista eIone Amaral foram recebidos no Conservatório Mineiro deMúsica Lobo de Mesquita por seu diretor, professor FelipeLeonardo Miranda e outros professores. Foram realizadasduas representações de danças folclóricas produzidas porprofessores e alunos do Conservatório, como atividadedidática extraclasse. A primeira foi a dança do pau de fitase a segunda, Dança de São Gonçalo. Em seguida, osfolcloristas presentes fizeram pronunciamentos e roda deconversa com os professores do Conservatório.

Ainda no dia 6, à noite, no Teatro Santa Izabel, emmesa de debate intitulada “Cultura popular, palavras everbetes, Antônio Moura falou sobre história e literatura e

Frei Chico apresentou seus estudos sobre religiosidadepopular. Em seguida os palestrantes responderam algumasquestões levantadas pela platéia.

Dia 7, no Mercado Velho, à noite, Feira de Livro,com prosa entre leitores e autores e lançamento de livros.Frei Chico conversou com os presentes sobre religiosidadepopular e suas experiências no Vale do Jequitinhonha. LuizCarlos Mendes Santiago falou sobre os livros de sua autoria,“O mandonismo mágico no sertão” e “Tempos deDiamantina”. Raimundo Nonato Miranda Chaves lançou ecomentou o livro “Camilinho, escola de vida”, editado pelaComissão Mineira de Folclore, em 2017. Antônio de PaivaMoura comentou conteúdo de seu livro “Diamantina passadoe presente, editado pela Comissão Mineira de Folclore, em2014. O presidente José Moreira de Souza falou em nomeda Comissão Mineira de Folclore.

No dia 8, Antônio Moura e Erildo Nascimento deJesus acompanharam o cortejo do reinado do Rosário,juntamente com o Dr. Ângelo Oswaldo de Araújo Santos,secretário de estado da cultura de Minas Gerais. AntônioMoura observou que o desfile foi muito expre3ssivo emtermos de simbologia religiosa e de história social dos afro-descendentes. Louva-se a restauração do bailado dramáticoda marujada que havia desaparecido na primeira metadedo século XX. Ao longo do desfile houve apresentação dedança afro.

Chamou a atenção uma alegoria de barco a velas,sobre ondas marítimas, simbolizando a batalha de Lepanto,na Grécia, em 7 de outubro de 1571. Essa batalha foi umconfronto entre os turcos otomanos e diversos países ecidades estados da Europa. O papa atribuiu a vitória doscristãos à interferência de Nossa Senhora naquela batalha.Por isso, instituiu a devoção e a celebração ao Rosário nodia 7 de outubro. Outro símbolo reminiscências da batalhade Lepanto ocorreu no momento em que os marujosbuscaram a imagem de Nossa Senhora do Rosário nointerior da igreja. No adro, o capitão da marujada levantoua espada e fez discurso prometendo lutar pela fé cristã. Emseguida colocou na bainha a espada e seguiu triunfante pelasruas da cidade.

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Em Paracatu – 26 de outubroAntônio de Oliveira Mello em noite solenelança a obra Memória Cultural: umaantologia paracatuense, na CâmaraMunicipal de Paracatu.Nosso companheiro, Antônio de Oliveira Mello doou aParacatu mais uma obra modelo. A Comissão Mineira deFolclore se sente honrada com mais essa prenda e cuida eimitá-lo no projeto “O Movimento dos Folcloristas emMinas Gerais”.No dia seguinte ao lançamento do livro, Oliveira Mello reuniuos visitantes para lhes apresentar Paracatu e sua história. Opercurso teve início na Igreja de NossaSenhora do Rosário e prosseguiu por todos os lugares quefixam a história de Paracatu.

Nessa oportunidade o presidente da ComissãoMineira de Folclore proferiu as seguintespalavras:Saudação a Antônio de Oliveira MelloSaudações a todos os presentesExmo. Sr prefeitoExmo. Sr Presidente da Câmara Municipal deParacatuExmo Adrilhes UlhoaExmo. Senhor Professor Antônio de OliveiraMelloSomos Paracatu!É desse modo que me sinto ao ser convidadopara apresentar a obra de nosso Antônio deOliveira Mello.Já disse ao autor que Paracatu é uma cidadeprendada. Atribuo essa prenda ao fato de nestacidade ter nascido o menino Antônio no dia 22de abril do ano de 1937. Posso afirmar comcerteza: nenhuma cidade teve a graça de contarcom uma pessoa tão atenta ao saber viver naterra em que nasceu.Afirmo e provo. Nenhum município mineiroconta com obra tão extensa quanto a que lhededica Antônio de Oliveira Mello. Digo mais,Oliveira Mello criou escola. Aqui se encontrampresentes outros membros dessa escola.

Passei a viver Paracatu quando recebi de presentede uma aluna a obra “Paracatu Perante aHistória”. Obra profética. O autor vislumbra oque Paracatu oferece ao Brasil com atransferência da Capital Federal para o Sertão.Desdobra-se em meditações a partir da obra deAfonso Arinos. Pelo Sertão.Temos, hoje, o coroamento dessas peripécias.Dois volumes de três são apresentados aqui.Memória Cultural – uma antologia paracatuense-, nos é apresentada em dois volumes. O terceiroveio em primeiro lugar. Tem o título de “Vidas eVozes no caminho da história” publicado em2015 com a certeza de que em 2016 viriam à luzos dois volumes restantes. O momento chegou.É hoje.Eu me congratulo com esta cidade que se fezprendada com o nascimento dessa criança noano de 1937. Oliveira Mello é herdeiro do cultivo

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à Memória deste Sertão. Somos Paracatu.Paracatu gerou filhotes. Eis o Noroeste de Minas,as Minas Reveladas.Memória Cultural sintetiza esse longo percurso. Ésíntese.Esta obra nasceu, há cinquenta e sete anos. Assementes são “Paracatu Perante a História”,“Afonso Arinos e o Sertão” e “Assalto ao HomemVulgar”.Nós da Comissão Mineira de Folclore noscongratulamos com esta cidade que nos deu como

modelo de dedicação ao Saber Local a Antôniode Oliveira Mello e agradecemos a gentileza deter honrado nosso movimento dos folcloristasmineiros com a primeira edição de MemóriaCultural que hoje se mostra multiplicada portrês vezes.São muitos os frutos surgidos dessassementes. O nome de família é:Meu Bem Querer!

01 de novembro - a cidade de Januária CelebraCentenário de Saul MartinsO folclore é a tribuna do povo. O vulgo sabe castigar os opressores e premiar os generosos. Em toda aHistória, seja onde for, há registros e bons exemplos da força da sabedoria popular. [ Saul Martins.Antônio Dó. Edição de 1967. p.50]

O professor Prof. Carlos Ceza de Carvalho, membroefetivo da Comissão Mineira de Folclore noticiou este

evento.De forma concreta a importância de Saul Alves

Martins para sua gente: parentes, amigos e conterrâneos nãotem tamanho.

Ao analisar os relatos de seus parentes, especialmentede sua filha Jiçara Martins e amigos, pude perceber ricosfragmentos para sua biografia. Segundo os relatos, Saul Martinsnasceu em uma estrada, sobre um carro de boi, transportemais comum na época. De acordo com as histórias dos paisJustino Alves Gobira e Maria Moreira Martins Gobira, quandoSaul nasceu precisou ser envolvido em algodão e podia caberno bolso do paletó do pai por ser prematuro e por isso,pequeno demais.

Segundo relatos da sobrinha Rosa Maria, que moroucom seus pais, Saul Martins estava sendo levado para nascerem Januária pelas mãos da parteira Mãe Judith, mas não deu

tempo. Após o nascimento, veio para Januária e aquipermaneceu por um bom tempo devido as condiçõesdifíceis onde os pais residiam – zona rural; e ter nascidoprematuro. Neste ponto lembrei do trecho da obra deEuclides da Cunha que dizia “O sertanejo é, antes detudo, um forte!”. Imagina nascer numa situação difícil echegar aonde chegou! Saul é mesmo motivo de inspiraçãoe exemplo para nós.

Importante registrar aqui o comentário do nossopresidente da Comissão Mineira de Folclore – CMFL -Prof. José Moreira sobre o selo que foi lançado emJanuária: “há um carro de boi para lembrar que o infanteSaul nasceu na estrada, fora do tempo, pesando 500gramas. Coisa de atenção de Todos os Santos. O quaseinviável menino viveu 92 anos. Já imaginaram se elenascesse no tempo certo?”

De um ponto a outro, quantas participações,quantos feitos e realizações, tendo uma família grande!

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Família consanguínea e outras tantas de considerações pelasamizades feitas nas atividades sociais e profissionais e nacarreira militar tão ovacionada e comemorada.

Este preâmbulo inicial talvez ainda não consigaexpressar o tom da importância dessa nobre figura para osnorte-mineiros de Januária e Região Barranqueira do SãoFrancisco. Mas o tamanho da figura que nasceu em umcarro de Boi se tornou tão grande que não é possível maisfalar da importância dele para Januária e região, mas para opovo brasileiro.

Foram tantas realizações como Militar, Professor,Antropólogo, Poeta, Escritor, Folclorista, compositor doshinos da Polícia Militar de Minas Gerais, do 30º batalhãoda PMMG em Januária e do hino da cidade do Bonito deMinas. Compositor que tinha traços melódicos nas letras eversos. E o impressionante, não tocava nenhum instrumentomusical nem tinha formação musical. Mas talento não lhefaltava!

É importante falar da geografia neste contexto, poisJanuária município situado no lado esquerdo na Região doMédio São Francisco era o maior município em extensãode terra e foi gradativamente, com passar do tempo, sendodesmembrado com as emancipações políticas.

O distrito onde nasceu Saul, nos sertões do Tejuco,às margens do Rio Pandeiros, foi elevado à categoria demunicípio com denominação de Bonito de Minas com a leiestadual nº 12.030 de 21 12-1995. Assim, Saul é deJanuária, é do Bonito de Minas. É um educador, cidadãodo mundo.

Em 1º de novembro 2017 foi realizada a aberturadas comemorações do Centenário de nascimento de SaulMartins que teve como programação: o lançamento do SeloComemorativo pelos correios; o lançamento dodocumentário do Mestre Saul Martins - Sua Vida e SuaObra e o lançamento da campanha de preservação doacervo da biblioteca Saul Martins do IFNMG-CampusJanuária entre outras atividades culturais do gênero.

O acontecimento foi idealizado pelos membros daComissão Mineira de Folclore, Prof. Carlos Ceza deCarvalho, Bibliotecário do IFNMG Campus Januária eRos’elles Magalhães Felício, professora e coordenadorado Campus da Unimontes Januária, com apoio daComissão do Centenário Saul Martins em Januária.

Na sua extensa biografia, Saul Martins ocupou oposto de Coronel da Polícia Militar, foi professor e poetacom vários livros publicados, antropólogo, atuando comoescritor sutil das percepções da Cultura Popular, e dasformas de sociabilidade tradicionais, expostas no interiorde Minas Gerais, especialmente as rodas de São Gonçalo.Nessa condição, deixou um legado na descrição e nasistematização das formas de expressão cultural do interiordo Brasil.

Saul Martins foi pioneiro em apresentar gruposfolclóricos como o São Gonçalo e Folias de Reis no Paláciodas Artes em BH.

Em relação ao evento de 1º de novembro de 2017,esse foi apenas a abertura das comemorações do centenáriode Saul Martins, que conforme a programação serãoestendidas até 2018.

Saul ao ser o Primeiro Secretário da CMFL na Gestão deAires da Mata Machado Filho -1948-1980, fez dessaconvivência imbricada uma relação de parcerias eaprendizagem ao ser trilhado pelas mãos de Aires. Juntostornaram-se um pilar da nossa comissão junto com outrosgrandes nomes fundadores.Realizamos esse trabalho, cumprindo com a proposta dacomissão criada para o Centenário de Saul Martins emJanuária-MG em parceria com a Campanha da Bibliotecado IFNMG- Campus Januária que tem como patrono onosso grande educador Saul Martins.Como membro da Comissão Mineira de Folclore, apósparticipar da semana do folclore em agosto de 2017, volteipara Januária com o desafio de fazer também umahomenagem a este grande personagem que é um dos pilaresfundador de vários obras e instituições, dentre as quais, aComissão Mineira de Folclore.Pelo fato de Saul ser de Januária e estar sendo homenageadopela CMFL que tem como presidente o Prof. José Moreiraem BH, reuni vários amigos e parceiros, em Januária, epropus a eles o desafio de participar comigo de umacomissão aqui em Januária para tratar do Centenário. Vistoque percebi que ninguém mais de Januária estaria preparandoalguma comemoração a respeito. Graças a Deus conseguicativar e entusiasmar a todos. Como estratégia resolvirealizar a solenidade na sede da Biblioteca Saul Martins noInstituto Federal do Norte de Minas Gerais - CampusJanuária.Durante o evento tivemos várias falas bonitas, poesias, notado comando geral da polícia Militar em Minas lida pelocomandante do 30º Batalhão Ten. Cel. Paulo Sérgio quetambém é membro da nossa comissão para o Centenário.Essa comissão conta com membros do IFNMG, Unimontes,Casa da Memória, AJL-Academia Januarense de Letras,Centro de Artesanato, Sesc. Além da parceria com o amigoDeniston Diamantino e da Secretaria de Cultura/Turismoda Prefeitura Januária.Tivemos também boa participação do povo de Bonito deMinas que veio numa comitiva animada e teve um apoio doPrefeito Zé Reis. Além da cobertura da TV local.Em minhas pesquisas, percebi que o Prof. Saul é muitoquerido e respeitado pelos norte-mineiros. O seu centenárionão poderia deixar de ser comemorado em sua terra natal.Por isso, as motivações e ideias do professor José Moreiratinham que ser consideradas e transformadas em ações

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significativas. E ser pioneiro no estado fazendo lançamentodas comemorações do centenário de Saul Martins, lançandoum selo que marca a história do nosso homenageado, queficará conhecido no cenário nacional e/ou mundial, é muitogratificante para alguém que não é de Januária, mas quereside aqui.Ainda é importante relatar que Saul Martins, comoAntropólogo/Folclorista foi muito importante para o Nortede Minas ao Defender sua dissertação de mestrado com abiografia do cangaceiro Antônio Dó e sua tese de doutoradocom o título “Contribuição para o estudo científico doartesanato”, ambos publicados na forma de livro.Na antropologia descobriu os estudos folclóricos, nãoapenas como fonte de dados para posteriores análises, mastambém como um rico material de discussão. Tambémpublicou vários livros, além de contribuições em coletâneas.Na sua veia poética o poema “Flores doCampo” foi considerado um dos dez melhores sonetos dafase contemporânea em Minas Gerais, que gerou ao Saul oprêmio recebido pela Academia Mineira de Letras em1951. Por tudo e por todos, salve Saul Martins! Salve aComissão Mineira de Folclore!

9 de novembro – reuniãoextraordinária da CMFL naLagoa do NadoFoi dia de apresentar pela última vez a Exposiçãocuja curadoria coube á Comissão Mineira deFolclore no “Centro de Referência da CulturaPopular e Tradicional Lagoa do Nado”. Nessaoportunidade, tomou posse como membroefetivo da Comissão Mineira de Folclore asenhora Alba Dutra da cidade de Almenara.Como assunto da Pauta foram examinados oprograma de celebração do Centenário de SaulMartins em assembleia prevista para o dia 22de novembro; a participação dos membros noprojeto “Movimento dos Folcloristas em Minas

Gerais. Em seguida Marco Llobus expôsrelatório de sua participação como colaboradorda Comissão Mineira de Folclore e comomembro efetivo a partir de sua posse em 2016.

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22 de novembro 4ª AssembleiaGeral Ordinária da CMFL

Quarta Assembleia Ordinária daComissão Mineira de Folclore

Realizou-se no dia 22 de novembro de 2017 às 19:00 horas,no auditório da Fundação Municipal de Cultura, Rua daBahia nº 888 – Centro, na cidade Belo Horizonte, com aseguinte pauta:

o Abertura - composição da mesa

o Atividade - Fala dos componentes daMesa / Centenário Saul Martins(Recomendação 03 minutos de fala)

Mercês Ambrósio - por JanuáriaRepresentante da PrefeituraMunicipal de VespasianoAcademia de Letras GuimarãesRosa - João Bosco de CastroUm representante da FundaçãoMunicipal de Cultura

Um representante da família SaulMartins

• Ação Comemorativa “Centenário Saul Martins”o Apresentação do Vídeo “Saul Martins”

de Sílvia Villani e Dêniston Diamantino(25 minutos)

o Palestra de João Bosco de Castro - 30min

o Lançamento do Carranca edição 4 - 17Comemorativo do Centenário de SaulMartins

o Anúncio da agenda de atividadespromovidas pela Comissão Mineira deFolclore em comemoração ao Centenáriode Saul Martins; Atividades no Museu deFolclore; Prêmio Saul Martins. Outros

• - Lista para eleição da Diretoria da ComissãoMineira de Folclore

Outros assuntos:

18 Novembro – ConsciênciaNegra em Vespasiano

Em cumprimento à parceria da ComissãoMineira de Folclore com o município deVespasiano cuja prefeitura abriga nosso Museude Folclore Saul Martins, a Comissão Mineirade Folclore esteve presente na celebração doDia da Consciência Negra. O qual constou dedesfile de guarda de Moçambique e de roda deconversa no auditório do Palácio da Artes “NairFonseca Lisboa”. Atividade coordenada por IoneAmaral, membro efetivo da CMFL ecoordenadora das atividades de nossaComissão junto ao Museu de Folclore SaulMartins.

ImersõesForam realizadas duas reuniõesextraordinárias. A última do ano naresidência de Clara Selma, no BairroItapoã em Belo Horizonte e a primeirade 2018 em Pinhões, Santa Luzia.

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RelatórioEdileila Portes emGovernador Valadares nosEstados Unidos e em BeloHorizonteNossa companheira, Edileila Portes,residente em Governador Valadares,tornou-se a maior embaixadora daComissão Mineira de Folclore.Iniciou o mês de novembro nos EstadosUnidos e levou nossas revistaspara serem oferecidas emembaixadas e universidadesconceituadas. Nelas repetiupalestras sobre o “Salvem o RioDoce”.De volta ao Brasil, lançou emdiferentes cidades de MinasGerais – Belo Horizonte e Juiz deFora, incluídos -, do Rio deJaneiro e de São Paulo, sua obraapaixonada: Rasgos apaixonados: ode aoVale do Rio Doce. 80 anos do IPHAN

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional celebrou no dia30 de novembro 80 anos de sua fundação.Merece fixar alguns momentos que levaram o governo Getúlio Vargas acriar o, então, Serviço do Patrimônio Histórico. O despertar da Repúblicapara repensar o Brasil como nação, de que resulta o movimento da Semanade Arte Moderna de 1922. No caso de Minas, o momento de atenção paraa constituição de um Estado em meio à Federação, o momento significativose dá pela criação do Arquivo Público Mineiro, no ano de 1895. Celebrar oAleijadinho e os Inconfidentes torna-se palavra de ordem para reconhecero surgimento de uma “consciência de mineiridade”. Há que lembrar aindaque o episcopado mineiro se mostra atento para a questão do patrimôniojá na segunda década do século XX e que será o mineiro Rodrigo MeloFranco de Andrade o escolhido para coordenar as ações do Serviços doPatrimônio Histórico. – Alô, Oliveira Mello, alô Paracatu! –Pode-se afirmar ainda que a criação do Serviço do Patrimônio Histórico éum dos indezes do

Surgimento da Comissão Mineira de Folclore. Provas?Aires da Mata Machado Filho foi um dos escolhidos paradesenvolver o relatório sobre Diamantina comopatrimônio histórico. Dessa incumbência resultou a obraArraial do Tijuco, cidade Diamantina publicada no anode 1945.Somente esse percurso histórico explica que o presidenteda Comissão Mineira de Folclore tenha sido escolhidopara receber do IPHAN a Medalha Mário de Andradecomemorativa dos 80 anos de criação dessa importanteinstituição.Foi no dia 6 de dezembro de 2017.

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Artigos

Mais um inhame

A história do querer se conhecer, entender, passa peloreconhecimento e busca de sua formação e como seconstrói as reflexões de sua identidade cultural. Quemsomos? Por que assim somos? Por onde viemos? Quaissão nossos valores, princípios, base moral? Qual é a nossahistória - oficial ou não? Que oficial é esse? E esse nãooficial? Quais são nossas fontes - desse saber? Onde estáesse saber? E quem tem esse saber? E pra que serve essesaber? E, em que perspectiva percebo esse saber? Qualvalor se dá ou dão a esse saber? Que “inhame” é essenessa plantação de “café”?

Como poeta (uma audácia), navego por entre as formasda grafia, da palavra, da letra, do seu conjunto depontuações, símbolos, signos. Uma atribuição no brincare buscar na linguagem - invertendo, estudando,provocando, acidentes e incidentes, numa percepção,para além daquilo que é imposto ou meramenteaprofundado. Entendo que neste mar das interrogações(anzóis invertidos), aquilo que nos fisga, e que nos arrastapor entre inúmeras correntes. E por outros mares, marese mares.

E mesmo que isso se apresente como mera “adjetivação”,subjetiva e de certa forma generalista, é a base, paraestender além dos limites da forma comum imposta. Emesmo que provoque uma sensação de perplexibilidade,tais inversões, e até mesmo na grafia - esse traço de nossaconstituição ocidental, histórica e brasileira - são osmeios e atos para desnudar essa “antagônica filosofia”formalista, de não se ver, pensar, integrar como povo, eentre o povo, meu povo e, eu povo, no saber de povo.Sendo esse o saber e segredo, chave e resposta para boaparte dos ditames. Aonde me encontro, de onde venho,e como sou. E tudo isso, perante ao velado e grande“apartheid” da antagônica “filosofia” do mar dasambiguidades. (¿) Onde povo, ser povo, saber de povo, ésubtraído e constantemente subjulgado.

Essa excessiva sopa de letras, um misto de apresentaçãoe divagação, perpassa por entre inquietudes e sim, poralgumas revoltas. Desdobro agora em relato, parte dessecaminhar, e o que me lembro por agora, de tais ações queme fazem mais um inhame para este caldo em construção.

Durante um período, dedicado a vivenciar e entender oprocesso de implantação de uma nova estrutura política -no âmbito das artes e cultura / idos de 1997 - que seencontrava em franco desenvolvimento em nossa capital.Vivencie através de inúmeros encontros, um campo parao diálogo e troca de vários saberes. Artistas,pesquisadores, instituições, participavam. Uma rede seformava, crescia, criando e promovendo muitaspossibilidades. A cidade reivindicava implantação de

inúmeros centros culturais. E em meio a essa efervescênciaque estava apenas começando, lá estava eu, também, noafinco de saber um pouco mais sobre nossa culturapopular. Durante um desses encontros, conheci o saudosoamigo Geraldo Inocêncio, e fiquei sabendo de Jequitibá,a capital Mineira do Folclore. Devido a proximidade demorar no mesmo bairro, iniciamos de pronto uma amizade;o encontrava para me contar alguns causos, e fui com elealgumas vezes para Jequitibá, onde ele me falava sobrecultura popular e sempre, me apontava o respeito quetinha pelos membros da Comissão Mineira de Folclore.No caminhar dessa rede estabelecida por esse processopolítico cultural, várias ações e eventos começaram a seintegrar suas ações com a cultura popular, como exemplo,o projeto Manuelzão. E sempre, nos eventos em queenvolvia a cultura popular, estava ali, algum representante,um notório aos nossos olhos, um membro da ComissãoMineira de Folclore. E foi assim que Conheci Carlos Felipe,Tadeu Martins, Frei Chico e mais alguns (2002 - 2003).

E no andar desse trem, já puxando a corda em defesa dessacultura popular, fui caminhando. Tive pequenos encontrose vivências com a Comissão, principalmente no CTM. Masfoi em 2010 durante a produção do 1º Seminário doPatrimônio Imaterial de Minas Gerais, que fui apresentadoao nosso querido professor José Moreira - intermedio feitopelo nosso amigo em Comum, o ex-presidente daComissão Espírito-santense de Folclore, Eliomar Mazoco.Lembro me de Mazoco dizendo algo assim: - Marco, colano mestre, viu.

Em 2013 fui convidado pela prefeitura de Belo Horizonte,para assumir uma assessoria, no intuito de criar edesenvolver o primeiro Programa de valorização dasmanifestações da cultura popular da cidade BeloHorizonte. De pronto aceitei, sabendo que não era possívelrealizar tal feito, sem a participação e orientação daComissão Mineira de Folclore. De tal forma, que assumo ocargo dia 04 de Fevereiro de 2013, e quinze dias depois, láfui eu, pedir a benção, justamente no dia do aniversáriodessa digníssima instituição. Sabia, que certos códigos,acessos, estavam mais próximos das personalidades daComissão, do que comigo. Também, de pronto, iniciei oprocesso, e entendimento de como estavam organizadasas entidades e coletivos representativos, e para isso,também, precisava conhecer a história de suas formações.Novamente, quem é que conhecia, ou tinha vivenciadotais histórias? Alguns dos membros da Comissão Mineirade Folclore!

Esse trabalho, dentro de uma equipamento e narepresentação do poder público, foi árduo, fogo amigo demuitos lados, principalmente de dentro, mas havia o defora também. Porém, o convívio praticamente diário, detudo que foi feito pelo programa, ou teve comotestemunha a Comissão Mineira de Folclore ou suaintervenção direta. Fato que protegeu o programa, e umato que demonstra a extrema generosidade e parceria que

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Artigosmuito me ajudou e ajudou a cidade de Belo Horizonte.Esse convívio resultou em algumas boas façanhas (quemviveu sabe), também, não posso omitir, deparamos comalguns velhos obstáculos, normalmente ligado a algumpreconceito. Mas, no que tange ao aspecto pessoal, possodizer, resultou numa profunda gratidão e amizade. E noano previsto da minha saída do cargo público (2016),informei e solicitei ao meu amigo Professor Moreira, omeu interesse de participar e ser membro dessa queridae digna Comissão Mineira de Folclore. Fato realizado.

A Comissão hoje, reconheço, também, é a minha morada.E tem dia em que a gente até tem uma cachacinha lá deGouveia.

Marco Llobus

Boi e CalungaRafael Sol

O mamulengo é o teatro de bonecos popular do Nordeste.Um dia vi um mamulengueiro que tinha um boizinho e umvaqueiro chamado Benedito. Aquele boi não era um boi defazenda, que pasta.Era um boi decoradinho com lantejoulas e coisas brilhantes,tinha um saiote de cetim. Espirrava talco pelo fiofó. Era umboi de festa, boi de folguedo, desses que correm atrás dascrianças. Dava briga para saber quem ia ser miolo, brincardentro dando ginga e molejo. Boi encantado que coloriu astardes de festa e alegrou muitos corações. Este animalpercorre a história do homem trazendo uma grandesimbologia. Aires da Mata Machado, este último foi quemfalou do boi totêmico em seu livro O Negro e o Garimpoem Minas Gerais. Este livro buscava entender a simbologiado boi nos folguedos populares no Brasil. Aponta-se que amaioria das instituições totêmicas tanto banto quantosudanesas se enfraqueceram ao chegar ao Brasil, no entantoo totem do boi sobreviveu de forma marcante em nossacultura, o bumba-meu-boi é prova disto. De origem banto,tem sua permanência por influência ameríndia do vaqueiroe caboclos. Trazendo aspectos religiosos, alguns povosbantos prestam culto ao boi associando o mesmo à boacolheita. Cada chefe de família dos Ba-Naneca tem aproteção de um Geroa, boi consagrado, festejado comcânticos e instrumentos especiais, segundo o pesquisador.Esta festa de celebração da paz e da abundância deve terum boi preto e branco tendo como dono um dos grandessenhores de terras, vai com outro boi chamado Xicca euma vitela figurando como dona de casa, ou esposa dasituação. No fim das colheitas, no meio do ano, fazem umaprocissão da casa do amo até uma distância de cerca de 7léguas, tendo no cortejo donzelas enfeitadas na cabeça comgrandes enfiadas de bagos de várias sementes, e homenscom a cara pintada de um barro branco chamado peio,

significa felicidade. Chegando na localidade, oferecem umpó de casca de árvore bem amargo ao boi Geroa chamadobungarulo. Se o boi lambe, é um bom agouro, e o fazendeirorecebe felicitações, se não lambe é sinal de má sorte, e paga-se com a vida. Essas influências totêmicas do boi são muitofortes no Nordeste, e são do tronco banto. Além disso,algumas práticas e superstições se estabeleceram comocolocar chifres de boi nas cercas de roças e hortas afastamau olhado e coisa-feia. Chá de escremento bovino servecontra coqueluche e outros males. Queimar estrume de boià porta ou dentro das casas imuniza-as contra a entrada dedoenças ruins e feitiços. O homem do Nordeste sabe oquanto deve ao boi, ou ao gado bovino de modo geral,também equinos nos trabalhos de penetração do territórioe sua fixação. Daí a inevitável consagração do boi ou docavalo traduzida também nos folhetos populares. BoiEspácio ou Rabicho da Geralda, a glória do Boi Misteriosoou Boi Pintadinho, também a Vaca do Burel. Entre osepisódios curiosos da história nacional figura a lenda do boide Belquior, que foi espetáculo que seduziu os holandesesdurante o período de sua dominação no Nordeste. Contamque em 1643, na festa da abertura da ponte do Recife aotrânsito publico, Nassau anunciou que, nas festividades, umboi iria voar.O fato se verificaria no campo do Palácio de Friburgo hojePraça da República. No dia anunciado, realmente apareceuao povo o boi de Belchior Alves, boi manso que andavapelas ruas da cidade, entrando de casa em casa. Depois depassear pela praça, viu-se sair por uma corda ligada até ummastro com alguma distância, o boi que voava. Não era umboi de verdade, mas uma armação cheia de palha, com oque pôde o governante iludir a curiosidade pública naquelafesta de inauguração da ponte do Recife, segundo Pereirada Costa.Há também o Rabicho da Geralda, que serviu de inspiraçãopara José de Alencar, onde o boi Rabicho percorre terraspor onze anos, uma figura lendária para o contexto da época.Na história é falada sobre uma grande seca que houve naépoca, mas não se trata da seca de 1877, a mais celebradado século XIX, pois Alencar divulgou o texto três anos antes.Ao que tudo indica, seria a de 1777, conhecida como ados três sete”, ou a de 1790-93, das mais dramáticasconhecidas.Dos romances tradicionais dentro do ciclo do boi podemoscitar ainda O Boi Surubim, O Boi Liso, O Boi de Mão dePau, ABC do Boi Prata, Boi Víctor, Boi Adão, e o ABC doBoi Elias. Na tradição oral desses romances, o herói éapenas o boi. Os demais personagens, vaqueiro, cavalo efazendeiro são secundários.O Boi traduz uma verdadeira prosopopéia, trazendo ocantor que é o espectro do próprio boi, herói que vagueiapelas várzeas. As histórias de boi, geralmente, estão emtorno de uma temática principal. O boi perdido no mato,

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nenhum vaqueiro consegue prendê-lo, pois tem astúcia ebravura.A história do Boi Misterioso ou Boi Mandingueiro tem amesma temática, muito semelhante as duas narrativasinclusive a vinda de um vaqueiro que não é conhecido nolocal, numa vem de Mato Grosso, na outra vêm do Piauí. Éa história de um bezerro que se tornou um boi famoso poisninguém conseguia pegar, diziam até que ele filho de umgênio criado por uma fada. O fazendeiro oferece umpresente para quem pegar, um anel, um relógio, três contosde réis, até que um vaqueiro de fora montado num cavalomagro e franzino consegue a façanha. Boi Misterioso é deautoria de Leandro Gomes de Barros, maior autor decordéis que já houve. Mesmo autor de O Cavalo queDefecava Dinheiro, obra que inspirou Ariano Suassuna aescrever uma de suas peças famosas.Em Vespasiano, Minas Gerais, tem um tal de Boi da Manta,que surgiu nas festas do Rosário em épocas passadas,desapareceu e voltou em festas carnavalescas. Porém ofolguedo não se fixou no Carnaval. Plínio Barreto diz servinculado a Festa do Divino, boi do divino, onde era boivivo, sacrificado e repartido para os presentes igual ao boiGeroa africano. Já o boi figurativo passou para o Carnavalde rua, trazendo mulinhas, marmotas fazendo algazarra ecorrerias. Sábado de Aleluia também sai o Boi da Mantamas diferente do Carnaval, pois vem acompanhado dasguardas de congado. O Boi de Aleluia tem músicas própriasque se referem ao boi. Vêm o boiadeiro conduzindo o boipreso ao laço, o toureiro que dança e toureia com asgarrochas na mão. O público pode participar, acontecemtentativas de marrar os assistentes que saem correndo.Trazem burrinhas e pessoas montadas em imitações decavalinhos como nos folguedos nordestinos. O toureiro vestecapa vermelha e com as garrochas acontecem evoluçõesna frente do boi. Toureando e dançando ao som de caixas,violas e sanfonas Benedito Catumbi faz o boi, Bené Pretoveste o boi da manta, é o miolo. O vaqueiro, esperto e ágile José Batista, Carambola recita frases alusivas ao boi esua origem, Joaquim Alves com laço em punho dirige o boi,corrigindo excessos. O cortejo se completa com as guardasde congado, marujos e caboclinhos. Este folguedo mineirolembra bem os festejos de boi no Nordeste.O boi é uma tatuagem na carne da sociedade rural. Osvaqueiros e seus aboios tinham versos que mostravam oamor pela vida de gado. Boi tem valor sagrado, vira assuntonas rodas, vaqueiro tem o dever de viver chamando gado esente-se honrado. Fazem versos, repentes de viola, chapéude couro. Deixam cargos militares para correr atrás de touro.Ê boi, na hora da despedida da farda para o gibão, o coronelacha digno dando libertação. Vaqueiro é profissão que dárespeito, o sujeito ganha cartaz para entrar para asvaquejadas, e conhece cada palmo de terra da regiãocorrendo o sertão atrás do gado. Vaqueiro chegando em

bando, num trote só, chega assustar, parece coisa decangaceiro, chegando de assalto. Boi bravo vira lenda. Viracordel. Vira mote. Vira boi boneco.No Rio Grande Norte tem muito mamulengueiro bom, lánão é mamulengo, o brinquedo lá se chama João Redondo.Tem Chico Daniel e os irmãos Relâmpago. Lá boneco écalunga, e quem faz calunga é calungueiro. Em Pernambucoeu conheci calunga por outra coisa. Calunga aqui é partedo maracatu. No meio do batalhão, tem a dama do passo,uma moça que carrega uma boneca negra de madeirachamada calunga. O cortejo real vai até à igreja de NossaSenhora do Rosário, que é a santa padroeira, também doCongado em Minas Gerais. Os negros entoavam versos nafrente da igreja, onde a parada era obrigatória. Versos àpadroeira do Rosário e à São Benedito, santo da predileçãopor ter a pele negra. Sobre a calunga, Arthur Ramos concluique a boneca seria o cetro, o distintivo do Rei que vai aocortejo, ao mesmo tempo que um elemento de religiosidade.O maracatu traz algumas outras manifestações sobreviventesdo modo bantu de fazer os cultos religiosos. Ao lado dereis, rainhas e embaixadores, figuram animais totêmicoscomo o galo e o jacaré, além da calunga como símbolofetiche-religioso. Calunga é um deus entre os bantus, o Marapara os Angola-congueses. Arthur no seu livro O NegroBrasileiro ainda aponta que nas macumbas cariocas, deorigem bantu, cantam os negros: E vem, E vem, A rainha domar, Vamos savar, Ó Calunga! A Rainha do mar.No Congo e Angola é uma figurinha de madeira, este feticheou iteque é uma figura de madeira, um pequeno boneco.Por isso, no Brasil, calunga passou a ter uso popularsignificando boneco, como viu no uso comum potiguar. Osnegros do Maracatu que chamam a boneca da calunga, jánão sabem porque fazem, ficando esquecida no inconscientea primitiva significação de calunga, um deus.Maracatu então não festeja somente sobrevivência históricae totêmicas, Festejam religião. Aproveitam da situação doCarnaval, iludindo a perspicácia dos brancos opressores efestejam os seus antigos reis, sua memória. Entre os deusesadoram Calunga, um dos maiores, um motivo universal, deusdo mar, e das águas.Chama-se calunga que é natural de São Vicente, primeiracidade do Brasil, vizinha de Santos. Em Goiás segundoCouto de Magalhães era sinônimo de negro, o mesmoacontecendo em Santa Catarina. Em Cabo Frio há umapeixe há um peixe com este nome, e calungueira é o nomeda embarcação para pescar o mesmo. Na África portuguesaem um ria afluente do Caporolo, com o nome de Calunga.É nome de planta em Minas Gerais e sertão da Bahia. Nalíngua bantu aparece com várias significações como morteou personificação da morte. Kalunga-ngombe, rei do mundoinferior. Ainda na África, é título de fidalguia na Jinga. Silva

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Campos, num dos contos que recolheu na Bahia, encontrareferência de calunga com as águas no conto A Mãe D´água.Zão, Zão, Zão.Calunga.Olha o munguelendô.Calunga.Minha gente toda.Calunga.Vamo-nos embora.Calunga.Para a minha casa.Calunga.De debaixo d’água.Calunga...Munguelendô ou munguelendo é palavra que se assemelhaà mamulengo e pode ser uma das origens para o termo,uma vez que esta não podemos calcular a infiltração desteconto nos séculos passados. Podendo ter servido de

Artigosinspiração para a palavra hoje adotada no teatro popularde bonecos como conhecemos. Renato Mendonça baseado em Marcelo Soares confirmaorigem africana, derivado do quimbundo, kalunga, mar. Podeter alguma relação com Iemanjá, orixá associado às águasdo mar. Aires da Mata Machado recolheu em Diamantinauma ronda infantil onde calunga aparece como refrão.Eu fui no mato, calunga,Cortar cipó, calunga,Eu vi um bicho, calunga,De um olho só...Diz o mestre que a cantiga conserva ainda seu antigosignificado.Calunga, cambada, calundu, são tantos termos trazido daÁfrica e incorporados à nosso jeito brasileiro, que muitasvezes nem reparamos como nossa língua é repleta depequenos mistérios.

Rafael Sol 2017 Belo Horizonte

Augusto Fernandes: que genteboa.

Antonio de Paiva MouraFERNANDES, Augusto. Que gente boa!

(costumes, fatos e cousas de Diamantina). Belo Horizonte:Edição do Autor, 1944. É uma resenha oportuna porquepassados 67 anos da primeira edição desse precioso livro,pode-se dizer que é como se ele tivesse sido escrito hoje.Tudo que Augusto Fernandes disse permanece intocável.

De início, diz que Diamantina é uma linda cidade,finamente histórica, berço incontestável da civilizaçãomineira. Teria mudado algo neste conceito? Absolutamente,nada. Por sua raridade, Que gente boa! se constitui em umdos melhores documentos históricos de Diamantina.Entremeada em diversos tópicos, Augusto Fernandes colocasua autobiografia, como em “uma banca escolar”, na qualfora examinado na Escola Normal, em 1900, no derradeiromês do século XIX. Na banca examinadora figuravam ArturQuiroga, Artur Alves Pereira e Juscelino Ribeiro FonsecaJúnior.

Outro ponto de sua biografia aparece no tópico“leitura dum livro.” Fernandes narra o caso de um banquetepromovido para a apresentação de seu primeiro livro: Tipospopulares de Diamantina (1929), com narração dasmanias de alguns tipos de rua. No auge do evento penetrouno recinto, Avelino, vulgo Quimboto, preto muito forte quegostava de desfilar na guarda romana, na sexta feira dapaixão. Quimboto queria agredir Augusto Fernandes comum porrete que tinha em mãos. Fernandes escondeu-se nointerior do Hotel Leopoldo, até que os convivasconseguissem fazer Quimboto ir embora. Qjimboto não seconformava com o fato de Fernandes tê-lo tratado como

tipo popular no referido livro. Diz Fernandes que sempreque via Quimboto na rua cortava voltas enormes para nãose encontrar com ele.

No tópico “Musica e músicos”, Augusto Fernandesconsulta fontes primárias como os arquivos das bandas deDiamantina, Arquivo do Conservatório Mineiro de Música,Arquivo do Batalhão da Polícia Militar em Diamantina. Nesteúltimo leu o dossiê de Antonio Efigênio de Souza, voluntáriona guerra contra Solano Lopes, tendo por isso, recebido aalcunha de Paraguai. Pode-se dizer que Augusto Fernandesé pioneiro na historiografia da música de Diamantina. Angélicade Rezende, em seu livro de história da música mineira,Nossos avós cantavam e contavam, muito se beneficiouda pesquisa de Fernandes. Aires da Mata Machado Filho,no livro Arraial do Tijuco, cidade Diamantina baseou-seem Que gente boa, ao falar da música e da guerra doParaguai.

Um outro caso muito interessante do ponto de vistacientífico, foi a narração de alguns traços psicológicos doPadre José Carolino de Menezes, que faleceu por volta de1940, no asilo Pão de Santo Antonio. Por causa de um deseus poemas satíricos, publicado no jornal Correio daManhã, Rio de Janeiro acabou se indispondo com o clerode Diamantina, que lhe valeu a suspensão de ordem poralgum tempo. Ainda em vida mandou fazer seu próprio caixãomortuário, suspenso do chão por um suporte de madeira.No interior do caixão havia compartimentos nos quaisguardava um pouco de terra dos lugares onde vivera. Oreferido caixão ficava em um quarto próximo da tipografiado jornal Voz de Diamantina. A idéia de satirizar é destrutivae conduz ao sentimento de culpa e à pulsão de morte, nestecaso, simbolizada pela feitura de seu próprio caixão.

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Relatório: Complementos

Comissão Mineirapresente na 28ª FeiraNacional de Artesanato– Belo Horizonte - 5 a 10de dezembroPor iniciativa de Maria Madalena Diniz Bastos– Dadá Diniz –, e anuência do SESC MG aComissão Mineira de Folclore participou da 28ªFeira de Artesanato e contou com amplo estandecedido gratuitamente para garantir nossainterlocução com os artesãos. Nessaoportunidade, os membros da ComissãoMineira de Folclore se dispuseram a permanecerdiariamente nesse espaço distribuindo alegriae divulgando as obras dos membros sempreestudiosos do saber viver em Minas Gerais.

Entre as visitas que nos honraram, destacamos a da senho-ra Maria Stella Moreira Rates, da cidade de Paraopeba,rainha perpétua de Nossa Senhora do Rosário, que com-pletou 90 anos, acompanhada da senhora Maria HelenaMartins Ribeiro da cidade de Curvelo. Dona Maria Stellaofereceu ao acervo da Comissão Minei-ra de Folclore sua preciosa obra: MinhaVida, Minha Fé. As fotos mostram DonaMaria Stella com a senhora Maria Hele-na e Adélia em frente a sua casa emParaopeba. Essa casa pertenceu aAvelino Fóscolo, cuja obra será aprecia-da na pesquisa “O Mobimento dosFolcloristas em Minas Gerais”.

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Relatório: Complementos

Projetos e ExecuçãoPela primeira vez, ao longo de muitos anos, aComissão Mineira de Folclore obteve recursospara financiar alguns de nossos projetos.Outros tentados não foram aprovados. Mas, jáé algo alvissareiro termos sido contempladospara desenvolver dois projetos.

Projeto O Movimento dos FolcloristasEste projeto obteve recursos no valor deR$40.000,00 do Fundo Estadual de Cultura deMinas Gerais.. O objetivo é acelerar aimplantação do Centro de InformaçõesFolclóricas com foco nas seguintes diretrizes:Dado que a Comissão Mineira de Folclore surgiuno ano de 1948 em atenção à criação daComissão Nacional de Folclore, compreender osestudos e as obras desenvolvidas anteriormentedesde a criação do Estado de Minas Gerais comoentidade da República e as ênfasesdesenvolvidas por estudiosos ou artistas.No caso, parte-se da criação do Arquivo PúblicoMineiro – 1895 -; e da criação da AcademiaMineira de Letras – 1909 -, do Instituto Históricoe Geográfico de Minas Gerais – 1907 -; eexamina-se os foco dos movimentos literáriose artístico no que tem a ver com o viver em MinasGerais.Iniciou-se a execução desse projeto emnovembro de 2017 e o Relatório Final estaráconcluído no prazo de 12 meses.A contrapartida da parte da Comissão Mineiraserá o trabalho voluntário de seus membrosseniores, os quais participarão intensamente dacoordenação e elaboração dos Relatórios alémda publicização dos resultados.

Projeto Lei de Incentivo da PBHA Fundação Municipal de Cultura de BeloHorizonte aprovou recursos que estão sendocaptados com base na Lei de Incentivo projetonº 0372/2015 , no valor de R$90.000,00 paragarantir à Comissão Mineira de Folclore apublicação de obras de membros da ComissãoMineira de Folclore, os quais, no momento deelaboração do projeto se dispuseram aencaminhá-las para publicação, juntamente comuma edição da Revista da Comissão Mineira deFolclore.Do total aprovado, foram pagos R$9.000,00 àempresa que captou os recursos aprovados eos mesmos estão sendo depositados na conta

corrente da Comissão Mineira de Folclore em12 parcelas mensais.

Conclusão eagradecimentos

A Comissão Mineira de Folclore chega aos 70 anos deexistência com o olhar voltado para o dia 19 de fevereirodo ano de 2048. Muita água irá rolar. Os futuristas fazemprognósticos interessantíssimos e nos preparam para oChoque do Futuro. Um desses choques é o fim do trabalhohumano. Se esta promessa for verdadeira, então, Folcloreirá reinar. As pessoas irão se encontrar mais frequentementee terão muito que conversar.Há porém um grande desafio: Será que todo encontroterá seu preço? Viveremos uma era de MercadoAbsoluto?Há que imaginar os desafios impostos por três sistemas emconflito em nosso cotidiano: O Sistema do Mercado no qualtudo tem valor expresso em moeda, no qual o Cego DeusPlutão comanda as relações, todas as relações. O Sistemadas Imposições incorporado em tarifas, tributos e impostosque se justifica pela ideologia da promoção do Bem Comum.E, por último, o nosso sonhado Sistema da Dádiva queconsidera que todos nós somos criadores de arte eexatamente isto que resiste ao Mercado e ao EstadoImpositor – ou impostor? -. O que quer dizer que até quandonos submetemos ao trabalho e à imposições isto somente épossível se formos criativos e pudermos oferecer mais doque o que retribuído.Esta é a história da Comissão, ao longo de seus setentaanos. Tudo que oferecemos resiste a preços, a valoresexpressos em equivalente de troca.

É momento de agradecer a todos que acreditam quepodemos andar nas contramão com fé que o que caracterizanossa humanidade são os móveis da doação. O Espírito daDádiva.Neste dia 19 de fevereiro, os membros da ComissãoMineira de Folclore estarão elegendo a nova diretoria parao período 2018 até 22 de agosto de 2020.Estamos unidos para doar a Minas Gerais Atenção e Estudode sermos povo e de saber viver no interior de todas ascoações do mercado e das imposições.

José Moreira de SouzaCARRANCA PÁGINA 31

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CARRANCA

Órgão Informativo da Comissão Mineira de Folclore – CMFLNúmero 01-18– Janeiro - Março - 2018.Acessível emwww.folcloreminas.com.br

Diretor Responsável – José Moreira de SouzaFotos: José Moreira de Souza,,

Editoração Gráfica: José Moreira de Souza

Diretoria da CMFL - 2014 - 2017Presidente de Honra: Domingos DinizPresidente: José Moreira de SouzaVice-presidente: Míriam Stella BlonskiSecretária: Juliana Correa de Carvalho GarciaTesoureiro: Raimundo Nonato de Miranda ChavesConselho Fiscal da CMFLAntônio de Paiva MouraEdméia da Conceição de Faria OliveiraLuiz Fernando Vieira Trópia

IMPRESSORemetenteComissão Mineira de FolcloreRua Pires da Mota - 202Bairro Madre Gertrudes

CEP – 30512-760Belo Horizonte - MGE-mail: [email protected]

Agradecimentos:

Prefeitura Municipal de Belo Horizonte -Fundação Municipal de Cultura

Comissão Mineira deFolclore

Novos TemposGestão 2018 - 2020