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B I O Q U Í M I CB I O Q U Í M I C A A

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Tanto atletas de elite, nas competições, quanto pessoas comuns, em suas

tarefas domésticas, estão realizando atividade física. Por trás de cada

 simples movimento de nosso corpo, existe uma complexa coordenação

entre vários órgãos, comandada pelo sistema nervoso e envolvendo

diversos hormônios. Além disso, como acontece com toda máquina,

 precisamos de certa quantidade de energia extra nesses momentos,

e esta deve ser fornecida prontamente, ou não conseguiremos realizar 

o trabalho desejado. Este artigo discute como o corpo obtém energia

a partir de moléculas orgânicas combustíveis, presentes nos alimentos

que comemos ou em estoques no próprio corpo. Tais moléculas

têm propriedades diferentes, sua utilização depende da intensidade

e da duração da atividade física e o modo como são usadas respeita

uma hierarquia entre os diferentes órgãos e sistemas do organismo.

Paulo Cesar de Carvalho AlvesInstituto de Bioquímica Médica, Universidade Federal do Rio de Janeiro

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do exercício físico

B I O Q U Í M I C A

Oscombustíveis

    t    O    C    k

    s    N    i    t    a

    r    s    /    l

    e

    C    H

    r    a    e    s    e    r    O    t

    P    H    O

Costumamos dizer que estamos praticando exercício quando o ob- índice específico (na dança ou no esporte, por exem-jetivo da atividade física é o esporte, a promoção da plo, por lazer ou profissionalmente), pode ser defi-saúde ou a obtenção de uma aparência corporal es- nida como ‘performance’ (ou desempenho). No en-pecífica (como emagrecer ou ficar musculoso). Na tanto, a busca obsessiva pelo melhor resultado mui-verdade, praticamos atividade física o tempo inteiro tas vezes ultrapassa os limites do funcionamento do– mesmo dormindo ou repousando gastamos energia corpo, prejudicando a saúde. O mesmo ocorre quan-para continuar vivos (figura 1). Já a realização de do a atividade física é realizada em busca de umamovimentos determinados, visando alcançar um identidade corporal, como no caso das pessoas que

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querem emagrecer rápido ou ficar muito musculosase exageram nos recursos utilizados.

O funcionamento do corpo envolve a atuaçãointegrada de diversos órgãos e sistemas. Estes têmestruturas e funções diferenciadas, mas uma aná-lise em nível molecular revela que exibem muitas

semelhanças, sobretudo quanto às reações químicasque ali ocorrem. Chamamos de ‘metabolismo’ esseconjunto de reações químicas que caracterizam oestado vital. Elas ocorrem continuamente, aceleradaspor enzimas, formando vias de reações seqüenciaisaltamente integradas e finamente reguladas, paramanter nossa máquina corporal estruturada. Por isso,o tempo inteiro o corpo realiza ‘trabalho’, pois semeste não há organização, e para realizar trabalho osuprimento de energia deve ser contínuo. Chamamosde ‘catabolismo’ o conjunto das vias químicas que li-beram energia para processos que realizam trabalho,e de ‘anabolismo’ o conjunto das vias que usam essa

energia para construir novas moléculas e manter oorganismo funcionando. As reações catabólicas têmde ocorrer na mesma intensidade que as anabólicaspara que o sistema atue com perfeição (figura 2).

Para que cada músculo específico seja movi-mentado na hora certa, com a força e a velocidadeideal, é necessário o comando e a coordenação do

Figura 1. Gasto de energia em relação ao estadode repouso para algumas atividades ísicas do

dia-a-dia e para alguns esportes (o gasto equivalea 1 em repouso e os números abaixo são múltiplos

dessa taxa básica em outras atividades)

sistema nervoso. Este age como um maestro em umaorquestra: não pode falhar em momento algum, epara isso precisa receber um aporte constante demoléculas de glicose, sua principal fonte de energia,além de oxigênio, necessário para a perfeita retiradada energia contida na glicose (figura 3). Essa regra

básica – o aporte constante de glicose e oxigênio aosistema nervoso – vai determinar como os outrosórgãos, inclusive os músculos, podem obter energiadurante a atividade física.

De onde vema energia? Os agentes finais do movimento são os músculosque, quando se contraem, movem as diferentes par-tes do corpo, que são articuladas. Para que tanto a

contração quanto o relaxamento do músculo ocor-ram, é necessário ter uma fonte de energia e ummecanismo capaz de direcionar esta para a maqui-naria muscular. A principal energia usa-da para realizar trabalho em nossoorganismo está contida nas liga-ções químicas do trifosfato de

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adenosina (conhecido pela sigla, em inglês,ATP) – nessa molécula, o composto ade-nosina está ligado a três radicais químicosque contêm fósforo, chamados de gruposfosfato (Pi). A quebra de uma dessas liga-ções, que gera difosfato de adenosina

(ADP) e um grupo fosfato livre, libera aenergia usada no processo que provoca acontração muscular.

A molécula de ATP deve ser imedia-tamente regenerada (por meio da religa-ção entre ADP e um grupo fosfato) paraque o fornecimento de energia não dimi-nua. Para fazer isso, o organismo usa outrafonte de energia: as ligações químicasexistentes nos chamados ‘combustíveis

Figura 2. Na digestão e no uso dos estoques de combustíveis

(reações catabólicas), o organismo desaz moléculas maiores,como proteínas, amido, triglicerídios e outras, em seusconstituintes (aminoácidos, glicose, ácidos graxos).Nas reações anabólicas, as moléculas menores são degradadasainda mais para liberar a energia necessária para realizartrabalho ou usadas na síntese de outras moléculas

Figura 3. A redução da concentração de glicoseno sangue (hipoglicemia) pode causar sérias alteraçõesno sistema nervoso central, inclusive a morte

Glicose no sangue(mg/100 ml)

+ +

Faixanormal

100

90

80

70

60

50

40

30

20

10

0

Alterações neurológicas leves;

ome; liberação de glucagon,

adrenalina e cortisol;

transpiração; tremores

LetargiaConvulsão e coma

Danos cerebrais permanentes

Morte

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celulares’: carboidratos (açúcares), ácidos graxos(presentes em gorduras) e aminoácidos (figura 4). Aglicose, principal molécula combustível do grupodos carboidratos, é estocada na forma de glicogênio.Os ácidos graxos, capazes de liberar mais energiaque a glicose, são estocados principalmente no te-

cido adiposo, na forma de triglicerídios (gorduraneutra). Já os aminoácidos, que não são estocadosno corpo como proteínas de reserva, têm pequenopapel na produção de energia para a atividade físi-ca, embora sejam usados para gerar glicose em casosde jejum excessivo ou exercício físico muito prolon-gado (em uma maratona, por exemplo).

A energia contida nesses compostos é liberadapor meio de reações muito espontâneas de oxidação(catabolismo), nas quais uma molécula (ou compos-to) cede elétrons a outra, ligando-se ou não a ela.Quando o oxigênio molecular (O

2) participa direta-mente da oxidação, em processos celulares, dizemos

que há ‘respiração celular’. É por esse processo queas mitocôndrias, organelas presentes nas células,produzem ATP. Fora das mitocôndrias, a única formade regenerar a molécula de ATP, sem a participaçãodo O2, é a oxidação da glicose, e esta é a maneiramais rápida de repor a energia gasta pela célula.

Como acelerara ofertaA velocidade com que o músculo esquelético gastaenergia pode aumentar muito em frações de segun-

do. Não só quando um corredor de elite sai da linhade largada, em uma prova curta, para atingir a ve-locidade de 10 m por segundo em menos de umsegundo, mas também quando estamos deitados nacama e nos levantamos para ir ao banheiro. Nessesmomentos – guardadas as proporções –, a taxa comque o ATP estava sendo consumido na situação derepouso aumenta subitamente com a nova exigênciamuscular, e este precisa ser reciclado velozmente,ou a nova atividade não poderá ser mantida. Paraisso, é preciso acelerar de imediato as vias catabó-licas e assim transferir a energia química dos com-bustíveis para a reconstituição das ricas ligações defosfato no ATP. Qual sistema deve ser ativado pri-meiro?

Temos a opção de usar a glicose ou os ácidosgraxos como fonte de energia, mobilizados de seusestoques pela ação do hormônio adrenalina. Taiscompostos têm diferentes potenciais – quantitati-vo ou qualitativo – de geração de energia. No caso

 

em questão, o critério de quantidade não é o melhor,a princípio, já que a energia deve estar disponívelcom urgência. Assim, a melhor solução é a glicóli-se anaeróbica, ou seja, a quebra da molécula de gli-cose sem a participação do oxigênio molecular,

fora da mitocôndria. Esse processo é o mais velozpara a reposição da energia gasta. Surge entãooutro problema: como obter glicose de modo tão rá-pido, se o músculo não pode captá-la livrementedo sangue? Essa captação só ocorre logo após asrefeições, quando estamos com excesso de açúcarno sangue, ou durante exercícios moderados delonga duração. Para contornar essa dificuldade, ascélulas musculares têm um estoque próprio de gli-cose, na forma de glicogênio.

Figura 4. Três tipos de combustíveis são usadospelo organismo para gerar energia. A glicose,armazenada como glicogênio, permite a regeneraçãodo ATP (principal onte de energia celular) orada mitocôndria e sem necessidade de oxigênio, gerandoácido láctico (ou lactato). Os ácidos graxos são estocadoscomo triglicerídios e os aminoácidos vêm de alimentosou proteínas do corpo. Esses combustíveis geram ácidopirúvico ou acetil-coenzima-A, usados nas mitocôndriaspara regenerar ATP por dois processos interligadosem seqüência (ciclo de Krebs e osorilação oxidativa)

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Figura 5. As ontes de energia para a contração e o relaxamento dos músculos variam durante o exercício. No primeiro minuto, a principal onteé o ATP já existente e a osocreatina (linha preta). Enquanto isso, começa a quebra do glicogênio, que libera glicose (linha vermelha).Essa ase (anaeróbica, ou seja, sem oxigênio molecular) dura cerca de cinco minutos. Em seguida, na ase aeróbica, a glicose é processadanas mitocôndrias, reciclando ATP com mais efciência (linha azul). Se o exercício continua, os ácidos graxos tornam-se a principal onte energética,poupando os estoques de glicogênio (linha verde). Se a intensidade do exercício aumentar de repente, a ase anaeróbica recomeça

Essa resposta, na verdade, é parcialmente correta, turbinas’, voltam a fazer a reciclagem do ATP gasto,já que a glicólise anaeróbica, por mais rápida que por meio da respiração celular. Com isso, o ácido

seja (apenas 12 reações enzimáticas para ir do gli- láctico deixa de ser produzido e a glicose é total-cogênio até o ácido láctico, subproduto final), ainda mente oxidada, em uma série de reações que con-é muito lenta se comparada ao aumento súbito no somem O

2e têm como produtos finais gás carbôni-

gasto energético exigido, por exemplo, em compe- co (CO2) e água (H

2O). Essa é a chamada ‘fase aeró-

tições. É aí que o músculo esquelético lança mão bica’ do movimento.de seu grande trunfo: o sistema creatina/fosfocrea- Nessa fase, uma molécula de glicose pode gerartina. Nesse sistema, apenas uma reação enzimática 19 vezes mais ATP que na fase anaeróbica, o queretira um grupo fosfato da fosfocreatina (molécula representa uma grande economia do precioso estoquepresente nos músculos) e o liga à molécula de ADP, de glicogênio do músculo. Essa reserva é preciosareconstituindo o ATP, o que permite sua reutilização, porque, quando começa a se esgotar, o músculoe gerando creatina livre. entra no processo de fadiga local e pára de funcio-

A fosfocreatina atua como um pronto-socorro nar! Além disso, nunca se sabe se nos próximosenergético, em situações de urgência (figura 5). Com instantes será necessário ‘apertar o passo’ por algumesse recurso, as células musculares adaptam-se ao motivo, como pegar o ônibus que já está querendonovo ritmo e a glicólise anaeróbica passa a ocorrer em ir embora, fugir de um predador (ou assaltante!) ouvelocidade compatível com a intensidade do trabalho, ultrapassar um competidor nos últimos metros detornando-se de novo a principal forma de regenerar uma maratona.ATP, a partir de ADP. Para isso, são usados os grupos Nessas situações (luta ou fuga), há um novo saltofosfato que se acumularam nas células por causa da na exigência de energia para o trabalho muscular,quebra acelerada de moléculas de ATP. salto que dificilmente é suportado pelos sistemas

A glicólise gera ácido láctico e este é lançado na aeróbicos de reciclagem de ATP. Voltamos entãocirculação sangüínea, na forma de lactato. Se o a gastar a glicose anaerobicamente e a ‘queimar’ omovimento súbito continuar e não for muito inten- glicogênio 19 vezes mais rápido (no mínimo!). Ouso (caminhar a passos normais, por exemplo), as seja, precisa ter sobrado bastante no estoque. Nessemitocôndrias, que antes estavam ‘esquentando as caso, a concentração de lactato no sangue aumen-

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ta rapidamente, até chegar ao chamado limiar delactato. Se insistirmos nesse ritmo, ou acima dele,a concentração de lactato no sangue sobe muitoe nos sentimos ‘enjoados’. Em breve o estoque deglicogênio muscular começa a se esgotar. É quandoocorre perda de força muscular (fadiga local), que

pode ser seguida de dores, câimbras e, no extremo,da paralisação dos músculos.Em todos os tipos de atividade física o hormônio

adrenalina tem participação importante. Além dosefeitos sobre o sistema cardiorrespiratório, essehormônio ajuda a acelerar a quebra do glicogêniomuscular e hepático para liberar glicose para o

 

músculo e o cérebro, respectivamente. Parte daglicose liberada pelo fígado, porém, pode ser capta-da pelos músculos em exercícios de longa duração,reduzindo a oferta para o cérebro. A adrenalinatambém ajuda a poupar glicogênio ao estimularparalelamente a mobilização dos estoques de trigli-

cerídios no tecido adiposo.Assim, quando nos mantemos em trabalho mus-

cular aeróbico, nosso sangue começa a ser invadi-do por ácidos graxos liberados desses estoques (o

mesmo ocorre quando ficamos emjejum). Estes são usados

como fonte de ener-gia para o

Enzimas eTransferênciade energiaO autor pesquisa, desde sua graduação

em medicina, a atuação das enzimas (chamadas

de ATPases) que transferem a energia do ATP

para os processos celulares, como a contração

e relaxamento musculares. Além disso, escreve

capítulos de livros didáticos sobre bioquímica doexercício e edita livros sobre metabolismo e sobre

as origens moleculares de diversas doenças.

fígado, o coração, os músculos esqueléticos e outrosórgãos e tecidos, exceto o cérebro e as hemácias(glóbulos vermelhos). Portanto, a glicose é poupada.Aliás, o músculo esquelético, principalmente emrepouso, prefere usar ácidos graxos, em vez de gli-cose. É por isso que emagrecemos lentamente quan-

do dormimos ou ficamos em jejum. No entanto, sealguém quer de fato emagrecer, não deve ficar dor-mindo: deve seguir uma dieta com quantidadesadequadas de calorias e fazer exercícios aeróbicos.

Fibras brancase vermelhas

Em todas as fases do exercício descritas até agora,

as responsáveis pelos movimentos são fibras espe-cializadas existentes em nossos músculos, que po-dem ser divididas em duas categorias principais: asfibras de contração rápida (tipo II b) e as de contra-ção lenta (tipo I e tipo II a).

As de contração rápida são encontradas em gran-des quantidades em músculos especializados emexercício de explosão, como o músculo do peito dasgalinhas, que só movem suas asas de maneira re-pentina e por tempo limitado. Como não usammuito oxigênio molecular, esses tipos de músculotêm poucos vasos sangüíneos, poucas mitocôndrias

e pouca mioglobina (proteína muscular que estocaoxigênio, semelhante à hemoglobina do sangue).

  Já as de contração lenta ocorrem em maiorquantidade em músculos especializados em

fazer movimentos contínuos por muito tem-po, como o músculo do peito das avesmigratórias, que trabalham muitas horas

sem parar. Podemos concluir que estassão as fibras ‘vermelhas’, pois, comoprecisam de muito oxigênio para rea-lizar trabalho aeróbico, são muitovascularizadas, têm muitas mitocôn-drias e muita mioglobina.

Até os tipos de algumas das pro-teínas (miosinas) dos filamentos quese contraem nesses dois tipos defibras são diferentes. A maioria dosmúsculos humanos é composta poruma mescla dessas duas fibras. Nosexercícios de baixa a média intensida-de, são utilizadas as fibras de contração

lenta (aeróbicas), mas, à medida quea intensidade do exercício aumenta,

entram em ação também as de contraçãorápida (anaeróbicas).

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    e    x    t    r    a     í    D    O    D    e    J    i    a    N    D    i    e    l    i    N    e    t    a    l . ,   2   0   0   2 .

    (    B    )    e    x    t    r    a     í    D    O    D    e    H    a    k    i    m    i    e    t    a    l . ,

   2   0   0   7 .

    (    a    )

Os limites 

do exercício 

A busca de melhor desempenho por atletas profis-sionais – e até por amadores – leva muitas pessoasao uso de recursos que põem em risco a saúde (cha-mados de doping ), como hormônios esteróides ana-bolizantes, que aumentam a massa muscular, ou asanfetaminas, que estimulam o sistema nervoso cen-tral. Entre os recursos lícitos está o treinamento, quedesenvolve naturalmente a capacidade de nossosórgãos e sistemas de realizar exercícios específicos,levando ao condicionamento físico. Também podemser citados os recursos nutricionais, como uma ali-mentação adequada, contendo as biomoléculas ne-cessárias para reforçar a estrutura muscular ou criar

reservas energéticas adequadas.Muitos estudos têm sido feitos para compreender

os processos envolvidos no condicionamento e de-terminar os limites impostos pela fadiga. Esta ocor-re durante a atividade física e limita a performance.A fadiga parece ter um componente ‘periférico’(decorrente de fatores ligados ao músculo em mo-vimento) e outro ‘central’ (decorrente de alteraçõesdo sistema nervoso central, na motivação para rea-lizar a atividade). A principal causa de fadiga peri-férica é a exaustão dos estoques de glicogênio nosmúsculos, que impede tanto o uso de ácidos graxos

como combustível, nos exercícios de longa duração,porque a oxidação desses ácidos depende de outramolécula difícil de obter nessas condições, quantoa realização de exercícios de alta intensidade, poisestes dependem de quantidades grandes de glicosepara gerar energia rapidamente. Nos exercícios in-tensos, alterações da acidez dos músculos e/ouacúmulo de subprodutos das reações (como o fos-fato livre) parecem inibir a atividade de enzimas-chave para o uso da glicose. Já a fadiga central pa-rece estar ligada à síntese do neurotransmissor se-rotonina em certas regiões do cérebro, que levariaa menor disposição para a atividade física.

Compreender os mecanismos dos dois tipos defadiga pode ajudar a evitar ou superar o problema.É preciso ter em mente, porém, que a fadiga é ummecanismo de preservação do organismo diante deuma situação que pode causar danos severos, àsvezes irreversíveis. Portanto, deve ser respeitadacomo um sinal de alerta.

Mais recentemente, com os avanços da biologiamolecular e do controle da expressão de genes nosseres vivos, um novo tipo de doping , diferente daingestão de compostos químicos, está prestes aacontecer: o doping genético. Talvez já exista e não

A

B

Figura 6. Comparação entre camundongos normais(esquerda) e com modifcações genéticas que alteraramseus músculos (direita). Animais transgênicos com maiorexpressão de um gene (PGC-1) mostram aumento de fbrasvermelhas no dorso e nas patas traseiras (A). Já osupercamundongo, com maior expressão de uma enzima(PEPCK-C), além de ter mais mitocôndrias nas células,apresenta aumento (visto em microscópio ótico) de estoquesde gordura (regiões brancas) no músculo da pata (B)

saibamos, pois o crime surge sempre antes da lei.Hoje, por exemplo, são bem conhecidos os fatoresbiológicos que controlam a proporção dos dois tiposde fibras nos músculos. Já podem ser criados emlaboratório camundongos com alterações genéticas

que têm maior proporção de um ou de outro tipo defibra muscular, ou seja, capacitados para exercíciosde alta intensidade ou de longa duração (figura 6).

Trabalho publicado recentemente revelou quecamundongos com alterações genéticas que induzema expressão nos músculos de uma enzima típica dofígado (conhecida pela sigla PEPCK-C) tornam-se su-peratletas. Esses animais podem correr cerca de6 km a uma velocidade de 20 m por minuto, enquan-to camundongos normais ficam esgotados após200 m nessa velocidade! Eles também apresentam,em relação aos normais, capacidade aeróbica25% maior e menos da metade da concentração delactato no sangue durante o exercício. O mais espan-toso: comem 60% mais comida e têm metade do pe-so dos ‘primos’ não transgênicos! Além disso, vi-vem mais, e aos 2,5 anos (já ‘velhinhos’ para ca-mundongos) correm o dobro da distância atingidapelos animais normais de seis meses a um ano deidade (jovens adultos). A explicação parece estar noaumento da capacidade, nos animais transgênicos,de usar os ácidos graxos como combustível. Agoraque já fabricaram o supercamundongo, não devedemorar muito para vermos nas pistas de atletismoos super-homens!

SUGESTÕESPARA LEITURA

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phy_c6.h)CamerON, l.C. &

maCHaDO, m.

(ed.) Tópicos

avançados embioquímica

do exercício.ro d Jno,

ed. shp, 2004.Da POiaN, a.t.

‘inoduçãoà ção hoonn D Pon &

Cvho-av(ed.), Hormônio

e metabolismo:

integração

e correlações

clínicas.ro d Jno,ahnu, 2003.

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