brasília, 8 a 12 de novembro de outubro de 2004 nº 369 · 3 direito administrativo concurso...

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1 Novembro/2018 Sessões de 29 de outubro a 30 de novembro e 84 número

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Novembro/2018

Sessões de 29 de outubro a 30 de novembro

e

84 número

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Novembro de 2018

Compilação dos Informativos nos 922 a 924

Data de divulgação: 3 de dezembro de 2018

O Informativo por Temas apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo

Informativo STF concluídos no mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por

assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Concurso Público

Concurso público e remarcação de teste de aptidão física Sistema Remuneratório

Forças Armadas e reestruturação remuneratória

Substitutos interinos das serventias extrajudiciais: submissão ao teto remuneratório

constitucional

Direito Constitucional

Conselho Nacional de Justiça

Controle jurisdicional dos atos do Conselho Nacional de Justiça Controle de Constitucionalidade

ADPF: manifestações em universidades e normas eleitorais Direitos e Garantias Fundamentais

Sustentação oral e ampla defesa Poder Judiciário

Competência jurisdicional e delitos comuns conexos a crimes eleitorais Reclamação

Reclamação: liminar em ADPF e proibição de transporte de amianto

Direito Penal

Processual Penal

Crime de fuga e direito à não autoincriminação

Direito Processual Civil

Mandado de Segurança

Restituição de parcelas recebidas por boa-fé por ordem liminar revogada

Direito Processual Penal

Arquivamento

Arquivamento de inquérito e novas diligências instrutórias Pena

Condenação pelo tribunal do júri e execução provisória da pena Provas

Colaboração premiada e termo de compartilhamento Recurso

Apelação: inclusão de circunstâncias judiciais sem incremento da pena e “reformatio in

pejus”

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DIREITO ADMINISTRATIVO

Concurso Público

Concurso público e remarcação de teste de aptidão física É constitucional a remarcação do teste de aptidão física de candidata que esteja grávida à época de

sua realização, independentemente da previsão expressa em edital do concurso público.

Com base nessa orientação, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 973 da repercussão geral,

negou provimento a recurso extraordinário em que discutida a possibilidade de remarcação de data de

aplicação de teste de aptidão física a candidata gestante à época de sua realização.

A Corte entendeu que o interesse de que a grávida leve a gestação a termo com êxito exorbita os

limites individuais da genitora, a alcançar outros indivíduos e a própria coletividade. Enquanto a saúde

pessoal do candidato em concurso público configura motivo exclusivamente individual e particular, a

maternidade e a família constituem direitos fundamentais do homem social e do homem solidário. Por ter

o Poder Constituinte estabelecido expressamente a proteção à maternidade, à família e ao planejamento

familiar, a condição de gestante goza de proteção constitucional reforçada. Em razão desse amparo

constitucional específico, a gravidez não pode causar prejuízo às candidatas, sob pena de ofender os

princípios da isonomia e da razoabilidade.

Além disso, o direito ao planejamento familiar é livre decisão do casal. A liberdade decisória

tutelada pelo planejamento familiar vincula-se estreitamente à privacidade e à intimidade do projeto de

vida individual e parental dos envolvidos. Tendo em vista a prolongada duração dos concursos públicos e

sua tendente escassez, muitas vezes inexiste planejamento familiar capaz de conciliar os interesses em

jogo. Por tais razões, as escolhas tomadas muitas vezes impõem às mulheres o sacrifício de sua carreira,

traduzindo-se em direta perpetuação da desigualdade de gênero.

De todo modo, o direito de concorrer em condições de igualdade ao ingresso no serviço público,

além de previsto em todas as Constituições brasileiras, foi reconhecido pelo Pacto de São José da Costa

Rica e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Ademais, os princípios em jogo devem ser analisados à luz da moderna concepção de

administração pública gestora. Ao realizar o certame seletivo, o administrador público deve organizar

suas ações e decisões de modo a otimizar a gestão pública, entendida esta como o exercício responsável

do arbítrio administrativo na forma de decisões, ações e resultado esperado. O gestor, assim, precisa saber

avaliar por qual razão o concurso é necessário e quais são os resultados esperados, impondo-se a

necessidade de planejamento do processo de contratação.

No caso em comento, a melhor alternativa para o resguardo dos interesses envolvidos corresponde

à continuidade do concurso público, com a realização de teste físico em data posterior, reservado o

número de vagas necessário. Se, após o teste de aptidão física remarcado, a candidata lograr aprovação e

classificação, deve ser empossada. Caso contrário, será empossado o candidato ou candidata

remanescente na lista de classificação em posição imediatamente subsequente.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que deu provimento ao recurso ante o reconhecimento da

impossibilidade, prevista no edital do certame, de remarcação do teste, na linha do que decidido no RE

630.733.

RE 1058333/PR, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 23.11.2018. (RE-1058333)

(Informativo 924, Plenário – Repercussão Geral)

Sistema Remuneratório

Forças Armadas e reestruturação remuneratória A Segunda Turma, em conclusão de julgamento e por maioria, negou provimento a recurso

extraordinário em que se discutia a extensão a servidores públicos civis da majoração de vencimentos, no

percentual de 45%, concedida a servidores militares, a título de reestruturação de cargos, com base na Lei

8.237/1991 e no princípio da isonomia dos índices revisionais disciplinados na redação original do art. 37,

X, da Constituição Federal (CF) (1).

A Turma, inicialmente, destacou que o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou orientação no

sentido de que a solução de controvérsia referente à natureza de vantagem pecuniária concedida por lei,

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em revisão geral ou não, possui índole infraconstitucional, o que inviabiliza o prosseguimento do recurso

(Informativo 188).

Ademais, conforme o Enunciado 339 da Súmula do STF, não cabe ao Poder Judiciário promover

aumento de vencimentos de servidores públicos, com base na isonomia. Até porque, neste caso, há lei

específica – Lei 8.237/1991 – que se refere, exclusivamente, aos integrantes das Forças Armadas.

Assim, tendo em vista tratar-se de reestruturação remuneratória da carreira militar, redefinindo

remuneração, soldo, gratificações, adicionais, auxílios, indenizações e proventos, não há que se falar em

extensão aos servidores públicos civis.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que proveu o recurso extraordinário. Entendeu que a

majoração de vencimentos concedida aos militares pela referida lei, por alcançar o restabelecimento do

poder aquisitivo da remuneração, caracteriza-se como reajuste extensível aos servidores públicos civis –

em percentual a ser definido em liquidação de sentença –, à vista do que dispõe o inciso X do art. 37 da

CF.

(1) CF: “Art. 37. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e, também, ao seguinte: (...) X – a revisão geral da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e

militares, far-se-á sempre na mesma data; (redação original) ”

RE 229637/ SP, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em

6.11.2018. (RE-229637)

(Informativo 922, Segunda Turma)

Substitutos interinos das serventias extrajudiciais: submissão ao teto remuneratório

constitucional Incide o teto remuneratório constitucional aos substitutos interinos de serventias extrajudiciais.

Com base nessa premissa, a Segunda Turma negou seguimento a agravo regimental em mandado

de segurança contra ato do corregedor nacional de Justiça que determinou aos substitutos das serventias

extrajudiciais observância ao teto remuneratório previsto no art. 37, XI, da Constituição Federal (CF) (1).

Os impetrantes alegaram que notários e registradores, inclusive interinos, são particulares em

colaboração com a administração, não lhes sendo aplicável o teto constitucional.

A Segunda Turma reafirmou jurisprudência no sentido de que os substitutos interinos de serventias

extrajudiciais estão sujeitos ao teto remuneratório previsto no art. 37, XI, da CF.

(1) CF: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito

Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também,

ao seguinte: (...) XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos

detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos

cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos

Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais

e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsidio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder

Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;”

MS 29.039/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 13.11.2018. (MS-29039)

(Informativo 923, Segunda Turma)

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Conselho Nacional da Justiça

Controle jurisdicional dos atos do Conselho Nacional de Justiça

O controle dos atos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelo STF somente se justifica se

houver inobservância do devido processo legal, exorbitância das competências do Conselho e

injuridicidade ou irrazoabilidade manifesta do ato impugnado.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria de votos, denegou a segurança e

revogou liminar anteriormente concedida.

O mandado de segurança foi impetrado contra decisão do CNJ que negou pedido de

desmembramento de procedimento de controle administrativo (PCA) a envolver elevado número de

interessados em procedimentos individuais. O procedimento foi instaurado para apuração da regularidade

de serventias judiciais a serem exploradas em caráter privado após a Constituição de 1988.

Os impetrantes sustentaram que a recusa à individualização do procedimento ofende as garantias

constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, bem como a Lei 9.784/1999.

Além disso, traduz inobservância ao Verbete 3 da Súmula Vinculante do Supremo (1).

A Turma asseverou que o fato de o procedimento de controle administrativo contar com número

elevado de partes interessadas não viola o devido processo legal, o contraditório ou a ampla defesa.

Ademais, o prejuízo à defesa deve ser analisado concretamente à luz das especificidades do caso.

A questão enfrentada pelo CNJ possui natureza jurídica e prescinde de dilação probatória. Na

decisão do PCA, o CNJ analisou todos os argumentos suscitados na defesa, que diziam respeito à: (1)

competência do CNJ para apreciar a legalidade dos atos de admissão dos serventuários; (2) incidência do

prazo decadencial quinquenal para anulação dos atos de nomeação; (3) manutenção das nomeações em

homenagem à confiança legítima, à boa-fé, ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido; (4)

aplicabilidade imediata ou não do art. 31 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT);

(5) legalidade dos atos do Tribunal de Justiça do Paraná; (6) habilitação em concurso público; (7)

aplicação de outros precedentes à espécie.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que deferiu a ordem para anular o procedimento

administrativo de controle, a partir da decisão que negou o desmembramento do processo.

(1) Verbete 3 da Súmula Vinculante/STF: “ Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o

contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o

interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão.”

MS 28.495/PR, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em

13.11.2018. (MS-28495)

(Informativo 923, Primeira Turma)

Controle de Constitucionalidade

ADPF: manifestações em universidades e normas eleitorais O Plenário referendou, com efeito vinculante e eficácia contra todos, decisão monocrática que, em

arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), suspendeu os efeitos de atos judiciais ou

administrativos emanados de autoridade pública que possibilitem, determinem ou promovam o ingresso

de agentes públicos em universidades públicas e privadas, o recolhimento de documentos, a interrupção

de aulas, debates ou manifestações de docentes e discentes universitários, a atividade disciplinar docente

e discente e a coleta irregular de depoimentos desses cidadãos pela prática de manifestação livre de ideias

e divulgação do pensamento em ambientes universitários ou em equipamentos sob a administração de

universidades públicas e privadas e serventes a seus fins e desempenhos.

A arguição impugnava decisões proferidas por juízes eleitorais que determinaram a busca e

apreensão do que seriam “panfletos” e materiais de campanha eleitoral em universidades e nas

dependências das sedes de associações de docentes e que proibiram aulas com temática eleitoral e

reuniões e assembleias de natureza política, impondo a interrupção de manifestações públicas de apreço

ou reprovação a candidatos nas eleições gerais de 2018, em ambiente virtual ou físico de universidades

federais e estaduais. Em alguns casos, policiais executaram essas ações sem comprovação de ato judicial

que o respaldasse. As medidas tiveram como fundamento jurídico o art. 37 da Lei 9.504/1997 (1), que

estabelece normas para as eleições.

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Preliminarmente, o Colegiado reconheceu adequada a utilização da ADPF, haja vista o respeito ao

princípio da subsidiariedade e a viabilidade da impugnação, por meio desse instrumento processual, de

decisões judiciais ou de interpretações judiciais de textos normativos.

Citou, no ponto, a orientação jurisprudencial fixada no julgamento da ADPF 405 e da ADPF 147

no sentido de que um conjunto de reiteradas decisões sobre determinada matéria deve ser considerado ato

do poder público passível de controle pela ADPF e de que esta é a via correta para questionar

interpretação judicial de normas constitucionais e legais. Registrou, também, o posicionamento firmado

na ADPF 33, quanto à plausibilidade do conhecimento da ADPF quando o princípio da segurança jurídica

seja seriamente ameaçado, sobretudo em razão de conflitos de interpretação ou de incongruências

hermenêuticas causadas pelo modelo pluralista de jurisdição constitucional, desde que presentes os

demais pressupostos de admissibilidade.

No mérito, o Plenário entendeu que os atos questionados violam os princípios constitucionais

assecuratórios da liberdade de manifestação do pensamento e desobedecem às garantias inerentes à

autonomia universitária (CF, artigos 5º, IV, IX e XVI; 206, II e III; e 207 (2)).

Observou que, às vésperas do pleito eleitoral de 2018, denso e tenso, as providências judiciais e os

comportamentos administrativos interrompem atos pelos quais se expressam ideias e ideologias,

preferências, propostas e percepções do que se quer no processo político.

Asseverou, ainda, que as normas jurídicas impeditivas de práticas durante o processo eleitoral

devem ser interpretadas de acordo com sua finalidade e nos limites por elas contemplados, sem

transgredir princípios constitucionais. Caso se extrapole o limite necessário ao resguardo de todas as

formas de manifestação livre de pensar e do espaço livre de cada um agir segundo seu pensamento

político, ocorre abuso não por parte de quem se expressa, mas de quem limita a expressão.

A finalidade do art. 37 da Lei 9.504/1997, que regulamenta a propaganda eleitoral e impõe

proibição de alguns comportamentos em períodos que especifica, é a de impedir o abuso do poder

econômico e político e de preservar a igualdade entre os candidatos no processo. A norma visa resguardar

a liberdade do cidadão, o amplo acesso às informações, para que ele decida conforme sua livre convicção,

sem cerceamento direto ou indireto a seu direito de escolha. A vedação por ela estabelecida possui a

finalidade específica de lisura do processo eleitoral. O que não estiver dentro dos limites dessa finalidade

e, diversamente, atingir a livre manifestação do cidadão não se afina com a teleologia da norma eleitoral

nem com os princípios constitucionais garantidores da liberdade de pensamento, manifestação,

informação, ensino e aprendizagem.

Portanto, as providências judiciais e administrativas impugnadas na ADPF, além de ferir o

princípio garantidor de todas as formas de manifestação da liberdade, desrespeitam a autonomia das

universidades e a liberdade dos docentes e discentes. As condutas limitadas pelos atos questionados

restringem não os direitos dos candidatos, mas o livre pensar dos cidadãos.

O Colegiado esclareceu que os dispositivos da Lei 9.504/1997 somente têm interpretação válida

em sua adequação e compatibilidade com os princípios previstos no art. 5º, IV, IX e XVI, da CF, por

meio dos quais são asseguradas todas as formas de manifestação da liberdade de pensamento, de

divulgação de ideias e de reunião dos cidadãos.

As autoridades judiciais e policiais, ao impor comportamentos restritivos ou impeditivos do

exercício desses direitos, proferiram decisões com eles incompatíveis e em afronta, ainda, ao princípio

democrático e ao modelo de Estado de Direito erigido e vigente no Brasil.

Por sua vez, as normas previstas nos artigos 206, II e III, e 207 da CF se harmonizam com os

direitos às liberdades de expressão do pensamento, de informar e de ser informado. Esses direitos são

constitucionalmente assegurados, para o que o ensino e a aprendizagem se conjugam, de modo a garantir

espaços de libertação da pessoa, a partir de ideias e compreensões do mundo convindas ou não e expostas

para convencer ou simplesmente expressar o entendimento de cada qual.

A autonomia é o espaço de discricionariedade conferido constitucionalmente à atuação normativa

infralegal de cada universidade para o excelente desempenho de suas funções. As universidades são

espaços de liberdade e de libertação pessoal e política. Seu título indica a pluralidade e o respeito às

diferenças, às divergências para se formarem consensos, legítimos apenas quando decorrentes de

manifestações livres. Por isso, a Constituição ali garante, de modo expresso, a liberdade de aprender e

ensinar e, ainda, de divulgar livremente o pensamento.

Também o pluralismo de ideias está na base da autonomia universitária como extensão do

princípio fundante da democracia brasileira, previsto no art. 1º, V, da CF (3). Dessa forma, os atos

impugnados, ao se contrapor a esses direitos fundamentais e determinar providências incompatíveis com

seu pleno exercício e eficaz garantia, interpretam a referida norma eleitoral de forma incompatível com

sua dicção e traidora dos fins a que se destina, que são os de acesso igual e justo a todos os cidadãos,

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garantindo-lhes o direito de informar-se e projetar suas ideias, ideologias e entendimentos, sobretudo em

espaços afetos diretamente à atividade do livre pensar e divulgar pensamentos plurais.

O ministro Gilmar Mendes, que também referendou a decisão, propôs, sem adesão dos demais

ministros, outras medidas, no sentido de que seja preservada a liberdade de cátedra e as liberdades

universitárias também no âmbito das relações privadas, tanto individuais quanto institucionais.

(1) Lei 9.504/1997: “Art. 37. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam,

e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de

ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a

tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados. ” (2) CF: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos

estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos

seguintes: (...) IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; (...) IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; (...) XVI – todos podem reunir-se

pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião

anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;” (3) CF: “Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...) II – liberdade de aprender, ensinar,

pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de

instituições públicas e privadas de ensino; ” (4) CF: “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e

patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. ”

(5) CF: “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) V – o pluralismo político. ”

ADPF 548 MC-Ref/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 31.10.2018. (ADPF-548)

Parte 1: Parte 1:

Parte 2: Parte 2:

(Informativo 922, Plenário)

Direitos e Garantias Fundamentais

Sustentação oral e ampla defesa A sustentação oral do representante do Ministério Público que diverge do parecer juntado ao

processo, com posterior ratificação, não viola a ampla defesa.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma denegou a ordem de habeas corpus.

HC 140780/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 30.10.2018. (HC-140780)

(Informativo 922, Primeira Turma)

Poder Judiciário

Competência jurisdicional e delitos comuns conexos a crimes eleitorais A Primeira Turma, por maioria, acolheu questão de ordem e afetou ao Plenário o julgamento de

agravo regimental em inquérito – instaurado para investigar a suposta prática de delitos, por deputado

federal e ex-prefeito, nos anos de 2010, 2012 e 2014. O inquérito aponta os crimes previstos nos arts. 317

(corrupção passiva) e 333 (corrupção ativa) do Código Penal (CP); além daqueles dispostos no art. 1º

(ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens,

direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime), inciso V (contra a Administração

Pública), da Lei 9.613/1998 e no art. 22 (efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de

promover evasão de divisas) da Lei 7.492/1986.

O parlamentar e o ex-prefeito, agravantes, pretendem a reforma da decisão do ministro Marco

Aurélio (relator), que declinou da competência para a primeira instância da Justiça estadual. Na decisão

agravada, o relator considerou o fato de que os delitos atribuídos ao deputado federal teriam sido

cometidos parte em 2010, quando exercia mandato de deputado estadual, e parte em 2014, quando os

crimes, apesar de supostamente praticados quando já ocupava o cargo de deputado federal, não estariam a

este relacionados, porque ligados ao recebimento de quantia, de maneira oculta, para a campanha à

prefeitura. Os agravantes pedem a manutenção da competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para

julgamento do feito ou, subsidiariamente, a fixação da competência da Justiça eleitoral. Destacam que a

suposta doação ilegal, realizada em 2014, diz respeito à campanha para a reeleição do primeiro agravante

ao cargo de deputado federal, e não à campanha para prefeito. Apontam, ademais, a conotação eleitoral

dos delitos imputados, os quais estariam relacionados à atividade parlamentar do deputado federal.

A Procuradoria-Geral da República (PGR), em contrarrazões, propôs questão de ordem no sentido

de remeter o feito ao Pleno, para que ele defina o alcance da competência criminal eleitoral. Reconhece

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que o fato alegadamente ocorrido no ano de 2014 consubstancia o delito eleitoral tipificado no art. 350

(omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer

inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais) do Código Eleitoral (CE),

cuja investigação deve permanecer tramitando perante o STF em razão do cargo, porquanto praticado por

deputado federal. O parlamentar teria solicitado e recebido quantia de grupo empresarial, a título de

doação ilegal vinculada à campanha para a reeleição ao citado cargo. O ex-prefeito, por sua vez, teria sido

um dos facilitadores da transação. Para a PGR, o fato ocorrido em 2010 também consubstancia o referido

crime eleitoral, mas sua investigação deve ser realizada perante a Justiça eleitoral, haja vista que o

deputado federal investigado, à época, exercia mandato de deputado estadual. De igual modo, nesse caso,

o parlamentar teria recebido quantia do grupo empresarial, a pretexto da campanha eleitoral ao cargo de

deputado federal, e cujo repasse teria sido facilitado mais uma vez pelo ex-prefeito.

A PGR ainda ressalta haver elementos indicativos do cometimento de crime no ano de 2012,

relativo ao recebimento, pelo ex-prefeito, de quantia paga pelo mesmo grupo empresarial, a pretexto da

campanha eleitoral para reeleição ao cargo de prefeito municipal, considerado o interesse do grupo na

facilitação de contratos referentes a evento esportivo de 2016. Articula com a presença de indícios de

atuação funcional do ex-prefeito aptos a caracterizarem, em tese, delitos de corrupção ativa e passiva. O

deputado federal teria atuado como operacionalizador dos pagamentos espúrios, inclusive mediante

transações realizadas no exterior. Sublinha a existência de indícios da prática dos crimes dos arts. 350 do

CE; 317 e 333 do CP; 22 da Lei 7.492/1986; e 1º (lavagem de dinheiro) da Lei 9.613/1998. Infere a

incompetência do STF para a investigação quanto a esses fatos, por não terem ocorrido durante o

exercício do mandato de deputado federal. No tocante ao crime eleitoral, afirma a competência da Justiça

eleitoral; e, em relação aos demais fatos, a competência da primeira instância da Justiça federal. Sustenta,

no ponto, que uma eventual conexão entre crimes comuns de natureza federal e crimes eleitorais não se

resolve subtraindo-se da Justiça federal a competência prevista no art. 109, IV, da Constituição Federal

(CF) (1), e atribuindo-a à Justiça eleitoral, em face do disposto nos arts. 35, II, do CE (2) e 78, IV, do

Código de Processo Penal (CPP) (3). Cabe repartição da atribuição, nessa hipótese, entre a Justiça

eleitoral e a federal. Frisa a ausência de aparelhamento da Justiça eleitoral para processar e julgar delitos

de alta complexidade, como os relacionados ao caso. Registra que a questão alusiva à competência para

processar e julgar crimes comuns federais conexos a delitos eleitorais tem recebido, na Segunda Turma,

solução no sentido de caber a atuação à Justiça eleitoral.

Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso, que decidiu remeter ao Plenário a análise integral

do recurso, nos termos do art. 11, parágrafo único, combinado com o art. 22, parágrafo único, b, do

Regimento Interno do STF (RISTF) (4). O ministro entendeu ser necessária a interpretação conforme a

Constituição do art. 35, II, do CE, o que importaria em declaração parcial de inconstitucionalidade.

Considerou a relevância do tema debatido e a necessidade de haver uma decisão do Plenário que se

aplique a todos os casos.

Já a ministra Rosa Weber fez ressalva na questão de ordem por considerar que, no caso concreto –

um inquérito com três conjuntos distintos de fatos, situados em tempos distintos –, seria possível remeter

ao Pleno apenas a questão concernente aos fatos definidos e relativos ao ano de 2012.

Vencido o ministro Marco Aurélio, que não acolheu o pedido da PGR de afetação da matéria ao

Plenário, tendo em conta o que previsto no art. 22, caput e parágrafo único, do Regimento Interno do STF

(RISTF). Para o relator, a questão veiculada não é controvertida entre as Turmas, e os acórdãos

formalizados pela Segunda Turma estão em consonância com a jurisprudência firmada pelo Pleno em

outros precedentes (CC 7.033; CJ 6.070; Pet 6.820; Pet 6.694).

(1) CF/1988: “Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: (...) IV – os crimes políticos e as infrações penais

praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, excluídas

as contravenções e ressalvada a competência da Justiça Militar e da Justiça Eleitoral; ”

(2) CE: “Art. 35. Compete aos juízes: (...) II – processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos, ressalvada a competência originária do Tribunal Superior e dos Tribunais Regionais; ”

(3) CPP: “Art. 78. Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras: (...)

IV – no concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta. ” (4) RISTF: “Art. 11. A Turma remeterá o feito ao julgamento do Plenário independente de acórdão e de nova pauta: I –

quando considerar relevante a arguição de inconstitucionalidade ainda não decidida pelo Plenário, e o Relator não lhe houver

afetado o julgamento; II – quando, não obstante decidida pelo Plenário, a questão de inconstitucionalidade, algum Ministro propuser o seu reexame; III – quando algum Ministro propuser revisão da jurisprudência compendiada na Súmula. Parágrafo único. Poderá a

Turma proceder da mesma forma, nos casos do art. 22, parágrafo único, quando não o houver feito o Relator. (...) Art. 22. O Relator

submeterá o feito ao julgamento do Plenário, quando houver relevante arguição de inconstitucionalidade ainda não decidida. Parágrafo único. Poderá o Relator proceder na forma deste artigo: a) quando houver matérias em que divirjam as Turmas entre si ou

alguma delas em relação ao Plenário; b) quando, em razão da relevância da questão jurídica ou da necessidade de prevenir

divergência entre as Turmas, convier pronunciamento do Plenário. ”

Inq 4435 Quarto AgR/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento

em 20.11.2018. (Inq-4435)

(Informativo 924, Primeira Turma)

9

Reclamação

Reclamação: liminar em ADPF e proibição de transporte de amianto A Primeira Turma deu provimento a agravo interno para julgar improcedente reclamação ajuizada

contra acórdão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) em que se alegava afronta à autoridade da

decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que deferiu parcialmente liminar na Arguição de

Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 234.

O acórdão do TST confirmou decisão proferida em ação civil pública que proibiu, com base no art.

1º da Lei 12.684/2007 (1) do Estado de São Paulo, o uso de quaisquer tipos de amianto e determinou à

empresa reclamante que se abstivesse de transportar cargas contendo amianto in natura e reparasse os

danos morais coletivos.

Na ADPF, o Plenário, em liminar, suspendeu a eficácia das interdições ao transporte interestadual

e internacional de cargas, inclusive as de amianto da variedade crisotila, quando fundamentadas em

descumprimento da mencionada norma estadual, haja vista que, à época, a Lei federal 9.055/1995 admitia

a comercialização do mineral.

A Turma reconheceu, inicialmente, ter havido perda de objeto, porque, antes do trânsito em

julgado da decisão liminar na ADPF – suspensa para aguardar o julgamento definitivo da ADI 3.937 –, o

STF teria concluído, nesta ação direta, pela constitucionalidade da referida lei estadual. Portanto, o

parâmetro de controle que levaria a conclusão diversa na reclamação estaria prejudicado.

Ainda que se superasse a perda do objeto, o Colegiado reconheceu não haver aderência estrita

entre a decisão reclamada e a decisão cautelar proferida na ADPF 234. No caso, o TST enfrentou o tema,

em exame de agravo de instrumento, exclusivamente pela aplicação do enunciado 126 de sua Súmula (2),

que diz respeito à impossibilidade de revolvimento de fatos e provas e corresponde ao enunciado 7 da

Súmula do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Vencido o ministro Alexandre de Moraes (relator), o qual negou provimento ao recurso para

manter sua decisão monocrática que reputou desrespeitada a liminar deferida na ADPF 234, ressalvada a

superveniente conclusão resultante do julgamento da ADI 3.937. Para ele, antes dessa situação

consolidada, houve condenação não somente no sentido da abstenção do transporte de amianto, mas

também em indenização por danos morais coletivos. Por isso, não haveria prejuízo da reclamação.

(1) Lei 12.684/2007: “Art. 1º Fica proibido, a partir de 1º de janeiro de 2008, o uso, no Estado de São Paulo, de produtos,

materiais ou artefatos que contenham quaisquer tipos de amianto ou asbesto. ”

(2) Enunciado 126 da Súmula do TST: “Incabível o recurso de revista ou de embargos (arts. 896 e 894, b, da CLT) para reexame de fatos e provas. ”

(3) Enunciado 7 da Súmula do STJ: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial. ”

RCL 26.003/SP, rel. Min. Alexandre de Moraes, red. p/ o ac. Min. Rosa weber, julgamento em

13.11.2018. (RCL-26003)

(Informativo 923, Primeira Turma)

10

DIREITO PENAL

Processual Penal

Crime de fuga e direito à não autoincriminação

A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTN) (1) é constitucional,

posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as

hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 907 da repercussão

geral, deu provimento ao recurso extraordinário para reformar o acórdão recorrido que declarou a

inconstitucionalidade do referido tipo penal e, consequentemente, absolveu o réu.

Denunciado pelo Ministério Público estadual, o réu foi condenado como incurso nas sanções do

crime previsto no art. 305 do CTB. Ao julgar a apelação, o juízo de segundo grau a proveu para declarar a

inconstitucionalidade do crime de fuga, com consequente absolvição do réu. Baseou-se, para isso, no art.

386, III, do Código de Processo Penal (CPP) (2), por entender que ninguém está obrigado a produzir

prova contra si mesmo.

O Ministério Público estadual, ora recorrente, sustentou que o crime de fuga não ofende os direitos

à não autoincriminação e ao silêncio, uma vez que o objetivo dessas garantias não abarca a simples

exigência de permanência no local do acidente do agente que o tenha provocado. Não há obrigação legal

de prestar declarações ou assumir culpa, mas apenas de evitar o uso de subterfúgios à ação do poder de

polícia administrativo, viabilizando a identificação dos envolvidos em acidente de trânsito, inclusive para

o fim de evitar futuras punições ou responsabilizações judiciais injustas.

Para o Colegiado, é admissível a flexibilização do princípio da vedação à autoincriminação

proporcionada pela opção do legislador de criminalizar a conduta de fugir do local do acidente. De fato,

tal procedimento não afeta o núcleo irredutível daquela garantia enquanto direito fundamental, qual seja,

jamais obrigar o investigado ou réu a agir ativamente na produção de prova contra si próprio. O tipo penal

do art. 305 do CTB apenas obriga a permanência do agente no local para garantir a identificação dos

envolvidos no sinistro e o devido registro da ocorrência pela autoridade competente.

O bem jurídico tutelado é a administração da justiça, prejudicada pela fuga do agente do local do

evento, uma vez que tal atitude impede sua identificação e a consequente apuração do ilícito, para fins de

se promover a responsabilização cível ou penal de quem, eventualmente, provocar um acidente de

trânsito, dolosa ou culposamente. Essa diligência administrativa, aliás, transforma-se em meio de defesa

do próprio acusado.

A exigência de permanência no local do acidente e de identificação perante a autoridade de

trânsito não obriga o condutor a assumir eventual responsabilidade cível ou penal pelo sinistro nem,

tampouco, enseja que contra ele se aplique qualquer penalidade caso não o faça. O condutor, após sua

identificação pela autoridade de trânsito, pode optar, quando indagado, por permanecer em silêncio e não

prestar nenhum esclarecimento acerca das circunstâncias do acidente.

Insta reconhecer que eventual declaração de inconstitucionalidade da conduta tipificada no art. 305

do CTB (1), em nome da observância absoluta e irrestrita do princípio da vedação à autoincriminação

(nemo tenetur se detegere), caracterizaria evidente afronta ao princípio constitucional da

proporcionalidade quanto à vedação de proteção deficiente.

Esse princípio pode ser relativizado pelo legislador justamente por possuir natureza de direito

fundamental, que, no contexto da teoria geral dos direitos fundamentais, implica a valoração do princípio

da proporcionalidade e seus desdobramentos como critério balizador do juízo de ponderação, inclusive no

que condiz com os postulados da proibição de excesso e de vedação à proteção insuficiente.

A fragilização da tutela penal do Estado, mediante a visualização de óbices à responsabilização

penal da conduta de fugir do local do acidente, deixa a descoberto o bem jurídico de tutela da

administração da justiça que o Estado deveria salvaguardar por meio da norma penal, bem como,

indiretamente, os direitos fundamentais que se busca proteger com a promoção de maior segurança no

trânsito, sobretudo o direito à vida.

Além disso, descriminalizar o crime de fuga significaria efetivamente negar a vontade do

Parlamento. Essa conduta é criminalizada porque a Constituição promete, em nome do povo, uma

sociedade justa e solidária, o que não poderia ser garantido caso afastada a juridicidade de uma conduta

de quem abandona o local do acidente para fugir à responsabilidade penal e civil.

Acrescente-se a isso a existência de norma de direito internacional vigente na ordem jurídica

interna que abona essa opção feita pelo legislador. O Decreto 86.714/1981, que internalizou no Brasil a

11

Convenção de Trânsito de Viena, prevê o comportamento do condutor e demais envolvidos em caso de

acidente (art. 31).

Esse normativo dispõe que, “sem prejuízo do disposto nas legislações nacionais sobre a obrigação

de prestar auxílio aos feridos, todo condutor ou qualquer outro usuário da via, implicado em um acidente

de trânsito, deverá: (...) c) se exigido por outras pessoas implicadas no acidente, comunicar-lhe sua

identidade” (Item 1, c). No mais, “se houver resultado ferida ou morta alguma pessoa no acidente,

advertir à polícia e permanecer ou voltar ao local do acidente até a chegada desta, a menos que tenha sido

autorizado por esta para abandonar o local ou que deva prestar auxílio aos feridos ou ser ele próprio

socorrido” (Item 1, d).

Em precedente análogo à situação dos autos, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou

entendimento no sentido de que o princípio constitucional da vedação à autoincriminação não pode ser

interpretado de maneira absoluta. Essa relativização alcança aquele sujeito que atribui falsa identidade

perante autoridade policial com o intuito de ocultar maus antecedentes, o que torna típica a conduta

prevista no art. 307 do Código Penal (3), sem qualquer traço de ofensa ao disposto no art. 5º, LXIII, da

CF (4) (RE 640139 – Tema 478 da repercussão geral).

A persecução penal admite a relativização dos direitos na hipótese de justificável tensão entre o

dever do poder público de promover uma repressão eficaz às condutas puníveis e as esferas de liberdade

ou intimidade daquele que se encontre na posição de suspeito ou acusado.

Nesse âmbito, o direito à não autoincriminação se insere no mesmo conjunto de direitos subjetivos

e garantias do cidadão brasileiro, de que são exemplos os direitos à intimidade, à privacidade e à honra.

Essa relativização é admissível, embora mediante a observância dos parâmetros constitucionais

pertinentes à harmonização de princípios eventualmente colidentes.

Diante desse quadro, trata-se de garantia que não pode ser interpretada como o direito do suspeito,

acusado ou réu a não participar da produção de medidas probatórias. A referida flexibilização possibilita

que se efetivem, em maior medida, outros princípios fundamentais com os quais aquele colide no plano

concreto, sem que isso acarrete qualquer violação à dignidade da pessoa humana.

O Tribunal asseverou, também, ser corolário da garantia contra a não autoincriminação a

preservação do direito do investigado ou réu de não ser compelido a, deliberadamente, produzir

manifestação oral que verse sobre o mérito da acusação. Esse direito, no entanto, sofre ponderável

flexibilização diante do quadro alarmante dos delitos de circulação.

O direito do investigado de não realizar condutas ativas que importem na introdução de

informações ao processo também comporta níveis de flexibilização, muito embora a regra geral seja a da

sua vedação.

A jurisprudência do Supremo, historicamente, adotava uma postura restrita quanto à

admissibilidade das intervenções corporais. Contudo, na linha do que se visualiza no cenário

internacional, esta Corte, gradativamente, iniciou uma caminhada em sentido oposto. Um precedente

exemplificativo desse processo é a Rcl 2.040/DF, na qual se decidiu que a autoridade jurisdicional

poderia autorizar a realização de exame de DNA em material colhido de gestante mesmo sem sua

autorização, tendo em vista o objetivo de investigar possível crime de estupro.

O direito comparado à luz da legislação e da jurisprudência dos principais países da Europa

Continental admite a intervenção corporal coercitiva, desde que autorizada judicialmente, restrita à

cooperação passiva do sujeito investigado ou acusado e sem ofensa à dignidade humana.

Ademais, a Corte enfatizou a diferença entre a situação dos autos e a de quem pratica um

homicídio doloso no trânsito. Nos crimes dolosos, o dolo na prática do crime e o iter criminis são, desde o

início, os atos preparatórios, executórios, a consumação e obviamente a evasão. Há um dolo para prática

do crime, de modo que o agente não pode ser responsabilizado caso fuja do local do delito.

Por sua vez, o art. 305 do CTB não acusa, impõe ou aponta que o condutor do veículo seja um

criminoso. Ao contrário, o que se pretende é preservar o local do acidente para proteger a administração

da justiça, razão pela qual se impõe que os condutores lá permaneçam. O que se pune é o afastamento do

local de acidente.

Por fim, o ministro Ricardo Lewandowski ponderou que o abandono do local do acidente pode ser

legitimado em caso de eventual risco de agressões que o condutor possa vir a sofrer por parte dos

circunstantes, ou até mesmo numa situação de lesão corporal sofrida pelo próprio motorista no sinistro.

Nos casos concretos em que houver perigo de vida do causador do evento caso permaneça no local do

acidente, o juiz poderá aferir a exclusão da antijuridicidade da conduta, tal como a legítima defesa ou o

estado de necessidade.

Para o ministro Alexandre de Moraes, essas situações representam condutas atípicas, uma etapa

anterior à excludente de ilicitude, porque o tipo penal exige que o condutor do veículo se afaste do local

12

do crime “para fugir à responsabilidade penal ou civil”. Havendo necessidade de o agente evadir-se pelas

circunstâncias apresentadas, não ocorre dolo específico do tipo.

Ficaram vencidos os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli, que

desproveram o recurso extraordinário. Para eles, o tipo penal do art. 305 do CTB viola o princípio da não

autoincriminação. A CF assegura que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de

permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado” (4).

Segundo ressaltado, tal disposição vem sendo interpretada pelo STF em sentido amplo,

abrangendo qualquer investigado ou acusado, e não apenas o preso. A cláusula contra a autoincriminação

não se restringe ao direito de permanecer em silêncio, mas preserva o suspeito, investigado, denunciado

ou o réu da obrigação de colaborar ativa ou passivamente com as autoridades, sob pena de infringência à

cláusula do devido processo legal.

Mesmo que o condutor permaneça em silêncio, pode vir a produzir prova contra si. A

comprovação da conduta criminosa pressupõe a configuração de autoria e de materialidade, e a

permanência do imputado no local do crime inquestionavelmente contribui para a comprovação da

autoria, assentando seu envolvimento com o fato em análise potencialmente criminoso.

Em sentido semelhante, o Tribunal consignou que a condução coercitiva do imputado para prestar

informações, ainda que possa permanecer em silêncio, viola o direito à não autoincriminação (ADPF

395). Em idêntica lógica, o fato de o condutor do veículo poder permanecer posteriormente em silêncio

não afasta a violação ao direito à não autoincriminação, quando obrigado a permanecer no local do

acidente.

Há também desproporcionalidade por excesso ao se considerar a disparidade de tratamento em

relação a outros delitos mais graves, como estupro ou homicídio. Nesses casos, o legislador não

criminalizou a conduta do acusado que venha a evadir-se do local. Nesse sentido, criminalizar alguém que

simplesmente deixa o local do acidente não se mostra harmônico com o princípio constitucional da

proporcionalidade.

(1) CTB/1997: “Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil

que lhe possa ser atribuída: (...)”

(2) CPP/1941: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: (...) III –

não constituir o fato infração penal. ”

(3) CP/1940: “Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou

alheio, ou para causar dano a outrem: (...). ” (4) CF/1988: “Art. 5º (...) LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe

assegurada a assistência da família e de advogado. ”

RE 971.959/RS, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 14.11.2018. (RE-971959)

Parte 1: Parte 1:

Parte 2: Parte 2:

(Informativo 923, Plenário – Repercussão Geral)

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Mandado de Segurança

Restituição de parcelas recebidas por boa-fé por ordem liminar revogada

A Primeira Turma, por maioria, deu provimento a embargos de declaração para sanar omissão

referente à possibilidade de se exigir a devolução de valores recebidos de boa-fé por servidor público,

percebidos a título precário no período em que liminar produziu efeitos.

Para o Colegiado, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (MS 25.430 e MS

30.556 AgR), é desnecessária a devolução dos valores recebidos por liminar revogada, em razão de

mudança de jurisprudência. Também é descabida a restituição de valores recebidos indevidamente,

circunstâncias em que o servidor público atuou de boa-fé.

A orientação ampara-se na confiança legítima que tinham os beneficiários de a pretensão ser

acolhida e no lapso temporal transcorrido entre o deferimento da liminar e sua revogação. Os princípios

da boa-fé e da segurança jurídica afastam o dever de restituição de parcelas recebidas por ordem liminar

revogada.

Vencido em parte o ministro Marco Aurélio (relator), que proveu os embargos para apenas afastar

a omissão. O relator entendeu haver a necessidade de devolução dos valores recebidos pela impetrante

com base no art. 46, § 3º, da Lei 8.112/1990 (1).

(1) Lei 8.112/1990: “Art. 46. As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de junho de 1994, serão

previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias,

podendo ser parceladas, a pedido do interessado. (...) § 3o Na hipótese de valores recebidos em decorrência de cumprimento a decisão liminar, a tutela antecipada ou a sentença que venha a ser revogada ou rescindida, serão eles atualizados até a data da

reposição.”

MS 32.185/DF, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 13.11.2018. (MS-32185)

(Informativo 923, Primeira Turma)

14

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Arquivamento

Arquivamento de inquérito e novas diligências instrutórias A Segunda Turma, por maioria e com base em voto médio, deu parcial provimento a agravo

regimental para reformar a decisão monocrática que arquivou o inquérito com fundamento na ausência de

indícios mínimos de autoria ou materialidade, e por descumprimento dos prazos para a instrução do

inquérito, conforme previsto no art. 231, § 4º, e, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal

(RISTF) (1).

Prevaleceu o voto do ministro Ricardo Lewandowski, que determinou o retorno dos autos ao

Parquet para que conclua diligências de caráter instrutório, ainda pendente de execução, no prazo de

sessenta dias, sob pena de arquivamento do inquérito, na forma do art. 231, § 4º, e, do RISTF (1), e sem

prejuízo do art. 18 do Código de Processo Penal (CPP) (2).

No inquérito, investiga-se o envolvimento de senador em crimes de corrupção passiva e lavagem

de dinheiro relacionados ao suposto recebimento de vantagens indevidas por meio de empresas

contratadas por sociedade de economia mista.

Como resultado das investigações, a Polícia Federal, em relatório, representou pelo arquivamento

do inquérito, em razão da falta de prova da existência dos delitos. A Procuradoria-Geral da República

(PGR), no entanto, após sucessivas prorrogações do prazo de vista para que apresentasse suas conclusões,

requereu apenas a baixa dos autos, com fundamento na diretriz adotada pelo STF no julgamento da AP

937 QO/RJ. Diante desse cenário, o ministro Gilmar Mendes (relator) proferiu decisão para rejeitar o

pedido de declinação da competência e determinar o arquivamento do inquérito.

No recurso de agravo, a PGR postulou a reforma da decisão de arquivamento. Arguiu que o

trancamento de inquérito apenas pode se dar em hipóteses excepcionais de evidente constrangimento

ilegal, o que não ocorreu no caso. No mais, reiterou o pedido de remessa dos autos à Justiça Federal,

porque o foro por prerrogativa de função somente alcançaria os atos cometidos por parlamentares durante

o exercício do cargo e quando relacionados às funções desempenhadas.

O pedido para prosseguir com as investigações baseou-se em informações bancárias estrangeiras

que indicam a evasão de valores supostamente recebidos pelo investigado em esquema de propinas

instalado em diretoria de estatal. Essas informações, obtidas por meio de acordo de cooperação jurídica

internacional, somente teriam se tornado acessíveis em momento posterior à recomendação de

arquivamento do inquérito feita pela autoridade policial.

Para a Turma, é necessário, ao menos, colher-se a posição conclusiva do órgão ministerial acerca

do que se contém nos autos, apontando concretamente os novos elementos de prova a serem

considerados. O Ministério Público poderá tanto trazer aos autos os documentos obtidos a partir da

cooperação internacional, devidamente traduzidos, quanto apresentar suas conclusões.

De posse de manifestação mais objetiva da PGR, com provas suficientes para eventual

continuidade das investigações, o STF poderá avaliar se é mesmo o caso de arquivamento ou se a

investigação deve prosseguir e em que condições.

Vencidos os ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, que mantiveram o arquivamento do

inquérito. Consideraram que o Judiciário tem o poder e o dever de controlar a investigação preliminar e

limitar eventuais abusos na persecução penal, resguardados os direitos e garantias fundamentais.

Para eles, a investigação em análise carece de justa causa para seu prosseguimento, conforme

conclusão firmada na própria representação pelo arquivamento do inquérito feita pela autoridade policial.

Ainda que declarações de colaboradores sejam suficientes para o início de investigações, tais elementos

não podem legitimar persecuções eternas, sem que sejam corroborados por provas independentes.

Os novos elementos probatórios apontados pela acusação dizem respeito a informações que já

foram objeto de outro inquérito, há anos arquivado. A declinação da competência em uma investigação

que já deveria estar concluída representaria apenas protelar a solução, violando o direito à duração

razoável do processo e à dignidade da pessoa humana.

Vencidos parcialmente os ministros Edson Fachin e Celso de Mello, que proveram o agravo para

remeter os autos à primeira instância.

(1) RISTF: “Art. 231. (...) § 4º O Relator tem competência para determinar o arquivamento, quando o requerer o

Procurador-Geral da República ou quando verificar: (...) e) ausência de indícios mínimos de autoria ou materialidade, nos casos em

que forem descumpridos os prazos para a instrução do inquérito ou para oferecimento de denúncia. ”

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(2) CPP: “Art. 18. Depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a

denúncia, a autoridade policial poderá proceder a novas pesquisas, se de outras provas tiver notícia. ”

Inq 4244/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em

20.11.2018. (Inq-4244)

(Informativo 924, Segunda Turma)

Pena

Condenação pelo tribunal do júri e execução provisória da pena Nas condenações pelo tribunal do júri não é necessário aguardar julgamento de recurso em

segundo grau de jurisdição para a execução da pena.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, não conheceu da impetração de

habeas corpus e revogou liminar que suspendia a execução da pena privativa de liberdade.

O paciente foi condenado pelo tribunal do júri a doze anos, cinco meses e dez dias de reclusão, em

regime inicial fechado, pela tentativa de homicídio qualificado. O Conselho de Sentença, porém, o

absolveu da imputação do delito de homicídio consumado.

Em sede de apelação, o tribunal de justiça afastou a redução de 2/3 da pena e estabeleceu o

patamar de 1/3 para cada uma das condenações, fixando a pena definitiva em dezenove anos, cinco meses

e dez dias de reclusão. Determinou a realização de novo júri no tocante à absolvição do crime de

homicídio, bem como o início da execução provisória da pena, reportando-se ao decidido, pelo Supremo,

no exame do HC 126.292.

A defesa argumentou que a execução da pena dependeria de novo julgamento pelo tribunal do júri

e que fundamentar a decisão exclusivamente no entendimento firmado no HC 126.292 ofenderia o

princípio da fundamentação das decisões jurídicas, previsto no art. 93, IX, da CF (1).

A Turma asseverou que as decisões do tribunal do júri são soberanas. Por isso, o tribunal de justiça

pode, eventualmente, anulá-las, mas não pode substituí-las.

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedeu a ordem e rejeitou a preliminar de

inadequação de habeas corpus.

(1) CF: “Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura,

observados os seguintes princípios: (...) IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas

todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o

interesse público à informação;”

HC 140449/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em

6.11.2018. (HC-140449)

(Informativo 922, Primeira Turma)

Provas

Colaboração premiada e termo de compartilhamento Não há óbice ao compartilhamento de delação premiada desde que haja delimitação dos fatos.

Com base nesse entendimento, a Segunda Turma negou provimento a agravo regimental em que se

discutia a possibilidade de compartilhamento de delação premiada entre o Ministério Público Federal

(MPF) e o estadual.

O Ministério Público estadual requereu acesso aos termos de depoimento de colaborador para fins

de apuração de eventual prática de ato de improbidade administrativa por parte de agente público.

O MPF, por outro lado, sustentou a superveniente incompetência do Supremo Tribunal Federal

(STF) para deliberar sobre as pretensões que envolvam o compartilhamento de provas já remetidas a

outras instâncias do Poder Judiciário.

A Turma entendeu que remanesce a competência do juízo homologador do acordo de colaboração

premiada para deliberação acerca de pretensões que envolvam o compartilhamento de termos de

depoimento prestados pelo colaborador, ainda que haja remessa a outros órgãos do Poder Judiciário.

Salientou ser pacífica a jurisprudência no sentido de se admitir, em procedimentos

administrativos, o empréstimo de prova do processo penal, bem como para subsidiar apurações de cunho

disciplinar.

16

Por fim, afirmou que, reconhecidas as delimitações consubstanciadas, no caso, pelo termo de

depoimento, não há causa impeditiva ao compartilhamento requerido.

PET 7065/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 30.10.2018. (PET-7065)

(Informativo 922, Segunda Turma)

Recurso

Apelação: inclusão de circunstâncias judiciais sem incremento da pena e “reformatio in

pejus” Não viola o princípio da proibição da reformatio in pejus a reavaliação das circunstâncias

judiciais em recurso de apelação penal, no âmbito do efeito devolutivo, desde que essa não incorra em

aumento de pena.

Com base nesse entendimento, a Primeira Turma, por maioria, denegou a ordem de habeas

corpus.

No julgamento em primeira instância, a pena-base foi fixada em dois anos e seis meses acima do

mínimo legal devido à avaliação de três circunstâncias negativas: antecedentes, consequências do crime e

culpabilidade.

O tribunal de justiça local, ao reavaliar as circunstâncias em face de apelação defensiva, retirou a

relativa aos antecedentes, por falta de sentença transitada em julgado; acrescentou fundamentação, antes

omissa, às consequências do crime; reafirmou a culpabilidade; e incluiu um terceiro fator, circunstâncias

do crime, não mencionado anteriormente. Dessa forma, manteve a pena-base.

A defesa aduziu a ausência de embasamento fático em relação aos aspectos culpabilidade e

consequências do crime e afirmou o caráter desfavorável da reanálise da sentença ao réu, apesar da não

alteração da pena (Informativo 877).

Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que concedeu a ordem. Ressaltou a impossibilidade

de decisão prejudicial ao réu em recurso da defesa e, por conseguinte, a incoerência quanto à substituição

das circunstâncias judiciais.

HC 126457/PA, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgamento

em 6.11.2018. (HC 126457/PA)

(Informativo 922, Primeira Turma)

Supremo Tribunal Federal

Secretaria de Documentação - SDO