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CARACTERÍSTICAS ANALÍTICAS DE VINAGRES COMERCIAIS DE VINHOS BRASILEIROS 1 Luiz Antenor RIZZO 2, Alberto MIELP RESUMO A matéria-prima utilizada para a elaboração do vinagre é variável de acordo com sua disponibilidade em cada país. No Brasil, os vinagres são elaborados principalmente a partir do álcool de cana-de-açúcar e do vinho. O objetivo do presente trabalho foi caracterizar o vinagre brasileiro encontrado no comércio e identificado através do rótulo como sendo elaborado a partir de vinho, em função de sua constituição química e do tipo - tinto e branco. Analisaram-se 13 amostras de diferentes marcas comerciais de vinagres de vinho branco e 16 de vinho tinto. Além das variáveis que possuem limites estabelecidos pela legislação brasileira - álcool, acidez volátil, extrato seco reduzido, cinzas e cloretos- determinaram-se acetato de etila, metanol, prolina, A 420nm, A 520nm, pH, alcalinidade das cinzas, densidade e os minerais K, Na, Ca, Mg, Mn, Fe, Cu, Zn e P. As análises foram efetuadas através de métodos físico-químicos, utilizando- se técnicas de cromatografia em fase gasosa e espectrofotometria de absorção e emissão atômica. Os resultados, submetidos à análise de componentes principais, mostraram que os três primeiros eixos explicam 71,7% e 68,3% da variação total, para os vinagres comerciais de vinho branco e tinto, respectivamente. Os vinagres de vinho tinto apresen- tam valores mais elevados de densidade, metanol, prolina eK em relação aos vinagres comerciais de vinho branco. Constatou-se elevada variabilidade na composição química dos vinagres das diferentes empresas produtoras. PALAVRAS-CHAVE: Elementos minerais; Compostos voláteis; Enologia; Vinagre. SUMMARY ANALYTICAL CHARACTERISTICS OF COMMERCIAL BRAZILIAN WINE VINEGARS The raw material used for the elaboration of vinegar varies according to its availability in each country. Brazilian vinegars are mainly elaborated from sugar cane alcohol and wine. For this reason a reasonable volume of wine is used to make vinegar. The objective of this work was to analyze Brazilian vinegars, both red and white, made from wine as specified by the label, with respect to their chemical composition and type. Sixteen samples of red and 13 of white wine vinegars, of different trademarks, were analyzed. Besides the variables specified by the Brazilian legislation (alcohol, volatile acidity, reduced dry extract, ash and chloride), the following analyses were performed: ethyl acetate, methanol, proline, A 420nm, A 520nrn, pH, ash alkalinity, density, K, Na, Ca Mg, Mn, Fe, Cu, Zn and P. The analyses were performed by physico-chemical methods, gas chromatography, atomic absorption spectrophotometry and atomic emission spec- trophotometry. The data, submitted to the principal component analysis (PCA), showed that the first three axes explai- ned 71.7% and 68.3% of the total variation of the commercial white and red wine vinegars, respectively. The red vinegars showed higher values for methanol, proline and K than the white ones. KEY WORDS: Mineral elements; Volatile compounds; Enology; Vinegar. 1 Recebido para publicação em 15/05/1998. Aprovado para publicação em 22/10/1998. Z Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa - Centro Nacional de Pesquisa de Uva e Vinho, Caixa Postal 130, 95700-000 Bento Gonçalves, RS. E-mail: [email protected]. Autor para correspondência. 3 Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, 95700-000 Bento Gonçalves, RS. Bolsista do CNPq. E-mail: [email protected]. Braz. J. Food Technol., Campinas, 1(1,2): 25-31, janldez.1998 L- _ 25

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CARACTERÍSTICAS ANALÍTICAS DE VINAGRES COMERCIAISDE VINHOS BRASILEIROS 1

Luiz Antenor RIZZO 2, Alberto MIELP

RESUMO

A matéria-prima utilizada para a elaboração do vinagre é variável de acordo com sua disponibilidade em cada país.No Brasil, os vinagres são elaborados principalmente a partir do álcool de cana-de-açúcar e do vinho. O objetivo dopresente trabalho foi caracterizar o vinagre brasileiro encontrado no comércio e identificado através do rótulo comosendo elaborado a partir de vinho, em função de sua constituição química e do tipo - tinto e branco. Analisaram-se 13amostras de diferentes marcas comerciais de vinagres de vinho branco e 16 de vinho tinto. Além das variáveis quepossuem limites estabelecidos pela legislação brasileira - álcool, acidez volátil, extrato seco reduzido, cinzas e cloretos­determinaram-se acetato de etila, metanol, prolina, A 420nm, A 520nm, pH, alcalinidade das cinzas, densidade e osminerais K, Na, Ca, Mg, Mn, Fe, Cu, Zn e P. As análises foram efetuadas através de métodos físico-químicos, utilizando­se técnicas de cromatografia em fase gasosa e espectrofotometria de absorção e emissão atômica. Os resultados,submetidos à análise de componentes principais, mostraram que os três primeiros eixos explicam 71,7% e 68,3% davariação total, para os vinagres comerciais de vinho branco e tinto, respectivamente. Os vinagres de vinho tinto apresen­tam valores mais elevados de densidade, metanol, prolina e K em relação aos vinagres comerciais de vinho branco.Constatou-se elevada variabilidade na composição química dos vinagres das diferentes empresas produtoras.

PALAVRAS-CHAVE: Elementos minerais; Compostos voláteis; Enologia; Vinagre.

SUMMARY

ANALYTICAL CHARACTERISTICS OF COMMERCIAL BRAZILIAN WINE VINEGARS

The raw material used for the elaboration of vinegar varies according to its availability in each country. Brazilianvinegars are mainly elaborated from sugar cane alcohol and wine. For this reason a reasonable volume of wine is usedto make vinegar. The objective of this work was to analyze Brazilian vinegars, both red and white, made from wine asspecified by the label, with respect to their chemical composition and type. Sixteen samples of red and 13 of white winevinegars, of different trademarks, were analyzed. Besides the variables specified by the Brazilian legislation (alcohol,volatile acidity, reduced dry extract, ash and chloride), the following analyses were performed: ethyl acetate, methanol,proline, A 420nm, A 520nrn, pH, ash alkalinity, density, K, Na, Ca Mg, Mn, Fe, Cu, Zn and P. The analyses were performedby physico-chemical methods, gas chromatography, atomic absorption spectrophotometry and atomic emission spec­trophotometry. The data, submitted to the principal component analysis (PCA), showed that the first three axes explai­ned 71.7% and 68.3% of the total variation of the commercial white and red wine vinegars, respectively. The red vinegarsshowed higher values for methanol, proline and K than the white ones.

KEY WORDS: Mineral elements; Volatile compounds; Enology; Vinegar.

1 Recebido para publicação em 15/05/1998. Aprovado para publicação em 22/10/1998.Z Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa - Centro Nacional de Pesquisa de Uva e Vinho, Caixa Postal 130, 95700-000Bento Gonçalves, RS. E-mail: [email protected]. Autor para correspondência.3 Engenheiro Agrônomo, Pesquisador, Embrapa Uva e Vinho, Caixa Postal 130, 95700-000 Bento Gonçalves, RS. Bolsista doCNPq. E-mail: [email protected].

Braz. J. Food Technol., Campinas, 1(1,2): 25-31, janldez.1998L- _ 25

1. INTRODUÇÃO

2. MATERIAL E MÉTODOS

O vinho e o vinagre foram os dois primeiros pro­dutos de fermentação espontânea utilizados pelohomem na alimentação (LLAGUNO, 1987), sendovinagre, o produto obtido da acetificação do vinho.No entanto, a matéria-prima utilizada para sua ela­boração é variável em função da disponibilidade decada país. Assim, na Itália, Espanha, França e Gré­cia, países de grande tradição vitícola, o vinagre é'feito sobretudo de vinho. No Brasil, os vinagres sãoelaborados principalmente a partir do álcool de cana­de-açúcar e do vinho. Na China e no Japão, o vinagreé produzido a partir do arroz, enquanto nos EstadosUnidos e Inglaterra, a partir da sidra e do malte. NaAlemanha é mais utilizado o vinagre de álcool. Alémdessas matérias-primas, foram também experimenta­dos os fermentados de abacaxi, de manga, de bananae de caqui (RICHARDSON, 1967, ADAMS, 1978,ZANCANARO, AQUARONE, 1981, AQUARONE,ZANCANARO, 1983, PEIXOTO et aI., 1987, 1989).

No Brasil, os maiores produtores de vinagre se con­centram no Estado de São Paulo. Estima-se que sejamproduzidos anualmente mais de 100 milhões de li­tros de vinagre, havendo, por isso, demanda de vi­nho para atender às necessidades desse setor da agro­indústria.

O processo industrial mais difundido é o que utili­za cultura submersa, através de forte aeração, comacetificadores do tipo Frings. O método Orleans maislento é utilizado apenas nos estabelecimentos de pe­queno porte, quando o objetivo é obter um produto demelhor qualidade.

Quanto à composição química do vinagre brasilei­ro, as informações são reduzidas. A legislação esta­belece parâmetros apenas para os teores de acidezvolátil, extrato seco reduzido, álcool, cinzas, cloretose sulfato (BRASIL, 1974). De outra parte, o estudo daconstituição química do vinagre é de fundamentalimportância, pois está relacionada com a qualidade,a tecnologia e a matéria-prima utilizada na sua ela­boração.

O presente trabalho teve o objetivo de estudar acomposição química de vinagres comerciais de vi­nho brasileiros e de caracterizá-los através da análi­se de componentes principais (ACP).

marcas comerciais da empresa A; 4, 5 e 6, da B; 7 e 8,da C; 9 e lO, da D; lI, 12 e 13, de E, F e G.

Os vinagres de vinho tinto pertenciam às mesmassete empresas produtoras. Os vinagres 1,2, 3 e 4 per­tenciam à empresa A; 5, 6, 7 e 8, à B; 9,10 e lI, à C; 12e 13, à D; 14, 15 e 16, à E, F e G.

As amostras foram coletadas em supermercadospor técnicos do Serviço de Inspeção Federal, do Mi­nistério da Agricultura, e analisadas no Laboratóriode Enoquímica do Centro Nacional de Pesquisa deUva e Vinho da EMBRAPA, em Bento Gonçalves, RS.

As determinações dos elementos minerais e doscompostos voláteis foram feitas em duplicata. As aná­lises do extrato seco (EXT), extra to seco reduzido(ESR), cinzas (CIN), alcalinidade das cinzas (ALC),pH e cloretos (CLO) foram efetuadas conforme meto­dologia oficial de análises de bebidas e vinagres (BRA­SIL,1986).

A densidade relativa a 20/20°C (DEN) foi determi­nada através de um densímetro digital ANTONPAAR. A acidez total (ACT) foi obtida através de titu­lação de 1mL de vinagre com uma solução alcalinade hidróxido de sódio O,lmol L-I. A acidez fixa (ACF)foi determinada através da titulação do resíduo secoobtido por evaporação de 25mL de vinagre, a 100°C,depois de previamente diluído em água destilada. Aacidez volátil (ACV) foi obtida pela diferença entre aacidez total e a acidez fixa. Os açúcares redutorestotais (AÇR) foram analisados depois da reação deuma determinada quantidade de solução cupro-al­calina com a amostra de vinagre. O excesso de íonscúpricos foi determinado por titulação com tiossulfa­to de sódio (MEYER, LEYGUE-ALBA, 1991).

A absorbância a 420nm (A 420), a absorbância a520nm (A 520), a intensidade de cor (INT) e a colora­ção (COR) foram determinadas por espectrofotome­tria, de absorção na região do visível, utilizando-secubetas de 1mm de percurso óptico para os vinagresde vinho tinto e de 10mm de percurso óptico para osvinagres de vinho branco.

A prolina (PRO) foi analisada através de métodocolorimétrico com a ninidrina (AMERINE, OUGH,1976). Os compostos voláteis, acetato de etila (ACE),metanol (MET) e etanol (ETA) foram determinados porcromatografia em fase gasosa. Utilizou-se um apare­lho equipado com um detector de ionização de cha­ma e uma coluna de aço inoxidável com 5% de Carbo­wax 600 como fase estacionária e Chromosorb W de60 a 80 Mesh como suporte, de 3,2m de comprimentoe com 1/8" de diâmetro interno. Para a determinação

Foram analisadas 13 amostras de vinagres de vi- do acetato de etila e do metanol, a amostra de vinagrenho branco e 16 amostras de vinagre de vinho tinto. (3mL), previamente destilada, foi injetada diretamenteAs amostras dos vinagres de vinho branco pertenci- no aparelho após ter recebido 10% do volume de umaam a sete empresas produtoras designadas pelas le- solução de l,Og L-I de 4-metil-2-pentanol (padrão in-tras A, B, C, D, E, F e G. Os vinagres I, 2 e 3 eram terno). No caso da determinação do etanol, utilizou-

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se uma solução de metanol a 5% como padrão inter­no (BERTRAND, 1975).

Os cátions Ca, Mg, Mn, Fe, Cu e Zn foram determi­nados por espectrofotometria de absorção atômica,enquanto o K e o Na, por emissão atômica em chama(PERKIN-ELMER, 1976). O P foi determinado por co­lorimetria, utilizando o molibdato de amônio.

Os resultados obtidos foram submetidos à análisede componentes principais (ACP) (FOUCART, 1982,ROSIER, 1994), através do programa STAT-ITCF de-

senvolvido por PHILIPPEAU (1986) no Instituto Téc­nico dos Cereais e Forrageiras da França.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O teor médio, mínimo e máximo das variáveis ava­liadas, nas 13 amostras de vinagre de vinho branco enas 16 amostras de vinagre de vinho tinto, estão indi­cados na Tabela 1.

TABELA 1. Características analíticas dos vinagres comerciais de vinhos branco etinto brasileiros.

Vinagres de vinho branco Vinagres de vinho tinto

Variáveis Mínimo Máximo Médio* Mínimo Máximo Médio*

Densidade a 20/20ºC (g L") 1008,3 1010,6 1009,9 1009,1 1010,9 1010,3

Etanol (g L") 0,4 3,6 1,5 0,6 5,7 1,3

Metanol (mg L'l ) 0,1 29,2 3,8 5,0 36,2 19,3

Acetato de etila (mg L'l ) 66 361 189 22 715 186

Acidez total (g 100mL·1 ác. acético) 4,20 4,68 4,49 4,20 5,28 4,59

Acidez volátil (g 100mL" ác. acético) 4,09 4,49 4,34 4,08 5,15 4,40

Acidez fixa (g 100mL·1 ác. acético) 0,06 0,23 0,15 0,10 0,33 0,18

pH 2,65 2,88 2,76 2,69 2,88 2,77

Extrato seco (g L") 6,18 11,2 9,32 6,0 12,0 9,78

Extrato seco reduzido (g L") 6,8 10,3 8,22 6,0 11,2 8,86

Açúcares redutores totais (g L") 0,4 3,1 2,04 0,7 3,1 1,88

Cinzas (g L'l ) 1,3 1,8 1,50 1,1 2,2 1,46

Alcalinidade das cinzas (meq L") 5,6 14,0 8,40 5,2 13,6 8,58

Absorbância a 420nm 0,043 0,212 0,114 0,003 0,072 0,047

Absorbância a 520nm 0,023 0,073 0,048

Intensidade de cor (A420nm + A520nm) 0,048 0,145 0,096

Coloração (A420nm/A520nm) 0,827 1,340 0,998

Prolina (mg L'l ) 1,3 34,2 9,6 5,4 37,1 16,2

Cloretos (mg L") 63 1123 262 37 1100 167

K (mg L") 71 508 330 236 857 425

Na (mg L") 20 526 217 20 557 123

Ca (mg L'l ) 32 200 82 37 179 84

Mg (mg L") 7 25 16,4 12 38 24,9

Mn (mg L") 0,2 6,7 2,5 0,3 7,2 2,6

Fe (mg L'l ) 0,5 2,7 1,4 1,5 24,4 4,0

Cu (mg L') 0,1 0,7 0,17 0,1 0,6 0,16

Zn (mg L') 0,1 0,5 0,17 0,1 0,6 0,25

P (mg L'l ) 42 204 109 15 184 114

(.) Análises não aplicáveis aos vinagres de vinho branco.(*) Para vinagres de vinho branco foram utilizadas 13 amostras e para vinagres de vinho tinto, 16 amostras.

Os resultados evidenciaram teores baixos de acetatode etila, metanol, prolina e Mg nos vinagres brasileiros,em comparação com os valores encontrados por MEC­CA et alo (1979) nos vinagres italianos e por LLAGUNO,

POLO (1991) nos vinagres espanhóis. Em relação aosvinhos brasileiros, os vinagres apresentaram teores maiselevados de Na, P e cloretos e mais baixos de K e Mg(RIZZON, SALVADOR, 1987). Três vinagres comerciais

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EXT

ALC

ACVACT

Ca ACFDEN

Na

p

CLO A420 E A

A E

cm

AÇR

K

FIGURA 1. Círculo das correlações do plano for­mado pelos eixos 1 e 2 - Vinagres de vinho branco.Legenda: DEN - densidade; ETA - etanol; MET ­metanol; ACE - acetato de etila; ACT - acidez total;ACV - acidez volátil; ACF - acidez fixa; pH; EXT ­extrato seco; E5R - extrato seco reduzido; AÇR ­açúcares redutores; CIN - cinzas; ALC - alcalini­dade das cinzas; A 420 - absorbância a 420nm;PRO - prolina; CLO - cloretos; K; Na; Ca; Mg; Mn;Fe; Cu; Zn e P.

As variáveis que participaram na formação do eixo1, em ordem decrescente de importância foram: ex­trato seco reduzido (E5R), prolina (PRO), extrato seco(EXT), alcalinidade das cinzas (ALC), pH, acidez fixa(ACF), acidez total (ACT), densidade (DEN), Zn, Fe,acidez volátil (ACV) e metanol (MET).

O extrato seco reduzido (E5R) e a prolina (PRO)são componentes que conferem estrutura ao vinagree cujos teores estão relacionados com o vinho-baseutilizado. As variáveis responsáveis pela acidez, al­calinidade das cinzas (ALC), pH, acidez volátil (ACV),acidez fixa (ACF) e acidez total (ACT) também sãodependentes da composição inicial dos vinhos. Noentanto, como a legislação brasileira estabelece em4% o teor mínimo de acidez volátil para os vinagresbrasileiros, o efeito da matéria-prima é menos evidenteem conseqüência da diluição efetuada, pois o teor deácido acético do vinagre obtido a partir do vinho ésempre superior ao teor mínimo estabelecido pelalegislação.

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As variáveis que participaram da ACP e as corre­lações com os dois principais eixos são indicadas naTabela 2. Os três primeiros eixos explicam 71,7% davariação total. Nesse trabalho, estudaram-se os doisprimeiros eixos que contém 33,0% e 23,9%, respecti­vamente, da variação total. A projeção das variáveisno plano formado pelos dois principais eixos é indi­cada na Figura 1.

3.1 Análise de componentes principais dos vinagresde vinho branco

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de vinho tinto apresentaram menos de 7,Og L-I de ex­trato seco reduzido, valor mínimo estabelecido pelalegislação brasileira. No entanto, todos os vinagresde vinho tinto se enquadraram nos limites da legisla­ção quanto ao teor alcoólico, acidez volátil e cinzas.Observou-se variabilidade acentuada nos teores decloretos, K, Na e Ca nos vinagres analisados.

Além das variáveis relacionadas com a cor, os vi­nagres tintos apresentaram valores de densidade, me­tanol, prolina e K mais elevados em relação aos vina­gres brancos.

TABELA 2. Correlação entre as variáveis dos vina-gres de vinhos branco e os dois principais eixos.

Variáveis Eixos

1 2

Densidade a 20/20QC (g L-') DEN 0,7399' 0,0687

Etanol (g L') ETA 0,0180 -0,6914'

Metanol (mg L") MET 0,6748' 0,2882

Acetato de etila (mg L') ACE 0,0154 -0,8071'

Acidez total (g 100mL" ác. acético) ACT 0,7647* 0,2105

Acidez volátil (g 100mL-1 ác, acético) ACV 0,6843' 0,2272

Acidez fixa (g 100mL-' ác, acético) ACF 0,7844' 0,1393

pH pH 0,7902* -0,0662

Extrato seco (g L") EXT 0,7965' -0,2971

Extrato seco reduzido (g L-') E8R 0,8869' -0,0804

Açúcares redutores totais (g L") AÇR 0,2705 -0,5079

Cinzas (g L-') CIN -0,0927 -0,8571'

Alcalinidade das cinzas (meq L') ALC 0,7958' -0,2988

Absorbância a 420nm A 420 0,1364 -0,7174'

Prolina (mg L") PRO -0,8425' -0,1717

Cloretos (mg L") CLO -0,4033 -0,7258*

K (mg L") K -0,4904 0,7081'

Na (mg L") Na 0,0520 -0,9349'

Ca (mg L-') Ca 0,5074 0,1254

Mg (mg L") Mg -0,5899 -0,2252

Mn (mg L') Mn -0,1822 -0,0393

Fe (mg L') Fe -0,7169* -0,2850

Cu (mg L") Cu -0,0645 0,0450

ln (mg L') ln -0,7251' 0,2242

P(mgL') P 0,0186 0,9074'

'Correlações consideradas importantes.

3.2 Análise de componentes principais de vinagres devinho tinto

FIGURA 2. Projeção dos vinagres de vinho bran­co sobre o plano formado pelos eixos 1 e 2.

As variáveis que participaram da ACP e as correla­ções com os dois principais eixos são indicadas na Ta­bela 3. Os três primeiros eixos explicam 68,3% da vari­ação total. No presente trabalho, estudaram-se os doisprimeiros que explicam 30,9% e 20,9%, respectivamen­te, da variação total. A projeção das variáveis no planoformado pelos dois principais eixos é indicada na Fi­gura 3. As variáveis que contribuíram na formação doeixo 1, em ordem decrescente de importância foram: al­calinidade das cinzas (ALC), absorbância a 420nrn (A420), prolina (PRO), Mg, absorbância a 520nrn (A 520),intensidade de cor (INT), pH, P, cinzas (CIN), densida­de (DEN) e metanol (MET) (Figura 3).

Os vinagres 4, 5 e 6 (empresa B) e 7 e 8 (empresa C)formaram outro grupo, pois apresentaram composiçãoquímica semelhante. Esses vinagres se identificam peloelevado teor de P, baixo de Na, cinzas (CIN), cloretos(CLO) e acetato de etila (ACE). Da mesma maneira queos vinagres da empresa A, eles também possuem extra­to seco (EXT) mais elevado e prolina (PRO) e metanol(MET) mais baixos.

Os vinagres 9 e 10 (empresa D) se identificam porapresentar teor mais elevado de Na, cloretos (CLO) ecinzas (CIN) e mais baixos de P, K e metanol (MET). Demodo geral, a composição química desses vinagres foimais influenciada pela utilização de produtos enológi­cos no processamento.

Os vinagres 12 e 13 (empresas F e G) podem ser con­siderados os mais genuínos em relação à matéria-pri­ma utilizada na elaboração, pois tiveram teores maiselevados de prolina (PRO), metanol (MET), K e Mg.

2

1

8 7

11

10

13

12

&xol

Entre as variáveis que compõem o eixo 1, a pro­lina (PRO) e o metanol (MET) conferem genuinida­de aos vinagres de vinho. Assim, a concentraçãode prolina no vinagre deve ser proporcional a dovinho, por ser um de seus aminoácidos mais im­portantes, e por ser pouco metabolizada pelas le­veduras no processo de fermentação alcoólica (US­SEGLIO-TOMASSET, BOSIA, 1990) e pelas bactéri­as acéticas. No entanto, uma vez que os vinhos uti­lizados para elaboração de vinagre no Brasil sãode uvas americanas (Vitis labrusca), que possuemmenor teor de prolina (RIZZON et al., 1993), a con­centração desse aminoácido nos vinagres de vinhobranco analisados foi baixa.

O metanol (MET) é um álcool encontrado natu­ralmente nos vinhos e conseqüentemente nos vi­nagres de vinho, uma vez que não é degradadopelas bactérias acéticas (LLAGUNO, 1977, MEC­CA et al., 1979; LLAGUNO, paLO, 1991). Assim,como no caso da prolina, o teor de metanol do vi­nagre de vinho deve ser proporcional ao do vinho­base utilizado na acetificação.

O eixo 2 é formado por um conjunto de elemen­tos minerais que compõem as cinzas dos vinagres,tais como Na, P, cinzas (CIN), cloretos (CLO) e K.

Além desses constituintes, também participamdo eixo 2 os compostos voláteis: acetato de etila(ACE), o etanol (ETA) e a absorbância a 420nm (A420), variável relacionada à cor dos vinagres devinho branco. O Na é o elemento mineral que maisse identifica com esse eixo, pois o teor desse cátioné muito influenciado por produtos enológicos, taiscomo bentonite, gelatina e caseína (MANFROI etal., 1994). O P por sua vez está presente nos vinhose vinagres na forma de fosfatos. O seu teor podeestar relacionado com a adição de ativadores decrescimento para as bactérias acéticas.

Quanto à projeção dos vinagres de vinho brancono plano formado pelos eixos 1 e 2 (Figura 2), ob­servou-se dispersão acentuada das amostras dasdiferentes empresas produtoras. No entanto, cons­tataram-se semelhanças entre as marcas comerci­ais de cada empresa. Assim, os vinagres 1, 2 e 3,pertencentes à empresa A, se caracterizaram porapresentar teor mais elevado de extra to seco (EXT)e de acidez. O valor mais elevado de pH pode estarrelacionado com a alcalinidade das cinzas (ALC).Esses vinagres se identificaram também por apre­sentar baixos teores de prolina (PRO), metanol(MET) e K, componentes que conferem genuinida­de ao vinagre. Observa-se que a composição des­ses vinagres foi muito influenciada pela matéria­prima utilizada na acetificação.

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TABELA 3" Correlação entre as variáveis dos vina­gres de vinho tinto e os dois principais eixos.

Variáveis

Densidade a 20/209C (9 L-')

Etanol (g L")

Metanol (mg L"I)

Acetato de eUla (mg l-I)

Acidez total (9 l00ml·1 ác. acético)

Acidez volátil (g lOOmL'! ác. acético)

Acidez fixa (g 100mL-1 ác. acético)

pH

ExtraIo seco (9 L"')

ExtraIo seco reduzido (9 L")

Açúcares redutores totais (g L"I)

Cinzas (9 L-1)

Alcalinidade das cinzas (meq L")

Absorbãncia a 420nm

Absorbãncia a 52Qnm

Intensidade de cor (A 420 + A 520)

Coloração (A 420/A 520)

Prolina (mg L"')

Cloretos (mg L"')

K (mg L")

Na (mg L")

Ca (mg L")

Mg (mg L")

Mn (mg L")

Fe (mg L")

Cu (mg L")

Zn (mg L")

P (mg L")

·Correlações consideradas importantes.

DENETAMETACE

ACTACV

ACFpH

EXTESA

AÇA

CIN

ALCA 420

A 520

INT

COA

PAO

CLOK

Na

Ca

Mg

Mn

Fe

Cu

Zn

P

0,5696

0,0729

0,5380

0,2814

0,3573

0,3448

-0,0195

0,7371"

0,1755

0,3916

-0,2605

0,5743

0,9484"

0,9477*

0,8267"

O,900P'

0,2454

0,9364"

-0,1079

0,0738

0,3012

0,5176

0,9114"

-0,5305

0,5709

0,0949

0,2819

-0,6687*

Eixos

-0,3039

-0,1372

0,5305

0,0419

0,2193

0,3954

-0,8839"

-0,3236

-0,8894"

-0,8783"

-0,5633

0,3126

-0,2089

-0,1930

-0,4242

-0,3170

0,7409"

0,2664

0,0711

0,1555

0,2065

-0,5250

0,1132

-0,1468

0,4799

-0,2214

0,8091"

-0,2925

Entre as variáveis que participaram da formaçãodo eixo 1, algumas estão relacionadas com a genuini­dade do vinagre de vinho tinto, como a prolina (PRO),Mg e alcalinidade das cinzas (ALe); outras, como aintensidade de cor (INT), a absorbância a 420nm (A420) e a absorbância a 520nm (A 520), participam doaspecto do vinagre.

O eixo 2 é formado por variáveis responsáveis pelaestrutura do vinagre de vinho tinto, como é o caso doextrato seco (EXT), extrato seco reduzido (E5R), aci­dez fixa (ACF), coloração (COR) e Zn.

A distribuição dos vinagres comerciais de vinhotinto no plano formado pelos eixos 1 e 2 é indicada naFigura 4.

16

10

11

14

FIGURA 4" Projeção dos vinagres de vinho tinto so­bre o plano formado pelos eixos 1 e 2.

Da mesma forma que para os vinagres de vinho bran­co, observou-se, também para os vinagres de vinho tin­to, uma dispersão acentuada entre as empresas e seme­lhança entre os vinagres da mesma empresa. Assim, osvinagres 1,2,3 e 4 (empresa A) apresentaram composi­ção química diferente em relação aos vinagres 5, 6, 7 e 8(empresa B). Desse modo, os vinagres da empresa A,juntamente com o vinagre 16 (empresa G), se caracteri­zaram por apresentar teores elevados de prolina (PRO),Mg e Metanol (MET), variáveis que lhes conferem genu­inidade. Os vinagres da empresa B, ao contrário, tive­ram teores baixos desses elementos. No entanto, apre­sentaram altos teores de P e Mn, constituintes possivel­mente provenientes da adição de ativadores de cresci­mento para as bactérias.

Os vinagres 9, 10 e 11 (empresa e) e o vinagre 14(empresa E) foram similares, devido ao teor baixo de

ln

COR

METFe

ACVCIN

ACT NaK

CLO ACE

Mn

ETACu

P DEN pH INT

AÇR A520C.

ACF EXT ESR

FIGURA 3" Círculo das correlações do plano formadopelos eixos 1 e 2 - Vinagres de vinho tinto. Legenda:DEN - densidade; ETA - etanol; MET - metanol; ACE ­acetato de etila; ACT - acidez total; ACV - acidez volátil;ACF - acidez fixa; pH; EXT - extrato seco; E5R - extratoseco reduzido; AÇR - açúcares redutores; CIN - cinzas;ALC - alcalinidade das cinzas; A 420 - absorbância a420nm; A 520 - absorbância a 520nm; INT - intensida­de de cor; COR - coloração; PRO - prolina; CLO - clore­tos; K; Na; Ca; Mg; Mn; Fe; Cu; Zn e P.

6 5

7

13

12

15

1 2

34

30 Braz. J. Food Technol., Campinas, 1(1,2): 25-31, jan/dez.1998______________----1

extrato seco (EXT). Os três vinagres da empresa Capresentaram menos de 7,Og L-1 de extrato seco, que éo valor mínimo estabelecido pela legislação brasilei­ra, para vinagres de vinho tinto.

Os vinagres 12 e 13 (empresa O) apresentaram emcomum teores de P, Ca e extrato seco (EXT) mais elevado.

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