carone, edgard. as origens da iii internacional

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Falando um pouco da 3ª Internacional Comunista, aquela que fez revolução!

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  • AS ORIGENS DAIII INTERNACIONAL COMUNISTA*

    Edgard Carone**

    Mesmo com a represso, o socialismo se torna mais popularaps a Comuna de Paris (1871). a partir de ento que omovimento operrio europeu deixa de se apresentar como respostautpica burguesia, surgindo na sua real dimenso revolucionria.

    Momento significativo do processo evolutivo oaparecimento de novas formas organizativas, como os sindicatose partidos, tendncias ideolgicas variadas, que abrangem teoriasque vo do individualismo ao coletivismo. o momento, nesse fimde sculo XIX, que traz em seu bojo o anarquismo coletivista e oanarquismo individualista, o socialismo evolutivo e o socialismoradical, o catolicismo social etc. O avano dessas e de outrascorrentes, com maior ou menor intensidade, que marca cadauma dessas correntes.

    A classe operria no vai se beneficiar unicamente dessesinstrumentos mas, sim, atingir um patamar superior, que vai almdos limites tradicionais de fronteira, de raa e de lngua de cadapovo. Pela primeira vez surge um organismo que aglutina o

    * O artigo sobre as origens da III Internacional Comunista utiliza pesquisa ampla,mas para esse trabalho fizemos uso de duas nicas fontes que respondem ao objeti-vo proposto, a saber: Branko Lazitch, Lnine et la Troisime Internationale.Neuchtel: ditions de la Baconnire, 1951; e Jules Humbert Droz, Lorigine delinternationale communiste: de Zimmerwald Moscou. Neuchtel: ditions de laBaconnire, 1968.

    ** Professor titular da FFLCH da USP.

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    proletariado de vrios pases, tentando superar questes que tratamda cultura e do regionalismo existente. Como dizem Marx e Engels,em 1848, o proletariado no tem ptria e proletrios de todosos pases, uni-vos.

    O derradeiro passo para o centralismo operrio, como formasuprema do poder, agora em escala planetria, a fundao da IInternacional, em Londres, no ano de 1864. A AssociaoInternacional dos Trabalhadores (AIT) , na sua origem, o pontocentral da coordenao e cooperao da classe operria nomomento de se transformar em movimento e de se iniciar ointernacionalismo. Essa organizao sofre, porm, grave crise,porque no seu bojo abrigam-se partidrios de Proudhon, Lassale,Bakounine, Mazzini, Marx e outros. A sua estrutura de cartercentralizadora, o que a leva, nos momentos de crise, luta pelosinteresses particulares de cada faco, em detrimento dos daentidade propriamente dita. Essa dubiedade provoca o seu fim, oque se d na hora do conflito entre marxistas e anarquistas, ouMarx contra Bakounine. Em 1872, a AIT se transfere para NovaYork, onde sobrevive por mais 4 anos.

    durante a Exposio Universal de Paris, em 1889, quediversas correntes partidrias, presentes ao evento, concordamem formar uma II. Internacional. A maior parte dos participantespertencem a sindicatos, associaes partidrias e partidos. Evitandocriar uma organizao centralizadora, por causa de sua miscelniaideolgica, ela ser uma federao de partidos e de gruposnacionais autnomos, da qual ela coordenar a ao atravs decongressos, que se reuniro a cada trs anos. s aps 1905que se acrescenta a ela outros mecanismos burocrticos.

    A II. Internacional vive seu perodo ureo entre 1889 e 1914,isto , no momento mais dinmico do sistema capitalista, a fase doimperialismo. O movimento operrio se beneficia das novascondies materiais da sociedade e v crescer, na Alemanha e naFrana, organizaes proletrias de massa. No entanto, devido aoseu carter descentralizador, no qual domina a forma federativa,os partidos que a compe tomam, inmeras vezes, posies

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    prprias, o que provoca conflito entre os seus membros. Afinal, adeclarao de guerra da Inglaterra e Frana contra a Alemanha eustria, em agosto de 1914, leva-a a sofrer grave crise, resultandona ciso entre os que apiam e os que no apiam a sua respectivaburguesia no seu esforo de guerra. Nos anos posteriores, a II.Internacional sobrevive com o apoio dos partidos revisionistas e oconsentimento dos governos da classe dominante.

    A situao provocada pelo conflito armado demonstra ocarter de insegurana ideolgica de boa parte dos lderessocialistas, pois desde 1901 com o pice em 1907 -, a palavra deordem da II. Internacional a da luta contra a guerra, a guerraespoliativa em proveito da burguesia.

    A adeso irrestrita da maioria dos Partidos Social-Democrticos e dos Partidos Socialistas a titulao depende decada pas e s tem sentido figurativo ao conflito armado, encontraresistncia unicamente de pequenos grupos na Rssia, naAlemanha, na Frana etc. No primeiro deles, encontram-se osbolcheviques, com Lenine e alguns mencheviques, com Martinove Trotski. Na Alemanha, Rosa Luxembourg, Karl Liebnecht eOtto Rhlle. Na Frana, os sindicalistas Monette e Merrhein. Epequeno nmero de socialistas suos, espanhis, americanos etc.A listagem dos internacionalistas como so chamados pequena, porm essa vanguarda revolucionria vai ter papelfundamental nas revolues de 1917-1920 e na fundao da III.I.C.

    Ao ter notcia, pelos jornais, de que os socialistas alemes efranceses aderem ao esforo da guerra dos seus respectivosgovernos seguido logo depois pela aprovao do Oramento deGuerra -, Lenine, na primeira hora, no acredita no noticirio dosjornais, achando ser ardil da burguesia, porm, logo depois,indignado, obrigado a reconhecer a realidade.

    Dessa maneira, esboroa-se a esperana dos socialistasinternacionalistas, como so chamados na poca. A ttica contraa guerra, preconizada nos Congressos da II. Internacional ou emCongressos Partidrios surgem, nesse momento, como utpicos e

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    inoperantes. De nada adianta o slogan de Abaixo a Guerra, Vivaa Repblica Social, ou Viva o socialismo internacional. preciso que em todos os lugares repercuta nas orelhas do governovosso grito: Ns no queremos a guerra! Abaixo a guerra! Vivaa reconciliao internacional! (Lazitch, 1951, pp. 44-51). Seno a palavra de Greve Geral.

    Nos primeiros meses do conflito armado, quando se sobressaiainda o exacerbado pendor dos envolvidos na guerra, a ao dosinternacionalistas representa percentual frgil, pois eles ainda esto procura de solues viveis para o impasse da guerra. No entanto,alguns optam por medidas mais globais, tentando apoio de maiornmero de personalidades e de partidos europeus, nocomprometidos com a guerra. A iniciativa parte dos socialistasitalianos e suos, pases ainda neutros, pois a Itlia s entra noconflito armado em 1917, enquanto a Sua se manteve neutra.Em 27 de setembro de 1914, renem-se em Lugano (Sua)representantes dos respectivos partidos socialistas. A conclusoaventada evitar que a guerra se estenda ainda mais e que envolvaos atuais pases neutros; ou seja, criar as bases de uma aocomum contra a continuao do espantoso massacre, orientadopor aqueles que no participam da guerra, mas que sofrem osseus efeitos... e exigir dos socialistas dos pases neutros aoimediata e a negociao diplomtica com os governos dos Estadosem guerra, para por fim rapidamente ao massacre dos povos(Droz, 1968, pp. 99-101).

    Outra iniciativa de resultado parcialmente negativo vem dossocialistas da Sua e Itlia, quando pedem que o Bureau SocialistaInternacional (isto , a II Internacional), sediada na Blgica,patrocine uma crtica ao social-chauvinismo, isto , queles quetraram os ideais socialistas. Melhor resultado mesmo assimlimitado teve a Conferncia das Mulheres, de 26 a 28 de marode 1915. Presidida por Clara Zetkin, dela participam 25 delegadas:4 inglesas, 7 alemes, 1 francesa, 3 holandesas, 2 suas, 1 italiana,2 russas mencheviques, 4 russas bolcheviques e 1 polonesa. Asbolcheviques so Kruposkaia (mulher de Lenine), Inessa Armand,

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    Zinaide Lenina e Helena Rosmirovitch. Depois de debates vota-seResoluo condenando a guerra e a poltica imperialista de anexaode territrios. Os bolcheviques no aceitam a frmula e nem seucontedo e, depois de longos debates, redigem texto, no qual ospartidos social-democrticos e a II. Internacional so criticados: emvez da palavra-de-ordem permanecer a luta pela paz propemtransform-la de guerra imperialista em guerra civil (Lazitch,1951, pp. 40-1).

    Os bolcheviques so conseqentes na sua luta contra aburguesia. A posio de Lenine no nova e nem surge com oconflito de 1914. Em Congressos anteriores II. Internacional elese mostra partidrio da tese da transformao da guerra em guerracivil e, em 1907, junto com Rosa Luxembourg, assina documentocom o mesmo teor.

    Nos primeiros meses da guerra, momento em que ochauvinismo patrioteiro ainda domina, as condies de luta afavor da paz so mnimas. A partir de 1915, o desencanto comeaa se manifestar entre algumas correntes de esquerda, comoindividualmente em alguns membros da classe dominante. Aexistncia das novas condies objetivas leva determinadascorrentes internacionalistas a pensarem em traduzir a sua revolta,agora de maneira coletiva e no mais dispersa ou exclusivamentepartidria.

    Reunidos em 1915, em Zimmerwald, vilarejo situado naSua, esto presentes delegados de vrias correntes e vriasnacionalidades. A Conferncia marcada para 15 de maio desseano, em reunio realizada em Berna, Sua. Nela j se comprovaa situao diferencial existente entre os participantes, situaoque volta a se repetir na Conferncia de Zimmerwald, em setembrode 1915. Em Berna, Zinoviev quem participa em nome dosbolcheviques, e defende a tese de Lenine, que encontra resistnciados outros seis delegados que so contra a idia de fundar a III.Internacional e de transformar a situao existente em guerra civil;a outra corrente deseja que cessem imediatamente as hostilidadese que se convide para a prxima reunio os representantes de

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    todas as correntes, at os prprios companheiros do centristaKautski (Lazitch, 1951, pp. 44-5).

    A reunio em Zimmerwald se realiza entre 5 e 8 de setembrode 1915. Dela participam 39 socialistas da Alemanha, 10 membros,de tendncia do centro, (Georg Ledebour e Adolph Hoffemann; 3do grupo Spartacus Ernest Meyer e Bertha Thaleimer - e JulienBorchard, redator de jornal). Dos russos, temos Lenine e Zinoviev,da parte bolchevique; Axerold, Martov e Martinov, pelomencheviques; Natanson-Brovov e Tchernov em nome dossocialistas-revolucionrios; e Trotski, em nome do jornal NashSlavo. Alm deles, Bergan, pela social democracia da Letnia;Lemansky, pelo Bund, partido social democrata judaico; A. Warley,pela social democracia polonesa; K. Radek, pelo C.N. Polons;Lapinsky, pelo partido socialista polons; pelo partido socialistaitaliano, Lazzaro, Modigliani, Morgari Serrati e A. Balabanova;pela Federao Socialista Balkanica, Rakovski; pelo P.S. Romeno,Kolarov e, pelos blgaros, Hoglnd; T. Noerman, pela esquerdanorueguesa, Henriette Roland-Host, pela holandesa; da Frana,A. Merrhein e A. Bourderon; da Sua, R. Grimm, F. Platten e F.Graber. Fora 3 ingleses, que no comparecem por terem sidodetidos pelo governo do seu pas.

    Horas antes do incio do Congresso, comeam asdivergncias: Lenine envia partidrios para receber os francesese inicia-se a discusso: ele favorvel criao imediata da IIIInternacional; defende a tese de declarar a greve das massascontra a guerra. Merrheim responde a Lenine: no vim aquipara fundar uma III. Internacional. Vim para lanar e fazer ouvir ogrito de minha conscincia angustiada ao proletariado de todos ospases, para que ele se lance internacionalmente numa ao contraa guerra. Durante a reunio, Lenine tambm ataca Ledebour,quando este se mostra favorvel tese de continuar a votar, nofuturo, os crditos de guerra pelo Reichstag alemo.

    As divergncias da ala revolucionria e os centristas seacentuam, durante a redao do Manifesto, cujo esboo obra deTrotsky; da concluso geral participam Lebedour, Grinn, Lenine,

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    Trotsky, Merrheim, Rakovsky e Modigliani. A linha bsica a daluta contra os princpios e teorias de Lenine. Os bolcheviques,por sua vez, apresentam os textos do Manifesto do seu Partido,em 1o. de novembro de 1914 e a Resoluo na Conferncia deBerna, em fevereiro de 1915 e os projetos das Conferncias dasMulheres e dos Jovens, em fevereiro de 1915. Nenhuma das trsobteve os votos da maioria dos delegados, ficando assim relegadasas teses sobre a transformao da guerra imperialista em guerracivil, sobre a necessidade de uma ruptura completa, no s com ossociais patriotas, mas tambm com o do centro, alm do repdio tese sobre a criao de uma III. Internacional (Lazitch, 1951, pp.46-9).

    O manifesto aprovado declara que a guerra era o produtodo imperialismo e as instituies, produto do regime capitalista:os governos monrquicos ou republicanos, a diplomacia secreta,as poderosas organizaes patronais, os partidos burgueses, aimprensa capitalista e a Igreja dividem a responsabilidade dessaguerra. Culpados tambm so os partidos socialistas que fogemaos compromissos votados anteriormente nos CongressosInternacionais de Sttutgar (1907), Copenhague e Ble. Ns queno nos acomodamos sobre o terreno da solidariedade nacionalcom nossos exploradores, mas que continuamos fiis solidariedadeinternacional do proletariado e luta de classes, ns nos reunimospara renovar os laos rompidos das relaes internacionais, paraapelar classe operria que retome conscincia de si mesma e aconduza na luta pela paz (Lazitch, 1951, pp. 49-50).

    Apesar de Lenine denunciar que a Conferncia deZimmerwald resulta em vitria das faces contemporizadoras,ele no deixa de assinar o documento, pois tambm ele um avano,quando internacionaliza a questo da luta a favor do socialismo.Outro resultado positivo a criao, durante o Congresso deZimmerwald, de uma Comisso Socialista Internacional, sediadana Bernia, que aparece sob o lema de que a tarefa principal dosocialismo deve ser, hoje, a de unir o proletariado internacionalnuma fora revolucionria ativa, ligada, em tempo de paz como

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    em tempo de guerra, pela comunidade das concepes, dosinteresses e dos deveres (Lazitch, 1951, p. 55). E a Comissomostra-se ativa, marcando para 5 de fevereiro de 1916 outra reuniointernacional.

    Essa outra reunio acontece em Kienthal, de 24 a 30 deabril de 1916. Dela participam 45 delegados, dos quais 7 daAlemanha (seriam 16, faltando Kautski, Haase e Berstein): PaulFrlich, Ernest Meyer, Berta Thalheimer entre outros. Da Frana,so 4 representantes: F. Loriot, Guilbeaux; a Itlia conta com 7delegados, entre eles Serrati e Angelica Balabanova; a Rssiaenvia Lenine, Zinoviev, Inessa Armand (pelos bolcheviques);Axelrod e Martov (pelos mencheviques) e outros 3 pelos socialistas-revolucionrios; da Polnia so 5, entre eles K. Radek; da Sua6; de Portugal, 1 (Edmundo Peluso); da Srvia 1 e da ustria, 2.

    A convocao coincide com o aumento do descon-tentamento devido ao problema da guerra suja (uso de gs),repercutindo principalmente entre camadas da classe mdia e doproletariado. Nesse curto espao de tempo, que vai de Zimmerwalda Kienthal, do-se na Itlia e Sua reunies entre lideranaspartidrias sindicais: francesas e italianas, suas e alems, russase suas. nesse novo clima que ocorre a Conferncia de Kienthal.

    A realizao da Conferncia de Kienthal se faz a partir dosprincpios expostos pelo manifesto de Zimmerwald, que reza: atarefa principal do socialismo deve ser hoje a de reunir o proletariadointernacional em uma fora internacional de ao, ligada em tempode paz como em tempo de guerra pela comunidade das concepes,de interesses, de deveres. De comum acordo, baseado na Ordemdo Dia, so discutidos temas como o Direito da Participao dosDelegados, a luta para por fim guerra, a atitude do proletariadoem face aos problemas da paz, agitao e propaganda: aoparlamentar e ao de massas.

    No entanto, dos temas tratados, sobressaem o da atitudedo proletariado em face aos problemas da paz. O documentocomea afirmando que a

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    guerra atual a conseqncia dos antagonismos imperia-listas resultantes do regime capitalista. As foras capita-listas exploram, no seu interesse, os problemas da nacio-nalidade sem soluo, as aspiraes dinsticas e tudo oque sobrevive do passado colonial. O verdadeiro fim daguerra o de provocar uma nova repartio das posses-ses coloniais e de submeter os pases atrasados econo-micamente ao imprio da alta finana. A guerra, no po-dendo suprimir o regime capitalista, no pode igualmenteeliminar as causas das guerras futuras. Ela refora a oligar-quia financeira (...) As anexaes realizadas pela violnciaexcitam o dio entre os povos, produzem novas causas defrico e de choques. As alianas polticas e as coalizesdas potncias so meio prprio para prolongar e estendera guerra econmica provocando conflagraes mundiaissempre mais graves.

    Os projetos para por fim guerra, de autoria dos pacifistasburgueses e de socialistas nacionalistas, substituem vrias ilusespor outras novas. Eles tapeiam as massas, desviando-as do caminhoda luta de classe. Se o regime capitalista incapaz de asseguraruma paz durvel s o socialismo criar as condies necessrias sua realizao (Droz, 1968, pp. 190-1).

    O foco essencial dos debates desses anos que permeiam1914 a 1919 no unicamente a questo da traio ao destinohistrico e revolucionrio da classe operria, como o do sentido desua organizao e funo internacional. Da o nascimento de umaquesto primordial, que divide as lideranas trabalhistas: deve-secontinuar prestigiando a II. Internacional, mesmo aps a maioriade seus lderes terem aderido ao social-patriotismo? A II.Internacional representa ainda a classe operria e, por essa razo,deve-se lutar para vencer os oportunistas e patrioteiros, desalojando-os de suas lideranas partidrias? Finalmente, outra corrente fala

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    em morte da II. Internacional e viva III., slogan que mostra oradicalismo revolucionrio da corrente.

    Quando Lenine v confirmado o apoio de partidos da II.Internacional ao esforo de guerra de seus respectivos pases,imediatamente fala em se fundar uma III. Internacional: a II.Internacional est morta, vencida pelo oportunismo. Abaixo osoportunistas e viva a III. Internacional desembaraada no s dostrnsfugas mas tambm do oportunismo! A II. Internacionalpreencheu sua tarefa, til, preparatria, da organizao das massasproletrias, durante uma longa poca de paz que foi aquela daescravido capitalista, a mais cruel, e do progresso capitalista, omais rpido (ltimo tero do sculo XIX e comeo do sculo XX).Cabe III. Internacional organizar as foras do proletariado parao assalto revolucionrio dos governos capitalistas, para a guerracivil contra a burguesia de todos os pases, para a vitria dosocialismo (Lazitch, 1951, pp. 190-1).

    O prognstico vai levar ainda trs anos para se concretizar.Naquele momento, a maioria dos militantes dos Partidos Socialistasda Europa estranham a proposta dos internacionalistas. Em abrilde 1917, na Conferncia Pan-Russa Bolchevique, Lenine volta questo, falando da tarefa do nosso partido que milita num pasonde a revoluo comeou mais cedo do que os outros, o detomar iniciativa da criao duma III Internacional, que romperdefinitivamente com os defentistas e que combater resolutamentea poltica hbrida do centro (Lazitch, 1951, p. 76).

    A anlise que Lenine faz das condies revolucionrias e adefesa das teses extremistas tambm no so aceitas por grandenmero de seus partidrios. Na Conferncia de Berna, que vai dejaneiro maro de 1915, partidrios da direo bolchevique, comoBukharin, Krilenko e Piatakov se dizem contrrios ao extremismode suas solues, como nos casos da transformao da guerraimperialista em guerra civil, a do derrotismo revolucionrio e apalavra-de-ordem de paz. Meses depois h a polmica em queesto de um lado, Lenine e Zinoviev, e doutro, Radek e um grupode bolcheviques. Entretanto a situao mais crtica dentro do

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    prprio meio socialista: O ponto de vista de Lenine diferia doresto da imigrao russa em duas questes fundamentais: o daguerra imperialista e o da fundao de uma nova internacional. Aposio de Lenine sobre a guerra, que se resumiria nas palavras-de-ordem transformao da guerra imperialista em guerra civil ederrota do seu prprio governo, no foi aceita por nenhum grupoe nenhum agrupamento e nenhum chefe socialista russo naimigrao. O mesmo - a concepo de Lenine do que trata doabandono da II. Internacional e a fundao da III. - no encontroutambm a aprovao dos chefes socialistas russos na imigrao(Lazitch, 1951, pp. 31-3).

    No decorrer de 1915 e 1916, Lenine persiste, em todas assituaes possveis, na defesa e divulgao de suas teses, mas oresultado diminuto. a situao objetiva, que se encaminha parao caos isto , a crise da guerra -, que vai dar razo aosbolcheviques: aumentam as revoltas militares nos pases embeligerncia; Nicolau II abdica ao trono; os franceses e inglesespressionam o novo governo russo a continuar participando doconflito armado; os operrios das grandes cidades como Moscoue So Petesburgo entram em greves contnuas etc. Osacontecimentos acabam provocando crise institucional na Rssia,o que facilita o processo revolucionrio e os acontecimentos deOutubro de 1917.

    O poder bolchevique, que se inicia nessa hora, vai levarmeses e at anos para se consolidar. At 1920 ou 1921 temos,ainda, momento de instabilidade do poder comunista, devido aosataques militares dos pases burgueses Rssia: so os japonesese americanos na Sibria, os franceses no Mar Negro, os alemes,poloneses e franceses na Sibria. Mesmo nessa hora de sufoco,Lenine no abandona a idia de criar uma nova Internacional, aIII..

    Poucos dias aps a sua chegada Rssia, Lenine redige assuas Teses de Abril. Na dcima sexta tese, afirma que a guerraprovoca a formao de trs correntes no movimento operrio: 1)a social-chauvinista, que so socialistas em palavras e chauvinistas

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    de fato, cuja maioria composta de chefes social-democratas detodos os pases; 2) os kautskistas do centro, que so osrevolucionrios e internacionalistas em palavras, mas reformistase aliados do social-chauvinismo de fato; 3) e os internacionalistas,representados pela esquerda Zimmerwaldeana, que so pela cisodas duas correntes anteriores.

    No mesmo ms e ano (abril de 1917), os bolcheviques, naConferncia Pan Russa, voltam a acentuar a necessidade deconvocao de uma III. Internacional que romper definitivamentecom os defentistas e combater resolutamente com a polticahbrida do centro (Lazitch, 1951, p. 76).

    A deciso final acontece em janeiro de 1919 aps a reuniode pequeno grupo de dirigentes bolcheviques Lenine, Tchicherine,Sirola (da Finlndia) e J. Feinberg. Logo depois, no dia 19 de janeiro,divulga-se Manifesto, encabeado com os nomes de Lenine, Trotski,em nome do Comit Central do Partido; Karsky, pelo bureauestrangeiro do PC Polons; Roudniausky, pelo PC da Hungria;Duda, pelo PC da ustria; Rakovsky, pela federao balcnica;Rosing pelo PC da Letnia; e Rheiustein e Sirola.

    Marcado para comear em 15 de janeiro de 1919, conformedeterminao anterior, a primeira reunio transferida para 3 demaro. Nessa data, d-se a inaugurao da III InternacionalComunista, sendo considerado o seu Primeiro Congresso.Entretanto, a sua realizao no ato pacfico, como veremos emoutra parte.

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICASDROZ, J.H. Lorigine de linternationale committe: de Zimmerwald Moscou.

    Neuchtel: ditions de la Baconnire, 1968.

    LAZITCH, B. Lnine et la troisime internationale. Neuchtel: ditions de laBaconnire, 1951.

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    Edgard CaroneRESUMO: O texto analisa o rico processo histrico (de finais do sculoXIX e primeiras duas dcadas do XX) de lutas de classes e de ideologiado movimento socialista, que culminar com a fundao da III InternacionalComunista.

    PALAVRAS-CHAVE: Socialismo, revoluo, internacionalismo, partidos,ideologia, reformismo, esquerda.

    ABSTRACT: This texts analyses the rich historical process (from the endof the 19th century to the first two decades of the 20th century) of the classconflict and idealogy of the socialist movement, which will end up withthe institution of the III Communist International.

    KEY WORDS: Socialism, revolution, internationalism, political parties,ideology, reform, left.