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TEXTO PARA DISCUSSÃO N O 363 CAIC: Solução ou Problema? José Amaral Sobrinho Marta Maria de Alencar Parente JANEIRO DE 1995

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TEXTO PARA DISCUSSÃO NO 363

CAIC: Solução ouProblema?

José Amaral SobrinhoMarta Maria de Alencar Parente

JANEIRO DE 1995

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

O IPEA é uma fundação pública vinculada aoMinistério do Planejamento e Orçamento, cujasfinalidades são: auxiliar o Ministro dodo Planejamento e Orçamento naelaboração e no acompanhamento da políticaeconômica e prover atividades de pesquisaeconômica aplicada nas áreas fiscal,financeira, externa e de desenvolvimentosetorial.

PRESIDENTEAndrea Sandro Calabi

DIRETOR EXECUTIVOAntonio José Guerra

DIRETOR DE ADMINISTRAÇÃOAdilmar Ferreira Martins

DIRETOR DE PESQUISAClaudio Monteiro Considera

DIRETOR DE POLÍTICAS PÚBLICASLuís Fernando Tironi

DIRETORA DE PROJETOS ESPECIAISAnna Maria Peliano

DIRETOR DE TREINAMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL — CENDECAdroaldo Quintela Santos

TEXTO PARA DISCUSSÃO tem o objetivo de divulgar resultadosde estudos desenvolvidos direta ou indiretamente pelo IPEA,bem como trabalhos considerados de relevância para disseminaçãoatravés do Instituto, informando profissionais especializados ecolhendo sugestões.

Tiragem: 200 exemplares

SERVIÇO EDITORIALBrasília — DF:SBS Q. 1, Bl. J, Ed. BNDES — 10o andarCEP 70.076-900

Av. Presidente Antonio Carlos, 51 — 17o andarCEP 20.020 - 010 —- Rio de Janeiro — RJ

SUMÁRIO

I. APRESENTAÇÃO

II. HISTÓRICO DO PROGRAMA

III. O QUE É O PRONAICA

IV. SITUAÇÃO ATUAL

V. ANÁLISE DO PROGRAMA

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

BIBLIOGRAFIA

CAIC: SOLUÇÃO OU PROBLEMA?

José Amaral Sobrinho*Marta Maria de Alencar Parente*

* Técnicos da Diretoria de Projetos Especiais do IPEA

A produção editorial deste volume contou com o apoio financeiro do PNUD (Projetos BRA 92/029 eBRA 91/016) e do Programa de Gerenciamento do Setor Público — Gesep/BIRD.

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I. APRESENTAÇÃO

Este estudo tem por objetivo analisar a situação atual do Programa Na-cional de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente — Pronaica, apartir de seus pressupostos, objetivos, estratégias e primeiros resultados.

O documento descreve inicialmente o programa abordando sua con-cepção, objetivos, diretrizes, estratégias e estrutura programática e a si-tuação em que hoje se encontra em termos de implantação. Ao final,apresenta uma análise do modelo de atendimento proposto e de seusresultados e problemas.

As considerações e conclusões apresentadas fundamentam-se na análiseda proposta do programa e em dados disponíveis em relatórios sobre oPronaica, elaborados pela Secretaria de Projetos Educacionais Especiais -Sepespe, do Ministério da Educação e do Desporto.

II. HISTÓRICO DO PROGRAMA

Como parte de suas políticas sociais, o governo federal propôs-se a des-envolver, a partir de 1990, ações integradas de educação, saúde, assis-tência e promoção social para crianças e adolescentes, como forma deassegurar melhores condições de vida a este segmento da população.

A prioridade dada às crianças e adolescentes se fundamenta na Consti-tuição Federal de 1988 e em compromissos assumidos pelo governo bra-sileiro em diversos forosinternacionais.1

Esses compromissos ganharam especial atenção nos países em desenvol-vimento, em que os problemas econômicos afetam as crianças de duasmaneiras: primeiro, pelos escassos investimentos na área social; e, segun-do, pelo desemprego ou subemprego que, ao reduzir a renda, reduz acapacidade da família de garantir a sua sobrevivência e de prover oscuidados básicos dos filhos.

No Brasil, os indicadores sociais demostram uma situação indesejável. Em1990, segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios(PNAD/IBGE), o país contava com uma população de 60 milhões de cri-anças e adolescentes na faixa etária de zero a 17 anos, o que representa41% do total de habitantes. Desse total, 15 milhões encontravam-se nafaixa de indigência, disseminados por todo o território nacional; no Nord-este, na área rural, concentrava-se um terço de todas as crianças eadolescentes que vivem em situação de extrema pobreza.

1 Encontro Mundial de Cúpula pela Criança, realizado na sede das Nações Unidas, em 1990, no qual foi aprovada a Declaração

Mundial sobre a Sobrevivência, a Proteção e o Desenvolvimento da Criança e adotado o Plano de Ação para a sua implementa-ção nos anos 90.

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O contínuo processo migratório do campo para a cidade, bem como en-tre as regiões, tem contribuído para o agravamento da situação de po-breza nos grandes centros urbanos, colocado milhares de crianças eadolescentes em situação de abandono ou provocado sua incorpora-ção precoce ao mundo do trabalho.

É bastante significativo o contingente de crianças e adolescentes queexercem uma atividade econômica. Mesmo sendo um fenômeno mais in-tenso nas zonas rurais,o trabalho infantil nos grandes centros urbanos aumentou bastante nos úl-timos anos, tendo como um dos fatores agravantes desta situação a de-terioração das condições de trabalho. Forçados a uma jornada de tra-balho muitas vezes superior a 40 horas semanais, com salários muito bai-xos e sem nenhuma garantia trabalhista, as crianças se vêem obrigadas ainterromper os seus estudos, em um processo contínuo de abandono eretorno à escola. Esta situação onera os custos do sistema educacionale reduz a sua eficácia.

Associada a esta situação, apresenta-se igualmente grave o reduzidotempo de permanência das crianças e dos adolescentes na escola, oque dificulta o alcance dos objetivos educacionais que se espera.

Dessa forma, embora a década de 80 registre um crescimento expressivoda escolarização na faixa etária dos 7 aos 14 anos, o mesmo não ocorrecom as taxas de evasão e repetência, que permanecem altas, assimcomo o baixo índice de conclusão do ensino de 1

o grau.

Dentro desse contexto, e como resposta aos compromissos assumidos, ogoverno federal criou, em 14 de maio de 1991, o Projeto Minha Gente,com o objetivo de desenvolver ações integradas de educação, saúde,assistência e promoção social e dinamizar as políticas sociais básicas deatendimento à criança e ao adolescente.

Com estas ações, o governo federal se propôs a reduzir os efeitos nega-tivos da pobreza sobre as crianças e adolescentes que habitam as perife-rias dos maiores aglomerados urbanos do país.

O modelo proposto teve as seguintes características: atendimento socialintegrado em um mesmo local; atendimento em tempo integral; envolvi-mento comunitário;desenvolvimento de programas de proteção à criança e à família; gestãodescentralizada; e, como característica principal, a implantação de uni-dades físicas — o Centro Integrado de Atenção à Criança e ao Adoles-cente — CIAC. Este centro previa o atendimento em creche pré-escola eensino de primeiro grau; saúde e cuidados básicos; convivência comuni-tária e desportiva.

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A meta definida foi a contrução de cnco mil CIAC's para atender aaproximadamente seis milhões de crianças, sendo 3,7 milhões em escolasde primeiro grau e 2,3 milhões em creches e pré-escolas.

O programa foi concebido originariamente pela Legião Brasileira de Assis-tência, com coordenação a cargo do Ministério da Criança e, posterior-mente, da Secretaria de Projetos Especiais da Presidência da República.

Com a extinção da Secretaria de Projetos Especiais da Presidência daRepública, o Ministério da Educação e do Desporto criou, em 1992, a Se-cretaria de Projetos Educacionais Especiais para dar continuidade aoprojeto.

O Ministério da Educação e do Desporto, ao assumir as ações do projeto,introduziu algumas modificações em sua concepção e mudou sua deno-minação para Programa Nacional de Atenção Integral à Criança e aoAdolescente — Pronaica. O programa continuou adotando o atendi-mento integral à criança como forma alternativa para o desenvolvimentodessa população, admitindo, no entanto, que tal atendimento pode serdado em instalações especialmente construídas ou adaptadas.

A ênfase conferida pelo MEC à pedagogia da atenção integral e àsformas de desenvolvê-la refletiu-se na alteração do nome dado às uni-dades de serviços especialmente construídas ou adaptadas para essefim. Na denominação adotada pelo Projeto Minha Gente (CIAC), desta-cava-se a característica arquitetônica do centro integrado. Com o nomeCentro de Atenção Integral à Criança — CAIC, a tônica desloca-se parao atendimento integral, que “ requer a adoção de pedagogia própria in-dependente do espaço físico a ser utilizado” .2

O objetivo do programa continua sendo a superação dos problemas en-frentados por grande parcela da população infantil carente, na faixaetária de zero aos 14 anos,garantindo-lhes seus direitos fundamentais e seu desenvolvimento inte-gral, com vistas ao seu preparo consciente para o exercício da cidada-nia.

Seus objetivos mais específicos são:

a) a melhoria da situação educacional, especialmente em relação aoensino de1

o grau, com repercussões sobre a formação da criança e do adoles-

cente e a iniciação para o trabalho;

b) a difusão da pedagogia da atenção integral e sua assimilação pelarede de serviços sociais básicos;

2 MEC/Sepespe, 1994.

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c) a redução da taxa de mortalidade infantil e a ampliação dos níveis deexpectativa de vida;

d) a melhoria das condições de saúde, mediante a atenção especial acrianças e adolescentes;

e) a redução do nível de violência contra crianças; e

f) a promoção social das comunidades atendidas.

O Pronaica absorveu toda a estrutura organizacional, o acervo patrimo-nial, a programação orçamentária e financeira aprovada para o ProjetoMinha Gente, os planos plurianuais de investimentos e os ativos e passivosdo projeto, ficando sua administração e execução a cargo da Secretariade Projetos Educacionais Especiais do Ministério da Educação e do Des-porto, criada para esse fim.

Com o Pronaica o Ministério da Educação e do Desporto propõe-se aatender, até o ano 2003, a 1,2 milhão de crianças e adolescentes, dasáreas urbanas periféricas, em programas de atenção integral, em traba-lho conjunto com as secretariasestaduais e municipais de Educação. Esse compromisso está contido noPlano Decenal de Educação para Todos.

III. O QUE É O PRONAICA

O Pronaica é um programa do Ministério da Educação e do Desportocriado para coordenar o desenvolvimento de ações de atenção integralà criança e ao adolescente, de forma descentralizada, articulada e in-tegrada, por meio de órgãos federais, estaduais e municipais, organiza-ções não-governamentais e com a cooperação de organismos internaci-onais.

III.1 DIRETRIZES E ESTRATÉGIAS

O Ministério da Educação e do Desporto definiu como diretrizes doprograma:

a) a garantia do direito da criança ao pleno desenvolvimento desuas capacidades e potencialidades;

b) a universalização do atendimento às necessidades básicas dacriança e do adolescente, embora priorizando medidas voltadasà população mais pobre e sem assistência;

c) a oferta de serviços de qualidade para as crianças, em oposiçãoa soluções precárias e improvisadas, parciais, descontínuas emeramente assistencialistas;

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d) a irradiação e a disseminação de novas tecnologias, adequadasà atenção integral;

e) a intersetorialidade, a intercomplementaridade, a articulação deações;

f) a descentralização das ações, pela ação compartilhada entreUnião, estados e municípios e entre os diversos setores sociais e acomunidade, e o compartilhamento de responsabilidades; e

g) a flexibilidade em termos normativos, programáticos e gerenciais.

Estas diretrizes visam garantir o atendimento integral à criança e aoadolescente, a intersetorialidade e a participação comunitária, ouseja, a atenção integral entendida como "co-responsabilidade doEstado, da sociedade e da família e consubstanciada na integraçãode ações e serviços voltados para o atendimento das necessidadesde desenvolvimento integral da criança nos aspectos físico, psíqui-co, intelectual e de socialização".3

A estratégia básica do programa é a implantação gradativa dapedagogia da atenção integral nas escolas da rede oficial, estaduale municipal, consti-tuída por diferentes modalidades que podem ser adotadas, conco-mitante ou separadamente, conforme as necessidades e disponibili-dades locais, tais como:

a) articulação e integração de serviços e experiências locais já exis-tentes;

b) adequação e melhoria de espaços físicos e equipamentos sociaisdisponíveis;

c) construção de unidades de serviços especiais para a oferta daatenção integral, ou seja, os centros de atenção integral à crian-ça — CAIC's (integração físico-espacial);

d) administração participativa integrada; e

e) financiamento compartilhado.

Ainda segundo orientação do programa, a construção do centrosintegrados de atenção à criança é concebida como a última alter-nativa para o atendimento integral, "devendo ser adotada somentequando indispensável".4

3 MEC/Sepespe, op. cit.

4 MEC/Sepespe,op.cit.

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III.2 ESTRUTURA PROGRAMÁTICA

O programa está subdividido em subprogramas que integram açõesde natureza finalística e instrumental. Os subprogramas de naturezafinalística são:

� Proteção Especial à Criança e à Família;

� Promoção da Saúde da Criança e do Adolescente;

� Educação Infantil (creche e pré-escola);

� Educação Escolar;

� Esportes;

� Cultura;

� Educação para o Trabalho;

� Alimentação.

Os subprogramas de natureza instrumental, que perpassam todos osdemais programas, são:

� Suporte Tecnológico;

� Gestão;

� Mobilização.

O desenvolvimento das ações de cada subprograma está pautadonas seguintes orientações:

a) o atendimento à criança e ao adolescente é prioritário, sendoadmitida a extensão ao núcleo familiar a que pertencem e aogrupo social como um todo;

b) os subprogramas desenvolvem-se de forma integrada, sem pre-valência de um sobre o outro, com a utilização de todos os meiose recursos disponíveis;

c) a ação integrada supõe a articulação entre os diversos subpro-gramas e ações, assim como a articulação das agências empe-nhadas no processo — família, sociedade e Estado — , entre astrês esferas do poder público — União, estados e municípios — eentre os diversos setores sociais envolvidos, tais como educação,saúde, assistência social, trabalho, justiça, cultura e esporte;

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d) os serviços de caráter inovador, a serem prestados pelos subpro-gramas, devem contar com recursos humanos com formaçãoadequada; e

e) nos CAIC's, em qualquer das alternativas de implantação, cadasubprograma tem um núcleo de serviços correspondente.

III.3 FINANCIAMENTO

A responsabilidade pelo financiamento do Pronaica é compartilha-da entre o governo federal, os estados, os municípios e a comuni-dade local.

O governo federal tem como principais responsabilidades no pro-grama: a elaboração do projeto arquitetônico e de engenharia; aconstrução da estrutura física; os equipamentos; a manutenção dasequipes de coordenação geral e técnica; a realização de pesquisaspara a avaliação do programa; a assistência ao estudante pelosprogramas da Fundação de Assistência ao Estudante — FAE (Ali-mentação; Livro Didático; Material Escolar e Bibliotecas Escolares ).

Aos governos estaduais compete assegurar os recursos humanos ne-cessários ao funcionamento — dirigentes e docentes — e compar-tilhar com os municípios as despesas de operação e manutençãodos CAIC's.

Aos municípios competem a aquisição do terreno e a manutençãodos CAIC's, com o uso de recursos próprios ou do apoio financeiroestadual, de organismos privados e da comunidade local.

As formas e a dimensão da participação das diferentes instânciasgovernamentais, bem como da comunidade, devem ser definidas enegociadas em função da disponibilidade individual de cada par-ceiro, embora a responsabilidade de implantação do programa sejatomada diretamente pelo estado, conforme acordo assinado entrea Secretaria Estadual de Educação e o Ministério da Educação e doDesporto. Com este acordo, o estado fica comprometido com oMEC pela implantação e pelo acompanhamento do Pronaica. Cabeao estado repassar aos municípios a responsabilidade pela manu-tenção e o gerenciamento das ações do programa e, quando for ocaso, do CAIC em nível local.

III.4 RECURSOS HUMANOS

O programa considera os recursos humanos o vetor principal para aefetiva integração e a qualidade dos serviços. Com essa compre-ensão, o recrutamento do pessoal necessário à composição do seuquadro funcional é definido nas seguintes bases:

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� mobilização para o engajamento no programa;

� recrutamento de pessoal de preferência em nível local;

� estímulo especial ao quadro de profissionais do Pronaica sem,contudo, discriminar outros recursos humanos;

� valorização dos profissionais que atuam no Pronaica, enquantoagentes de mudança; e

� treinamento de multiplicadores para a constituição de equipesregionaise locais.

Como se trata de um conjunto de ações a serem desenvolvidas deforma integrada e a partir de pedagogia própria, todos os profissio-nais são treinados, desde o professor ao auxiliar administrativo, pas-sando pelo médico, o psicó-logo, o assistente social, o nutricionista e o cozinheiro, para que asdiretrizes de integração e qualidade dos serviços sejam alcançadas.

Para o funcionamento integral de um CAIC padrão AA12 (12 salasde aula) são necessárias 160 pessoas, entre profissionais de diferen-tes áreas de formação e níveis de qualificação.

O programa prevê, para a contratação desses profissionais, a ado-ção do mesmo regime de contratação utilizado pela rede já exis-tente. Em situações específicas, o processo de contratação poderáassumir formas diferenciadas, sem o aproveitamento de funcionáriosestaduais ou municipais.

III.5 O PROJETO SOCIAL

Para participar do programa, os estados e municípios devem ela-borar o Projeto Social, que vem a ser um conjunto de subprogramase ações detalhados e adequados a partir de um estudo inicial sobrea comunidade na qual se propõe a implantação do Pronaica.

O Projeto Social tem como eixo a análise da situação da infância eda adolescência na localidade, e contém a caracterização geralda comunidade, informações sobre os serviços sociais existentes, di-agnósticos da situação atual e a proposta de atenção integral acrianças e adolescentes, em termos programáticos e operacionais.

O Projeto Social constitui um primeiro passo para o desenvolvimentodo programa, em nível local.

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IV. SITUAÇÃO ATUAL

IV.1 IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA — QUADRO GERAL

O Pronaica até o momento vem desenvolvendo apenas a estratégiade criação de infra-estrutura básica para o funcionamento dos cen-tros integrados de atenção à criança e ao adolescente, não tendoainda utilizado instalações já existentes para o alcance de seus ob-jetivos.

O processo de criação e construção dos CAIC's é coordenado emnível central pelo Ministério da Educação e do Desporto, pela suaSecretaria de Projetos Educacionais Especiais— Sepespe, a quemcabe a responsabilidade institucional pelo financiamento e a cons-trução dos centros.

Em função dessa situação, este item retrata apenas a situação doprograma em relação aos CAIC's.

Dos cinco mil CAIC's previstos para serem implantados nos 600 mai-ores aglomerados urbanos (meta prevista pelo Projeto Minha Gen-te), o MEC assumiu como meta de curto prazo, para o período1993/1994, a construção de 423 CAIC's em diversas regiões do país.

Até a presente data, existem 359 CAIC's em diferentes estágios deimplantação. Destes, 148 encontram-se em obras (41%); 81 já foramconcluídos (22,5%); 81, inaugurados (22,5%); 47 estão com constru-ção já autorizada (13%) e dois, com a construção suspensa (0,5%).Existem ainda 64 unidades programadas, cujas obras ainda não fo-ram autorizadas (ver Quadros 1, 2 e 3, em anexo).

Segundo informações colhidas junto ao MEC, todos os CAIC's comconstrução já concluída, inaugurados ou não pelo MEC, estão emfuncionamento total ou parcial.

IV.2 IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA POR REGIÃO

Dos 359 CAIC's em processo de implantação, 238 (65%) estão con-centrados nas regiões Sudeste e Nordeste.

Na região Sudeste existem atualmente 57 CAIC's construídos e emfuncionamento, 69 em obras, 15 com construção autorizada e doiscom construção suspensa.

Na região Nordeste existem 40 CAIC's construídos e em funciona-mento, 37 em obras e 18 com construção autorizada, num total de95 unidades.

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A região Sul ocupa o terceiro lugar em número de unidades em im-plantação, com um total de 86. Desse total, 55 já foram concluídose encontram-se em funcionamento, 25 encontram-se em obras eseis, com construção autorizada.

Na região Centro-Oeste estão sendo implantados 29 CAIC's: 10 jáforam construídos e encontram-se em funcionamento, 14, em obrase cinco, com construção autorizada.

A região Norte é a menos beneficiada pelo programa; conta ape-nas com seis CAIC's, sendo três em obras e três com construção au-torizada.

Quanto a equipamento e instalações, dados fornecidos peloMEC/Sepespe indicam que 162 CAIC's em funcionamento encon-tram-se parcialmente equipados.

Embora existam vários CAIC's que já funcionam há mais de quatroanos, inclusive no Distrito Federal, como é o caso do CAIC Samam-baia I ( o quarto a ser inaugurado ), no momento não dispomos deinformações relacionadas a seu funcionamento, administração egestão. O MEC iniciou um primeiro levantamento e já dispõe de al-gumas informações, coletadas diretamente junto aos CAIC's, que seencontram em fase de tratamento e análise; assim, não estão dis-poníveis.

A capacidade de atendimento de cada CAIC em construção nestaetapa do programa é de 864 alunos em dois turnos no primeiro grau,234 alunos em dois turnos na pré-escola e 30 crianças na creche emtempo integral, o que perfaz um total de 1.128 pessoas atendidas.

Se o MEC continuar mantendo este padrão de construção — CAICcom 12 salas — , quando as 423 unidades de serviço estiverem emfuncionamento serão atendidos cerca de 477 mil alunos.

IV.3 IMPLANTAÇÃO DOS SUBPROGRAMAS NOS CAIC'S

De acordo com a primeira coleta de dados básicos realizada pelaSepespe nos 146 CAIC's em funcionamento, os 80 que já responde-ram ao levantamento apresentam os seguintes subprogramas finalís-ticos implantados: de proteção especial à criança e à família, em 18CAIC's; de saúde da criança e do adolescente, em 22; de educa-ção infantil (creche e pré-escola), em 142; de educação escolar(ensino de primeiro grau), em 146; de esporte, em 45; de cultura, em44; de educação para o trabalho, em 24; e de alimentação, em 130.

Ainda de acordo com a mesma fonte, dos subprogramas instrumen-tais, o componente gestão foi implantado em 135 CAIC's; mobiliza-

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ção e participação, em 27; e suporte tecnológico, parcialmente,nos 146 CAIC's em funcionamento.

IV.4 CUSTO DE CONSTRUÇÃO E EQUIPAMENTOS

De acordo com informações obtidas junto ao MEC, a construção deum CAIC padrão AA12,5 com 4. m2 de área construída, tem custa-do, em média, ao governo federal, US$ 2 milhões, sem incluir o custodo terreno, que é de responsabilidade da prefeitura, e cujo tama-nho padrão é de 16 mil m2. Dependendo da região, registra-se umavariação no preço da obra, basicamente em função de fatores lo-cais que influenciam na construção.6

O custo para equipar um CAIC tem se situado na faixa de US$ 200mil, o que significa que o custo total de uma unidade de serviço,construída e devidamente equipada, corresponde, em média, acerca de dois milhões e duzentos mil dólares.

IV.5 O CUSTO/ALUNO EM UM CAIC — UMA REFERÊNCIA

Não foi possível precisar neste trabalho o custo real de um alunomatriculado no ensino regular de 1

o grau oferecido pelo CAIC, de-

vido à insuficiência de informações mais detalhadas sobre os pro-cedimentos técnicos adotados e a natureza das despesas tomadaspara o cálculo desse custo. Entretanto, o MEC apresenta algumasreferências, relacionadas aos aspectos de custo/aluno, obtidas emlevantamentos realizados pelo ministério, que indicam um custo mé-dio — de uma criança, em escola pública das regiões Sul e Sudeste— de aproximadamente U$ 200/ano.7

Os cálculos básicos feitos pela Sepespe para o atendimento deuma criança assistida por um CAIC em tempo integral, inclusivematriculada no ensino de 1

o grau, coloca este custo no patamar de

U$ 600/ano. Dividindo os U$ 600/ano por 12 meses, tem-se um custoaproximado de U$ 50/usuário/mês, o que representa um cus-to/aluno/dia de U$ 2, considerando-se um atendimento de 25 di-as/mês.

Segundo informação da Sepespe, estão incluídos nesses custos osgastos com todos os serviços prestados pelo CAIC, bem como oatendimento em tempo integral prestado ao aluno durante 200 diasletivos, e, nos demais dias do ano, à comunidade.

5 Padrão AA12 corresponde à especificação argamassa armada com 12 salas de aula.

6 MEC/Sepespe/CAT, maio de 1994.

7 MEC/Sepespe, op.cit.

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O MEC, ao definir as despesas com a manutenção de uma criançaou adolescente, computou os gastos com os diferentes subprogra-mas que compõem o Pronaica, embora esses custos não represen-tem, necessariamente, a soma de todos os subprogramas.

Cabe observar que, com a atenção integral, o MEC acredita supe-rar os problemas existentes em relação ao atendimento feito emuma escola comum, "cujos custos — considerados os fenômenos daevasão e da repetência — , assumem para a sociedade valores mui-to mais altos".8

V. ANÁLISE DO PROGRAMA

V.1 CONCEPÇÃO, PRESSUPOSTOS E OBJETIVO

O programa tem seu objetivo, suas estratégias, seus pressupostos eseus fundamentos. Seu objetivo é a "superação das carências dascrianças e dos adolescentes". Suas estratégias: "a integração dosserviços", "o atendimento integral", "a participação da comunidade"e "a gestão local pelas prefeituras e instituições comunitárias". Seuspressupostos: a inovação e a flexibilidade. Seus fundamentos estãocentrados na urgência de reverter as precárias condições de vidade parte das crianças e adolescentes brasileiros, nos posicionamen-tos e compromissos internacionais e na Constituição Federal de1988, que estabelece nos seus dispositivos relativos à área social im-portância primordial a essa questão, para o que o Estado deverá as-sumir e dispensar apoio e atenção especiais, provendo os meios ne-cessários pelo desenvolvimento de programas de assistência social àcriança e ao adolescente.

O programa declara a intenção de se colocar como fator de super-ação de problemas, como integrador dos serviços sociais, flexível,inovador e moldado pela comunidade e gerido localmente pelasprefeituras, com a ajuda das instituições comunitárias.

Um programa com tais características e dimensão levanta inicial-mente a questão de sua capacidade de resposta aos problemasque propõe solucionar.

A superação dos problemas das crianças e dos adolescentes e desuas famílias extrapola a capacidade de atuação do programa. Es-ses estabelecimentos podem amenizar, em alguns aspectos, os pro-blemas emergenciais das crianças e adolescentes que terão acessoa seus programas, sem, contudo, alterar essa realidade.

8 MEC/Sepespe,op.cit.,p.32.

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Há alguns equívocos e simplificações nas estratégias propostas e nospressupostos que tornam o programa bastante vulnerável e de difícilexecução:

a) A concentração e integração dos serviços básicos têm sua lógicaao possibilitar às crianças e adolescentes o recebimento de aten-dimento diversificado. Por outro lado, essa integração "intra-muros" não leva em consideração outros projetos em desenvolvi-mento pelo setor público, nas mesmas áreas, que, provavelmente,têm como alvo a mesma clientela do CAIC. Essa duplicação deações e de estruturas administrativas, além de onerar os custospara o setor educacional, gera fragmentação de ações e cria di-ficuldades para uma efetiva coordenação do programa.

A interdisciplinaridade das ações, resultado da integração dos servi-ços básicos, é de difícil operacionalização, em razão da própria es-trutura do setor público, cujos serviços são organizados de formasetorizada, como educação, saúde, assistência e outros.

Esta setorização também se estende à estrutura orçamentária e aofinanciamento. Há, assim, competências bem delimitadas, meca-nismos e procedimentos bem definidos e diferenciados que, certa-mente, não serão modificados pelas propostas do programa.

Para exemplificar a complexidade de se administrar a intersetoriali-dade pode-se citar o fato de que os recursos do salário-educação,que os estados e municípios compartilham com o governo federal, eque constituem a principal fonte de recursos para a manutenção doensino de primeiro grau, somente podem ser aplicados, por lei, nestenível de ensino. Assim, é vedada sua aplicação em programas desaúde, lazer, esporte, desenvolvimento comunitário, creche e pré-escola.

b) O programa reconhece que a educação integral pode assumirum papelcatalizador e levar a uma nova concepção de escola, a escolacomunitária, cujo conteúdo programático deve ser flexível, adap-tado à realidade local e regional.

Estes aspectos do programa na área educacional precisam seranalisados com cautela.

Em primeiro lugar, seria conveniente fazer uma distinção entre edu-cação integral e escola de tempo integral.

A educação integral implica a integração, no ambiente escolar, devários conteúdos e atividades, ampliando-se o leque de conheci-mento e vivência de alunos. Escola de tempo integral é aquela quepermite ao aluno a permanência na escola nos turnos da manhã e

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da tarde. Esta ampliação da permanência pode facilitar o atendi-mento educacional mais integrado, pela possibilidade dos alunos seenvolverem em outras atividades.

Em segundo lugar, uma das funções da escola é transmitir à criançae ao adolescente as ferramentas básicas para a aprendizagem, ouseja, códigos de leitura, de escrita e de cálculo aritmético, bemcomo outras informações e habilidades que lhe permitam participarconsciente e ativamente na sociedade.

Para o alcance desses objetivos nacionais, a Lei de Diretrizes e Bases— LDB — definiu um núcleo comum para o currículo que não podeser substituído ou alterado ao sabor das posições locais e comunitá-rias. O apoio à criança deve levá-la a se integrar na sociedade, enão afastá-la pelo empobrecimento de seus conteúdos.

Assim, a especificidade do setor educação deve ser garantida,mesmo que a escola, por questões da situação social do país, sejautilizada como um local estratégico para se atingir uma larga faixada população infantil com outros serviços essenciais, como já vemsendo feito, por exemplo, com a alimentação escolar.

Em terceiro lugar, a escola pode ser comunitária pelas formas depropriedade, de gestão e de envolvimento, mas não pelo conteúdo,que transcende a comunidade.Isto porque a escola tem suas com-petências básicas definidas para promover o processo de aprendi-zagem, cabendo-lhe a definição de métodos de trabalho e de ensi-no adequados, de modo a atender aos conteúdos educacionaisnacionais e às especificidades regionais e locais.

c) O programa coloca seu sucesso em grande parte na comunida-de, que tem a responsabilidade de opinar, decidir e administraras ações. Cabe a ela identificar as necessidades locais e os sub-programas a implantar.

Dois alertas devem ser feitos ao se abordar a participação da co-munidade.

Participação comunitária não se cria de cima para baixo; nasce dadinâmica dos grupos comunitários no equacionamento de proble-mas e superação de carên-cias. Como exemplo, uma pesquisa feita pela Organização Mundialde Educação Pré-Escolar — Omep — , em 1988, em 7.785 programasde atendimento à criança, evidenciou a grande diversidade de insti-tuições não-governamentais, de cunho associativo, comunitário, denatureza confessional, etc., que se organizaram para atender a ca-rências de seus membros ou de setores específicos.

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Esse movimento de organização de setores da sociedade é aindapouco significativo no Brasil, sendo mais representativo nas regiõesSul e Sudeste. Pela novidade do processo e pela falta de prática nomanejo de organizações, essas instituições comunitárias enfrentamtambém diversos problemas internos. Há dissenso no âmbito dosgrupos comunitários, o que, até certo ponto, é normal, mas que, senão for bem gerenciado, transforma-se em conflito permanente e in-terfere negativamente nessas organizações, chegando a desestru-turá-las, torná-las ineficientes e até inviabilizá-las.

Assim, atribuir o sucesso de emprendimento de tal envergadura àparticipação da comunidade é delegar responsabilidade muitogrande a setores que ainda não têm estrutura e tradição para tal,bem como assumir que a comunidade aceita participar em estrutu-ras e organizações que, afinal, não nasceram por sua iniciativa.

Prevê-se a gestão do programa pelas prefeituras, o que poderá re-presentar-lhes um grande ônus: de um lado, pela falta de fôlegogerencial dos municípios (exceto das grandes capitais e alguns deporte médio) para administrar grandes organizações; e, de outro,pela falta de recursos para mantê-las funcionando com padrões deeficiência e qualidade.

d) O programa é apresentado como algo "inovador", fora dos pa-drões normais de organização dos serviços sociais, como formade lhe garantir a legitimidade e a aceitação.

Na área educacional, projetos inovadores já foram implantados,como as escolas de tempo integral na Bahia e no Distrito Federal emdécadas passadas. As escolas polivalentes implantadas com recur-sos da United States Agency for International Development — Usaidem vários estados, na década de 70, também foram inovadoras.Mais recentemente, várias secretarias de Educação dos estados in-vestiram em programas que inovaram a forma de organização dotempo e do espaço escolares, bem como a gestão e as formas deorganizar o conteúdo, buscando ampliar as oportunidades das cri-anças mais carentes.

A experiência mostra que o caráter inovador não garante o sucessodo empreendimento. As experiências citadas, apesar do caráterinovador e da excelência de seus projetos, tiveram suas instalaçõesabandonadas ou utilizadas para outros fins. A principal razão para adescontinuidade dessas inovações foi que ficaram restritas a um pe-queno percentual da rede de estabelecimentos, bem como da cli-entela à qual se destinavam. Por serem restritas, pela incapacidadefinanceira do sistema de expandi-las para toda a rede de ensino,elas acabaram se transformando em um "quisto" dentro do sistemaeducacional, tornando-se a exceção, e não a regra.

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A literatura existente sobre as questões educacionais brasileirasaponta para soluções e alternativas mais racionais e abrangentesem termos da clientela que poderá ser alcançada. São soluçõesembasadas na realidade da educação, que apontam para a ne-cessidade de um enfrentamento responsável e imediato que vise àmanutenção da universalização do ensino de 1

o grau e à melhoria

de sua qualidade.

e) O programa é discriminador, pois concentra recursos substanciaispara atendimento a uma pequena parcela da população-alvo,ou seja, crianças e adolescentes em situação de risco. Como osCAIC's estão sendo construídos em áreas urbanas, excluem daproposta as crianças e adolescentes do meio rural, apesar dascondições de pobreza e alijamento social serem ali mais intensas.

Outro aspecto que merece destaque é o custo/aluno anual de umCAIC(U$ 600), considerando que o custo médio de um aluno/ano na es-cola pública nas regiões Sul e Sudeste situa-se em torno de U$ 200.

As estatísticas educacionais mostram que cerca de 95% da popula-ção de sete a 14 anos têm acesso à escola. O grande problema éque as escolas existentes não têm qualidade e são extremamenteineficientes. A melhoria das condições de funcionamento dessas es-colas é prioridade absoluta.

O percentual de crianças que serão beneficiadas quando todos osCAIC's em processo de implantação estiverem concluídos e funcio-narem com os subprogramas previstos é bastante reduzido face aos27 milhões de crianças que freqüentam escolas públicas, aos 60 mi-lhões de crianças objeto de atenção do Estatuto da Criança e doAdolescente e aos 15 milhões de crianças economicamente margi-nalizadas. Se os recursos gastos nos CAIC's fossem utilizados paradotar as escolas já existentes de condições adequadas e dignas defuncionamento, a clientela beneficiada seria muito maior, e os efei-tos para o sistema educacional, mais permanentes e significativos.

V.2 RESULTADOS ATÉ AGORA ALCANÇADOS

O Pronaica atingiu, até o momento, apenas 7% das metas físicasprevistas na proposta original do Projeto Minha Gente que ele incor-porou, considerando-se os CIAC's/CAIC's construídos e em funcio-namento.

Quanto à implantação dos subprogramas previstos, constata-se que,nos 146 CAIC's em funcionamento, os de Educação Infantil (crechee pré-escola) e Educação Escolar (1

o grau) foram implantados na

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quase totalidade. Os demais subprogramas ainda não foram implan-tados.

O atendimento educacional nos CAIC's em funcionamento é ainda,do ponto de vista quantitativo, bastante modesto, situando-se nafaixa de 165 mil crianças. Isto representa apenas 0,6% do contingen-te que atualmente se encontra matriculado na pré-escola e no ensi-no fundamental.

Quando a totalidade dos 359 CAIC's já em processo de construçãoestiverem em funcionamento, este percentual chegará a 1,4%, tam-bém modesto face à dimensão da matrícula no pré-escolar e no en-sino de primeiro grau.

Os 130 CAIC's que implantaram o subprograma de Alimentação Es-colar fornecem, pelo menos, uma refeição diária para as criançasmatriculadas. Esse resultado está ainda longe do previsto, conside-rando-se que a proposta do Pronaica é o atendimento com três re-feições diárias para os escolares do 1

o grau, da pré-escola e, princi-

palmente, para as crianças das creches, necessitadas de maiorescuidados alimentares.

Quanto aos subprogramas que dão suporte físico, social e psicológi-co às crianças e adolescentes, objetivando assegurar melhores con-dições de saúde física (alimentação, nutrição) e psicológica, os re-sultados não são também satisfatórios. Dos 146 CAIC's em funciona-mento, apenas 18 implantaram o subprograma Proteção Especial àCriança e à Família, e 22, o subprograma Promoção à Saúde daCriança e do Adolescente. Se se considera que o suprimento dascarências das crianças e adolescentes contribui para a sua perma-nência na escola e a prontidão para a aprendizagem, o fato de nãoserem asseguradas as condições de alimentação — consideradacomo um dos fatores para o alcance de melhor rendimento e fre-qüência — reduz mais ainda os benefícios do programa em termosde aproveitamento.

Cabe ainda mencionar que o programa prevê o atendimento emtempo integral; nos 146 CAIC's em funcionamento, a jornada escolaré de apenas seis horas. Essa redução do tempo de permanência dacriança no centro está próxima do que aconteceu com experiênciassemelhantes como a dos CIEP's, em que muitos passaram a funcio-nar em dois turnos, perdendo sua característica de centros de aten-dimento em tempo integral.

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O programa tem sua lógica voltada para a atenção às crianças e famíli-as carentes, a fim de amenizar a precariedade em que vivem. No entan-

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to, tem objetivos além de suas possibilidades de alcance, tanto pelacomplexidade das causas das carências sociais que afetam grande partedas crianças e dos adolescentes, quanto pela extrapolação de sua pro-posta, que vai além das possibilidades, limites e competências do sistemaeducacional na sua totalidade e suas especificidades básicas.

O programa parece desconsiderar, na sua prática, a existência de estru-turas físicas e organizacionais localmente instaladas, e que necessitam,na maioria, de melhores condições para o seu funcionamento e manu-tenção. Por outro lado, minimiza as dificuldades e meandros das organi-zações públicas, da participação comunitária e das administrações mu-nicipais, em especial.

As dificuldades vivenciadas pelas secretarias estaduais e municipais deEducação para o enfrentamento diário dos problemas de gestão e manu-tenção dos seus sistemas, com toda a complexidade de problemas e si-tuações, colocam de imediato dúvidas quanto à questão da viabilidadee sustentabilidade dos CAIC's, principalmente nas regiões mais carentes.

Os poucos CAIC's em funcionamento, seu elevado custo, o tamanho e acomplexidade de sua estrutura física e de serviços — que acarretam umônus bastante significativo para os orçamentos das prefeituras — e as di-ficuldades para equacionar sua gestão a partir das críticas de secretariasestaduais e municipais de Educação sinalizam no sentido de que o pro-grama tem poucas chances de ser o instrumento pelo qual o governopoderia alcançar a superação dos problemas das crianças e dos adoles-centes.

Face à estrutura de serviços sociais existentes, a atenção à criança e aoadolescente deveria, para ter maiores chances de sucesso, ter como ori-entação a melhoria dos serviços básicos de educação, saúde e assis-tência, em vez de priorizar a implantação de novas estruturas. Os resulta-dos certamente viriam em prazo muito mais curto, seriam mais sólidos, ebeneficiariam um número bem maior de crianças.

Embora o programa contemple a possibilidade de ter sua metodologiaimplantada em estabelecimentos já existentes, a prática vem demons-trando o contrário, uma vez que, das unidades de serviço autorizadas,construídas ou equipadas, apenas duas utilizam-se de instalações já exis-tentes.

Este programa apresenta-se como mais uma experiência de programanacional concebido de forma centralizada pelo governo federal, comexecução partilhada pelos estados e municípios. Confronta-se com oprocesso de descentralização, no qual a educação vem alcançandoavanços progressivos com a ampliação dos espaços de participaçãodos estados e municípios, de maior representatividade política e autono-mia de gestão e administração.

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Acrescenta-se ainda, como dificuldade relevante, a intensidade dos des-níveis regionais e inter-regionais, que concorrem para a inviabilidade deprogramas de cunho nacional.

QUADRO 1

Evolução da Situação do PronaicaSituação geral da implantação

BRASIL

Situação Quantidade % sobre o Brasil

Programado 64 15,1%

Autorizado 47 11,1%

Em obras 148 35,0%

Suspenso 2 0,5%

Concluído 81 19,1%

Inaugurado 81 19,2%

Total 423 100,0%

Fonte: MEC/Sepespe/CAT - maio/1994Convenções:Programado= Previsto, ainda não autorizadoAutorizado= Autorizado, obra não iniciadaEm obras= Avanço físico entre 1% e 99%Suspenso= Obra suspensaConcluído= Avanço físico 100%, ainda não inauguradoInaugurado= Concluído e inaugurado pelo MEC

QUADRO 2

Evolução da Implantação dos Caic's por Região

Região P A EO C I S Total

Norte 3 3 3 - - - 9

Nordeste 14 18 37 24 16 - 109

Centro-Oeste 10 5 14 1 9 - 39

Sudeste 26 15 69 32 25 2 169

Sul 11 6 25 24 31 - 97

Brasil 64 47 148 81 81 2 423

Fonte: MEC/Sepespe/CAT - maio/1994Convenções:P=Programado(previsto, ainda não autorizado)A=Autorizado(autorizado, obra não concluída)EO= Em obras (avanço físico entre 1% e 99%)S= Suspenso(obra suspensa)C= Concluído (avanço físico 100%, ainda não inagurado)I= Inaugurado (concluído e inaugurado pelo MEC)

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QUADRO 3

Evolução da Implantação dos Caic's porEstado/Região

Estado/Região P A EO C I S Total

Norte 3 3 3 - - - 9

Pará 3 3 1 - - - 7

Tocantins - - 2 - - - 2

Nordeste 14 18 37 24 16 - 109

Alagoas - - - 5 3 - 8

Bahia 4 5 - 1 - - 10

Ceará 1 3 7 - - 11

Maranhão - - - 15 3 - 18

Pernambuco 2 4 7 1 1 - 15

Piauí 2 1 7 - 2 - 12

Paraíba 3 1 5 - 2 - 11

Rio Grande do Norte 1 3 6 2 5 - 17

Sergipe 1 1 5 - - - 7

Centro-Oeste 10 5 14 1 9 - 39

D.Federal 2 - 6 - 8 - 16

Goiás 3 4 4 - 1 - 12

Mato Grosso 2 - 2 1 - - 5

M. Grosso do Sul 3 1 2 - - - 6

Sudeste 26 15 69 32 25 2 169

M. Gerais 16 9 22 13 13 - 73

E.Santo 3 - 8 - 1 - 12

R. Janeiro - - 8 1 5 2 16

São Paulo 7 6 31 18 6 - 68

Sul 11 625 24 31 - 97

Paraná 4 3 6 18 10 - 41

Sta.Catarina 3 3 8 5 12 - 31

Rio Grande do Sul 4 - 11 1 9 - 25

Brasil 64 47 148 81 81 2 423

Fonte MEC/Sepespe/CAT - maio/1994Convenções:P= Programado (previsto, ainda não autorizado)A= Autorizado (autorizado, obra não iniciada)EO= Em obras (avanço físico entre 1% e 99%)C= Concluído (avanço físico 100%, ainda não inaugurado)S=Suspenso (obra suspensa)I= Inaugurado (concluído e inaugurado pelo MEC)

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BIBLIOGRAFIA

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