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Bioinorgânica do Cobre Prof. Fernando R. Xavier UDESC 2018

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Bioinorgânica do Cobre Prof. Fernando R. Xavier

UDESC 2018

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Cobre: Características gerais

Ao contrário do ferro, o cobre não estava biodisponível na Terra primitiva. Ao

considerarmos sua atmosfera redutora, os íons cobre permaneceram precipitados na

forma de CuS, um sulfeto bastante insolúvel.

Somente após a produção de O2 em massa pelas cianobactérias, os íons cobre(2+)

começaram a ser utilizados pelos sistemas vivos.

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Enquanto enzimas que atuam em ambientes redutores trabalham em uma faixa de

potenciais eletroquímicos mais estreita, a presença de oxigênio criou a necessidade

de sistemas que atuassem em uma ampla faixa de potenciais que podem variar de

0 até 0,8 V.

Íons cobre são excelentes candidatos a assumirem este papel. Sendo assim é dito que

se os primeiros estágios da Terra primitiva foram a era bioquímica do ferro,

certamente o estágio seguinte foi a era bioquímica do cobre.

O cobre está presente em um grande número de enzimas, muitas delas envolvidas em

reações de transferência de elétrons, na ativação do dioxigênio e de outras

pequenas moléculas tais como: óxidos de nitrogênio, metano, monóxido de

carbono e ainda na dismutação do H2O2.

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Os estados de oxidação mais comuns encontrados para íons cobre em sistemas

biológicos são 1+ e 2+. Assim como a forma reduzida do ferro, íons Fe(2+), íons

Cu(1+) podem gerar radicais livres (∙OH) via processo de Fenton.

Considerando outros metais de transição divalentes ad primeira série de transição, o

cobre é o que apresenta complexos mais estáveis sob um ponto de vista

termodinâmico.

Íons Cu(2+) são considerados duros enquanto íons Cu(1+) são macios. Para este

último, fica evidenciada por sua preferência por ligantes contendo enxofre. Ambas as

espécies são cineticamente lábeis.

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Uma diversidade de metaloenzimas de cobre ocorrem em plantas e animais. Elas são

utilizadas em reações de transferência de elétrons (azurina, plastocianina, lacase),

para reações de oxigenação (tirosinase, ascorbato oxidase) e para transporte de

oxigênio (hemocianina).

Enzimas de cobre

Íons cobre são geralmente coordenados por ligantes enxofre ou nitrogenados.

Metaloenzimas de cobre podem conter íons Cu(1+) d10, Cu(2+) d9, e Cu(3+) d8.

Em termos de números de coordenação, íons Cu(1+) podem variar de 2, 3 ou 4,

enquanto íons Cu(2+) variam entre 4, 5 ou 6. Considerando o NC. 4, íons cobre

divalentes são quadrado-planos enquanto íons monovalentes são tetraédricos.

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Classificação das enzimas de cobre

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Mononuclear Binuclear Tetranuclear

Tipo Tipo 1 Tipo 2 Tipo 3 CuA CuZ

UV-Vis Forte ~600 nm e

(em algumas

proteínas)

450 nm

Fraca ~700 nm Fraca ~700 nm Forte ~480 e 530

nm

Forte ~640 nm

Ligantes

comuns

His, Cys His, Asp His His, Cys His, S2-

Geometria sítio

ativo

Tetraédrico

distorcido

Distorcido

tetragonalmente

Tetragonal Trigonal plana cluster

Exemplos Azurina SOD, GAO Catecol Oxidase,

Tirosinase

Citicromo c

oxidase

N2O redutase

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Enzimas de cobre tipo I (Azuis)

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Tem como função transportar elétrons durante o

processo de fotossíntese. Possui baixa massa molar

(~10,5 kDa) e está presente em plantas superiores.

Plastocianina (Tipo I)

Seu sítio ativo pode ser descrito como uma pirâmide

trigonal distorcida. O plano trigonal é composto por

02 histidinas e uma cisteína enquanto na posição

axial encontra-se uma metionina.

Sua coloração azul (597 nm) é originada de um

processo de TCLM Spπ → Cudx2-y

2.

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Azurina (Tipo I)

Assim como a plastocianina, tem como função

transportar elétrons durante o processo de

fotossíntese. Possui baixa massa molar (~ 16 kDa)

e está presente em bactérias.

As azurinas estão presentes em processos de

desnitrificação promovidos por bactérias.

Seu sítio ativo pode ser descrito como uma pirâmide

trigonal distorcida. O plano trigonal é composto por

02 histidinas e uma cisteína enquanto na posição

axial encontra-se uma metionina e um grupo cabonil.

Apresenta uma banda de fluorescência intensa em 308 nm.

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Enzimas de cobre na ativação e redução do O2

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Enzimas de cobre tipo II (não-azuis)

Enzimas de cobre do tipo II são muito bem caracterizadas do ponto de vista

estrutural, entretanto, para que possam ativar o O2 estas necessitam passar pela

espécie Cu(3+) (improvável) para converter O2 em superóxido.

Para contornar esta possibilidade, atualmente duas soluções são propostas na

literatura:

O primeiro caso é da Galactose oxidase (GAO), uma enzima que, na presença de

oxigênio, converte galactose no seu respectivo aldeído com concomitante formação de

H2O2.

Estudos apontam que ao invés de Cu(3+), a GAO é uma metaloenzima radicalar

onde foi detectado a presença da espécie tirosil–Cu(2+) como espécie ativa.

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Galactose oxidase: Estrutura e sítio ativo

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Galactose oxidase: Mecanismo de ação

Este processo de formação de radicais tirosil durante o mecanismo reacional também

é observado na citocromo c oxidase.

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Peptidilglicina monooxigenase (PHM)

Tem papel fundamental na biossíntese de peptídeos sinalizadores. É também

classificada como uma enzima de cobre do tipo II. Possuir dois centros de cobre

isolados, sendo um cataliticamente ativo e o outro fornecedor de elétrons.

Estudos apontam que o dioxigênio se liga de forma end-on a um centro de cobre(1+)

(forma reduzida) e consequente formação da espécie superóxido.

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Esta forma reduzida é atingida pelo

fornecimento de 1 elétron a longa distância

do outro centro de cobre presente na enzima

através do próprio substrato.

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Superóxido dismutase de Cu e Zn

A SOD-CuZn é composta por duas subunidades idênticas, cada uma contendo um cobre

e um zinco no sitio ativo.

As estruturas cristalinas das formas reduzida e oxidada da SOD-CuZn foram

determinadas por cristalografia de raios X.

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A única diferença significativa nas estruturas das formas reduzida e oxidada se

encontra no sítio de cobre, que se encontra coordenado a três histidinas na SOD-

CuIZn e pentacoordenado na SOD-CuIIZn.

Na SOD-CuIIZn, o íon CuII é deslocado em ~ 1 Å na direção do sítio de Zn. O resíduo

His63 é desprotonado, ligando-se ao CuII como ligante ponte, e uma molécula de água

é adicionada ao Cu.

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Uma particularidade estrutural importante, que é virtualmente idêntica nas formas

oxidada e reduzida da enzima, é um canal na forma de funil que dá acesso ao íon

Cu.

Esse funil tem uma largura de 24 Å na

superfície da proteína, tornando-se

progressivamente mais estreito até atingir

4 Å diretamente sobre o íon Cu.

Esse estreitamento tem como efeito limitar a ligação de ânions pequenos similares

em tamanho e carga ao superóxido ao íon CuII, tais como cianeto, azida e fluoreto,

tornando a enzima altamente específica para reação com o íon superóxido.

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O canal que conduz ao sítio ativo também contem uma arginina

conservada ~ 6 Å sobre o íon Cu, cujo papel é gerar o campo

eletrostático que atrai o superóxido até o sítio ativo.

Acredita-se que o grupo guanidina positivamente carregado do resíduo arginina

encontra-se posicionado de forma a guiar o íon superóxido para dentro do canal,

formando ligações de hidrogênio a medida que se aproxima do centro de Cu tanto na

forma reduzida como oxidada.

O canal que dá acesso ao sítio ativo também contém uma cadeia de moléculas de

águas unidas por ligações de hidrogênio que possivelmente participam do

mecanismo da reação fornecendo prótons quando superóxido é reduzido a peróxido.

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Mecanismo proposto - SOD

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Redução de O2- para produzir H2O2

A redução de O2- pela SOD-CuIZn parece ocorrer por um mecanismo de esfera externa.

Baseando-se em comparações com compostos modelo de CuI, observou-se que o

arranjo trigonal plano CuI(His)3 possui pouca afinidade para ligar-se a um quarto ligante.

A SOD-CuIZn coordena pequenos ânions, mas aparentemente não ao CuI.

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Para que o superóxido seja rapidamente reduzido pela SOD-CuIZn, é necessária a

associação de H+ ao O2- ao passo que um elétron é transferido, convertê-lo em

peróxido.

Alternativamente, HOO- aceita um próton da cadeia de moléculas de água conservadas,

formando H2O2 sem que haja formação do complexo Cu-OOH.

Acredita-se que esse próton seja doado pela His63, formando HOO- que possivelmente

se liga ao íon CuII. Uma subsequente protonação ocorre e H2O2 é liberado.

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Oxidação de O2- para produzir O2

Estudos com ânions como N3-, CN- e F- mostram que esses íons ligam-se diretamente

ao Cu(II) na SOD-CuIIZn.

Com base nesse fato, é provável que O2- também se ligue ao Cu(II) formando o

complexo CuII(O2-) antes que ocorra a transferência de elétron para formar SOD-CuIZn e

O2.

É possível que O2- no canal do sítio ativo da SOD-CuIIZn, interaja com a cadeia de

moléculas de água e Arg conservadas, e finalmente substitua a molécula de água ligada

ao Cu(II).

A transferência de elétrons então ocorre, O2 é liberado e se difunde para forma do canal,

enquanto que a ponte imidazolato é quebrada e a His63 é protonada.

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Enzimas de cobre tipo III

Enzimas de cobre do tipo III são caracterizadas por possuírem centros binucleares de

cobre espacialmente próximos e acoplados antiferromagneticamente.

Apesar da diversidade de funções que enzimas desta classe apresentam, a homologia

sequencial e estrutural de seus sítios ativos são consideravelmente preservadas.

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Hemocianina - Hc

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A cada centro estão coordenados três átomos de nitrogênio doadores imidazólicos

correspondentes a resíduos do aminoácido histidina, estando um deles envolvido numa

ligação covalente com um resíduo cisteína.

A reação da Hc reduzida com oxigênio resulta numa unidade binuclear de Cu(II)

pentacoordenados separados por uma distância de 3,5 Å e ligados entre si por uma

unidade ponte peroxo, a forma oxi-hemocianina

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É uma monooxigenase encontrada em microorganismos, plantas e animais que catalisa

a hidroxilação de monofenóis a o-difenóis e a oxidação de catecóis a o-quinonas.

Tirosinase

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Tirosinase – Tipos e homologia estrutural

• UV - Transições fracas na região de 600-700 nm

• EPR - forte acoplamento antiferromagnético – ausência sinal EPR

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Tirosinase – Sítio ativo

Comparações das propriedades químicas, EPR, UV-visível, dicroísmo circular e Raman

ressonante revelaram grande semelhança com a hemocianina, permitindo sugerir um

sítio ativo binuclear de cobre que forma um aduto estável com o íon peróxido.

Estudos de EXAFS apontam para

uma distância intermetálica de

3,6 Å para a oxi-tirosinase e 3,4 Å

para a met-tirosinase.

A forma met-tirosinase, também

chamada de estado de repouso,

corresponde a uma espécie

binuclear de cobre(II) que não

contém o íon peróxido

coordenado.

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i.

ii. Função de cresolase

iii.

O2

OH OH

OHAH2

+ H2O + A

iv.

v. Função de catecolase ou catecol oxidase

vi.

vii.

O2

OH

OH

O

O

+ H2O2 2

Tirosinase – Reações típicas

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Tirosinase – Mecanismo de ação

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Tirosinase – Mecanismo de ação: Um detalhe importante

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Tirosinase – Alguns complexos modelo

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Catecol oxidase

A catecol oxidase (CO) é outro membro proeminente do grupo das metaloenzimas de

cobre do tipo III. Catalisa a oxidação de catecóis às correspondentes o-quinonas, sem

apresentar atividade sobre tirosinas.

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Forma oxidada da CO possui dois centros de Cu(2+) em uma geometria piramidal

trigonal. O ambiente coordenação dos centros de cobre são constituídos por resíduos

histidinas e ponte OH. A distância Cu...Cu é de cerca de 2,9 Å.

Oxi Red

Na forma a reduzida, a distância intermetálica é de 4,4 Å, sem significativas mudanças

conformacionais nos grupos ligantes além da perda da ponte hidróxido.

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O espectro eletrônico forma oxidada da CO apresenta máximos na faixa de

700-800 nm atribuídos a transições d-d e uma transição na faixa de 310 e 330 nm

atribuída a uma TCLM provavelmente do -hidroxo para os centros de Cu(2+).

Ao coordenar o íon peróxido surgem máximos atribuídos a transições de transferência

de carga do íon peróxido para Cu(II) em 343 nm ( 6500 M-1cm-1) e 580 nm ( 450

M-1 cm-1).

Além disso, os centros binucleares de cobre na catecol oxidase são caracterizados

pelo forte acoplamento antiferromagnético e ausência no espectro de EPR.

Catecol oxidase: Propriedades espectroscópicas

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Mecanismo de ação proposto por Krebs et. al.

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Mecanismo de ação proposto por Siegbahn et. al.

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Catecol oxidase – Alguns complexos modelo

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