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Capital Portador de Juros: Marx e Chesnais Ref.: Capítulo XXI, vol. 3, de O Capital de Karl Marx e cap. 1 de A finança mundializada de François Chesnais 1

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Page 1: Capital Portador de Juros: Marx e Chesnais - Blog da Crise · Teses de Marx “O retorno do capital a seu ponto de partida é, em geral, o movimento característico do capital em

Capital Portador de Juros: Marx e Chesnais

Ref.: Capítulo XXI, vol. 3, de O Capital

de Karl Marx e cap. 1 de A finança mundializada de François Chesnais

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Economia Vulgar

É bem conhecida a duplicidade categorial: economia científica e economia vulgar . Ela é apresentada assim em O Capital:

�Tese: “Economia Política clássica... [que] investiga �Tese: “Economia Política clássica... [que] investiga o nexo interno das condições de produção burguesas”

�Antítese: “Economia vulgar que apenas se move no nexo aparente..., oferecendo um entendimento plausível dos fenômenos.”

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Economia Apologética

Marx apresentou, também, a categoria de economia apologética que não se confunde com a de economia vulgar:

A “apologética então consiste em falsificar as mais simples relações econômicas e, especialmente, em se aferrar à unidade em face da contradição”.

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Relações com o Método

Não são noções meramente políticas ou meramente retóricas que despontam na luta política, mas, diferentemente, são categorias inerentes ao método de Marx.

As duas primeiras dizem respeito à relação As duas primeiras dizem respeito à relação dialética entre fenômeno e essência, ciência positiva e ciência crítica, prática utilitária e práxis. A terceira refere-se a modos de pensar que estão aquém – ou além – da própria ciência, mesmo vulgar.

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Chesnais: capital portador de juros

Para Chesnais, o capitalismo contemporâneo é caracterizado pela centralidade e pela dominação do capital financeiro. E ele o define como “modalidade” e não como “forma”:

“Esse capital busca ‘fazer dinheiro’ sem sair da esfera financeira, sob a forma de juros de empréstimos, de dividendos e outros pagamentos recebidos a título de posse de ações e, enfim, de lucros nascidos de especulação bem-sucedida”.

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a) “o capital portador de juros ressurgiu no início dos anos 80” não “por movimento próprio”, mas devido as políticas de desrepressão financeira praticadas pelos EUA principalmente.financeira praticadas pelos EUA principalmente.

b) “A abertura externa e interna dos sistemas nacionais, antes fechados e compartimentados, conduziu à emergência de um espaço financeiro mundial”.

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c) Da emergência da esfera financeira internacional decorre “a personificação dos mercados”, com três dimensões:

� “autonomia relativa da esfera financeira em relação à produção... e as autoridades monetárias”;produção... e as autoridades monetárias”;

� “caráter de fetiche dos ‘valores’ criados pelos mercados financeiros”;

� “os operadores delimitam os contornos da mundialização financeira”.

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d) Essa modalidade de capital é caracterizada como “propriedade patri-monial financeira” e o seu fim é o “moderno entesouramento”.

Ela é central porque determina a lógica e o ritmo da acumulação; ela é dominante porque subordina o capital industrial (ou funcionante) ao seu propósito acima mencionado.

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e) Define uma categoria de capitalistas rentistas que são “proprietários situados em posição de exterioridade à produção, e não como credores”.

A finalidade da “propriedade patrimonial... não é nem o consumo nem a criação de riquezas que aumentem a capacidade de produção, mas o ‘rendimento’” que visa “o entesouramento estéril”.

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f) “A restauração do poder da finança teve dois resultados”:

� “A força formidável da centralização do capital”;� “A força formidável da centralização do capital”;

� “a finança... conseguiu alojar a ‘exterioridade da produção’ no próprio cerne dos grupos industriais.

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g) Conseqüências : a) controle da ‘governança corporativa’ nas empresas; b) redução da parcela salarial na repartição da renda; c) crescimento mundial muito lento; d) crises constantes.crises constantes.

g) A crise permanente ameaça a economia mundial por existe algo que denomina “insaciabilidade da finança”.

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Em particular, por que essa modalidade de capital tem a tendência de gerar crises e mais crises?

“A propensão do capital portador de juros para demandar da economia ‘mais do que ela pode dar’ é uma conseqüência de sua exterioridade à produção”

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No cap. XXI, do volume III, Marx deriva a categoria de “capital portador de juros” do conceito de capital e o apresenta como forma inerente ao modo de produção capitalista – e inerente ao modo de produção capitalista – e não como mera modalidade que pode existir ou não existir dependendo das circunstâncias históricas. O trecho chave é o seguinte:

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“Dinheiro... pode na base da produção capitalista ser transformado em capital e, em virtude dessa transformação, passar de um valor dado para um valor que se valoriza a si valor dado para um valor que se valoriza a si mesmo, que se multiplica. Produz lucro... Assim adquire, além do valor de uso que possui como dinheiro, um valor de uso adicional, a saber, o de funcionar como capital”.

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Em resumo: De D passa a D – M – D’.

“Nessa condição de capital possível, de meio para a produção de lucro, torna-se meio para a produção de lucro, torna-se mercadoria, mas uma mercadoria sui generis. Ou, o que se dá no mesmo, o capital enquanto capital se torna mercadoria”.

Em resumo: De D – M – D’ passa a D – D.16

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Observação

Não confundir dinheiro (último D’), capital monetário (segundo D), capital-mercadoria (M), capital funcionante (MP e FT) com mercadoria capital (primeiro D). mercadoria capital (primeiro D).

... ... ' 'MP

D D P M D DFT

− − −≺

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Diferença específica entre D –D e D – M – D’:

“A mudança de lugar de D [em D – D] de modo algum constituí um momento seja da metamorfose das mercadorias [D – M e M – D’], seja da reprodução do mercadorias [D – M e M – D’], seja da reprodução do capital [MP e FT ...P... M dentro de D – M – D’]”.

Ao invés disso, há uma transferência (empréstimo) do valor de uso do dinheiro como capital, ou seja, da mercadoria capital.

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Marx distingue circulação de mercadorias comuns (lugar em que ocorrem as metamorfoses das mercadorias) e circulação da mercadoria capital (lugar em que se transfere a posse do capital sob várias formas e em que não há metamorfoses). várias formas e em que não há metamorfoses).

A TE vulgar chama uma delas de mercado de bens e serviços e a outra de mercado financeiro, mas não apreende a diferença de fundo entre elas (se há ou não metamorfose).

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Tese: “O capital existe como capital em seu movimento real, não no processo de circulação, mas somente no processo de produção, no processo de exploração da força produção, no processo de exploração da força de trabalho”.

Ou seja, na circulação de mercadorias, o capital não aparece como capital, mas como dinheiro ou mercadoria.

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Antítese: “A coisa é diferente com o capital portador de juros e justamente essa diferença constitui seu caráter específico. O possuidor de dinheiro que quer valorizar seu dinheiro como capital portador de juros... lança-o na circulação”.juros... lança-o na circulação”.

Ou seja, na circulação financeira o capital aparece como capital. E o seu movimento é virtual – não real. Por que? Veja o que diz Marx:

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“O retorno do capital a seu ponto de partida é, em geral, o movimento característico do capital em seu ciclo global. Isso não é característico apenas do capital portador de juros. O que o distingue é a forma externa, dissociada do ciclo mediador do forma externa, dissociada do ciclo mediador do retorno. O capitalista prestamista entrega seu capital, transfere-o ao capitalista industrial, sem receber um equivalente. Sua entrega não constitui ato algum do processo real de circulação do capital, mas apenas encaminha esse ciclo, a ser realizado pelo capitalista industrial”.

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Agora, o seu seguinte trecho é crucial:

“O movimento característico do capital em geral, o retorno do dinheiro ao capitalista, o geral, o retorno do dinheiro ao capitalista, o retorno do capital ao seu ponto de partida, recebe no capital portador de juros uma figuratotalmente externa, separada do movimento real de que é forma”.

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Quando Marx fala em “figura totalmente externa”, ele se refere à aparência do movimento.

Por outro lado, quando fala em “movimento real de que é forma”, ele se refere à sua essência (produção que é forma”, ele se refere à sua essência (produção de mais valia e metamorfoses).

E essência e aparência do capital portador de juros estão em contradição: o capital portador de juros é autônomo na aparência e não- autônomo na essência.

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Uma tese minha

Ao invés de dizer que “a finança... conseguiu alojar a ‘exterioridade da produção’ no próprio cerne dos grupos industriais” para puncioná-lo como diz Chesnais, eu diria que puncioná-lo como diz Chesnais, eu diria que “o capital financeiro se internaliza na produção para melhor capturar a sua parte na mais-valia aí produzida”. Ou seja, é a essência que aparece, e não a aparência que se mantém.

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Em resumo

Chesnais tem uma grande contribuição à compreensão do capitalismo contemporâneo. Porém, ele não põe em evidência suficientemente o vínculo interno entre o capital financeiro e o capital industrial. Enfatiza apenas o vínculo externo, concebendo então o capital financeiro como rentista. concebendo então o capital financeiro como rentista. Na minha opinião, ao contrário, ele é apenas o sócio majoritário na empresa do capital industrial de melhor explorar a força de trabalho. A exacerbação desse capital depois da crise dos anos 70 não é uma excrescência, mas uma resposta racional às demandas irracionais do desenvolvimento do capital além dos seus limites.

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