berbara - pintores de flandres.pdf

Upload: anonymous-0bgszfr

Post on 01-Mar-2018

222 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    1/21

    RHAA 8 17

    Propria Belgarum laus:

    Domenicus Lampsonius e as

    Pictorum aliquot celebrium germaniae inferioris effigies*(in english, p. 110)

    MARIA BERBARA

    Mestre em Histria da Arte pela UNICAMPDoutora em histria da arte pela Universidade de Hamburgo (Alemanha)

    Ps-doutorado pela FAU/USP e Universidade de Leiden (Holanda)

    Professora de histria da arte da UERJ

    RESUMO Este artigo prope uma anlise detalhada das Pictorum aliquot celebrium Germaniaeinferioris Effigies(Anturpia: Quatuor Ventorum, 1572), livro que contm 23 gravuras represen-tando retratos de pintores nrdicos dos sculos XV e XVI acompanhadas por versos latinoscompostos pelo humanista flamengo Domenicus Lampsonius. Enfatiza-se o confronto entrea arquitetura lampsoniana e os esquemas propostos por Vasari, de um lado, e de outro oesforo de construo, por parte do flamengo, de uma histria da arte autctone, capazde ressaltar as linguagens nacionais do retrato e da paisagem, propor linhagens artsticas

    autnomas e criar uma memria transalpina auto-referente. oferecida uma traduo crticaindita dos poemas de Lampsonius, realizada a partir do original latino.

    PALAVRAS-CHAVE Lampsonius, Vasari, Pases Baixos, Itlia, Renascimento.

    ABSTRACT This paper focuses on a detailed analysis of the Pictorum aliquot celebrium germaniaeinferioris effigies(Antwerp: Quatuor Ventorum, 1572). The book contains 23 engravings re-presenting portraits of Nordic 15th and 16th painters, each accompanied by Latin verses

    composed by the Flemish humanist Domenicus Lampsonius. The emphasis of the paper liesboth on the confrontation between the Lampsonian architecture and the schemes proposedby Vasari, and on the Flemish humanists effort to build an autochthonous history of art(Lampsonius stresses the national idioms of portrait and landscape, proposes autonomousartistic lineages and searches to create a self-referent transalpine memory). The paper offers,still, a critical translation (from the original Latin to Portuguese) of Lampsonius poems..

    KEYWORDS Lampsonius, Vasari, Low Countries, Italy, Renaissance.

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    2/21

    Maria Berbara

    18 RHAA 8

    De acordo com uma leitura contempornea, asPictorum aliquot celebrium germaniae inferioris effigies1estabe-leceram o primeiro cnone histrico-artstico nrdico.2O livro, publicado em 1572, em Anturpia, pela vivado editor flamengo Hieronymus Cock, contm 23 gra-

    vuras representando retratos de pintores flamengos eholandeses dos sculos XV e XVI acompanhadas porversos latinos louvando-lhes as qualidades pessoaise/ou artsticas; o autor dos poemas o humanista,colecionista, diplomata, pintor e poeta DomenicusLampsonius (Bruges, 1532 Lige, 1599), a quemVasari menciona como uomo di bellissime lettere e moltogiudizio in tutte le cose.3

    Lampsonius estuda na Faculdade de Artesde Louvain e, em 1554, parte para a Inglaterra naqualidade de secretrio particular de Reginald Pole,

    que naquele momento retornava Inglaterra, con-vocado por Mary I Tudor, aps um exlio italianode 22 anos. Em 1558, aps a morte do cardeal, re-gressa a seu pas, entrando imediatamente a serviodo ento recm-nomeado bispo de Lige, Robert deBerghes (e posteriormente de seus sucessores, Grardde Groesbeeck e Ernst de Baviera). Durante esse pe-rodo, o humanista estabelece intensas relaes comdestacados intelectuais do pas e da Europa entreos quais o portugus Pedro Ximenes, Justus Lipsiuse Abraham Ortelius; paralelamente, freqenta a aca-

    demia recentemente formada por Lambert Lombardaps seu retorno da Itlia, onde entra em contato comdiversos dos art istas figurantes nasEffigies. Em 1569,desposa Beelken Schelen, de quem teria dois filhos,Marie e Grard.4

    A biografia e os textos de Lampsonius irradiama claridade meriodional que se associa freqentementeao humanismo; embora tenha vivido durante um pe-rodo tenso, instvel e crescentemente intolerante doponto de vista poltico e religioso, o intelectual fla-

    mengo dominava, com elegncia e firmeza, os regis-tros prprios do homo eruditusrenascentista: filologia eretrica, teologia e lnguas clssicas, diplomacia, lite-ratura, filosofia, crtica de arte e msica todos eramcampos que Lampsonius, firmemente amparado nasolidez da prpria inteligncia, percorria com segu-rana, independncia e vvida curiosidade.

    Seus escritos incluem, alm naturalmente dasEffigies, uma Lamberti Lombardi vita(1565), diversos po-

    emas em sua maioria dedicados a artistas5 e umvasto e erudito epistolrio, incluindo cartas a Tiziano,Clovio e Vasari; este ltimo escreve-lhe, por sua vez,requisitando informaes sobre pintores flamengos,as quais serviriam de fonte para o captulo da edio

    giuntina das Vite intitulado a posteriori De diversiartefici fiamminghi.6

    A arquitetura das Effigies remonta tradioclssica dos modelos ilustres,7 retomada durante oRenascimento e solidamente vinculada retratsticae histria por Giovio;8por outro lado, a coleode imagens de homens clebres (cujo denominadorcomum, geralmente, uma mesma profisso ou of-cio) experimenta uma enorme fortuna em meados doQuinhentos, tanto ao norte quanto ao sul dos Alpes.Embora o gnero potico encomistico das artes e dos

    artistas tambm de derivao clssica tenha flores-cido notavelmente j no Quatrocentos, Lampsonius o primeiro a criar, no norte da Europa, uma coleopotica ilustrada de pintores famosos nos moldes datradio dos uomini illustri, elevando-os, portanto, mesma categoria intelectual de prelados, juristas, te-logos ou filsofos.

    Assim como Van Mander, Lampsonius apro-xima-se a Vasari ao construir uma histria da artenacional intimamente vinculada genealogia e de-terminada por uma progresso histrica; ao mesmotempo em que emula os esquemas histricos e hist-rico-artsticos vasarianos, porm, o humanista buscarevalorizar a tradio artstica flamenga exaltando aslinguagens nacionais do retrato e da paisagem e pro-pondo linhagens artsticas autnomas e auto-referen-tes. Embora explicite sua intensa admirao pela arteitaliana contempornea e seus paradigmas em seusversos a Scorel, afirma que s digno de chamar-se pintor aquele que gastou mil pincis em Roma ,Lampsonius insiste na importncia da observao e

    da imitao da natureza, fundamental no processo deformao do artista; a excelncia deste, para o escritor,mora no justo equilbrio entre arse natura.9

    Quais os critrios de Lampsonius ao selecionaros artistas cantados nasEffigies? A retratstica e, prin-cipalmente, a pintura de paisagem so, como dito an-teriormente, altamente louvadas pelo humanista, queas trata como idiomas neerlandeses nativos; dos 23artistas listados, seis so paisagistas, e outros como

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    3/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 19

    Bouts mantm uma evidente Wahlverwandtschaftcoma representao de paisagens. Lampsonius privilegiaainda dilogos internos, como o de Bosch e Brueghel,que indiquem a criao de uma linhagem artsticaprpria, assim como a inveno de formas e tcnicas

    em solo flamengo por exemplo a pintura a leo,lendariamente atribuda a Van Eyck. Um nmero me-nor de pintores entre os quais Pieter Cock, Scorele Frans Floris pertence ao grupo que a crtica dosculo XX chamaria, pejorativamente, romanista, eque mantm evidentemente uma forte conexo coma produo italiana contempornea. Embora algunsartistas tenham certamente sido includos no livropor razes pessoais ou circunstanciais, mesmo elesparecem de alguma maneira vincular-se s correntespropostas por Lampsonius; das paisagens pintadas

    por seu caro mestre Gassel, por exemplo, o huma-nista proclama terem sido as obras que despertaramseu amor pela arte. A organizao dasEffigies, comoa das Vitevasarianas, primordialmente cronolgica,o que acentua o carter orgnico do desenvolvimentoda arte flamenga de acordo com Lampsonius; analo-gamente a Vasari, a arte contempornea aparece aohumanista como o apogeu de uma trajetria evolutivacuja origem, nos Pases Baixos, Van Eyck.

    A antologia lampsoniana, determinante a ums tempo de uma identidade e um cnone, exerceu

    profunda influncia tanto nos Pases Baixos quantona Itlia;10Karel van Mander que traduz a maio-ria dos versos das Effigiesna segunda edio de seuSchilderboeck assimila no apenas a escolha lampso-niana, mas tambm certos princpios gerais do livro,principalmente sua diviso entre correntes nativas eitalianizantes e sua alta apreciao da retratstica e dapintura de paisagem.11

    A maioria das pranchas inseridas nasEffigiesfoigravada por Cornelis Cort (Hoorn, ca. 1533 Roma,1578) e Jan Wierix (Anturpia, 1549 Bruxelas, ca.

    1618); algumas so realizadas a partir de desenhos deDrer ou de auto-retratos dos artistas. possvel queo prprio Cock tenha produzido as gravuras restantes.A segunda edio dasEffigies tambm publicada em1572, e as duas seguintes, com os tipos de TheodoorGalle (filho de Philip), aparecem ao longo dos oitoanos subseqentes. Em 1694, publica-se a primeiraverso inglesa da obra. H somente duas traduesmodernas completas das Effigies: para o francs, na

    edio crtica de Puraye, e, mais recentemente, para oitaliano, por Maria Teresa Sciolla.12Miedema traduzalguns dos poemas nas notas de sua edio das Vidasde Van Mander posteriormente vertidas, por suavez, para o ingls.13

    A presente traduo foi realizada a partir de umexemplar da segunda edio da obra (Antuerpiae: subintersignio Quatuor Ventorum), atualmente conservado nabiblioteca da Universidade de Leiden, Holanda [Fig. 1].Neste exemplar, tanto a dedicatria quanto o vig-simo terceiro retrato com seu correspondente poema foram suprimidos, eliminando, portanto, quaisquermenes a Cock. Por razes de espao, omite-se aquia dedicatria a Hieronymus, mas inclui-se o poemafinal, parte integrante da editio princeps.14

    ***

    1. HUBERT VAN EYCK (? m. Gantes (?), 1426)

    [Fig. 2]

    Hubert van Eyck, irmo de Johannes; pintor

    Hubert, teu irmo e tu recebestes recentemente me-recidos louvores de nossa Talia(1). Caso no bastem,acrescenta este: graas a ti, teu irmo e discpulosuperou-te. isso que nos mostra esta obra de Gan-tes(2)que a tal ponto enamorou o rei Felipe, que eleencomendou uma reproduo a Coxcie(3), a fim deenvi-la Espanha, sua ptria.

    (1)Referncia ode escrita em honra dos irmos van Eyck porLucas de Heere em sua obra Den Hof en Boomgaert der Posien.15O poema seria transcrito por Van Mander no Schilderboeck.

    (2) O Polptico de Gantes, tambm conhecido como Cordeiro Mstico,at hoje conservado na Catedral de Gantes.

    (3) Trata-se do pintor flamengo Michiel Coxcie (ou Coxie; Malines(?), 1499-1592). O poema de Lucas de Heere finaliza-se comuma meno a esta cpia.

    No h consenso sobre a possvel relao deparentesco entre Hubert e Jan, e, no limite, mesmosobre a existncia do primeiro. Esta ltima questosurgiu na primeira metade do sculo XIX, por ocasioda descoberta da famosa quatrina em verso leonino(isto , hexmetros dtilos com rimas internas) pintadasobre a moldura dos painis inferiores externos (ladoesquerdo) do polptico de Gantes:

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    4/21

    Maria Berbara

    20 RHAA 8

    [Pictor?] Hubertus Eyck. Maior quo nemo repertus

    incepit. pondus. Q Johannes arte secundus

    [Frater perf] ecit. Judoci Vijd prece fretus

    VersV SeXta MaI Vos CoLLocat aCta tUerI [1432]

    Aproximadamente (vrias letras apagaram-se),a quatrina pode ser traduzida da seguinte forma: Opintor Hubert van Eyck, considerado superior a todos,iniciou [este retbulo]. Jan, segundo em arte, finali-zou-o sob encomenda de Josse Vydt. Em 6 de maioele (Vydt) vos roga atravs deste verso cuidar o quepassou a existir (a data oferecida pelo cronogramado ltimo verso). Em algum momento e por razesdesconhecidas, pintou-se sobre a quatrina, a qual veioa ser descoberta por ocasio de uma limpeza realizadapelo Kaiser Friedrich Museum (Berlim) em 1822/23.

    Sua autenticidade, porm, foi posteriormente contes-tada, sobretudo depois de um exame microqumico(1951) ter confirmado que a inscrio foi realizada emuma folha de prata que substitura a folha de ouroencontrada nas demais partes da moldura do retbulo.Particularmente controversas so as palavras iniciaisdo terceiro verso, apagadas e conhecidas somente apartir de transcries realizadas antes da limpeza de1823. Um segundo ponto polmico o hiperblicoelogio a Hubert, considerado inverossmil por muitos.Em 1933, E. Renders chegou a afirmar que a quatrina

    inteiramente falsa, e que Hubert jamais existiu.16Nosregistros da cidade de Gantes e de algumas igrejas,porm, o nome de um pintor chamado Hubert (a grafiado nome varia: Luberecht, Ubrechts, Hubrechte, Lu-brecht) van Eyck consta diversas vezes, sendo inclusiveindicada a data de sua morte (1426) em um epitfio que,embora destrudo em 1578, chegou a ser copiado duasvezes. Posteriormente, a autenticidade da inscrio e,portanto, da existncia de Hubert foi reafirmada porhistoriadores da arte como Elisabeth Dhanens,17 emum volume exclusivamente dedicado ao polptico. A

    estudiosa argumenta que o estilo caligrfico da inscri-o o do perodo da realizao da obra; que o ltimoverso dirigido aos clrigos da parquia de So Joo,os quais deveriam assegurar-se da apropriada manu-teno da pintura; e que as palavras arte secundusasso-ciadas a Jan referem-se ao fato de ele ser mais jovem, eno inferior, artisticamente, a Hubert. De acordo comBrand Philip,18a palavra inicial da quatrina deveria ler-sefictor, nopictor, e Hubert seria, portanto, o escultor

    que teria criado o tabernculo posteriormente (emsegundo lugar) pintado por Jan. Panofsky, em seuclebre volume sobre a pintura primitiva flamenga,19buscou, por sua vez, associar o texto da quatrina ao queconsiderava uma marcada heterogeneidade estilstica e

    iconogrfica do polptico: de acordo com o alemo, Janhavia herdado diversos painis iniciados por Hubertpara distintos propsitos, utilizando-os para o novopolptico encomendado por Jodocus Vijd.

    O debate em torno existncia de Hubert, suasuposta relao de parentesco com Jan, e atribuio dedeterminadas obras a ambos sobretudo o polptico deGantes permaneceria vvido ao longo do sculo XX;cf. o abrangente livro de V. Herzner,20que considera aquatrina uma falsificao quinhentista e nega inteira-mente a participao de Hubert no retbulo belga.

    Particularmente notvel, nestes versos iniciaisdasEffigies, a centralidade do toposda superaoarts-tica, um dos mais amplamente utilizados na arquiteturavasariana. Jan Van Eyck, cujo papel inaugural, no livro, anlogo ao de Giotto nas Vite, tem, como o italiano,um predecessor ao qual supera: seu irmo, paralelizadopor sua vez a Cimabue. Ao longo das Vite, Vasari cons-truiria outros clebres binmios fundacionais, estru-turas histricas nas quais um genial artista emerge apartir do confronto com seu mestre e catapulta a umanova manieraa arte de toda a sua gerao: os Bellini,

    Verrocchio/Leonardo e, naturalmente, Ghirlandaio/Michelangelo,21 entre outros exemplos menos cle-bres. A figura de Hubert, por outro lado, possibilita aLampsonius mencionar em cheio o retbulo de Gantes,obra que, no imaginrio coetneo, constitua a pedrafundamental da arte flamenga moderna.

    2. JAN VAN EYCK

    Jan Van Eyck, pintor

    Eu, que pela primeira vez mostrei, com meu irmoHubert, como as brilhantes cores misturam-se aoleo de linho, maravilhei a rica e florescente Brugescom a descoberta que ignorara, talvez, o prprioApeles(1), e que nossa bravura no tardou em di-fundir pelo mundo inteiro.

    (1) Van Eyck diretamente comparado a Apeles em uma quatrinalatina composta no final do Quinhentos ou comeo do Seis-centos por Maximilian de Vriendt que exorta, precisamente, o

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    5/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 21

    Cordeiro Msticode Gantes.22Em uma carta de 1589 ao huma-nista francs Ludovicus Demontiosus (Louis de Montjosieu; cf.Puraye, Op. cit., p. 101 e seg.), Lampsonius discorre longamentesobre a clebre anedota de origem pliniana que opunha Apelesa Protgenes (Hist. Nat., XXXV, 81-82), muito difundida nossculos XVI e XVII; a comparao entre o ateniense e VanEyck, sob esta luz, enfatiza especificamente a finura e delicadezada linha eyckiana. A importncia do controle linear como pr-

    requisito indispensvel para a realizao de grandes obras de arteaparece em uma anedota de Camerarius que parafraseia direta-mente a passagem de Plnio, no prefcio a sua traduo latina dosVier Bchende Drer;23na supracitada missiva a Demontiosus,Lampsonius paraleliza diretamente ambas as anedotas.

    Diversos escritores quatrocentistas, como Fila-rete, destacam a habilidade de Van Eyck no empregoda pintura a leo principalmente o leo de linho, cujaprincipal diferena em relao aos demais a secagemrpida; nenhum deles, porm, refere-se ao flamengocomo o inventor da tcnica. A lenda segundo a qualVan Eyck descobriu a tcnica da pintura a leo temsua origem, com toda a probabilidade, nas Vite deVasari (Antonello da Messina, Domenico Veneziano/Andrea del Castagno, e, na edio de 1568, De diversiartifici fiamminghi), segundo as quais o nuovo segretodeVan Eyck teria sido levado Itlia por Antonello daMessina (cf. a estrofe do supracitado poema de Lucasde Heere:Een Schilder uut Italien [i.e., Vasari]selfs confesseert/ Dat Heycus daer dOlverwe broght em heeft vonden: / Em van

    dry sine waercken hi mentioneert / Die te Napels, Florencen em

    Turbino (sic)stonden). Guicciardini, em 1567, chegaria asituar a inveno em uma data precisa: 1410.

    Ao longo do prprio Quatrocentos, diversasfontes italianas associam o que lhes pareciam as qua-lidades mais notveis da arte flamenga isto , a ri-queza e brilho do colorido e sua extraordinria capa-cidade de retrarre del naturale tcnica da pintura aleo.24Ao destacar justamente a suposta inveno datcnica em seus versos sobre Jan, Lampsonius plantaorgulhosamente o mestre flamengo na origem do quese considerava uma revoluo artstica de dimenses

    pan-europias; paralelamente, o humanista enfatiza aimportncia da contribuio individual dos grandesartistas, aos quais associam-se descobertas pontuaisde carter inaugural. Por outro lado, Lampsonius pro-pe igualmente um claro contraponto arte italianaem geral, e florentina em particular, tradicionalmenteassociada pintura a fresco. Em um clebre episdioda Vita de Sebastiano del Piombo, um vociferanteMichelangelo teria afirmado que il colorire a olio era

    arte da donna e da persone agiate et infingarde; VanMander recordaria o episdio no captulo 12 (11-13)do Grondt der edel vry schilder-const, onde, sem contradizerdiretamente Buonarroti, argumenta que a pintura afresco no apropriada ao clima mido, ventoso e

    frio da Holanda, onde ademais no se dispe do tipode cal apropriada para a execuo do fresco.25

    A pintura a leo, mais que puramente umatcnica, surge para Lampsonius como um signo deidentidade, conferindo aos albores da pintura flamengauma dignidade prpria.

    A idia de que Van Eyck tenha inventado atcnica da pintura a leo persiste at os dias de hoje,comparecendo invariavelmente em guias tursticos deBruges e anedotas de manual contadas sobre o pintor.

    O retrato de Van Eyck uma citao direta

    de um dos juzes ntegros, no polptico de Gantes(o painel, roubado em 1934, atualmente conhecidoatravs de uma cpia do sculo XX).

    3. HIERONYMUS BOSCH (ca. 1450-1516)

    [Fig. 3]

    Hieronymus Bosch, pintor

    Por que, Hieronymus Bosch, esses teus olhos at-nitos?(1)Por que essa palidez no rosto? como setivesses visto esvoaar diante de ti os Lemures, es-pectros do rebo.(2)Para ti abriram-se, sem dvida,os recessos do avaro Dis(3)e sua morada no Trtaro,visto ter tua mo podido to bem pintar todos ossegredos do Averno.(4)

    (1) Como assinalou Rogier van Son (Op. cit, p. 189), Lomazzorevela claramente seu conhecimento de Lampsonius em seuescrito sobre Bosch: lAttonito, Girolamo Boschi fiamengo,che nel rappresentare strane apparenze e spaventevoli et orridisogni fu singolare e veramente divino.

    (2) rebo a escurido do mundo subterrneo. De acordo com aTeogoniade Hesodo, rebo e sua irm Nyx (Noite) nascem deCaos. Freqentemente, seu nome utilizado como sinnimo deHades, ou mundo subterrneo, como o faz aqui Lampsonius. Oslemures so os espectros dos mortos, que habitam o Hades.

    (3) Dis, um dos nomes de Hades, a contrao de dives, rico.(4) De acordo com a Teogonia, o Trtaro est to abaixo da terra

    quanto o cu est acima; era a mais horrvel das regies subter-rneas. Averno um lago prximo a Npoles, que, segundo alenda antiga, era uma das entradas para o Hades por extenso,o nome igualmente empregado como sinnimo de Hades.Possivelmente, Lampsonius tinha em mente a clebre passagemda Eneidaem que a sibila adverte Enias (VI. 126-9): Satesanguine diuom, Tros Anchisiade, facilis descensus Auerno:noctes atque dies patet atri ianua Ditis; sed reuocare gradumsuperasque euadere ad auras, hoc opus, hic labor est.

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    6/21

    Maria Berbara

    22 RHAA 8

    Em claro contraste com o humanismo se-reno que irradia das efgies dos irmos Van Eyck,o semblante de Bosch aparece tenso e crispado, emconsonncia com os versos de Lampsonius. Clebrepor suas desconcertantes telas de temtica fantstica,

    predominantemente diablica e de iconografia obs-cura, Bosch aparece de fato como um contrapontoarcaizante s novidades luminosas dos irmos VanEyck; sua cidade natal, Hertogenbosch, distante dosgrandes centros cosmopolitas como Bruges, Gantes eLouvain, seguramente contribuiu para a formao daarte altamente idiossincrtica que de imediato iden-tifica e caracteriza Bosch, o qual estudiosos proemi-nentes do sculo XX consideraram uma ilha soli-tria e inacessvel erguendo-se inabalvel em meio corrente quatrocentesca flamenga (Panofsky, Op.

    cit., p. 357, mas tambm Friedlnder, entre outros).Se, por um lado, as telas de Bosch relacionam-seevidentemente tradio dos bestirios, iluminurasgrotescas e grgulas esculpidas em igrejas gticas, poroutro subvertem as prprias regras dessas formas derepresentao ao conferir-lhes um absoluto protago-nismo; em suas obras criaturas hbridas, arquiteturasfantsticas, flores e animais demonacos invadem oinferno, o paraso, episdios bblicos, cenas da Paixoe da vida de santos.

    Embora partcipe de uma corrente distinta dos irmos Van Eyck, Bosch cujo papel fundadortorna-se totalmente claro no poema que Lampsoniusdedica a Brueghel cria igualmente uma arte de per-sonalidade marcadamente flamenga. Paralelamente, opintor obtm um impactante xito internacional oque interessa particularmente ao orgulho patritico deLampsonius j na primeira metade do Quinhentos,quando comea a formar-se a clebre coleo que Fe-lipe II instalaria no Escorial em 1574; neste perodo,ainda, pinturas de Bosch so adquiridas por Isabela, aCatlica; Margarida da ustria; Felipe de Borgonha e,na Itlia, Domenico e Marino Grimani, entre outrosclebres colecionistas. No Seiscentos exceto na Espa-nha a fama de Bosch decai consideravelmente, vindoo pintor a receber renovada ateno no sculo XX.

    A efgie de Bosch guarda notveis semelhanascom seu retrato publicado no Cdice de Arras (fl.275), remontando ambos, seguramente, ao mesmooriginal.

    4. ROGIER VAN DER WEYDEN

    (Tournai, ca. 1399, Bruxelas, 1464)

    Roger, pintor de Bruxelas

    Que no te baste o elogio de haver pintado muitas

    e belas obras, Roger, prprias do teu tempo; osteus so trabalhos dignos de estar sempre diante dosolhos de todos os pintores se so sbios. Isto nosmostram as pinturas que impedem ao tribunal deBruxelas desviar-se do caminho de Tmis.(1)Eterna a tua ltima vontade de legar o produto de tuaarte, oferecendo remdio ao pobre e ao faminto.Aquelas [pinturas] deixaste na terra, e perecerobrevemente; porm isto [ou seja, a atitude que to-mou] uma lembrana que brilhar eternamenteno firmamento.(2)

    (1) A obra qual faz meno Lampsonius foi, infelizmente, destru-da por ocasio do bombardeamento de Bruxelas pelo marechalde Villeroy, durante o assdio de Lus XIV, em 1695: trata-se dequatro painis representando exemplos da Justia extrados dahistria de Trajano e de Herkenbald (ou Archambault, um doscondes de Bourbon; as histrias provm do Dialogus Miraculorumde Caesarius van Heisterbach), em um dos quais h um auto-retrato de Van der Weyden (a obra conhecida atravs de umacpia, em tapearia, atualmente conservada no Museu Histricode Berna). Os painis figuram, paralelizando-os, episdios da

    vida do imperador e do duque, em que ambos demonstram sergovernantes bondosos e justos.26A deusa Tmis associada

    Justia.(2) Esta ltima passagem foi traduzida de forma equivocada por

    Sciolla & Hymans, os quais provavelmente baseiam-se na tra-duo de Van Mander, que a modificou ligeiramente em sua

    verso: Ghy liet u goeders doch h ier daerde voor haer deel /Die blijven metter tijd verdorven al gheheel / Maer die schoonstucken claer, waer by wy u ghedencken / Die sullen onghes-cheynt in Hemel eeuwigh blincken (207 r20). Como observouMiedema, o que Lampsonius busca enfatizar que as pinturas,objetos materiais, so perecveis, ao passo que a fama do artista

    particu larmente se cantada por um poeta imortal. 27

    Com Van der Weyden, Lampsonius retoma alinhagem de Van Eyck, cuja morte, em 1441, eleva Ro-gier posio de principal pintor em Flandres. Muitoembora a historiografia da arte, ao menos desde a pri-

    meira metade do sculo XX, tenda a perceber maisdiferenas que semelhanas entre Van Eyck e Van derWeyden,28diversas fontes quinhentistas e seiscentistasenxergavam-nos freqentemente em uma soluo decontinuidade. Assim como Van Eyck, no entanto, Vander Weyden conheceu, em vida, fama internacional, eambos so seguramente os primeiros artistas nrdicosa tornar-se celebridades comparveis a seus counterpartsitalianos. No por acaso, enfim, Lampsonius menciona

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    7/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 23

    precisamente os painis da Justia, os quais glorificam,em chave patritica, o bom governo nrdico; assimcomo diversos de seus colegas latinos, Van der Weydenparece reclamar aqui igualmente o direito de heredi-tariedade flamengo virtuscvica romana.

    A efgie de Van der Weyden, similarmente deBosch, parece ter um prottipo comum ao do desenhodo Cdice de Arras representando o pintor.

    5. DIERIC (ou Dirk) BOUTS

    (Haarlem, ca. 1415 1475)

    Theodoro de Haarlem, pintor

    Tu tambm, Theodoro, mereces estar aqui; tam-bm tua mo a Blgica(1)sempre elevar aos astroscom merecidas laudes. A prpria natureza, me dascoisas que reproduzes, teme encontrar em ti quem,em arte, a iguale.

    (1) Nesta passagem e em outras, Lampsonius utiliza os termos belgae Belgicano latim original, os quais aqui se traduz literalmenteapesar de que, evidentemente, a Blgica atual nada tenha a vercom a regio referida pelo humanista para a qual no h,de resto, nenhuma traduo absolutamente exata: como bemobservou Claire Billen em seu artigo introdutrio no catlogoFiamminghi a Roma, Flandres uma regio que no existe, emesmo no Quinhentos escritores como Guicciardini tinhamdificuldade em dar um nome preciso ao territrio que hoje emdia compreende Holanda, Blgica, Luxemburgo e par te do norteda Frana.29Apesar de sua heterogeneidade poltica, lingstica

    e cultural, porm, durante o Renascimento esse territrio eraquase sempre referido como um pas, e seu nome Flandres,Blgica atribudo por metonmia.

    Bouts tem sido freqentemente consideradopela crtica como uma espcie de elo entre a primeiragerao de Van Eyck e Van der Weyden e aquela dosegundo Quatrocentos. Com ele Lampsonius d, por-tanto, perfeita continuidade sua histria, introduzindoao mesmo tempo a questo fundamental da pinturade paisagem: embora no tenha sido um paisagista no

    senso estrito, Bouts era freqentemente considerado,desde o Quinhentos, como um precursor do gneroque constituiria uma das mais salientes marcas da arteflamenga (Molanus, por exemplo, refere-se a ele comoinventor in describendo rure). Em muitas de suas obras, efe-tivamente, uma paisagem delicada e complexa, de umcolorismo refinado, parece atrair mais imediatamente aateno do observador do que as figuras em primeiroplano. Lampsonius enfatiza justamente a qualidade

    mimtica das telas de Bouts, evocando o antigo toposda rivalidade entre o pintor e a natureza.

    6. BERNARD VAN ORLEY

    (Bruxelas, ca. 1488-1541)

    Bernardo de Bruxelas, pintor

    Que Bruxelas, cidade real, habilssima em pintartapearias,(1)honre-se em adotar Bernardo, no sedeve, creio eu, sua arte de pintar ainda que aesta muito se deva mas ao fato de ele te ser caro, Margarida, regente da Blgica,(2) a quem nadaagrada mais que a arte de Apeles.(3)Tu lhe davasmanbrios de ouro para seus pincis, e ele muitasvezes recebia felipes de ouro, uma moeda recente-mente cunhada.(4)

    (1) No texto latino original,Attalicas vestes, em aluso proverbialsofisticao da dinastia real de Prgamo, um dos mais famososcentros da civilizao helenstica.

    (2) Margarida da ustria (1480-1530), duquesa de Sabia, regente daHolanda entre 1507 e 1518, poderia ser considerada uma espciede Isabella dEste nrdica.30 Durante seu reinado, Margaridacongregou em sua corte em Hof van Kamerrijk msicos, lite-ratos e artistas; ali mant inha sua extraordinria coleo de obrasde arte, a qual inclua obras-primas como oMatrimnio Arnolfini,de Van Eyck, e as Trs Riches Heuresdo duque de Berry (irmosLimbourg). Orley foi pintor oficial da corte de Margarida entre1518 e 1530, e ao apontar justamente este vnculo Lampsoniusenfatiza a figura, comum em solo italiano, do pintor de corte aservio de monarca esclarecido.

    (3)

    Isto , a pintura.(4) Felipes eram florins de ouro; o nome, naturalmente, faz refe-

    rncia a Felipe, o Belo.

    Orley o primeiro artista plenamente quinhen-tista tratado por Lampsonius, e tambm o primeirorepresentante do assim chamado romanismo, isto , umavertente da pintura flamenga e tambm espanhola claramente orientada em direo arte italiana eclssica. O termo, sobretudo de meados do Oitocentosao terceiro quartel do Novecentos, poderia adquirir

    uma clara conotao pejorativa quando empregado pordeterminados historiadores nrdicos (p. ex. Van denBranden), os quais consideravam os romanistasquasecomo traidores da tradio autenticamente flamenga;especialmente a partir dos anos 1980 e 90, ele vemsendo cada vez menos utilizado pela crtica em virtudetanto da revalorizao das realizaes artsticas dosromanistasquanto de uma maior apreciao da diver-sidade de sua resposta individual arte italiana.31

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    8/21

    Maria Berbara

    24 RHAA 8

    Bernard foi tanto pintor quanto desenhista detapearias, cuja indstria, como assinala Lampsonius,florescia em Bruxelas, aonde chegavam diversas en-comendas italianas; ao priorizar o disegno em detri-mento da execuo material da obra de arte, Orley

    equiparava-se aos grandes mestres italianos sobre-tudo Rafael, cujos cartes para as tapearias papais oflamengo seguramente pudera estudar em Bruxelas32 assumindo plenamente a dignidade intelectual re-nascentista do artista.

    7. JEAN GOSSAERT (ou Gossart), chamado

    MABUSE (Wijk-bij-Deurstede/Maubeuge,

    ca. 1472 Middelbourg, 1536)

    Johannes Mabuse, pintor

    Tambm de ti, Mabuse, meus versos diro queensinaste teu sculo a pintar. Que outro, de fato,teria logrado com maior suavidade aplicar ricos pig-mentos em telas dignas de Apeles? No mais, deixa-te superar por teus sucessores; uma habilidade nomanejo do pincel similar tua, porm, ser rara.

    Friedlnder rene Mabuse e Orley em sua mo-numentalAltniederlndische Malereicom o objetivo, se-gundo nos informa diretamente o grande estudioso,de confront-los e diferenci-los. Mabuse e Orleyforam, efetivamente, diversas vezes confundidosao longo dos sculos, e em vida rivalizaram. Assimcomo Orley, Mabuse tambm pode ser consideradoum romanista; contrariamente quele, porm, Gossa-ert, tendo viajado a Roma em 1508/9, foi talvez oprimeiro pintor flamengo a estudar a estaturia cls-sica e as realizaes dos grandes mestres italianoscontemporneos in loco(da peregrinao que Van derWeyden teria realizado a Roma no ano santo de 1450no resta nenhum vestgio).

    Lampsonius, contudo, insere pela primeira vezaqui um discreto elemento de juzo negativo: emborahbil no manejo do pincel, afirma, Mabuse inferior,em todos os demais aspectos, a seus sucessores. Anosdepois, Van Mander reprovaria a Mabuse como aVan Scorel, Van Heemskerck e Frans Floris pelaimitao passiva dos modelos italianos; tratando es-pecificamente de Mabuse, o escritor, de modo seme-lhante a Lampsonius, elogia a mo do pintor, mas

    no seu gheest, isto , sua capacidade de conceber eengendrar imagens a mesma que deveria apropria-damente mediar sua assimilao da arte italiana.33Sintomaticamente, Lampsonius no aponta o pionei-rismo de Mabuse relativamente ao grand tour italiano

    e nem faz quaisquer referncias sua relao com aItlia, sublinhando, em vez disso, qualidades que sepoderiam considerar caracteristicamente flamengas ahabilidade ao manejar o pincel, o brilho das cores, ameticulosidade em sua arte.

    8. JOACHIM PATINIR (ou Patinier, ou

    Patenier; Dinant ou Bouvignes, ca. 1480

    Anturpia, antes de 1524)

    Joachim de Dinant, pintor

    Se entre todas estas imagens, Joachim, nenhumabrilha mais vivamente que a tua, isto no so-mente porque a gravou sobre o cobre a mo deCort,(1) que no teme rivais, mas tambm porqueDrer,(2)admirando tua mo quando pintavas cam-pos e casas, outrora desenhou com o buril, sobrepergaminho, tua imagem;(3)Cort, rivalizando comeste desenho, superou a si prprio e, portanto, atodos os outros.

    (1) Cornelis Cort, como foi dito acima, realizou vrias das gravurascontidas nasEffigies. Em suas cartas a Vasari, Tiziano e Clovio,

    Lampsonius recomenda-o para a realizao de gravuras a part irdas obras dos italianos.

    (2) Drer, por ocasio de sua viagem aos Pases Baixos em1520/1521, realizou um retrato, perdido, de Patinir. Em seudirio, o artista germnico refere-se a ele como Landschaftsmaler

    designao profissional que, como observou Fried lnder, provavelmente empregada pela primeira vez aqui.34

    (3) No original, exaravit in palimpsesto tuos vultus ahena cuspide. O meioem que realizou a imagem ambguo, pois, se o palimpsestosugere desenho (trata-se de um pergaminho de onde o escritoinicial apagado, de maneira a poder ser reutilizado), exaro um

    verbo que se emprega em conexo com tbuas de cera, onde seescrevia com o estilete ou buril.

    Lampsonius d incio, aqui, linhagem dos pai-sagistas propriamente ditos. Primeiro artista flamengoa tratar a paisagem de forma totalmente independente,Patinir considerado, ainda, o inventor da Weltlandschaft,uma representao panormica da paisagem. Lamp-sonius, curiosamente, no louva particularmente suaatividade como paisagista, mas sim o retrato que delerealizara o grande Drer, introduzindo portanto simul-taneamente o tema da retratstica, segundo dos grandes

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    9/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 25

    apangios da arte nrdica. Outro conceito fundamentalque surge nos versos a Patinir o doparagone, a com-parao, no caso, entre dois artistas contemporneos Drer e Cort que realizam obras de mesmo temapor distintos meios a gravura e o desenho.

    9. QUENTIN METSYS (ou Massys)

    (Louvain, 1466 Anturpia, 1530)

    Quentin Messius, pintor de Anturpia

    Antes, eu era operrio dos Ciclopes;(1)ao mesmotempo que eu, porm, um pintor comeou a cortejarminha bela. Ela, astutamente, disse-me preferir osilencioso pincel ao fragor dos martelos: o amorfez-me pintor. Desta histria d f o pequeno mar-telo que como a assinatura autntica dos meus

    quadros. Assim como Vnus requisitara a Vulcanoarmas para seu filho, tu, Amor, sumo poeta, o fer-reiro transformas em pintor.

    (1)No original,faber, ferreiro, ou, genericamente, operrio, arteso.De acordo com algumas vertentes mitolgicas, os ciclopes eramassistentes de Hefesto, deus vinculado fundio metlica e,portanto, aos ferreiros.

    Lampsonius dedica os versos a Metsys com baseem uma lenda relativa biografia do artista, segundoa qual ele teria sido originariamente um ferreiro que

    passara a dedicar-se pintura para afastar sua amadade um pintor qual fora destinada, por esposa, porseu pai, tambm pintor. No se sabe se o prprioLampsonius o autor da anedota, a qual Van Manderretoma mencionando, porm, uma segunda explicao segundo ele mais verossmil para a transformaode Quentin, de ferreiro, em pintor: Metsys teria sidoum homem enfermo que, incapaz de sustentar suame por meio do trabalho fisicamente rduo, passara apintar para ganhar seu sustento. Em ambas as verses,caso se possa extrair alguma moral da lenda, esta a

    da elevao social e intelectual do arteso faber Cyclo-peus e sua transformao em artista; paralelamente, aanedota evoca ainda o mito, to difundido durante oRenascimento e depois, da espontaneidade da vocaoartstica e do autodidatismo dos grandes mestres (VanMander sustentaria que Metsys jamais teve um profes-sor ou tutor; as frases iniciais da sua vida de Quentin,de resto, recordam inequivocamente a abertura da vidavasariana de Michelangelo: tanto o flamengo quanto o

    aretino insistem na predeterminao inata do artista,nele infundida durante sua gestao ou nascimento, qual no podem fazer frente quaisquer contrariedadesimpostas pelo destino).

    Ao longo das Effigies, Lampsonius freqente-

    mente associa artistas a cidades especficas (Van Eyck/ Bruges, Orley / Bruxelas, etc.), criando um tecidonacional a um s tempo denso e pormenorizado, sus-tentado pela identidade local; o elogio do artista, nestesentido, confunde-se muitas vezes com o elogio dacidade em questo. A Metsys vincula-se Anturpia,que ao longo do Quatrocentos suplantara comercial,econmica e culturalmente Bruges para tornar-se, noQuinhentos, uma espcie de capital de factodos PasesBaixos.

    10. LUCAS VAN LEYDEN(Leiden, ca. 1494-1533)

    Lucas de Leiden, pintor

    Se no s igual a Drer, Lucas, dele te aproximas,seja pintando telas, seja gravando sobre o metal ad-mirveis figuras que imprimes sobre o fino papel.Se h nisto alguma glria, aceita, com tua Leidennatal, parte no pequena de meus cantos.

    Uma vez mais, Lampsonius mescla a lode aoartista e urbe; uma vez mais cita Drer e destaca aquesto fundamental do paragone. Sobretudo at me-ados dos anos 1520, o pintor, desenhista e gravadorLucas van Leyden efetivamente buscava rivalizar como alemo; posteriormente, porm, parece voltar suaateno para as obras italianas transmitidas pelas gra-vuras de Marcantonio Raimondi.

    11. JAN VAN AMSTEL (ou Jan Hollander)

    (Amsterd (?), ca. 1500 Anturpia, ca. 1542)

    [Fig. 4]

    Jan de Holanda, pintor

    A glria prpria dos belgas bem pintar os campos;a dos italianos, homens ou deuses; por isso que sediz, com razo, que o italiano tem o crebro em suacabea, e o belga, em sua hbil mo. Jan, preferisteportanto que tua mo pintasse bem paisagens, a quetua cabea pintasse mal homens e deuses.

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    10/21

    Maria Berbara

    26 RHAA 8

    Sabe-se pouco sobre a biografia de Jan vanAmstel; Bnzit menciona-o suscintamente como umpintor flamengo nos sculos XV e XVI, e no h umanica obra que, com toda a segurana, possa ser atribu-das a ele embora alguns crticos tenham procurado

    identific-lo com o assim chamado Monogramista deBrunswick.35Os versos que Lampsonius lhe dedica,porm, esto entre os mais citados dasEffigies, sobre-tudo quando, a partir dos anos 1980 e 1990, acende-seum renovado debate sobre uma antiga questo: a con-trovrsia entre pintura manual e cerebral associadas,respectivamente, a Flandres e Itlia. Oparagoneentreos binmios paisagem/Flandres e histria/Itlia foraum autntico topos quinhentista: no Trattato di pitturade Francesco Lancillotti (Roma, 1509), por exemplo,o autor afirma que A paesi dappresso e alontani /

    bisogna un certo ingiegno a descretione / che melhanno e fiandreschi che italiani, isto , para [pintar]paisagens prximas e distantes, so necessrios umcerto engenho e habilidade descritiva, as quais somais prprias dos flamengos do que dos italianos.36Principalmente a partir dos anos 1520 e 1530, estadualidade que at ento adquirira um carter pre-dominantemente conciliatrio, fundando-se sobre aadmirao mtua e a conscincia da especificidade dashabilidades prprias de flamengos e italianos trans-forma-se crescentemente em confronto aberto, vincu-

    lando-se a paisagem arte manual e a figura, artemental. Ao comentar os frescos da Capela Paolina,Vasari afirma que Michelangelo no almejou senoa perfeio, pois nem paisagens, nem rvores, nemcasario, nem mesmo as diversas sedues da arte soadmitidas nesta pintura, porque jamais nelas se deteve,talvez porque cnscio de no dever rebaixar seu enge-nho a coisas similares.37Nos Dilogos em Roma, Fran-cisco de Hollanda poria na boca de Buonarroti umlongo discurso no qual o antagonismo entre pinturaflamenga e italiana apareceria de forma clara e lapidar:

    Pintam em Flandres propriamente para enganar avista exterior ... O seu pintar trapos, maonarias, ver-duras de campos, sombras de rvores, e rios e pontes,a que chamam paisagens, e muitas figuras para c emuitas para acol. E tudo isto, ainda que parea bema alguns olhos, na verdade feito sem razo nem arte,sem simetria nem proporo, sem advertncia do es-colher nem despejo, e finalmente sem nenhuma subs-tncia nem nervo ... Somente s obras que se fazem

    em Itlia podemos chamar quase verdadeira pintura,e por isso boa chamamos italiana ... nenhuma naonem gente (deixo estar um ou dois espanhis) podeperfeitamente fartar ou imitar o modo de pintar de It-lia, que o grego antigo, que logo no seja conhecido

    facilmente por alheio, por mais que se nisso esforcee trabalhe.38Francisco sintetiza, assim, um antago-nismo extremo entre os dois modos de pintar, o qualparece tornar-se cada vez mais difundido no campo dateoria artstica italiana: a pintura flamenga manual,e a italiana, cerebral; a primeira distrai-se na descriodo natural, ao passo que a segunda concentra-se narepresentao do essencial; a primeira fala aos olhos,a segunda ao intelecto; a primeira mundana, a se-gunda, divina. Em seus versos, Lampsonius participado debate buscando voltar a estabelecer um sentido

    de igualdade entre a pintura flamenga de paisagens ea italiana de figuras: ambas tm sua laus, equiparvele prpria, e prova de sbio discernimento, por partede Jan, haver claramente percebido sua particular vo-cao e talento, em vez de buscar emular sem xitouma arte que lhe alheia. No Schilderboeck, Van Manderretomaria em vrios momentos a defesa da pinturade paisagem em face da de histria, comparando-ase propondo analogias que anatomizam a paisagem;39como Lampsonius, o escritor busca equilibrar paisa-gem e histria, conferindo primeira a dignidade de

    gnero pictrico especfico e autnomo.Os versos de Lampsonius so freqentementecitados pela crtica contempornea como uma espciede pendant da clebre frase buonarrotiana: Deve-sepintar com o crebro, e no com as mos.40Certosautores, inclusive, chegam falsamente a afirmar queMichelangelo a teria formulado em referncia arteflamenga.41Embora a frase evidentemente se relacione questo da arte intelectual versusmanual, o contextono qual ela foi escrita nada tem a ver com a oposioItlia/Pases Baixos ou histria/paisagem. altamente

    improvvel, ainda, que Lampsonius tenha lido a cartaem que Michelangelo a inseriu, uma vez que o con-junto de cartas do mestre assim como os DilogosdeHollanda permaneceu indito at o Oitocentos. Poroutro lado, essa imagem parece ter-se tornado moedacorrente a partir de meados do Quinhentos; recorde-se, por exemplo, a passagem do Disegnode Doni: Per-che in queste cose di leggier disegno gloltramontanici aplicano piu lingegno & la pratica, che glItaliani

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    11/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 27

    non fanno; onde si dice in proverbio, che glhanno ilcervello nelle mani.42

    12. JOOS VAN CLEVE

    (Clves (?), ca. 1480 Anturpia, 1540-41)

    Iustus de Clves, pintor de Anturpia

    Entre os artistas belgas, nossa musa no te omi-tir, Iustus, grande jia da arte da pintura. Tantoem tua prpria arte quanto na do teu filho teriassido afortunado, se o crebro do infeliz no tivesseadoecido.(1)

    (1) O filho de Joos, Cornel is van Cleve (1520 ca. 1567), tambmfoi pintor; ele teria sido acometido por uma grave doena mentaldurante sua estadia na Inglaterra, por volta de 1558. Em diversasfontes, referido como sotte Cleve, isto , o louco Cleve.

    A biografia de Joos foi durante muitos anoscontroversa, assim como a atribuio de suas obras;atualmente, tende-se a identific-lo com o assim cha-mado Mestre da Morte da Virgem.

    Lampsonius no fornece quaisquer comentriosminimamente especficos sobre a produo artsticade Cleves; tambm Van Mander parecia estar poucoinformado relativamente vida e obra do mestre.Cleves, no entanto, foi elogiado por Vasari e Guic-

    ciardini como gran coloritore e raro in far ritratti dinaturale.43O pintor absorve tanto influncias italia-nas sobretudo leonardianas, mas tambm rafaelescas quanto a herana flamenga de Van Eyck e Van derWeyden, que incorpora de forma quase arcaizante; apartir de 1515, adota a linguagem pictria de Patinir,sem no entanto abandonar a contruo de formas ar-quitetnicas e decorativas italianizantes.

    Sciolla e Puraye traduzem o ltimo verso dopoema erroneamente, assumindo que o cerebrum emquesto o de Joos, introduzindo um pronome pes-

    soal inexistente no original e concluindo, portanto,que o humanista se equivocara ao atribuir ao pai aenfermidade mental do filho;44acreditamos que esteerro, assim como outros em suas tradues (cf. acimao poema a Van der Weyden, nota 2), devem-se suadependncia de Van Mander, que em sua traduo dosversos lampsonianos vinculara explicitamente a Joos ocrebro doente: Hadtghy ellendigh Manghesondt vanherssens bleven.

    13. MATTHIJS COCK

    (Anturpia, ca. 1510 antes de 1548)

    Mathias Cock, pintor de Anturpia, irmo de

    Hieronymus

    Tu tambm, Mathias, sabias pintar paisagens queno tiveram igual em nossos tempos. Que tu estejasentre os artistas que honram a Blgica com famaimortal no se deve apenas ao amor fraterno, mastambm tua arte, justamente louvada.

    Lampsonius aponta imediatamente a razo prin-cipal para a incluso de Matthijs nasEffigies: o pintor irmo de Hieronymus, primeiro editor e destinatriodo livro. Matthijs foi, no entanto, timo pintor e dese-nhista de paisagens, sobretudo no tocante obteno

    de uma perspectiva complexa e apurada; assim comoo irmo, viajou Itlia, de onde traz, segundo VanMander, a nuova manieraitaliana pintura de paisagens(particularmente notvel a semelhana com as paisa-gens de Tiziano gravadas por Campagnola).

    O humanista enfatiza uma vez mais o vnculo dosartistas com a cidade de Anturpia, elemento biogrficoigualmente destacado por Van Mander, que, em suabiografia (conjunta de Hieronymus), compara a cidadeflamenga diretamente ao que fora Florena (232r).

    14. HERRI MET DE BLES

    (Il Civetta; Bouvines (?), ca. 1510 ?)

    [Fig. 5]

    Henrique Bles, pintor de Bouvines

    Dinant, prxima a Lige, viu nascer um artista(1)que o poeta-pintor(2)cantou em seus versos. Foi aprpria localizao excelente de sua ptria que delefez um artista; nenhum mestre ensinou-lhe. A pe-quena Bouvines invejou a glria de sua vizinha e

    criou Henrique, hbil na pintura de paisagem. Masassim como pequena Bouvines supera Dinant, Joaquim, tu superas Henrique.

    (1) Patinir.(2)O prprio Lampsonius.

    Pouco se sabe acerca da biografia do paisagista;Lampsonius, como Van Mander, indica Bouvines como

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    12/21

    Maria Berbara

    28 RHAA 8

    sua cidade natal; Guicciardini, talvez confundindo-ocom Patinir, aponta Dinant (ele e Vasari referem-se aJoaquim Patinir, porm, como sendo de Bouvines).Gozou de extrema popularidade na Itlia, onde se lheconhecia por Civetta por causa da coruja que quase

    invariavelmente representada em suas obras, e quecomparece igualmente na gravura dasEffigies. Lampso-nius, previsivelmente, confronta Bles a Patinir, vincu-lando aoparagonea disputa entre cidades e outorgandoao segundo uma inquestionvel supremacia.

    O juzo negativo de Lampsonius malgrado aevidente popularidade de Bles ao longo do Quinhentostanto na Itlia quanto nos Pases Baixos prevale-ceu at recentemente, sendo o artista quase sempremencionado em funo de Patinir, invariavelmenteconsiderado superior a ele (cf., por exemplo, Friedln-

    der). A partir dos anos 1990, novos estudos (principal-mente a tese doutoral de Serck), uma grande exposio(Namur) e uma conferncia (Princeton) procuraramdestacar Bles de Patinir, ressaltando a qualidade desua produo artstica e apontando sua particular co-laborao para a pintura de paisagem.45

    Lampsonius retoma aqui o toposda espontanei-dade do gnio artstico (cf. os versos a Metsys), poste-riormente enfatizado igualmente por Van Mander, e aausncia de professores; aqui o humanista acrescenta,porm, a idia de que a prpria natureza a ensinar-

    lhes sua arte, vinculando portanto intrinsecamente aptria produo artstica. O local de nascimento deum determinado pintor, assim, torna-se algo essencial,sobretudo quando se trata de um paisagista do quese deriva sub-repticiamente o papel coadjuvante, ou aomenos co-protagonista, do paradigma italiano. Muitoembora, na Vida de Scorel, Lampsonius proclamea importncia da escola romana, aqui o humanistaaponta a quase auto-suficincia da natureza na forma-o do artista; na arquitetura lampsoniana, a nobrezada pintura de paisagem associa-se simultaneamente a

    um princpio artstico e ao orgulho ptrio.

    15. JAN CORNELISZ VERMEYEN (ou Juan de

    Mayo; Beverwijk, ca. 1500 Bruxelas, ca. 1559)

    [Fig. 6]

    Ian Maius, pintor

    Que homens, locais e cidades, o que no mundo

    inteiro digno de ser visto no pintou Maius? En-quanto seguia-te por terras e mares, ImperadorCarlos,(1)pintou os grandes feitos por tua mo re-alizados, os quais logo brilharam no ouro de atli-cas tapearias.(2)A mo do artista, porm, supera apreciosidade do material.(3)No menos que atravs

    de sua arte, ofereceu-te um espetculo agradvelquando, sobre um local elevado, exibia abertamente,quando requisitado, as ondulantes volutas de suabarba, longa at seus ps.(4)

    (1) Carlos V.(2) Cf. vida de Orley. Vermeyen desenhou os cartes para os arazzi

    celebrativos da vitria imperial na Tunsia (atualmente no Kuns-thistorisches Museum de Viena).

    (3) Como percebeu Miedema, o argumento remonta, ao menos, aRoma: Materiam superabat opus (Ovdio,MetamorfosesII, 5).

    (4) Esta caracterstica parece ter outorgado ao artista ao menos tantafama quanto suas obras; na Espanha, Vermeyen era referido

    como Juan de la Barbalunga.

    46

    Poderia considerar-se que Vermeyen pertence segunda gerao posterior de Mabuse e Orley de romanistas, ou pintores flamengos de marcada as-cendncia italianizante. Lampsonius enfatiza a carreirainternacional do artista e sua relao com Carlos V, decuja corte chegou a ser pintor oficial e a quem acompa-nhou em sua viagem Tunsia em 1535.47Entre todosos 23 retratos de artistas contidos nas Effigies, o deVermeyen, assinado por Wierix, o nico que possui

    uma vista ao fundo; para a sua realizao Wierix pa-rece ter-se inspirado diretamente no auto-retrato queVermeyen inclui no carto correspondente dcimacena da Conquista de Tunez, aludindo tanto a palmeiraquanto a cena de luta obra em questo.

    16. PIETER COECKE (ou Coeck)

    (Aalst, 1502 Bruxelas, 1550)

    Petrus Coeck de Aelst, pintor

    Eras pintor; mas no eras somente, Petrus, pin-tor. Tornaste Aalst clebre em todo o mundo comtua arte; mas muita arte, fruto de muito esforo, preciso para a contruo de belas casas. Serlioensinou-o aos italianos, e tu, tradutor bilnge deSerlio, aos belgas e franceses.

    Alm de pintor e arquiteto, Coecke era, ademais,um erudito lingista, tendo traduzido no somente o

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    13/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 29

    tratado de Serlio mencionado por Lampsonius, mas,tambm, o De architeturade Vitrvio (holands). Assimcomo seu predecessor nasEffigies, pertencia segundagerao de romanistasflamengos, tendo provavelmenterealizado uma grande viagem Itlia entre 1524 e

    1525; de acordo com Van Mander, foi Coecke queintroduziu o modo correto de construo (de rechtewijse van bouwen) nos Pases Baixos (218v).

    Uma vez mais, Lampsonius projeta a glria doartista sobre sua cidade natal.

    17. JAN VAN SCOREL (ou Schoorel)

    (Schoorl, 1495 Utrecht, 1562)

    Jan Scorel batavo, pintor

    De mim se dir, atravs dos sculos, que fui o pri-meiro a ensinar os bons artistas belgas atravs domeu exemplo a viajar a Roma. No pode consi-derar-se digno do nome de artista, de fato, quemnaquela escola no consumiu mil lpis e cores pin-tando telas.

    O poema de Lampsonius abre com as palavraslatinasprimus ego, o que lhe confere um acentuadssimocarter inaugural. Tambm Van Mander afirma que foigraas a Scorel que os flamengos abandonaram definiti-vamente a arte medieval, e at os dias de hoje o seu sog-giornoitaliano freqentemente considerado pela crticacomo um marco da histria da pintura flamenga.

    Scorel fora em vida internacionalmente famoso,tendo alcanado posies to destacadas quanto a decurador oficial das colees vaticanas durante o curtopontificado de Adriano VII. Grande viajante, partiupouco antes de 1520 rumo Terra Santa, tendo passadopor Nuremberg (onde conheceu Drer), Carinthia, Ve-neza, Malta, Rodes, Chipre e Jerusalm antes de seestabelecer em Roma a servio do papa. Segundo Van

    Mander, neste perodo Scorel estuda energicamente aestaturia antiga, assim como as obras de Rafael e Mi-chelangelo. Van Mander afirma que Scorel, como Coe-cke, era altamente talentoso no aprendizado de idiomas,e que se dedicara a escrever epigramas e cantos.

    Como observou Friedlnder, h um forte ele-mento de otimismo na vida e obra de Jan van Scorel.Profundamente imbudo da cultura humanista, imunes turbulncias de ordem religiosa que marcaram seu

    tempo, diplomtico e erudito, inteligente e sereno, cos-mopolita, poliglota e altamente refinado, Scorel foi defato um condutor perfeito para o trnsito de lingua-gens artsticas entre a Itlia e os Pases Baixos.

    O elogio hiperblico de Lampsonius antes

    de Scorel, Mabuse j havia viajado Itlia, e artistascontemporneos seus, como Vermeyen, difundiamigualmente pelos Pases Baixos elementos italianizan-tes enfatiza a importncia tanto do exemplumitalianoquanto da perseverante prtica artstica.

    18. LAMBERT LOMBARD

    (Lige, 1505/1506 1566)

    Lambert Lombard de Lige, pintor e arquiteto

    No desejo tecer aqui, em poucos versos, o elogiodevido a teus mritos, Lombard; este aparece notexto se merece ser lido que a pena de Lamp-sonius(1)escreveu sobre ti.(2)

    (1) Em grego no original ( ).(2)Refere-se naturalmente a Lamberti Lombardi vita, publicada em

    1565 (Bruges, Hubert Goltzius).

    Dentre todos os artistas elencados nas Effigies,Lombard o nico ao qual Lampsonius dedica umaobra literria independente; esta costuma ser referidapela crtica como o primeiro comentrio histrico-ar-tstico publicado nos Pases Baixos. A tiragem inicialdo texto contava com um nmero exguo de cpias,o que sugere que tenha sido destinado a um pblicoselecionado; anos depois, Van Mander iniciaria suabiografia de Lombard lamentando no haver encon-trado nenhum exemplar do escrito.

    Na arquitetura histrico-artstica ideada porLampsonius, Lombard ocupa, mutatis mutandis, umaposio semelhante a de Michelangelo na Vitavasa-

    riana: ambos encontram-se no apogeu de uma tra-jetria evolutiva cujas razes alimentam-se vigorosa-mente em solo ptrio (Lampsonius abre sua biografia,de fato, informando que Lombard nasceu em Lige,e que superou todos os artistas flamengos que lheprecederam). No texto do humanista, Lombard equi-libra-se elegantemente entre a imitao dos antigos eitalianos, de um lado, e de outro a apreciao plena daherana flamenga; assim como seus colegas italianos,

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    14/21

    Maria Berbara

    30 RHAA 8

    ainda, o pintor funda sua produo artstica sobre opressuposto fundamental do disegno, elevando social eintelectualmente o artista setentrional. Ao longo desua biografia, Lampsonius insiste recorrentemente naampla erudio de Lombard, a qual abarcava as cin-

    cias e letras clssicas; a pintura, afirma o humanista, arte liberal, no mecnica, de onde a necessidade deque quem a pratique disponha de vasta cultura.

    19. PIETER BRUEGHEL

    (Breda?, ca. 1525/30 Bruxelas, 1569)

    Petrus Brueghel, pintor

    Quem este Hieronymus Bosch, renascido nomundo? Quem, to hbil na arte de imitar os sonhosfantsticos do mestre com o pincel e o lpis, capaz

    at mesmo de super-lo? Louvado sejas, Petrus,louvado pela tua arte. Em teu gnero de pintura(e no de teu mestre), pleno de humor e engenho,mereces de todos, em todos os lugares, o prmio dalaude, no inferior a de nenhum outro artista.

    Assim como nos versos a Bosch, Lampsoniusinicia seu poema a Pieter com uma pergunta retrica,acentuando o aspecto misterioso e enigmtico da obrados dois artistas nrdicos. J em 1568, Vasari refere-se a Brueghel como segundo Bosch; o vnculo de

    continuidade entre os dois artistas repete-se em Lamp-sonius, Guicciardini e Van Mander, sobrevivendo porsculos. Se Hieronymus, contudo, alimentava-se vigo-rosamente do universo demonaco-mstico medieval,as obras de Pieter, embora freqentemente fantsticase de temtica alusiva tradio popular flamenga, res-piravam a racionalidade do humanismo renascentista:contrariamente a Bosch, de fato, a efgie de Brueghelrepresenta o artista em perfil clssico, com as mosrepousadas, o olhar sereno e a barba longa dos sbios. margem da soluo de continuidade criada, essas

    diferenas no passam despercebidas a Lampsonius,em cujos versos as fantasmagorias infernais de Boschrenascem em Brueghel como invenes plenas de hu-mor e engenho. Alm de Bosch, Brueghel participaigualmente da corrente paisagstica de Patinir, Mes-sys e, principalmente, Jan van Amstel; no obstante aclareza do vnculo com seus predecessores, contudo,Pieter infunde, como bem observou Lampsonius, umnovo vigor a temas e formas tradicionais.

    O humanista retoma aqui os topoi comuns sEffigies e a Vasari da imitao e superao de ummestre por seu sucessor, reforando o desenho de umalinhagem de razes puramente autctones. Ao elegermodelos no entre os clssicos latinos, mas entre os pr-

    prios flamengos, Lampsonius gera uma tradio auto-referente e cria uma memria transalpina prpria.48

    20. WILLEM KEY

    (Breda, ca. 1515/16 Anturpia, ca. 1568/69)

    Gilherme Caius, pintor de Breda

    Os rostos de homens retratados pela habilidosa mode Caius de modo que te parea v-los no tememser superados pela arte de nenhum outro belga (ex-cetuando um nico, em minha opinio: Mor).

    Com Key, Lampsonius enaltece o segundo dosgrandes gneros flamengos considerados nativos: aretratstica. O humanista recorre ao antigo topos daconfuso entre o real e o representado, to perfeita aimitao toposeste remontante, ao menos, clebreanedota pliniana das frutas pintadas por Zeuxis; si-multaneamente, retoma oparagoneentre artistas, atri-buindo somente ao contemporneo de Key, o retra-tista Antonis Mor, maior habilidade na expresso dorosto humano. Lampsonius era amigo de Mor, a quemconheceu durante sua estada na Inglaterra e dedicouvrios epigramas ditirmbicos.49

    21. LUCAS GASSEL

    (Helmond, ca. 1595/1500 Bruxelas, ca. 1570)

    Lucas Gassel, pintor de Helmond

    Salve, Lucas, a mim mais caro que todos os ou-tros, e a quem honro no menos que a meu prpriopai. Em ti encontrei o princpio de meu amor pela

    pintura, quando pintavas, com habilidosa mo, cam-pos e casas. Como tua arte, so tua probidade, tuaretido, e tudo aquilo que pode conduzir as mentesao amor pelo que bom. Que viva eternamente,portanto, a fama da tua virtude e da tua arte, ancioque amo por essas duas razes.(1)

    (1) Isto , por sua grandeza tanto artst ica quanto moral. Os artis-tas, elevados categoria de uomini illustri, tornam-se paradigmasuniversais.

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    15/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 31

    O poema que Lampsonius dedica a seu esti-mado professor , sem dvida, a mais pessoal dasEffigies; o paisagista, sucessor de Patinir e Henri metde Bles, louvado tanto por suas qualidades artsticasquanto pela superioridade de seu carter.

    Gassel no mencionado nem por Vasari nempor Guicciardini, e a biografia de Van Mander a seurespeito suscinta e pouco informativa; at o presente,poucas so as obras atribudas ao mestre brabantino,e escassos os estudos histrico-artsticos dedicados aele; suas paisagens conhecidas, contudo, revelam umagrande inventividade e capacidade prosptica.

    22. FRANS FLORIS (Anturpia, ca. 1519/20 1570)

    [Fig. 7]Franciscus Floris, pintor de Anturpia

    Se como pintor, Floris, tivesses acrescentado tantahabilidade tua arte quanto a que te outorgara anatureza visto que preferes pintar muito a pin-tar bem,(1)e no te deleitas em demorar-te no aca-bamento justo e no esforo eu clamaria: recuai,pintores de todo o mundo, quer tenhais vivido emtempos de nossos pais ou avs.

    (1) Lampsonius provavelmente tinha em mente a mxima latinanon multa, sed multum.

    Caracteristicamente, em seu retrato Floris re-presentado desenhando uma figura humana. Vasarie Guicciardini posicionam-no cabea dos artistasflamengos vivos, destacando este ltimo sua excelnciana inventionee no disegno.

    Um dos maiores representantes do romanismo,Floris introduziu igualmente nos Pases Baixos o ateli moda italiana, o qual contava com um grande n-mero de assistentes altamente especializados (120, de

    acordo com Van Mander) e produzia em escala indus-trial. A esta concepo de produo massiva alude pe-jorativamente Lampsonius, para quem aApellea manus,sem dvida, caracterstica pessoal e intransfervel do(grande) art ista. A rapidez de execuo atribuda a Flo-ris igualmente destacada por Van Mander, segundoo qual o flamengo pintou, para o Arco dos Genove-ses em Anturpia, sete figuras em tamanho naturalpor dia, durante cinco semanas; o escritor repreende,

    contudo, a vida desregrada do pintor, afirmando que,de acordo com seus contemporneos, foi consideradoto grande artista quanto bebedor. Floris foi, em vida,celebrrimo, e sua intensa atividade artstica propor-cionou-lhe imensa fortuna.

    Aluno de Lambert Lombard, foi seguramenteem Lige que o pintor entrou em contato com Lamp-sonius.

    23. HIERONYMUS COCK

    (Anturpia, ca. 1510 1570)

    Hieronymus Cock de Anturpia, pintor

    Engano-me? O pintor, Hieronymus, no te re-tratou aqui aps tua morte? Em tua efgie aparece,aos olhos desavisados, um no sei qu de torpore debilidade. Oh, mais claramente o diz o crnioque aponta tua mo esquerda: os artistas aqui indi-cados precederam Cock; ele, encerrando a marcha,chama-os a si.

    Lampsonius abre e encerra as Effigies comCock. Alm de dirigir a clebre casa editorial Qua-tuor Ventorum(In de vier winden, Aos Quatro Ventos),Hieronymus era um dos personagens mais destacadosdo mercado de gravuras, dedicando-se ele prprio

    atividade grfica. As gravuras eram, naturalmente,o principal meio de difuso da produo italiana aonorte dos Alpes, e no por acaso Lampsonius dedica-lhe tanta ateno; conversamente, artistas flamengos ealemes eram divulgados na Itlia por meio delas. Oxito de Cock suscitou crticas por parte de alguns deseus contemporneos e, posteriormente, de Van Man-der, para quem o editor havia abraado a atividadecomercial em detrimento da cultura e da arte.

    Lamsponius conclui asEffigiescom uma esp-cie de sutil transformao do sentido tradicional do

    memento mori: a caveira apontada por Cock o editore, provavelmente, arquiteto inicial do livro parecerepresentar menos uma admoestao a que os vivosmeditem sobre a morte do que uma vitria da artesobre a prpria morte; menos uma recordao datransitoriedade da vida humana do que o reconhe-cimento e homenagem imortalidade das obras queela capaz de criar. Os versos de Lampsonius, acom-panhando as efgies dos pintores que a publicao de

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    16/21

    Maria Berbara

    32 RHAA 8

    * Agradeo ao Prof. Dr. Luiz Marques (Unicamp) por ter meapontado a importncia capital dos escritos de Lampsonius,inditos tanto em publicaes de lngua portuguesa quantoespanhola, e ao Prof. Dr. Karl Enenkel (Universidade deLeiden, Holanda), pelos valiosos esclarecimentos s minhasdvidas quanto compreenso precisa de algumas passagensdo texto latino.

    1DoravanteEffigies.2MELION, W.S. Shaping the Netherlandish Canon. Karel van Manders

    Schilder-Boeck. Chicago/Londres: The University of ChicagoPress, 1991, p.143.

    3Edio de G. Milanesi (Florena: Sansoni, 1878-1882, 9 vols.),

    VII, p. 590.4Para maiores informaes sobre a biografia de Lamsponius cf.

    PURAYE, J. Dominique Lampson, Humaniste. Lige: Descle deBrouwer, 1950.

    5Acerca da atividade potica de Lampsonius cf. PURAYE, J.,Op. cit., captulo III.

    6 Este ttulo foi originariamente criado por Milanesi em suaclebre edio das Vite (Op. cit., VII, p. 579 e seg.).

    7Para a tradio da representao literria dos uomini famosicf.JOOST-GAUGIER, C. L., The early beginnings of the no-tion of uomini famosi and the de viris illustribus in Gra-eco-Roman literary tradition.Artibus et Historiae: III, 6, 1982,pp. 97-115.

    8Para o Musaeum Jovianumcf. MNTZ, M. E., Le Muse deportraits de Paul Jove.Mmoires de LInstitut National de France.Paris, XXXVI, 2, 1901, pp. 249-343; RAVE, P. O., PaoloGiovio und die Bildnisvitenbcher des Humanismus. Jahr-buch der Berliner Museen. Berlim, I, 1959, pp. 119-54; e a ediode R. Meregazzi dosElogia(Roma: Istituto Poligrafico delloStato, 1972).

    9A este propsito cf. BECKER, J., Zur niederlndischen Kuns-tliteratur des 16. Jahrhunderts: Domenicus Lampsonius.Ne-derlands Kunsthistorisch Jaarboek, 24, 1973, p. 147 e seg.

    10Em um artigo recente, Rogier van Son (Lomazzo, Lampsoniusen de noordelijke kunst.Nederlands Kunsthistorisch Jaarboek, v. 44,1993, pp. 185-96) argumenta que o conhecimento de Lomazzosobre os artistas flamengos derivava no de seu contato pessoalcom a arte nrdica, mas de Vasari, Guicciardini e, sobretudo,Lampsonius: todos os pintores mencionados nasEffigiesfiguramnos escritos de Lomazzo, e, conversamente, os nicos artistasnrdicos mencionados por Lomazzo e no por Lampsonius soaqueles estabelecidos no norte da Itlia (Giambologna, Stra-dano), ou cuja obra se dera a conhecer na Itlia atravs de gravu-ras (Drer, Aldegrever, Schongauer, etc.). O estudioso concluique asEffigies foram fundamentais para o conhecimento dositalianos sobre a arte nrdica ou, ao menos, para a seleo de

    artistas nrdicos aos quais a Itlia dedicara ateno (Lomazzo provavelmente a exceo que confirma a regra segundo aqual escritores italianos quinhentistas assumiam a intrnsecasuperioridade da arte italiana sobre a nrdica).

    11Cf. MELION, Op. cit., captulo 11.12Em SCIOLLA, G. C. & VOLPI, C. Da van Eyck a Brueghel.

    Scritti sulle arti di Domenico Lampsonio. Turim: UTET, 2001. Para aedio francesa cf. PURAYE, J. Les Effigies des Peintres clbres desPays-Bas. Lige: Descle de Brouwer, 1956. A maioria dos po-emas desta ltima provm da edio do Schilderboeckde HenriHeymans (Le Livre des Peintres de Carel van Mander(2 v.). Paris:Rouam, 1884-1885), traduzidos por sua vez a partir de Van

    Mander; os demais foram traduzidos por Marie Delcourt.13Doornspijk: Davaco, 1994 (6 volumes).14Traduzido a partir da reproduo em Sciolla e Puraye. No

    exemplar de Leiden, as gravuras trazem o nome de Galle, e no-tas biogrficas so acrescentadas a cada efgie (de acordo comMiedema (Op. cit., v. II, p. 176), Van Mander teria utilizadoalgumas destas notas). Na edio de 1600, com os tipos deGalle, o retrato de Cock tambm suprimido. Para as diversasedies das Effigies cf. VAN SOMEREN, J. F. BeschrijvendeCatalogus van gegraveerde Portretten van Nederlanders. Amsterd; Fre-derik Muller, 1888-1891, v. I, ns 210 e 211, pp. 196-9, quemno entanto menciona uma segunda edio do livro completa,isto , com 23 retratos. possvel que o exemplar de Leiden

    tenha reunido o frontispcio da segunda edio s gravuraspublicadas em 1600 com os tipos de Galle.15 Gantes: G. Manilius, 1565; cf. edio de W. Waterschoot,

    Zwolle: W.E.J. Tjeenk Wil link, 1969, pp. 29-32.16Hubert van Eyck, personnage de lgende. Paris/Bruxelas: Van Oest, 1933.17Van Eyck:The Ghent Altarpiece. Londres: Penguin Books (Allen

    Lane), 1973.18The Ghent Altarpiece and the Art of Jan van Eyck(particularmente

    captulo 2: The Quatrain). Princeton University Press, 1971.19Early Netherlandish Painting(2 v.). Harvard University Press, 1953.20Jan Van Eyck und der Genter Altar; Worms: Wernersche Verlags-

    gesellschaft, 1995. Cf. ainda DHANENS, E. & DUVERGER,J. Het Grafschrift van Hubert van Eyck en het Quatrain

    van het Gentsche LamGods-Retabel, In Verhandelingen vande Koninklijke Vlaamsche Akademie van Wettenschappen, Letteren

    en Schoone Kunsten van Belgi. Anturpia-Utrecht: Standaart/DeHaan: 1945.

    21Cf. VASARI, G. La Vita di Michelangelo nelle redazioni del 1550e del 1568, ed. de BAROCCHI, P. Milo: Ricciardi, 1962, II,p.76 (nota 63).

    22Cf. TOURNEUR, V. Un second quatrain sur lAgneau Mysti-que, InAcademie Royale de Belgique, Bulletin de la Classe des Lettreset des Sciences Morales et Politiques, ser. 5, XXIX, 1943, p. 57 e seg.

    Cock cristaliza, eternizam a fama que lhes foi con-ferida pela prpria dignidade e grandeza; sobre esta

    tradio o humanista busca traar a prpria histriada arte flamenga.

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    17/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 33

    23Cf. SMITH, A. Drer and Bellini, Apelles and Protogenes;Burlington Magazine, CXIV, 830, 1972, pp. 326-9

    24 Para referncias, cf. BORCHERT, T.H. & HUVENNE, P.Die Erfindung der lmalerei Van Eyck im Spiegel ita-lienischer Kunstl iteratur, inBORCHERT, T.-H. (Org.),Janvan Eyck und seine Zeit. Flmische Meister und der Sden 1430

    1530. Stutgart: Belser, 2002. Cf. ainda BRINKMAN, P., eCUYPERS, D.,Jan van Eyck en de uitvinding van de olieverf. Haia:Openbaar Kunstbezit, nmero 3, 1996 e DHANENS, E., Hu-bert en Jan Van Eyck(publicao conjunta em vrios idiomas).

    Anturpia: Mercatorfonds, 1998 (particularmente p. 68 e seg.da verso holandesa).

    25Cf. a edio de MIEDEMA, H. Utrecht, Haentjens Dekker& Gumbert, 1973, v. I, pp. 254-7.

    26Cf. MAQUET-TOMBU, J. Les tableaux de justice de Rogervan der Weyden lHotel de Ville de Bruxelles. Phoebus, v.II, 1948/49, pp. 178-81

    27Op. cit., II, p. 283.28Cf. por exemplo Friedlnder,Altniederlndische Malerei(aqui se

    utiliza a edio em lngua inglesa Early Netherlandish Painting.Leiden: A. W. Sijthoff, II, 1967, p. 28 e seg.).29Vlaanderen. Geschiedenis en geografie van een land dat niet

    bestaat. In Fiamminghi a Roma, 1508 1608, catlogo da exposi-o realizada no Paleis voor Schone Kunsten de Bruxelas e noPalazzo delle Esposizioni de Roma em 1995 (Snoeck-Ducaju& Zoon), pp. 48-52.

    30Cf. DUVERGER, J. Margareta van Oostenrijk (1480-1530)en de italiaanse Renaissance, In Relations artistiques entre les Pays-Bas et lItalie la Renaissance: Etudes ddies Suzanne Sulzberger.Bruxelas/Roma: Institut historique belge de Rome: 1980, pp.127-42.

    31Cf. DACOS, N. Les peintres romanistes. Histoire du terme,

    perspectives de recherche et exemple de Lambert van Noort,In Bulletin de LInstitut historique Belge de Rome, L, 1980, pp. 161-86,que prope o termo italianizante como alternativa (segundoela, mais precisa e livre de preconceitos) a romanista.

    32Cf. ainda DACOS, N. Cartons et dessins raphalesques Bruxelles: Laction de Rome aux Pays-Bas, In Fiamminghi aRoma 1508-1608, Op. cit., suplemento ao nmero 100 , 1997,pp. 1-22.

    33Cf. MELION, Op. cit., p. 118 e seg.

    34 InRUPPRICH, H. (ed.). Drer Schriftlicher Nachlass, Berlim,1956-69, I, p. 169.

    35Cf. FAGGIN, G. T., Jan van Amstel. Paragone (arte), XV,n. 175, 1964, pp. 43-51, GENAILLE, R., Jan van Amstel,le monogrammiste de Brunswick. Revue belge dArchologie etdHistoire de lArt, XIX, 1950, pp. 147-53, e WESCHER, P.,

    Jan van Hemesen und Jan van Amstel. Jahrbuch der BerlinerMuseen, XII, 1970, pp. 34-60.36Ed. de RAFFAELLI, R. Recanati, 1885, p.4.37Traduo indita de Luiz Marques.38Cf. a edio de MENDES, M. Dilogos de Roma de Francisco de

    Holanda. Lisboa: S da Costa, 1955, pp. 19-21.39Cf. MELION, Op. cit., p. 97 e seg.40Il CARTEGGIO di Michelangelo Buonarroti, ed. de P. Barocchi e

    R. Ristori, a partir da edio pstuma de G. Poggi. Florena:SPES, 1979 (v. IV), p. 150.

    41Cf. por exemplo Elena Parma e Margaret Koster, ambas InBORCHERT, Op. cit., respectivamente p. 96 e 79.

    42Cf. fac-smile da edio de 1549 com introduo e notas de

    Mario Pepe. Milo: Electa, 1970, p. 16 v.43Para referncias cf. MIEDEMA, Op. cit., III, p. 158, nota 1.44Os ltimos versos, no original, lem-se: Quam propria, nati

    tam felix arte fuisses / Mansisset sanum si misero cerebrum onde misero, no dativo, naturalmente refere-se ao filho (nati)de Joos, e no ao prprio.

    45MARROW, H., MULLER, N. E. & ROSASCO, B. J. (Org.).Herri met de Bles. Studies and Explorations of the World Landscape

    Tradition. Simpsio: Universidade de Princeton, 1995. PrincetonUniversity Press, 1995; SERCK, L., Henri Bles et la peinture de pay-sage dans les Pays-Bas mridionaux avant Bruegel. Dissertao dou-toral, Universit Catholique de Louvain, 1990; TOUSSANT,

    J. (Org.),Autour de Henri Bles(cat. exp.). Namur, 2000.46Para referncias cf. MIEDEMA, Op. cit., III, p. 132 e seg.47Cf. HORN, H.J.Jan Cornelisz Vermeyen. Painter of Charles V and

    his conquest of Tunis (vols). Davaco: Doornspijk, 1989.48Cf. MEADOW, M. Pieter Bruegel the Elders Netherlandish Proverbs

    and the practice of Rhetoric. Zwolle: Waande, 2002, p. 104 e seg.49Cf. PURAYE, J. Antonio Moro et Dominique Lampson.Oud

    Holland: 64, 1949, pp. 175-83. Mor incluiu um poema de Lamp-sonius em seu auto-retrato conservado nos Uffizi (1558).

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    18/21

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    19/21

    Lampsonius e as Effigies

    RHAA 8 35

    1 Effigies. Primeira pgina.

    2 Effigies. Hubert van Eyck.

    3 Effigies. Hieronymus Bosch.

    1

    32

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    20/21

    Maria Berbara

    36 RHAA 8

    4 Effigies. Jan van Amstel.

    5 Effigies. Herri met de Bles.

    5

    4

  • 7/25/2019 BERBARA - Pintores de Flandres.pdf

    21/21

    Lampsonius e as Effigies

    7

    6

    6 Effigies. Jan Cornelisz Vermeyen.

    7 Effigies. Frans Floris.