captação - revista backstage€¦ · prefiro gravar com v’acordeon roland já adaptado por mim...

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58 www.backstage.com.br REPORTAGEM Karyne Lins [email protected] Captação O acordeão não é utilizado somente para gravar forró. Ao contrário do que se pensa e dependendo do gosto do arranjador, o instrumento é popular nas gravações de outros estilos no Brasil e de fácil captação e mixagem. de acordeão O segredo do acordeão não está nas teclas, mas na técnica de fole, do peito e do braço, e o que vai fazer a diferença não é o instrumento, é a pegada do músi- co. Apesar de ser popular, é incomum o seu uso devido às barreiras de preço, comercialização e por ser bem pesado. Ele é a última opção para quem quer aprender um instru- mento. As pessoas precisam perder o preconceito em rela- ção ao instrumento. Já gravei gospel, pop, rock, qualquer estilo que em seu arran- jo ele possa ser aplicado”, opinou o acordeonista e técnico Leno Maia, que tem em seu currículo gravações com a cantora Cassiane e Banda Quatro Por Um. A interferência dos acordeonistas “Eles querem sempre o melhor timbre possível”, resumiu Manuel Jeneci, que estuda o instrumento há 16 anos. Érico Paiva, Clébio Diniz e Eliseu Ribeiro, que trabalham juntos há quase dez anos e já gravaram com Dominguinhos e Waldeci Araújo, falaram sobre a importância dessa parceria. “Cada músico sabe os limites e virtudes do seu instrumento e nós utilizamos essas informações como base para posicionamento e escolha dos microfones. Sem falar na pega- da e execução de cada acordeonista, que interferem bastante no timbre e, logicamente, na técnica de captação”. Rodolfo Forte, há dez anos gravando acordeão em Fortaleza, gerencia procedimentos para gravação por meio de orientações Leno Maia Fotos: Divulgação

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Page 1: Captação - Revista Backstage€¦ · prefiro gravar com V’Acordeon Roland já adaptado por mim com timbres nordes-tinos. A microfonação tem que estar nas tampas laterais do

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REPORTAGEM

Karyne [email protected]

CaptaçãoO acordeão não é utilizado somente para gravar forró. Ao contrário do quese pensa e dependendo do gosto do arranjador, o instrumento é popularnas gravações de outros estilos no Brasil e de fácil captação e mixagem.

de acordeão

Osegredo do acordeão não está nas teclas, mas natécnica de fole, do peito e do braço, e o que vai fazera diferença não é o instrumento, é a pegada do músi-

co. Apesar de ser popular, é incomum o seu uso devido àsbarreiras de preço, comercialização e por ser bem pesado.Ele é a última opção para quem quer aprender um instru-mento. As pessoas precisam perder o preconceito em rela-ção ao instrumento.

Já gravei gospel, pop, rock, qualquer estilo que em seu arran-jo ele possa ser aplicado”, opinou o acordeonista e técnico LenoMaia, que tem em seu currículo gravações com a cantoraCassiane e Banda Quatro Por Um.

A interferência dos acordeonistas“Eles querem sempre o melhor timbre possível”, resumiu Manuel

Jeneci, que estuda o instrumento há 16 anos. Érico Paiva, ClébioDiniz e Eliseu Ribeiro, que trabalham juntos há quase dez anos e jágravaram com Dominguinhos e Waldeci Araújo, falaram sobre aimportância dessa parceria. “Cada músico sabe os limites e virtudesdo seu instrumento e nós utilizamos essas informações como basepara posicionamento e escolha dos microfones. Sem falar na pega-da e execução de cada acordeonista, que interferem bastante notimbre e, logicamente, na técnica de captação”.

Rodolfo Forte, há dez anos gravando acordeão em Fortaleza,gerencia procedimentos para gravação por meio de orientações

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e dicas, já que o acordeão é bem peculiarem relação à afinação e ao abafamento.Marcos Farias já gravou e acompanhou ZéRamalho, Elba Ramalho, Morais Moreirae foi um dos pioneiros nas gravações evan-gélicas com Shirley Carvalhaes, RoseNascimento e Tuca Nascimento. No seucaso, em particular, ele tem mais influên-cia nessa parte do que o técnico do estú-dio. “Tenho uma timbragem particular eos oriento na captação”.

SonoridadesManuel Jeneci faz eletrificações para

acordeão e alguns músicos que gravamcom seu sistema são Dominguinhos,Sivuca, bandas de forró, e, segundo ele, odesempenho dos acordeões que possuemmicrofone interno pode ser bom, desdeque a eletrificação seja boa. “Domingui-nhos grava muito em estúdio usando doiscanais, um para o baixo e um para teclascom a sanfona em linha”, disse Manuel.

Marcos Farias concorda que o desempe-nho dos acordeões que possuem microfo-ne interno para performances quandobem microfonados são maravilhosos.

“Dependendo da proposta do traba-lho até pode ser admissível. A sonoridadeserve para um trabalho de estúdio. Euprefiro gravar com V’Acordeon Rolandjá adaptado por mim com timbres nordes-tinos. A microfonação tem que estar nastampas laterais do instrumento e não

Rodolfo mostra como faz a captação Erico Paiva, Clebio Diniz e Eliseu Rbeiro Marcos Farias

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dentro do fole, a monitoração tem queestar baixa, com os devidos cortes de fre-qüência e o músico tem que emitir o somde uma maneira bem linear”, explicouMarcos Farias.

Sandro Haick, músico e técnico deestúdio há 15 anos, gravou recentemen-te com Dominguinhos o seu último CD,Conterrâneos, além de Oswaldinho doAcordeon e Alessandro Kramer. Ele pre-fere microfonar o som acústico, mas jágravou trabalhos de Dominguinhos emlinha algumas vezes.

Microfones e formas decaptação“Dependendo de qual acordeão (mar-

ca, modelo com ressonância ou não) e dosmicrofones utilizados e de como foremposicionados, podem ou não servir”, disseRodolfo Forte. Os microfones cardióidessão os mais indicados para captação desteinstrumento porque são pequenos, ativos

e reproduzem com mais fidelidade não sóo som, como o ambiente, a energia e ofole. Os grandes problemas em microfonaracordeões em estúdio são os ruídos mecâ-nicos, por isso o uso de microfones cardiói-des como primeira opção.

Em cada região do Brasil, o acordeãoé conhecido por um apelido diferentedado pela cultura local. Primeiramente, onome correto é acordeão. Esses instru-mentos de sopro e foles possuem divi-sões técnicas e de tessitura como exem-plo, a sanfona do nordeste, a gaita doSul do Brasil, fisiharmônica na Europa,etc. São uma infinidade de modelos, taiscomo as concertinas de oito baixos, osacordeões concerto de baixo solto e assanfonas cromáticas. Em verdade hánomenclaturas diferentes para o mesmoinstrumento e uma infinidade de subdivi-sões para os instrumentos de fole. Naregião sul é chamado de Gaita Gaúcha,Bandaneon, Gaita Ponto. No Nordeste, éapelidado de sanfona, concertina, etc.Os instrumentos de 80 e 120 baixos sãoidênticos. A diferença está na gaita pon-to, pois são de botão e possuem 8 e 12baixos. As técnicas para captação sãoas mesmas, segundo alguns técnicos,mas Rodolfo não concorda. “As técnicassão bem diferentes no ato de tocar, apredileção por determinadas marcas de

Lista de equipamento

instrumentos mais simples ou mais re-quintada fez com que historicamente osirmãos sulistas representassem o tãoamado acordeão de outra forma, tam-bém muito importante. Em relação à cap-tação, não podemos afirmar que haja omesmo esquema, entretanto, devemossugerir o nosso caminho seguindo seuslimites diferenciais”, disse Rodolfo. Manu-el Jeneci explicou que os músicos nor-destinos gostam de dois microfones paradentro da tampa com o baixo bem gravee os músicos gaúchos gostam da captarutilizando os microfones para fora.

Acordeão digital

O acordeão digital tem como vanta-gem a diversificação de timbres e o sompronto para utilizar. O maestro Oswal-dinho usa nas recentes gravações eshows o primeiro acordeão digital, que éo SR7 Roland. “É o primeiro digital domundo e acho sua captação melhor. Jávem com tecnologia que não precisaequalizar e posso utilizá-lo em linha”, dis-se Oswaldinho.

Para Marcos Farias, vai depender dasituação. “Em um show, um dinâmico ser-ve muito bem, porém, para uma gravaçãoem estúdio, os microfones como os AKGC 441, Neumann U87, Berhinger B1 eCAD da linha E são bons parceiros”. “Oscardióides são bons, entretanto, o acor-deão é um instrumento de sopro e, poresse aspecto, se possuir uma excelentemicrofonação, poderá ser utilizado em li-nha”, opinou Rodolfo.

A posição ideal desses microfones nahora da captação é o bom direcionamen-to. Em relação à distância ideal, dependedo modelo do acordeão, pois a posiçãofica entre as teclas e a tampa. Manuellembrou que se um estúdio não possui osmicrofones citados, se o acordeão temuma eletrificação boa, grava em linha efica tudo resolvido. Em relação à micro-fonaçao de acordeão em estéreo, umadesvantagem é porque o músico precisade duas linhas. A melhor técnica pararesolver isso, segundo Manuel, seria usarum cabo Y.

Érico Paiva diz que acordeão com mi-crofone interno (plugado) de maneira ge-ral são utilizados em shows e em estúdioquando a proposta é dar uma textura deshow ao vivo. “Existem acordeões plugadoscom o som muito bom”, disse Érico Paiva,que utiliza SM-81, AKG 451, Samson C-2,Neumann KM 184, Neumann U-87, AKG414, Áudio-Tecnica 4050 e Behringer B-1para captação.

Clébio Diniz e Eliseu Ribeiro usam oposicionamento pela frente para captarmelodia e harmonia, microfone ao lado doteclado na mão direita e, para os baixos,posicionados próximos à mão esquerda. Adistância varia entre 5 e 40 centímetros.

“Alguns técnicos captam o som so-mente do teclado. Outros já fazem a cap-tação de tecla e dos baixos. Dependendodo tipo do arranjo, eu não uso os baixos,porque é como se fosse um acompanha-mento de um contrabaixo”, disse Leno

Detalhe do posicionamento dos microfones

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Maia, que usa o Neumann TLM 170para teclas e o C414 da AKG para baixos.Quanto à distância ideal dos microfones,os entrevistados sugerem, dependendoda sala, que seja entre 30 e 50 cm.

Interferência da salaPara os entrevistados, o som da sala é

muito importante, pois o som gravado re-produz fielmente como soa o instrumentodentro da sala. Na opinião de Manuel, asala do estúdio não interfere na captação.

Captação de notasequilibradamente e evitarressonâncias e captaçãodo ventoRodolfo Forte enumerou alguns deta-

lhes. Marca e modelo do microfone, cap-tação utilizada. Posição, sustentáculos e

potência de captação entre teclado ebaixos, já que o baixo sempre tenta enco-brir o som do teclado. Volumes individu-ais para mão esquerda e direita, ou seja,baixos e teclado. Posicionamento doscastelos do instrumento em relação aosmicrofones, havendo ou não castelosdeitados. Uso de pré-amplificadoresvalvulados com funções diversas.

“Acho que tem que ser com um bommicrofone, no mínimo um par de 414AKG; a coisa vai depender mais do mú-sico mesmo. A dinâmica é com o músi-co. Dominguinhos é perfeito, o som jávem pronto e equilibrado, e quanto aovento, não corto nada, tudo faz parte dosom”, opinou Sandro. Manuel acreditaque não existe um segredo para essacaptação. Vai depender do jeito de to-car, pois cada músico tem uma assinatu-ra diferente.

Microfonação em estéreoA técnica é usar microfones da mes-

ma referência em uma distância entreos pedestais de um metro e meio de umaforma triangular a onde o acordeão sejaa ponta do triângulo com uma distânciade 30 cm do mesmo. Sandro Haickmicrofona o acordeão em estéreo e dizque não vê desvantagens. Ele faz com oteclado para um lado e o baixo para ooutro, não totalmente aberto, e quandotem dobra, Sandro inverte tudo, então olado esquerdo terá o teclado do primei-ro acordeão e o baixo do segundo, e olado direito terá o inverso.

Equalização e mixagem“O som de um bom acordeão está quase

pronto se utilizarmos a técnica, microfone ebons pré-amps. A equalização é uma questãode correção como filtro pass”, disse ÉricoPaiva. Marcos Farias recomenda a equali-zação e mixagem da seguinte forma: em umasala sem reflexão, com uma taxa de compres-são de 2.1 em menos 10 db e em relação aequalização, variando de instrumento parainstrumento, reverb PLATE 1.8 de time.

Leno não gosta de equalização. “O quevaria na sonoridade é o bom gosto namixagem e uma boa mixagem pede boasala, bons microfones e só um reverb. Nadade equalizações”, opinou Leno Maia.Sandro disse que depende da proposta.“Gravo flat com um bom pré-amp e bonsmicrofones e para a mixagem equalizocomo precisar, com um filtro no médio, umpouco de agudo, depende da base. Na ver-dade, não existe uma regra. Tem que soar omais fiel possível ao som do instrumentoacústico”, finalizou Sandro Haick.

Dicas“Nunca microfone um instrumento

sem ouvi-lo antes. Isso é regra básica. Paraqualquer instrumento, estilo, ritmo. Peçaao músico para tocar um trecho do que vaiser gravado, escute na técnica, depois es-cute no estúdio na posição dele. Em segui-da, tome as suas decisões”, diz Érico Paiva.

“Procure sempre ouvir muita músicaboa, pois são referências. Músicos bons têmsempre um ótimo som, de preferência gra-vado nos anos 50, 60, 70 e 80, na era análo-ga. Tenho muita saudade dos sons de vinil,das fitas de duas polegadas, acho que te-mos que acompanhar a tecnologia sim,mas gosto mais daquele som sem copy epaste”, afirma Sandro Haick.

“Escutar o som do instrumento antesde colocar os microfones pode dar refe-rências ao músico, porque cada instru-mento tem uma acústica diferente”, acre-dita Manuel Jeneci.

Fernando Moreira Sandro

Dominguinhos com o acordeão digital Roland