bastos - aranha e a história da educação

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  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014 517

    MARIA LCIA DE ARRUDA ARANHA E A HISTRIA DA EDUCAOMaria Lucia de Arruda Aranha and the History of Education

    Maria Helena Camara Bastos1

    RESUMO

    Tomando os manuais como instncias de produo e de circulao de saberes de uma disciplina ou campo de conhecimento, possvel identificar as permanncias e marcas que ainda hoje defi-nem a disciplina Histria da Educao nos cursos de formao de professores. O artigo analisa a produo, circulao e apropriao do manual de autoria de Maria Lcia de Arruda Aranha, intitulado Histria da Educao, publicado pela Editora Moderna, com trs edies (1989, 1996, 2006). Aborda a trajetria da autora e sua insero no campo educacional; a histria da obra - da materialidade ao contedo, da edio circulao -; e a contribuio para a disciplina. Foca a importncia da Histria da educao e da Pedagogia; os temas abordados, a partir do ndice e/ou sumrio de cada captulo; as referncias bibliogrficas; os dropes; as leituras complementares e as atividades sugeridas.

    Palavras chave: Manuais Didticos; Histria da Educao; Formao de Professores.

    ABSTRACT

    Taking the manuals as examples of production and of circulation of known items of a discipline or field of knowledge, it is possible to identify the long-standing aspects and features that still currently define the discipline of History of Education in teacher education courses. The article analyzes the production, circulation, and appropriation of the manual authored by Maria Lcia de Arruda Aranha, entitled Histria da Educao (History of Education), published by Editora Moderna, with three editions (1989, 1996, 2006). The article deals with the trajectory of the au-thor and her entry in the field of education, the history of the work from materiality to content, from publishing to circulation; and the contribution to the academic discipline. It focuses on the importance of History of Education and of Pedagogy; the themes dealt with, based on the table of contents and/or summary of each chapter; the bibliographical references; the dropes; the complementary readings; and the suggested activities.

    Keywords: Teachers Manuals; History of Education; Teacher Training.

    Introduo

    Tomando os manuais como instncias de produo e de circulao de saberes de uma disciplina ou campo de conhecimento2, possvel identificar as permanncias e

    1 Doutorado em Educao pela Universidade de So Paulo, com estgio de ps-doutorado concludo no Service dhistoire de lducation, em Paris, Frana. Professora do Programa de Ps-Graduao em Educao da Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul. Pesquisadora do CNPq e da Fapergs. E-mail: [email protected]

    2 Os manuais escolares so reveladores daquilo que constitui o duplo movimento contraditrio da disseminao de conhecimentos elaborados no interior de uma disciplina. Os manuais de pedagogia cursos, tratados, lies tiveram a funo de iniciar os alunos da Escola Normal na nova cincia da educao, isto , (in)formar e inculcar os valores de

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    marcas que ainda hoje definem a disciplina Histria da Educao nos cursos de formao de professores. Os livros-texto, pelo contedo e estrutura, sinalizam para uma tradio disciplinar adotada ao longo do sculo XX e, ainda hoje, presente. Os manuais so dispositivos discursivos que nos permitem apreender o universo da Histria da Educao tal como concebido e ensinado. Tambm uma fonte privilegiada para analisar a cultura escolar e disciplinar as prticas escolares.

    Em outro estudo (BASTOS, 2006), sinalizamos para a necessidade de aprofundamento analtico de cada um dos manuais que circularam/circulam no Brasil, nacionais e estrangeiros, tendo em vista a complexidade do objeto. Um tpico, que merece um olhar mais atento, o conceito de educao e histria da educao postos em circulao pelos autores na seo introduo dos manuais. Ao mesmo tempo, salientvamos a necessidade de analisar as produes de manuais para a disciplina, da dcada de 1960 at hoje, especialmente as mais recentes produes3.

    Prosseguindo nas pesquisas sobre os manuais de Histria da Educao, que contriburam para a constituio do campo no Brasil, no presente estudo analisaremos a produo, circulao e apropriao do manual de autoria de Maria Lcia de Arruda Aranha, intitulado Histria da Educao, publicado pela Editora Moderna4, cuja primeira edio de 1989 (287 p.). Em 1993/1996 tem uma segunda edio, revista e ampliada (255 p.), o mesmo ocorrendo em 2006, mas com a ampliao do ttulo Histria da Educao e da Pedagogia: Geral e Brasil (384 p.), acompanhada de DVD com animaes. Escrito para uso nos cursos de Magistrio (ensino de 2 Grau/Ensino Mdio) e de Graduao (Pedagogia), atualmente adotado como referncia em programas de ensino da disciplina de graduao; trabalhos de cientficos (monografias, dissertaes, teses); bibliografia de referncia de concursos de professores, tanto para o ensino bsico como superior; em artigos de revistas.

    Maria Lcia de Arruda Aranha nasceu em Trs Lagoas, Mato Grosso do Sul. Formada em Filosofia na Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo (PUC-SP), lecionou para o Ensino Mdio, em escolas da rede pblica e particular, at se aposentar. Em 1986, em parceria com Maria Helena Pires Martins, publica a obra Filosofando - introduo filosofia, atualmente em 3 edio, inaugurando uma longa atuao junto Editora Moderna, como autora e coordenadora de coleo. Tambm publica as obras: Temas de Filosofia (em co-autoria Maria Helena Pires Martins, em 3 edio revista e ampliada/2003); Filosofia da Educao (2 edio, 1996); Maquiavel, a lgica da fora (2 edio/2006); Guia Prtico para o professor tica e cidadania na sala de aula (2

    um sistema pblico de educao. Dessa forma, so manuais de profissionalizao que visam fundar prticas profissionais em conformidade com um modelo, de forma prescritiva e til (ROULLET, 2001, p.7). Para Correia e Peres (2001, p.197), os manuais ou livros de texto participam da gramtica da escola e definem o territrio dos discursos pedaggicos e curriculares.

    3 Por exemplo: Histria da Educao do Brasil: Hilsdorf (2003); Ghiraldelli (1990; 2003); Xavier, Ribeiro, Noronha (1994); Stephanou & Bastos (2004/2005), etc.; Histria da Educao e/ou Pedagogia: Gadotti (1993); Cambi (1999); Pilleti (1993); Aranha (1989); Ferreira (1996/2001); Sebarroja (2003).

    4 Fundada por Ricardo Feltre e mais dois professores em 1968, iniciou com livros para 2 grau, na dcada de 1980, livros infantis e ocupa atualmente lugar de destaque na literatura didtica. So Paulo/SP. Em 2001, passou a integrar o Grupo Santillana, que atua na Europa e nas Amricas (HALLEWELL, 2005, p. 471).

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    edio/2002); Qual a graa? O bom e o mau do humor (2001); A praa do povo. Poltica e cidadania (2001); A bssola e a balana. Para um mundo mais justo (2001)5.Essa intensa produo e atuao junto editora Moderna permite aquilatar a circulao e a apropriao de suas obras6, adotadas como referncia tanto para o ensino da Filosofia como de Histria da Educao7.

    O estudo objetiva realizar uma biografia da obra, analisando a insero do autor no campo educacional; a histria da obra - da materialidade ao contedo, da edio circulao -, e a contribuio para a disciplina Histria da Educao. A pesquisa foca a importncia da Histria da Educao e da Pedagogia definida pela autora; os temas abordados, a partir do ndice e/ou sumrio de cada captulo; as referncias bibliogrficas, a fim de perceber a vinculao ou no com os manuais modelos e/ou mais tradicionais; os dropes, as leituras complementares e as atividades sugeridas. A ideia analisar as permanncias e descontinuidades, a apropriao das novas temticas de pesquisa da rea, voltadas histria cultural, compreendendo o que h de histrico no movimento das ideias, isto , como a educao e a pedagogia so pensadas pela autora e como circulam.

    O manual em sua materialidade

    Para Magalhes (2011, p. 31), um manual escolar, em geral, prefigura um perfil pedaggico e cognoscente do leitor, pelo que apresenta como estrutura, com textos organizados e orientaes de leitura e explorao. Considera que na origem da produo autoral e editorial do manual est um complexo constitudo pelos parmetros: informao, adaptao, acessibilidade, convenincia pedaggica-didtica. A partir dessas premissas, nesta seo abordaremos os aspectos formais da obra de Aranha em suas trs edies: 1989, 1996 e 2006.

    Quadro 1. Elementos da materialidade dos manuais

    1989 - 1 edio 1996 - 2 edio 2006 - 3 edio

    Ttulo Histria da Educao Histria da Educao Histria da Educao e da Pedagogia Geral e Brasil

    Formato 21 x 14 cm 23,5 x 16,5 cm 24 x 17 cm

    Nmero pginas 288 254 384

    Diagramao da Texto nico 2 colunas 2 colunas

    Imagens 4 mapas/10 figuras 4 mapas33 figuras /23 novas

    3 mapas/13 figuras

    5 Tambm tem captulos em duas coletneas publicadas por outras editoras. 6 Apesar da solicitao junto Editora, at o momento no obtivemos os dados de tiragem das obras em cada

    edio.7 Por exemplo, o livro adotado em cursos de educao a distncia, com primeira capa da Universidade que

    ministra e, a seguir, a capa original da obra.

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    Sumrio da obra - Apresentao- Introduo-5unidades/12 captulos- ndice onomstico-Indicaes bibliogrficas

    - Apresentao- 13 captulos- ndice de nomes -Indicaes bibliogrficas- Sobre a autora

    - Apresentao- Introduo- 12 captulos-Orientao bibliogrfica- Bibliografia bsica- Bibliografia geral- ndice de nomes com breve biografia

    Organizao dos captulos

    - Epgrafe- Contexto histrico- Educao- Pedagogia- Educao Brasileira (a partir do Captulo 7)- Dropes (excertos de autores)- Atividades (questes)-Leiturascomplementares

    - Epgrafe- Contexto histrico- Educao- Pedagogia- Parte II: Educao Brasileira (a partir do captulo 7)- Dropes-Leituras complementares-Atividades (questes, anlise do texto, pesquisa)

    - Introduo- Contexto histrico- Educao- Pedagogia- Dropes- Leitura complementar- Atividades (questes gerais e questes sobre a leitura complementar)- Sites para consulta

    Quanto materialidade, observa-se mudanas significativas da primeira para a terceira edio. Na primeira edio, o formato do livro menor, em relao s demais edies, apresenta 4 mapas e 10 figuras em preto e branco. Na segunda edio, com a mudana do tamanho do volume, h alteraes: a reduo do nmero de pginas, mesmo com o acrscimo de um captulo (sociedades tribais: a educao difusa); a formatao em duas colunas; a incluso de vinte trs imagens novas em preto e branco.

    na terceira edio que se constata mudanas significativas na materialidade da obra e no contedo, um cuidado maior com a diagramao, qualidade do papel, uso de duas cores (os dropes e as atividades so destacados em quadros na cor argila, contrastando com o fundo branco da pgina). A capa e as imagens que introduzem os captulos, em nmero de 12, (pgina par), no tamanho integral da folha, coloridas em duas cores - argila e branco. O uso das imagens ilustrativo, no havendo nenhuma aluso s figuras no corpo do texto.

    Na primeira e segunda edio, as capas no apresentam uma vinculao direta com a temtica da obra. Na figura 1, a capa composta com a foto de uma caixa de giz coloridos. J na figura 2, a capa reproduz o quadro de Tsing-Fang Chen, intitulado Human Achievement.

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    Figura 1: Capa 1989 Figura 2:Capa 1996 Figura 3: Capa 2006

    Na terceira edio (figura 3) h mudanas significativas no projeto editorial, especialmente quanto contracapa, que traz imagens representando diferentes contextos vinculados histria da educao e da escola: uma sala de aula de meninas e outra do Renascimento; uma moa lendo.

    Figura 4: Capa 2006

    Na contracapa: uma sala de aula; poetisa grega Safo; uma estudante frente ao computador (figura 5).

    Figura 5: Contracapa (2006)

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    Em todas as edies, a contracapa apresenta uma breve descrio da obra, ressaltando sua importncia e inovao. Um destaque ressaltado da autora integrar a discusso dos aspectos polticos, econmicos e sociais vinculados educao, e buscar nos pressupostos filosficos o fio condutor que auxilia a interpretao dos fatos histricos. Outra inovao mencionada o fato de abordar a educao e a pedagogia como tpicos separados, com referncia ao contexto histrico de cada perodo. Tambm informa ao leitor interessado, que a educao brasileira no constitui uma unidade parte, mas se acha integrada histria da educao universal. Essa sistemtica se mantm, com a observao de que um diferencial em relao s obras similares. No entanto, a partir do captulo referente ao Renascimento: humanismo e Reforma, a organizao dos captulos divide-se em duas partes: uma geral e outra relativa ao Brasil, como unidades distintas, sem conexo.

    A obra segue uma dinmica organizacional com pouca variao entre as edies: apresentao da obra e uma introduo elementos sempre presente, assim como o ndice de nomes e indicaes bibliogrficas. Na primeira edio (1989), a obra esta dividida em cinco unidades, com 12 captulos. Essa diviso desaparece nas demais edies, somente variando o nmero de captulos: 13 (1996) e 12 (2006).

    Quadro 2. Unidade/Captulos e Tpicos nos Sumrios das trs edies

    1989 1996 2006

    Unidade Captulo Captulos

    I. Questes preliminares1. Introduo Filosofia2. A importncia da histria da educao

    1. Importncia da histria da educaoIntroduo: Histria e histria da educao

    II. A Educao na Antiguidade3. Antiguidade Oriental: a educao tradicionalista4. Antiguidade grega: a paidia5. Antiguidade romana: a humanitas

    2. Sociedades tribais: a educao difusa3. Antiguidade Oriental: a educao tradicionalista4. Antiguidade grega: a paidia5. Antiguidade romana: a humanitas

    1. Comunidades tribais: a educao difusa2. Antiguidade Oriental: a educao tradicionalista3. Antiguidade grega: a paidia4.Antiguidade romana: a humanitas

    III. A Educao medieval6. Idade Mdia: a formao da f

    6. Idade Mdia: a formao do homem de f

    5. Idade Mdia: a educao mediada pela f

    IV. A Educao Moderna (universal e brasileira)7. Renascimento: a nova imagem do homem8. Idade Moderna: a pedagogia realista9. Iluminismo: o ideal liberal de educao

    7. Renascimento: humanismo e ReformaParte I: A nova imagem do homemParte II. Brasil: incio da colonizao e catequese8. Idade Moderna: a pedagogia realistaParte I: O sculo do mtodoParte II. Brasil do sculo XVII9. Sculo das Luzes: o ideal liberal de educaoParte I: A pedagogia liberal e laicaParte II. Brasil na era pombalina

    6. Renascimento: humanismo, Reforma e ContrarreformaParte I: Renascena europeiaParte II. Brasil: catequese e incio da colonizao7. Sculo XVII: a pedagogia realistaParte I: O sculo do mtodoParte II. Brasil do sculo XVII8. Sculo das Luzes: o ideal liberal de educaoParte I: A pedagogia liberal e laicaParte II. Brasil na era pombalina

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    V. A Educao Contempornea (universal e brasileira)10. Sculo XIX: a organizao da educao nacional11. Sculo XX: a educao para a democracia12. A educao brasileira no sculo XX

    10. Sculo XIX: a educao nacionalParte I: A organizao da educao pblicaParte II. Brasil: a educao no Imprio11. Sculo XX: a educao para a democracia12. Brasil no sculo XX: o desafio da educao

    9. Sculo XIX: a educao nacionalParte I: A organizao da educao pblicaParte II. Brasil: de colnia a Imprio10. Educao para a democracia11. Brasil: a educao contempornea

    13. A educao no terceiro milnio 12. Para onde vai a educao?

    Para Aranha (1989, p. 15), a obra tem um olhar prospectivo histria da educao. Isto , pretende que o leitor, ao findar a leitura e realizar as atividades recomendadas, que no caia no desalento e nem tenha um sonho visionrio, mas que o conhecimento histrico adquirido permita os meios adequados para que torne o projeto de mudana da educao realmente exequvel. Dessa perspectiva, a organizao interna de cada captulo, depois dos tpicos de contedo, apresenta a seo Dropes, que consiste em excertos curtos de informao, curiosidades, que tm a funo de oferecer uma diversificao temtica, com fatos pitorescos do perodo estudado.

    Quantos alunos passavam por uma escola [grega]? Veja o exemplo de Iscrates que, em mais de 50 anos de magistrio, recebeu pouco mais de cem alunos... (Janine Assa, 1989, p. 58).

    Veja alguns grafites representativos da revolta estudantil de 1968: proibido proibir; No mude de emprego, mude o emprego de sua vida; A barricada fecha a rua, mas abre o caminho; o sonho a realidade; [...]. (nas trs edies)

    A seguir, o manual tem a seo Leituras complementares, que, segundo a autora, objetiva ampliar as discusses e colocar o aluno em contato com textos originais de diferentes autores. Na primeira e segunda edio h permanncia das indicaes, com algumas incluses decorrentes da alterao formal da distribuio do contedo da obra: o novo captulo Sociedades Tribais: a educao difusa, com o texto de Pierre Clastres intitulado A tortura nas sociedades primitivas; o captulo A educao no terceiro milnio, com duas leituras (Eduardo Galeano O futebol; Adam Schaff Homo studiosus homo universalis); a de Luiz Alves de Matos para o Brasil no sculo XVII - A Educao e a realidade social; e a de Fernando de Azevedo sobre a reforma pombalina.

    Na terceira edio, a seo reformulada, mantendo poucos dos textos das edies anteriores. H uma reformulao significativa, com a presena de autores mais atuais e representativos da Nova Histria, Histria Cultural, Histria da educao, nacionais e internacionais.

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    Quadro 3. Textos e autores da seo Leituras complementares.

    Captulos 1989/1996 2006

    Introduo A Escola nica. GramsciA Histria da Educao. Saviani.

    Destruio da memria.

    O Trabalho do Historiador. Andre Burguire

    Para que a histria da educao? Antnio Nvoa

    Sociedades Tribais: a educao difusa (1996)

    A tortura nas sociedades primitivas. Pierre Clastres

    A tortura nas sociedades primitivas. Pierre Clastres

    Amrico Vespcio tinha razo. Paula Caleffi

    A Educao na Antiguidade

    Jornada ao Oriente. Theodore Roszak

    A Educao como converso da alma. Plato

    A Educao. AristtelesDos Deveres. Ccero

    A Educao da criana. Quintiliano

    A palavra, a escrita e o sujeito. Georges Kutukdjam

    Civilizao e Barbrie. Aranha e MartinsA Educao como converso da alma.

    PlatoArtes liberais e artes mecnicas. Aristteles

    O que ser cidado. Jaime PinskyA Educao da criana. QuintilianoO ensino do direito. H-I Marrou

    A Educao Medieval O Pedagogo. Clemente de Alexandria

    Cristo ensina interiormente, o homem avisa exteriormente pelas

    palavras. Santo AgostinhoAs confisses de Golias.

    Educao e imaginrio popular. Franco Cambi

    A Educao Moderna.Universal e Brasil

    Carta de Gargantua e Pantagruel. Rabelais

    Fragmentos de Ensaio. MontaigneRegras do Ratio Studiorum.

    Leonel FrancaA Educao dos culumins. Gilberto

    FreireDidtica magna. Comnio

    A Educao e a realidade social. Luiz A. de Mattos

    Fragmentos de Emlio. RousseauA etiqueta no Antigo Regime.

    Renato J. RibeiroA reforma pombalina. Fernando de

    Azevedo

    Regras do Ratio Studiorum. Leonel Franca

    A Maloca indgena. K. Hamada e Valria Adissi

    Didtica magna. ComnioA Educao e a realidade social. Luiz A. de

    MattosA Educao de Emlio. RousseauA cultura moral. Immanuel Kant

    A educao da mulher. Maria B. Nizza da Silva

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014 525

    A EducaoContempornea

    Universal e Brasil

    O Panopticon. Michel FoucaultO Ateneu. Raul Pompia

    A Educao no Imprio. Fernando de Azevedo

    Democracia e Educao. J. DeweyAs pedagogias no-diretivas. G.

    SnydersO Trabalho Pedaggico. Ildeu M.

    CoelhoA situao da Filosofia. Marilena

    Chau

    A Bildung alem. Franco CambiO Panopticon. Michel Foucault

    Escolas de improviso. Luciano Faria F e Diana Vidal

    Democracia e Educao. J. DeweyAs pedagogias no-diretivas. G. Snyders

    O todo tem suas qualidades prprias. Edgar Morin

    Desafios presentes e futuros. Srgio Haddad e M. Clara Pierro

    A organizao dos conhecimentos da criana. Ansio Teixeira

    Forma e contedo. Dermeval Saviani

    A Educao no terceiro milnio (1996)

    Para onde vai a educao (2006)

    O futebol. Eduardo GaleanoHomo studiosus homo universalis.

    Adam Schaff

    Escola, comunidade com projeto. Isabel Alarco

    O potencial da democratizao. Ladislau Dowbor

    Aps a seo Leituras complementares, so apresentadas Atividades, divididas em questes gerais, que procuram orientar a compreenso do captulo, a partir de perguntas com vrios nveis de complexidade; e questes sobre as leituras complementares, que pretendem ampliar as discusses e temas de pesquisa. Na terceira edio, essa seo reformulada e aumentada significativamente, orientando pesquisas para que o aluno v alm. Esse fato decorre do aumento dos contedos trabalhados em cada captulo e das leituras complementares, o que pode ser uma evidncia da preocupao com a ampliao do conhecimento do aluno, instigando-o para ir alm do texto, mesmo que seja conduzido pelas atividades propostas.

    Por exemplo, no captulo 11 Brasil: educao contempornea, a autora prope a anlise do artigo 213 da Constituio de 1988, sobre os recursos pblicos serem destinados s escolas pblicas, podendo ser dirigidos s escolas comunitrias, confessionais ou filantrpicas, definidas em lei, so propostas duas questes:

    a) Explique o teor da polmica que antecedeu a aprovao desse artigo no Congresso Constituinte.

    b) Faa referncias a fatos da histria da educao brasileira que justifiquem como esta questo da destinao das verbas pblicas bem antiga. (2006, p.353)

    Quanto ao ndice onomstico/de nomes no h alterao nas duas primeiras edies. Na terceira edio, a autora acrescenta uma brevssima biografia (ano de nascimento e morte) e algum dado de identificao: AZEVEDO, Fernando (1894-1974). Educador, crtico, ensasta e socilogo (2006, p. 375)8.

    8 Esses acrscimos muitas vezes no caracterizam objetivamente o autor. Por exemplo: CAMARA BASTOS, Maria Helena. Professora e pedagoga brasileira contempornea (2006, p.376), quando, na realidade, a formao em Histria.

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    A seo Indicaes bibliogrficas/orientao bibliogrfica, que tem o objetivo de ampliar as possibilidades de pesquisa (2006, p. 10), dividida em vrias subsees, no havendo alteraes significativas entre a primeira para a segunda edio. H somente um remanejamento de ttulos, com poucas referncias novas [17 ttulos, especialmente na bibliografia geral, com a incluso de obras tanto brasileiras (Luiz Alves de Matos, Marta Kohl de Oliveira, Maria Elizabete Xavier, outros ttulos de Dermeval Saviani), como estrangeiras (Jsus Palcios, Boaventura de Souza Santos, Adam Schaff, L. Vykotsky)]. H uma nica referncia de autor estrangeiro da rea da Histria: Philippe Aris Histria social da criana e da famlia. As Colees so da prpria editora Moderna (Logos, Polmica), da Cortez (Polmicas do nosso tempo) e da Brasiliense (Primeiros passos, Primeiros voos, Tudo Histria).

    Quadro 4: Indicaes bibliogrficas/Orientao bibliogrfica

    1989 - 1 ed. Indicaes bibliogrficas

    (p.284-288)

    1996 - 2 ed.Indicaes bibliogrficas

    (p.249-254)

    2006 - 3 ed.Orientao bibliogrfica

    (p.370-374)

    Introduo Filosofia (10 obras)

    Histria da Educao (14 obras) Histria da educao e da pedagogia (21 obras)

    Histria da Filosofia (7 obras) Histria Geral e do Brasil (9 obras) Dicionrios (pedagogia, filosofia, histria e outros) (10 obras)

    Dicionrios de Filosofia (7 obras)

    Histria da Filosofia (8 obras) Revistas (10)

    Dicionrios de Pedagogia (6 obras)

    Introduo Filosofia (13 obras) Colees (11 obras)

    Histria da Educao (12 obras) Dicionrios de Pedagogia (7 obras) Orientao para trabalhos (2 obras)

    Revistas (5) Dicionrios de Filosofia (8 obras) Bibliografia geral (86 obras)

    Colees (6 obras) Revistas (5)

    Orientao para trabalhos (2 obras)

    Colees (8 obras)

    Bibliografia geral (55 obras) Orientao para trabalhos (3 obras)

    Bibliografia geral (68 obras)

    Na terceira edio, a orientao bibliogrfica altera-se tanto na organizao quanto nos ttulos. H tambm um aumento expressivo nas revistas indicadas, mantendo as da primeira e segunda edio (Cadernos Cedes, Cadernos de Pesquisa, Educao & Sociedade, Frum Educacional, Revista da Andes), com novos ttulos Educao, Pr-Posies, Revista Brasileira de Educao, Revista Brasileira de Histria da Educao, Revista Nova Escola. Nas obras que compem a bibliografia geral importante destacar os autores estrangeiros de presena significativa no cenrio nacional, especialmente nos cursos de formao de professores - Jacques Delors, Edgar Morin, Jaume Carbonell Sebarroja.

    A subseo Histria da Educao traz os manuais clssicos da disciplina, que esto presentes nos planos da disciplina desde o incio do sculo XX. Por exemplo, a

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    obra de Francisco Larroyo de 1944, mas a autora indica a quarta edio atualizada (Ed. Mestre Jou, 1974), que apresenta o apndice de Clio Cunha A Educao no Brasil. H tambm um remanejamento de referncias entre os tpicos: a obra Tratado de Cincias Pedaggicas (DEBESSE; MIALARET, 1974), primeiro volume compunha a bibliografia geral; em 2006, indicado o segundo volume.

    H uma atualizao na bibliografia da histria da educao e da pedagogia (Geral e Brasil), com a incorporao de ttulos publicados a partir de 2000 (Franco Cambi, Maria Lcia Hilsdorf, Mario Manacorda, Maria Stephanou & Maria Helena Camara Bastos9,Diana Vidal, Saviani & Lombardi, Sociedade Brasileira de Histria da Educao).

    Quadro 5. Indicaes bibliogrficas de Histria da Educao10

    Histria da Educao (1989 e 1996) Histria da Educao e da Pedagogia (2006)

    ABBAGNO&VISALBERGHI. Histria da pedagogia (1957/1981-82)

    ABBAGNO&VISALBERGHI. Histria da pedagogia (1957/1981-82)

    EBY, Frederick. Histria da educao moderna (1952/1962)

    CAMBI, Franco. Histria da Pedagogia (1996)

    HUBERT, Ren. Histria da Pedagogia. (1949/1957) DEBESSE&MIALARET. Tratado de Cincias Pedaggicas (1974)

    LARROYO, Francisco. Histria Geral da Pedagogia (1944/1974)

    EBY, Frederick. Histria da educao moderna (1952/1962)

    LUZURIAGA, Lorenzo. Histria da Educao e da Pedagogia (1951/1955)

    GADOTTI, Moacir. Pensamento Pedaggico brasileiro (1995)

    LUZURIAGA&MEDINA. Histria da educao pblica (1959)

    HILSDORF,M.L.Histria da educao brasileira: leituras (2005)

    LUZURIAGA&MEDINA. A pedagogia contempornea (1951)

    HUBERT, Ren. Histria da Pedagogia (1949/1957)

    MONROE, Paul. Histria da Educao (1905/1939) LARROYO, Francisco. Histria Geral da Pedagogia (1944/1974)

    PONCE, Anbal. Educao e lutas de classe (1934/1968)

    LOMBARDI&NASCIMENTO.Fontes, histria e historiografia da educao (2004)

    RIBEIRO, M.L. Histria da educao brasileira (1986)

    LUZURIAGA, Lorenzo. Histria da Educao e da Pedagogia (1951/1955)

    ROMANELLI, Otaza. Histria da Educao no Brasil (1978)

    MANACORDA, Mrio. Histria da educao: da antiguidade aos nossos dias (1983/1989)

    ROSA, M. Glria. A histria da educao

    atravs de textos (1971)

    MARROU, H-I. Histria da educao na

    Antiguidade (1948/1969)

    9 A Coleo organizada pelas autoras - Histria e Memrias da educao no Brasil (Vozes, 3 v. 2004/2005) - amplamente utilizada em excertos nas sees Leituras complementares e/ou Dropes (com 12 referncias)

    10 Optou-se em colocar a data primeira edio da obra e da traduo no Brasil, pois esses manuais tiveram vrias edies, e no a indicada pela autora, para evidenciar a permanncia de alguns clssicos da rea.

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014528

    *MARROU, H-I. Histria da educao na

    Antiguidade (1948/1969)

    MONROE, Paul. Histria da Educao

    (1905/1939)

    *XAVIER, M.E ata lii. Histria da educao.

    A escola no Brasil (1974)

    PONCE, Anbal. Educao e lutas de classe

    (1934/1968)

    RIBEIRO, M.L. Histria da educao

    brasileira (1986)

    ROMANELLI, Otaza. Histria da Educao

    no Brasil (1978)

    ROSA, M. Glria. A histria da educao

    atravs de textos (1971)

    SAVIANI, D (org.). Histria e Histria

    da educao: o debate terico-metodolgico atual

    (2000)

    SAVIANI, D (org.). O legado educacional do

    s4culo XX no Brasil (2004)

    SBHE. Educao no Brasil: histria e

    historiografia (2001)

    STEPANOU&BASTOS (org). Histrias e

    memrias da educao no Brasil (3 v. 2004/2005)

    VIDAL&HILSDORF. Brasil, 500 anos:

    tpicos em Histria da Educao (2000). * Somente na 2 edio (1996)

    O amplo espectro de autores recomendados e citados evidencia que a escrita dos manuais resulta de ampla pesquisa bibliogrfica, de obras clssicas da historiografia da histria da educao, incorporando, na terceira edio, obras de pesquisadores representativos de uma nova viso da disciplina na perspectiva de uma histria cultural, especialmente quanto histria da educao brasileira.

    Quanto circulao, alm do fato de ter trs edies revistas e ampliadas, h vrios indcios da permanncia de adoo/utilizao do manual de Aranha. Dcio Gatti (2009), ao analisar programas de ensino da disciplina de 55 cursos de Pedagogia no Brasil, lista os autores mais citados e o nmero de citaes: Maria Lcia Aranha aparece em 18 planos. Mora Garcia (2011, p153), ao abordar a Histria da Educao no Brasil no estudo comparado que faz com Argentina, Colmbia e Venezuela, elenca Aranha entre algumas das obras mais representativas da rea. Em 2013, a revista Nova Escola, da Editora Abril, publicou uma srie Histria da Educao no Brasil: de onde vem para onde vai a escola brasileira11, em seis nmeros de junho a dezembro. Os textos decorreram de entrevistas com pesquisadores da rea, mas as jornalistas tambm consultaram e indicaram a obra de Aranha, que podemos pensar ter sido um guia que orientou a srie.

    11 1. Incio da Colnia: O ensino como catecismo (jun/jul. 2013); 2. Fim da Colnia e Imprio: Mestres quase nobres (ago.2013); 3. Primeira Repblica: Um perodo de reformas (set. 2013); 4. Era Vargas: Profuso de ideias (out. 2013); 5. Ditadura Militar: As aulas para o trabalho (nov. 2013); 6. Ps-ditadura at os dias de hoje: Qualidade para todos (dez. 2013).

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014 529

    Histria, Histria da Educao e da Pedagogia

    O tempo o sentido da vida. (sentido: como se diz o sentido de um riacho, o sentido de uma frase, o sentido de um pano,o sentido do odor). Paul Claudel

    A epgrafe de Paul Claudel abre as duas primeiras edies da obra de Maria Lcia Aranha. o mote para abordar as noes de tempo, histria, memria, histria da educao. A autora apresenta a ideia que o homem feito de tempo e, dessa forma, sujeito da histria, se autoproduz e ao mesmo tempo produz sua prpria cultura (1996, p. 15).

    A abordagem dos conceitos histria, histria da educao e da pedagogia est presente nas trs edies. Na primeira (1989), integra a unidade 1 - Questes preliminares -, com dois tpicos: Introduo Filosofia (com a subdiviso: Introduo, As distores do processo, As consequncias para a educao, A importncia da filosofia, Educao e ideologia, Concluso); A importncia da histria da educao (com a subdiviso: o homem um ser histrico, A histria da histria, A histria da educao, Um olhar prospectivo). Na segunda edio (1996), o ttulo altera-se para Importncia da histria da educao, com sete partes, que mantm praticamente a mesma diviso anterior, com pequenas variaes (O homem feito de tempo, Educao e ideologia, Questionando a educao, Reconstituindo o passado, A histria da histria, Histria da educao, Um olhar prospectivo). Na terceira edio (2006), o tpico Histria e Histria da Educao a introduo do livro, com as unidades: Somos feitos de tempo; A histria da histria, com o subitem - As antigas concepes de histria, Histria moderna e contempornea; Histria da Educao; Concluses. Para a autora, o captulo introdutrio tem o objetivo de distinguir duas funes da histria da educao: a de docncia e a de pesquisa, ambas exercendo influncia na poltica educacional (2006, p. 25).

    Na primeira edio (1989), na apresentao, Aranha afirma que toda histria da educao pressupe uma filosofia da educao, que fornece o fio condutor. Nessa perspectiva, na primeira unidade questes preliminares, apresenta uma introduo filosofia, salientando sua importncia para a educao. A partir da epgrafe de Bernard Charlot, retirada de sua obra A mistificao pedaggica: realidades sociais e processos ideolgicos na teoria da educao (1983), esboa as finalidades da educao

    Definir os fins educativos definir, ao mesmo tempo, a sociedade, a cultura e o homem que se quer promover. Educar realmente cultivar a criana para dela fazer um homem. (...) Toda imagem do homem uma imagem social. Fixar fins para a educao escolher um tipo de homem, portanto de homem social, portanto de sociedade. Elaborando fins educativos, opta-se por um modelo, ao mesmo tempo, do homem e da sociedade. Essa escolha no abstrata e intemporal. H tantas escolhas possveis quanto classes e grupos em conflito, pois a determinao dos fins pedaggicos exprime esse conflito. (CHARLOT, 1983, apud ARANHA, 1989, p. 2)

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014530

    Com esse mote, a autora pretende explicitar os principais conceitos que vai utilizar ao longo de sua obra: histria, como interpretao da ao humana transformadora no tempo; pedagogia, como teoria crtica da educao, isto , da ao do homem ao transmitir ou modificar a herana cultural; condio humana, como resultante do conjunto das relaes sociais; ideologia, como fenmeno tpico da sociedade dividida em classes, em que a classe dominada no percebe a diviso existente e assume os valores da classe dominante, no atingindo a conscincia prpria da classe a que pertence (1989, p. 8). Aborda, ainda, a histria da histria, trazendo as diferentes concepes tericas: o positivismo, com as noes de processo, progresso; a dialtica marxista; a Escola dos Annales; o ps-modernismo.

    Para a Histria da educao assinala a importncia de estud-la a partir do contexto histrico, pois considera que as questes de educao so engendradas nas relaes que os homens estabelecem ao produzir sua existncia (1996, p.19). Alm disso, assinala que se conhece melhor a histria da pedagogia ou das doutrinas pedaggicas do que propriamente das prticas efetivas da educao. Para referendar sua opinio, apoia-se em Casemiro dos Reis Filho12, que assinala a necessidade de estudos analticos da realidade educacional, a fim de que o conhecimento histrico seja capaz de fornecer reflexo filosfica o contedo da realidade sobre a qual se pensa, tendo em vista descobrir as diretrizes e coordenadas da ao pedaggica (REIS FILHO, 1981, p.2, apud ARANHA, 1996, p. 19).

    Na introduo da terceira edio (2006), com o avano da rea da Histria da Educao como disciplina e campo de pesquisa, Aranha cita a fundao da Sociedade Brasileira de Histria da Educao/SBHE (2000). Apresenta a fala de Dermeval Saviani, que tambm salienta a importncia da dimenso histrica dos problemas enfrentados, no apenas para manter e deixar disponvel o registro das informaes, mas alertar os responsveis pelos rumos da educao no pas trazendo baila, nos momentos oportunos, as informaes que, por ofcio, eles detm (2006, p.26).

    Aranha, ao finalizar a introduo nas trs edies, indica ao leitor o fio condutor que a orientou na elaborao dos captulos do livro e que deve ser a meta de toda educao a busca de uma escola verdadeiramente democrtica, entendida como:

    escola universal, leiga e gratuita; escola nica, que no separe formao e profissionalizao, saber e fazer, trabalho intelectual e trabalho manual; integrao entre escola e comunidade; adequada formao dos educadores quanto aos trs aspectos de competncia, politizao e profissionalizao, e ainda mais, visando formao de educadores, como tambm de pedagogos, historiadores da educao, cientistas da educao e filsofos da educao. (ARANHA, 1989, p. 9)

    A autora considera que o conhecimento proporcionado pela histria da educao e da pedagogia possibilita atingir as metas que prope ao leitor, a partir de um olhar prospectivo, que permita buscar os meios adequados que tornem o projeto de mudana da educao realmente exequvel (1996, p.20). interessante observar que a autora

    12 A Educao e a iluso liberal (1981)

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014 531

    visa com sua obra no s a formao de pedagogos, mas de historiadores da educao, cientistas da educao, filsofos da educao, sem explicitar qual o papel de cada um.

    Finalizando

    A anlise das edies da obra de Maria Lcia Arruda Aranha, uma produo acadmica para subsidiar a disciplina Histria da educao nos cursos de formao docente, tanto de ensino mdio como superior, uma referncia na rea, pela circulao e apropriao, conforme j assinalado. Pelo contedo e estrutura, sinaliza para uma tradio disciplinar adotada ao longo do sculo XX e ainda hoje presente nos cursos de formao de professores; em concursos.

    O manual analisado apresenta as quatro grandes caractersticas identificadas por Nvoa (1994, p.31): uma ateno privilegiada s ideias dos grandes educadores do passado, as quais so apresentadas quase sempre a partir de um mesmo olhar e, muitas vezes com palavras idnticas; uma evocao cronolgica, que inicia, regra geral, nos tempos mais remotos das civilizaes primitivas e termina com os educadores do sculo XXI; uma ideologia progressista (conservadora), no sentido de que a educao contada como uma epopeia e como um movimento de aperfeioamento da humanidade; uma concepo positiva, de crena nas potencialidades do novo movimento cientfico (cincia da educao, psicologia, sociologia), bem ilustrada pelo captulo final destes manuais13.Mesmo trazendo em todos os captulos o contexto histrico de cada poca, Aranha adota, conforme Nvoa (1994), a perspectiva de apresentar o processo civilizacional visto pelos fatos educativos e perspectivas pedaggicas.

    Os manuais so dispositivos discursivos que nos permitem apreender o universo da Histria da Educao tal como ele tem sido concebido e ensinado. Em uma perspectiva diacrnica, sublinha-se a permanncia, em grande parte, das finalidades, perspectivas, temas e contedos, que chegam at aos dias de hoje (MOGARRO, 2007, p. 215), assim como as categorias de temporalidade, facticidade e memorialidade que marcam a investigao e ensino no campo disciplinar (SANTOS, 2007, p.232).

    Para Magalhes (2011, p. 9), o manual escolar, no plano histrico, muro do tempo e memria do futuro, pois d configurao, ordem e significado cultura escolar e faz da escolarizao o caminho do futuro. Permite aos pesquisadores analisar o conhecimento veiculado, os referenciais privilegiados, a consonncia com os programas de ensino recomendados e a experincia docente do autor.

    No Brasil, enquanto a dcada de noventa, do sculo XX, foi dedicada ampliao da pesquisa e da discusso historiogrfica da educao, com novos temas e com novas e mltiplas abordagens (GHIRALDELLI, 1993, p.50); a primeira dcada do sculo XXI necessita centrar esforos no sentido de se aproximar da sala de aula, dos cursos de formao de professores, da rica produo de pesquisa, revendo os contedos,

    13 Esses modelos difundiram-se por todo o mundo ocidental, com vistas oficializao de uma ordem escolar e de saberes pedaggicos modernos (CARUSO, 2003, p. 1), que, desde os finais do sculo XIX, tm sido um empreendimento mundial, universal e universalista (SCHRIWER, 2001), especialmente para a profissionalizao docente.

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014532

    procedimentos didticos e bibliografia dos programas das disciplinas de Histria da Educao e da Histria da Educao do Brasil. Nessa perspectiva, a anlise dos manuais que circulam nessas primeiras dcadas do sculo XXI permite que avancemos na proposta e ampliao da disciplina, na graduao14 e ps-graduao, instigando os professores a terem novos olhares e adotarem novas abordagens na produo de materiais didticos, em diferentes mdias.

    Uma pergunta que nos instiga como pesquisadores: porque da longevidade da adoo do manual de Maria Lcia Arruda Aranha? Podemos aventar algumas hipteses: boa aceitao e estmulo do mercado editorial; a estrutura formal dos currculos, que se refletem nos modelos dos manuais; os concursos que mantm a tradio historiogrfica da disciplina; a condensao do contedo disciplinar em um nico dispositivo; as compras significativas que faz o governo federal para o programa da biblioteca escolar.Para Gatti (2004), a permanncia de uma obra est muito relacionada capacidade das editoras disponibilizarem, a ttulo de propaganda, exemplares dos livros aos professores responsveis pelas disciplinas a que a obra se vincula, o que muito caro, sendo que poucas tm esta possibilidade. Assim, lembrando que este contedo de Histria da Educao esteve relacionado at pouco tempo com a Habilitao Especifica do Magistrio e presente em inmeros cursos de Pedagogia no Brasil, parece ser esta uma hiptese expressiva, mas que merece maior investigao.

    Referncias

    ARANHA, Maria Lcia Arruda. Histria da Educao. So Paulo: Moderna, 1989.

    ARANHA, Maria Lcia Arruda. Histria da Educao. So Paulo: Moderna, 1996. (2 ed. rev. ampl.)

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    14 O desafio estender a disciplina para os demais cursos de formao de professores, pois os futuros docentes devem ter oportunidade de refletir sobre a natureza, as finalidades, as origens e as transformaes do seu ofcio, o que contribui tanto para o desenvolvimento da reflexo pedaggica como para o debate democrtico sobre a educao nas sociedades (MEIRIEU, 1998, p.XIV). Em algumas universidades do Rio Grande do Sul (UFRGS, UNISINOS, UNILASALLE), a disciplina tambm ministrada para as outras licenciaturas, como obrigatria ou optativa. Um exemplo, da UNILASALLE (Canoas/RS), em que a disciplina Histria da Educao ministrada em 90% dos cursos de licenciatura, com a carga horria de 60 a 72 horas-aula. A incluso da disciplina, como obrigatria nos demais cursos, foi efetivada a partir de 1999, no curso de Filosofia; de 2000 a 2002 nos demais cursos.

  • Cadernos de Histria da Educao v. 13, n. 2 jul./dez. 2014 533

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    Recebido em abril de 2014Aprovado em junho de 2014