cap. 14 - autoria e participação - juarez cirino dos santos

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1 Capítulo 14 AUTORIA E PARTICIPAÇÃO I. Introdução A relação do sujeito ativo com a conduta descrita no tipo legal pelo legislador pode existir sob as formas de autoria ou de participa- ção, como categorias gerais que abrangem todas as modalidades de contribuições pessoais para o fato criminoso. A definição do compor- tamento humano como autoria do ou como participação no tipo de injusto parece decorrer das próprias estruturas básicas de organização das atividades humanas na produção da existência social e, desse modo, constituiriam formas estruturais de ação individual ou coletiva, disciplinadas pelo legislador na lei penal. Assim, a autoria do tipo de injusto pode ser individual, se o autor realiza pessoalmente todas as características do tipo legal; pode ser mediata, se o autor realiza o tipo de injusto utilizando outra pessoa como instrumento; pode ser coletiva (ou coautoria), se vários autores realizam em comum o tipo de injusto 1 . Por outro lado, a participação no tipo de injusto realizado pelo(s) autor(es) pode ocorrer sob as formas de instigação, como de- terminação dolosa a fato doloso de outrem, e de cumplicidade, como ajuda dolosa a fato doloso de outrem 2 . Excepcionalmente, a autoria pode ser colateral, se vários autores realizam independentemente um do outro o mesmo fato típico. 1 Ver ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, § 25, n. 11; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, § 61, I, 3, p. 644. 2 ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, § 26, B, n. 57 s e C n.184 s.; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, § 61, I, p. 643-644.

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Direito Penal, Autoria e Participação, Juarez Cirino dos Santos

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1Captulo 14AUTORIA E PARTICIPAOI. IntroduoA relao do sujeito ativo com a conduta descrita no tipo legal pelo legislador pode existir sob as formas de autoria ou de participa-o,comocategoriasgeraisqueabrangemtodasasmodalidadesde contribuies pessoais para o fato criminoso. A defnio do compor-tamento humano como autoria do ou como participao no tipo de injusto parece decorrer das prprias estruturas bsicas de organizao dasatividadeshumanasnaproduodaexistnciasociale,desse modo, constituiriam formas estruturais de ao individual ou coletiva, disciplinadaspelolegisladornaleipenal.Assim,aautoriadotipo de injusto pode ser individual, se o autor realiza pessoalmente todas as caractersticas do tipo legal; pode ser mediata, se o autor realiza o tipo de injusto utilizando outra pessoa como instrumento; pode ser coletiva (ou coautoria), se vrios autores realizam em comum o tipo de injusto1. Por outro lado, a participao no tipo de injusto realizado pelo(s) autor(es) pode ocorrer sob as formas de instigao, como de-terminao dolosa a fato doloso de outrem, e de cumplicidade, como ajuda dolosa a fato doloso de outrem2. Excepcionalmente, a autoria pode ser colateral, se vrios autores realizam independentemente um do outro o mesmo fato tpico.1Ver ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 11; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, I, 3, p. 644.2ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 26, B, n. 57 s e C n.184 s.; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, I, p. 643-644.2Captulo 14II. Conceito de autorO esquema de compreenso da matria como autoria (indivi-dual, mediata e coletiva) e participao (instigao e cumplicidade) representa o produto histrico do desenvolvimento de sucessivas teorias sobre a experincia judicial de imputao pessoal de fatos criminosos: a teoria unitria de autor, fundada na contribuio causal para o fato; o conceito restritivo de autor, que distingue autor de partcipe com base na realizao da ao tpica; a teoria subjetiva de autor, que diferencia autor e partcipe pelo critrio do animus de autor ou de partcipe; f-nalmente, a moderna teoria do domnio do fato, que conjuga critrios objetivos e subjetivos para defnir autor e partcipe do tipo de injusto.1. Teoria unitria de autorA teoria unitria de autor a mais antiga concepo sobre a rela-o do sujeito com o fato: autor quem produz qualquer contribuio causal para a realizao do tipo de injusto3. Em sua frmula original, ateoriaunitriadeautornodistingueentreautorepartcipe:as diferenas objetivas e subjetivas de contribuio dos autores no so matria do tipo de injusto, mas problema da aplicao da pena, como medida da culpabilidade individual.A simplicidade da teoria unitria de autor explica sua sobrevivn-cia em algumas legislaes4 por exemplo, na ustria, na Dinamarca, na Itlia e na lei penal brasileira (art. 29, CP). A teoria unitria de 3ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 1-24O conceito unitrio de autor ainda prevalece na Itlia (art. 110, Cdigo Penal de 1935), na ustria ( 12, Cdigo Penal de 1975) e, pelo menos de modo formal, no Brasil (art. 29, Cdigo Penal de 1985), por exemplo. Ver, entre outros, BITENCOURT, Lies de Direito Penal, 1995, p. 92; FRAGOSO, Lies de Direito Penal, 1985, n. 241, p. 263; MESTIERI, Manual de Direito Penal I, 1999, p. 199-200.3Captulo 14 Autoria e Participaoautor trata todos como autores: se todas as contribuies causais para o resultado tpico so equivalentes, ento todos so autores do fato punvel;seasdiferenasdecontribuiosubjetivaeobjetivaexpri-mem a culpabilidade pessoal, ento so consideradas na pena e a sano penal aparece em ntima correlao com a personalidade do autor; enfm, se no existe diferena entre autores e partcipes, ento a aplicao do Direito Penal bastante simplifcada, no caso concreto.Mas as desvantagens da teoria unitria de autor parecem mais re-levantes: se as contribuies causais para o fato punvel so equivalentes, ento (a) todos os sujeitos envolvidos no tipo de injusto so nivelados, desaparecendo diferenas objetivas e subjetivas na produo do desva-lor de ao e do desvalor de resultado que defnem o tipo de injusto, e (b) sujeitos no qualifcados podem ser autores de delitos especiais (por exemplo, a qualidade de funcionrio pblico, no peculato) ou de delitos de mo prpria (o falso testemunho), o que representa um contrassenso. A natureza grosseira da teoria unitria de autor explica seu abandono progressivo, mesmo naquelas legislaes como a bra-sileira que, por inrcia ou comodismo, ainda a adotam5.2. Conceito restritivo de autorO conceito restritivo de autor a primeira tentativa cientfca de distinguir autor e partcipe, com base no critrio objetivo-formal da ao tpica: o autor realiza a ao tpica (a ao de matar, no homicdio; a ao de subtrair, no furto etc.); o partcipe realiza ao de instigao ou de ajuda extratpica para a realizao do tipo de injusto, punvel por extenso da punibilidade da ao tpica6.5ROXIN,Strafrecht,2003,v.II,25,n.4;JESCHECK/WEIGEND,Lehrbuchdes Strafrechts, 1996, 61, II, p. 645-646; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 506, p. 150.6ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 5; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 24, p. 670.4Captulo 14O mrito do conceito restritivo de autor reside em fundamen-tar a distino de autor e partcipe na produo do fato tpico um critrioformalrigorosoemtodasashiptesesdeautoriadiretado tipo de injusto , mas tem o defeito de no explicar as hipteses de autoria mediata (o herdeiro entrega bombom envenenado tia rica, atravsdoflhomenor,paraapressarorecebimentodaherana)e de coautoria (B distrai a ateno da tia rica para que A possa colocar veneno no caf dela)7.3. Teoria subjetiva de autorAteoriasubjetivadistingueautorepartcipepelocritrioda vontade:a)oautorrealiza,comvontadedeautor,acontribuio causal para o tipo de injusto: quer o fato como prprio ou age com animus auctoris mesmo sem realizar ao tpica (se A, com nimo de autor, garante a segurana de B, na ao de homicdio de C, so ambos coautores); b) o partcipe realiza, com vontade de partcipe, a contribuio causal para o tipo de injusto: quer o fato como alheio ou age com o chamado animus socii apesar de realizar ao tpica (homicdio realizado por incumbncia da mfa ou do servio secreto, por exemplo)8.7Nessesentido,acrtica,porexemplo,deJESCHECK/WEIGEND,Lehrbuchdes Strafrechts, 1996, 61, III, p. 648-649; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 24, p. 670. NoBrasil,veraexcelentemonografadeBATISTA,Concursodeagentes,2004,2 edio, n. 10, p. 31; tambm, ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 392, p. 668; ao contrrio, MIRABETE, Manual de Direito Penal, 2000, p. 231, adota o critrio objetivo formal do conceito restritivo de autor para todas as hipteses de autoria e participao.8ROXIN,Strafrecht,2003,v.II,25,n.18-26; JESCHECK/WEIGEND,Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, IV, p. 649-650; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 22-23, p. 669-670; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 512, p. 152. No Brasil, comparar BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 27, p. 67.5Captulo 14 Autoria e ParticipaoA crtica aponta dois problemas principais da teoria subjetiva de autor: critrios baseados em fenmenos psquicos (intelectuais ou emocionais), como vontade ou nimo de autor ou de partcipe, no so determinveis diretamente e, portanto, so imprecisos; em tipos que excluem autoria mediata (delitos de mo prpria, por exemplo), sujeitos no qualifcados no podem ser autores e sujeitos qualifcados no podem ser apenas partcipes, por mais que queiram o fato como prprio ou como alheio, respectivamente9. Apesar da crtica cientfca, a teoria subjetiva do autor parece indicar estados psquicos caracte-rsticos de autores e de partcipes e, por isso, ainda hoje dominante na jurisprudncia alem10.4. Teoria do domnio do fatoA teoria do domnio do fato (tambm chamada teoria objetiva materialouteoriaobjetivo-subjetiva),desenvolvidaessencialmente por ROXIN11 embora, anteriormente, WELZEL tivesse falado em domnio fnal do fato12 , parte da premissa dequeteoriassomente objetivasousomentesubjetivasnooferecemcritriossegurospara identifcar autor e partcipe do fato punvel. A teoria do domnio do fato hoje dominante na dogmtica penal integra o critrio obje-tivo do conceito restritivo de autor (que vincula o conceito de autor ao do tipo legal), com o critrio subjetivo da teoria subjetiva de autor (que incorpora a vontade como energia produtora do tipo de injusto), mas supera os limites de ambas as teorias porque considera a 9ROXIN,Strafrecht,2003,v.II,25,n.22s.; JESCHECK/WEIGEND,Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, n. IV, 3, p. 651; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 23, p. 670; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 513, p. 152. No Brasil, ver BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 28, p. 68.10ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 18-26; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, IV, 2, p. 650.11ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 13.12WELZEL, Studien zum System des Strafrechts, ZStW, 58 (1939), p. 491.6Captulo 14ao na sua estrutura subjetiva e objetiva, pressuposta no controle do tipo de injusto e necessria para mostrar o fato como obra do autor: subjetivamente, o projeto de realizao (a vontade criadora) do tipo de injusto; objetivamente, a (magnitude das contribuies para) rea-lizao do projeto de tipo de injusto13. A ideia bsica para distinguir autor e partcipe da teoria do domnio do fato a realizao da ao tpica: o autor domina a realizao do tipo de injusto, controlando a continuidade ou a paralisao da ao tpica; o partcipe no domina a realizao do tipo de injusto, no tem controle sobre a continuidade ou paralisao da ao tpica14.Mas, preciso esclarecer: segundo ROXIN, a teoria do domnio do fato capaz de diferenciar autores e partcipes somente nos delitos deautoriageral,quepodemserrealizadosporqualquerpessoaa maioria dosdelitos, chamadosHerrschaftsdelikte,emque oautor domina a realizao do tipo e o partcipe apenas infuencia o acon-tecimentotpico;nosdelitosdedever(oschamadosPfichtdelikte), somente o portador do dever jurdico (por exemlplo, o funcionrio pblico) pode ser autor os demais, podem ser partcipes; nos delitos de mo prpria (os chamados eigenhndigen Delikte), o autor realiza o tipo pelas prprias mos os demais somente podem ser partcipes15. Assim, naqueles delitos gerais, a teoria do domnio do fato parece adequada para defnir todas as formas de realizao ou de contribuio para realizao do tipo de injusto, compreendidas nas categorias de autoria e de participao, assim concebidas: 1) autoria, sob as modalidades (a) direta, como realizao pessoal do tipo de injusto, (b) mediata, como utilizao de outrem para reali-13VerJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,61,V,1,p.651-2. NoBrasil,verBATISTA,Concursodeagentes,2004,2edio,n.29-30,p.69-71; tambm, BITENCOURT, Lies de Direito Penal, 1995, p. 98-99; FRAGOSO, Lies de Direito Penal, 1985, n. 243, p. 263-264; MESTIERI, Manual de Direito Penal I, 1999, p. 202-203; ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 394, p. 670.14ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 10. 15ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 13-15. 7Captulo 14 Autoria e Participaozar o tipo de injusto, e (c) coletiva, como deciso comum e realizao comum do tipo de injusto; 2) participao, sob as formas (a) de instigao, como determi-nao dolosa a fato principal doloso de outrem, e (b) de cumplicidade, como ajuda dolosa a fato principal doloso de outrem.Aleipenalbrasileiraadota,ainda,ateoriaunitriadeautor, mas a introduo legal de critrios de distino entre autor e part-cipe transforma, na prtica judicial, o paradigma monstico da teoria unitria em paradigma diferenciador, admitindo o emprego de teorias modernas sobre autoria e participao, como, por exemplo, a teoria do domnio do fato, cujos postulados so inteiramente compatveis com a disciplina legal de autoria e participao no Cdigo Penal alis, a Exposio de Motivos reconhece que o legislador decidiu optar, na parte fnal do art. 29, e em seus dois pargrafos, por regras precisas que distinguem a autoria da participao, reclamada pela doutrina por causa de decises injustas16.III. Formas de autoria1. Autoria diretaA autoria direta defne a realizao pessoal do tipo de injusto pelo autor mediante atividade do prprio corpo , que detm, com ex-clusividade, o domnio do fato: realizao individual da ao de matar, de ofender a integridade ou a sade corporal de outrem etc. Os tipos legais descrevem, em geral, aes ou omisso de aes individuais e, 16Por isso, MESTIERI, Manual de Direito Penal I, 1999, p. 200, fala, com razo, em teoria unitria temperada.8Captulo 14na hiptese de realizao individual do tipo de injusto, a questo da autoria se reduz ao problema criminalstico de identifcao da pessoa fsica do autor, resolvida integralmente pelo conceito restritivo de autor, absorvido pela teoria do domnio do fato17.2. Autoria mediataAautoriamediatadefnearealizaodotipodeinjustocom o domnio da vontade de outrem, utilizado como instrumento, que realizaofatoemposiosubordinadaaocontroledoautor.Logo, noexisteautoriamediata:a)seoterceironoinstrumentonas mosdoautormediato,mas(co)autorplenamenteresponsvel;b) nostiposespeciaisprprios,queexigemautorescomqualifcao especial; c) nos tipos de mo prpria, que exigem realizao corporal da ao tpica pelo autor; d) nos tipos de imprudncia, por ausncia de vontade construtora do acontecimento e, portanto, por ausncia de domnio do fato18.17ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 38-44; JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, V, 1-2, p. 651-652. No Brasil, ver BATISTA, Concurso deagentes,2004,2edio,n.31,p.77,78;tambm,MESTIERI,Manualde DireitoPenalI,1999,p.202;ZAFFARONI/PIERANGELI,ManualdeDireito Penal brasileiro, 1997, n. 395, p. 670-671.18VerJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,62,I,2,p.664; tambm,JAKOBS,Strafrecht,1993,21/78,p.637;MAURACH/GSSEL/ZIPF, StrafrechtII,1989,48,I2,p.258.NoBrasil,compararBATISTA,Concursode agentes,2004,2edio,n.53-55,p.129-133;BITENCOURT,LiesdeDireito Penal, 1995, p. 109; FRAGOSO, Lies de Direito Penal, 1985, n. 246, p. 265-266; ZAFFARONI/PIERANGELI,ManualdeDireitoPenalbrasileiro,1997,n.395, p. 371-374.9Captulo 14 Autoria e Participao2.1. Hipteses de autoria mediataAs hipteses de autoria mediata podem ser estudadas conforme dois critrios: a) um critrio tradicional, que classifca a autoria mediata conforme o estgio do conceito de crime afetado pelo domnio do autor sobre o instrumento; b) um critrio moderno, que classifca a autoria mediata conforme a natureza do domno da vontade do instrumento. O critrio tradicional indica as seguintes hipteses de ao do ins-trumento: a) ao em erro de tipo: o mdico utiliza enfermeira (em erro de tipo) para aplicar injeo mortal no paciente; b) ao justifcada: induo de doente mental a atacar o instrumento, que mata o agressor em legtima defesa (objetivo do autor mediato)19; c) ao injusta de inimputvel, utilizado pelo autor mediato para praticar incndio20; d) ao exculpvel do instrumento, por obedincia hierrquica ou sob coaoirresistveldoautormediato21;d)aodoinstrumentoem erro de proibio inevitvel induzido ou mantido pelo autor mediato: policial comete crime em cumprimento de ordem de superior hierr-quico, sem possibilidade de conhecimento da ilegalidade da ordem22; f ) ao do instrumento sem a inteno especial exigida pelo tipo legal, por erro provocado pelo autor mediato: o autor mediato apropria-se de objeto alheio subtrado, erroneamente, pelo instrumento23.Ocritriomoderno,desenvolvidoporROXIN,fundadona natureza do domnio da vontade do instrumento pelo autor mediato, 19JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,62,II,3,p.667-668; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 537, p. 160; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 48, n. 68, 73, p. 274-5.20MAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,48,n.79,p.276;WELZEL,Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 193; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 537, p. 160.21KOERNERJR.,Obedinciahierrquica,2003,p.94-97;HAFT,Strafrecht,1994, p. 113.22MAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,48,n.81,p.277;LACKNER, Strafgesetzbuch, 25, n. 4.23DREHER-TRNDLE,Strafgesetzbuch,25,n.3;MAURACH/GSSEL/ZIPF, StrafrechtII,1989,48,n.59s.,p.272;WESSELS/BEULKE,Strafrecht,1998, n. 537, p. 160.10Captulo 14classifca todas as hipteses de autoria mediata em trs categorias, assim defnidas: a) domnio da vontade por fora de erro do instrumento, determinadorealizaodocrimesemconscinciadatipicidade (erro de tipo) ou da proibio do fato (erro de proibio); b) domnio davontadeporforadecoao(irresistvel)sobreoinstrumento, foradorealizaodotipo;c)domniodavontadeporforade aparelho de poder organizado, em que o instrumento (neste caso: autor imediato) determinado realizao do tipo no cumprimento de ordens superiores24. Este critrio parece prefervel, pelo menos por duas razes: primeiro, organiza todas as hipteses em trs categorias; segundo, redimensiona o conceito de obedincia devida, agora inserido no contexto de aparelhos de poder organizado, em que a fungibilida-de do executor garante a realizao do fato e fundamenta a autoria mediata do superior hierrquico autor da ordem importante para determinar responsabilidades por autoria mediata em crimes cometi-dos por agentes do Estado, em perodos de ditaduras militares ou de surtos temporrios de estados policiais, realizados no cumprimento de ordens superiores. Nas situaes de autoria mediata, a pena do autor mediato agravada e o instrumento , em regra, impunvel exceto na hiptese de aparelhos de poder organizado, em que o executor da ordem ilegal autor imediato do fato.1) No domnio da vontade por fora de erro do instrumento, o autor induz ou mantm em erro o instrumento: o mdico induz a enfermei-ra, como instrumento inconsciente (sem dolo), a aplicar no paciente injeo mortal previamente preparada (erro de tipo)25; b) o policial cometecrimeemcumprimentodeordemdesuperiorhierrquico, 24ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 45. 25 ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 61-65; WELZEL,DasDeutscheStrafrecht, 1969,15,p.102;KUHL,Strafrecht,1997,20,n.52,p.683; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 537, p. 160. Ao contrrio, MIRABETE, Manual deDireitoPenal,2000,p.233,defineasituaoexemplificadacomoautoria mediata por meio de pessoa que atua sem culpabilidade.11Captulo 14 Autoria e Participaosem possibilidade de conhecimento da ilegalidade da ordem (erro de proibio)26. 2) No domnio da vontade por fora de coao (irresistvel) sobre o instrumento, o autor domina a realizao do fato pelo domnio (da vontade) do instrumento, que atua sem liberdade: sob ameaa de morte o autor mediato obriga o instrumento a praticar falso testemunho; a intensidade da coao necessria para defnio como irresistvel depen-de das pessoas envolvidas, da natureza da ameaa e do fato coagido27;3) No domnio do fato por fora de aparelho de poder organizado, o autor mediato domina a realizao do fato pela fungibilidade do au-tor imediato mera engrenagem substituvel do aparelho de poder, cujarecusaimplicasubstituioautomtica,edecisesindividuais contrrias do autor imediato no excluem o fato , cuja punibilidade no exclui a punibilidade do autor mediato: a execuo das ordens de homicdio de Hitler e Eichmann era assegurada pela fungibilidade do executor; o domnio da Junta Militar argentina sobre o aparelho de poder do Estado tornava irrelevante a identidade do executor de cada um dos 30 mil homicdios de opositores polticos do regime28; igualmente, o comando dos generais-Presidentes sobre a organizao do poder estatal no perodo da ditadura militar brasileira garantia a execuo dos assassinatos e das torturas nos pores dos rgos de re-presso poltica dos anos de chumbo, pela fungibilidade do executor das ordens.Aautoriamediataporforadeaparelhodepoderorganizado nopodeserestendidasempresaseconmicas,segundoROXIN, sobdoisargumentos:a)ausnciadefungibilidadedoexecutor;b) inexistncia de desvinculao ao Direito29 ou seja, empresas econ-micas so organizaes vinculadas ao Direito. Mas admissvel, sob 26MAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,48,n.81,p.277;LACKNER, Strafgesetzbuch, 25, n. 4.27ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 47; WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 102.28ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 105-109.29ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 129-132. 12Captulo 14outros fundamentos, a responsabilidade de dirigentes de empresas por crimes permitidos, exigidos ou no impedidos (de modo contrrio ao dever) de empregados da empresa30. Em concluso, a autoria mediata por fora de aparelho de poder organizado est restrita aos crimes de abuso de poder do Estado alm de organizaes criminosas de tipo mafoso, cujo conceito continua controvertido ou indeterminvel , excluindo empresas econmicas e simples organizaes hierrquicas, segundo a literatura31.2.2. Problemas especiais2.2.1.Erro.Oerronaautoriamediatapodeocorrernapessoado autor mediato e na pessoa do instrumento. O erro do autor mediato sobre caractersticas que fazem do autor imediato um instrumento nas mos daquele exclui o domnio do fato e transforma o autor mediato eminstigador:oautorpensaincumbirdoentementaldeproduzir incndio, mas o autor imediato capaz de culpabilidade e, portanto, responsvel pelo tipo de injusto como autor direto. A hiptese inversa, de erro sobre a capacidade de culpabilidade de pistoleiro contratado pararealizarhomicdio,que,semconhecimentodocontratante, doente mental, constitui, objetivamente, autoria mediata, mas o des-conhecimento do domnio do fato pelo autor mediato mantm sua posio de instigador32. Por outro lado, o erro do instrumento sobre o objeto da ao representa aberratio ictus para o autor mediato porque o instrumento equiparado a simples mecanismo, como uma arma que erra o alvo: coagido sob ameaa de morte ao homicdio de Y, o instrumento mata Z, confundido com Y na escurido da noite33.30ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 105-109.31ROXIN, Strafrecht, 2003, v. II, 25, n. 139. 32Assim, JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 62, III, 1, p. 671; LACKNER, Strafgesetzbuch, 25; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 267.33JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,62,III,1,p.671-672; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 215; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 550, p. 165.13Captulo 14 Autoria e Participao2.2.2. Excesso. O excesso do instrumento, por iniciativa prpria ou por erro sobre as tarefas ou fnalidades respectivas, ao contrrio, no atribuvel ao autor mediato, por ausncia de controle sobre o excesso do instrumento34.2.2.3.Tentativa.Atentativanaautoriamediata,caracterizadapelo incio de realizao do tipo segundo o plano do fato, controvertida: a) para alguns autores, a tentativa j ocorre no instante da liberao do instrumento para realizar o tipo de injusto, sob controle do autor me-diato35 uma teoria que inclui, claramente, atos preparatrios; b) para outros, a tentativa somente ocorre no instante em que o instrumento inicia a realizao da ao tpica36 uma interpretao compatvel com o Direito Penal do tipo porque enquanto o instrumento, como mecanismo submetido ao poder do autor mediato, no cria perigo direto para o bem jurdico com o incio da realizao do tipo, no pode haver tentativa.2.2.4.Omissodeao.Aautoriamediataporomissodeao, tambm, controvertida: responsvel por instituio de tratamento psi-quitrico no impede agresso de doente mental sobre outro interno. Umsetordateoriaconsideraogaranteautormediatoporomisso de ao37; outro setor rejeita autoria mediata por omisso de ao e, na hiptese acima, considera o garante autor direto por omisso de ao38 uma soluo inteiramente conforme lgica da dogmtica da omisso de ao imprpria.34JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,62,III,3,p.672; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 48, n. 45, p. 268-269; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 545, p. 163.35JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 62, IV, 1, p. 672-673.36KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 97, p. 702; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 48, n. 115, p. 284.37MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 48, n. 95, p. 280.38JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 62, IV, 2, p. 673; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 471.14Captulo 143. Autoria coletiva (ou coautoria)A autoria coletiva (ou coautoria) defnida pelo domnio comum do tipo de injusto mediante diviso do trabalho entre os coautores: a) subjetivamente, deciso comum de realizar (com conscincia e von-tade) tipo de injusto determinado, que fundamenta a responsabilidade de cada coautor pelo fato tpico comum integral; b) objetivamente, realizaocomumdotipodeinjusto,mediantecontribuiespar-ciais no domnio comum do fato tpico39. A convergncia subjetiva e objetiva dos coautores exprime acordo de vontades, expresso ou tcito, para realizar tipo de injusto determinado.3.1. Deciso comum para o fatoA deciso comum para o fato signifca convergncia de conscin-cia e de vontade dos coautores para tipo de injusto determinado, que fundamenta a atribuio conjunta do fato integral: a deciso comum desencadeiaadistribuiodetarefasindividuaisnecessriaspro-duo do resultado comum por isso, nos crimes de imprudncia, do ponto de vista conceitual, a coautoria impossvel e, do ponto de vistaprtico,desnecessria,porquenahiptesedecomportamentos imprudentes simultneos cada leso do dever de cuidado ou do risco permitido fundamenta a atribuio do resultado como autoria cola-teral independente.39Assim,aopiniodominante:JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts, 1996,63,I,1,p.674-675;ROXIN,Tterschaftund Tatherrschaft,1994,p.277; KUHL,Strafrecht,1997,20,n.98-99,p.703;MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 5, p. 288; WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 107; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 526-8, p. 156-157. No Brasil, ver BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 37-38, p. 101-106; BITENCOURT, Lies deDireitoPenal,1995,p.99-100;MESTIERI,ManualdeDireitoPenalI,p.202-203; ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 396, p. 674-675.15Captulo 14 Autoria e ParticipaoO momento da deciso comum deve ocorrer antes da realizao dotipodeinjusto,mas,excepcionalmente,podeocorrerdurantea realizao at a terminao do tipo de injusto, com responsabilidade penal do coautor pelos fatos anteriores conhecidos, desde que a con-tribuio do coautor promova sua realizao posterior por exemplo, na extorso mediante sequestro , com exceo de tipos de injusto independentes j concludos40.3.2. Realizao comum do fatoArealizaocomumdofatoconstitudapelascontribuies objetivas de cada coautor para o acontecimento total, que explicam o domnio funcional do tipo de injusto. As contribuies objetivas para o fato comum podem consistir na realizao integral das caractersti-cas do tipo de injusto, na realizao parcial dessas caractersticas ou, mesmo, na ausncia de realizao de qualquer dessas caractersticas, desdequeaaoatpicarealizadapelocoautorsejanecessriapara realizar o tipo de injusto: por exemplo, na coautoria de roubo, um coautor espera no carro com motor ligado para a fuga, outro coautor desliga o alarme, um terceiro coautor garante a retirada, um quarto coautor controla as vtimas com a arma, um quinto coautor apanha o dinheiro e, ainda, um sexto coautor pode ter planejado, organizado ou dirigido a cooperao no fato comum41 cuja punio ser agravada, conforme o art. 62, I, CP. A contribuio objetiva do coautor deve ser necessria para promover o tipo de injusto comum, mas sufciente contribuir para desenvolver o plano criminoso, independentemente da presena fsica no local do crime, embora a entrega de armas ou instrumentos para o fato seja, por si s, insufciente para a coautoria42.40Ver JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 63, II, p. 678; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 126, p. 716.41Assim, JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 63, II, 1, p. 679; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 277; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 529, p. 157.42MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 34-35, p. 295.16Captulo 143.3. Distribuio da responsabilidade penalA diviso funcional do trabalho na coautoria, como em qualquer obra coletiva, implica contribuies diferenciadas para a obra comum, do ponto de vista subjetivo (planejamento) e objetivo (execuo) do tipo de injusto, o que coloca o problema da distribuio da responsa-bilidade penal entre os coautores. A distribuio da responsabilidade penal depende das contribuies individuais para o fato comum logo, a atribuio conjunta do fato integral, fundada na deciso comum e realizao comum de tipo de injusto determinado, no pode ser iguali-tria, mas diferenciada pela natureza das contribuies respectivas para o tipo de injusto, como objeto de valorao do juzo de culpabilidade.Art.29.Quem,dequalquermodo,concorreparao crimeincidenaspenasaestecominadas,namedida de sua culpabilidade.Esse princpio geral, aplicvel coautoria e participao, tem fexibilidade sufciente para abranger a diversidade de contribuies subjetivas e objetivas, bem como as hipteses de excesso de contribui-o ou de contribuies de menor importncia para o tipo de injusto comum, como se demonstra.3.3.1.Responsabilidadepeloexcesso.Emregra,oexcessoemre-lao ao tipo de injusto objeto da deciso comum s atribuvel ao seu autor; por exceo, pode ser atribudo aos demais coautores ou partcipes , na hiptese de previsibilidade do resultado mais grave, na forma exclusiva de aumento at metade da pena do crime menos grave, conforme a seguinte regra complementar, igualmente aplicvel coautoria e participao:Art. 29, 2. Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe- aplicada a pena deste; essa pena ser aumentada at metade, na hiptese de ter sido previsvel o resultado mais grave.17Captulo 14 Autoria e ParticipaoA aplicao da regra facilitada por uma distino entre excesso quantitativo e excesso qualitativo, essencial para defnir a previsibili-dade do resultado mais grave: a) o excesso quantitativo previsvel e, por isso, determina o aumento da pena do crime menos grave objeto do dolo comum, aos coautores e partcipes: em deciso comum de leso corporal, o homicdio da vtima constitui excesso quantitativo atribuvel exclusivamente ao autor do excesso, mas a previsibilidade desse excesso permite aumentar a pena da leso corporal imputvel aos demais; b) o excesso qualitativo imprevisvel e, portanto, no imputvel aos coautores ou partcipes: em deciso comum de furto em residncia, o estupro da vtima constitui excesso qualitativo imputvel exclusivamente ao autor do excesso43.Em tipos qualifcados pelo resultado, a atribuio do resultado mais grave pressupe, no mnimo, imprudncia do coautor44 (ou do partcipe) uma resultante do princpio da culpabilidade, que exclui qualquer responsabilidade penal objetiva.3.3.2. Tentativa na coautoria. A tentativa de tipos de injusto em coau-toria defnida por duas teorias: a) a teoria dominante (Gesamtlsung) prope uma soluo geral caracterizada pelo incio de realizao do programa tpico comum por qualquer dos coautores45; b) a teoria mi-noritria (Einzellsung) prope uma soluo individual caracterizada pelo incio de realizao da contribuio tpica de cada coautor respec-tivo46. Os argumentos dessas teorias parecem igualmente relevantes: se dois coautores projetam roubo em residncia alheia, a tentativa comea para ambos no momento em que qualquer deles soa a campainha da casa ou fora a abertura da porta (Gesamtlsung); mas se um coautor 43DREHER-TRNDLE,Strafgesetzbuch,25,n.5,p.82;MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 58, p. 299-300; WESSELS/BEULKE,Strafrecht, 1998, n. 531, p. 158-159.44JAKOBS, Strafrecht, 1993, 21/46, p. 619; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 61, p. 300; ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 176.45JAKOBS,Strafrecht,1993,21/61,p.629;JESCHECK/WEIGEND,Lehrbuchdes Strafrechts, 1996, 63, IV, 1, p. 681; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 123, p. 713-714; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 100, p. 308.46Assim, ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 199.18Captulo 14deve falsifcar um documento, que outro coautor dever colocar em circulaodepois,oinciodafalsifcaododocumentoconfgura tentativa apenas para o primeiro coautor, sendo mero ato preparatrio para o segundo (Einzellsung) o que parece mostrar a necessidade de subordinar a soluo do problema da tentativa natureza da ao descrita no tipo legal (ver Tentativa e consumao, adiante).3.3.3. Coautoria por omisso de ao. A possibilidade de coautoria por omisso de ao rejeitada por um setor minoritrio47, mas admitida pelo setor dominante da literatura48. Exemplos: omisso de ao co-mum do pai e da me em relao aos cuidados do flho recm-nascido; vrios dirigentes de empresa omitem a retirada do mercado de produto nocivo sade da populao. Segundo a teoria dos delitos de dever, na omisso de cuidados do pai e da me, cada garante seria autor inde-pendente por omisso de ao e no coautor por omisso de ao; entretanto, no caso dos dirigentes de empresa, atribuies estatutrias comuns poderiam caracterizar coautoria por omisso de ao49. Por outro lado, hipteses de atuao positiva de um coautor, enquanto o outro, de modo contrrio ao dever, omite a ao de impedir a atuao positiva do primeiro, no seriam casos de coautoria, mas de autoria e de participao, pela posio subordinada do omitente em relao ao autor (o vigia no impede o furto no estabelecimento vigiado)50.3.3.4. Coautoria em tipos especiais prprios. Em tipos que exigem qualidades especiais do autor, a atribuio tpica pressupe coautor qualifcado: no existe coautoria ou participao em delitos de mo prpria sem realizao pessoal do tipo de injusto (falso testemunho); noexistecoautoriaouparticipaoemdelitosespeciaisprprios sem coautores com as qualidades necessrias (peculato, concusso etc.); no existe coautoria ou participao em crimes patrimoniais 47WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 206.48JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 63, IV 1; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 86 s., p. 306; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 469.49Nesse sentido, ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 206.50Ver JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 63, IV, 2, p. 682.19Captulo 14 Autoria e Participaosem a inteno especial de apropriao etc. (furto, roubo etc.)51 uma consequncia do princpio da tipicidade que fundamenta a teoria do autor.IV. Participao como contribuio acessria dolosa em fato principal doloso de outrem,A participao confgura contribuio acessria dolosa em fato principal doloso de outrem e, assim, depende da existncia do fato prin-cipal, como a parte depende do todo. A dependncia da participao em face do tipo de injusto signifca o seguinte: primeiro, a participao tem por objeto o tipo de injusto porque no tem contedo de injusto prprio e, por isso, assume o contedo de injusto do fato principal; segundo,aparticipaoacessriadotipodeinjusto,queexiste como fato principal por essa razo, a acessoriedade da participao limitada ao tipo de injusto no se estende culpabilidade do fato principal, que no objeto da participao. A dependncia da partici-pao limitada ao tipo de injusto do fato principal constitui a chamada acessoriedade limitada da participao (a antiga acessoriedade extrema, hoje abandonada, exigia, tambm, culpabilidade do fato principal)52.51DREHER-TRNDLE, Strafgesetzbuch, 25, n. 6; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 530, p. 158.52Nessesentido,JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,63,VII, 1-2, p. 655-656; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 53, n. 854-859, p.380;WESSELS/BEULKE,Strafrecht,1998,n.551-554,p.165-166.NoBrasil, BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 67, p. 161-165; BITENCOURT, LiesdeDireitoPenal,1995,p.104;FRAGOSO,LiesdeDireitoPenal,1985,n. 247, p. 266-267; MESTIERI, Manual de Direito Penal I, 1999, p. 203; ZAFFARONI/PIERANGELI,ManualdeDireitoPenalbrasileiro,1997,n.403,p.685-686; curiosamente, MIRABETE, Manual de Direito Penal, 2000, p. 232-233, no menciona a natureza acessria da participao; JESUS, Direito Penal I, 1999, p. 413-414, alm da acessoriedade limitada e extrema, distingue, ainda, uma acessoriedade mnima e uma hiperacessoriedade, sem signifcao dogmtica no moderno Direito Penal.20Captulo 14A defnio da participao como contribuio acessria de tipo de injusto doloso exclui a possibilidade de participao em crimes de imprudncia: na imprudncia inconsciente no h previso do resultado nem possibilidade de domnio do fato para distinguir entre autoria e participao; na imprudncia consciente existe previso do resultado e pode ocorrer domnio do fato, mas a punio no se fundamenta na distino entre autor e partcipe, e sim na leso individual do dever de cuidado ou do risco permitido53. A hiptese da morte de pedestre por viga lanada na rua pela ao conjunta de dois operrios de construo constitui autoria colateral independente de homicdio imprudente54: os operrios cooperam na ao de lanar a viga, mas a leso do dever decuidadooudoriscopermitidorealizadaindividualmentepor cada operrio55.A dependncia da participao, expressa na natureza acessria da participao em face do tipo de injusto, explica a ausncia de dom-nio do fato do partcipe, com duas consequncias importantes: a) o partcipe no pode cometer excesso em relao ao fato objeto do dolo comum porque excesso pressupe domnio comum do fato e, portan-to, coautoria; b) a participao delimita a rea das contribuies de menor importncia, necessariamente incompatveis com a existncia dodomniodofatoemboranemtodaparticipaosejademenor importncia e, s vezes, a participao seja to importante quanto a autoria, como ocorre em algumas situaes de instigao (homicdio mediante pagamento, por exemplo).Art. 29, 1. Se a participao for de menor importn-cia, a pena pode ser diminuda de um sexto a um tero.53VerJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,63,VI,p.654-655; WELZEL,DasDeutscheStrafrecht,1969,p.99;MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 47, n. 102, p. 251.54Assim, atualmente JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 61, VI, p. 655.55MIRABETE,ManualdeDireitoPenal,2000,p.235,defneessahiptesecomo coautoriadecrimeculposo,apesardeexigirparaacoautoria(p.229)umliame psicolgicoentreosvriosautores,ouseja,aconscinciadequecooperamnumaao comum portanto, um conceito aplicvel exclusivamente aos crimes dolosos.21Captulo 14 Autoria e ParticipaoA natureza dependente da participao condiciona sua punibili-dade existncia de tipo de injusto doloso, consumado ou tentado:Art.31.Oajuste,adeterminaoouinstigaoeo auxlio, salvo disposio expressa em contrrio, no so punveis, se o crime no chega, pelo menos, a ser tentado.Enfm,aparticipaopodecontribuirparaotipodeinjusto doloso de dois modos: mediante provocao do dolo do tipo de injusto no autor; mediante apoio material para realizao do tipo de injusto pelo autor56. Em suma, a participao pode existir sob as formas de instigao para e de cumplicidade em tipo de injusto doloso.1. InstigaoAinstigaosignifcadeterminaodolosadoautorarealizar tipodeinjustodoloso:oinstigadorprovocaadecisodofatome-diante infuncia psquica sobre o autor, mas no tem controle sobre a realizao do fato, reservado exclusivamente ao autor57. Os meios deinfunciadoinstigadornopsiquismodoautorsoinmeros: persuaso,pedidos,presentes,ameaas,promessasderecompensa, pagamentos, at simples expresses de desejo podem constituir insti-gao (o pagamento e a promessa de recompensa agravam a pena do instigador e do autor, na forma do art. 62, IV, CP). A infuncia sobre o psiquismo do autor para determinar deciso de realizar um tipo de 56Assim, JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, I, 2, p. 685; KUHL, Strafrecht, 1997, 20, n. 132, p. 718-719; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 552, p. 165.57WESSELS/BEULKE,Strafrecht,1998,n.567-570,p.169-170.NoBrasil,ver BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 76, p. 181-183; BITENCOURT, Lies de Direito Penal, 1995, p. 106; FRAGOSO, Lies de Direito Penal, 1985, n. 248, p. 267-268; MESTIERI, Manual de Direito Penal I, 1999, p. 203-204; ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 412, p. 695.22Captulo 14injusto parece pressupor ao, excluindo a hiptese de instigao por omisso de ao58.O dolo do instigador caracteriza-se por um duplo objeto: ime-diatamente,temporobjetocriaradecisoderealizarumtipode injusto doloso no psiquismo do autor; mediatamente, tem por objeto a realizao do tipo de injusto doloso pelo autor59.1.1. O dolo do instigador e a deciso do autorSobre a relao entre dolo do instigador e deciso do fato no psiquismo do autor, preciso esclarecer alguns pontos:a) o objetivo do instigador a consumao do tipo de injusto e no, apenas, tentativa: se a instigao realizada por agente provoca-dor, que quer a tentativa, mas exclui a consumao do fato principal ouqueraprpriaconsumaoformal,masexcluialesomaterial do bem jurdico, ento a instigao impunvel assim como o fato principal por absoluta impossibilidade de leso do bem jurdico: no fagrante preparado, a hiptese de permannciada drogafornecida pelo trafcante em poder do consumidor est excluda60;b) o dolo do instigador, direto ou eventual, deve serconcreto, no sentido de ter por objeto autor determinado e fato determinado: um autor indeterminado para realizar o tipo de injusto ou um tipo de injusto indeterminado para ser realizado pelo autor (com exceo de 58ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 484.59VerJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,II,2b,p.687; tambm, MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 51, n. 19, p. 346.60Assim,porexemplo,JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996, 64, II, 2b, p. 688; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 51, n. 35, p.349-350.NoBrasil,afavordapuniodoagenteprovocador,nahiptesede crime impossvel, sob o argumento de identidade entre o dolo do delito e o dolo da tentativa, ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 414, p. 697.23Captulo 14 Autoria e Participaodetalhes de tempo, lugar ou outros dependentes do desenvolvimento posterior do fato) no so compatveis com a instigao61;c) a ao de instigao deve determinar a deciso do autor para o fato: autores inclinados para o fato podem ainda ser instigados, mas autores j decididos no podem mais ser instigados, admitindo-se, en-tretanto, cumplicidade psquica, como reforo de deciso j existente62.1.2. O dolo do instigador e o fato do autorSobrearelaoentredolodoinstigadorefatorealizadopelo autor, preciso, tambm, esclarecer alguns pontos:a) a punibilidade da instigao tambm pressupe tipo de injusto consumado ou tentado (art. 31, CP);b) fundamento de punibilidade da instigao a correspondn-cia entre dolo do instigador e tipo de injusto consumado ou tentado, exceto detalhes de tempo, lugar, meio ou modo de execuo, neces-sariamente deixados por conta do autor;c) o instigador no pode ser punido pelo excesso do autor, con-forme a regra do art. 29, 2o: no excesso qualitativo, o fato principal diferente atribudo exclusivamente aoautor (instigado ao furto, o autorrealizaestuprocontraaproprietriaquedormiasozinhana residncia); no excesso quantitativo, o fato principal maior atribu-do ao autor, e o fato menor da instigao atribudo ao instigador63 (instigado ao furto, o autor realiza roubo): a exceo da regra re-presentada pela hiptese de previsibilidade do resultado mais grave, 61CompararJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,II,2b, p. 688; ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 46.62JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, II, 2c, p. 689.63VerJESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,II,3e4,p. 689;MAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,51,n.44-58,p.351-354; ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 89.24Captulo 14que determina aumento at metade da pena do crime menos grave (art. 29, 2o, segunda parte);d) nos delitos qualifcados pelo resultado, a atribuio do resul-tadomaisgraveaoinstigadorpressupe,nomnimo,imprudncia deste, fundada no critrio de autoria colateral64.1.3. Erro de tipo e erro de tipo permissivoA exigncia de dolo condiciona a possibilidade de erro de tipo e de erro de tipo permissivo na pessoa do instigador, assim resolvido na literatura:a) o erro de tipo do instigador exclui o dolo, como qualquer erro de tipo (acreditando na palavra do parceiro de caa que, no crepsculo da tarde, confundira um corpo escuro na foresta com um javali, o caador desfere certeiro tiro no proco da vila, que sentara na relva para descansar, no seu passeio vespertino);b) o erro de tipo permissivo do instigador tem por objeto a si-tuao justifcante ou os pressupostos objetivos de causa de justif-cao para o autor: resolve-se pelas mesmas regras do erro de tipo, como qualquer erro de tipo permissivo, segundo a teoria limitadas da culpabilidade65;c) o erro de execuo do autor sobre o objeto da ao instigada (A mata B, confundido com C, na escurido) resolve-se pelas regras da aberratio ictus, para o autor e para o instigador: segundo a teoria da concretizao, dominante na literatura, tentativa de homicdio contra C, em concurso com homicdio imprudente de B66; segundo a teoria 64ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 99; WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 122.65SCHNCKE/SCHRDER/CRAMER, 26, n. 15; ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 66.66JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, II, 4, p. 691; WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 75; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 579, 25Captulo 14 Autoria e Participaoda equivalncia genrica do resultado tpico, adotada na lei brasileira, homicdio consumado (art. 20, 3, CP).2. CumplicidadeA cumplicidade signifca ajuda dolosa do cmplice para tipo de injusto doloso do autor: o cmplice presta ajuda material para realiza-o de fato principal doloso e, assim como o instigador, tambm no controla a realizao do fato punvel, poder exercido exclusivamente pelo autor67.2.1. Natureza da ajuda materiala) A ajuda material dolosa do cmplice pode ser fsica ou tcnica: toda e qualquer contribuio para promoo ou realizao de tipo de injusto doloso constitui cumplicidade, como entregar armas ou ferra-mentas, garantir a segurana do autor, mapear o local etc. Contudo, a forma intelectual ou psquica de ajuda, admitida na literatura como reforo do dolo do autor (o autor no utiliza a ferramenta entregue pelo cmplice porque a porta da casa j estava aberta, mas a oferta do instrumento fortaleceria a deciso daquele)68 parece exagerada: afnal, p.173;KUHL,Strafrecht,1997,20,n.209,p.748;ROXIN,Tterschaftund Tatherrschaft, 1994, p. 288.67Assim,JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,III,1, p. 691. No Brasil, ver BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 80, p. 186; BITENCOURT, Lies de Direito Penal, 1995, p. 106-107; FRAGOSO, Lies de DireitoPenal,1985,n.249,p.268-269;MESTIERI,ManualdeDireitoPenalI, p.203-204;ZAFFARONI/PIERANGELI,ManualdeDireitoPenalbrasileiro, 1997, n. 416, p. 698.68JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, III, 1, p. 691.26Captulo 14o cmplice no contribuiu para o fato e o reforo do dolo constitui mera presuno69.b) O momento da ajuda material amplo: pode ocorrer desde apreparaodofato(entregadechavedacasa,paraofurto)ata consumao material (obteno da vantagem, na extorso mediante sequestro, por exemplo)70.c) A possibilidade de ajuda dolosa por omisso de ao con-trovertida:umsetordaliteraturarejeitacumplicidadeporomisso de ao71; outro setor admite cumplicidade por omisso de ao se o cmplice garantidor do bem jurdico72; uma terceira posio parece melhor porque considera o garante autor por omisso de ao impr-priaenosimplesmentecmplice(funcionrioresponsvelpelo trabalho externo de presos tolera a realizao de furto; proprietrio de bar permite leso corporal de fregus dentro do estabelecimento)73.d) A ao de ajuda material deve promover o fato principal, no sentido de representar contribuio causal para o resultado74 ou de ele-var o risco de produo do resultado75 (venda de chave de parafuso por lojista, sabendo de seu emprego para cometer determinado furto etc.).2.2. O dolo do cmplice e o fato principalAssim como o dolo do instigador, o dolo do cmplice caracteriza--se por um duplo objeto: o objeto imediato a prpria ao de ajuda aoautor,oobjetomediatoarealizaodofatoprincipaldoloso 69Posio aqui modifcada: nas edies anteriores, conforme a literatura dominante.70Assim, DREHER/TRNDLE, Strafgesetzbuch, 27, n. 3; ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 291; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 583, p. 175.71 a posio de WELZEL, Das Deutsche Strafrecht, 1969, p. 222.72Por exemplo, DREHER/TRNDLE, Strafgesetzbuch, 27, n. 7.73ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 476.74Ver WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 582, p. 174.75Assim, ROXIN, LK(Roxin), 1992, 25, n. 5 e 17.27Captulo 14 Autoria e Participaopelo autor76. Nesse sentido, tem por objetivo a consumao do fato principal no, apenas, a tentativa e precisa ser concreto, referindo--se a autor determinado e fato determinado (exceto detalhes, tambm deixados por conta do autor).Igualmente, a punibilidade do cmplice depende de fato princi-pal consumado ou tentado (art. 31, CP), pressupe correspondncia entre o contedo do dolo do cmplice e o fato principal consumado ou tentado do autor, e no abrange excessos qualitativos (fato princi-pal diferente) ou quantitativos (fato principal mais grave) do autor77, valendo tambm para o cmplice a regra do art. 29, 2, CP.O erro de tipo e o erro de tipo permissivo do cmplice so resolvi-dos como no caso do instigador: o erro de tipo exclui o dolo; o erro de tipo permissivo (incidente sobre pressupostos objetivos de justifcao para o autor) exclui o dolo78.3. Concorrncia de formas de participao possvel a concorrncia de vrias formas de participao, formando cadeias de instigao ou de cumplicidade, compreendidas no conceito de cumplicidade mediata no tipo de injusto. A cadeia de instigao formada pela instigao instigao ao tipo de injusto79; a cadeia de cumplicidade formada pela instigao ajuda ao tipo de injusto, pela ajuda instigao ao tipo de injusto e pela ajuda ajuda ao tipo de injusto80.76MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht, 1989, 52, n. 31-32, p. 361.77Ver,portodos,JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,III, 2-4, p. 695-696.78JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, III, 2d, p. 695.79JESCHECK/WEIGEND,LehrbuchdesStrafrechts,1996,64,II,2a,p.687; MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht, 1989, 51, n. 13, p. 345.80SCHNCKE/SCHRDER/CRAMER, 27, n. 18. No Brasil, BATISTA, Concurso de agentes, 2004, 2 edio, n. 73, p. 187.28Captulo 14A reunio das posies de autor e de partcipe do tipo de injusto na mesma pessoa frequente: o autor do fato principal instiga terceiro coautoria ou participao no tipo de injusto e, nesse caso, a forma superior absorve a forma inferior: instigao absorve cumplicidade, autoria absorve instigao ou cumplicidade81.4. Participao necessriaA participao necessria aparece em tipos legais cuja realizao exige o concurso de vrias pessoas, como o homicdio piedoso, a usura, o favorecimento pessoal, a receptao etc. Os tipos legais nos quais a participao necessria so agrupados em tipos de convergncia e ti-pos de encontro: a) nos tipos de convergncia a atividade dos partcipes necessrios alinha-se do mesmo lado e orienta-se para o mesmo fm (o motim de presos, o furto em concurso de pessoas etc.): todos os part-cipes necessrios so coautores; b) nos tipos de encontro a atividade dos partcipes necessrios desenvolve-se a partir de posies diferentes, mas orientadaparaomesmofm(ofavorecimentopessoal,orufanismo etc.): em todas as hipteses, a punio incide sobre o autor, nunca sobre o partcipe necessrio, ou porque o tipo protege o partcipe necessrio (rufanismo) ou porque o partcipe necessrio se encontra em posio de motivao compreensvel (favorecimento pessoal)82.81JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 64, IV, 1-2, p. 697.82VerMAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,50,n.7s.,p.315-318; ROXIN,LK(Roxin),1992,25,n.38;WELZEL,DasDeutscheStrafrecht,1969, p. 507; WESSELS/BEULKE, Strafrecht, 1998, n. 587, p. 176.29Captulo 14 Autoria e Participao5. Tentativa de participaoNa legislao penal brasileira, a tentativa de participao no punvel, pelo seguinte fundamento: o contedo de injusto da participa-o no prprio, mas depende do tipo de injusto realizado pelo autor, que o partcipe deve, concretamente, provocar ou ajudar contudo, na tentativa de participao no existe nenhuma promoo do fato principal, nem por instigao, nem por cumplicidade83.V. Comunicabilidade das circunstncias ou condies pessoaisA distribuio da responsabilidade penal na coautoria e na parti-cipao depende, segundo o princpio da culpabilidade (art. 29, CP), dascontribuiessubjetivaseobjetivasdecadacoautorparaaobra comum ou de cada partcipe para o tipo de injusto do(s) autor(es)84, mas a individualizao da responsabilidade penal admite diferenciaes complementares determinadas pela comunicabilidade de circunstn-cias ou condies de carter pessoal.Art.30.Nosecomunicamascircunstnciaseas condies de carter pessoal, salvo quando elementares do crime.As chamadas circunstncias ou condies de carter pessoal so caractersticas pessoais especiais, cuja presena pode agravar a pena (mo-tivo ftil, motivo torpe etc.), reduzir a pena (primariedade, motivo de 83Assim,BATISTA,Concursodeagentes,2004,2edio,n.71,p.175;tambm, FRAGOSO, Lies de Direito Penal, 1985, n. 247, p. 266.84MAURACH/GSSEL/ZIPF,StrafrechtII,1989,49,n.112,p.310;ROXIN, Tterschaft und Tatherrschaft, 1994, p. 288.30Captulo 14relevante valor social ou moral) ou excluir a pena (desistncia volun-tria, arrependimento efcaz etc.) no coautor ou partcipe respectivo85.Acomunicabilidadedecircunstnciasoucondiespessoaisa outros coautores ou partcipes regida pela seguinte regra: caracters-ticas pessoais agravantes, redutoras ou excludentes de pena somente seaplicamaocoautoroupartciperespectivoe,portanto,nose comunicam aos demais86 de outro modo, a responsabilidade penal no seria regida pelo princpio da culpabilidade; a exceo dessa regra representada por caractersticas pessoais que so, tambm, circuns-tnciasoucondieselementaresdotipodecrime(...salvoquando elementares do crime), as quais se comunicam a todos os coautores ou partcipes (por exemplo, o estado puerperal no infanticdio)87 .85JESCHECK/WEIGEND, Lehrbuch des Strafrechts, 1996, 63, VII, 4, p. 657-659.86MAURACH/GSSEL/ZIPF, Strafrecht II, 1989, 49, n. 112, p. 310.87BITENCOURT,LiesdeDireitoPenal,1995,p.115-116;FRAGOSO,Liesde DireitoPenal,1985,n.252,p.272-273;MESTIERI,ManualdeDireitoPenalI, 1999, p. 204; ZAFFARONI/PIERANGELI, Manual de Direito Penal brasileiro, 1997, n. 411, p. 694-695.