caroline rodrigues da silva thiago beno de oliveira...editora jml rua mandaguaçu, 534 - sobre loja,...

302
MANUAL DAS ESTATAIS Caroline Rodrigues da Silva | THIAGO BUENO DE OLIVEIRA 1 Curitiba, 2019

Upload: others

Post on 25-Oct-2020

0 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

1Curitiba, 2019

Page 2: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Editora JMLRua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430Central de Relacionamento JML: (41) 3595.9999Fax: (41) 3595.9998Portal: www.jmleventos.com.br

REVISÃOAna Rapha Nunes

PROJETO GRÁFICO & DIAGRAMAÇÃOStudio Bild Design & Fotografia

Marcela Grassi Mendes de Faria

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

S586 Silva, Caroline Rodrigues da

Manual das estatais: questões jurídicas, práticas e

essenciais de acordo com a lei 13.303/2016 [livro eletrônico]. /

Caroline Rodrigues da Silva, Thiago Bueno de Oliveira. - Curitiba:

Editora JML, 2019.

1,71Mb; PDF.

ISBN 978-85-93826-05-4

1. DIREITO.

CDD 340

Page 3: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

APRESENTAÇÃO .............................................................................. 10PREFÁCIO – Phd. Dr. RODRIGO PIRONTI ......................................... 12DEDICATÓRIA THIAGO ...................................................................... 14DEDICATÓRIA CAROLINE .................................................................. 15

Microtema: Entendendo melhor as disposições preliminares ...16Questão 01 .................................................................................... 17

- A exceção de aplicação legislativa às Estatais que tiverem, em conjunto com suas respectivas subsidiárias, no exercício social anterior, receita operacional bruta inferior a R$ 90.000.000,00 (noventa milhões de reais) é relativa ou não?

Questão 02 .................................................................................... 20- A participação de empresa estatal no fomento de startups gera participação societária, absorvendo as recomendações do parágrafo segundo, do art. 2º, ou se trata de mero contrato de patrocínio com pessoa física ou com pessoa jurídica para promoção de atividades culturais, sociais, esportivas, educacionais e de inovação tecnológica, desde que comprovadamente vinculadas ao fortalecimento de sua marca, dentro dos limites do § 3º, do art. 27?

Questão 03 .................................................................................... 23- Houve alguma alteração na definição/conceito de Empresa Estatal?

Questão 04 .................................................................................... 25- O regime jurídico foi alterado? Qual(is) eventual(ais) inovação(ões)?

Microtema: Estatutos, Transparência, Responsabilidade e Elegibilidade ................................................................................... 28

Questão 05 .................................................................................... 29- O que efetivamente as Estatais precisam prever, a partir de agora, em seus estatutos sociais que não se tinha antes?

Questão 06 .................................................................................... 32- Qual o fundamento lógico-jurídico por trás dos requisitos de transparência previstos no art. 8º, da Lei Federal n.º 13.303/16?

sumário

Page 4: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Questão 07 .................................................................................... 35- A demonstração do interesse público das Estatais nos moldes do art. 8º, inciso I e parágrafo 1º é suficiente? Como evitar a construção de argumentos retóricos?

Questão 08 .................................................................................... 38- Por que se exigir regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno às Estatais?

Questão 09 .................................................................................... 45- Avaliação de desempenho de administradores e membros de conselho realmente é possível? Quem avalia o quê?

Questão 10 .................................................................................... 47- Como realmente se dá a transitividade do prazo de gestão dos membros dos Comitês (Administração e Fiscal) e Diretoria em Reconduções e “mandatos tampões”?

Questão 11 .................................................................................... 49- Quais são realmente os atos de abuso de poder que podem eventualmente ser praticados pelo acionista controlador da Estatal previstos na Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976?

Questão 12 .................................................................................... 51- Os inovadores requisitos de elegibilidade previstos no art. 17 realmente visam afastar o elemento político das nomeações das Estatais?

Questão 13 .................................................................................... 52- As vedações previstas no § 2º do Art. 17 não se constituem em mácula à representatividade democrática?

Questão 14 .................................................................................... 53- Os requisitos de elegibilidade e vedações dos Administradores (Diretoria e Conselho de Administração) são os mesmos impostos para os membros do Conselho Fiscal? Se não, em que difere?

Questão 15 .................................................................................... 55- Como se dá o processo do tal “voto múltiplo” relacionado à eleição de conselheiro de administração pelas minorias (acionistas minoritários)?

Page 5: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Questão 16 .................................................................................... 56- Por que se vedar a participação remunerada de membros da Administração Pública Direta e Indireta em mais de dois conselhos (administrativo ou fiscal) de alguma estatal (incluindo suas subsidiárias)?

Microtema: Conselho de Administração, Fiscal, de Auditoria e Diretoria .......................................................................................... 57

Questão 17 .................................................................................... 58- O comitê de auditoria estatutário não acaba se sobrepondo à estrutura de Auditoria Interna?

Microtema: Função Social da Estatal ......................................... 66Questão 18 .................................................................................... 67

- Como efetivamente orientar a Estatal para o alcance do bem-estar econômico e para a alocação socialmente eficiente dos recursos geridos, visando à realização do interesse coletivo?

Questão 19 .................................................................................... 71- Como estabelecer práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social corporativa compatíveis com o mercado de atuação da estatal?

Microtema: Da dispensa e inexigibilidade de licitação ............ 73Questão 20 .................................................................................... 74

- Quais os elementos abrangidos na dispensa da observância das regras de licitação tratada no artigo 28, §3°?

Questão 21 .................................................................................... 86- Os novos valores de dispensa por valor são maiores comparados ao antigo limitador. Contudo, eles realmente retratam uma adequação econômico-financeira ao longo do tempo?

Questão 22 .................................................................................... 89- É possível aplicar às Estatais os mesmos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais nas hipóteses de contratação direta de seus correspondentes da Lei 8.666/93?

Questão 23 .................................................................................... 92- Sobrepreço e superfaturamento definitivamente não são a mesma coisa. Qual a diferença?

Page 6: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Disposições gerais sobre Licitações e Contratos 94Questão 24 .................................................................................... 95

- Por que não houve alteração na lógica licitatória com a nova legislação?

Questão 25 .................................................................................... 98- Como compreender as diretrizes a serem observadas pelas Estatais e dispostas no artigo 32?

Questão 26 .................................................................................... 100- Quais cuidados devem ser adotados para a padronização?

Questão 27 .................................................................................... 108- Como extrair o significado de maior vantagem competitiva?

Questão 28 .................................................................................... 113- Utilizar ou não utilizar a modalidade pregão? Eis a questão!

Questão 29 .................................................................................... 119- Como aplicar “legística material” aos regulamentos de licitações e contratos e garantir a qualidade normativa do art. 40?

Questão 30 .................................................................................... 121- O valor estimado da contratação é, como regra, sigiloso. Seria esse sigilo uma garantia de elaboração de propostas mais vantajosas às Estatais? Quais os aspectos positivos e negativos apontados sobre o sigilo?

Microtema: Licitações sustentáveis nas Estatais..................... 135Questão 31 .................................................................................... 136

- O que são e quais os obstáculos para instituir as contratações sustentáveis?

Questão 32 .................................................................................... 145- Como aplicar as normas socioambientais nas contratações das Estatais?

Questão 33 .................................................................................... 161- É possível exigir certificação de qualidade sob o aspecto ambiental?

Questão 34 .................................................................................... 168- O que é o ciclo de vida do produto e como ele se relaciona à vantajosidade da proposta?

Page 7: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Disposições específicas para obras e serviços de engenharia ...................................................................................... 173

Questão 35 .................................................................................... 174- Quais alertas necessários para implementar o serviço de execução “contratação semi-integrada”, novo padrão estabelecido na Lei 13.303/16?

Questão 36 .................................................................................... 176- Os serviços de execução “contratação integrada” são a salvação para a “preguicite aguda do 3º grau” ou a salvação das contratações?

Microtema: Disposições específicas para aquisição de bens .. 179Questão 37 .................................................................................... 180

- Quais os parâmetros dispostos na Lei das Estatais sobre a aquisição de bens?

Questão 38 .................................................................................... 184- Como atender ao art. 48 e dar publicidade à relação de aquisições de bens? Qual é o fundamento dessa norma? É possível estender às contratações de serviços?

Microtema: Do processo licitatório ............................................ 187Questão 39 .................................................................................... 188

- Quais evoluções efetivamente ocorreram dentro do processo licitatório?

Questão 40 .................................................................................... 190- Modos de disputa são modalidades de licitação diferenciada? Qual a diferença?

Questão 41 .................................................................................... 192- Qual o processamento das licitações nos modos de disputa?

Questão 42 .................................................................................... 196- Os tipos de licitação foram afetados com a nova legislação?

Questão 43 .................................................................................... 198- Como utilizar o critério de julgamento de maior retorno econômico? E o de melhor destinação de bens alienados?

Page 8: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Questão 44 .................................................................................... 210- Como aplicar o tratamento diferenciado da Lei Complementar 123/06 às licitações das Estatais?

Questão 45 .................................................................................... 229- Há diferença entre o julgamento dos lances ou propostas e a verificação da efetividade dos mesmos? Quais os critérios de desclassificação da proposta?

Questão 46 .................................................................................... 246- A negociação é obrigatória? Há possibilidade de negociar outras condições além do preço?

Questão 47 .................................................................................... 249- Quais os parâmetros para estabelecer exigências de documentos de habilitação nas contratações ante a escassez da disciplina do artigo 58?

Questão 48 .................................................................................... 256- A lei das Estatais não dispôs sobre a exigência, como requisito de habilitação, de documentos de regularidade fiscal e trabalhista. Diante desse aspecto, é possível afirmar que não podem as entidades exigir tais documentos em suas contratações? Por outro lado, poderiam as Estatais disciplinar a matéria em regulamento próprio e estabelecer um elenco de documentos de regularidade fiscal e trabalhista a serem exigidos?

Questão 49 .................................................................................... 261- Qual o efeito da homologação do resultado da licitação?

Microtema: Dos procedimentos auxiliares ................................ 264Questão 50 .................................................................................... 265

- Pré-qualificação permanente é instituto novo?

Questão 51 .................................................................................... 266- Qual diferença entre pré-qualificação permanente e catálogo eletrônico de padronização e cadastramento?

Questão 52 .................................................................................... 267- Qual a validade da ata de registro de preços?

Page 9: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Dos Contratos ............................................................ 271Questão 53 .................................................................................... 272

- Como compreender a submissão dos contratos das Estatais ao regime de direito privado?

Questão 54 .................................................................................... 275- A Lei das Estatais não vinculou a duração dos contratos à vigência de créditos orçamentários, como dispunha a legislação anterior, mas limitou a cinco anos. Como estabelecer a vigência dos contratos?

Questão 55 .................................................................................... 278- Houve alguma alteração legal no que se refere às modificações contratuais?

Microtema: Das Sanções Administrativas .................................. 284Questão 56 .................................................................................... 285

- As Estatais podem aplicar as sanções dispostas na Lei 8.666/93 e na Lei 10.520/02?

Questão 57 .................................................................................... 289- Como elaborar a cláusula de penalidades administrativas?

Questão 58 .................................................................................... 292- É necessário instituir um procedimento para aplicação das penalidades? Quais as cautelas?

Questão 59 .................................................................................... 295- Qual a função da extensão da sanção da suspensão às empresas e aos profissionais definidos no art. 84?

POSFÁCIO – Dr. FÁBIO MEDINA OSÓRIO .......................................... 296REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................... 297

Page 10: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

10

APRESENTAÇÃOA Lei Federal n° 13.303/2016 (Lei das Estatais – LE) dispôs

sobre o estatuto jurídico da empresa pública e sociedade de economia mista, regulamentando diversos aspectos relacionados às normas de governança, controle, integridade, licitações e contratos, dentre outros temas, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios.

A LE regulamenta o artigo 173, §1° da Constituição Federal/88 e tem a pretensão de agregar maior transparência, impessoalidade, controle, eficiência e moralidade na atuação e contratações das Estatais em vista da sua natureza jurídica e do mercado em que atuam. Como toda lei que estabelece um estatuto jurídico, ainda mais com modificações substanciais em relação ao modelo anterior (Lei Federal n.º 8.666/93), a Lei Federal n.º 13.303/16 trouxe uma grande, variada e complexa carga de dúvidas quanto aos conceitos, normas e procedimentos edificados em seu texto.

Após dois anos da edição da Lei das Estatais e muitos treinamentos realizados pelo Brasil, os autores desta obra, Caroline Rodrigues da Silva e Thiago Bueno de Oliveira, decidiram compartilhar com o público em geral as diversas questões que têm nessa jornada, registrando suas considerações em relação a cada uma delas.

A intenção da obra é que ela possa ser considerada como fonte de consulta na rotina dos diversos empregados públicos, das inúmeras Empresas Estatais, sejam da União, dos Estados, do DF ou dos Municípios.

Page 11: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

11

Por isso, a obra está edificada em microtemas, alinhados com a estrutura normativa, contendo numeração sequenciada das perguntas, com o objetivo de facilitar a consulta por parte dos colaboradores das Estatais, em especial levando em consideração a pressa imposta pela rotina das atividades ordinárias.

Já com a intenção de transformar esta obra em repositório habitual de consulta e mantê-la sempre atualizada, pretendemos para as próximas edições responder às perguntas elaboradas pelos leitores, participantes das capacitações e alunos. Portanto, venha fazer parte desta obra também!

Por fim, desejamos uma boa leitura a todos, e ficamos na expectativa de que realmente alguns dos vários pontos temáticos tratados na Lei das Estatais possam ser esclarecidos. Até a nossa próxima edição.

Thiago Bueno e Caroline Rodrigues

Brasília/Curitiba, novembro de 2018.

Page 12: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

12

PREFÁCIO – Phd. Dr. RODRIGO PIRONTI

A obra que ora se apresenta à comunidade jurídica “Manual das Estatais: questões jurídicas, práticas e essenciais de acordo com a Lei 13.303/16”, de Caroline Rodrigues da Silva e Thiago Bueno de Oliveira é revestida de alto conteúdo prático, forjado na vivência diária de seus autores com o tema e em suas concretas experiências acadêmicas com a novíssima – pois ainda fruto de debates muito incipientes – Lei das Estatais.

O Manual torna-se de indispensável leitura, quando sua proposta alia a singular didática de seus autores à forma de sua estruturação, é dizer, a modelagem escolhida (de perguntas e repostas), agregada das percepções precisas e objetivas de seus autores, transforma o texto não apenas em uma importante fonte pesquisa, senão também, em uma relevante reflexão ao conteúdo individual apresentado.

Nós, os administrativistas, temos trabalhado muito com as inovações de uma Administração Pública que se pretende cada vez mais dialógica e consensual. Neste sentido, surge como de fundamental importância as modernizações trazidas pela Lei 13.303/16, tema central do texto ora prefaciado.

Constitui dever da classe de administrativistas apresentar sugestões aos novos modelos legislados e, para além disso, questioná-los e aprimorá-los.

Questões como a nova estrutura de governança e a gestão de riscos nos contratos das estatais, os novos

Page 13: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

13

modelos de disputa e de relacionamento contratual que serão versados nos regulamentos destas empresas, dentre outros, representam temas fundamentais no atual debate jurídico e no cenário nacional.

Assim, como sempre nos ensinou o mestre Romeu Felipe Bacellar Filho, a compreensão de que o regime jurídico administrativo não se subsume ao chamado direito público, mas configura um regime de direito, implica, entre outros, na admissão de que o modelo trazido pela Lei das Estatais, inova e altera, positivamente, o regime empresarial-estatal até então conhecido. Neste aspecto, a obra torna-se indispensável.

Por fim, ao registrar nestas breves linhas a satisfação em ter pelos autores, a sugestão de meu nome para figurar como prefaciador deste importante Manual, não poderia deixar de reconhecer o brilhantismo e zelo com que Caroline Rodrigues e Thiago Bueno conduzem seus passos profissionais e acadêmicos e, da mesma forma, a qualidade técnica e de gestão da JML, empresa que honra o Estado do Paraná e o país, com sua gestão eficiente e com a condução limpa e proba de suas atividades.

Rodrigo Pironti Aguirre de Castro

Pós-Doutor em Direito Público pela Universidad Complutense de

Madrid

Doutor e Mestre em Direito Econômico pela Pontifícia Universidade

Católica do Paraná

Page 14: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

14

DEDICATÓRIA THIAGO

Dedico esta obra a todos os que direta e indiretamente nos auxiliaram para produzi-la. A Deus, por sempre nos acompanhar e iluminar o nosso caminho. Aos amigos, Juliano José Lopes e Julieta Mendes Lopes Vareschini, pela parceria de mais de década e por sempre receberem bem nossas ideias e propostas. À professora e amiga, Caroline Rodrigues, por ter aceitado este desafio em gerar conhecimento. Ao professor, consultor e eminente jurista Phd. Rodrigo Pironti, por engrandecer a presente obra com seu prefácio. Ao também professor, consultor, ex Ministro-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU) e jurista internacional, Dr. Fábio Medina Osório, por agraciar esta obra com seu posfácio. Aos nossos alunos, que nos proporcionam pensar em soluções.

Registro meu agradecimento especial à minha família. Aos meus pais (Arnaldo e Vanda), por terem nos concebido e pelo apoio sempre incondicional. À minha esposa, Adriana, e meus filhos, Guilherme e Raquel, pela compreensão em razão das inúmeras ausências e por serem o estímulo para que eu nunca desista de progredir. À tia Domingas, fiel escudeira, por todo o cuidado e dedicação para com os meus filhos.

Que possamos buscar constantemente inspiração em Paulo Freire, cuja humildade sempre contagiou e por definir pessoa sábia como “Aquela que sabe que não sabe tudo; Aquela que sabe que não é a única que sabe; Aquela que sabe que a outra sabe o que ela não sabe; Aquela que sabe que ela e a outra saberão muita coisa juntas; Aquela que sabe que ela e a outra pessoa não saberão tudo o que pode ser sabido”.

Page 15: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

15

DEDICATÓRIA CAROLINE

Aos meus pais, Ademir e Maria Helena, e ao meu companheiro, Cleverson, que me apoiam e acreditam em meu desempenho profissional de forma incondicional, com muito amor e compreensão.

À família e aos amigos, que enobrecem e colorem a vida.

Aos amigos, Juliano José Lopes e Julieta Mendes Lopes Vareschini, pela parceria e por proporcionar meu desenvolvimento profissional.

Aos colegas de trabalho, que impulsionam minha evolução profissional.

Ao professor Thiago Bueno, pela colaboração na obra.

Aos participantes de capacitações, que inspiraram esta obra e contribuem com as inquietações e entusiasmos.

A Deus e aos espíritos, que iluminam meu caminho.

Page 16: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Entendendo melhor as

disposições preliminares da Lei 13.303/16

Page 17: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

17

Questão 01- A exceção de aplicação legislativa às Estatais que tiverem, em conjunto com suas respectivas subsidiárias, no exercício social anterior, receita operacional bruta inferior a R$ 90.000.000,00 (noventa milhões de reais) é relativa ou não?

R: Ótima pergunta para começar esta obra dedicada a tentar superar os vários questionamentos naturais oriundos da aplicação prática da Lei das Estatais (Lei Federal n.º 13.303/16). Em pronta resposta ao questionamento, poderíamos afirmar que sim, a referida exceção é relativa, conforme demonstraremos na sequência.

O art. 1, § 1º, da Lei Federal n.º 13.303/16, consigna que o conteúdo do Título I (a tratar de disposição preliminar, regime societário e da função social da empresa estatal) não se aplica à empresa pública e à sociedade de economia mista que tiver, em conjunto com suas respectivas subsidiárias, no exercício social anterior, receita operacional bruta inferior a R$ 90.000.000,00 (noventa milhões de reais), ou seja, classificada como Estatal de menor porte. Contudo, acaba excepcionalizando o disposto nos arts. 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 11, 12 e 27, para afirmar que minimamente esses artigos devem ser obrigatoriamente cumpridos por tais Estatais.

De pronto, verifica-se que artigos relevantes como o art. 17, que prevê os requisitos de elegibilidade para a vaga de membro do Conselho de Administração ou de Diretoria, estariam fora de incidência.

Page 18: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

18

Assim, insurgem questionamentos naturais como: “Então se a Estatal XYZ tem receita operacional bruta anual de R$ 80 milhões de reais, não irá poder aplicar qualquer critério de elegibilidade para a sua Diretoria ou Conselho de Administração?”

Em uma primeira leitura, literal e restrita apenas ao início da Lei Federal n.º 13.303/16, poder-se-ia até pensar que sim. Contudo, ao realizar leitura sistemática de todo normativo, bem como de seu decreto regulamentador, verifica-se que a intenção legislativa foi outra.

A ratio legis foi apenas de retirar o caráter obrigatório de alguns dispositivos do Título I, da Lei Federal n.º 13.303/16, diante da condição mais simplificada que possuem as Estatais de pequeno porte. Ou seja, a real intenção é que adotem práticas de governança (entre elas critérios de elegibilidade) e controle proporcionais à relevância, à materialidade e aos riscos do negócio daquela determinada Estatal.

Infelizmente, no âmbito da lei ordinária federal, esse “espírito da lei” não ficou tão evidenciado. Entretanto, ao mergulhar na leitura do Decreto Federal n.º 8.945/161, verifica-se a materialização justamente da ratio legis apontada acima.

Isso porque consigna os requisitos de elegibilidade, as vedações de perfis para indicações aos cargos de Conselheiro de Administração e Diretor, contudo, proporcionais ao porte da Estatal, aos riscos aos quais está exposta e à complexidade de suas atividades. Por essa razão, o art. 53, parágrafo único, dispensa a

1 Regulamenta a Lei Federal n.º 13.303/16 no âmbito apenas da União.

Page 19: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

19

exigência de requisito adicional para o exercício do cargo de Diretor a que se refere o inciso II do caput do art. 24. E o art. 54 estabelece que os administradores deverão atender obrigatoriamente os requisitos estabelecidos no art. 28 (elegibilidade), apenas com metade do tempo de experiência previsto em seu inciso IV.

Em que pese ser possível construir pensamento jurídico diverso2, entendemos que a harmonização normativa na forma exposta é a única capaz de expressar o grande objetivo da primeira parte da inovação legislativa da Lei das Estatais: a busca por uma melhor governança e integridade. Por esse motivo, simplesmente não se aplicar dispositivos relevantes a Estatais de menor porte seria, em nossa opinião, um retrocesso não desejado.

2 Um outro raciocínio jurídico válido é que o Decreto acaba por ignorar o comando legal, uma vez que a lei menciona não se aplicar alguns dispositivos do Título I. Contudo, o decreto, ao regulamentar a referida legislação no âmbito da União, acaba mencionando a aplicabilidade do conteúdo de tais artigos de incidência inicialmente afastada.

Page 20: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

20

Questão 02- A participação de empresa estatal no fomento de startups gera participação societária, absorvendo as recomendações do parágrafo segundo, do art. 2º, ou se trata de mero contrato de patrocínio com pessoa física ou com pessoa jurídica para promoção de atividades culturais, sociais, esportivas, educacionais e de inovação tecnológica, desde que comprovadamente vinculadas ao fortalecimento de sua marca, dentro dos limites do § 3º, do art. 27?

R: É claro que para um fomento consistente, a resposta deve ser direcionada para a necessidade de participação societária, o que implica realmente em atender as recomendações do parágrafo segundo, do art. 2º, da Lei Federal n.º 13.303/16, que a propósito estabelece:

(...)

§ 2º Depende de autorização legislativa a criação de subsidiárias de empresa pública e de sociedade de economia mista, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada, cujo objeto social deve estar relacionado ao da investidora, nos termos do inciso XX do art. 37 da Constituição Federal.

Como se vê, há um duplo requisito: 1) Autorização Legislativa; 2) Pertinência temática entre os objetos sociais de investida e investidora.

Desdobrando a referida previsão legal, o art. 8º, do Decreto Federal n.º 8.9455/16, em seu art. 8º, acaba por avançar também no tratamento da matéria. Vejamos:

Page 21: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

21

Art. 8o  A participação de empresa estatal em sociedade privada dependerá de:

I - prévia autorização legal, que poderá constar apenas da lei de criação da empresa pública ou da sociedade de economia mista investidora;

II - vinculação com o objeto social da empresa estatal investidora; e

III - na hipótese de a autorização legislativa ser genérica, autorização do Conselho de Administração para participar de cada empresa.

(...)

§ 2o A empresa estatal que possuir autorização legislativa para criar subsidiária e também para participar de outras empresas poderá constituir subsidiária cujo objeto social seja participar de outras sociedades, inclusive minoritariamente, desde que o estatuto social autorize expressamente a constituição de subsidiária como empresa de participações e que cada investimento esteja vinculado ao plano de negócios.

§ 3º  O Conselho de Administração da empresa de participações de que trata o § 2º  poderá delegar à Diretoria, observada a alçada a ser definida pelo próprio Conselho, a competência para conceder a autorização prevista no inciso III do caput. 

Diante dessas perspectivas, empresas Estatais, como BNDESPAR, FINEP e CODEMIG, vêm se consolidando

Page 22: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

22

como grandes investidores, inclusive em startups3, independentemente do nível do investimento (seed capital, venture capital ou private equity)4.

Portanto, meros contratos de patrocínio com pessoa física ou jurídica, para promoção de inovação tecnológica (previstos no art. 27, § 3º), podem no máximo auxiliar a forma mais simples de investimento em startups, ou seja, seed capital. Quanto às demais formas de investimento, há de se compor a estrutura societária da investida, implicando em verificar as condicionantes legais mencionadas.

3 O BNDESPAR (BNDES PARTICIPAÇÕES S/A), subsidiária integral do BNDES S/A criada para administrar as participações em empresas detidas pelo banco, com a missão de desenvolver o mercado de capitais, é hoje o maior investidor em startups no Brasil. Compartilhamos aqui a redação do art. 15, inciso XXVI, do seu Estatuto Social, que, ao prever a competência do seu Conselho de Administração, fixa que cabe a ele: XXVI - autorizar, em linha com o plano de negócios da BNDESPAR aprovado nos termos do inciso XIV, as participações minoritárias da BNDESPAR no capital de outras sociedades, bem como suas participações em fundos de investimento cuja política preveja participações no capital de outras sociedades, podendo delegar tais competências à Diretoria, observada a alçada a ser definida pelo próprio Conselho e o disposto no artigo 18, XV, deste Estatuto;4 Para maior familiarização dos níveis de investimento, recomendamos a leitura da cartilha elucidativa desenvolvida entre a Apex-Brasil, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Anprotec e publicada pela Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP) (versão 2014). Em resumo, poderíamos assim contextualizar: Seed Capital: Investimento na fase inicial do negócio, visando quase sempre recursos para sua estrutura (típica situação de startups); Venture Capital: Investimento em empresas que já estão estruturadas, mas ainda em processo de crescimento e desenvolvimento; Private Equity: Investimento em empresas desenvolvidas que buscam consolidação no mercado.

Page 23: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

23

Questão 03- Houve alguma alteração na definição/conceito de Empresa Estatal?

R: Não. A Lei Federal n.º 13.303/16 não alterou a definição/conceito de Empresa Estatal. Portanto, o conceito clássico de Empresas Estatais, como sendo aquelas pessoas jurídicas de natureza jurídica de direito privado, cuja criação é autorizada por lei especifica, com patrimônio público ou misto (ou seja, com recursos essencialmente públicos), para a prestação de serviço público ou para a execução de atividade econômica de natureza privada5, permanece completamente válido.

Do ponto de vista legal, o conceito de Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista, previsto no ainda vigente Decreto-Lei n.º 200/67, de igual forma, continua válido. Vejamos:

Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se:

(...)

II - Emprêsa Pública [Sic] - a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criado por lei para a exploração de atividade econômica que o Govêrno [Sic] seja levado a exercer por fôrça de contingência ou de conveniência administrativa podendo revestir-se de qualquer das formas admitidas em direito.

(...)

5 Conceito imortalizado pioneiramente por Hely Lopes Meirelles em sua obra clássica: Direito Administrativo Brasileiro.

Page 24: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

24

III - Sociedade de Economia Mista - a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei para a exploração de atividade econômica, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União ou a entidade da Administração Indireta.

Page 25: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

25

Questão 04- O regime jurídico foi alterado? Qual(is) eventual(ais) inovação(ões)?

R: Esta é uma pergunta que requer destaque. De uma maneira direta e objetiva, deve-se ressaltar que não houve alteração no regime jurídico anteriormente posto, uma vez que continua sendo um regime jurídico diferenciado, contudo agora predominantemente de direito privado (vide leitura do art. 68)6.

Levando em consideração regime jurídico como o conjunto sistematizado de princípios, fundamentos teóricos e regras legais, que visam à disciplina de certo objeto, constata-se que em sede de contratos realmente houve uma evolução, uma vez que novos princípios foram adicionados e os fundamentos teóricos reformulados.

Entretanto, esse direcionamento para direito privado continua não significando o abandono por completo das regras de direito público, mesmo no âmbito dos contratos firmado pela Estatais. Em outras palavras, mesmo o art. 68 enunciando os preceitos de direito privado como drive para as contratações das Estatais, remanesce um “conteúdo mínimo” de direito público.

Primeiro, porque o próprio art. 68, da Lei Federal n.º 13.303/16, menciona expressamente que os contratos regidos pela referida legislação serão regulados também pelos dispositivos do já citado diploma legal, que, ao longo do seu texto, ainda traz conteúdo tipicamente publicista, como a pré determinação do seu conteúdo por

6 Art. 68. Os contratos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cláusulas, pelo disposto nesta Lei e pelos preceitos de direito privado.

Page 26: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

26

meio do edital; pela determinação em edital dos critérios de julgamento da proposta, que posteriormente irão impactar na execução do contrato; pela sua auditabilidade pelo controle externo e interno7.

Segundo, porque a atuação estatal é cada dia mais complexa, diante especialmente da ampliação da organização econômica e da busca de novas oportunidades de negócios. A natureza instrumental da entidade estatal para o cumprimento de sua função administrativa impõe a aplicação do que Marçal Justen Filho vem a chamar de “mínimo” de direito público. Em suas palavras:

Ser dotada de personalidade jurídica de direito privado não significa ausência de natureza estatal, o que exige instrumentos de controle e vinculação à realização dos valores da democracia republicana. Os recursos econômicos utilizados são, na origem, de titularidade estatal, portanto não podem ser utilizados senão para a realização dos interesses coletivos e para a promoção dos direitos fundamentais. A atribuição de poder econômico para aquela entidade é uma manifestação de poder político estatal, o que significa submissão ao controle inerente à tripartição de Poderes.8

7 Marçal Justen Filho, antes mesmo da edição da referida legislação das Estatais, já defendia que a entidade estatal de direito privado está sujeita a controles e limitações, destinados a assegurar sua natureza de instrumento para a realização dos valores de uma democracia republicana.8 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 207.

Page 27: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

27

Defende o autor que um ente estatal de direito privado “nunca poderá operar como se fosse uma empresa puramente privada, para a qual é legítimo buscar o lucro egoístico”9. De outro modo, o lucro visado pelas Estatais não deve ser o valor único nem fundamental da instituição.

O nível de extensividade dos preceitos de direito privado a ser aplicável aos contratos é perceptível com a eliminação das cláusulas exorbitantes. Ou seja, nada mais de alteração unilateral do contrato administrativo, de rescisão unilateral, ou de deixar de cumprir a obrigação que lhe é acometida, mesmo tendo a outra parte realizada a dela (mitigação da exceção do contrato não cumprido)10.

Mais uma vez nos socorrendo de Marçal Justen Filho, “o mínimo de direito público é mais amplo e extenso quando se trata de uma empresa prestadora de serviços públicos. É mais reduzido quando se trata de uma exploradora de atividade econômica”.

Portanto, a alteração imposta pela Lei Federal n.º 13.303/16 apenas redirecionou o regime jurídico diferenciado das Estatais, de preponderantemente de direito público, para preponderantemente de direito privado.

9 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 2009, p. 207.10 Defendemos que até na tipificação das infrações e das respectivas penalidades e valores das multas, houve incidência dos preceitos do direito privado, haja vista não serem mais tipicamente unilaterais, direcionadas única e exclusivamente ao contratado (o que daria a conotação de exorbitância). Até porque, a legislação tentou acompanhar o trending mundial de aproximação da forma de administrar a “coisa pública”, diante do “Estado-rede” que vivemos no atual Estado Contemporâneo, sob pena de gerar insulamento Estatal, o que provoca ainda mais o distanciamento da racionalidade de cada mercado.

Page 28: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Estatutos, Transparência,

Responsabilidade e Elegibilidade

Page 29: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

29

Questão 05- O que efetivamente as Estatais precisam prever, a partir de agora, em seus estatutos sociais que não se tinha antes?

R: Didaticamente, para melhor expor as inovações legislativas da Lei Federal n.º 13.303/16, classificamos o conteúdo a constar nos respectivos Estatutos Sociais em 2 grupos, a saber: Conteúdo Cogente e Conteúdo Facultativo.

Quanto ao primeiro grupo (Cogente), destacamos a necessidade de se observar em sua elaboração: I) atendimento às regras de governança corporativa, de transparência e de estruturas, práticas de gestão de riscos e de controle interno, composição da administração e, havendo acionistas, mecanismos para sua proteção; II) previsão de competências e vinculação hierárquica de áreas estruturalmente novas (gestão de riscos e compliance); III) definição quanto à constituição e funcionamento do Comitê de Auditoria Estatutário; IV) definição dos requisitos específicos para o exercício do cargo de diretor; V) definição dos parâmetros/quesitos para avaliação de desempenho, individual e coletiva, de periodicidade anual, dos administradores e dos membros de comitês; VI) definição, no mínimo, de um requisito específico adicional para o cargo de Diretor, em relação ao cargo de Conselheiro de Administração.

Nesse sentido, compartilhamos que o art. 9º, ao deliberar sobre regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno, estabelece em seus parágrafos 2º e 4º, que o Estatuto Social das referidas entidades deverão: I) prever as atribuições da área de cumprimento

Page 30: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

30

de obrigações (compliance)11 e de gestão de riscos, bem como estabelecer mecanismos que assegurem atuação independente da referida área (uma vez que a lei o artigo supracitado determina que tal área seja vinculada ao diretor-presidente e liderada por diretor estatutário)12; II) prever, ainda, a possibilidade de que a área de compliance se reporte diretamente ao Conselho de Administração em situações em que se suspeite do envolvimento do diretor-presidente em irregularidades ou quando este se furtar à obrigação de adotar medidas necessárias em relação à situação a ele relatada.

Adicionalmente, ressaltamos que o art. 13 impõe que a lei autorizativa de criação da empresa pública e da sociedade de economia mista deverá dispor sobre as diretrizes e restrições a serem consideradas na elaboração do estatuto da companhia, em especial sobre: (...) III - avaliação de desempenho, individual e coletiva, de periodicidade anual, dos administradores e dos membros de comitês, observados os seguintes quesitos mínimos: a) exposição dos atos de gestão praticados,

11 O termo compliance ainda está muito vinculado à ideia de cumprimento de leis, de conformidade jurídica, tanto que a legislação ora em análise absorveu justamente essa conotação. Acima disso, compliance deve ser entendido como um instituto que transcende a mera conformação/cumprimento de obrigações, se aproximando mais à ética substancial (material), a qual é regida quase sempre por princípios não necessariamente positivados, mas que guiam o comportamento dos membros de uma organização.12 Nesse quesito, fazemos uma pequena crítica quanto à forma de vinculação da referida área, em especial por direcionar sua conexão com uma pessoa específica (diretor-presidente) e não a um board (colegiado), como por exemplo um comitê ou um conselho de administração (como regra, pois há previsão de vinculação ao Conselho de Administração de forma excepcional, nas hipóteses descritas no art. 9º, § 4º, ou seja, quando se suspeite do envolvimento do diretor-presidente em irregularidades ou quando este se furtar à obrigação de adotar medidas necessárias em relação à situação a ele relatada). Esse tipo de vinculação unipessoal, em nossa opinião, acaba por potencializar o que chamamos de “Poder de Neutralização”, uma vez que se estará concentrando em apenas um tomador de decisão, fato este que pode fragilizar todo trabalho conduzido pela referida área de compliance.

Page 31: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

31

quanto à licitude e à eficácia da ação administrativa; b) contribuição para o resultado do exercício; c) consecução dos objetivos estabelecidos no plano de negócios e atendimento à estratégia de longo prazo13.

Quanto ao segundo grupo (Facultativo), ressaltamos a possibilidade de solucionar, mediante arbitragem, as divergências entre acionistas e a sociedade, ou entre acionistas controladores e acionistas minoritários14, assim como a possibilidade de dispor sobre a contratação de responsabilidade civil aos tomadores de decisão15.

13 Não mencionamos aqui a orientação quanto à necessidade de definição no que tange à constituição e ao funcionamento do Comitê de Auditoria Estatutário, bem como da definição dos requisitos específicos para o exercício do cargo de diretor, em razão da literalidade normativa de tais preceitos.14 Para essa referência, nos reportamos ao art. 12, parágrafo único, da Lei Federal n.º 13.303/16. Cumpre aqui salientar que a arbitragem é uma espécie de heterocomposição de conflitos. Nesse sentido, entendemos pertinente apresentar as 2 formas básicas de composição de conflitos reconhecidas no ordenamento jurídico brasileiro: a) AUTOCOMPOSIÇÃO: nesse caso, as próprias partes resolvem seus conflitos por meio de mútuas concessões, apesar da possibilidade de um terceiro intermediador das negociações. Podem ser instrumentos alternativos à atuação do Poder Judiciário e dividem-se em: Conciliação e Mediação; b) HETEROCOMPOSIÇÃO: nesse caso, os conflitos são intermediados e resolvidos por um terceiro estranho às partes em conflito, cuja decisão vincula as partes. Pode ser exercitada tanto extra como judicialmente e divide-se em: Arbitragem e Jurisdição Estatal (Poder Judiciário). Ressaltamos que o Estado brasileiro em diversos instrumentos legislativos reconhece a possibilidade de aplicação de métodos (alternativos ou padrão) para solução de controvérsias, destacando-se entre vários, a Lei Federal 13.140/2015 (Lei sobre mediação como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da Administração Pública), por meio da aplicação dos institutos da mediação judicial e extrajudicial, a qual acabou abrindo precedente embrionário para prever em seu art. 37, ser facultado aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, suas autarquias e fundações públicas, bem como às empresas públicas e sociedades de economia mista federais, submeter seus litígios com órgãos ou entidades da administração pública federal à Advocacia-Geral da União, para fins de composição extrajudicial do conflito. 15 Para essa referência, nos reportamos ao art. 17, § 1º, da Lei Federal n.º 13.303/16. Em resumo, o Seguro D&O visa resguardar conselheiros, diretores, administradores e gestores, que atuam por delegação e que desempenham funções decisórias na instituição, bem como garantir o pagamento de indenização, a título de perdas e danos, devido a terceiros pelo segurado, em decorrência de fato ou atos de gestão, pelo qual sejam responsabilizados, quando ocorridos durante o período de vigência da apólice ou durante o prazo complementar e suplementar aplicável.

Page 32: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

32

Questão 06- Qual o fundamento lógico-jurídico por trás dos requisitos de transparência previstos no art. 8º, da Lei Federal n.º 13.303/16?

R: Ao tecermos a leitura sobre o referido artigo16, depreendemos nitidamente que o foco normativo está na elaboração e divulgação de informações. Isso porque, o fundamento lógico-jurídico por trás de tais requisitos

16 Art. 8º. As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão observar, no mínimo, os seguintes requisitos de transparência: I - elaboração de carta anual, subscrita pelos membros do Conselho de Administração, com a explicitação dos compromissos de consecução de objetivos de políticas públicas pela empresa pública, pela sociedade de economia mista e por suas subsidiárias, em atendimento ao interesse coletivo ou ao imperativo de segurança nacional que justificou a autorização para suas respectivas criações, com definição clara dos recursos a serem empregados para esse fim, bem como dos impactos econômico-financeiros da consecução desses objetivos, mensuráveis por meio de indicadores objetivos; II - adequação de seu estatuto social à autorização legislativa de sua criação; III - divulgação tempestiva e atualizada de informações relevantes, em especial as relativas a atividades desenvolvidas, estrutura de controle, fatores de risco, dados econômico-financeiros, comentários dos administradores sobre o desempenho, políticas e práticas de governança corporativa e descrição da composição e da remuneração da administração; IV - elaboração e divulgação de política de divulgação de informações, em conformidade com a legislação em vigor e com as melhores práticas; V - elaboração de política de distribuição de dividendos, à luz do interesse público que justificou a criação da empresa pública ou da sociedade de economia mista; VI - divulgação, em nota explicativa às demonstrações financeiras, dos dados operacionais e financeiros das atividades relacionadas à consecução dos fins de interesse coletivo ou de segurança nacional; VII - elaboração e divulgação da política de transações com partes relacionadas, em conformidade com os requisitos de competitividade, conformidade, transparência, equidade e comutatividade, que deverá ser revista, no mínimo, anualmente e aprovada pelo Conselho de Administração; VIII - ampla divulgação, ao público em geral, de carta anual de governança corporativa, que consolide em um único documento escrito, em linguagem clara e direta, as informações de que trata o inciso III; IX - divulgação anual de relatório integrado ou de sustentabilidade.

Page 33: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

33

está calcado no conceito de transparência ativa, o qual, em apertada síntese, impõe a obrigação de divulgação, independentemente de solicitações, informações de interesse geral ou coletivo, essenciais para o exercício democrático do controle social.

A inspiração incipiente desse conceito vem da Lei de Acesso à Informação (LAI), a qual desde 2011 prevê em seu art. 8º que é dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas, devendo constar na referida divulgação, conteúdo atinente:

I – ao registro das competências e estrutura organizacional, endereços e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público;

II – aos registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros;

III – aos registros das despesas;

IV – às informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados;

V - dados gerais para o acompanhamento de programas, ações, projetos e obras de órgãos e entidades; e

VI - respostas a perguntas mais frequentes da sociedade.

Em razão disso, defendemos que tais divulgações precisam ser além de espontâneas, atinentes tanto a informações positivas, quanto negativas, por mais “doloroso” que possa transparecer, pois são elas

Page 34: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

34

(informações negativas) que irão permitir constatar/validar a evolução institucional no sentido de supera-las, demonstrando a maturidade institucional de resiliência, comprometimento, organização, entre outras vários elementos.

Essa interpretação é corroborada, em nosso ponto de vista, quando no art. 8º, da Lei Federal nº 13.303/16, o legislador determina como requisitos de transparência, a divulgação tempestiva e atualizada de informações relevantes, em especial as relativas a atividades desenvolvidas, estrutura de controle, fatores de risco, dados econômico-financeiros, comentários dos administradores sobre o desempenho, políticas e práticas de governança corporativa e descrição da composição e da remuneração da administração, a serem consolidadas em um único documento escrito (carta anual de governança), em linguagem clara e direta.

Não há instituição alguma que realize 100% do que foi previsto, não há estrutura de controle 100% segura, muito menos administradores com desempenho perfeito (100%), razão pela qual há de se evidenciar, mais uma vez, informações negativas. Essa atitude é que demonstra verdadeiramente a transparência de uma instituição.

Por isso, caso a Instituição decida não ir por este caminho, uma vez divulgadas as atividades desenvolvidas em um determinado ano, demonstrando o respectivo desempenho institucional, a partir do ano subsequente de publicação de tal documento, será possível comparar tais informações e verificar o que não foi cumprido, permitindo exigir esclarecimentos da Estatal quanto à essa questão. Ou seja, não há como se furtar em divulgar também informações negativas.

Page 35: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

35

Questão 07- A demonstração do interesse público das Estatais nos moldes do art. 8º, inciso I e parágrafo 1º é suficiente? Como evitar a construção de argumentos retóricos?

R: Apenas para relembrar, o art. 8º, inciso I e parágrafo 1º consignam que:

Art. 8º As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão observar, no mínimo, os seguintes requisitos de transparência:

I - elaboração de carta anual, subscrita pelos membros do Conselho de Administração, com a explicitação dos compromissos de consecução de objetivos de políticas públicas pela empresa pública, pela sociedade de economia mista e por suas subsidiárias, em atendimento ao interesse coletivo ou ao imperativo de segurança nacional que justificou a autorização para suas respectivas criações, com definição clara dos recursos a serem empregados para esse fim, bem como dos impactos econômico-financeiros da consecução desses objetivos, mensuráveis por meio de indicadores objetivos;

(...)

§ 1º O interesse público da empresa pública e da sociedade de economia mista, respeitadas as razões que motivaram a autorização legislativa, manifesta-se por meio do alinhamento entre seus objetivos e aqueles de políticas públicas, na forma explicitada na carta anual a que se refere o inciso I do caput. (g.f)

Page 36: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

36

Aparentemente, a materialização da referida Carta Anual pode gerar a sensação de que realmente a simples explicitação do alinhamento entre objetivos institucionais e a política pública a ser atendida evidencia o interesse coletivo ou o imperativo de segurança nacional que justificou a autorização da criação daquela determinada estatal.

Contudo, a perspectiva mais importante é saber identificar, em sua essência, se os objetivos institucionais são parte da solução (e em qual medida) da problemática proposta a partir daquela determinada Política Pública, sob pena de se construir cartas anuais retóricas17.

Para tanto, sugerimos “importar”, com as respectivas cautelas, parte de uma metodologia intitulada de “legística”, tipicamente aplicada para se garantir a qualidade de um determinado ato normativo, por meio da racionalização em sua elaboração, com a adoção de práticas de simplificação e consolidação, de modo a evitar a proliferação legislativa sem técnica ou rigor científico, permitindo uma avaliação dos impactos legislativos daquele determinado ato.

Em outras palavras, seria a tentativa de construir uma “avaliação do cumprimento do interesse público Estatal”. Nesse sentido, propomos a realização dos seguintes passos: a) Definição do problema externado a partir da Política Pública a ser atendida pela Estatal; b) Descrição

17 Ou seja, uso de mecanismos contundentes e ostentosos para ludibriar ou vangloriar-se. Discurso enfadonho e vazio. Nos termos do Dicionário Michaelis On-line: Discussão ou debate sem conteúdo. Estilo primoroso, mas pobre de ideias; verbosidade. Disponível em: https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/ret%C3%B3rica. Acesso em 30/10/2018.

Page 37: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

37

dos objetivos da Política Pública; c) Descrição dos objetivos institucionais da Estatal; d) Descrição das opções para se atingir os objetivos da Política Pública; e) Análise dos Impactos econômicos e sociais dos objetivos da Política Pública e institucionais da Estatal; f) Comparação entre as alternativas aventadas (custo-benefício).

Apesar de trabalhoso, é assim que se diagnosticará a real efetividade pública de uma determinada Estatal, de modo a expor verdadeiramente o seu interesse público.

Page 38: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

38

Questão 08- Por que se exigir regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno às Estatais?

R: Pergunta mais complexa do que aparenta ser. De modo reducionista, poderíamos afirmar simplesmente porque gestão de riscos e controle interno são dois dos quatro elementos básicos para o exercício de uma boa governança corporativa/institucional. Em sua perspectiva ampla, defendemos que a Governança será plenamente alcançada com a integração dos seguintes elementos:

Page 39: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

39

De um modo mais analítico, do ponto de vista do elemento “controle interno”, compartilhamos parte do “Glossário de termos do controle externo”, desenvolvido e utilizado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que prevê os seguintes conceitos:

Sistema de controle interno – sinônimo de controle interno aplicado a uma entidade (INTOSAI, 2004). No Brasil, a expressão também designa o conjunto de atividades avaliativas, unidades e órgãos instituídos para dar cumprimento às finalidades previstas no Art. 74, da Constituição Federal.

Controles internos – sinônimo de Atividades de controle.

Atividades de controle – ações estabelecidas por meio de políticas e procedimentos que ajudam a garantir o cumprimento das diretrizes determinadas pela administração para mitigar os riscos à realização dos objetivos (COSO, 2013). 18

Na visão da International Organization of Supreme Audit Institutions (INTOSAI), controle interno é um processo integrado e dinâmico efetuado pela direção e pelo corpo de colaboradores, estruturado para enfrentar riscos e fornecer razoável segurança de que, na consecução da missão da entidade, os seguintes objetivos gerais serão alcançados: (1) execução ordenada, ética, econômica,

18 BRASIL, Tribunal de Contas da União. PORTARIA-SEGECEX Nº 27 DE 24 DE OUTUBRO DE 2017. Atualiza o documento “Glossário de Termos do Controle Externo”. 2007, p. 33, 14 e 10, respectivamente.

Page 40: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

40

eficiente e eficaz das operações; (2) cumprimento das obrigações de accountability; (3) cumprimento das leis e dos regulamentos aplicáveis; (4) salvaguarda dos recursos, para evitar perdas, mau uso e dano.19

Pelo olhar da doutrina, controle interno é aquele exercido sobre “todo plexo de ações estabelecido pela Administração Pública, de efeito interna corporis, para promover a eficiência e a eficácia nas operações estatais e verificar o cumprimento das políticas estabelecidas em lei, visando ao alcance dos objetivos e metas anteriormente programados”20.

Quanto à perspectiva da gestão de riscos, iniciamos destacando a importância desse elemento de governança na ótica da International Organization of Supreme Audit Institutions (INTOSAI), para quem “No setor público, as expectativas gerais são de que os servidores públicos devem atender ao interesse público com justiça e administrar os recursos públicos adequadamente. (...) O objetivo do gerenciamento de riscos é permitir que a Administração trate efetivamente com a incerteza, e seus riscos e oportunidades associados, aumentando a capacidade de criar valor, fornecendo serviços mais efetivos, de modo mais eficiente e econômico, direcionando-os sempre levando em conta valores como equidade e justiça”.21

19 INTOSAI. International Organization of Supreme Audit Institutions. INTOSAI GOV 9100: Guidelines for internal control standards for the public sector, 2004. Disponível em: <http://www.issai.org/en_us/site-issai/issai-framework/intosai-gov.htm>. Acesso em 18 de dezembro de 2018, p. 15.20 GUERRA, Evandro Martins. Os controles externos e internos da administração pública. 2ª ed. Ver. e ampl. 2ª Reimpressão. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 274.21 INTOSAI. International Organization of Supreme Audit Institutions. INTOSAI GOV 9130: Guidelines for Internal Control Standards for the Public Sector - Further Information on Entity Risk Management, 2007. Disponível em: <http://www.issai.org/en_us/site-issai/issai-framework/intosai-gov.htm>. Acesso em 18 de dezembro de 2018, p. 5.

Page 41: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

41

A governança de riscos compreende todas as atividades coordenadas para dirigir e controlar uma organização no que se refere ao risco. Não é uma atividade autônoma, separada das demais, mas sim parte de todos os processos organizacionais, incluindo o planejamento estratégico, os projetos, atividades operacionais de rotina e processos de gestão em todos os níveis da organização.22

A compreensão da natureza do risco, a arte e a ciência da escolha, está no cerne da economia moderna. Cada escolha que fazemos, quando buscamos atingir um objetivo, tem seus riscos. Das decisões operacionais do dia a dia aos trade-offs fundamentais na reunião do conselho, lidar com o risco nessas escolhas faz parte do processo decisório.23

Quando avaliamos as escolhas possíveis, raramente as decisões são binárias, implicando uma resposta certa ou errada. É por esse motivo que podemos considerar o gerenciamento de riscos uma arte/ciência. Quando avaliamos os riscos durante o processo de definição da estratégia e dos objetivos de negócios de uma organização, o gerenciamento de riscos ajuda definitivamente na otimização dos resultados.24

O processo de gestão de riscos representa o conjunto de atividades contínuas, realizado pelas pessoas em todos os níveis da entidade, desde a definição das estratégias

22 BRASIL. ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. ABNT NBR ISO 31000: Gestão de riscos - princípios e diretrizes. 2018, p. 7.23 COSO. Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission. Enterprise risk management: Integrating with Strategy and Performance. Executive summary. 2017, p. 6.24 COSO. 2017, p. 6.

Page 42: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

42

até o nível das atividades operacionais, concebido para identificar riscos que possam afetar a capacidade da organização em atingir os seus objetivos e para apoiar tomadas de decisões e ações que forem necessárias para mantê-los em níveis compatíveis com os limites de exposição a riscos previamente estabelecidos, de maneira a fornecer segurança razoável do cumprimento dos objetivos25.

Como se vê, há de se desenvolver minimamente as funções de Controle Interno, Auditoria Interna, Compliance e Gestão de Riscos, interdependentes entre si, para que a Governança possa ser exercida em um nível satisfatório.

Destacamos que o importante é garantir o desenvolvimento/realização de funções e não a criação necessariamente de uma estrutura exclusivamente dedicada de todas elas (o que é desejável, mas não obrigatório).

Vale reforçarmos essa percepção com o art. 6º e 9º da Lei Federal n.º 13.303/2016, pois o referido diploma legal estabelece que o estatuto das Estatais deve, agora, observar regras de “práticas de gestão de riscos e de controle interno”.

Art. 6º O estatuto da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias deverá observar regras de governança corporativa, de transparência e de estruturas, práticas de gestão de riscos e de controle interno, composição da administração

25 BRASIL, Tribunal de Contas da União. Referencial Básico de Gestão de Riscos. 2018, p. 53.

Page 43: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

43

e, havendo acionistas, mecanismos para sua proteção, todos constantes desta Lei.

(...)

Art. 9º A empresa pública e a sociedade de economia mista adotarão regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno que abranjam:

I - ação dos administradores e empregados, por meio da implementação cotidiana de práticas de controle interno;

II - área responsável pela verificação de cumprimento de obrigações e de gestão de riscos;

III - auditoria interna e Comitê de Auditoria Estatutário.

Como se vê, o normativo menciona que as Estatais devem adotar uma estrutura que tenha uma área responsável pela conformidade e pela gestão de riscos, sem identificá-las como áreas formais e específicas na estrutura (diferente do que acontece com a auditoria interna).

Entretanto, no âmbito da União, o Decreto Federal n.º 8.945/16 deixou mais evidente a necessidade de constituição da área de compliance e de gestão de riscos, por não mais mencionar área responsável pela atividade, e sim como área específica e determinada. Vejamos:

Art. 15. A empresa estatal adotará regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno que abranjam:

I - ação dos administradores e empregados, por

Page 44: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

44

meio da implementação cotidiana de práticas de controle interno;

II - área de integridade e de gestão de riscos; e

III - auditoria interna e Comitê de Auditoria Estatutário.

Como se vê, percebe-se que nada se comenta sobre área de controle interno (como estrutura específica). A bem da verdade, a palavra “obrigatoriedade” só é utilizada para determinar a constituição do Conselho Fiscal, de Auditoria Estatutário (art. 24, IV e V, do Decreto Federal n.º 8.945/16) e auditoria independente (art. 12 do já citado decreto e art. 7º da Lei Federal n.º 13.303/16).

Por isso, mais uma vez, defendemos que o foco não é a criação de uma estrutura exclusivamente dedicada a todas essas funções básicas de governança, em especial: controle interno, gestão de riscos, compliance (estes dois últimos irão depender do decreto regulamentador da lei pelos demais entes federativos, uma vez que, pela simples previsão legal, o foco está em exercer apenas as respectivas funções no âmbito da instituição).

Page 45: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

45

Questão 09- Avaliação de desempenho de administradores e membros de conselho realmente é possível? Quem avalia o quê?

R: Sim. Assim como já exposto anteriormente nesta obra, a avaliação de desempenho de administradores e membros de comitê é tema a ser tratado obrigatoriamente nos Estatutos das Empresas Estatais, fato este que gera um comprometimento institucional muito maior.

Ao se analisar o inciso III, do art. 13, verificamos que o legislador nos brindou com os quesitos mínimos de avaliação do público-alvo deste questionamento, estabelecendo que deverão ser analisados, entre outros fatores:

a) exposição dos atos de gestão praticados, quanto à licitude e à eficácia da ação administrativa;

b) contribuição para o resultado do exercício;

c) consecução dos objetivos estabelecidos no plano de negócios e atendimento à estratégia de longo prazo.

Vejam que tais parâmetros avaliativos estão intrinsecamente conectados com a transparência das informações, que a propósito subsidiarão justamente a referida avaliação.

Contudo, o legislador federal (seja no âmbito da lei ordinária n.º 13.303/16, quanto do decreto regulamentador n.º 8.945/16) não definiu competência de quem faz avaliação de quem, nem previu o formato do processo de avaliação de desempenho26.

26 Até porque não deveria fazer tal tipo de especificação, por se tratar de matéria eminentemente operacional, tipicamente tratada em normativos internos institucionais. Contudo, infelizmente na estrutura normativa nacional tais procedimentos acabam sendo alvo rotineiro de normatização legal.

Page 46: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

46

O que se fez foi apenas conferir competência ao Comitê Estatutário de Elegibilidade para verificar a conformidade do processo de avaliação dos administradores e dos Conselheiros Fiscais.

Portanto, necessita (o Comitê) que o processo de avaliação seja definido, para que possa validar o seu efetivo cumprimento. Apesar de ser mera conformação procedimental, por ser um comitê estatutário, possui a segurança suficiente para apontar eventual irregularidade no cumprimento de um procedimento previamente definido, o que definitivamente pode inibir desvirtuamentos na referida avaliação.

De modo a responder a parte final deste questionamento (Quem avalia o quê?), por experiência profissional, verificamos diversos formatos: autoavaliações no âmbito daquele próprio conselho e diretoria executiva; avaliação por hierarquia (Diretoria Executiva pelo Conselho Deliberativo/Administração); avaliação por pares (Conselho de Administração pelo Conselho Fiscal e vice-versa).

Independentemente do formato institucional escolhido (o qual deixamos para os colaboradores com expertise em Recursos Humanos), o importante é garantir a avaliação dos requisitos mínimos fixados no art. 13, inciso III, da Lei Federal n.º 13.303/16.

Page 47: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

47

Questão 10- Como realmente se dá a transitividade do prazo de gestão dos membros dos Comitês (Administração e Fiscal) e Diretoria em Reconduções e “mandatos tampões”?

R: Essa é uma pergunta interessante porque temos situações distintas, a depender do cargo. Vejamos.

Para os membros do Conselho de Administração e para os cargos de Diretor, o prazo de gestão é unificado e não superior a 2 (dois) anos, sendo permitidas, no máximo, 3 (três) reconduções consecutivas (Art. 13, VI, da Lei Federal n.º 13.303/16 e Art. 24, VI e VII, do Decreto Federal n.º 8.945/16).

Já para os membros do Conselho Fiscal, o legislador foi omisso precisamente quanto à unificação ou não do prazo de gestão dos respectivos membros, restringindo-se a dizer que: o prazo de gestão dos membros do Conselho Fiscal não superior a 2 (dois) anos, permitidas 2 (duas) reconduções consecutivas (Art. 13, VIII, da Lei Federal n.º 13.303/16 e Art. 24, IX, do Decreto Federal n.º 8.945/16).

Dessa forma, de modo a suprir tal lacuna, nos permitimos construir raciocínio lógico-jurídico com base em normativo bastante utilizado quando se envolve Conselho Fiscal: Lei Federal n.º 6.404/76 (cuja aplicabilidade é inclusive reconhecida pela própria Lei Federal n.º13.303/16 – art. 26).

Nesse sentido, mergulhando na referida Lei das Sociedades por Ações (Lei Federal n.º 6.404/76), verificamos que recentemente (levando em consideração

Page 48: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

48

o tempo de edição da Lei 6.404) a Lei Federal n.º 10.303/01 (algo bem irônico, numeração exatamente 3 mil abaixo da Lei das Estatais) promoveu alterações normativas relevantes na Lei das S/A, entre as quais, destacamos a reformulação dos dispositivos que tratavam dos deveres e responsabilidades dos membros de Conselho Fiscal.

No art. 165, restou consignado que membros do conselho fiscal têm os mesmos deveres dos administradores (formado pelo Conselho de Administração e/ou Diretoria – art. 138) de que tratam os arts. 153 a 156 (cujos temas são: dever de diligência, finalidade das atribuições, desvio de poder, dever de lealdade e conflito de interesses).

Assim, seria juridicamente lógico e viável, estendermos a interpretação para considerar que o prazo de gestão dos membros de Conselho Fiscal também é unificado, na medida em que tal característica é aplicável aos Administradores.

Por fim, para os membros do Comitê de Auditoria Estatutário, o prazo de atuação pode variar de 2 a 3 anos, mas não é coincidente para cada membro27 (art. 39, § 9º, do Decreto Federal n.º 8.945/16).

27 Entretanto não é revelado no dispositivo normativo se o padrão segue ou não o modelo staggered board, que viabiliza a renovação gradual do conselho, com objetivo de evitar alterações em massa.

Page 49: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

49

Questão 11- Quais são realmente os atos de abuso de poder que podem eventualmente ser praticados pelo acionista controlador da Estatal previstos na Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976?

R: São atos que tangenciam a dupla conotação do abuso de poder: desvio de finalidade e excesso de poder (competência), além da isonomia e moralidade, e estão previstos no art. 117, § 1º. Vejamos:

Art. 117. O acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder.

§ 1º São modalidades de exercício abusivo de poder:

a) orientar a companhia para fim estranho ao objeto social ou lesivo ao interesse nacional, ou levá-la a favorecer outra sociedade, brasileira ou estrangeira, em prejuízo da participação dos acionistas minoritários nos lucros ou no acervo da companhia, ou da economia nacional;

b) promover a liquidação de companhia próspera, ou a transformação, incorporação, fusão ou cisão da companhia, com o fim de obter, para si ou para outrem, vantagem indevida, em prejuízo dos demais acionistas, dos que trabalham na empresa ou dos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;

c) promover alteração estatutária, emissão de valores mobiliários ou adoção de políticas ou

Page 50: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

50

decisões que não tenham por fim o interesse da companhia e visem a causar prejuízo a acionistas minoritários, aos que trabalham na empresa ou aos investidores em valores mobiliários emitidos pela companhia;

d) eleger administrador ou fiscal que sabe inapto, moral ou tecnicamente;

e) induzir, ou tentar induzir, administrador ou fiscal a praticar ato ilegal, ou, descumprindo seus deveres definidos nesta Lei e no estatuto, promover, contra o interesse da companhia, sua ratificação pela assembléia-geral;

f) contratar com a companhia, diretamente ou através de outrem, ou de sociedade na qual tenha interesse, em condições de favorecimento ou não equitativas;

g) aprovar ou fazer aprovar contas irregulares de administradores, por favorecimento pessoal, ou deixar de apurar denúncia que saiba ou devesse saber procedente, ou que justifique fundada suspeita de irregularidade.

h) subscrever ações, para os fins do disposto no art. 17028, com a realização em bens estranhos ao objeto social da companhia. (Incluída dada pela Lei nº 9.457, de 1997)

28 Exige a realização de ¾ do capital social da companhia.

Page 51: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

51

Questão 12- Os inovadores requisitos de elegibilidade previstos no art. 17 realmente visam afastar o elemento político das nomeações das Estatais?

R: Os requisitos de elegibilidade do art. 17, que são uma das grandes inovações atinentes ao capítulo dedicado a tratar de regime jurídico das Estatais, em nossa concepção, não têm a intenção de afastar a influência política na formação da composição de conselho de administração, fiscal (em grande medida) e de diretoria. Tanto é que se manteve a clássica sistemática de “indicação” ao cargo.

A pretensão foi apenas melhor qualificar as eventuais indicações políticas, de modo a prestigiar a formação técnica, a experiência profissional e a moralidade, em detrimento da pura e simples articulação político-partidária.

Em resumo, o que se deseja nos dias atuais não é a simples eliminação do poder político dos inúmeros procedimentos por ele influenciados, mas a obrigatoriedade de internalização da consciência ética-profissional da classe política.

Page 52: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

52

Questão 13- As vedações previstas no § 2º do Art. 17 não se constituem em mácula à representatividade democrática?

R: Desde a edição da Lei Federal n.º 13.303/16 temos ouvido falar (não em larga medida) que tais vedações acabam por mitigar/diminuir a representatividade democrática, em especial pela proibição de indicação de pessoa que atuou como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral, bem como de pessoa que exerça cargo em organização sindical.

Aos que assim pensam, ressaltamos que tais vedações indicadas acima (e devidamente previstas nos incisos II e III, do § 2º, do Art. 17) são transitórias, uma vez que estão condicionadas a uma temporalidade muito clara (últimos 36 meses ou tempo presente), de modo a tentar mitigar, em razão justamente da relevância de tais atividades, eventual conflito de interesse que possa comprometer o interesse coletivo ou influenciar, de maneira imprópria, o desempenho da função pública.

Page 53: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

53

Questão 14- Os requisitos de elegibilidade e vedações dos Administradores (Diretoria e Conselho de Administração) são os mesmos impostos para os membros do Conselho Fiscal? Se não, em que difere?

R: Não são os mesmos. A propósito, os requisitos de elegibilidade não são exatamente os mesmos nem entre os próprios Administradores. Isso porque o art. 24, inciso II, do Decreto Federal n.º 8.945/16, estabelece que o Estatuto Social da Estatal deverá definir, no mínimo, um requisito específico adicional para o cargo de Diretor, em relação ao cargo de Conselheiro de Administração.

Quanto aos candidatos a membros do Conselho Fiscal, alertamos que os requisitos de elegibilidade são menores do que os exigidos dos Administradores (Basta ler o art. 26, § 1º, da Lei Federal n.º 13.303/16 e art. 41, do Decreto Federal n.º8.945/16).

Contudo, no que tangem às vedações para indicação ao Conselho Fiscal, a diferença não é tão grande assim, uma vez que se aplica aos membros do Conselho Fiscal praticamente metade de tais vedações, proibindo-se a indicação: a) de representante do órgão regulador ao qual a empresa estatal está sujeita; b) de dirigente estatutário de partido político e de titular de mandato no Poder Legislativo de qualquer ente federativo, ainda que licenciado; c) de pessoa física que tenha firmado contrato ou parceria, como fornecedor ou comprador, demandante ou ofertante, de bens ou serviços de qualquer natureza, com a União, com a própria estatal ou com empresa estatal

Page 54: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

54

do seu conglomerado estatal, nos três anos anteriores à data de sua nomeação; d) de pessoa que tenha ou possa ter qualquer forma de conflito de interesse com a pessoa político-administrativa controladora da empresa estatal ou com a própria estatal; e) de pessoa que se enquadre em qualquer uma das hipóteses de inelegibilidade previstas na Lei Complementar n.º 64/90.

Como é possível observar, para o cargo de membro do Conselho Fiscal, o legislador não vetou a indicação de quem seja/exerça: a) Ministro de Estado, de Secretário Estadual e de Secretário Municipal; b) titular de cargo em comissão na administração pública federal, direta ou indireta, sem vínculo permanente com o serviço público; c) parente consanguíneo ou afim até o terceiro grau das pessoas mencionadas nos incisos I a IV; d) pessoa que atuou, nos últimos trinta e seis meses, como participante de estrutura decisória de partido político; e) pessoa que atuou, nos últimos trinta e seis meses, em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral; f) cargo em organização sindical.

Page 55: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

55

Questão 15- Como se dá o processo do tal “voto múltiplo” relacionado à eleição de conselheiro de administração pelas minorias (acionistas minoritários)?

R: O voto múltiplo é um instituto previsto no art. 141, da Lei Federal n.º 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações), constituindo-se em um procedimento facultativo de votação para eleição de membros do Conselho de Administração, a ser escolhido entre os acionistas minoritários, que representem no mínimo 10% do capital social com direito a voto, desde que exercida até 48 (quarenta e oito) horas antes da assembleia-geral.

Uma característica interessante é que se trata de um direito subjetivo do acionista minoritário, o que dispensa inclusive eventual previsão no Estatuto Social da Estatal.

Em resumo, trata-se de um procedimento em que se atribui a cada ação, tantos votos quantos sejam os membros do conselho, garantindo-se o direito de cumular os votos num só candidato ou distribuí-los entre vários.

Ou seja, o voto múltiplo atua para permitir a concentração de votos, a fim de tentar garantir a participação dos minoritários no conselho, fazendo prevalecer o interesse social, sobre o interesse dos controladores.

Page 56: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

56

Questão 16- Por que se vedar a participação remunerada de membros da Administração Pública Direta e Indireta em mais de dois conselhos (administrativo ou fiscal) de alguma estatal (incluindo suas subsidiárias)?

R: A intenção normativa foi eliminar a prática recorrente até então realizada no âmbito das Estatais e que acabava por gerar uma “distribuição” de cargos para membro de Conselhos, cujo somatório dos Jetons proporcionava rendas significativas, e às vezes incompatíveis com as atividades exercidas, especialmente pela insuficiência de tempo minimamente necessário para se dedicar ao exercício do cargo (diante de tal cumulatividade).

Page 57: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Conselho de Administração,

Fiscal, de Auditoria e Diretoria

Page 58: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

58

Questão 17- O comitê de auditoria estatutário não acaba se sobrepondo à estrutura de Auditoria Interna?

R: Não. Ao menos a intenção inicial é que não ocorra tal sobreposição de atividades. Contudo, a legislação, ao abordar competências e vinculações, tanto da Auditoria Interna, quanto do Comitê de Auditoria Estatutário, acaba ajudando a formar tal confusão, em especial ao mencionar que a Auditoria Interna deverá ser vinculada ao Conselho de Administração, seja diretamente ou por meio do Comitê de Auditoria Estatutário. Vejamos:

Lei 13.303/16

Art. 9º

§ 3º A auditoria interna deverá:

I - ser vinculada ao Conselho de Administração, diretamente ou por meio do Comitê de Auditoria Estatutário;

Mais a frente, o art. 24 da referida lei prevê algumas das competências atribuídas ao já citado comitê. Nesse sentido, verifica-se nitidamente que o seu grande objetivo é gerar a interface institucional, por meio do seu órgão máximo (Conselho de Administração), com o mundo externo (stakeholders/shapeholders), conforme destacamos abaixo:

Art. 24. A empresa pública e a sociedade de economia mista deverão possuir em sua estrutura societária Comitê de Auditoria Estatutário como órgão auxiliar do Conselho de Administração, ao qual se reportará diretamente.

Page 59: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

59

§ 1º Competirá ao Comitê de Auditoria Estatutário, sem prejuízo de outras competências previstas no estatuto da empresa pública ou da sociedade de economia mista:

I - opinar sobre a contratação e destituição de auditor independente;

II - supervisionar as atividades dos auditores independentes, avaliando sua independência, a qualidade dos serviços prestados e a adequação de tais serviços às necessidades da empresa pública ou da sociedade de economia mista;

(...)

V - avaliar e monitorar exposições de risco da empresa pública ou da sociedade de economia mista (...)

(...)

VI - avaliar e monitorar, em conjunto com a administração e a área de auditoria interna, a adequação das transações com partes relacionadas; 

(...)

VIII - avaliar a razoabilidade dos parâmetros em que se fundamentam os cálculos atuariais, bem como o resultado atuarial dos planos de benefícios mantidos pelo fundo de pensão, quando a empresa pública ou a sociedade de economia mista for patrocinadora de entidade fechada de previdência complementar. 

Page 60: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

60

Entretanto, a mesma previsão normativa proporciona, no mínimo, dúvida de atuação do mencionado comitê, ao prever que possuirá também competência para:

Art. 24 (...)

(...)

IV - monitorar a qualidade e a integridade dos mecanismos de controle interno, das demonstrações financeiras e das informações e medições divulgadas pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista;

Ora, o monitoramento de mecanismos de controle interno é atividade típica de Auditoria, que no caso acima estaria sendo absorvido pelo Comitê de Auditoria Estatutário, salvo se o produto similar (monitoramento) tivesse realmente destinatários distintos.

Nesse sentido, a perspectiva de vinculação do Comitê de Auditoria Estatutário ao órgão colegiado máximo veio prevista de modo mais claro e objetivo no Decreto Federal n.º 8.945/16, o que poderia evitar o argumento de sobreposição/absorção de competência. Senão vejamos:

Art. 38. A empresa estatal deverá possuir Comitê de Auditoria Estatutário como órgão auxiliar do Conselho de Administração da empresa (...)

Entretanto, quando pensamos que esse imbróglio está a se resolver, o mesmo Decreto prevê que a Auditoria Interna deverá auxiliar o Conselho de Administração (C.A) ou sua Controladoria (no caso de não haver estrutura de Conselho de Administração formada). In verbis:

Page 61: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

61

Art. 17. A auditoria interna deverá:

I - auxiliar o Conselho de Administração da empresa ou, se não houver, de sua controladora, ao qual se reportará diretamente;

Como é possível notar, há tímida evolução entre a Lei e o Decreto que a regulamenta, pois pela previsão legal, deve a Auditoria estar vinculada ao Conselho de Administração. Pela regulamentação do decreto, deve a Auditoria auxiliar o Conselho de Administração (o que não enseja sua vinculação diretamente).

De modo a buscar a máxima harmonização entre esses dois agentes (Auditoria e Comitê de Auditoria Independente), cabe trazer à baila recente publicação lançada pelo Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa (IBGC), junto com o Instituto dos Auditores Internos do Brasil (IIA Brasil), intitulado “Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o Conselho de Administração”, onde além de pautar as responsabilidades da Auditoria Interna e o seu papel no Sistema de Governança, destaca seu inter-relacionamento com outros agentes/estruturas de governança, entre eles, o Comitê de Auditoria Estatutário, o Conselho de Administração e Diretoria.

Nesse aspecto, reforça-se a ideia de que “a auditoria interna, por reportar-se idealmente ao conselho de administração por meio do comitê de auditoria, deve ser vista como uma importante aliada deste órgão. Ela produz relatórios e gera informações que são utilizadas pelo comitê de auditoria para supervisionar os controles internos, a conformidade, a ética, o gerenciamento de

Page 62: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

62

riscos e a elaboração das demonstrações financeiras”29

Ainda com base no referido material do IBGC/IIA, “o relacionamento entre a auditoria interna e o comitê, portanto, deve ser de confiança, de forma que as principais questões ou deficiências identificadas pela primeira sejam prontamente reportadas ao segundo”30. Complementa, por fim, que “uma vez que o comitê, como órgão de assessoramento ao conselho de administração, é responsável por garantir as condições e a estrutura necessária para que a auditoria interna trabalhe com independência, a auditoria interna deve explicitar ao comitê quais as condições necessárias para sua atuação adequada. Por sua vez, o comitê deve solicitar relatórios sobre os trabalhos feitos pela auditoria interna, assim como analisar se o plano de trabalho está atingindo seus objetivos”31.

Em apertada síntese, depreende-se que a Auditoria Interna atua como órgão técnico do comitê de auditoria, e este como órgão consultivo/de assessoramento do Conselho de Administração.

Contudo, isso não significa dizer que houve um “esvaziamento ou usurpação” de competências da Auditoria Interna, a qual ainda continua tendo relacionamento com a Diretoria Executiva, sempre atento ao respeito à independência da área de auditoria.

29 IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa). IIA-Brasil (Instituto dos Auditores Internos do Brasil). Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o conselho de administração. São Paulo: IBGC, 2018, p. 26.30 IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa). IIA-Brasil (Instituto dos Auditores Internos do Brasil). Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o conselho de administração. São Paulo: IBGC, 2018, p. 26.31 IBGC. IIA-Brasil Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o conselho de administração, p. 27.

Page 63: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

63

Nesse sentido, mais uma vez entendemos ser relevante compartilhar o entendimento do IBGC/IIA quanto à essa interação. Vejamos:

A auditoria interna deve responder ao comitê de auditoria ou ao conselho de administração. Portanto, o seu relacionamento com a diretoria, que é responsável pela gestão, dá-se pela forma de reporte administrativo. No dia a dia, a auditoria interna interage com a diretoria para dirimir dúvidas e fazer demandas operacionais, já que o conselho e o comitê de auditoria não estão presentes durante todo o tempo, e a interlocução costuma depender do agendamento de reuniões. Mas esta relação de reporte administrativo entre auditoria interna e diretoria não deve comprometer a independência da primeira. (...) O auditor não deve permitir que a gestão interfira em suas conclusões e, para isso, o apoio do conselho de administração e do comitê de auditoria é fundamental32.

Como se vê, a interlocução entre auditoria e diretoria executiva por si só não macula o princípio da independência técnico-funcional, tido como aquele que, do ponto de vista técnico, pressupõe que o controlador, seja ele interno ou externo, não dependa do auxílio de outros órgãos para a realização do mister de controle33.

32 IBGC. IIA-Brasil Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o conselho de administração, p. 28.33 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de Gestão Pública Gerencial. 3ª ed. Revista e ampliada. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 87.

Page 64: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

64

Como assevera Jorge Ulisses Jacoby Fernandes em sua obra dedicada aos Tribunais de Contas, “Significa o princípio que o controle não deve depender funcionalmente de outras pessoas ou órgãos para a aferição do juízo técnico de valor nos trabalhos que realiza; não está, pois subordinado tecnicamente.”34

É por essa razão que continua ainda válido o já chancelado modelo das três linhas de defesa35, onde se verifica as instâncias para as quais a Auditoria Interna deve se reportar.

E mais, a Auditoria Interna focada na elaboração das avaliações sobre a eficácia da governança, do gerenciamento de riscos e dos controles internos, verificando como os objetivos de gerenciamento de riscos e controle são alcançados pela instituição e o Comitê de Auditoria Estatutário focado no resultado de tais avaliações com o público externo e com o tratamento direto com os auditores externos independentes.

Inclusive, essa perspectiva de comunicação externa, proporcionando um olhar democrático no controle da atividade administrativa, resulta na elevação do grau de consensualidade e legitimação das atividades da

34 JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. 4º ed. Ver. atual. E ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 42/43.35 Compatibiliza-se, inclusive, a identidade visual proposta pela metodologia das 3 Linhas de Defesa.

Page 65: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

65

Administração Pública36, elementos fundamentais quando se está inserido no Estado em Rede atualmente vivenciado37.

Nessa perspectiva, mais uma vez, Rodrigo Pironti é extremamente preciso ao afirmar que “A noção de um Estado Responsável, em que se pressupõem práticas de Governança que conduzam a uma boa administração e a eficiência administrativa deve, necessariamente, integrar instrumentos consensuais e concertados de gestão pública”38.

36 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de Gestão Pública Gerencial. 3ª ed. Revista e ampliada. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 85.37 Sobre a concepção do Estado-Rede, recomendamos a leitura dos materiais produzidos a respeito do tema do sociólogo catalão Manuel Castells.38 CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Ensaio avançado de controle interno: profissionalização e responsividade. 1ª Reimpressão. Belo Horizonte: Fórum, 2016, p. 120.

Page 66: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema: Função Social da Estatal

Page 67: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

67

Questão 18- Como efetivamente orientar a Estatal para o alcance do bem-estar econômico e para a alocação socialmente eficiente dos recursos geridos, visando à realização do interesse coletivo?

R: Em nossa opinião, devemos estruturar a resposta inicialmente sob uma perspectiva econômica e na Teoria da Escolha. Nesse sentido, devemos partir das seguintes premissas:

Função de Bem-Estar Social – possibilidade de considerar as preferências individuais, e ao mesmo tempo, conseguir ordená-las em uma única preferência social.

Propriedades das preferências individuais: Seriam cinco as propriedades básicas que se poderia esperar de uma regra que agregue preferências individuais39:

1) Transitividade (manutenção da coerência na escolha. Se A é preferível à B; e B é preferível à C. A necessariamente é preferível à C);

2) Independência de alternativas irrelevantes (a função de bem-estar social deve ser objeto de uma mesma avaliação, tanto para um subconjunto de preferências quanto para o conjunto completo das mesmas, e as mudanças na ordenação de preferencias alternativas que são irrelevantes – ou seja, aquelas fora do conjunto das preferências hegemônicas – não tem impacto no ranking de preferência estabelecido na sociedade);

39 Raciocínio desenvolvido por Kenneth Arrow na sua obra Social Choice and Individual Values. New Haven and London: Yale University. Press, 1963. Como contraponto, sugerimos a leitura da obra do desenvolvimentista Amartya Sen, intitulada: Desenvolvimento como liberdade.

Page 68: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

68

3) Princípio de Pareto (Unanimidade. Se todos os participantes preferem uma certa alternativa a outras, esta seria a preferência da sociedade num contexto de soberania dos cidadãos);

4) Domínio irrestrito das preferências individuais (a função de bem-estar social tem que ser definida por um conjunto diverso e completo de preferências);

5) Não imposição sistemática das preferências de um indivíduo sobre os outros (o bem-estar social deve evitar o perfil “ditador”, somente será alcançado a partir das preferencias sociais de todos os participantes, ou pelo menos de sua grande parte).

Teorema de Arrow: Demonstra que não existe nenhuma função de bem-estar social que atenda simultaneamente todas as cinco propriedades básicas de preferências individuais.

Diante da dificuldade apontada pelo famoso Teorema de Arrow (intitulado inclusive de Teorema da Impossibilidade de Arrow), como então fazer escolhas públicas?

Esse é um ponto altamente relevante, pois a referida dificuldade infelizmente abre caminho para que cada indivíduo (incluindo líderes institucionais) tente manipular os processos de tomada de decisão social a seu favor (desvinculando-se da realização do interesse coletivo e gerando apenas o bem-estar econômico pessoal).

O ponto nevrálgico é saber como agregar as preferências individuais em uma única escolha coletiva de maneira racional e justa. Kenneth Arrow, economista desenvolvedor do referido teorema, já dizia que: “A racionalidade individual não é suficiente para garantir a racionalidade social”.

Page 69: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

69

Encontrar alternativas válidas para realizar uma escolha coletiva racional e justa, alcançando o bem-estar econômico e a alocação socialmente eficiente dos recursos geridos não é tarefa fácil. Apenas como uma singela tentativa, visualizamos que a intervenção estratégica da racionalidade dos agentes, por meio do estudo do comportamento estratégico destes, de forma a entender como as decisões dos indivíduos se inter-relacionam e quais os resultados dessas decisões, pode vir a colaborar com esse cenário.

Do ponto de vista pragmático, toda essa estruturação do pensamento econômico apresentado vem sendo absorvida em um nível de gestão por meio, por exemplo, da Análise de Impacto Regulatório (AIR), que é tema de destaque na agenda da Administração Pública, tanto que recentemente (JUN/2018) houve a elaboração/publicação do documento “Diretrizes Gerais e Guia Orientativo para Elaboração de Análise de Impacto Regulatório”40, pela Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil da Presidência da República, bem como a edição da Resolução n.º 90, de 05 de dezembro de 2018, da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), que estabelece boas práticas para a elaboração e revisão de medidas regulatórias que afetam o comércio exterior.

40 BRASIL. Presidência da República. Diretrizes gerais e guia orientativo para elaboração de Análise de Impacto Regulatório – AIR. Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais [et al.]. Brasília: Presidência da República, 2018. Disponível em: http://www.casacivil.gov.br/central-de-conteudos/downloads/diretrizes-gerais-e-guia-orientativo_final_27-09-2018.pdf/@@download/file/Diretrizes%20Gerais%20e%20Guia%20Orientativo_final_27.09.2018.pdf. Acesso em 18/12/2018.

Page 70: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

70

De acordo com a referida diretriz da Casa Civil, o AIR é “o processo sistemático de análise baseado em evidências que busca avaliar, a partir da definição de um problema regulatório, os possíveis impactos das alternativas de ação disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos, tendo como finalidade orientar e subsidiar a tomada de decisão”41.

Como se vê, diante da necessidade da referida metodologia analisar as alternativas de ação disponíveis para o alcance dos objetivos pretendidos, tendo como finalidade a realização do interesse coletivo, fundamental saber estruturar a escolha pública de maneira coletiva, racional e justa, alcançando o bem-estar econômico e a alocação socialmente eficiente dos recursos geridos.

41 BRASIL. Presidência da República. Diretrizes gerais e guia orientativo para elaboração de Análise de Impacto Regulatório – AIR, p. 14.

Page 71: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

71

Questão 19- Como estabelecer práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social corporativa compatíveis com o mercado de atuação da estatal?

R: Práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social agregam valores definidores de vantagem competitiva no mercado em que atuam grandes corporações. Considerando a natureza jurídica das Estatais e o novo marco regulatório, que preconiza no artigo 27, § 2°, que as empresas públicas e as sociedades de economia mista devem adotar práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social corporativa, cabe às Estatais definirem suas políticas de acordo com essa direção para agregar valor à sua marca e obter vantagens competitivas para, assim, ganhar inicialmente confiança dos seus clientes/consumidores, dos investidores, do mercado e da sociedade.

Um conceito que se originou nas ações de sustentabilidade e de responsabilidade social é o de cidadania corporativa, que abarca a forma como a empresa se relaciona com toda a sociedade, em benefício próprio e coletivo.

As ações de responsabilidade social e sustentabilidade ambiental estão relacionadas à adoção de posturas, comportamentos, condutas em benefício do público interno ou externo e em prol do meio ambiente, tais como estabelecer uma política ambiental interna para redução do consumo de energia e de água, segregação de resíduos e destinação dos recicláveis a cooperativa local, redução de impressões, aquisição de equipamentos de

Page 72: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

72

maior eficiência energética, promoção de atividades recreativas para a sociedade, efetuar doações a instituições de caridade, etc.

No âmbito das Estatais, caberá a cada qual redesenhar suas estratégias de modo a estabelecer práticas de sustentabilidade ambiental e de responsabilidade social que sejam compatíveis com seu mercado de atuação. Essa compatibilidade demanda avaliar seu objeto social e as diretrizes adotadas pela entidade, como sua missão, valores e visão. Uma estatal de saneamento, por exemplo, pode estabelecer eventos para a população com foco em preservação da água, como palestras, concurso de fotografia, construção de cisternas em locais de secas e doação à população, plantio de mudas de árvores em margens de rios e córregos, dentre outros.

Por certo que algumas práticas independem dessa avaliação da área de atuação. A redução da utilização de recursos naturais, por exemplo, pode ser aplicada com programas internos de redução de energia, de utilização de água, de segregação de resíduos e destinação adequada de qualquer estatal. Assim como a substituição de equipamentos de maior eficiência energética ou a doação de valores, insumos, móveis e equipamentos, a entidades filantrópicas.

Page 73: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Da dispensa e

inexigibilidade de licitação

Page 74: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

74

Questão 20- Quais os elementos abrangidos na dispensa da observância das regras de licitação tratada no artigo 28, §3°?

R: A Lei das Estatais definiu as hipóteses nas quais estará a entidade autorizada a promover a contratação direta. Foram divididas em três categorias: (1) a não observância das regras licitatórias, (2) a dispensa de licitação, e a (3) inexigibilidade. As dispensas de licitação, como nos moldes da Lei de Licitações, são hipóteses taxativas definidas pelo legislador, nas quais o procedimento licitatório não se mostra vantajoso, conveniente ou oportuno ao atendimento dos interesses Estatais. São situações de baixo valor da contratação, ou de emergência, ou ainda quando o processo licitatório frustrado ou fracassado não puder ser repetido, dentre outras situações elencadas na lei. Já a inexigibilidade de licitação resta caracterizada quando não for possível instaurar competição entre os interessados, seja em função da impossibilidade de estabelecer critérios objetivos de julgamento entre as propostas, ou da ausência de pluralidade de competidores.

No momento trataremos da primeira categoria de contratação direta, que se desenvolve com a dispensa da observância das regras licitatórias.

Page 75: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

75

A Lei 13.303/16 preconiza no artigo 28, §3°42 que as empresas públicas e as sociedades de economia mista estão dispensadas da observância dos dispositivos sobre licitação para (inciso I) comercialização, prestação ou execução, de forma direta, de produtos, serviços ou obras especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais; e, para (inciso II) casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculadas a oportunidades definidas e específicas de negócios, justificando a inviabilidade de competição. Para maior esclarecimento, a lei definiu oportunidade de negócio como a formação ou extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação da participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais.

Vislumbra-se com o dispositivo a flexibilidade atribuída às Estatais para assegurar o funcionamento e a

42 “Art. 28. ...[...]§ 3° São as empresas públicas e as sociedades de economia mista dispensadas da observância dos dispositivos deste Capítulo nas seguintes situações: I - comercialização, prestação ou execução, de forma direta, pelas empresas mencionadas no caput, de produtos, serviços ou obras especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais; II - nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada a oportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo. § 4° Consideram-se oportunidades de negócio a que se refere o inciso II do § 3o a formação e a extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação de participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais, respeitada a regulação pelo respectivo órgão competente.”

Page 76: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

76

competitividade no segmento em que atuam, em vista da sua natureza jurídica.

Nesse aspecto, reconhece o legislador que a realização de licitação para o desenvolvimento de atividades empresárias, para a escolha de parceiros ou para operações em mercado de capitais em oportunidades de negócio pode oferecer obstáculos e prejuízo à competitividade. Os aspectos avaliados nessas situações envolvem gestão empresária a partir de critérios técnicos.

Para melhor compreender essa hipótese de contratação direta, Edgar Guimarães e José Anacleto A. dos Santos diferenciam as contratações com terceiros para desenvolvimento das atividades das Estatais. Citam as contratações necessárias de bens, obras ou serviços que se destinam à obtenção de elementos materiais, técnicos ou jurídicos em atividades-meio para assegurar o desenvolvimento das atividades; e, as contratações inerentes à atividade para a qual foram criadas, constituindo a razão de existir da estatal, ou seja, sua atividade-fim. Para esses juristas, a norma do inciso I afasta a licitação quando os objetos a serem contratados se confundam com as atividades econômicas finalísticas43.

Portanto, uma primeira ilação do dispositivo decorre da expressão “objeto social”, que, contrariamente ao que entendem os juristas acima, compreendemos que se diferencia da atividade-fim, que representa conceito jurídico aberto, passível de interpretação.

43 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 43.

Page 77: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

77

O TCU reconheceu em algumas oportunidades, a partir do Acórdão 121/1998-Plenário, que as Estatais exploradoras de atividade econômica estavam dispensadas da licitação para as contratações que compreendiam sua atividade-fim.

Contudo, conforme sinaliza Marçal Justen Filho, essa orientação apresenta uma pluralidade de dificuldades, em razão da necessidade de delimitação do conceito de atividade-fim44. De fato, essa definição nem sempre era fácil.

Delimitar o afastamento das regras licitatórias para atividades vinculadas ao objeto social e não à atividade-fim orienta de forma objetiva o aplicador da lei. Logo, é mais fácil recorrer às cláusulas estatutárias e identificar de forma literal o objeto social que autorizaria a não observância das regras licitatórias do que estabelecer os limites da atividade finalística.

Outrossim, nos entendimentos sobre a matéria, o TCU ressaltava que, além da atuação na atividade-fim, outros requisitos se faziam indispensáveis, como verificar no caso concreto que os trâmites da licitação constituem óbice instransponível à atividade negocial da empresa, que atua em mercado concorrencial45.

A Lei das Estatais delimitou o afastamento das regras licitatórias. Estão dispensadas dos procedimentos licitatórios as Estatais para a comercialização, prestação

44 JUSTEN FILHO, Marçal. A contratação sem licitação nas empresas estatais. In Estatuto jurídico das empresas estatais: Lei 13.303/2016. Marçal Justen Filho, org. São Paulo: Editora RT, 2016, p. 300.45 Como expresso nos seguintes julgados: Acórdãos 1.390/2004-Plenário, 1.186/2007-2a Câmara, 2.176/2007-Plenário e 1.854/2009-2a Câmara, todos do TCU.

Page 78: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

78

ou execução de forma direta das atividades relacionadas ao seu objeto social. Vale dizer, uma estatal cujo objeto é a prestação de serviços de distribuição de água, não precisa realizar licitação para a distribuição da água aos seus consumidores. O Banco do Brasil, por exemplo, não precisa realizar licitação para oferecer serviços financeiros aos seus clientes.

Dúvida que pode surgir diz respeito à obtenção de insumos para execução dessas atividades vinculadas ao objeto social. Marçal Justen Filho sinaliza que o dispositivo legal “exclui outras hipóteses contratuais, por meio das quais a empresa estatal obtém recursos ou produz as soluções indispensáveis para assegurar a exploração de sua atividade”46.

Em sentido ampliativo, Dawison Barcelos e Ronny Charles discorrem que:

a referida hipótese de inobservância das regras licitatórias pode-se dar tanto na ‘venda’ direta de produtos, serviços ou obras, pela estatal, como na ‘aquisição’ de produtos, serviços ou obras vinculadas diretamente à venda anteriormente indicada, desde que especificamente relacionados com seus respectivos objetos sociais. Importante frisar que o termo comercialização indica atividade ampla, não podendo ser totalmente apartado da necessidade de aquisição dos insumos pertinentes para a execução direta das atividades relacionadas aos respectivos objetos sociais.47

46 JUSTEN FILHO, Marçal. A contratação..., 2016, p. 301.47 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 104.

Page 79: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

79

Compreensível a preocupação dos juristas, mas não nos parece ser essa a melhor interpretação da matéria. A ampliação da hipótese pode, em nome da competitividade no mercado em que atua a estatal, gerar desvios e tornar a exceção uma regra na práxis administrativa. Não se pode olvidar também que o legislador expressamente definiu que a não observância dos procedimentos licitatórios decorre da execução de forma direta das atividades relacionadas ao objeto social da entidade não incluindo as contratações celebradas com fornecedores para atendimento àquelas atividades. No exemplo citado acima, a estatal que presta serviços de distribuição de água deve contratar as obras ou adquirir os insumos para execução direta das obras por meio do processo licitatório, como regra.

Como visto acima, a Lei das Estatais também permite o afastamento das regras licitatórias para as contratações de parcerias em oportunidades de negócio definidas e específicas, na qual a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, devendo ser justificada a inviabilidade do procedimento competitivo.

Tais requisitos devem ser demonstrados como forma de atender ao preconizado pela legislação e garantir a lisura do procedimento. Enfatiza-se a necessidade de justificar a inviabilidade da licitação e definir as características do parceiro que fundamentam sua escolha.

O Tribunal de Contas da União tem estabelecido em suas manifestações sobre o afastamento das regras licitatórias fundamentadas no artigo 28 da Lei 13.303/2016, a necessidade de justificar a inviabilidade de realização da licitação, como se observa a seguir:

Page 80: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

80

O legislador não dispensou de forma incondicional as estatais de licitar nos casos considerados como oportunidades de negócio, explicitados no § 4º da Lei 13.303/2016. Ele determinou aos gestores, mesmo quando da identificação de situações consideradas como oportunidades de negócios, que justifiquem a inviabilidade de realização de procedimento competitivo. Em outras palavras, a licitação permanece como regra mesmo nos casos de oportunidades de negócio, sendo excetuada apenas quando da inviabilidade de procedimento competitivo.

Não se trata de liberalidade concedida ao gestor, no sentido de optar ou não pelo procedimento competitivo. Tampouco há dispensa integral de promoção de competição entre eventuais interessados. Diferentemente do posicionamento do memorando aqui analisado, pela inaplicabilidade de licitação, a regra estabelecida pela Lei das Estatais abre a possibilidade de escolha de parceiros, em oportunidades de negócios, porém impõe que se justifique a inviabilidade de competição nesses casos. Assim, a regra impõe a competição; não sendo viável, exige justificativa.

Dessa forma, o posicionamento pela inaplicabilidade de licitação nos casos que venham a ser classificados como oportunidades de negócio vai de encontro

Page 81: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

81

ao estabelecido na parte final do art. 28, § 3º, inciso II, da Lei 13.303/2016. Nesse sentido, da necessária justificativa quanto à inviabilidade de competição, se deu o posicionamento constante do Relatório que antecedeu ao Voto condutor do Acórdão 2.645/2017-TCU-Plenário, de autoria do Ministro Relator José Múcio Monteiro, conforme abaixo:

147. Embora o § 3º do art. 28 do Estatuto trate de licitação dispensada, o inciso II do § 3º, na verdade, trata de inexigibilidade de licitação, pois no final do inciso II consta a expressão ‘justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.

148. No dispositivo citado (inciso II do § 3º do art. 28 da Lei 13.303/2016), é dispensada a licitação entre empresa pública ou sociedade de economia mista nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada a oportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.

149. No § 4º do art. 28 é explicitado que se consideram ‘oportunidades de negócio’, a que se refere o inciso II do § 3º, a formação e a extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação de participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais,

Page 82: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

82

respeitada a regulação pelo respectivo órgão competente.

150. A combinação do art. 28, § 3º, inciso II, com o § 4º do mesmo artigo da Lei 13.303/2016 concede alto grau de discricionariedade às empresas públicas e às sociedades de economia que avaliarão, com parâmetros ainda imprecisos, se as características particulares de parceiros em potencial e oportunidades de negócio definidas e específicas poderão justificar a inviabilidade de procedimento competitivo.

151. Entretanto, como foi apontado no parágrafo 147 desta instrução, no final do inciso II do § 3º do art. 28 é explicitada a necessidade de se justificar a inviabilidade de competição. Portanto, a empresa pública ou sociedade de economia mista somente poderá contratar empresa para prover produtos ou serviços com base nos dispositivos citados (Lei 13.303/2016, art. 28, § 3, inciso II c/c § 4º) se for caracterizada a inviabilidade de competição.

Portanto, tendo em vista o posicionamento firmado no memorando dos assessores jurídicos que apoiam a Eletrobrás no seu processo de desinvestimento, no sentido de ser inaplicável o procedimento licitatório às alienações de participações da Estatal que forem consideradas oportunidades de negócio, nos termos fixados pelo art. 28, § 4º, da Lei 13.303/2016, e a fim de evitar que processos de

Page 83: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

83

alienação venham a ser questionados, ou até mesmo anulados, mais à frente, cumpre propor, tendo em vista o art. 28, §3º da Lei 13.303/2016, determinação para que a Estatal preveja em seus normativos que, nas situações que venham a ser enquadradas como oportunidade de negócio, somente deixe de promover processos competitivos naqueles casos em que restar justificada a inviabilidade desses procedimentos.48

Em outra oportunidade o Ministro relator Benjamin Zymler estabeleceu os requisitos da lei para o afastamento da licitação na situação exposta:

107. Da leitura desse dispositivo, depreende-se que, embora a realização de licitação seja a regra, estão previstas exceções aplicáveis aos casos em que a sociedade de economia mista esteja atuando de maneira a explorar atividade econômica relativa à sua atividade fim. Afinal, ao realizar procedimento negocial afeto à sua finalidade, a estatal poderá se valer de meios que lhe permitam competir em condições de igualdade com as empresas privadas do setor econômico em que ela atua. Em síntese, quando realizar uma negociação comercial, diretamente relacionada com as atividades que compõem seu objeto social, a empresa buscará uma solução de contratação que seja mais próxima à de uma empresa privada.

...

48 TCU. Acórdão n° 1765/2018, Plenário.

Page 84: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

84

117. Da leitura desse dispositivo legal, constato que a contratação direta da empresa parceira depende:

a) da configuração de uma oportunidade de negócio, o qual pode ser estabelecido por meio dos mais variados modelos associativos, societários ou contratuais, nos moldes do estabelecido no § 4º do art. 28 da Lei das Estatais;

b) da demonstração da vantagem comercial que se espera advirá para a empresa estatal;

c) da comprovação pelo administrador público de que o parceiro escolhido apresenta condições peculiares que demonstram sua superioridade em relação às demais empresas que atuam naquele mercado; e

d) da demonstração da inviabilidade de procedimento competitivo.49

O afastamento das regras licitatórias difere das hipóteses tradicionais de contratação direta no que se refere ao procedimento. Enquanto nas dispensas e inexigibilidades as Estatais devem instaurar e respeitar um processo administrativo, com definição e descrição de objeto, justificativas de valor e da escolha do contratado, além da avaliação quanto ao correto enquadramento da situação à hipótese legal e demais comprovações à espécie, na hipótese ora aventada as entidades estão dispensadas da observância das regras licitatórias,

49 TCU. Acórdão 2.488/2018 – Plenário.

Page 85: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

85

o que inclui o afastamento da etapa preliminar de contratação, prescindindo da documentação minuciosa das características do contrato, mas não retira, como afirmado acima, a necessidade de justificativas pertinentes, em especial na hipótese de formação de parcerias.

Page 86: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

86

Questão 21- Os novos valores de dispensa por valor são maiores comparados ao antigo limitador. Contudo, eles realmente retratam uma adequação econômico-financeira ao longo do tempo?

R: Sim. A Lei Federal n.º 13.303/16 realmente representou um avanço significativo em relação ao padrão que as Empresas Estatais estavam acostumadas, uma vez que ficavam vinculadas aos ditames da Lei Federal n.º 8.666/93.

No art. 29, dedicado a tratar sobre as hipóteses de dispensa de licitação, estabeleceu em seus incisos I e II, valores correspondentes respectivamente à: I) R$ 100.000,00 (cem mil reais), quando o objeto tratar de obras e serviços de engenharia, desde que não se refiram a parcelas de uma mesma obra ou serviço, ou ainda a obras e serviços de mesma natureza e no mesmo local que possam ser realizadas conjunta e concomitantemente; II) R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), quando o objeto for relativo a outros serviços e compras, desde que não se refiram a parcelas de um mesmo serviço, compra ou alienação de maior vulto que possa ser realizado de uma só vez.

À época da publicação da lei das Estatais (2016), não havia sido editado o Decreto Federal n.º 9.412/2018, que acabou por atualizar os valores das modalidades de licitação previstas na Lei Federal n.º 8.666/93 e, consectariamente, os valores das dispensas por valor, uma vez que são definidos por percentual (10%) vinculado à modalidade convite.

Page 87: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

87

Nessa perspectiva, interessante comparar os valores da lei das Estatais com os novos parâmetros da Administração Pública Federal (APF), de modo a constatar se realmente os valores fixados no art. 29 retratam uma adequação econômico-financeira ao longo do tempo.

Realizando tal exercício, verifica-se de pronto que os valores do art. 29 expressam uma confortável margem, uma vez que os valores atualizados pelo já citado Decreto Federal representam, respectivamente R$ 33.000,00 e R$ 17.600,00.

De modo a sacramentar a adequação dos novos valores fixados na lei das Estatais, outro exercício interessante é realizar a atualização monetária dos valores fixados na Lei Federal n. 8.666/93, cujos patamares foram atualizados por último em 1998, por meio da Lei Federal n.º 9.648.

Mais uma vez, infere-se nitidamente que estão devidamente ajustados os valores da Lei Federal n.º 13.303/16, pois tal atualização monetária projetaria os valores para R$ 66.306,25 e R$ 35.363,3350.

E mais, a própria lei n. 13.303/16 em seu art. 29, § 3º, menciona que os valores estabelecidos nos incisos I e II do caput (ou seja, 100 mil e 50 mil) podem ser alterados para

50 Para essa projeção, utilizamos como base a calculadora do cidadão, ferramenta disponibilizada no site do Banco Central do Brasil, por meio do link: https://www3.bcb.gov.br/CALCIDADAO/publico/exibirFormCorrecaoValores.do?method=exibirFormCorrecaoValores e que utiliza como indexador o índice IGP-M (FGV). A memória de cálculo corresponde ao seguinte cenário: Data inicial: 05/1998 (mês de publicação da Lei Federal 9.648). Data final: 06/2016 (mês de publicação da Lei Federal 13.303). Valor Nominal: R$ 15.000,00. Valor corrigido na data final: R$ 66.306,25. Data inicial: 05/1998 (mês de publicação da Lei Federal 9.648). Data final: 06/2016 (mês de publicação da Lei Federal 13.303). Valor Nominal: R$ 8.000,00. Valor corrigido na data final: R$ 35.363,33.

Page 88: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

88

refletir a variação de custos, por deliberação do Conselho de Administração da empresa pública ou sociedade de economia mista, admitindo-se valores diferenciados para cada sociedade.

Page 89: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

89

Questão 22- É possível aplicar às Estatais os mesmos entendimentos doutrinários e jurisprudenciais nas hipóteses de contratação direta de seus correspondentes da Lei 8.666/93?

R: Sim. Ao dispor sobre as hipóteses de dispensa de licitação o legislador da lei 13.303/16 adotou regime semelhante ao da lei 8.666/93. Ambas as leis se fundamentaram na Constituição Federal, que dispôs no art. 37, inciso XXI, que as ressalvas à licitação estão especificadas na legislação.

O procedimento licitatório, em tese, é o meio mais adequado à realização da contratação, em vistas do interesse público, da vantajosidade, da isonomia e de outros valores constitucionais aplicáveis, como transparência, eficiência, moralidade, etc.

Contudo, nem sempre a licitação consegue atender a esses valores. Assim o legislador ressalvou as contratações por dispensa e por inexigibilidade, que podem ter resultados mais consentâneos ao interesse público e à vantajosidade. As dispensas, como já tratado outrora, são hipóteses taxativas definidas no artigo 29 da Lei 13.303/2016, nas quais ainda que possível realizar um processo licitatório, seu resultado pode não ser o mais vantajoso, em vista das características do objeto, da urgência na contratação, do valor do contrato, etc. A inexigibilidade, por sua vez, decorre das circunstâncias fáticas que se materializam em inviabilidade de competição, resultante da inexistência de pluralidade

Page 90: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

90

de sujeitos aptos a contratar, ou da impossibilidade de comparar objetivamente propostas. A inexigibilidade está descrita no artigo 30 e nos incisos há hipóteses exemplificativas para sua aplicação.

Considerando as semelhanças entre os textos da Lei 8.666/93 e da Lei 13.303/16 é possível estabelecer as mesmas interpretações, aplicando-se os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais da lei anterior às Estatais. Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres compartilham dessa opinião:

os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais mostram-se aplicáveis, no que couber, às situações enfrentadas no âmbito da Lei das Estatais, salvo nas hipóteses em que a nova redação apresenta elemento diferenciador ou quando interpretação diversa se mostrar mais condizente com as atividades exercidas pelas empresas estatais.51

De fato, ainda são poucas as manifestações interpretativas da Lei das Estatais, inclusive no âmbito das Cortes de Contas. Portanto, naquilo que houver identidade das regras e sem colidir com os valores preconizados pela novel legislação, autoriza-se a aplicação dos entendimentos já consagrados sobre as regras de contratação direta da Lei 8.666/93. Na compreensão de Marçal Justen Filho, há essa possibilidade em situações específicas “em que existir identidade de pressupostos, de finalidade e de conteúdo das situações disciplinadas”52.

51 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 113.52 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. - 16ª Ed. Rev. Atual. Ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 288.

Page 91: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

91

Por outro lado, observa-se uma redução das situações que permitem a contratação por dispensa de licitação, em comparação à Lei 8.666/93, o que não significa a possibilidade de aplicação de tais hipóteses às Estatais.

Page 92: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

92

Questão 23- Sobrepreço e superfaturamento definitivamente não são a mesma coisa. Qual a diferença?

R: A Lei Federal n.º 13.303/16 (artigo 31, § 1º) foi o primeiro diploma legal federal a prever explicitamente a diferença entre sobrepreço e superfaturamento. Em apertada síntese, poderíamos afirmar que sobrepreço, pela própria etimologia da palavra, corresponde a cenários nos quais o preço praticado encontra-se superior ao parâmetro utilizado pela entidade contratante naquele caso concreto. De outro modo, o superfaturamento é um desvirtuamento da necessidade administrativa, que pode ocorrer por inúmeras razões e por meio de várias formas, tanto que o rol elencado no inciso II, do § 1º, do art. 31 é meramente exemplificativo (e que demonstra apenas as hipóteses em que essa situação é mais corriqueiramente constatada). Vejamos:

Art. 31

(...)

II - superfaturamento quando houver dano ao patrimônio da empresa pública ou da sociedade de economia mista caracterizado, por exemplo:

a) pela medição de quantidades superiores às efetivamente executadas ou fornecidas;

b) pela deficiência na execução de obras e serviços de engenharia que resulte em diminuição da qualidade, da vida útil ou da segurança;

c) por alterações no orçamento de obras

Page 93: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

93

e de serviços de engenharia que causem o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato em favor do contratado;

d) por outras alterações de cláusulas financeiras que gerem recebimentos contratuais antecipados, distorção do cronograma físico-financeiro, prorrogação injustificada do prazo contratual com custos adicionais para a empresa pública ou a sociedade de economia mista ou reajuste irregular de preços.

Portanto, não há correlação direta entre superfaturamento e sobrepreço, de modo que o pior cenário possível é o superfaturamento com sobrepreço. Fiquemos atentos!

Page 94: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Disposições gerais sobre

Licitações e Contratos

Page 95: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

95

Questão 24- Por que não houve alteração na lógica licitatória com a nova legislação?

R: Porque ainda se tem como “estereótipo” que o processo licitatório sempre atenderá primordialmente ao interesse público, devendo ser considerado como regra universal, aplicando-se somente de modo excepcional as demais formas de contratação pública, ou seja, a dispensa e a inexigibilidade de licitação.

Em outras palavras, temos a sensação de que a expressão “licitação pública” constitui um “conceito mágico”, o qual representaria o cumprimento de uma lisura impecável, diante das rédeas mais curtas (quando comparadas com as formas de contratação direta), ou seja, infinitamente mais burocrática53. E que a estratégia de formalizar uma contratação direta seria agressiva/contrária ao interesse público.

Às vezes, quem sabe, a própria hiperpublicização do controle e a disseminação do Direito Administrativo do Medo tenham colaborado em certa medida para esse cenário.

Em nossa concepção, manter a referida “lógica licitatória” seria transformar a licitação pública em uma terminologia que intitulamos de “Inocente útil”. Ou seja, expressão que inocentemente lançada em uma justificativa/argumentação, acreditando-se fielmente em sua carga

53 Nessa mesma perspectiva, recomendamos a leitura da obra de Renato Geraldo Mendes e Egon Bockmann Moreira, intitulada de Inexigibilidade de licitação. Repensando a contratação pública e o dever de licitar.

Page 96: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

96

axiológica (baseada no estereótipo já mencionado), acaba sendo útil para simplesmente “encerrar” qualquer tipo de discussão a respeito da forma de contratação daquele bem ou serviço54.

Ademais, os inúmeros acontecimentos, deflagrados em operações investigativas de prática de atos corruptivos no país, têm demonstrado que o referido raciocínio não tem uma base tão consistente quanto tenta transparecer.

Devemos relembrar que o paradigma do Estado Democrático de Direito impõe que o interesse público não seja um dado di per si, passível de ser “automaticamente” retratado. É algo a ser descoberto (então poderíamos dizer que será identificado casuisticamente), motivo pelo qual defendemos que a melhor forma de contratação será sempre aquela que permitir o cumprimento do interesse público naquele determinado caso em concreto.

Pensar assim, em nossa opinião, é muito mais convergente inclusive com a perspectiva atual/moderna imposta pela Administração Pública Gerencial, que retrata a função de controle enquanto vetor do processo decisório na busca, entre outras coisas, do aperfeiçoamento como fonte para o desenvolvimento55.

Temos que começar a mudar de paradigma, de modo a não mais pensar que o negócio/contratação mais vantajoso é uma exclusividade do processo licitatório. Começar a

54 Há de se convir que, quando certa instituição é indagada como procedeu determinada contratação, há um “alívio” quando a resposta é: “Fizemos processo licitatório” em comparação com “Fizemos uma contratação direta”.55 Nesse sentido, recomendamos a leitura da obra de autoria do PhD Rodrigo Pironti Aguirre de Castro, intitulada: Sistema de Controle Interno: Uma perspectiva do modelo de gestão pública gerencial. Ed. Fórum.

Page 97: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

97

compreender que a eficiência pauta o melhor caminho para se assegurar a isonomia naquela determinada contratação. E que a aplicação rígida/cogente das regras editalícias desvinculadas da racionalidade de cada mercado/setor é prejudicial, uma vez que acaba por afetar a dimensão concorrencial daquela específica contratação.

Page 98: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

98

Questão 25- Como compreender as diretrizes a serem observadas pelas Estatais e dispostas no artigo 32?

R: A nova formulação licitatória das Estatais, em grande parte inspirada no Regime Diferenciado de Contratação, determina maior celeridade e eficiência na atividade administrativa. Cabe lembrar que a licitação não é um fim em si, mas um meio para obtenção de uma prestação contratual ótima e consentânea aos interesses públicos. Outrossim, deve-se compatibilizar a licitação à eficiência demandada às Estatais, seja em função do mercado concorrencial em que atuam, seja por conta da necessidade de prestação de serviços públicos adequados às exigências da população usuária.

Tal cenário é o fundamento para instituição de diretrizes a serem observadas pelas Estatais em suas contratações e que estão dispostas no artigo 3256.

56 Art. 32. Nas licitações e contratos de que trata esta Lei serão observadas as seguintes diretrizes: I - padronização do objeto da contratação, dos instrumentos convocatórios e das minutas de contratos, de acordo com normas internas específicas; II - busca da maior vantagem competitiva para a empresa pública ou sociedade de economia mista, considerando custos e benefícios, diretos e indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, ao desfazimento de bens e resíduos, ao índice de depreciação econômica e a outros fatores de igual relevância; III - parcelamento do objeto, visando a ampliar a participação de licitantes, sem perda de economia de escala, e desde que não atinja valores inferiores aos limites estabelecidos no art. 29, incisos I e II; IV - adoção preferencial da modalidade de licitação denominada pregão, instituída pela Lei no 10.520, de 17 de julho de 2002, para a aquisição de bens e serviços comuns, assim considerados aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado; V - observação da política de integridade nas transações com partes interessadas. § 1° As licitações e os contratos disciplinados por esta Lei devem respeitar, especialmente, as normas relativas à: I - disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas; II - mitigação dos danos ambientais por meio de medidas condicionantes e de compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental; III - utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente, reduzam o consumo de energia e de recursos naturais; IV - avaliação de impactos de vizinhança, na forma da legislação urbanística; V - proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, inclusive por meio da avaliação do impacto direto ou indireto causado por investimentos realizados por empresas públicas e sociedades de economia mista; VI - acessibilidade para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. § 2° A contratação a ser celebrada por empresa pública ou sociedade de economia mista da qual decorra impacto negativo sobre bens do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial tombados dependerá de autorização da esfera de governo encarregada da proteção do respectivo patrimônio, devendo o impacto ser compensado por meio de medidas determinadas pelo dirigente máximo da empresa pública ou sociedade de economia mista, na forma da legislação aplicável. § 3° As licitações na modalidade de pregão, na forma eletrônica, deverão ser realizadas exclusivamente em portais de compras de acesso público na internet. § 4° Nas licitações com etapa de lances, a empresa pública ou sociedade de economia mista disponibilizará ferramentas eletrônicas para envio de lances pelos licitantes.

Page 99: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

99

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres as definem como uma orientação, um caminho a ser seguido57. Edgar Guimarães e José Anacleto Santos salientam que “diretrizes é um conjunto de instruções ou orientações para demarcar a conduta dos agentes públicos quando da configuração das licitações e dos contratos”58.

A pauta das diretrizes é a de estabelecer o meio mais adequado para atingir a finalidade da melhor contratação. Não se pode olvidar que as Estatais apresentam natureza jurídica de direito privado, o que conduz à leitura dos normativos aplicáveis sob o ponto de vista do mercado privado.

Em vista disso, pode-se afirmar que as diretrizes estabelecidas na Lei das Estatais objetivam fazer uma ponte entre as contratações públicas e a natureza das entidades, atribuindo-se flexibilidade, atualidade e eficiência das Estatais nas contratações.

57 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 225.58 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 99.

Page 100: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

100

Questão 26- Quais cuidados devem ser adotados para a padronização?

R: A primeira diretriz definida no artigo 32 da Lei é a padronização do objeto da contratação, dos instrumentos convocatórios e das minutas de contratos. Tal orientação tem relação direta com a eficiência, na medida em que estabelecer padrões gera otimização de custos operacionais. Ademais, a padronização assegura qualidade e estabilização de processos.

Há dois referenciais para atendimento à diretriz: padronização de objetos e de documentos.

O primeiro deles, a padronização do objeto da contratação, tem por finalidade definir características técnicas estanques de bens ou serviços de modo que contratações desse mesmo objeto deverão atender ao modelo estabelecido. Os objetos padronizados atendem às necessidades de maneira prática, sem variações.

Essa diretriz exprime mecanismo de redução de custos e apresenta as seguintes vantagens: facilidade de conservação, manutenção e fiscalização; e, redução de custos administrativos para a contratação, considerando a desnecessidade de a cada contratação definir as especificações técnicas do objeto. Sidney Bittencourt acrescenta como vantagens: “aproveitamento de servidores treinados para o uso de bens ou para a execução de serviços; adequação dos trabalhos a produtos ou tecnologias já existentes; e o conhecimento dos usuários às características operacionais”59.

59 BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017, p. 140.

Page 101: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

101

Outro aspecto positivo pode ser apontado sobre a padronização: padronizar objetos reduz a variedade de materiais utilizados, considerando-se a adoção de um modelo que servirá de referência, desconsiderando outros semelhantes. Desse modo, o controle de estoque e almoxarifado, por exemplo, é simplificado, diminuindo-se custos de estocagem, como do armazenamento físico, do manuseio, da distribuição e da obsolescência.

Por outro lado, cabe apontar as seguintes desvantagens da padronização de objetos: possibilidade de inadequação do modelo padronizado a necessidades pontuais; restrição à competitividade; e, necessidade de constante avaliação sobre a adequação do modelo padronizado à demanda da entidade. Também pode ocorrer que o objeto seja atualizado ou substituído no mercado com o decorrer do tempo, o que pode reduzir a oferta e aumentar seu preço.

Para Edgar Guimarães e José Anacleto A. Santos, “a padronização de objeto implica encontrar uma suficiente e satisfatória definição integral da solução esperada quando da licitação, com apontamento de todos os requisitos de qualidade e características que atendam à necessidade administrativa”60.

Tal procedimento pode envolver tanto os padrões técnicos (especificações), como os procedimentos operacionais para executá-los. Em relação a estes, sua aplicação é muito válida para serviços, estabelecendo-se o modo

60 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 100.

Page 102: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

102

e a sequência que devem ser executados, incluindo-se as tarefas, objetivos, materiais necessários, processos, resultados, ações preventivas e corretivas, etc.

Os objetos padronizados devem atender a alguns critérios para que surtam os resultados decorrentes, tais como a abrangência, a flexibilidade e a praticidade. Assim, pela abrangência, os objetos devem possuir atributos úteis que atendam ao maior número possível de demandas da entidade. Por meio da flexibilidade, os objetos devem atender a novas demandas. Assim decorre que especificações fechadas e excessivas podem trazer, ao contrário, rigidez que impede o atendimento a necessidades não vislumbradas anteriormente. Por fim, em função da praticidade, os objetos apresentam especificações diretas e simples para sua correta e ampla compreensão, reduzindo o subjetivismo do julgamento no momento da aquisição.

Para o procedimento de padronização, cabe mapear os processos e estabelecer, inicialmente, quais objetos serão padronizados. É conveniente que a padronização recaia sobre objetos comumente utilizados (como materiais de expediente, insumos de obras ou outros, aplicados com frequência nas atividades finalísticas da entidade), que viabilizem a compatibilidade de equipamentos e soluções técnicas (insumos e equipamentos de TI), ou em razão de identidade, imagem, estética (voltados a cores, tecidos, superfícies, marca, mobiliário, etc.).

Posteriormente, instaura-se procedimento definindo os objetos a serem padronizados, as partes interessadas (comissão de padronização), os prazos e a autoridade competente que ratificará o processo.

Page 103: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

103

A comissão de padronização deve ser constituída formalmente por ato administrativo. Será integrada, ao menos, pelo representante da área demandante da padronização, da área responsável pela contratação e da administração para tomada de decisões. Pode-se contratar especialistas externos, caso não haja na entidade pessoas com competência técnica para promover a padronização dos objetos.

A comissão deve, preliminarmente, identificar as necessidades administrativas em relação ao objeto escolhido para padronização e apurar a previsão de contratações futuras e valores necessários para instruir o processo com informações necessárias a avaliar a vantajosidade econômica do procedimento. Em seguida, é importante definir as vantagens e desvantagens da padronização, sob os aspectos técnicos, comparando produtos e serviços disponíveis no mercado que melhor atendam à demanda.

Concluídas as etapas preliminares, a padronização parte da descrição original de elementos do objeto, classificando-os e catalogando-os. Há padrões técnicos em normas que podem ser utilizados nessa fase, com referências mínimas que devem ser atendidas. Avaliações de mercado também são fundamentais. É importante estabelecer as especificações com base em adequação, necessidade e disponibilidade. Quanto à adequação, a descrição do objeto deve ser pertinente para a obtenção do melhor resultado. A necessidade invoca a escolha de definições aptas a atender às demandas da entidade com qualidade, sem sacrifício de valores relevantes. Por fim, a disponibilidade determina que o objeto seja encontrado

Page 104: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

104

no mercado fornecedor, dando-se preferência à ampla competitividade.

Ao final, a comissão elabora relatório com as informações técnicas e percepções das vantagens e desvantagens da padronização, encaminhando à autoridade competente o processo devidamente instruído para avaliação. A autoridade pode, em despacho motivado, decidir pelo acolhimento do relatório e adoção do padrão desenvolvido, pela devolução à comissão para instruções complementares, ou pelo arquivamento caso as desvantagens superem as vantagens. Decidindo-se pela padronização cabe a publicação do ato, propiciando transparência do procedimento e conhecimento aos interessados.

Desse modo, as contratações subsequentes à padronização deverão seguir a descrição definida e aprovada.

Para a aquisição de bens, a Lei das Estatais faculta a indicação de marca ou modelo na hipótese de padronização do objeto61. É importante destacar que o processo de padronização não condiciona, necessariamente, a indicação de marca. Como visto, são as descrições técnicas que serão padronizadas, o que pode levar ao direcionamento de determinada marca. Mas essa opção deve ser revestida de motivação técnica, até porque haverá uma restrição relevante à

61 “Art. 47. A empresa pública e a sociedade de economia mista, na licitação para aquisição de bens, poderão: I - indicar marca ou modelo, nas seguintes hipóteses: a) em decorrência da necessidade de padronização do objeto;[...]”.

Page 105: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

105

competitividade. Deve-se, nesse caso, demonstrar que as características da marca eleita são fundamentais para a definição do objeto e não se encontram presentes em marcas similares. Não se admite, em qualquer hipótese, a restrição injustificada.

Cabe, por fim, sublinhar que a padronização deve ser objeto de constante avaliação, para identificar a pertinência e disponibilidade das características técnicas padronizadas e a necessidade de atualização. Se necessário, deve ser promovida a revisão da descrição, de forma técnica e fundamentada.

Além dos objetos, a lei define como diretriz a padronização de instrumentos convocatórios e minutas de contratos.

Há tempos que o Tribunal de Contas da União aponta que a elaboração de minutas-padrão de editais e contratos são medidas de eficiência. Cita-se o Acórdão abaixo, de 2006, mas que se mantém atual:

Portanto, a adoção da sistemática de utilização de minutas-padrão de editais e de contratos comuns que se repetem periodicamente no âmbito da <omissis>, que já contaram com a análise e a aprovação prévia pelo órgão jurídico, e que são inseridos em suas instruções internas, é procedimento adequado a uma administração eficiente - como deve ser para quem atua em regime de concorrência com as empresas privadas - e termina por concretizar o princípio da eficiência constitucional.

Ademais, a padronização de procedimentos que se repetem rotineiramente é um meio

Page 106: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

106

salutar de a Administração desincumbir-se de tarefas que, numericamente significativas, na essência referem-se sempre aos mesmos atos administrativos. Sua adoção é desejável na medida em que libera recursos humanos e materiais para serem utilizados naquelas ações que impõem atuação individualizada. A repetição de procedimentos licitatórios que tenham o mesmo objeto e que guardem proporção em relação às quantidades enquadram-se nessa hipótese62.

Assim, o estabelecimento de minutas-padrão dos instrumentos convocatórios e contratos atrela-se à eficiência em função de redução de tempo e pessoas necessárias para elaborar tais documentos. Otimizam-se recursos financeiros, materiais e humanos na fase de planejamento da contratação. Para as contratações que se repetem periodicamente, basta utilizar a minuta previamente aprovada, preenchendo com informações da contratação que seguirá.

A Lei das Estatais preconiza que o regulamento interno de licitações e contratos deve dispor sobre as minutas-padrão de editais e contratos63.

Ao elaborar minutas-padrão, cabe à estatal definir quais documentos podem ser padronizados, em vista dos

62 TCU. Acórdão 392/2006 – Plenário.63 Art. 40.  As empresas públicas e as sociedades de economia mista deverão publicar e manter atualizado regulamento interno de licitações e contratos, compatível com o disposto nesta Lei, especialmente quanto a: [...]III - minutas-padrão de editais e contratos.

Page 107: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

107

objetos recorrentes e que não demandam alterações relevantes das cláusulas. Essa tarefa cabe, em geral, à área de licitações e/ou contratos, com apoio do corpo jurídico da entidade.

Assim como a padronização de objetos, as minutas-padrão de atos administrativos devem ser elaboradas considerando-se a abrangência, para atender ao maior número possível de situações referentes àqueles objetos; a flexibilidade, para atendimento a necessidades variadas, mas similares; e, a praticidade, importando aqui em descrição de cláusulas diretas e gerais, de fácil compreensão pelo agente que utiliza os documentos e os adequará à situação concreta.

Devem ser estabelecidas cláusulas gerais dos instrumentos convocatórios e dos contratos que observem a legislação vigente e recomendações de órgãos de controle, contemplando todas as mínimas informações necessárias para correta compreensão do objeto, procedimentos, responsabilidades, obrigações, resultados esperados, etc., estabelecendo segurança jurídica e o atendimento aos princípios aplicáveis. Desse modo, caberá à área competente adequar a minuta padronizada às regras específicas do caso concreto. Tais minutas devem ser aprovadas pela assessoria jurídica e ratificadas pela autoridade competente.

Por derradeiro, ao finalizar o processo de padronização, seja de objeto ou de documentos, cabe à entidade apresentar os modelos às áreas que atuarão diretamente com os mesmos, para conhecimento e capacitação técnica, monitorando as ações, corrigindo falhas e atualizando os processos.

Page 108: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

108

Questão 27- Como extrair o significado de maior vantagem competitiva?

R: A lei apresenta outra diretriz consentânea à natureza jurídica das Empresas Estatais e sua vocação para o exercício de atividades econômicas em regime de concorrência com o competitivo mercado privado ou para a prestação de serviços públicos. Em vista dessas características, as contratações de terceiros devem agregar vantagem competitiva às Estatais para que possam exercer com excelência e eficiência seu objeto social.

A vantagem competitiva como diretriz a ser observada pelas Estatais implica, segundo a Lei, em avaliação de outros critérios além do binômio preço-qualidade nas contratações. Busca-se, por meio da contratação pública, a ponderação entre custos e benefícios, diretos ou indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental.

Nas organizações privadas, a vantagem competitiva é relacionada ao alcance de níveis de performance econômica elevados em função das estratégias adotadas pela empresa no mercado competitivo em que atuam. Logo, a sua aplicação em maior escala para Estatais que exercem suas atividades em regime de concorrência.

A vantagem competitiva foi estudada por Michael Porter, nos Estados Unidos, na década de 1980, que criou ferramentas, métodos e análises sobre o meio estratégico, questões de planejamento e de competitividade das organizações. De modo simplificado, Porter apresenta

Page 109: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

109

três conceitos para a compreensão da vantagem competitiva: cinco forças competitivas, estratégias competitivas genéricas e cadeia de valor.

No enfoque das forças competitivas, propõe-se que o desempenho de uma organização deve ser atribuído ao desempenho médio de suas concorrentes. Estabelece-se uma estratégia para assumir posicionamento setorial que oriente a obtenção de vantagem no mercado de atuação.

Essas cinco forças propostas por Porter podem ser assim resumidas:

a) ameaça de novos concorrentes – que pode ser dificultada por economias de escala, diferenciação do produto/serviço, exigências de capital, política governamental, etc.

b) produtos substitutos – em função da facilidade com que o consumidor consegue substituir um produto/serviço por outro similar ou alternativo.

c) poder de barganha dos compradores – que podem forçar a redução de preços em razão da quantidade a ser contratada.

d) poder de barganha dos fornecedores – na hipótese de seus produtos serem essenciais ao comprador, ocasionando uma relação de dependência.

e) rivalidade entre os concorrentes – sendo a força mais clara de competição em um setor, caracterizada pelo alto número de empresas competindo em um mesmo setor.

Concernente às estratégias competitivas genéricas, Porter as descreve como sinônimo de decisões voltadas a ações ofensivas ou defensivas para criar uma posição no setor de atuação. Aponta três estratégias:

Page 110: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

110

a) liderança geral de custos – visando o baixo custo produtivo, o que otimiza a competição e o desempenho da empresa, melhora seu poder de negociação e proporciona altas margens de lucro.

b) diferenciação – oferecendo produtos e serviços com a qualidade almejada pelos consumidores, mas com singularidade em relação à concorrência. As empresas que optam por essa estratégia investem mais em pesquisas, utilizam matéria-prima de melhor qualidade e investe no atendimento ao cliente. Pode proporcionar lealdade e reconhecimento da marca.

c) enfoque – direcionada a um nicho mais específico de atuação, atendendo às necessidades de um mercado restrito ou de consumidores específicos.

Por fim, o último conceito de vantagem competitiva apresentado por Porter é o da cadeia de valor, que representa o conjunto das atividades desempenhadas pela empresa, desde as relações com os fornecedores até a execução da atividade-fim. Analisa-se o comportamento dos custos e fontes existentes de forma a otimizar o valor final do produto/serviço. Estão incorporadas nessa cadeia atividades primárias (logística de entrada, operações, logística externa, marketing e vendas e serviços) e atividades secundárias (aquisição, desenvolvimento da tecnologia, gestão de recursos humanos e infra-estrutura).

Diante do perfil e características da empresa no setor em que atua, é possível estabelecer as estratégias para assumir e manter um posicionamento setorial e consolidar sua vantagem competitiva.

Page 111: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

111

É possível trazer os conceitos de Porter adaptando-os às Empresas Estatais para que possam seguir a diretriz legal. Como frisado acima, a natureza jurídica de direito privado e o mercado em que atuam, muitas vezes em regime de concorrência, determinam a necessidade de estabelecer ferramentas que garantam as vantagens competitivas dessas empresas. Mas ainda que sejam prestadoras de serviço público ou atuem em regime de monopólio, cabe estabelecer diretrizes que determinem o foco de atuação na satisfação do usuário ou do consumidor, o que transmudaria a vantagem competitiva externa (com relação a outras empresas concorrentes), em interna (referindo-se à própria empresa).

Nesse aspecto, cabe à estatal, dentro do seu foco de atuação, tentar alcançar níveis de performance econômica elevados garantindo a vantagem competitiva e até mesmo sua sustentabilidade econômica. Para tanto, deve identificar as forças competitivas que possam desestabilizar seu posicionamento setorial em vista do desempenho de suas concorrentes; eleger uma estratégia competitiva genérica; e, mapear sua cadeia de valor, analisando seus custos e fontes para otimizar o valor final de seu produto/serviço.

Contudo, a Lei das Estatais foi além dos conceitos tradicionais apresentados para vantagem competitiva e instaurou a análise de custos e benefícios, diretos e indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, depreciação econômica e desfazimento de bens e resíduos. Em verdade, a Lei agregou os aspectos sociais e ambientais à vantagem competitiva.

Page 112: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

112

Enfim, a busca da maior vantagem competitiva para as Estatais deve preconizar, além dos conceitos elencados acima, a ponderação entre custos e benefícios, incluindo os aspectos sociais e ambientais das suas escolhas.

Para tanto, em suas contratações, esses aspectos legais podem ser visualizados na escolha e especificação do objeto ou na obrigação das contratadas e podem estar relacionados às estratégias competitivas genéricas, como:

a) liderança geral de custos – ao focar no baixo custo de seus produtos ou serviços, contratando objetos com características mais simples e de baixo valor, ou ainda, com valor reduzido de manutenção ou com baixa depreciação econômica;

b) diferenciação - ao oferecer produtos e serviços singulares e diferenciados, investir em pesquisas, utilizando matérias-primas de boa qualidade, focar no atendimento ao consumidor/usuário, melhorando sua imagem. As contratações podem realçar os benefícios sociais e ambientais, agregando a diferenciação.

c) enfoque - ao agregar as estratégias acima em um segmento-alvo, se assim possível dentro da atividade finalística da estatal.

As estratégias competitivas podem, se bem utilizadas, assegurar vantagem competitiva e liderança à estatal em seu ramo de atuação, além de apresentar sustentabilidade econômica e financeira para alcançar os resultados consistentes com sua missão e objetivos gerais.

Page 113: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

113

Questão 28- Utilizar ou não utilizar a modalidade pregão? Eis a questão!

R: A Lei das Estatais tem despertado dúvidas em função da utilização da modalidade pregão. Isso porque definiu como diretriz a ser seguida pelas Estatais a adoção preferencial da modalidade pregão, para aquisição de bens e serviços comuns.

Cabe pontuar que a lei inaugurou significativa alteração nos processos licitatórios ao eliminar todas as modalidades de licitação disciplinadas na Lei 8.666/93. Não há referências à concorrência, à tomada de preços, ao convite, ao concurso ou ao leilão.

Pretendeu o legislador com a Lei das Estatais simplificar os procedimentos visando garantir maior celeridade às contratações. Desse modo, foi delimitado na lei que o processo licitatório será conduzido por meio de modos de disputa, podendo a entidade optar pelo fechado, aberto ou pela combinação de ambos. Foi definido, também, que a sequência de fases do procedimento considerará, como regra, o julgamento e verificação das propostas ou lances anteriormente à habilitação e há apenas uma fase recursal.

É possível observar que a sistemática acima delineada na Lei das Estatais apresenta semelhanças com o processamento do pregão. Ante as incontestáveis vantagens dessa modalidade, em especial no aspecto da celeridade, compreende-se que as leis que disciplinam regras licitatórias apresentem modalidades cujo processamento se espelha naquela.

Page 114: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

114

Contudo, se a Lei das Estatais flexibilizou as regras de processamento dos certames e instituiu os modos de disputa com algumas das características comuns ao pregão, por que o legislador definiu como diretriz a ser seguida pelas Estatais a adoção da modalidade definida na Lei 10.520/02? Não há resposta adequada para essa pergunta. Mas cabe avaliar o conteúdo da norma para aplicá-la, já que, não nos olvidemos, o pregão é uma diretriz a ser seguida pelas Estatais.

Essa atividade hermenêutica decorre da compreensão da expressão “diretriz” que, como visto acima, visa estabelecer o meio mais adequado à consecução da melhor contratação.

Nesse aspecto, pode-se afirmar que o legislador estabelece uma orientação para que as Estatais utilizem a modalidade pregão nas contratações de bens e serviços comuns.

Além da compreensão sobre de que se trata a diretriz, outra dificuldade reside na aplicação da legislação. Questiona-se se devem as Estatais aplicar a Lei 13.303/16 ou a Lei 10.520/02. A resposta para tal indagação deve levar em conta que há diferenças relevantes entre tais normativos legais.

A lei do pregão determina que: nos autos do procedimento conste o orçamento estimado da contratação; o prazo para abertura do certame deve respeitar o intervalo mínimo de oito dias úteis da data da divulgação do edital; o prazo recursal é de três dias; e, a penalidade administrativa disposta na lei é a de impedimento de licitar e contratar com a esfera da Administração que aplicou a sanção pelo prazo de até cinco anos.

Page 115: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

115

Por sua vez, a Lei das Estatais determina a regra do orçamento sigiloso; o prazo mínimo de divulgação do instrumento convocatório é de cinco dias úteis, menor que o do pregão; o prazo para interposição de recursos e contrarrazões é de cinco dias úteis; e, quanto às penalidades, a mais severa é a suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade que aplicou a sanção pelo prazo de até dois anos.

Segue quadro ilustrativo para melhor visualizar essas diferenças:

Lei 10.520/02 Lei 13.303/16

OrçamentoDivulgado nos autos do procedimento

Sigiloso

Divulgação mínima do instrumento convocatório

Oito dias úteis Cinco dias úteis

Prazo recursal Três dias Cinco dias úteis

Sanção mais severa

Impedimento de licitar e contratar com a esfera da Administração que aplicou a sanção pelo prazo de até cinco anos.

Suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade que aplicou a sanção pelo prazo de até dois anos.

Page 116: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

116

Tais diferenças revelam o dilema do administrador sobre como atender à diretriz estabelecida na Lei das Estatais e adotar a modalidade pregão.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres estabelecem duas formas de interpretação possíveis: a literal e a lógico-sistemática. Para os juristas, através da interpretação literal chega-se à conclusão de que para bens e serviços comuns aplica-se a Lei 10.520/2002 e não o procedimento previsto na Lei 13.303/201664. Contudo, tal entendimento pode prejudicar as ferramentas de flexibilidade dispostas na Lei das Estatais, como a certificação de qualidade, pré-qualificação permanente e orçamento sigiloso, o que conduz ao segundo modelo interpretativo, o lógico-sistemático, que determina a coerência entre dispositivos existentes nos textos legais. Nesse sentido, permite-se que o procedimento licitatório seja modulado como no pregão, mas adotando-se as ferramentas da Lei das Estatais65.

Mesmo entendimento é o de Sidney Bittencourt, para o qual “o aplicador da LE deverá adotar procedimento licitatório semelhante ao do pregão, ou seja, ter a conduta prevista na lei do pregão como modelo, como forma, como subsídio, mas não como regra a ser cumprida”66.

Em outro revés, Edgar Guimarães e José Anacleto Abduch dos Santos orientam que as Estatais ao licitarem na modalidade pregão cumpram a lei do pregão, mas somente no que se refere ao rito ou procedimento,

64 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 227.65 Ob. Cit. P. 229.66 BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017, p. 149.

Page 117: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

117

excluindo-se, por exemplo, a aplicação das sanções previstas no artigo 7° da Lei 10.520/0267.

Em que pese a incongruência da legislação, nos parece adequado seguir uma interpretação lógico-sistemática, adequando o pregão aos dispositivos da Lei das Estatais.

Como dito acima, o legislador criou modos de disputa excluindo as modalidades tradicionais, visando uma maior flexibilidade e celeridade nos procedimentos licitatórios. Considerando algumas semelhanças ocorridas entre o processamento do pregão e do modo de disputa aberto, que preconiza uma fase de lances sucessivos, é plausível entender que, para contratações de bens e serviços comuns, seja adotado o modo de disputa aberto, o qual pode ser presencial ou eletrônico, prevalecendo essa forma em detrimento daquela. Desse modo, estará a estatal seguindo a diretriz preconizada na lei quanto ao processamento da licitação através da ritualística do pregão, mas de acordo com as demais definições da lei 13.303/16, definido esse processamento em seu regulamento interno.

Contudo, reconhece-se que uma parcela das Estatais estabeleceu nos seus regulamentos de licitação os ritos licitatórios dos modos de disputa e do pregão, aplicando-se a Lei 10.520/02. Preveem assim a existência dos modos de disputa aberto e fechado e dos pregões presencial e eletrônico, mas adaptando-os à Lei 13.303/16.

Para essas Estatais que dispuseram em seus Regulamentos de Licitações sobre a adoção do pregão,

67 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 102.

Page 118: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

118

nas contratações de bens e serviços comuns, entendemos que, para que haja harmonia entre a legislação que trata da matéria, cabe adotar algumas disposições como orçamento sigiloso, como regra, respeito ao prazo recursal de cinco dias úteis preconizado na Lei das Estatais e com divulgação mínima do edital de oito dias, como a lei do pregão define. Tais adaptações garantem a compatibilidade entre as leis, a flexibilidade às Estatais e prevê prazos mais alargados em benefícios dos licitantes.

Page 119: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

119

Questão 29- Como aplicar “legística material” aos regulamentos de licitações e contratos e garantir a qualidade normativa do art. 40?

R: Assim como já pincelado em resposta anterior no início desta obra, a metodologia intitulada “legística” é estruturada justamente para garantir a qualidade de um determinado ato normativo, por meio da racionalização em sua elaboração, com a adoção de práticas de simplificação e consolidação, de modo a evitar a proliferação legislativa sem técnica ou rigor científico, permitindo uma avaliação dos impactos legislativos daquele determinado ato.

Em apertada síntese, pode ser classificada de 2 formas (Formal e Material). Vejamos:

Legística Formal - Otimização do círculo de comunicação normativa e fornecimento de princípios destinados à melhoria da compreensão e do acesso aos textos legislativos. Exemplo concreto no ordenamento jurídico nacional está na Lei Complementar n.º 95/98, que instituiu regras sobre a “elaboração, redação, alteração e consolidação das leis”.

Legística Material - Atuação no processo de construção e decisão sobre o conteúdo do novo ato normativo. Foco na análise de efetividade normativa (impacto). Nível de concretude dos objetivos que justificaram o impulso para normatização e os resultados obtidos com ela. No ordenamento jurídico nacional, podemos citar o Decreto Federal n.º 4.176/02 (revogado) e Decreto Federal

Page 120: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

120

n.º 9.191/17, que estabelece as normas e as diretrizes para elaboração, redação, alteração, consolidação e encaminhamento de propostas de atos normativos ao Presidente da República pelos Ministros de Estado.

Mergulhando na perspectiva da legística material, compartilhamos a ótima orientação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), constante em seu estudo intitulado Better Regulation, no qual consigna que uma boa regulação deve: I) Servir claramente aos objetivos definidos na política governamental; II) Ser clara, simples e de fácil cumprimento pelos cidadãos; III) Ter base legal e empírica; IV) Ser consistente com outras regulações e políticas governamentais; V) Produzir benefícios que compensem os custos, considerando os efeitos econômicos, sociais e ambientais disseminados por toda a sociedade.

É com essa diretriz que entendemos ser necessário desenvolver regulamentos de licitações e contratos com a garantia da qualidade normativa desejada, pois entendemos que toda regulação traz efeitos colaterais ou trade-offs, mas uma boa regulação potencializa os ganhos esperados e diminui a extensão dos efeitos indesejados.

Page 121: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

121

Questão 30- O valor estimado da contratação é, como regra, sigiloso. Seria esse sigilo uma garantia de elaboração de propostas mais vantajosas às Estatais? Quais os aspectos positivos e negativos apontados sobre o sigilo?

R: Uma das inovações da Lei das Estatais, em comparação ao regime licitatório anterior, é a do sigilo do orçamento68. A Lei, que seguiu a concepção do Regime Diferenciado de Contratação, define que, como regra, o orçamento da licitação será sigiloso, ou seja, não será acessível aos licitantes, mas faculta o afastamento da regra mediante justificativa na fase preparatória do certame.

O sigilo não é absoluto, devendo ser disponibilizado o valor aos órgãos de controle interno e externo, cabendo o respectivo controle documental.

Algumas ponderações são importantes sobre o tema.

A primeira delas é o fundamento para o sigilo. Aponta-

68 “Art. 34. O valor estimado do contrato a ser celebrado pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista será sigiloso, facultando-se à contratante, mediante justificação na fase de preparação prevista no inciso I do art. 51 desta Lei, conferir publicidade ao valor estimado do objeto da licitação, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas. § 1° Na hipótese em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, a informação de que trata o caput deste artigo constará do instrumento convocatório. § 2° No caso de julgamento por melhor técnica, o valor do prêmio ou da remuneração será incluído no instrumento convocatório. § 3° A informação relativa ao valor estimado do objeto da licitação, ainda que tenha caráter sigiloso, será disponibilizada a órgãos de controle externo e interno, devendo a empresa pública ou a sociedade de economia mista registrar em documento formal sua disponibilização aos órgãos de controle, sempre que solicitado.”

Page 122: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

122

se que inviabilizar o acesso do orçamento aos licitantes pode estimular a elaboração de propostas consentâneas à realidade das empresas, sem artificialidade balizada no valor orçado pela Administração. Esse é um aspecto positivo da não divulgação dos valores.

Sidney Bittencourt sinaliza que “inexistindo conhecimento prévio do valor referencial do objeto contratual, os licitantes tenderão a oferecer um preço menor, mais consentâneo com o efetivamente praticado no mercado”69.

Marcos Juruena Villela Souto acrescenta que a divulgação do orçamento reduz a margem de competição70.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres comparam o sigilo às relações negociais, nas quais uma parte esconde da outra o preço para garantir maiores benefícios econômicos. Sinalizam também que o sigilo pode dificultar a combinação entre competidores, já que não haverá referência para a parametrização do lucro escuso que pode ser obtido através de conluio; além do mais, os licitantes tenderiam a apresentar propostas de acordo com suas próprias estimativas, o que pode afastar empresas despreparadas, que elaboram propostas sem critério técnico e responsabilidade71.

Contudo, não há unanimidade na doutrina sobre a regra do sigilo. Marçal Justen Filho critica o orçamento sigiloso com os seguintes argumentos:

69 BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017, p. 161.70 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 149.71 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 235.

Page 123: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

123

a minha maior discordância com o sigilo é o risco de corrupção. Quem conhecer o valor do orçamento adquire uma vantagem indevida na competição. Há um segundo problema, que envolve hipóteses em que o orçamento apresenta defeitos, que o tornam inexequível. A ausência de divulgação torna impossível a revelação dos defeitos. Enfim, existe uma outra questão, que é surreal: se a melhor oferta for superior ao valor do orçamento, inicia-se uma negociação para redução do seu valor sem divulgação do referido valor.72

De fato, quem tem conhecimento sobre o valor estimado da contratação apresenta vantagens em relação aos demais competidores. Isso pode dar margem a desvios. Se por um lado a lei desestimula o conluio, por outro pode estimular a corrupção, tornando o orçamento disponível a alguns agentes que podem ser assediados por terceiros a revelar o valor. Para evitar tal situação, é importante que, ao definir pelo sigilo, a estatal estabeleça procedimentos austeros de controle quanto a quem tem acesso à informação.

A Lei definiu que o detalhamento dos quantitativos e demais informações necessárias à elaboração da proposta devem ser divulgadas. Igualmente, caso a estatal tenha adotado o critério de julgamento do maior desconto, não poderá, por óbvio, tornar sigiloso o orçamento, já que os

72 JUSTEN FILHO, Marçal. A constitucionalidade da Lei 13.303/2016: a distinção entre sociedades estatais “empresárias” e “não empresárias”. In: Revista Eletrônica da PGE RJ, v. 1, n. 1, 2018. Disponível em: http://www.revistaeletronica.pge.rj.gov.br/comum/code/MostrarArquivo.php?C=MTE3.

Page 124: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

124

descontos serão apresentados pelos licitantes com base nesse parâmetro. Será divulgado o valor do prêmio nas licitações em que o critério de julgamento adotado é o de melhor técnica, no qual o edital já definirá previamente o valor do prêmio ou remuneração.

Nas licitações, de forma geral, há obrigatoriedade de divulgação do orçamento quando este servir como critério de aceitabilidade de preços. O TCU incorporou essa regra às Estatais na decisão abaixo:

REPRESENTAÇÃO. PREGÃO. EXECUÇÃO DE SERVIÇOS DE MANUTENÇÃO, INSTALAÇÃO E DESINSTALAÇÃO DE EQUIPAMENTOS DE SISTEMA DE CLIMATIZAÇÃO E DE MANUTENÇÃO CORRETIVA DE BEBEDOUROS, GELADEIRAS E FRÍZERES. NÃO DIVULGAÇÃO DO VALOR ESTIMADO DA CONTRATAÇÃO E DA PLANILHA COM VALORES ORÇADOS, UTILIZADOS COMO CRITÉRIO DE ACEITABILIDADE DAS PROPOSTAS. ADOÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR SUSPENSIVA DO CERTAME. OITIVA. DILIGÊNCIA. ARGUMENTOS APTOS A AFASTAR APENAS EM PARTE AS SUPOSTAS IRREGULARIDADES APONTADAS. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA REPRESENTAÇÃO. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA ANULAÇÃO DO CERTAME. COMUNICAÇÕES. ARQUIVAMENTO.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, diante das razões expostas pelo Relator, em:

Page 125: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

125

9.4. dar ciência à [omissis] sobre a seguinte irregularidade identificada no Pregão Eletrônico [omissis]:

9.4.1. não divulgação do preço de referência em edital de licitação na modalidade pregão, quando utilizado como critério de aceitabilidade de preços, em desacordo com a jurisprudência desta Corte de Contas (vide Acórdãos 392/2011-TCU-Plenário, 2.166/2014-TCU-Plenário, 10.051/2015-TCU-2ª Câmara e 745/2018-TCU-Plenário) ;

...

Relatório

38. Em que pese o sigilo previsto na Lei das Estatais quanto ao valor estimado da contratação, não há nesse normativo qualquer especificidade acerca da utilização dos preços de referência como critério de aceitabilidade das propostas de preços. É nesse aspecto que a questão acima debatida merece ser revisitada à luz de entendimentos recentes deste Tribunal, conforme apresentado a seguir.

39. Repise-se que, entre as argumentações da [omissis], foram citados acórdãos referentes aos anos de 2006 e 2007.

40. No entanto, a jurisprudência do TCU avançou e se consolidou no sentido de que é obrigatória a divulgação do preço de referência, mesmo nas licitações na modalidade pregão, quando o valor for utilizado como critério de

Page 126: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

126

aceitabilidade das propostas, ainda que esta regra conste do edital.

41. Esse entendimento vem firmado nos Acórdãos 392/2011-TCU-Plenário (Relator: José Jorge) , 2.166/2014-TCU-Plenário (Relator: Augusto Sherman) , 10.051/2015-TCU-2ª Câmara (Relator: André Luís de Carvalho) , e 745/2018-TCU-Plenário (Relator: Benjamim Zymler) .

...

Voto

...

9. No que se refere à não divulgação do orçamento de referência, os argumentos trazidos pela [omissis] não se mostram aptos a afastar a irregularidade apontada. A jurisprudência desta Corte é firme quanto à obrigatoriedade de divulgação dos preços de referência em editais de licitação quando forem utilizados como critério de aceitabilidade das propostas, conforme os precedentes já elencados, bem como o Acórdão 2.166/2014-TCU-Plenário (rel. Ministro Augusto Sherman) e o Acórdão 745/2018-TCU-Plenário (rel. Ministro Benjamin Zymler) .

10. Ademais, não identifico, na redação da Lei 13.303/2016, proibição absoluta à revelação do orçamento de referência, mesmo porque o art. 34 daquele diploma faculta à contratante conferir publicidade ao valor estimado mediante

Page 127: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

127

justificação –  in casu, a adoção do preço de referência como critério de aceitabilidade da proposta não apenas justifica, mas obriga, referida divulgação, em homenagem ao princípio da publicidade insculpido na Constituição Federal.73

Contudo, entendemos que o posicionamento externado acima colide com a própria Lei 13.303/16, que define no artigo 56, inciso IV74, que as propostas que apresentarem valores superiores ao orçamento estimado serão desclassificadas. Ou seja, a sistemática da lei preconiza que o orçamento serve como parâmetro para aceitabilidade das propostas, na medida em que aquelas que ultrapassarem o valor estimado da contratação devem ser desclassificadas. Seguindo a posição do TCU acima, a divulgação do orçamento seria a regra, contrariando o disposto no artigo 34 que, como visto, determina o sigilo como regra.

Não se pode olvidar que o sigilo é regra temperada pela possibilidade de divulgação da informação sob justificativa administrativa no momento da preparação do procedimento licitatório. Tal possibilidade está consentânea com a flexibilidade atribuída pela lei às Estatais em seus procedimentos. Assim, caso a divulgação do orçamento possa resultar em propostas mais vantajosas e ampliação da competitividade no

73 TCU. Acórdão 1502/2018 – Plenário.74 “Art. 56. Efetuado o julgamento dos lances ou propostas, será promovida a verificação de sua efetividade, promovendo-se a desclassificação daqueles que:[...]IV - se encontrem acima do orçamento estimado para a contratação de que trata o § 1o do art. 57, ressalvada a hipótese prevista no caput do art. 34 desta Lei;”

Page 128: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

128

certame, cabe apresentar as justificativas pertinentes e divulgar o orçamento juntamente com o edital.

Seguindo a orientação expressa pelo TCU, ao analisar dispositivo correlato no RDC, cabe ponderar a adoção do orçamento sigiloso em “obras mais complexas com prazo exíguo para a conclusão e cuja parcela relevante dos serviços a serem executados não possua referência explícita no Sinapi/Sicro...”75

Há outro julgado digno de nota do TCU sobre o sigilo do orçamento, igualmente em análise ao RDC, mas que apresenta uma análise um pouco mais aprofundada sobre o tema:

35. Existem as obrigatoriedades do orçamento público definidas nos §§ 1º e 2º – in caso, para as licitações cujo critério de julgamento for o de maior desconto ou melhor técnica. A questão é sondar se essas duas hipóteses são exaustivas; ou seja, se podem existir outras circunstâncias, devidamente motivadas, que autorizem a “abertura” do orçamento.

36. Acredito que sim. Considero, aliás, que interpretação diversa seria a contrario sensu de toda a lógica do regime. O RDC delineou uma vasta gama de soluções para que o gestor definisse como obter a melhor proposta. Basta motivá-las, considerando as particularidades e idiossincrasias de cada contratação. Se demonstrada a vantagem em abrir o orçamento, que assim se faça. ...

75 TCU. Acórdão 3011/2012 – Plenário.

Page 129: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

129

38. Regrou-se no decreto, sempre, o orçamento sigiloso; mas não extraio tal conclusão após uma interpretação lato da Lei 12.462/2011. Entendo o orçamento fechado como uma possibilidade – talvez uma preferência – mas não uma meta compulsória. Tal conclusão é a que mais se aproxima do espírito geral do Regime. Novamente, em se tratando das múltiplas possibilidades para definir o que vem a ser a melhor proposta, basta motivar o caminho de maior conveniência, dentro dos novos regramentos e dos ideais de eficiência, eficácia, efetividade e economicidade.

39. Feita a digressão, se tomada a condição de o orçamento sigiloso ser uma plausibilidade, pode-se questionar se o fato de todas as propostas terem sido superiores ao paradigma não seriam condição para abertura dos preços. No caso concreto, afinal, existe uma meta de tempo a ser atingida, que é o término tempestivo da obra para a Copa do Mundo. Se mesmo após a abertura do orçamento na fase de negociação não restar proposta classificada (dentre as licitantes chamadas à negociação), a próxima licitação poderia ser feita com orçamento público.

40. Em arremate, não obstante a letra do Decreto 7.581/2011 regulamentar que somente ao fim do certame é que deve o orçamento ser publicado (a Lei estabelece a adjudicação como condição), para fazer valer a real

Page 130: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

130

possibilidade de negociar, desde que em ato público e devidamente justificado, não vejo, em princípio, reprovabilidade em abrir o sigilo na fase de negociação.76

Por fim, na hipótese de serem promovidas alterações no orçamento estimado que envolva o detalhamento dos quantitativos e outras informações pertinentes à elaboração da proposta, caberá a divulgação das modificações, conforme orienta o TCU:

Nas licitações realizadas pelas empresas estatais, ainda que o valor estimado da contratação seja sigiloso, qualquer modificação no orçamento estimativo que envolva o detalhamento dos quantitativos e as demais informações necessárias para a elaboração das propostas deve ser objeto de divulgação nos mesmos termos e prazos dos atos e procedimentos originais, ensejando a reabertura do prazo para apresentação das propostas, nos termos do art. 39, parágrafo único, da Lei 13.303/2016.77

Outra questão de relevante importância é o momento de divulgação do orçamento. A Lei do RDC definiu que o orçamento será tornado público imediatamente após o encerramento da licitação. Embora muitos artigos tenham tido sua inspiração nesse normativo, a Lei 13.303/2016 não definiu o momento em que o orçamento poderá ser divulgado. Tal dispositivo foi vetado sob a justificativa

76 TCU. Acórdão 306/2013 – Plenário.77 TCU. Acórdão 3059/2016 – Plenário.

Page 131: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

131

de que poderia a divulgação “acarretar consequências indesejáveis para a formação de preços e adequada competição em processos licitatórios posteriores, para objetos similares”.78

Mas, considerando a flexibilidade almejada pela lei às Estatais e até mesmo a possibilidade de as entidades divulgarem o orçamento sob justificativa, não se vislumbra vedação à regulamentação interna sobre o momento para abrir o valor orçado, que, seguindo a orientação do RDC, pode ser efetuado após a adjudicação, ou ainda, se oportuno, no momento da negociação, para facilitar esse procedimento e evitar que a etapa da negociação obstaculize a celeridade do procedimento e acarrete “negociação” interminável.

Harmonizando com esse entendimento, Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres discorrem que:

a solução deve ser dada pela regulamentação interna, de acordo com o perfil da estatal e as peculiaridades de sua atividade empresarial, orientando pela abertura do sigilo, em regra, após a adjudicação do objeto, e a possibilidade de ampliá-lo (o sigilo) até um momento futuro ou mesmo indefinidamente (o que deve ser compreendido de forma excepcional e apenas em relação ao dever de realização da publicação oficial), quando isso for necessário ou estratégico para a estatal, nos limites da legislação.79

78 BRASIL. Lei n° 13.303/2016, Mensagem nº 359, de 30 de junho de 2016.79 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 243.

Page 132: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

132

Cabe à estatal, portanto, definir no caso concreto, ante as particularidades do objeto e do respectivo mercado, na fase de preparação, se é pertinente ou não a divulgação do orçamento, justificando a posição que optar pela publicidade do valor estimado.

Em relação à obtenção do orçamento, a Lei das Estatais não definiu o procedimento adequado para tanto. Mas não difere das contratações promovidas por outros órgãos.

Todas as contratações promovidas pelas Estatais, precedidas ou não por licitação, devem, como regra, ser instruídas com estimativa do custo do objeto, que subsidie a definição de recursos necessários para a cobertura das despesas contratuais e possibilite a análise de adequabilidade das propostas ofertadas.

Trata-se de tema que demanda cautelas severas pela estatal para que o valor estimado esteja de fato de acordo com o mercado. Quanto mais em função do disposto no artigo 56, inciso IV, no qual serão desclassificadas as propostas que se encontrem acima do orçamento estimado. Se estiver mal dimensionado o orçamento, poderá ocasionar a desclassificação indevida de licitantes e a frustração da licitação.

O valor estimado que integrará o orçamento-base deve ser obtido observando-se alguns requisitos, como: atualidade, abrangência, efetividade e parametrização. Deve-se atentar para que os valores sejam um retrato do mercado para aquele objeto a ser contratado. Portanto, devem ser atuais, evitando-se pesquisas defasadas, de anos anteriores, sem refletir as variações de custos do mercado; abrangentes, de forma a alcançar de forma

Page 133: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

133

representativa o mercado; efetivas, de modo a refletir as condições e critérios para atendimento do objeto, com prazos, dimensões qualitativas e quantitativas, especificações e outras informações que possam influenciar no valor; e, definidos mediante parametrização adequada, estabelecendo-se as fontes de pesquisa, a metodologia, os procedimentos e demais critérios pertinentes. E sempre que o custo de um objeto for formado por componentes e insumos diversos deve ser elaborada uma planilha de custos e formação de preços que instrua o certame.

Por esses e outros motivos é que em 2014, a Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação (SLTI), do então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), editou a Instrução Normativa n.º 05/2014, que dispôs sobre o novo procedimento administrativo para a realização de pesquisa de preços para a aquisição de bens e contratação de serviços em geral, destacando justamente a nova ordem preferencial dos parâmetros a serem utilizados pela Administração Pública Federal (APF), por entenderem estar decrescentemente alinhados com os requisitos acima80.

80 O art. 2º determina que: Art. 2º A pesquisa de preços será realizada mediante a utilização dos seguintes parâmetros: (Alterado pela Instrução Normativa nº 3, de 20 de abril de 2017) I - Painel de Preços disponível no endereço eletrônico http://paineldeprecos.planejamento.gov.br; (Alterado pela Instrução Normativa nº 3, de 20 de abril de 2017); II - contratações similares de outros entes públicos, em execução ou concluídos nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores à data da pesquisa de preços; (Alterado pela Instrução Normativa nº 3, de 20 de abril de 2017); III - pesquisa publicada em mídia especializada, sítios eletrônicos especializados ou de domínio amplo, desde que contenha a data e hora de acesso; ou (Alterado pela Instrução Normativa nº 3, de 20 de abril de 2017); IV - pesquisa com os fornecedores, desde que as datas das pesquisas não se diferenciem em mais de 180 (cento e oitenta) dias. (Alterado pela Instrução Normativa nº 3, de 20 de abril de 2017).

Page 134: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

134

O TCU orienta que a pesquisa que formará o orçamento estimado demanda avaliação crítica dos valores obtidos, devendo-se descartar aqueles que apresentem grande variação em relação aos demais81 e seja realizada a partir de consulta a fontes variadas, tais como:

... pesquisas junto a fornecedores, valores adjudicados em licitações de órgãos públicos – inclusos aqueles constantes no Comprasnet –, valores registrados em atas de SRP, entre outras fontes disponíveis tanto para os gestores como para os órgãos de controle – a exemplo de compras/contratações realizadas por corporações privadas em condições idênticas ou semelhantes àquelas da Administração Pública –, desde que, com relação a qualquer das fontes utilizadas, sejam expurgados os valores que, manifestamente, não representem a realidade do mercado.82

Enfim, é fundamental que os parâmetros metodológicos que orientam as pesquisas de preços da entidade sejam estabelecidos em regulamento interno.

81 TCU. Acórdão 403/2013 - Primeira Câmara.82 TCU. Acórdão 2.170/2007 – Plenário.

Page 135: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Licitações sustentáveis

nas Estatais

Page 136: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

136

Questão 31- O que são e quais os obstáculos para instituir as contratações sustentáveis?

R: Antes de estabelecer um conceito de licitações sustentáveis é importante pontuar, de modo conciso, quais os marcos históricos que as fundamentam.

A Revolução Industrial inaugurou um desenvolvimento que se baseava em uso intensivo de combustíveis fósseis, como o carvão, despejo de lixo urbano e efluentes químicos nos rios e mares, poluição atmosférica e exploração excessiva dos recursos naturais, levando ao declínio de muitos deles, além da prática do imperialismo e colonialismo, para apropriação de riquezas.

Desde que o movimento ambientalista desabrochou nas décadas de 40 e 50 do século passado, o mundo passou a conhecer os malefícios causados ao meio ambiente pelo modelo desenvolvimentista emergente. O movimento tomou envergadura global na década de 60 com a obra “Primavera Silenciosa” de Rachel Carson, que apontou o materialismo da ciência e os problemas relacionados ao uso de pesticidas na agricultura para a saúde humana e dos animais. Então, passou-se a questionar como estabelecer um desenvolvimento que não fosse tão predatório aos recursos naturais a ponto de inviabilizar o atendimento das necessidades de gerações presentes e futuras.

O que se observou em muitos países foi um crescimento econômico que não foi acompanhado pelo desenvolvimento social. Outrossim, a exploração

Page 137: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

137

dos recursos naturais para fazer frente aos avanços da indústria e aumento nas relações comerciais tornou-se predatória e os sistemas naturais começaram a colapsar.

As nações passaram a dialogar para instaurar modelos de desenvolvimento que pudessem atender às necessidades das gerações presentes sem, contudo, prejudicar a satisfação das necessidades das gerações futuras. Esse foi o conceito apresentado pela ONU para o desenvolvimento sustentável na Primeira Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em Estocolmo, na Suécia, em 1972.

A sustentabilidade passou a ter presença em agendas políticas e a comunidade internacional organizou grandes eventos globais para discutir a questão ambiental e elaborar documentos que estabelecessem os princípios da sustentabilidade e as ações para empreendê-los.

Dá-se destaque, nesse plano, a iniciativa da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que elaborou em 1987 o Relatório Brudtland, intitulado “Nosso Futuro Comum”, o qual apontou para a incompatibilidade entre desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo até então vigentes.

Na sequência, a ONU realizou na cidade do Rio de Janeiro, em 1992, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como ECO-92, que estabeleceu os princípios do desenvolvimento sustentável e um programa de ações para alcança-lo. Foram produzidos importantes documentos oficiais, como a Carta da Terra e a Agenda 21, e realizadas três convenções para tratar de temas

Page 138: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

138

específicos como biodiversidade, mudanças climáticas e desertificação.

Por meio da Agenda 21, muitas nações se comprometeram a estabelecer e manter diálogo construtivo para alcançar uma economia mundial mais eficiente e equitativa, e viabilizar um padrão de desenvolvimento ambientalmente racional. Sua implementação e o comprometimento com os princípios estabelecidos na ECO-92 foram reafirmados em Joanesburgo, em 2002, durante a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável. O Plano de Implementação de Joanesburgo, em seu parágrafo 18, estabelece o incentivo às autoridades competentes para levar em consideração as questões do desenvolvimento sustentável nas tomadas de decisão, incluindo medidas como a promoção de políticas de aquisição pública que incentivem o desenvolvimento e a difusão de bens e serviços ambientalmente racionais83.

Nessa mesma Cúpula foi proposta a elaboração de um conjunto de programas com duração de 10 anos (10 Years Framework Program) para apoiar e fortalecer iniciativas regionais e nacionais para promoção de mudanças nos padrões de consumo e produção. Esses programas foram estabelecidos no Processo de Marrakesh, em 2003, e foram criados 7 Grupos de Trabalho (Task Forces), cuja adesão era voluntária, para apoiar a implementação de programas e projetos-piloto para o conceito de Produção e Consumo Sustentáveis (PCS)84. Dentre essas forças de trabalho, dá-se destaque a de Compras Públicas Sustentáveis,

83 Disponível em: https://sustainabledevelopment.un.org/84 Disponível em: http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/producao-e-consumo-sustentavel/plano-nacional/processo-de-marrakesh

Page 139: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

139

lançada pelo governo da Suíça, em 2005. Contou com vários países e tinha como objetivo promover e apoiar a implementação de compras públicas sustentáveis (CPS). Como principais resultados cita-se o desenvolvimento de uma abordagem em CPS, treinamentos e orientações, implementação e conscientização. Entre os anos 2009 e 2012, a abordagem foi testada em 11 países-piloto.

YAKER et al. delinearam como resultados obtidos pela implementação de CPS por meio da abordagem acima:

redução específica das emissões de CO², tanto em função das metas globais quanto das metas locais; redução de custos, principalmente por meio do reconhecimento dos benefícios e custos não tangíveis; boa governança; criação de empregos; empoderamento das minorias; criação de riquezas e de transferência de competências e tecnologia85.

As contratações públicas sustentáveis, que nos parece uma terminologia mais adequada, buscam satisfazer as necessidades do ente promotor da contratação, com isonomia, visando à proposta mais vantajosa ao interesse coletivo e buscando alcançar um equilíbrio entre os pilares da sustentabilidade, quais sejam, o ambiental, o social e o econômico, gerando, de forma direta ou indireta, benefícios à coletividade e minimizando impactos ao meio ambiente.

85 YAKER, Farid, et.al. O trabalho do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente na promoção das Compras Públicas Sustentáveis. In Panorama de licitações sustentáveis: direito e gestão pública. Coord. VILLAC, Teresa; BLIANCHERIS, Marcos Weiss; SOUZA, Lilian Castro de. Belo Horizonte: Fórum 2014, p. 43.

Page 140: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

140

As licitações sustentáveis foram erigidas ao status legal no Brasil, pela Lei 12.349, de 2010, que incorporou um novo objetivo às licitações. Além da isonomia e da proposta mais vantajosa, as contratações públicas devem promover o desenvolvimento nacional sustentável. Essa lei foi responsável pela inserção das licitações sustentáveis no bojo do planejamento das contratações públicas.

Ainda que a sustentabilidade tenha alicerce constitucional86, sendo princípio aplicável em diversas searas, a partir de 2010 os gestores devem conferir prioridade a políticas públicas que visem garantir o atendimento às necessidades e bem-estar das presentes gerações, sem impedir a aferição desses mesmos benefícios às gerações futuras.

Nas palavras de Juarez Freitas, agora sob o manto da sustentabilidade “a proposta mais vantajosa será sempre aquela que, entre outros aspectos a serem contemplados, apresentar-se a mais apta a causar, direta ou indiretamente, o menor impacto negativo e, simultaneamente, os maiores benefícios econômicos, sociais e ambientais”87.

86 É o que facilmente se conclui de uma interpretação lógico-sistemática da Constituição Federal, dos artigos 3°, inciso II; 170, incisos VI e seguintes; e, 225. Tal concepção, em sua vertente ambiental, foi referendada pelo STF Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da ADIn 3.540 MC/DF: “O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia [...]”.87 FREITAS, Juarez. Princípio da Sustentabilidade: Licitações e a Redefinição da Proposta Mais Vantajosa. REVISTA DO DIREITO UNISC, SANTA CRUZ DO SUL Nº 38│p. 74- 94│JUL-DEZ 2012. p. 78

Page 141: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

141

Sobre os pilares da sustentabilidade, Marçal Justen Filho aponta dois aspectos que envolvem a questão:

- A dimensão econômico-social – O fomento às atividades no Brasil

O contrato administrativo é concebido como instrumento para fomentar atividades no Brasil. Tanto podem ser atividades materiais realizadas aqui, como o desenvolvimento de ideias, no âmbito do conhecimento, da ciência e da tecnologia.

Isso significa, em última análise, assegurar um tratamento preferencial às empresas estabelecidas no Brasil. Haverá preferência pela contratação de empresas aptas a assegurar empregos, a pagar tributos e a manter a riqueza nacional do país.

- A dimensão ecológica – Adoção de práticas ambientalmente corretas

A outra dimensão normativa envolve a adoção de soluções ambientalmente corretas. A contratação administrativa deve buscar práticas amigáveis ao meio ambiente, reduzindo ao mínimo possível os danos ou o uso inadequado dos recursos naturais.88

A Lei das Estatais estabeleceu no artigo 31 como princípio a ser observado nas licitações realizadas e nos contratos celebrados, dentre outros, o desenvolvimento nacional

88 FILHO, Marçal Justen. DESENVOLVIMENTO NACIONAL SUSTENTADO – CONTRATAÇÕES ADMINISTRATIVAS E O REGIME INTRODUZIDO PELA LEI Nº 12.349/101. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 50, abril 2011. Disponível em: http://www.justen.com.br//informativo. php?informativo=50&artigo=528, acesso em 15 de março de 2018.

Page 142: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

142

sustentável, seguindo o norte dado pela Lei 8.666/93.89

Há benefícios importantes e tangíveis para a realização de contratações públicas sustentáveis. Pode-se citar a melhoria da performance ambiental do país, com a redução de emissões de CO², destinação adequada de resíduos, aquisição de produtos que não causam ou causam poucos impactos ambientais; redução de custos a médio e longo prazo, com contratação de produtos e serviços mais eficientes, inclusive do ponto de vista energético; criação de empregos, desenvolvimento da economia local, criação e distribuição de riqueza; maior diálogo com o mercado; estímulo a concorrência, com a criação de soluções tecnológicas, inovadoras e sustentáveis; além de estimular novos comportamentos socioambientais na sociedade.

A Administração é um importante consumidor de produtos e serviços, movimentando a economia em face das contratações que realiza. Estima-se que as contratações públicas movimentem cifras equivalentes a aproximadamente 12% do Produto Interno Bruto. Esse percentual expressivo é suficiente para a dedução de que as necessidades Estatais modelam o setor privado e o Estado pode, com o desempenho de uma função indutora da sustentabilidade, implementar políticas públicas socioambientais por meio dessas contratações.

89 Que estabeleceu no artigo 3° os princípios que regem as licitações, com o destaque para o do desenvolvimento nacional sustentável: “Art. 3° A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.”

Page 143: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

143

Mas há muitas barreiras ainda a serem transpostas. Dados do ano de 2017 apontam que, no âmbito da Administração Pública Federal, apenas 0,88% das aquisições de bens se pautaram em critérios de sustentabilidade. O número para contratação de serviços é ainda menor, de somente 0,75%90.

Essa expressiva baixa adesão pode ser explicada pela concepção de que as contratações sustentáveis são complexas e elevam os custos para a Administração. Aponta-se também a falta de conhecimento e de informação sobre políticas ambientais e sociais bem como de critérios de sustentabilidade para incluí-los nas contratações. Muitos desses critérios podem restringir a competitividade e se não houver fundamentação técnica pode vir a ser questionada por órgãos de controle. A oferta no mercado para determinados produtos e metodologias é insuficiente; não há ferramentas práticas para determinação e avaliação de critérios sustentáveis; e, por fim, a cultura organizacional, pautada no materialismo imediatista também podem ser empecilhos para a realização de contratações sustentáveis.

Sobre essa última questão apontada, a cultura organizacional, Juarez Freitas discorre que “os critérios estratégicos da sustentabilidade, no processo de tomada da decisão administrativa, requerem o maior distanciamento temporal e a capacidade de prospecção de longo prazo, com o abandono resoluto da visão reducionista dominante, segundo a qual o sistema

90 Fonte: Ministério do Planejamento – órgãos integrantes do SIASG.

Page 144: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

144

jurídico cuidaria apenas do imediato e da obtenção do “preço míope”.91

Enfim, a Lei das Estatais, seguindo outros normativos licitacionais, agregou o princípio constitucional da sustentabilidade como princípio a ser observado pelas sociedades de economia mista e empresas públicas em suas licitações e contratações. Há outras importantes referências sobre a sustentabilidade em seu texto. Cabe às entidades, agora, incluir em seu planejamento de contratações critérios estratégicos da sustentabilidade para atender ao determinado na Lei e nos clamores globais por uma sociedade mais justa, equitativa e que respeite o meio ambiente.

91 FREITAS, Juarez. Princípio da Sustentabilidade: Licitações e a Redefinição da Proposta Mais Vantajosa. REVISTA DO DIREITO UNISC, SANTA CRUZ DO SUL Nº 38│p. 74- 94│JUL-DEZ 2012. p. 87.

Page 145: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

145

Questão 32- Como aplicar as normas socioambientais nas contratações das Estatais?

R: Conforme observado anteriormente, o desenvolvimento de contratações públicas sustentáveis contribui para a melhoria da performance ambiental e social do Brasil, além de outros benefícios apontados.

Como forma de estimular, mas de forma cogente, a Administração Pública Indireta, a Lei das Estatais estabeleceu no artigo 32, que define as diretrizes a serem observadas nas licitações e contratos, em seu parágrafo primeiro, o atendimento a uma série de normas de cunho socioambiental:

Art. 32.  ...

[...] 

§ 1o  As licitações e os contratos disciplinados por esta Lei devem respeitar, especialmente, as normas relativas à: 

I - disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas; 

II - mitigação dos danos ambientais por meio de medidas condicionantes e de compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental; 

III - utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente, reduzam o consumo de energia e de recursos naturais; 

Page 146: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

146

IV - avaliação de impactos de vizinhança, na forma da legislação urbanística; 

V - proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, inclusive por meio da avaliação do impacto direto ou indireto causado por investimentos realizados por empresas públicas e sociedades de economia mista; 

VI - acessibilidade para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida. 

Cabe notar a obrigatoriedade imposta pela lei para o atendimento às normas acima. Não se traduz em faculdade. Ao promover qualquer contratação, deve a estatal utilizar produtos que reduzam o uso de recursos naturais, garantir acessibilidade a pessoas com mobilidade reduzida, destinar adequadamente os resíduos sólidos gerados em obras e serviços, etc. É importante se observar, também, que as imposições acima não decorrem da Lei das Estatais, mas sim, de normas constitucionais e infraconstitucionais, todavia o legislador das Estatais enfatizou tais políticas e diretrizes como forma de sobrelevar as políticas públicas socioambientais e incorporá-las ao texto da Lei 13.303/16, numa ação propositiva e inserida em valores relevantes para a sociedade.

É válido tratar individualmente de tais normas.

I. Disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados pelas obras contratadas.

A geração de resíduos é um dos mais graves problemas da sociedade contemporânea e tem despertado grandes discussões em âmbito mundial, nas mais diversas

Page 147: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

147

instâncias92, pois está relacionada a questões de saúde pública, bem-estar e da qualidade do meio ambiente, intimamente ligados.

A quantidade em que são gerados, a sua composição e o tratamento que a eles têm sido dado, ocasionam muitos problemas ambientais, sociais e de saúde pública. Esse aumento deriva do crescimento acelerado das cidades e da industrialização93.

O tema é tão relevante que foi incluído inicialmente em um dos “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio” (ODM), também conhecidos como “8 Jeitos de Mudar o Mundo”, que constituíram um conjunto de metas pactuadas pela Organização das Nações Unidas com seus países membros, com a finalidade de tornar o mundo mais justo e solidário. Os Objetivos para o Milênio foram substituídos mais recentemente pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). São 17 objetivos e 169 metas aprovados na Cúpula das Nações Unidas Sobre Desenvolvimento Sustentável, realizada no final de setembro de 2015, em Nova York, com a finalidade de criar uma agenda universal que estimule ações para os próximos 15 anos em áreas consideradas cruciais para a humanidade e o planeta.

A geração e o tratamento adequado de resíduos estão inseridos no Objetivo 12 dos ODS, que visa assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis, com

92 GOUVEIA, Nelson, Resíduos sólidos urbanos: impactos socioambientais e perspectiva de manejo sustentável com inclusão social. Ciência & Saúde Coletiva [en linea] 2012, 17 (Junio-Sin mes): [Fecha de consulta: 8 de diciembre de 2016] Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=63023390015> ISSN 1413-8123, acesso em 15 de fevereiro de 2018.93 SANTAELLA, Sandra Tédde, et al. Resíduos sólidos e a atual política ambiental brasileira. Fortaleza: UFC/ LABOMAR/ NAVE, 2014.

Page 148: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

148

destaque para o 12.5, 12.6 e 12.7, respectivamente: “Até 2030, reduzir substancialmente a geração de resíduos por meio da prevenção, redução, reciclagem e reuso”, “incentivar as empresas, especialmente as empresas grandes e transnacionais, a adotar práticas sustentáveis e a integrar informações de sustentabilidade em seu ciclo de relatórios”, “promover práticas de compras públicas sustentáveis, de acordo com as políticas e prioridades nacionais”.94

Relaciona-se a tais objetivos, no que se refere aos resíduos, a necessidade de implantação de uma gestão integrada dos mesmos, com a finalidade de reduzir o consumo de matéria-prima oriunda de recursos naturais, com vistas a buscar um equilíbrio entre a produção e o impacto ambiental correspondente; rever processos produtivos que geram resíduos; aumentar a reutilização e a reciclagem; e, promover o tratamento e depósito ambientalmente adequados dos rejeitos.

Em que pese a relevância do tema para a saúde e o meio ambiente, denota-se que a sociedade como um todo, incluindo atores públicos e privados, ainda não está preparada, ou suficientemente consciente, da necessidade de promover uma gestão adequada de resíduos. Soma-se a isso o fato de, localmente, o poder público municipal muitas vezes ser negligente quanto à gestão de resíduos nas cidades. Não há recursos materiais e humanos para o adequado processo de tratamento do lixo gerado95, ou tais recursos não são alocados para essa finalidade.

94 Disponível em: http://nacoesunidas.org/pos2015/agenda2030/, consultado em 1° de outubro de 2016.95 GRIPPI, Sidney. Lixo: reciclagem e sua história: guia para as prefeituras brasileiras. 2.ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2006.

Page 149: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

149

É importante sinalizar que muitos desses resíduos sólidos são compostos por materiais recicláveis que podem ser reaproveitados se retornados à cadeia de produção, gerando renda para trabalhadores envolvidos na coleta e comercialização96, assim como gerando lucro para empresas que utilizam esses materiais em seus processos produtivos.

As políticas públicas nesse setor são fundamentais para estabelecer marcos normativos e avanços legais que favoreçam o engajamento de toda a coletividade e, acrescenta-se, para não sobrevirem descontinuidades políticas.

Dias Neto, nesse aspecto, sublinha a importância de o Estado, por meio de políticas públicas, instituir princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes e normas para o gerenciamento dos resíduos sólidos, com a finalidade de definir a direção do Estado e das obrigações dos setores produtivos no desenvolvimento social e ambiental mais justo97.

Variadas são as questões materializadas em políticas públicas. Em matéria ambiental, as regulamentações são os instrumentos de política ambiental, definida essa como o conjunto de metas e regulamentos que visa reduzir o impacto da ação humana sobre o meio ambiente98. A política ambiental brasileira segue a prática internacional,

96 GRIPPI, Sidney, ob.cit.97 DIAS NETO, Antônio Alves. Gestão de resíduos sólidos: uma discussão sobre o papel das políticas públicas e arranjos institucionais do estado, UFBA, 2009. Programa de Pós-graduação em Engenharia Ambiental Urbana da Universidade Federal da Bahia.98 FAISTEL, F. Meio ambiente, políticas ambientais e desenvolvimento sustentável. Revista Campus, Paripiranga, v. 1, n. 1, p. 134-161, 2008.

Page 150: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

150

baseada em medidas de comando e controle, que fixam os comportamentos por lei e fiscalizam seu cumprimento.

O Estado, enquanto catalisador de debates e questões socioambientais, é o principal personagem na narrativa de identificar os problemas que afetam a sociedade e planejar as soluções mais adequadas. Seu protagonismo se sobressai em matéria de resíduos sólidos, considerando a necessidade da mudança dos padrões existentes de produção e consumo, assim como da implantação de um gerenciamento integrado de resíduos sólidos que consiga responder à demanda da sociedade e do setor econômico, e que associe o equilíbrio econômico, a eficiência ambiental e a justiça social.

Como resposta à crise socioambiental e aos debates globais, o Brasil criou um aparelhamento jurídico que objetiva regular a gestão dos resíduos, de forma integrada, com princípios, diretrizes, fundamentos, instrumentos, planos e programas. Trata-se da Política de Saneamento Básico, tratada na Lei nº 11.445/2007 e a Política Nacional de Resíduos Sólidos, disposta na Lei 12.305/2010.

Não trabalhou primeira lei com completude sobre o tema, até porque sua pretensão era trazer as diretrizes gerais para o saneamento básico, incorporando os resíduos sólidos nesse conceito. Coube à Lei nº 12.305/2010 o aprofundamento que a matéria carecia.

Nesse aspecto, Yoshida destaca que “A PNRS constitui sem dúvida um marco legal histórico na gestão compartilhada do meio ambiente como exigência constitucional, compartilhando a corresponsabilidade pela gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos entre

Page 151: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

151

os poderes estatais dos diferentes níveis federativos e entre os atores econômicos e sociais”99.

Aqui é possível estabelecer o liame entre a PNRS e a Lei das Estatais. O Estado define através do entrelaçamento de leis a consecução de suas políticas públicas. O que o legislador da Lei 13.303/16 fez foi materializar um dos objetivos da Lei 12.305/10, qual seja, promover a gestão integrada e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos, ao determinar no artigo 31, §1°, inciso I, que nas obras100 deve ser respeitada a “disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos gerados”.

A PNRS apresenta conceituações importantes para melhor compreensão do seu texto e uniformização de entendimentos sobre a matéria, que constam no artigo terceiro da lei:

Art. 3o  Para os efeitos desta Lei, entende-se por: 

[...]

VII - destinação final ambientalmente adequada: destinação de resíduos que inclui a reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético ou outras destinações admitidas pelos órgãos competentes do Sisnama, do SNVS e do Suasa, entre elas a disposição final, observando normas

99 YOSHIDA, Consuelo. Competência e as diretrizes da PNRS: conflitos e critérios de harmonização entre as demais legislações e normas. In: JARDIM, Arnaldo; YOSHIDA, Consuelo; FILHO, José Valverde Machado. [organ.] Política nacional, gestão e gerenciamento de resíduos sólidos. Barueri, SP: Manole, 2012, p. 12.100 Defendemos que a regra deve ser estendida também para compras e serviços.

Page 152: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

152

operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos; 

VIII - disposição final ambientalmente adequada: distribuição ordenada de rejeitos em aterros, observando normas operacionais específicas de modo a evitar danos ou riscos à saúde pública e à segurança e a minimizar os impactos ambientais adversos; 

[...]

X - gerenciamento de resíduos sólidos: conjunto de ações exercidas, direta ou indiretamente, nas etapas de coleta, transporte, transbordo, tratamento e destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, de acordo com plano municipal de gestão integrada de resíduos sólidos ou com plano de gerenciamento de resíduos sólidos, exigidos na forma desta Lei; 

XI - gestão integrada de resíduos sólidos: conjunto de ações voltadas para a busca de soluções para os resíduos sólidos, de forma a considerar as dimensões política, econômica, ambiental, cultural e social, com controle social e sob a premissa do desenvolvimento sustentável; 

[...] 

XIII - padrões sustentáveis de produção e consumo: produção e consumo de bens e

Page 153: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

153

serviços de forma a atender as necessidades das atuais gerações e permitir melhores condições de vida, sem comprometer a qualidade ambiental e o atendimento das necessidades das gerações futuras; 

XIV - reciclagem: processo de transformação dos resíduos sólidos que envolve a alteração de suas propriedades físicas, físico-químicas ou biológicas, com vistas à transformação em insumos ou novos produtos, observadas as condições e os padrões estabelecidos pelos órgãos competentes do Sisnama e, se couber, do SNVS e do Suasa; 

XV - rejeitos: resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada; 

XVI - resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível.

Page 154: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

154

Dos conceitos acima é possível observar uma imprecisão técnica do legislador da Lei das Estatais quanto ao termo “disposição final” de resíduos sólidos, sendo o correto estabelecer a destinação final de resíduos sólidos ou a disposição final de rejeitos nos aterros sanitários. Queremos acreditar que a destinação final de resíduos é mais apropriada, por incluir as etapas de reutilização, reciclagem, compostagem, recuperação, aproveitamento energético dos resíduos e a disposição final dos rejeitos.

Defende-se que as Estatais devem promover o gerenciamento adequado dos resíduos gerados, abrangendo dar a destinação adequada dos mesmos.

É possível perceber que na confluência entre a PNRS e a Lei das Estatais, no que se refere à destinação dos resíduos, a proposta mais vantajosa da estatal deve privilegiar, na análise do ciclo de vida, os produtos e serviços que promovam menores impactos ambientais, inclusive no que se refere à qualidade e quantidade de resíduos gerados, estabelecendo-se nas especificações dos produtos utilizados ou adquiridos que os mesmos devem ser produzidos por materiais reutilizados, ou reciclados ou recicláveis, ou ainda, biodegradáveis. E que os resíduos gerados nas obras e serviços devem ser destinados adequadamente: recicláveis e reutilizáveis para cooperativas ou associações que promovam a segregação e destinação às empresas que utilizam a matéria-prima reciclável, e os rejeitos aos aterros sanitários de acordo com a classificação dos mesmos.

Cabe estabelecer tais aspectos na definição do objeto, com as obrigações a serem cumpridas pela contratada, e fiscalizar seu cumprimento, para garantir a efetividade das políticas públicas.

Page 155: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

155

II - Mitigação dos danos ambientais por meio de medidas condicionantes e de compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental

A Lei das Estatais estabelece outro mecanismo de consecução de políticas públicas ambientais: a mitigação de danos ambientais no procedimento de licenciamento ambiental.

Todo empreendimento tem potencial de impacto ambiental que deve ser indenizado, mitigado. Assim, a compensação ambiental se consubstancia num mecanismo financeiro para incorporar aos custos globais do empreendimento os custos sociais e ambientais da degradação por esse gerada. Trata-se de um importante instrumento de política pública que destina os custos dos impactos ambientais à sua compensação, visando reduzir os prejuízos ambientais.

A Lei 9.985/2000, que dispôs sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação e foi regulamentado pelo Decreto n° 4.340/2002, estabeleceu no artigo 36 que:

Art. 36. Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente, com fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório - EIA/RIMA, o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral, de acordo com o disposto neste artigo e no regulamento desta Lei.

Page 156: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

156

Obviamente o dever da compensação ambiental não decorre da Lei das Estatais, mas sim da legislação que estabelece a temática. Contudo, foi de crucial importância enfatizar as regras estabelecidas nas políticas públicas ambientais enfatizando a ampliação dos interesses coletivos, incorporando interesses macro e evidenciando a transversalidade da sustentabilidade nas Estatais.

III - Utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente, reduzam o consumo de energia e de recursos naturais 

Seguindo a mesma linha da sustentabilidade, é crucial desenvolver políticas internas na estatal que preconizem a redução do consumo de energia e de recursos naturais.

Para tanto, é importante analisar os processos produtivos, consumos da estatal e estabelecer metas de redução.

Orienta-se, para tanto, estabelecer melhorias no ambiente de trabalho; estimular a conscientização dos empregados, clientes e fornecedores, com a adoção de boas práticas relacionadas à redução do consumo de energia; promover a manutenção preventiva de equipamentos que consumam energia reduzindo ou evitando que falhas prejudiquem o desempenho dos mesmos; aproveitar iluminação e ventilação naturais nos ambientes; adquirir equipamentos mais eficientes e que consumam menos energia, investir em isolamento térmico e automação, etc.

Faz-se necessário envolver gestão e áreas técnicas e de operação em esforços conjuntos e constantes, estabelecendo as políticas, normativos, metas, meios de controles e avaliação para garantir a efetividade das ações e o cumprimento da Lei.

Page 157: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

157

IV - Avaliação de impactos de vizinhança, na forma da legislação urbanística

A legislação urbanística, disposta no Estatuto da Cidade, Lei 10.257/2001, estabelece que:

Art. 36.  Lei municipal definirá os empreendimentos e atividades privados ou públicos em área urbana que dependerão de elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV) para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento a cargo do Poder Público municipal.

O Estudo de Impacto de Vizinhança tem por objetivo analisar e informar de forma prévia à municipalidade quanto às repercussões da implantação de empreendimentos e atividades impactantes. Conforme se extrai do Caderno Técnico de Regulamentação e Implementação de Instrumentos do Estatuto das Cidades, elaborado pela Universidade de Brasília:

O Estudo de Impacto de Vizinhança tem o intuito de analisar e informar previamente à gestão municipal quanto às repercussões da implantação de empreendimentos e atividades impactantes, privadas ou públicas, em áreas urbanas, a partir da ótica da harmonia entre os interesses particulares e o interesse da coletividade de modo a: a) evitar desequilıbrios no crescimento das cidades; b) garantir condições mınimas de qualidade urbana; e c) zelar pela ordem urbanıstica e

Page 158: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

158

pelo uso socialmente justo e ambientalmente equilibrado dos espaços urbanos.101

Desse modo, cabe às Estatais considerarem a legislação urbanística ao definirem empreendimentos que demandem a elaboração de estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV), para obter as licenças ou autorizações de construção, ampliação ou funcionamento.

V - Proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, inclusive por meio da avaliação do impacto direto ou indireto causado por investimentos realizados por empresas públicas e sociedades de economia mista

O patrimônio histórico, cultural, arqueológico e imaterial é um conjunto de manifestações de um corpo social, numa referência simbólica e rica que identificam a sociedade. Segundo informações da UNESCO: “O patrimônio é o legado que recebemos do passado, vivemos no presente e transmitimos às futuras gerações. Nosso patrimônio cultural e natural é fonte insubstituível de vida e inspiração, nossa pedra de toque, nosso ponto de referência, nossa identidade.”102

As referências normativas de proteção desse patrimônio decorrem da Constituição Federal que, no artigo 5°, inciso LXXIII, dispôs que “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato

101 SCHVARSBERG, Benny; MARTINS, Giselle C.; CAVALCANTI, Carolina B.. Estudo de Impacto de Vizinhança: Caderno Técnico de Regulamentação e Implementação/ Benny Schvasrberg, Martins, Giselle C., Kallas, Luana M. E.; Cavalcanti, Carolina B.; Teixeira, Letícia M.. Brasília: Universidade de Brasília, 2016.102 Disponível em: http://www.unesco.org/new/pt/brasilia/culture/world-heritage/heritage-legacy-from-past-to-the-future/. Acesso em 24 de outubro de 2018.

Page 159: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

159

lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência.”

Foi além a Carta Magna, ao definir a competência dos entes políticos, a União, Estados, Distrito Federal e Municípios da proteção de documentos, obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, incluindo os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos, inclusive devendo ser impedidas as destruições e descaracterizações de tais objetos, conforme o art. 23, III e IV.

Por fim, no artigo 216, a CF/88 estabelece que o Patrimônio Histórico Cultural brasileiro constitui em “bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira”, incluindo formas de expressão; modos de criar, fazer e viver; criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; e,  os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.

Cabe, portanto, às Estatais estabelecer a proteção do patrimônio cultural, histórico, arqueológico e imaterial, avaliando os impactos de seus investimentos nessas manifestações.

Page 160: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

160

VI - Acessibilidade para pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida

A Lei n° 10.098/2000 estabeleceu as normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.

A lei desenhou um importante eixo para acessibilidade, dispondo sobre conceitos relevantes, diretrizes, disposições para as edificações públicas e privadas destinadas ao uso coletivo, de forma a proporcionar mínimas condições de acesso e conforto das pessoas com deficiência cujo impedimento seja  de longo prazo  ou com mobilidade reduzida  permanentemente ou temporariamente, que demandarem atendimento especializado.

Assim como nas disposições socioambientais citadas acima, é crucial que as Estatais se adaptem à legislação que trata da matéria, observando, em especial, as normas específicas para suas edificações.

Page 161: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

161

Questão 33- É possível exigir certificação de qualidade sob o aspecto ambiental?

R: A ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) define certificação como um processo no qual uma entidade independente avalia se determinado produto atende às normas técnicas103. Como benefícios para uma empresa de certificação de seus produtos aponta-se para a promoção de comprometimento com a qualidade, a melhoria contínua do desenvolvimento do negócio, assegurar eficiência e eficácia do produto, introdução de novos produtos e marcas no mercado, redução de perdas no processo produtivo, diminuição de controles e avaliações por parte dos clientes, melhoria da imagem da empresa, assegurar o atendimento de normas técnicas e tornar a organização altamente competitiva104.

Nesse aspecto, a certificação ambiental relaciona-se ao desempenho ambiental dos processos produtivos, em todo seu ciclo de vida, garantindo que os produtos certificados respeitam dispositivos legais sobre questões ambientais.

Alguns dos principais selos de certificação ambiental são: (a) ISO 14001, administrado pela ABNT que certifica projetos de sistema de Gestão Ambiental; (b) FSC (Forest Stewardship Council), que assegura que a matéria-prima proveniente ou não de produtos madeireiros são

103 Disponível em: http://www.abnt.org.br/certificacao/o-que-e, acesso em outubro de 2018.104 Disponível em: http://www.abnt.org.br/certificacao/o-que-e, acesso em outubro de 2018.

Page 162: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

162

originados de manejo florestal responsável; (c) Rótulo Ecológico ABNT, que atesta produtos com práticas amigáveis ao meio ambiente; (d) Certificado Rainforest Alliance, que define práticas agrícolas corretas que causam menores impactos à saúde dos consumidores, assim como estabelece normas para gestão do meio ambiente e dos trabalhadores envolvidos com a atividade produtiva105; (e) Selo Verde da CNDA, que assegura que o produto ou serviço atende a um conjunto de normas preestabelecidas minimizando impactos ambientais106; (f) Programa Carbon Free, da Iniciativa Verde, para compensação de emissões de gases de efeito estufa (GEE) decorrentes de qualquer atividade humana, como produtos, serviços, obras ou eventos107.

Traçados os aspectos preliminares, uma das grandes inovações da Lei das Estatais foi a possibilidade de exigência de certificação de qualidade para aquisição de bens. Está disposta no art. 47, inciso III:

Art. 47.   A empresa pública e a sociedade de economia mista, na licitação para aquisição de bens, poderão:  

...

III - solicitar a certificação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, por instituição previamente credenciada. 

105 Disponível em: http://ibd.com.br/pt/Ras.aspx, acesso em outubro de 2018.106 Disponível em: https://www.cnda.org.br/selos-e-certificacoes, acesso em outubro de 2018.107 Disponível em: http://www.iniciativaverde.org.br/programas-e-projetos-carbon-free.php, acesso em outubro de 2018.

Page 163: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

163

Permite o artigo 47, portanto, que a estatal, para a aquisição de bens, solicite a certificação do produto, inclusive sob o aspecto ambiental.

Como bem pontuam Dawison Barcellos e Ronny Charles, essa exigência era inadmissível no regime da Lei 8.666/93, em função da restrição no artigo 30 da documentação que poderia ser exigida para fins de qualificação técnica108.

Edgar Guimarães e José Anacleto apresentam ressalvas à exigência, sob o argumento de que “podem ser desnecessárias e, ainda, frustrar ou restringir indevidamente a competição”109.

Os mesmos autores indicam a necessidade de motivação, demonstrando a pertinência e necessidade em face do objeto a ser contratado.

No mesmo sentido, Sidney Bittencourt ressalva:

Essa autorização legal, todavia, deve ser encarada com cautela. Sabe-se que no âmbito privado, essa é uma exigência comum, especialmente nas contratações das grandes empresas. No entanto, embora bastante difundida, principalmente a série ISO, e já existente desde longa data, ainda não é grande o número de empresas que possuem tais certificações, notadamente no âmbito das micro e pequenas. Além disso, o que é preponderante é que essa não é uma exigência

108 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 301.109 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 166.

Page 164: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

164

legal para que a empresa funcione e exerça normalmente suas atividades.110

A exigência de certificação ambiental segue as diretrizes de sustentabilidade das contratações. Mas a repercussão ambiental das escolhas das Estatais não pode estar alijada das necessidades quanto à correta e adequada execução contratual. Vale dizer, exigir certificações não pode ser pretexto para excluir potenciais fornecedores, mas sim exigência que guarda relações com o objeto, de forma a garantir maior competitividade, agregar maior qualidade, enfim, repercutir em mais benefícios à estatal, de forma motivada tecnicamente no processo da contratação.

Ademais, deve haver minuciosa avaliação quanto à motivação da exigência de certificação e quais são as aplicáveis ao produto objeto da contratação, possibilitando que as empresas apresentem certificações diferentes, mas vinculados aos mesmos objetivos.

Em virtude do caráter voluntário dessas certificações e da restrição à competitividade, o TCU se manifestou repetidamente sobre a inviabilidade dessas exigências. Tomem-se como exemplos os acórdãos abaixo:

As certificações nacionais correspondentes à família 9000 da ISO se referem, em linhas gerais, a critérios para implantação de sistemas de garantia da qualidade. Para obtê-los, a empresa deveria demonstrar a adequação de seus procedimentos de fabricação aos padrões estabelecidos na norma, o que garantiria, ao menos em tese, que os produtos oriundos

110 BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017, p. 227.

Page 165: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

165

dessa empresa tenham sempre as mesmas características. Todavia, isso não garante que eles tenham qualidade superior aos de uma empresa que não seja certificada. Além do que, obter a certificação ISO é faculdade das empresas – não há lei que a indique como condição para exercício de qualquer atividade. Restritiva, portanto, a exigência desse predicado como condição para qualificação em licitações, pois afastar os participantes não certificados reduz a possibilidade de alcance da melhor proposta para a Administração, sem que haja justificativa razoável para tanto.111

“22. Demais disso, com relação à exigência de selo verde pelo sistema de certificação Cerflor/PEFC (item 18.d acima), não é demais esclarecer que o sistema de certificação que detém a maior quantidade de empresas certificadas no Brasil, na área de cadeia de custódia para produtos de origem florestal, é o Forest Stewardship Council - FSC, com representação no Brasil (http://www.fsc.org.br), o qual, ao final de 2012, possuía em seu cadastro 919 empresas certificadas, ao passo que o Cerflor, Programa Brasileiro de Certificação Florestal, possuía apenas 34 empresas certificadas, contando apenas 4 empresas vinculadas à área que foi objeto da licitação (http://www.florestal.gov.br/snif/producao-florestal/

111 TCU. Acórdão 1085/2011, Plenário.

Page 166: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

166

ertificacaoflorestal?print=1&tmpl=component). 23. Logo, não se vislumbra justificativa razoável para a exigência somente do selo verde Cerflor/PEFC, com flagrante restrição da competitividade. 24. Nessa linha, deve-se registrar que a exigência de certificação específica, sem amparo legal e sem justificativa pertinente nos autos do processo licitatório, tem sido considerada, por este Tribunal, como cláusula restritiva à competição, a exemplo do que ficou entendido no Acórdão 2.392/2006-Plenário”.112

Mais recentemente, contudo, a despeito dos entendimentos anteriores, o TCU tem apresentado outro norte quanto à sustentabilidade nas contratações. A esse respeito, cita-se o Acórdão que recomendou à entidade jurisdicionada a promover a avaliação da certificação ambiental da série ISO de empresas participantes e produtoras:

1.8. Recomendar ao <omissis> que:

...

1.8.2. quanto à sustentabilidade:

1.8.2.1. desenvolva ações que visem aprimorar a gestão dos recursos renováveis e da sustentabilidade ambiental, como, por exemplo, a utilização racional de água, energia e papel em suas operações;

1.8.2.2. promova, quando conveniente e possível,

112 TCU. Acórdão 3026/2013 – Segunda Câmara.

Page 167: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

167

a inclusão de critérios nas licitações com foco na sustentabilidade ambiental, como, por exemplo, a aquisição de produtos produzidos com menor consumo de matéria-prima e maior quantidade de conteúdo reciclável; preferência à aquisição de produtos de fontes não poluidoras; avaliação da  certificação ambiental  da série ISO de empresas participantes e produtoras; aquisição de produtos que colaboram para o menor consumo de energia e/ou água;113

O assunto não está pacificado na Corte de Contas da União.

Contudo, sob o manto da Lei 13.303/16, como visto, o legislador permitiu que na licitação para a aquisição de bens seja solicitada a certificação de qualidade e o TCU ainda não se pronunciou sobre a matéria. Considerando que a certificação refere-se ao produto ofertado e a lei expressamente definiu que a solicitação ocorra na licitação, entende-se que a estatal pode, de forma justificada no processo, em vista das características do objeto da licitação, exigir que os licitantes comprovem a certificação do produto na fase de julgamento e efetividade da proposta sob pena de desclassificação114.

113 TCU. Acórdão n° 7849/2018 – Segunda Câmara.114 Art. 56. Efetuado o julgamento dos lances ou propostas, será promovida a verificação de sua efetividade, promovendo-se a desclassificação daqueles que:I - contenham vícios insanáveis;II - descumpram especificações técnicas constantes do instrumento convocatório;...VI - apresentem desconformidade com outras exigências do instrumento convocatório, salvo se for possível a acomodação a seus termos antes da adjudicação do objeto e sem que se prejudique a atribuição de tratamento isonômico entre os licitantes.”

Page 168: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

168

Questão 34- O que é o ciclo de vida do produto e como ele se relaciona à vantajosidade da proposta?

R: A Lei 13.303/16 inaugurou no artigo 31 um atributo para a busca da vantajosidade nas licitações e contratações. Segundo a lei, a seleção da proposta mais vantajosa deve considerar o ciclo de vida do objeto.

Dentro do conceito de sustentabilidade foi instituída a avaliação do ciclo de vida do produto, para dimensionar em todas as fases e etapas que contemplam a fabricação, o uso e o descarte, quais os impactos ambientais que o produto causa em sua cadeia.

Consoante define a Resolução n° 03/2010 do CONMETRO (Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial), ciclo de vida de um produto refere-se aos “estágios sucessivos e encadeados de um sistema de produto, desde a aquisição da matéria-prima ou de sua geração a partir de recursos naturais à disposição final”115.

O mesmo normativo estabelece definições referenciadas à Análise do Ciclo de Vida:

É um processo para i. Avaliar as cargas ambientais associadas a um produto, processo ou atividade, através da identificação e quantificação de energia e materiais usados e resíduos liberados; ii. Avaliar o impacto da energia e materiais lançados no meio ambiente; iii. Identificar e avaliar as oportunidades que

115 Item 3.5, do Termo de Referência do PROGRAMA BRASILEIRO DE AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA – PBACV, da IN 03/2010 (CONMETRO).

Page 169: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

169

afetam o melhoramento ambiental durante todo o ciclo de vida do produto, processo ou atividade, envolvendo a extração e o processamento de matérias-primas brutas, manufatura, transporte, distribuição, uso, reuso, manutenção, reciclagem e destinação final.116

O objetivo da ACV de um produto é o de promover a melhoria do desempenho ambiental de produtos.

Nesse aspecto, a Lei das Estatais estabeleceu a ACV como medida para implementar a sustentabilidade nas contratações de tais entidades definindo-o como instrumento de análise das propostas em seu aspecto de vantajosidade.

O doutrinador Juarez Freitas discorre que a proposta mais vantajosa “será sempre aquela que, entre outros aspectos a serem contemplados, apresentar-se a mais apta a causar, direta ou indiretamente, o menor impacto negativo e, simultaneamente, os maiores benefícios econômicos, sociais e ambientais.”117

Agora, questiona-se: como definir essa vantajosidade em função do menor impacto ambiental no caso concreto sem um parâmetro adequado para tanto? E mais, como estabelecer essa análise no âmbito das sociedades de economia mista e das empresas públicas?

Então, a utilidade de, como outrora aduzido, estabelecer

116 Item 3.6, do Termo de Referência do PROGRAMA BRASILEIRO DE AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA – PBACV, da IN 03/2010 (CONMETRO).117 FREITAS, Juarez. Princípio da Sustentabilidade: Licitações e a Redefinição da Proposta Mais Vantajosa. REVISTA DO DIREITO UNISC, SANTA CRUZ DO SUL Nº 38│p. 74- 94│JUL-DEZ 2012. p. 78.

Page 170: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

170

a conexão entre a natureza jurídica das Estatais e a necessidade de atendimento às normas públicas e, no caso, tendente a implementar políticas públicas socioambientais. E a análise do ciclo de vida de produtos pode servir como um elo adequado. Digno de aplausos ao legislador que instituiu a ACV como tempero da vantajosidade.

No mercado privado, a ACV tem promovido a competitividade ambiental da produção industrial brasileira e o acesso aos mercados interno e externo, bem como, tem sido utilizada por pesquisadores para ampliar a base científica de sistemas produtivos e suas relações com o meio ambiente.

Ainda que a Lei 13.303/16 preveja referido instrumento, não apresentou ferramentas para essa avaliação nas propostas.

Uma forma de utilizar a ACV nas contratações públicas é compreender as definições trazidas pela série de normas ISO 14040, que determinam a estrutura, os princípios, os requisitos e as diretrizes para um estudo ACV que dê subsídios para a tomada de decisões em relação à definição dos objetos licitatórios e seus critérios.

De forma sumária, sinaliza-se que, segundo a norma acima, há quatro fases para um estudo: definição de objetivo e escopo, análise de inventários, avaliação de impactos e interpretação, assim compreendidas:

Definição dos Objetivos e Escopo

É o momento em que se determinam as fronteiras do estudo (temporal e geográfica), a quem se destinam os resultados, os critérios de

Page 171: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

171

qualidade, as regras de corte e as categorias de impacto a serem consideradas.

Análise de Inventários

Consiste na coleta dos dados que representam os fluxos de massa e energia que entram e que saem das diversas etapas do ciclo de vida do produto, dentro das fronteiras estabelecidas na fase anterior.

Avaliação dos Impactos

Nesta fase, os fluxos definidos no inventário são convertidos em impactos ambientais através da multiplicação dos valores brutos por fatores de equivalência que remetem a resultados em unidades comuns, como por exemplo, kg de CO2 equivalentes para a categoria de aquecimento global.

Interpretação

Ao final, buscam-se identificar as questões significativas do estudo, checar a integridade, a sensibilidade e a consistência dos resultados e definir as conclusões, as limitações e as recomendações do estudo.118

Essa avaliação é voltada para um sistema de produto específico (bens ou serviços), desde a aquisição da matéria-prima ou de sua geração a partir de recursos naturais até a disposição final. Envolve informações do processo produtivo e modelado pela empresa que o comercializa, tais como o levantamento quantificado

118 Disponível em: http://acv.ibict.br/acv/o-que-e-o-acv/

Page 172: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

172

de dados das entradas (materiais, energia e recursos) e saídas (produtos, subprodutos, emissões, etc.), identificação dos impactos ambientais e interpretação desses dados ao longo do ciclo de vida do bem ou serviço.

Em razão disso, nem sempre será possível promover a ACV com avaliação sistematizada e com base nas metodologias normatizadas para produtos de terceiros, o que pode trazer obstáculos a sua aplicação nas licitações.

As Estatais podem, nesse contexto, identificar objetos nos quais podem promover a avaliação de seu ciclo de vida e eleger especificações que promovam menores impactos ambientais em sua cadeia produtiva, como referentes à produção e ao consumo de energia, processo produtivo, aspectos de manutenção, embalagens, transporte e logística, impactos relacionados ao uso, reuso, aproveitamento, disposição final, etc.

Page 173: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Disposições específicas

para obras e serviços de engenharia

Page 174: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

174

Questão 35- Quais alertas necessários para implementar o serviço de execução “contratação semi-integrada”, novo padrão estabelecido na Lei 13.303/16?

R: De acordo com a redação estabelecida no art. 43, inciso V, a contratação semi-integrada é aquela utilizada quando for possível definir previamente no projeto básico as quantidades dos serviços a serem posteriormente executados na fase contratual, em obra ou serviço de engenharia que possa ser executado com diferentes metodologias ou tecnologias.

E mais, diante da previsão estabelecida no art. 42, inciso V, pode ser definida como a contratação que envolve a elaboração e o desenvolvimento do projeto executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

Ou seja, se retira da Administração Contratante o encargo em desenvolver o projeto executivo, peça fundamental e obrigatória para execução de qualquer tipo de obra ou serviço de engenharia, conforme alerta explicitamente o art. 43, § 2º, da Lei Federal n.º13.303/16.

Uma vez sendo estabelecida como a forma de execução padrão das Estatais, consoante previsão do art. 42, § 4º, da Lei Federal n.º13.303/16, alguns alertas se fazem necessários para sua adoção. São eles:

1) Possibilidade de execução da obra ou serviço de engenharia com diferentes metodologias ou tecnologias (art. 43, inciso V);

Page 175: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

175

2) Elaboração ou contratação do projeto básico, por se constituir como especificação técnica obrigatória antes da realização do processo licitatório (art. 42, § 4º);

3) Possibilidade de alteração do projeto básico, desde que demonstrada pelo licitante a superioridade das inovações em termos de redução de custos, de aumento da qualidade, de redução do prazo de execução e de facilidade de manutenção ou operação (art. 42, § 1º, inciso IV);

4) Alocação dos riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto básico pela contratante como de sua responsabilidade na matriz de riscos (Art. 42, § 3º).

Page 176: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

176

Questão 36- Os serviços de execução “contratação integrada” são a salvação para a “preguicite aguda do 3º grau” ou a salvação das contratações?

R: Não. É claro que o conforto/comodidade desta forma de execução de obra/serviço de engenharia leva naturalmente a se pensar em uma solução mágica, especialmente diante da ainda latente falta de planejamento no âmbito das contratações públicas em geral.

Isso porque, diante da previsão constante no art. 42, inciso VI, da Lei Federal n.º 13.303/16, deve ser considerada, quando a contratação envolver a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto.

Percebe-se nitidamente que há uma transferência praticamente integral do encargo de desenvolvimento/elaboração de inúmeras atividades normalmente atribuídas à Administração Contratante (só não se abriu mão da confecção do anteprojeto de engenharia) ao futuro Contratado.

Portanto, todo esse cenário leva realmente o Administrador Público a “sonhar” em utilizar esse regime como salvação de suas contratações.

Do ponto de vista histórico, também existe a construção desse estereótipo de “corta caminho”, pois teve sua

Page 177: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

177

previsão inicialmente fixada na Lei Federal n.º 12.462/11 (art. 8º, inciso V) e foi incorporada ao ordenamento jurídico nacional diante do objetivo inicial da referida norma, que era simplesmente estabelecer um regime diferenciado de contratação pública para os megaeventos esportivos que seriam então sediados pelo Brasil, os quais não poderiam ficar suscetíveis à famigerada burocracia brasileira.

Contudo, sua escolha/aplicabilidade deve ser restrita, não sendo permitida sua utilização em obra que se caracteriza por ser simples e “corriqueira” na construção civil119.

Atenta à utilização de argumentações ludibriosas utilizadas pelos gestores públicos, a própria Lei das Estatais alerta que não será admitida, por parte da empresa pública ou da sociedade de economia mista, como justificativa para a adoção da modalidade de contratação integrada, a ausência de projeto básico (art. 42, § 5º).

Em sede de controle, o Tribunal de Contas da União tem ficado também atento à utilização da referida forma de execução de obra.

Em passagem do já citado Acórdão 2433/2016 –Plenário. TCU, destacamos excerto que menciona, em nossa opinião, de forma correta, que “a contratação integrada não é por si só uma solução mágica que resolverá os crônicos problemas encontrados quando da execução de obras públicas (v.g. ambiente de corrupção, despreparo dos agentes públicos, restrições orçamentárias, empresas inidôneas e despreparadas tecnicamente)”.

119 Como referência, citamos o Acórdão 2433/2016 –TCU – Plenário. Rel. Min. Benjamin Zymler.

Page 178: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

178

Não há dúvida de que a contratação integrada é um avanço em termos de licitação e, quando bem empregada, é uma ótima ferramenta para contratação de obras públicas, em especial porque há a transferência de determinados riscos à Contratada, justamente porque são melhor gerenciados por ela. Mas, então, utilizar desse avanço para considerá-la sempre a melhor opção é que não se demonstra adequado, pois a vantajosidade ou não da utilização da contratação integrada deve ser verificada casuisticamente.

Page 179: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Disposições específicas para aquisição de bens

Page 180: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

180

Questão 37- Quais os parâmetros dispostos na Lei das Estatais sobre a aquisição de bens?

R: A Lei 13.303/2016 define no artigo 47120 que as Estatais poderão na licitação para aquisição de bens indicar marca ou modelo, exigir amostra e solicitar a certificação de qualidade do produto ou do processo de fabricação.

Quanto à indicação de marca ou modelo, a Lei dispôs sobre as hipóteses permissivas: na padronização do objeto; quando a marca ou modelo for o único capaz de atender ao objeto da contratação; e, quando necessária para a compreensão do objeto.

Como tratado acima (questão 26), a padronização do objeto da contratação define características técnicas estanques de bens ou serviços de modo que contratações desse mesmo objeto deverão atender ao modelo

120 Art. 47. A empresa pública e a sociedade de economia mista, na licitação para aquisição de bens, poderão: I - indicar marca ou modelo, nas seguintes hipóteses: a) em decorrência da necessidade de padronização do objeto; b) quando determinada marca ou modelo comercializado por mais de um fornecedor constituir o único capaz de atender o objeto do contrato; c) quando for necessária, para compreensão do objeto, a identificação de determinada marca ou modelo apto a servir como referência, situação em que será obrigatório o acréscimo da expressão “ou similar ou de melhor qualidade”;II - exigir amostra do bem no procedimento de pré-qualificação e na fase de julgamento das propostas ou de lances, desde que justificada a necessidade de sua apresentação; III - solicitar a certificação da qualidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, por instituição previamente credenciada. Parágrafo único. O edital poderá exigir, como condição de aceitabilidade da proposta, a adequação às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ou a certificação da qualidade do produto por instituição credenciada pelo Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Sinmetro).

Page 181: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

181

estabelecido. No procedimento para padronização do objeto, pode ser necessário indicar marca, como resultado de individualização do objeto padronizado. Mas essa opção deve ser acompanhada de argumentos técnicos.

O Tribunal de Contas da União apresenta a seguinte manifestação sobre o assunto:

Ao final do procedimento de padronização, devem ser escolhidas determinadas características e atributos técnicos indispensáveis à contratação. A lei não admite, porém, a preferência de marca determinada, em razão de prevalecer o princípio da igualdade entre os fornecedores. A padronização de marca somente é possível em casos excepcionais, quando ficar incontestavelmente comprovado que apenas aquele produto, de marca certa, atende aos interesses da Administração.121

A segunda hipótese citada na lei para a indicação de marca decorre do reconhecimento de que somente determinada marca atende às necessidades da estatal, em detrimento de quaisquer outras de bens similares. Nesse caso, é fundamental comprovar a inviabilidade de atendimento por outros bens e motivar tecnicamente que somente a marca específica é capaz de satisfazer o interesse público122.

121 BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU/ Tribunal de Contas da União. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 215.122 Conforme definiu o TCU nos Acórdãos 113/2016, 122/2014 e 3179/2016, todos do Plenário.

Page 182: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

182

Por fim, a última hipótese para indicação de marcas nas aquisições de bens das Estatais tem como finalidade a necessária compreensão do bem objeto da contratação, servindo como referência e devendo ser obrigatório o acréscimo da expressão “ou similar ou de melhor qualidade”. A indicação da marca não exime a estatal de estabelecer a descrição técnica do produto. Até porque marcas similares podem ser aceitas se, de fato, o desempenho, qualidade ou produtividade sejam compatíveis às da marca de referência e, para tanto, as especificações para a comparabilidade devem estar descritas no instrumento convocatório.

A indicação de marca, qualquer que seja a hipótese, demanda um procedimento preliminar no qual, de forma geral, a entidade descreve o objeto, com suas características técnicas, e verifica marcas que atendem à descrição, incorporando as justificativas pertinentes no processo, com a ratificação da autoridade competente.

Outro aspecto tratado na Lei 13.303/16 sobre a aquisição de bens é a exigência de amostra. Tal situação pode ser válida para confrontar a descrição do objeto licitado com as características do bem ofertado pelo licitante, avaliando sua compatibilidade.

A referida exigência deve ser avaliada pela estatal e justificada, pois pode onerar a proposta e ser considerada restritiva à competitividade, em vistas de custos para produção, para envio (transporte) e prazo. Outrossim, o procedimento deve estar delimitado no instrumento convocatório, com prazos razoáveis para o cumprimento; definição do que será avaliado, se o objeto integral ou apenas parte dele, componentes, material ou modo de

Page 183: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

183

fabricação, etc.; quem avaliará, se algum empregado capacitado ou laboratório de testes. Importante também definir qual o conteúdo do laudo ou parecer de aprovação ou reprovação da amostra. É necessário frisar que, conforme remansosa jurisprudência do TCU, a amostra deve ser exigida apenas do licitante classificado provisoriamente em primeiro lugar123 e todo o procedimento de avaliação da amostra pode ser acompanhado pelos interessados, com lisura e transparência.

Por derradeiro, sobre a solicitação de certificação de qualidade do produto, remete-se à leitura dos comentários na questão 33, acima.

123 Vide Acórdão 1987/2018, Segunda Câmara do TCU.

Page 184: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

184

Questão 38- Como atender ao art. 48 e dar publicidade à relação de aquisições de bens? Qual é o fundamento dessa norma? É possível estender às contratações de serviços?

R: O artigo 48 da Lei 13.303/16 assim dispõe:

Art. 48.   Será dada publicidade, com periodicidade mínima semestral, em sítio eletrônico oficial na internet de acesso irrestrito, à relação das aquisições de bens efetivadas pelas empresas públicas e pelas sociedades de economia mista, compreendidas as seguintes informações:  

I - identificação do bem comprado, de seu preço unitário e da quantidade adquirida;  

II - nome do fornecedor;  

III - valor total de cada aquisição. 

A publicidade em relação às aquisições promovidas pelas Estatais é uma importante ferramenta que possibilita o controle dos atos, com transparência e moralidade.

Dawison Barcelos e Ronny Charles discorrem que:

A publicidade dada a essas informações objetiva favorecer o controle social e o acompanhamento dos gastos da estatal com suas aquisições. A ausência de respeito a esta exigência legal pode, inclusive, ser caracterizada como um ato de improbidade administrativa, conforme regra definida no artigo 11 da Lei n° 8.429/1992.124

124 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 296.

Page 185: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

185

A publicidade tratada pela lei reafirma o valor constitucional do dever dos gestores de prestar informações relevantes de seus atos licitatórios e contratuais.

Trata-se do veículo de conhecimento sobre informações que possam afetar de alguma forma os sujeitos destinatários da publicidade e da possibilidade ampla de controle e verificação de regularidade dos atos praticados na contratação. Em função dessas duas dimensões apresentadas, pode-se considerar que essa publicidade deve ser estendida às contratações de serviços também.

Digno de nota foi a opção do legislador de que a publicidade ocorra em sítio eletrônico oficial na internet de acesso irrestrito. Edgar Guimarães e José Anacleto Santos apontam que:

No mundo contemporâneo, em que há um predomínio cada vez maior da rede mundial de computadores (internet), não há sentido algum em deixar de utilizar as ferramentas da tecnologia da informação postas à disposição de toda a sociedade.

Prestigiar a tecnologia para dar publicidade das ações administrativas significa atender de maneira absolutamente eficiente e econômica os reclamos da legislação125.

De acordo com o dispositivo legal, cabe, portanto, disponibilizar as seguintes informações, com periodicidade semestral, no site: identificação do bem

125 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 168.

Page 186: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

186

adquirido, seu preço unitário, quantidade, identificação do fornecedor e valor total de cada aquisição. Por oportuno, entendemos relevante incluir a publicidade dos serviços contratados, com as informações do objeto, valor, duração do contrato e identificação do prestador.

Page 187: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Do processo licitatório

Page 188: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

188

Questão 39- Quais evoluções efetivamente ocorreram dentro do processo licitatório?

R: Como mencionado anteriormente na presente obra, infelizmente não houve mudança na lógica licitatória, que ainda está pautada por velhos paradigmas. Contudo, não podemos deixar de notar que operacionalmente houve evolução.

Nesse sentido, podemos destacar: 1) Inversão de fases (especialmente entre as relativas ao julgamento das propostas e análise da habilitação) (art. 51); 2) Melhor adequação dos prazos mínimos de publicação, conforme a natureza do objeto ou do tipo de licitação (art. 39), permitindo uma melhor elaboração das propostas; 3) Adoção de modos de disputa (aberto ou fechado), ao invés de modalidades de licitação (art. 52); 4) Adoção de lanças intermediárias (art. 53); 5) Maximização dos tipos de licitação (art. 54); 6) Previsão explícita da necessidade de desenvolvimento de parâmetros específicos quando o tipo de licitação envolvido for eminentemente subjetivo, visando limitar a subjetividade do julgamento (art. 54, § 2º); 7) Possibilidade de utilização da avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes, desde que exista sistema objetivo de avaliação instituído, como critério de desempate (art. 55); 8) Estabelecimento de rotina de negociação junto ao detentor do melhor preço ofertado ou demais licitantes (conforme o caso), quando o referido valor ainda assim permanecer acima do valor estimado, podendo eventualmente levar à uma situação de revogação da licitação, quando a referida negociação

Page 189: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

189

restar infrutífera (art. 57); 9) Fase recursal única como regra (art. 59); 10) Atribuição de direito público subjetivo para celebração de contrato administrativo ao licitante vencedor, uma vez homologado o processo licitatório (art. 60)126.

126 Em que pese a redação do referido artigo, ousamos discordar do efeito atribuído ao procedimento administrativo relacionado à homologação, por entendermos que houve um desvirtuamento do instituto. Na realidade, a homologação é a etapa do processo licitatório dedicado à ratificação e ao controle de todos os atos do processo licitatório, realizado pela autoridade superior (quase sempre a mesma que realizou a autorização da licitação) após análise minuciosa do processo. Nesse momento do procedimento que a autoridade superior pode tomar duas decisões fatídicas à licitação pública: 1) anulação do processo licitatório em caso de ilegalidade; 2) revogação do referido processo na hipótese de fato superveniente que justifique tal decisão. Até a presente redação, o pensamento doutrinário majoritário é que nenhum processo homologado gerava ao adjudicatário o direito público subjetivo à celebração do contrato administrativo.

Page 190: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

190

Questão 40- Modos de disputa são modalidades de licitação diferenciada? Qual a diferença?

R: Depende. Se interpretarmos restritivamente/literalmente, não há previsão normativa descrevendo-os como modalidades de licitação. Contudo, se interpretarmos sistemática/teologicamente o instituto “modalidades”, amplamente descritas como formas procedimentais de realização do processo licitatório127, poderíamos considerá-los modalidades sui generis de licitação.

Diferentemente da grande maioria das atuais e declaradas modalidades de licitação, os modos de disputa não possuem critérios de escolha residentes no objeto a ser contratado ou no valor da contratação. O foco está apenas no procedimento em que se dará a disputa entre os competidores.

Essa perspectiva nos faz remonta ao trecho da obra de um dos subscritores desta128, que ao tratar sobre modalidades e tipos de licitação, ressalta a observação de Adilson Abreu Dallari, no sentido de que as modalidades no Brasil não são as únicas possíveis.

Encontram-se na legislação estrangeira inúmeros procedimentos licitatórios diferenciados pela maior ou menor publicidade, pela seleção da proposta de melhor qualidade ou única e exclusivamente de menor preço etc.

127 CAMPOS, Gabriel de Brito. Curso de Direito Administrativo. Brasília: Ed. Fortium, 2006, p. 278.128 OLIVEIRA. Thiago Bueno. O caráter regulatório das Licitações Públicas. Brasília: ABECER, 2012, p. 87.

Page 191: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

191

Enfim, o certo é que a possibilidade de se construírem modalidades de licitação é bastante grande, bastando que se observem os princípios aplicáveis à espécie e se conjuguem no procedimento as fases ou os elementos mais aptos a propiciar o fim visado pela Administração (o que acaba por justificar a interpretação sistemática/teologicamente do que vem a ser considerado “modalidades de licitação”).

Page 192: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

192

Questão 41- Qual o processamento das licitações nos modos de disputa?

R: A Lei das Estatais, dentro da compreensão de oferecer flexibilidade às entidades com relação ao processamento dos certames, atribuiu a tarefa de disciplinar o rito dos modos de disputa aos seus regulamentos internos de licitação.

Tal mister inaugura dificuldades operacionais de estabelecer as etapas da contratação, até porque a lei se restringiu a definir em que consiste cada modo de disputa, mas não esmiuçou as etapas de cada qual.

Entretanto, essa dificuldade operacional é aparente e pode ser resolvida à luz da legislação e da prática administrativa. A Lei 12.462/2011, que estabeleceu o Regime Diferenciado de Contratações, já inaugurou tais modos de disputa e pode servir de inspiração às Estatais ao definir seus procedimentos.

Na eleição do modo de disputa, deve-se dar preferência ao aberto nas hipóteses em que o objeto permita a alteração dos valores em fase competitiva de lances. Aos objetos de reduzida margem para alteração, o modo de disputa aberto não se mostra o mais adequado, em geral para os critérios de julgamento de menor preço, maior desconto ou maior oferta de preços.

Do contrário, o modo de disputa se mostra mais consentâneo às licitações com pouca margem de alteração dos valores propostos, ou naqueles em que o fator preço não é o único a influenciar na vantagem da

Page 193: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

193

contratação, como ocorre com os critérios de julgamento de melhor destinação de bens alienados, melhor combinação de técnica e preço, melhor técnica, melhor conteúdo artístico e maior retorno econômico.

O modo de disputa aberto guarda semelhança com o rito do pregão.

Podemos, assim, estabelecer as seguintes etapas do modo de disputa aberto:

1 – Credenciamento dos licitantes, entrega dos envelopes contendo a proposta, e comprovação de poderes dos participantes para a prática de atos durante a sessão, em especial a oferta de lances e a negociação de ofertas mais vantajosas;

2 – Apresentação de declaração de cumprimento de requisitos de habilitação;

3 – Abertura da sessão pública pela comissão de licitação129 e classificação das propostas;

4 – Fase de lances verbais, na qual a comissão convida o autor da proposta menos vantajosa a promover a redução ou aumento de sua proposta (de acordo com o critério estabelecido) e os autores das demais propostas em rodadas de forma sucessiva e até definir pela mais vantajosa, de acordo com o critério de julgamento.

Permite-se, nessa etapa, os lances intermediários, no qual os licitantes podem oferecer lances iguais ou inferiores ao maior ofertado, no critério de maior oferta, ou iguais ou superiores ao menor ofertado, nos demais critérios

129 Ou outra denominação atribuída ao colegiado responsável pelo processamento e julgamento da licitação. Manteremos, para efeitos práticos, a denominação “comissão de licitação” nesta obra.

Page 194: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

194

de julgamento. Ou seja, os licitantes não precisam a cada rodada cobrirem o lance mais vantajoso.

Ao final da fase, se definido o lance mais vantajoso e sua diferença em relação ao valor do segundo colocado for de pelo menos 10%, a comissão reinicia a disputa para redução desse percentual.

5 – Efetividade do lance, em que a comissão examinará a proposta quanto ao valor estabelecido na fase de lances, bem como as especificações do objeto, em compatibilidade com o descrito no instrumento convocatório.

6 – Negociação para obtenção de proposta mais vantajosa ou para enquadrar no orçamento estimado, sob pena de desclassificação da proposta.

7 – Avaliação dos documentos de habilitação do primeiro colocado, à luz dos critérios estabelecidos no instrumento convocatório.

8 – Declaração do vencedor, de acordo com as disposições editalícias.

9 – Fase recursal, consultando na sessão pública os licitantes sobre a intenção de recorrer e, se todos estiverem presentes, sobre renúncia do direito de recorrer.

10 – Finalização do processo com adjudicação e homologação ou revogação do certame.

No modo de disputa fechado, que apresenta alguma semelhança com as modalidades estatuídas na Lei 8.666/93, as propostas não sofrem mutações em fase de lances, permanecendo a mesma durante o seu julgamento.

Page 195: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

195

Pode-se estabelecer a seguinte ritualística do modo de disputa fechado:

1 – Credenciamento dos licitantes e entrega dos envelopes contendo a proposta e comprovação de poderes dos representantes para os atos da sessão, em especial negociar com a comissão por condições mais vantajosas.

2 – Abertura e verificação da conformidade das propostas e classificação, de acordo com o critério de julgamento estabelecido.

3 - Efetividade da proposta, em que a comissão examinará a oferta quanto ao valor estabelecido, bem como as especificações do objeto, em compatibilidade com o descrito no instrumento convocatório.

6 – Negociação para obtenção de proposta mais vantajosa ou para enquadrar no orçamento estimado, sob pena de desclassificação da mesma.

7 – Avaliação dos documentos de habilitação do primeiro colocado, à luz dos critérios estabelecidos no instrumento convocatório.

8 – Declaração do vencedor, de acordo com as disposições editalícias.

9 – Fase recursal, consultando na sessão pública os licitantes sobre a intenção de recorrer e, se todos estiverem presentes, consultando sobre renúncia do direito de recorrer.

10 – Finalização do processo com adjudicação e homologação ou revogação do certame.

Page 196: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

196

Questão 42- Os tipos de licitação foram afetados com a nova legislação?

R: Sim. O art. 54 trouxe como novo critério de julgamento de propostas no âmbito do processo licitatório (tipos de licitação), a melhor destinação de bens alienados.

Nesse tipo de licitação, deve ser considerada, nos termos do respectivo instrumento convocatório, a repercussão, no meio social, da finalidade para cujo atendimento o bem será utilizado pelo adquirente.

Em outras palavras, o edital possuirá o conteúdo “indutor” para verificar a forma mais adequada de destinação daquele determinado bem(ns) adquirido(s), fomentando assim valores jurídicos relevantes, o que, em nossa opinião, acaba reafirmando nosso entendimento de que há um caráter regulatório das licitação públicas130.

Especificamente quanto ao tipo de licitação “melhor destinação de bens alienados”, Edgar Guimarães e José Anacleto Abduch Santos, na obra dedicada a analisar os artigos da Lei das Estatais131, consideram que:

130 As licitações públicas possuem caráter regulatório, na medida em que são utilizadas como plataforma para implementar políticas públicas de incentivo. Isto é, são instrumentos de concretude da intervenção indireta do Estado na ordem econômica, haja vista que os benefícios (incentivos) concedidos possuem o escopo de: 1) desenvolver atividades consideradas imprescindíveis ao progresso do país, como ocorre com as atividades econômicas desempenhadas pelas Microempresas (ME) e Empresas de Pequeno Porte (EPP), importantíssimas no processo econômico, em razão de sua elevada empregabilidade; 2) buscar justiça social e econômica apta a assegurar a neutralização das diferenças encontradas; 3) proteger o desenvolvimento nacional (baseado na pesquisa científica, no desenvolvimento e inovação tecnológica) da interferência internacional. OLIVEIRA. Thiago Bueno. O caráter regulatório das Licitações Públicas. Brasília: ABECER, 2012, p. 144. 131 GUIMARÃES, Edgar; SANTOS, José Anacleto Abduch. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei nº. 13.303/2016 – Lei das Estatais. Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 187.

Page 197: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

197

“O instrumento convocatório poderá estabelecer parâmetros objetivos para a comparação entre propostas de destino final para os bens a serem alienados pelas estatais, de modo a privilegiar valores jurídico-constitucionais, como a sustentabilidade ambiental ou social, privilégio de categorias menos favorecidas da sociedade, redução das desigualdades regionais e sociais ou qualquer destinação que melhor atenda o cumprimento da função social da empresa pública e da sociedade de economia mista”.

Cumpre aqui destacar que os tipos: maior desconto, melhor conteúdo artístico, maior retorno econômico, em que pese não estarem previstos na lei ordinária à qual se submetiam as Estatais até a edição na nova legislação (Lei Federal n.º 8.666/93), não são considerados novos no ordenamento jurídico nacional, uma vez que todos esses já tinham previsão no âmbito da Lei Federal n.º 12.464/11 (Lei do Regime Diferenciado de Contratação – RDC), razão pela qual deixamos de abordar nesta pergunta.

Page 198: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

198

Questão 43- Como utilizar o critério de julgamento de maior retorno econômico? E o de melhor destinação de bens alienados?

R: A Lei das Estatais definiu no artigo 54132 oito critérios de julgamento possíveis para as licitações. Além dos já conhecidos menor preço, maior desconto (como variação do menor preço), melhor combinação de técnica e preço, maior oferta de preço e melhor técnica, acrescentou o melhor conteúdo artístico, o maior retorno econômico e a melhor destinação de bens alienados.

Esses critérios de julgamento substituíram nas licitações sob o regime anterior os tipos de licitação e definem os parâmetros para aferição da proposta mais vantajosa à entidade promotora do certame.

Como no regime anterior, o julgamento das propostas, com base nos critérios acima, deve se pautar pela objetividade, para comparação equânime entre as propostas, com base em critérios estipulados previamente no instrumento convocatório.

Para o presente estudo, nos debruçaremos nos dois últimos critérios de julgamento, quais sejam, o maior

132 Art. 54. Poderão ser utilizados os seguintes critérios de julgamento:I - menor preço;II - maior desconto;III - melhor combinação de técnica e preço;IV - melhor técnica;V - melhor conteúdo artístico;VI - maior oferta de preço;VII - maior retorno econômico;VIII - melhor destinação de bens alienados.

Page 199: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

199

retorno econômico e a melhor destinação de bens alienados.

O maior retorno econômico teve sua gênese no Regime Diferenciado de Contratação (Lei n° 12.462/11), que estabeleceu no artigo 23 que tal critério deve ser utilizado exclusivamente para a celebração de contratos de eficiência. Estes, por sua vez, terão por objeto a prestação de serviços, incluindo ou não obras e o fornecimento de bens, para proporcionar economia ao ente contratante, sendo o contratado remunerado com base na economia gerada.

De forma assemelhada, a Lei das Estatais estabeleceu no artigo 54, §6° que ao ser utilizado o critério de julgamento de maior retorno econômico, “os lances ou propostas terão o objetivo de proporcionar economia à empresa pública ou à sociedade de economia mista, por meio da redução de suas despesas correntes, remunerando-se o licitante vencedor com base em percentual da economia de recursos gerada”.

Não se aprofundou na disciplina desse critério a lei, o que deve remeter ao regulamento de cada estatal as regras necessárias à utilização do mesmo. Pode-se usar como parâmetro que delineou o RDC e seu respectivo Decreto n° 7.581/11 que definiu no artigo 36:

“Art. 36. No critério de julgamento pelo maior retorno econômico as propostas serão consideradas de forma a selecionar a que proporcionar a maior economia para a administração pública decorrente da execução do contrato. “

Page 200: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

200

§ 1° O critério de julgamento pelo maior retorno econômico será utilizado exclusivamente para a celebração de contrato de eficiência.

§ 2° O contrato de eficiência terá por objeto a prestação de serviços, que poderá incluir a realização de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar economia ao órgão ou entidade contratante, na forma de redução de despesas correntes.

§ 3o O instrumento convocatório deverá prever parâmetros objetivos de mensuração da economia gerada com a execução do contrato, que servirá de base de cálculo da remuneração devida ao contratado. 

§  4o  Para efeito de julgamento da proposta, o retorno econômico é o resultado da economia que se estima gerar com a execução da proposta de trabalho, deduzida a proposta de preço. 

Art. 37.  Nas licitações que adotem o critério de julgamento pelo maior retorno econômico, os licitantes apresentarão:

I - proposta de trabalho, que deverá contemplar:

a)  as obras, serviços ou bens, com respectivos prazos de realização ou fornecimento; e

b) a economia que se estima gerar, expressa em unidade de medida associada à obra, bem ou serviço e expressa em unidade monetária; e

II - proposta de preço, que corresponderá a um percentual sobre a economia que se estima

Page 201: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

201

gerar durante determinado período, expressa em unidade monetária. 

Embora a Lei das Estatais não tenha vinculado o critério de julgamento do maior retorno econômico aos contratos de eficiência, é inevitável a associação, até mesmo por conta da sua origem no RDC e o objeto baseado na economia gerada pelo particular em proveito da Administração.

A eficiência ganhou status de princípio constitucional após a Emenda Constitucional n° 19, de 1998, visando agregar o desempenho gerencial à Administração Pública.

Carvalho Filho relaciona o princípio à prestação com qualidade de serviços públicos. Ele afirma que:

o núcleo do princípio é a procura de produtividade e economicidade e, o que é mais importante, a exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro público, o que impõe a execução dos serviços públicos com presteza, perfeição e rendimento funcional. Há vários aspectos a serem considerados dentro do princípio, como a produtividade e economicidade, qualidade, celeridade e presteza e desburocratização e flexibilização, como acentua estudioso sobre o tema.133

Mas o doutrinador não se limita aos serviços públicos:

ao contrário, deve ser observado também em relação aos serviços administrativos internos das pessoas federativas e das pessoas a elas vinculadas. Significa que a Administração

133 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 31.ed. Rev.Atual.Ampl. São Paulo: Atlas, 2017, p. 31/32.

Page 202: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

202

deve recorrer à moderna tecnologia e aos métodos hoje adotados para obter a qualidade total da execução das atividades a seu cargo, criando, inclusive, novo organograma em que se destaquem as funções gerenciais e a competência dos agentes que devem exercê-las.134

De forma simplória, pode-se afirmar que a eficiência está relacionada à utilização dos meios mais econômicos para atingir os melhores resultados. A prestação ótima com resultados satisfatórios e ao menor dispêndio, voltando-se à prestação contratual como a materialização da eficiência. Logo, não é difícil constatar sua relação entre o critério de julgamento do maior retorno econômico aos contratos de eficiência.

A finalidade desses contratos, na Administração, é a de gerar redução de despesas correntes.

Para compreender um pouco melhor o assunto, segundo o artigo 12 da Lei 4.320/1964, a despesa orçamentária divide-se em despesas correntes e despesas de capital. As primeiras são representadas pelas: (a) despesas de custeio, destinadas à manutenção de serviços e correspondem aos gastos com pessoal, material de consumo, serviços de terceiros, obras de conservação, etc.; e, (b) transferências correntes, que não correspondem à contraprestação direta de bens ou serviços por parte do Estado e subdividem-se e subvenções sociais e subvenções econômicas.

134 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ob.Cit., p. 31/32.

Page 203: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

203

Para Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres, embora a lei tenha se referido genericamente às despesas correntes, o critério mostra-se mais apropriado às despesas de custeio135.

Concordamos com esse posicionamento, não se vislumbrando a possibilidade de redução de despesas de transferências correntes, que são destinadas a cobrir despesas de custeio de instituições de caráter assistencial ou cultural, ou ainda, cobrir déficits de manutenção. Por outro lado, as despesas de custeio abrangem a manutenção das atividades das entidades, como despesas com pessoal, aquisição de bens e consumo, manutenção de equipamentos, despesas de água, energia, telefone, etc., permitindo presumir que dessas despesas poderá ser proporcionada economia às Estatais na hipótese de utilização do critério de julgamento do maior retorno econômico.

Há, portanto, caminhos variados para o gestor seguir e buscar a redução de despesas de custeio. Tem-se observado uma utilização crescente de contratos de ganho de eficiência no consumo de energia elétrica e de água.

Os contatos de eficiência são também conhecidos como contratos de risco, de performance ou de desempenho, em função de suas características, como a de que o contratado assume o risco de ter uma parte de sua remuneração vinculada à execução, à performance contratual.

135 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 347.

Page 204: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

204

Tais contratos exigem uma complexa equação no desempenho de fatores técnicos, econômicos, financeiros e jurídicos, em vista da natureza do risco na consecução dos objetivos contratuais e que demanda uma abordagem sistêmica a partir de: (a) diagnóstico preliminar da solução mais adequada ao aumento da eficiência, decorrente de análises de viabilidade técnica, econômica e financeira; (b) elaboração de projetos para implantação de programas e medidas de eficiência; (c) execução de obras, reformas, melhorias, intervenções técnicas, etc.; (d) realização de medições e verificações para determinação da economia gerada pelo sistema.

A remuneração da contratada está vinculada exclusivamente ao valor da economia a ser gerada (lembrando que o critério de julgamento da licitação será o de maior retorno econômico). Desse modo, o investimento aplicado na implantação do sistema de eficiência não será coberto apenas com a contrapartida que corresponde à parcela das despesas reduzidas ao longo da execução do contrato. Por isso, é razoável compreender que a remuneração se protraia em tempo superior ao da execução para que haja amortização dos investimentos. Caso contrário, inviabiliza o negócio e não haverá interessados em contratar com a Administração. Deve haver um equilíbrio entre a redução dos custos da estatal e a remuneração adequada para tanto.

O edital da licitação deve trazer, no mínimo, informações como dados de consumo do elemento a que se pretende aplicar as medidas de eficiência (água, luz, etc.), a sistemática da remuneração ao contratado, como se dará a medição da eficiência e sua periodicidade, o prazo para

Page 205: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

205

amortização dos investimentos e as consequências na hipótese de não atingir a economia prevista.

Outros elementos para compor a licitação podem ser extraídos do Decreto 7.581/2011, transcrito anteriormente, como os documentos que devem ser apresentados pelos licitantes, expressos pela proposta de trabalho e a proposta de preço. A primeira deve contemplar as obras, serviços ou bens e seus prazos de realização ou fornecimento, e a economia que se estima gerar. A proposta de preço compreenderá um percentual sobre a economia que se pretende produzir durante um dado período. O retorno econômico para o julgamento será o resultado daquela economia deduzida a proposta de preço. Ou seja, o benefício líquido para o ente promotor da licitação.

Um exemplo permite compreender melhor o critério. Supomos que determinada estatal, pretendendo reduzir suas despesas de energia elétrica, realiza licitação cujo critério de julgamento é o do maior retorno econômico. Lança o edital com as informações necessárias para a composição das propostas, sinalizando que o gasto mensal médio de energia elétrica é de R$ 850.000,00. Três licitantes comparecem na disputa e apresentam as propostas conforme a tabela abaixo:

licitante

proposta resultado

proposta de trabalho/economia

proposta de preço/% sobre

a economiaremuneração economia

A R$ 50.000,00 15% R$ 7.500,00 807.500

B R$ 80.000,00 20% R$ 16.000,00 786.000

C R$ 90.000,00 30% R$ 27.000,00 787.000

Page 206: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

206

Cada licitante contemplou em sua proposta de trabalho todas as intervenções necessárias e prazos para execução do objeto, além do valor da economia que estimou gerar. Suas propostas de preço corresponderam a um percentual sobre a economia estimada, o que reverteu na remuneração acima. No resultado entre a economia estimada e a remuneração gerou o benefício líquido estimado. Esse resultado é que orientará a proposta vencedora, ou seja, a que trouxer maior retorno econômico que, no exemplo acima, foi apresentado pela licitante B.

Na hipótese de a empresa contratada não alcançar a economia estimada, ou seja, quando a subtração entre a economia contratada e a alcançada resultar em valor menor do que o contratado, haverá desconto no valor de sua remuneração, mas caso a diferença seja maior que o valor da remuneração, deverá o contratado pagar o excedente. O objetivo de tal procedimento é o de manter o padrão contratado, não arcando a estatal com resultado diverso do contratado.

Consoante estabelece o parágrafo único do artigo 79, se a diferença entre a economia contratada e efetivamente obtida for superior à remuneração do contratado, além do desconto da remuneração, será aplicada a sanção estabelecida no contrato, após a estatal instaurar procedimento administrativo respeitando o contraditório e a ampla defesa.

Outro critério de julgamento a ser estudado é o da melhor destinação de bens alienados. Tal critério, inovador em relação às licitações tradicionais, extrapola as vantagens econômicas das propostas e, conforme dispõe o §7°,

Page 207: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

207

do artigo 54, deve ser considerada, obrigatoriamente, a repercussão no meio social da utilização do bem adquirido.

Os bens inservíveis que, antes eram alienados mediante concorrência ou leilão no qual a oferta vencedora representava o maior valor proposto para aquele bem, ultrapassaram as barreiras financeiras e alcançaram outros valores jurídico-constitucionais, numa conotação clara do pilar social da sustentabilidade.

Sachs entende como sustentabilidade social “a criação de um processo de desenvolvimento que seja sustentado por um outro crescimento e subsidiado por uma outra visão de que seja uma sociedade boa. A meta é construir uma civilização com maior equidade na distribuição de renda e de bens, de modo a reduzir o abismo entre os padrões de vida dos ricos e dos pobres”136.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres pontuam que não houve diferenciação na Lei das Estatais quanto à classificação de bens móveis ou imóveis, sinalizando, contudo, que o artigo 29, XVII previu a dispensa de licitação destinada à doação de bens móveis para fins e usos de interesse social137.

Entendemos, porém, que, se a Lei pretendesse restringir aos bens móveis, trataria dessa categoria de modo expresso no critério de julgamento. Assim, concordamos

136 SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o Século XXI. In BURSZTYN, Marcel et al. Para pensar o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Brasiliense, 1993, p. 37.137 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 305.

Page 208: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

208

com Edgar Guimarães138 que entende que os bens de que trata a lei podem ser móveis ou imóveis.

Para utilização desse critério, caberá à estatal avaliar a oportunidade e conveniência dessa opção em detrimento da alienação por outros critérios, como o que preveja unicamente o maior valor. Decerto, essa justificativa deve estar amparada em estudos técnicos e sociais, já que há vinculação à repercussão no meio social da destinação do bem. Ou seja, relaciona-se a uma finalidade social, de bem comum. Mas não isenta a entidade de promover a avaliação econômica do bem a ser alienado, pois não se trata de doação, caso contrário, poderia se estabelecer a dispensa de licitação disposta no artigo 29, inciso XVII, em se tratando de bens móveis. Será vencedora a proposta que ofertar o preço estimado e representar a utilização para o bem com melhor destinação no meio social.

A maior dificuldade reside na comparação de propostas desiguais. Como definir objetivamente qual a melhor destinação para computadores alienados que serão utilizados em diferentes projetos sociais, por exemplo? A Lei não apresenta os caminhos.

Algumas possibilidades podem ser traçadas. Primeiramente é importante promover um estudo sobre possíveis repercussões sociais do bem a ser alienado. Ou seja, se efetivamente podem trazer algum benefício social para os destinatários. E, posteriormente, estabelecer critérios objetivos que serão analisados para definir a melhor destinação, tais como índice de vulnerabilidade

138 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 187.

Page 209: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

209

social, população que será atendida, faixa etária, grupo social, etc. Pode ser estabelecida pontuação dos critérios, definida objetiva e motivadamente no edital. A estatal poderá também definir previamente a finalidade do bem, caso haja muitas possibilidades que inviabilizem as comparações, como, por exemplo, após avaliar uma repercussão social positiva, fixar que os computadores alienados devem ser direcionados para projeto social de ensino de manutenção técnica dos equipamentos, pontuando itens como população a ser atendida, grupo social, horários, instrutores, metodologia, etc.

A Lei estabelece no artigo 54, §8°, que o descumprimento da finalidade da proposta vencedora resultará na restituição do bem ao acervo da estatal, sendo vedado o pagamento de indenização em favor do adquirente. Mas, nessa hipótese, em harmonia com o entendimento de Sidney Bittencourt, o valor despendido pelo adquirente para a aquisição deve ser restituído ao mesmo (p. 254). Ou seja, se a finalidade não for cumprida pelo vencedor, o bem será restituído à estatal e eventuais valores recebidos a título de pagamento pelo bem serão restituídos.

O adimplemento quanto à destinação deve ser acompanhado pela estatal, estabelecendo-se condições de avaliação periódicas até determinado prazo para cumprimento da função social estabelecida no edital e/ou na proposta vencedora.

Page 210: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

210

Questão 44- Como aplicar o tratamento diferenciado da Lei Complementar 123/06 às licitações das Estatais?

R: A Lei Complementar 123/06 instituiu o Estatuto Nacional das Micro e Pequenas Empresas e estabeleceu, dentre várias questões administrativas, tributárias, de obrigações trabalhistas e previdenciárias e de acesso a crédito e ao mercado, o tratamento diferenciado e favorecido às microempresas e empresas de pequeno porte.

Traçando brevemente um panorama histórico sobre o Estatuto, pontua-se que, no final do ano de 2003, foi promulgada a Emenda Constitucional 042/2003, que alterou o regime tributário nacional. O artigo 146 previu a criação de lei complementar para tratar das normas gerais tributárias abrangendo o tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte.

Segue o artigo citado da CF/88:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

...

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

...

d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no

Page 211: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

211

caso do imposto previsto no art. 155, II, das contribuições previstas no art. 195, I e §§ 12 e 13, e da contribuição a que se refere o art. 239. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003).

Essa lei complementar deveria incluir a criação de regimes especiais ou simplificados para arrecadação dos impostos e contribuições devidos pelas micro e pequenas empresas, no âmbito da União, Estados e Municípios.

Após muitos debates e mobilizações nacionais, foi promulgada a Lei Complementar n° 123/06, com o objetivo de tutelar os micros e pequenos empresários seguindo ditames constitucionais sobre a matéria.

A esse respeito, Marçal Justen Filho sintetiza: “A Constituição adotou a orientação de que benefícios restritos às pequenas empresas é uma solução destinada a promover a isonomia: as pequenas empresas devem ser protegidas legislativamente como meio de compensar a insuficiência de sua capacidade econômica para competir com as grandes empresas.”139

O objetivo do Estatuto, portanto, é assegurar a neutralização das diferenças entre as pequenas e as grandes empresas para que possa ser aplicada adequadamente a isonomia.

A Lei Complementar 123/2006 é, destarte, uma norma geral que determina a simplificação de regras nos procedimentos licitatórios às pequenas empresas, consubstanciado em três vertentes: na possibilidade de

139 JUSTEN FILHO, Marçal. O Estatuto da microempresa e as licitações públicas. São Paulo: Dialética, 2007, p. 33.

Page 212: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

212

regularização fiscal tardia, no empate ficto e na realização de licitações exclusivas para as pequenas empresas.

Estão vinculadas ao atendimento dos seus preceitos a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, como se observa da leitura do artigo 1°:

Art. 1° Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere:

I - à apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação, inclusive obrigações acessórias;

II - ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive obrigações acessórias;

III - ao acesso a crédito e ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão. (grifou-se)

Na opinião de Jair Santana e Edgar Guimarães:

De um simples passar de olhos, é possível inferir que todas as pessoas políticas da federação estão sujeitas à observância da LC n° 123/06, vale dizer, a União, Estados-Membros,

Page 213: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

213

Municípios, Distrito federal e todos os Poderes constitucionalmente instituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário), como também, os Tribunais de Contas, Ministério Público e os órgãos e entidades da Administração Direta e Indireta.

Quanto às empresas públicas e sociedades de economia mista, entidades estas que fazem parte da Administração Indireta, o legislador complementar fixou prazo de um ano para que tais entidades promovam ações visando a adaptação dos seus respectivos estatutos ao disposto na LC n° 123/06 (art. 77, §2°)140 (grifou-se)

Com isso, todos os órgãos e entidades da Administração Pública direta ou indireta de todas as esferas (Federal, Estadual, Municipal e DF), públicos e privados (inclusive as empresas Estatais), que realizam licitações para promover suas contratações devem atender aos ditames da Lei Complementar 123/06.

Inclusive, vale mencionar que a Lei Complementar nº 147/2014, que promoveu significativas alterações no texto da LC 123, ao alterar a redação do art. 47 da Lei de 2006, deixa clara a necessidade de se aplicar as regras constantes no Estatuto e conceder o tratamento diferenciado e simplificado às microempresas e empresas de pequeno porte nas contratações públicas realizadas pela administração direta e indireta, autárquica e

140 SANTANA, Jair Eduardo, GUIMARÃES, Edgar. Licitações e o Novo Estatuto da Pequena e Microempresa: Reflexos Práticos da LC n°123/06. 2.ed. atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 40.

Page 214: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

214

fundacional, federal, estadual e municipal. Nesse sentido, destaca-se:

Art. 47. Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica.

Parágrafo único. No que diz respeito às compras públicas, enquanto não sobrevier legislação estadual, municipal ou regulamento específico de cada órgão mais favorável à microempresa e empresa de pequeno porte, aplica-se a legislação federal. (grifou-se)

Depreende-se da redação do parágrafo único acima não ser vedado que os entes ali mencionados disciplinem a matéria dentro de sua estrutura normativa. Nesse sentido, os artigos 48 e 49, antes da alteração promovida pela LC 147/14, somente poderiam ser aplicados se houvesse regulamentação na legislação do respectivo ente. Atualmente, se não houver regulamentação específica, deverão os órgãos e entidades da Administração Pública direta ou indireta, estadual ou municipal aplicar o disposto na Lei Complementar 123/06, observando, no que preciso, a regulamentação feita pela administração federal.

Page 215: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

215

Pela redação original da LC 123/06, antes das últimas alterações, a realização dessas licitações diferenciadas era uma faculdade e somente seria válida se houvesse regulamentação específica por parte do ente federativo. Segue o texto anterior:

Art. 47. Nas contratações públicas da União, dos Estados e dos Municípios, poderá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica, desde que previsto e regulamentado na legislação do respectivo ente. (grifou-se)

Após a alteração, o preceito passou a ser impositivo e não mais prevê a necessidade de regulamentação para aplicação de seus comandos. Caso os entes não apresentem normativo que regulamente as licitações diferenciadas, devem observar, no que preciso, a regulamentação feita pela administração federal, conforme já asseverado.

Quanto aos entes constantes na redação do artigo 47, anteriormente à alteração promovida pela LC 147/14, estavam abrangidos a União, os Estados e os Municípios. Pela redação atual, o legislador especificou melhor e abarcou de modo mais amplo, e para que não restassem dúvidas, toda a Administração Pública, direta e indireta, inclusive as fundações e autarquias. Mas não excluiu da aplicação as sociedades de economia mista e as empresas

Page 216: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

216

públicas, senão não teria se valido da expressão “indireta”. Essa é a interpretação cabível à matéria, considerando a abrangência que se deve dar aos benefícios estatuídos pela Lei Complementar 123/06 às micro e pequenas empresas.

Destaca-se, portanto, segundo o estatuído na LC 123, com alteração promovida pela LC 147, a necessidade de a legislação do ente federado (inclusive as sociedades de economia mista e empresas públicas) observar a condição mais favorável à ME ou EPP ao regulamentar a matéria.

Contudo, é fundamental apontar que a Lei das Estatais disciplinou no artigo 28, §1° que se aplicam “às licitações das empresas públicas e das sociedades de economia mista as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006”.

Tal dispositivo, de clareza solar, portanto, determina a aplicação do tratamento diferenciado, favorecido e simplificado às ME/EPP nas contratações das empresas públicas e das sociedades de economia mista. Entretanto, o assunto não é unânime na doutrina. Para citar, Marçal Justen Filho entende pela inconstitucionalidade da regra estatuída no §1°, acima, argumentando que para as Estatais exploradoras de atividade econômica o preço mais elevado decorrente do tratamento diferenciado pode comprometer sua capacidade competitiva. Sintetiza que:

Ou seja, a determinação contemplada no §1° do art. 28 compromete a exigência de eficiência, eis que a empresa estatal é constrangida a pagar valores superiores aos que poderia obter

Page 217: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

217

no mercado pelos mesmos produtos e serviços. Isso se traduzirá em redução de sua capacidade competitiva. Assim se passará porque os seus competidores não se subordinarão a idêntico regime e poderão contratar bens e serviços pelo menor preço possível.141

Em linha oposta, Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres compreendem a preocupação do jurista acima em relação às licitações diferenciadas, estabelecidas no artigo 48 da LC 123, que podem gerar contratações mais caras, mas sinalizam que o próprio estatuto das ME/EPP admitiu seu afastamento quando, por exemplo, gerarem desvantagens econômicas. Arrematam pela constitucionalidade do dispositivo alegando que:

“Na avaliação dos interesses públicos envolvidos, tanto a eficiência e economicidade das contratações das estatais, como o fomento a determinado segmento do mercado (ME/EPP), parece-nos que o legislador, legitimamente, optou pela adoção do regime diferenciado previsto pelo Estatuto das microempresas e empresas de pequeno porte, mesmo em relação aos certames das estatais.142”

Concordamos com o exposto acima por esses últimos doutrinadores, repisando nosso entendimento de que o tratamento diferenciado tem status constitucional

141 JUSTEN FILHO, Marçal. A contratação sem licitação nas empresas estatais. Estatuto jurídico das empresas estatais: Lei 13.303/2016. Org. Marçal Justen Filho. São Paulo: Editora RT, 2016, p. 296.142 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 77.

Page 218: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

218

voltado a promover a isonomia entre os licitantes, como meio de compensação da insuficiência econômica e administrativa das pequenas empresas para competir com as grandes. Não se pode olvidar que a isonomia é princípio-base de toda licitação e somente se consubstancia quando houver tratamento igual entre iguais, havendo flagrante desigualdade se aplicado tratamento igual a situações ou sujeitos desiguais. Encontra-se aí o valor constitucional do tratamento diferenciado: a neutralização das diferenças entre empresas diferentes para que possam competir em igualdade, ao menos legal.

Ainda cabe pontuar que, embora os benefícios preconizados na LC 123/06 no que se refere às licitações públicas prescindem de regulamentação no edital em função da auto-executoridade do estatuto143, é importante que os direitos de titularidade das pequenas empresas estejam expressos no instrumento convocatório.

Ultrapassada a questão da aplicação da Lei Complementar 123/06 nas licitações promovidas pelas Estatais, resta entender como se aplica agora o estatuto das micro e pequenas empresas, moldado para atender às regras licitatórias das Leis 8.666/93 e 10.520/02.

Preliminarmente, esclarece-se o que a LC 123/06, em seu artigo 3°, considera microempresas ou empresas

143 Como já definiu o TCU no Acórdão 702/2007, do Plenário: “Tais disposições, ainda que não previstas no instrumento convocatório, devem ser seguidas, vez que previstas em lei. Cometerá ilegalidade o Sr. Pregoeiro caso, no decorrer do certame, recuse-se a aplicá-las, se cabíveis.21. Não se vislumbra, deste modo, a necessidade de inclusão, no edital, destes dispositivos, conforme requerido pela Representante”

Page 219: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

219

de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o  art. 966 do Código Civil, devidamente registrados no órgão competente, conforme o caso, desde que: no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00; e no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior  a R$  360.000,00    e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00.

Os benefícios aplicáveis às pequenas empresas nas licitações são o tratamento diferenciado e favorecido, disposto nos artigos 42 a 45, que tratam da regularização fiscal e trabalhista tardia e do direito de preferência na contratação; e, o tratamento diferenciado e simplificado, assentado nos artigos 47 a 49, que versam sobre a licitação exclusiva, o estabelecimento de cota de 25% e a subcontratação.

De modo resumido, a LC 123, com suas alterações posteriores (LC 147/14 e LC 155/16) preconiza que a comprovação nas licitações de regularidade fiscal e trabalhista das microempresas e empresas de pequeno porte somente será exigida para efeito de assinatura do contrato (art. 42). Devem tais empresas, porém, apresentar toda a documentação exigida para efeito da comprovação da regularidade, ainda que apresente restrição (art. 43). O prazo para a regularização da documentação será de cinco dias úteis, prorrogáveis a critério da Administração (Art. 43, §1°).

Aplicando-se os dispositivos acima às licitações promovidas pelas Estatais, caberá, no caso concreto, avaliar quais os documentos exigidos no edital a título de regularidade fiscal e/ou trabalhista, já que a Lei das Estatais em seu artigo 58 não elencou dentre os documentos de habilitação aqueles aptos

Page 220: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

220

a avaliar a regularidade fiscal e trabalhista144, ao contrário da exaustiva lista da Lei 8.666/93. Portanto, caso não exigidos tais documentos, por óbvio que o benefício em análise não será extensível a outros documentos porventura exigidos no edital. Em hipótese contrária, se a entidade elencou nas exigências habilitatórias a regularidade fiscal e/ou trabalhista, caberá aplicar o referido tratamento diferenciado, como preconizado na Lei Complementar 123/06.

Outro benefício previsto na LC 123/06 é o direito de preferência, que se consubstancia na possibilidade de contratação da pequena empresa na hipótese de empate com empresa não enquadrada com a melhor proposta no certame (art. 44). A Lei estabelece uma ficção de empate nas propostas para aplicação do benefício, considerando empatadas as propostas apresentadas pelas ME/EPP iguais ou até 10% superiores à proposta mais bem classificada (§1°). Na modalidade pregão, o intervalo percentual será de até 5% superior ao melhor preço (§2°).

O critério de desempate criado pela lei se resolve pela preferência concedida às pequenas empresas de ofertarem propostas com valor inferior à mais bem classificada (se licitante não enquadrada) para sagrarem-se vencedoras (art. 45, I). Ou seja, permite a lei que as ME ou EPP, cuja proposta esteja na condição de empate ficto, reduzam o seu valor para cobrir a oferta do primeiro menor preço apresentado, desde que esse não seja de empresa enquadrada, situação em que não será aplicado o direito de preferência. Caso a licitante não exerça seu

144 Sobre o tema, confira o texto sobre as exigências habilitatórias nesta obra.

Page 221: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

221

direito, serão convocadas as remanescentes que estejam empatadas fictamente, na ordem classificatória, para o exercício do mesmo direito (art. 45, II).

Se houver equivalência dos valores ofertados pelas pequenas empresas, que se encontrem nos intervalos de 10% ou 5%, será realizado sorteio entre elas para que se identifique aquela que primeiro poderá apresentar melhor oferta (art. 45, III). Não sendo exercitado o direito por nenhuma das licitantes por esses critérios, o objeto será adjudicado em favor da proposta originalmente vencedora do certame (art. 45, § 1º).

Evidentemente, se a proposta classificada de melhor preço foi apresentada por empresa enquadrada, esta será consagrada vencedora e não se aplicará o exercício do direito de preferência às demais ME ou EPP que se encontrem naquele intervalo preconizado pela Lei (art. 45, §2º).

A aplicação desse benefício do direito de preferência nas licitações realizadas por Estatais pode implicar na dificuldade de estabelecer o percentual do intervalo do empate, já que a LC menciona valores diferentes para as modalidades da Lei 8.666/93 e da Lei 10.520/02, mas a Lei das Estatais não implementou modalidades, e sim, modos de disputa. Desse modo, a questão que se apresenta é se nas licitações das Estatais estariam empatadas fictamente pequenas empresas que estivessem colocadas no intervalo de 5% ou 10% superior ao melhor preço apresentado por empresa não enquadrada?

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres aplicam por analogia o Regime Diferenciado de Contratações, que

Page 222: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

222

esclareceu em no Decreto Federal n° 7.581/2011 que o empate ficto se estabelece em propostas de valor até 10% superior a mais bem classificada. Justificam esse entendimento no seguinte sentido:

Como já dissemos, o regime licitatório da Lei n° 13.303/2016 estabeleceu sistemática de modalidade única e flexível, similar ao que ocorreu com o Regime Diferenciado de Contratações (RDC). Assim, não sendo o pregão, por aplicação da regra literal da LC 123/2006, esta modalidade flexível deve adotar o percentual de 10% definido pelo legislador.145

Sidney Bittencourt, por outro lado, não viu óbices em se aplicar o percentual e 5% quando for utilizada a modalidade pregão pela estatal promotora do certame.

De fato, a Lei das Estatais não estabeleceu modalidades, o que desperta a interpretação de que o pregão, nos moldes do instituído pela Lei 10.520/02, não será aplicável às Estatais146, mas o tema causa divergências. Contudo, como outrora apontado, reconhece-se que uma parcela das Estatais estabeleceu nos seus regulamentos de licitação os ritos licitatórios dos modos de disputa e do pregão, aplicando-se a Lei 10.520/02. Preveem assim a existência dos modos de disputa aberto e fechado e dos pregões presencial e eletrônico, mas adaptando-os à Lei 13.303/16. Desse modo, essas Estatais dispuseram sobre a adoção do pregão, nas contratações de bens e serviços comuns, com sistemática própria.

145 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 79.146 Sobre o tema, confira os comentários sobre a utilização da modalidade pregão, nesta obra.

Page 223: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

223

Há duas interpretações possíveis para a questão: aplica-se analogicamente a regra estatuída para o RDC, pela similaridade do regime licitatório com o das Empresas Estatais e estabelece-se que o intervalo do empate ficto para as licitações processadas pelas Estatais é de até 10%, inclusive para licitações eletrônicas; ou, limita-se o empate em até 5% para a hipótese de utilização da modalidade pregão e até 10% para os modos de disputa.

A solução, nos parece, está na regulamentação dada à Lei 13.303/16 no âmbito de cada estatal (como determinado no artigo 40 daquela lei). Para as empresas públicas e sociedades de economia mista, que elaboraram regulamentos e estabeleceram que seus procedimentos licitatórios serão desenvolvidos exclusivamente por modos de disputa, sendo que para bens e serviços comuns será realizado o modo de disputa aberto, e não a modalidade pregão, deve ser estabelecido o intervalo percentual de até 10%, atendendo ao determinado na LC 123, artigo 44, §1°.

Contudo, para as entidades que regulamentaram os modos de disputa e não abriram mão da modalidade pregão, com sua nomenclatura, elementos caracterizadores e com as adaptações pertinentes às disposições da Lei das Estatais, estabelece-se o intervalo de até 5% para serem consideradas empatadas as propostas das pequenas empresas com a mais bem classificada no certame, não enquadrada. Desse modo, estar-se-á atendendo ao comando expresso da Lei Complementar n° 123, no artigo 44, §2°, de que na modalidade pregão o intervalo será de até 5%. Tal conduta privilegia a segurança jurídica nas relações com os licitantes, garantindo a aplicação

Page 224: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

224

dos percentuais expressos na Lei Complementar nas licitações.

Acrescenta-se outro tempero à discussão. O RDC não estabeleceu a possibilidade de utilização da modalidade pregão, como o fez, de modo acertado ou não, a Lei das Estatais, que se referenciou expressamente à utilização da modalidade pregão como diretriz a ser observada pelas Estatais (art. 32, inciso IV). Tal assertiva constitui obstáculo à aplicação analógica às Estatais do RDC e seu Decreto 7.581/2011, que no artigo 38, estabeleceu o empate ficto em até 10% superior à proposta mais bem classificada.

De fato, ante a falta de clareza na Lei das Estatais quanto a esse tema, não há uniformidade de entendimentos e o assunto deve ser bem esclarecido nos regulamentos das Estatais, em vista do que dispõe a Lei 13.303/16 e a Lei Complementar 123.

Por fim, não podemos deixar de analisar o tratamento diferenciado e simplificado estabelecido nos artigos 47 a 49 do Estatuto das ME/EPP. Esses benefícios têm por objetivo promover o desenvolvimento econômico e social em âmbito municipal e regional, ampliar a eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica.

Uma primeira questão a avaliar é a aplicação desses dispositivos às Estatais, uma vez que a Lei Complementar 123 estabeleceu no caput do artigo 47147 os sujeitos a que foi endereçada a norma, quais sejam, a administração pública direta e indireta, autárquica e fundacional, não

147 Art.  47.   Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá (...).

Page 225: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

225

incluindo as sociedades de economia mista e as empresas públicas.

Sinaliza-se que, anteriormente à alteração promovida pela LC 147/14, estavam abrangidos pela norma a União, os Estados e os Municípios.

Mas, como o advento da Lei 13.303/16, que expressamente determinou no artigo 28, §1° a aplicação das disposições constantes dos artigos 42 a 49 da LC 123 nas licitações promovidas pelas Estatais, o dilema foi desvendado.

Especificamente sobre as licitações diferenciadas (art. 48), de modo sumário, a Lei Complementar determina a realização de licitações exclusivas às micro e pequenas empresas nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (inciso I). Considerando que a regra das contratações é o parcelamento do objeto, sempre que técnica e economicamente viável e não houver prejuízo para o interesse público essa opção, constituindo cada item, ou lote, um objeto autônomo e independente, ou um objeto integral, e cujo valor seja de até 80.000,00, deve a estatal promover a licitação exclusiva à participação das pequenas empresas.

A LC também dispõe sobre a possibilidade de exigir a subcontratação de ME ou EPP nos processos licitatórios destinados à contratação de obras e serviços (inciso II). Pela subcontratação, a empresa contratada transfere parte da execução contratual a um terceiro. Essa parcela deve ser estabelecida no edital. José Anacleto Abduch Santos sinaliza que “a parcela do objeto para a qual foi exigida prova de capacidade técnica ou econômico-financeira não pode ser objeto de subcontratação, ou,

Page 226: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

226

em sendo, deverá a ME e EPP subcontratada provar que a detém, na forma do edital”148. Nessa hipótese, conforme o parágrafo segundo, os empenhos e pagamentos poderão ser destinados diretamente às subcontratadas.

A LC define que em certames para aquisição de bens de natureza divisível, deve a entidade estabelecer cota de até 25% do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte (inciso III). Nesse caso, o restante do objeto não destinado à cota será colocado em disputa para todos os licitantes (cota principal), enquadrados ou não. Desse modo, apenas parte de um mesmo objeto, desde que divisível, será disputado unicamente pelas pequenas empresas, o que pode sobrevir valores diferentes para o mesmo objeto, caso empresas diferentes sejam vencedoras. Caso não haja proposta para a cota reservada, poderá ser adjudicado o objeto para ao licitante não enquadrado, desde que pelo valor da cota principal do mesmo objeto. Se ME ou EPP vencer pelas cotas reservada e principal, deverá ser adjudicado o objeto pelo menor valor, caso haja diferença.

O último dos benefícios apresentados pela LC sobre as licitações diferenciadas é a prioridade de contratação até o limite de 10% do melhor preço válido para as microempresas e empresas de pequeno porte sediadas local ou regionalmente (§3°). Para José Anacleto A. Santos, a expressão “local” refere-se ao município e “sediadas regionalmente” entende serem as “ME ou EPP sediadas na região – espaço geográfico – eleita pelo

148 SANTOS, José Anacleto Abduch. Licitações e o Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte. 1. Ed. Curitiba: Juruá Editora, 2008. v. 1, p. 133.

Page 227: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

227

órgão promotor da licitação como destinatária da ação de fomento por intermédio da contratação”, devendo a administração contratante indicar as regiões nas quais “pretende que a contratação seja instrumento de promoção do desenvolvimento social e econômico”149. A aplicação dessa hipótese está subordinada à redução do valor ofertado pelo pequeno empresário ao originalmente vencedor do certame, à semelhança do benefício do direito de preferência incidente sobre as propostas (art. 44).

Por derradeiro, a LC 123 prescreveu as hipóteses de afastamento das licitações diferenciadas no artigo 49:

Art. 49. Não se aplica o disposto nos arts. 47 e 48 desta Lei Complementar quando:

I - (Revogado);                (Redação dada pela Lei Complementar nº 147, de 2014)     

II - não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório;

III - o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não for vantajoso para a administração pública ou representar prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a ser contratado;

IV - a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos dos arts. 24 e 25 da Lei nº 8.666, de 21 de

149 SANTOS, José Anacleto Abduch. Ob. Cit. P. 141.

Page 228: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

228

junho de 1993, excetuando-se as dispensas tratadas pelos incisos I e II do art. 24 da mesma Lei, nas quais a compra deverá ser feita preferencialmente de microempresas e empresas de pequeno porte, aplicando-se o disposto no inciso I do art. 48.         

As regras acima, portanto, ocasionam a inaplicabilidade dos dispositivos dispostos nos artigos 47 e 48, como a inexistência de ao menos 3 competidores enquadrados local ou regionalmente, comprovado de forma objetiva na fase preparatória; na hipótese de gerarem desvantagens econômicas ao ente promotor do certame ou prejuízos para o interesse público; e, licitação dispensável ou inexigível, à exceção das contratações de pequeno valor, dando-se preferência, nesse caso, à contratação das pequenas empresas.

Vale ressaltar que a Lei Complementar 123/06 foi a opção legislativa para alcançar valores constitucionais que preveem o tratamento diferenciado e favorecido às micro e pequenas empresas. Trata-se de implementação de política pública visando ao desenvolvimento dos pequenos empresários e da geração de renda e distribuição de riquezas. Apresenta cunho político, econômico, social e sustentável. Logo, a importância, afora do dever legal, de estabelecer tais tratamentos nas contratações promovidas pelas Empresas Estatais, com critérios previstos de forma clara e objetiva nos instrumentos normativos pertinentes.

Page 229: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

229

Questão 45- Há diferença entre o julgamento dos lances ou propostas e a verificação da efetividade dos mesmos? Quais os critérios de desclassificação da proposta?

R: Segundo disciplinou a Lei da Estatais, as licitações das empresas públicas e sociedades de economia mista observarão a sequência de fases preconizada no artigo 51150.

Para o tema proposto, cabe sublinhar nessa sequência legal estabelecida que, após a apresentação de lances ou propostas, haverá o julgamento e, na sequência, a verificação da efetividade dos mesmos.

Ou seja, tratam-se de fases diferentes o julgamento dos lances ou propostas e a verificação de sua efetividade. Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres diferenciam

150 Art. 51. As licitações de que trata esta Lei observarão a seguinte sequência de fases: I - preparação; II - divulgação; III - apresentação de lances ou propostas, conforme o modo de disputa adotado; IV - julgamento; V - verificação de efetividade dos lances ou propostas; VI - negociação; VII - habilitação; VIII - interposição de recursos; IX - adjudicação do objeto; X - homologação do resultado ou revogação do procedimento. § 1° A fase de que trata o inciso VII do caput poderá, excepcionalmente, anteceder as referidas nos incisos III a VI do caput, desde que expressamente previsto no instrumento convocatório. § 2° Os atos e procedimentos decorrentes das fases enumeradas no caput praticados por empresas públicas, por sociedades de economia mista e por licitantes serão efetivados preferencialmente por meio eletrônico, nos termos definidos pelo instrumento convocatório, devendo os avisos contendo os resumos dos editais das licitações e contratos abrangidos por esta Lei ser previamente publicados no Diário Oficial da União, do Estado ou do Município e na internet.

Page 230: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

230

tais fases nos seguintes termos: “Durante a fase de julgamento, realiza-se a valoração dos lances e proposta à luz do critério preestabelecido no instrumento convocatório. A fase de verificação de efetividade dos lances ou propostas, por sua vez, destina-se a averiguar a idoneidade e o atendimento do conteúdo da oferta em relação aos parâmetros definidos no edital.151”

Portanto, logo após a apresentação da oferta do licitante, será promovido o processamento da licitação de acordo com o modo de disputa adotado no edital, com fase de lances no modo de disputa aberto ou se adotado o pregão, ou avaliação da proposta.

Será promovido o julgamento dos lances ou propostas de acordo com o critério empregado no edital e com base no artigo 54, que definiu como critérios de julgamento: o menor preço, o maior desconto, a melhor combinação de técnica e preço, a melhor técnica, o melhor conteúdo artístico, a maior oferta de preço, o maior retorno econômico e a melhor destinação de bens alienados.

Ou seja, na fase de julgamento, serão avaliados os atributos das ofertas dos licitantes em função do critério adotado. Por exemplo, numa licitação cujo critério seja o menor preço, a comissão de licitação ou o pregoeiro julgarão os lances ou propostas estabelecendo numa ordem de classificação (de menor para a de maior vantagem), aquela de menor preço, que representará a maior vantagem para a estatal.

151 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 259.

Page 231: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

231

Definida a oferta de maior vantagem152, dentro do critério de julgamento estabelecido e segundo a ordem de classificação, caberá nessa ocasião a verificação de sua efetividade. Será avaliada a conformidade do lance ou proposta com o atendimento das especificações técnicas do objeto, o conteúdo formal ou material exigido, bem como a exequibilidade da oferta, de forma a atender às necessidades previamente estipuladas.

O artigo 56 define que na verificação da efetividade será promovida a desclassificação do lance ou proposta que: I - contenham vícios insanáveis; II - descumpram especificações técnicas constantes do instrumento convocatório; III - apresentem preços manifestamente inexequíveis; IV - se encontrem acima do orçamento estimado para a contratação; V - não tenham sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela estatal; VI - apresentem desconformidade com outras exigências do instrumento convocatório, salvo se for possível a acomodação a seus termos antes da adjudicação do objeto e sem que se prejudique a atribuição de tratamento isonômico entre os licitantes.

Da leitura dos incisos acima é possível dividir a verificação da efetividade sob os critérios de valor (incisos III, IV e V) e de substância das ofertas (incisos I, II e VI).

Quanto ao valor, portanto, serão desclassificadas as ofertas que apresentem valores manifestamente inexequíveis, estejam acima do orçamento estimado ou

152 Conforme orienta o artigo 56, § 1°, “a verificação da efetividade dos lances ou propostas poderá ser feita exclusivamente em relação aos lances e propostas mais bem classificados”.

Page 232: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

232

que não tenham sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela estatal (incisos III, IV e V).

A inexequibilidade está relacionada com a inviabilidade de execução do objeto licitado. Ou seja, a oferta tem valor tão inferior que impossibilitará o cumprimento integral das obrigações pactuadas pelo contratado.

A inexequibilidade das propostas sempre foi tema intricado na prática, pois não há fórmula ou critério absoluto que determine se a oferta é ou não exequível. Depende da estrutura e de critérios internos dos licitantes, o que gera incertezas dos julgadores sobre a desclassificação sob esse motivo. Até porque é defeso às entidades excluir propostas que possam representar maior vantajosidade econômica. Logo, qualquer fórmula de inexequibilidade apresenta apenas um critério relativo de sua presunção. É o mesmo entendimento já consolidado na doutrina e na jurisprudência.

Marçal Justen Filho advoga que:

a desclassificação por inexequibilidade apenas pode ser admitida como exceção, em hipóteses muito restritas. O núcleo da concepção ora adotada reside na impossibilidade de o Estado transformar-se em fiscal da lucratividade privada e na plena admissibilidade de propostas deficitárias. [...] Indo avante, existe uma grande dificuldade prática na identificação do patamar mínimo de inexequibilidade. A administração não dispõe de condições precisas e exatas sobre os custos do particular, o que torna a discussão sempre problemática153.

153 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. - 16ª Ed. Rev. Atual. Ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 868/870.

Page 233: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

233

Mas é certo que admitir proposta inexequível traz um risco de inadimplemento muito grave, que pode frustrar as expectativas da estatal e carrear consequências danosas ao interesse público como, por exemplo, receber produto ou serviço de qualidade inferior, rescindir o contrato não cumprido e ter que realizar nova contratação, instaurar procedimentos de penalização, etc. Enfim, há desembolso de tempo, de recursos financeiros, de processos administrativos.

A Lei das Estatais apresentou fórmula no §3°, do artigo 56, que pode aferir a inexequibilidade da proposta nas licitações de obras e serviços de engenharia:

Art. 56...

§ 3o    Nas licitações de obras e serviços de engenharia, consideram-se inexequíveis as propostas com valores globais inferiores a 70% (setenta por cento) do menor dos seguintes valores:

I - média aritmética dos valores das propostas superiores a 50% (cinquenta por cento) do valor do orçamento estimado pela empresa pública ou sociedade de economia mista; ou

II - valor do orçamento estimado pela empresa pública ou sociedade de economia mista.

Definiu a lei no parágrafo §4° do mesmo artigo 56 que para outros objetos a avaliação da exequibilidade demanda o estabelecimento de critérios de aceitabilidade de preços que considerem o preço global, os quantitativos e os preços unitários.

Page 234: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

234

A fórmula estabelecida no §3° apenas aponta uma inexequibilidade relativa, como pacificamente definido na jurisprudência do TCU, que editou a Súmula 362 em função do critério estabelecido na Lei 8.666/93, com redação semelhante ao da Lei das Estatais, com o seguinte conteúdo: “O critério definido no art. 48, inciso II, § 1º, alíneas “a” e “b”, da Lei 8.666/1993 conduz a uma presunção relativa de inexequibilidade de preços, devendo a Administração dar à licitante a oportunidade de demonstrar a exequibilidade da sua proposta.”

Nesse aspecto, a Lei 13.303/16 definiu no §2° que a estatal “poderá realizar diligências para aferir a exequibilidade das propostas ou exigir dos licitantes que ela seja demonstrada”.

De fato, não é possível determinar, de plano, a inexequibilidade da proposta, nem mesmo com aplicação de fórmulas. Ao contrário, deve ser aferida diante das peculiaridades do caso concreto, em função de práticas de mercado, de obrigações e condições de execução do objeto, das características do proponente, etc. A desclassificação de proposta inexequível deve ser objetivamente demonstrada sendo previamente permitida a demonstração de sua exequibilidade pelo proponente, sob pena de sua desclassificação.

A realização de diligências pela autoridade julgadora será essencial para definir com segurança pela efetividade ou não da proposta sobre esse aspecto. Recomenda-se que a estatal promova a diligência necessária com bastante critério reunindo informações e documentos para fundamentar sua decisão.

Page 235: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

235

Outra causa de desclassificação de propostas em relação ao valor é para aquelas que se encontrem acima do orçamento estimado.

O primeiro aspecto a se observar é que não se trata de faculdade da estatal a desclassificação. Como regra, não pode aceitar valores ofertados superiores ao estimado para a contratação.

Essa avaliação vai ocorrer após negociação prevista no artigo 57. É o que se depreende da truncada redação do artigo 56, inciso IV, que menciona o artigo 34 (sobre o orçamento sigiloso) e o §1° do artigo 57 (que trata da negociação).

Como bem observado por Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres:

outro ponto que merece atenção é o fato de o caput art. 57 da Lei n° 13.303/2016 indicar que a negociação será procedida após a confirmação da efetividade do lance ou proposta. O preceito parece fazer sentido apenas no tocante à negociação de condições mais vantajosas, diante da existência de licitante com proposta considerada efetiva; ou quando conjugado com seu §1°. Na hipótese de todos os lances ou propostas apresentadas situarem-se acima do orçamento estimado para a contratação, mostra-se evidente a possibilidade de negociação para alcançar a confirmação da efetividade, antes, portanto, do momento apontado no caput do art. 57.154

154 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 361.

Page 236: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

236

Ou seja, na hipótese em que o lance ou proposta, após o julgamento, se encontre acima do orçamento estimado, caberá negociar sua redução. Se, após tal procedimento, ainda permanecer acima do orçamento base, caberá a desclassificação do proponente.

Cabe acrescentar que, embora o legislador tenha definido que serão desclassificados lances ou propostas acima do valor estimado, o mesmo critério deve ser aplicado nas hipóteses em que a vantajosidade está atrelada ao acréscimo de valores a serem desembolsados, como nos critérios de julgamento de maior desconto e maior oferta de preços, por exemplo.

Tal hipótese de desclassificação demanda ainda mais atenção e cautela da estatal ao definir seu orçamento estimado, sob pena de desclassificar licitantes indevidamente em razão de falhas na orçamentação do objeto. Convém estabelecer parâmetros adequados para avaliar o valor da contratação que espelhe apropriadamente o mercado do objeto da contratação.

Em relação ao conteúdo formal da proposta, como citado acima, serão desclassificadas as propostas que contenham vícios insanáveis, descumpram as especificações técnicas e apresentem desconformidade com outras exigências.

Quanto aos vícios, a primeira ilação da lei é no sentido de que vícios sanáveis não impedem a efetividade da proposta. Tal concepção está de acordo com o princípio do formalismo moderado, que privilegia a competitividade e admite a promoção de diligências para saneamento de falhas supríveis que não gerem lesão a direito ou prejuízo

Page 237: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

237

à Administração e que atendam sua finalidade visada ainda que de forma transversa, consoante doutrina e jurisprudência, inclusive do STJ e STF, asseveram:

Nesse panorama, deve-se interpretar a Lei e o Edital como veiculando exigências instrumentais. A apresentação de documentos, o preenchimento de formulários, a elaboração das propostas, não se constituem em condutas ritualísticas. Não se trata de verificar a habilidade dos envolvidos em conduzir-se do modo mais conforme ao texto da lei. Todas as exigências são o meio de verificar se o licitante cumpre os requisitos de idoneidade e se sua proposta é satisfatória e vantajosa.

Portanto, deve-se aceitar a conduta do sujeito que evidencie o preenchimento das exigências legais, ainda quando não seja adotada a estrita regulação imposta originariamente na Lei ou no Edital. Na medida do possível, deve promover, mesmo de ofício, o suprimento de defeitos de menor monta. Não se deve conceber que toda e qualquer divergência entre o texto da Lei ou do Edital conduz à invalidade, à inabilitação ou à desclassificação.

(…)

A ausência de cumprimento a uma formalidade, quando existir uma realidade inquestionável e insuscetível de controvérsia, não deve acarretar a desclassificação da proposta.”155

(grifou-se)

155 FIILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 737 e 744.

Page 238: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

238

“[Voto do Ministro Relator]

Assim, a interpretação e aplicação das regras nele estabelecidas deve sempre ter por norte o atingimento das finalidades da licitação, evitando-se o apego a formalismos exagerados, irrelevantes ou desarrazoados, que não contribuem para esse desiderato. No presente caso, não se afigura que o ato impugnado tenha configurado tratamento diferenciado entre licitantes, ao menos no grave sentido de ação deliberada destinada a favorecer determinada empresa em detrimento de outras, o que constituiria verdadeira afronta aos princípios da isonomia e da impessoalidade. Ao contrário, entendo que foi dado fiel cumprimento ao citado art. 4º, parágrafo único, do Decreto 3.555/2000, no sentido de que “as normas disciplinadoras da licitação serão sempre interpretadas em favor da ampliação da disputa entre os interessados, desde que não comprometam o interesse da administração, a finalidade e a segurança da contratação”. Não se configura, na espécie, qualquer afronta ao interesse público, à finalidade do procedimento licitatório nem à segurança da contratação, uma vez que venceu o certame empresa que, concorrendo em igualdade de condições, ofereceu proposta mais vantajosa e logrou comprovar, na sessão, a aptidão para ser contratada.”156 (grifou-se)

156 TCU. Acórdão 1758/2003. Plenário.

Page 239: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

239

“A administração não poderia prescindir do menor preço, apresentado pela empresa vencedora, por mera questão formal, considerando que a exigência editalícia foi cumprida, embora que de forma oblíqua, sem prejuízo à competitividade do certame. Sendo assim, aplica-se o princípio do formalismo moderado, que prescreve a adoção de formas simples e suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito aos direitos dos administrados, promovendo, assim, a prevalência do conteúdo sobre o formalismo extremo, respeitadas ainda as formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados, tudo de acordo com o art. 2º, § único, incisos VIII e IX, da Lei nº 9.784/1999.”157 (grifou-se)

“O precedente tem grande utilidade por balizar a atividade de julgamento das propostas pelo Princípio da Proporcionalidade. Não basta comprovar a existência do feito. É imperioso verificar se a gravidade do vício é suficientemente séria, especificamente em face da dimensão do interesse público. Admite-se, afinal, a aplicação do princípio de que o rigor extremo na interpretação da Lei e do edital pode conduzir à extrema injustiça ou ao comprometimento da satisfação do interesse público.”158

157 TCU. Acórdão 7334/2009. Primeira Câmara.158 STJ. MS n.º 5.418/DF.

Page 240: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

240

“EMENTA: LICITAÇÃO: IRREGULARIDADE FORMAL NA PROPOSTA VENCEDORA QUE, POR SUA IRRELEVÂNCIA, NÃO GERA NULIDADE.[...] Distante de qualquer juízo discricionário, pertencente à fase anterior a qual é possível a liberdade de escolha do objeto, especificação, condições de pagamento, entre outros pertinentes ao momento preparatório e inicial da licitação, procede-se agora o exame objetivo, vinculando-se a Comissão Julgadora a que foi traçado no edital, passa-se à adjudicação e à celebração do contrato entre a Administração e o administrado (concorrente bem-sucedido). (...) Assim, o agente da Administração, ao dar efeito aos critérios estabelecidos na fase da licitação, deve propiciar, com praticidade, a resolução de problemas de cunho condizente com sua competência, sem “engessar” o procedimento, de modo a que o licitante não fique vulnerável à exclusão por qualquer tipo de desconexão com a regra estabelecida, ainda que de caráter formal, salvo quando de todo justificável. (...) Vale também ressaltar a prevalência do bom senso do condutor da licitação e da Comissão especialmente designada para tal fim, que deverão também se basear no princípio da competitividade, relevando formalismos que se sobreponham à finalidade do certame, sem, contudo, deixarem de considerar a legalidade e a impessoalidade dos atos praticados.”159

159 STF, ROMS nº 23.714-1/DF, 1ª T., Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 13.10.2000.

Page 241: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

241

Quanto aos erros nas propostas, é possível classificá-los em formais, materiais e substanciais. O erro formal decorre da elaboração de documento de forma diferente da exigida. Em geral, não o vicia nem o torna inválido, sendo possível, na maioria dos casos, identificar a falha e validar o ato. Embora produzido de forma diferente da exigida pode atingir a finalidade pretendida. Como exemplo, pode-se citar: ausência de numeração de páginas; documentos colocados fora da ordem estabelecida; ausência de informação em um documento que pode ser obtida em outro documento apresentado, etc.

No erro material, por sua vez, há um flagrante desacordo entre a vontade do agente e o que ficou expresso no documento. Geralmente é grosseiro e de fácil percepção, refletindo uma situação inexata. A princípio, não vicia o documento se puder ser saneado sem alteração substancial do mesmo. Pode-se exemplificar o erro material como: erro aritmético do valor da proposta, que apresenta soma incorreta; erro de data (troca de ano); de unidade de medida (litros no lugar de metros), etc.

Por fim, o erro substancial vicia o documento, tornando-o incompleto ou equivocado, impedindo sua correção ou seu aproveitamento e não produzindo os efeitos desejados. Na proposta, o erro substancial altera a sua substância, o resultado final. A sua consequência, como regra, é a desclassificação do licitante ou anulação do ato, conforme o caso.

Marçal Justen Filho, ao tratar dos vícios existentes nas licitações públicas, estabelece a distinção entre erros formais e substanciais da seguinte maneira:

Page 242: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

242

Os defeitos de uma proposta podem ser classificados em formais e substanciais. São formais os defeitos relacionados aos requisitos de exteriorização da proposta. São substanciais aqueles pertinentes aos requisitos de conteúdo da proposta.

A distinção nem sempre é simples, inclusive porque se pode entender que o defeito substancial se exterioriza no aspecto formal da proposta. Assim, por exemplo, suponha-se o erro material de soma de parcelas numa planilha. Trata-se de um erro formal ou de um defeito substancial? Essa indagação específica não comporta resposta absoluta, aplicável a todos os casos. Um erro de soma pode ser um defeito meramente formal quando não traduzir nem importar em defeito substancial. Mas esse erro pode refletir-se no conteúdo da proposta, tornando-a absolutamente defeituosa. Basta imaginar que o valor defeituoso tenha sido considerado para a formulação de outros elementos. Imagine-se uma proposta para uma obra de engenharia em que se verifique um erro de soma no tocante às cargas a serem suportadas por uma certa estrutura. Aquilo que poderia ser irrelevante adquire, nesse contexto, o caráter de essencialidade. É absolutamente insanável tal defeito.

Page 243: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

243

A distinção entre defeitos formais e substanciais é útil, porque os defeitos formais comportam maior dose de saneabilidade do que os substanciais. Assim, há regras formais cujo descumprimento é absolutamente irrelevante. Tal se passa, por exemplo, com a regra que determine a cor do papel das propostas. Já os defeitos substanciais apresentam, usualmente, maior grau de relevância.

Mas a distinção entre defeitos formais e defeitos substanciais não se destina a fornecer um critério absoluto de solução para disputas dobre desclassificação. É incorreto afirmar que todos os defeitos formais são sanáveis e que todos os substanciais não o são. Em todos os casos, é indispensável determinar a extensão e as decorrências do defeito. Há defeitos formais e substanciais sanáveis e existem aqueles que não comportam saneamento.160 (grifou-se)

E prossegue o citado doutrinador, destacando que a solução da questão está na lesão ao interesse protegido:

O ponto fundamental reside no reconhecimento de que a tutela à forma é um meio de proteção a um interesse reputado também digno de tutela. Isso significa que a mera desconformidade entre o modelo legal e (ou) editalício não é suficiente para acarretar a desclassificação. É indispensável que a desconformidade acarrete um prejuízo a um interesse protegido.161

160 FILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 850-851.161 FILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 853.

Page 244: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

244

De um modo geral, a possibilidade de saneamento de falhas está adstrita àquelas que possam ser corrigidas de acordo com as informações disponibilizadas na proposta e desde que não alterem o valor global da mesma.

Nesse sentido, cabe destacar o disposto na IN nº 05/2017 do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, que dispõe sobre as regras e diretrizes do procedimento de contratação de serviços sob o regime de execução indireta no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, o qual dispõe no Anexo VII-A que erros no preenchimento da planilha não são motivo suficiente para a desclassificação da proposta, quando a planilha puder ser ajustada sem a necessidade de majoração do preço ofertado, e desde que se comprove que este é suficiente para arcar com todos os custos da contratação:

7.9. Erros no preenchimento da planilha não são motivos suficientes para a desclassificação da proposta, quando a planilha puder ser ajustada sem a necessidade de majoração do preço ofertado, e desde que se comprove que este é o bastante para arcar com todos os custos da contratação.

Em vista do exposto anteriormente, caberá à estatal, no caso concreto, avaliar o erro sob os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da competitividade, da economicidade, do interesse público e da isonomia, motivando adequadamente a decisão pela efetividade da proposta saneando o vício ou pela desclassificação da mesma em vista da constatação de vício insanável.

Page 245: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

245

Por fim, caso a proposta não apresente todas as especificações técnicas ou desatenda a outras exigências editalícias deve ser desclassificada.

Page 246: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

246

Questão 46- A negociação é obrigatória? Há possibilidade de negociar outras condições além do preço?

R: Seguindo a sequência de fases preconizada pelo art. 51, após a verificação e confirmação da efetividade dos lances ou propostas, caberá promover a negociação. Os parâmetros estão dispostos no art. 57. A negociação visa lograr condições mais vantajosas para a estatal. Na hipótese do preço do primeiro colocado permanecer acima do orçamento estimado cabe negociar com os demais licitantes, na ordem estabelecida inicialmente (§1°). Caso não obtido valor igual ou inferior ao orçamento estimado após a negociação, será revogada a licitação (§3°).

Duas observações emergem da leitura da lei. A primeira delas é a de que a negociação é obrigatória e a lei não deixa margens de interpretação.

A segunda decorre da redação dos parágrafos acima, no sentido de que a negociação se restringe à obtenção de valores iguais ou abaixo do valor estimado da contratação. Mas não pode ser essa a melhor interpretação, já que o caput do art. 57 define que a negociação visa à obtenção de propostas mais vantajosas.

Do cotejo, portanto, do caput do 57 com seus parágrafos, depreende-se que a negociação tem por finalidade: (a) obter condições mais vantajosas à estatal e (b) adequar o lance ou proposta ao valor estimado.

Quanto à proposta mais vantajosa, podem estar abarcados na negociação aspectos relacionados à substância do

Page 247: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

247

objeto, como qualidade, prazo, metodologia de execução, tecnologia empregada, níveis superiores de eficiência, critérios socioambientais, valores, etc.

Edgar Guimarães, no entanto, orienta que:

O resultado da negociação não pode desnaturar o objeto original da contratação, e tem por objetivo tão somente produzir um aperfeiçoamento ou melhoria na proposta do licitante. O licitante não tem obrigação de atender a qualquer situação de melhoria ou de aprimoramento de sua proposta; logo, poderá ou não concordar em melhorar as condições propostas, e a sua recusa não a autoriza a sua desclassificação ou eliminação do certame162.

Dawison e Ronny Charles pontuam que a negociação de condições mais vantajosas não colide com o disposto no artigo 54, §3° da lei, que proíbe que a estatal considere, para efeito de julgamento, vantagens não previstas no instrumento convocatório, porquanto a negociação ocorre em momento posterior à fase de julgamento163.

Mas é importante frisar que a negociação não pode ser palco de inovações substanciais no objeto de forma a desatender ao julgamento objetivo e à isonomia entre os participantes, desnaturando-o. Tudo o que for imprescindível para a execução do objeto deve ser previsto no edital e avaliado na fase de análise da efetividade das

162 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 201.163 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 375.

Page 248: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

248

propostas. A negociação se volta a soluções criativas e que busquem, dentro dos parâmetros do objeto, o aprimoramento da proposta.

Já a segunda finalidade da negociação, a adequação do lance ou proposta ao valor estimado, será utilizada para obter preço que se enquadre no orçamento definido pela estatal, considerando que o artigo 56, inciso IV, define que serão desclassificadas as propostas que se encontrarem acima do orçamento estimado para a contratação.

Cabe acrescentar, nesse aspecto, que sempre que o valor apresentado pelo licitante não estiver adequado ao orçamento estimado, poderá a estatal promover a negociação. O que não implica em negociar apenas para reduzir o valor, mas nos critérios de maior desconto, maior oferta de preços e maior retorno econômico. Por exemplo, pode haver negociação para elevar o valor da proposta apresentada pelo licitante, já que nessas hipóteses, a vantajosidade está atrelada ao acréscimo de valores a serem desembolsados com a execução do objeto.

Page 249: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

249

Questão 47- Quais os parâmetros para estabelecer exigências de documentos de habilitação nas contratações ante a escassez da disciplina do artigo 58?

R: Uma das mais significantes inovações da Lei 13.303/16 diz respeito aos documentos a serem exigidos a título de habilitação dos licitantes. Assim dispõe o artigo 58:

Art. 58.   A habilitação será apreciada exclusivamente a partir dos seguintes parâmetros:

I - exigência da apresentação de documentos aptos a comprovar a possibilidade da aquisição de direitos e da contração de obrigações por parte do licitante;

II - qualificação técnica, restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes, de acordo com parâmetros estabelecidos de forma expressa no instrumento convocatório;

III - capacidade econômica e financeira;

IV - recolhimento de quantia a título de adiantamento, tratando-se de licitações em que se utilize como critério de julgamento a maior oferta de preço.

§ 1o    Quando o critério de julgamento utilizado for a maior oferta de preço, os requisitos de qualificação técnica e de capacidade econômica e financeira poderão ser dispensados.

§ 2o    Na hipótese do § 1o, reverterá a favor da

Page 250: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

250

empresa pública ou da sociedade de economia mista o valor de quantia eventualmente exigida no instrumento convocatório a título de adiantamento, caso o licitante não efetue o restante do pagamento devido no prazo para tanto estipulado.

Ao contrário da Lei 8.666/93, que esmiuçou cada um dos documentos para habilitação jurídica, qualificação técnica, qualificação econômico-financeira e regularidade fiscal e trabalhista, a Lei das Estatais estabeleceu parâmetros para avaliação da habilitação mais consentâneos com a Constituição Federal, que determinou no artigo 37, inciso XXI, que somente poderão ser exigidas qualificações técnicas e econômico-financeiras que guardem relação com a execução do objeto, limitando assim as balizas habilitatórias a serem exigidas dos licitantes.

Tal simplificação em relação à legislação anterior pode causar algumas dificuldades operacionais. É de ressaltar que o legislador das Estatais não definiu os documentos de regularidade fiscal.

Tal situação não passou desapercebido pela doutrina. Edgar Guimarães sinaliza que “a LRE tem regime jurídico próprio e específico para a habilitação. Não se aplicam, portanto, as disposições contidas nos artigos 27 a 31 da Lei n° 8.666/93”164.

164 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 202.

Page 251: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

251

Dawison Barcelos e Rony Charles Torres salientam que:

a Lei expressamente excluiu parâmetros ou requisitos habilitatórios que eram historicamente exigidos nas licitações sob a égide da Lei n° 8.666/1993, notadamente a regularidade fiscal e trabalhista, indicando a opção legislativa de não utilizar as licitações das estatais como instrumento de política fiscal e trabalhista, em detrimento da busca de propostas mais vantajosas economicamente para as empresas165.

Marçal Justen Filho, em seus comentários à Lei 8.666/93, observou que há relação direta entre a competitividade e as exigências habilitatórias:

A fixação de requisitos de participação numa licitação conduz à redução do universo de potenciais licitantes, ainda que propicie elevação de um contrato bem executado. Quanto maiores as exigências condicionantes da participação, tanto menor o número de licitantes aptos a participar da disputa. Logo, a ampliação dos requisitos de participação configura-se como um fator que contribui para a elevação dos preços obtidos pela Administração. O efeito prático da ampliação da severidade na fixação dos requisitos de habilitação é a tendência à obtenção de objeto bem executado, mas com preço muito elevado.166

165 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 380.166 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. - 16ª Ed. Rev. Atual. Ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 542.

Page 252: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

252

Para as Estatais, cabe estabelecer os parâmetros de habilitação e a sua forma de exigência no Regulamento de Licitações e nos instrumentos convocatórios, pautando-se pela Lei 13.303/16. Observa-se que a lei estabeleceu que a habilitação será avaliada, de forma exclusiva, sobre os parâmetros estabelecidos no artigo 58.

O que se tem observado nos RLC, no entanto, é uma repetição dos parâmetros da Lei 8.666/93. Certamente com as influências burocráticas da lei anterior, não se compreendeu a liberdade dada pela Lei das Estatais para definição das condições de participação.

Enfim, o modelo da lei estabelece a exigência de documentos aptos a comprovar a possibilidade de aquisição de direitos e a contração de obrigações do licitante. Trata-se de matéria de direito civil e comercial. De forma geral, são constituídos de cédula de identidade ou certidão de registro civil, para pessoas físicas; de comprovação de inscrição do empresário individual; de contrato social, ou estatuto da S.A com sua ata de eleição e posse dos administradores; estatuto e instrumento de eleição da atual diretoria da sociedade simples. Cada qual registrado nos registros competentes.

Em relação à qualificação técnica, a lei define que deve ser restrita a parcelas do objeto técnica ou economicamente relevantes. Busca-se comprovar que o licitante apresenta habilidades e conhecimentos técnicos necessários à execução do objeto. Abrange tanto a qualificação genérica, na qual o licitante deve comprovar a inscrição e a situação de regularidade perante entidade profissional para atividades reguladas, como a qualificação específica, relacionada ao objeto

Page 253: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

253

da licitação e que compreende a profissional, quanto ao responsável técnico, e a operacional, relativa à empresa, e consistem na comprovação de experiência anterior em objeto similar à contratação, com a apresentação de atestados de capacidade técnica.

Sidney Bittencourt aponta a escassez de elementos da Lei das Estatais sobre as exigências de qualificação técnica:

Infelizmente, a LE é omissa quanto à maneira de demonstração de qualificação técnica, diversamente da Lei Geral de Licitações, que aponta que essa capacitação demonstrará por intermédio do registro ou inscrição da entidade profissional competente; da comprovação de aptidão para desempenho de atividade pertinente e compatível em características, quantidades e prazos com o objeto da licitação, e indicação das instalações e do aparelhamento e do pessoal técnico adequados e disponíveis para a realização do objeto da licitação, bem como da qualificação de cada um dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelos trabalhos; da comprovação, fornecida pelo órgão licitante, de que recebeu os documentos, e, quando exigido, de que tomou conhecimento de todas as informações e das condições locais para o cumprimento das obrigações objeto da licitação; e da prova de atendimento a requisitos previstos em lei especial, quando for o caso.

Certamente, o constante da Lei Geral de Licitações servirá como um bom roteiro para os regulamentos a serem elaborados

Page 254: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

254

pelas estatais, com exceção da inusitada comprovação de que o licitante ‘recebeu os documentos’. [...] Tal dispositivo, de técnica duvidosa, está sendo sumariamente rejeitado pela prática, em face de sua total desnecessidade, sendo, inclusive, fator que só dificulta um procedimento licitatório167.

Quanto à capacidade econômica e financeira, os documentos a serem exigidos e analisados devem demonstrar que o licitante possui condições econômicas e financeiras para arcar com os encargos exigidos para a execução do contrato. De forma geral, comprova-se a partir do cálculo de índices contábeis extraídos do balanço patrimonial ou das demonstrações contábeis do último exercício social, já exigíveis e apresentados na forma da lei. Outros documentos podem ser exigidos para comprovação da liquidez do licitante, como certidão negativa de falência ou concordata ou de execução patrimonial; garantias; capital social ou patrimônio líquido mínimo; relação dos compromissos assumidos que possam importar em diminuição da sua capacidade operativa ou absorção de disponibilidade financeira.

Edgar Guimarães e José Anacleto Abduch Santos sugerem que as Estatais utilizem sistemática similar à da Lei de Licitações:

As empresas públicas e as sociedades de economia mista não se submetem ao regime da Lei n° 8.666/93, nem de caráter subsidiário. Contudo, o instrumento convocatório pode

167 BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017, p. 271.

Page 255: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

255

prever a mesma ou similar sistemática de prova de capacidade econômico-financeira nela prevista. São mecanismos comprobatórios já usuais nos processos de contratação pública, cuja adoção pode reduzir os riscos para a estatal.

Por outro lado, é de se observar que a inexistência de parâmetros legais para a exigência de prova de capacidade econômico-financeira confere às empresas públicas e às sociedades de economia mista uma excepcional possibilidade de prever maior solidez e robustez econômica e financeira dos potenciais contratados, desde que justificadamente e sem que tal conduta viole o princípio da isonomia, afastando indevida e legitimamente potenciais competidores.168

Por fim, estabeleceu a lei como parâmetro da habilitação a prova de recolhimento de quantia como forma de adiantamento para as licitações que utilizem como critério de julgamento a maior oferta de preço, como forma de garantir o recebimento do valor ofertado.

Enfim, ao regulamentar os critérios de habilitação cabe à estatal pormenorizar a relação de documentos que atendam à baliza legal, e nos instrumentos convocatórios relacionar de forma clara e objetiva cada documento que seja absolutamente relevante à execução do objeto da licitação.

168 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 207.

Page 256: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

256

Questão 48- A lei das Estatais não dispôs sobre a exigência, como requisito de habilitação, de documentos de regularidade fiscal e trabalhista. Diante desse aspecto, é possível afirmar que não podem as entidades exigir tais documentos em suas contratações? Por outro lado, poderiam as Estatais disciplinar a matéria em regulamento próprio e estabelecer um elenco de documentos de regularidade fiscal e trabalhista a serem exigidos?

R: Um aspecto que causou grande repercussão no meio jurídico foi a omissão do legislador da Lei 13.303/16 quanto aos documentos de regularidade fiscal e trabalhista a serem exigidos com critério de habilitação dos licitantes.

Como visto acima, a Lei das Estatais apresentou um encolhimento das exigências habilitatórias. Trouxe os parâmetros consentâneos ao texto constitucional do artigo 37, inciso XXI, que impôs que somente podem ser exigidas qualificações técnicas e econômicas indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Talvez em razão dessa baliza constitucional, o legislador reduziu na Lei 13.303/16 as exigências habilitatórias, pautando-se por aquelas que visem assegurar uma prestação adequadamente executada. O que pode ter pautado a ausência da regularidade fiscal e trabalhista.

Dawison Barcelos e Ronny Charles apresentam seus argumentos para a exclusão de tais comprovações:

Page 257: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

257

Aparentemente, na ponderação entre exercer uma política de relativo auxilio à ação da fiscalização tributária e trabalhista ou adotar uma opção menos restritiva à competição para obtenção de propostas economicamente mais vantajosas, parece o legislador ter optado pela segunda.169

É importante observar que o texto da lei define que as condições de habilitação serão avaliadas segundo os parâmetros ali estabelecidos de forma exclusiva. Sendo assim, uma primeira ilação do texto legal é a de que não seria possível incluir nos Regulamentos de Licitações e Contratos aquilo que a lei não permitiu a título de condições de habilitação.

Tal entendimento harmoniza-se com a opinião de Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres:

... a priorização dessa preocupação trabalhista ou fiscal não deveria ser a regra nas contratações firmadas. Embora, por uma política fiscal e trabalhista, a Lei n° 8.666/1993 tenha definido como requisito de habilitação, a regularidade fiscal e trabalhista.

Importante firmar: esta não foi a escolha da Lei n° 13.303/2016! A nova Lei não incluiu as regularidades fiscal e trabalhista entre os requisitos de habilitação! Esta não inclusão não foi à toa e não pode ser desprezada pelo aplicador do Direito.

169 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 390.

Page 258: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

258

Nada obstante a clara ausência da previsão desses requisitos no texto legal, algumas estatais, ainda no primeiro ano de vigência da nova Lei, ao aprovar seus regulamentos internos (conforme exige o artigo 40), incluíram entre os requisitos de habilitação a serem exigidos dos licitantes, as regularidades fiscal e trabalhista!

Porém, seria possível a aplicação subsidiária da Lei n° 8.666/1993, para justificar a exigência das regularidades fiscal e trabalhista?

Como já defendemos, em tópico anterior desse livro, a resposta parece negativa. Reitere-se, inclusive, que a Lei n° 13.303/2016, no caput do artigo 58, quando trata sobre habilitação, expressamente prevê que ela ‘será apresentada exclusivamente’ a partir dos parâmetros ali indicados, entre os quais não se encontram a regularidade fiscal e a regularidade trabalhista.170

Por outro lado, Edgar Guimarães e José Anacleto Abduch dos Santos incorporam outro entendimento sobre a matéria:

A LRE não exige prova de regularidade fiscal. Embora se defenda que a Lei n° 8.666/93 não se aplica subsidiariamente nas licitações das estatais, alguns dos documentos relativos à regularidade fiscal previstos no artigo 29 da Lei n° 8.666/93 devem ser exigidos dos licitantes

170 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 392.

Page 259: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

259

em certames promovidos pelas empresas públicas e pelas sociedades de economia mista – contudo, não por exigência nela contida, mas em decorrência de outras normas que têm aplicação na espécie.171

De forma geral, as Estatais têm definido, em seus regulamentos internos ou instrumentos convocatórios, documentos de regularidade fiscal similares aos da Lei n° 8.666/93, em razão de práticas consolidadas ou de segurança jurídica.

Não vislumbramos óbices à exigência de documentos exigidos não por conta da lei anterior, mas decorrentes de outras normas, como a regularidade com o FGTS e o INSS, haja vista o disposto no artigo 195, §3°, da CF, que define que empresa em débito com o sistema da seguridade social não poderá contratar com o Poder Público, ou na Lei n° 9.012/95, que, em seu artigo 2°, assenta que as empresas em débito com o FGTS não poderão celebrar contratos de prestação de serviços com qualquer órgão da Administração Pública, inclusive a indireta, bem como participar de concorrência pública.

Para contratação de prestação de serviços continuados com mão de obra exclusiva, é importante exigir, além das comprovações acima citadas, a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT).

A escolha pelos parâmetros, ressalta-se, será apreciada em função do objeto e das consequências para a estatal quanto ao seu descumprimento. 

171 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 203.

Page 260: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

260

Ainda que a lei não tenha traçado elementos mínimos dos documentos de regularidade fiscal, não impede que os mesmos sejam exigidos na celebração e durante a fiscalização do contrato.   

Page 261: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

261

Questão 49- Qual o efeito da homologação do resultado da licitação?

R: Conforme disciplina o artigo 51 da Lei 13.303/16, a homologação constitui a última fase das licitações promovidas pelas Estatais, posteriormente à adjudicação.

A homologação de uma licitação, em sua concepção tradicional, implica na avaliação administrativa sobre a legalidade e a conveniência do certame, definindo que o mesmo atingiu os fins devidos. A adjudicação, em contrapartida, assegura ao licitante a condição de vencedor da licitação.

Marçal Justen Filho defende que a homologação deve anteceder a adjudicação em razão das definições de cada qual. Para o jurista, comentando os artigos da Lei 8.666/93:

não há, antes da homologação uma ‘adjudicação’ nem haveria possibilidade de a Administração adjudicar sem ter, anteriormente, homologado. A homologação deriva da análise global e completa dos trabalhos da autoridade responsável pela licitação. A adjudicação concentra-se no resultado da licitação. Pressupõe a homologação da qual decorre.

A distinção entre homologação e adjudicação não significa diferenciação absoluta entre ambos. A homologação significa julgar conveniente a proposta classificada em primeiro lugar; a adjudicação não possui idêntico conteúdo.

Page 262: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

262

Homologação e adjudicação são atos que se complementam e inter-relacionam. Não pode haver adjudicação sem prévia homologação. Não há cabimento em homologar-se o resultado sem, como consequência, adjudicar o objeto ao vencedor.172

A Lei das Estatais, contudo, definiu no artigo 51 que nas fases da licitação, a adjudicação antecede a homologação, assim como fez o legislador do pregão. Consoante define Marçal Justen Filho “essa solução significa tão somente, a prática de um ato destituído de qualquer efeito se e enquanto não produzida a homologação pela autoridade competente.”173

Mas a Lei 13.303/16 foi além. Estabeleceu que a homologação implica a constituição do direito relativo à celebração do contrato em favor do vencedor. Trata-se de uma evolução em matéria licitacional, na qual a relação vertical entre Administração e particular dá lugar a uma relação horizontalizada, que permite maior segurança aos licitantes. O efeito da homologação do direito à contratação também é consentânea aos princípios da moralidade e da eficiência.

A homologação, consoante à Lei das Estatais, implica na avaliação pela autoridade competente da regularidade do certame e de sua conveniência, além de atribuir ao licitante vencedor o direito de celebrar o contrato:

172 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. - 16ª Ed. Rev. Atual. Ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 812.173 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários... p. 813.

Page 263: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

263

Art. 60.  A homologação do resultado implica a constituição de direito relativo à celebração do contrato em favor do licitante vencedor.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres argumentam:

a Lei das Estatais deslocou o marco para o reconhecimento do direito à contratação, da convocação para a assinatura do termo contratual para o momento da homologação do resultado do certame. Essa alteração possui como pano de fundo a nova concepção das relações jurídico-contratuais existentes entre as empresas estatais e os particulares, mais equilibrada, e que acena para a superação do modelo de Administração autoritária, em que o particular era visto como objeto do poder administrativo, e não sujeito – ou parte – da relação.174

Fato é que a novidade da LE em outorgar à homologação o efeito de atribuir o direito à contratação do adjudicatário, traz uma responsabilidade ainda maior à autoridade competente, pois não pode a estatal, após a homologação, não celebrar o contrato. Agora o licitante vencedor, uma vez homologado o certame, tem o direito líquido e certo de ser contratado, o que permite ao mesmo impetrar mandado de segurança contra a autoridade que homologou o resultado da licitação sem celebrar pari passu o contrato.

174 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 403.

Page 264: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Dos procedimentos

auxiliares

Page 265: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

265

Questão 50- Pré-qualificação permanente é instituto novo?

R: Não. Mais uma vez, trata de instituto também já absorvido no ordenamento jurídico nacional por meio da Lei Federal n.º 12.462/11 (RDC) (art. 29).

A própria Lei Federal n.º 8.666/93, regime jurídico que as Estatais se vinculavam até a entrada em vigor do novo marco regulatório estabelecido pela Lei Federal n.º 13.303/16, previa lá em seu art. 114 que poderia haver pré-qualificação de licitantes (ou seja, restrito apenas para fornecedores e não amplamente como previsto hoje, em que se há pré-qualificação de fornecedores e de bens) nas concorrências (hoje, desvinculado de qualquer modalidade, até porque não é o parâmetro utilizado pelo novo legislador), sempre que o objeto da licitação recomende análise mais detida da qualificação técnica dos interessados. Ou seja, estava a se tratar de um instituto pontual e não permanente.

Page 266: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

TH

IAG

O B

UE

NO

DE

OL

IVE

IRA

266

Questão 51- Qual diferença entre pré-qualificação permanente e catálogo eletrônico de padronização e cadastramento?

R: Interessante começar esta resposta descrevendo o ponto comum de todos esses três institutos. Todos são procedimentos auxiliares das licitações a serem conduzidas sob a égide da Lei Federal n.º 13.303/16. Ou seja, são procedimentos a serem utilizados adicionalmente ao processo licitatório, como ferramenta de facilitação operacional.

Entretanto, por mais útil que possa vir a ser cada um desses institutos, relembramos que há necessidade de regulamentação própria, antes da sua efetiva utilização, conforme explicitamente previsto no art. 71, inciso I, do Decreto Federal n.º 8.945/16.

De forma simples, objetiva e didática, podemos dizer que a diferença reside no fato de um dos institutos ter como objetivo a análise preliminar de características do objeto/objetiva ou do fornecedor/subjetiva (pré-qualificação); outro com foco na padronização das especificações técnicas e descrições de bens/serviços a serem demandados; e por fim, um último com objetivo de agregar informações estratégias ou também habilitatórias a serem mantidas pelo Poder Público.

Como se vê, comumente se confunde pré-qualificação subjetiva e cadastramento, mas são institutos diferentes. Isso porque, aquela implica em análise documental, que acaba por refletir em uma decisão administrativa (de natureza declaratória); este, trata-se apenas de um conjunto de informações consolidadas pelo Poder Público (expediente de natureza meramente informativa).

Page 267: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

267

Questão 52- Qual a validade da ata de registro de preços?

R: Antes de estudar sobre a validade da Ata de Registro de Preços (ARP), é importante citar suas principais características, dispostas no artigo 66 e seguintes da Lei das Estatais. Vejamos:

Art. 66.   O Sistema de Registro de Preços especificamente destinado às licitações de que trata esta Lei reger-se-á pelo disposto em decreto do Poder Executivo e pelas seguintes disposições:

§ 1o    Poderá aderir ao sistema referido no  caput  qualquer órgão ou entidade responsável pela execução das atividades contempladas no art. 1o desta Lei.

§ 2o    O registro de preços observará, entre outras, as seguintes condições:

I - efetivação prévia de ampla pesquisa de mercado;

II - seleção de acordo com os procedimentos previstos em regulamento;

III - desenvolvimento obrigatório de rotina de controle e atualização periódicos dos preços registrados;

IV - definição da validade do registro;

V - inclusão, na respectiva ata, do registro dos licitantes que aceitarem cotar os bens ou serviços com preços iguais ao do licitante

Page 268: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

268

vencedor na sequência da classificação do certame, assim como dos licitantes que mantiverem suas propostas originais.

§ 3o    A existência de preços registrados não obriga a administração pública a firmar os contratos que deles poderão advir, sendo facultada a realização de licitação específica, assegurada ao licitante registrado preferência em igualdade de condições.

Trata-se tal ferramenta de um registro em ata, precedido de licitação, de fornecedores e valores de produtos ou serviços, para contratações futuras e eventuais, na medida da necessidade da estatal. As regras relativas ao Sistema de Registro de Preços das Estatais devem ser estabelecidas em decreto do Poder Executivo.

A Lei 13.303/16 não definiu a vigência das atas de registro de preços como o fez a Lei 8.666/93. Pode-se cogitar, por isso, a existência de um sistema de registro de preços permanente, enquanto se mantiver vantajoso. Essa é a opinião de Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres, como segue:

a ausência de limite definido para a validade da ata de registro de preços representa uma das mais significativas diferenças entre o SRP tradicional e o sistema instituído às empresas estatais.

Caso o regulamento não imponha limites gerais ao prazo de validade das atas, ao contrário do ocorrido no SRP/RDC, as empresas estatais terão liberdade para definir prazos mais largos

Page 269: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

269

e, adotadas as devidas cautelas, usufruir dos preços registrados que ainda se mantenham vantajosos após doze meses. Vale dizer, por fim, que esse cenário possibilita, inclusive, a regulamentação de modelo de sistema de registro de preços permanente.175

Edgar Guimarães sinaliza sobre a previsão da validade das atas de registro de preços no regulamento interno da estatal:

o novo regime jurídico das estatais remete a definição da validade do registro para a própria entidade instituidora. O instrumento adequado para a previsão da validade dos registros de preços é o regulamento interno de licitações e contratos. Assim, cada estatal poderá definir o prazo de validade de seus registros de preços, não havendo necessidade de ser o mesmo para todas elas.176

Ademais, por mais que se possa pensar que o Decreto Federal n.º 7.892/13 incidirá sobre as contratações de serviços e a aquisição de bens, quando efetuadas pelo Sistema de Registro de Preços - SRP, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, fundos especiais, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades controladas, direta ou indiretamente pela União, há de se

175 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 444.176 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 236.

Page 270: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

270

ressaltar que infelizmente o referido normativo acaba por regulamentar o SRP previsto no art. 15 da Lei nº 8.666/93, ou seja, SRP vinculado ao regime jurídico anterior e distinto ao que atualmente as Estatais estão submetidas, motivo pelo qual não se pode, em nossa opinião, utilizar da referida previsão para regulamentar eventual lacuna provocada pela Lei Federal n.º13.303/16.

Cabe aguardar as disposições sobre o registro de preços a serem regulamentadas em decreto do poder executivo. Contudo, considerando a não definição pela Lei das Estatais sobre a validade do registro de preços, é de se sustentar a possibilidade de validade superior a um ano, caso se mantiverem vantajosos os preços registrados, sendo necessário acurado acompanhamento dos valores e definindo-se os procedimentos no regulamento interno.

Page 271: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Dos Contratos

Page 272: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

272

Questão 53- Como compreender a submissão dos contratos das Estatais ao regime de direito privado?

R: Outra notável alteração observada com a Lei das Estatais, em relação à legislação tradicional, diz respeito ao regime jurídico dos contratos. O artigo 68 vincula os contratos ao disposto na Lei e aos preceitos de direito privado. Afasta-se, portanto, a incidência do direito público nos contratos das Estatais e, como consequência, distancia-os das cláusulas exorbitantes.

Tais cláusulas são decorrentes da supremacia do interesse público que vigora nos contratos administrativos. Essa supremacia atribui as prerrogativas extraordinárias de alteração e rescisão unilateral dos contratos, exigência de garantias por parte do contratado, dever/poder de fiscalizar a execução contratual e de aplicar penalidades ao particular desidioso, limitação à oposição da exceptio non adimpleti contractus e retomada do objeto.

A Lei das Estatais privilegiou uma horizontalização um pouco mais acentuada nas relações com os particulares, numa vinculação mais equânime, em detrimento da verticalização do regime público, no qual a Administração se encontra em posição superior em razão da incidência das normas de direito público, assim como exposto na resposta da Questão n.º 4 desta obra.

Ainda assim, manteve a Lei a possibilidade de estabelecer limites às alterações contratuais e ao prazo máximo de vigência contratual. Ou seja, ainda que as normas de direito privado prevaleçam sobre o direito público, as

Page 273: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

273

características das empresas Estatais, com natureza de direito privado que utilizam total ou parcialmente recursos públicos, ainda atrai, em parte, as normas publicistas.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro sinaliza, sobre o assunto, que:

Essa sujeição parcial a normas de direito público justifica-se pelo fato de as empresas públicas e sociedades de economia mista (bem como suas subsidiárias) manterem vínculo com o ente político que as criou, para fins de controle, além do fato de administrarem total ou parcialmente recursos públicos e terem por objetivo a execução de atividades econômicas que o Estado presta por motivo de interesse público relevante ou por motivo de segurança nacional.177

Desse modo, advoga-se que, nos contratos das Estatais, orbita um regime híbrido, com normas de direito público, mas com aspectos relevantes de direito privado, que permitem a negociação de alguns de seus termos, como a alteração contratual.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres observam que há efeitos positivos e desafios com a retirada de boa parte das prerrogativas extraordinárias:

Como efeito positivo, podemos citar a redução de riscos para o fornecedor, já que a possibilidade de alteração, supressão ou mesmo acréscimo unilateral serão fatores

177 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 31ª. Rev. Atual. Ampl., Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 560.

Page 274: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

274

que podem repercutir na análise econômica que o licitante deve fazer para elaboração de sua proposta. Esta redução de risco pode, logicamente, induzir uma redução de custos na contratação, porque evitam contingências que podem afetar a precificação das propostas por licitantes responsáveis.

Por outro lado, a ausência de certas prerrogativas extraordinárias exige maior planejamento e cuidado no estabelecimento de cláusulas contratuais, para que sejam devidamente definidas as obrigações, prevenidos os riscos e estabelecidos os efeitos do descumprimento obrigacional”.178

Portanto, ante a submissão, ainda que não exclusiva, aos preceitos de direito privado, a lei excluiu as prerrogativas tradicionais da rescisão unilateral, alteração unilateral do contrato e a ocupação provisória. Prevalece, entretanto, o dever/poder de aplicar de forma unilateral as sanções contratuais. Excluindo-se tal prerrogativa, as Estatais devem privilegiar a consensualidade nas suas relações jurídicas.

178 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 451.

Page 275: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

275

Questão 54- A Lei das Estatais não vinculou a duração dos contratos à vigência de créditos orçamentários, como dispunha a legislação anterior, mas limitou a cinco anos. Como estabelecer a vigência dos contratos?

R: Pontua-se como significativa alteração em relação à legislação anterior a vigência dos contratos. Rememora-se que, na Lei 8.666/93 (art. 57), os contratos terão, como regra, a duração adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, com exceções que permitem duração maior, como para projetos contemplados no Plano Plurianual, prestação de serviços executados de forma contínua, aluguel de equipamentos e utilização de programas de informática e outras hipóteses previstas na lei.

A Lei 13.303/16 estabeleceu em seu artigo 71 que a duração dos contratos não excederá a 5 anos, contados a partir de sua celebração, excetuando-se os projetos contemplados no plano de negócios e investimentos da estatal e nos casos em que a pactuação por prazo superior a 5 anos seja prática rotineira no mercado e a limitação inviabilize ou onere de forma excessiva a realização do negócio. Para tais hipóteses permite-se contratos com duração superior a 5 anos. A Lei ainda vedou o contrato por prazo indeterminado.

Não estipulou a lei vigência mínima, ou a definição da duração em função do objeto, como para contratos de fornecimento ou para serviços prestados de forma contínua. Desse modo, cabe à estatal regulamentar tais

Page 276: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

276

aspectos na minuta do contrato, no edital ou mesmo no RLC, definindo a duração de seus contratos, atentando-se às limitações legais, o meio de controle da vantajosidade, procedimentos para prorrogação da vigência, forma de denúncia e rescisão, etc.

A vigência dos contratos deve ser estabelecida em vista do objeto, das práticas de mercado e da limitação orçamentária. Pode-se, por exemplo, definir que para um contrato de fornecimento a vigência seja estabelecida em 24 meses, ou um contrato de serviço continuado apresente vigência de 60 meses. Mas, nesses casos, cabe estipular as regras para, de forma periódica, avaliar a vantajosidade (técnica e financeira) e o interesse de ambas as partes na manutenção da avença.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres sinalizam sobre a possibilidade da denúncia contratual:

é possível imaginar o estabelecimento de uma regra que permita a denúncia contratual a qualquer tempo, desde que preservado um prazo mínimo, antes que se efetive a extinção do contrato. Outra opção seria regrar que a denúncia contratual fosse precedida de aviso prévio. Assim, por exemplo, embora se admitisse a denúncia contratual a qualquer tempo, a parte denunciante teria que avisar esta intenção com antecedência mínima de 06 meses (ou o tempo definido no contrato como suficiente para que uma nova opção contratual fosse aventada).179

179 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 466.

Page 277: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

277

Arquitetar uma cláusula de denúncia, de fato, é conveniente às partes, estabelecendo prazo para pré-aviso, visando a descontinuidade do contrato.

Page 278: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

278

Questão 55- Houve alguma alteração legal no que se refere às modificações contratuais?

R: Na fase contratual é dever de ambas as partes executar fielmente as cláusulas do instrumento contratual. No entanto, visando melhor atendimento ao objetivo da contratação e ao interesse macro, coletivo, permite-se a alteração de seu conteúdo. Na Lei 8.666/93 essa alteração poderia ser imposta ao contratado pela Administração, resultado de uma das cláusulas exorbitantes, a alteração unilateral dos contratos. Reside, então, a grande diferença em relação às disposições da Lei 13.303/16.

Em função das características dos contratos das Estatais, mais consentâneos às normas do direito privado, as modificações contratuais devem resultar de acordo entre as partes. Em outras palavras, não pode a entidade impor unilateralmente as alterações. Elas devem ser expressamente aceitas pela contratada, reduzindo-se, assim, riscos para essa parte de situações que venham a alterar suas condições impostas sem possibilidade de negociações.

É o que se depreende da leitura do artigo 72 da nova lei:

Art. 72.   Os contratos regidos por esta Lei somente poderão ser alterados por acordo entre as partes, vedando-se ajuste que resulte em violação da obrigação de licitar.

Dawison Barcelos e Ronny Charles Torres pontuaram sobre o aspecto da superação da modificação unilateral:

Page 279: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

279

“Por um lado, a prerrogativa de alteração unilateral do contrato, fundamentada na premissa clássica de supremacia do interesse público, mostra-se importante para adequar a execução contratual a demandas administrativas supervenientes. Por outro lado, ela envolve riscos para o licitante, gerando custos que impactam no preço ofertado pelos interessados na pretensão contratual.

[...]

Na Lei n° 13.303/2016, a lógica de alteração unilateral é superada. Troca-se um desenho de relação contratual verticalizada por uma relação contratual mais horizontal, em que as hipóteses de alteração estarão submetidas ao consenso, identificado na regra contratual ou por acordo entre as partes”.180

No mais, as regras legais são as mesmas. O contrato somente pode ser alterado em face da existência de um fato superveniente, justificado e demonstrado no processo, que altere as necessidades da contratação. Tal ocorrência deve ser evidenciada no processo através de avaliações técnicas e jurídicas, sem que com isso o objeto seja desnaturado. Ademais, a Lei estabeleceu os limites para as modificações, no artigo 81:

Art. 81.  Os contratos celebrados  nos  regimes  previstos  nos  incisos I a V do art. 43 contarão com cláusula que estabeleça a possibilidade

180 BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas estatais. Salvador: Podivum, 2018, p. 478.

Page 280: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

280

de alteração, por acordo entre as partes, nos seguintes casos:

I - quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos;

II - quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei;

III - quando conveniente a substituição da garantia de execução;

IV - quando necessária a modificação do regime de execução da obra ou serviço, bem como do modo de fornecimento, em face de verificação técnica da inaplicabilidade dos termos contratuais originários;

V - quando necessária a modificação da forma de pagamento, por imposição de circunstâncias supervenientes, mantido o valor inicial atualizado, vedada a antecipação do pagamento, com relação ao cronograma financeiro fixado, sem a correspondente contraprestação de fornecimento de bens ou execução de obra ou serviço;

VI - para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial

Page 281: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

281

do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.

§ 1o   O contratado poderá aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50% (cinquenta por cento) para os seus acréscimos.

§ 2o    Nenhum acréscimo ou supressão poderá exceder os limites estabelecidos no § 1o, salvo as supressões resultantes de acordo celebrado entre os contratantes.

§ 3o    Se no contrato não houverem sido contemplados preços unitários para obras ou serviços, esses serão fixados mediante acordo entre as partes, respeitados os limites estabelecidos no § 1o.

§ 4o    No caso de supressão de obras, bens ou serviços, se o contratado já houver adquirido os materiais e posto no local dos trabalhos, esses materiais deverão ser pagos pela empresa pública ou sociedade de economia mista pelos custos de aquisição regularmente

Page 282: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

282

comprovados e monetariamente corrigidos, podendo caber indenização por outros danos eventualmente decorrentes da supressão, desde que regularmente comprovados.

§ 5o    A criação, a alteração ou a extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, bem como a superveniência de disposições legais, quando ocorridas após a data da apresentação da proposta, com comprovada repercussão nos preços contratados, implicarão a revisão destes para mais ou para menos, conforme o caso.

§ 6o    Em havendo alteração do contrato que aumente os encargos do contratado, a empresa pública ou a sociedade de economia mista deverá restabelecer, por aditamento, o equilíbrio econômico-financeiro inicial.

§ 7o    A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato e as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condições de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do contrato e podem ser registrados por simples apostila, dispensada a celebração de aditamento.

§ 8o    É vedada a celebração de aditivos decorrentes de eventos supervenientes alocados, na matriz de riscos, como de responsabilidade da contratada.

Page 283: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

283

Da leitura do artigo acima, ainda se pode inferir que as modificações podem ser qualitativas, relacionadas com as condições do objeto, quando os fatos supervenientes identificados ensejarem a necessidade de alteração do projeto ou as especificações do objeto, ou quantitativas, que modificam quantitativamente o objeto. Para ambas as categorias, a lei estabeleceu os limites de 25% (compras, obras ou serviços) e 50% (reforma de edifício ou equipamento), sendo o valor contratual utilizado como parâmetro para aferição da modificação. Tais limites somente podem ser superados nas supressões decorrentes de acordo entre as partes. As alterações que ocasionem o aumento de encargos à contratada demandam o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro.

Por fim, a lei limitou as alterações vedando-as na hipótese de eventos supervenientes alocados como de responsabilidade da contratada na matriz de risco e nesse caso não há possibilidade de aditivo. Seriam eventos previstos no contrato, não se caracterizando, portanto, como extracontratuais. Uma vez materializados, cabe à contratada arcar com as respostas necessárias para completa execução do pactuado.

Page 284: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

Microtema:Das Sanções

Administrativas

Page 285: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

285

Questão 56- As Estatais podem aplicar as sanções dispostas na Lei 8.666/93 e na Lei 10.520/02?

R: A Lei das Estatais, sobre sanções administrativas, assim estabelece nos artigos 82 e 83:

Art. 82.   Os contratos devem conter cláusulas com sanções administrativas a serem aplicadas em decorrência de atraso injustificado na execução do contrato, sujeitando o contratado a multa de mora, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato.

§ 1o  A multa a que alude este artigo não impede que a empresa pública ou a sociedade de economia mista rescinda o contrato e aplique as outras sanções previstas nesta Lei.

§ 2o    A multa, aplicada após regular processo administrativo, será descontada da garantia do respectivo contratado.

§ 3o    Se a multa for de valor superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, a qual será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista ou, ainda, quando for o caso, cobrada judicialmente.

Art. 83.   Pela inexecução total ou parcial do contrato a empresa pública ou a sociedade de economia mista poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:

Page 286: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

286

I - advertência;

II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;

III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade sancionadora, por prazo não superior a 2 (dois) anos.

§ 1o    Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela empresa pública ou pela sociedade de economia mista ou cobrada judicialmente.

§ 2o    As sanções previstas nos incisos I e III do  caput  poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, devendo a defesa prévia do interessado, no respectivo processo, ser apresentada no prazo de 10 (dez) dias úteis.

Extrai-se das disposições acima que os contratos e/ou instrumentos convocatórios devem dispor sobre as sanções a serem aplicadas nas hipóteses de atraso injustificado na execução do contrato, ou em razão de inexecução parcial ou total do mesmo.

A Lei apresentou como penalidades a advertência, a multa e a suspensão de participação em licitação e impedimento de contratar com a estatal sancionadora por prazo não superior a 2 anos.

Importa observar que a lei delimitou as sanções que podem ser aplicadas aos contratados desidiosos,

Page 287: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

287

inspirada na Lei n° 8.666/93, mas com a exclusão da sanção de declaração de inidoneidade, estabelecida no artigo 87, inciso IV, daquela Lei. Passou por cima do pregão também, que delimitou a penalidade de impedimento de licitar e contratar com a União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelo prazo de até 5 anos, em função de uma série de atos praticados pelo licitante/contratado.

Ou seja, o legislador das Estatais agiu de forma mais branda ao definir como penalidade mais severa a suspensão do direito de licitar e contratar com a entidade por prazo não superior a dois anos. Por esse fato, de ter delimitado as penalidades aplicáveis no âmbito das licitações e contratos das Estatais, não há possibilidade de aplicar as sanções delimitadas na Lei 8.666/93 e na Lei 10.520/02, inclusive se a estatal admitir a utilização do pregão em face de interpretação da Lei das Estatais, do artigo 32, inciso IV.

Tal é o entendimento de Edgar Guimarães e José Anacleto Santos:

Quando da adoção do pregão para licitar bens e serviços comuns, serão utilizados apenas os dispositivos da lei que versem sobre modalidade, vale dizer, rito ou procedimento. Não se aplica, à guisa de exemplo, nas contratações e licitações das estatais o regime de sanções previsto no artigo 7° da Lei do Pregão, vez que a Lei 13.303/16 conta com regime jurídico sancionatório próprio.181

181 GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 103.

Page 288: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

288

É importante ressaltar que a ausência de penalidades mais severas na Lei das Estatais, como legislado na Lei n° 8.666/93 e na n° 10.520/02, não se materializa como lacuna normativa, na qual admitir-se-ia a aplicação analógica dessas leis às Estatais. Em matéria de sanções administrativas, recai o princípio da legalidade estrita, na qual somente as penas previstas expressamente em lei podem ser aplicadas. Ora, se o legislador das Estatais optou por estabelecer seu sistema punitivo de forma exaustiva nos artigos 82 e 83, sem referência normativa às outras leis, como fez com o RDC (Lei 12.462/11)182 em seu art. 47, §2°, ou com o pregão, no artigo 9°183, qualquer interpretação criativa do operador da lei 13.303/16 de ampliar o rol sancionatório vai contra o princípio da legalidade e, de forma macro, o Estado Democrático de Direito.

Em outras palavras, considerando que o legislador das Estatais dispôs de forma exaustiva sobre as sanções administrativas que podem ser aplicadas no âmbito das licitações e contratações promovidas pelas sociedades de economia mista e empresas públicas, não se pode pretender aplicar penalidades não descritas na Lei 13.303/16, como a declaração de inidoneidade descrita na Lei 8.666/93, ou a sanção de impedimento disposta na Lei 10.520/02, sob pena de ferir princípios e garantias constitucionais.

182 Que em seu art. 47, § 2o definiu que as regras sancionatórias da Lei 8.666/93 aplicam-se às licitações e contratos regidos pelo RDC. 183 “Art. 9º  Aplicam-se subsidiariamente, para a modalidade de pregão, as normas da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.”

Page 289: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

289

Questão 57- Como elaborar a cláusula de penalidades administrativas?

R: A elaboração da cláusula de penalidades requer cautela por parte da estatal para que, no momento de eventual aplicação, a sanção cumpra com seus objetivos: prevenção, em aspecto pedagógico de evitar o descumprimento; e repressão, para impedir que a entidade e a sociedade sofram prejuízos pelo descumprimento.

O sistema administrativo-punitivo apresenta semelhanças com o sistema penal e alguns princípios são correlatos, como o da (1) legalidade, no qual a Constituição Federal impede penalização sem lei formal que defina a infração e a sanção correspondente, imprimindo segurança jurídica, limitando sanções arbitrárias e carreando previsibilidade às hipóteses de ilicitude; (2) especificação, ou tipicidade, no qual a autoridade administrativa não possui faculdade de escolher no caso concreto a sanção cabível, mas, ao contrário, devem estar previstas no edital e contrato as infrações e sanções correspondentes; (3) proporcionalidade, que corresponde à adequação entre a sanção e a conduta, guardando compatibilidade da penalidade aplicável com a gravidade e reprovabilidade da infração; e, (4) culpabilidade, que pressupõe uma conduta subjetiva do particular, ou seja, não se pune pela mera ocorrência de um evento, mas sim porque o particular atuou de modo reprovável.

Tais princípios devem ser compreendidos para elaborar adequadamente a cláusula de penalidades contratuais.

Page 290: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

290

Com base neles, a estatal deverá delimitar as sanções no edital e contrato em vista dos limites da Lei 13.303/16, especificando as condutas passíveis de penalização e a sanção correspondente, de forma progressiva, da mais branda à mais grave.

A elaboração demanda um exercício de avaliar, dentre todas as obrigações estipuladas à contratada, os prejuízos decorrentes de seu descumprimento, e assim estabelecer, de forma proporcional e objetiva, as penalidades correspondentes.

A advertência é a penalidade mais branda, aplicável a inexecuções parciais, de pequena monta, que não importem em prejuízo para a estatal. Apresenta dois efeitos: fiscalização mais acurada pelo contratado e a ciência de que a reincidência poderá gerar punição mais severa. Em função da necessidade de processo administrativo formal para aplicá-la (assim como para qualquer sanção), dificulta sua utilização na prática.

A multa constitui penalidade de efeitos financeiros. Há duas espécies: a moratória, em função do atraso na execução do contrato (art. 82), e a compensatória, que visa compensar prejuízos que possam ser ocasionados com o descumprimento parcial ou total do contrato. Ambas podem ser descontadas do valor de garantia prestada. Devem ser estipuladas as infrações passíveis de multa e o percentual de cada qual, de forma objetiva, impedindo aplicação arbitrária. Como boa prática, sugere-se o estabelecimento de tabelas com a descrição de cada infração e o valor da multa correspondente.

Page 291: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

291

Por fim, a suspensão de participação em licitação e o impedimento de contratar com a estatal sancionadora pelo período de até dois anos é a sanção mais grave. Constitui pena restritiva de direitos, inibindo a participação em licitações e a celebração de novos contratos, aplicável para condutas de grande reprovabilidade. Seu efeito foi estabelecido de forma clara na lei, gerando efeitos apenas no âmbito da entidade sancionadora.

Importante também definir no contrato o processo administrativo punitivo.

Page 292: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

292

Questão 58- É necessário instituir um procedimento para aplicação das penalidades? Quais as cautelas?

R: Ao identificar o descumprimento parcial ou total das obrigações que cabem ao contratado, há duas regras para as Estatais: a primeira é o dever de aplicar as penalidades cabíveis e estabelecidas no contrato; a segunda, que decorre da primeira, é a instauração de um processo administrativo que fundamente a penalização.

A Constituição Federal garante no artigo 5°, LV, que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.

Nesse sentido, qualquer sanção aplicada aos contratados, que não tenha sido fundamentada em processo administrativo, é ato arbitrário, contrário aos valores democráticos e à Constituição federal e passível de anulação pelo Poder Judiciário.

Portanto, cabe à estatal definir internamente o respectivo processo administrativo, delimitando a competência sancionatória, as etapas, meios de defesa, recursos, procedimentos e prazos, incluindo as principais informações no instrumento convocatório e no contrato.

Todo procedimento sancionatório deve ser instaurado com a identificação da irregularidade e relato do fiscal/gestor com as informações da conduta do contratado e cláusulas descumpridas, instruindo o processo com dados, documentos que demonstrem o ilícito. O contratado deve ser citado para, querendo, se manifestar

Page 293: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

293

no prazo definido. Nessa citação, formal, devem ser apresentadas as seguintes informações: (a) identificação da entidade; (b) finalidade da notificação, ou seja, que é para a apresentação de defesa prévia; (c) indicação dos fatos e fundamentos legais que ensejaram a abertura do processo; (d) prazo para resposta com a data de início da contagem; (e) possibilidade de acesso aos autos do procedimento; (f) informação da continuidade do processo com ou sem a apresentação da resposta; e (g) orientação de que à parte são concedidos todos os meios de prova em direito.

Após o envio da manifestação da contratada, o processo deve ser encaminhado para decisão da autoridade competente. É relevante encaminhar para análise da assessoria jurídica da entidade, para conferir segurança para tomada da decisão.

É fundamental que a autoridade competente avalie todos os fatos alegados na defesa do contratado, que poderá justificar o ato cometido afastando a punição, afastando, por exemplo, a culpabilidade.

Após a decisão e a comunicação da mesma ao contratado, este poderá interpor recurso contra a penalidade aplicada, e será encaminhado para a autoridade superior da estatal.

Aplicando-se a penalidade de multa, caberá descontar o valor da garantia prestada pelo contratado. Se superior ao valor da garantia, além da perda da mesma, o contratado deve responder pela diferença, que será descontada de pagamentos ainda devidos ou cobrada judicialmente. Podem ser cumuladas as penalidades de advertência e suspensão temporária com a de multa.

Page 294: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

294

Finalizado o procedimento, o artigo 37 da Lei das Estatais define que a estatal deve informar os dados relativos às sanções de forma a manter atualizado o cadastro de empresas inidôneas disposto no art. 23 da Lei n° 12.846/2013, a Lei Anticorrupção.

Page 295: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

295

Questão 59- Qual a função da extensão da sanção da suspensão às empresas e aos profissionais definidos no art. 84?

R: A Lei das Estatais reprisou o disposto no artigo 88 da Lei 8.666/93, que permite a aplicação da penalidade de suspensão temporária aos profissionais ou empresas que:

A) tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;

B) tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;

C) demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a estatal em virtude de atos ilícitos praticados.

Prevê a lei, portanto, a possibilidade de estender a penalidade de suspensão em razão de fatos não diretamente relacionados à execução do contrato, mas às condutas preconizadas no artigo. Há obstáculos de interpretação do artigo 84. O primeiro deles foi a menção à idoneidade do inciso III, já que a Lei 13.303/16 não prescreveu a declaração de inidoneidade.

Na opinião de Edgar Guimarães e José Anacleto Abduch Santos: “Imaginamos que a única solução para a situação ora ventilada é a instauração de um processo administrativo punitivo por meio do qual se comprove a prática de atos ilícitos e se reconheça a inidoneidade do sujeito.”184

184 GUIMARÃES, Edgar. Lei das estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017, p. 279.

Page 296: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

296

POSFÁCIO – Dr. FÁBIO MEDINA OSÓRIO

Indubitavelmente a Lei Federal n.º 13.303/16 representou mais um marco normativo de alta relevância no âmbito das Empresas Estatais, uma vez que veio dar voz ao comando constitucional adormecido desde a Emenda Constitucional n.º 19, de 1998.

Nesse contexto, a obra “Manual das Estatais: questões jurídicas, práticas e essenciais de acordo com a Lei 13.303/16”, de Caroline Rodrigues da Silva e Thiago Bueno de Oliveira, brinda a comunidade jurídica com um conteúdo rico em experiências (em razão do perfil docente dos autores), com olhar crítico necessário para questões relevantes (diante da riqueza epistêmica dos autores) e com um formato altamente pragmático (haja vista estar estruturado em perguntas e respostas categorizadas em microtemas).

Todas essas características conferem um conforto de leitura dificilmente encontrado nas obras jurídicas da atualidade, motivo pelo qual muito me orgulha posfacia-la.

Definitivamente, deve-se reconhecer que com a presente obra os autores passam a integrar o seleto grupo de administrativistas que buscam incansavelmente a evolução/desenvolvimento da estrutura administrativa do Estado.

Por fim, registro aqui meu elogio ao extremo profissionalismo dos autores, professores Caroline Rodrigues e Thiago Bueno, bem como ao rigor científico da JML, consultoria de referência em probidade empresarial na condução de todas suas atividades.

Fábio Medina Osório

Doutor em Direito Administrativo pela Universidad Complutense

de Madrid.

Advogado e Ex-Ministro da Advocacia Geral da União (2016).

Page 297: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

297

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:BARCELOS, Dawison, TORRES, Ronny Charles Lopes de. Licitações e Contratos nas empresas Estatais. Salvador: Podivum, 2018.

BITTENCOURT, Sidney. A nova lei das Estatais. São Paulo: JH Mizuno, 2017.

BRASIL. ABNT. Associação Brasileira de Normas Técnicas. ABNT NBR ISO 31000: Gestão de riscos - princípios e diretrizes, 2018.

BRASIL. Lei Federal n° 13.303/2016. Dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

BRASIL. Decreto Federal n° 8.945/2016. Regulamenta, no âmbito da União, a Lei Federal n.º 13.303, de 30 de junho de 2016.

BRASIL. Instrução Normativa n.º 01/16. MP/CGU. Dispõe sobre controles internos, gestão de riscos e governança no âmbito do Poder Executivo federal.

BRASIL. Câmara de Comércio Exterior (CAMEX). Resolução n.º 90, de 05 de dezembro de 2018, que estabelece boas práticas para a elaboração e revisão de medidas regulatórias que afetam o comércio exterior.

BRASIL. IBGC (Instituto Brasileiro de Gestão Corporativa). IIA-Brasil (Instituto dos Auditores Internos do Brasil). Auditoria Interna: Aspectos essenciais para o conselho de administração. São Paulo: IBGC, 2018.

Page 298: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

298

BRASIL. Instituto dos Auditores Internos (IIA). Declaração de posicionamento do IIA: As três linhas de defesa no gerenciamento eficaz de riscos e controles. São Paulo, 2013.

BRASIL. Presidência da República. Diretrizes gerais e guia orientativo para elaboração de Análise de Impacto Regulatório – AIR. Subchefia de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais [et al.]. Brasília: Presidência da República, 2018.

BRASIL. Tribunal de Contas da União. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU/ Tribunal de Contas da União. – 4. ed. rev., atual. e ampl. – Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência: Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010.

BRASIL, Tribunal de Contas da União. Portaria-SEGECEX Nº 27 DE 24 DE OUTUBRO DE 2017. Atualiza o documento “Glossário de Termos do Controle Externo”, 2007.

BRASIL, Tribunal de Contas da União. Referencial Básico de Gestão de Riscos, 2018.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 31.ed. Rev.Atual.Ampl. São Paulo: Atlas, 2017.

CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de Gestão Pública Gerencial. 3ª ed. Revista e ampliada. Belo Horizonte: Fórum, 2014.

_____. Ensaio avançado de controle interno: profissionalização e responsividade. 1ª Reimpressão. Belo Horizonte: Fórum, 2016.

Page 299: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

299

COSO. Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission. Enterprise risk management: Integrating with Strategy and Performance. Executive summary, 2017.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 31ª. Rev. Atual. Ampl., Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018

DIAS NETO, Antônio Alves. Gestão de resíduos sólidos: uma discussão sobre o papel das políticas públicas e arranjos institucionais do estado, UFBA, 2009. Programa de Pós-graduação em Engenharia Ambiental Urbana da Universidade Federal da Bahia.

EMERY, Emerson Baldotto. Desenvolvimento sustentável – Princípio da eficiência em procedimentos licitatórios. Belo Horizonte: Fórum, 2016.

FAISTEL, F. Meio ambiente, políticas ambientais e desenvolvimento sustentável. Revista Campus, Paripiranga, v. 1, n. 1, p. 134-161, 2008.

FREITAS, Juarez. Princípio da Sustentabilidade: Licitações e a Redefinição da Proposta Mais Vantajosa. REVISTA DO DIREITO UNISC, SANTA CRUZ DO SUL Nº 38│p. 74- 94│JUL-DEZ 2012

GUERRA, Evandro Martins. Os controles externos e internos da administração pública. 2ª ed. Ver. e ampl. 2ª Reimpressão. Belo Horizonte: Fórum, 2011.

GOUVEIA, Nelson, Resíduos sólidos urbanos: impactos socioambientais e perspectiva de manejo sustentável com inclusão social. Ciência & Saúde Coletiva [en linea] 2012, 17 (Junio-Sin mes): [Fecha de consulta: 8 de diciembre de 2016] Disponível em: <http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=63023390015> ISSN 1413-8123

Page 300: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

300

GRIPPI, Sidney. Lixo: reciclagem e sua história: guia para as prefeituras brasileiras. 2.ed. Rio de Janeiro: Interciência, 2006.

GUIMARÃES, Edgar. Lei das Estatais: comentários ao regime jurídico licitatório e contratual da Lei n° 13.303/2016/ Edgar Guimarães, José Anacleto Abduch Santos – Belo Horizonte: Fórum, 2017.

INTOSAI. International Organization of Supreme Audit Institutions. INTOSAI GOV 9100: Guidelines for internal control standards for the public sector, 2004.

INTOSAI. International Organization of Supreme Audit Institutions. INTOSAI GOV 9130: Guidelines for Internal Control Standards for the Public Sector - Further Information on Entity Risk Management, 2007.

JACOBY FERNANDES, Jorge Ulisses. Tribunais de Contas do Brasil: jurisdição e competência. 4º ed. Ver. atual. E ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2016.

JUSTEN FILHO, Marçal. A constitucionalidade da Lei 13.303/2016: a distinção entre sociedades estatais “empresárias” e “não empresárias”. In: Revista Eletrônica da PGE RJ, v. 1, n. 1, 2018. Disponível em: http://www.revistaeletronica.pge.rj.gov.br/comum/code/MostrarArquivo.php?C=MTE3

_____. JUSTEN FILHO, Marçal. A contratação sem licitação nas empresas estatais. Estatuto jurídico das empresas estatais: Lei 13.303/2016. Marçal Justen Filho, org. São Paulo: Editora RT, 2016.

Page 301: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

301

_____. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. - 16ª Ed. Rev. Atual. Ampl., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.

_____. JUSTEN FILHO, Marçal. Desenvolvimento nacional sustentado – contratações administrativas e o regime introduzido pela lei nº 12.349/101. Informativo Justen, Pereira, Oliveira e Talamini, Curitiba, n. 50, abril 2011. Disponível em: http://www.justen.com.br//informativo. php?informativo=50&artigo=528

_____. JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.

NIEBUHR, Joel de Menezes. Regulamento de Licitações e Contratos das Estatais. Revista Colunistas. Direito do Estado. ANO 2016 NUM 307. Disponível em: http://www.direitodoestado.com.br/colunistas/joel-de-menezes-niebuhr/regulamento-de-licitacoes-e-contratos-das-estatais.

PORTER, Michael E. A Vantagem Competitiva das nações, Campus, Rio de Janeiro, Campus, 1989.

_____. Estratégia Competitiva: técnicas para análise de indústrias e da concorrência. 2ª Edição, Rio de Janeiro: Elsevier, 2004 – 3ª reimpressão, Michael E. Porter; tradução de Elizabeth Maria de pinho Braga.

SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o Século XXI. In BURSZTYN, Marcel et al. Para pensar o desenvolvimento sustentável. São Paulo: Brasiliense, 1993)

Page 302: Caroline Rodrigues da Silva THIAGO BENO DE OLIVEIRA...Editora JML Rua Mandaguaçu, 534 - Sobre Loja, Bairro Emiliano Perneta, Pinhais - PR. CEP: 83324-430 Central de Relacionamento

MA

NU

AL

DA

S E

STA

TAIS

C

ar

ol

ine

Ro

dr

igu

es

da

Sil

va

|

T

HIA

GO

BU

EN

O D

E O

LIV

EIR

A

302

SANTAELLA, Sandra Tédde, et al. Resíduos sólidos e a atual política ambiental brasileira. Fortaleza: UFC/ LABOMAR/ NAVE, 2014.

SANTANA, Jair Eduardo, GUIMARÃES, Edgar. Licitações e o Novo Estatuto da Pequena e Microempresa: Reflexos Práticos da LC n°123/06. 2.ed. atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

SANTOS, José Anacleto Abduch. Licitações e o Estatuto da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte. 1. Ed. Curitiba: Juruá Editora, 2008. v. 1.

SCHVARSBERG, Benny; Martins, Giselle C.; Cavalcanti,Carolina B.. Estudo de Impacto de Vizinhança: Caderno Técnico de Regulamentação e Implementação/ Benny Schvasrberg, Martins, Giselle C., Kallas, Luana M. E.; Cavalcanti, Carolina B.; Teixeira, Letícia M.. Brasília: Universidade de Brasília, 2016.

SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Contratual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

YAKER, Farid, et.al. O trabalho do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente na promoção das Compras Públicas Sustentáveis. In Panorama de licitações sustentáveis: direito e gestão pública. Coord. VILLAC, Teresa; BLIANCHERIS, Marcos Weiss; SOUZA, Lilian Castro de. Belo Horizonte: Fórum 2014.

YOSHIDA, Consuelo. Competência e as diretrizes da PNRS: conflitos e critérios de harmonização entre as demais legislações e normas. In: JARDIM, Arnaldo; YOSHIDA, Consuelo; FILHO, José Valverde Machado. [organ.] Política nacional, gestão e gerenciamento de resíduos sólidos. Barueri, SP: Manole, 2012)