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Capítulo 4 Concentração Bancária: Bancos Privados Nacionais Líderes 4.1. Condições institucionais para expansão da moeda bancária Ocorreram, na década de 20 do século XX, alguns fatos marcantes da história bancária brasileira. Antes, a característica predominante dos empreendimentos bancários era sua alta instabilidade. No século XIX, houve a crise de 1857/8, iniciada nos Estados Unidos e na Europa; a crise de 1864 de origem interna e localizada na praça do Rio de Janeiro, que culminou na falência de várias casas bancárias; a crise de 1875, em que desmoronou o império econômico de Mauá e alguns outros bancos; o Encilhamento, provocado pela política de emissão de Rui Barbosa; a política deflacionista de Murtinho, que resultou na profunda crise bancária de 1900. HASENBALG & BRIGAGÃO (1970: 23/4) apontam as seguintes causas para tais ocorrências: (a) o impacto das crises externas (através do desequilíbrio no balanço de pagamentos e desvalorização da moeda nacional); (b) as próprias oscilações da política econômica executada no país (variações entre as posições “papelistas” e “metalistas”, a pluralidade e a centralização emissora, a contenção e a ampliação dos meios de pagamento); (c) a atração exercida pela atividade bancária para investimentos de natureza especulativa; (d) a falta de fiscalização e controle da atividade bancária, por parte do governo central. Contra essa última causa se instituiu, pela Lei nº 4182 de 13 de novembro de 1920, a fiscalização dos bancos e casas bancárias. Organizou-se a Inspetoria Geral dos Bancos, cujo decreto nº 14728 de 16 de março de 1921 também estabeleceu as normas para a instalação e o funcionamento dos bancos. O regulamento e a fiscalização devem ter influído para a grave crise econômica de 1929 não tivesse gerado o pânico observado nas de 1857, 1864, 1875 e 1900. Na crise de 1929, o sistema bancário estava melhor estruturado, havia um incipiente controle governamental, mais senso de liquidez e maior experiência empresarial no setor. Não se verificaram tantas corridas bancárias e fechamentos de bancos. Além de tomar essas medidas institucionais, o governo do Presidente Wenceslau Brás, depois de pressionado pelos numerosos debates parlamentares e manifestos de órgãos de classe, resolveu fundar, no Banco do Brasil, a Carteira de Redescontos, que começaria a funcionar em 1921. Isso ocorreu em um contexto de crise financeira. Desde meados de 1919, havia escassez de numerário, com dificuldades de desconto nas principais praças do país. A maior parte do dinheiro em giro se concentrara no interior, para pagamento de produtos agrícolas pastoris. Só uma melhor organização bancária e, sobretudo, uma carteira de redescontos corrigiria esse tipo de perturbações. Era necessário abrir aos bancos créditos proporcionais ao capital, para eles facilitarem o desconto de letras comerciais, sabendo onde buscar a compensação em caso de necessidade de liquidez. Bons negócios, com as melhores garantias, muitas vezes não podiam ser aceitos, pois não se tinha como os bancos descongestionarem suas

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Capítulo 4

Concentração Bancária: Bancos Privados Nacionais Líderes

4.1. Condições institucionais para expansão da moeda bancária

Ocorreram, na década de 20 do século XX, alguns fatos marcantes da história bancária brasileira. Antes, a característica predominante dos empreendimentos bancários era sua alta instabilidade. No século XIX, houve a crise de 1857/8, iniciada nos Estados Unidos e na Europa; a crise de 1864 de origem interna e localizada na praça do Rio de Janeiro, que culminou na falência de várias casas bancárias; a crise de 1875, em que desmoronou o império econômico de Mauá e alguns outros bancos; o Encilhamento, provocado pela política de emissão de Rui Barbosa; a política deflacionista de Murtinho, que resultou na profunda crise bancária de 1900.

HASENBALG & BRIGAGÃO (1970: 23/4) apontam as seguintes causas para tais ocorrências: (a) o impacto das crises externas (através do desequilíbrio no balanço de pagamentos e desvalorização da moeda nacional); (b) as próprias oscilações da política econômica executada no país (variações entre as posições “papelistas” e “metalistas”, a pluralidade e a centralização emissora, a contenção e a ampliação dos meios de pagamento); (c) a atração exercida pela atividade bancária para investimentos de natureza especulativa; (d) a falta de fiscalização e controle da atividade bancária, por parte do governo central.

Contra essa última causa se instituiu, pela Lei nº 4182 de 13 de novembro de 1920, a fiscalização dos bancos e casas bancárias. Organizou-se a Inspetoria Geral dos Bancos, cujo decreto nº 14728 de 16 de março de 1921 também estabeleceu as normas para a instalação e o funcionamento dos bancos. O regulamento e a fiscalização devem ter influído para a grave crise econômica de 1929 não tivesse gerado o pânico observado nas de 1857, 1864, 1875 e 1900. Na crise de 1929, o sistema bancário estava melhor estruturado, havia um incipiente controle governamental, mais senso de liquidez e maior experiência empresarial no setor. Não se verificaram tantas corridas bancárias e fechamentos de bancos.

Além de tomar essas medidas institucionais, o governo do Presidente Wenceslau Brás, depois de pressionado pelos numerosos debates parlamentares e manifestos de órgãos de classe, resolveu fundar, no Banco do Brasil, a Carteira de Redescontos, que começaria a funcionar em 1921. Isso ocorreu em um contexto de crise financeira.

Desde meados de 1919, havia escassez de numerário, com dificuldades de desconto nas principais praças do país. A maior parte do dinheiro em giro se concentrara no interior, para pagamento de produtos agrícolas pastoris. Só uma melhor organização bancária e, sobretudo, uma carteira de redescontos corrigiria esse tipo de perturbações. Era necessário abrir aos bancos créditos proporcionais ao capital, para eles facilitarem o desconto de letras comerciais, sabendo onde buscar a compensação em caso de necessidade de liquidez. Bons negócios, com as melhores garantias, muitas vezes não podiam ser aceitos, pois não se tinha como os bancos descongestionarem suas

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carteiras de crédito. A falta de um sistema de redesconto obrigava os bancos a manterem um encaixe monetário bastante elevado.

Uma das razões para a criação da Carteira de Redescontos tinha sido a busca de fortalecimento da posição competitiva dos bancos nacionais face aos bancos estrangeiros. A ausência de redesconto havia sido apontada como causa da vulnerabilidade dos bancos domésticos às crises monetárias e para a preferência do público pelos estrangeiros, cujas matrizes os socorriam, prontamente, durante as emergências. Facilitou-se mais o redesconto para os bancos locais em relação aos estrangeiros, apesar desses também poderem recorrer à carteira. Constatou-se, imediatamente, o aumento do volume de depósitos em bancos nacionais.

Em junho de 1921, também como remédio para atenuar a crise de liquidez a aumentar o giro da moeda, ampliando o uso de cheques, houve a criação de câmaras de compensação em diversas cidades do país. Pelo Decreto 4635 de 8 de janeiro de 1923, o Banco do Brasil foi dotado do monopólio de emissão de papel-moeda. Passou então a ser um banco de emissão e redescontos.

Até então tinha sido insuficiente, além de obsoleto, o mecanismo de crédito ao qual se socorria a lavoura cafeeira, principal atividade econômica do país. O comissário, cuja função não era a de fornecer dinheiro, na prática, era quem mais o concedia. Ele tinha uma larga clientela. No desejo aumentá-la ainda mais, descontava, nos bancos, as letras dos fazendeiros, para movimentação de seu capital. Os bancos de depósitos e descontos, cuja função principal consistia em receber dinheiro dos “capitalistas” a juros módicos, para emprestá-lo a juros mais altos aos comerciantes, não operavam apenas com o capital próprio, em geral de pequena dimensão. Trabalhavam, fundamentalmente, com os depósitos dos correntistas. Operando sobre esses, alguns a prazos fixos, porém, curtos, e outros à vista, e portanto podendo ser retirados a qualquer instante, geralmente aplicavam apenas dois terços das quantias recebidas. Imobilizavam em encaixe, por medida de prudência, o outro terço, tendo em vista os saques ou as retiradas eventuais.

Quando nenhuma alteração ocorria na vida comercial, tudo caminhava mais ou menos bem. Com a vinda da safra do café, tudo se pagava, auferindo cada qual o lucro que lhe cabia. Mas, ao menor atrito, toda essa engrenagem emperrava, desorganizando a vida econômica brasileira, causando prejuízos colossais. Para tanto, não era necessário mais que ligeira convulsão política, financeira ou econômica em um dos grandes mercados consumidores de café. Por exemplo, uma demora nas ordens de compra dos Estados Unidos ou da Europa retardava as vendas que o comissário desejava fazer e com cujo produto compensava os adiantamentos aos lavradores, liquidando os descontos das letras nos bancos. Para sair de tal situação, isto é, para “fazer dinheiro”, vendia-se o café por qualquer preço no mercado. Como conseqüência fatal surgiam os pedidos de reforma das letras, que os bancos, às vezes, não podiam conceder, por precisarem contar com esse dinheiro para a restituição dos depósitos recebidos a prazo fixo, a coincidir nessas datas.

Então, lavradores e comerciantes, oferecendo cada qual maiores vantagens de juros, recorriam diretamente aos “capitalistas”. Estes, por sua vez, para receberem as vantagens oferecidas, retiravam os depósitos em contas correntes, não reformavam os de prazos fixos, enfraquecendo assim, consideravelmente, os encaixes, pois escasseavam os recursos bancários.

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Em tais situações, era necessário por qualquer forma “fazer dinheiro”. O pânico fazia com que todos gritassem contra a falta de numerário. Explicavam-se, assim, as medidas governamentais tomadas para atenuar as crises de liquidez.

4.2. Grandes bancos privados mineiros

O nascimento dos primeiros grandes bancos privados mineiros só ocorreu com o crescimento comercial e industrial de Belo Horizonte, depois 1922. Além de ser, na época, proporcionalmente, a cidade de maior crescimento demográfico no Brasil, como sede do governo estadual ela reuniu, desde sua fundação em 1897, uma população com poder aquisitivo relativamente elevado, derivado principalmente dos salários pagos pela administração do Estado. Isso a tornou um mercado de certa expressão. Boa parte do excedente que então circulava na capital do Estado era derivada da arrecadação fiscal exercida sobre o café.

O Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais, que foi o maior banco privado nacional de 1940 a 1946, já nasceu grande. Em 7 de setembro de 1922, um grupo de comerciantes e industriais (proprietários de indústrias têxtil e sócios da siderurgia Belgo-mineira) de Belo Horizonte decidiu criar um banco para melhor atender seus interesses. Foi instalado em 1º de janeiro de 1923, com 6.000 contos de réis, o que já o fazia o maior banco privado de Minas. Logo, abriu duas agências no interior, em Formiga (1923) e Palmira (1924). Conquistou, rapidamente, significativa participação no mercado de depósitos à vista: 10% do total do Estado, em 1923, 12%, em 1924, e 17%, em 1925.

Antes de sua fundação, em 1922, o Hipotecário e Agrícola se colocava no 8º lugar entre os maiores bancos nacionais. Ele, ao lado do governamental Crédito Real, se destacava amplamente dos demais bancos de Minas Gerais: possuíam 22 e 16 agências, respectivamente, localizados nos principais centros produtores do interior. Juntos, detinham quase 90% do total estadual de depósitos em contas correntes, salientando-se o Hipotecário e Agrícola com mais de 60%.

É interessante investigar a acumulação “primitiva” (prévia) do capital empregado nos empreendimentos bancários.

Em geral, o capital em Minas era originário do capital comercial, de capital rural (fazendas) ou então dos benefícios derivados de paternalismo político, quer dizer, através do Estado. Pela limitação das oportunidades econômicas no restante do Estado, a capital construída a partir de 1897 constituiu um “novo horizonte” para a acumulação de capital e, portanto, um pólo atrativo para os empresários mineiros originários do interior. O grande industrial mineiro, em geral, iniciou suas atividades no setor têxtil, mantendo ao lado da fábrica uma casa de comércio. Possuía um caráter comercial o empreendimento industrial. Posteriormente, diversificou suas atividades, ou adquirindo terras, ou voltando-se para metalúrgicas. Esse era o traço comum. O empreendimento econômico possuía feições tradicionalistas, os participantes eram ligados através de laços de parentescos. Inclusive, a ascensão social via casamento com jovens de tradicionais famílias mineiras era característica. O papel da especulação imobiliária na formação das grandes fortunas em Minas era também marcante.

A origem do atual Banco Real está em Minas Gerais. O Banco da Lavoura de Minas Gerais (denominação escolhida por capricho pessoal de seu fundador Clemente

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Faria e não indicadora de nenhuma especialização nessa área econômica), inaugurado em 16 de junho de 1925, ao contrário do seu maior concorrente, o Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais, fundado dois anos antes, não surgiu com grandes dimensões. Os outros banqueiros se referiam ao Banco como o “tamborete do Clemente”. Funcionou, de 1926 a 1928, num acanhado prédio da Rua Caetés, por onde se expandia, também, o comércio na capital mineira. Ali se instalou sua matriz. Só em 1930 inaugurou sua primeira agência, em Conselheiro Lafaiete, antiga Queluz.

Os onze incorporadores do Banco solicitaram a seus amigos e coestaduanos a subscrição de ações. Foram 91 os subscritores iniciais das ações para a constituição do capital originário. Foi fundado com capitais exclusivamente mineiros e dirigido por financistas mineiros. Entre seus fundadores se destacava Clemente Faria, filho de fazendeiro latifundiário, criador de gado em Pedra Azul, quase fronteira com a Bahia. Em 1910, com 18 anos, foi fazer um curso de Direito em Belo Horizonte. Iniciou então sua carreira de comerciante, com a venda de cadeiras de engraxates e especulação com balanças de pesar. Entre 1915 e 1918, negociou com prédios, confeitarias, águas marinhas, etc., fundando ainda a Cia. Mineira de Diversões, proprietária de cinema, após 1930. Foi eleito deputado estadual graças ao “curral eleitoral” do pai, sendo reeleito diversas vezes. Portanto, fazendeiro, negociante, advogado, político com grande intuição para negócios bancários, e com prestígio pessoal, detinha amplas condições para tornar-se o empresário inovador que foi, pioneiro do crédito popular.

Em 1925, quando surgiu, em Belo Horizonte, as atividades de uma cooperativa de crédito que, em apenas dois anos, transformou-se no Banco da Lavoura, era quase nula a intimidade do povo com os negócios dos bancos, que mais operavam com o comércio, a indústria e a lavoura. Em 1926, por inspiração de Clemente Faria, foi instituída no estabelecimento uma seção de pequenos depósitos (“a conta da economia” e a idéia do “cofrinho” sob forma de um “porquinho”), que teve a maior aceitação, inclusive com centenas de pedidos do interior do Estado. O novo banco passou a ter, além da clientela de comerciantes e industriais, a do povo em geral em busca de crédito pessoal.

Buscava atender a todos que o procuravam e não somente os afiançados por garantia de bens imóveis, levando em grande conta as garantias do trabalho individual e do “padrão moral de cada um”. Portanto, a característica própria do Banco da Lavoura, que lhe deu grande popularidade, era que, inicialmente, emprestava fundamentalmente a negócios pequenos, com grande facilidade para o cliente, pois não exigia avalista, “confiando na pessoa conhecida”. Tornou-se assim um banco “estimado”, sem concorrência na área de crédito pessoal. Seu segredo era fazer grande número de negócios, ao contrário dos outros bancos que só faziam negócios grandes. Nas palavras do próprio Clemente de Faria, criador do banco de varejo no Brasil: – “O importante é emprestar pouco a muitos”!

O novo papel que o Banco da Lavoura passou a desempenhar na vida bancária de Belo Horizonte constituiu o primeiro golpe sério na agiotagem, que explorava as camadas populares. Em 1929, transformou-se em uma Sociedade Anônima. A partir de então, o crescimento do Banco se deu tanto pela abertura de novas agências como pela incorporação de outras instituições financeiras.

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Em 1947, tornou-se o maior banco privado nacional em volume de depósitos, mantendo tal posição até 1964, exceto nos anos de 1951 e 52. É interessante analisar como ele galgou a essa liderança.

Em 1929, o Lavoura não sofreu diretamente com a crise cafeeira, pois não trabalhava com esse produto. O café de Minas Gerais era exportado principalmente pelo porto do Rio de Janeiro e somente em 1936 o Banco abriu agência lá, a 1ª fora do estado. No ano seguinte, fez o mesmo em São Paulo, com grande movimentação. Em 1934, o Lavoura já tinha incorporado o Banco Comercial de Bom Sucesso. Sua marcha para o interior do Estado de Minas, no final da década dos 30, processou-se de início com a encampação de bancos e casas bancárias afetados pela crise cafeeira, sobretudo na região Sul. Foram incorporados o Banco de Resende, de Alfenas, de Pouso Alegre, de Campanha e o Santaritense. Em 1937, com 25 agências e 14 escritórios, tornou-se a 25ª instituição financeira do Brasil.

Com uma fatia bem definida no mercado interno mineiro, saltou para os estados do Sudeste. Depois da II Guerra Mundial, no ano de 1945, o Banco da Lavoura, além da sua matriz em Belo Horizonte, dispunha de uma filial no Rio de Janeiro e outra em São Paulo, e 48 agências em Minas Gerais, 3 no Estado do Rio e uma no Espírito Santo. Quanto a escritórios, possuía 31 em Minas e um fluminense. Outras regiões em seguida foram atingidas, via Goiás, Rio Grande do Sul, Bahia e Pernambuco, Paraná e Alagoas. Incorporou o Banco do Norte do Brasil S.A. de Alagoas. Em 1950, chegou a Belém do Pará e Macapá, por meio do financiamento de uma empresa constituída com a finalidade de explorar então a maior riqueza mineral da região amazônica: o manganês. Nesse mesmo ano, além da matriz e uma agência metropolitana em Belo Horizonte, contava com 3 filiais (Distrito Federal, São Paulo e Porto Alegre) e 143 agências e escritórios, disseminados por todo o país. Portanto, no pós-Guerra, pode-se falar na constituição de uma rede nacional de agências bancárias.

Indubitavelmente, saltava à vista as posições dos bancos mineiros no ranking dos 20 maiores bancos brasileiros, por ordem de volume de depósitos, de 1935 a 1964. Estavam sempre em postos de realce, concorrendo com os bancos de São Paulo, Estado cuja economia era muito mais desenvolvida. Poucos bancos cariocas se destacavam. Além do Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais (maior privado nacional de 1940 a 1946), do Lavoura (entre 1947 e 1964, exceto 1951 e 1952), destacavam-se o Nacional, criado em 1944 e alcançando o segundo posto de 1957 a 1964, e o Moreira Salles, entre o terceiro e o quinto posto, nesse mesmo período. Curiosamente, esses três bancos são “galhos” na “árvore genealógica” do Unibanco. O Nacional adquiriu o Comércio e Indústria em 1974. Ele, por sua vez, como será visto, teve sua “parte boa” incorporada pelo Unibanco, em 1995.

Os três bancos governamentais mineiros apresentaram performance diversa, até a reforma financeira de 1964: o Crédito Real (adquirido pelo Bradesco na privatização realizada em 1997) sempre esteve entre os cinco maiores bancos no Brasil por volume de depósitos. Em 1963 e 1964, só estava abaixo do Banco do Brasil e do Banespa, o banco estadual paulista, que, em todo o período investigado, foram os dois maiores. O Banco Hipotecário e Agrícola, nacionalizado em 1941, tendeu ao declínio. O Banco Mineiro da Produção, criado em 1937, ocupou sempre uma posição intermediária, entre o décimo e o vigésimo lugares. A fusão de ambos, em 1967, resultou no Banco do Estado de Minas Gerais (BEMGE), adquirido na sua privatização, em 1998, pelo Banco Itaú.

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Uma questão fundamental, na história bancária brasileira, é: por que os bancos de Minas Gerais tiveram uma posição de destaque no cenário brasileiro que não era correspondente à que detinha a economia em que estavam sediados? É possível sugerir uma resposta.

O processo de concentração bancária do pós-guerra se tratava de exemplo típico de concentração em que um número mais restrito de matrizes, que caiu de 663, em 1944, para 328, em 1964, congregava uma rede de filiais e agências mais extensa, indo de 1.796 para 6.389, no mesmo período de 20 anos, distribuída pelo país. Entre os 13 bancos brasileiros com mais de 50 agências e filiais, em 1950, destacavam-se, além do Banco do Brasil (com 277 agências), os fundados em Minas Gerais, com 8 participações. O Lavoura com 136 agências era o 2º colocado. Os bancos paulistas eram três: o Mercantil de São Paulo (em 7º lugar com 75), o Bradesco (em 9º com 66) e o Banespa (em 11º com 62). Somente um banco gaúcho entrava nessa lista: o Agrícola e Mercantil (em 12º lugar com 60).

Minas Gerais era o Estado que possuía maior número de praças bancárias. Só foi superado por São Paulo no final da década dos 60. Raros eram os bancos de outros estados e estrangeiros que atuavam em Minas, nessa época. Portanto, grande parte da rede bancária mineira estava situada no próprio mercado estadual. Mas não se limitava às fronteiras do Estado.

Por exemplo, em 1954, o Banco da Lavoura de Minas Gerais tinha 115 agências no interior e 47 em outros Estados, sendo 14 em São Paulo e 37 em 22 outras unidades federativas. O Banco de Crédito Real de Minas Gerais tinha 62 agências no interior e 56 em outros Estados, sendo 6 em São Paulo. O Banco Hipotecário e Agrícola de Minas Gerais tinha 96 agências no interior e 9 em outros Estados. O Banco Moreira Salles possuía 107 agências, sendo 77 em São Paulo, 19 em Minas Gerais , 6 no Distrito Federal e 5 no Paraná. Enquanto isso, os bancos paulistas que possuíam o maior número de agências fora de seu Estado eram o Mercantil de São Paulo (17 no Paraná e 5 no Distrito Federal) e o Comércio e Indústria de São Paulo (24 em outros estados). O Banco da Província do Rio Grande do Sul tinha somente 10 agências em outros Estados.

Portanto, uma característica típica era que os bancos mineiros possuíam o maior número de agências em outros Estados, enquanto os paulistas e os gaúchos se restringiam mais aos âmbitos estaduais. Sobretudo São Paulo era o maior campo dessa expansão dos estabelecimentos mineiros, constituindo o Banco Moreira Salles (como veremos mais adiante) o paradigma mais completo a esse respeito, pois era um banco cuja matriz se localizava em Poços de Caldas, Minas Gerais. Grupos financeiros mineiros também controlavam a maior parte do mercado bancário carioca.

“Esse nomadismo dos bancos mineiros se explica por não existirem em Minas Gerais fontes de negócios suficientemente amplas para alimentar sua meia dúzia de estabelecimentos gigantescos, procurando eles aproximarem-se de outras regiões mais ricas em manancial de financiamentos, como é São Paulo, por exemplo. Quanto aos bancos paulistas, a limitação de suas atividades ao âmbito estadual se deve ao fato de se encontrarem mais ligados à comercialização do café, rendosa fonte de negócios bancários, nada existindo de comparável a isso nesse ramo de transações. É por isso também que os bancos mineiros procuram São Paulo de preferência” (LIMA, 1956).

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Foram os bancos sediados em Minas Gerais os primeiros a se expandirem a outras regiões, configurando, de certo modo, o sentido de bancos de abrangência nacional. Não se tinha, até então, um banco de âmbito verdadeiramente nacional, que estivesse presente em todos os Estados do país.

O Banco da Lavoura era, até 1964, o maior banco particular em funcionamento no Brasil e na América Latina. Foi o precursor do Banco Real e do Banco Bandeirante, criados após a cisão, em 1971, entre os dois filhos de Clemente de Faria: Aloyzio e Gilberto. Contava, já em 1957, com 376 agências distribuídas por todo o país, do Amapá ao Rio Grande do Sul. Com uma posição consolidada no Brasil, o Banco iniciou sua trajetória internacional. Foi o primeiro banco privado brasileiro a se lançar no exterior, abrindo, em 1958, escritórios de representação em Nova York, que, em 1964, se transformaria em uma full agency, e Paris. Dez anos antes, o Dr. Aloysio de Andrade Faria tinha assumido a superintendência do Banco em substituição ao seu pai, falecido em outubro de 1948, aos 57 anos. A gestão de Aloysio de Faria pautou-se pela continuidade da obra do pai. Com apenas 28 anos na época, ele realizou o ideal de fazer do Banco da Lavoura de Minas Gerais uma instituição presente em todo território nacional. Entretanto, em 1998, 40 anos após a morte de seu fundador, os bancos de seus sucessores (já com suas sedes para São Paulo) foram adquiridos por bancos estrangeiros – o Real pelo holandês ABN-Amro e o Bandeirante pelo português Caixa Geral de Depósitos.

Em 1957, demonstrando seu pioneirismo, o Lavoura tinha sido o primeiro banco a se instalar em Brasília, antes mesmo da inauguração da futura Capital Federal, recebendo a carta patente nº 1. No período entre 1958 e 1966, incorporou o Banco Vera Cruz, totalizando 346 agências, e criou o Banco Real de Investimentos S.A.. No ano de 1969, efetuou a mudança da sede da organização de Belo Horizonte para São Paulo e criou mais duas empresas financeiras: a Companhia Real de Investimentos e a Companhia Real de Crédito Imobiliário, além de fazer a incorporação do Banco Mercantil de Niterói.

A denominação Banco Real S.A. foi adotada em 1971, pouco antes de planejar e iniciar, em 1975, um acelerado processo de expansão no exterior, com a criação do Grupo Real del Paraguay, constituído por um banco comercial e mais três empresas. No ano seguinte, abriu sua agência em Fernando de Noronha e incorporou o Banco de Minas Gerais, que contava com 133 agências. No ano do seu cinqüentenário, 1975, o Banco Real contava com a maior rede nacional de agências (512) e 10 unidades no exterior (Bogotá, Panamá, Grand Cayman, Nassau, Curaçao, Los Angeles, Nova York, Toronto e Cidade do México), além das 12 empresas associadas, destacando-se a Companhia Real de Investimentos como a 1ª do ranking nacional.

No período de 1975 a 1998, com um regime de alta inflação e uma intensa disputa por floating bancário a ser aplicado em correção monetária, o Banco Real consolidou sua posição entre os quatro maiores bancos privados brasileiros. Mas, Aloysio de Faria não resistiu à proposta bilionária do ABN AMRO Bank. Vendeu o Banco Real, entrou na lista da Forbes dos maiores bilionários brasileiros e abriu um banco de atacado, para cuidar do dinheiro da elite brasileira: o Banco Alpha.

A lista da Forbes incluiu cinco brasileiros entre as pessoas mais ricas do mundo em 2003. A dupla de irmãos Joseph e Moise Safra, donos do Banco Safra, apareceram em 92º lugar no ranking, com cerca de US$ 3,6 bilhões. Em seguida, os banqueiros

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Aloysio de Andrade Faria (Banco Alpha), com US$ 2,7 bilhões, e Júlio Bozano (Bozano, Simonsen), com US$ 1,2 bilhão, ocuparam respectivamente a 132ª e a 348ª posição na lista. A única mulher brasileira na relação da Forbes, em 427º lugar, com US$ 1 bilhão, era Lily Safra, viúva do banqueiro libanês-brasileiro Edmond Safra.

Em 2007, ano em que o número de bilionários na lista da revista Forbes bateu seu recorde, com 946 membros, o Brasil contribuiu com 20 nomes no grupo que possuía pelo menos US$ 1 bilhão. A liderança do ranking brasileiro continuava a ser de Joseph Safra, com US$ 6 bilhões, que era o 119º mais rico do mundo. Porém a sua fortuna não era mais somada com a de seu irmão Moise (314º, com US$ 2,9 bilhões), como tinha acontecido até o ano anterior. Mesmo com suas fortunas ultrapassando os US$ 7,4 bilhões de 2006, eles cairiam na lista, de 69º para 76º. Jorge Paulo Lemann, um dos principais acionistas da cervejaria InBev, ganhou, com seus US$ 4,9 bilhões (eram US$ 3,4 bilhões em 2006), a segunda posição do ranking nacional, ultrapassando Aloysio Faria, do banco Alfa, que viu sua fortuna subir de US$ 3,8 bilhões para US$ 4 bilhões.

4.3. Da Casa Bancária Moreira Salles ao Unibanco

Vamos destacar, neste tópico, algumas passagens do livro editado pelo Instituto Moreira Salles, em 1994, cujo título é História do Unibanco: 1924-1994.

Nas três primeiras décadas do século XX, João Moreira Salles acumulava a atividade de comerciante com a de correspondente bancário, em uma região que envolvia, em cerca de 80 km, cidades do sul de Minas e a região paulista de Mococa. Correspondente bancário era um agente que, na falta de banco propriamente dito no local, exercia parte de seu papel. O comércio brasileiro nessa época, no interior do Brasil, especialmente no Centro-Sul, era realizado ou por lojas comerciais ou por caixeiros-viajantes. Estes faziam a ligação entre os produtores ou importadores de mercadorias, nos grandes centros, e as lojas do interior. Eram eles que as abasteciam. Para não transportar grandes quantias, os caixeiros juntavam o dinheiro que haviam recebido dos comerciantes e o depositavam junto aos correspondentes bancários, que em troca emitiam cheques a serem descontados contra os bancos em que trabalhavam.

Moreira Salles se iniciou também em outro ramo de capital importância em sua vida: o café. Comprava o produto dos fazendeiros e o revendia. Possuía armazéns na região.

No início dos anos 20, o departamento bancário da Casa Moreira Salles, em Poços de Caldas (centro cafeeiro e de turismo), representava 13 bancos e contava com pouco mais de 200 clientes, para os quais realizava, sobretudo, operações de cobrança, mas também de saques, depósitos, desconto de títulos, câmbio, pagamentos e transferências. Sejam os fazendeiros abastados, sejam os roceiros, todos eles, ilhados em suas propriedades, dependiam da casa comercial para seu abastecimento em todos os tipos de encomenda. Só o comerciante tinha idéia do preço, de quanto tempo levaria para o artigo chegar, da forma como fazer o pagamento. Só ele dispunha de fundos para adiantar o numerário. Vinda a colheita, o fazendeiro pagava a dívida.

Como visto, nessa época, o governo brasileiro promoveu uma série de inovações no sistema bancário. A primeira foi a criação da Carteira de Redesconto do Banco do Brasil, dando a este banco a função de emprestador em última instância, garantindo a liquidez das instituições financeiras. Em 1921, entrou em vigor o serviço de

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compensação de cheques, por intermédio do Banco do Brasil, dando-lhes credibilidade. Foi baixada também uma série de normas com o objetivo de fiscalizar, disciplinar e organizar o funcionamento das instituições financeiras. A Inspetoria Geral dos Bancos assumiu esse papel.

Com essa normatização do setor bancário, as casas comerciais, como a Moreira Salles, que tinham na atividade financeira apenas um de seus departamentos, passaram a precisar de uma carta patente para funcionar. A Casa Moreira Salles requereu-a e a obteve em 27 de setembro de 1924. Esta é a data que o Unibanco considera como seu marco fundador. Hoje, com o desaparecimento de vários concorrentes nacionais, pode se gabar de ser o mais antigo banco privado brasileiro.

Em 1931, a loja sofreu uma modificação considerável: a seção bancária virou casa bancária. A primeira subentendia um simples departamento de uma loja comercial, onde outros interesses eram mais importantes. Casa bancária, embora ainda não significasse banco, sendo a diferença entre os dois o porte do capital com que operavam, já identificava uma instituição financeira por direito próprio, não um apêndice de outra atividade. A essa altura, a atividade da casa bancária consistia basicamente em depósitos e empréstimos pessoais e comerciais. Os empréstimos eram feitos muitas vezes sem que fosse necessário “lamber o selo”, como se dizia, ou seja, sem que se assinasse promissória, onde, obrigatoriamente, ia um selo. Era na base da confiança.

Em 1933, Walter Moreira Salles, ainda estudante da Faculdade de Direito do Largo São Francisco em São Paulo (formou-se em 1936), passou à qualidade de sócio da firma, enquanto seu pai passou a dedicar-se mais de perto aos negócios com café. O mesmo movimento que metamorfoseava o comerciante do interior em banqueiro o transformava em comerciante de café. Era comum às lojas como a de João Moreira Salles entregarem suas mercadorias aos fazendeiros contra pagamento futuro, ou seja, quando fossem vendidas as safras. Não raro, o pagamento era feito com o próprio café, num sistema de troca. Isso fez com que muitos comerciantes acabassem se encaminhando para o mercado de café.

Desde os anos 20, a firma de Moreira Salles negociava com produtores de café do sul de Minas e norte de São Paulo. O café adquirido nessa região era revendido para casas comissárias de Santos. João Moreira Salles acabou decidindo mudar-se para aquela cidade portuária, em 1924.

Ele nunca se ateve exclusivamente à casa comercial. Em diferentes épocas, teve plantação de uvas, negócios com fumo e criação de gado. Foi gerente de agência bancária em Poços de Caldas. Foi também revendedor de automóveis importados. Tornou-se concessionário de redes telefônicas, presidente de firma que construía linha férrea, e até arriscou-se em negócio com madeiras no Paraná e Santa Catarina. Foi também presidente da Associação Comercial de Santos.

Ao mudar-se para Santos, Moreira Salles não abandonou a loja. Havia temporadas que passava em Poços. Na maior parte do tempo, no entanto, eram os sócios que cuidavam do negócio. As associações (inclusive internacionais) sempre foram uma constante na história do Grupo Moreira Salles. Os contatos políticos e a representação de estrangeiros foram uma marca distintiva do Grupo Moreira Salles e, em particular, do embaixador Walter Moreira Salles, no panorama do mundo brasileiro dos negócios e das empreitadas empresariais.

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Aos 28 anos, Walther Moreira Salles teve a primeira chance de sair do Brasil. Foi para os Estados Unidos a convite do Departamento de Estado, para um estágio no mercado financeiro nova-iorquino. Foi onde conheceu um grupo de jovens bancários que, anos depois, se tornaria a elite do mercado financeiro internacional. De lá voltou casado com Helene, filha de um alto executivo da Coty, criador do famoso perfume Channel número 5. Também foi nessa viagem que articulou seu primeiro grande negócio. A amizade com um representante da Caterpillar propiciou-lhe a informação de que havia a intenção da empresa de sair do Brasil. Pressentindo o boom rodoviário que vinha pela frente, Salles conseguiu a representação Caterpillar, que foi um de seus primeiros grandes negócios rentáveis, fora do banco (NASSIF, FSP, 28/02/01).

Em 1940, firmou-se a convicção de que a Casa Bancária só cresceria se juntasse esforços com outros estabelecimentos similares da região. A idéia de juntar a Casa Bancária Moreira Salles, a Casa Bancária de Botelhos (propriedade de Pedro di Perna) e o Banco Machadense (propriedade de grandes fazendeiros com interesse secundário no negócio bancário) em um estabelecimento único parecia reunir toda a conveniência. No dia 15 de julho de 1940, o Banco Moreira Salles recebeu sua carta patente. Inicialmente, sua sede seria em Poços de Caldas. Pedro di Perna, que não podia ocupar oficialmente cargos de direção por força do artigo da Constituição de 1937, que vetava essa posição a estrangeiros, após naturalizar-se brasileiro, em 1943, foi eleito diretor vice-presidente do banco resultante da fusão.

Menos de um ano após sua fundação, foi inaugurada a filial do Banco no Rio de Janeiro. No entanto, na essência, o Moreira Salles continuava um banco do Sul de Minas. As demais agências ou subagências (escritórios), surgidas nos anos de 1940 e 1941, estavam em cidades mineiras dessa região, cujo centro de gravidade era Poços de Caldas. O ano de 1942 foi aquele em que, baseado no capital que havia acumulado no sul de Minas, o Banco Moreira Salles começou a transbordar para São Paulo, escorrendo tanto pelo mapa do café no interior paulista quanto atingindo a capital do Estado. Pelo Censo de 1940, a cidade tinha 1,3 milhão de habitantes contra 1,7 milhão do Distrito Federal.

A diretoria passou a ficar em São Paulo. Apesar de Poços de Caldas continuar como sede oficial, o centro decisório do banco se transferiu para lá. Tendo nascido numa área que, embora situada em Minas, obedecia à influência de São Paulo, era natural que o Banco crescesse no rumo sul. Belo Horizonte, a capital mineira, não exercia o mesmo poder de atração, inclusive pela fragmentação econômica do Estado. Por isso, a sucursal do Banco Moreira Salles em Belo Horizonte não seria inaugurada senão em 1950.

Outra razão que explicava a lógica da expansão do Moreira Salles, tal como se deu, era a já citada vinculação do destino do Banco ao mapa do café. Em 1943, foi inaugurada uma sucursal em Santos. Em Campinas, a agência foi inaugurada em 1945. Cinco anos após sua fundação, 34 praças eram servidas pelo Banco, sendo que as cidades de São Paulo, na relação, já superavam as de Minas Gerais: eram 17 contra 16. A captação de depósitos e os empréstimos eram a quase totalidade das operações bancárias no interior. Os empréstimos eram basicamente à lavoura e feitos por meio das “operações de desconto” de promissórias, que se faziam nos prazos de 30, 60, 90 e 120 dias.

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Poços de Caldas dera a Walter Moreira Salles o conhecimento da elite brasileira. A cidade havia se transformado em balneário de fama internacional. Para lá se dirigiam, nas temporadas, a alta intelectualidade carioca e os barões rurais paulistas. Após 1930, o governo de Antônio Carlos construiu o conjunto arquitetônico compreendendo o balneário, o Palace Hotel e o Cassino. Passou a receber, então, a nova elite política do Brasil: os tenentes que haviam levado Getúlio Vargas ao poder. Nova York garantiu o contato com a futura elite financeira norte-americana. O Rio lhe colocaria em contato com a elite financeira européia e com o alto mundo do capitalismo internacional (NASSIF, FSP, 28/02/01).

Nos anos 50, houve uma mudança na geopolítica do Moreira Salles. Expandir deixou de ser somente estender-se de cidade a cidade. Passou a ser, igualmente, ampliar sua rede dentro de uma mesma cidade. O Banco adaptava-se ao processo de concentração urbana que começava a marcar o país com inauguração de uma série de agências urbanas. Não que o Banco abandonasse sua antiga vocação. A faceta do banco do café, ou da casa ligada aos negócios agrícolas, continuava presente, e rompia uma fronteira nova: o Norte do Paraná, seguindo no rastro das regiões que começavam a despontar como importantes centros cafeeiros.

Por exemplo, quase encostado na fronteira da Bolívia, assentado em grande parte do Pantanal, no atual Estado do Mato Grosso do Sul, em 1950, foi adquirido de um grupo francês o maior negócio então controlado pelo Grupo Moreira Salles, que o possuiu até 1980: o empreendimento agrícola da Fazenda Bodoquena, cuja área era quase 2,5 vezes maior do que a superfície de Luxemburgo. Em 1956, entrou um sócio de reputação internacional, Nelson Rockefeller, da famosa família de banqueiros e industriais norte-americanos. Outro desbravamento de fronteira agrícola, realizado por João Moreira Salles, no mesmo ano da aquisição da Bodoquena, foi o do Norte do Paraná. Adquirindo uma área grande, perfazendo um total de 7,5 mil alqueires, fundando cidades, providenciando a infra-estrutura, teve papel chave na colonização de uma vasta área nessa então longínqua região paranaense, que seria ocupada pelas plantações de café.

No começo dos anos 50, a Brazilian Warrant, e com ela a fazenda Cambuhy, o maior empreendimento agrícola diversificado em área contínua do Estado de São Paulo desde os anos 20, a E. Johnston, exportadora de café, e todas as demais empresas que faziam parte de um grupo inglês foram adquiridas pelo Grupo Moreira Salles. O grupo proprietário decidiu fazer o repatriamento de seu capital, para a reconstrução inglesa, após a II Guerra. Patrocinou então a venda de ativos britânicos no exterior a empresários locais. A Brazilian Warrant serve até hoje de holding para as empresas não-financeiras do grupo Moreira Salles. A E. Johnston também sobrevive no papel de holding, para a área financeira, no seu caso.

NASSIF (FSP, 28/02/01) narra detalhes dessa história. A partir da Segunda Guerra, o alto mundo internacional tornou o Rio o seu ponto de encontro predileto. A cidade tinha passado por profundas reformas nos anos 30, ganhara um ar internacional. Os cassinos garantiam os eventos sociais. Muitos europeus endinheirados, especialmente financistas judeus, instalaram-se por lá, aguardando o fim dos conflitos. Pouco antes, Walther Moreira Salles exercitara sua capacidade de juntar capitais em torno de projetos, em um país carente de capitais, entrando como sócio da Refinaria União, que tinha tido perda de capital, depois de protagonizar o mais importante lançamento público de ações dos anos 40. Mas com os financistas europeus Moreira

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Salles descobriu novas maneiras de se capitalizar e de articular capitais. Dois irmãos, financistas internacionais, ensinaram-lhe os caminhos de um novo mercado que se formava no mundo: o mercado de câmbio e de negociação de títulos de dívida de países.

A Inglaterra saíra da Segunda Guerra devendo para o mundo e montara um plano de pagamento das dívidas com ativos ingleses. Todas as dívidas foram relacionadas, transformando-se em espécies de “moedas”. Havia a “libra Brasil”, a “libra Egito”, a “libra Suécia” e assim por diante. Criou-se um mercado informal em Zurique, onde essas “moedas” eram negociadas. Com as informações que recebeu sobre esse mercado, Walther Moreira Salles traçou uma estratégia com o banco S.G. Warburg. Por meio do café, do qual continuava sendo grande exportador, acumulou dólares e passou a comprar “libras egípcias”, que valiam menos do que as brasileiras pelo fato de existirem mais ativos ingleses no Egito. Depois, seu braço direito, Homero Souza e Silva, fazia "swaps" com “libras Brasil”, no mercado de Zurique. Os créditos eram depositados no Warburg, que ia comprando, aos poucos, o controle acionário da Brazil Warrant, o maior ativo inglês no Brasil, dono da maior exportadora de café, de armazéns alfandegados, fazendas. Quando completou o processo de aquisição, ele foi oficializado. O grupo ficou com o direito de remeter dólares para pagamento pelo câmbio oficial, que era metade do valor do paralelo. Ao terminar a operação, bastou a venda de parte das terras da Brazil Warrant, para quitar completamente a compra.

O Grupo Moreira Salles participou e acabou por retirar-se de muitos negócios não bancários: mina de ouro de Morro Velho (retirou-se em 1980), Refinaria União de Petróleo (em 1958), Carbocloro (em 1970), Unipar e Petroquímica União (em 1974), Aracruz (em 1983). Restaram a CBMM, uma das três produtoras e exportadoras mundiais de nióbio (em Araxá), a Fazenda Cambuhy, maior empreendimento agrícola paulista produtor de laranja, café, gado e borracha, interligada à Cambuhy Citrus, uma fábrica com capacidade de produzir 40 mil toneladas de suco de laranja concentrado por ano, e o Club Méditerranée, em Itaparica (BA) e Mangaratiba (RJ).

O crescimento dos bancos, nos anos 50, era reflexo da política desenvolvimentista do período. Nela estava implícito um convite a ousar e rasgar fronteiras. Mais de uma centena de novas agências foram criadas pelo Moreira Salles, ao longo dos anos 50, de forma que, ao se encerrar a década, em 1960, o total era de 177 unidades. No Estado de São Paulo, localizavam-se 88 delas, sendo 36 na capital. Em 1964, o Banco tinha 191 agências.

A partir de então, outro fenômeno se manifestou no setor: a corrida para a modernização dos serviços bancários através de métodos proporcionados pelo progresso da eletrônica. Iniciou-se um processo de fusões e aquisições para se ganhar a economia de escala necessária para a automação e a integração nacional, através de uma infra-estrutura de comunicações, que exigia enormes investimentos. Quem não estivesse apto a fazê-los estaria arriscado a cair fora do negócio bancário.

Em 1967, o Banco Agrícola Mercantil, também conhecido como Agrimer, era um dos maiores bancos do país com operações que, embora concentradas principalmente no Rio Grande do Sul (102 agências) e, secundariamente, em Santa Catarina (13 agências), estendiam-se também ao Paraná, a São Paulo e ao então Estado da Guanabara. Nesse ano, o Banco Agrícola Mercantil fundiu-se com o Banco Moreira Salles. Ele atravessava um período de dificuldades, devido a investimentos excessivos

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para seu porte, com imobilização de capital na construção do maior prédio de Porto Alegre.

Aproveitando a oportunidade da incorporação do Agrimer, o Moreira Salles adotou o nome de União de Bancos Brasileiros, inspirado no famoso Union des Banques Suisses (UBS), e mudou sua sede para o Rio de Janeiro. O UBB nasceu com 333 agências, tornando-se a maior rede privada do Brasil, e mais de 1 milhão de correntistas. As agências se distribuíam por nove estados mais o Distrito Federal, sendo 150 em São Paulo, 102 no Rio Grande do Sul, 27 na Guanabara, 25 em Minas Gerais. Os municípios alcançados pela rede eram 242. O número de funcionários era 8570. Dois anos após, a UBB figurava no ranking dos bancos privados nacionais em 2º lugar.

Uma segunda grande incorporação ocorreu em 1970, quando a UBB absorveu o Banco Predial do Estado do Rio de Janeiro. A criação do Banco de Investimento do Brasil (BIB) tinha representado um acréscimo em matéria de sofisticação e de alta tecnologia financeira na história do Grupo Moreira Salles. Mas com a incorporação do Predial, e da cultura de varejo que vinha com ele, enveredou-se pelo caminho inverso: o da popularização. O Banco ficou com um perfil mais popular no Rio do que em outras praças.

Segundo NASSIF (FSP, 28/02/01), esse foi um período de intensas compras de controle de empresas em dificuldades, sua recuperação e posterior venda. Foi também o período em que Walter Moreira Salles “revolucionou” o mercado de capitais brasileiros, associando-se aos Rockfeller e ao fundo Delta de um banco de investimentos norte-americano, especialista em negociação de dívidas de países do Terceiro Mundo, na criação do fundo Crescinco, que ajudaria a reformular o mercado acionário brasileiro.

Em 1975, as 15 empresas financeiras do Grupo Moreira Salles passaram a ostentar um nome único: Unibanco. O Unibanco continuou a crescer por via das fusões, aquisições e incorporações e também pela expansão geográfica. A partir do final dos anos 70, Walter Moreira Salles, em vez de continuar ampliando o grupo, resolveu consolidar os ativos e resolver os passivos. Foi movido por razões pessoais, mas com a mesma intuição para negócios que o consagrou. Esse processo permitiu ao banco sair incólume das grandes mudanças no mercado bancário, após 1986, e ingressar consolidado nos anos 90.

Em 1976, sob a presidência do embaixador Walther Moreira Salles, o Conselho de Administração foi constituído e foram lançadas as bases da governança corporativa do Unibanco. Concomitantemente, vários executivos provenientes do antigo BIB foram para a cúpula do Unibanco, como Roberto Konder Bornhausen, Israel Vainboim e Tomas Zinner. Bornhausen assumiu a presidência da diretoria executiva, cargo que ocupou até 1988, quando passou à vice-presidência do conselho do Unibanco. De 1988 a 1992 a presidência do Unibanco foi ocupada por Vainboim. Em 1992, Zinner, outro ex-integrante do BIB, foi nomeado presidente, cargo que ocupou até 1998.

Ao longo da década de 80, começou a se destacar a presença da instituição no varejo com a compra do Banco Mineiro, em 1981. Houve o crescimento da Credicard, da qual era associado desde 1971, com a incorporação do Diners Club. Somou-se o início das operações de Prever Previdência Privada (depois Prever Seguros) e o nascimento da Sul América Unibanco Seguradora, em 1983.

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Nesse ano, uma associação mudou o perfil do setor de seguros no Brasil: a Unibanco Seguradora (12ª do ranking àquela época) juntou-se à Sul América, líder do setor, por meio de uma troca de participações. Nasceu a Sul América Unibanco Seguradora, contando com toda a rede do Unibanco para consolidar sua liderança. Neste mesmo ano, transformou uma situação de fato em de direito, mudando a localização da matriz do Rio de Janeiro para São Paulo.

No mesmo ano, a partir de um “piloto” em Curitiba, as três primeiras unidades

do Banco 24 Horas foram abertas ao público. Nelas, o cliente podia realizar saques, depósitos ou consultar dados a qualquer hora. No Brasil, o 24 Horas Unibanco foi pioneiro em seu gênero. Oito anos depois, em 1991, nasceu o Banco 30 Horas, marca do Unibanco. O novo serviço tornava o Banco disponível a seus clientes por 30 horas: seis na agência e outras 24 ao alcance do telefone. Com o tempo, o serviço passou a contar com diversos canais alternativos, como internet, celular, fax, entre outros. A inovação configurou um canal de atendimento ininterrupto para o cliente.

Também em 1991, o embaixador Walther Moreira Salles retirou-se da

presidência do Conselho de Administração do Unibanco, após 60 anos de atividades no Banco. Passou a ocupar o posto de presidente de honra do Conselho, mas cuidando das atividades culturais do Conglomerado. Nasceu então o Instituto Moreira Salles (IMS), destinado à promoção e ao desenvolvimento de programas culturais para o grande público. O IMS passaria a ser presidido pelo embaixador. Um ano após foi inaugurada a Casa da Cultura de Poços de Caldas, cidade onde tivera origem a Casa Bancária Moreira Salles.

Nessa ocasião, durante seu discurso de despedida, o embaixador resumiu a forma de atuar do Unibanco, como também um de seus princípios humanistas: – “Somos pessoas que atendem pessoas. Por maiores que sejam os recursos tecnológicos à disposição de um banco, ainda assim, ao final de cada comutação eletrônica permanecerá a circunstância simples, irredutível, de pessoas servindo pessoas”.

Quanto à sucessão, na prática, naquele momento, assumiu seu lugar Roberto Konder Bornhausen. Mas o filho Pedro, então com 31 anos, já estava na vice-presidência. A transição de gerações no comando completou-se em 1997, quando Pedro, graduado em Economia e História pela Universidade da Califórnia, passou a ocupar a presidência. As principais funções executivas do banco ficaram divididas entre Fernando Sotelino, presidente do banco de atacado, e Joaquim Francisco de Castro Neto, presidente do banco de varejo, estrutura criada em 1998.

A experiência da associação com o BIB, banco de investimento com sócios estrangeiros, propiciou à administração do Unibanco ganhar em sofisticação e profissionalização. Nessa época, ainda não havia se desenhado o conglomerado financeiro. O BIB, de onde vieram vários nomes que foram para a cúpula do Unibanco, como Roberto Konder Bornhausen, Israel Vainboim e Tomas Zinner, fortalecido pelo Basulvest, deu ao Unibanco por algum tempo uma fama na área de banco de investimentos superior à que tinha no varejo. Havia ainda uma indefinição entre priorizar uma área ou outra. O Banco estava “fora de foco”.

Ele tinha resolvido segmentar-se, logo após a aquisição do BIB, quando foram criadas as plataformas de atendimento personalizado de clientes pessoas jurídicas por região. Pouco depois, surgiu o atendimento específico para o chamado “mercado do

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meio”, das empresas de médio porte. O Banco deu um novo passo na área, mais adiante, dividindo as plataformas de pessoas jurídicas de maneira não mais geográfica, mas setorial, modelo que permitiu uma especialização mais apurada. Levou os heads de cada setor a se deslocarem pelo País, para visitar os clientes da sua área.

A divisão da estrutura de comando do Unibanco em duas presidências, em 1998, uma para o Atacado, outra para o Varejo, teve como um dos objetivos devolver o foco do banco para o primeiro segmento, tirando proveito de suas vantagens. Entre estas, estava a de possuir um balanço de tamanho suficiente para conceder crédito, mas também oferecer serviços como administração de caixa, sem descuidar das operações típicas de banco de investimento. Estas eram favorecidas por uma rede de distribuição que incluía as broker dealers, em Nova York e Londres, criadas na segunda metade da década de 90.

Para atender seus milhares de clientes, em 1993, tinha inaugurado um novo Centro de Processamento de Dados, aumentando em 40% a capacidade de processamento do Unibanco. O investimento realizado pelo banco nessa ampliação antevia o crescimento substancial que ocorreria em suas operações.

Sem dúvida, um dos fatores que mais contribuíram para tal crescimento foi a

aquisição de parte dos ativos, em 1995, do Banco Nacional, operação sem precedentes no mercado brasileiro, devido ao porte das duas instituições financeiras. Com ela, o Unibanco passou a ter uma rede de 1.446 dependências no Brasil, agregando 2,1 milhões de clientes e uma base de 1,4 milhão de portadores de cartão de crédito. A escala das atividades do Unibanco elevou-se para outro patamar.

Ao assumir o banco que pertenceu à família Magalhães Pinto, o Unibanco dobrou os ativos, de R$ 11,1 bilhões para R$ 22,8 bilhões, e o número de clientes, para cerca de 3 milhões. A rede do Unibanco, com 641 agências e postos, passou a ser 40% maior. Os depósitos totais praticamente dobraram de R$ 4,9 bilhões para R$ 9,2 bilhões. Passado o primeiro ano de rápida consolidação de estruturas, agilizada para permitir a exposição e o conseqüente corte de “custos duplos”, o Unibanco já começou a trabalhar a redução dos custos. Em paralelo, desenvolveu sua nova segmentação de modo a abranger as faixas de clientes conquistados com a operação do Nacional.

Essa compra abriu o foco no varejo, agregando fatias de renda mais baixa à tradicional clientela de renda mais alta da instituição. Nos anos seguintes, o Unibanco avançou em segmentos específicos do varejo. Em janeiro de 1996, associou-se ao Banco Icatu na Fininvest, financeira com grande experiência no segmento de crédito direto ao consumidor, adquirindo, inicialmente, participação de 48,8% no capital. Adquiriu o controle (51%) do Banco Dibens, em março de 1998. Ainda em 1996, associou-se à gigante americana American International Group (AIG), na área de seguros, desfazendo sua parceria antiga na área com a Sul América. Esse processo de aquisições e associações com rede de lojas comerciais levaria ao Unibanco o poder de acessar mais de 18 milhões de clientes.

Em 1997, ocorreu outro movimento marcante: o Unibanco lançou suas ações na NYSE. Tornou-se, então, o primeiro banco brasileiro a negociar seus títulos na bolsa de Nova York.

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Com o aumento significativo do volume das suas operações e no intuito de buscar maior agilidade na tomada de decisões, com encurtamento da cadeia de comando, a estrutura organizacional do Unibanco passou a basear-se, a partir de 1998, em quatro pilares: Banco de Varejo, Banco de Atacado, Seguros e Asset Management. A revisão de processos administrativos e operacionais, que viria depois, deveria proporcionar redução de custos e prepará-lo, estrategicamente, para a competitividade crescente do mercado financeiro nacional e internacional.

O Unibanco começou o novo milênio com aumento de 50% na base de clientes e 1.623 pontos de atendimento no Brasil. Isso se deveu em parte ao crescimento orgânico, mas também foi resultado da aquisição do controle integral da Fininvest, do Credibanco e do Banco Bandeirantes. Com a compra do Bandeirantes, por meio de uma emissão de ações, o Unibanco passou a contar com um novo sócio estrangeiro: a Caixa Geral de Depósitos. O maior grupo financeiro de Portugal, que controlava o Bandeirantes, passou a deter 12,3% do capital total do Unibanco, integrando o bloco estratégico de acionistas estrangeiros junto com o alemão Commerzbank AG e o japonês Mizuho Financial Group.

Após a forte consolidação do mercado financeiro brasileiro com crise,

privatização, desnacionalização e concentração bancária, na última década do século XX, a estratégia do Unibanco passou a priorizar o crescimento orgânico, ganhos de escala e otimização da base de clientes. O novo milênio começou com novas parcerias: com a Globex/Ponto Frio, por meio de seu banco InvestCred (depois PontoCred), e com o Magazine Luiza, formando o LuizaCred. Nessas duas operações, no segmento de crédito direto ao consumidor, o Unibanco passou a deter 50% de participação e a gestão dos negócios. Na Fininvest, possuía 100% de participação, desde dezembro de 2000. Juntas, as parcerias permitiram a ocupação de posição de destaque na oferta de produtos e serviços a um mercado ainda com grau baixo de bancarização. Em 2003, o Unibanco adquiriu a Creditec, consolidando ainda mais sua posição de liderança no segmento de crédito ao consumidor.

O Unibanco passou a ser, entre os “sobreviventes”, o mais antigo banco privado nacional, depois da venda do Econômico ao espanhol BBVA. No ano das comemorações dos 80 anos do Unibanco, em 2004, houve a compra do HiperCard, cartão de crédito private label e principal meio de pagamento das lojas Bompreço, aceito em mais de 70.000 estabelecimentos comerciais do Nordeste. O Unibanco também adquiriu as operações brasileiras do BNL, Banca Nazionale del Lavoro, e fechou importante parceria com o grupo Sonae para a criação de uma financeira. Neste ano, após 33 anos de uma bem-sucedida parceria, o Unibanco vendeu sua participação na Credicard para seus outros dois sócios no negócio.

Com o fim do governo FHC, Pedro Sampaio Malan, ex-ministro da Fazenda, foi convidado a ocupar o posto de vice-presidente do Conselho de Administração. Pedro Bodin, ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, principal executivo do Banco Icatu e um dos principais sócios do grupo Icatu, foi eleito membro do Conselho. Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, mais adiante, também foi convidado a participar do Conselho de Administração do Unibanco. Nunca se saberá se o embaixador Walther Moreira Salles Moreira Salles, falecido em 2001, teria aprovado tal identificação com a oposição política e com uma determinada linha de pensamento econômico...

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Com o novo governo, o de Lula, em 2003, inicialmente desacreditado por seus dirigentes, o Banco demorou reagir às oportunidades abertas face a um novo contexto macroeconômico e social. O Unibanco tinha saído na frente de outros bancos de varejo para firmar-se antes no segmento de financiamento ao consumo, posicionando-se para quando esse segmento explodisse. Chegou a construir uma franquia privilegiada, cuja principal jogada foi a compra da Fininvest. Mas essa estratégia começou a ser desenhada no contexto do governo FHC, quando o crédito consignado, por exemplo, nem era cogitado. O que parecia ser uma vantagem, virou um problema temporário sob as novas condições do mercado. O crédito consignado empurrou para as linhas mais caras os piores tomadores. “O crédito consignado, a redução de taxas e a bancarização da população brasileira geraram uma mudança de natureza estrutural no mercado”, reconheceu depois Pedro Moreira Salles (VALOR: 27/04/07. C3).

A partir dessa constatação, foi no quesito governança corporativa que as mudanças mais significativas aconteceram. O organograma do Unibanco mudou, para buscar maior sinergia entre as áreas, com o fim da estrutura de pilares. Decretou o fracasso da estratégia mais radical de segmentação. Pedro Moreira Salles se tornou o presidente executivo. A presidência do Conselho de Administração, até então ocupada por ele, passou a ser exercida por Pedro Sampaio Malan, que já ocupava há um ano a vice-presidência do conselho do Unibanco.

A busca por maior rentabilidade começou em 2004, quando Pedro Moreira Salles iniciou uma profunda reformulação no banco. No processo, assumiu mais responsabilidades executivas. Migrou de uma estrutura em que o banco de varejo e o de atacado atuavam como duas instituições separadas, com presidentes próprios, para uma em que ele mesmo comandasse o dia-a-dia dos dois negócios. Joaquim de Castro Neto e Fernando Sotelino, presidentes dos bancos de varejo e atacado que fizeram carreira na instituição, foram afastados.

Muita gente da velha guarda do Unibanco foi substituída durante o ajuste. Em diversos casos, os substitutos não duraram muito tempo. A mudança na estrutura de comando foi acompanhada por um mandato para forte redução de custos, especialmente no Banco de Atacado. Executivos que participaram dessa mudança de foco diziam que o banco desperdiçou talentos, transferidos sem grande custo para a concorrência.

Na área de Atacado, as grandes mudanças promovidas a partir da reorganização de 2004 tiveram um impacto dramático. O banco manteve boas posições nos rankings de emissão de títulos de dívida direta. Mas perdeu a onda de abertura de capital de empresas brasileiras, que se firmou a partir de 2005. Também perdeu posições na captação de recursos externos. O Unibanco era, segundo os rankings, o banco nacional mais ativo até 2003, quando ocupava o vigésimo segundo lugar, sendo que os líderes sempre foram bancos estrangeiros. Em 2004, foi ultrapassado pelo Itaú BBA, que continuou liderando o ranking entre as instituições nacionais. Na renda fixa, o Unibanco subiu no ranking de sexto para quarto lugar e manteve participação de 7,6% no total das operações, segundo a Associação Nacional dos Bancos de Investimento (ANBID). Na renda variável, parte do mercado que explodiu, o Unibanco passou de protagonista a coadjuvante. Em 2003, o Unibanco ocupava o terceiro lugar em estruturação de operações de renda variável (emissões de ações), com 10% do mercado. Na época, o Credit Suisse (ainda CS First Boston) tinha 10,5%. Em 2006, o Unibanco ficou em sétimo na renda variável, com participação de 3,5% do total. O Credit Suisse liderou, com 35,8%.

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O Unibanco caiu também na lista dos maiores bancos de varejo do país e em rankings de atividades específicas como administração de fundos, captação de recursos externos ou liderança de operações de abertura de capital de empresas. Em dezembro de 2006, ultrapassado pelo ABN AMRO Real e pelo Santander, ficou em quinto lugar entre os maiores bancos privados do país.

4.4. Surto bancário durante a II Guerra Mundial

No período da II Guerra Mundial houve um crescimento extraordinário do número de bancos nacionais em funcionamento no país. Em 1940, existiam no Brasil, incluindo matrizes, filiais e agências, 1360 estabelecimentos bancários. Em 1944, ano do auge do crescimento, esse número havia subido para 2459. Houve, portanto, um aumento de 1099 estabelecimentos. Considerando apenas as matrizes, o aumento foi de 309 bancos: em 1940, existiam 354 e, em 1944, 663. Dos 309 bancos novos, 72 estavam localizados no Distrito Federal, 38 em São Paulo, 17 em Minas Gerais e 24 no Rio Grande do Sul. Praticamente, a metade em quatro estados. Incluindo agências, filiais e sucursais, o aumento no Distrito Federal foi de 99, em São Paulo de 247, em Minas de 214 e no Rio Grande do Sul de 164.

Até o fim da II Guerra Mundial, vigorou um padrão de crescimento bancário cuja característica maior era a pouca concentração das unidades bancárias. A multiplicação das agências (78% a mais de 1940 a 1944) não acompanhava o ritmo mais acelerado de criação de novas empresas no setor (crescimento de 87% no mesmo período). Segundo HASENBALG & BRIGAGÃO (1970: 39), “esse padrão desconcentrado de crescimento revelava por um lado as facilidades decorrentes da legislação para o setor, bem como a não interferência reguladora do Estado no processo de expansão nesta etapa; por outro lado, o nível reduzido de recursos de capital, bem como requisitos organizativos e tecnológicos necessários à instalação de novos bancos relacionam-se ao intenso crescimento do número de empresas”.

O maior crescimento relativo ocorreu nos anos de guerra, entre 1940 e 1944, sendo o auge em 1943/44. A que se deveu essa notável expansão?

O Relatório da Diretoria do Banco do Brasil, em 1945, mostrou, em traços largos, um retrato da situação. “Fundaram-se bancos e casas bancárias em profusão. Pessoas alheias à técnica bancária, desconhecedoras dos mais rudimentares princípios de administração, atraídas unicamente pela idéia de lucros fáceis, obtiveram, abusando das facilidades oriundas da inexistência de uma lei bancária rigorosa, cartas-patentes para criação de bancos e estes surgiram com cogumelos em todo o país”.

“Foi causa também desta imoderada criação de bancos e casas bancárias a prática seguida pelos Institutos, Caixas Econômicas e Autarquias de efetuarem depósitos em bancos particulares, onde as taxas eram mais altas que no Banco do Brasil. A especulação criou mesmo um mercado de procura destes depósitos mediante comissões”.

“Houve bancos que se fundaram com capital meramente nominal, inúmeras vezes obtido por empréstimos, apenas para efeito do depósito legal exigido. Cumpridas as simples formalidades legais, obtida a carta-patente, saía o novo banqueiro à procura de depósitos de Institutos e passava a operar com estes recursos, aplicando-os sem

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obedecer a nenhum princípio de técnica bancária, preferindo, na maioria das vezes, operações de cujos resultados ele participava individualmente”.

Outro observador contemporâneo, em um jornal da época, esclarecia mais a ação das disponibilidades dos Institutos de Previdência e outros órgãos autárquicos. “Premidos pelo retardamento inexplicável do pagamento da parte que lhes era devida pelo Governo, os Institutos de Previdência foram levados a procurar um rendimento máximo para as suas disponibilidades efetivas e isto só encontravam, por uma estreiteza de ação favorecidas por circunstâncias diversas, nas elevadas taxas de juros atribuídas pelos bancos particulares, especialmente aqueles que foram fundados com o fito de aproveitarem o bom negócio. E, por esta via, foram lançados no mercado depósitos superiores a 1 bilhão de cruzeiros, utilizados quase exclusivamente no Rio de Janeiro, em negócios imobiliários”.

Houve uma especulação desenfreada na época da II Guerra Mundial. Ela se relacionava com uma elevada inflação e tinha seus aspectos urbanos e rurais. Esses fenômenos foram acompanhados de um forte surto bancário. Ambos tiveram seu auge nos anos de 1943 e 1944. Os “homens de negócio” da época deviam pensar que só o lucro especulativo tinha condições de compensar a vigorosa desvalorização da moeda nacional.

Um funcionário do FMI, em 1947, possuía a tese de que “a infecção inflacionista, entre nós, foi anterior à guerra e aos focos da moléstia originados por esta: os saldos do balanço comercial e as despesas extraordinárias de guerra”.

Segundo esse autor, “os diferentes fatores que originaram a inflação do período da Guerra foram os seguintes:

1. emissões para cobrir déficit orçamentários, em que se incluíam as emissões para compra de ouro;

2. política de grandes obras suntuosas na capital federal e nas principais capitais dos estados;

3. expansão do crédito bancário para empresas novas e muitos empreendimentos especulativos, e, ao revés, dificuldade de créditos para a lavoura de gêneros alimentícios;

4. o comércio exterior, apresentando saldos favoráveis que obrigaram o governo a emitir para comprar as letras de exportação, sem aplicação em novas importações em virtude da guerra; e também o predomínio das exportações de produtos da indústria extrativa agrícola e mineral sobre os demais, alcançando os mais altos preços;

5. a afluência de capital estrangeiro, principalmente de refugiados, que procuraram aplicação em bens imóveis e empresas de fácil liquidação (como o comércio de antiguidades, jóias, pedras preciosas e a indústria de lapidação), visando o retorno à Europa, em que deviam ser incluídas as destinadas à construção de bases navais e aéreas e as efetuadas por vários organismos criados para prestar assistência social nas zonas de interesse vital para o esforço de guerra;

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6. dificuldades de transporte criadas pela guerra, prejudicando o abastecimento dos principais centros comerciais e industriais do país e agravando o insulamento econômico do Brasil Central e outros pontos de nosso território”.

Caracterizando-se como uma “inflação de crédito”, o excesso de poder de compra criado durante a guerra se dirigiu principalmente para investimentos especulativos. Daí explicava-se o enorme aumento dos preços de imóveis de toda a espécie, quer rurais, quer urbanos, e das ações de algumas empresas, notadamente as de bancos e de fábricas de tecidos, diretamente beneficiadas pelas condições anormais criadas pela guerra.

A inflação operou uma redistribuição da renda nacional, beneficiando alguns grupos que acumularam fortunas, rapidamente, em detrimento da grande maioria da população, cujas condições de vida passaram a ser mais difíceis. Vejamos os grupos que se beneficiaram da “inflação da guerra”.

O Estado Novo (1937-1945) promoveu um amplo programa de construções urbanas no Distrito Federal e nas capitais dos Estados. Essa política de urbanização contribuiu para o aumento dos preços dos imóveis. O boom imobiliário não visava mais atender à necessidade de moradias, devido ao aumento da urbanização, mas sim explorar o lado especulativo do negócio. Elevaram-se, desmesuradamente, os lucros recebidos por construtores civis, comerciantes, industriais e banqueiros dos centros em que essas obras foram realizadas.

Diretamente beneficiadas pelas condições anormais criadas pela II Guerra Mundial, as ações de algumas empresas, notadamente, bancos e fábricas de tecidos, tiveram altas expressivas. No Rio de Janeiro, Belo Horizonte e outras capitais, aqueles que tinham se enriquecido, rapidamente, aumentaram seus gastos de “nouveau riche” e os restaurantes de luxo, os teatros, os cinemas, os cassinos e toda a espécie de diversões, em um país distante do palco da Guerra, passaram a se constituir negócios de primeira ordem. O jogo tomou formas e proporções nunca vistas.

Como visto, no capítulo sobre o Banco do Brasil, mais duas grandes especulações, no fim da ditadura de Vargas, foram feitas sob a proteção do Banco oficial: a do zebu e a do algodão. Talvez o aumento da demanda de carne, quer interna, quer externa, durante a guerra, possa ter sido o elemento gerador da violenta especulação com o zebu. Mas o fato foi que, em 1943/44, segundo o alarmante testemunho jornalístico, “os fazendeiros mineiros ostentavam sua fortunas contando nos dedos os números de zebus adquiridos em terras distantes, a peso de ouro”. Era a “febre do zebu”, como ficou conhecido o boom do boi que valia fabulosas fortunas.

“Em 1944, os grandes criadores pagavam fortunas para ver seus zebus publicados em páginas inteiras dos jornais, e os grandes campeões dos torneios recebiam um banho público de dezenas de garrafas de champanhe francês. Não havia limites para a ´loucura´ do zebu. Negociavam-se reprodutores da raça nas ruas de Belo Horizonte com base simplesmente em suas fotos. Particulares corriam aos bancos para tomarem empréstimos, com o fim de especularem com o valor do boi”.

“Os reprodutores alcançavam preços altíssimos. Se uma casa no bairro mais sofisticado de Belo Horizonte custava, por exemplo, 100 milhões, um zebu importado custava 500 milhões. Um boi valia cinco casas no melhor bairro. Mas teve um dia que a

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febre curou e o boi voltou a valer realmente um boi. Foi o caos nas grandes fazendas que ostentavam zebus e dívidas nos bancos. O preço caiu naquilo que realmente correspondia ao valor do animal, e os fazendeiros, assustados, correram aos bancos. O Banco do Brasil teve que garantir. Decretou-se a moratória. O sonho acabou e muita gente ficou na miséria. Como na febre da borracha ou na febre da bolsa”.

O zebu atraia uma grande massa de capital em inversões estimuladas pela Carteira Agrícola do Banco do Brasil porque se sentia falta de aplicações produtivas em que empregar. Havia bancos demais que se multiplicavam talvez pela própria falta do que fazer com o dinheiro. No que tocava aos bancos privados, havia participações acionárias dos bancos no capital de empresas de comércio e indústria, sem nenhum programa preconcebido, na maioria dos casos como emprego de reservas.

Durante a II Guerra Mundial, a especulação com o zebu envolveu os banqueiros mineiros da seguinte forma: o Banco do Brasil fornecia em abundância o crédito pecuário aos criadores mineiros, que especulavam com o valor do gado e depositavam seus ganhos na rede bancária privada. Esta, por sua vez, recambiava esses valores principalmente para Belo Horizonte, onde os banqueiros os aplicavam em especulação imobiliária. A capital de Minas recebeu, por várias décadas, fundos não só do interior mineiro, como também de outros Estados.

Era comum o uso de fraude para obtenção desse crédito pecuário. Fazendeiros conseguiam empréstimos para compra de gado que já estava no seu curral. Usavam notas fiscais antigas e/ou falsificadas para comprovação da compra e empregavam os empréstimos em compra de terras e/ou imóveis nas cidades. A fiscalização do Banco do Brasil era diminuta. Quando havia, conseguia-se o trajeto das visitas do fiscal às fazendas. Assim, esse leal servidor do maior banco brasileiro era precedido de uma “boiada itinerante”, de uso comum dos fazendeiros da região, justamente para ocasiões como essas se apresentavam.

A especulação também campeava nos negócios imobiliários, meio de vida de uma frondosa classe de prósperos corretores. Ela acentuou-se no pós-guerra e na década dos 50, época de um vertiginoso crescimento da capital mineira – Belo Horizonte –, que atingia a maior taxa de crescimento populacional entre todas as capitais brasileiras. Foi a época da abertura das grandes avenidas, dos loteamentos de bairros inteiros, da urbanização da Pampulha, etc.

A especulação com imóveis foi outra “febre”. O belohorizontino era, antes de mais nada, um comprador de lotes... Contavam-se diversos “casos” sobre o relacionamento dos bancos com seus clientes. Um deles dizia que os bancos emprestavam com segundas intenções: mesmo sabendo que o cliente não tinha condições financeiras, incentivavam-no a construir, “sob garantia de amparo do banco”. Depois de a obra ter alcançado certo desenvolvimento, cessavam o crédito e pressionavam o cliente para saldar suas dívidas. Desesperado, este vendia por baixo preço a um “testa-de-ferro” (representante) do banqueiro, a construção inacabada. O banqueiro terminava a obra e a revendia com lucro fabuloso. Os banqueiros mineiros eram proprietários de parcela nada pequena dos imóveis da cidade de Belo Horizonte.

Com o excesso de dinheiro acumulado nas mãos de poucos, evoluiu a exploração do negócio bancário. Ele facilitava a reaplicação dos recursos. Existiam estabelecimentos bancários que empregavam quase todos os depósitos captados em

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empréstimos em contas correntes ou na carteira de descontos. Sem disponibilidades em caixa, face à possibilidade de uma corrida (resgate) de seus clientes, eles confiavam na “solidariedade bancária”. Naquela época, um banco podia emprestar, diretamente, a outro, socorrendo-o em momentos difíceis. Isso criava uma interligação entre os diversos bancos e um risco de crise sistêmica que davam margem não só para eles incorrerem em operações arriscadas, como também para deterem um grande poder de barganha política.

Os banqueiros, ficando com grande parte dos recursos de terceiros captados por seus bancos para o próprio usufruto (ou de sua família), racionava o crédito para financiar os estoques e a produção. Aumentava, assim, o custo desse dinheiro e dificultava a obtenção de empréstimos pelas empresas. Isso diminuía a lucratividade e impedia a expansão das atividades produtivas. Estas se tornavam ainda menos atrativa diante da atividade financeira: era mais lucrativo especular do que produzir. Os lucros gerados na produção, intensificada durante a II Guerra, não eram reinvestidos na ampliação da capacidade produtiva (tendendo já ao esgotamento), mas sim na atividade puramente especulativa.

A realização de novos investimentos reais, em ampliação da capacidade produtiva, durante esse período, era limitada não só pela dificuldade de obtenção de créditos por parte das empresas. Elas poderiam recorrer ao autofinanciamento, em face de seus fabulosos lucros naquele período de conflito bélico. Mas havia também a restrição às importações de máquinas, equipamentos e matérias primas, imposta pela guerra. Face a essa barreira e à possibilidade de elevados lucros especulativos, a acumulação real foi relegada a um segundo plano.

Entretanto, nem tudo foi “fictício” nesse processo de inflação de ativos, provocado por uma mirabolante onda especulativa. Na verdade, o “véu monetário” tendia a cobrir a visão de uma real acumulação de capital urbano, que se deu nesse período.

É ilustrativo o depoimento de FONTENLA (1975: 109). “A especulação criara um mercado de procura de depósitos mediante elevadas comissões. Pessoas alheias à técnica bancária, atraídas unicamente pela idéia de lucros fáceis, tinham obtido cartas-patentes para criação de bancos. Conhecemos bancos que tinham responsabilidades por redescontos cinco a dez vezes maiores que suas reais possibilidades; a sua função como estabelecimento de crédito era só aparente. Proposto e aceito o redesconto de um título por um desses estabelecimentos, o cliente só poderia receber o dinheiro no dia seguinte ou horas mais tarde pois aquele título era levado às pressas para o redesconto, a fim de ser feita a disponibilidade de caixa necessária para o pagamento. O lucro estava na diferença de juros e comissões cobrados. No vencimento, se o cliente não podia pagar, era feito novo título, que seguia o mesmo caminho do primeiro e a situação estava resolvida. Esta era a especulação, o expediente denominado inflação de crédito”.

O aumento do número de bancos assumira no Brasil, em 1944, proporções inquietantes. Era fácil tornar-se banqueiro. Alguns grupos de pretendentes colocavam na diretoria do novo banco, como prevendo dificuldades, nomes de prestígio político. Nesse ano, em 13 de abril, pelo Decreto-lei nº 6419, reorganizou o governo a CAMOB, atribuindo-lhe funções reguladoras da criação de estabelecimentos bancários e fiscalizadoras de seu funcionamento. Inclusive passou a denominar-se Caixa de Mobilização e Fiscalização Bancária. Ela, ao contrário da Carteira de Redescontos do

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Banco do Brasil, cujas operações eram a curto prazo, socorria os bancos nas dificuldades que lhes advinham de perdas de depósitos, recursos imobilizados ou aplicados a longo prazo.

Por esse mesmo decreto, limitou-se a expansão dos bancos de acordo com o seu maior ou menor capital. Houve a limitação das atividades dos pequenos bancos, mediante um critério de zoneamento estabelecido por sua capacidade financeira. A concorrência no sistema bancário ficou então definida institucionalmente. O ônus do castigo pela especulação recaiu sobre os pequenos. Segundo as autoridades monetárias, os pequenos bancos que provocaram o encarecimento no mercado de crédito, pois necessitavam obter vantagens que compensassem os juros relativamente altos pagos aos seus depositantes. Foram eles também que se ligaram às iniciativas que a outros pareceram excessivamente arrojadas.

A criação de um Banco Central do Brasil era uma velha discussão, medida já aconselhada, em 1931, pelo financista britânico Sir Otto Niemeyer, que a convite do governo brasileiro, procedeu a um estudo econômico-financeiro do país. Sob a ameaça de crise que se esboçou em 1944, o governo foi obrigado a tomar medidas mais positivas em direção a tal objetivo. Assim, Getúlio Vargas, pelo Decreto-lei nº 7293, em 2 de fevereiro de 1945, criou, diretamente subordinada ao Ministério da Fazenda, a Superintendência da Moeda e do Crédito, “com o objetivo imediato de exercer o controle do mercado monetário e preparar a organização do Banco Central”.

A atividade bancária ficou, portanto, submetida a um controle governamental mais rígido. Os bancos teriam que se adaptar. Mudou o caráter da atividade bancária depois de 1945. Foi o fim de uma etapa competitiva do sistema bancário brasileiro.

4.5. Bancos em São Paulo

Segundo BANAS (1959: 24), “até pelo menos 1953, efetivamente, o café era a mola-mestra do sistema bancário nacional, ou melhor, de seu setor mais rentável, o paulista. Tanto o volume dos negócios ligados ao produto, como a segurança e a velocidade com a qual as aplicações voltavam para o banco, asseguravam aos estabelecimentos bancários paulistas uma rentabilidade consideravelmente superior à da média observada no conjunto dos bancos no Brasil. É esta, aliás, a razão porque os estabelecimentos de todas as regiões do país passaram a abrir agências no Estado de São Paulo: todos queriam se aproximar desta fabulosa ‘matéria-prima bancária’, que era o café. Em outras palavras, o volume de dinheiro quando depositado em um ‘Banco de Café’ rendia mais do que quando confiado a um banco que trabalhava no Rio, em Minas ou no Rio Grande do Sul. Assim, enquanto que esses últimos bancos mantiveram as suas raízes no seu Estado de origem e só participavam marginalmente nas transações com o café, a sua rentabilidade era inferior à dos bancos cafeeiros, mesmo quando o volume dos depósitos lhes era mais favorável”.

Embora o capital cafeeiro tivesse perdido seu papel dominante no ritmo de acumulação da economia paulista, para o setor urbano-industrial e outras lavouras, o financiamento da comercialização do café ainda propiciava lucros bancários extraordinários.

A situação mudou na década de 50, pois a inflação brasileira entrou em uma fase mais aguda e as necessidades de investimentos industriais foram crescendo. Como

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conseqüência desse aumento da demanda de crédito, subiu consideravelmente a taxa de juros, principalmente das aplicações. Em que pese a taxa de inflação, após 1950, ficar acima do limite para a taxa de juros fixada pela “Lei da Usura” (12% ao ano), através de recursos como juros cobrados “por fora”, sobrecarga nas comissões bancárias e contas vinculadas (ou saldos compensatórios), alcançava-se lucros bancários substanciais com a inflação. Estes lucros resultavam da diferença entre duas taxas de juros negativas: as cobradas, que eram crescentes, e as pagas (sobre depósitos à vista até 1966), que eram estáveis. Com isso, as aplicações no comércio cafeeiro deixaram de render mais, em termos de volume, do que empréstimos ou descontos concedidos a outros setores econômicos do país. Já não era vantagem trabalhar exclusivamente com o café, mas sim acumular o maior volume de depósitos, pois o rendimento se uniformizava através dos lucros inflacionários.

Dessa forma, os bancos de Minas Gerais, que tinham a seu favor a vantagem inicial de ter estendido sua rede de agências para todas as regiões do território nacional em busca de novos depositantes, começaram a se beneficiar da nova situação. Suas colocações no ranking dos maiores bancos privados por volume de depósitos e a evolução de seus lucros líquidos demonstravam essa situação. Essa vantagem só com o tempo poderia ser compensada pela expansão dos bancos paulistas para fora de sua região. Isso ocorria lentamente.

A economia se diversificava, gradativamente, com a indústria ocupando lugar preponderante. O sistema de crédito precisava acompanhar essa modificação. Enquanto os bancos brasileiros, por necessidade ou por pressão do Banco do Brasil, se adaptavam, os bancos estrangeiros se mantinham especializados no financiamento do comércio exterior e de negócios de câmbio, não se interessando nem pelo financiamento agrícola nem pelo crédito à indústria local. O fortalecimento do mercado interno, em desfavor das trocas com o exterior, foi mais favorável aos bancos nacionais.

“Os negócios de financiamento do café eram muito lucrativos, assegurando uma rápida circulação dos créditos. A associação dos bancos com armazéns e comissários de café de Santos dava boa rentabilidade. Mas os bancos cafeeiros não permitiram sequer que outros bancos da praça de São Paulo, quanto mais dos outros Estados, penetrassem em seu mercado. Os negócios com o café eram seguros, pois o Banco do Brasil garantia preços mínimos de financiamento, de maneira que a função dos estabelecimentos bancários era, muitas vezes, de uma espécie de agentes do Banco oficial” (BANAS, 1959: 8).

Depois de 1949, a rentabilidade no setor cafeeiro aumentou mais, e com ela cresceu o enriquecimento dos bancos especializados. Esses estabelecimentos adotaram uma política de autofinanciamento, utilizando entre metade e dois terços do lucro para reforçar as reserva bancárias e incorporá-las, mais tarde, ao capital. Os bancos estrangeiros, ao contrário, talvez pelo temor às conseqüências do nacionalismo do segundo Governo Vargas, remeteram os lucros, na razão de 80%, para o exterior, utilizando somente 20% para reforçar suas reservas. Com isso, aumentaram mais lentamente seu capital, e, paralelamente, seus depósitos, em comparação com os bancos nacionais.

O saneamento do sistema bancário trouxe em seu bojo forte concentração. Como vimos, lucros substanciais dos bancos eram realizados em cima das taxas de juros negativas, em termos reais, devido à inflação. O fato de elas estarem abaixo do aumento

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dos preços levou a que a demanda do crédito estivesse sempre acima da capacidade de oferta. A permanente necessidade de elevação dos depósitos à vista (fonte dos lucros bancários) determinava o processo de expansão da rede bancária, pela abertura de novas agências. A concessão de novas cartas-patentes era caso raro, o que obrigava as fusões ou encampações de bancos. O processo de concentração bancária era revelado pela queda do número de matrizes de 1944 a 1964, de 663 a 328, e pela elevação do número de agências, entre esses anos, de 1.796 para 6.389. A média de agências por banco subiu, portanto, de 2,7 para 19,5.

Houve também nítido vínculo entre a política econômica e a concentração bancária. Nos períodos de aceleração inflacionária com política liberal de crédito, a reinversão dos lucros retidos permitiu a expansão interna dos bancos. Políticas de contenção inflacionária, por exemplo, do Governo Dutra, da gestão Gudin de 1954/55, quando a taxa de inflação caiu de 27% para 16,4%, e da resolução SUMOC, em 1958/59, de utilizar os depósitos à vista e os depósitos compulsórios no Banco do Brasil para atender ao Tesouro Nacional, levaram a crises bancárias. Com elas, houve a eliminação e/ou a fusão dos bancos frágeis com instituições financeiras mais sólidas, além da elevação dos depósitos à vista nestas. Isto porque os negócios bancários, por princípio, são essencialmente de confiança. Na época, em regra, a instituição de crédito trabalhava na razão de 90% de suas disponibilidades com fundos de terceiros (os depositantes), que ao menor sinal de instabilidade podiam, pelas suas retiradas, colocar o mais sólido estabelecimento em dificuldades.

Outro fator de fortalecimento dos bancos nacionais foi a adoção pelo Governo Federal da política de garantia dos preços mínimos agrícolas, similar à norte-americana, não somente para o café, como já era hábito, mas também para outras safras comercializáveis. Começou assim a época da “monetização do campo”, cujas origens remontam a 1951, e que drenou dinheiro em volume crescente para o chamado interior. Os bancos nacionais, atentos à nova situação, começaram a estender a rede de suas agências para os centros de produção agrícola. Os bancos estrangeiros não acompanharam o movimento. Desde seus ingressos, adotaram o hábito de fazer negócios que se limitavam ao setor do comércio exterior. Depois, com a prática de reserva de mercado para os bancos brasileiros, a SUMOC não concedia autorização para os estrangeiros abrirem novas agências, no interior, tolerando somente suas agências já existentes em algumas capitais.

Paralelamente à penetração no interior, processou-se a transformação dos bancos de caráter regional em bancos nacionais. Os estabelecimentos de Minas Gerais, desde a época da II Guerra, saíram de seu Estado. Os bancos paulistas, no final dos anos 50, ainda não tinham iniciado sua peregrinação para os outros Estados da União. Isso porque as oportunidades oferecidas pela expansão de sua economia eram tão rentáveis que não incitavam ao nomadismo, em busca de outros destinos para o financiamento.

Entretanto, no pós-guerra, houve uma súbita expansão de um grupo de bancos de São Paulo, que na maioria dos casos nasceram durante o período da II Guerra Mundial, daí seus apelidos de “cadetes”. Adotavam métodos de trabalho dinâmico, assumindo posições de arrecadadores de impostos estaduais e municipais, oferecendo maiores facilidades aos depositantes, entre outras inovações financeiras. Seu crescimento extraordinariamente rápido ameaçou os bancos tradicionais, obrigando-os a prestar o mesmo tipo de serviços.

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Entre os “cadetes vencedores”, dois se tornaram os maiores bancos privados nacionais.

4.6. Origem do Bradesco: "Banco Brasileiro de Dez Contos, Se Há"

Amador Aguiar (1904-1991), o fundador do maior banco privado do país, garantia nunca ter lido um livro sobre economia, "para não passar a cometer erros". Foi um exemplo típico de self-made man, homem que adquiriu fortuna pelo própria iniciativa. Apesar de sua baixa escolaridade (estudou apenas até o quarto ano primário), seu estilo administrativo mudou a história das instituições bancárias no Brasil.

O terceiro dos 13 filhos de trabalhador rural foi criado em fazenda, onde a família trabalhava, em Sertãozinho, na região de Ribeirão Preto. Em 1920, fugiu de casa porque, como revelaria mais tarde, o pai “fumava, bebia e era mulherengo”. Antes, se convertera ao protestantismo. A ética protestante e o espírito do capitalismo (“fora do lugar”) eram apresentados sob forma de uma idolatria pelo trabalho, inclusive seu lema era a frase “trabalho não mata e não faz mal”, e uma visão moralista da vida.

A peculiaridade dessa filosofia da avareza parece ser, acima de tudo, a idéia do dever de um indivíduo com relação ao aumento de seu capital, que é tomado como um fim em si mesmo. A obtenção de mais e mais dinheiro, combinado com o estrito afastamento de todo gozo espontâneo da vida, é um princípio orientador do capitalismo. O homem é dominado pela produção de dinheiro, pela aquisição econômica encarada como finalidade última da vida, não mais como meio de satisfazer suas necessidades materiais. A perda de tempo através da vida social, conversas ociosas, do luxo, e mesmo do sono além do necessário para a saúde (seis, no máximo oito, horas por dia) é o primeiro e o principal de todos os pecados. Não é, pois, o ócio e o lazer, mas apenas a atividade que serve para aumentar a glória de Deus.

O surgimento desse novo espírito, o "espírito do capitalismo moderno", em que se muda seu método de explorar o mercado, tomando em suas mãos os mínimos detalhes, cuidando pessoalmente da clientela, ajustando diretamente a qualidade do produto às necessidades e desejos destes clientes, é revelado pelos principais traços biográficos de Amador Aguiar. Ele começou a introduzir o princípio dos "baixos-preços" e de "grande-giro" na atividade bancária. Repetiu-se aqui o que sempre e em toda parte é o resultado de tal processo de "racionalização" capitalista: aqueles que não fizeram o mesmo, tiveram que sair do negócio bancário. Sob a pressão de uma amarga luta competitiva, os lucros tinham de ser sempre reinvestidos na expansão dos negócios. A velha atitude de lazer e conforto para com a vida deu lugar à rija frugalidade, pois não visava a consumir mas sim a ganhar.

As próprias palavras de WEBER (1974: 199) cabem para ilustrar o papel dessa ética protestante, que deu margem à mais bem sucedida empresa capitalista brasileira no ramo bancário. “A questão das forças motivadoras da expansão do capitalismo moderno não é, em primeira instância, uma questão da origem das somas de capital disponíveis para uso capitalístico, mas, principalmente, do desenvolvimento do espírito do capitalismo. Onde ele aparece e é capaz de se desenvolver, ele produz seu próprio capital e seu suprimento monetário como meios para seus fins, e não o inverso”.

Amador Aguiar deu 64 anos de sua vida como "bancário" (gostava de ser assim chamado), 47 dos quais dedicados com exclusividade ao Bradesco, desde a sua

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fundação. Dedicava pelo menos 12 horas de expediente ao dia na sede do Banco, na Cidade de Deus (inaugurada em 1953 e concluída em 1959 em Osasco), cujo marco à entrada é a estátua de um burro de carga. “Dedico todo o meu tempo ao banco; para minha família sempre fui uma visita”, costumava dizer.

Seu primeiro emprego foi como tipógrafo, em Ribeirão Preto. Dizia que, na gráfica, aprendeu a "ler com atenção", o que considerava essencial para seu sucesso. Perdeu parte do dedo indicador direito ao operar uma impressora Liberty, hoje exposta como troféu à entrada da gráfica do Bradesco, em Osasco. Trabalhou ainda como gráfico em Bebedouro, onde se casou aos 21 anos. Sua esposa queria ficar perto do pai, que morava em Birigui. Por isso, mudaram e o marido foi trabalhar na agência local do Banco Noroeste, em 1926. Fazia um pouco de tudo na pequena agência, até serviços de faxineiro. Um ano depois assumiu o serviço de contadoria e, dois anos mais tarde, foi promovido a gerente da agência do Noroeste em Presidente Alves. Mais um ano e passou a gerenciar a agência de Penápolis. Em 1932, retornou a Birigui, como gerente da agência onde fora contínuo. Seu desempenho eficiente na dinamização dos serviços bancários das filiais onde trabalhou levaram-no a ocupar postos-chave dentro do Banco Noroeste, onde chegou a sub-diretor.

Em 1943, aos 39 anos, Amador Aguiar assumiu a direção do então pequeno Banco Brasileiro de Descontos S.A. (apelidado de "Banco Brasileiro de Dez Contos, Se Há"), quando foi convidado por um grupo de amigos que tinha comprado a Casa Bancária Almeida & Cia. Ltda., fundada em 1941, em Marília, para transformá-la em banco. Um dos amigos, exatamente o que entendia de banco, morreu na véspera de assumir o cargo. O grupo então convidou Amador, para substituí-lo.

Sua experiência de quase duas décadas no Banco Noroeste demonstrava que uma larga fatia de riquezas não estava sendo explorada pelos banqueiros. Em Marília, uma cidade de 36 mil habitantes, 14 bancos disputavam uma clientela de elite onde não existia elite. A força de trabalho era, predominantemente (64%), de imigrantes japoneses, que vendiam a produção de algodão em caroço para empresas do porte da Anderson Clayton, Matarazzo e Swift. A região, nos anos 40, era conhecida pelas abundantes colheitas de café e algodão. Vivia-se a "febre do algodão" em função do aquecimento da demanda externa provocado pela situação bélica, produto que contava então com o maior financiamento da CREAI do Banco do Brasil.

Na época, em Marília, o banco de Amador Aguiar não procurou, prioritariamente, conquistar os barões do café, que haviam resistido à crise de 1929, nem os empresários que começavam a desenvolver no interior paulista a indústria do açúcar. Ele foi atrás do homem simples, do colono japonês ou italiano, do comerciante de cereais, do pequeno agricultor e do funcionário público. Sua estratégia inicial consistiu em atrair o pequeno comerciante, o funcionário público, pessoas de posses modestas, ao contrário dos bancos da época, que só tinham atenções para os grandes proprietários de terras.

Quando o Banco abriu as portas (permaneciam abertas diariamente das 9:00 às 18:00 horas), além da Matriz (em Marília), possuía 6 agências em Getulina, Rancharia, Vera Cruz, Garça, Tupã e Pompéia. Esta era o ponto final da Estrada de Ferro Paulista, que fervilhava com o comércio de algodão. Sua primeira providência foi tirar os gerentes das "gaiolas" (redomas de vidro onde trabalhavam) e colocá-los na entrada, para fácil acesso ao cliente. Amador Aguiar contou como transformou o Bradesco no

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banco mais procurado da região de Marília: simplesmente descobrindo as falhas dos concorrentes, através de funcionários "olheiros", que circulavam nas agências, ou davam plantões nas portas, para ouvir as reclamações dos clientes.

Não discriminava os colonos japoneses, não aderindo à xenofobia provocada pela II Grande Guerra. Os bancos dos "países do eixo", que antes atendiam com exclusividade essa colônia de imigrantes, tinham sido fechados. Como o Banco não discriminava os naturais de países aliados do Eixo na Guerra, era comum os japoneses fazerem fila para abrir contas. Eles se sentiam protegidos, porque tinham confiança de que não teriam o dinheiro bloqueado. Tinham inclusive um intérprete no Bradesco. A convivência, desde a infância, de Amador Aguiar com agricultores japoneses ensinou-o a importância da austeridade e da obstinação, típica dos orientais.

Raros eram os clientes que sabiam preencher cheques corretamente. A devolução de cheques fazia parte da rotina do mercado. No Bradesco, os gerentes davam um atendimento pessoal aos clientes no preenchimento dos cheques, garantindo-os. Ele foi um dos primeiros a estimular o uso de cheques por seus correntistas, que eram orientados a preencher as folhas nas próprias agências. Inusitado em São Paulo, este estilo de exploração do mercado de massas antecipava-se ao ciclo de massificação do capitalismo, com popularização dos negócios.

A região agrária, onde se localizava, enfrentava graves dificuldades de transporte dos produtos industriais. O Banco passou a explorar o filão comercial: era possível encomendar remédio, trigo, peças de reposição, combustível, etc., nas suas agências. Ao funcionar como se fosse um empório, somou aos seus clientes agricultores os comerciantes e as prefeituras.

O próprio Amador lembraria: “Criamos uma coisa nova no Brasil: um banco dedicado a prestar serviços”. O Bradesco foi o primeiro banco onde se podia pagar e receber as mais diversas contas, inovação que expandiu rapidamente a clientela do banco. A escalada daquele estabelecimento pequeno, com apenas 54 funcionários, foi acelerada sob o comando de Amador Aguiar, seguindo a filosofia (hoje se diria “estratégia”) de que muitos pequenos empréstimos constituem uma operação menos arriscada do que poucos grandes empréstimos.

A mudança da Matriz para a capital paulista, logo em 1946, ampliou radicalmente a possibilidade de expansão. As iniciativas de assumir a cobrança de tarifas públicas (Light em 1946) e receber as declarações de Imposto de Renda (em 1967) foram decisivas, para seu crescimento. O Bradesco descobriu que a Receita Federal guardava nos seus depósitos pilhas de notificações do Imposto de Renda, sem saber como fazê-las chegar, de forma rápida, aos contribuintes. Como estava se saindo bem com a cobrança de contas de luz, assumiu a operação, que adensava as filas. Os banqueiros concorrentes não vislumbravam nenhuma possibilidade de lucro imediato. Em 1967, uma nova lei dos incentivos fiscais vincularia a entrega das declarações do Imposto de Renda ao domicílio bancário de aplicações dos incentivos fiscais. A colheita foi rápida. Num universo de 200 mil contribuintes, o Bradesco ficou de longe com a maior fatia, cerca de 30%.

A história da expansão de sua rede de agências se confundiu com os avanços do capitalismo brasileiro. Inicialmente, nos anos 50, o processo de expansão do Banco para fora do Estado de São Paulo acompanhou sua clientela na penetração da fronteira

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agrícola do norte do Paraná. Em suas terras roxas, onde o café fazia brotar fortunas e cidades, o Banco duplicava os depósitos a cada mês. Em 1951 e 1952, foi o maior banco privado nacional em captação de depósitos. Das suas 5 agências pioneiras, no Paraná, logo se saltou para 15. O Banco conhecia os colonos e liberava o crédito na base da confiança, sem exigir cadastro.

O Bradesco começou a comprar bancos cedo, desde 1948, cinco anos após sua fundação, quando incorporou o Banco Mobilizador de Crédito. Até 2007, foram 42 bancos incorporados pelo conglomerado, além das seguradoras e outros tipos de instituições financeiras. Em 1948, 1954 e 1959 foram 3 aquisições; entre 1965 e 1973, ocorreram 15; na última onda de aquisições, de 1997 a 2007, somaram-se mais 24. De maneira geral, os objetivos para as fusões e aquisições são: adquirir clientes, entrar em novos mercados e/ou cortar custos. A fusão entre dois bancos pode complementar, geograficamente, seus mercados e reduzir, proporcionalmente, custos, por causa de um melhor aproveitamento (“economia de escala”) que o banco resultante terá com uma infra-estrutura de maior porte.

Em 1967, cobria 11 estados do país, com uma rede de 326 agências. Onze anos após, depois do processo de concentração bancária e conglomeração, que liderou, alcançaria a milésima agência. Em 1978, a única faculdade de expansão da rede era o programa de agências pioneiras. Nos anos de 1978 e 79, abria uma agência por dia útil. Chegou ao pico de 2.090 agências funcionando, em 1986. Depois, o Banco se fortaleceu mais nos grandes centros financeiros, onde o retorno era mais imediato, e reduziu a rede.

Ao mesmo tempo em que desenvolvia o banco comercial, o Bradesco foi formando um conglomerado financeiro, com a criação de um banco de investimento, de uma financeira, de uma corretora de valores mobiliários, de uma agência de turismo, e de companhias de crédito imobiliário. Associou-se, em 1983, com o grupo Atlântico Boavista, do empresário Antonio Carlos Almeida Braga, criando o Grupo Bradesco de Seguros com 10 companhias de seguros e com uma empresa de capitalização.

Já existia no Banco, desde 1962, um grupo de inteligência que não aglutinava mais do que uma dezena de pessoas, entre elas as que foram escolhidas como sucessoras na sua presidência. Ele procurava criar uma estrutura de tirar lições consistentes dos perfis dos bancos recém-incorporados. Nesse mesmo ano, foi o primeiro banco brasileiro a incorporar o computador na rotina diária. Na realidade, foi a primeira empresa a adquirir o primeiro computador da América Latina, que possibilitava o acesso a extratos diários aos clientes, prestação de serviço inédita para a época. Seguindo a estratégia de pioneirismo, o Bradesco implantou o Cartão de Crédito Bradesco, em 1968.

A revolução da informática provou ser mais uma iniciativa bem sucedida. Aumentou os números da cobrança e da produtividade, pois as contas correntes não mais precisavam ser refeitas um par de vezes por segurança. A possibilidade do extrato diário atraiu clientes. Desde então, predominou na tecnologia bancária de ponta.

No período do chamado "milagre econômico", o Banco pode explorar vários novos negócios de uma economia que crescia até 12% ao ano, inclusive o crédito direto ao consumidor, quando explodiu o boom das compras de automóveis. Nos anos 70, houve também o avanço do Bradesco nas regiões da fronteira agrícola, começando a

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atuar em projetos agropecuários. A meta era usar os incentivos fiscais para levar pecuária e novas tecnologias ao interior. Foi assim que nasceram fazendas como a Rio Capim, no Tocantins, a Bodoquena, no Mato Grosso do Sul (adquirida do Grupo Moreira Salles), e a Canuanã, na Ilha do Bananal, numa das portas de entrada da região amazônica.

Na década dos 70, o Bradesco não só incorporou vários outros bancos mas também, ao inaugurar duas novas unidades em 1978, uma no Oiapoque (AP), outra no Chuí (RS), pontos extremos do País, chegou à milésima agência. Foi implantada a cobrança automática.

Chegou a haver negociações de Amador Aguiar com Walter Moreira Salles, para fundir o Bradesco ao Unibanco, em 1972. Diante da diretoria do Unibanco, composta por executivos com formação universitária, Aguiar não resistiu a falar dos "meninos" do Bradesco: – “Meus diretores têm curso primário. O único que fez ginásio não está conosco. Ele se licenciou para ser governador”. Referia-se a Laudo Natel, duas vezes governador de São Paulo. O projeto de fusão foi arquivado. A justificativa acabou sendo o “choque cultural”. Um diretor do Unibanco foi inclusive barrado pelo porteiro do Bradesco, devido ao tamanho de seu cabelo...

Na década de 80, o Banco completaria um ciclo de expansões. O negócio de seguros se fortaleceria com a incorporação da Atlântica-Boa Vista. O Conglomerado Bradesco consolidou-se com o Turismo, o Cartão de Cédito, a Previdência Privada e o Leasing. Em 1983, no seu quadragésimo aniversário, já exibia a estatura de conglomerado financeiro (com todas suas empresas despontando como líderes em seus segmentos de mercado), com 1.400 agências e 2 milhões de acionistas. Era o maior banco privado da América Latina.

O Bradesco formou o Grupo Bradesco Seguros, com negócios nos segmentos de previdência privada aberta e de capitalização, além da seguradora. O uso do cartão magnético se popularizava entre os clientes ao longo desses anos. As primeiras agências com auto-atendimento e o Telecompras Bradesco foram implantados. Em 1986, o serviço Telesaldo, atualmente Fone Fácil Bradesco, entrou em operação.

Dizia a lenda que Amador Aguiar dirigiu um fusquinha a maior parte da vida. Na verdade, ele morreu deixando, não os mais de US$ 800 milhões que dizia o boato, na época de sua morte, em 24 de janeiro de 1991, mas sim R$ 100 milhões, como se soube nas disputas judiciais entre suas filhas e a segunda mulher pelo espólio do banqueiro. Ele podia ser visto, sem dúvida, como um calvinista weberiano.

O banqueiro Olavo Setúbal, presidente do Conselho de Administração do Banco Itaú, guardou na memória uma frase que lhe foi dita pelo legendário Amador Aguiar. Foi em meados dos anos 60, durante o processo de fusões que atingiu o sistema financeiro no Brasil e a partir do qual surgiu o Itaú, como um banco relevante. – “Olhe, Olavo, você vai passar todos eles, mas a mim não”, disse Aguiar, antecipando o crescimento que o Itaú teria até tornar-se o principal concorrente do Bradesco, no país. Em 1991, Aguiar morreu, sem ver sua frase desmentida, pois o Itaú nunca chegou de fato a ameaçar a liderança do Bradesco enquanto Aguiar era vivo, durante duas décadas de disputa.

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Ele foi um banqueiro homenageado pelo maior concorrente, Olavo Egydio Setúbal, presidente do Itaú: – “Foi ele quem desmistificou a figura do banqueiro elitista, que só emprestava dinheiro à burguesia e à nobreza. Ele quebrou a imagem do banqueiro tradicionalista e transformou o banco em um prestador de serviços ao povo. É o primeiro banqueiro popular do Brasil”.

Os fatores decisivos para o crescimento do Bradesco, segundo Lázaro Brandão, sucessor de Amador Aguiar como presidente do seu Conselho de Administração, foram “pré-disposição para o trabalho; aproveitar toda oportunidade ou de incorporação ou de ampliação da rede, e cuidar bem da parte de apoio, da automação”. Ele alinhou ainda a rapidez de decisões e o vislumbre de áreas que poderiam dar retorno. Citou como exemplo o Norte do Paraná à época de sua colonização, feita na senda do café. O Bradesco foi o primeiro a ir para lá. “Outra das armas fortes na manutenção da liderança, foi a capacidade de ser pioneiro, de agregar novos valores para o cliente, seja o mais humilde, seja um grande empresário, e a capacidade de se superar, constantemente, desafio permanente para os funcionários”, disse (GZM, 30/01/02).

Só funcionário do Bradesco ascendeu dentro da empresa. Essa “carreira fechada”, embora possa ter dado alguma desvantagem em relação à contratação de algum expoente, no mercado de trabalho, trouxe harmonia interna em relação à ascensão profissional. Quando foi montada a engenharia do banco, ele passou a ser, indiscutivelmente, profissionalizado. Não tinha ninguém da família Aguiar em sua direção.

Em torno da herança de Amador Aguiar desenrolou-se uma longa disputa judicial. De um lado do contencioso, perfilou a viúva em segundas núpcias, uma ex-professora da Fundação Bradesco, que se casou com ele, em 1987, quando tinha 47 anos. Do outro lado, se juntaram as três filhas do primeiro casamento: duas gêmeas e uma adotiva. A viúva tentava ser confirmada como a única herdeira dos bens, condição que lhe foi conferida pelo segundo testamento de Amador Aguiar, assinado um mês e 12 dias antes de sua morte, no dia 24 de janeiro de 1991, com 86 anos. As filhas tentavam assegurar uma participação no espólio, calculado. Inicialmente, em US$ 800 milhões, e reverter a renúncia que fizeram, em 1986, às ações do Bradesco, que haviam herdado quando da morte da mãe. Com isto teriam mais 7% na participação na holding que controla o Bradesco, a Cidade de Deus Comercial e Participações. Os netos desejavam ser reconhecidos como herdeiros únicos, como constava do testamento que o banqueiro assinara antes, em 1986. Dos membros da família Aguiar, somente dois dos onze netos participavam da diretoria do Banco, sendo que um deles fazia parte do Conselho de Administração do Conglomerado.

A harmonia profissional foi uma das inspirações de Amador Aguiar, quando foi pioneiro em colocar toda a diretoria em um enorme salão. Antigamente, todos dividiam uma comprida mesa retangular, sem gavetas, “para ninguém deixar trabalho sem solução à vista de seus colegas”. Ela era encabeçada pela escrivaninha de estilo colonial do presidente, depois conservada no Museu da “Cidade de Deus”.

Em termos de carreira, quando era feita uma incorporação, quem viesse do outro banco entrava no mesmo espírito como se fosse do quadro original. Isso se tornou um grande estímulo profissional. Um exemplo era o presidente executivo, Márcio Cypriano, que tinha vindo para o Bradesco com a incorporação do Banco da Bahia, em 1973, onde

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era gerente. Após longo tempo, ascendeu ao posto de presidente executivo, depois de Lázaro Brandão.

A prioridade do Bradesco sempre foi o mercado doméstico, embora tivesse aberto agências no exterior. O ingresso dos grandes bancos estrangeiros tornou o mercado brasileiro mais competitivo do que antes. Eles chegaram muito preparados em know how. Tinham também potencialidade de capital. Mas se depararam com uma sobrecarga de serviços a cargos dos bancos. Não trouxeram idéias de como baratear os custos, conforme era expectativa.

Um banco com o patamar de US$ 100 bilhões em ativos era muito grande no Brasil, mas não era nenhum destaque para a economia mundial. Embora na América Latina o Bradesco já fosse o maior banco, em comparação com o resto do mundo estava somente entre os cinqüenta maiores. Esse porte era devido à estagnação vivida pela economia brasileira até 2003. Sua expectativa tornou-se, a partir de então, se país crescesse o PIB em 4% ao ano, de maneira sustentável, que isso daria fôlego suficiente para a demanda de crédito e o crescimento de seus ativos.

Por isso mesmo, o Bradesco permaneceu como um banco doméstico. Sua competição era, essencialmente, no território nacional. Fora, tinha uma presença modesta em Nova York, na Argentina, em Luxemburgo, pois competir no exterior exigiria uma estrutura muito diferente. Entre as agências e subsidiárias no exterior, a maior era o Bradesco Grand Cayman, cujos ativos (US$ 8.387,5 milhões) eram quase 8 vezes maiores que o do Bradesco Nova York. O esforço internacional teria de ser muito maior. No país, tinha espaço para crescer, conquistar em torno de 20% do mercado. Na primeira década do milênio, a participação do Bradesco estava entre 12% e 13%, dependendo do critério utilizado, se por créditos ou por ativos. Seu objetivo imediato, e que estava sendo alcançado, era de crescer em 1 milhão de correntistas ao ano. Na área de seguros, era líder. Bateu o Banco do Brasil em câmbio. Estava buscando a liderança nas áreas de previdência aberta, capitalização e leasing.

O grupo criou, em agosto de 2000, a Bradesco Participações (BRADESPAR), realocando os ativos que não eram da área financeira. Foi um marco na história do banco. Até então era um sócio de respeito de empresas não-financeiras, com participações acionárias que lembravam, em parte, os cruzamentos típicos dos bancos alemães e, também, o “valor escondido” característico das instituições japonesas. O acionista ganhou com a criação do BRADESPAR, realizando um valor que ficava “escondido”, quando as participações estavam abrigadas no imobilizado do banco. Essa cisão serviu para aumentar a transparência das atividades do banco.

No âmbito de seguros e previdência, o Bradesco uniu os produtos do ramo vida da seguradora aos da previdência complementar, criando a Bradesco Vida e Previdência. O Banco estava em linha há tempos com o que havia de mais avançado no mundo. A bancassurance, a integração entre seguros e banco comercial, era um movimento novo que os bancos, inclusive em outras partes do mundo, estavam perseguindo.

A seguradora usava o banco como canal de distribuição e o banco utilizava a seguradora como fonte de produtos e geradora de reservas garantidas de longo prazo. Banco e seguradora eram complementares. A base de distribuição garantia vendas cruzadas de produtos. No Bradesco, a integração era total, em primeiro lugar, porque

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100% do controle da seguradora era do banco. Depois, estrategicamente, estava posicionado para aquelas duas faces, porque a venda de seguros dependia da rede de distribuição, que permitia estar próximo ao cliente. O cliente de seguros, ou de previdência, privilegiava muito a proximidade e seu vínculo com o banco.

Mas se a tendência mundial era nova, Amador Aguiar começou a praticá-la no início dos anos 60. Aproveitava a rede de distribuição do Bradesco para vender os produtos, o que não requeria nenhum custo a mais. No final dos anos 70, o Bradesco foi extremamente inovador ao montar operações com as então duas maiores seguradoras do Brasil, a Sul América e a Atlântica Boavista, que eram competidores ferrenhos. O Banco tratou de ser eqüidistante, e criou o Top Club, a primeira apólice de seguros em que o prêmio era dividido meio a meio entre as duas seguradoras.

O acerto dessa política espelhou-se nos resultados do conglomerado: no seu lucro líquido total, girava em torno de um terço (1/3) a contribuição do lucro líquido da seguradora . Uma parte expressiva desse montante decorreu do setor da previdência complementar, onde o Bradesco também desempenhou um papel inovador. Percebeu o potencial dessa atividade já no final da década de 70, início dos anos 80, quando a previdência privada foi regulamentada no Brasil. Mas, diferentemente dos concorrentes, o Bradesco não colocou a previdência como uma carteira da seguradora: optou por criar uma empresa distinta, com sua própria estrutura e uma diretoria com a missão exclusiva de “pensar previdência 24 horas por dia”.

O Bradesco sempre foi tido, em termos de tecnologia, como detentor de uma das redes mais sofisticadas de todo o setor bancário latino-americano. Há mais de 40 anos, desde que foi a primeira empresa brasileira a adquirir computador IBM 1.401, em 1961, que o conglomerado investe pesadamente em sistemas para manter sua vantagem tecnológica sobre a concorrência.

No início da década dos 90, todas as agências Bradesco passaram a trabalhar on-line e o auto-atendimento se expandiu para todo o Brasil. Foram implantadas máquinas automáticas de emissão de cheques, de saques e recolhimento de depósitos. O sistema de Internet Banking conquistou os clientes e passou a ser um dos mais importantes canais de atendimento, com 7,763 milhões de usuários cadastrados, no final de 2006. Foi implantado o Bradesco Mobile Banking, que permitiu operações de consulta de saldos e extratos e pagamento de algumas contas pelo celular. O Bradesco fechou o século na liderança tecnológica entre os bancos privados do Brasil.

As profundas mudanças do ambiente bancário brasileiro, durante a crise da década dos 90, foram aproveitadas pelo maior banco privado nacional. No topo da escala, o Bradesco adaptou-se ao fim da inflação e das receitas oriundas do trânsito de fundos (floating), graças à extensa rede de distribuição no país, à diversidade de produtos e à marca sólida.

O Banco dobrou sua participação nos ativos totais do setor bancário nacional: de 5,7% para 12%, entre 1996 e 2006. O conglomerado cresceu não só organicamente, mas também graças às aquisições. Podem ser caracterizadas duas ondas de aquisições. A primeira, de 1948 até 1973, com 18 aquisições, teve o objetivo de dar escala ao Banco. A segunda, entre 1997 e 2007, com 25 aquisições, visou mais a alcançar segmentos do mercado ainda não tão explorados com expertise específica.

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A base de clientes correntistas aumentou, entre 1998 e 2006, em 10,5 milhões, indo de 6,3 milhões de contas correntes, para 16,8 milhões, distribuídas entre 3.008 agências, quase 800 a mais do que as 2.210 de 1998. Esse porte em número de agências, praticamente, já tinha sido alcançado em 2002.

O maior destaque financeiro do Bradesco, no período 1998-2006, foi mesmo seu desempenho anual: seu lucro líquido girava em torno de R$ 1 bilhão no final da década passada, foi para o patamar de R$ 2 bilhões entre 2000 e 2003, atingiu R$ 3,1 bilhões em 2004, R$ 5,5 bilhões em 2005, R$ 6,4 bilhões em 2006 e R$ 8,0 bilhões em 2007. Correlacionando-o com a prestação de serviços bancários e a elevação do crédito, verifica-se a aposta estratégica do Banco tardou um pouco em dar o resultado esperado, mas foi na direção correta, apostando no crescimento da economia brasileira. Sua rentabilidade sobre o patrimônio líquido passou de uma faixa entre 16% e 22%, até 2004, para alcançar percentual acima de 25% a partir de então.

4.7. Banco Federal, Itaú, Sul Americano, América, União Comercial, enfim, Itaú

Foi fundado em 2 de janeiro de 1945, como Banco Central de Crédito, mais um entre os 327 bancos que surgiram no Brasil entre julho de 1944 e junho de 1945. Em 7 de setembro de 1944, tinha sido inaugurado, em São Paulo, o Banco Itaú S/A, com seu capital tendo como subscritores paulistas e mineiros por exemplo, o Cel. Juventino Dias, ligado à Cia. de Cimento Itaú. No dia 12 de setembro, 5 dias após, inaugurou-se a sucursal de Belo Horizonte. Contemporâneos, o Federal e o Itaú iriam se fundir, 20 anos depois.

A primeira agência foi aberta na sede na Rua Benjamin Constant, 187, em São Paulo, no dia 2 de janeiro de 1945. Ao final do primeiro ano de atuação, o banco já tinha, além da sede, duas outras agências, em Campinas e em São João da Boa Vista, com 22 funcionários no total. No final da década de 40, o Banco Central de Crédito possuía 11 agências, três na cidade de São Paulo e oito no interior. Em 1951, a sede do banco mudou para a Rua São Bento, 493, em São Paulo. Em 1952, a razão social da empresa passou a ser Banco Federal de Crédito, por recomendação do governo federal, a fim de reservar o termo "Central" para a instituição que passaria a ser o Banco Central do Brasil.

Formado em Medicina, em 1931, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, o paulista Eudoro Villela começou sua carreira como pesquisador, seguindo os passos de seu pai, Eurico de Azevedo Villela. Nesse ano, já era o encarregado dos cursos de anátomo-patologia do Instituto Oswaldo Cruz. Essa experiência lhe permitiu obter bolsa de estudos no exterior, sob o patrocínio da Fundação Gaffré-Guinle, para trabalhar em Paris, durante 4 anos, no Institut du Radium de La Fondation Curie, sob orientação da própria de Madame Curie. Publicou vários trabalhos de sua especialidade, em colaboração com cientistas franceses.

Na Europa, Eudoro tomou conhecimento das técnicas escandinavas de produção de chapas de fibra de madeira, que o inspirou a criar a Duratex, com apoio de Alfredo Egydio de Souza Aranha, em 1951. Eudoro era genro do Souza Aranha, o tio de Olavo Setúbal.

Com Souza Aranha, desde 1944, Eudoro participava da direção do antigo Banco Federal de Crédito. A partir dos anos 50, ele lançou-se igualmente nos setores de

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moinho de trigo, fábrica de rações, louças, válvulas industriais e reflorestamento. Tornou-se também pecuarista, tendo dado grande impulso a Fazenda Paraíso, em São João da Boa Vista, Estado de São Paulo, desenvolvendo um dos maiores rebanhos nacionais de gado holandês.

Em 1947, Olavo Setúbal e Renato Refinetti, dois engenheiros recém-formados na Politécnica da USP, fundaram a Deca, uma indústria de materiais sanitários, numa garagem de 200 m2, em São Paulo. Em 1951, Setúbal associou-se a um grupo de investidores independentes, para fundar a Duratex. Na ata de fundação da companhia, esses acionistas se definiam como "capitalistas".

Ao final da primeira década de funcionamento, o Banco Federal de Crédito tinha 24 agências e 113 funcionários. Em 1959, Alfredo Egydio de Souza Aranha convidou seu sobrinho, Olavo Egydio Setúbal, cuja indústria, a Deca, ia “de vento em popa”, a participar do Federal de Crédito. Ao completar 15 anos, no ano seguinte, o Banco já ocupava a 52ª posição entre os maiores, com 31 agências e um capital social de US$ 1 milhão. Tudo parecia ir muito bem, mas as regras da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), antecessora do Banco Central, impunham limites ao crescimento, com exigências de reservas e depósitos compulsórios cada vez mais altos. Para superar a barreira, o Banco Federal de Crédito teria de buscar caminhos mais ousados.

Com a morte de Alfredo Egydio, em 1961, seu genro, Eudoro Villela, foi eleito presidente do banco. O novo presidente delegou a tarefa de reestruturar o Federal de Crédito a Olavo Setúbal, que convidou seu companheiro na Deca, José Carlos Moraes Abreu, para ajudá-lo, pois a solução dos problemas exigia um competente advogado de empresas. Iniciava-se a contratação de um novo tipo de profissional, o de formação universitária.

As mudanças no Federal de Crédito começaram no dia 10 de outubro do mesmo ano, quando os funcionários encontraram uma novidade em suas agências: as circulares. Uma firma de consultoria tinha sido contratada para estudar o funcionamento e sugerir racionalização dos serviços, atitude inédita em bancos. A consultoria propôs a automação, indicou equipamentos e coordenou os processos de implantação. Iniciava-se o processo em que a agência central passava a comandar todas as funções, unificando-as de acordo com uma diretriz estratégica. As circulares definiam quem respondia sobre o quê, disciplinavam os serviços e divulgavam as diretrizes. Até então, um simples desconto de duplicata tinha de subir até um diretor da cúpula para receber um visto. Esse processo foi descentralizado, criaram-se critérios específicos e comissões de crédito.

Para acelerar mais o crescimento do banco, foram criados concursos para aumento de depósitos e abertura de contas populares. Assim, procurava-se ampliar o espectro social da ação do banco. Antes, apenas as firmas e as elites usavam os serviços bancários. Era preciso conquistar a classe média e o assalariado urbano que, com a industrialização, tinham maior poder aquisitivo.

Desde o início da década de 60, o Itaú utilizava computadores IBM nas operações, mas eram poucas as inovações que permitiam aos equipamentos melhorar o processamento dos serviços. Apenas em 1967, em um congresso em Recife, o Itaú apresentou uma série de teses para aprimorar o processamento de dados nos bancos. Uma delas foi a introdução do cheque magnético, aprovada pelo Banco Central. Outra,

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um sistema que permitia a leitura de documentos diretamente pelo computador, sem necessidade de transcrevê-los, o que abreviava o processo.

Até 1961, o banco só podia atuar em São Paulo, pela legislação da SUMOC. Em janeiro de 1962, o banco abriu sua primeira agência fora do Estado de São Paulo, na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro.

A família Setúbal e o empresário Eudoro Villela, que tinham fundado o Banco Federal de Crédito, decidiram, em julho de 1964, que fundir-se com um banco do mesmo porte, com agências instaladas em regiões diferentes, era o caminho para o crescimento. A escolha se fixou no Banco Itaú, fundado em 1944, cuja sede ficava bem próxima, mas que atuava nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e Paraná, além de São Paulo. A associação dos dois bancos fez surgir o Banco Federal Itaú, o primeiro passo para a criação do conglomerado financeiro Itaú.

Até então, nenhuma fusão ou incorporação entre bancos de médio e grande porte havia sido realizada. O Federal de Crédito e o Banco Itaú anunciaram fusão bancária inédita. O Itaú pertencia a um grupo de Minas Gerais, com origem em Itaú de Minas, liderado por José Balbino Siqueira. Era banco idôneo, sólido, sem ativos problemáticos, dirigido com a tradicional prudência mineira, com forte penetração na clientela rural. Após a fusão, surgiu o Banco Federal Itaú S.A., que começou a funcionar com uma rede de 112 agências em seis Estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Guanabara, Mato Grosso, Minas Gerais e Paraná) e capital social de US$ 4,2 milhões. A diretoria foi composta por Jorge Dias de Oliva (presidente, vindo do Banco Itaú), Eudoro Villela (diretor presidente) e Olavo Egydio Setubal, que passou a ser o diretor geral da instituição.

Com a Lei da Reforma Bancária, do mesmo ano, o Federal Itaú passou a fazer aquisições e passou a buscar expansão para outros pontos do país. Em 1967, foi inaugurada a agência de Salvador, a primeira no Nordeste. Em 1969, o Federal Itaú adquiriu o Banco da América e se tornou o Banco Itaú América, com agências em São Paulo, Minas Gerais, no Rio de Janeiro, Paraná, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Distrito Federal e na Bahia.

Em 1964, o Federal de Crédito era um banco bastante moderno para a época. Pequeno, ocupava a 32ª posição entre os maiores bancos oficiais e privados por depósitos à vista, mas seu núcleo profissional de dirigentes acabou servindo de espinha dorsal no processo de fusões e associações. A partir da fusão com o Sul Americano do Brasil, em 1966, a nova instituição passou a se chamar Banco Federal Itaú Sul Americano. Nessa nova fusão, a maior atração era que o Banco Sul Americano tinha diretores e os principais acionistas ligados à Cia. Paulista de Estradas de Ferro. Um dos fundadores do Sul Americano, Luiz de Moraes Barros, era presidente do Banco do Brasil, desde 1964. Com a fusão, Moraes Barros deixou a presidência do banco e retornou ao partir de então chamado Banco Federal Itaú Sul Americano S.A., como diretor presidente executivo. O novo banco iniciava as operações com capital social de US$ 6,7 milhões e 184 agências.

Em 1969, avançou o processo de aquisições de outras cartas patentes, com a compra do Banco América, um banco fundado por Herbert Levy, em 1944, que chegou a ser o banco paulista com maior número de agências urbanas, clientela de elite e agências em bairros de classes média e alta. O novo banco, chamado Itaú América S.A., tornou-se o 7º maior do País, com 274 agências e capital social de US$ 14,8 milhões.

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No período 1970-1974, o Itaú América incorporou o Banco Aliança, o Banco Português do Brasil e o Banco União Comercial. Ao final dessas incorporações, foi adotado, definitivamente, o nome Banco Itaú S.A. Quando se tornou o 2º maior banco privado nacional, apoiado no esquema profissional do Federal de Crédito, o Itaú possuía uma árvore genealógica em que figuravam 30 bancos, pois entre os que participaram diretamente da sua formação muitos resultavam de associações anteriores. Sua rede era de 561 agências e estava situado entre os 500 maiores bancos do mundo.

Com as incorporações, o Itaú, até então um banco médio, começou a crescer rapidamente e tornar-se cada vez mais competitivo no mercado, indo para as primeiras colocações no ranking dos bancos privados. Nesse momento, ocorreu a primeira grande campanha do banco: “Ajude o Itaú a ser o primeiro”. A partir dessa campanha, o Itaú passou a diferenciar-se pelo uso do marketing. Em 1973, quando o Banco Português foi incorporado, o banco passou a chamar-se simplesmente Itaú (pedra preta em tupi-guarani), nome escolhido tendo em vista sua força em termos de comunicação.

O Banco União Comercial foi absorvido em 1974. Essa aquisição ocorreu em circunstâncias especiais, que valem ser lembradas.

A quebra do Banco Halles, que abalou o sistema financeiro brasileiro, em abril de 1974, poucas semanas após a posse do presidente Ernesto Geisel, marcou o início de um ciclo de crises que causaria profundas alterações na estrutura do sistema financeiro nacional (GZM, 16/09/99). Além de mostrar quanto era irrealista a reforma bancária de 1965, a intervenção do Banco Central no Halles e seus desdobramentos levaram à montagem de um esquema institucionalizado de socorro aos bancos e prenunciaram a abertura ao capital estrangeiro em uma área em que sua presença era severamente limitada.

A débâcle do Halles foi traumática, principalmente, pelo imprevisto. Até 1974, havia anos que nenhuma instituição brasileira apresentara publicamente uma situação de insolvência, mas não porque problemas desse tipo não tivessem ocorrido. Desde o fim da década de 60, não foram poucos os bancos de porte médio para cima que chegaram a um estado pré-falimentar, exigindo ação por parte da autoridade monetária. Protegido pela censura prévia à imprensa, o Banco Central fazia então intervenções “brancas” (secretas) nas instituições com balanços “embonecados”, até ser encontrada uma solução, que era sempre a de transferir o controle para outro grupo financeiro em condições não reveladas ao público.

O sigilo forçado não pôde ser mantido no caso do Halles. Fervilhavam boatos sobre a precariedade das contas do Halles, o Banco Central apertou a fiscalização e, em vista do que foi apurado, decretou uma intervenção aberta no banco e cinco empresas do grupo. O Halles atraíra as aplicações com a promessa de altos rendimentos e, de repente, com a notícia da intervenção, os investidores fizeram quilométricas filas diante de suas agências, principalmente em São Paulo e no Rio, exigindo o seu dinheiro de volta. Todo o sistema parecia estar em risco, pois não faltavam bancos ou financeiras (sociedades de crédito e financiamento) que operavam de forma muito parecida aos bancos colocados sob liquidação judicial.

O governo resolveu o problema do Halles transferindo-o para o Banco do Estado da Guanabara (BEG), o que era facilitado pela circunstância de se tratar de um banco oficial que vinha obtendo bons resultados. Mas, segundo analistas, este foi o começo

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das dificuldades com que se defrontaria o BEG, que depois se fundiu com o Banco do Estado do Rio de Janeiro (Banerj), cujo nome veio a adotar. A incorporação do Halles, aliás, foi apresentada como uma medida político-econômica de largo alcance, destinada a fortalecer a fusão dos Estados da Guanabara e do Rio de Janeiro.

Dentro desse clima de insegurança quanto a uma nova corrida bancária, em agosto de 1974, estourou o Banco União Comercial (BUC). O BUC, que era resultado da fusão de três bancos de expressão (o Comercial de São Paulo, o Brasul e os Irmãos Guimarães – BIG), parecia ser destinado a estar entre os maiores do País. Entretanto, problemas administrativos decorrentes da heterogeneidade das três instituições que se fundiram, o controle ineficiente, negócios desastrados e a incapacidade do novo banco de manter a clientela eram espelhados por um balanço medíocre ao fim do primeiro semestre. A situação se complicava porque, além do banco comercial, o conglomerado era composto de dois bancos de investimento (Univest e União Investbanco).

A forma utilizada pelo Banco Central do Brasil para o BUC não foi a mesma do Halles. A intervenção na instituição foi velada, mesmo sendo noticiado reuniões entre o ministro Simonsen e o presidente do Banco Central, Paulo Lira, com a diretoria do BUC, em busca de uma forma de ajuda oficial que permitisse uma solução. Na realidade, o BUC já estava sendo negociado. No final de agosto, o Banco Central anunciou que o BUC passara para o controle do Itaú.

O BUC, no final de 1973, era o 7º banco comercial privado, por volume de depósitos; contudo, atingiu esta posição pelo inchaço e pela superposição de diversas instituições financeiras, não conseguindo unidade interna, operacional e em termos de direção. Em seu passivo, carregava uma dívida de US$ 50 milhões, contratada junto a bancos estrangeiros, para efetivar a compra de outros bancos. Mas suas fusões e incorporações anteriores foram mal consolidadas. As autoridades monetárias temiam que a quebra do banco desencadeasse uma enorme crise sistêmica, no mercado financeiro.

Como resultado da negociação com essas autoridades, o Itaú assumiu todo o passivo do BUC e a parte boa do ativo, pois não ficou com os créditos de liquidação duvidosa ou contratados anormalmente, deixados à responsabilidade do Banco Central. Além disso, o Itaú ficou responsável pelo prejuízo do BUC e por sua dívida externa. Em troca, recebeu a estrutura do BUC, com 250 agências, enquanto as do Itaú somavam 468. Finda a incorporação, o Itaú distanciou-se de seus concorrentes, firmando-se na posição de segundo maior banco privado brasileiro, atrás apenas do Bradesco.

Em 1972, tinha havido a fusão da Deca (fundada em 1947) com a Duratex (fundada em 1951). Então, dois anos após, em 1974, foi criada a Itaúsa, a holding do grupo. Naquela época, assim como atualmente, a receita da área financeira representava 85% do grupo. À parte industrial cabia apenas 15% do total.

O crescimento do mercado interno trouxe a oportunidade de expansão internacional, com a inauguração da agência Nova York do Banco Itaú, a primeira fora do Brasil, em 1979. No ano seguinte, foi inaugurada a agência Buenos Aires.

Também nesse ano, com vistas no mercado de informática e na automação de suas agências bancárias, o grupo criou a Itautec. O Itaú pode trilhar esse caminho porque tinha uma grande experiência acumulada na área de sistemas (software), que

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garantia um suporte tecnológico para impulsionar a criação da Itautec. Esse patrimônio tecnológico começou a formar-se no tempo do Banco Federal de Crédito, pois o engenheiro Olavo Setúbal considerava que a informática representava um instrumento vital para o desenvolvimento de uma empresa bem administrada. Em 1964, o Federal de Crédito já contava com um computador IBM, para apoiar seus serviços. Setúbal, como seu principal executivo, começou, em 1960, a montar uma equipe, para a qual trouxe um grupo de engenheiros que trabalhavam na Duratex, capaz de, em suas palavras, “criar uma máquina industrial na área financeira e de pensar em sistemas de custo e planejamento a longo prazo”.

O setor de processamento de dados do banco possuía, no final da década de 70, cerca de 5 mil funcionários, entre perfuradores, analistas, programadores, pessoal de apoio e operadores. Nessa época, foram desenvolvidos todos os programas mais evoluídos da instituição, alguns em uso até hoje, com ajustes e correções normais de rumo. Como a evolução do processamento de dados, em 1980, teve início o projeto do ., com a implantação do sistema de processamento on-line nas agências. Após diversos meses de desenvolvimento e testes, em março de 1981, o Banco Eletrônico foi implantado na agência Boa Vista, no centro de São Paulo. Gradativamente, o sistema foi sendo ampliado até atingir toda a rede de agências.

A importância da informática, percebida desde o início dos anos 60 pelos dirigentes, que permitiu ao Itaú se colocar, no final dos anos 70, como um dos maiores bancos do País. Nos anos 90, transformou-o no único estabelecimento brasileiro a ter lugar entre os 100 melhores bancos mundiais. Reconhecido pelos slogans “Banco Eletrônico Cinco Estrelas”, “Pronto para o Futuro” e “O Banco da Era Digital”, essa imagem do Banco Itaú se consolidou no mercado por sua vocação para o uso da tecnologia de informações na prestação de serviços para os clientes. Alcançou a liderança nos principais serviços de conveniência do mercado: Itaú Investnet, Itaú Prevline, Itaucard, Itaú Bankline (banco por computador) e Itaú Bankfone (banco por telefone).

Em 1984, a Itaúsa penetrou na área química e assumiu o controle da Elekeiroz, também fabricante de fertilizantes, da qual já era acionista. Em 1989, o grupo se expandiu para a área eletrônica de consumo. Por US$ 10 milhões, a Itaúsa adquiriu a Philco, a terceira maior empresa dessa área, no país. Em 1994, a Itautec fundiu-se com a Philco, relacionando a informática com o entretenimento no Grupo Itautec Philco. Em junho de 1997, houve uma guinada estratégica de redução da produção. O novo foco do negócio da Itautec-Philco deixou de ser produzir e passou a ser distribuir e dar assistência técnica aos seus produtos e componentes eletrônicos, até a marca Philco ser vendida à Gradiente.

À família Setúbal cabia a administração das empresas, graças a um acordo de acionistas firmado com os Villela. Eudoro Villela compartilhava a liderança do complexo familiar com o engenheiro Olavo Egydio Setúbal, que presidia o conselho de administração do Banco Itaú.

Até julho de 1990, o presidente do grupo Itaúsa, empresário, ex-prefeito paulistano e ex-chanceler brasileiro, Olavo Setúbal, mantinha nos postos-chave de sua organização, ou seja, nas presidências do Banco Itaú e da Duratex, dois executivos com participações acionárias minoritárias, respectivamente, José Carlos Moraes de Abreu e Renato Refinetti. Este amigo de Olavo Setúbal, desde o curso ginasial, exerceu a

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presidência da Duratex por mais de 15 anos. A partir de então, a sucessão no grupo desencadeou-se. Roberto Setúbal, então com 36 anos, o quarto dos sete filhos de Olavo Setúbal, foi guindado à diretoria-geral do Banco, e três anos após, em 28/03/94, passou a ser o presidente. Tornou-se, assim, o mais jovem entre os principais banqueiros brasileiros. No final de 1990, Paulo Setúbal Neto, então com 41 anos, o primogênito da família, tinha sido indicado para ocupar a presidência da Duratex, a mais tradicional indústria do grupo e fabricante de chapas de madeira e materiais de construção.

A intenção de Olavo Setúbal, portanto, era que, enquanto um filho se ocupasse da área financeira, o outro comandaria as indústrias, uma área que, além da Duratex, possuía companhias como Philco e Elekeiroz, do ramo químico. Ao final de 1990, a porção financeira representava mais de 60% das receitas do grupo, enquanto a área industrial respondia por 40%. A expectativa era que com a superação da estagflação da década anterior tal relação mudaria, cabendo ao primogênito a fatia mais importante.

Vários herdeiros da família Setúbal ocupavam, então, posições de destaque no grupo. O patriarca, Olavo Setúbal, presidente da Itaúsa e da Itauprev, tinha sete filhos, sendo seis homens, dos quais cinco estavam em posição de comando no grupo. Além de Paulo, presidente da Duratex e da Elekeiroz e vice-presidente da Itaúsa, e Roberto, presidente do Banco Itaú, Olavo Setúbal Júnior era vice-presidente da Itaú Seguros, Alfredo Setúbal, diretor de investimentos do Banco Itaú, Ricardo Setúbal, coordenador financeiro da Philco e da Itautec. Maria Alice, socióloga, e José Luiz, médico pediatra, não trabalhavam nas empresas do grupo.

A saída de Carlos Câmara Pestana da presidência do Banco já estava prevista desde que ele assumiu, em 1990, substituindo José Carlos Moraes de Abreu, pois completaria, em 1994, 62 anos, a idade máxima para alguém ocupar funções executivas no Itaú. Com a prevista troca por Roberto Setúbal, alçado na época ao cargo de diretor-geral, efetivada, a família Setúbal voltou ao comando do Banco. Desde 1985, quando o patriarca do clã, Olavo Setúbal, deixou o cargo, o Itaú vinha sendo dirigido por executivos profissionais. Moraes de Abreu era advogado. O português Câmara Pestana, antes de vir para o Brasil, em 1975, era diretor-geral do Banco Português do Atlântico, o maior do país, e presidente da Associação dos Bancos de Portugal. Embora trabalhando no Itaú, durante 19 anos, ele manteve um estreito contato com Portugal. Em 1988, foi nomeado para uma comissão oficial que adequou as normas do mercado financeiro português às da Comunidade Econômica Européia, com vistas à unificação do mercado, em 1992. Isso, provavelmente, facilitou a penetração do Itaú no mercado financeiro português e, daí, europeu.

Quando foi anunciada a substituição de José Carlos Moraes de Abreu, na presidência e na direção-geral do Banco Itaú, por Carlos Câmara Pestana e por Roberto Setúbal, respectivamente, reformulou-se sua estrutura e filosofia operacional. Nos anos anteriores, o Banco tinha dado uma ênfase muito grande à tecnologia, deixando a área comercial em um segundo plano. Na gestão Pestana, ambas tiveram o mesmo destaque.

Com a indicação de Roberto Setúbal para a direção-geral, responsável pelas operações comerciais da instituição, esta área ganhou dimensão e autonomia. O atendimento pessoal a sua clientela de maior renda tornou-se, mais do que nunca, uma meta estratégica do negócio. Tanto assim que, após a aquisição do Banco Francês e Brasileiro, em 1995, também com uma clientela com esse perfil, transferiu os clientes com maiores aplicações para a bandeira Itaú Personnalité. Agressividade mercadológica

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implicou uma postura mais flexível do Banco perante seus clientes, que se tornou uma meta viável a partir da descentralização e da expansão da área comercial. Antes, embora tivesse a oferta dos mais diversos produtos e serviços financeiros, o Itaú não demonstrava muita flexibilidade para fazer combinações diversas com esses produtos e serviços. Só oferecia pacotes padronizados.

O patriarca da família Villela, Eudoro, cuja morte ocorreu em 19 de abril de 2001, era o presidente do Conselho de Administração da Itaúsa. Com problemas de saúde há cinco anos, Eudoro Villela já estava, na prática, afastado. Seus descendentes não ocupavam cargos executivos, embora os dois netos juntos possuíssem tantas ações quanto toda a família Setúbal. Na lista anual da revista Forbes, em 1995, entre os bilionários brasileiros, a quarta melhor colocação ficou com a família Villela com US$ 1,8 bilhão. Ela dividia o controle da Itaúsa com a família do banqueiro Olavo Setúbal, sétimo colocado com US$ 1,2 bilhão, ou seja, o Itaúsa propiciava, somando-se as duas fortunas, o segundo posto, US$ 1 bilhão abaixo de Antônio Ermírio de Moraes, o primeiro colocado, presidente do Grupo Votorantim.

A morte de Eudoro Villela não causou impacto societário ou administrativo na Itaúsa. Sua participação acionária no grupo já havia sido transferida aos filhos Maria de Lourdes (Milu) e Alfredo, também falecido. Os herdeiros de Villela e os Setubal, Olavo e seus filhos, inclusive o presidente do Itaú, Roberto, estavam unidos em um acordo de acionistas na empresa ESA (iniciais de Egydio de Souza Aranha) que detinha 59,73% do capital votante da ITAÚSA que, por sua vez, controlava o Itaú com direta ou indiretamente 78,28% do capital votante, de acordo com informações enviadas à Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), em junho de 2000. Se fosse desmembrada a participação dos Setubal e dos Villela na Itaúsa se verificaria que a participação dos dois ramos da família era quase a mesma, com uma ligeira supremacia dos primeiros.

Villela presidiu o Banco Itaú por 14 anos, durante sua primeira fase de expansão acelerada através das fusões e aquisições. Assumiu o posto em 1961, aos 56 anos, depois da morte de Souza Aranha, e o manteve até setembro 1975, quando deixou o cargo por limites estatutários. Durante todo o tempo em que Villela presidiu o Itaú, Olavo Setubal foi diretor geral do Banco. No mesmo ano em que Villela passou a dedicar-se apenas ao Conselho de Administração da Itaúsa, Olavo Setubal também se afastou para ocupar a Prefeitura de São Paulo.

Foi sob a presidência de Eudoro Villela que o Banco Itaú passou, em 10 anos, de apenas um entre os 50 maiores para o 2º maior do País, depois de seis fusões e incorporações. Foi quando se fundiu ao Itaú, de Minas Gerais, em 1964, ao Banco Sul Americano, em 1966, ao Banco da América, em 1969. Incorporou o Aliança, em 1970, o Banco Português do Brasil, em 1973, e o Banco União Comercial, em 1974.

Olavo Setubal faleceu em 27 de agosto de 2008, deixando como legado a holding Itaúsa, que congregava operações industriais (Duratex, Itautec e Elekeiroz) e o Banco Itaú Holding Financeira (Itaú e Itaú BBA). Era a maior empregadora de São Paulo, contando com R$ 350 bilhões de ativos segundo o balanço de 1º semestre/08. O Itaú Holding já era um dos 15 maiores bancos das Américas. Era um dos poucos bancos nacionais privados que podiam ser classificados entre os “vencedores”, no início do século XXI.

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Cabe apresentar, brevemente, a estratégia de gestão, após a crise bancária dos anos 90. O Itaú Holding buscava a excelência em duas frentes complementares: o atendimento de qualidade e a criação de produtos e serviços, para mais de 21 milhões de clientes, aliados ao desenvolvimento de tecnologias que garantissem agilidade, segurança e conveniência, mesmo diante de um universo de quase 3 bilhões de operações anuais. Em um mercado com fortes concorrentes, era necessário criar, constantemente, diferenciais competitivos para assegurar a perenidade dos negócios.

A forma encontrada para elevação no número de clientes de 2001 (10,882 milhões) a 2006 (21,059 milhões) é reveladora da estratégia adotada nessa época. Os correntistas foram de 8,134 milhões para 10,151 milhões. Os poupadores declinaram de 1,963 milhão para 1,955 milhão. No final do ano de 2006, os não-correntistas do Itaú BBA eram 200 mil clientes, da Taíi, 3,159 milhões, de cartões de crédito, 3,226 milhões, de Seguros e Previdência, 500 mil, de Veículos e Crédito Imobiliário, 723 mil, e Aposentados, 1,344 milhão. Todos esses clientes (correntistas e não-correntistas) somavam os 21 milhões. Em outras palavras, esses não-correntistas praticamente não existiam em 2001, mostrando que o crescimento da clientela foi, fundamentalmente, devido à incorporação de seus cadastros no banco de dados do Itaú.

O mesmo princípio de aliar capacidades complementares norteou as aquisições do Itaú Holding ao longo de sua trajetória. Um exemplo disso foi o Banco Itaú BBA, que liderava o segmento de banco de investimentos e tinha participação destacada na captação de recursos das grandes empresas brasileiras, seja por meio da oferta pública de ações, seja pela emissão de títulos. Em 5 de novembro de 2002, o então Banco Itaú S.A. anunciou a associação com o grupo controlador do Banco BBA-Creditanstalt S.A. (BBA). O Itaú e o BBA iniciaram, em 10 de março de 2003, as operações do Banco Itaú-BBA S.A., o maior banco de atacado do país, oferecendo produtos e serviços para seus clientes corporativos. Para melhor gerenciar seus negócios, concedendo maior autonomia operacional aos seus diversos segmentos internos e possibilitando maior transparência nas demonstrações financeiras, o então Banco Itaú S.A. anunciou também uma reorganização societária, que culminou na criação do Banco Itaú Holding Financeira S.A., instituição financeira que incorporou, em 24 de março de 2003, a totalidade das ações do Banco Itaú S.A., que assim tornou-se sua subsidiária integral.

A estratégia do Itaú Holding concretizava-se por meio de dois movimentos relevantes: o crescimento orgânico, baseado em bons resultados em diversas áreas de atuação, e aquisições estrategicamente escolhidas. Estas, mais que o aumento do porte da Empresa, visaram especialmente ganhos de performance em segmentos específicos de mercado. As conseqüências do êxito dessas iniciativas levaram à consolidação da segmentação dos negócios, que possibilitou criar estruturas operacionais adequadas para atender cada grupo de clientes, estratégia que o Itaú desenvolveu de forma pioneira no mercado.

A segmentação tinha de assegurar respostas rápidas às demandas dos clientes e às tendências dos mercados. Mas o modelo de gestão exigia interatividade entre as áreas e constante troca de informações entre as diversas instâncias, fortalecendo sinergias e acelerando a tomada de decisões. O avanço na tecnologia de informações (com a integração de sistemas) era fundamental.

Além de se manter como um forte competidor nas atividades bancárias tradicionais, o Itaú Holding buscava ser o líder nas novas demandas do mercado.

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Avaliava que o grande desafio a ser enfrentado, no futuro próximo, consistia no desenvolvimento de estratégias para crescer no segmento de pessoa jurídica, pois sua participação nesse mercado não correspondia à sua capacidade de gestão.

O Banco Itaú Holding Financeira S.A. comunicou que, em 26 de março de 2003, a aliança estratégica com a Fiat Automóveis S.A. foi concluída com a aquisição de 99,99% do capital total do Banco Fiat S.A., por intermédio do Banco Itaú S.A., junto a Fiat Auto S.p.A. e a Fiat Automóveis S.A. (Fiat). No dia 20 de outubro, o Itaú assinou contrato com a AGF Brasil Seguros e a AGF do Brasil Participações Ltda., para a aquisição do Banco AGF, da empresa AGF Vida e Previdência e da carteira de vida em grupo da AGF Seguros.

Em junho de 2004, o Banco Itaú iniciou as operações de sua financeira, a Taií, que fechou o ano com 30 lojas em São Paulo e Rio de Janeiro. Ainda focado na expansão do segmento de crédito ao consumo, em julho, o Banco Itaú Holding Financeira S.A e a Companhia Brasileira de Distribuição (CBD) anunciaram parceria para a criação de uma financeira. Em outubro, foram assinados os contratos definitivos entre as partes para permitir a oferta de serviços financeiros aos clientes do Grupo Pão de Açúcar em todo o Brasil. No segmento de cartões de crédito, em novembro, o Itaú aumentou a participação acionária na Credicard para 50% e na Orbitall para 100%, tornando-se assim o líder do segmento no País, com participação de mercado superior a 20%. Em dezembro, o banco reforçou as operações de crédito ao consumidor e anunciou acordos de aquisição de carteiras de crédito consignado com os bancos BMG e Intercap.

Inicialmente, o Itaú foi reticente em relação aos empréstimos com desconto em folha de pagamentos. Ele relegou ao segundo plano essa área do crédito, que tinha baixo risco e crescia 70% ao ano na concorrência. Entretanto, percebendo seu atraso, a força no consignado passou a interessar ao Itaú, através da aquisição de parte da carteira do BMG, em dezembro de 2004, após a “crise do Banco Santos”.

A aquisição das operações do BankBoston no Brasil, no Chile e no Uruguai, em 2006, buscou fortalecer a liderança do Itaú entre as instituições privadas na administração de recursos de terceiros, custódia e nos mercados de grandes empresas e de pessoas físicas de alta renda, além de propiciar a expansão de suas operações em novos mercados na América Latina. Sob a denominação ItauBank, toda a operação do BankBoston passou para o Banco Itaú, onde suas 89 agências de atendimento assumiram a marca Itaú Personnalité. Seguindo a estratégia de realizar movimentos que gerassem ganho de performance, e não somente de porte, a aquisição fortaleceu também a presença internacional do Banco Itaú, o que ampliava a capacidade de oferta de serviços globais para os clientes locais.

A atuação internacional do Banco Itaú ganhou impulso por meio da operação de aquisição do BankBoston International e do BankBoston Trust Company Limited por meio de sua subsidiária Banco Itaú Europa Luxembourg S.A. Essa aquisição reforçava o objetivo estratégico de alcançar, no prazo de cinco anos, posição entre as três melhores e maiores operações de private banking para clientes latino-americanos. O Banco Itaú passou a ser responsável pelo atendimento a cerca de 5.500 novos clientes de private bank na América Latina, com um total de ativos financeiros sob gestão da ordem de US$ 3,7 bilhões.

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A integração com o BankBoston, em 2006, trazendo um reforço na carteira de clientes pessoa jurídica, já tinha possibilitado ao Itaú Holding reestruturar sua operação no segmento, unindo as expertises de ambos os bancos. Essa aquisição também possibilitou a inserção em novos mercados na América Latina. Pretendia, ao mesmo tempo, investir em países como Chile e Uruguai, reforçar a atuação na Argentina, e levar a expertise consolidada no mercado doméstico. Sua maior presença internacional, não apenas na América Latina, mas também em locais como Europa e Hong Kong, visava criar diferenciais competitivos para a atuação no mercado interno, permitindo ampliar o leque de opções oferecidas aos clientes no Brasil.

Entre 2002 e 2006, a composição da carteira de crédito do Itaú se alterou, profundamente. Os empréstimos às grandes empresas, que eram 62,1% do total, passaram a 28,6%, talvez devido a elas passarem recorrer mais à emissão de títulos de dívida direta, no mercado de capitais. Em compensação, o crédito às pessoas físicas elevou-se de 23,0% para 43,2%, às micro e pequenas e médias empresas, de 9,6% para 21,8%, e os créditos direcionados, que sem considerar o crédito rural flutuava na faixa de 4,0% a 5,2%, passaram, a partir de junho de 2004, com o crédito rural, para a faixa de 8,5% a 6,3%.

O planejamento estratégico do Itaú avaliava que também havia boas oportunidades de crescimento nos seguintes segmentos: clientes não correntistas de baixa renda, especialmente por meio da Taií; parcerias com varejo, principalmente no mercado de veículos; cartão de crédito; alta renda; previdência e seguros; mercado imobiliário.

No segmento de cartões de crédito, a aquisição da Credicard, em 2005, aportou ao Banco Itaú a tecnologia de atuação no mercado de não correntistas, que já começava a ser capturada para ampliação de negócios. Sua base de cartões de crédito alcançou 13,4 milhões e 23,5% da participação total de mercado, em 2006.

Essa capacidade de identificar e capturar as oportunidades de mercado era uma das mais fortes características do Itaú. O Banco visava concretizar, nos anos seguintes, as possibilidades de crescimento presentes no segmento de pessoa jurídica. A evolução da economia brasileira permitia prever que, em um futuro não muito distante, a taxa de juros deveria cair a um dígito, permitindo uma forte expansão das áreas de crédito, de um modo geral. Isso por que a participação do crédito bancário em relação ao Produto Interno Bruto no Brasil era ainda baixa, se comparada com países desenvolvidos. Seu presidente avaliava que os efeitos dessa expansão seriam percebidos no crédito ao consumo, para pequenas empresas e o mercado imobiliário, que tinha enorme potencial de negócios, fruto do grande déficit habitacional do País, onde grande parcela da população ainda acalentava o sonho da casa própria.

Um fato histórico aconteceu quando o Itaú assumiu o primeiro lugar no ranking dos maiores bancos privados, elaborado pelo Banco Central do Brasil, com a anunciada compra do BankBoston, pelo Itaú em 2006. Esse ranking não incluía, porém, ativos de operações que o Banco Central não fiscalizava, como seguro e capitalização. Se essas informações fossem incluídas, o Bradesco continuaria na dianteira.

Pesquisas permitiam visualizar a imagem pública dos bancos privados. O Banco Itaú era o banco o preferido das pessoas físicas. O Bradesco, das empresas. Os estrangeiros norte-americanos, Citibank e, antes de sua aquisição pelo Itaú, o

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BankBoston, destacavam-se no atendimento a clientes de alta renda (private) e grandes corporações (corporate). Os estrangeiros europeus, ABN Amro, HSBC e Santander, não tinham ainda uma imagem desvinculada de seus antecessores, respectivamente, o Real, o Bamerindus e o Banespa. Diziam os banqueiros que “o segredo do negócio bancário não está só no que se faz, mas em como se faz. Os produtos são os mesmos nos bancos, a maneira de vender é que faz a diferença”.

4.8. Safra: Banco Particular Internacional

O Banco Safra aparecia no ranking dos 50 maiores bancos no Brasil, publicado trimestralmente pelo Banco Central do Brasil, logo após os bancos gigantes com ativos acima de US$ 100 bilhões – Banco do Brasil, Itaú, Caixa Econômica Federal, Bradesco – e os bancos grandes com ativos acima de US$ 50 bilhões – ABN AMRO Real, Unibanco, Santander Banespa. Em junho de 2007, estava acima de, entre outros, HSBC, Votorantim, Nossa Caixa, Citibank, UBS Pactual. O Banco Central o classificava como “banco privado nacional”. Melhor seria classificado como um “banco particular internacional”. Isto ocorreria por suas características históricas.

No século XIX, florescia a economia dos países europeus, em torno do Mediterrâneo, e da América do Norte, graças ao impulso das grandes invenções, por exemplo, a máquina a vapor, a eletricidade, e ao movimento de navios, das caravanas e dos grandes comboios ferroviários. Eles transportavam e comercializavam produtos agrícolas e mercadorias das mais diversas. O financiamento de toda essa intensa movimentação comercial era assegurado por banqueiros que viriam a se tornar lendários, entre os quais aqueles da família Safra, que no Oriente Médio deram origem a uma linhagem de financistas e lançaram ali os fundamentos da moderna atividade bancária, baseados no aprofundamento das informações e no crescente aumento do intercâmbio entre cidades.

Particularmente intensa era a troca de mercadorias entre os portos e cidades da Europa, como Paris, Nice, Marselha, Madrid, Barcelona, Nápoles, Trieste, Gênova e Veneza com Alexandria, Atenas, Istambul, Beirute, Damasco e Alepo – cidade a noroeste da Síria e um dos maiores centros de comércio. Para ela convergiam comerciantes e mercadorias do Oriente e do Ocidente.

Em Alepo viviam os Safra, de vocação cosmopolita, que se dedicavam a financiar o comércio, aceitando o câmbio de moedas de diferentes estados, como os “para” do Império Otomano, os “zecchini” de Veneza, os “thaler” de Maria Theresa, outras moedas do Oriente, da Europa e da África, além de metais como prata e, principalmente, ouro. Embora as práticas contábeis já estivessem desenvolvidas, Jacob Safra, o patriarca, era conhecido por sua excepcional memória e habilidade em lidar com números, visto que realizava mentalmente o cálculo de conversão de diferentes moedas e cotações, bem como dos custos de financiamentos que concedia aos seus clientes.

Em meados do século XIX, foi fundada, em Alepo, a Safra Frères & Cie. que, ao nascer, já trazia o nome da família. Em pouco tempo, tornava-se famosa em todo o Oriente Médio, com reputação firmada junto a grandes e criteriosos financistas. A expansão da empresa levou a família Safra a abrir filiais em Istambul, Alexandria e Beirute.

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Mais tarde, já na primeira metade do século XX, foi fundado em Beirute o Banco Jacob Safra, dirigido pelo patriarca que, assim, deu origem a uma nova geração de banqueiros de sucesso. Depois da Segunda Guerra Mundial, Jacob Safra estendeu seus negócios à Europa e, em seguida, à América Latina e aos Estados Unidos. Seus descendentes deram continuidade a um duradouro relacionamento com a comunidade de clientes. Vários deles mantiveram a tradição de Jacob Safra nas diversas áreas da economia e nos muitos países em que o Grupo Safra opera.

A saga empresarial dos Safra, no Brasil, começou com a Safra Importação e Comércio, que Edmond Safra fundou, em 1955. Em 1956, Edmond já rumava para a Suiça, e iniciava sua escalada de banqueiro internacional. Edmond esteve ainda na fundação do Banco Safra no Brasil, mas o vendeu para seus dois irmãos Joseph Yacoub Safra e Moise Yacoub Safra. Eles são os donos do império Safra no Brasil.

Para compreender os Safra, precisa-se compreender suas origens, enraizadas na comunidade judaica sefaradita do Oriente Médio. Durante muitas gerações, os Safra foram banqueiros e negociantes de ouro, em Alepo, um grande centro comercial. Não existe comunidade judaica na diáspora que se assemelhe à do Alepo quanto à proximidade de seus membros. Até hoje eles vivem todos intimamente ligados.

Os Safra são muito experientes com ouro e já o eram desde os tempos dos otomanos. A palavra "safra" em árabe quer dizer "amarelo". Em Nova York, assim como em Genebra e São Paulo, Safra é o principal operador de ouro e de outros metais preciosos, especialmente prata. Com sua arbitragem face a operações cambiais, as operações com ouro d0 Safra são puramente uma questão de margens de lucro. Como operador de ouro e câmbio, ele lucrava com o diferencial entre a oferta de compra e a oferta de venda, quer os preços do ouro subissem ou caíssem. Safra também barganhava em opções de ouro de longo prazo, de balcão, fazendo um hedging cuidadoso, para minimizar sua exposição ao mercado.

O pai de Edmond levou sua família para Beirute, onde ele nasceu, em 1932. O pai fundou o Banque de Crédit Nationale, que funciona até o presente com o mesmo nome, no Líbano. Foi o jovem Safra que tirou a empresa da família de Beirute, no final dos anos 40's, quando distúrbios anti-semitas sacudiram a cidade, depois da fundação de Israel. Safra fixou a empresa bancária primeiro na Itália e, depois, para sempre, no Brasil, onde “sentou praça” em São Paulo – que, não por coincidência, era um dos principais refúgios para os judeus de Alepo, que deixavam a Síria.

Em 1956, Safra engrossou a investida dos banqueiros estrangeiros à Suiça, onde ele fundou o Trade Development Bank. Ele se mudou para Genebra, em 1962, vendendo o banco brasileiro, o Banco Safra, para seus irmãos Joseph e Moise. Mesmo assim, Safra nunca abandonou sua cidadania brasileira, e ainda mantinha uma casa no país, embora morasse em Genebra.

Edmond Safra mudou-se para Genebra para fundar a sociedade financeira e comercial SUDAFIN, que, em 1959, foi convertida para seu primeiro banco, o Trade Development Bank, o qual cresceu de um para cinco bilhões de dólares nos anos 80. Ele estendeu seu império financeiro, satisfazendo seus ricos clientes de Monte Carlo até Miami.

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Em 1966, fundou o Republic National Bank of New York, com um capital de onze milhões de dólares, que era reconhecido internacionalmente como o primeiro banco dos Estados Unidos em transações de ouro e metais preciosos. Mais tarde, foram estabelecidas filiais do Republic em Londres, na Inglaterra, e em Genebra, na Suíça. Assim, o Republic ficou incluído tanto nas bolsas de valores da América como nas da Europa. O Republic National Bank, com 88 agências espalhadas por todo o mundo, tornou-se o terceiro maior banco da região metropolitana de Nova York, atrás de Citigroup e Chase Manhattan. Em 1988, formou o Safra Republic Holdings S. A. Republic, uma firma especializada em gerência de riqueza.

Edmond Safra construiu o Republic Bank of New York a partir de uma única casa, na Quinta Avenida, para tornar-se o vigésimo maior banco dos Estados Unidos, com 69 filiais em Nova York, Flórida e California. Safra controlava 28,7% do capital acionário do Republic, uma concentração de propriedade sem paralelo para um grande banco norte-americano. Em 1983, o Trade foi vendido por US$ 520 milhões ao American Express. Devido a um acordo de não concorrência, Edmond retirou-se do mercado europeu, durante cinco anos. Em 1988, Safra construiu seu Safra Republic Holdings, com sede em Genebra, 20,7% de propriedade dele próprio e 48,8% controlados pelo Republic New York, para tornar-se uma rede de private banking, com operações bancárias para grandes contas. Pouco tempo antes de morrer, Safra vendeu o Republic Bank para o Hong Kong Shangai Bank, HSBC, pela quantia de dez bilhões de dólares.

No começo dos anos 90, a fortuna de Edmond Safra foi estimada em 2,5 bilhões de dólares, e a Forbes o colocou como o 199° homem mais rico do mundo.

Em 1976, Edmond tinha se casado com a viúva brasileira de origem inglesa Lily Watkins Cohen Monteverde Bendahan, tornando-se seu quarto marido. Ela era uma das herdeiras da rede de varejo Ponto Frio, uma das maiores do Brasil. Eles nunca tiveram filhos. Lily Monteverde era de ascendência russo-judaica. O casamento com uma não-sefaradita contrariou alguns sefaraditas aferrados à tradição.

Patrono e filantropo de várias instituições de caridade das comunidades judaicas sefarditas ao redor do mundo, Edmond Safra fazia significativas doações. Em 1999, ano de sua morte, tinha doado uma grande quantia em dinheiro para uma instituição que estudava o mal de Parkinson e para o Museu do Louvre. Tinha uma coleção de livros sobre museus e financiava eventos culturais e salas da Fundação Bienal de São Paulo. As caridades apoiadas por Safra passaram depois de sua morte a receber doações de sua esposa, Lily, e de seus dois irmãos, José Safra e Moises Safra.

Edmond gostava de colecionar obras de arte. Decorava suas residências em Genebra, em Nova York e a Villa Leopoldo, que pertenceu ao rei Leopoldo da Bélgica, na Costa Azul, com quadros de pintores impressionistas, belas mobílias, esculturas, etc. Em 2005, anéis, relógios, vasos, escrivaninhas, cômodas e telas a óleo de sua coleção foram a leilão, na Sotheby's de Nova York. "Desde o falecimento de Edmond, dediquei a maior parte do meu cotidiano à fundação filantrópica. Minha vida e meus interesses mudaram, e, já não tenho tempo nem escala nas casas para apreciar a coleção como fazíamos antes, tive então que tomar uma decisão difícil: é hora de transferir aos outros o prazer de possuir estes tesouros”, disse Lily Safra.

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Edmond sempre carregava uma pedra azul no bolso e, quando vivia uma situação difícil, olhava para o retrato do pai e pensava. "Seu pai, vivendo as angústias de um judeu num mundo árabe, dera-lhe três conselhos para a vida: construir um banco como se constrói um navio: sólido para enfrentar tempestades; manter alta liquidez, porque os judeus às vezes têm de fugir depressa; e nunca ser o maior, porque os raios atingem primeiro as árvores mais altas. Esses conselhos foram seguidos", disse o falecido economista e ex-senador Roberto Campos, amigo dele durante quarenta anos.

Em dezembro de 1999, Edmond morreu num incêndio criminoso em seu apartamento no prédio Belle Époque, em Monte Carlo, Mônaco. Às 5h30 da manhã, a cobertura do edifício começou a pegar fogo, e os bombeiros só conseguiram apagá-lo depois de três horas. No banheiro do apartamento, foram encontrados os corpos de Safra e de sua enfermeira, ambos mortos por asfixiamento. Lily Safra e uma filha de seu primeiro casamento foram achadas escondidas, na suíte do casal, e sobreviveram.

Ted Maher, um enfermeiro estadunidense, foi preso sob a acusação de ter começado o incêndio. Foi condenado por uma corte de Mônaco somente em 2002. Maher alegou que causou o incêndio para poder realizar um resgate heróico e, assim, conseguir uma recompensa dos Safra; porém, ele perdeu o controle do fogo sem intenção. Esta versão do assassinato foi questionada por muitos que acreditavam que a confissão era extremamente conveniente.

Nas palavras de Edmond Safra, “nenhum judeu deve ser dono do maior banco num país não-judeu. Foi isso que meu pai me ensinou. Eu disse isso para os meus irmãos no Brasil também. Nunca se tornem o maior banco”.

A ligação de Joseph e Moise com Edmond era muito próxima. Há quem visse o império Safra no Brasil e no exterior como uma coisa só. Existia, porém, total independência de capital entre o império de Edmond Safra, centrado no Republic National Bank of New York e o conglomerado de Joseph e Moise, em torno do Banco Safra.

O Grupo Safra, constituído por uma rede internacional de empresas controladas pela família Safra, compreendia atividades bancárias, que constituíam seu principal foco de atuação, e também de produção de papel e celulose. Presente nos EUA, Europa, Oriente Médio, América Latina e Caribe, o nome Safra tornou-se um símbolo mundial de tradição. Podia-se dizer que o Banco Safra era o banco nacional privado mais internacionalizado, porém não era estrangeiro. Por sua participação em outras áreas não financeiras, o Grupo Safra era igualmente respeitado. No setor de papel e celulose, por meio de uma associação, alicerçou o desenvolvimento da Aracruz Celulose, a maior produtora mundial de celulose branqueada de eucalipto.

Os investimentos não-financeiros do grupo Safra, no Brasil, estavam longe de ser acessórios. O Brasil era um país onde a família se estendeu de forma particularmente ampla para fora do seu nicho atávico, o setor bancário. Assim, integravam os negócios do grupo Safra, no Brasil: três fazendas de gado de corte em Mato Grosso, com cerca de 30 mil cabeças de gado; 19,6% do capital (e 28% do votante) da maior indústria de celulose do país, a Aracruz; a Filobel, fiação de algodão e poliéster, em Jundiaí (SP); participações em empresas privatizadas como a Companhia Eletromecânica Celma (21,4% do capital votante), em Petrópolis (RJ), e a Acesita (8,69% do capital votante), siderúrgica em Itabira (MG); e participação, junto com a GE e a Villares, na joint

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venture Gevisa, em São Paulo, com o objetivo de fabricar locomotivas, pontes rolantes, motores elétricos e seus componentes

O Banco Safra sempre foi, basicamente, um banco de atacado. Contava com uma rede relativamente pequena de agências localizadas nos principais centros econômicos do país, e duas subsidiárias no exterior: Safra National Bank of New York e Banco Safra (Grand Cayman Islands) Ltd. As operações com pessoas jurídicas eram responsáveis por mais de 80% das receitas totais. O Banco, porém, vinha investindo no atendimento à pessoa física de alta renda.

No final de 2006, o Safra dispunha de 92 agências e 20 Postos de Atendimento Bancário (PAB). Essa estrutura com baixos custos, dimensionada para atender os objetivos do Banco, era um dos fatores que lhe assegurava a posição de um dos líderes do mercado em eficiência. Do total de agências, uma estava no exterior (Ilhas Cayman), 58 nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, e as demais em outras capitais e importantes cidades brasileiras. Os PABs funcionavam em grandes clientes corporativos.

No início de 1990, tinha ocorrido a cisão parcial do Banco, com parcela do patrimônio líquido em nova companhia, denominada Safra Participações S.A.. Tal decisão foi decorrente do elevado índice de imobilizado e investimentos que o Banco possuía em empresas pertencentes a áreas não bancárias. No Relatório Anual de 2006 do Banco Safra, seu presidente, Carlos Alberto Vieira, anunciou como fato relevante o acordo assinado entre os acionistas mediante o qual, a partir de outubro de 2006, Joseph Safra assumiu o controle integral das empresas financeiras do Grupo Safra, que reunia outros bancos, todos independentes, no Brasil, EUA, Europa, América Latina e Caribe.

4.9. Lições positivas da história bancária brasileira

O que a história da origem dos RUBIS – R de Real, U de Unibanco, B de Bradesco, I de Itaú e S de Safra – mostrou que justificasse o destaque em relação aos seus concorrentes?

Pelo menos cinco traços eram comuns no esboço dos seus perfis de “vencedores”, exceto as já citadas particularidades do Banco Safra. Este era um banco de atacado, que tinha apenas o primeiro ponto em comum com os outros, bancos de varejo. Primeiro, todos os bancos, em conjunto com empresas não-financeiras, faziam parte de um grupo econômico forte. Segundo, atuavam em todas as atividades bancárias, seja de varejo, seja de atacado, entretanto, sem perderem o foco em seu nicho de mercado específico. Terceiro, cresceram através de fusões e aquisições bancárias, ganhando abrangência nacional, apesar de sempre privilegiarem a disputa de negócios na região mais dinâmica e no centro financeiro, isto é, em São Paulo. Quarto, conseguiram opor uma barreira tecnológica aos seus concorrentes. Quinto, estavam entre os 50 maiores bancos de capital aberto por ativos nas Américas, obtinham os maiores lucros da história dos bancos na América Latina, mas ainda não tinham escala, considerando a conversão de seus ativos em dólar, para almejar maior inserção internacional.

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4.9.1. Conglomeração econômico-financeira

Antes de 1964, não existiam quaisquer restrições legais sobre o destino dos empréstimos dos bancos comerciais. A SUMOC, que era autoridade monetária, apenas recomendava, como "boa técnica bancária", que os bancos não concedessem empréstimos à diretoria. Entretanto, não havia controle ou fiscalização. Assim, os banqueiros aplicavam em seus próprios grupos econômicos, através de empréstimos aos familiares.

As principais vantagens da propriedade de um banco por um grupo econômico eram: a) o crédito fácil e imediato ao capital de giro das empresas do grupo; b) o privilégio único das empresas do grupo obter financiamento de médios e longos prazos; c) o ganho implícito nos juros reais negativos cobrados nos créditos concedidos às empresas do próprio grupo; d) os elevados lucros da intermediação bancária, que decorriam das enormes diferenças entre juros recebidos por empréstimos e juros pagos pelos depósitos, permitidas principalmente pelas altas taxas de inflação.

Os lucros dos banqueiros se dirigiam aos investimentos agrários e urbanos em geral, e não apenas ao próprio setor bancário. Evidentemente, os lucros declarados na contabilidade oficial dos bancos não incluíam tanto os "ilegais" (a "caixa 2" com os juros cobrados "por fora"), quanto o dinheiro retirado sob forma de custos, ou seja, os ordenados pagos à diretoria, que era fundamentalmente formada, na quase totalidade dos bancos brasileiros, por pessoas das famílias que detinham o controle acionário. Em geral, não eram os próprios bancos que investiam seus lucros em empresas de outros setores, mas as famílias dos banqueiros, muitas vezes através das holdings ou das empresas líderes dos grupos econômicos.

Todos os grandes bancos brasileiros faziam parte de grupos que contavam com dezenas de empresas, não só da área financeira, mas também de outros ramos de atividade, principalmente, indústria de alimentos, têxtil, não-metálicos, mineração, metalurgia, agro-pastoril, além dos setores imobiliário, comercial e de serviços, como diversões, hotéis, redes de lanchonetes, etc.. Como foi dito, tais empresas não eram propriedades diretas dos bancos, mas tinham ou o controle acionário detido por famílias dos banqueiros, ou participações ou relações de interesse com os bancos.

Quando o mercado nacional estava se consolidando, o crescimento permanente da rede de agências era necessário para o sucesso. Para garantir a participação no “mercado reservado” (protegido da concorrência estrangeira), acompanhando seu crescimento, a expansão bancária por meio de fusões, aquisições ou incorporações era obrigatória, inclusive em direção a novas áreas (e regiões) de negócios. Era o meio de adquirir as cartas patentes que já estavam concedidas pelo Banco Central do Brasil. Os “bancos RUBIS”, que puderam e souberam se colocar à frente desse processo, saíram dele nos primeiros postos, em qualquer ranking bancário.

Nos anos 90, após a abertura do mercado interno à competição internacional e a queda súbita dos lucros inflacionários, deu-se conta que um ciclo da história bancária tinha chegado ao fim. A fórmula do "supermercado financeiro", bem sucedida anteriormente, teve de ser revista. O crescimento desmedido deixou de ser garantia do sucesso, podendo inclusive significar exposição ao risco de fracassar. Daí, alguns dos bancos fora desse núcleo de “vencedores” avaliaram que seria mais prudente o

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fortalecimento setorial em áreas que tradicionalmente já dominavam e não a diversificação. Foi necessário o “encolhimento” e a cautela no novo cenário de exposição à competição.

A particularidade do Bradesco, em outras áreas de negócios, era que o Banco investia parcelas ponderáveis das reservas técnicas da seguradora e da previdência privada (por lei, parte dessas reservas tem de ser aplicada no mercado acionário) em participações minoritárias em empresas, especialmente de áreas industriais, no período recessivo. Com a esperada retomada do crescimento sustentado, a expectativa era que essas empresas deslanchassem e trouxessem um retorno que ajudaria muito ao Banco. Sua estratégia era garimpar oportunidades de negócios que lhe permitissem pelo menos ocupar um assento no conselho de administração.

Como era o banco que detinha o controle acionário tanto da seguradora como da empresa de previdência privada, ele era o principal beneficiário das participações adquiridas em 41 companhias não-financeiras, no valor de cerca de US$ 1,5 bilhão, em 1995, sem considerar as obtidas nas privatizações posteriores. À luz da legislação brasileira, havia uma vantagem no procedimento adotado de ter apenas participações minoritárias, não detendo, em conseqüência, o controle direto das decisões nas empresas. Nas companhias nas quais detinha menos de 10% do capital, ele não perdia o cliente, como banco. Acima dessa participação, de acordo com a lei, o banco passava a não poder mais emprestar dinheiro para a empresa.

Na década seguinte, o Bradesco retornou à ortodoxia bancária, separando o Banco das operações não bancárias ao criar a holding Bradespar. Para novo ciclo de inovações financeiras haveria a preservação de sua cultura de empresa de cliente popular. O Bradesco, no início de 2002, com suas 2.884 agências e seus 12,7 milhões de clientes não pretendia mudar sua principal característica: ser um banco prioritariamente dirigido ao varejo. Só estava abaixo do Banco do Brasil que, então, possuía 3.050 agências e 14,1 milhões de clientes. Os outros concorrentes diretos estavam abaixo dele: Itaú, 2.263 e 8,8 milhões, Unibanco, 806 e 5,4 milhões, respectivamente.

Não era só a política de investimentos do Bradesco que era diferente da de seu maior rival. A forma de financiar seus investimentos na indústria também era outra. Enquanto o Itaú dispunha dos recursos da holding Itaúsa, para aplicá-los fora de sua área financeira, o Bradesco, antes de criar a holding Bradespar, investia em empresas através de seus fundos de investimentos, seguradoras e carteiras de previdência privada. Estas instituições precisavam formar reservas técnicas como lastro para remunerar seu cotista ou associado.

Ao contrário do Bradesco, que buscava se caracterizar como um investidor em ações preferenciais, o grupo do Banco Itaú sempre teve a preocupação de ser um controlador da gestão das empresas em que possuía participação acionária. O próprio Banco era impedido de ficar, permanentemente, com ações de empresas coligadas. Ficava no máximo dois anos. Mesmos os fundos de investimento não podiam aplicar em ações do próprio grupo. O Banco só podia dar apoio operacional para underwriting das empresas não-financeiras do conglomerado. Estas, quando necessitavam de recursos de longo prazo, podiam, alternativamente, dependendo do movimento do mercado acionário, ou lançar ações com certa garantia de subscrição, ou então recorrer ao BNDES.

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O Banco Itaú atuava no mercado de capitais, mas não assumia posição acionária relevante como investidor. Não tinha a filosofia de colocar ações no permanente de seu balanço patrimonial. Só assumia participação acionária temporariamente, em processos de privatização, lançamento de ações e debêntures, etc.. Mesmo na área de seguros, as reservas técnicas eram lastreadas em ações de empresas sólidas e tradicionais, sem nenhuma estratégia estritamente de controle setorial.

A estratégia de outros grupos bancários não se limitava a aplicações de portfólio. Todavia, pode-se, ainda assim, considerar que o interesse fundamental de suas diversificações era meramente patrimonial, à medida que não havia uma clara política de integração banco-indústria, mas o aproveitamento de oportunidades de negócios para a aplicação dos recursos excedentes gerados no setor financeiro. Esta postura diante dos negócios não financeiros não impediu que cada grupo bancário “vencedor” mantivesse posições importantes em determinados áreas industriais, mas sem que o espaço da atividade principal fosse atingido por decisões de investimentos fora do núcleo central. A estratégia comum dos maiores grupos bancários tinha como foco garantir os interesses da área financeira que ocupava posição dominante no total dos negócios.

Tal preocupação evidenciava-se, por exemplo, na trajetória de diversificação do grupo Moreira Salles (COSTA & LOPREATO, 1995). As expansões das operações não financeiras realizaram-se de modo desvinculado das atividades financeiras. As duas áreas de negócios foram mantidas independentes, com administrações separadas e lógicas de atuação próprias, comandadas por holdings isoladas. A estratégia teve origem nas preocupações de se prevenir contra qualquer risco político de estatização ou desapropriação que pudesse envolver o grupo como um todo.

A lógica do movimento de diversificação baseou-se na associação com outros empreendedores e no aproveitamento de boas oportunidades de negócios compatíveis com a capacidade de acumulação interna do grupo. A cautela na aplicação dos recursos e a opção conservadora de se manter nos setores onde detinham maior controle sobre as variáveis básicas levaram o grupo a rever sua estratégia de mercado, no final dos anos 70. Abriu mão, então, das posições na petroquímica, papel e celulose, extração de ouro e pecuária, em função da instabilidade do quadro econômico e das condições específicas desses mercados. Como foi visto, o grupo Moreira Salles, associado a outros, desde os anos 40, atuava na área de pecuária e na comercialização e produção de café. Nos anos 60, participou da criação da Petroquímica União e da Aracruz e passou a atuar também em mineração e metalurgia, com a extração de ouro e a criação da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM). Nos anos 70, entrou na área de turismo em associação com o Club Mediterranée.

A saída dos setores de petroquímica e papel e celulose elevou a concentração dos investimentos em segmentos tradicionais e de baixo risco. O grupo optou por vender as participações nos setores não consolidados, com regras de atuação e fixação de preços com forte influência do setor público e que exigiam elevados aportes de capital, para garantir o posicionamento no mercado. Manteve, no entanto, o controle da CBMM, que detinha uma posição dominante no mercado e capacidade de se sustentar com recursos próprios. A opção conservadora e de aversão ao risco definiu uma posição em favor da concentração dos esforços na atividade principal, reafirmando os interesses dominantes do setor financeiro, no interior do grupo.

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Esse posicionamento manteve-se coerente ao longo do tempo. Os esforços do grupo concentraram-se em ampliar a participação do Unibanco no mercado e em consolidar a imagem de uma instituição moderna e ágil, preocupada com o avanço tecnológico e com a acirrada concorrência no setor. Só em 1989, após 10 anos, o grupo voltou a investir no setor industrial, com a implantação de uma fábrica de suco de laranja, aproveitando a produção disponível nas fazendas do próprio grupo. Mas, a principal novidade na área industrial foi a aplicação na Companhia Siderúrgica de Tubarão, aproveitando o programa de privatizações e a existência das chamadas moedas podres. O novo investimento, partilhado com a CVRD e a CSN, reafirmou a estratégia do grupo em aproveitar as oportunidades de bons negócios, sem comprometer os recursos a serem aplicados na área financeira.

O Grupo Safra compartilhava o controle da Aracruz Celulose, inicialmente, com a Lorentzen, a Votorantim e o BNDES. Ela era a maior produtora mundial de celulose branqueada de eucalipto, totalizando 3,0 milhões de toneladas anuais. Tendo como principais mercados a Europa e a América do Norte, a Aracruz era uma companhia totalmente integrada: possuía suas próprias florestas, fábrica de celulose, um terminal portuário e estações privadas de tratamento de água e geração de energia. O compromisso com o desenvolvimento sustentado e um mínimo impacto ambiental refletia-se na decisão de utilizar, exclusivamente, árvores de eucalipto cultivadas em área de reflorestamento de mais de 260.000 hectares. Com investimento de US$ 1,25 bilhão, representando um dos maiores investimentos privados no Brasil, uma nova unidade da empresa (Veracel Celulose) foi construída no Estado da Bahia, em parceria com o Grupo sueco-finlandês Stora Enso. Inaugurada em setembro de 2005, foi considerada uma das mais avançadas unidades de manufaturas do mundo. Produzia 900 mil toneladas anuais de celulose branqueada de eucalipto.

A família Safra e o grupo Votorantim chegaram a anunciar, em setembro de 2008, um acerto para comandar conjuntamente a holding criada para controlar a empresa resultante da união de Aracruz e Votorantim Celulose e Papel (VCP). Antes, VCP, Lorentzen e Safra controlavam a Aracruz, cada um com 28% das ações ordinárias. Até maio, o comando do negócio era regido por um acordo que incluía ainda o BNDES, com 12,5% das ações com direito a voto. Entretanto, com a “crise mundial do crédito” o acordo foi postergado. A nova empresa teria envergadura para ficar ativa em relação ao mercado internacional. A vantagem, no entanto, seria maior do que a das estrangeiras. Isso porque apesar de a Indonésia e o Chile terem custos de produção menores, o Brasil era mais competitivo em relação à produtividade e aos ciclos de colheita. Com o aumento da escala, o cenário da empresa tenderia a melhorar.

4.9.2. Segmentação e “core business”

Segmentação e data base marketing estiveram entre os principais instrumentos dos grandes bancos de varejo, para ampliar os negócios e reduzir os custos. A construção de uma base de dados não se desenvolvia de um dia para o outro e precisava ser continuamente revista. Em instituições estrangeiras que entraram no mercado, nos anos 90, a segmentação foi uma preocupação inicial e levou algum tempo. Alguns ainda nem tinham tido tempo de concluir o trabalho de segmentar os clientes em pelo menos três tipos, com base na renda, valor aplicado, dados demográficos e comportamentais.

Com uma base de dados sofisticada e informações suficientes para conhecer os hábitos de consumo dos correntistas, os maiores bancos varejistas brasileiros puderam

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dividir a clientela em grupos a serem atingidos com produtos e canais específicos. Os clientes tanto pessoas físicas quanto pessoas jurídicas podiam ser segmentados. O principal parâmetro era a faixa de renda ou faturamento. Uma boa ficha do cliente incluía mais do que dados cadastrais como idade, endereço e sexo. Trazia também informações de comportamento bancário como número de produtos do banco que o cliente detinha, reconhecimento dos produtos, tempo de relacionamento, perfil de crédito, dados sobre cheque especial e assinalava se o cliente era aplicador de recursos ou tomador de crédito. Com esses dados em mãos, era possível identificar as características comuns entre os que compraram um determinado produto e buscar na relação de clientes aqueles com padrão semelhante, mas que ainda não possuíam o produto. A ação comercial tornava-se muito mais certeira.

A segmentação trazia ganhos porque acarretava maior conhecimento e informação dos clientes o que permitia explorar nichos e oferecer produtos especializados. A política de marketing ficava melhor, mais eficiente e mais barata. Se não houvesse a segmentação, ela tinha que ser geral e tendia a ser pouco eficiente. Com a segmentação, era possível imputar aos clientes o custo certo dos serviços e produtos que usavam, e não os custos de uma rede grande de agências que, praticamente, não usava. O banco podia escolher os clientes de valor agregado maior, produzir mais ofertas para esse alvo e transformar a capacidade instalada para obter o maior nível de receita possível. A eficiência de uma abordagem segmentada era revelada na comparação com outros meios de ofertas: mala direta, call center, etc. No Itaú, por exemplo, estimava-se que o retorno positivo das ofertas do banco aos clientes quintuplicou com o uso intensivo e aperfeiçoamento da base de dados.

O negócio era inserir as informações contidas no data base no sistema de modo a serem utilizadas nos vários canais de atendimento, das agências e plataformas, aos call centers, máquinas automáticas (ATM) e Internet. Assim, era possível oferecer ao cliente que entrasse no 'home banking’, por exemplo, uma linha de crédito ou uma apólice de seguro. O modelo era fundamental para possibilitar, de fato, as “vendas cruzadas” e de um modo barato.

Ao adotar a segmentação e o data base, um banco tinha que estar preparado para mudar não só sua oferta de produtos, mas também segmentar os canais de distribuição e aperfeiçoar os sistemas. A segmentação ocasionava a revisão da rede de atendimento do banco, com a definição das agências de varejo, as de atacado, as plataformas corporate e as de atendimento personalizado. A segmentação avançava com a separação das agências de atacado entre grandes, pequenas e médias empresas.

A segmentação também teve impacto na mudança física e no papel da agência e dos terminais de cada banco. As agências, redesenhadas de acordo com os critérios da segmentação, receberam investimentos para estimular o auto-atendimento. Passaram a parecer-se mais com agências de viagem, onde o cliente era atendido sentado. A função de caixa foi muito reduzida, adotando-se inclusive o “programa de fila zero”.

Era mais caro ter um cliente com atendimento pessoal, mas os “clientes especiais” se pagavam, porque se conferia valor para um tratamento diferenciado. A segmentação serviu também para definir por quantos clientes um gerente ficava responsável e o padrão de atendimento: por exemplo, podia haver um gerente para um grupo de 300 clientes de um nível de renda superior e um para 700 com nível de renda inferior.

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A posição cautelosa do Unibanco na área industrial contrastou com uma postura agressiva na esfera financeira, onde se destacou como pioneiro na segmentação de mercado, posicionando-se no chamado varejo seletivo, no atendimento a grandes empresas e na administração de recursos de terceiros. Mas a compra da parte boa do Banco Nacional e da financeira Fininvest, compartilhando de início seu controle com o Banco Icatu, abriu campo para o Unibanco avançar no chamado mercado de varejo (pessoas físicas em geral) de baixa renda e para entrar no mercado de crédito direto ao consumidor, consolidando sua posição como um dos maiores bancos privados do País.

O Unibanco criou, a partir de abril de 1998, as lideranças executivas do Banco de Varejo e do Banco de Atacado, seguindo os passos de alguns grandes bancos internacionais. Esperava-se que essa nova estrutura organizacional daria mais impulso aos seus negócios, permitindo-lhe foco específico em cada macro segmento: varejo, atacado, seguros e administração de recursos de terceiros. Não foi o que ocorreu, levando-o a reverter essa experiência seis anos após.

Direcionando suas ações para o relacionamento, o processo de segmentação no Bradesco alinhou-se à tendência de mercado de reunir grupos de clientes de um mesmo perfil, o que permitia um atendimento diferenciado e crescentes ganhos de produtividade. Proporcionava ao Banco maior competitividade na execução de sua estratégia de negócios, dando dimensão adequada às operações, quer para pessoas físicas quer para jurídicas, em termos de qualidade e especialização, nas demandas específicas das mais diversas faixas de clientes.

O Bradesco Corporate estava presente nas principais cidades brasileiras. Por meio de suas plataformas, desenvolvia relacionamento especializado com grandes grupos econômicos, cujo faturamento anual superava R$ 180 milhões. O princípio da parceria consistia em importante diferencial não só para o próprio Corporate como à sua área Asian Desk, gerando os melhores resultados: R$ 85,3 bilhões era o total de recursos administrados pela área, em 2006, compreendendo 1.286 grupos econômicos.

O Bradesco Empresas tinha foco em empresas que, anualmente, faturavam entre R$ 15 milhões e R$ 180 milhões, oferecendo gerenciamento de negócios, tais como empréstimos, financiamentos, investimentos, comércio exterior, derivativos, cash management e operações estruturadas. O total de recursos administrados pela área, entre operações de crédito, fianças, depósitos, fundos e cobrança, abrangendo 22.729 empresas em todos os setores da economia, atingiu R$ 31,4 bilhões, em 2006.

A estrutura especializada no atendimento às pessoas físicas de elevado patrimônio, com disponibilidade mínima de R$ 1 milhão para investimentos, era o Bradesco Private Banking. Ele prestava assessoria personalizada e inteiramente direcionada para a valorização patrimonial, orientando cada tipo de cliente quanto a suas melhores alternativas. Em dezembro de 2006, essa divisão gerenciava R$ 22 bilhões, de um total de 4 mil clientes.

Direcionado para pessoas físicas com renda mensal a partir de R$ 4 mil ou disponibilidade de investimento superior a R$ 50 mil, o Bradesco Prime oferecia atendimento personalizado, assessoria financeira completa, bem como produtos e serviços diferenciados. Com Rede de Atendimento exclusiva para o segmento, ao final do exercício de 2006, eram 208 Agências Prime distribuídas em todo o País, especialmente projetadas para proporcionar privacidade aos mais de 344 mil clientes.

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Ao preservar a vocação cultivada desde suas origens, o Bradesco mantinha o segmento Varejo como estratégico e prioritário, com atendimento a todas as faixas da população. Neste tradicional campo de atuação, alcançava o maior número possível de empresas e pessoas, em todas as regiões do País, inclusive naquelas de menor nível de desenvolvimento. Em dezembro de 2006, o segmento atendia a mais de 16 milhões de correntistas.

O Banco Postal era a marca por meio da qual o Bradesco ofertava seus produtos e serviços em quase todos os municípios brasileiros, em parceria com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Com suas 5.585 agências, em dezembro de 2006, contribuía para o acesso bancário das populações locais, especialmente nas praças desassistidas de agências bancárias. Firmou-se como um indutor da expansão do mercado, pela capacidade de inclusão de novos consumidores de serviços financeiros, inclusive como tomadores de financiamentos e empréstimos, além de ter se tornado relevante ponto de apoio aos clientes do Banco que transacionavam em todo o Brasil. Desde sua criação, em 2002, mais de 4.800 cidades de todas as regiões do País ganharam acesso a esses serviços.

Por fim, o Bradesco mantinha ainda parceria com diversos estabelecimentos comerciais, tais como supermercados, farmácias, lojas de departamentos, panificadoras e outras redes varejistas. Através de sua rede de “correspondentes não-bancários”, oferecia aos clientes e comunidade em geral a comodidade do atendimento mais próximo da residência ou local de trabalho. O Bradesco não deixava de explorar nenhum segmento de mercado, mesmo aqueles compostos por camadas de baixa renda, que a Caixa Econômica Federal buscava atender.

No final dos anos 80, o Itaú estava sem foco mercadológico e chegou até a perder pontos para a concorrência. Desde então, com a mudança de sua direção, definiu-se como um banco essencialmente urbano, de varejo, mas com forte presença junto às médias e grandes empresas. Propôs-se a ter uma forte atuação nas áreas de serviços, principalmente em cobrança, e de crédito, com ênfase em operações tradicionais como descontos de duplicatas e adiantamentos de contratos de câmbio (ACC). Concluiu que sua força não estava nas inovações financeiras, mas na prestação de serviços para os clientes a preços competitivos. A estratégia do Banco Itaú também foi atuar em três mercados: o de pessoas físicas, o de médias empresas e de grandes corporações. Cada qual contava com uma estrutura própria, para atendê-lo.

Havia distinção na atuação em cada uma desses mercados. No varejo, passou a se dar tratamento diferenciado para cada cliente pessoa física, cobrando-lhe pelo acesso a serviços bancários em função da sua reciprocidade, ou seja, de seu volume de negócios. Havia um sério problema de custos em atender, adequadamente, cerca de 6,5 milhões de contas correntes, na época, com serviços tecnologicamente sofisticados sem elas disporem de saldos médios adequados. Em função do nível de aplicações financeiras alternativas, o foco principal acabou se dirigindo para o cliente classe média. A “cultura da empresa” não permitia obter nem o relacionamento pessoal que o gerente do Bradesco tinha com o popular, nem ter facilidade de alcançar as camadas de altas rendas, como faziam o Citibank e o Unibanco. Assim, o perfil do cliente típico do Itaú se delineou configurando o profissional liberal e/ou o assalariado de curso superior.

O atendimento pessoal ao cliente dono de pequena empresa era também imprescindível, pois a própria empresa não dispunha de contabilidade confiável. Esse

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foi outro ponto falho para o Itaú aprimorar. Ele tinha, tradicionalmente, um relacionamento pessoal com clientela desse perfil, mas não na proporção que o Bradesco, nos centros urbanos, e o Banco do Brasil, no interior, dispunham. A automação seguiu como um dos principais apelos do Banco Itaú junto ao mercado. A diferença é que passou a se esforçar para ser reconhecido por algo mais do que "Banco Eletrônico", como ele se autodenominava. A informática, somada a uma maior eficiência no atendimento pessoal à clientela, tornou-se, mais do que nunca, o centro estratégico do negócio.

Na realidade, o Itaú não podia perder o foco sobre seu cliente-médio, que demandava serviços bancários relativamente simples. Eles constituíam, em meados da década de 90, um universo de 6,5 milhões de pessoas, cujas contas correntes somavam expressiva disponibilidade para lastrear aplicações. Na década seguinte, com uma estratégia multifocal, através de um atendimento eletrônico e, se possível, personalizado dos múltiplos segmentos de sua clientela, sob o comando unificador do Banco Itaú Holding Financeira, ele recuperou seu posicionamento mercadológico como uma das maiores instituições financeiras privadas do Brasil. Em 2006, contava com 59.921 funcionários, no Brasil e no exterior, responsáveis por estruturas, produtos e serviços para atendimento a mais de 21 milhões de clientes.

O Itaú Holding contava com uma rede que abrangia 3.383 agências e postos de atendimento bancário, 820 pontos de atendimento eletrônico em empresas, 23.096 caixas eletrônicos e 834 lojas Taií. As principais subsidiárias do Itaú Holding eram o Banco Itaú e o Banco Itaú BBA. Por meio deles, atuava com destaque no Brasil e no exterior, participando de todas as áreas da atividade econômica.

O Banco Itaú, por meio de estruturas especializadas, atendia diversos perfis de clientes: pequenas (faturamento anual entre R$ 500 mil e R$ 10 milhões), médias (entre R$ 10 milhões e R$ 100 milhões) e microempresas (abaixo de R$ 500 mil), o Poder Público, investidores institucionais, pessoas físicas, incluindo o segmento de alta renda (acima de R$ 5.000 mensais) atendido pelo Personnalité e clientes com elevado patrimônio financeiro (acima de R$ 2 milhões) atendidos pelo Itaú Private.Também administrava os negócios de underwriting, custódia, corretagem de valores mobiliários, cartões de crédito, consórcios, seguros, capitalização e previdência privada. O financiamento de veículos, os cartões de crédito e as operações de financiamentos para clientes não correntistas de baixa renda (Taií) realizavam-se por meio da Itaucred.

Maior banco de atacado do País, o Banco Itaú BBA atuava no segmento corporate, onde atendia cerca de 1.100 grupos econômicos dentre os maiores que operavam no País (faturamento anual acima de R$ 100 milhões), e investment banking. Em 2006, a integração das operações corporate do BankBoston transferiu para o Banco Itaú BBA a gestão de R$ 3,7 bilhões em operações de crédito e co-obrigações.

O Itaú era, antes, assumidamente conservador. As mudanças ocorridas no Banco, desde quando, em 1994, Roberto Setúbal (então com 40 anos) se tornou presidente executivo, decorreram de um planejamento estratégico, no qual se enquadraram as oportunidades surgidas. Foram elas: criação do Banco Itaú Europa e do Itaú Argentina, joint venture com o Bankers Trust dos EUA, aquisições do Banco Francês e Brasileiro ao Crédit Lyonnais, de bancos estaduais, do BankBoston, etc..

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Roberto Setúbal achava que não adiantava nada executar bem uma estratégia quando ela se mostrava equivocada. Então, ele a mudou. Em 1990, ocorreu o início da discussão de segmentar o varejo, distinguindo clientes pessoas físicas e clientes pequenas e médias empresas. Em 1992, começou-se a destacar os clientes corporate. Foi quando o Itaú reviu sua estratégia de inserção no mercado. Houve várias iniciativas de reorganização interna, novos produtos e reformulação de agências. Desde então, o Itaú passou a ser considerado líder do mercado em novos serviços com informática e telecomunicação, com um dos sistemas de banco eletrônico entre os mais avançados do mundo.

Uma questão ainda não respondida, que só o futuro diria, era se a tendência de aumento da informatização unida com telecomunicação levaria à perda de importância de um banco deter grande rede de agências. Qualquer grande banco de varejo tinha de estar preparado para esta eventualidade.

4.9.3. Localização

Da população brasileira no final do século XX, cerca de 170 milhões de pessoas, 22% viviam em São Paulo: eram em torno de 37 milhões de pessoas – uma população superior à das regiões Sul e Centro-Oeste juntas. Mais de 10 milhões viviam na capital de São Paulo, ou seja, uma população maior do que a do Rio Grande do Sul ou, ainda, maior do que a do Uruguai e do Paraguai juntos. Com um PIB de US$ 279 bilhões (superior, dependendo da cotação do dólar, ao da Argentina), São Paulo detinha 36% da economia brasileira. Sua renda per capita era de US$ 7,95 mil, em 1998. Logo, havia um significativo mercado potencial, para ser explorado pela atividade bancária, no Estado.

Dada essa histórica concentração regional, a capital de São Paulo possuía, em janeiro de 1997, segundo dados da FEBRABAN, 116 sedes de bancos, ou seja, mais da metade dos 229 bancos então existentes no Brasil adotaram-na como o centro de decisões financeiras. Da rede nacional de agências, 11,7% estavam na cidade de São Paulo e quase 1/3 no Estado.

Segundo os resultados da Pesquisa da Atividade Bancária Paulista do SEADE, realizada em 1996, o Estado de São Paulo possuía 46% e 33% da clientela bancária nacional – pessoas físicas e pessoas jurídicas, respectivamente. Era notável a relevância do mercado paulista, especialmente para os maiores bancos varejistas. “Os bancos que dominavam o mercado financeiro, em São Paulo, tinham poder de domínio do mercado nacional” (COSTA, MARINHO & MATTEDI, 1999).

No Estado de São Paulo, em 1996, o grupo de bancos classificados como “gigantes” (cada um com mais de 1 milhão de clientes no Estado, em média, 2,230 milhões clientes por banco) era constituído, em ordem declinante, por Itaú, Bradesco, Banespa, Unibanco e Banco do Brasil. Esses cinco bancos gigantes possuíam 77% da clientela paulista, somando pessoas físicas e jurídicas. Os bancos “grandes”, possuindo entre 100 mil e 1 milhão de clientes, também em ordem decrescente, eram Nossa Caixa, Real (ABN-Amro), Caixa Econômica Federal, América do Sul, Noroeste, Mercantil de São Paulo, Sudameris. Esses sete grandes tinham 18% dos correntistas no Estado. Portanto, 95% da clientela paulista, somando pessoas físicas e pessoas jurídicas, buscavam esses doze bancos.

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Estimava-se que o Itaú tinha a metade de sua clientela em São Paulo e o Bradesco, assim como o Unibanco, cerca de 1/3. O Banco do Brasil teria pouco mais de 1/10 de seus correntistas em São Paulo. Em 2001, a Nossa Caixa anunciava ter quase 3 milhões de clientes, porém nem todos correntistas, no Estado.

O PIB (Produto Interno Bruto) da capital paulista (US$ 102,4 bilhões) superava, em 2005, a renda gerada por 22 Estados norte-americanos, quando analisados individualmente, e era maior do que o de todos os Estados brasileiros, exceto São Paulo, segundo pesquisa pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio), divulgada em 11/01/08. Se a cidade de São Paulo fosse um país, ele estaria entre as 50 maiores economias do mundo, no 47º lugar, à frente do Egito e do Kwait e na mesma dimensão da Nova Zelândia e da Hungria. Além disso, a renda gerada pela capital paulistana correspondia a quase 85% da renda de Israel. Ele seria o 5º PIB da América do Sul, ao lado do Chile, mas, por exemplo, cinco vezes maior que o do Uruguai.

Justificava-se, portanto, a cidade de São Paulo ser o principal centro financeiro da América Latina e abrigar sucursais das maiores instituições bancárias do mundo. Possuía, aproximadamente, 1.500 agências de bancos nacionais e internacionais, abrigando 38% das sedes das 100 maiores empresas privadas de capital nacional e 63 % das sedes de grupos internacionais instalados no país. São Paulo também era sede de 16 dos 20 maiores bancos múltiplos e comerciais; de 8 das 10 maiores corretoras de valores e de 5 das 10 maiores empresas de seguros. A BM&F (Bolsa de Mercadorias & Futuros) era a sexta do mundo em volume de contratos negociados. A Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo) movimentava R$ 6 bilhões por dia. Cerca de 30 mil milionários viviam, em 2005, na cidade de São Paulo, representando 60% de todos milionários do Brasil. Em São Paulo eram efetuadas 10 compras por segundo via cartão de crédito ou débito. Existiam mais de 240 mil estabelecimentos comerciais na cidade e mais de 70 shopping centers – o maior número do Brasil. Esses shoppings recebiam acima de 30 milhões de pessoas por mês.

Na disputa pelas agências bancárias estava onde se decidia, de fato, quem dominava o mercado. Apesar de o desenvolvimento tecnológico permitir acesso ao banco pela internet, telefone e máquinas de auto-atendimento, possuir agências ainda era fundamental, pois era na agência que acontecia o relacionamento pessoal do cliente com o banco. Este cliente era mantido pelo relacionamento, inclusive o eletrônico. Nos mercados como o do Brasil, a presença da agência era mais fundamental do que em países da Europa ou nos Estados Unidos. Havia, no país, uma parcela da população que tinha pouco acesso ou nunca tinha ido a um banco. Ela não tinha experiência com produtos financeiros. Era mais fácil trazer pessoas com esse perfil para o banco (ou vender-lhes um produto financeiro) em uma agência.

Uma rede de agências também tinha o papel fundamental de reduzir o custo de captação dos bancos, dando um diferencial competitivo para as instituições de varejo. Quando a rede era grande, o funding ficava mais barato.

Com várias aquisições a partir de 1995, principalmente, devido às oportunidades surgidas na crise bancária e nas privatizações dos bancos estaduais, os dois maiores bancos privados (Bradesco e Itaú) deram um salto à frente da concorrência. Construíram uma rede de agências praticamente imbatível por outro banco privado, no território nacional. Em 2000, o Bradesco tinha 10,8 milhões de clientes. Restrito ao crescimento

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orgânico, agregaria mais 2,1 milhões de clientes até o ano de 2003. Entretanto, atingiu 14,5 milhões, ou seja, acrescentou mais 1,6 milhões de clientes devido às aquisições.

A estratégia defensiva foi o principal motor das aquisições de bancos feitas, realizadas após 1995/96, pelo Bradesco (BCN/Credireal, Baneb, Boavista, Mercantil de São Paulo, BEA, BES, Cidade, BBVA, Zogbi, BEM, BEC, BMC), Itaú (Banerj, Bemge, Banestado, BEG, BankBoston), Unibanco (Nacional, Sul América, Dibens, Bandeirantes/Banorte, Credibanco, Banorte). A necessidade de ganhar escala e conquistar outras fatias do mercado nacional para enfrentar a maior concorrência por clientes foi fundamental. Os bancos brasileiros foram movidos pela oportunidade de se defender das aquisições dos bancos estrangeiros, especialmente do Santander (Banespa, Geral do Comércio, Noroeste, Bozzano Simonsen/Meridional), do ABN Amro (Real, Bandepe, Paraiban, Sudameris/América do Sul), do HSBC (Bamerindus) e do BBV (Excel/Econômico). No início de 2008, o Santander adquiriu o ABN Amro Real.

Uma empresa do setor bancário, para se tornar eficiente, tinha que operar em larga escala. A estrutura montada para atender certo número de clientes era a mesma exigida para atender um número muito maior. O varejo bancário estava focado em ganho de escala e eficiência. Conseguir escala implicava em aquisição. A estratégia dos maiores bancos nacionais privados, portanto, foi crescer com aquisições de concorrentes em São Paulo e de bancos com nichos regionais, ganhando maior escala nacional.

Analisando a rede de agências bancárias de cada banco nos diversos estados, em 2002, depois de passada a onda de privatização dos estaduais, o que chamava mais a atenção era que o Banco do Brasil só não tinha a liderança em São Paulo e nos Estados onde o banco governamental tinha sido privatizado e adquirido por um dos dois grandes concorrentes. No estado de São Paulo, possuía 564, abaixo das 987 do Bradesco, 723 do Banespa-Santander e 584 do Itaú. Os outros estados onde não era o líder eram: o Amazonas, 23 contra 48 do Bradesco; a Bahia, 210 contra 228 do Bradesco; Goiás, 119 contra 172 do Itaú; Minas Gerais, 348 contra 458 do Itaú; e Estado do Rio, 204 contra 301 do Itaú, 234 do Bradesco, e 212 do Unibanco. O Banco do Brasil tinha 21% do total de agências bancárias brasileiras, o Bradesco, 19%, o Itaú, 16%, a Caixa, 12%. Esses quatro somavam 68%. Os outros bancos com expressão no varejo (Santander, HSBC, Unibanco, ABN) ficavam na faixa entre 828 e 1.003 agências. Todos os demais possuíam menos que 500 agências.

O Bradesco, por exemplo, tinha apenas na principal praça do mercado bancário, o Estado de São Paulo, mais agências do que dois de seus grandes concorrentes, o ABN Amro Real e o Unibanco, tinham no Brasil todo. Das 987 agências do Bradesco no Estado de São Paulo, 130 vieram da aquisição do Banco Mercantil de São Paulo. A rede nacional do Unibanco, sem incluir os postos de atendimento bancário (PABs) montava a 908 agências; a do ABN Amro Real, a 828.

Todos estavam cientes da importância do mercado paulista, que concentrava 5,4 mil agências, um terço das 16,8 mil existentes em todo o País. Em seguida, vinham Minas Gerais, com 12%, o Estado do Rio, com 10%, Paraná com 8%, Rio Grande do Sul com 6%, e a Bahia com 5%. Esses eram os Estados com acima de 662 agências. Santa Catarina e Goiás tinham 501 agências cada um, e os outros mal chegavam a uma centena, quando muito a duas centenas, cada qual. Portanto, a concentração regional era muito pronunciada, os seis primeiros Estados citados com percentuais reuniam quase 3/4 das agências.

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Entretanto, a forte expansão econômica periférica, no período entre 2003 e 2007, fez aumentar o volume de empréstimos oferecidos pelos maiores bancos brasileiros às regiões Norte e Nordeste. A parcela destinada ao Sudeste registrou pequena queda, mas, mesmo assim, em valores totais, a região ainda concentrava a maior parte dos recursos liberados pelas instituições. Isso foi o que revelaram os balanços dos quatro maiores bancos nacionais (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco e Itaú), que, segundo o Banco Central do Brasil, respondiam, juntos, por 54% do crédito oferecido pelo sistema financeiro (FSP: 02/01/08).

Os balanços demonstraram que, entre junho de 2002 e junho de 2007, embora o Sudeste tenha sido a única região que apresentou expansão abaixo da média nacional, sua participação no total de financiamentos caiu apenas de 57,6% a 53,7%. Com uma participação de 56,5% no PIB, a região ficou com percentual de crédito menor do que o de seu peso na economia produtiva.

4.9.4. Informatização

O uso de novas tecnologias era fundamental para a manutenção da posição no mercado. Os bancos gigantes adotaram uma estratégia para conquistar e manter a clientela varejista com base em crescente disponibilidade de tecnologias de informação e equipamentos de auto-atendimento. A tecnologia se tornou decisiva na disputa pelo mercado.

A concentração de equipamentos de auto-atendimento ocorreu de maneira quase absoluta nos bancos gigantes do varejo. Percebia-se, nitidamente, a barreira tecnológica existente entre a atuação no mercado de atacado, caso dos micros, pequenos e médios bancos, e no mercado de varejo, disputado por bancos grandes e gigantes. Os bancos menores, que atuavam no atacado e/ou em nicho de mercado, não investiam em tecnologias de atendimento para clientes. Na realidade, a capacitação de seus técnicos especializados e a tecnologia voltada para sua área de atuação eram mais estratégicas do que a disponibilidade de tecnologias para clientes.

Por sua vez, os bancos gigantes, segundo estimativa feita pela Federação Brasileira das Associações de Bancos (FEBRABAN), investiram, crescentemente, desde 1995, quando gastaram cerca US$ 1 bilhão em hardware, software e serviços. Em 1996, US$ 1,5 bilhão; em 1997, US$ 1,8 bilhão; em 1998, US$ 2,06 bilhões. Acumuladas, essas quantias já representavam um volume de investimentos significativo, mesmo para bancos de escala internacional, desde que se considerasse que o mercado brasileiro não era a prioridade estratégica dos acionistas desses bancos, pois o risco-país até 2002 era muito elevado. Portanto, a barreira tecnológica foi um dos obstáculos impostos à conquista do mercado de varejo brasileiro, inclusive aos bancos estrangeiros, nos anos 90, quando ocorreu a abertura financeira.

Continuou crescente o investimento em informática, pois, em 2007, os bancos gastaram R$ 6,2 bilhões em hardwares, softwares e redes de telecomunicações, segundo dados de uma pesquisa feita pela FEBRABAN. As despesas globais de tecnologia de informações (TI) atingiram quase R$ 15 bilhões. As despesas com equipamentos, que no passado constituíam a parcela mais pesada do orçamento de TI, nesse ano representaram um terço do total.

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A internet banking consolidou-se como ferramenta fundamental de comunicação entre banco e clientes. Tanto que o número de usuários dos chamados home banking, para pessoas físicas, sofreria uma redução, mas não o office banking, voltados a pessoas jurídicas. Em tais serviços, a conexão era feita via modem com o banco. A tendência já era que esses serviços fossem extintos, sendo substituídos pelo acesso via internet.

Embora o pagamento de muitos tributos ainda exigisse autenticação, o atendimento envolvendo funcionários das instituições, medido pelas transações de caixas de agências, caiu. Os investimentos do comércio em automação dos pontos de venda também contribuíram para aumentar as operações com cartões de crédito. Com o avanço das transações com cartões de crédito e de débito, o número de cheques compensados diminuiu.

Em função do menor custo de atendimento via eletrônica, aumentou o acesso bancário da população. Essa democratização dos serviços bancários ocorreu como conseqüência da estabilidade econômica e a necessidade das instituições de novos clientes. Com pouco espaço para crescer nas classes mais altas e sob incentivo do governo, após 2003, os bancos tiveram de mudar a estratégia usada por anos no Brasil e, assim, passaram a procurar os mais pobres. Era possível traçar algumas características do perfil dos novos clientes: geralmente ganhava pouco, não tinha trabalho formal e morava em locais distantes ou na periferia. As instituições financeiras permitiam que esse cliente protegesse seus recursos contra a inflação e contasse com crédito para consumo. Apesar de se destacar a “democratização bancária”, a novidade ainda ocorria em nichos. Os novos clientes foram absorvidos mais pela Caixa Econômica Federal, embora o Banco do Brasil e o Banco Postal também tenham os atendido.

O número de bancos operando no Brasil sofreu uma retração. Tal concentração foi motivada pelos processos de fusões e aquisições de bancos privados e de privatizações de bancos estaduais. Os estrangeiros não ocuparam o espaço dos bancos nacionais líderes. A rentabilidade dos nacionais demonstrava que sua liderança se mantinha de forma muito consolidada, no caso do Bradesco e Itaú. De acordo com FEBRABAN, em 2006, existiam no Brasil 85 bancos privados nacionais (com ou sem participação estrangeira), ante 61 privados estrangeiros e com controle estrangeiro. Os 13 bancos públicos federais e estaduais completavam o número total de 159 bancos.

4.9.5. Rentabilidade internacional, escala nacional

Ranking organizado por ativos totais em 2005, expressos em dólares norte-americanos, elaborado pela Economática, empresa de consultoria brasileira, mostra que entre os 50 maiores bancos de capital aberto (exclui Caixa Econômica Federal) da América Latina e Estados Unidos, estavam cinco instituições brasileiras, duas do México e duas do Chile. As demais eram dos Estados Unidos. O Banco do Brasil aparecia em 11º, o Bradesco, em 17º, o Itaú, em 19º, o Unibanco, em 30º e o Santander Banespa, em 49º.

Outro estudo, com a comparação do desempenho dos bancos brasileiros e americanos, foi feito pela Economática (FSP: 25/08/08). Levou em conta a rentabilidade média dos balanços publicados por 23 instituições no Brasil e 81 nos EUA no primeiro semestre do ano de 2008, quando estava em pleno vigor a “crise do subprime” norte-americana. Do final de 2002 até esse período, portanto, durante os cinco anos e meio do

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governo Lula, a rentabilidade dos bancos brasileiros saltou de 12,4% para 21,7%. Entre os bancos nos EUA, nesse mesmo período, a rentabilidade caiu de 15,7% para 8,9%.

Se fossem levados em conta os quatro maiores bancos tanto do Brasil quanto dos Estados Unidos, a diferença aumentaria. A rentabilidade patrimonial dos principais bancos brasileiros, no primeiro semestre de 2008, de 28,5%, era praticamente quatro vezes a dos americanos, de 7,1%. Os quatro maiores bancos brasileiros eram o Itaú (rentabilidade de 30% e ativos em US$ 216 bilhões), o Unibanco (30% e US$ 108 bilhões), o Banco do Brasil (27% e US$ 262 bilhões) e o Bradesco (26,5% e US$ 253 bilhões). Já os americanos eram o Goldman Sachs (23,2% e US$ 1.088 bilhões), o JP Morgan Chase (8,5% e US$ 1.776 bilhões), o Bank of America (5,8% e US$ 1.717 bilhões) e o Citigroup (-11,5% e US$ 2.100 bilhões).

Esses rankings revelavam que, no setor bancário, a escala em ativos necessária para uma investida internacional era muito maior do que a exigida para uma empresa não-financeira. Assim, era de se esperar uma saída maior dos maiores bancos brasileiros apenas quando os espaços de crescimento interno no país fossem se esgotando. Isso estava longe de acontecer no Brasil, tanto pelo lado do crescimento da clientela, quanto pelo lado do mercado de crédito. Além desse fator, outro limitante era que eles operavam, fundamentalmente, com a moeda nacional. Quando esse seu “poder de comando de decisões” era convertido pelo padrão monetário hegemônico na economia mundial, o dólar, eles não alcançavam competitividade internacional.

Entretanto, baseado no valor das ações, cotadas em 18 de janeiro de 2008, depois da “crise do subprime” e com o real apreciado, a consultoria Economática elaborou ranking em que o Bradesco e o Itaú ficaram entre as maiores instituições financeiras das Américas, quando apenas quatro anos antes ocupavam o 43º e o 34º lugares, respectivamente. Passaram o valor de mercado de alguns símbolos do capitalismo mundial. Os bancos American Express, Bank of NY Mellon, Morgan Stanley e Merrill Lynch, apareceram nas posições seguintes à do Itaú, antes do Banco do Brasil, em 14º, e do Unibanco, em 17º lugar.

A comprovação da possibilidade de alto desempenho, no mercado doméstico, podia ser constatada analisando a rentabilidade dos bancos brasileiros. Entre os 25 maiores lucros da história dos bancos de capital aberto da América Latina, até 2005, encontravam-se bancos brasileiros, obtendo 23 posições! Além deles, somente o Banamex do México aparecia duas vezes, com os lucros de 2000 (14º) e 1999 (15º). A lista era liderada pelo lucro do Bradesco em 2005, de US$ 2,35 bilhões e tinha na 25ª posição o lucro do Itaú em 1998: US$ 728 milhões. Esses dois bancos apareciam 8 e 7 vezes, respectivamente. O Banco do Brasil aparecia 4 vezes e o Banespa, 3 vezes. O lucro do Unibanco aparecia apenas uma vez, em 22º lugar, referente ao ano de 2005.

O lucro bancário crescente, em atividade de mercado livre, formal e fiscalizada, não significava anormalidade ou irregularidade. Pelo contrário, sua maximização, considerando certa aversão ao risco, deveria ser bem vista por todos os participantes do sistema bancário, inclusive os clientes. Mas não era o que acontecia junto à imprensa, o que prejudicava a imagem pública dos bancos. A visão do lucro como pecado e dos juros como usura era tradição do cristianismo medieval que perdurou onde o reacionarismo clerical sobreviveu mais tempo.

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O lucro líquido era, meramente, o resultado contábil constatado ex-post a partir de milhões de decisões de negócios entre um banco e sua rede de clientes. Seu crescimento, em contexto de queda da taxa de juros básica, indicava a maior intensidade desses negócios e, portanto, melhor avaliação de capacidade de pagamento por parte dos clientes.

Em outras atividades, provavelmente se reconheceria: “está colhendo o que se plantou”; “está retornando o que se investiu”; “está vendendo o que se oferece”. Entretanto, no sistema bancário, do qual praticamente toda a população economicamente ativa urbana participava (mais de 77 milhões de contas correntes movimentadas em 2007), interpretava-se que “o banqueiro está ganhando à custa do meu dinheiro”. Esquecia cada cliente que ele teve autonomia na decisão de adquirir algum produto ou serviço bancário. Se ele optou, foi “servidão voluntária”. A relação entre os custos e os benefícios de se participar dessa rede da moeda eletrônica era, em princípio, bastante favorável a todas os clientes.

Qual era, de fato, a injúria? Não devia ser, genericamente, quanto aos “lucros dos bancos”. Em níveis absolutos, a maioria deles não chamava tanto a atenção quanto os do Itaú e do Bradesco, respectivamente, 4º e 5º maiores lucros de empresas na América Latina, no ano de 2006. Os setores de siderurgia e telecomunicações foram os que tiveram mais representantes na lista dos 20 maiores lucros desse ano, com 4 companhias de cada área. Mas todos os críticos viam com “naturalidade” os lucros maiores da Petrobrás, em um período de alta do preço do petróleo, e da Vale, sendo puxado pelo aumento dos preços do minério de ferro.

Na realidade, o sistema bancário brasileiro era muito heterogêneo. A concorrência por clientes não se dava de acordo com modelos abstratos de competição perfeita em torno de preços (“menores juros e tarifas”), mas sim em disponibilidade e qualidade de produtos e serviços bancários. Em estrutura de mercado caracterizada por ser de oligopólio diferenciado, os líderes sempre foram pioneiros na automação bancária e no atendimento eletrônico massivo.

A análise das “preferências dos consumidores”, expressas através do número de clientes (pessoas físicas e jurídicas) de cada banco, podia revelar os distintos patamares de lucros existentes. A Caixa possuía 41 milhões de clientes, mas cerca de 32 milhões estavam em contas de poupança, e entre os 9 milhões de correntistas a metade possuía a conta simplificada. O Banco do Brasil tinha quase 24,6 milhões de clientes, o Bradesco, 18 milhões, e o Itaú mantinha cerca de 13 milhões de contas ativas.

Em outro patamar estavam Unibanco (7,7 milhões), Santander (7,2 milhões), Real (6 milhões), HSBC (4 milhões), Nossa Caixa (7,2 milhões), Banrisul (4,2 milhões), todos com dimensões mais regionais do que propriamente nacionais. Outros 150 bancos mal atingiam “milhares” de clientes. Muitos exploravam nichos de negócios apenas locais.

Os patamares de lucros acompanhavam mais ou menos os números de clientes (e de agências e funcionários), que resultavam também nesses patamares distintos em volumes de depósitos, empréstimos e ativos. Todos estavam correlacionados com os números de clientes. Por que a liderança destacada do Itaú e do Bradesco entre os bancos privados?

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Era fruto de terem capitaneado longo processo histórico de fusões e aquisições de bancos e estarem sempre na vanguarda tecnológica. A barreira tecnológica representada pela necessidade de se investir bilhões de dólares em país de alto risco colocou obstáculos inclusive para os concorrentes estrangeiros. Vários deles desistiram de disputar o varejo brasileiro e se associaram aos dois, que se capitalizaram ainda mais.