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Camila Cristina Rodrigues
ANÁLISE DO COMPORTAMENTO PROLIFERATIVO DE UMA LINHAGEM DE
Saccharomyces cerevisiae POR CITOMETRIA DE FLUXO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ciências Farmacêuticas da
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e
Mucuri, como requisito para obtenção do título de
Mestre em Ciências Farmacêuticas.
Orientador: Prof. Dr. Gustavo Eustáquio Brito
Alvim de Melo
Coorientador: Prof. Dr. Rinaldo Duarte
Diamantina
2017
Dedico este trabalho ao meu filho Davi,
fonte de minha inspiração e luta constante!
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por essa benção, por me ajudar nessa caminhada,
pois, sem Ele nada é possível, ele me fez acreditar, persistir, renovando sempre minha
esperança e fé.
Aos meus pais Teresa e Rodrigues, que abriram a porta do meu futuro com o estudo
sendo sempre amigos, protetores, companheiros e conselheiros. Nas horas mais difíceis, eu
sabia com quem contar, sendo sempre meu porto seguro, não medindo esforços em me ajudar
e em ajudar ao meu filho. Amo vocês!
A minha irmã Ana, sempre sendo minha amiga e companheira para todos os
momentos, e pode ter certeza que sempre estaremos juntas uma apoiando a outra. Amo você
DINDA do nosso Davi. Agradeço também minha prima-irmã Maria Eduarda pela amizade e
por nunca deixar eu desistir!
A Deyverson, meu marido, por seu amor e cumplicidade. Por compreender minha
ausência e por me incentivar a seguir em frente, me inspirando e estando sempre ao meu lado.
Eu te amo!
Ao meu filho Davi, que com ele aprendi o precioso dom da vida. Por ter aprendido a
superar minha ausência, sendo sempre carinhoso e preocupado comigo. Você será sempre
meu bebê, minha vida!!!
Agradeço todos os meus familiares, tios, tias, avós, primos e afilhada pelo incentivo e
suporte que me proporcionaram e pelas alegrias nos momentos de lazer.
A família do meu marido, Deliane, Débora, Desiane, Zelita e Geraldo pela amizade e
apoio. Obrigada por amar meu filho!
Aos companheiros do CIPq, Bruna, professora Etel, Vinícius, Rosa, Karine, Mariana
Adriana, Ulisses, professor Danilo, Gabriel, Irma, Carol Ansani, que durante esta caminhada
transformamos cúmplices um dos outros.
Aos amigos do Labimuno Gustavo, Wagner, Lucas, Mica, Valéria, Bethânia, Agnes,
Marcelo, Angélica, Willian, Gilda e Josué, pela descoberta, desafio, conquistas, entusiasmo,
forças e alegrias. Pela amizade ou pelo simples convívio, me apontaram o caminho. Obrigada
a todos por tornar inesquecíveis meus momentos no laboratório!
A Carol Ferreira e Tiago, pela simplicidade, companheirismo, e por estar sempre
dispostos a me ajudar.
Agradeço a todos os meus colegas de pós-graduação, em especial aos meus amigos de
turma de Mestrado, Valério, Jorge, Thaisa, Dayana, Laura, Eliziana e Carolle por toda a força
nesta luta que travamos juntos!
Agradeço a todos os professores que me ajudaram a percorrer este caminho
transmitindo seus conhecimentos e auxiliando em minha formação.
Em especial um muito obrigado a Agnes, Valéria, Mica e Bethânia, pessoas e
profissionais excepcionais.
Ao meu co-orientador Rinaldo pelo tempo dedicado e por estar sempre disposto a me
ajudar.
Ao professor Doutor Gustavo Eustáquio Brito pela oportunidade, amizade, ensino,
paciência e dedicação, você é meu exemplo de profissional e pessoa.
Agradeço aos órgãos de fomento, cuja contribuição foi fundamental para a realização
do meu trabalho. Ao Centro Integrado de Pós-Graduação e Pesquisa em Saúde (CIPq) da
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, em Diamantina, MG, por
fornecer equipamentos e suporte técnico para os experimentos.
Agradeço à equipe de funcionários do Campus JK e do CIPq pelo empenho e pela
disposição em ajudar.
Enfim, agradeço a todos que tornaram possível a realização desse trabalho, fico
lisonjeada de ser membro de um grupo de pesquisa excepcional que me aceitaram,
compartilharam conhecimentos e fizeram parte de grandes momentos da minha vida.
“A persistência é o menor caminho do
êxito.”
(Charles Chaplin)
RESUMO
As leveduras do gênero Saccharomyces, em especial as da espécie Saccharomyces cerevisiae,
são microrganismos eucarióticos unicelulares do Reino Fungi. Possuem um papel importante
em processos de fermentação, como na utilização para a produção de bebidas alcoólicas e
pães, sendo considerados micro-organismos seguros para alimentos. O monitoramento das
matérias-primas e da proliferação de leveduras é uma necessidade para o sucesso do processo
fermentativo. Nesse sentido, a citometria de fluxo, que é um método rápido e preciso, pode se
apresentar como ferramenta promissora no campo da fermentação e no controle de
bioprocessos. Assim, o objetivo desse trabalho foi realizar a análise do crescimento e
heterogeneidade populacional de uma linhagem comercial de Saccharomyces cerevisiae pela
técnica de citometria de fluxo. Para isso foi utilizada a marcação intracelular com o
fluorocromo éster succinimidílico de diacetato de carboxifluoresceína. A suspensão de
levedura incorporada com o fluorocromo foi transferida para tubos de ensaio contendo 10 mL
de YEPD e incubada a 25º C e foram analisadas, após diferentes tempos, por citometria de
fluxo, microscopia confocal e espectrofotometria. Os resultados demonstraram que foi
possível observar, por citometria de fluxo, alterações morfológicas da linhagem
Saccharomyces cerevisiae ao longo do tempo, bem como quantificar o decaimento da
fluorescência do corante CFSE após sucessivos processos mitóticos. Por essa técnica também
foi possível mensurar o número de células da linhagem estudada ao longo do processo de
multiplicação comparando-se às outras metodologias comumente utilizadas para este fim.
Conclui-se com esse estudo que a citometria de fluxo mostrou-se como uma ferramenta
confiável e sensível para a análise do crescimento e heterogeneidade populacional de
Saccharomyces cerevisiae.
Palavras-chave: processos fermentativos, proliferação, Saccharomyces cerevisiae, citometria
de fluxo.
1
ABSTRACT
Yeasts of the genus Saccharomyces, especially those of the species Saccharomyces
cerevisiae, are unicellular eukaryotic microorganisms of the Fungi Kingdom. They have an
important role in fermentation processes, such as in the use for the production of alcoholic
beverages and breads, being considered microorganisms safe for food. The monitoring of raw
materials and the proliferation of yeasts is a necessity for the success of the fermentation
process. In this sense, flow cytometry, which is a fast and precise method, can be presented as
a promising tool in the field of fermentation and in the control of bioprocesses. Thus, the
objective of this work was to analyze the growth and population heterogeneity of a
commercial strain of Saccharomyces cerevisiae by the flow cytometry technique. For this,
intracellular labeling was used with the fluorochrome succinimidyl ester of
carboxyfluorescein diacetate. The yeast suspension incorporated with the fluorochrome was
transferred into test tubes containing 10 ml of YEPD and incubated at 25 ° C and analyzed
after different times by flow cytometry, confocal microscopy and spectrophotometry. The
results demonstrated that it was possible to observe, by flow cytometry, morphological
alterations of the Saccharomyces cerevisiae lineage over time, as well as to quantify the decay
of CFSE dye fluorescence after successive mitotic processes. By this technique it was also
possible to measure the number of cells of the lineage studied throughout the multiplication
process, comparing to the other methodologies commonly used for this purpose. It is
concluded with this study that flow cytometry proved to be a reliable and sensitive tool for the
analysis of the growth and population heterogeneity of Saccharomyces cerevisiae.
Key words: fermentative processes, proliferation, Saccharomyces cerevisiae, flow cytometry.
1
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Células de Saccharomyces cerevisiae em reprodução por brotamento.. .................. 24
Figura 2: Estrutura simplificada de uma levedura com broto. ................................................. 25
Figura 3: Configuração de um citômetro de fluxo ................................................................... 29
Figura 4: Esquema do espalhamento da luz técnica de citometria de fluxo ............................. 30
Figura 5: Coloração fluorescente de CFSE em esplenócitos de ratos. ..................................... 31
Figura 6: Análise do crescimento inicial do Aspergillus nidulans em resposta a fonte de
carbono por citometria de fluxo................................................................................................ 33
Figura 7: Estratégia de análise do crescimento celular por citomeria de fluxo ........................ 39
Figura 8: Estratégia de análise de proliferação celular pela diluição do CFSE. ....................... 40
Figura 9: Câmara de Neubauer ................................................................................................. 42
Figura 10: Análise da linhagem de Saccharomyces cerevisiae por microscopia confocal
(aumento de 400x). ................................................................................................................... 46
Figura 11: Análise da linhagem de Saccharomyces cerevisiae por microscopia confocal
(aumento de 400x) nos tempos de 0, 6, 12 e 18 horas de incubação ........................................ 47
Figura 12: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição
do CFSE por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 24, e 30 horas. .................................. 49
Figura 13: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição
do CFSE por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas. ................................ 50
Figura 14: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição
do CFSE por citometria de fluxo nos tempos de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas. ........................ 51
Figura 15: Percentual de eventos da região M1 nas culturas de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de
incubação. ................................................................................................................................. 51
Figura 16: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 24 e 30 horas. ..................................... 53
Figura 17: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas ................................ 54
Figura 18: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo nos tempos de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas.. ...................... 55
Figura 19: Percentual de eventos da região SC nas culturas de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de
incubação. ................................................................................................................................ 56
Figura 20: Avaliação no número de células por citometria de fluxo. ...................................... 58
Figura 21: Avaliação no número de células por espectrofometria. .......................................... 59
Figura 22: Avaliação no número de células por Câmera de Neubauer .................................... 60
Figura 23: Correlação do número de células. .......................................................................... 61
11
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Composição do meio utilizado nos ensaios de crescimento. ................................... 37
12
13
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Classificação taxonômica de Saccharomyces cerevisiae. ...................................... 23
Quadro 2: Principais diferenças entre leveduras “ale” e “lager”.. .......................................... 27
14
15
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
%: Porcentagem
A. tubingensis: Aspergillus tubingensis
a.c.: antes de Cristo
ANOVA: Análise de Variância
BD: Becton Dickinson
BP: Bandpass
CFSE: éster succinimidílico de diacetato de carboxifluoresceína (do inglês: 5-6-
carboxyfluorescein diacetate succinimidyl ester)
CIPq-Saúde: Centro Integrado de Pós-Graduação e Pesquisa em Saúde
FITC: Isotiocianato de fluoresceína (do inglês: fluorescein isothiocyanate)
FSC: Dispersão frontal (do inglês: forward scatter)
FSC-A: Área do pico de voltagem do parâmetro tamanho (do inglês: forward scatter)
h: hora
log: Logaritmo decimal
LP: Long pass
mL: Mililitro
mm: Milímetro
mM: Milimolar
nm: Nanômetro
N: tamanho amostral
nº: Número
16
ºC: Graus Celsius
p/v: peso por volume
PBS: tampão fosfato salina (do inglês: Posphate Buffered Saline)
R2:
coeficiente de correlação
S. cerevisiae: Saccharomyces cerevisiae
SC: população celular de levedura identificada no gate
SSC: Dispersão lateral, side scatter
SSC-H: Altura do pico de voltagem do parâmetro (do inglês: side scatter)
UFVJM: Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri
US$: Dólares
US-05: Fermento neutro para fermentaçao de cervejas Ale Americanas
USA: United States of America
xg: força da centrífuga aplicada é X vezes maior que a força gravitacional da Terra
YEPD: Yeast extract – peptone – dextrose
α: Alfa
μL: Microlitro
μm: Micrômetro
μM: Micromolar
17
SUMÁRIO
1.INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 19
2. REVISÃO DE LITERATURA ............................................................................................ 21
2.1 Processos Fermentativos .................................................................................................... 21
2.2 Leveduras............................................................................................................................ 22
2.3 A levedura Saccharomyces cerevisiae ............................................................................... 23
2.4 Citometria de fluxo ............................................................................................................. 28
3. OBJETIVOS ......................................................................................................................... 35
3.1 Objetivo Geral .................................................................................................................... 35
3.2 Objetivos Específicos ......................................................................................................... 35
4 METODOLOGIA .................................................................................................................. 37
4.1 Linhagem e manutenção de Saccharomyces cerevisiae ..................................................... 37
4.2 Marcação da levedura Saccharomyces cerevisiae com 5-6-carboxyfluorescein diacetate
succinimidyl ester (CFSE) ........................................................................................................ 38
4.3 Análise por citometria de fluxo .......................................................................................... 38
4.3.1 Análise fenotípica de S. cerevisiae ...................................................................... 38
4.3.2 Análise da marcação com a sonda fluorescente CFSE ........................................ 40
4.4 Análise por microscopia confocal ...................................................................................... 41
4.5 Análise da concentração das suspensões de S. cerevisiae no Espectrofotômetro e
Contagem de Células Viáveis na câmera de Neubauer............................................................41
4.6 Análises Estatísticas ........................................................................................................... 43
18
5.RESULTADOS ..................................................................................................................... 45
5.1 Verificação da marcação da levedura Saccharomyces cerevisiae com a sonda CFSE ...... 45
5.2 Avaliação do decaimento da fluorêscencia do CFSE na levedura Saccharomyces
cerevisiae por microscopia confocal ........................................................................................ 46
5.3 Avaliação do decaimento da fluorêscencia do CFSE na levedura Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo ............................................................................................ 48
5.4 Avaliação das alterações morfológicas da levedura Saccharomyces cerevisiae por
citometria de fluxo ................................................................................................................... 52
5.5 Análise do número de células da linhagem Saccharomyces cerevisiae ao longo da
incubação ................................................................................................................................. 56
6. DISCUSSÃO ....................................................................................................................... 63
7. CONCLUSÕES ................................................................................................................... 67
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 69
19
1 INTRODUÇÃO
A utilização dos processos fermentativos é uma prática que ocorre em momentos
diferentes da história da humanidade e a aquisição de conhecimentos sobre os micro-
organismos e as enzimas possibilitou, a partir da segunda metade do século XIX, o
desenvolvimento e o progresso da biotecnologia (OLIVEIRA e MANTOVANI, 2009).
Um importante campo de pesquisa na área biotecnológica é o estudo do processo
fermentativo utilizando linhagens de leveduras com características específicas para a obtenção
de produtos industriais. Dentro do universo de leveduras de interesse biotecnológico
encontram-se as leveduras do gênero Saccharomyces com aplicação em fermentações
alcoólicas e de pães.
A levedura da espécie Saccharomyces cerevisiae, especialmente, possui a habilidade
de converter vários substratos em produtos de interesse biotecnológico e apresentam elevado
poder vegetativo, alta capacidade de multiplicação, fácil conservação e ação enzimática
prolongada. Essa levedura possui relevância no mercado industrial e há uma busca crescente
por condições fermentativas e/ou organismos fermentadores ainda mais eficientes (MARTINS
et al, 2013).
Neste contexto, a citometria de fluxo tem sido utilizada em processos biotecnológicos
há alguns anos. Trata-se de uma técnica bem conhecida no campo científico, principalmente
na análise de células humanas, sendo muito versátil pela rapidez, sensibilidade e capacidade
de avaliar células individualizadas com alta precisão. Além disso, a possibilidade de análise
de múltiplos parâmetros permite a avaliação simultânea de diversos parâmetros biológicos,
como o crescimento e comportamento proliferativo de leveduras importante em processos
fermentativos (ROBINSON E ROEDERER, 2015, GALBRAITH, 2012).
Diante disso, o presente estudo tem por objetivo utilizar a citometria de fluxo como
método quantitativo alternativo para analisar o crescimento e heterogeneidade populacional
da levedura Saccharomyces cerevisiae, visto que, essa técnica oferece a possibilidade de
análises de células individuais e medidas diretas multiparamétrica.
20
21
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Processos fermentativos
Os processos biotecnológicos são conhecidos pela humanidade desde a antiguidade.
As civilizações antigas já utilizavam à fermentação de cereais em grãos para produção de
bebidas alcoólicas e para a produção de pão, além da produção de queijos e iogurtes
(OLIVEIRA e MANTOVANI, 2009).
Os trabalhos de Pasteur e o progresso da microbiologia no século XIX permitiram a
expansão da microbiologia industrial possibilitando, mediante o desenvolvimento de
processos baseados no metabolismo microbiano, a produção de substâncias como: acetona,
butanol, etanol, ácido cítrico, antibióticos, dentre outros. Esse avanço tecnológico permitiu a
utilização de leveduras em outras áreas de aplicação, tais como no tratamento ambiental, na
produção de aditivos, de produtos químicos e de medicamentos (OLIVEIRA e
MANTOVANI, 2009).
Na indústria biotecnológica, que necessita do uso de biofermentadores, é fundamental
o controle rigoroso do crescimento do micro-organismo. Para que um bioprocesso seja viável
é necessário compreender as características morfológicas, genéticas, fisiológicas e
bioquímicas, uma vez que o modo de crescimento de um micro-organismo está relacionado
com a absorção dos substratos e a produção e secreção dos compostos desejados
(ARAKAWA, 2009; COLEN, 2006). As características de um micro-organismo utilizado em
processos fermentativos é um fator determinante para o sucesso desses processos. A linhagem
de interesse deve apresentar um bom rendimento de produção, manter constância fisiológica e
não provocar patogenia. Além disso, deve-se ter em mente que cada micro-organismo é único
no seu desenvolvimento anatômico, morfológico e fisiológico. Dessa forma, o
reconhecimento de suas características de crescimento e sua fisiologia é importante para a
obtenção bem sucedida da produção do metabólito pelo micro-organismo em questão. Por
isso, para cada fermentação, as condições devem ser estabelecidas para a produção máxima
do metabólito de interesse, visando aumentar o seu potencial de produção (COLEN, 2006).
22
As enzimas estão entre os mais importantes produtos obtidos para a necessidade
humana por meio das fontes microbianas, visto que os micro-organismos são atualmente a
primeira fonte industrial de enzimas (50% são originárias de fungos e leveduras, 35% de
bactérias e 15% de plantas e animais). A produção a partir de processos fermentativos
utilizando-se linhagens microbianas é mais aplicada quando comparada à extração vegetal ou
animal devido a diversos fatores, tais como a possibilidade de produção em larga escala,
grande variedade de atividades catalíticas, possibilidade de manipulação genética e menor
impacto econômico e ambiental (ERICKSON, NELSON, e WINTERS, 2012).
Dentre os micro-organismos utilizados para aplicações biotecnológicas destacam-se os
do Reino Fungi cuja relevância se dá pela versatilidade na produção de enzimas e metabólitos
de interesse econômico, na indústria farmacêutica e alimentícia (COLEN, 2006).
2.2 Leveduras
Os fungos abrangem um vasto grupo de organismos que compreendem mais de cinco
milhões de espécies (BLACKWELL, 2011). São organismos macro ou microscópios, estão
distribuídos em vários ambientes terrestres e utilizam diversos tipos de substratos para sua
sobrevivência. Os fungos constituem um grupo de eucariotos identificados e caracterizados
através de critérios morfológicos e fisiológicos e seus integrantes possuem ciclos de vida e
metabolismo variados devido à diversidade genética e metabólica (WADMAN et al., 2009;
LOGUERCIO-LEITE et al., 2006).
Esses micro-organismos representam os principais decompositores de ambientes
terrestres, explorando novos territórios pelo típico crescimento celular polarizado
(SILVERMAN-GAVRILA e LEW R., 2002). São bioquimicamente versáteis e podem causar
doenças em plantas, animais e humanos, principalmente em indivíduos imunocomprometidos
(MADIGAN et al., 2010).
Por outro lado, os fungos são utilizados em diversas áreas industriais, como na
produção de alimentos, de ácidos orgânicos, enzimas, vitaminas, polissacarídeos, lipídeos,
entre outros, além de ser valiosos na produção de metabólicos primários e secundários, e
extremamente úteis na realização de processos de biotransformação. Diante disso, é fácil
compreender o aumento dos estudos e a exploração racional de algumas linhagens fúngicas,
pois são micro-organismos com potencial para a obtenção de produtos biotecnológicos
23
(GUIMARÃES et al., 2006; SILVA, 2004; ADRIO e DEMAIN, 2003).
As leveduras constituem um grupo de micro-organismos unicelulares pertencentes ao
Reino Fungi que se reproduzem assexuadamente por brotamento ou por fissão binária, e que
apresentam núcleo organizado com membrana nuclear (célula eucariótica) e parede celular
rígida. São aclorofiladas, com nutrição heterotrófica através da absorção dos nutrientes
(KURTZMAN et al., 2011).
As aplicações industriais das leveduras incluem a produção de enzimas, nucleotídeos,
vitaminas, glicoproteínas, coenzimas, ácidos nucléicos, lipídeos, glicerina e riboflavina. Além
disso, as leveduras são utilizadas como modelo experimental de células eucarióticas por serem
facilmente manipuláveis, não patogênicas e fornecerem grande quantidade de células em um
tempo relativamente curto. As leveduras também podem ser utilizadas em fermentações para
a produção de pães, vinhos, cervejas e aguardentes (BORZANI, 2008, ARAUJO et al., 2009).
2.3 A levedura Saccharomyces cerevisiae
As células de Saccharomyces cerevisiae apresentam-se na forma unicelular, elíptica,
cujas dimensões são de 3 a 8 µm de comprimento por 5 μm de largura com reprodução
assexuada por brotamento ou gemulação (Figura 1) (LEGRAS et al., 2007). A classificação
taxonômica da S. cerevisiae está indicada no Quadro 1.
QUADRO 1 – Classificação taxonômica de Saccharomyces cerevisiae
Táxons
Classificação
Domínio Eukarya
Reino Fungi
Filo Ascomycota
Classe Saccharomycetes
Ordem Saccharomycetales
Família Saccharomycetaceae
Gênero Saccharomyces
Espécie Saccharomyces cerevisiae
24
Figura 1: Células de Saccharomyces cerevisiae em reprodução por brotamento
Fonte: Miranda Júnior, 2012.
No processo de brotamento, uma nova célula é formada como uma pequena
protuberância da célula antiga; o broto gradualmente aumenta de tamanho e então, separa da
célula parental, ou seja, ocorre divisão do núcleo por constrição, e parte dele, e outras
organelas, entram no broto, após essa constrição, a conexão citoplasmática é fechada pela
síntese de novo material de parede celular (Figura 2). Outras leveduras podem reproduzir-se
assexuadamente por fissão binária transversa, ou ainda sexuadamente (LEGRAS et al.,2007;
CARVALHO et al., 2006).
25
Figura 2: Estrutura simplificada de uma levedura com broto
Adaptado de Suhre, 2014.
A levedura Saccharomyces cerevisiae é utilizada para a produção de pão e da maioria
das bebidas alcoólicas. Essas leveduras são encontradas em ambientes ricos em açúcar e
podem realizar duas formas de metabolismo quimiorganotrófico: a respiração e a
fermentação. No processo de respiração, na presença de oxigênio, as leveduras crescem
eficientemente em diferentes açúcares originando varias células de leveduras e CO2. Em
condições anóxicas, as leveduras realizam o metabolismo fermentativo que é um processo
bioquímico que ocorre no citoplasma da levedura pela ação de inúmeras enzimas durante a
fase da oxidação anaeróbica, transformando o açúcar em álcool, anidrido carbônico e outros
produtos secundários. É um processo importante no qual são obtidos os álcoois industriais, a
produção de diversas bebidas alcoólica e como produto secundário, o gás carbônico
(BORZANI, 2008, ARAUJO et al., 2009, MADIGAN et al., 2010).
Como exemplo de processo de fermentação, têm-se a utilização da Saccharomyces
cerevisiae para produção de cerveja, devido à sua segurança e capacidade de produzir os
metabólitos primários etanol e dióxido de carbono, bem como outros subprodutos que
Broto
Citoplasma Parede celular
Membrana Plasmática
Vacúolo
Núcleo
Mitocôndrias
Complexo de Golgi
Retículo Endoplasmático
Centríolos
26
proporcionam características organolépticas específicas para obtenção dos diversos estilos
existentes da bebida (LEGRAS et al., 2007; CARVALHO et al., 2006).
As cepas de leveduras de S. cerevisiae podem ser classificadas de acordo com seu
processo fermentativo para a produção de cerveja em dois grupos: as leveduras de alta
fermentação (ale) e leveduras de baixa fermentação (lager). Apesar da literatura científica
progressivamente se referir às leveduras como S. cerevisiae tipo “ale” e S. cerevisiae tipo
“lager”, é necessário manter uma distinção entre elas, devido ao fato de existirem algumas
diferenças bioquímicas relevantes entre esses dois tipos de cepas de leveduras (BOKULICH e
BAMFORTH 2015; CARVALHO et al, 2006).
Leveduras “ale", elaboradas de leveduras de Saccharomyces cerevisiae, são
organismos mais complexos e diversificados (BOKULICH E BAMFORTH, 2015), não
apresentam o gene mel, que produzem a enzima extracelular α-galactosidase (melibiase), o
que as impossibilita de utilizarem a melibiose como fonte de carbono. Além disso, as cepas
“ale” podem crescer a 37°C e a maioria das fermentações de cervejas ”ale” propiciam rapidez
ao processo (3 a 5 dias) em temperaturas relativamente altas (18 a 25 ºC). Essas leveduras são
descritas como “leveduras de alta fermentação” isto é, se elevam à superfície do líquido
durante e ao final da fermentação, formando uma película flutuante e espessa de biomassa que
podem ser retiradas desta superfície (CARVALHO et al, 2006).
Já as leveduras “lager” são leveduras das cepas de Saccharomyces pastorianus
(carlsbergensis) caracterizadas por possuírem os genes mel, permitindo assim a utilização do
dissacarídeo melibiose (glicose-galactose), e não apresentam crescimento em temperaturas
superiores a 34°C. Cervejas do tipo “lager” são fermentadas à temperatura entre 7 a 15 °C e a
duração da fermentação e da maturação são de 7 a 10 dias. Os sabores e aromas das cervejas
“lager” são mais suaves e leves em comparação com as cervejas “ale”, por realizar o processo
em baixas temperaturas. Leveduras “lager” são descritas como “de baixa fermentação”
floculando na base do fermentador no final da fermentação formando uma fase sedimentada
de biomassa que pode ser retirada, ao final do processo, do fundo da base do fermentador. De
maneira simplificada está demonstrado no quadro 2 as principais diferenças entre leveduras
“ale” e “lager” (ARAÚJO; SILVA; MINIM, 2003).
27
Quadro 2: Principais diferenças entre leveduras “ale” e “lager”
Leveduras de baixa fermentação “lager” Leveduras de alta fermentação “ale"
Possuem os genes mel Não apresentam os genes mel
Não apresentam crescimento a temperaturas
superiores a 34°C
Podem crescer a 37°C
Fermentadas à temperatura entre 7 a 15 °C e
a duração da fermentação e da maturação são
de 7 a 10 dias
Rapidez ao processo (3 a 5 dias) em
temperaturas relativamente altas (18 a 22 ºC)
Durante a fermentação, o crescimento das leveduras pode ser dividido em cinco fases:
(1) lag; (2) log; (3) desaceleração; (4) estacionária e (5) declínio. Durante a fase lag não
ocorre crescimento, ou seja, é a fase em que a levedura se adapta ao meio e, apesar de não se
multiplicarem, esses micro-organismos sintetizam enzimas e constituintes celulares. Na fase
logarítmica (log), a população de leveduras cresce de maneira exponencial, sendo sintetizados
numerosos metabólitos primários. Durante a fase de desaceleração ocorre um declínio da taxa
específica máxima de crescimento, em resultado da diminuição de nutrientes essenciais ao
metabolismo celular e/ou do aumento da concentração de produtos do metabolismo tóxicos
para as células. As leveduras então atingem a fase estacionária, devido ao esgotamento dos
nutrientes e, ao acúmulo de excretas, algumas células morrem, enquanto outras continuam a
se dividir. No fim da fase log e início da fase estacionária começam a serem sintetizados os
metabólitos secundários que são importantes para os processos
de crescimento, desenvolvimento e reprodução dos organismos e para a indústria
biotecnológica. E por fim, a fase de declínio, sem a renovação dos nutrientes, as células
morrem em um tempo variável (MEGA et al., 2011; LEGRAS et al.,2007).
O conhecimento de como as populações microbianas expande é relevante para o
desenvolvimento de métodos de controle do crescimento microbiano, pois durante a divisão
celular, uma célula se transforma em duas e de acordo com um tempo necessário (tempo de
geração) o número total de células e a massa duplicam, e esses tempos de geração variam
entre os micro-organismos e depende do meio e das condições de incubação. Portanto, para
que a fermentação resulte num produto economicamente viável, o micro-organismo deve ser
capaz de se multiplicar rapidamente, produzir a substância de interesse em altos níveis e em
um período de tempo relativamente curto, ser facilmente manipulável e geneticamente
28
estável, sendo essencial que os fermentadores sejam monitorados durante o processo de
produção. Nesse contexto, a busca por processos fermentativos ainda mais eficientes é uma
área de pesquisa em ascensão (MADIGAN et al., 2010).
2.4 Citometria de fluxo
O crescimento de uma população pode ser mensurado pela análise de alterações no
número de células ou alterações na concentração de algum componente celular. Alguns
métodos comuns de crescimento celular são: a contagens de células com o uso de microscópio
para enumerar e observar as células presentes em uma cultura, sendo um método simples e
rápido, porém os resultados podem não ser confiáveis; contagem de células viáveis em placa
pelo método de semeadura por espalhamento ou semeadura em profundidade que fornece a
melhor estimativa do número de células viáveis em uma amostra, mas podem apresentar erros
devido à adequação do meio de cultura e das condições de incubação. Outro método útil para
estimar o crescimento celular baseia-se nas medidas da turbidez com um auxílio de um
espectrofotômetro que promove a passagem de luz através de uma suspensão celular, dessa
forma, quanto maior o número de células, mais turva a suspensão e maior a quantidade de luz
dispersa, porém devido a agregados e biofilmes que formam nas suspensões às vezes é um
método impreciso (MADIGAN et al., 2010).
A citometria de fluxo é outro método para a contagem de células em amostras líquidas
e a sua utilização em microbiologia aumentou significantemente, apresentando vantagens
como rapidez nos resultados, precisão e fácil padronização. Além disso, a citometria é uma
técnica multiparamétrica que pode ser usada para a monitorização em tempo real de processos
biológicos e industriais, permitindo a tomada de decisões para ajustar condições de operação
no decorrer do processo. A técnica baseia-se na medida do espalhamento de luz quando uma
célula ou partícula é interceptada, individualmente, por um feixe de luz. Tais medidas
possibilitam avaliar características citométricas de uma dada população celular, permitindo
sua caracterização por meio de parâmetros relacionados à sua morfologia (PEREIRA DE
SOUZA et al., 2011; KUŘEC et al., 2009).
O citômetro de fluxo é composto pelos sistemas fluido, óptico e eletrônico (Figura 3).
O sistema fluido, composto por reservatórios de salina e mangueiras, é responsável por
conduzir as células para um compartimento onde as mesmas são interceptadas
29
individualmente por um laser. O laser, juntamente com os espelhos, lentes e detectores
compreendem o sistema óptico: ao ser interceptada pelo feixe de luz, a célula promove o
espalhamento da luz incidente, cuja detecção fornece informações sobre o tamanho (dispersão
frontal da luz ou FSC) e granulosidade (dispersão lateral da luz ou SSC) celulares. A Figura 4
representa o espalhamento da luz incidente. Além disso, caso a célula esteja marcada com
sondas fluorescentes, haverá ainda excitação das mesmas, seguido de emissão de
fluorescência que será filtrada e direcionada aos detectores através de filtros e espelhos
ópticos. A luz captada pelos detectores é transformada em um pico de voltagem que é
convertido em sinal eletrônico permitindo a análise, pelo experimentador, por meio de
programas computacionais específicos (TUCHIN, 2011; BASIJI et al., 2007).
FIGURA 3: Configuração de um citômetro de fluxo
As células ou partículas em suspensão são carreadas pelo fluxo do citômetro e enfileiradas para interceptar o
laser individualmente. A dispersão frontal do laser é mensurada pelo detector forward scatter (FSC) e a
dispersão lateral é mensurada pelo detector side scatter (SSC). O laser também pode excitar fluorocromos de
marcadores fluorescentes, sendo a fluorescência detectada por detectores específicos. O conjunto de espelhos
dicroicos e filtros bandpass ou longpass são posicionados antes dos canais de detecção de fluorescência para
selecionar a faixa de comprimento de onda que poderá chegar aos canais de detecção. A luz captada pelos
detectores é transformada em um pico de voltagem que é convertido em sinal eletrônico. Fonte:
<http://www.semrock.com/flow-cytometry. aspx> Acesso em Maio de 2017.
30
FIGURA 4 – Esquema do espalhamento da luz
A dispersão gerada pelas células ao passar o laser é responsável por fornecer os parâmetros de tamanho - FSC
(do inglês, Forward scatter) e granulosidade SSC (do inglês, Side scatter) ou complexidade interna. O tamanho
é fornecido devido à dispersão frontal do laser, que é mensurada por um detector posicionado à frente do
mesmo, enquanto a complexidade interna da célula é dada a partir de um detector que capta a dispersão lateral
do mesmo feixe que atingiu a célula. Adaptado de
<http://www.ibb.unesp.br/Home/Departamentos/MicrobiologiaeImunologia/citometria_de_fluxo.pdf> Acesso
em Junho de 2017.
Os corantes relacionados com proliferação celular, e utilizados na citometria de fluxo,
não são moléculas fluorescentes, mas apresentam a capacidade de se difundirem passivamente
na célula. Uma vez dentro da célula, essas moléculas são hidrolisadas por esterases
intracelulares não específicas e geram produtos fluorescentes que permanecem no meio
intracelular de maneira homogênea. Como exemplo, tem-se o composto Violet Prolifereration
Dye 450 (VPD450), que se excita à 405nm (laser violeta) e emite luz a 450 nm (fluorescência
azul), bem como o 5-6-carboxyfluorescein diacetate succinimidyl éster – CFSE, que é
excitado a 488nm (laser azul) e emite luz fluorescente à 521 nm (fluorescência verde FITC).
A distribuição homogênea dos produtos fluorescentes no citoplasma da célula resulta em
fluorescência uniforme. Quando ocorre divisão celular, tais compostos são distribuídos entre
as células filhas, o que faz com que essas tais células emitam menos fluorescência quando
comparadas às células progenitoras. Esse fenômeno permite a análise, por técnicas
fluorescentes, do comportamento proliferativo das células, por meio do decaimento da
fluorescência emitida pelas mesmas, ao longo das sucessivas divisões celulares ocorridas.
Incident
Light Source
Side Scatter Detector
Forward Scatter Detector
31
Essas divisões podem ser mensuradas por meio de histogramas de fluorescência, onde cada
pico corresponde a um ciclo de divisão celular (LYONS et al. 2000). A figura 5 mostra um
exemplo de análise por citometria de fluxo utilizando o fluorocromo CFSE. No exemplo
podemos perceber que as células não estimuladas e coradas com CFSE apresentam a máxima
intensidade de fluorescência. Já as células estimuladas com um estímulo específico
(anticorpos anti-CD3 e anti-CD28) apresentam picos de menor intensidade de fluorescência,
correspondendo aos ciclos de divisão da linhagem celular em questão. Atualmente os
citômetros podem apresentar até 16 detectores, o que permite analisar múltiplas características
celulares e/ou componentes celulares de um elevado número de células de forma individual
(RIESEBERG el al., 2001).
FIGURA 5 - Coloração fluorescente de CFSE em esplenócitos de ratos
Os esplenócitos foram marcados com 1 μM de CFSE e analisados com ou sem estimulação com anti-CD3 e
anti-CD28 após 3 dias. Pode-se observar um pico único com intensidade máxima de fluorêscencia em células
que não proliferaram (não estimuladas) e picos de diferentes intensidades de fluorescência referentes à
proliferação celular após estímulo devido à distribuição do corante CFSE entre as células filhas. Fonte:
https://www.bdbiosciences.com/documents/Horizon-DS-Cell-Proliferation-Dyes.pdf. Acesso em Junho de 2017.
A utilização da citometria de fluxo nos estudos com a levedura S. cerevisiae e nos
processos biotecnológicos relacionados com a produção de cerveja já foram descritos
previamente na literatura. Scheper e colaboradores (1987) demonstraram que a citometria de
fluxo foi uma técnica útil na diferenciação de aspectos biológicos da levedura Saccharomyces
cerevisiae submetidas às culturas contínuas e descontínuas. Foram avaliados parâmetros
celulares tais como tamanho, conteúdo de RNA e de DNA, além de parâmetros fenotípicos,
como a formação de brotamentos, ao longo do processo de proliferação celular. Já Boyd e
colaboradores (2003), utilizando o corante fluorescente oxonol, realizou uma análise, por
Não
est
imu
lad
a
Esti
mu
lad
a
32
citometria de fluxo, da viabilidade das leveduras durante o processo de produção de cerveja.
Os dados obtidos por essa técnica ofereceram um erro substancialmente reduzido na
determinação da viabilidade celular, em comparação ao método onde foi utilizado o corante
azul de metileno, que é a técnica de referência usada pela indústria para medir tal parâmetro
(LODOLO et al., 2008). Além disso, devido ao grande número de células avaliadas pela
citometria de fluxo, essa técnica se mostrou mais confiável, o que permitiu maior controle de
qualidade do processo fermentativo (BOYD et al., 2003).
Knutsen et al., (2011) em seu estudo utilizou a citometria de fluxo para análise do
ciclo celular da levedura Schizosaccharomyces pombe. Este trabalho apresentou grandes
avanços na análise de células de levedura por citometria de fluxo, uma vez que demonstrou
um método que permitiu a separação de células binucleares de mononucleares, além de outro
método que facilitou a eliminação dos dupletos celulares que são formados em uma
frequência significativa quando as células são fixadas. Esses dois métodos melhoraram as
análises de célula única da levedura estudada por citometria de fluxo e, assim, permitiu uma
análise de células muito mais detalhada, exata e sofisticada.
Estudos prévios, com fungos da espécie Aspergillus nidulans, realizados por nosso
grupo de pesquisa, demonstraram que a citometria de fluxo foi capaz de detectar diferenças
morfológicas durante o crescimento fúngico quando esses eram submetidos às diferentes
fontes de carbono. Para a realização desses experimentos foram utilizados os parâmetros de
tamanho e complexidade interna dos micro-organismos que foram comparados com dados
obtidos pela microscopia óptica. A estratégia de análise foi baseada na seleção de uma região
específica em gráficos bidimensionais de tamanho versus complexidade interna, onde foi
possível distinguir aglomerados correspondentes às células em brotamento ou em fase inicial
de proliferação. Esse estudo permitiu determinar diferenças no crescimento fúngico entre
culturas suplementadas com glicose e sacarose (Figura 6). No entanto, essas diferenças não
foram observadas nas análises realizadas por microscopia. Nesse estudo foi sugerido que a
citometria de fluxo poderia ser uma ferramenta útil no estudo da germinação e crescimento
fúngico, tendo em vista a facilidade de execução, boa sensibilidade e reprodutibilidade, e
principalmente na capacidade de análise de um número expressivo de células, que pode
chegar à 50.000 ou 100.000 células em uma única análise, o que aumenta a confiabilidade dos
resultados (PEREIRA DE SOUZA, et al, 2011).
33
FIGURA 6: Análise do crescimento inicial do Aspergillus nidulans em resposta a fonte de carbono por
citometria de fluxo
Os conídios foram colhidos em solução salina e imediatamente analisados por citometria de fluxo constituindo o
controle (0 h). Culturas em solução salina suplemento ou não com uma fonte de carbono (glicose ou sacarose)
foram analisados por citometria de fluxo após 3-8 h de incubação a 30 ° C. Populações R1, R2 e R3 são
indicadas no primeiro gráfico. Os valores de R2 são dados na parte inferior de cada gráfico como percentagem
de eventos ± desvio padrão (SD) Fonte: Pereira de Souza et al., 2011.
Tendo em vista a experiência acumulada com as investigações já realizadas por nosso
grupo de pesquisa, e considerando a importância do conhecimento acerca do comportamento
34
proliferativo de leveduras durante sua utilização em processos produtivos fermentativos, o
presente estudo propõe uma análise alternativa, por citometria de fluxo, do comportamento
proliferativo de uma cepa comercial de S. cerevisiae.
Como estratégia experimental, decidimos verificar se corantes, normalmente utilizados
para avaliação de proliferação de células humanas, também poderiam ser usados para avaliar
o crescimento de leveduras. Vale ressaltar que diferenças estruturais entre essas duas células,
tais como a presença de parede celular nas leveduras, poderiam ser determinantes para a
utilização ou não das sondas fluorescentes. Tendo como base os estudos realizados por
Pereira e colaboradores (2011), decidimos também verificar se a citometria de fluxo poderia
ser capaz de demonstrar diferenças morfológicas detectáveis ao longo do processo
fermentativo. Como descrito anteriormente, a citometria de fluxo é uma técnica capaz de
detectar alterações no tamanho e complexidade interna de células em crescimento e esse tipo
de análise permite comparar o perfil morfológico de leveduras que crescem em condições
normais daquelas que crescem em condições adversas, tais como em ambientes com altas
concentrações de álcool ou em ambientes que envolvam a adição de insumos que possam ser
prejudiciais ao processo fermentativo. Por fim, também nos propusemos a verificar se a
técnica de citometria de fluxo poderia ser utilizada para mensurar o número de células ao
longo do processo de multiplicação de leveduras. Esses dados, uma vez comparados aqueles
obtidos por técnicas convencionais utilizadas para esse fim, poderão ser utilizados para
verificar a confiabilidade do ensaio aqui proposto.
35
3 OBJETIVOS
3.1 GERAL
Analisar o crescimento e heterogeneidade populacional de uma linhagem comercial
de Saccharomyces cerevisiae (US-05 – Fermentis) por citometria de fluxo.
3.2 ESPECÍFICOS
Verificar, por microscopia confocal, a capacidade de marcação intracelular com sondas
fluorescentes;
Analisar, por citometria de fluxo, o comportamento proliferativo da linhagem de
Saccharomyces cerevisiae por meio do decaimento da fluorescência emitida pela
marcação intracelular com a sonda CFSE;
Analisar, por citometria de fluxo, mudanças no perfil morfológico (tamanho e
complexidade interna) da linhagem de Saccharomyces cerevisiae ao longo do processo
de multiplicação celular;
Comparar as análises realizadas pela citometria de fluxo com técnicas comumente
utilizadas para o estudo da proliferação de leveduras.
36
37
4 METODOLOGIA
4.1 Linhagem e manutenção de Saccharomyces cerevisiae
A levedura Saccharomyces cerevisiae utilizada no presente trabalho foi adquirida
comercialmente (US-05 - Fermentis Division of S.I.Lesaffre BP 3029) e mantida em estoque
no laboratório de Imunologia do Departamento de Farmácia da UFVJM. A levedura
liofilizada foi reativada em tubos contendo meio de cultura líquido “Yeast extract peptone
dextrose” (YEPD) a 25ºC cuja composição encontra-se descrita na Tabela 1. Após quatro
dias, foi retirada uma alíquota dessa suspensão celular para posterior inoculação no meio Ágar
Saboraud (Acumedia Manufacturing, Michigan-USA), em temperatura de 25ºC, por três dias,
seguindo as recomendações do fabricante. Após o período de incubação, foi coletada uma
colônia isolada para análise por microscopia óptica (BX41TF Olymmpus, Olymmpus Optical
CO, LTD, Laboratory Equipament LISTED 8C57, Japão), que também serviu para ser
inoculada em tubos contendo 10 ml do meio YEPD. Após 48 horas de incubação a 25ºC, foi
adicionado glicerol (30%, p/v, concentração final) e confeccionadas alíquotas de 2 mL em
tubos de polipropileno específicos para criopreservação. As alíquotas foram armazenadas a -
80ºC até o momento de uso nos experimentos.
Tabela 1: Composição do meio utilizado nos ensaios de crescimento
Constituintes Composições
Extrato de levedura 1%
Peptona de carne 2%
Glicose 2%
38
4.2 Marcação da levedura Saccharomyces cerevisiae com 5-6-carboxyfluorescein
diacetate succinimidyl ester (CFSE)
Uma alíquota de 1mL da suspensão de leveduras congeladas foi inoculada em tubo de
ensaio contendo 10 mL de meio YEPD e incubada a 25º C por 48 horas. Após esse tempo,
retirou-se do tubo de ensaio uma alíquota de 2 ml da suspensão de levedura e transferiu-se
para um tubo de polipropileno contendo 10 mL de tampão fosfato salina (PBS), que foi
centrifugada a 2000 x g, a 25º C por 10 minutos. Após a centrifugação, descartou-se o
sobrenadante e o precipitado de células (pellet) foi suspendido em PBS.
Para ajustar a concentração da suspensão de leveduras para 1 x 107
células/mL,
utilizou-se a câmera de Neubauer para contagem, em microscópio óptico, das leveduras
viáveis pelo método de exclusão pelo Azul de Tripan. Ajustada a concentração, a suspensão
de leveduras foi marcada com CFSE (Sigma St. Louis, MO, USA) a 10 µM, por 30 minutos a
25º C, ao abrigo da luz e agitação manual por 20 segundos a cada 10 minutos. Após esse
tempo, a reação foi interrompida adicionando-se 10 mL de PBS, por 5 minutos a 25º C. Em
seguida, a suspensão foi centrifugada por 10 minutos a 2000 x g e 25ºC. Após descarte do
sobrenadante, as leveduras foram suspendidas com 1 mL de PBS e a suspensão de leveduras
marcadas com o CFSE foi transferida para tubos de ensaio contendo 10 mL de YEPD e
incubada a 25º C e foram analisadas por citometria de fluxo, microscopia confocal e
espectrofotometria.
4.3 Análise por citometria de fluxo
4.3.1 Análise fenotípica de S. cerevisiae
Foi realizada a análise por citometria de fluxo em um citômetro BD FACSCanto™ II
(BD Biosciences, San Jose, CA, EUA) com a seguinte configuração: 3 lasers (azul 488 nm,
vermelho 633 nm e violeta 405 nm), um octógono (488/10 Band pass-BP, 530/30 BP, 585/42
BP, 670 Long Pass - LP e 780/60 BP) e dois trígonos (trígono I -660/20 BP e 780/60 BP;
trigono II - 450/50 BP e 510/50 BP), que possibilita a análise dos parâmetros de tamanho
(FSC - forward side scatter), complexidade ou granulosidade celular (SSC - side light scatter
39
e 8 fluorescências de espectros diferentes, simultaneamente.
A estratégia de análise consistiu na aquisição de uma amostra no tempo inicial de 0
hora e discriminação de uma região “SC” (gate SC) contendo a população de leveduras com
morfologias semelhantes que caracterizassem, teoricamente, as leveduras em estado de
repouso, antes do processo de multiplicação. Essa região “SC” (gate) estabelecida foi adotada
e mantida para as análises em tempos posteriores para verificação das mudanças no padrão
fenotípico (tamanho e complexidade interna) das leveduras ao longo de sua proliferação. Vale
ressaltar que os ajustes de voltagem do citômetro foram estabelecidos a partir dessa primeira
amostra adquirida e foram mantidos ao longo dos experimentos subsequentes. A Figura 7
ilustra como foi realizada a análise da primeira amostra e o estabelecimento do gate SC.
Tendo em vista que o processo de multiplicação de leveduras ocorre por brotamento e que
durante a divisão celular há uma produção de novas organelas e metabólitos, as leveduras, ao
longo do tempo, mudam sua morfologia. Essa mudança, na citometria, se reflete por um
deslocamento para a direita do gate SC estabelecido. A aquisição dos dados foi realizada em
cultura de leveduras submetidas à tempos distintos, utilizando-se o software BD FACSDiva
(BD Biosciences, San Jose, CA, EUA), tendo sido adquiridos um total de 50.000 eventos. A
análise dos dados foi realizada pelo Programa FlowJo 10.0.7 (Tree Star, Ashland, OR, USA).
FIGURA 7: Estratégia de análise do crescimento celular por citometria de fluxo
Gráfico de distribuição pontual de tamanho (FSC - Forward side scatter) versus granulosidade (SSC - Side light
scatter) utilizado para analisar o percentual de células.
Gra
nu
losi
dad
e
Tamanho
SC
50000 eventos
40
4.3.2 – Análise da marcação com a sonda fluorescente CFSE
O comportamento proliferativo da levedura foi determinado utilizando a técnica de
incorporação e decaimento da fluorescência de CFSE, conforme descrito por Lyons et al.
(2000), um corante excitável pelo laser azul (488nm) do citômetro de fluxo.
Para a análise das células marcadas com CFSE, foi feita, primeiramente, a seleção da
população celular de leveduras, identificada em SC, em gráficos de FSC-A versus SSC-H
para as células de leveduras analisadas no tempo inicial (0 hora). Em seguida as células de
leveduras foram analisadas para intensidade de fluorescência do CFSE utilizando-se
histogramas do número de eventos em função da fluorescência (Figura 8). O marcador M1 foi
definido como células que possuem menor intensidade de fluorescência de CFSE e o
marcador M2 foi definido como pico de células de máxima intensidade de fluorescência. Em
seguida, esses marcadores foram utilizados para a análise do comportamento proliferativo da
linhagem de Saccharomyces cerevisiae, pois, espera-se que ao longo da proliferação, maior
percentual de células tendem a ser detectado na região M1, devido ao processo de divisão
celular, uma vez que o corante se distribui entre as células filhas provocando o decaimento da
intensidade da fluorescência do mesmo.
FIGURA 8: Estratégia de análise de proliferação celular pela diluição do CFSE
A B
Gráfico de distribuição pontual FSC x SSC foi utilizado para a seleção da população desejada (A). Em seguida,
histograma de CFSE x número de eventos, foi utilizado para definir a região M1 como células que possuem
menor intensidade de fluorescência de CFSE e a região M2 como pico de células de máxima intensidade de
fluorescência.
Gra
nu
losi
dad
e
Tamanho
Ev
ento
s
CFSE
50000 eventos
M1 M2
0 100
41
4.4 Análise por microscopia confocal
Para a realização das análises por microscopia confocal, a suspensão de leveduras
coradas e não coradas pelo CFSE, em determinados tempos, foram centrifugadas a 2000 x g,
por 10 minutos a 25ºC, seguido de duas lavagens com PBS. Após essa etapa, foram utilizados
200 µL de suspensão das leveduras para a análise da fluorescência e morfologia celulares,
utilizando-se lâminas de vidro e lamínulas de 0,17 mm de espessura. A leitura das lâminas foi
realizada em microscópio confocal Zeiss Laser Scanning Microscope 700 (LSM 700) (Carl
Zeiss, Jena, Germany), sob aumento de 400 vezes. Para a aquisição das imagens, foi utilizado
o software ZEN (Carl Zeiss, Jena, Turíngia, Alemanha).
Para avaliar a presença do fluorocromo CSFE nas células de leveduras foi utilizado o
laser azul (488 nm). O equipamento foi configurado para detectar fluorescência com intervalo
de comprimento de onda entre 515 e 545nm. Os parâmetros adotados de potência do laser e
ganho de detector foram padronizados para todas as análises.
As imagens das células de leveduras foram adquiridas em campo escuro (campo usado
para avaliar a emissão de fluorescência) e em campo claro, obtidas com o auxílio de um
detector de luz transmitida. Também foi adotada a sobreposição das imagens (merge) obtidas
pela análise de fluorescência e de campo claro com o objetivo de avaliar se a fluorescência
emitida estava restrita aos compartimentos celulares.
4.5 Análise da concentração das suspensões de S. cerevisiae no Espectrofotômetro e
Contagem de Células Viáveis em Câmera de Neubauer
Com o objetivo de acompanhar a concentração da suspensão de leveduras ao longo do
tempo de incubação, foram realizadas análises espectrofotométricas e a contagem
microscópica de células em câmara de Neubauer. Para a primeira análise foi utilizado um
espectrofotômetro, modelo Multiskan™ GO (Thermo Fisher Scientific, MA, EUA). Após os
períodos determinados de incubação, a suspensão de leveduras foi centrifugada a 2000 x g,
por 10 minutos e à 25º C seguida de duas lavagens com PBS. O volume da suspensão de
42
leveduras foi ajustado para o mesmo volume inicial contido na cultura e foi retirado cerca de
200 µL da amostra, que em seguida, foram transferidos para uma placa transparente de 96
poços de fundo chato, em duplicata, para leitura da absorbância, utilizando-se o comprimento
de onda de 650 nm.
A contagem de células viáveis em Câmera de Neubauer (Figura 9) foi realizada pelo
método de exclusão pelo Azul de Tripan, com auxílio do microscópico óptico (BX41TF
Olymmpus, Olymmpus Optical CO, LTD, Laboratory Equipament LISTED 8C57, Japão)
com objetiva de 40X. A contagem foi realizada nos quatro quadrantes laterais da câmara e a
concentração da suspensão de células na amostra foi estimada de acordo com a seguinte
fórmula:
nº de células/mL = nº total de células x fator de diluição x 10000
nº de quadrantes contados
FIGURA 9: Câmara de Neubauer
A B
A Câmera de Neubauer é utilizada para determinar a quantidade de células e outras estruturas em amostras
(A). A grade de contagem da Câmera de Neubauer é constituída de quadrantes com subdivisões diferentes, o
tamanho é o critério de escolha do quadrante no qual a célula é contada. A contagem da levedura foi realizada
nas quatro partes laterais da câmara (1), sendo contadas as células de leveduras situadas nos quadrantes
representados pelo número 2 (B). Fonte: Adaptado de
<http://fei.edu.br/~rbianchi/publications/RevistaFEI2004-a.pdf>;
<http://www.biomedicinapadrao.com.br/2013/10/conhecendo-camara-de-neubauer.html > Acesso em Junho de
2017.
43
4.6 Análises estatísticas
Para análise da normalidade dos dados, utilizou-se o teste Shapiro-Wil e as diferenças
entre as variáveis com distribuição normal foram testadas utilizando-se ANOVA com Post
Hoc de Tukey. Diferenças estatisticamente significativas foram consideradas quando p<0,05.
Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão e as análises foram realizadas
utilizando o software GraphPad Prism 5 (GraphPad Software Inc., San Diego, CA, EU).
44
45
5 RESULTADOS
5.1 Verificação da marcação da levedura Saccharomyces cerevisiae com a sonda
CFSE
Neste estudo, objetivou-se verificar se a citometria de fluxo poderia ser útil na análise
do crescimento e heterogeneidade populacional da linhagem de Saccharomyces cerevisiae,
por meio da marcação intracelular com a sonda fluorescente CFSE. No entanto, foi necessário
confirmar se o CFSE teria a capacidade de ultrapassar a rígida parede celular da levedura e
atingir o meio intracelular. Esse seria o requisito necessário para que a análise de proliferação
celular, por citometria de fluxo, pudesse ser realizada (LYONS et al. 2000). Além disso, era
importante demonstrar que a fluorescência detectada pelo citômetro de fluxo seria fruto da
penetração da sonda fluorescente no interior da célula e não de artefatos provenientes de
marcações inespecíficas ocorridas aleatoriamente.
A análise por microscopia confocal permitiu confirmar que o fluorocromo CFSE
penetrou na linhagem Saccharomyces cerevisiae estudada (Figura 10) e que a fluorescência
emitida esteve relacionada com a presença do corante no interior da célula. Também foi
possível verificar que a sonda CFSE se distribui de maneira homogênea no interior da célula.
Esse resultado forneceu segurança e confiabilidade para a realização das análises de
proliferação por citometria de fluxo.
46
FIGURA 10: Análise da linhagem de Saccharomyces cerevisiae por microscopia confocal
(aumento de 400x) A B
Levedura em campo claro: observa-se a forma unicelular elíptica e a delimitação da parede celular (A). Levedura
marcada - emissão de fluorescência: observa-se o citoplasma todo corado com o fluorocromo CFSE (B).
5.2 Avaliação do decaimento da fluorêscencia do CFSE na levedura Saccharomyces
cerevisiae por microscopia confocal
Visto que a sonda fluorescente CFSE foi capaz de penetrar no interior das
leveduras, e sabendo que ao longo das divisões celulares esse corante se distribui para as
células filhas, foi testado se esse decaimento da fluorescência poderia ser observado pela
microscopia confocal. Para essa análise, as leveduras foram avaliadas após 0, 6, 12 e 18 horas
de incubação e as imagens representativas dos experimentos estão apresentadas na Figura 11.
De acordo com as imagens, percebe-se que ocorreu um decaimento da fluorescência de CFSE
ao longo do tempo. Também foi possível observar que o número de células por campo, com o
passar das horas, foi aumentando em relação ao tempo anterior analisado.
47
FIGURA 11: Análise da linhagem de Saccharomyces cerevisiae por microscopia confocal (aumento de
400x) nos tempos de 0, 6, 12 e 18 horas de incubação
A B C
Campo claro (A). Campo escuro (B) e a sobreposição do campo claro e do campo escuro - merge (C).
0 h
6 h
12h
18 h
48
5.3 Avaliação do decaimento da fluorêscencia do CFSE na levedura Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo
Pelas análises realizadas por microscopia confocal não é possível quantificar o
decaimento da fluorescência, bem como realizar uma análise que contemple uma grande
quantidade de células. Além disso, há a subjetividade das análises de intensidade de
fluorescência, principalmente quando são realizados experimentos em dias distintos.
Diante dessas limitações, foi decidido realizar uma análise quantitativa, avaliando um
número bem maior de células, pela técnica de citometria de fluxo. Para essa análise foram
avaliadas 50.000 células para verificar a marcação e decaimento da fluorescência emitida pelo
corante intracelular CFSE. Para a quantificação dos dados foram utilizados histogramas de
fluorescência versus número de leveduras nas culturas de S. cerevisiae não tratadas com
CFSE (Controle não corado), bem como culturas de células coradas com esse corante e
avaliadas após 0, 6, 24 e 30h de incubação. Utilizando a cultura com 0 h de incubação, foi
delimitada uma região (M2) que contemplasse células com a máxima intensidade de
fluorescência, ou seja, as células recém-coradas que ainda não haviam entrado em processo de
mitose. Também foi estabelecida uma região (M1) para obter a quantidade de células que, ao
entrarem em divisão, apresentariam valores menores de intensidade de fluorescência de
CFSE.
De acordo com os resultados, foi possível detectar o decaimento da fluorescência do
CFSE incorporado pela levedura, pela técnica de citometria de fluxo (Controle: M1= 100%,
M2= 0%; 0 hora M1= 1,62% e M2= 92,8%; 6 horas M1= 56,2% e M2= 42,9%; 24 horas M1=
98,8% e M2= 1,18%; 30 horas M1= 99,2% e M2=0,76%). Sendo o controle constituído de
leveduras não marcadas com o CFSE.
49
FIGURA 12: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição do CFSE
por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 24, e 30 horas
Histograma de intensidade de fluorescência do CFSE x número de eventos. No controle a região M1 representa a
região de células não marcadas e M2 representa a região de células marcadas.
Nessa primeira análise observou-se que os histogramas referentes aos tempos de 24 e
30 horas de incubação foram semelhantes ao da cultura controle não marcada. Também foi
possível concluir que o intervalo de tempo entre 6 e 24 horas foi muito grande para
acompanhar o decaimento gradual da fluorescência de CFSE. Dessa forma, decidiu-se realizar
as análises com um intervalo menor de incubação, sendo eles: 0, 6, 12, 18 e 24 horas de
incubação.
De acordo com os dados demonstrados na Figura 13, o intervalo de 6 em 6 horas
continuou sendo muito longo para detecção gradual do decaimento da fluorescência do
corante CFSE (Controle: M1= 100%, M2= 0%; 0 hora M1= 1,62% e M2= 92,8%; 6 horas
M1= 56,2% e M2= 42,9%; 12 horas M1= 93,8% e M2= 5,57%; 18 horas M1= 98,3% e M2=
1,60%; 24 horas M1= 98,8% e M2= 1,18%). Além disso, foi possível perceber que a
fluorescência do corante CFSE nas leveduras incubadas por 18 e 24 horas se assemelhou às
culturas não marcadas (controle). Diante desses dados, definimos um intervalo de 3 horas para
a realização de novas análises.
Controle 0 hora 6 horas
24 horas 30 horas
Ev
ento
s
CFSE
M1 M2
100 0
M1 M2
1,62 92,8
M1 M2
56,2 42,9
M1 M2
98,8 1,18
M1 M2
99,2 0,76
50
FIGURA 13: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição do CFSE
por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas
Histograma de intensidade de fluorescência de CFSE x número de eventos. No controle a região M1 representa a
região de células não marcadas e M2 representa a região de células marcadas.
A Figura 14 representa os dados referentes às análises citométricas das leveduras após
0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de incubação (N= 7). A análise do percentual de eventos
representada pelas regiões M1 e M2 demonstrou a ocorrência de decaimento gradual de CFSE
ao longo do tempo, permitindo inclusive determinar o tempo máximo para análise da
proliferação dessa cepa de S. cerevisiae específica que foi de 18 horas de incubação.
Os valores percentuais de células posicionadas dentro da região M1 (células que
sofreram mitoses), em cada um dos tempos avaliados, estão demonstrados na figura 15. A
análise dos dados revela que houve diferença estatística nos tempos de 0, 3, 6 e 9 horas em
relação ao controle; para os tempos de 12, 15 e 18 horas não houve diferença estatística em
relação ao controle. Também podemos verificar que os níveis de fluorescência, após 9 horas,
ficaram bastante baixos, com valores próximos aos observados para a cultura controle não
marcada.
Controle 0 hora 6 horas
Ev
ento
s
CFSE
24 horas18 horas12 horas
M1 M2
100 0
M1 M2
1,62 92,8
M1 M2
56,2 42,9
M1 M2
93,8 5,57
M1 M2
98,3 1,60
M1 M2
98,8 1,18
51
FIGURA 14: Análise da proliferação celular da levedura Saccharomyces cerevisiae pela diluição do CFSE
por citometria de fluxo nos tempos de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas
Histograma de intensidade de fluorescência do CFSE x número de eventos. No controle a região M1 representa a
região de células não marcadas e M2 representa a região de células marcadas.
FIGURA 15: Percentual de eventos da região M1 nas culturas de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de incubação
Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão. Diferenças estatisticamente significante (p<
0,05,ANOVA com post hoc de Tukey) são identificadas pelas letras diferentes (N= 7).
Controle 0 hora 3 horas
9 horas 12 horas 15 horas
Ev
ento
s
6 horas
18 horas
CFSE
M1 M2
100 0
M1 M2
5,03 94,6
M1 M2
9,22 89,0
M1 M2
56,2 42,9
M1 M2
84,3 15,3
M1 M2
92,6 7,22
M1 M2
94,6 5,26
M1 M2
96,1 3,78
Cont. 0 3 6 9 12 15 180
20
40
60
80
100
Per
cen
tual
de
even
tos
da
reg
ião
M1
Tempo de incubação (horas)
a
b
a, e
d
c
e
a a
52
5.4 Avaliação das alterações morfológicas da levedura Saccharomyces cerevisiae por
citometria de fluxo
Estudos anteriores realizados por nosso grupo de pesquisa demonstraram que a
citometria de fluxo foi capaz de detectar alterações no tamanho e complexidade interna, de
maneira quantitativa, ao longo do crescimento de Aspergillus nidulans antes mesmo que tais
alterações pudessem ser detectadas por microscopia convencional (PEREIRA DE SOUZA et
al., 2011). Esse estudo nos motivou a verificar se, ao longo da proliferação da levedura S.
cerevisiae, seria possível detectar diferenças morfológicas, uma vez que células em divisão
necessitam aumentar a síntese de diversos componentes citoplasmáticos e nucleares para
garantirem a formação das células-filhas.
Para essa investigação, as mesmas células utilizadas na análise de fluorescência foram
também utilizadas para avaliar o perfil morfológico. Leveduras não coradas com CFSE
(controle) foram testadas para fins comparativos e para demonstrar que a presença do corante
CFSE não induziu mudanças nos parâmetros morfológicos aqui avaliados. Nesse primeiro
experimento foram realizadas as análises citométricas em leveduras no tempo inicial (0 hora)
e após incubação de 6, 24 e 30 horas. A Figura 16 mostra as alterações morfológicas de
Saccharomyces cerevisiae e o percentual de células presentes na região SC (Controle = 95%,
0 hora = 96%; 6 horas = 60,7%; 24 horas = 92,7%; 30 horas = 86,5%).
53
FIGURA 16: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces
cerevisiae por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 24 e 30 horas
Gráfico de distribuição pontual de tamanho (FSC - Forward side scatter) versus granulosidade (SSC - Side light
scatter) demonstrando o percentual de células presente na região SC.
Novamente, e corroborando os dados obtidos na análise do decaimento de CFSE, as
diferenças no perfil de tamanho e granulosidade utilizando a análise de intervalos muito
grandes de incubação não foram suficientes para demonstrar diferenças nos parâmetros
avaliados. Sendo assim, foram realizados novos testes onde o intervalo de incubação foi de 6
horas, ou seja, no tempo inicial (0 hora) e após incubação de 6, 12, 18 e 24 horas. A Figura 17
ilustra as alterações morfológicas das leveduras de Saccharomyces cerevisiae por citometria
de fluxo e o percentual de células presente na região SC (Controle = 95%, 0 hora = 96%; 6
horas = 60,7%; 12 horas = 83,6%; 18 horas = 90,9%; 24 horas = 92,7%).
SC
95
SC
96SC
60,7
SC
93,8
SC
95,3
Gra
nu
losi
dad
e
Tamanho
Controle 0 hora 6 horas
24 horas 30 horas
54
FIGURA 17: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces cerevisiae
por citometria de fluxo nos tempos de 0, 6, 12, 18 e 24 horas
Gráfico de distribuição pontual de tamanho (FSC - Forward side scatter) versus granulosidade (SSC - Side light
scatter) demonstrando o percentual de células presente na região SC.
Tendo em vista que as alterações morfológicas mais expressivas foram observadas
entre as leveduras avaliadas após 0 e 6 horas e 6 e 12 horas de incubação, supõe-se que o
intervalo de 6 horas ainda não foi um intervalo adequado para se avaliar a dinâmica das
alterações de tamanho e complexidade interna da célula, inerentes ao processo proliferativo.
Pensando nisso, e também com base nos dados já observados para as análises de proliferação
demonstradas anteriormente, decidiu-se realizar as análises em tempos ainda menores. A
Figura 18 é uma figura representativa de 7 experimentos e mostra as alterações morfológicas
das leveduras de Saccharomyces cerevisiae e o percentual de células presente na região SC no
tempo inicial de 0 hora e após 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de incubação. De acordo com os
dados obtidos, podemos verificar que as análises realizadas de 3 em 3 horas permitiu uma
melhor visualização das alterações morfológicas ocorridas ao longo da proliferação celular.
Na Figura 19 podemos observar os valores percentuais obtidos na região SC, que representam
SC
95SC
96
SC
60,7
SC
92,7SC
83,6
SC
90,9
Controle 0 hora 6 horas
24 horas
Gra
nu
losi
dad
e
Tamanho
12 horas 18 horas
55
a fração de células com morfologia característica de células em estágios iniciais do processo
de proliferação.
FIGURA 18: Avaliação das alterações morfológicas das células de leveduras de Saccharomyces cerevisiae
por citometria de fluxo nos tempos de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas
Gráfico de distribuição pontual de tamanho (FSC - Forward side scatter) versus granulosidade (SSC - Side light
scatter) demonstrando o percentual de células na região SC.
Controle 0 hora 3 horas
Gra
nu
losi
dad
e
6 horas
Tamanho
9 horas 12 horas 15 horas 18 horas
SC
93,7
SC
92,1
SC
70,4
SC
64
SC
85,9
SC
88,8
SC
91,8
SC
91
56
FIGURA 19: Percentual de eventos da região SC nas culturas de 0, 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de incubação
Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão. Diferenças estatisticamente significativas (p< 0,05
ANOVA com post hoc de Tukey) são identificadas pelas letras diferentes (N= 7).
A análise dos dados revela que a diminuição do percentual de leveduras dentro da
região SC das culturas avaliadas após 3 e 6 horas de incubação ocorreu por um deslocamento
das populações celulares em direção a uma região onde se encontram células com valores
aumentados de FSC, ou seja, de maior tamanho celular. Há uma tendência ao aumento do
percentual de células na região SC, após 9 horas de culturas, se igualando à cultura controle a
partir de 12 horas de incubação, permitindo inferir que as leveduras, depois de certo tempo,
retornam à morfologia inicial. Esse dado é consistente com a dinâmica das alterações
morfológicas ocorridas durante o processo de divisão celular, ou seja, a célula em processo de
mitose aumenta seu tamanho e sua complexidade e ao final da mitose, ambas as células-filhas
assumem uma morfologia semelhante às células progenitoras.
5.5 Análise do número de células da linhagem Saccharomyces cerevisiae ao longo da
incubação
A divisão celular intensa ao longo das 18 horas de incubação foi detectada
visualmente por meio da turvação do meio de cultura, bem como por meio do número de
eventos analisados por unidade de tempo (fluxo) durante a aquisição dos dados pela
Cont. 0 3 6 9 12 15 180
20
40
60
80
100
Tempo (horas)
Per
cen
tual
de
even
tos
da
regiã
o S
CP
erce
ntu
ald
e ev
ento
sd
a re
giã
oS
C
Tempo de incubação (horas)
a a
b, d
d
c
a a a
57
citometria de fluxo. Diante dessa observação, indagamos se a citometria de fluxo também
poderia ser utilizada para mensurar o número de células, e mesmo a concentração da
suspensão celular, após um determinado intervalo de tempo de incubação das leveduras. Vale
ressaltar que na citometria de fluxo, as células são alinhadas e interceptadas uma a uma pelo
laser, e a detecção dos sinais fluorescentes da célula, juntamente com os dados de dispersão
da luz incidente, são interpretados em conjunto como evento único. Para o observador, cada
evento pode ser considerado como uma célula e, quanto mais concentrada estiver a suspensão
celular, maior será a quantidade de eventos analisados por uma unidade de tempo (taxa de
leitura). Assim, de maneira geral, a taxa de leitura reflete a concentração da suspensão celular
analisada.
Diante do exposto, utilizou-se a citometria de fluxo para mensurar a concentração das
suspensões celulares após um determinado tempo de cultura. A estimativa do número de
células na citometria de fluxo foi avaliada analisando a quantidade de células interceptadas
pelo laser durante um intervalo fixo de tempo previamente determinado (30 segundos). A
análise das suspensões de leveduras após 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas de incubação está
demonstrada na Figura 20.
58
FIGURA 20: Avaliação no número de células por citometria de fluxo
Número de células no tempo inicial de 0 hora e após incubação nos tempos de 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas. Os
resultados foram expressos como média ± desvio padrão. Diferenças estatisticamente significativas (p< 0,05, ANOVA com post hoc de Tukey) são identificadas pelas letras diferentes (N= 7).
Essas análises foram comparadas com aquelas obtidas por técnicas convencionais
utilizadas para esse fim, tais como a espectrofotometria. Na análise espectrofotométrica, foi
utilizada uma curva padrão, obtida por meio da análise de absorbância a 650nm, de
suspensões de S. cerevisiae após uma diluição seriada de uma concentração devidamente
conhecida (Figura 21A). A partir dessa curva, foi possível mensurar a concentração das
suspensões celulares experimentais no tempo inicial de cultura e após 3, 6, 9, 12, 15 e 18
horas de incubação (Figura 21B).
O número de leveduras por mL de suspensão, após diferentes tempos de incubação
também foi avaliado por meio da contagem de células em câmera de Neubauer pelo método
de exclusão pelo Azul de Tripan. Os resultados desta análise estão demonstrados na Figura 22.
0 3 6 9 12 15 180
2
4
6
8
10
12
14
Tempo de incubação (horas)
a aa, b
b
a, b
c
d
Nú
mer
o d
e cé
lula
s (1
06/m
L)
59
FIGURA 21: Avaliação no número de células por espectrofotometria
Curva padrão da suspensão de levedura (A); número de células no tempo inicial de 0 hora e após incubação nos
tempos de 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas (B). Os resultados foram expressos como média ± desvio padrão. Diferenças
estatisticamente significativas (p< 0,05,ANOVA com post hoc de Tukey) são identificadas pelas letras diferentes
(N= 7).
0 3 6 9 12 15 180.0
0.4
0.8
1.2
1.6
2.0
2.4
2.8
0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.70
4
8
12
16
20
24
Y= 54,65X + 002648
r² = 0,9957
Absorbância
Núm
ero d
e C
élula
s (1
06/m
L)
A
B
Núm
ero d
e cé
lula
s (1
06/m
L)
Tempo de incubação (horas)
aa
a
a,ba,b
b
c
60
FIGURA 22: Avaliação no número de células por câmera de Neubauer
Número de células no tempo inicial de 0 hora e após incubação nos tempos de 3, 6, 9, 12, 15 e 18 horas. Os
resultados foram expressos como média ± desvio padrão. Diferenças estatisticamente significativas (p< 0,05,
ANOVA com post hoc de Tukey) são identificadas pelas letras diferentes (N= 7).
Diante dos resultados, foi possível verificar que os dados obtidos pela citometria de
fluxo apresentaram uma concordância na mensuração do número de células contadas ao longo
do processo de crescimento da levedura quando comparados às outras duas técnicas avaliadas,
o que pode ser comprovado pelos altos índices de correlação observados e demonstrados na
Figura 23. Esses dados reforçam o potencial da técnica de citometria de fluxo para a avaliação
do comportamento proliferativo de culturas de leveduras.
0 3 6 9 12 15 180
4
8
12
16
20
24
28
Tempo (horas)
Nº
de
Cél
ula
s viá
vei
s(x106)
Nú
mer
o d
e C
élula
s V
iávei
s (1
06/m
L)
Tempo de incubação (horas)
aa
a, b
b
a, b
c, d
d
61
FIGURA 23: Correlação do número de células
Número de células contadas por Câmera de Neubauer versus citometria de fluxo (A); Número de células
contadas por espectrofotometria versus citometria de fluxo (B).
0 3 6 9 12 150.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
0 3 6 9 12 150
5
10
15
20
25
r² = 0,9870
Núm
ero d
e cé
lula
s co
nta
das
por
Neu
bau
er(1
06/m
L)
Número de células contadas por citometria (106/mL)
r² = 0,9474
Número de células contadas por citometria (106/mL)
Núm
ero d
e cé
lula
s co
nta
das
po
r
esp
ectr
ofo
tom
etri
a (1
06/m
L)
A
B
62
63
6 DISCUSSÃO
O controle de processos e a otimização no campo da biotecnologia requer métodos
modernos para obter uma rápida avaliação dos processos metabólicos e crescimento das
células durante a fermentação (RIESEBERG et al., 2001).
Com grande impacto na comunidade científica, a citometria de fluxo permite realizar
medições de grandes quantidades de células em um curto período de tempo, de maneira que a
heterogeneidade das populações pode ser revelada e diferentes subconjuntos de células
identificados e quantificados (CÔRTE-REAL et al., 2002). Além disso, é uma técnica
multiparamétrica que pode ser usada para monitoramento em tempo real de qualquer processo
fermentativo, permitindo tomar decisões para ajustar condições de operação no decorrer do
processo (KUŘEC et al., 2009).
Em trabalhos prévios, analisando fungos do gênero Aspergillus, foi desenvolvida uma
técnica alternativa de acompanhamento do crescimento desse micro-organismo por meio da
citometria de fluxo (PEREIRA DE SOUZA et al., 2011). De acordo com os resultados, a
técnica permitiu observar diferenças morfológicas ao longo do crescimento fúngico, ainda não
detectáveis pelas técnicas convencionais como a microscopia óptica. Em outro estudo com a
linhagem A. tubingensis AN1257, além de acompanhar o crescimento fúngico por citometria
de fluxo, foi analisada a necessidade ou não de fixação desse fungo e os resultados
possibilitaram quantificar as populações de forma precisa, independente do processo de
fixação das células com paraformaldeído (RODRIGUES, 2014).
Diante dos resultados obtidos com fungos do gênero Aspergillus, e ampliando a
aplicação da citometria de fluxo nos processos biotecnológicos, o presente estudo focou na
análise do crescimento e heterogeneidade populacional de uma linhagem comercial de
leveduras utilizadas na produção de cervejas, tendo em vista a possibilidade de inclusão dessa
ferramenta na análise de parâmetros ligados ao controle de qualidade do processo produtivo
da bebida, tais como: i) possibilidade de avaliar o percentual de contaminação ou presença de
levedura selvagem ao longo do processo fermentativo; ii) capacidade de avaliar, de maneira
individualizada, uma grande quantidade de células e seus parâmetros fenotípicos durante o
crescimento; iii) acompanhar a produção de cervejas que utilizam mais de uma cepa de
levedura, iv) acompanhar a eficiência da proliferação das leveduras em determinadas
condições (altos teores de álcool ou adição de insumos diversos na cerveja em fermentação).
64
Visto que a espécie Saccharomyces cerevisiae se reproduz assexuadamente por
brotamento ou gemulação, e durante o processo de brotamento, o núcleo se divide por
constrição e parte dele, bem como outras organelas, entram no broto (LEGRAS et al.,2007;
CARVALHO et al., 2006) foi possível, pela citometria de fluxo demonstrar o decaimento da
intensidade da sonda fluorescente, utilizada para análise de proliferação celular, ao longo do
tempo de incubação da levedura (Figura 14). Esse resultado foi confirmado com a marcação e
decaimento desse corante pela técnica de microscopia confocal como evidenciado na Figura
11. No entanto, sempre que a técnica for utilizada, é necessário avaliar o intervalo de tempo
em que se deseja verificar o fenômeno do decaimento de CFSE, visto que cada levedura tem
um tempo específico para divisão celular. Em nosso estudo, por exemplo, verificamos que em
tempos superiores a 18 horas, não foi possível verificar a marcação com o referido corante.
Após 24 e 30 horas, as células já se apresentavam, mesmo tendo sido marcadas no início do
experimento, como àquelas do grupo controle não corado.
Verificou-se também no presente estudo, que as alterações morfológicas do processo
de brotamento da linhagem Saccharomyces cerevisiae podem ser estudadas por citometria de
fluxo, visto que as células proliferaram apresentando diferenças em complexidade celular e
morfologia, sendo então separadas por tamanho na fase de brotamento (Figura 18). Os
resultados baseados em tamanho e complexidade celular demonstraram um perfil cíclico,
característico das alterações morfológicas observadas ao longo da multiplicação de leveduras.
Ou seja, ao longo da proliferação, células progenitoras modificam sua conformação para dar
origem a duas novas células filhas, sendo essas, uma vez formadas, morfologicamente
semelhantes à célula progenitora antes de iniciar a divisão celular (MADIGAN et al., 2010).
Em nossa análise, foi possível quantificar o percentual de células no início do processo de
divisão, bem como a redução desse percentual após um intervalo de 3 e 6 horas,
correspondente às células que perderam suas características iniciais e migraram para uma
região fora da demarcação estabelecida (região SC). Esses dados permitiram inferir que a
cepa comercial de S. cerevisiae completou seu processo mitótico próximo de 6 horas (doble
time ou tempo de geração).
Embora os resultados apresentados aqui tenham sido satisfatórios para a proposição da
técnica como uma ferramenta útil na análise morfológica das leveduras, os dados obtidos
também revelaram a necessidade de adoção de medidas, tais como a sincronização do
processo de proliferação celular, que proporcione maior definição entre as células
65
progenitoras nas fases inicial e intermediária/final do processo mitótico. Como pode ser
observado nos gráficos da Figura 18 e 19, a região SC estabelecida apresenta claramente, no
tempo 0, populações diferentes em termos de tamanho, que certamente se encontram em
etapas diferentes da mitose.
As análises realizadas por citometria de fluxo permitiram também mensurar o número
de células ao longo do tempo de incubação, o que coloca a técnica como um método
promissor e alternativo para estudos quantitativos (Figura 22). A alta correlação entre as
células contadas pela citometria de fluxo e aquelas contadas em câmara de Neubauer e pela
espectrofotometria confirma o potencial da técnica para esse fim (Figura 23) (SAMPAIO,
2007). Outra abordagem possível para se mensurar a concentração de uma suspensão de
leveduras seria utilizar suspensões celulares com concentrações distintas e conhecidas e
submetê-las à análise por citometria de fluxo para quantificar a taxa de leitura, que representa
um número de células contadas em uma unidade definida de tempo. Dessa forma, uma
suspensão menos concentrada geraria uma taxa de leitura menor do que as suspensões mais
concentradas. Esses parâmetros poderiam ser utilizados para a construção de curvas padrões
que serviriam para a determinação de suspensões celulares com concentração desconhecida.
Questionamentos sobre esse tipo de análise poderiam ser levantados uma vez que é possível,
principalmente em suspensões celulares muito concentradas, a contagem de leveduras
agregadas. Essas aglomerações poderiam ser contabilizadas como um único evento, ou seja,
uma única célula. No entanto, existem maneiras de minimizar esse erro avaliando-se o sinal
de voltagem gerado quando as células são interceptadas pelo laser. O sinal de voltagem
gerado quando uma célula é interceptada, de maneira individual, pela fonte de laser, apresenta
uma altura, largura e área bem definidas. No entanto, quando duas células agregadas são
interceptadas, o sinal de voltagem sofre alteração em pelo menos um desses parâmetros
(altura, largura ou área). Durante a aquisição de dados pela citometria de fluxo, é possível
configurar o equipamento para identificar e excluir os sinais de voltagem que fogem ao
padrão de células individualizadas, e dessa forma garantir a confiabilidade dos resultados
obtidos ((TUCHIN, 2011; BASIJI et al., 2007).
Estudos prévios conduzidos por Boyd e colaboradores (2006) demonstraram o
potencial da citometria de fluxo no controle de processos biotecnológicos na produção de
cerveja. Nessa investigação os autores propõem um método para a determinação citométrica
66
da viabilidade de leveduras por meio da utilização da sonda fluorescente oxonol, um corante
lipofílico e aniônico que acumula no citoplasma de células mortas. Após a incubação das
leveduras, obtidas do processo de fermentação do mosto cervejeiro, com o referido corante,
foi possível determinar o percentual de células fluorescentes (mortas) e não fluorescentes
(viáveis). Esse ensaio se mostrou mais sensível e reprodutível quando comparado ao ensaio
clássico utilizando-se a marcação das células com o corante azul de metileno, seguido de
análise microscópica. Segundo os autores, a possibilidade de análise de um grande número de
células pela citometria de fluxo foi um fator preponderante na reprodutibilidade dos dados.
O presente estudo teve como principal objetivo a proposição da citometria de fluxo
como uma técnica alternativa para a análise do crescimento e heterogeneidade populacional
de leveduras comerciais de S. cerevisiae. No entanto, a citometria de fluxo também possibilita
a avaliação de diversos outros parâmetros, sejam eles fisiológicos e bioquímicos, de maneira
simultânea, ao longo de processos biotecnológicos. A utilização de anticorpos específicos
conjugados a fluorocromos e direcionados para marcadores celulares específicos da estrutura
celular, bem como a utilização de substâncias capazes de emitir fluorescência após a ação de
enzimas presentes no interior das células, faz com que a citometria possa ser utilizada para a
observação de diversos mecanismos moleculares que possam influenciar no processo
produtivo biotecnológico, tais como a expressão e atividade de enzimas, bem como a
produção de metabólitos de interesse. Nesse sentido, a citometria de fluxo, além de
possibilitar a análise do processo fermentativo como demonstrado aqui, abre perspectivas para
investigações futuras em outras áreas biotecnológicas.
67
7 CONCLUSÕES
A partir dos resultados obtidos, corantes normalmente utilizados para avaliação de
proliferação de células humanas, também podem ser usados para avaliar o crescimento da
levedura, uma vez que através da citometria de fluxo, por meio da marcação intracelular do
fluorocromo CFSE, foi capaz de demonstrar o decaimento da fluorescência do fluorocromo
específico para análise de proliferação celular ao longo do tempo de incubação da levedura
Saccharomyces cerevisiae.
A citometria de fluxo foi capaz de demonstrar diferenças morfológicas ao longo do
processo fermentativo, através das alterações no tamanho e complexidade interna de células
em crescimento. Verificou-se também que as análises realizadas em tempos menores (de 3 em
3 horas de incubação) obteve melhor configuração observada para o estudo da população
celular de interesse.
A técnica de citometria de fluxo também foi utilizada para mensurar o número de
células ao longo do processo de multiplicação de leveduras, demonstrando que a citometria de
fluxo pode ser um método multiparamétrico interessante e alternativo para estudos
quantitativos e principalmente com a capacidade de análise de um número expressivo de
células.
De acordo com os dados obtidos no presente estudo concluiu-se que a análise do
comportamento proliferativo, tais como crescimento celular, tamanho e granulosidade
(complexidade) de S. cerevisiae foram possíveis de ser realizada por citometria de fluxo. A
possibilidade de uso de sondas fluorescentes para marcação intracelular dessa levedura
também abriu perspectivas para o uso da técnica para detecção ou quantificação de outros
parâmetros bioquímicos e fisiológicos de interesse biotecnológico.
68
69
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