c a d e r n o s d i s c e n t e s c o p p e a d n° 29 · ex-alunos latu sensu, de mestrado e de...

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Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n. 29, p. 1-78 2007 C A D E R N O S D I S C E N T E S C O P P E A D 29 2 0 0 7 S U M Á R I O Editorial Gestão de Demanda por Serviços nos Momentos de Pico Guarino Gentil Junior Rômulo Augusto Andrade Pereira 5 Contrato Psicológico: Uma revisão da Literatura Tânia Tisser Beyda 22 Análise do Significado do Trabalho Baseada em relatos do livro Closing Ana Carolina O. Andrade Pinto Milena Mercedes Puma 41 Aspectos da Expatriação e Gestão de Expatriados Carolina Burnier Pacheco Denise Rodrigues da Silva 58

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Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n. 29, p. 1-78 2007

C A D E R N O S D I S C E N T E S C O P P E A D N° 29 2 0 0 7

S U M Á R I O Editorial

Gestão de Demanda por Serviços nos Momentos de Pico

Guarino Gentil Junior Rômulo Augusto Andrade Pereira 5

Contrato Psicológico:

Uma revisão da Literatura Tânia Tisser Beyda 22

Análise do Significado do

Trabalho Baseada em relatos do livro Closing

Ana Carolina O. Andrade Pinto Milena Mercedes Puma 41 Aspectos da Expatriação e Gestão

de Expatriados Carolina Burnier Pacheco Denise Rodrigues da Silva 58

Editora Ursula Wetzel Assistente do Editor Lucilia Silva Projeto Gráfico e Capa Raquele Mendes Coelho Editoração Lucilia Silva Revisão de Português Argemiro de Figueiredo Correspondências devem ser enviadas para: COPPEAD/UFRJ Cadernos Discentes COPPEAD Caixa Postal 68514 21941-972 – Rio de Janeiro – RJ Telefone: (21) 2598-9841 Fax: (21) 2598-9817 E-mail: [email protected] Direitos e Permissão de Utilização

As matérias assinadas são de total e exclusiva responsabilidade dos autores. Todos os direitos reservados ao COPPEAD/UFRJ. É permitida a publicação de trechos e de artigos, com autorização prévia e identificação.

Cadernos Discentes COPPEAD é uma publicação do COPPEAD/UFRJ com o objetivo de estimular e divulgar a produção acadêmica do corpo discente do Coppead, constituída pelos alunos dos cursos latu sensu, mestrado e doutorado.

APRESENTAÇÃO Os CADERNOS DISCENTES COPPEAD têm por objetivo divulgar a produção de alunos e ex-alunos latu sensu, de Mestrado e de Doutorado. Dentro de uma filosofia de integrar teoria e prática, é comum que os alunos sejam solicitados a realizar pesquisa e a escrever casos relativos aos conteúdos abordados nas diversas disciplinas. Produzem, assim, um material que, apesar de ter por objetivo primário a avaliação de desempenho, constitui, também, um esforço de investigação de alta qualidade. No entanto, nem todos os trabalhos e pesquisas apresentados nas disciplinas estão de acordo com as regras básicas e usuais de publicação de trabalho científico. A preocupação com essa questão fez com que o processo de seleção dos mesmos seguisse uma rígida metodologia.

Em primeiro lugar, o professor de cada disciplina seleciona e indica aqueles trabalhos que considera terem sido os melhores da turma. O editor, por sua vez, analisa a adequação da inclusão em determinado volume, enviando-os, posteriormente, para dois avaliadores segundo a filosofia de blind-review. Uma vez criticados, os trabalhos voltam aos alunos para a realização das modificações entendidas como necessárias pelos revisores. Embora não seja esse o objetivo principal dos Cadernos, alguns aprendizados adicionais estão presentes no processo. Primeiro, a compreensão, por parte dos alunos, de que a qualidade do trabalho por eles desenvolvido pode render frutos não pensados inicialmente. Segundo, o entendimento de que o mérito de ter o artigo publicado não se faz sem ônus, uma vez que podem ser necessárias algumas modificações, ou seja, faz parte do processo de aprendizado do aluno não apenas a geração de um trabalho de pesquisa em si mesmo, mas também a compreensão de que o reconhecimento decorre de um comprometimento com a excelência, necessariamente presente em todos os passos do caminho. Por fim, mas não com menor ênfase, entendemos que os artigos aqui publicados são de utilidade para as comunidades acadêmica e empresarial brasileiras. A maior parte dos trabalhos publicados diz respeito a situações de negócios relevantes para quem discute ou para quem aplica os conceitos de Administração. Por todos esses motivos, o COPPEAD muito se orgulha de apresentar o melhor da produção intelectual de seus alunos.

A Editora

EDITORIAL

Dois importantes temas compõem este caderno: a estratégia de serviços e os aspectos humanos nas organizações. O primeiro tema está representado pelo trabalho Gestão de Demanda por Serviços nos Momentos de Pico ao apresentar as diversas metodologias à disposição para solucionar o ajuste entre demanda e oferta. A segunda temática desenvolve-se nos três trabalhos seguintes. Contrato Psicológico: uma revisão de literatura apresenta uma compilação sobre a temática mais recente do contrato psicológico. A importância deste trabalho decorre do fato deste conceito ainda ser pouco aplicado nas práticas e políticas de gestão de pessoas, notadamente no que se refere às expectativas do empregado quanto à sua relação com as organizações. O artigo Análise do Significado do Trabalho Baseada em Relatos do Livro Closing é uma proposta de destacar os conceitos de significados do trabalho presentes em uma obra de cunho histórico documental (Closing é um relato de fechamento de uma fábrica de móveis a partir de narrativas de ex-empregados e de fotografias sobre o encerramento das atividades). O mérito do presente artigo consiste em colocar foco sobre a importância e o papel do trabalho em uma época em que a centralidade do trabalho vem sendo discutida. O número se encerra com o artigo Aspectos da Expatriação e Gestão de Expatriados. Trata-se de uma revisão de literatura que aborda os impactos da transferência sobre o empregado, sua família e a própria dinâmica do trabalho. Desejo a todos uma ótima leitura.

Profª Ursula Wetzel

Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n. 29, p. 5-21 2007 5

GESTÃO DE DEMANDA POR SERVIÇOS NOS MOMENTOS DE PICO

Guarino Gentil Junior Rômulo Augusto Andrade Pereira

RESUMO

Este artigo trata das diversas metodologias que podem ser usadas por empresas prestadoras de serviços para tentar igualar demanda e oferta. Com isso há uma diminuição das receitas perdidas no setor de serviços e uma redução do nível de ociosidade da capacidade. Em um primeiro momento, são demons-tradas as formas usadas para adaptar a capacidade da empresa prestadora de serviços às oscilações da demanda. Em seguida, a demanda não é mais encarada como uma variável estritamente exógena e incontrolável pela empresa. Baseado nisso, são apresentadas maneiras para induzir a demanda a se adaptar à capacidade da prestadora de serviços. Posteriormente, é explicado o funcionamento de cada metodologia, assim como suas possíveis conseqüências e, finalmente, são comentadas as dificuldades em sua introdução que são encontradas pelos administradores. Palavras-chave: serviços, picos de demanda, filas; demanda não atendida, ociosidade da capacidade; Yield Management, incentivos à demanda.

1. INTRODUÇÃO Mesmo após muitos anos de estudos, as operações de serviços ainda representam

um enorme desafio para estudiosos e prestadores. As características extremamente peculiares do setor transformaram-no num grande “quebra-cabeças” operacional, em que cada peça possui encaixes com todas as outras. Dessa forma, é impossível separarmos a operação de serviços das demais áreas como marketing, finanças, RH e estratégia, por exemplo.

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Os estudos que tentaram aplicar as teorias desenvolvidas para a manufatura à indústria de serviços nos mostraram que estávamos diante de algo novo e, mais importante, diferente de tudo o que se havia estudado anteriormente.

Neste trabalho estaremos estudando meios de lidar com a imprevisibilidade da demanda que, por causa da perecibilidade e indivisibilidade dos serviços, pode gerar grandes problemas para as empresas do setor. A impossibilidade de se estocar o “produto” oferecido faz com que a administração dos picos (e vales) de demanda represente importante desafio para os prestadores de serviços.

Se durante certo período do dia uma loja de alimentos, por exemplo, ou mesmo de

conserto de automóveis, recebe um número de clientes maior do que a sua capacidade, o que acontece? Ou, ao contrário, se estas mesmas lojas recebam tão poucas solicitações que seus funcionários ficam ociosos a maior parte do tempo, sem terem o que fazer. O que isso acarreta para a empresa? E mais, como evitar que isso aconteça? Como diminuir as conseqüências destes fatos?

Este trabalho busca responder a algumas destas perguntas de forma direta,

utilizando exemplos práticos associados à teoria previamente vista.

Motivação

A gestão de demanda ganha grande importância se pensarmos nas conseqüências indesejadas que picos ou vales de demanda podem ter.

ExcessoExcesso

Falta Falta Falta

Formação de Estoque

Qtde

Tempo

Utilização do Estoque

ExcessoExcesso

Falta Falta Falta

Capacidade Perdida

Demanda perdida ou mal atendidaQtde

Tempo

Figura 1 – Diferenças entre o comportamento dos setores manufatureiros e de serviços quanto ao comportamento da oferta e da demanda no tempo. À esquerda temos a

manufatura, à direita o serviço.

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Uma má administração do fluxo de clientes pode gerar, em um primeiro momento, dois grandes problemas para o prestador de serviços: clientes mal atendidos, ou, ainda pior, clientes não atendidos ou perdidos. Os dois casos são péssimos para qualquer empresa, mas são ainda piores para as empresas prestadoras de serviços. A intangibilidade do negócio torna o momento de encontro entre cliente e prestador a parte mais importante e ao mesmo tempo perigosa da relação. Chamado de “Hora da Verdade”, este encontro carrega em si a responsabilidade de gerar no cliente a percepção da qualidade do serviço prestado. Em muitos casos, este será o único julgamento que o cliente poderá fazer de determinado serviço. Um mau atendimento arruína a “Hora da Verdade” e deteriora a percepção de qualidade não só de um, mas de todos os clientes presentes no momento da execução. Nada pior do que uma loja cheia e uma pessoa insatisfeita reclamando. Agora imagine uma extensão de tudo isso e dessas experiências para fora da loja. Tanto a má execução quanto a não-execução do serviço podem gerar perda de clientes para a concorrência e propaganda negativa para a empresa. Estas duas conseqüências podem trazer sérios problemas financeiros, com a diminuição da receita e do market share, e de imagem, uma vez que a propaganda boca a boca já provou ser uma das mais efetivas, especialmente no ramo de serviços. Dentre os vários benefícios que uma relação amigável entre capacidade e demanda pode gerar está a diminuição dos custos por clientes. Evitando-se os picos de atendimento e melhorando a distribuição destes ao longo do tempo, temos funcionários trabalhando num um ritmo mais agradável, o que, além de deixá-los mais satisfeitos (segundo a cadeia serviço-lucro, um fator crucial para a saúde de qualquer serviço), aumenta a qualidade da execução da tarefa e evita gastos desnecessários com mão-de-obra para suportar os períodos de aumento da demanda.

Além disso, problemas com estresse de funcionários ou funcionários desestimulados são minimizados com uma carga de trabalho sem tantas variações. Tudo isso repercute diretamente na produtividade, aumentando a eficiência e valorizando a empresa.

Pode-se perceber, portanto, o porquê de tamanha preocupação com a administração da demanda e do sem-número de estratégias e métodos para adaptar tanto a demanda à capacidade quanto a capacidade à demanda.

2. ADAPTAÇÃO DA CAPACIDADE À DEMANDA

Este é o tipo de ação que mais estamos acostumados a observar no nosso dia-a- dia. Muitas vezes apresenta-se como a solução mais simples, porém com custo mais

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elevado. Na verdade, a adaptação da capacidade à demanda deveria ser utilizada na falta de medidas menos dispendiosas. Freqüentemente esta solução requer gastos com a contratação de funcionários temporários, aluguel de equipamentos ou ainda a assinatura de contratos desvantajosos financeiramente para a empresa. Indicada para serviços em que a sazonalidade é muito grande ou a demanda flutua muito, a adaptação da capacidade à demanda implica um horizonte de planejamento mais curto. Como alternativa, teríamos a estratégia de manutenção de um nível de capacidade fixo, chamado nível de serviço. Para uma empresa com mão-de-obra especializada, recursos caros e baixo turn over esta estratégia revela-se mais interessante, pois os custos para adequar a capacidade seriam exorbitantes.

No entanto, existem casos em que os métodos de adaptação da demanda não se aplicam e, portanto, não há outra solução a não ser alterar a capacidade. São eles:

• Demandas sazonais muito fortes: esse tipo de demanda não pode ser

alterado. Por exemplo, o aumento da procura por roupas no Natal, ou brinquedos no Dia das Crianças. Pode-se perceber que, ultimamente, as lojas e prestadores vêm tentando antecipar esta demanda na tentativa de diminuir os custos no pico. Desta forma, observamos cada vez mais cedo movimentos voltados para as datas especiais e campanhas como “Antecipe seu Natal!” ou ainda “Saia na frente no Dia dos Pais!” Mesmo assim, durante o pico, lojas são obrigadas a contratar funcionários temporários de modo a atender a enorme demanda. Outros tipos de serviços também

Qtde

TempoDemandaCapacidade OriginalCapacidade Adaptada

Figura 2 – Gráfico que mostra a adaptação da capacidade de acordo com os níveis de demanda.

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passam por tais situações, como as companhias telefônicas ou sites de internet, como veremos no Box 1.

Box 1: Telefonia móvel em grandes eventos

As operadoras de telefonia móvel sofrem bastante quando há eventos como shows, comemorações de réveillon ou outros grandes acontecimentos.

Todas as antenas possuem um número máximo de usuários que podem se conectar a ela ao mesmo tempo e esses equipamentos são dimensionados de acordo com a densidade populacional da área onde estão localizados. Há também a preocupação de se evitar as chamadas “zonas de sombra”, local onde não há cobertura por nenhuma antena ou central. Dessa forma, podemos verificar que durante um grande evento, quando há um deslocamento maciço da população para uma pequena área das cidades, as antenas fixas utilizadas regularmente ficam sobrecarregadas.

Na tentativa de evitar este problema, as operadoras, além de outros recursos, utilizam antenas móveis, que podem ser deslocadas pela cidade por um caminhão ou outro veículo de porte. Estas antenas aumentam a capacidade de atendimento de chamadas da região, porém possuem alcance menor.

Um dos exemplos de caos telefônico é a festa de réveillon da cidade do Rio de Janeiro na praia de Copacabana. Um bairro que normalmente abriga aproximadamente 160 mil pessoas1 recebe, em um único dia, mais de 2 milhões em um espaço de 610 mil metros quadrados2

Resultado: dificilmente se consegue realizar ou receber uma ligação no período das 22h30 às 01h30.

Isso acaba causando um transtorno para os clientes, que desejam saudar seus amigos e familiares (e pagam por isso), e para as operadoras, que recebem várias reclamações e muitas vezes são obrigadas a ressarcir os clientes seja através do abono de uma parte da fatura ou de meios legais (multas e indenizações) nos casos mais extremos.

• Demanda intra-day forte e inalterável: este é um caso clássico em que a capacidade deve ser alterada. Não há saída para resolver o problema da “Hora do Rush”. A ida e a volta do trabalho movem multidões todos os dias e, a não ser que se alterem os horários comerciais e de trabalho, estas continuarão saindo e chegando na mesma hora ao trabalho. Pode-se imaginar a dificuldade de uma empresa de transporte, terrestre ou aéreo, de atender os seus clientes nos picos de demanda. Neste sentido, as frotas são dimensionadas de forma diferente durante as horas do dia para comportar estes picos e vales de demanda em tão curto espaço de tempo. Um

1 Segundo Censo de 2000 do IBGE. 2 Segundo informações da prefeitura do Rio de Janeiro para o réveillon de 2004.

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exemplo de adequação da capacidade neste caso foi observado no estado australiano de Victoria, como descrito no Box 2.

Box 2: Os táxis de Victoria, Austrália

Em maio de 2002, o governo do estado de Victoria, na Austrália, em uma iniciativa inovadora, lançou os chamados peak service taxis, ou táxis de pico de serviço. São táxis que operam apenas em horários predeterminados (das 15 horas de um dia até as 7 horas do dia seguinte), suprindo portanto a grande necessidade dos horários de ida e volta do trabalho. Os veículos são diferenciáveis pela cor verde do topo do carro e são usados também durante a realização de grandes eventos como o Australian Grand Prix de F-1, Melbourne Cup de Cricket e o Australian Tennis Open.

O serviço começou a ser oferecido em janeiro de 2003 com apenas cem veículos. As licenças vêm sendo liberadas ao longo dos anos (cem a cada ano) e hoje o serviço já conta com aproximadamente 300 carros de topo verde. A expectativa do governo é de oferecer mais 300 destas licenças especiais que vêm melhorando a qualidade do transporte da cidade, principalmente nos horários da manhã e do final da tarde.3

As licenças não podem ser repassadas e têm duração de seis anos. Após este período, se houver demanda, é dada aos portadores a oportunidade de mudar para uma licença de 24 horas. Desta forma, são viabilizadas mais licenças de pico.

3. ADAPTAÇÃO DA DEMANDA À CAPACIDADE

No caso do gerenciamento da demanda, o prestador de serviços geralmente não tem controle direto sobre a mesma. Para isso, o prestador deve agir indiretamente, influenciando a demanda com a prestação de serviços diferenciados, fornecendo informações aos clientes e, o mais comum, com a política de preços.

3 Informações obtidas no site do governo do estado de Victoria, Austrália (www.doi.vic.gov.au).

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Assim, nos períodos em que há picos de demanda e a capacidade da empresa de atender os clientes não é flexível e suficiente, resultando na formação de filas, o prestador de serviços deve adotar práticas que façam a demanda adaptar-se à oferta. Isto também se aplica nos casos em que há vales de demanda, tendo como conseqüência a ociosidade da capacidade.

Dessa forma, quando há picos de demanda, devem ser adotadas práticas que façam uma parcela da demanda ser desestimulada; neste momento ela é transferida para períodos menos concorridos. Já nos períodos em que houver vales de demanda, deve-se tentar estimulá-la, conquistando novos clientes para a empresa ou atraindo clientes já existentes dos períodos de pico.

Em resumo, o que deve ser feito primeiramente é analisar a viabilidade de se adotar

medidas para adaptar a demanda à oferta. Em muitos casos, a possibilidade de modificar a demanda para que esta se adapte à capacidade do prestador de serviços é muito pequena e até mesmo inexistente. No setor de emergência de hospitais, por exemplo, não há como fornecer estímulos para que o paciente volte em um horário mais tranqüilo para ser atendido. O paciente precisa ser atendido imediatamente. O mesmo pode ser dito sobre o serviço de transportes, pois na maioria das vezes o passageiro está com alguma hora marcada.

Deve-se analisar também se a prestação de serviços atende a vários tipos de

clientes. Pode ser que um tipo de cliente seja inflexível, e o outro tipo, não. Nesses casos, o esforço para adaptar a demanda à oferta seria apenas no tipo de cliente que parece ser flexível. Um exemplo disso é o caso do serviço de transporte aéreo. Alguns clientes viajam

Qtde

TempoDemandaCapacidade OriginalDemanda Adaptada

Figura 3 – Gráfico que mostra a adaptação da demanda de acordo com a capacidade.

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de avião a negócios, enquanto outros viajam de férias. É evidente que o cliente que viaja a negócios é inflexível e dificilmente poderá mudar seu dia ou horário de vôo mesmo que lhe seja apresentado alguma promoção. Já o cliente que viaja de férias pode ser bastante flexível e aceitar mudar o horário e até mesmo o dia de seu vôo, desde que seja recompensado de alguma forma.

Essas condições revelam que o prestador de serviços precisa ter um conhecimento

muito grande da sua base de clientes e de seus hábitos e desejos. Segundo Figueiredo (2004), “estas informações ajudarão o prestador de serviços a decidir que mecanismos serão mais efetivos no gerenciamento da demanda de seus serviços”. Há certas medidas que dependem do tipo de cliente que é atendido pela empresa; por exemplo, a política de preços, pois depende do cliente ser ou não sensível a preços.

Ademais, deve ser feita uma avaliação cuidadosa para a necessidade de alteração

da demanda. É fácil encontrar exemplos em que a existência de picos é que é o atrativo do negócio, e a suavização deles pode arruinar a empresa. Boates, shows e casas de espetáculos são alguns exemplos, pois, nesses negócios, o público também faz parte da oferta de serviços já que o cliente é estimulado não só pelos serviços prestados diretamente pela empresa, mas também pela possibilidade de conhecer novas pessoas.

Assim, após verificar a necessidade de adotar medidas que façam a demanda se

adaptar à oferta, é preciso escolher que tipo de medidas será adotado. Para isso, serão apresentadas as medidas mais comuns que são utilizadas.

Informação ao cliente

Esta prática consiste em simplesmente fornecer informações aos clientes a respeito dos horários de picos, do tempo de espera médio ou dos meios alternativos para se obter o mesmo serviço. Para que esta prática seja bem- sucedida, é necessário que a informação seja fornecida na medida certa e de forma completa. As informações fornecidas não podem ser de difícil acesso, pois causaria desinteresse no cliente e a prática se tornaria inócua.

Apenas com o fornecimento de informações a respeito dos horários e dias de pico,

já é possível que haja uma redução nos picos de demanda e um aumento na procura pelos serviços nos períodos de vale de demanda. Isso ocorre porque, com o acesso mais fácil a essas informações, os clientes mais flexíveis e que não desejam freqüentar filas, escolherão mudar seus horários.

Informações a respeito do tempo de espera médio também funcionam para suavizar

a demanda. Ademais, a informação do tempo de espera médio também pode fazer com que os clientes que desejarem permanecer em filas fiquem menos insatisfeitos, pois esperas

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incertas parecem ser mais longas que esperas conhecidas e finitas. Mas para que esta medida seja bem-sucedida, é necessário que haja alguma padronização no fornecimento do serviço que faça com que o tempo de espera médio não seja muito variável. Caso contrário, o cliente pode ficar mais insatisfeito ainda se seu tempo de espera efetivo for maior do que o esperado, mesmo que o erro seja devido a fatores aleatórios. O Box 3 apresenta um exemplo desta medida.

Box 3: Fantasia4 e o tempo de espera

Esperas incertas parecem mais longas que esperas conhecidas e finitas. Baseado neste fato, a Fantasia fornece em seus parques de diversão um serviço útil e bastante interessante de informação que torna as filas (bastante freqüentes nos parques da empresa) menos desagradáveis para os visitantes.

Nas entradas das atrações existem placas informativas que fornecem o tempo de espera médio daquela (e às vezes de outra) fila.

As placas fazem com que os clientes saibam de antemão o tempo que eles deverão esperar para usufruir a atração e permite que eles escolham entre esperar por esta ou outra atração.

Entretanto, isto só é possível graças à padronização do serviço prestado em cada brinquedo. Cada um deles tem um tempo determinado para que os clientes entrem no brinquedo, um tempo fixo de duração da atração e um tempo certo para que os clientes saiam do brinquedo para que os próximos da fila possam entrar.

Dessa forma, com um tempo fixo entre uma atração e outra, a variabilidade do tempo de prestação do serviço é muito pequena e o tempo de espera médio é bastante próximo do efetivo. Com a padronização do serviço oferecido, o tempo de espera médio é facilmente calculado sabendo o tempo de duração da atração e o número de pessoas que estão na fila.

Esta medida tem sido tão efetiva que é realizada ao redor do mundo em outros parques temáticos, lojas, restaurantes e outros lugares onde haja filas.

Prestação de serviços diferenciados

A prestação de serviços diferenciados pode ser um estímulo para a suavização dos picos e vales de demanda. A capacidade ociosa nos períodos de vale de demanda pode ser aproveitada pelo prestador de serviços para oferecer serviços complementares aos serviços que ele oferece nos períodos de pico.

Para que esta medida seja bem-sucedida é preciso que haja funcionários versáteis.

Dessa forma, faz-se necessária uma seleção mais apurada com o objetivo de contratar

4 Nome Fictício.

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pessoas com habilidades múltiplas. Também é importante que haja treinamento para orientar os funcionários para a prestação adequada desses serviços extras. Neste ponto específico pode-se verificar a importância dos processos de recrutamento e treinamento e a necessidade de comunicação com o setor de Recursos Humanos da empresa.

Com essas medidas, os clientes mais flexíveis poderão migrar para horários menos

concorridos em busca desses serviços diferenciados. O resultado são clientes mais satisfeitos, tanto os que mudaram de horário por causa da prestação de um serviço que agrega mais valor, quanto os que não mudaram porque enfrentarão filas menores. O Box 4 apresenta um exemplo de prestação de serviços diferenciados em horários de vale de demanda.

Box 4: Concessionárias Geupeot5 – Entrega e busca em domicílio de carros para revisão

O serviço de revisão de carros, apesar de necessário e extremamente importante, acaba sempre por trazer algumas dificuldades para as empresas. Em primeiro lugar, porque seus clientes ficam sem transporte e portanto já possuem uma leve tendência à insatisfação. Em segundo, porque a responsabilidade de reter o carro do cliente por dias (na maioria dos casos) pode acarretar um sem-número de riscos. E por fim, porque não se sabe quando os clientes vão levar o carro para a revisão. Portanto é uma demanda difícil de ser prevista.

Algumas concessionárias da montadora Geupeot do Rio de Janeiro encontraram um modo de oferecer conveniência aos clientes (diminuindo a supracitada tendência à insatisfação) e ainda melhorar a previsibilidade da demanda.

Para quem tem que levar o carro para fazer revisão, a Geupeot oferece um serviço diferenciado. Entre os horários das 8 às 12 horas e das 16 às 18 horas, as concessionárias Geupeot entregam e buscam em domicílio os carros de seus clientes.

Esse é um horário em que, normalmente, haveria pouca solicitação de revisão de carros. Mas o recrutamento de funcionários versáteis, que possuem carteira de habilitação e alguma experiência no serviço de motorista, permite à Geupeot aproveitar sua capacidade ociosa nesses horários para oferecer conveniência a seus clientes. Desde que haja alguém autorizado para dar e receber as chaves do carro para algum funcionário da empresa, o cliente não precisará gastar seu tempo indo e voltando da concessionária.

Além de clientes mais satisfeitos por causa dessa comodidade, as concessionárias da Geupeot ainda ganham previsibilidade em sua demanda. Com este serviço, as concessionárias sabem o horário que deve chegar e entregar o carro. Ademais, a entrega e busca do carro será no melhor horário para a empresa.

Este serviço hoje entra no pacote de venda do carro, valorizando o próprio produto da empresa e agregando valor ao mesmo.

5 Nome fictício.

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Um cuidado que se deve ter com a oferta de serviços complementares é que estes não prejudiquem o funcionamento das operações existentes e dos serviços originais. O prestador de serviços deve estar atento para que a utilização da capacidade ociosa não comprometa a qualidade dos seus serviços prestados e para que a empresa não saia de seu core business.

Política de preços diferenciados

Praticar preços diferentes em cada período é uma medida que se baseia nas leis da oferta e da demanda. De acordo com a teoria econômica, preços mais elevados fazem com que a demanda por bens e serviços seja menor graças à utilidade marginal decrescente da demanda. De maneira análoga, preços mais baixos acarretam uma demanda maior por bens e serviços.

Dessa forma, as empresas deveriam cobrar mais caro pela prestação de seus

serviços nos períodos de pico de demanda, enquanto que nos vales de demanda elas deveriam cobrar mais barato. Com essas medidas, a demanda poderia ser modificada indiretamente pelo prestador de serviço de modo a tentar fazer, mais facilmente, com que a oferta e a demanda se equilibrassem. Isso ocorreria, pois ao se cobrar um preço mais elevado, os clientes mais flexíveis poderiam mudar seu consumo para um período em que os preços são mais baixos, ficando apenas os consumidores que aceitam pagar um preço prêmio.

A capacidade de essa medida alterar a demanda depende basicamente da

elasticidade-preço da demanda. Se os clientes forem pouco sensíveis a preços, é evidente que a medida não será tão eficaz em suavizar os picos e vales de demanda. Todavia, se os clientes forem sensíveis a preços ou pelo menos uma parcela significativa dos clientes o for, a medida poderá trazer bons resultados. O Box 5 apresenta um exemplo de política de preços adotada por uma empresa de telefonia móvel.

Box 5: Planos promocionais da Lógico6

A guerra de preços das operadoras de celulares é incessante. A cada dia novas promoções são postas no mercado na tentativa de se arrebanhar um número cada vez maior de novos clientes. Uma das armas nessa guerra são os planos com preço por minuto diferenciado. Além de aumentar a conveniência para os clientes, que em muitas vezes podem escolher os horários que querem falar mais barato, ajuda a empresa na previsão da demanda e na adaptação da mesma à sua capacidade.

A Lógico é uma empresa de telefonia móvel que adota uma política de preços diferenciados para tentar adaptar a demanda à oferta. Este é um setor que apresenta um alto

6 Nome fictício.

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custo fixo, devido aos equipamentos necessários para a prestação de seus serviços, e um custo variável extremamente baixo, uma vez que sua capacidade já está instalada. Assim, a capacidade de ofertar seus serviços é muito inflexível e a sua política de preços se apresenta como uma adequada solução para equilibrar demanda e oferta.

A Lógico oferece diversos planos pré-pagos e pós-pagos para seus clientes. Dentre eles, há os planos destinados à categoria de clientes jovens. Estes planos oferecem aos seus usuários uma tarifa mais baixa que a dos demais planos no horário das 21 às 9 horas, que é um horário pouco requisitado, e uma tarifa mais elevada que a dos outros planos no horário das 9 às 21 horas, que é mais requisitado.

Pelo fato de os clientes jovens serem mais flexíveis em seu consumo e mais sensíveis a preços que os demais clientes, a Lógico consegue distribuir melhor sua demanda ao longo do dia, transferindo alguns dos usuários nos horários de pico para os de vale de demanda. Assim, a empresa apresentará uma ociosidade menor e haverá menos necessidade de expandir a capacidade instalada.

Todavia, a adoção de preços diferenciados pode apresentar muitos riscos. Ao se adotar preços mais baixos, há um estímulo para que os concorrentes também façam o mesmo. Preços baixos podem suavizar os picos e vales de demanda, mas também atraem clientes potenciais e até mesmo clientes dos concorrentes.

Uma possível conseqüência disso é uma guerra de preços que é muito comum em

alguns setores, como o de companhias aéreas. Nestes setores em que o custo fixo é muito elevado enquanto o custo variável é muito baixo, essas guerras de preços são mais fáceis de ocorrer, resultando em uma situação em que todas as empresas que participam do mercado se vêem pior do que antes, com receitas e lucro menores.

Outro problema nessa prática é a mudança nas expectativas do cliente. Uma vez

que o cliente se depara com um preço menor pelo mesmo serviço que lhe é ofertado, ele ficará mais satisfeito. Todavia, esse cliente pode ficar acostumado ao preço baixo e depois não aceitar mais que o preço retorne ao seu nível anterior. Ele pode pensar que se a empresa ofereceu uma vez o serviço a um preço mais baixo é porque esse deve ser o preço justo e aí não aceitar pagar um preço maior. Para evitar tal problema, é importante deixar bem claro que o preço mais baixo trata-se de uma promoção e que é por tempo limitado.

Um problema que também pode ocorrer com a adoção de diversos preços é uma

mudança de segmentação não-intencional e um impacto negativo na imagem da empresa. Esta prática pode fazer com que sejam atraídos clientes que a empresa não tem tanta perícia para atender ou que todo o seu know-how não é suficiente para satisfazê-los, fazendo com que a empresa se afaste do foco de seu negócio.

Uma última conseqüência indesejada desta prática é que ela pode impactar

negativamente a imagem do prestador de serviços. Isto seria extremamente perigoso em

Cadernos Discentes COPPEAD, Rio de Janeiro, n. 29, p. 5-21 2007 17

negócios em que o preço alto é sinal de qualidade. Nesses setores, preços baixos podem passar a imagem para os clientes de queda na qualidade do serviço prestado, investimento baixo em tecnologia ou até mesmo de insustentabilidade da empresa no longo prazo, pondo em questão a capacidade da mesma de garantir um pós-venda adequado nos meses ou anos seguintes à contratação do serviço.

Yield Management

Segundo Figueiredo (2004), o Yield Management “é um mecanismo que se baseia em praticar preços diferenciados, dependendo do estoque remanescente de lugares disponíveis, considerando a proximidade do momento da realização do serviço”. Desta forma, o Yield Management, também conhecido como Revenue Management, funciona então como uma segmentação do mercado ao longo do tempo.

Como se pode esperar, o sucesso na adoção do Yield Management vai depender

de como os clientes que a empresa atende são segmentados por preço. Em outras palavras, quanto maior é a diferença na disposição a pagar pelo serviço de cada cliente que a empresa atende, maiores são as chances de a implementação do Yield Management apresentar resultados positivos. Assim, se todos os clientes que a empresa atende se dispõem a pagar aproximadamente o mesmo preço pelo serviço prestado, o Yield Management tem pouca capacidade de apresentar elevação nos lucros. Caso contrário, a sua implementação tem grandes chances de aumentar os lucros da empresa.

As condições para a implementação do Yield Management e suas conseqüências

podem ser mais bem entendidas através da visualização da Figura 4. Pode-se verificar por essa figura que quanto mais os clientes forem heterogêneos quanto a preço, maior é o impacto nas receitas com a adoção do Yield Management.7 Por outro lado, quanto mais semelhantes os clientes são quanto a sua disposição a pagar, menor é o impacto nas receitas. Verifica-se que com a mesma diferença entre os preços usada no gráfico “d” da Figura 4, podem-se diferenciar mais tipos de clientes no gráfico “b” da mesma figura.

7 A receita está representada pelas partes cinza em cada gráfico da Figura 4.

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Figura 4 – Impacto na receita provocado pela implementação do Yield Management em um ambiente com clientes heterogêneos quanto ao preço e em um ambiente com clientes

homogêneos quanto ao preço.

Box 6: Companhias aéreas e o Yield Management

Depois de um marasmo no mercado de aviação brasileiro, quando as empresas estavam acomodadas em um mercado sem concorrência e dominado por poucas, o surgimento de empresas com baixo custo e, por conseqüência, baixos preços foi quase uma revolução. Tal foi o tamanho dessa mudança que hoje o setor é caracterizado por guerras de preços e brigas judiciais sob alegação de práticas de dumping.

Neste ambiente podemos observar claramente a prática do Yield Management. Para reservas feitas com antecedência, os preços dos lugares nos aviões chegam a ser menos da metade do pago por um passageiro que comprou a cadeira ao lado apenas 20 minutos antes do embarque.

Esta prática garante uma sobrevida às empresas para que não sejam muito prejudicadas pela guerra de preços do mercado. Apesar do baixo número de concorrentes, as rotas no mercado brasileiro são poucas se compararmos com mercados como EUA ou Europa.

Este sistema demanda grande capacidade de obtenção de informação e um sistema integrado capaz de analisar os inputs e definir a melhor estratégia de preços.

Interessante notar que esta estratégia pode colocar lado a lado passageiros que pagaram preços totalmente diferentes pelas passagens, o que pode gerar algum constrangimento.

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Alteração direta da demanda

Conforme já foi mencionado no início da seção “Adaptação da Demanda à Oferta”, o prestador de serviço geralmente não tem controle direto sobre ela e, por isso, age indiretamente, influenciando-a com a prestação de serviços diferenciados, fornecendo informações aos clientes e com a política de preços.

Todavia, em alguns casos, pode haver uma maneira de se controlar a demanda

diretamente, reduzindo os seus picos. Mas tais casos são muito específicos e requerem que o prestador de serviços ou algum interessado tenha um grande poder político ou econômico para isso. Daí a razão para estes casos serem tão incomuns.

O Box 7 apresenta o caso do Horário de Verão, que é uma maneira pela qual o

governo usa seu poder para alterar diretamente os picos de demanda de energia elétrica.

Box 7: Horário de Verão

Com a aproximação do verão, o consumo de energia elétrica tende a aumentar. A razão para o aumento deve-se ao maior número de ventiladores e aparelhos de ar-condicionado ligados nessa época do ano.

Sem o horário de verão, o pôr-do-sol ocorreria próximo às 18 horas junto com o horário da volta dos trabalhadores a seus lares. Assim, a luz e os aparelhos elétricos nas casas estariam sendo ligados ao mesmo tempo em que a iluminação pública e as placas comerciais estariam sendo ativadas. Soma-se a isso o fato de a indústria ainda estar em operação nesse mesmo horário. Esse cenário sem o horário de verão com certeza apresentaria um pico de demanda extremamente acentuado nesse horário, aumentando as chances de black-out e a necessidade por maiores investimentos em geração e distribuição de energia elétrica.

Com a introdução do horário de verão, o pôr-do-sol ocorreria uma hora mais tarde, ou seja, próximo às 19 horas. Dessa forma, a luz doméstica, os aparelhos elétricos, a iluminação pública e as placas comerciais seriam ligados mais tarde, quando a atividade industrial já começa a diminuir.

Portanto, com a implementação do horário de verão, há um deslocamento de uma parte do pico da demanda por energia elétrica para um período em que ela não é tão requisitada. Assim, quando um tipo de demanda por energia elétrica começa a diminuir, outro tipo de demanda começa a aumentar. Outro caso interessante de ser mencionado é o do trânsito nas grandes cidades. Nas grandes metrópoles, onde o trânsito é muitas vezes caótico, os governos se utilizam de alguns artifícios no sentido de evitar transtornos maiores à população. Neste sentido, algumas prefeituras adotam o esquema de rodízio de carros nos lugares de grande trânsito. Esta medida nada mais é do que uma interferência direta na demanda, que faz com que as vias públicas fiquem menos engarrafadas e contribui para o bem-estar da população.

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4. CONCLUSÃO

Dificuldades para ajustar a demanda à oferta

Apesar da existência dessas diversas metodologias de ajuste da demanda à oferta, isto não é uma tarefa de fácil adoção. Há um conjunto de pré-requisitos que devem ser primeiramente atendidos, além da existência de alguns obstáculos que o administrador deverá vencer para que a demanda por um determinado tipo de serviço ofertado pela empresa seja adaptada à sua capacidade.

A primeira grande dificuldade que aparece na tentativa de se adaptar a demanda à

oferta deve-se ao benchmark contínuo dos clientes. Os clientes de qualquer setor e empresa são exigentes. Rapidamente eles se acostumam aos serviços extras que em um primeiro momento servem como diferenciadores do serviço original e como instrumentos para suavizar picos e vales de demanda, e em um segundo momento já são indispensáveis para que a empresa se mantenha competitiva no mercado.

Dessa forma, para que um prestador de serviços continue superando as

expectativas de seus clientes e suas práticas para suavizar picos e vales de demanda continuem eficazes, é necessário que ele esteja sempre inovando e encontrando maneiras de agregar valor ao serviço que é oferecido.

Outro obstáculo na adaptação da demanda à oferta é que nem sempre o prestador

de serviço atende clientes que são flexíveis. Como já foi mencionado em outras sessões, é preciso que os clientes que são atendidos pela empresa sejam flexíveis ou que pelo menos uma parte deles o seja.

Um terceiro desafio é saber como incentivar as mudanças no comportamento dos

consumidores. Para isto, é essencial que haja uma definição exata do tipo de cliente que a empresa atende ou pretende atender. Em seguida, ela precisa ter um conhecimento profundo da sua base de clientes para saber qual a melhor prática a ser adotada para adaptar a demanda dos consumidores à capacidade de ofertar seus serviços.

Por fim, é preciso que seja feita uma análise cuidadosa quanto à necessidade de se

adaptar a demanda à oferta. Deve-se verificar se há necessidade de se adotar qualquer uma das medidas mencionadas neste trabalho. Como já foi citado, há casos em que a existência de picos de demanda é que dá sustentabilidade ao negócio. Em outros casos, pode ser que as vantagens oriundas da implementação de alguma metodologia de ajuste da demanda à oferta não compensem os custos de sua adoção. Portanto, se alguma medida para reduzir picos e vales de demanda for realmente necessária, deve-se fazer uma análise para cada caso de forma a escolher a mais viável.

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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FIGUEIREDO, Kleber. Gestão de Capacidade em Serviços. Nota técnica. 2004. State Government of Victoria – Department of Infrastructure (site internet) -<http://www.doi.vic.gov.au/Doi/Internet/vehicles.nsf/AllDocs/F399D08A5A79ABFFCA2570A5001DCF21>. Acesso em 12 de Janeiro de 2006. Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro – Secretaria Municipal de Turismo (site internet) - <http://www.rio.rj.gov.br/secs/rioestudos/rioestudos128.doc>. Acesso em 12 de Janeiro de 2006.

ABSTRACT

This article discusses several methods that may be used by service providers to adapt demand and offer of their services. The main goal is to reduce revenues lost due to demand peaks as well as to decrease the capacity idleness level. First, we discuss forms to adapt the service company capacity to the oscillations of demand. Afterwards, the demand is no more treated as a strictly external and uncontrollable variable by the company. Based on this, ways to induce demand to adapt itself to the company’s capacity are presented. Later, each method is explained, as well as its possible consequences. And finally, the difficulties of the introduction of these methods are listed and commented.

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CONTRATO PSICOLÓGICO: UMA REVISÃO DA LITERATURA

Tânia Tisser Beyda

RESUMO

O contrato psicológico é um tema relevante para a compreensão das relações de trabalho, pois tem sido considerado, entre seus pesquisadores, como a base do relacionamento entre empresa e empregado. Este artigo tem por objetivo sintetizar a literatura sobre o contrato psicológico, desde suas primeiras conceituações, por Argyris, em 1960 e Levinson, em 1965, até a sua retomada com as pesquisas acadêmicas de Denise M. Rousseau na década de 1980. O artigo aborda algumas controvérsias em sua conceituação, além de sua natureza, suas características, elementos que colaboram para sua formação, o impacto do tempo e as violações do contrato. Palavras-chave: contrato psicológico; relação empregado-empregador.

1. INTRODUÇÃO

As mudanças ocorridas nas relações de trabalho, nestas últimas décadas, contribuíram para a retomada do interesse sobre a questão do relacionamento empregado e organização empregadora. Na busca pela compreensão dos fatores motivadores e necessidades dos trabalhadores, segundo Schein (1980), diversos pesquisadores concluíram que se tratava de um problema complexo, que foi conceituado como “contrato psicológico”.

Várias pesquisas e livros têm sido publicados a respeito da nova configuração do contrato psicológico, com destaque para Rousseau (1995), que o define como as crenças dos indivíduos sobre os termos do acordo de troca, estabelecidos entre estes e suas organizações. Segundo ela, o grande benefício do contrato psicológico seria tornar os indivíduos e as empresas mais produtivos como decorrência de atuarem em um ambiente de trabalho, onde são firmados, e cumpridos, compromissos entre as partes, permitindo-lhes planejar e antecipar seu futuro; não só profissional, mas também o futuro de sua vida pessoal.

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Observamos que o tema “contrato psicológico” tem sido objeto de muitas pesquisas

no exterior: na base de dados ISI Web of Science8 encontramos 351 documentos indexados pela palavra-chave “psychological contract”.

Entretanto observamos haver uma lacuna de pesquisa sobre este tema no Brasil. Em dois eventos nacionais: o EnANPAD9 (de 1997 a 2006) e o EnEO10 (de 2000 a 2006), num período em que ocorreram 14 eventos, apenas dois trabalhos foram apresentados abordando este tema. Pesquisamos também na base da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD),11 na qual já se encontram cadastrados mais de vinte mil itens, e encontramos apenas sete documentos indexados pela palavra-chave “contrato psicológico”.

2. DEFININDO O CONTRATO PSICOLÓGICO

Na busca pela compreensão dos fatores motivadores, das necessidades e do comportamento dos indivíduos no ambiente de trabalho, os pesquisadores vêm seguindo rumos diversos. Alguns estudando o contexto organizacional e o ambiente, outros, as características pessoais dos indivíduos, e ainda outros, a interação dos indivíduos e do ambiente (CONWAY e BRINER, 2005).

É neste último caminho que se insere o contrato psicológico. Este conceito tem como premissa inicial que o relacionamento entre o empregado e o empregador está baseado numa relação de troca, em que cada parte oferece algo em contrapartida do que a outra parte pode oferecer. O contrato psicológico não tem formato legal, pois sua natureza apóia-se nas percepções de cada parte, e não em termos documentados de forma escrita (CONWAY e BRINER, 2005).

O termo “contrato psicológico” foi utilizado formalmente pela primeira vez por

Argyris, em seu livro Understanding Organizational Behaviour, publicado em 1960. Ele acreditava que os empregados e as organizações criavam contratos psicológicos que permitiam a expressão e a gratificação de necessidades mútuas, através de acordos implícitos. Quando os empregados percebiam que os supervisores (ou capatazes) respeitavam seus direitos ao desenvolvimento, ao crescimento e permitiam que tivessem iniciativa, em troca também respeitavam o direito da organização de se desenvolver (CONWAY e BRINER, 2005).

8 Pesquisa efetuada no site portal.isiknowledge.com, em 21/11/2006. 9 Pesquisa efetuada no site www.anpad.org.br, em 21/11/2006. 10 Idem. 11 Pesquisa efetuada no site bdtd.ibict.br, em 21/11/2006.

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Posteriormente, diversos autores e pesquisadores utilizaram o termo, sem haver, entretanto, a adoção de uma definição única e padronizada. Buscaremos apresentar a seguir as definições e conceitos introduzidos pelos autores mais comumente citados na literatura.

Schein (1980) entende que o contrato psicológico implica a existência de um conjunto de expectativas, não escritas, operando continuamente entre cada membro de uma organização e os seus vários gestores, além dos demais membros desta organização.

Segundo ele, o contrato psicológico pressupõe que cada empregado tem expectativas em relação a salário, horas de trabalho, benefícios e privilégios, garantias de não ser demitido inesperadamente, entre outros. Muitas destas expectativas são implícitas e envolvem o senso de dignidade e valor do indivíduo. Entre outras expectativas, os indivíduos esperam também que as organizações forneçam, além do trabalho, instalações que sejam satisfatórias, oportunidades para crescimento e aprendizado, e feedback sobre seu desempenho (SCHEIN, 1980).

Em um artigo contemporâneo aos primeiros estudos de Schein, Levinson (1965) analisa os significados da relação homem-organização e sugere o uso do conceito de reciprocidade como forma de integração dos conceitos interpessoais com a psicologia industrial. Ele define o conceito como um processo contínuo de atender e satisfazer às expectativas e necessidades mútuas, em um relacionamento entre um homem e sua organização. O autor reforça sua definição com o argumento de que a reciprocidade seria um processo de construção de um contrato psicológico entre pessoas e a organização.

A reciprocidade teria como principais funções facilitar a manutenção do equilíbrio e do crescimento psicológico e o domínio de parte da vida de um indivíduo. Quando a reciprocidade do relacionamento não cumprisse suas funções, o indivíduo poderia se comportar de várias formas, tais como fazer greve ou deixar a organização (LEVINSON, 1965).

Outra definição de Kotter (1973), é que o contrato psicológico é um contrato implícito entre um indivíduo e sua organização, no qual se especifica o que cada um espera dar e receber, do outro, neste relacionamento. O indivíduo ao ser contratado por uma organização tem expectativas do que espera receber (salário, promoção, status, desafios etc.), bem como do que espera oferecer (tempo, esforço, habilidades e competências, lealdade etc.). Do mesmo modo, a organização tem expectativas do que espera receber do novo empregado e do que espera oferecer em troca, podendo haver ou não coincidência de expectativas (KOTTER, 1973).

Handy (1978) apresenta o contrato psicológico como um conjunto de expectativas. Por parte do indivíduo, as expectativas seriam os resultados que espera obter da

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organização e que satisfarão determinadas necessidades suas e, em troca, disponibilizará seus talentos e energia. Da mesma forma, a organização possui um conjunto de expectativas em relação ao indivíduo e um conjunto de resultados ou pagamento que se dispõe a fornecer (HANDY, 1978).

Rousseau (1995) define o contrato psicológico como as crenças dos indivíduos sobre os termos do acordo de troca, que estabelecem com suas organizações. A autora também se refere ao contrato psicológico como modelos mentais que os indivíduos utilizam para organizar eventos como promessas, auto-afirmação e confiança. Tais modelos teriam como função principal orientar os indivíduos sobre quais os eventos que devem esperar que ocorram na organização e como interpretá-los.

As crenças do indivíduo passam a fazer parte do contrato psicológico, quando ele percebe que deve à organização certa contribuição (por ex.: dedicação, lealdade, sacrifícios) em troca de certos benefícios (salário, segurança no trabalho etc.). Os contratos psicológicos diferem do conceito geral de expectativas, pois são promissórios e recíprocos. As promessas de comportamento futuro, por parte da organização, são dependentes de uma ação recíproca do empregado (ROUSSEAU, 1990).

Para Guest (2002), o contrato psicológico é definido também como as percepções,

de ambas as partes envolvidas na relação de trabalho, tanto da organização quanto do individuo, das promessas e obrigações recíprocas insinuadas durante o relacionamento. Ele argumenta que o contrato psicológico foca uma interação entre uma parte específica, o empregado, e uma parte nebulosa, a organização (GUEST, 1998).

Neste sentido, Morrison e Robinson (1997) alertam que a organização pode assumir uma identidade antropomórfica aos olhos do empregado; mesmo assim, a organização não seria reconhecida como possuindo um contrato psicológico próprio.

Nos primeiros relatos sobre contrato psicológico, os autores não abordavam a questão da reciprocidade, implicando que ambas as partes tinham seus próprios contratos (MORRISON e ROBINSON, 1997). Schein (1980) é bem claro a este respeito, argumentando que as organizações apresentam expectativas mais sutis e implícitas de que os empregados irão realçar a imagem da organização, serão leais, manterão confidência sobre assuntos internos, estarão sempre altamente motivados e dispostos a fazer sacrifícios em prol da organização.

Mais recentemente, os pesquisadores vêm enfatizando que, apesar dos agentes organizacionais (supervisores e gerentes) terem seu próprio entendimento do contrato psicológico, eles fazem parte deste contrato (MORRISON e ROBINSON, 1997).

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Inicialmente, Rousseau (1989) considerava que a conceituação do contrato psicológico focaria apenas a experiência do empregado, e que os indivíduos o possuem e as organizações, não. A organização, como a outra parte do relacionamento, forneceria o contexto para a criação do contrato psicológico, mas não poderia ter, ela mesma, um próprio. Apesar dos agentes organizacionais formarem um contrato psicológico com os empregados e se comportarem de forma alinhada a este, as organizações não poderiam “percebê-lo” (ROUSSEAU, 1989).

Posteriormente, Rousseau (1995) passou a definir contrato psicológico como as crenças, baseadas em promessas expressas ou implícitas, referentes ao acordo de troca entre o indivíduo e a firma empregadora e seus agentes.

A complexidade do contrato psicológico é relevante para a compreensão das relações de trabalho, uma vez que cada uma das partes tem seus interesses próprios, muitas vezes desconhecidos pela outra parte. Guest (1998) critica o uso do termo “contrato”, pois este implica concordância entre as partes, fato altamente improvável em se tratando do contrato psicológico, pois este é formado na mente das partes e na esperança de que a outra parte esteja de acordo. Não sendo possível, portanto, a confrontação entre as partes para que a concordância seja estabelecida.

Outro fator, segundo Guest (1998), que contribui para a complexidade do contrato psicológico, bem como para a inadequação do uso do termo, diz respeito à possibilidade de modificações em suas cláusulas. Num contrato entre duas partes, em geral, as mudanças só podem ser feitas com o consentimento dos envolvidos. Já no contrato psicológico existe a possibilidade de que ele seja modificado, arbitrária e secretamente, por ambas as partes.

3. SUA IMPORTÂNCIA PARA AS RELAÇÕES DE TRABALHO

O equilíbrio do contrato psicológico é necessário para a existência de uma relação,

entre o empregado e a organização, que seja harmoniosa e contínua (SIMS, 1994). Schein (1980) considera que existem duas condições que, se atendidas, possibilitam que as pessoas trabalhem com eficiência, comprometidas, com lealdade, entusiasmadas com os objetivos da organização e satisfeitas. Estas condições, claramente incluídas no conceito de contrato psicológico, são:

a) O nível de expectativas, sobre o que o indivíduo espera receber da organização e o que está disposto a oferecer em retorno, deve ser condizente com as expectativas da organização sobre o que oferecerá e o que espera receber em troca;

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b) Existência de acordo sobre a natureza do que é o objeto da troca; por exemplo, dinheiro por tempo no trabalho; satisfação das necessidades sociais por empenho e lealdade; desenvolvimento profissional por alta produtividade.

Apesar de grande parte do contrato psicológico não ser declarada e sustentada por

documentos legais, ele possui uma qualidade imperativa, pois representa as expectativas de ambas as partes para a continuidade do relacionamento. A qualquer momento existirão expectativas satisfeitas e outras não satisfeitas; mas ambas as partes têm um nível mínimo de satisfação aceitável (THOMAS Jr., 1997). Quando uma das partes percebe que o nível de satisfação de suas expectativas está abaixo do nível mínimo, considerará que o contrato foi violado, gerando conseqüências no seu comportamento na organização.

Em decorrência de o contrato psicológico não ser considerado de forma idêntica por ambas as partes, freqüentemente ele se torna a origem de problemas e conflitos. Segundo Handy (1978), a organização em geral tem uma perspectiva mais abrangente do contrato, podendo levar o indivíduo à sensação de estar sendo explorado, e a organização, à percepção de que existe falta de cooperação ou envolvimento por parte do indivíduo.

É relevante para o estudo das relações de trabalho ressaltar que a maioria dos indivíduos pertence a mais de um tipo de organização e que, portanto, haverá mais de um contrato psicológico. Sendo assim, o indivíduo não procuraria satisfazer todas as suas necessidades através de apenas um contrato, ele teria oportunidade de atendê-las através de vários contratos (HANDY, 1978).

Segundo Rousseau (1995), a importância do contrato psicológico está no benefício de tornar os indivíduos e as empresas mais produtivos como decorrência de atuarem em um ambiente de trabalho onde são firmados e cumpridos compromissos entre as partes, que lhes permitam planejar e antecipar seu futuro; não só profissional, mas também o futuro de sua vida pessoal.

Handy (1978) é muito enfático quando argumenta sobre a relevância do contrato psicológico para as relações de trabalho. Segundo ele, o contrato psicológico é um fator relevante nas relações de trabalho, devendo fazer parte das preocupações dos gestores. O comportamento dos indivíduos em relação às tarefas que lhe são delegadas, a forma de controle e sua satisfação em relação às recompensas recebidas serão decorrência de seu contrato psicológico. Outro argumento que Handy (1978) utiliza é que o contrato psicológico reside na essência de qualquer problema de mudança organizacional. Mudanças nos métodos de controle, nos processos de trabalho, na hierarquia ou estrutura da organização, implicam alterações no contrato psicológico e não se pode pressupor que as mudanças sejam desejadas por todos.

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As alterações ocorridas nas relações de trabalho, nas últimas décadas, implicaram a redução da relevância dos contratos de trabalho coletivos sindicalizados e o aumento da necessidade de tratar os contratos de forma individualizada. O contrato psicológico passa, então, a oferecer um construto potencialmente útil para a compreensão das novas formas que as relações de trabalho contemporâneas vêm tomando (GUEST, 1998).

Em 2004, Guest propôs um modelo analítico para aplicação do contrato

psicológico nas relações de trabalho.

Figura 1: Modelo para aplicação do contrato psicológico

nas relações de trabalho (Guest, 2004)

O modelo de Guest (2004) apresenta uma série de variáveis que ajudam a moldar

o contexto das relações de trabalho, tanto no nível individual quanto organizacional, bem como alguns aspectos relevantes das políticas e práticas organizacionais. O contexto ajuda a formar o conteúdo do contrato psicológico, bem como as respostas a ele. As reações dos indivíduos são difíceis de prever sem a compreensão do contexto e das práticas, entretanto quando há o cumprimento dos termos do contrato podem-se esperar resultados positivos.

Guest (2004) expande o modelo do contrato psicológico incorporando o conceito de estado do contrato psicológico, que se refere à situação de realização dos termos do contrato, se as promessas e obrigações foram atendidas, se houve justiça e quais foram suas implicações para a confiança entre as partes. E finalmente, o modelo apresenta resultados normalmente explorados nas pesquisas, distinguindo-os em conseqüências relacionadas à atitude e comportamento (GUEST, 2004).

Individual:Idade

GêneroEducação

Nível na hierarquiaTipo de trabalhoCarga Horária

Tipo de contratoEtnia

Tempo no cargoRemuneração

Organizacional:Setor

TamanhoNatureza da propriedadeEstratégia de negócios

Reconhecimento do sindicato

Políticas e práticas de RH

Relações de Trabalho

Clima e cultura organizacionais Comportamentais:

FreqüênciaIntenção de ficar ou sairDesempenho no trabalho

Comportamento de cidadania organizacional

Atitudinais:Comprometimento com

organizaçãoSatisfação no trabalho

Equilíbrio vida pessoal e trabalho

Segurança do trabalhoMotivação

Stress

Promessas recíprocas,Incentivos e obrigações

Satisfaçãodo acordo

Confiança

Justiça

Fatores contextuais Políticase Práticas

Estado doContrato Psicológico ResultadosContrato

Psicológico

Individual:Idade

GêneroEducação

Nível na hierarquiaTipo de trabalhoCarga Horária

Tipo de contratoEtnia

Tempo no cargoRemuneração

Organizacional:Setor

TamanhoNatureza da propriedadeEstratégia de negócios

Reconhecimento do sindicato

Políticas e práticas de RH

Relações de Trabalho

Clima e cultura organizacionais Comportamentais:

FreqüênciaIntenção de ficar ou sairDesempenho no trabalho

Comportamento de cidadania organizacional

Atitudinais:Comprometimento com

organizaçãoSatisfação no trabalho

Equilíbrio vida pessoal e trabalho

Segurança do trabalhoMotivação

Stress

Promessas recíprocas,Incentivos e obrigações

Satisfaçãodo acordo

Confiança

Justiça

Satisfaçãodo acordo

Confiança

Justiça

Fatores contextuais Políticase Práticas

Estado doContrato Psicológico ResultadosContrato

Psicológico

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4. CARACTERÍSTICAS DO CONTRATO PSICOLÓGICO

Conway e Briner (2005) identificaram, por meio de diversas pesquisas publicadas, uma série de características relevantes para a compreensão do conceito. São elas:

§ As crenças: não existe consenso sobre que natureza de crenças faria parte do contrato psicológico. Os pesquisadores se referem às crenças sobre promessas, expectativas ou obrigações. Segundo Morrison e Robinson (1997), uma obrigação só faria parte do contrato psicológico se estivesse acompanhada de uma crença de que seja uma promessa da organização. Conway e Briner (2005) optam por considerar que somente as promessas poderiam ser parte integrante do conteúdo do contrato psicológico.

§ A natureza implícita: em geral se considera que o contrato psicológico inclui

promessas implícitas e explicitas. As explicitas se originariam de acordos feitos por agentes da organização, de forma verbal ou escrita. Enquanto as implícitas se originam de interpretações de eventos ocorridos, do testemunho da experiência de colegas, do comportamento das partes etc. Quanto mais explicitas forem as promessas, mais previsível será o comportamento do empregado, entretanto, não há concordância sobre quão explicita pode ser uma promessa e ainda fazer parte do contrato psicológico (CONWAY e BRINER, 2005).

§ A natureza subjetiva: a questão da subjetividade do contrato psicológico deve ser

considerada através de duas perspectivas:

a) Em que medida os indivíduos vêem as coisas de formas diferentes, ou seja, sempre haverá dúvidas se o empregado pode compreender de forma completa e correta as intenções e significados do comportamento do empregador e vice-versa;

b) Até que ponto as percepções individuais podem ser objetivamente medidas,

ou seja, até que ponto os termos do contrato podem ser explicitados e medidos. Alguns termos seriam mais subjetivos que outros; por exemplo, salário e horário de trabalho podem ser considerados objetivos e podem ser medidos, enquanto o mesmo não ocorre com respeito e lealdade.

§ O acordo percebido: os autores apresentam como um debate relevante o fato de

o contrato psicológico ser definido apenas no nível da percepção das crenças individuais do empregado sobre o relacionamento de troca, ou haver a necessidade de que estas mesmas crenças sejam possuídas também pela organização. Rousseau, em 1990, argumentava que o empregado e o empregador poderiam possuir crenças diferentes em relação aos termos do

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contrato psicológico e que a reciprocidade, ou concordância sobre os termos, não seria uma condição necessária. Entretanto, após estudo conduzido em 2004, ela concluiu que o fundamento do relacionamento funcional empregado-empregador são as trocas caracterizadas por reciprocidade ou compreensão compartilhada das obrigações mútuas e confiança nos compromissos recíprocos (DABOS e ROUSSEAU, 2004).

§ O objeto da troca: nesta questão, existe consenso entre os pesquisadores e

autores, de que o contrato psicológico tem como premissa a existência da relação de troca. Entretanto não há, ainda, um entendimento claro sobre quais resultados uma parte espera da outra, como retribuição à sua contribuição específica (CONWAY e BRINER, 2005). Ou seja, tomando como exemplo o salário, caso ele fosse aumentado, que mudanças ocorreriam na contribuição do empregado para a organização.

§ Um conjunto completo de crenças do empregado em relação ao relacionamento

contínuo com seu empregador: os autores concluem haver concordância, na literatura, sobre o contrato psicológico incluir todas as possíveis trocas que poderiam ocorrer na relação empregado-empregador. Mesmo assim, os pesquisadores tendem a limitar seus estudos, focalizando um conjunto de incentivos oferecidos pelo empregador e um conjunto de contribuições disponibilizadas pelos empregados. Segundo Conway e Briner (2005), este enfoque leva a negligenciar uma gama de trocas possíveis no mundo do trabalho.

§ Uma troca contínua: o relacionamento de troca, conceituado como contrato

psicológico, pode ser considerado contínuo por perspectivas diversas: (a) por estar em operação continuamente, expondo um processo constante de renegociação e barganha mútua (SCHEIN, 1980), ou (b) por continuamente apresentar ciclos de atendimento e satisfação de promessas mútuas (ROUSSEAU, 1995).

§ As partes do contrato psicológico: as definições do contrato psicológico se

referem a duas partes envolvidas: o empregado e a organização. O empregado é de fácil identificação, entretanto o contrato psicológico não pode ser mantido por uma organização, apesar de já mencionado o processo de antropomorfismo. As organizações, como entidades abstratas, não têm contratos psicológicos, apesar de seus agentes o possuírem em relação aos empregados (CONWAY e BRINER, 2005).

§ O contrato psicológico é moldado pela organização: muitas definições

consideram que o contrato psicológico consiste de um relacionamento de troca,

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que é formado e moldado pelas interações do empregado e sua experiência com a organização empregadora atual. Isto implica que crenças formadas através de outras origens ou outras experiências profissionais anteriores não seriam parte do contrato psicológico. Entretanto, na prática, é extremamente difícil fazer esta segregação (CONWAY e BRINER, 2005).

5. FATORES FORMADORES DO CONTRATO PSICOLÓGICO

Segundo Schein (1980), cada indivíduo, seja empregado ou gerente, molda suas

expectativas com base em suas necessidades íntimas, no que aprendeu de outros, das tradições e normas que possam estar operando no ambiente, de suas próprias experiências passadas e de uma grande variedade de outras fontes. O relacionamento entre o indivíduo e a organização é interativo, revelado pela influência recíproca e por um processo de barganha mútuo para estabelecer e restabelecer um contrato psicológico que seja viável.

Rousseau (1995) estrutura dois grupos específicos de fatores que atuam na formação do contrato psicológico: § Mensagens externas e insinuações sociais da organização, por meio da expressão e

interpretação das intenções futuras da empresa. § Contexto social e as interpretações, predisposições e construções internas do indivíduo

influenciadas pelo seu estilo pessoal de processar as informações que recebe.

No primeiro grupo, podemos entender mensagens externas como os compromissos transmitidos por eventos que sinalizam intenções sobre o futuro. São eventos que costumam ocorrer nos processos de gestão de recursos humanos, tais como: recrutamento, socialização, promoções e atividades de desenvolvimento de pessoal. Algumas vezes, podem ocorrer também durante a implementação de mudanças organizacionais, como no anúncio de reestruturações ou mudanças de foco estratégico (ROUSSEAU, 1995).

Alguns tipos de mensagens externas que comunicam promessas podem ser: declarações, observação do tratamento dado a outros, políticas corporativas, além de construções sociais baseadas em experiências passadas ou na reputação da organização. Já as insinuações sociais, são informações obtidas de colegas de trabalho e têm como função: colaborar na formação do contrato psicológico; transmitir pressão social para que o indivíduo se ajuste ao entendimento do grupo sobre os termos do contrato; e moldar como o indivíduo interpretará as ações da organização (ROUSSEAU, 1995).

Algumas características são importantes para que o indivíduo possa atribuir credibilidade e intenção às mensagens recebidas, conferindo-lhes caráter de “promessas”. Segundo Rousseau (1995), o emissor da mensagem deve ser percebido como um indivíduo

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dotado de autoridade, poder e capacidade de estabelecer o compromisso. Deve se inserir em um contexto considerado apropriado; por exemplo, durante atividades relacionadas à gestão de pessoas, na comunicação sobre avaliação ou novos padrões de desempenho, ou em meio a comunicações sobre mudanças organizacionais. Outro elemento que dá credibilidade à “promessa” surge quando o emissor da mensagem se comporta de maneira consistente com o compromisso estabelecido.

Rousseau (1995) apresenta dois fatores pessoais – viés cognitivo (estilo de processamento de informações) e motivação para carreira – como características que influenciam a forma do indivíduo utilizar as informações codificadas.

Como viés cognitivo se inclui: visões irrealistas de si mesmo, percepção exagerada de controle do ambiente e excesso de otimismo (TAYLOR e BROWN, 1988). As evidências indicam que a maioria dos indivíduos demonstra possuir uma visão muito positiva sobre si mesmo, deixando de lado seus aspectos negativos, que são considerados sem importância. Taylor e Brown (1988) observam, ainda, que a maioria dos indivíduos acredita ter desempenho “acima da média”, possuir mais habilidades, ter mais sorte, trabalhar com mais empenho que os demais e ter uma visão de um futuro melhor que a média dos indivíduos. As pessoas têm a propensão de se lembrar mais das informações que se ajustam ao conceito que têm de si mesmas, tendendo a se esquecer das informações que o contradizem.

Como conseqüência do estilo cognitivo, os indivíduos tendem a acreditar que atenderam a seus compromissos ou obrigações do contrato, ao mesmo tempo que estão propensos a se lembrar apenas dos compromissos nos quais se sentem mais competentes em atender ou ser mais bem-sucedidos (ROUSSEAU, 1995).

A motivação para a carreira, segundo Rousseau (1990), também é um fator que influencia a formação do contrato: indivíduos que pretendem fazer carreira de longo prazo na organização desenvolvem compromissos e expectativas diferentes dos indivíduos que pretendem usar esta organização como uma “passagem” para outros empregos, o que é chamado na literatura de “carreirismo”.

O contrato formal de trabalho costuma ser assinado pelo empregado e por um agente da organização, enquanto o contrato psicológico se forma através da interação com inúmeros “representantes da organização”. Dentre estes estão: recrutadores, gerentes, colegas, mentores, além de mensagens advindas de vários sistemas, processos e documentos da organização, tais como: sistema de remuneração, benefícios oferecidos, processo de avaliação de desempenho, carreira, treinamento e manuais de gestão de pessoal. É esperado que estes agentes adotem mensagens alinhadas e congruentes, mas isso dificilmente acontece e, o tempo todo, são feitos os mais diversos tipos de compromissos na organização (ROUSSEAU, 1995).

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Guest (1998) considera inevitável que haja a percepção de violação do contrato

psicológico, em decorrência de existirem múltiplos agentes organizacionais, que podem estar, simultaneamente, oferecendo contratos diferentes ou concorrentes. Considerando a diversidade dos agentes que atuam fazendo promessas, e os que são capazes de cumpri-las, não seria surpresa, segundo o autor, encontrar evidências de que o contrato psicológico tenha sido violado.

6. AS DIVERSAS NATUREZAS DO CONTRATO PSICOLÓGICO

Os contratos psicológicos se diferenciam de várias formas, mas comumente as

diferenças se baseiam na natureza da relação entre o indivíduo e a organização. Handy (1978) apresenta três tipos de contratos psicológicos: coercitivo, calculista e cooperativo. Segundo o autor, é raro encontrar contratos definidos de forma tão clara quanto à categorização apresentada, lembrando que os diversos tipos podem coexistir simultaneamente em uma mesma organização.

Os contratos coercitivos (Handy, 1978) se formariam em organizações onde o indivíduo é mantido como membro contra sua vontade, como em prisões e hospícios. Neste tipo de contrato, os indivíduos se conformam em obedecer em troca de não serem punidos. Estes tipos de organizações fortalecem seu controle, despojando o indivíduo de sua identidade pessoal e enfatizando a conformidade. O autor lembra que infelizmente algumas instituições, como escolas e fábricas, podem ser incluídas nesta categoria de contrato.

Os contratos calculistas (HANDY, 1978) são voluntários, e, em geral, há uma troca bastante explicita de bens, dinheiro ou “coisas desejadas” (promoção, oportunidade social, o próprio trabalho) por serviços prestados. Este seria o tipo de contrato predominante na maioria das organizações industriais. Em situações em que a organização busca obter mais resultados pela mesma remuneração, ou ameaça retirar a possibilidade de trabalho do indivíduo, este poderá ter a percepção de que o contrato se tornou coercitivo e tenderá a ajustar seu lado do contrato.

Já nos contratos cooperativos (HANDY, 1978), o indivíduo tende a identificar-se

com as metas da organização e participar ativamente na sua consecução. Em troca de seu envolvimento, além de remuneração mais justa, recebe mais poder e mais liberdade para efetuar seu trabalho na busca das metas. O autor alerta que nem todos os indivíduos estarão predispostos a compartilhar a responsabilidade por metas e que não se pode impor este tipo de contrato, sob o risco de que ele pareça coercitivo. A liberdade de aceitá-lo seria um dos pré-requisitos para sua existência.

Rousseau (1995) caracteriza dois tipos de contratos, que guardam algum tipo de ligação com a categorização de Handy (1978), entretanto, têm sido os mais citados na

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literatura mais recente: os transacionais e os relacionais. Eles se baseiam na diversidade da natureza das trocas percebidas pelos empregados e pelo tempo de contratação (finito ou indeterminado) estabelecido pela organização.

Os dois tipos apresentados seriam extremidades de um contínuo que permite acomodar as mais diversas naturezas de contratos. O contrato transacional costuma ser estabelecido com término específico, de curto prazo, a base de troca é monetária e o envolvimento entre as partes é limitado. Já o contrato relacional foca em uma relação sem prazo de término estabelecido, envolve obrigações no longo prazo, é baseado não apenas em trocas monetárias, mas, também, socioemocionais, requerendo investimentos de ambas as partes, que costumam ser percebidos como barreiras à saída.

Uma forma mais elaborada de compreender os contratos contemporâneos é apresentada por Rousseau (1995), que faz uso de um modelo de duas dimensões: duração da relação e requisitos de desempenho.

Quadro 1: Tipos de Contratos Psicológicos (Rousseau, 1995) 12

Requisitos de Desempenho

Especificados Não especificados Duração Transacional Transacional

Curto prazo

Baixo nível de ambigüidade; Alta rotatividade; Baixo comprometimento dos membros; Liberdade para aderir a novos contratos; Baixo nível de aprendizado; Integração e identificação fracas.

Ambigüidade e incerteza; Alta rotatividade, término; Instabilidade.

Equilibrado Relacional

Longo prazo

Alto nível de comprometimento dos membros; Alto nível de integração e identificação; Desenvolvimento contínuo; Suporte mútuo; Dinâmico.

Alto nível de comprometimento dos membros; Alto nível de compromisso afetivo; Alto nível de integração e identificação; Estabilidade.

A distinção na natureza dos contratos, transacional ou relacional, traz implicações para a forma como um empregado percebe que seu contrato foi violado e contribui para determinar sua resposta a esta percepção (MORRISON e ROBINSON, 1997).

12 Tradução livre da autora .

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Cada contrato psicológico é único, pois se desenvolve a partir das necessidades do indivíduo Entretanto, de acordo com Rousseau (1995), algumas vezes ocorrem contratos psicológicos compartilhados, chamados de contratos normativos. São situações em que os indivíduos interpretam seus compromissos e obrigações de forma similar, e para que isso ocorra, deve haver um alto grau de interação e compartilhamento de informações entre os indivíduos, além de um ambiente social comum a todos. Quando os indivíduos adotam crenças comuns sobre seus compromissos com seu empregador e as obrigações deste, o contrato normativo passa a fazer parte das normas sociais do ambiente de trabalho, passando a fazer parte da cultura do grupo ou da organização.

Guest (1998), de certa forma, critica esta expansão do contrato psicológico. O autor entende que o aprendizado obtido no processo de socialização de novos empregados resulta na formação de suposições sobre o comportamento adequado a adotar e de expectativas sobre as conseqüências do comportamento adotado. Desta forma, como não ocorre a interação com alguém em posição de autoridade, tampouco há o reconhecimento da articulação de promessas, inviabilizando, assim, a composição do conteúdo do contrato psicológico do empregado.

7. O EFEITO DO TEMPO

À medida que as necessidades dos indivíduos e das organizações se modificam, também se modificam as expectativas mútuas em relação ao contrato psicológico, transformando-o em um contrato dinâmico e que precisa de constante renegociação.

Schein (1980) alega que no início da carreira as expectativas estão mais relacionadas com o aprendizado sobre o trabalho; mais tarde, quando o indivíduo se sente mais produtivo, sua expectativa maior se relaciona com o reconhecimento e as recompensas pela contribuição dada. No período final da carreira, quando a contribuição parece ser menos visível, pode surgir a necessidade de reafirmação e segurança, e as expectativas de que a organização “tome conta” do indivíduo, e que ele não seja “descartado”.

Do ponto de vista da organização, Schein (1980) apresenta expectativas relacionadas a altos níveis de motivação, empenho e esforço dos empregados, quando é uma empresa jovem, em crescimento, ou está travando batalhas com seus concorrentes. Espera mais lealdade, quando está sofrendo algum tipo de ameaça, e um desempenho constante em períodos de estabilidade, quando acredita estar oferecendo segurança de trabalho no longo prazo para seus empregados.

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8. A VIOLAÇÃO DO CONTRATO PSICOLÓGICO

A violação do contrato psicológico pode ocorrer de várias formas e pode ser percebida em variadas intensidades. Apesar de ser potencialmente danosa à reputação das empresas, às carreiras dos indivíduos e às relações de trabalho, a violação parece ser freqüente. Os indivíduos parecem sobreviver a ela, e apesar de muitas vezes não ser fatal para o relacionamento, pode provocar respostas diversas (ROUSSEAU, 1995).

A violação é definida como o fracasso em atender aos termos do contrato. Considerando sua natureza subjetiva, as diferentes maneiras de os indivíduos interpretarem as circunstâncias do evento determinarão sua percepção sobre a violação. É mais fácil que os indivíduos sintam a violação, do que tenham certeza de que ela realmente ocorreu. Rousseau (1995) argumenta que as violações podem ter origem em eventos de naturezas diferentes. Podem ser provocadas inadvertidamente, quando o empregador é capaz e deseja atender ao termo do contrato, mas ocorrem divergências de interpretação. Quando há uma interrupção no termo do contrato, o empregador deseja cumprir com o compromisso, mas não é capaz por diversas razões. Ou finalmente, quando realmente há uma quebra ou infração do compromisso, no caso de o empregador ser capaz de cumpri-lo, mas não o desejar, renegando, assim, o contrato psicológico.

A autora defende que a violação é percebida quando causa prejuízos ao indivíduo, que deveriam ser evitados pelo contrato psicológico. O fracasso em atender aos compromissos estabelecidos pode decorrer de: oportunismo, negligência ou fracasso na cooperação em busca da resolução de situações de conflito. As situações de violação podem ser causadas pelas ações de diversos agentes organizacionais no seu relacionamento com o indivíduo, tais como: recrutadores, gerentes, colegas, mentores e pela alta gerência. Os sistemas de gestão da organização também podem ser a origem da violação, quando acontecem mudanças, ou elas são percebidas, na remuneração, nos benefícios, no desenvolvimento de carreira, na avaliação de desempenho e no treinamento.

Um problema relevante na questão de violação de contratos psicológicos é compreender por que alguns eventos, aparentemente contrários aos termos do contrato, não são percebidos como violação, enquanto outros, aparentemente inócuos, geram reações adversas. Rousseau (1995) propõe um modelo, apresentado a seguir, para a compreensão da dinâmica que ocorre na percepção da violação do contrato.

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Figura 2: Modelo de violação de contratos psicológicos (ROUSSEAU, 1995)

Segundo a autora, situações que provoquem um monitoramento constante do

contrato, por parte dos empregados, como mudanças organizacionais ou de lideranças, aumentam a quantidade de discrepâncias percebidas nos termos contratuais. Em geral, as grandes discrepâncias têm mais chance de serem percebidas como violações, no entanto, em situações de relacionamento problemático, entre empregado e empregador, as pequenas discrepâncias também poderão ser consideradas violações.

Quando um contrato é percebido como violado, as respostas podem tomar várias formas. Baseada em pesquisas de diversos autores, Rousseau (1995) propõe a análise das respostas em duas dimensões: tipo (ativa ou passiva) e natureza da ação (construtiva ou destrutiva).

Figura 3: Respostas à violação de contratos psicológicos (ROUSSEAU, 1995)

Construtiva Destrutiva Ativa Expressão Negligência ou Destruição

Passiva Lealdade ou Silêncio Saída

A natureza da resposta pode ser induzida por predisposições pessoais e fatores situacionais. Características pessoais que predispõem a vítima a acreditar que o relacionamento tem valor e deve ser salvo devem promover comportamentos de aprofundamento do relacionamento, tais como expressão ou lealdade (ROUSSEAU, 1995). Quando não existe esta crença, as demais respostas serão mais prováveis. A observação do

Monitoramento

Discrepância no contrato

Ação corretiva

Perda percebida

Percepção de propósito

Credibilidade das explicações

Justiçanos

procedimentos

Violação

Força do relacionamento

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Discrepância no contrato

Ação corretiva

Perda percebida

Percepção de propósito

Credibilidade das explicações

Justiçanos

procedimentos

Violação

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comportamento de colegas, em situações similares, e as suas conseqüências também podem influenciar na seleção da resposta à violação (ROUSSEAU, 1995).

A saída pode ocorrer de ambas as partes, com o término do relacionamento por parte da empresa, ou com o término voluntário do relacionamento por parte do empregado. Rousseau (1995) entende que a saída é comum em contratos transacionais, em que o custo de saída seria relativamente mais baixo; quando existem outras oportunidades de emprego disponíveis; nos casos em que o relacionamento é recente; quando outras pessoas também estão saindo; ou nas situações em que as tentativas de reparar a violação do contrato fracassaram.

A expressão se refere às ações que as vítimas tomam para tentar provocar a reparação da violação. Segundo Rousseau (1995), são ações que tentam reverter a violação ou buscar compensações que permitam a redução da percepção de perda e a busca da recuperação da confiança no contrato e no relacionamento. Este tipo de resposta pode ocorrer quando existe um relacionamento positivo e de confiança; há um canal de comunicação que o viabilize; ocorrem experiências de comportamentos similares; ou os empregados acreditam que podem influenciar a outra parte (ROUSSEAU, 1995).

Rousseau (1995) interpreta o silêncio como uma forma de não-resposta, que pode ser compreendida como lealdade, refletindo um desejo de resistência ou aceitação da situação desfavorável. Pode ocorrer quando o indivíduo acredita que não tenha outra alternativa de comportamento; que não possa exercer influência sobre a outra parte; quando não existem canais para buscar a reparação; ou nos casos em que não têm alternativas de emprego fora da empresa.

O último tipo de resposta, a negligência ou destruição, segundo Rousseau (1995), tende a ocorrer quando já existe um histórico de conflito, desconfiança e violação no relacionamento. É um tipo de resposta que pode ser incentivado também por situações semelhantes envolvendo outros funcionários e normalmente se estabelece em circunstâncias em que inexistem os canais de viabilização da expressão.

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CONWAY, N.; BRINER, R. B. Understanding psychological contracts at work: a critical evaluation of theory and research. New York: Oxford, 2005. 226 p. DABOS, G. E.; ROUSSEAU, D. M. Mutuality and reciprocity in the psychological contracts of employees and employers. Journal of Applied Psychology, v. 89, n. 1, p. 52-72, 2004. GUEST, D. E. Is the psychological contract worth taking seriously? Journal of Organizational Behavior , v. 19, n. Special issue: The psychological contract at work, p. 649 -664, 1998.

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ABSTRACT

The psychological contract is a very relevant issue for understanding work relations, for it has been considered, among the researchers, as the forming basis for the employee-employer relationship. This article has the objective to synthesize the literature about the psychological contract, since it’s first

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conceptualization, by Argyris, in 1960 and Levinson, in 1965, until it’s resumption by Denise M. Rousseau in the 80’s. The article approaches some controversial issues in its definition; beyond it’s nature, characteristics, forming elements, the impact of time and contract violations.

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ANÁLISE DO SIGNIFICADO DO TRABALHO BASEADA EM RELATOS DO LIVRO CLOSING

Ana Carolina O. Andrade Pinto

Milena Mercedes Puma

RESUMO

O significado do trabalho passou por diversas transformações ao longo do tempo. Isso se deu principalmente porque as relações de trabalho sofreram grandes modificações para se adaptar a novos meios de produção ou diferentes práticas gerenciais. Atualmente, o trabalho é central na vida de grande parte dos indivíduos, sendo também um instrumento muito importante na composição da nossa sociedade. Dado o tempo da vida de um indivíduo dedicado ao trabalho hoje em dia, torna-se muito importante entender seus benefícios e como as outras esferas da vida pessoal são afetadas por ele. Para tentar compreender como é vista a questão do trabalho, estudamos os principais teóricos do assunto e fizemos uma análise das histórias de cinco pessoas contadas no livro Closing, que trata da reação dos funcionários na ocasião do fechamento de uma fábrica de móveis, bem como de seus sentimentos em relação ao trabalho e à organização. Concluímos, após observar as diferentes fases pela qual passaram os indivíduos estudados, que, na sociedade industrializada atual, o emprego não é mais visto como o lugar da estabilidade e da segurança, ele é principalmente um instrumento para obter benefícios econômicos, sendo voltado para melhorar a experiência pessoal de cada um. Podemos sugerir que a tendência de descentralização do trabalho, vista com mais freqüência ultimamente na literatura, pode estar sendo causada por este novo significado que o trabalho tem assumido na sociedade. Palavras-chave: significado do trabalho, Closing; relações de trabalho, transforma-ção, descentralização do trabalho.

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1. INTRODUÇÃO

As relações de trabalho estiveram sempre em constante transformação, adaptando-se aos meios de produção dominantes e às novas práticas gerenciais. No entanto, hoje a centralidade do trabalho na vida dos trabalhadores é notável e pode ser percebida pelo número de anos que as pessoas passam se preparando para o trabalho, e no trabalho de fato. Além da centralidade, o trabalho é também responsável pela estrutura das relações sociais entre os indivíduos e pela própria formação da sociedade, sendo determinante na designação de papéis desta sociedade.

Mais importante, do ponto de vista dos valores humanos, é o papel subjetivo multifacetado do trabalho. A pergunta “o que é o trabalho para você?” não tem uma resposta única e correta devido à diversidade de conotações e significados que o termo carrega. Cada um vivencia a experiência do trabalho de maneira única e individual. Nos dias de hoje, pode-se dizer que ele tem, primordialmente, a função de localizar o indivíduo na sociedade, e é a referência ao redor da qual se pode construir outras estruturas sociais, como uma família ou um grupo de amigos. O trabalho tem o papel de permitir que o indivíduo possua uma família, uma casa, amigos, sendo também visto, por isso, como um instrumento.

Dada toda a importância do trabalho e as modificações que as relações trabalhistas vêm sofrendo nos últimos anos, existe grande preocupação em entender o significado do trabalho para os trabalhadores e os impactos que as reestruturações organizacionais têm sobre esta percepção. Procura-se também entender os efeitos que estas mudanças podem trazer para o significado do trabalho e, por isso, muitos pesquisadores se dedicam a buscar respostas para esta questão tão central no estudo das relações sociais.

2. OBJETIVO DO TRABALHO E RELEVÂNCIA

Este trabalho tem como objetivo fazer um estudo sobre o significado do trabalho na atualidade, buscando uma aproximação do arcabouço teórico e da experiência empírica, que analisa como determinadas pessoas vêem e se relacionam com a questão do trabalho. Para fazer essa ponte, estudamos os principais teóricos do assunto e fizemos uma análise das histórias de cinco pessoas contadas no livro Closing, que trata da reação dos funcionários na ocasião do fechamento da fábrica de móveis, bem como de seus sentimentos em relação ao trabalho e à organização.

Este estudo é relevante na medida em que busca entender o significado do trabalho como uma construção social e por causa da dificuldade de conceituar o que é o trabalho devido a sua natureza complexa e multifuncional (SALANOVA et al, 1996).

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Na atual sociedade industrializada, as pessoas passam cerca de 1/3 de suas vidas trabalhando, sendo esta mais uma razão para buscar entender o que o trabalho significa, o que traz de benefícios, como é vivenciado e como suas experiências afetam outras esferas da vida pessoal.

3. REVISÃO DE LITERATURA

Segundo Salanova et al (1996), o trabalho é uma construção social, que depende e é influenciado por todas as variáveis de um indivíduo. Ele não é essencial ou instintivo. Os autores consideram que uma aproximação teórica do conceito de trabalho envolve a definição de que o trabalho não tem um fim em si mesmo, mas que consiste de um meio para obter um fim, diferente da atividade laboral. Além disso, eles também estabelecem que o trabalho tem funções psicossociais como:

Ø Integração, que consiste em dar sentido à vida; Ø Provisão de status e prestígio; Ø Formação de identidade pessoal; Ø Função econômica, na intenção de manter a sobrevivência e as atividades de

consumo; Ø Fonte de oportunidades para a interação e os contatos sociais; Ø Estruturação do tempo, organizando e dividindo os diversos âmbitos da vida de um

indivíduo; Ø Manutenção do indivíduo sob uma atividade regular, estabelecendo um ponto de

referência, de dever; Ø Fonte de oportunidade de desenvolver habilidades e destrezas; Ø Função de transmitir expectativas sociais, através da socialização no ambiente de

trabalho; Ø Função de proporcionar poder e controle, sobre outros ou sobre processos, e até

mesmo sobre a própria vida.

Existem também funções negativas no trabalho, quando este é alienante (MARX, 1844 apud SALANOVA et al, 1996). No entanto, do ponto de vista de Sarti (2005), a classe pobre brasileira, normalmente sujeita a este tipo de função, desenvolve uma série de argumentos que justificam o trabalho monótono e repetitivo, como a defesa da honra e da dignidade, pois vê o trabalho como um direito social dela.

O significado atribuído ao trabalho por parte de Steers & Porter (apud SALANOVA

et al, 1996), finalmente, é o do trabalho como indicador de motivação laboral, no qual, a partir das características positivas do trabalho, o indivíduo passa a se sentir melhor em relação a ele mesmo, aumentando então seu comprometimento com o trabalho. Outro significado atribuído ao trabalho é o de representação social, sendo este uma parte

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importante da estrutura social construída pelos trabalhadores, de acordo com as normas sociais vigentes.

Outro significado ainda do trabalho está ligado ao produto de três forças: 1) o

ambiente do trabalho, o que está relacionado ao sistema de recompensas e ao design do trabalho, afetando o significado que é extraído deste trabalho; 2) as características psicológicas do indivíduo, que afetam diretamente o significado atribuído ao trabalho; e 3) o ambiente social do trabalho, que engloba os pares e chefes, que influenciam o grau de importância a ser dado aos diferentes aspectos do significado do trabalho (ROBERSON, 1990 apud WRZESNIEWSKI & DUTTON, 2001).

Um dos estudos mais importantes na área de significado do trabalho considera-o

uma construção psicológica multidimensional, relatando as seguintes dimensões: Ø Centralidade do trabalho; Ø Normas sociais sobre o trabalho; Ø Resultados valorizados do trabalho; Ø Importância das metas do trabalho; Ø Identificação com o papel do trabalho (MOW, 1983 apud SALANOVA et al, 1996).

Quintanilla & Wilpert (1991) desenvolveram um estudo sobre as mudanças que o

significado do trabalho vem sofrendo nos últimos tempos, com base na análise da primeira aplicação e da reaplicação dos questionários do estudo MOW (Meaning Of Work – 1983) seis anos após o primeiro. Dada a crescente evolução tecnológica, o tempo gasto no trabalho vem diminuindo e isso pode ser um sinal de que a sociedade industrial pode não funcionar mais como sociedade de trabalho. Opaschowski (apud QUINTANILLA & WILPERT, 1991) relata o avanço dos valores de lazer, tomando espaço dos valores trabalhistas, o que transforma a consciência dos indivíduos e impacta os valores sociais compartilhados. Observações da literatura sobre o significado do trabalho trazem muitas referências acerca da mudança dos valores dos indivíduos, e as justificativas encontradas giram em torno de questões como a ética de trabalho protestante, os objetivos em geral, os objetivos do trabalho.

No entanto, a comparação dos estudos MOW sugere que os indivíduos estão hoje mais inclinados para a esfera do lazer, que dão mais importância aos valores desta esfera. Uma importante informação obtida é de que as pessoas começam a pensar em trabalho muito mais pelo aspecto econômico, já que a porcentagem de pessoas que pararia de trabalhar se tivesse uma quantia razoável de dinheiro para viver confortavelmente aumentou significativamente nestes seis anos. É preciso ressaltar que apesar de o trabalho passar a ser uma atividade primordialmente para a subsistência, os indivíduos ainda reconhecem que ele adiciona uma variedade de outros benefícios.

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Os autores discutem também que as mudanças observadas neste estudo ainda são muito pequenas e que a mudança da centralidade do trabalho pode estar diretamente relacionada ao fato de este não ocupar mais tantas horas da vida dos indivíduos como antigamente (QUINTANILLA & WILPERT, 1991). A diminuição das horas de trabalho diárias e de tarefas do tipo alienantes, além do aumento da educação da população trabalhadora, podem ser fatores que contribuem largamente para este aumento da importância dos momentos de lazer dos trabalhadores. É ainda levantada a questão dos avanços tecnológicos, possibilitando o tele-trabalho, o que sem dúvida aumenta mais ainda a dificuldade para limitar eficientemente as esferas de trabalho e lazer.

Parry (2003) explora a mudança do significado do trabalho para trabalhadores de minas de carvão do País de Gales, onde, antigamente, o processo de identidade era gerado ao redor do emprego nas minas. Com as reestruturações que alteraram a natureza do trabalho em minas de carvão, o significado do trabalho para estes trabalhadores desapareceu nas suas formas mais tradicionais.

As evidências apresentadas neste estudo mostram que o ambiente de trabalho desfavorável das minas de carvão era compensado pela socialização deste mesmo ambiente, além de um salário que provia segurança e de um emprego significativo, relativamente autônomo, que tinha certo status na comunidade. No momento da reestruturação, as oportunidades criadas conseguiram prover o mesmo ambiente amigável somente para uma parcela de indivíduos privilegiados, o que fez com que os menos privilegiados saíssem à procura de um ambiente similar em atividades que trouxessem o mesmo significado, como atividades familiares, políticas ou de lazer. O autor chama a atenção para o fato de que, por causa da modificação do significado do trabalho destes ex-mineiros, a vida deles hoje está amplamente associada a uma interconexão de experiências compartilhadas que dão sentido às narrativas pessoais de cada um, o que está diretamente relacionado à diminuição do emprego formalizado ligado à socialização.

Um estudo desenvolvido por Claes e Quintanilla (1993) procurou identificar padrões no significado no trabalho de operadores de máquinas no terceiro ano no desempenho da função. Os padrões obtidos empiricamente variavam em três grandes variáveis, que eram: centralidade do trabalho, importância dos objetivos do trabalho e orientação direcionada a normas sociais sobre o trabalho.

O estudo demonstrou que, no início da carreira, o significado do trabalho parece ser muito mais dependente da situação pessoal de cada um do que de um componente estável das características do trabalho. Para dois terços da amostra, o significado do trabalho mudou em dois anos, tendendo a uma menor centralidade do trabalho e maior orientação para objetivos não-econômicos. O significado do trabalho pareceu ser diretamente influenciado pela idade dos respondentes, assim como o país de origem, o ambiente de trabalho, a socialização obtida neste ambiente e o comportamento.

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Os resultados indicam a importância de se estabelecer um mercado de trabalho

positivo, com táticas de socialização dentro da organização e planejamento de carreira, assim como a designação de empregos de acordo com as habilidades individuais dos empregados, treinamento e monitoramento do bem-estar e do comportamento dos indivíduos. Estas características do mercado permitiriam aos empregados jovens o desenvolvimento de um trabalho melhor tanto para eles mesmos, quanto para a organização em que estão inseridos.

Os estudos de significado do trabalho têm, reconhecidamente, um viés muito grande, já que utilizam, na maioria das vezes, estudos realizados com homens em empregos full-time, baseados na indústria manufatureira. Além disso, um fator de discrepância ainda maior é o fato de a maioria deles serem conduzidos em países do “Norte”, o que reforça ainda mais os padrões citados acima. Ou seja, nem as amplas modificações sofridas pelo trabalho em países pobres ou emergentes nem as diferentes percepções do significado do trabalho nestes países são contempladas (GREGSON, SIMONSEN &VAIOU, 1999).

A partir desta idéia, as discrepâncias resultantes das diferenças culturais dos analisados e dos analistas em estudos sobre o significado do trabalho são exploradas. Por exemplo, a terminologia utilizada para designar diferentes formas de trabalho muda muito, dependendo da sociedade estudada, resultando em conclusões diversas. Os autores, então, exploram similaridades e disparidades do trabalho part-time, auto-emprego e trabalho informal na Dinamarca, na Grécia e na Inglaterra. Este estudo revelou que o significado do trabalho nestes países está fortemente associado às raízes históricas, o que gera, invariavelmente, paralelos e distinções entre eles bastante claros. Por isso, os autores sugerem que a dicotomia Norte-Sul, em sua maioria de natureza opositora, pode não estar somente coberta de diferenças no significado do trabalho. Mais que isso, as análises desta dicotomia são baseadas ainda em pouca informação, e as maiores disparidades devem ser observadas entre diferentes categorias de trabalho.

Um exemplo de diferenças culturais influenciando o significado do trabalho nas diferentes classes econômicas é o trabalho de Sarti (2005), que fala sobre a dimensão do trabalho no mundo da classe mais pobre. Nesta classe, o trabalho está diretamente ligado à formação da identidade do indivíduo: é através do trabalho que os trabalhadores pobres têm a oportunidade de demonstrar sua dignidade, capacidade e disposição de vencer, o que faz dele uma pessoa “rica de espírito”.

A disposição para trabalhar é vista como uma dádiva, que compensa o fato de pertencerem à classe pobre, e é complementada pela boa vontade para aprender, que é também uma característica importante na busca pela dignidade do trabalho. Tais aspectos estão relacionados para que o trabalhador possa sentir que tem honra; e esta honra lhe dá

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a possibilidade de ter direito a um trabalho. Por ser uma pessoa honrada, digna, disposta e capaz de aprender, este indivíduo merece que a sociedade reconheça seu mérito e lhe conceda o direito ao trabalho, que em nada está ligado à noção de cidadania, e sim à de honra.

Considerando que o significado do trabalho é de grande importância no reconhecimento de dignidade da vida de um indivíduo, Hodson (2002) analisou a influência de aspectos demográficos, principalmente gênero e raça, no significado do trabalho, e também a influência da estrutura gerencial da organização. Os resultados da análise de certos casos ressaltaram que a liderança gerencial manifestada sob a forma de uma estrutura organizacional viável e producente é de extrema importância para a manutenção do trabalho como significativo na vida dos indivíduos. Mais ainda, foi revelado também que a autonomia no trabalho é de grande valor para a dignidade do trabalhador, e que as grandes empresas têm grandes dificuldades de adquirir o efeito positivo advindo desta autonomia por terem muitos mecanismos de controle.

O estudo revelou que um dos aspectos mais importantes para a manutenção de um significado positivo para o trabalho é o respeito aos direitos do trabalhador. A análise mais detalhada desta relação pode revelar uma ligação ainda forte dos trabalhadores com o antigo contrato psicológico, que estabelece segurança, uma questão muito valorizada no trabalho.

Um estudo de WrzesniewskI & Dutton (2001), que observou um indivíduo em seu trabalho sendo ativo na manipulação das características do próprio trabalho para uma melhor interação e adaptação de si mesmo, revelou um melhor desempenho deste. Os autores argumentam que os indivíduos têm grande participação quando se trata da percepção do significado do trabalho por meio da manipulação de características do próprio trabalho para proporcionar uma melhor adaptação. Uma visão mais holística desta adaptação implicaria entender que os indivíduos constroem sua vida e o significado desta com pequenas adaptações do trabalho e deles mesmos, dada a centralidade do trabalho na vida destes indivíduos.

4. METODOLOGIA

Os dados são secundários coletados do livro Closing: The life and death at an

american factory. Foram analisadas as interpretações de antigos funcionários da White Furniture Company, uma empresa americana de móveis localizada em Mebane, estado da Carolina do Norte. A empresa foi fundada em 1881 pelos irmãos White: Will e Dave, e foi a responsável pelo crescimento da pequena vila de Mebane. A empresa foi vendida em 1985 para o grupo Hickory – também da indústria de móveis, que contava com uma fábrica em Hillsborough –, passando a se chamar então Hickory-White. No entanto, em

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1991, todas as operações da Hickory-White foram fechadas, deixando cerca de 500 funcionários desempregados, 203 da fábrica de Mebane.

O livro Closing é um documentário sobre o fechamento da fábrica de Mebane, e os relatos dos ex-funcionários servem como fonte de interpretação da dimensão humana no processo da demissão em massa. Os cinco ex-funcionários têm as seguintes características: James

ü Nasceu em 1927, Newport, Tennessee. ü Ficou órfão de pai aos cinco anos e assumiu algumas responsabilidades dentro

de casa. ü Estudou somente até os 11 anos. ü Casou-se com uma alemã que conheceu durante a guerra (época em que

serviu no Exército). ü Entrou para White’s em 1951 e lá trabalhou até 1992 (41 anos) como

empacotador de móveis. Don

ü Nasceu em 1951, Brevard, Carolina do Norte. ü De família grande, teve infância pobre. ü Nasceu um líder. Habilidoso e inteligente. ü Em 1975, aos 22 anos, entrou para a indústria de móveis. ü Entrou em 1990 como gerente, já na fase em que a empresa era a Hickory-

White, e foi responsável por comunicar o fechamento, em 1991, a seus funcionários.

Annette

ü Nasceu em 1951. Mebane, Carolina do Norte. ü É afro-americana, divorciada, mãe de três filhos. ü Trabalhou desde a infância e abandonou a escola cedo. ü Entrou para a Hickory-White em 1990, uma das últimas pessoas a serem

contratadas. Foi funcionária de chão de fábrica. Robert

ü Nasceu em 1937, Mebane. Carolina do Norte. ü É afro-americano, casado e com filhos. ü Entrou para a White jovem, no ano de 1962, e se tornou o primeiro supervisor

negro da história da organização. ü No momento do fechamento era muito jovem para se aposentar e com muita

idade para começar uma nova carreira. ü Depois do fechamento da fábrica divide-se em dois empregos e mesmo assim

não consegue manter o padrão de vida alcançado na White.

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Margareth

ü Nasceu em 1938, Mebane, Carolina do Norte. ü Entrou para a White em 1956, depois da graduação na escola, e ficou na

empresa por 37 anos. Foi secretária da presidência. ü Casou em 1989 com Steve White, ex-CEO e ex-sócio da White.

5. DISCUSSÃO DE RESULTADOS JAMES

Para James, a questão da lealdade à empresa é fundamental. A empresa é fonte de segurança, estabilidade e longevidade, algo que deveria ser parecido com o próprio lar. Segundo ele, a relação com a empresa é como um casamento que dura para o resto da vida. Pelo seu depoimento, é possível constatar a centralidade do trabalho, a organização como um ponto de referência e como um meio que possibilita estruturar um lar e uma vida digna.

James e Margareth compartilham uma espécie de orgulho pela organização e pelos produtos de alta qualidade que a fábrica produzia. Para eles, o trabalho teria em primeiro lugar uma função integrativa ou significativa: é fonte de auto-estima e realização pessoal. Segundo Saranova, Gracia e Peiró (1996): “o trabalho cumpre esta função quando é intrinsecamente satisfatório e se converte em fontes de satisfação positiva”. Os valores subjetivos no trabalho da White são fundamentais para manter a satisfação e a lealdade dos funcionários.

Apesar do sentimento de ambos, James parece ser mais realista sobre a sua situação financeira e a de seus colegas. O sentimento dele é que a remuneração está aquém do esforço físico e mental empregado por ele e seus colegas. A remuneração dos funcionários é um tema que sempre incomodou James, que não se manteve calado e lutou por aquilo que considerava seu direito. Era um homem que acreditava em direitos e deveres e sabia que era um empregado esforçado. Apesar de não conseguir aumentos significativos, permanecia na empresa por outras razões. Provavelmente o significado psicossocial do trabalho para James passava por uma identificação com o papel do trabalho, ou seja, com aquilo que produz; e com os valores e crenças da organização, vista como uma grande família, cujos donos até eram acessíveis.

O que mais chama a atenção no caso de James é o fato de que o trabalho na White representava, para ele, mais do que um trabalho de fábrica (blue collar), era quando podia desempenhar um trabalho manual, de artesão, que requeria habilidade, destreza e

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até graça. E é possível constatar a satisfação dele com o que produzia vendo a decoração de sua casa: repleta de móveis das boas épocas da White. A decepção com a perda de qualidade dos móveis foi especialmente difícil para ele, que detestava a ênfase na quantidade. Essa decepção provocou então uma alteração na centralidade do trabalho, que perdeu importância logo depois da fusão com a Hickory. DON

Don, o gerente da fábrica, tem uma percepção clara de que o funcionário da fábrica de móveis é diferente do de qualquer outra fábrica. Para ele, os funcionários da manufatura de móveis são menos alienados e cooperam mais entre si do que os demais. Existe, em Don, a percepção da beleza por trás da transformação da madeira em móvel, o que parece estar ligado à dimensão “importância das metas laborais” do MOW. Isso explica, para ele, por que um emprego na White era desejado e a atmosfera positiva no ambiente de trabalho.

Don sabe também que o emprego para os funcionários é um meio de se chegar a um fim, representa principalmente uma função econômica. Em seu depoimento, afirma que as pessoas trabalham para comprar comida para seus filhos, para comprar uma casa, para pagar as contas. A percepção do gerente é a de que o trabalho significa principalmente uma troca, algo feito intencionalmente. Se fosse possível definir o trabalho, é provável que optasse pela sua definição concreta, que o caracteriza mais pelos aspectos tangíveis e objetivos da atividade.

E é por ter bem clara a noção de que o trabalho é o meio de sustentar financeiramente tantas famílias que a tarefa de comunicar as más notícias tornava-se um processo doloroso. As palavras referentes ao processo de demissão são pesadas e demonstram a profundidade das emoções geradas em Don. São palavras como: traição, devastação, dor, choque, conflito, dilema. Por estar relacionado à alta chefia e ser amigo do CEO do momento, Don passava a impressão de possuir poder e controle além do que de fato possuía, ocupando o papel de culpado ou cooperador da causa do fechamento. Para ele, ter a função de transmitir aquilo que não gostaria de transmitir e com o que não concorda é uma experiência traumatizante. E a decisão tomada foi a de nunca mais querer ser gerente para não repetir a experiência, que a compara com o inferno, ou uma guerra. Isto valida a teoria de Salanova, Gracia e Peiró (1996), que afirmam que o trabalho se trata de um “conjunto de cognições flexíveis e sujeito a mudanças e modificações em função das experiências pessoais e das mudanças em aspectos situacionais ou contextuais”. Don mudou o significado do trabalho e mudou também a centralidade do trabalho, que passou a ser relativa e não mais central.

Pelo relato de Don é possível perceber que o trabalho pode ter uma conotação negativa. As características de sua função na empresa, a natureza do seu trabalho e sua

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atividade principal (a de mediador) determinam, em parte, os efeitos ou conseqüências na sua experiência de trabalho.

Outro aspecto que chama a atenção em Don é a descoberta do trabalho na fábrica de móveis na sua juventude. Depois de duas experiências de trabalho, é o trabalho com móveis que encanta Don, o que aponta para uma identificação pessoal com o ramo de atividade. Esse encantamento poderia ter ocorrido devido ao envolvimento com um tipo de trabalho que envolve maestria, domínio da técnica. Mas é apenas uma hipótese teórica. ANNETTE

Annette é uma trabalhadora que não tem medo do trabalho pesado. Foi acostumada desde cedo a fazer alguns “bicos” na fazenda onde o pai trabalhava e aos 11 anos arrumou seu primeiro trabalho independente. O trabalho ocupa um lugar central e muito importante na vida de Annette e isso pode ser explicado pelos valores ensinado desde cedo pela figura dos pais. Ela declarou: “Meu pai e minha mãe me ensinaram isto: não roube, ganhe seu dinheiro.”

O orgulho de ter trabalhado a vida toda é explícito e pode ser comparado com o orgulho demonstrado por James quando fala da casa construída pelas próprias mãos. Tanto para Annette quanto para James o trabalho significa ao mesmo tempo orgulho e dever; o que estaria de acordo com a segunda dimensão de MOW: o trabalho como dever ou direito. Além disso, é uma questão de sobrevivência, o que coincide com os mesmos valores encontrados por Sarti nos trabalhadores da periferia de São Paulo: a disposição para o trabalho, a dignidade, o direito ao orgulho de si mesmo.

A luta de Annette parece ser a luta contra dois tipos de preconceitos: o de ser mulher (o que fazia com que seus colegas se perguntassem se ela seria capaz de fazer “trabalho de homem”) e o de ser negra. O significado do trabalho para ela é ter uma conduta de força de vontade e caráter diante das dificuldades encontradas principalmente no início. A firmeza com que Annette lidou com a tentativa de assédio e com os insultos que recebia evidencia o valor moral do trabalho para ela.

Existia, no seu caso, uma idealização do trabalho na White, considerado o trabalho dos “sonhos”. Aconteceram muitas tentativas de se empregar na empresa e as dificuldades iniciais – como preconceitos, desconhecimento da execução das tarefas e falta de treinamento – foram todas superadas. A remuneração para Annette era satisfatória – melhor do que nos trabalhos anteriores –, mas não era o principal. O orgulho do trabalho, a luta contra o preconceito, a construção de um ambiente melhor e o sentimento de pertencer a um grupo e contribuir para o todo eram mais importantes. Como aconteceu com James e com muitos outros, os valores subjetivos do trabalho eram mais importantes do que os valores materiais.

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Ela largou os estudos a fim de trabalhar, e ao longo do tempo passou por muitos

trabalhos e muitas mudanças em sua vida pessoal. O começo foi na roça, cuidando dos porcos, na plantação de tomate, na coleta de ovos. Depois foram trabalhos de fábrica, entre outras atividades. Enfrentou trabalhos mais ou menos pesados e com diferentes graus de racismo. Na esfera pessoal, mudou de cidade, casou, teve filhos, se separou, voltou para a cidade natal. Com tantas alterações e tendo mudado freqüentemente de ambiente de trabalho e de moradia, o significado do trabalho poderia ter se modificado para ela. Mas isso parece não ter acontecido. Os valores, as crenças e as condutas parecem permanecer os mesmos nela; o que apontaria para uma estabilidade do significado do trabalho. A garra e a disposição para lutar e seguir adiante quase faltaram em um momento de depressão, quando Annette pensou em suicídio. Mas foi apenas um momento, superado logo em seguida. ROBERT

O orgulho pelo bom trabalho e a luta contra o preconceito em um estado do sul dos EUA, onde a segregação entre negros e brancos era forte, também são compartilhados por Robert. Ele se tornou o primeiro supervisor negro da história da organização, o que era fonte clara de prestígio e auto-realização. O trabalho na White foi o primeiro na vida de Robert, e a estabilidade do emprego fazia com que o trabalho representasse uma fonte de identidade pessoal. Ele esperava trabalhar a vida toda na mesma empresa até o dia da aposentadoria, o que representa um indicador de que compartilhava as mesmas crenças laborais de James: o emprego como um lugar de estabilidade e segurança.

Robert afirma que quando entrou na White era muito jovem e agressivo, com muita vontade de trabalhar e de crescer. Ele passou a vida se definindo como um homem com habilidade para trabalhar bem e para trabalhar duro. Esse depoimento nos remete ao caráter masculino do trabalho, o discurso do homem viril, o de “homem forte para trabalhar” (SARTI, 2005). Essa disposição para o trabalho que Robert manifesta pode ser percebida como uma qualidade positiva da sua personalidade e é em parte responsável pela sua carreira bem-sucedida, que chega ao cargo de supervisor da fábrica.

A atividade de Robert na fábrica é bem executada, o que lhe traz um benefício moral e uma sensação de cumpridor do seu papel masculino de colocar dinheiro dentro de casa. O trabalho, para Robert, é parte de um compromisso moral com a família, que era, com a mulher e os dois filhos, considerada um “time”. O trabalho é um instrumento que viabiliza a vida familiar e também é um organizador do tempo, dividido entre tempo da fábrica e tempo da família. A esposa de Robert é mais aberta ao falar do impacto negativo da desestruturação do tempo de trabalho apos o fechamento. Ao se dividir em dois trabalhos, Robert sacrifica o tempo em família, implicando a formação de uma nova lógica no “time”.

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A percepção de estar fazendo um bom trabalho gerava a expectativa de logo ser

recompensado pelo seu superior. A este, Robert admirava, e sua relação com ele era muito satisfatória. Ele também tinha um bom relacionamento com os donos da empresa e com seus colegas de fábrica. As relações sociais que Robert estabelece no ambiente de trabalho dão sentido ao seu trabalho. É na White que ele se relaciona com pessoas fora de seu núcleo familiar, estabelecendo assim uma importante função do trabalho, que é a de gerar oportunidades de interação e contato social.

Fica claro que Robert identifica semelhanças fortes entre seus valores pessoais e os da White – lealdade, confiança, dignidade – e também com aquilo que faz (a atividade) A mudança para a White-Hickory foi muito perturbadora para ele, que não gostava da ênfase na quantidade. Por isso, quando foi transferido do chão de fábrica para a parte de transporte agradeceu por ficar longe do novo ambiente, que considerava um caldeirão de ansiedade e animosidade.

O momento do fechamento foi emocionante para Rober, que desde cedo trabalhou lá e ficou até os últimos dias. A identificação pessoal com aquele lugar onde trabalhou por tantos anos e vivenciou uma série de conquistas e experiências gratificantes, foi tão marcante que fechar a fábrica era como se fosse fechar uma parte de si mesmo, porque, assim como outros funcionários da White, Robert via a empresa como se fosse uma extensão do seu braço. E ao ver tudo se acabar, fez com que a esperança de que aquilo poderia ser salvo fosse embora definitivamente. Isso supõe uma ligação com a quinta dimensão do MOW: a identificação com o trabalho.

O fechamento da fábrica gerou não só perdas emocionais, mas também perdas materiais e econômicas para os mais de 200 funcionários. O impacto na vida pessoal de cada um foi enorme, e Robert considera a experiência traumática. Logo em seguida, ele percebe que o trabalho mudou, é temporário e instável. Robert idealiza o trabalho na White e pensa que trabalhos como o daqueles velhos tempos não existem mais. Mesmo assim, procura não se queixar e segue adiante. Define-se como um otimista, alguém que vê o lado ruim mas prefere se concentrar no lado positivo das coisas. MARGARETH

Margareth entrou para a White muito jovem, porém a identificação com a empresa e a vontade de trabalhar nela vieram desde cedo. A história da família de Margareth caminha paralelamente com a história da White, onde o pai trabalhava e onde o irmão foi trabalhar. A identidade de uma família inteira está entrelaçada com a identidade de uma organização.

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A dedicação de Margareth para com a empresa e depois para com Steve reflete sua própria personalidade. De hábitos simples, muito empenho e com muita vontade de cooperar, ela jamais faltou ao emprego. Na juventude, o trabalho era central para ela, que não se casou quando jovem e na maturidade dividia o tempo em dois: durante o dia trabalhava na fábrica, e à noite cuidava dos pais que estavam muito doentes. Nessa fase, o trabalho perde um pouco a centralidade porque a questão familiar passa a ser prioritária. Margareth, no entanto, faz o melhor que pode para atender bem aos dois lados: contrata uma enfermeira particular para cuidar dos pais durante o dia e se encarrega pessoalmente dos cuidados durante a noite.

Ela não tem uma atitude de descaso com a White, mas não abandona os pais. Em seu depoimento ela frisa, reiteradamente, que só faltou ao trabalho (duas vezes) durante o funeral dos pais, e é grata à empresa que lhe permitiu chegar atrasada diversas vezes. Era como se o contrato de trabalho houvesse se modificado e o empregador fosse flexível e solidário à causa.

Margareth ocupava um lugar junto à alta direção da empresa, como auxiliar administrativa da presidência, e por isso tinha acesso a informações privilegiadas. Provavelmente o trabalho significava para ela todos os aspectos positivos que a literatura indica: benefícios morais e financeiros, integração, relacionamentos sociais, identidade, status e prestígio, ponto de referencia, estruturação do tempo. A vida profissional de Margareth é uma vida de satisfação, que permitiu a ela ter participado de momentos gloriosos durante sua experiência de trabalho.

No relato de Margareth não há criticas ao comportamento da nova gestão, mas também não há elogios. Como os outros funcionários, é saudosa dos tempos da antiga White, e o fechamento da firma teve um impacto tão intenso que a faz afirmar que a ferida aberta na ocasião nunca se fechou, comprovando a ligação com a empresa e seus valores.

O companheirismo e a camaradagem aumentaram depois do anúncio do fechamento, e a principal preocupação de Margareth era com o destino dos funcionários, principalmente com os de 50 anos de idade, que ficavam em uma situação ainda mais difícil. Apesar de estar em contato com a alta chefia, ela não sabia como se daria o processo de downsizing, e logo só podia atuar consolando quem lhe pedia ajuda.

O aspecto social, de relacionamento com os demais, é o que parece ser o mais importante no caso de Margareth. Foi lá onde fez amizades e teve a oportunidade de aproveitar as boas condições físicas e psicológicas do emprego, a segurança e o horário de trabalho, que se tornou flexível quando precisou. Com certeza, para ela, o trabalho teve um valor positivo, por causa do bem-estar e da qualidade de vida que ele pôde proporcionar.

6. CONCLUSÕES

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A revisão de literatura aponta para o trabalho como uma fonte de aspectos

positivos: status, bem-estar, vida em sociedade, entre outros. Assim, o trabalho é visto como uma construção social, como uma atividade positiva e intencional que não tem um fim em si mesma, que é realizada para obter um benefício diferente da atividade trabalhista. Tais benefícios podem ser de natureza subjetiva ou material.

No entanto, o trabalho também apresenta disfunções, aspectos negativos, como apontados por muitos autores desde a época da Revolução Industrial (como é o caso de Marx).

A análise dos relatos baseados no livro Closing nos permite ver pelo menos três momentos distintos:

a. A época da antiga White: quando o trabalho era valorizado e idealizado. Constituía-se de um ambiente de trabalho agradável, de satisfação e orgulho pelo que era produzido e pelo tratamento digno recebido pelos funcionários.

b. O pós-venda: época da Hickory-White. Quando o valor passou a ser quantidade de produção e o ambiente ficou mais pesado, com controles rígidos e produção intensa.

c. Depois do fechamento: a entrada no mercado de trabalho dos anos 1990 mostrou uma realidade cruel, de trabalhos precários de pior qualidade.

No primeiro momento, o da velha White, o aspecto social salta aos olhos: Os

funcionários sentiam-se parte de um grupo, que contribui para a evolução da sociedade através do trabalho. Eram capazes de sustentar uma família e acreditavam estar fazendo um mundo melhor. Nessa White, o trabalho é dignificante, e é uma honra ter uma profissão. É como um rendimento moral que vai além do trabalho como uma simples troca de esforço por salário. O trabalho também tinha certa dose de idealização, comprovada pelo relato de Annette, que insistia em dizer que não havia preconceito racial, embora houvesse fortes evidências disso. Os valores da organização tiveram tal força que foram mais importantes que o fator remuneração, como é o caso de James, que teve a oportunidade de trabalhar na Ford Motor Company com um salário melhor, mas preferiu ficar.

No segundo momento, o ambiente muda com a troca da chefia e novas normas e crenças vão sendo implantadas pela nova gestão. A experiência de trabalho muda, mas isso não quer dizer que os valores de cada um acompanham as mudanças, como é o caso de Annette e Margareth.

Devido às modificações ocorridas nas últimas décadas, hoje, na sociedade ocidental industrializada, o emprego não é visto mais como o lugar da estabilidade e da

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segurança, ele é principalmente um instrumento para obter benefícios econômicos, uma atividade voltada para melhorar a experiência pessoal e o desenvolvimento do indivíduo. O trabalho é a atividade exercida no momento e pode ser alterado a qualquer instante, ao sabor das mudanças das empresas e dos objetivos pessoais de cada um, como é feito com freqüência. Pode-se dizer, então, que esta seja uma das causas da tendência de descentralização do trabalho, observada na literatura recente que aborda este assunto.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ABSTRACT

The meaning of work suffered various transformations throughout history. This occurred mainly because work relations went through lots of modifications to adapt to new

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means of production or different management practices. Nowadays, work is central in the lives of most people, being also an important instrument on the setting of our society. Given the time that each individual dedicates to work in these days, it becomes very important to understand its benefits and its influence on personal life. In order to understand work issues, we studied the main authors in the subject and we analyzed the stories of 5 people presented in the book Closing, that shows staff reaction in the moment of the factory closure, as well as their feelings toward work and the organization. We concluded, after observing the different phases the studied individuals went through, that, in the nowadays industrialized society, a job in no longer seen as something stable and secure, but it is mostly an instrument to obtain economic benefits, improve individual personal experiences. We could suggest that the work decentralization tendency, observed frequently in publications, is being caused by this new role that work plays in nowadays society.

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ASPECTOS DA EXPATRIAÇÃO E GESTÃO DE EXPATRIADOS

Carolina Burnier Pacheco Denise Rodrigues da Silva

RESUMO

O presente trabalho consiste numa revisão de literatura sobre expatriação e gestão de expatriados. Nele, são abordados principalmente artigos recentes, extraídos de revistas americanas e inglesas, bem como trabalhos apresentados após o ano 2000 no Encontro da Associação Nacional dos Programas em Pós-Graduação em Adminis-tração (EnANPAD), que ocorre anualmente no Brasil. Partindo do pressuposto de que a expatriação de empregados brasileiros em muito se assemelhe aos casos estrangeiros analisados, pretende-se aqui relatar as principais dificuldades advindas do processo de expatriação, para o expatriado, sua família e a empresa em que trabalha. Num momento posterior são identificadas particularidades da gestão de expatriados, como recrutamento e seleção, o papel da firma para a facilitação da adaptação ao país hospedeiro e da repatriação. A literatura revela mecanismos que comprovadamente melhoram o relacionamento empresa/ expatriado, de modo a maximizar o retorno proveniente da experiência para ambos. Palavras-chave: expatriação, gestão interna-cional, adaptação, gestão de recursos huma-nos, recrutamento, treinamento e seleção.

1. OBJETIVO

O presente estudo visa a reunir os principais aspectos da gestão de expatriados, abordados na literatura de gestão internacional. Serão determinados os impactos que a transferência de um profissional para país estrangeiro tem sobre esse próprio profissional, sua família e a empresa na qual ele trabalha. Para tanto, serão abordados o processo de expatriação, a adaptação do expatriado e de sua família, a repatriação e a gestão de expatriados (treinamento, recrutamento e seleção).

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2. INTRODUÇÂO

O cenário internacional exige cada vez mais flexibilidade e mobilidade de competências por parte das organizações. O objetivo de adquiri-las torna a expatriação uma opção cada vez mais escolhida pelas empresas. De fato, a internacionalização acelerada da economia trouxe uma nova dificuldade para os gestores: como administrar recursos humanos de uma mesma empresa espalhados geograficamente? Como melhorar o processo de adaptação de profissionais expatriados em país estrangeiro? Não apenas a política de salários praticados ganha especial importância, mas também o recrutamento, a seleção, o desenho de carreiras e de promoções tomam escala internacional (HERNANDES e MACHADO, 2003).

A expatriação requer muito do profissional. Este precisa ter “abertura de espírito,

estímulo pelo desafio, curiosidade quanto ao diferente, uma genuína capacidade de observação e de leitura de cenários, bem como respeito a uma realidade cultural e simbólica diferente da sua” (FREITAS, 2000, p. 3). Ser expatriado, definitivamente, não é para quem simplesmente gosta de viajar. O profissional precisa ter condição de mudar sua forma de vida. A experiência é complexa e mobiliza competências outras que não apenas as profissionais.

Portanto se torna de grande importância o estudo do processo de expatriação. Esse

levará a uma melhor compreensão das peculiaridades da gestão de expatriados, que inclui treinamento, recrutamento e seleção. Além disso, o presente trabalho abordará aspectos da adaptação do expatriado ao novo país, bem como ao novo ambiente de trabalho. Ainda no que se refere à adaptação, também será dado enfoque à família do expatriado.

O processo inverso, a repatriação, também será objeto de estudo. Isto por se tratar

de fenômeno igualmente complexo e de fundamental importância para que o empregado permaneça na empresa após a experiência internacional.

3. O PROCESSO DE EXPATRIAÇÃO

São de domínio público as dificuldades do ser humano diante de mudanças. É

muito árduo o processo de desenraizamento de uma cultura e de adaptação a outra completamente diferente. Contudo, o sucesso da adaptação em outro país não é determinado por elementos cognitivos, como conhecimento da cultura ou do idioma. Quando um executivo deixa seu país com sua família, começa uma nova vida, não se trata apenas de sua relação com seu trabalho. A partir daí começa um longo processo de desestruturação-reestruturação psicológica (JOLY apud FREITAS, 2000, p. 4).

Viver em outro país é fazer novas representações e novos significados, que muitas

vezes em nada se parecem com o que até então conhecemos. Deve-se para isso renunciar

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ao já estabelecido. Saber que comportamentos considerados comuns ou corriqueiros em seu país de origem podem vir a ser tidos como inadequados, bizarros ou ofensivos, na nova cultura. O mundo deverá passar a ser enxergado de outra forma e será necessário certo esforço, que variará de pessoa para pessoa (SELMER e LEUNG, 2003), para saber como se é enxergado por ele.

Novas emoções serão associadas a fatos e gestos familiares e ao mesmo tempo

estranhos. Especial atenção deverá ser dada às linhas e entrelinhas, que revelarão aspectos da nova cultura misturados aos da anterior, provocando às vezes confusão de referências, sentidos e emoções já estabelecidos. A experiência da expatriação é estreitamente relacionada a afetos (HERNANDES e MACHADO, 2003).

JOLY (apud FREITAS, 2000) descreve quatro fases da experiência existencial no

estrangeiro: a primeira seria o encantamento, a segunda o negativismo extremo, a terceira é na realidade uma alternativa, pois alguns guardam distância enquanto outros se integram, e finalmente o choque da volta, porque o indivíduo que retorna já não é mais o mesmo que saiu de seu país para trabalhar no exterior.

Muitas pessoas sofrem um choque cultural por ocasião de sua volta ao país de

origem. No retorno, tal como na ida, ocorre uma renovação da identidade de indivíduos expatriados com grandes conseqüências práticas para a gestão empresarial. A literatura relata uma grande dificuldade em reter executivos com experiência internacional nas organizações, bem como a necessidade de avaliações e planos de carreira próprios para essas situações (FREITAS, 2000).

4. ADAPTAÇÃO

4.1 Vida de Expatriado

Algumas variáveis podem determinar diferentes situações e reações na fase inicial da expatriação, como a existência de uma experiência anterior fora do país, que costuma reduzir o impacto inicial na nova cultura. Outros fatores que induzem ao mesmo efeito são: o domínio do idioma e o acompanhamento da família. Não é raro que, nesta fase, o expatriado, ainda não ciente das dificuldades que irá encontrar ao se deparar com um mundo completamente novo, fique encantado com a vida no novo país. Além disso, existem muitos relatos da percepção de si mesmo como diferente do outro, o que desencadeia todo um esforço de adaptação à nova cultura. Existem ainda relatos de uma visão negativa do outro, bem como de soberania do outro em sua própria visão, principalmente quando o expatriado sai de um país em desenvolvimento para um desenvolvido (MACHADO e HERNADES, 2003).

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Na situação de expatriado, é comum a busca de contato com patrícios que, muitas vezes, acabam por se tornar bastante próximos. Nessas relações, busca-se compartilhar não apenas as percepções, as interpretações e as cognições, mas também certa cumplicidade, já que as pessoas do grupo se compreendem emocionalmente, pelo fato de terem a mesma cultura e de estarem passando pelo mesmo tipo de experiência (FREITAS, 2000). Os laços sociais com outros expatriados servem de importante apoio psicológico.

BLACK (apud BROWN, VIANEN, JOHNSON, DE PATER e KLEIN, 2003) identificou

três tipos de adaptação que têm impacto no sucesso das missões internacionais. O primeiro seria adaptação a atividades fora do trabalho, o segundo as interações com pessoas do país estrangeiro e por fim a do expatriado ao seu novo papel no trabalho. Assim, os laços sociais podem ser fonte de informação sobre o novo país, aliviar o estresse e a ansiedade gerados pela expatriação e melhorar a comunicação e o entendimento com os companheiros naturais do país de destino.

No entanto, a comunicação entre expatriados e as pessoas naturais do país de

destino pode se apresentar bem mais complexa que aquela com outros expatriados. Em relação às primeiras, existem muitas vezes barreiras impostas pela diferença de línguas, além da cultural (BROWN, VIANEN, JOHNSON, DE PATER e KLEIN, 2003).

Contudo, para os expatriados, a expatriação parece revelar alguns bons aspectos.

Muitos ficam particularmente contentes com o fato de possuírem um trabalho desafiante, sem muitas regras preestabelecidas e repleto de novidades. Também são freqüentes relatos de contatos com pessoas influentes, as quais jamais conheceriam em seus países de origem, bem como acesso a informações privilegiadas (FREITAS, 2000). Freqüentemente para o expatriado, a empresa é “o palco que pode nutri-lo em suas carências de reconhecimento; ele é singularmente especial, o escolhido, e chegou para resolver algo importante; ele é parte de uma equipe pela qual vale à pena lutar e fazer sacrifícios” (FREITAS, 2000, p. 9). Percebe-se, entretanto, que aspectos negativos da expatriação transparecem, sobretudo nos relatos dos cônjuges.

4.2 A família do expatriado

Cerca de 80% dos expatriados no mundo são casados, e mais de 70% deles têm

filhos, que levam com eles para o país estrangeiro. A mudança costuma ser uma experiência muito difícil para a família. No entanto, a efetiva adaptação do expatriado parece estar estreitamente relacionada com a de seu cônjuge (ALI, VAN DER ZEE e SANDERS, 2003). A taxa de fracassos em expatriações é estimada em 40%, e a dificuldade de adaptação do cônjuge constitui uma de suas principais causas (SELMER e LEUNG, 2003). A família parece ser ainda uma das principais considerações feitas pelo profissional

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quando avalia os possíveis prós e contras de uma futura expatriação (ALI, VAN DER ZEE e SANDERS, 2003).

A adaptação de cônjuges é aparentemente mais difícil que a dos expatriados em si,

que durante uma grande parte do dia escapam do contato direto com a cultura do país de destino. Os principais fatores determinantes da adaptabilidade de esposas são: traços de personalidade e características familiares. Entre os primeiros, podemos citar: empatia cultural, abertura a novas idéias, iniciativa social, flexibilidade e estabilidade emocional. Entre os segundos: coesão familiar, adaptabilidade da família e comunicação familiar (ALI, VAN DER ZEE e SANDERS, 2003).

Todavia, uma grande fonte de insatisfação por parte das esposas de expatriados é o

fato de terem abandonado suas carreiras em prol da carreira de seus respectivos maridos. Muitas não têm visto para trabalhar no país anfitrião, o que pode inclusive causar uma desatualização, que, por ocasião do retorno a seu país de origem, resultará numa dificuldade de recolocação no mercado de trabalho (FREITAS, 2000). Muitas vezes, a esposa não fala a língua local. Não é incomum que receba pouco apoio em relação às questões domésticas; não conhece nada, não sabe pedir informações, não conhece a cidade, além de não ter carro, nem amigos, nem família (FREITAS, 2000).

Geralmente, ela precisa resolver tudo sozinha, já que o marido está envolvido em

decodificar os sinais e a cultura de seu novo ambiente de trabalho. Por outro lado, os filhos, muitas vezes, estão infelizes e inseguros, sem entender o novo mundo, precisando da mãe, que é a única com tempo e proximidade suficientes para lhes dar tranqüilidade e explicar o que está acontecendo. No entanto, a mulher passa a se sentir frágil e totalmente dependente do marido. Problemas de saúde são relatados com freqüência, derivados inclusive de mudanças drásticas de condições climáticas e de pressão, de um país para o outro (ALI, VAN DER ZEE e SANDERS, 2003). Para se sentir menos deslocada, a esposa acaba por se ligar a outras famílias expatriadas.

A partir de certo momento, ela começa a contabilizar suas perdas: família, amigos e

vida profissional. Ela se sente despojada de sua casa, onde tudo funcionava; da cidade, onde ela

conhecia tudo; do idioma, que era o de sua pátria; de sua profissão, à qual ela teve que renunciar; de seu status pessoal e social, pois ela agora é apenas a esposa de alguém (ALI, VAN DER ZEE e SANDERS, 2003, p. 564).

A adaptação parece ser ainda pior e a sensação de perda maior no caso de

maridos de expatriadas. Por isso, torna-se, muitas vezes, mais difícil para uma mulher casada aceitar ser expatriada que para um homem, também casado. Não por coincidência, a maior parte do conjunto das expatriadas é composta de mulheres solteiras.

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No caso de expatriadas casadas, a expatriação geralmente é aceita porque o casal

considera que num futuro bastante próximo o marido encontrará um emprego no país anfitrião. Contudo, em torno de 25% dos maridos jamais conseguem se empregar (SELMER e LEUNG, 2003). A falta de trabalho, e a própria busca por ele,passam a ser grande fonte de estresse. Muitos maridos não possuem habilitação para desempenhar qualquer profissão no país estrangeiro, nem as credenciais profissionais necessárias, além de enfrentarem as dificuldades bem conhecidas pelas mulheres de expatriados: língua, cultura e escassez ou falta de cargos que considerem satisfatórios.

Assim, o homem passa a ter que desempenhar um papel secundário, de apoio. Isto

freqüentemente acaba por gerar um sentimento de impotência, invalidez, crises de identidade, que podem levar à insatisfação de toda a família, ampliando seu estresse (SELMER e LEUNG, 2003). Enquanto é comum que as mulheres de expatriados acabem por formar uma comunidade própria, dificilmente o mesmo ocorre com homens na mesma condição, pois não se sentem confortáveis em fazê-lo.

Numa situação em que tanto o marido quanto a mulher trabalhavam em seu país

de origem, pode ser muito difícil para o homem se adaptar “à vida do lar” (SELMER e LEUNG, 2003). O homem que não trabalha, dependendo da sociedade em que se encontre, pode ser considerado atípico ou até mesmo vir a ser discriminado (SELMER e LEUNG, 2003). As chances de o marido ser condenado ao ostracismo no país de destino são bastante altas.

É possível ainda que, para não se ver na situação acima citada, e para diminuir os

problemas financeiros ocasionados pela diminuição na renda familiar, que representaria a família viver do trabalho de apenas um dos cônjuges, o homem venha a aceitar um emprego aquém de sua capacidade. Nesse caso, os sentimentos mais freqüentes passam a ser a frustração e a redução da auto-estima (SELMER e LEUNG, 2003). Esta situação, tanto quanto a de desemprego, pode acarretar uma forte comparação e competição com a esposa, dificultando o relacionamento entre os cônjuges.

Além disso, muitos empregadores desconfiam de maridos predispostos a

acompanharem suas mulheres durante uma expatriação. Uma grande dose de auto-estima e autoconfiança é necessária para ignorar tais preconceitos. No entanto, o apoio da empresa expatriadora parece ser considerado essencial pelos maridos de expatriadas (SELMER e LEUNG, 2003). Os que trabalhavam em seus países de origem sentem necessidade de empreender atividades que ajudem em suas carreiras no país estrangeiro. Muitas vezes são homens que ganhavam tanto quanto suas mulheres em seus países, mas que viram a expatriação como vital para a carreira de suas esposas e as suas próprias carreiras como transportáveis.

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Muitos dos maridos acreditam que a empresa deveria lhes prover suporte inclusive financeiro, dando-lhes emprego, base para trabalhar por conta própria ou dinheiro para se engajarem em atividades como voluntários. Eles não se importam tanto com o desenvolvimento, por parte da empresa, de grupos de apoio para maridos. No entanto, consideram essencial a existência de um apoio financeiro por ocasião do retorno de suas mulheres, expatriadas, aos seus países de origem, até que eles, maridos, consigam restabelecer suas carreiras (SELMER e LEUNG, 2003).

5. A REPATRIAÇÃO

O retorno ao país de origem e ao trabalho na empresa-mãe pode configurar um

novo choque cultural (MACHADO e HERNANDES e MACHADO, 2003). Primeiro porque a pessoa que voltou já não é mais quem era antes; sua própria identidade foi alterada pela absorção de elementos da outra cultura. Segundo porque quem ficou definiu outros interesses que muitas vezes não incluem quem ficou longe, pelo simples fato de a pessoa ter estado fora no momento em que foi tomada a decisão (FREITAS, 2000).

O fato é que mudanças, tanto internas quanto externas à organização, podem

tornar o retorno ao país de origem bastante difícil. A empresa pode ter sido submetida a mudanças nos componentes de sua alta cúpula, pode ainda ter reorganizado sua estrutura ou até ter tido importantes alterações em sua cultura. Colegas que antes funcionavam como mentores podem ter deixado a empresa ou se aposentado, deixando o repatriado à mercê dos tomadores de decisão. Paralelamente, ocorrem mudanças nas vidas pessoais, até mesmo nas de colegas, que podem ter se mudado, ou se afastado, ainda que em termos simplesmente de relacionamento.

Ainda, os filhos do repatriado podem ter dificuldades de adaptação na escola ou de

retomarem os relacionamentos com aqueles que eram seus amigos antes da expatriação (BLACK e GREGERSEN, 1999). Assim como os cônjuges, para os quais a experiência de expatriação tenha acabado por não acrescentar muito ao currículo, ou que tenham se desatualizado devido ao período de inatividade, podem ter dificuldades em conseguir um novo emprego.

Ressalta-se ainda o fato de que um grande número de executivos expatriados pede

demissão antes de completar o primeiro ano de retorno ao emprego de origem (FREITAS, 2000) e vão trabalhar em empresas concorrentes. Isto porque a readaptação à empresa costuma ser difícil, já que muitas vezes o repatriado não considera seu esforço (a expatriação) recompensado, tampouco reconhecido, seja pela empresa, seja pelos colegas.

Tal fato faz com que a taxa de turnover seja duas vezes maior que a dos gerentes

que não foram enviados ao exterior, o que se deve muito provavelmente ao choque cultural anteriormente citado (BLACK e GREGERSEN, 1999). Este choque é também uma das

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principais causas de retorno antecipado de executivos expatriados, aliado à insatisfação com o trabalho em si. Pesquisas mostram que em torno de 10 a 20 % executivos americanos expatriados retornam ao país de origem antes do tempo previsto. Entre aqueles que cumprem a missão por inteiro, praticamente um terço não atinge as expectativas de seus superiores em termos de desempenho.

6 . GESTÃO DE EXPATRIADOS

Uma das poucas formas que se tem de transformar o modo de as pessoas

pensarem negócios internacionais é enviá-las ao exterior por alguns meses. Por isso, não são poucas as empresas que investem consideravelmente em expatriação. No entanto, em geral, elas obtêm retorno um tanto quanto insatisfatório da experiência. Como já mencionado neste trabalho, a insatisfação do expatriado em relação à função para o qual foi designado, ou o choque cultural, acaba por gerar, em alguns casos, o aborto da missão no exterior. Outros expatriados, embora permaneçam em país estrangeiro pelo tempo previamente estabelecido, não conseguem atingir suas metas (BLACK e GREGERSEN, 1999).

A gestão internacional torna-se imprescindível na medida em que ter uma força de

trabalho verdadeiramente adaptada ao novo contexto mundial já não é mais um luxo, e sim uma necessidade competitiva. Quase 80% das empresas médias e grandes americanas enviam profissionais ao exterior, e 56% pretendem aumentar seu número de missões. Muitas, porém, se enganam por acharem que não devem dar atenção especial aos expatriados. Embora a maioria dos executivos saiba que as táticas de negociação e as estratégias de marketing variem de cultura para cultura, muitos não acreditam que isso justifique técnicas especiais de seleção ou treinamento. Eles acham que basta dar aos expatriados certos artigos de luxo (como passagens de primeira classe) e a questão fica resolvida (BLACK e GREGERSEN, 1999).

Mas a gestão de expatriados é bem mais complexa. De acordo com DAVID E.

MOLNAR e G. MICHAEL LOEWE (1997), existem sete etapas a serem seguidas com atenção pelos profissionais de Recursos Humanos, num processo de expatriação. Primeiro, deve ser perfeitamente compreendido o plano de negócios da empresa. Para administrar, de modo satisfatório, recursos humanos internacionais, os profissionais de RH devem ter conhecimento razoável das operações internacionais da companhia, de sua situação nos negócios e da situação econômica de cada país e dos tipos de habilidades requeridas para a missão (MOLNAR e LOEWE, 1997).

A segunda etapa consiste em deixar o profissional a ser expatriado ciente da política

internacional de serviços da companhia, antes de sua partida. A política deve ser estabelecida em termos de diretrizes, e não de regras rígidas, as quais devem ser desenvolvidas com ajuda de gerentes de operações globais, especialistas em impostos,

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contadores, profissionais de recolocação e consultores de RH. Isto vai ajudar a empresa a atingir um nível de conhecimento maior nessas diversas áreas, facilitando o gerenciamento de cada uma delas (MOLNAR e LOEWE, 1997). Além disso, o empregado deve ter exata noção dos objetivos de sua missão no exterior; deve saber que tipo de conhecimentos a empresa espera que ele traga da experiência. Isto o ajudará a focar nos objetivos corretos, na medida certa (BLACK e GREGERSEN, 1999).

Em terceiro lugar, deve ser desenvolvido um processo de orçamento internacional.

Isto servirá para que a empresa estime de maneira mais adequada o custo-benefício de mandar o profissional para o exterior. Por exemplo, enviar um empregado americano para outro lugar do globo pode vir a custar de três a cinco vezes o que custaria se permanecesse nos Estados Unidos (MOLNAR e LOEWE, 1997). Não se deve expatriar sem estabelecer previamente limites de custo (ANONYMUS, 2001).

Uma quarta etapa seria a de considerar a família dos expatriados em potencial.

Conforme já visto, a família se constitui em grande fonte de apoio psicológico, e muitas vezes, dependendo inclusive do período em que o profissional for mantido no exterior, se deverá pensar em expatriar toda a família. Nesse caso, o melhor candidato será não apenas aquele mais qualificado profissionalmente, mas também aquele cuja família apresente indícios de que não trará grandes problemas para o bom desenvolvimento da fase de adaptação (MOLNAR e LOEWE,1997).

Em quinto, os termos e condições da missão devem ser informados tanto por escrito

quanto verbalmente. Benefícios e responsabilidades da empresa e do empregado devem ficar esclarecidos. Por exemplo, a empresa deve deixar explícitas questões de alojamento e de pagamento de impostos (MOLNAR e LOEWE, 1997). É melhor para a companhia entregar dinheiro para que o expatriado consiga seu alojamento do que simplesmente se comprometer em pagar por alojamento, pois o custo resultante pode ser bem mais alto, já que alguns empregados resolvem tirar férias no exterior antes de chegarem ao país de destino.

No entanto, autores divergem quanto ao pagamento de auxílios pelo deslocamento.

Alguns defendem não ser uma boa solução, porque o profissional logo se esqueceria do pagamento (ANONYMUS, 2001). Outros acreditam que um auxílio em um único pagamento pelos sacrifícios, inclusive emocionais, que fazem os expatriados, seja uma solução melhor que pagamentos mensais regulares, pois estes fariam com que o empregado percebesse como perda de salário a ausência desse dinheiro ao ser repatriado (LATTA, 1998).

Em sexto, o empregado e sua família devem ser preparados para a mudança. Os

empregados expatriados necessitarão ainda de enorme apoio logístico. Seguros e assistência médica também aparecem como requisitos essenciais (MOLNAR e LOEWE,

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1997). A empresa pode decidir ainda pagar escolas particulares para os filhos do expatriado. Torna-se evidente, portanto, que a expatriação coloca a firma em contato muito mais direto com o expatriado e sua família, do que ela teria caso o profissional permanecesse na empresa-mãe.

J. STEWRAD BLACK e HAL B. GREGERSEN (1999) analisaram empresas americanas

bem-sucedidas em seus respectivos processos de expatriação. Eles chegaram à conclusão de que os pontos em comum são: focar em conhecimento de criação e em desenvolvimento de liderança global; enviar ao exterior pessoas cujas habilidades interculturais excedem seus conhecimentos técnicos; e terminar o processo de expatriação com uma repatriação deliberada.

No que se refere às características pessoais do expatriado, o mais bem-sucedido

costuma ser o persistente, que, apesar de fracassar por diversas vezes em tentativas de aproximação com residentes locais, não desiste e acaba por conseguir estabelecer laços de amizade. Profissionais assim costumam ainda ser bastante flexíveis, respeitando diferenças, com um jeito amistoso de fazer negócios. O último requisito é particularmente importante, pois a possibilidade de conflitos em negociações com pessoas de países estrangeiros, e portanto de culturas diferentes, é muito maior. Ou seja, um aspecto fundamental na expatriação é avaliar as aptidões interculturais do expatriado em potencial (BLACK e GREGERSEN, 1999).

Por fim, como última etapa do processo de expatriação, o setor de Recursos Humanos deve desenvolver o processo de repatriação. Este determinará como a organização vai aproveitar a experiência adquirida pelo empregado durante a expatriação e implementar mecanismos que evitem, ao máximo, pedidos de demissões de empregados após suas repatriações, o que representaria a perda do investimento feito durante todo o período de expatriação (MOLNAR e LOEWE, 1997). Portanto, no início do processo, devem ser feitos planos que estabeleçam como os conhecimentos adquiridos no exterior serão utilizados na empresa por ocasião do retorno do profissional. Também deve ser planejado o retorno da família do expatriado. Esses dois últimos pontos são essenciais para a redução do turnover de empregados com experiência internacional (MOLNAR e LOEWE, 1997).

Finalmente, as companhias começaram a reconhecer o que muitos repatriados já

sabem há muito tempo: o mais difícil das missões internacionais não é a expatriação em si, mas a repatriação, reintegrar-se à sua própria cultura. Isto é algo bastante difícil de ser entendido por aqueles que nunca foram expatriados e permaneceram na empresa-mãe, sejam eles chefes ou colegas dos repatriados. As pessoas costumam achar que estes tiveram um grande período de regalias. Para piorar a situação dos repatriados, freqüentemente a gestão de expatriados é atribuída ao departamento de Recursos Humanos, no qual, na maior parte das vezes, poucos gestores já trabalharam no exterior (BLACK e GREGERSEN, 1999).

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Enfim, a expatriação freqüentemente não termina de maneira satisfatória. Primeiro,

porque os empregadores dão pouca importância à repatriação, enquanto os expatriados consideram que seu sacrifício mereça reconhecimento por parte da companhia. Além disso, eles em geral estão ansiosos por colocar as habilidades e o conhecimento adquiridos no exterior em prática, o que com certa constância acaba resultando em frustração, tanto pelo comportamento da sede, quanto pelas próprias funções que acabariam por exercer. Isso pode ser ainda mais forte no caso de expatriados seniores, que tenham chegado a cargos altos em país estrangeiro (BLACK e GREGERSEN, 1999).

Embora um programa de repatriação seja válido, ele pode ser considerado não

razoável em termos de custos, a não ser no caso de um grande volume de expatriados. Muitas companhias que oferecem esses programas, contratam empresas de treinamento privadas ou fazem consórcios com outras firmas para repartir os custos. Não é pequeno o número de empresas que investem nesse tipo de programa, pois se dão conta de que é uma forma bastante barata de reter profissionais com idéias e experiência globais (BLACK e GREGERSEN,1999).

6.1 Treinamento

Treinamento é o processo sistemático de alterar o comportamento dos empregados na direção do alcance dos objetivos organizacionais. Ele está relacionado com as atuais habilidades e capacidades exigidas pelo cargo. Seu propósito é ajudar os empregados a utilizar suas capacidades e principais habilidades para serem bem-sucedidos na organização (CHIAVENATO, 1999).

No processo de expatriação, o treinamento tem principalmente o papel de ensino e

preparação, para que o funcionário se adapte da melhor forma possível a seu novo ambiente de trabalho.

As empresas têm um difícil papel no processo de recrutamento de profissionais

qualificados para expatriação. Além disso, um treinamento prévio oferecido pela firma ao funcionário e à sua família é crucial para uma melhor adaptação do expatriado ao trabalho e às mudanças em sua vida pessoal (WAXIN e PANACCIO, 2005), decorrentes de sua transferência para país estrangeiro.

Um estudo para identificar os efeitos das diferenças micro-culturais percebeu a

importância de programas de treinamento para executivos expatriados. Estes treinamentos devem incluir aspectos micro-culturais para que os executivos possam desenvolver um conhecimento mais profundo e rico das diferenças entre sua cultura e as culturas nas quais irão se inserir. Os pesquisadores recomendam ainda o estabelecimento de uma cultura

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ética corporativa e a formalização de códigos de conduta para futuros treinamentos de ética na organização (NELSON e QUICK, 2003, p. 37).

Uma das formas mais difundidas e estudadas de treinamento para a adaptação do

funcionário expatriado é o intercultural. Neste, o objetivo é ensinar aos membros de uma cultura a interagir com os de outra, e torná-los predispostos a se ajustarem ao novo ambiente (WAXIN e PANACCIO, 2005). O treinamento intercultural serve ainda para reduzir o choque cultural e o tempo necessário para que o expatriado atinja um grau aceitável de eficiência no trabalho. Além disso, traz expectativas mais realistas, mais satisfação no trabalho e diminui as intenções de voltar antes ao país de origem (KATZ e SEIFER, 1996).

Entretanto alguns autores criticam este tipo de treinamento. Seus principais

argumentos são: a movimentação mundial para contratação local: como os expatriados permanecem em média menos de três anos fora não valeria a pena o investimento em treinamento; o tempo entre a seleção e a ida do individuo não tornaria possível um treinamento realmente eficaz (LANE e DISTEFANO, 1991).

Porém não podemos negar que a socialização e o treinamento intercultural tornem

mais fácil para o futuro expatriado o aprendizado da cultura da organização. Assim, os gestores a serem expatriados acabam por aprender mais tanto sobre a cultura organizacional quanto sobre a própria cultura nacional, por meio da socialização. São três as principais áreas da socialização: seleção, treinamento antes da partida e socialização on-site. Essas podem ser usadas para preparar o expatriado para a nova etapa de sua vida (KATZ e SEIFER, 1996).

6.2 Recrutamento e Seleção

A cultura afeta tanto o modo de as pessoas pensarem, quanto seus comportamentos. Conseqüentemente, ela tem um papel significativo nas tomadas de decisão e, portanto, nas ações empreendidas pelos expatriados. Assim, o significado da carreira, os objetivos buscados pelo profissional na organização em que trabalha também variam drasticamente de cultura para cultura, e influenciam profundamente os conceitos de autoridade, gestão, trabalho e tudo aquilo que com isto estiver relacionado (KATZ e SEIFER, 1996). Por esta razão, o recrutamento e a seleção de pessoas para “atuarem” em outra cultura devem ser realizados com muita cautela.

Um dos principais papéis do recrutamento é divulgar no mercado as oportunidades

que a organização pretende oferecer para as pessoas que possuam determinadas características (as desejadas). É por meio dele que a organização sinaliza, a potenciais candidatos, uma oportunidade de emprego. O recrutamento funciona como uma ponte entre o mercado de trabalho e o setor de Recursos Humanos (CHIAVENATO, 1999).

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Conseguir casar as descrições de um cargo e as especificações pessoais dos

empregados é um papel difícil, a ser executado mediante recrutamento. Mais variáveis entram em jogo, e aumenta a probabilidade de erros, no caso de recrutamento de pessoas para trabalharem em país estrangeiro ou no caso de recrutamento de estrangeiros. Isto ocorre principalmente por causa das diferenças culturais, que aumentam as chances de erros na comunicação de expectativas e os riscos de interpretações erradas.

A seleção de pessoas funciona como uma espécie de filtro que permite que apenas

as pessoas que apresentem as características desejadas pela organização possam nela ingressar (CHIAVENATO, 1999, p. 107). Por melhor e mais cuidadoso que seja o processo de recrutamento e seleção dos expatriados, o sucesso deste executivo no exterior não é garantido. As relações que se desenvolverão dentro da organização (relações de subordinação e poder, autonomia, criatividade) e as características pessoais também são fatores de grande influência no processo de expatriação.

Segundo HOMEM e TOLFO (2004), tais características serão determinantes do

sucesso ou do fracasso da missão no exterior. Estas autoras ainda enumeram aspectos críticos a serem considerados no processo de seleção, dentre eles: os selecionados precisam entender os objetivos e intenções da corporação e serem capazes de comunicar estas intenções; precisam estar cientes da diversidade de pessoas que encontrarão; as empresas devem deixar bem claras as expectativas e desempenho esperados deste expatriado na execução do trabalho e detalharem e definirem bem o tipo de atividade a ser desenvolvido por eles.

Não é raro que as empresas escolham de maneira errada o profissional a ser

expatriado, pois não consideram características pessoais específicas que predigam o grau de dificuldade que este possa ter para se adaptar a novas culturas. Outro erro bastante comum é o de acharem que profissionais bem-sucedidos em seus países de origem serão igualmente bem-sucedidos no exterior. Ressalta-se ainda o fato de muitas empresas também não se preocuparem em dar apoio especial, mediante ressocialização, ao expatriado e à sua família por ocasião de sua repatriação, que é um processo tão complexo quanto o de expatriação, tornando indispensável para o empregado e sua família a assistência da organização (BLACK e GREGERSEN, 1999).

7 . CONCLUSÃO

A globalização requer das organizações um contínuo crescimento, cada vez mais

difícil de ser obtido sem implantação de subsidiárias ou filiais no exterior. Os empregados que serão enviados a missões fora de seus países devem ser capazes de se adaptar rapidamente a novas culturas. Por isso, a gestão de expatriados requer muita atenção por parte das empresas. O desenvolvimento de bons processos de expatriação é crucial para

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que a internacionalização da organização alcance o sucesso desejado e adquira novas competências.

Este processo deve levar em consideração que as mudanças serão bruscas, não só

para a empresa, mas principalmente para o profissional, que mudará de país, cultura, ambiente e de local de trabalho. Além disso, em organizações em que o quadro de funcionários envolve multiplicidade de culturas e etnias, como é o caso daquela que o empregado encontrará por ocasião de seu deslocamento para o exterior, o potencial para conflitos é enorme. Uma das opções para diminuí-lo é fazer com que tanto o expatriado quanto sua família entendam e respeitem as diferenças culturais entre o país de destino e seu país de origem e, na medida do possível, venham a apreciar o valor de cada uma delas.

De fato, para que a adaptação do expatriado ocorra de maneira eficiente, alguns

importantes fatores, além do trabalho em si, devem ser levados em conta. Um deles é a família, que muitas vezes recebe pouca ou nenhuma atenção por parte das empresas, apesar de sua adaptação, particularmente a do cônjuge do expatriado, ser fundamental para o sucesso do processo de expatriação. Tanto o funcionário quanto sua família devem ser preparados para o processo. A maior parte de retornos antecipados de expatriados de sua missão, por desistência, tem origem em dificuldades de adaptação da esposa, que acompanha o expatriado.

A literatura demonstra que maridos de expatriadas, por motivos culturais do país de

destino, muitas vezes um tanto quanto machistas, costumam ter maior dificuldade para se adaptar e formar laços sociais em países estrangeiros, que esposas de expatriados, sobretudo quando o marido da expatriada não trabalha durante o período da expatriação ou quando aceita emprego em situação inferior à esperada pela sociedade na qual está vivendo. Maridos de expatriadas também costumam ser mais exigentes em relação aos benefícios que a empresa oferece ao cônjuge do profissional expatriado.

Outro fator muitas vezes esquecido pelas organizações é a repatriação, o retorno

ao país de origem. Ela é tão complexa quanto a expatriação e é parte chave para que a empresa consiga reter o profissional, por ocasião de seu retorno, e, conseqüentemente, suas competências adquiridas internacionalmente.

Sem dúvida, com um treinamento eficiente, e com um processo de recrutamento e

seleção cautelosos, será possível minimizar bastante a probabilidade de fracasso no processo de expatriação. Pois não são somente as qualidades técnicas as primordiais para que a expatriação seja bem-sucedida, também as características pessoais do profissional escolhido, como adaptabilidade, flexibilidade, alta tolerância ao estresse e capacidade de tolerar o isolamento prolongado, são fatores importantes para o sucesso do empreendimento.

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Por se tratar de um procedimento complexo, cheio de nuances e com realidades

distintas, não há uma fórmula universal para que o processo de expatriação ocorra com sucesso. Contudo, a literatura indica cuidados que devem ser tomados para que os erros sejam minimizados. Sem dúvida, o maior erro que as empresas costumam cometer é encarar a expatriação de forma simplista. Muitas não desenvolvem recrutamento ou treinamento especiais, não consideram a família do expatriado, não lhe dedicando portanto a devida atenção.

Assim, muitas vezes, toda a administração de empregados que vão, estão ou

retornam do exterior é realizada de maneira muito semelhante à dos que permanecerão trabalhando na empresa-mãe. Porém, a literatura indica que a gestão de expatriados é um processo complexo, cujas especificidades não podem deixar de ser consideradas para que o empreendimento seja eficaz e traga os resultados esperados pela empresa.

8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ABSTRACT

This paper constists of a literature review regarding expatriation and expatriates´ management. Hereby, we will be accessing recent articles extracted from American and British journals. Some works presented since the year 2000, at EnANPAD, one of the most important National Meetings in Administration, held annually in Brazil, will equally be an important base for this work. Assuming that the expatriation process of Brazilian firms´ employees is quite similar to the international cases analyzed for the current work, we aim at describing the main difficulties originated in this process, from the point of view of expatriates, their families and the enterprise in which they work. Later, we will identify the particular aspects related to expatriates´ management, such as recruitment

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and professionals´ selection, the role of firms for a successful adaptation in the host-country, and for turning the repatriation process easier. The international business literature displays mechanisms to improve the relationship between firms and their expatriates, in order to maximize the experiment´s results for both.

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AUTORES Guarino Gentil Junior Mestrando em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Ciências Econômicas (UFRJ e-mail: [email protected] Rômulo Augusto Andrade Pereira Mestrando em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Engenharia Elétrica (UFRJ) e-mail: [email protected] Tânia Tisser Beyda Mestranda em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2006 Graduação: Arquitetura (USU) e-mail: [email protected] Ana Carolina O. Andrade Pinto Mestranda em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Biomedicina (UFRJ) e-mail: [email protected] Milena Mercedes Puma Mestranda em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Comunicação Social, ênfase em Publicidade e Propaganda (PUC-Rio) e-mail: [email protected] Carolina Burnier Pacheco Mestrando em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Administração (FDV-Fac de Vitória/2004) e-mail: [email protected] Denise Rodrigues da Silva Mestrando em Administração do COPPEAD/UFRJ da turma 2005 Graduação: Engenharia Química (UFRJ/1995) e-mail: [email protected]

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NORMAS PARA SUBMISSÃO DE TRABALHOS

1 OBJETIVO Estimular e divulgar a produção acadêmica do corpo discente do Coppead, constituída pelos alunos dos cursos latu sensu, mestrado e doutorado.

2 CARACTERÍSTICAS DOS TRABALHOS Os trabalhos publicados nos Cadernos Discentes Coppead deverão ser sempre inéditos, subdividindo-se em duas classes: original, quando apresenta temas ou abordagens próprias e de revisão, quando resume, analisa e discute informações já publicadas. Cada Caderno terá, em média, quatro artigos e será publicado assim que quatro artigos sejam aprovados (não existirá periodicidade). Os trabalhos deverão cobrir os tópicos e práticas de Administração, relacionados com os seguintes grandes temas: a) Economia e Finanças; b) Empreendedorismo; c) Estratégia, Sistemas de Informação e Organizações; d) Marketing; e) Negócios Internacionais; f) Operações, Logística e Tecnologia; g) Planejamento e Controle.

3 SUGESTÕES DE TRABALHOS a) Trabalhos de final de curso que tiveram, de preferência, conceito A ou equivalente; b) Revisões de literatura; c) Teses e dissertações que não viraram artigo ou livro. 3.1 Exclusões Não serão aceitos os trabalhos que sejam análise de um caso didático.

4 NORMAS EDITORIAIS O conteúdo deve ser semelhante, em forma, ao de um artigo a ser submetido a qualquer revista ou congresso, não se exigindo, no entanto, a mesma profundidade teórica ou empírica. a) Os trabalhos deverão ser submetidos no formato pré-estabelecido no parágrafo 4.1; b) Os trabalhos poderão ser submetidos por um professor ou pelo próprio aluno; c) Trabalhos submetidos pelo professor já deverão vir acompanhados do formulário de

avaliação proposto; d) Trabalhos submetidos diretamente pelo aluno, serão posteriormente avaliados pelo

professor responsável pela disciplina ou então por um professor indicado pelo Editor; e) O Editor poderá solicitar a avaliação de um segundo docente (do Instituto ou externo);

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f) O Editor será escolhido pela Diretoria do Instituto, dentre os membros do seu corpo docente;

g) Toda vez que o trabalho citar nomes de empresas os seguintes procedimentos serão adotados:

• O Aluno deve indicar se a coleta de dados foi feita na empresa e, nesse caso, solicitar a

autorização da empresa para a publicação; • O Professor que avalia o trabalho deve verificar se alguma empresa foi citada ou se sua

identificação é óbvia (nas duas situações, somente para casos com dados primários); • O Editor é responsável por verificar se a autorização foi dada (nos casos em que o

professor avaliador verificar que alguma empresa foi citada a partir de dados primários);

• O Editor é responsável, com o auxílio do professor, de resolver os casos em que o nome da empresa não tenha sido citado mas a identificação seja óbvia.

4.1 Estrutura dos trabalhos Sugere-se que a estrutura do trabalho siga as seguintes recomendações: a) Os trabalhos deverão ter a extensão máxima de 20 páginas incluindo notas e

referências bibliográficas; b) Deverão estar em formato Microsoft Word for Windows; c) O texto deverá ser apresentado em papel A4, margens a 3,0 cm, utilizando caracteres

em Futura LT BT, corpo 11, com, espaçamento múltiplo de 1,2 cm; d) Apresentar em página separada: título do trabalho, nome completo do(s) autor(es)

acompanhado de breve curriculum mencionando profissão, titulação acadêmica, vinculação institucional com endereço completo, telefone, fax e e-mail;

e) Título: deverá ser breve e descritivo contendo palavras que representem o conteúdo do texto;

f) Deverão conter um resumo em português, de aproximadamente 100 palavras, acompanhado da versão em inglês (abstract), ressaltando objetivo, método, resultados e conclusões do trabalho;

g) Palavras-chave: três a cinco termos que expressem o conteúdo do texto, com a devida versão em inglês;

h) Texto: deverá apresentar introdução expondo objetivos e metodologia, desenvolvimento tratando da matéria de forma clara e objetiva e conclusões, destacando os resultados obtidos. As seções e sub-seções deverão ser numeradas com títulos próprios evitando-se símbolos e demais caracteres que não denotam estrutura hierárquica do texto;

i) Deverão conter referências bibliográficas relacionadas com o assunto, seguindo as regras da ABNT;

j) As citações ao longo do texto deverão conter a fonte e serem apresentadas seguindo o padrão sobrenome do autor, ano de publicação e página. Exemplo: (BETHLEM, 1999, p. 3);

k) Apêndice: texto autônomo que complementa a argumentação principal; l) Anexo: texto que serve de fundamentação, comprovação ou ilustração; m) Notas deverão ser apresentadas em ordem progressiva ao longo do texto com sua

respectiva lista ao final do texto, localizadas depois das referências bibliográficas.