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Livro de Atualização em Pneumologia - Volume IV - Capítulo 39 - Página 1

39 DIAGNÓSTICO E TERAPÊUTICA DOSDERRAMES PARAPNEUMÔNICOS

Introdução

Os derrames pleurais são observados em cercade 40 a 57% das pneumonias complicadas que exi-gem internação hospitalar 1, 2. Tosse, febre, dortorácica e dispnéia persistentes podem serindicativos da presença de derrame pleural associa-do à pneumonia. Em muitos pacientes, quando oderrame assume pequenas proporções ou o quadroinfeccioso está controlado, a abordagem do espaçopleural pode ser desnecessária. Nos derrames mo-derados ou volumosos, ou quando há risco de com-plicações infecciosas, deve ser considerada a possi-bilidade de abordagem diagnóstica e terapêutica doderrame.

A adequada avaliação dos parâmetros clínicos,radiológicos e laboratoriais é fundamental para adecisão de intervenção pleural nas suas diversasformas 3. Dependendo da severidade do quadroinfeccioso, do tempo de início da antibioticoterapiae da virulência do agente infectante, 5% a 50% dospacientes podem necessitar de drenagem pleural. Aabordagem tardia ou inadequada dos derrames se-cundários à pneumonia implica no aumento das ta-xas de morbimortalidade, levando na maioria dasvezes ao risco de loculação dos derrames, empiemae sepsis. Estudos indicam que o tempo de internaçãohospitalar para os derrames parapneumônicos com-plicados ou para o empiema é 3 a 4 vezes maior quepara os derrames não complicados 4. Por outro lado,a abordagem diagnóstica precoce pode permitir

Evaldo Marchi Assistente Doutor da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP

Marcelo A. C. VazAssistente Doutor da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP

Roberta K. B. S. Salles Pós-Graduanda da Disciplina de Pneumologia – HC-FMUSP

decidir por procedimentos menos invasivos, como adrenagem pleural percutânea guiada por imagem, quecontribui para o adequado esvaziamento de líquido,em especial nos derrames loculados. Ainda nesta li-nha de raciocínio, a utilização de agentes fibrinolíticosestá ganhando cada vez mais aceitação, por permitir adrenagem do líquido pleural viscoso antes da forma-ção do empiema franco.

Diagnóstico dos Derrames Parapneumônicos

Métodos de ImagemPequenos derrames (200 a 500 ml) muitas vezes

são de difícil visualização na radiografia convencionalde tórax, causando apenas ligeiro velamento do seiocostofrênico. A consolidação de um lobo inferior porpneumonia pode contribuir para retardar o diagnósti-co do derrame pleural. Além disto, derrames loculadospodem assumir formas variadas na radiografia, con-fundindo a análise e interpretação dos achados 5.Como norma geral, qualquer paciente com pneumo-nia e suspeita de derrame pleural deve ser submetidoa radiografias de tórax em decúbito lateral, que per-mitem elucidar a presença de derrames de pequenovolume. Nesta situação, a constatação da presençade derrames com 10 mm ou mais de líquido nodecúbito lateral é indicativo de abordagem da cavida-de pleural por toracocentese com fins diagnósticos 1.A ausência de imagem característica de derrame nãoexclui a presença de líquido, que pode estar loculado,exigindo outros métodos auxiliares de imagem para

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confirmação e orientação diagnóstica. De fato, até30% de pacientes com efusões loculadas necessitamde ultrassonografia ou tomografia computadorizada detórax para diagnóstico dos derrames paraneumônicos6.

A ultrassonografia pode, além de localizar a co-leção líquida, contribuir para esclarecer a natureza deseu conteúdo e indicar o ponto mais adequado para atoracocentese. A utilização de transdutores de altafreqüência permite esclarecer com detalhes as carac-terísticas de ecogenicidade do derrame. Por este mé-todo é possível inferir que o derrame tem característi-cas de transudato quando se apresenta anecóico oucom baixa ecogenicidade, enquanto a presença deseptações ou debris, característicos de restos de fibrina,leva ao diagnóstico de exsudato ou empiema em for-mação 7.

Nos processos pleurais e parenquimatososcomplexos, a tomografia computadorizada é impe-rativa, podendo esclarecer detalhes da presença ediagnóstico diferencial do derrame septado com oabscesso pulmonar ou do mediastino, das caracte-rísticas de espessamento pleural e eventualmente daatenuação da gordura mediastinal, sugestivas deempiema 8, 9 .

A ressonância nuclear pode ser utilizada nodiagnóstico diferencial dos transudatos, exsudatosde diferentes etiologias e do empiema, baseado noresultado diferencial das características do sinalobtido. Porém, são necessárias ainda outras evi-dências para o emprego rotineiro deste exame parao diagnóstico diferencial dos derramesparapneumônicos 10.

Laboratório

Os parâmetros laboratoriais são importantes nadefinição do estágio do derrame parapneumônicono momento do diagnóstico, com o objetivo de pre-dizer a forma de terapia a ser instituída. O primeiroítem a ser considerado na avaliação do líquido pleuralé seu aspecto macroscópico, que pode ser límpido,turvo ou francamente purulento. Na análise dacelularidade do exsudato parapneumônico, o achadomais comum é o de um elevado número total deleucócitos (> 1.000 /cm2), com predominância deneutrófilos (> 60%).

Para o diagnóstico da fase fibrinopurulenta dos

derrames, indicativa de uma abordagem mais agres-siva, sugere-se a utilização das medidas dadesidrogenase lática (DHL), glicose e pH. A DHL,produto de lise celular, apresenta-se elevada, po-dendo freqüentemente alcançar valores maiores que1.000 UI/dL nos derrames parapneumônicos com-plicados e no empiema. Os níveis de glicose se en-contram diminuídos (< 60 mg/dL) precocemente,podendo alcançar níveis < 40 mg/dL nos casos maiscomplicados. Os níveis de glicose diminuem porintensa glicólise devido ao elevado metabolismo dosleucócitos e bactérias. Níveis de pH < 7,2 sugerematividade exsudativa intensa no líquido pleural, en-quanto pH < 7,0 é indicativo de empiema 11.

No entanto, a interpretação dos achadoslaboratoriais sofre a interferência de diversas variáveis,mais acentuadamente na avaliação da medida do pH.Para tanto, recomenda-se que o líquido obtido portoracocentese seja colhido de forma semelhante aoobtido para a gasimetria arterial, isto é, com seringaheparinizada, e analisado somente em aparelhos degasimetria, já que os valores obtidos em medidores demesa ou fitas de pH não são confiáveis 12. Na práticaclínica diária, no entanto, muitos laboratórios se recu-sam a medir o pH do líquido pleural em aparelhos degasimetria, justificando que os debris do líquido es-pesso causam danos ao equipamento. Mesmo comessa variável, a medida do pH deve ser utilizada derotina para nortear o raciocínio diagnóstico diferencialdos derrames parapneumônicos.

A análise bacterioscópica do líquido pleural nemsempre permite a identificação dos agentes patogênicosenvolvidos. Este fato ocorre provavelmente porque,na maioria das ocasiões, a antibioticoterapia empíricaé instituída precocemente para controle da pneumo-nia. Determinantes como idade, imunidade e fatoresde risco para aspiração contribuem para inferir a res-peito da etiologia dos derrames. Agentes anaeróbiossão associados mais freqüentemente ao empiema pós-pneumonia em pacientes com maior risco de aspira-ção brônquica, como os idosos, alcoólatras e doentesneurológicos, ou nos pacientes com risco de extensãodireta de uma infecção localizada, como nos portado-res de neoplasia de pulmão, abscesso subfrênico oude orofaringe. No total, os agentes anaeróbios po-dem ser encontrados em cerca de 17 a 76% dosempiemas, mas o diagnóstico depende de técnicas

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adequadas de cultura de anaeróbios, muitas vezes en-contradas somente em centros especializados 13.Dentre os agentes aeróbios, o Streptococcuspneumoniae ainda é o mais freqüentemente encon-trado (36%), sendo menos freqüente o S. aureus, E.coli, K. pneumoniae e H. influenzae. Não éincomum, no entanto, o achado de associação aeróbio– anaeróbio, razão pela qual a investigação direta epor cultura deve sempre contemplar estas duas possi-bilidades 14.

Classificação dos Derrames Parapneumônicos

Em 1995, procurando estabelecer parâmetrosmínimos para o diagnóstico diferencial dos derra-mes parapneumônicos nas suas diversas fases, Lightpropôs um modelo de classificação abrangente paraos derrames parapneumônicos, estabelecendo 7 di-ferentes categorias e tendo como referência a quan-tidade de líquido, as características bioquímicas (pH,glicose e DHL) e bacteriológicas (Gram e cultura),e a presença ou ausência de loculações 15.

De acordo com esta classificação, os derramesparapneumônicos podem ser não significantes (< 10

mm), derrames típicos não complicados (nãoloculados, com pH > 7,2; glicose > 40 mg/dL, eGram e cultura negativas), derrames complicados(limítrofe, simples ou complexo) e empiema (sim-ples ou complexo). Além de contribuir para sepa-rar os derrames parapneumônicos nas suas diver-sas fases e sugerir intervenções específicas nas di-ferentes situações, o autor reitera a necessidade deabordagem diagnóstica dos derrames > 10 mm,observados em radiografias em decúbito lateral, paracoleta de material e estabelecimento da melhor con-duta terapêutica (Quadro I).

No entanto, trabalhos ulteriores questionam ovalor da associação pH, DHL e glicose no diagnós-tico diferencial das diversas fases do derrameparapneumônico, com relatos de que nem semprevalores sugestivos de derrames complicados neces-sitam de abordagem terapêutica mais agressiva 16.

Fundamentado nestas dúvidas, um estudo demeta-análise foi elaborado para evidenciar se estesparâmetros isoladamente ou em associação seriamcapazes de separar os derrames complicados dos nãocomplicados. A conclusão foi a de que o pH seria oparâmetro mais fidedigno em discriminar esta diferen-

Quadro I: Classificação e Tratamento dos Derrames Parapneumônicos e Empiema.

Categoria Derrame Bioquímica Tratamento1 Não Significante Ausente Sem Toracocentese

(< 10 mm em decúbito)2 Típico Glicose > 40 mg/dL Antibióticos

(> 10 mm) pH > 7,2Gram e Cultura Negativas

3 Complicado Intermediário 7,0 < pH < 7,2 ou Antibióticos eDHL > 1.000 U e Toracocenteses SeriadasGlicose > 40 mg/dL

4 Complicado Simples pH < 7,0 ou Drenagem Pleural e Antibióticos(Não Loculado, Sem Pus) Glicose < 40 mg/dL ou

Gram ou Cultura Positivas5 Complicado Complexo pH < 7,0 ou Drenagem Pleural e Trombolíticos

(Multiloculado) Glicose < 40 mg/dL ou ou PleuroscopiaGram ou Cultura Positivas

6 Empiema Simples Indiferente Drenagem Pleural ou(Pus Livre ou Loculado ou Pleuroscopia ou DecorticaçãoSimples)

7 Empiema Complexo Indiferente Drenagem Pleural e Trombolíticos(Pus e Loculações Múltiplas) Pleuroscopia ou Decorticação

(Adaptado de Light RW. Pleural Diseases, ed. 3. Baltimore. Williams & Wilkins, 1995).

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colhido quando os antibióticos já foram instituídos,ou porque os laboratórios não dispõem de meiosadequados de cultura, em especial para anaeróbios.

A maioria dos antibióticos tem penetração ade-quada no espaço pleural, exceto os aminoglicosídeos,que podem ser inativados no empiema 19. De um modogeral, a escolha inicial dos antibióticos é empírica efundamentada em dados de maior freqüência de in-fecção pulmonar primária por faixa etária ou por gru-pos de risco 20, 21.

Considerando que a presença de derramepleural associado à pneumonia é critério deinternação e tratamento com antibioticoterapia porvia sistêmica, para as pneumonias adquiridas nacomunidade estão indicadas as cefalosporinas desegunda ou terceira geração ou os antibióticosbetalactâmicos mais inibidores da betalactamase,associados a um macrolídeo quando houver sus-peita de Legionella, Mycoplasma ou Chlamydia.Para os pacientes com pneumonia considerada se-vera, recomenda-se a associação de macrolídeo comcefalosporina de terceira geração (devido a maiorincidência de pseudomonas associada ao DPOC,bronquiectasias e fibrose cística). Pacientes compneumonia adquirida em ambiente hospitalar devemreceber cefalosporinas de terceira geração, associ-adas ou não ao aztreonam, tendo como alternativaso imipenem/cilastatina e as quinolonas. Nos casossuspeitos ou confirmados de infecção pelo S. aureus,deve ser considerado o uso de vancomicina outeicoplanin.

Toracocentese Terapêutica

A toracocentese é a forma menos invasiva deabordagem dos derrames pleurais parapneumônicos,mas sua indicação como terapêutica exclusiva é dis-cutível. Os relatos de literatura indicam de 25 a94% de sucesso no tratamento do empiema comtoracocenteses terapêuticas de repetição 22, 23. Oconsenso da ACCP recomenda que as toracocente-ses de repetição devam ser consideradas na aborda-gem terapêutica somente nos pacientes incluídos naCategoria 1 (derrames menores que a metade dohemitórax, com Gram e cultura negativos e pH < 7,2)que apresentarem piora clínica com instituição do tra-tamento conservador 18.

ça 17.Reconhecendo a dificuldade no estabelecimen-

to dos parâmetros mais adequados, o AmericanCollege of Chest Physicians (ACCP), baseado naresposta ao tratamento obtida por avaliação retros-pectiva de 24 estudos amplos de literatura, elabo-rou um consenso de alternativas para a abordagemdiagnóstica e terapêutica dos derramesparapneumônicos 18. Este estudo propõe uma clas-sificação mais simples, baseada em fatores de riscode evolução desfavorável quando os pacientes nãosão submetidos à drenagem precoce do espaçopleural. Dentre estes fatores de risco, foram consi-derados a hospitalização prolongada, o aumento damorbidade e da mortalidade, a perda funcionalventilatória e os riscos de toxicidade local esistêmica. A nova classificação estabelece três va-riáveis para análise: anatômica (quantidade e pre-sença ou ausência de loculações), bacteriológica(Gram e cultura) e bioquímica (pH). A partir dacombinação das variáveis, foram determinadas qua-tro diferentes categorias para os derramesparapneumônicos. Neste estudo, os autores esta-belecem critérios para a indicação de tratamentoclínico ou por drenagem pleural, sugerindo alterna-tivas terapêuticas para situações específicas. Comoconclusão, os pacientes classificados dentro dascategorias 1 e 2 (risco de evolução desfavorávelmuito baixo e baixo) podem não necessitar drena-gem da cavidade pleural. Nos pacientes das cate-gorias 3 e 4 (risco moderado e alto) é recomendadaa drenagem como procedimento mínimo, devendoser considerada a necessidade de terapêutica com-plementar, como a utilização de fibrinolíticos,pleuroscopia e cirurgia aberta (Quadro II, no início dapágina 5).

Tratamento dos Derrames Parapneumônicos

Antibióticos

O estabelecimento do diagnóstico bacterioló-gico é fundamental na indicação dos antibióticosideais para o tratamento dos exsudatos parapneu-mônicos. Infelizmente, na maioria das situações nãoé possível estabelecer os agentes etiológicos envol-vidos na infecção, seja porque o líquido pleural é

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Drenagem Pleural

A drenagem pleural é considerada a forma maiseficaz de tratamento dos derrames parapneumônicosnas categorias 3 e 4 do consenso americano, isto é,para os derrames volumosos com Gram ou culturapositivas e pH < 7,2, ou para o empiema franco.Também deve ser considerada na categoria 2 quan-do o derrame recidiva após toracocentese inicial ouhá piora no estado clínico do paciente 18.

A drenagem deve ser realizada de maneira efi-caz, com adequado posicionamento do dreno nacavidade, e de preferência mantida sob sucção compressão negativa para melhor esvaziamento do con-teúdo. Há discussão a respeito do calibre do drenoa ser utilizado. Estudam mostram que drenos decalibre fino, guiados ou não por métodos auxiliaresde imagem (ultrassom ou tomografia), podem sertão eficazes quanto os de calibre mais grosso 24. Avantagem do cateter de fino calibre é a de permitirmaior conforto aos pacientes, além de poder serrealizada por clínicos ou radiologistas treinados. Apresença de pus franco e espesso deve ser considera-da como indicação de utilização de drenos maiscalibrosos. Os parâmetros para retirada do dreno sãoa melhora clínica e radiológica, e a diminuição do dé-

bito de drenagem para menos que 100 ml / dia para osderrames não empiemáticos. No empiema, é conve-niente aguardar a parada total da drenagem, seguidada confirmação por imagem (ultrassom ou tomografia)da obliteração total do espaço pleural. A drenagemprolongada (maior que 7 a 10 dias), a septação pre-coce do derrame ou a presença de espessamentopleural, apontam para a utilização de alternativas tera-pêuticas mais agressivas.

Fibrinolíticos

O derrame pleural parapneumônico pode evo-luir com a formação de septações,compartimentalizando o espaço pleural. As lojas cri-adas retêm coleções líquidas em diferentes fases deevolução (da fase exsudativa até a empiemática), difi-cultando a penetração de antibióticos no líquido e oacesso adequado para a drenagem pleural. Asseptações são resultantes da ativação do sistema decoagulação, com formação de uma grande malha defibrina dentro da cavidade pleural, seguida pela migra-ção e proliferação de fibroblastos. O resultado final éa deposição de colágeno com desenvolvimento deespessamento pleural. A abordagem cirúrgica, quan-do já existem traves fibrosas, lojas empiemáticas ou

Figura 1: Fluxograma de ativação do sistema de coagulação. O fibrinogênio ativado forma dois compostos,o fibrinopeptídeo A e a fibrina. A fibrina e o fibrinogênio são degradados por ação da plasmina, com aformação de D-Dímero e de PDF (produto de degradação de fibrina). A plasmina é ativada pelos ativadoresde plasminogênio e pela estreptoquinase.

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grandes espessamentos, sempre é acompanhada demaior morbidade.

A determinação do melhor momento para aadequada abordagem terapêutica, clínica ou cirúr-gica, é fundamental para estabelecer o método maisadequado a ser utilizado 25. Os trombolíticos fo-ram sugeridos como alternativa ao tratamento dosderrames pleurais septados por sua interação no sis-tema de coagulação. Tanto a estreptoquinase quan-to o TPA (fator ativador de plasminogênio) atuamativando o sistema fibrinolítico (Figura 1) e destru-indo a malha de fibrina formada 26. Sem a malha defibrina, os fibroblastos não têm substrato para mi-grar e produzir colágeno, diminuindo a formaçãode loculações e a evolução para espessamentopleural.

Na literatura, não há consenso a respeito dautilização dos trombolíticos, porém duas diferen-tes abordagens são consideradas. A primeira reco-menda a utilização de trombolíticos a partir da co-locação do dreno torácico no tratamento dosempiemas instalados ou em formação, independen-temente de haver loculações, com o objetivo deevitar a formação de traves de fibrina e septações27. Foi demonstrado, com esta estratégia, que ostrombolíticos aumentam o volume de líquido dre-nado, mas não alteram o tempo de internação nemo número de complicações do derrameparapneumônico. A segunda estratégia descritautiliza o trombolítico no momento em que se iniciaa formação das septações. Nesta situação, otrombolítico conseguiu desfazer as lojas pleurais,evitando procedimentos auxiliares mais complexos,como a pleuroscopia 28.

A tendência atual é a de utilização de fibrinolíticoso mais precocemente possível no controle dos derra-mes que apresentarem sinais de loculação. Esta alter-nativa deve ser considerada como um passo interme-diário na abordagem dos derrames septados, situan-do-se entre a drenagem pleural simples e apleuroscopia para higiene da cavidade pleural 18.Neste sentido, para maior efetividade desta forma detratamento, recomenda-se a utilização do trombolíti-co nas primeiras duas semanas após a formação dasseptações.

O fibrinolítico mais utilizado na prática clínica é aestreptoquinase. A dose habitualmente recomendada

é de 250.000 UI, diluída em 50 ml de solução fisioló-gica e administrada 1 ou 2 vezes ao dia até a observa-ção de resposta clínico-radiológica, ou seja, aumentodo volume de drenagem e melhora da imagem radio-lógica, com desaparecimento das loculações. A ad-ministração deve ser feita por via intrapleural, se pos-sível através do dreno torácico, o qual deverá perma-necer fechado por duas horas após a instilação. Usu-almente a resposta é rápida e raramente requer maisdo que 3 doses, contudo podem ser administradas até6 doses (a dose total máxima recomendada é de1.500.000 UI). Quando não se observa resposta aotrombolítico até o terceiro dia pós inicio do tratamen-to, preconiza-se a limpeza cirúrgica da cavidade.

Febre, calafrios e reações alérgicas são as rea-ções adversas mais comuns relatadas com a utilizaçãoda estreptoquinase. Existem raros casos descritos decomplicações sérias como sangramento pleural,fibrilação ventricular e insuficiência respiratória aguda29. Os trombolíticos administrados no espaço pleuralnão alteram a coagulação sistêmica, sendo considera-das drogas seguras para a prática clínica. As contra-indicações absolutas para sua utilização são a existên-cia de reação alérgica prévia ao trombolítico ou a pre-sença de sangramento ativo no espaço pleural.

A uroquinase é outro trombolítico que pode serutilizado, contudo é mais difícil de ser obtido em nossomeio. Tem o mesmo grau de eficácia da estrepto-quinase, com a vantagem de apresentar menores índi-ces de reação alérgica. A dose preconizada é a de100.000 UI, diluída e administrada como aestreptoquinase.

Pleuroscopia

A toracoscopia é uma alternativa consideradaeficaz para o tratamento dos derramesparapneumônicos complicados com loculação e difi-culdade de drenagem. Os estudos controlados de li-teratura sugerem que os resultados com a pleuroscopia,indicada precocemente nos empiemas loculados, sãomelhores que a drenagem com fibrinolíticos 30, em-bora o número de pacientes avaliados tenha sidopequena para uma conclusão definitiva. A tendên-cia atual, considerando a menor agressão ao paci-ente, é a de indicar inicialmente os fibrinolíticos paraos derrames septados, seguido da pleuroscopia

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quando não se consegue controle eficaz.Quando indicada precocemente no tratamento

do empiema, a toracoscopia higiênica da cavidadeempiemática apresenta resultados comparáveis aosda toracotomia aberta com decorticação pulmonar,com as óbvias vantagens de custo e de uma evolu-ção pós-operatória muito menos tormentosa paraos pacientes 31.

Toracotomia e Decorticação

A toracotomia, seguida de decorticação, estáindicada nos pacientes com empiema que não obti-veram adequada expansão pulmonar, em especialnos casos de fístula persistente do parênquima, ouquando há coleções encistadas residuais pós-trata-mento com fibrinolíticos ou pleuroscopia 32. Osíndices de sucesso com a toracotomia para o trata-mento do empiema estão próximos dos 100%, em-bora, com a antibioticoterapia instituída precoce-mente para o tratamento das pneumonias e as alter-nativas menos agressivas modernamente disponí-veis, este procedimento tenha sido indicado com fre-

qüência cada vez menor. A toracotomia permite umaavaliação ampla da cavidade e do parênquima pulmo-nar, sendo possível desfazer lojas pleurais, realizar asegmentectomia ou lobectomia de áreas consideradasnecróticas, e drenar amplamente a cavidade pleural.

Drenagem aberta e Pleurostomia

A drenagem aberta, sem selo d’água, estáindicada nos casos de pacientes muito debilitados ecom empiemas crônicos (usualmente sem resolu-ção após 30 dias de tratamento) que não suportamprocedimentos mais agressivos como a decorticaçãopulmonar. Nesta situação, o dreno deve ser lavadofreqüentemente para a retirada de restos de fibrina,aguardando-se a obliteração espontânea da cavida-de ou melhora do estado geral do paciente para aindicação de decorticação. Nos casos em que acavidade residual é extensa e há previsão de fecha-mento em prazo longo, indica-se a ressecção departe de 1 ou 2 arcos costais na porção mais depen-dente da cavidade, com a transformação da lojaempiemática em pleurostomia.

Quadro II: Risco de evolução desfavoravél em pacientes com derrame parapneumônico. 18

Anatomia Bacterioscopia Bioquímica# Categoria Risco Drenagem

A0 DP Pequeno e B

x Cultura e

< 10 mm 1 Gram Cx pH 1 Muito Não 2

indeterminados indeterminado Baixo

A1 DP Moderado e B

0 Cultura e

> 10 mm Gram Negativos 3 e C0 pH > 7,2 2 Baixo Não 4

< ½ hemitórax

A2 DP Extenso B

1 Cultura e ou C

1 pH < 7,2 3 Moderado Sim

> ½ hemitórax 5 ou Gram Positivos loculado 6

espessamento 7

B2 Pus 4 Alto Sim

# : pH por gasimetria é ideal; glicose pode ser usada (P0 > 60 mg/dL; P

1 < 60 mg/dL).

Os valores de pH e glicose ainda não se encontram bem estabelecidos.1 : a experiência clínica indica que derrames < 10 mm resolvem espontaneamente.2 : se A

0 + P

1 ou B

1 , considerar que P

1 ou B

1 podem ser falso-positivos.Considerar toracocenteses de repetição se piora clínica ou

aumento do derrame.3 : independente do uso prévio de antibióticos.4 : se evolução clínica desfavorável, considerar toracocenteses repetidas ou drenagem.5 : derrames volumosos evoluem pior após drenagem, pela tendência à loculação.6 : loculações pleurais indicam pior prognóstico.7 : espessamento pleural à tomografia sugere empiema.

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Conclusão

O estabelecimento de uma nova proposta de clas-sificação, baseada nos resultados de estudos amplosde literatura dos últimos 30 anos, representa uma gran-de contribuição para a abordagem diagnóstica dosderrames parapneumônicos nas suas diversas fases.Fundamentada em parâmetros mínimos (característi-cas do derrame, medida de pH e presença de bacté-rias no líquido pleural), a proposta estabelece a ne-cessidade ou não de drenagem da cavidade pleuralcomo procedimento mínimo para os casos de derra-mes volumosos com presença de bactérias ou pH <7,2. Enfatiza ainda que, devido à dificuldade em ava-liar os resultados das diversas formas de tratamentopropostas na literatura, a utilização de fibrinolíticos, apleuroscopia e a toracotomia são alternativas válidas

para complementarem a drenagem pleural, dependen-do da avaliação clínica dos pacientes e da experiênciado serviço. Baseado nestes dados, o ideal é a adoçãode uma rotina de diagnóstico e de propostas terapêu-ticas para a abordagem dos derramesparapneumônicos (Figura 2).

É patente nos trabalhos de literatura, a preocu-pação em relação à necessidade de abordagem maisprecoce dos derrames para a obtenção de resultadosmais adequados no tratamento. Sobretudo, o grandedesafio a ser vencido é o do estabelecimento de umdiagnóstico laboratorial de qualidade, que permita umaavaliação fiel dos resultados, principalmente do pH,bacterioscopia e cultura, cabendo àqueles que lidamcom a rotina diagnóstica dos derrames pleurais, esta-belecer e exigir os meios necessários para a adequadaavaliação do líquido pleural.

Figura 2: Fluxograma de orientação diagnóstica e terapêutica na abordagem dos derrames pleurais (DP)parapneumônicos

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Livro de Atualização em Pneumologia - Volume IV - Capítulo 39 - Página 9

Referências Bibliográficas

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