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Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado) Convênio: UNESP/INCRA/Pronera Parceria: Escola Nacional Florestan Fernandes ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE DAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO DO CAMPO, ENTRE O ESTADO E O MOVIMENTO SEM TERRA NA ESCOLA DO ASSENTAMENTO “VALDICIO BARBOSA DOS SANTOS” NO MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DA BARRA ES. RONIMARCIA MARTINS LIMA Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr .Bernardo Mançano Fernandes Co-orientador: Rodrigo Simão Camacho Monitora: Eliete de Carvalho Margutti Presidente Prudente 2011

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Page 1: BARRA ES. RONIMARCIA MARTINS LIMA · 2.2 - a educaÇÃo do campo a partir dos princÍpios pedagÓgicos-polÍticos-filosÓficos do mst 33 2.3 - a educaÇÃo do campo nas Áreas de

Câmpus de Presidente Prudente Curso de Graduação em Geografia (Licenciatura e Bacharelado)

Convênio: UNESP/INCRA/Pronera

Parceria: Escola Nacional Florestan Fernandes

ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE DAS POLÍTICAS DE

EDUCAÇÃO DO CAMPO, ENTRE O ESTADO E O MOVIMENTO

SEM TERRA NA ESCOLA DO ASSENTAMENTO “VALDICIO

BARBOSA DOS SANTOS” NO MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DA

BARRA – ES.

RONIMARCIA MARTINS LIMA

Monografia apresentada ao Curso Especial de Graduação em

Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convênio

UNESP/INCRA/Pronera, para a obtenção do título de

Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Prof. Dr .Bernardo Mançano Fernandes

Co-orientador: Rodrigo Simão Camacho

Monitora: Eliete de Carvalho Margutti

Presidente Prudente

2011

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ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE DAS POLÍTICAS DE

EDUCAÇÃO DO CAMPO, ENTRE O ESTADO E O MOVIMENTO

SEM TERRA NA ESCOLA DO ASSENTAMENTO “VALDICIO

BARBOSA DOS SANTOS” NO MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DA

BARRA – ES.

RONIMARCIA MARTINS LIMA

Trabalho de monografia apresentado ao Conselho do curso de

Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia, campus de

Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista, para

obtenção do título de Licenciado e Bacharel em Geografia.

Orientador: Prof. Dr. Bernardo Mançano Fernandes

Presidente Prudente

2011

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Ronimarcia Martins Lima

ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE DAS POLÍTICAS DE

EDUCAÇÃO DO CAMPO, ENTRE O ESTADO E O MOVIMENTO

SEM TERRA NA ESCOLA DO ASSENTAMENTO “VALDICIO

BARBOSA DOS SANTOS” NO MUNICÍPIO DE CONCEIÇÃO DA

BARRA – ES.

Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do

título de Bacharel em Geografia da Universidade Estadual

Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, submetida à aprovação da

banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Presidente Prudente, novembro de 2011

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DEDICATÓRIA

Este trabalho é dedicado Aos educandos e

educandas da EEEF Valdício Barbosa dos

Santos pela confiança e estimulo ao meu

trabalho e estudo.

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AGRADECIMENTOS

Ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, pela oportunidade ao estudo e a inserção na

luta pela transformação da sociedade.

Aos companheiro/as do Setor de Educação do MST, quem me confiou à tarefa ao estudo da

geografia.

A EEEF Valdício Barbosa dos Santos pela contribuição em minha formação política e pedagógica.

Em especial aos educadores/as educandos/as conselho de escola/ merendeira/serventes e todos que

de maneira direta ou indireta contribuíram com o meu crescimento.

A Escola Nacional Florestan Fernandes pelo compromisso com a formação de quadros e

emancipação da classe trabalhadora.

A Turma Milton Santos pelos grandes momentos de alegria e de aprendizado.

Ao meu co-orientador Rodrigo Simão Camacho por acreditar na Educação do Campo como

ferramenta de luta da classe trabalhadora e ao estímulo e ajuda na conclusão de minha pesquisa.

Ao Prof. Dr. Bernardo Mançano Fernandes pelo desafio na criação do curso de Geografia e

orientação a minha pesquisa.

Ao Prof. Dr. Clifford Welch pela visita a minha comunidade e estímulo a minha pesquisa.

A monitora Yamila pela amizade e confiança e pelo estímulo aos primeiros passos de minha

pesquisa.

A minha grande amiga Daniele Batista pela imensa amizade e ajuda nesta caminhada.

A minha monitora Eliete de Carvalho Margutti pelo companheirismo, compreensão e ajuda na

elaboração de minha pesquisa.

A família Paim Valmir, Dina, Igor e Iris pela amizade e incentivo a todas as tarefas a mim

confiadas.

E em especial o meu companheiro Josias Resende da Silva pela compreensão e estímulo aos meus

estudos.

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Construtores do Futuro

Eu quero uma escola do campo

que tenha a ver com a vida, com a gente

querida e organizada

e conduzida coletivamente.

Eu quero uma escola do campo

que não enxergue apenas equações

que tenha como “chave mestra”

o trabalho e os mutirões.

Eu quero uma escola do campo

que não tenha cercas que não tenha muros

onde iremos aprender

a sermos construtores do futuro.

Eu quero uma escola do campo

onde o saber não seja limitado

que a gente possa ver o todo

e possa compreender os lados

Eu quero uma escola do campo

onde esteja o ciclo da nossa semeia

que seja como a nossa casa

que não seja como a casa alheia.

(Gilvan Santos)

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RESUMO

O presente trabalho buscou compreender a articulação e a conflitualidade das políticas de Educação

do Campo existentes entre o estado e o MST na escola do assentamento Valdício Barbosa dos

Santos. Para isso, fizemos uma análise da implementação da proposta político-pedagógica do MST

na escola, e sua contribuição na formação e organicidade do assentamento. A análise da

contribuição da escola para o assentamento foi feito através da interpretação dessa proposta

político-pedagógica na escola, buscando compreender a contribuição da escola na formação do

assentamento a partir da implementação dos princípios políticos- pedagógicos e filosóficos do MST

na escola. Assim, interpretamos os desafios da escola na formação dos educandos-camponeses

analisando as mudanças ocorridas neste território ao longo destes quinze anos. As informações

colhidas durante a pesquisa de campo serviram de suporte para a análise do assentamento e seu

processo organizativo.

Palavras-chave: Educação do Campo; Políticas de Educação; Território; Organicidade.

RESUMEN

Este estudio busco comprender la articulación y conflictos de las políticas de Educación entre el

Estado y el MST en la escuela del asentamiento Valdício Barbosa dos Santos. Para eso, se analizará

la aplicación de la propuesta político-pedagógica del MST en la escuela, y su contribución a la

formación de la organicidad del asentamiento. El análisis de la contribución de la escuela para el

asentamiento se realiza por medio de la interpretación de la propuesta político-pedagógica en la

escuela, tratando de comprender la contribución de la educación escolar en la formación del

asentamiento a partir de la aplicación de los principios políticos- pedagógicos y filosóficos del

MST en la escuela. Así, interpretamos los desafíos de la escuela en la formación de los estudiantes-

campesinos analizando los cambios en esta área durante estos quince años. Las informaciones

recopiladas durante la investigación de campo sirvieron e apoyo para el análisis del asentamiento y

su proceso de organización

Palabras clave: Educación del Campo, Política de Educación, Territorio, Organicidad.

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LISTA DE SIGLAS

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

CT Cooperativa dos técnicos

SP São Paulo

PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

EPAGRI Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural

PAA Programa de Aquisição de Alimento

PDE Plano de Desenvolvimento da Educação

IBD Índice de Desenvolvimento da Educação Básica

SAEB Sistema de Avaliação da Educação Básica

ENEM Exame Nacional do Ensino Médio

EJA Educação de Jovens e Adultos

MAPAS

MAPA 1 Assentamentos Espírito Santo de 1984-2010 18

MAPA 2 Levanamento cadastral de Imóveis Rurais-Conceição da Barra/ES 23

LISTA DE TABELAS

Tabela 1

Relação dos Assentamentos Resultantes das Negociações com o Governo do

Estado do Espírito Santo.

15

Tabela 2 Assentamentos no município de Conceição da Barra 22

FOTOS

Foto 1 Salas de aula: um barraco de palha e outro de madeira 46

Foto 2 Mutirão com educandos na escola Valdício Barbosa dos Santos 47

Foto 3 Aniversário dos 13 nos do Assentamento 49

Foto 4 Aniversário dos 13 nos do Assentamento 49

Foto 5 Educandos pintando o refeitório da escola 49

Foto 6 Prédio da escola atualmente 50

Foto 7 Educandos trabalhando na horta da escola 55

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Assentamento Valdício Barbosa dos Santos. 20

QUADROS

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Quadro 1 Número de alunos (as) ao longo da existência da escola de acordo as

séries 51

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

1 – A FORMAÇÃO DO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA DOS

SANTOS

12

1.1 - HISTÓRICO DA LUTA PELA TERRA NO ESPÍRITO SANTO E

A CONQUISTA DO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA DOS

SANTOS

12

1.2 – ORGANIZAÇÕES TERRITORIAIS E A HISTÓRIA DO

ASSENTAMENTO

21

1.3 – O ASSENTAMENTO E SUAS FASES: CONQUISTA

EMANCIPAÇÃO, MORALIZAÇÃO E O NOVO ASSENTADO

25

2 – A EDUCAÇÃO DO CAMPO E OS PRINCÍPIOS POLÍTICOS

PEDAGOGICOS-FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO DO MST: A

CONSTITUIÇÃO DA PEDAGOGIA DO MST NO ESPÍRITO SANTO

31

2.1 - A EDUCAÇÃO DO CAMPO 31

2.2 - A EDUCAÇÃO DO CAMPO A PARTIR DOS PRINCÍPIOS

PEDAGÓGICOS-POLÍTICOS-FILOSÓFICOS DO MST

33

2.3 - A EDUCAÇÃO DO CAMPO NAS ÁREAS DE ASSENTAMENTOS

E ACAMPAMENTOS NO ESPÍRITO SANTO

38

2.4 - A PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA E A FORMAÇÃO DE

JOVENS CAMPONESES

40

2.5 - A PROPOSTA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO: ENCONTROS E

DESENCONTROS COM A PROPOSTA DO MST

42

3 – A EDUCAÇÃO NO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA DOS

SANTOS: A ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL E SEUS

DESAFIOS

45

3.1 - A CONQUISTA DA EEEF VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS

POR MEIO DA LUTA PELA TERRA

45

3.2 - ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE NA PROPOSTA

POLÍTICO-PEDAGÓGICA DA EEEF VALDÍCIO BARBOSA DOS

SANTOS: A DISPUTA DE PROJETOS ENTRE O MST E O ESTADO

PARA A FORMAÇÃO DO EDUCANDO-CAMPONÊS

51

CONSIDERAÇÕES FINAIS 58

BIBLIOGRAFIA 61

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INTRODUÇÃO

Esta pesquisa analisa a articulação e a conflitualidade das políticas de Educação do Campo

entre o Estado e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra na escola do assentamento

Valdício Barbosa dos Santos em Conceição da Barra-ES. Tivemos o intuito de compreender se a

escola no assentamento contribui para formação material e simbólica do camponês.

Partimos da concepção de que a educação básica regular não contempla a Educação do

Campo, reforçamos, assim, a idéia de que são projetos diferentes. A educação básica regular ainda é

mera reprodutora do sistema capitalista, pois reforça os princípios de uma educação desigual entre

as classes. No entanto, a Educação do Campo, através do princípio das relações baseadas na

horizontalidade e solidariedade entre campo e cidade, nas formas de poder e da gestão das políticas,

de produção econômica e de conhecimento, são capazes de renovar os valores, atitudes, instigando

e recriando a identidade dos sujeitos na luta pela transformação social, possibilitando a reflexão na

práxis da vida e da organização social do campo, através da pertença à terra a valorização do campo

e emancipação da classe trabalhadora.

A proposta político-pedagógica da escola deve partir do contexto social e das relações

sócio-culturais, políticas e econômicas estabelecidas no território. Sendo capaz de contribuir para

além da grade curricular, tomando sempre o assentamento como a base fundamental da metodologia

de implementação da proposta político- pedagógica na escola, pois a escola deve ser parte integrada

da vida do assentamento, contribuindo na organicidade da comunidade, já que a escola é fruto da

conquista do assentamento além de ser um espaço onde as famílias se reúnem, estudam, e debatem

sobre. Reforçando a idéia de que tudo que acontece na comunidade reflete na escola. E a escola é

responsável em desenvolver sua metodologia, seus tempos, grade curricular e pedagogia da

alternância no fortalecimento deste território.

Essas contribuições reforçam a importância da elaboração do Projeto Político Pedagógico

da escola ser definido por seus sujeitos sociais, vinculados a uma cultura que se produz por meio de

relações mediadas pelo trabalho, entendendo trabalho como produção material e cultural de

existência humana construída a partir das contradições da sociedade, entre campo e cidade, e como

um princípio de classe estabelecido na realidade da comunidade, na luta dos movimentos sociais e

na identidade de classe.

Quando decidimos sobre o objeto de estudo, os objetivos propostos foram: entender como

as propostas de educação do MST e do Estado se articulam e se confllitualizam; identificar as

contribuições da escola na formação do território; pesquisar e analisar o processo histórico e

organizativo do assentamento e a formação de suas fases; pesquisar a contribuição da escola,

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através da pedagogia da alternância, na permanência dos jovens no assentamento; pesquisar a

contribuição da escola na formação da identidade camponesa e se a escola existe no assentamento é

diferente dela não existir.

A metodologia utilizada para a elaboração do trabalho foi primeiro definir o objeto de

estudo determinando o tema norteador com a intenção que este viesse a contribuir na análise da

proposta político e pedagógica da escola pensando a contribuição da escola no processo

organizativo do assentamento. Segundo, estabelecer os objetivos a serem alcançados. Terceiro,

definir um cronograma de trabalho com o orientador Prof. Dr. Bernardo Mançano Fernandes, o co-

orietador Rodrigo Simão Camacho e com o apoio da monitora Eliete Margutti.

A partir do projeto de pesquisa foram apontadas as bibliografias para embasar nosso estudo

com o objetivo de analisar a articulação e conflitualidade das políticas de Educação do Campo entre

o Estado e o MST na escola do assentamento Valdício Barbosa dos Santos, compreendendo como a

escola através de sua proposta político-pedagógica contribui na formação do assentamento.

Para verificar as hipóteses levantadas da contribuição da escola no assentamento foi

realizada uma pesquisa de campo no assentamento, tendo como sujeitos de pesquisa assentados/as,

educadores/as e educandos/as. Os depoimentos coletados aparecem em especial no primeiro e

segundo capítulo. No conjunto dos materiais utilizados tivemos o acesso aos princípios político-

pedagógicos do MST, o currículo da base comum do estado do Espírito Santo e o Projeto político

pedagógico da escola. Possibilitando a análise da pesquisa de campo realizada na comunidade.

No primeiro capítulo buscamos apresentar a formação do assentamento Valdício Barbosa

dos Santos através do histórico da luta pela terra no estado Espírito Santo, as principais ocupações e

formação de assentamentos. Além de focar a organização territorial e as fases do assentamento

como a conquista, a emancipação, a moralização e o novo assentamento. Avaliando a participação

da escola nestes processos.

No segundo capítulo abordamos sobre a Educação do Campo e os princípios políticos-

pedagógicos e filosóficos da educação do MST. Discutimos o conceito de Educação do Campo e

sua materialização nas escolas de assentamento, a pedagogia da alternância e a contribuição na

formação dos jovens camponeses, além dos encontros e desencontros das propostas de educação do

estado do Espírito Santo e do MST na escola.

No terceiro capítulo fizemos uma análise mais interna da conquista da escola e sua

contribuição política e pedagógica no assentamento, assim como seus desafios e a conflitualidade

de disputa de projetos com o estado.

A conclusão do trabalho traz elementos da articulação e conflitualidade das políticas de

educação e a contribuição destas propostas para a formação do educando-camponês.

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12

1. A FORMAÇÃO DO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS

1.1 - Histórico da luta pela terra no Espírito Santo e a conquista do assentamento Valdício

Barbosa dos Santos

“Reforma Agrária uma luta de todos!”

(Palavra de Ordem do 3º Congresso Nacional MST).

A história do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra - MST no Espírito Santo, de 1984

a 2010, é retratada por meio de ações concretas e coletivas, de ocupações de terras, manifestações e

sonhos. O Estado do Espírito Santo assim como outros estados apresentam dados de alta

concentração fundiária, onde os latifundiários concentram grande parte das terras do Estado,

dominando a propriedade da terra e o desempenho de sua função social.

As décadas de 50 e início da década de 60 do século passado foram marcados por grandes

conflitos no Campo. Esses conflitos se deram de duas formas: de um lado, os ataques às

comunidades camponesas, principalmente, caboclos que não tinham suas terras documentadas – os

chamados posseiros. Por outro lado, os conflitos promovidos pelo grande capital, ou seja, as

grandes empresas do setor de eucalipto, como a Aracruz Celulose, principalmente contra as

comunidades indígenas e quilombolas. Em ambos, o Estado foi conivente, usando a política e

permitindo a ação livre de pistoleiros que atacavam abertamente as comunidades, destruindo

plantações e incendiando casas de camponeses e comunidades indígenas.

A luta pela terra no estado do Espírito Santo teve uma forte influência das Comunidades

Eclesiais de Base (CEB‟S), por servir muitas vezes de espaço de esperança e diálogo para o povo,

expor suas angustias sobre os grandes impactos gerados pela desigualdade na região. De acordo

com Fernandes: “As (CEB‟S) eram os lugares onde foi possível criar espaços para se comunicar,

aprender e se organizar para lutar, para enfrentar de fato, o inimigo, para transformar a realidade

dura e sofrida”. (PIZZETA, 1997, p.74).

Outro espaço de socialização dos problemas e expectativa de novas esperanças foi a

Comissão Pastoral da Terra (CPT) cujo trabalho priorizava a formação de lideranças, que animavam

grupos de Sem Terras que surgiam em vários municípios do norte do Estado, denunciando também

as injustiças e violências praticadas contra os trabalhadores rurais. O que fortalecia ainda mais a

cada letra de canto religioso que denunciava e mostrava a dura realidade. Como no refrão: “Em

cima de um caminhão, em cima de um caminho, bem cedinho, ele vai bem cedinho, ele vai sem

nenhuma garantia, o seu pão de cada dia ele vai tentar ganhar”. (autor desconhecido).

O que ficava cada vez mais claro, pois a própria letra dos cantos denunciava a vida sofrida

a que é submetido o trabalhador e a trabalhadora, pois além da exploração do trabalho é também

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negada a possibilidade de uma vida digna no campo, tirando o direito a partilha da terra, a

autonomia sobre ela e a produção de alimentos para subsistência. Elementos fundamentais negados

pelo latifúndio, que possibilita a concentração e acumulação da terra e do poder pelo capital, o que

acontece desde os primórdios da Colonização brasileira. Segundo Fernandes: “O latifúndio carrega

em si a imagem da exploração, do trabalho escravo, da extrema concentração da terra, do

coronelismo, do clientelialismo, da subserviência, do atraso político e econômico”. (2008, p. 48).

Essas características foram às bases sobre as quais se alicerçou a produção agropecuária e a

estrutura da propriedade da terra, onde trabalhadores e trabalhadoras tiveram suas terras tomadas

para dar lugar ao pasto, a criação de boi e implantação de projetos de monoculturas. Sendo

necessária a Reforma Agrária, um projeto popular capaz de provocar a sociedade e as instituições

para refletirem sobre a questão agrária e o tamanho dos latifúndios, assim como sua função,

mostrando para a sociedade a necessidade de terra para a produção de alimentos, moradia para os

povos do campo e não só para a criação de gado. Como na música: “homem mulher e criança não

são cabeça de gado...” (autor desconhecido) reforçando ainda mais a desigualdade existente entre a

classe trabalhadora e a classe dominante.

De acordo com Paulino e Fabrini (2008):

O estudo minucioso de dados de produção, uso do solo e geração de renda lhe

permite indicar que a reforma agrária é um dos caminhos possíveis para o

cumprimento da função social da propriedade, princípio tomado como fundante do

desenvolvimento sustentável. (p. 16)

Para tanto era preciso se mobilizar em massa unindo forças, através da igreja, Sindicatos e

movimentos sociais, para romper com a exclusão latifundiária que amargava a vida de muitos

trabalhadores e trabalhadoras. Derrubando cercas e enfrentando o latifúndio com o objetivo de

devolver aos sujeitos do campo o direito a um retorno digno capaz de transformar a paisagem do

latifúndio na paisagem do camponês, substituindo a paisagem homogênea e as cabeças de gado por

homens mulheres, crianças e produção de alimentos. Como em Fernandes (2008):

A paisagem do território camponês é caracterizada pela grande presença de pessoas

no território, porque é nesse e desse espaço que constroem suas existências,

produzindo alimentos. Homens, mulheres jovens, meninos e meninas moradias,

produção de mercadorias, culturas e infra estrutura social entre outros. (p.40)

As primeiras articulações na luta pela terra de grupos de Sem Terra no Espírito Santo foi

em 1983 em um bairro periférico denominado de “Pé Sujo”, hoje Vila Nova São Mateus no litoral

norte. Este bairro era composto basicamente de trabalhadores rurais desempregados, muitos

expropriados de suas terras para dar espaço às monoculturas da cana de açúcar e eucalipto. Este

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14

grupo passou a ter orientação e acompanhamento do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) de

São Matheus e de padres ligados a pastoral social da igreja católica, responsáveis pelo

acompanhamento dos passos do primeiro Assentamento conquistado no Espírito Santo, os quais se

reuniam e debatiam alternativas para a conquista do tão sonhado pedaço de terra. Em outros

municípios outros grupos se organizavam para pressionar o governo do Estado.

Segundo o assentado Valmir da Costa Paim:

Esses novos sindicalistas, novos grupos, começaram a se articular e mobilizar cada

vez, mas pessoas, após essa mobilização interna estes grupos começaram a

participar de Congressos e Encontros Nacionais da Confederação Nacional dos

Trabalhadores da Agricultura (CONTAG) e da (CUT) e foi a partir desses eventos

que entraram em contato com lideranças de Sem Terra que já estavam articulados

no sul do Brasil, para adquirirem experiências de organização no Estado, mas

alguns sindicalistas da época optaram por dar continuidade as negociações com o

governo. Dessas negociações através de abaixo assinado e pressão para liberação

de terra criou então o primeiro assentamento no Espírito Santo em 13 de setembro

de 1984 que dividindo o numero de famílias formou-se o Assentamentos Córrego

da Areia, o Assentamento Córrego da Onça e o Assentamento São Roque ambos

no município de Jaguaré. (Entrevista realizada em 22 de outubro de 2010).

A luta pela terra no estado se intensificou com criação do MST que deu continuidade as

articulações das lutas já iniciadas com os trabalhos dos sindicatos e dos agentes pastorais. A partir

daí as lutas foram ampliadas com novas táticas usadas pelo MST que era primeiro a ocupação, para

depois a negociação. A partir destes trabalhos já iniciados no Estado, foi apresentada ao então

governador da época Gerson Camata, uma pauta de reivindicações, a qual incluía, de acordo com

Pizzeta (2005):

1 - A entrega imediata de trinta mil terras devolutas do estado às famílias de

trabalhadores rurais.

2 – Desapropriação imediata dos cinqüenta e nove mil hectares de terras da

floresta rio doce Desapropriação imediata dos 59.000 hectares de terras da Floresta

Rio Doce S / A, tendo em vista ser uma empresa estatal subsidiária da companhia

Vale do Rio Doce, e que foi formada com dinheiro público (dinheiro de incentivos

fiscais), sendo que todo o volume de eucalipto plantado não tem como ser

aproveitado.

3-Divulgação dos recursos do Fundo Fundiário do Estado para aplicá – lo

integralmente no assentamento de famílias de lavradores.

4- Assistências às famílias assentadas com alimentos e com infra estrutura

fornecidos pelo Estado. Porém, exigência de total liberdade para o grupo escolher

como preferir trabalhar a terra, e não ter imposto um “comodato”, como tem

acontecido nos dois primeiros assentamentos. (p. 10)

Em meio a cobranças e negociações, a realização do sonho com a terra começa a virar

realidade para as famílias que jamais tiveram suas casas, sua terra para plantar e colher seu próprio

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15

alimento. Conquistam seu próprio pedaço de terra, assim como muitas famílias que foram

expropriadas de suas terras para a expansão de monoculturas e pecuária se reterritorializam. Pois

dessas negociações sugiram também os assentamentos: Bela Vista Córrego do Balão, Nova Vitória,

Onze de Agosto e Rio Preto, Rio Itaúnas surgindo ai o primeiro Assentamento no município de

Conceição de Barra, como mostra o quadro abaixo:

Tabela 1 - Relação dos Assentamentos Resultantes das Negociações com o Governo do Estado do

Espírito Santo.

Assentamentos Data de

Criação

Área

(ha)

Nº Famílias Habitantes Município

Córrego da Areia Nov.84 310 40 Jaguaré

Córrego Grande Fev.85 265,0 27 152 São Mateus

Rio Itaúnas e Rio Preto Jun.85 458,0 33 195 Conceição da

Barra

Bela Vista Jun.85 208,0 34 219 Montanha

Córrego do Balão Jul.85 42,6 07 36 Montanha

Córrego da Onça Dez.85 90,0 08 Jaguaré

Nova Vitória Fev.86 525,0 32 212 Pinheiro

Onze de Agosto Fev.86 126,0 11 45 Pinheiro

Fonte: MST/ES, 2005.

Com a intensificação das mobilizações, tendo em vista a decisão política de se implantar o

MST no estado, foi então realizada a primeira grande ocupação de terra do MST no dia 27 de

outubro de 1985. Após meses de trabalho de base, de articulação das famílias Sem Terra nos

municípios, aproximadamente 300 famílias, ocupam a fazenda Georgina, localizada no distrito de

Nestor Gomes (Km 41) em São Matheus. A partir de então, acampados na beira da estrada, com os

ideais unificados, a luta pela terra passou a ser de resistências e confrontos, o que não desanimava

os Sem Terra, pois o ideal de conseguirem “um pedaço de terra” fazia com que entendessem que

isso somente seria possível através da união, do esforço e da luta de todos. Dessa ocupação

resultaram os Assentamentos Vale da Vitória (39 famílias), da Georgina (80 famílias), de Pratinha

(17 famílias) e do Pontal do Jundiá (46 famílias), já em meados de 1986.

Em setembro desse mesmo ano, o MST realizou com aproximadamente 300 famílias, a

ocupação de mais um latifúndio improdutivo, numa área da Floresta Rio Doce, no distrito de Nestor

Gomes, município de São Mateus. Desta vez sendo preciso ocupar a sede do Instituto Nacional de

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Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em Vitória, para pressionar negociações com o Governo

Federal. Os Sem Terra também sofreram despejo e acamparam na área do Assentamento da

Pratinha.

A decisão dos Sem Terra foi sempre positiva, comentou um deles: “O que nós queremos é

a Reforma Agrária feita na prática e não apenas um projeto no papel que nunca chega a ser

aplicado”.

Dessa ocupação resultaram os assentamentos de Jurema (área que já havia sido ocupada),

de Rio Quartel, em Linhares (20/02/1987, 45 famílias ocupam a área), de Pip-Nuck, em Nova

Venécia (26/12/1986, 50 famílias ocupam a área), além de um acampamento próximo à fazenda

Castro Alves, em Pedro Canário, em 25 de dezembro de 1986, com 89 famílias. Em todas essas

áreas, os trabalhadores também sofreram despejos porque as áreas já estavam com decreto de

desapropriação, mas, o INCRA ainda não havia tomado posse. Assim, as famílias ficaram nas

proximidades das áreas até sair à emissão de posse e o assentamento definitivo, após meses de

pressões e negociações com o INCRA os Sem terra, acampados em Pedro Canário conquistaram a

terra dando origem aos Assentamentos Castro Alves em Pedro Canário, Francisco Domingos

Ramos, em Montanha, e de Três Pontões, em Nova Venécia.

Outra grande ocupação e com confronto entre Sem Terra e pistoleiros e Sem Terra e PMs

foi em uma área da Acesita Energética, fábrica de celulose e eucalipto , onde um companheiro Sem

Terra foi assassinado, mas esta violência não foi suficiente para que as famílias desocupassem a

fazenda, ao contrário resistiram. Segundo Pizzeta (2005):

Essa ocupação se transformou em um dos primeiros símbolos de resistência,

devido ao aparato policial/ militar, que foi mobilizado para efetivar o desejo dos

Sem Terra da fazenda. Foi praticamente uma operação de guerra, que mobilizou

em torno de 600 homens fardados e preparados para a desocupação. Os Sem Terra

foram forçados a saíram da área para evitar um massacre, pois esse aparato estava

motivado a fazer um massacre. Os Sem Terra decidiram então caminha

praticamente toda noite, passando por matas, pastagens, córregos num percurso de

12 quilômetros, com os pertences crianças e tudo o que tinham para acampar em

uma área de um pequeno proprietário (...). Ai se finca a bandeira, o acampamento e

por vários meses os Sem Terra mostram a capacidade de resistência, de

mobilização e luta para conquistar a terra. (p. 88)

Dessa ocupação surgiram os Assentamentos Gavião em São Matheus, Três de Maio em

São Gabriel da Palha e Vale Ouro em Ecoporanga, todas em 1989.

Em três de junho de 1989 mais um latifúndio improdutivo fazenda Ipuena em Pinheiros era

marcada para se ocupado, mas a situação não era tão tranqüila os fazendeiros estavam articulados

com PM‟s para que eles se infiltrassem para impedir a ocupação, o grupo foi detido, mas na

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madrugada de 05 de junho, estrategicamente, o fazendeiro, os PM‟s e os pistoleiros chegaram até a

fazenda e barbarizaram com as famílias.

Em meio a essas várias ocupações, os conflitos foram acirrados, vários despejos, fome,

madrugadas de frio, medo, ataques, covardias, ameaças e mortes. Mas, a luta era fortalecida pelo

sonho da conquista da terra, para que várias famílias tivessem um pedaço de terra, adquirido através

da organização e mobilização de grupos de famílias, Sindicatos, STR, CEBS, CPT, MST etc. que

criaram várias estratégias de mobilizações e lutas para transformar o território do latifúndio no

território do camponês. É dessa forma que vários Sem Terra se territorilizaram ou

reterritorializaram na “tão sonhada terra”.

Muito sangue foi derramado, foram vários os companheiros assassinados e torturados por

acreditarem na luta pela terra e na justiça social. E como nos outros estados, para que várias

famílias conquistassem suas terras perdemos vários companheiros, como o companheiro Francisco

Domingos Ramos assassinado em 5 de fevereiro de 1988 a mando da União Democrática Ruralista

UDR, o companheiro Paulo Damião Tristão vulgo Purinha tesoureiro do Partido dos Trabalhadores

em Linhares ES, morto no dia 19 de junho de 1989 a mando de fazendeiros, O companheiro

Verino Sossái líder sindical de comunidades e o companheiro Valdício Barbosa dos Santos

Sindicalista e Diretor da associação dos trabalhadores rurais de Pedro Canário e Conceição da Barra

e um dos fundadores da Escola Família Agrícola de Pinheiro que foi também assassinado no dia

12 de setembro de 1989 a mando de fazendeiros. A luta pela terra no Espírito Santo assim como nos

outros estados foi construída através de muito sangue derramado, como no refrão da música: “pra

dividir a terra quanto sangue derramado na luta por um pedaço de chão”. (As Marcelitas). O

sangue destes companheiros não foi derramado em vão, foram companheiros que tiveram coragem

de enfrentar o latifúndio, denunciar as facetas das grilagens de terra, das terras improdutivas,

servidas apenas para passeio de final de semana e para plantação de pasto e criação de boi.

Sendo capazes de intervir na estrutura agrária do estado, moldada pela imposição das

relações de poder e hierarquia da sociedade. Configurando 61 Assentamentos no estado, como

mostra o mapa abaixo.

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Mapa 1: Assentamentos Espírito Santo de 1984-2010

Fonte: INCRA SR/20

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A massificação da classe camponesa na luta pela terra é fortalecida através do

enfrentamento contra o latifúndio, a exploração e a desigualdade social, que permeia a sociedade,

pois a mesma não é justa e nem favorável as classes subalternas. Que mesmo em meio a vários

conflitos acreditam na Reforma Agrária onde homens, mulheres jovens e crianças almejam romper

com as cercas do latifúndio, dando lugar a novas relações de vida. Materializadas no trabalho

familiar, na produção de alimentos, na autonomia e na luta dos povos do campo, transformando o

território do latifúndio no território camponês.

A luta na conquista do Assentamento Valdício Barbosa dos Santos não foi diferente, o

processo de ocupação da Fazenda Água Preta acontece em uma época de crise financeira,

desemprego e aumento da pobreza em decorrência da concentração fundiária nos municípios do

norte do estado do Espírito Santo, especificamente, em Conceição da Barra. Município marcado por

muitas violências contra camponeses, onde vários fazendeiros conseguiram suas terras, derramando

o sangue de muitos negros escravos, indígenas e posseiros que foram explorados e expulsos de suas

terras para dar lugar a pecuária e as monoculturas da cana de açúcar e o eucalipto.

Segundo o assentado Valmir da Costa Paim:

Em 22 de outubro de 1995 surge então a ocupação da Fazenda Água Preta

(Boticudo) localizada no município de Conceição da Barra no Estado do Espírito

Santo, por um grupo de Sem Terra do MST (Movimento dos trabalhadores rurais

sem terra), contendo 480 famílias organizadas pelo Fórum Campo Cidade.

(Entrevista realizada em 06/06/2010).

Após seis meses de acampamento, o sonho da terra conquistada vira realidade. A terra é

então liberada e como a área ocupada era de apenas 888 hectares e não comportava todas as

famílias, parte delas foram transferidas para o município de Mucurici Espírito Santo e a outra parte,

que era de 89 famílias, ficou na área e formou o Assentamento “Valdício Barbosa dos Santos”

como podemos observar na figura abaixo:

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Figura 1. Assentamento Valdício Barbosa dos Santos.

Fonte: DAF

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O assentamento recebeu o nome de Valdício Barbosa dos Santos em homenagem ao

companheiro Valdício Barbosa dos Santos (Léo), com o intuito de manter viva sua memória e

ensinamentos. Batizado pela luta por Léo, morto aos 42 anos, sete filhos. Lavrador aguerrido,

diretor da Associação de Trabalhadores Rurais de Pedro Canário e Conceição da Barra e membro

do Conselho da Escola Família Agrícola de Pinheiros. Que foi brutalmente morto pela União

Democrática Ruralista (UDR), em 12 de setembro de 1989, com balas assassinas da injustiça, da

covardia, das cercas malditas, dos latifúndios, do capim, da cana, do eucalipto, e das terras

concentradas. Nome também concedido a Brigada dos municípios de Conceição da Barra e Pedro

Canário, como Brigada “Valdício Barbosa dos Santos” composta por cinco assentamentos:

Assentamento Rio Preto/Itaúnas, Assentamento Pontal do Jundiá, Assentamento Castro Álvares,

Assentamento Valdício Barbosa dos Santos, Assentamento Paulo vinhas e o Assentamento Nova

Conquista em Pinheiro, que por está localizado geograficamente mais próximo á Pedro Canário que

á Cede de Pinheiro, compôs também a Brigada.

Nesse mesmo ano de 1995, o MST conquistou a criação da escola, ainda no acampamento

com educadores voluntários funcionando no curral da fazenda. Depois da posse da terra em 1996 o

Estado assina o ato de criação da Escola.

A partir do momento em que as famílias conseguiram conquistar o seu espaço surgiu então

uma proposta do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) de que as famílias

teriam que construir suas casas na sede do Assentamento, pois neste espaço seria construída a

agrovila. Algumas famílias não concordaram por ficarem longe dos lotes de produção e outras

aceitaram. No espaço da agrovila, além de serem construídas casas, foi também construído escola,

galpão e farinheira.

1.2 - ORGANIZAÇÕES TERRITORIAIS E A HISTÓRIA DO ASSENTAMENTO

A utopia da conquista da terra tece sonhos, regados de realidade que um dia vira memória

para aqueles que viveram e ou acreditam no rompimento da desigualdade social. Para entender a

organização territorial do assentamento foi preciso entrevistar assentados, assentadas e dirigentes

que vivenciaram e vivenciam a materialização da luta e conquista da terra e a permanecia do

Assentamento “Valdício Barbosa dos Santos.”.

Os Assentamentos de Reforma Agrária representam uma semente na esperança que busca a

força organizada do povo para construir no campo um lugar bom de viver. Pois, quem sai do campo

leva consigo a saudade da terra natal e a esperança de construir uma nova vida em outro lugar,

porém quem é expulso de sua terra leva consigo a esperança de retornar ao campo e construir dias

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melhores. Mas, poucos são os que adquirem recursos financeiros para comprar um lugar e viver no

campo. Por isso, a maioria só pode realizar este sonho, se sonhar no coletivo. Encontrar

consonância no campo da luta e viabilizar o retorno ao campo só é possível através da luta e

teimosia daqueles que ousam sonhar juntos. Já dizia a letra da música de Raul Seixas: “sonho que se

sonha junto é realidade”.

De acordo com os dados do IBGE, de 1970 ao ano 2000, saíram do campo capixaba quase

35% da população. E em Conceição da Barra Espírito Santo saiu mais de 41% da população do

campo. Todos têm o direito de optar onde prefere morar, campo ou cidade. Porém, no caso

brasileiro e, em especial no município de Conceição da Barra, isso não pode ser considerado

opcional, sair tanta gente do campo em tão pouco tempo. Por isso, entendemos que esse processo

fez sim parte da ofensiva do agronegócio e dos projetos econômicos implantados, que expulsa

numerosa quantidade de pessoas do campo.

A Reforma agrária, através da luta do Sem Terra, tem sido uma das poucas ações que

possibilitou o retorno e permanência de diversas famílias ao campo no Espírito Santo e, em

particular, em Conceição da Barra. São 240 (duzentos e quarenta) famílias oficialmente instaladas

em cinco assentamentos de Reforma Agrária no município, totalizando um número de 7.176

habitantes, promovendo o caminho inverso possível de ser entendido a partir da análise de que

(27,08%) dos 26.494 do total dos habitantes do município de Conceição da Barra hoje são

assentados e filhos de assentados.

Tabela 02 - Assentamentos no município de Conceição da Barra

Fonte: MST, 2005.

O processo histórico do MST no Estado do Espírito Santo, assim como nos outros estados,

foi constituindo por meio a vários conflitos, indignações, dor e resistência que a conquista da terra

foi tomando forma e corpo. Como na letra da música de Marcinha: “Sonho que brota da terra

regado por liberdade” foram surgindo a cada ano novas lutas e novas conquistas.

Nº Assentamentos no

município de Conceição da

Barra

Nº de

Famílias Área Ha.

Data de Criação

INCRA SEAG

01 Valdício B. dos Santos 89 888.40 09.04.96 X 02 Paulo Vinhas 63 474,09 051296 X 03 Independência 10 103,0 140388 X 04 Pontal do Jundiá 48 778,27 161289 X

05 Rio Preto/ Ituanas 30 460,00 250885 X

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Vejamos na seqüência um mapa do município de Conceição da Barra com a distribuição

territorial de seu município e a localização dos assentamentos formados em seu território.

Mapa 2:Levanamento cadastral de Imóveis Rurais-Conceição da Barra/ES

Fonte: DAF/2006

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O mapa apresentado mostra a configuração do município de Conceição da Barra e a

distribuição territorial de seu município, apresentando as área ocupadas pela cana de açúcar,

eucalipto assentamentos, pequena propriedade rural, pecuária, floreta e parque estadual.

Após um grande período sem conquistas, o ano de 1994 foi encerrado com a conquista do

Assentamento Nova Esperança com 50 famílias no município de Aracruz- ES. As famílias

excedentes deste assentamento continuavam sem perspectiva, e como um dos objetivos do

Movimento Sem Terra é “Enquanto houver uma família Sem Terra, todos somos Sem Terra”, a luta

e persistência continuou, e na noite do dia 23 de outubro este grupo de Sem Terra saiu novamente

em direção a um novo acampamento, em busca de terra para trabalhar, totalizando um número de

400 famílias seguindo em comboio de ônibus e caminhão.

A ocupação foi articulada com o fórum campo e cidade, além de um grupo significativo de

apoiadores urbanos. No entanto, o trajeto foi interrompido próximo à cidade de Conceição da Barra,

conforme relatou um dos líderes do MST e da ocupação na época:

[...] Nós preparamos a ocupação, articulando vários setores da sociedade:

deputados do PT, dirigentes da CUT, sindicalistas, advogados, pastorais. Então, a

polícia nos cercou ali, próximos a Conceição da Barra, na região de Santana e não

deixou ninguém passar. Prenderam os primeiros ônibus que chegaram, e as

famílias foram chegando, chegando, chegando... Nós montamos um acampamento

ali. Nós queremos ir para frente e a PM não deixando seguir [...] Ai ouve um

processo de negociação, intermediado pelas autoridades que nos acompanhavam.

Foi praticamente a primeira negociação com o novo governo do Estado com a PM

do governo do Estado [...] os policiais voltaram, voltaram para traz e nós seguimos

em pleno dia, mais 40 km para frente e, ás 12:15 horas, precisamente ás 12:15

horas, nós estávamos entrando na Fazenda Água Preta (Entrevista realizada em

22/10/2010).

Dessa ocupação, e da vitória sobre as forças repressivas da PM, nasceu o Assentamento

“Valdício Barbosa dos Santos”, marcando uma nova fase na organização e nas lutas do MST, para a

efetivação de uma das maiores ocupações do MST, onde programava - se na prática a palavra de

ordem definida no III Congresso Nacional do MST, realizado em Brasília no mês de julho de 1995

– “Reforma Agrária uma luta de todos”.·O Assentamento Valdício Barbosa dos Santos surgiu a

partir da luta de várias entidades públicas, religiosas e o MST, que no ano de 1992 integravam no

norte do Estado o fórum Campo e Cidade, formado por várias entidades: Igrejas Católicas,

Luteranas, Metodistas, sindicatos rurais e urbanos, associações, movimentos sociais, Federações e

ONGs que mobilizava na época, um número de 480 famílias distribuídas em acampamentos e

municípios do norte do estado.

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No 3º Congresso então são apresentadas as áreas passivas de desapropriação por dívidas de

imposto e improdutividade. E a fazenda Água Preta que pertencia ao fazendeiro Anízio Cremasco,

que na época 25% da fazenda já pertencia ao governo, era uma dessas fazendas.

O processo de ocupação da fazenda Água Preta, se dá numa época de alto índice de

desemprego, aumento da pobreza e concentração fundiária e o Fórum campo e cidade tinha o

objetivo de ajudar a Cidade a fazer luta no Campo e vice-versa, mobilizado todos os municípios do

norte e acampamentos.

Segundo o assentado Valmir da Costa Paim

A ocupação da fazenda foi massiva, contava na época, além do apoio do fórum

Campo e Cidade liderada pelo movimento sem terra, com apoio político do Partido

dos Trabalhadores (PT), Brice Bragato/ José Otávio Baioco/ Cláudio Veresa/ Paulo

Roberto/ João Carlos Coser, hoje prefeito de Vitória, que contribuíram por integrar

o fórum. O governo do estado, também do Partido dos Trabalhadores, Vitor Buaiz

se mostrava simpatizante as ocupações, favoreceu de certa forma as negociações. A

ocupação da fazenda aconteceu em 22 de outubro de 1995, durando apenas seis

meses. E a força do Fórum contribuiu com a agilidade no processo de

desapropriação da terra. (Entrevista realizada em 28/09/2010).

Como a área ocupada não comportava as quatrocentas e oitenta famílias, o excedente foi

distribuído em outras áreas, Fazenda Itaúnas, Córrego da Laje, Olinda I e Olinda II.

Sendo assim, o processo histórico do MST no estado do Espírito Santo foi construído

através da luta pela terra. Hoje temos sessenta e uma áreas conquistadas com quase três mil famílias

assentadas, que deixaram de ser exploradas pelos latifundiários. Vivendo em assentamentos essas

famílias já conseguiram melhorar suas condições de vida. E aos poucos vão transformando essas

áreas de assentamento em verdadeiras unidades de produção e comunidades sociais, com educação,

saúde, produção, organização e consciência.

1.3 – O ASSENTAMENTO E SUAS FASES: CONQUISTA EMANCIPAÇÃO,

MORALIZAÇÃO E O NOVO ASSENTADO.

O MST através da luta pela terra vem formando vários territórios, que é a formação dos

assentamentos. Estes territórios têm devolvido a muitos Sem Tem o direito a uma vida no campo.

Este processo significa a territorialização do camponês na terra. Para Fernandes (2007, p. 295):

“Um fator importante da territorialização do campesinato é, sem dúvida, a luta pela terra e as

políticas de reforma agrária que possibilitaram a expansão dos territórios camponeses”.

A constituição de assentamentos nas áreas do agronegócio significa a formação de

territórios camponeses. Sua construção emerge da luta pela terra e as relações sociais que o

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determinam são relações não capitalistas1. A formação destes territórios refletem as disputas

territoriais que envolvem o campesinato em conflito com o capital. Neste processo, ocorrem as

construções e destruições de territórios capitalistas e camponeses (FERNANDES, 2007).

Uma importante contribuição, neste sentido, para pensarmos como a sociedade constrói e

destrói territórios no modo de produção capitalista é a de Oliveira apud Fernandes (2007):

O território deve ser aprendido como síntese contraditória, como totalidade

concreta do processo/modo de produção/distribuição/circulação/consumo e suas

articulações e mediações [...]. O território é assim produto concreto da luta de

classes travada pela sociedade no processo de produção de sua existência [...].

Dessa forma, são as relações sociais de produção que dão configuração histórica

específica ao território. Logo, o território não é um prius ou um a priori, mas a

contínua luta da sociedade pela socialização igualmente contínua da natureza”. (p.

340).

Partindo dessa concepção de constituição dos territórios, vamos explicar o processo de

conquista do assentamento Valdício Barbosa dos Santos. A origem deste assentamento é resultado

de dois processos de territorialização envolvendo sujeitos diferentes: o primeiro processo é formado

pela territorialização de famílias que buscaram pela ocupação da terra a conquista do território pela

primeira vez. Ou seja, são sujeitos que eram moradores da cidade e nunca foram camponeses, mas

que se transformaram em camponeses por meio da luta pela terra.

A outra condição para a formação do assentamento são as famílias que já eram

camponesas, mas foram expropriadas da terra, de seu meio de produção, em função do agronegócio

que visa a concentração fundiária. Estas buscaram na ocupação de terras a sua reterritorialização, ou

seja, o retorno ao seu modo de vida camponês.

Pensando em nossa realidade estudada, entendemos que o processo de conquista e

consolidação do assentamento é um exemplo do que estamos denominando de reterritorialização.

Neste sentido, vamos descrever as fases que fizeram parte do processo de constituição do

assentamento nas condições que observamos atualmente. A primeira fase do assentamento, a

conquista, foi caracterizada pela luta pela terra, e pelos processos de consolidação do assentamento.

Onde as famílias começam a se instalar no assentamento, desfrutando das primeiras conquistas,

projetos de lavoura, infraestrutura e organização coletiva. Segundo a assentada e educadora Maria

Aparecida Pereira da Silva:

1 Termo utilizado por Martins (1981) que significa que, contraditoriamente, no capitalismo temos a presença de relações

que não são baseadas nos fundamentos básicos da reprodução ampliada do capital, sobretudo, a partir da produção de

mais-valia.

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O primeiro momento do assentamento foi caracterizado pela euforia, muitas

famílias queriam terra, mas não tinham se planejado para viver da e na terra, tudo

era muito bonito, colorido, mas depois deste período cada um vai se planejando o

que queria. E ai inicia um período de afirmação, ficar ou não no assentamento,

desencadeando um período de muitas mudanças, ficar, viver, me planejar ou

vender e ir embora. (Entrevista realizada em 23/05/2009)

De fato, o momento de se reafirmar enquanto camponês, lidar com a terra, produzir e

desenvolver um trabalho familiar no lote de produção é necessário para a consolidação do

assentamento enquanto território camponês. Pois, a garantia da sobrevivência da família na terra

está diretamente relacionada a uma série de fatores que se estabelecem a partir do novo projeto de

vida em que estas famílias estão inseridas. Essas novas relações estabelecidas nestes territórios

podem, em algumas circunstâncias, não ser o que de fato algumas famílias almejam, pois para se

reafirmarem enquanto camponeses é preciso lidar e viver da terra, e isso muitas vezes pode não ser

o ideário de muitas pessoas, que pode não ter estabelecido nenhuma relação com o campo antes, ou

outras que sempre tiveram seus patrões para ditar qual seria o trabalho a ser feito. Esta

inexperiência de vivenciar relações camponesas pode provocar uma conflitualidade de idéias e de

ideais contribuindo com a falta de organicidade do assentamento.

Todos esses fatos políticos e sociais contribuíram para o que chamamos de segunda fase do

assentamento, que é o processo de “emancipação da terra”. Em reunião com os servidores do

INCRA os mesmos propuseram às famílias a entrega do título da terra, com a afirmação de que os

assentados seriam donos da terra e teriam várias vantagens. A partir dessa ação, as famílias que

realizaram a troca, a venda e a desistência do lote, tornaram-se ilegais, em função do INCRA não

efetivar a devida regularização.

Em um período, em torno de 05 anos, mais de 40 famílias estavam irregulares,

inviabilizando diversas ações, como o acesso a financiamentos públicos, emissão de DAP

(Declaração de Aptidão do Produtor), ou qualquer outro documento concedido pelo INCRA ou que

dependesse dele para sua viabilização. Aquilo que transparecia uma facilidade, uma conquista das

famílias, passou a ser mais um problema, agravando gradativamente as dificuldades de (re)

organização das famílias.

Este foi o mesmo processo que ocorreu com as famílias de imigrantes que Martins (1978)

denominou de colonato. Em suas palavras:

[...] terras pouco apropriadas para agricultura, desprezados pela economia de

exportação (...) pois haviam sido impropriadamente utilizadas durante três séculos.

Logo depois o governo fez cessar qualquer tipo de ajuda àqueles núcleos

declarando-os emancipados quando não tinham condições para tanto. (p.125).

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Por diversos anos as famílias viveram uma grande desordem: a venda excessiva de lotes a

preços irrisórios; a compra de lotes por comerciantes que chegavam a adquirir até três lotes de

produção para criação de gado e turismo de final de semana, ocasionando um fluxo diferente de

pessoas no assentamento; a queda na produção pela falta de estímulo para plantar e o não acesso a

financiamento, assim como o endividamento de grande parte das famílias; o surgimento de

alternativas de renda de maneira inadequada para a vida do camponês como: produção de carvão

para venda; a desorganização das famílias e dos grupos de base do assentamento; Em função de

diversas famílias que passaram a ser „donas dos lotes‟ morarem na cidade, provocou um

esvaziamento do assentamento. Isso fez com que houvesse uma redução drástica do número de

educando na escola, chegando a ser ameaçada de ser fechada pela secretaria estadual de educação.

Com a desorganização do assentamento a territorialidade do agronegócio2

(FERNANDES, 2007) começava a adentrar no assentamento. Esta territorialidade do agronegócio

demonstra que as famílias já não conseguiam se organizar em seus próprios lotes, como se o

entusiasmo pelo trabalho tivesse que ser alimentado por algo mais fácil de ser implementado.

Facilitando a entrada de projetos municipais, como o plantio da pimenta malagueta e da mamona.

Pela falta de experiência das famílias assentadas com essas atividades e ser esse um projeto

experimental, não houve êxito nessas atividades.

O terceiro momento é o de retomada da organicidade do assentamento. Para isso foi

necessário a criação de uma comissão formada por assentados e representatividades do

assentamento, como membros de igrejas e da escola. Esta comissão tinha a finalidade de informar e

agilizar junto ao INCRA o processo de organicidade do assentamento. Este processo foi

denominado por ambas as partes como o processo de moralização fundiária3, que são medidas

tomadas pelo INCRA para superar as irregularidades encontradas nos assentamentos, por exemplo,

questões de direito legal, desenvolvimento de atividades comerciais, lotes vendidos sem autorização

do INCRA, arrendamento de terra, etc.

A moralização foi o momento de repensar as falhas, onde alguns iam ganhar e outros

perderem, sendo um período de muitas saídas, de conquistas difíceis de serem adquiridas, diferente

da primeira conquista condicionada aos aspectos políticos organizativos, o que gera muitos

problemas, em função de muitas famílias não entenderem e não aceitarem. De acordo com a

assentada Denilda Resende da Silva.

2 Significa que mesmo o território sendo camponês o agronegócio influencia diretamente nas ações dos camponeses

forçando para que produzam para o agronegócio, subordinando a sua renda e monopolizando o território. 3 Medidas tomadas pelo INCRA para superar as irregularidades encontradas nos assentamentos, por exemplo, questões

de direito legal, desenvolvimento de atividades comerciais, lotes vendidos sem autorização do INCRA,

arrendamento de terra etc.

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Era preciso ser feito um trabalho de recuperação do assentamento não para olhar

para o que lutamos tanto para conquistar ficando debaixo daquela lona quente

enfrentando polícia para hoje ver o assentamento abandonado, cheio de gado, sem

plantações, muitos assentados procurando serviço até fora do assentamento, se era

para ser assim, muitos deveriam ficar aonde vieram. Isso até desestimula quem

quer trabalhar. (Entrevista realizada em 25/10/2010).

O processo de moralização no assentamento é então iniciado em 2005 pelo INCRA e pela

comissão do assentamento formada por assentados/as e representantes do assentamento, que em

vistoria aos lotes notificaram 54 famílias irregulares, iniciando um longo processo jurídico contra

estas irregularidades.

A partir de 2009, inicia-se o processo de territorialização no assentamento pelos novos

assentados, que são os filhos dos assentados, meeiros e outras famílias que tem vínculo com a terra,

sendo essas características definidas pela comissão do assentamento juntamente com servidores do

INCRA, responsáveis por essa atividade. Esse novo assentado chega com muita vontade de

trabalhar na terra, por isso, em menos de dois anos, afirma o assentado Valmir da Costa Paim.

O Assentamento melhorou 90%, em relação à produção e organicidade, entrando

em uma nova fase. Pode ser que consigamos novamente organizar as famílias em

núcleos e agora estamos com 14 anos de assentamento, facilitados pelo governo.

Não é o que queríamos, mas ajudou bastante neste período que passamos.

(Entrevista realizada em 23/05/2010).

De fato, o assentamento tem mudado bastante a sua paisagem. Exemplo dessas mudanças é

o repovoamento por novas famílias que em pouco tempo já começaram a produzir e se organizar no

assentamento. Com uma diferença esse novo assentado em sua grande maioria traz consigo para o

assentamento valores diferentes dos assentados que estão no assentamento dês da época de

acampamento e que viveram seu processo de luta e conquista resistindo seus principais problemas.

O novo assentado concebe a terra apenas como um espaço de moradia e produção agrícola sem

levar em consideração o processo de luta e conquista da terra, a qual muitos até desconhecem, mas

ao mesmo tempo é a chegada desse novo público que vai incentivar também os assentados mais

antigos a reorganização do assentamento e o cultivo do lote de produção.

Além do repovoamento é notável a melhora na produção de alimentos,o fortalecimento da

comissão do assentamento que ganhou credibilidade de algumas famílias e críticas e ameaças de

outras, a reestruturação do conselho de escola com novos conselheiros, a credibilidade da escola

perante os assentados/as e as comunidades vizinhas, o aumento no número de educandos/as e a

participação dos famílias nas reuniões de pais, atividades culturais, seminários, visitas de estudo e

diversas atividades promovidas pela escola. A regularização possibilitou também as famílias o

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acesso a novos financiamentos como a reforma das casas, projetos de irrigação, café, aquisição de

veículos e outros.

Os desafios ainda persistem, porque não basta repovoar o assentamento, mas, sim,

reorganizá-lo. O primeiro desafio é concluir o processo de moralização fundiária, reorganizar os

grupos de famílias, ampliar a comissão do assentamento e as representatividades, aumentar ainda

mais a produção agrícola e fazer com que as famílias sintam-se parte da organização do

assentamento, sendo a escola o fio condutor deste processo de reorganização, pois ela é o único

espaço no assentamento que consegue reunir todos os públicos, além de ser um instrumento capaz

de despertar nos educandos/as e famílias a pertença ao Movimento Sem Terra, a valorização da

terra como fonte de sobrevivência e a unidade entre as famílias. Porque a escola deve ser sempre

parte do que acontece na comunidade, trazendo a realidade, os problemas e os desafios sempre

como base em sua proposta político pedagógica, estabelecendo relações entre ESCOLA-

EDUCANDO-FAMÍLIA – ESCOLA.

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2 – A EDUCAÇÃO DO CAMPO E OS PRINCÍPIOS POLÍTICOS PEDAGOGICOS-

FILOSÓFICOS DA EDUCAÇÃO DO MST: A CONSTITUIÇÃO DA PEDAGOGIA DO

MST NO ESPÍRITO SANTO

“a vida é uma escola, onde o viver é o livro

e o tempo o professor, onde alguns são sábios,

porém, até hoje, ninguém se formou”

(Zé Geraldo, Cantor e compositor)

2.1-A EDUCAÇÃO DO CAMPO

A educação é algo que se faz em movimento, tanto entre os períodos históricos, como entre

as pessoas, as classes, entre as regiões geográficas. Ou seja, a educação se realiza em um lugar.

Lugar em que as pessoas estão e ou que possam estar. E a escola é um desses lugares.

A educação pode se diferenciar conforme a organização do ambiente escolar, pois as

pessoas são fruto do meio em que vivem. Por isso, a organização da escola está intrinsecamente

relacionada à formação social dos sujeitos da escola. O espaço escolar já é, por si só,

pedagogicamente educativo. As pessoas se formam no ambiente em que vivem, trabalham, atuam.

Há, portanto, uma íntima relação entre a formação humana e o espaço de formação. Paulo Freire

afirma que “há uma pedagogicidade indiscutível na materialidade do espaço” (FREIRE, 1996,

p.20). Cada espaço possui uma pedagogicidade específica, podendo interferir no grau de formação

das pessoas.

O MST vem tecendo algumas significações da educação, num reconhecimento da

Educação do Campo como um direito das populações camponesas. Assim, o Campo, não pode ser

compreendido apenas como território da produção agrícola, mas como território legítimo de

produção da existência humana. Numa luta contínua pela universalização da educação como direito

social de todos e todas os que vivem no campo. Numa luta constante por políticas públicas que

reafirme essa legitimação. Nesta perspectiva, Caldart (2004) chama atenção para alguns elementos

que considera fundamental na construção de um projeto político e pedagógico da Educação do

Campo.

A identidade dessa educação a partir de seus sujeitos, da cultura, do trabalho, das

lutas sociais e modos de vida dos camponeses, forma um conjunto de condições

que não se limitam à escola, mas dela também se alimenta pela sua “vocação”

universal de ajudar no processo de humanização das pessoas. (p.10).

A Educação do Campo é um processo de construção de um projeto de educação dos

trabalhadores e das trabalhadoras do campo, abarcando seus interesses sociais, políticos,

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econômicos e culturais. Gerando um diálogo entre a teoria pedagógica e a realidade particular dos

camponeses.

O contexto originário da Educação do Campo se defrontou com o aumento da pobreza, a

degradação da qualidade de vida, o aumento da desigualdade social e da exclusão e a barbárie

provocada pela implantação violenta do modelo capitalista de agricultura. Neste mesmo contexto, a

situação em relação à educação era da ausência de políticas públicas que garantissem o direito a

educação e à escola para os camponeses/trabalhadores do campo. Mas, já havia a emergência de

lutas e de sujeitos coletivos reagindo a esta situação social (CALDART, 2004).

A Educação do Campo se constrói a partir da contradição que é a própria contradição de

classes no campo. Cada camponês deve fazer parte do seu próprio processo educacional que, por

um ou outro motivo, lhe é negado à condição de construir uma educação alicerçada em suas raízes

culturais. E isto significa estar num constante movimento tornando protagonista de sua própria

história. Para pensar uma proposta de Educação do Campo deve fazer emergir o processo sócio,

histórico, político e cultural de um povo como suas especificidades particulares e não simplesmente

estar voltada legalmente só para adaptações.

Apesar de o artigo 28 da LDB, que se refere à educação básica para a população rural, ser

um avanço na conquista legal do direito a uma educação diferenciada, há necessidade de sua

superação, tendo em vista que ela ainda destaca o termo “adaptações” em seu texto, ou seja, afirma

que os sistemas de ensino deverão fazer as adequações necessárias às peculiaridades da vida rural e

de cada região. Assim, segundo o artigo 28 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDB).

Art.28. Na oferta de educação básica para a população rural, os sistemas de ensino

promoverão as adaptações necessárias à sua adequação às peculiaridades da vida

rural e de cada região, especificamente:

I. Conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais necessidades e

interesses dos alunos da zona rural;

II. Organização escolar própria, incluindo adequação do calendário escolar às

fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;

III. Adequação à natureza do trabalho da zona rural.

Não bastam ter escola no campo, todos os sujeitos envolvidos sejam pais, educadores,

educandos e outros devem ajudar a construir um projeto político pedagógico permeado de causas,

histórias, desafios, sonhos, cultura e ideologia do povo do campo, e isso significa estar pautado na

história e não aceitar o conformismo de adaptações e migalhas.

Precisa-se de políticas públicas específicas para o campo para que a dignidade de quem

vive e trabalha no campo seja posto em prática, não sendo uma mera dicotomia entre rural e urbano.

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Idéia reforçada com os dizeres de Kolling, Nery e Molina (1999) ao afirmarem que devemos lutar

contra a homogeneização do capital ao mesmo tempo em que lutamos contra a desigualdade:

Precisamos de políticas públicas específicas para romper com o processo de

discriminação, para fortalecer a identidade cultural negada aos diversos grupos que

vivem no campo e para garantir atendimento diferenciado ao que é diferente, mas

não deve ser desigual. (p.58).

Dessa maneira, além da necessidade de construirmos uma educação que atenda as

especificidades dos educandos/as camponeses, é necessário pensarmos em uma educação que se

proponha a ser um instrumento de ruptura com a perspectiva neoliberal. Concordamos com

Mézáros que o “[...] capital é irreformável porque pela sua própria natureza, como totalidade

reguladora sistêmica, é totalmente incorrigível. [...]”. (2005, p. 27, grifo do autor). Nesse sentido, o

autor nos oferece uma reflexão densa e crítica sobre os limites e equívocos das visões

ideológicas/utópicas neoliberais da educação.

Trata-se de visões que elidem que os processos educacionais e os processos sociais

de reprodução estão intimamente ligados. Ou seja, sem rupturas nas relações

sociais que estão sob o controle do sistema capital não poderá haver mudanças

profundas no sistema educacional. Sob as relações sociais capitalistas a educação

funciona, dominantemente, como sistema de internalização dos conhecimentos,

valores e cultura funcionais à reprodução da (des) ordem do metabolismo do

sistema capital.

Logo, a Educação do Campo tem que ser pensada como uma alternativa que auxilie na

ruptura com o capital, pois “[...] é necessário romper com a lógica do capital se quisermos

contemplar a criação de uma alternativa educacional significativamente diferente”. (MÉZÁROS,

2005, p.27, grifo do autor).

2.2. – A EDUCAÇÃO DO CAMPO A PARTIR DOS PRINCÍPIOS PEDAGÓGICOS-

POLÍTICOS-FILOSÓFICOS DO MST

O MST construiu alguns princípios básicos que regem a sua perspectiva de educação. A

partir do caderno de educação do MST (1996) vamos discuti-los:

1º – Relação entre prática e teoria: a relação dialética entre teoria e prática é o que

possibilita o vínculo entre aquilo que se estudam na escola com as questões-problemas, as situações

do dia-a-dia da vida social;

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2º- Combinação metodológica entre processos de ensino e de capacitação: no ensino a

principal característica do processo de conhecimento é a articulação entre a teoria e a prática e

ambos são importantes para a consolidação da produção cultural e científica;

3º- A realidade como base de conhecimento: é importante que os conteúdos ministrados

nas escolas do campo estejam atrelados a proposta político-pedagógica da escola. Partindo da

realidade vivenciada pelos educandos.

4º- Conteúdos formativos socialmente úteis: é preciso selecionar conteúdos que

contribuam e estejam na perspectiva de distribuição igualitária dos conhecimentos produzidos pela

sociedade; e por outro lado, que tenham a potencialidade pedagógica necessária para educar os

cidadãos e cidadãs para a transformação social.

5º- Educação para o trabalho e pelo trabalho: é importante entender o trabalho como um

diferenciador entre as relações de exploração e as relações igualitárias nas relações sociais de

trabalho, capaz de desenvolver novas consciências, tanto individuais quanto coletivas. Bem como,

pensar o trabalho como o mediador primeiro da relação do ser humano com a natureza.

6º- Vínculo orgânico entre processos educativos e processos políticos: incentivar os

educandos/das a participarem politicamente junto às lutas sociais da classe trabalhadora.

7º-Vínculo orgânico entre processos educativos e processos econômicos: desenvolver na

área da escola atividades agrícolas, fortalecendo nos educandos a importância da agricultura

familiar para subsistência e renda da família.

8º- Vínculo orgânico entre educação e cultura: a escola deve ser um espaço de produção e

de socialização da cultura, valorizando as diversas atividades culturais presentes na escola e

comunidade em geral. Assim como a mística, as datas comemorativas e costumes vivenciados nas

famílias.

9º- Gestão democrática: a gestão da escola deve ser coletiva e feita pelos povos que a

compõem. Para isso, é importante que cada família, educadores/as e educandos/as. Sintam-se parte

do processo de construção da escola.

10º- Auto organização das/dos educandos: autonomia é um princípio que favorece ao

indivíduo sua própria organização, através do compromisso, do respeito ao coletivo, da

disponibilidade, da capacidade de mandar e obedecer e na busca soluções.

11º- Criação de coletivos pedagógicos e formação permanente dos educadores/as: é

importante que os educadores/as estejam em constante formação político e pedagógico, além

estarem inseridos em outras atividades políticas e organizativas da comunidade.

12º- Atitude e habilidade de pesquisa: a investigação é um método de analisar a realidade

para fazer proposições mais adequadas a uma intervenção na própria realidade.

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13º- Combinação entre processos pedagógicos coletivos e individuais: o processo de

desenvolvimento do conhecimento deve ser construído no coletivo para uma melhor sistematização

do ensino, mas também individual como um ser social que precisa ter um entendimento sistemático

do conhecimento produzido por ele mesmo.

É nesta perspectiva que está alicerçada a proposta pedagógica do MST, por isso,

pretendemos apresentar neste momento do trabalho, de maneira sucinta, uma reflexão a partir

desses pressupostos pedagógico-políticos dessa proposta.

Para iniciarmos nosso debate, vamos utilizar como referencial um documento elaborado

pelo Setor de Educação do estado do Espírito Santo. O projeto Sem Terrinha, que é um projeto que

apresenta uma pauta de reivindicações construída coletivamente onde expressamos o nosso

entendimento do que denominamos de projeto Sem Terrinha4.

O MST, ao longo de sua trajetória material e histórica, vem formando territórios

camponeses mostrando que a materialidade de suas lutas está na formação desses territórios, ou

seja, a conquista da terra para a reforma agrária. No entanto, além da conquista destes territórios, se

faz necessário que a educação também seja parte constituinte do processo de consolidação desses

territórios, constituindo, assim, uma luta por escola do/no campo, bem como por soberania

alimentar, por autonomia do trabalho e por formação de novas relações sociais entre homens e

mulheres.

A luta pela terra é feita por todas as gerações incluindo neste processo crianças, jovens,

adultos e idosos. Isto significa que as crianças também participam dos processos de luta pela terra,

que, geralmente, começam na luta junto com seus pais, já que estes vão para a terra, também, por

causa dos seus filhos, pensando em ter um espaço para as crianças e que esta possibilite uma melhor

qualidade de vida para toda a família, no entanto, esta qualidade de vida não se faz sem a presença

da escola.

Podemos afirmar que as crianças participam desse processo de luta de diferentes maneiras,

na qual podemos citar: nas brincadeiras, nas assembléias com seus gritos de ordem, nas marchas,

nos encontros dos Sem Terrinha (onde eles são os próprios sujeitos políticos da atividade), assim

como em outras atividades. Por isso, “para o MST, a participação da criança na organização é um

jeito de viver a infância diferente e ao mesmo tempo recuperar e recriar elementos culturais do

campo, produzindo novas relações sociais e novas formas de conceber a vida rural”. (MST, 2011,

não paginado).

4 Este documento foi elaborado em abril de 2011, e como fazemos parte do setor de educação do MST-ES,

participamos da elaboração do mesmo.

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Quando a criança cresce, vivencia e participa desde sua infância de atividades que ajudam

a entender o meio em que vivem o lugar onde constroem sua história, a atuação de seus pais na luta

pela terra etc. Existe, dessa maneira, a possibilidade de que esta criança Sem Terra, além de se

identificar como Sem Terrinha, entenda a importância da luta pela terra e a importância das pessoas

neste processo. E a escola deve contribuir neste processo de formação da criança.

Esse jeito próprio de ser das crianças Sem Terra se manifesta na maneira de entoar

o hino do MST, de olhar e cuidar da bandeira, no se assumir como criança Sem

Terra, etc. Quando falam do Movimento, das mobilizações feitas por elas, seus

olhares brilham. E falam com jeito alegre, feliz, com um conhecimento muito

grande. Apostar na formação das crianças desde as brincadeiras, as mobilizações,

a auto-organização, é formar pessoas com consciência política, conhecimento e

informação. Por isso é preciso montar estratégia dentro de um projeto de vida, de

ser humano em que se vai afirmando o direito da infância à cultura, pois é uma das

raízes que vão dar suporte a este ser humano com valores sociais, como sujeitos de

cultura, como sujeitos de direitos. (MST, 2011, Não paginado).

As Escolas dos assentamentos/acampamentos são instrumentos educativos que reforçam a

permanência dos trabalhadores/as na terra, fornecendo-lhes condições reais de construção de

conhecimentos necessários para implementarem um novo modelo de desenvolvimento territorial no

campo. Modelo este que é baseado na cooperação agrícola, nas tecnologias econômicas e

ecologicamente sustentáveis, no respeito à dignidade e aos direitos humanos do trabalhador da terra.

E com certeza é um grande desafio para a escola difundir a cultura e os conhecimentos científicos

nas diferentes áreas do saber, pois ela não pode restringir a sua atuação somente em sala de aula, ela

precisa estar integrada a comunidade, promover atividades culturais, pedagógicas e participar

ativamente das mesmas.

Assim, a luta pela terra neste país fez germinar a Educação do Campo. Ela nasce da

construção de um projeto de vida no campo. Por isso, a Educação do Campo não pode se realizar

nas propriedades do agronegócio, nos grandes latifúndios da monocultura. Apenas nos territórios

camponeses, pois os mesmos são lugares habitados por muitas pessoas (crianças, jovens, adultos e

idosos) onde a escola ganha importância. Dessa forma, o território camponês é o lugar da

concretização da Educação do Campo. Dessa forma, vejamos o quadro abaixo que nos mostra esses

antagonismos existentes no campo, descritos por Fernandes e Molina (2004, p. 85):

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Nesta perspectiva, Fernandes e Molina (2004) apontam que o campo é o espaço da cultura

e da vida, portanto, não podem ser vistos apenas como espaço de produção de mercadorias, como

aponta o agronegócio. E a escola do campo tem que estar sintonizada com esta lógica.

O campo não é somente o território do negócio. É, sobretudo, o espaço da cultura,

da produção para a vida‟‟, faz-se necessário apresentar como a escola está em

sintonia com o fazer pedagógico e a dimensão de campo: os processos de

socialização e de conservação e criação dos hábitos, costumes, ou seja, as

especificidades de um povo. Desde a infância é preciso criar uma visão crítica e

histórica por uma educação do campo, com cara de seus protagonistas. (p.53).

Então, pode-se dizer que a Educação do Campo é um processo de aprendizagem que

acontece no campo e que é desenvolvido pelos educadores e educandos desse espaço a partir das

necessidades dos sujeitos que lá vivem. Esse processo educativo deve acontecer nos territórios

camponeses, pois as pessoas têm o direito de estudar onde vivem. Também deve ser um projeto do

campo à medida que é pensado a partir da realidade dos camponeses.

CAMPO DO AGRONEGÓCIO

CAMPO DA AGRICULTURA

CAMPONESA

MONOCULTURA – COMMODITIES POLICULTURA – USO MÚLTIPLO DOS RECURSOS

NATURAIS

PAISAGEM HOMOGÊNEA E SIMPLIFICADA PAISAGEM HETEROGÊNEA E COMPLEXA

PRODUÇÃO PARA EXPORTAÇÃO

(PREFERENCIALMENTE)

PRODUÇÃO PARA O MERCADO INTERNO E PARA

EXPORTAÇÃO

CULTIVO E CRIAÇÃO ONDE PREDOMINA AS ESPÉCIES

EXÓTICAS

CULTIVO E CRIAÇÃO ONDE PREDOMINA AS

ESPÉCIES NATIVAS E DA CULTURA LOCAL

EROSÃO GENÉTICA CONSERVAÇÃO E ENRIQUECIMENTO DA

DIVERSIDADE BIOLÓGICA

TECNOLOGIA DE EXCEÇÃO COM ELEVADOS NÍVEL DE

INSUMOS EXTERNOS

TECNOLOGIA APROPRIADA, APOIADA NO SABER

LOCAL COM BASE NO USO DA PRODUTIVIDADE

BIOLÓGICA PRIMÁRIA DA NATUREZA.

COMPETITIVIDADE E ELIMINAÇÃO DE EMPREGOS TRABALHO FAMILIAR E GERAÇÃO DE

EMPREGOS

CONCENTRAÇÃO DE RIQUEZAS, AUMENTO DA

MISÉRIA E DA INJUSTIÇA SOCIAL.

DEMOCRATIZAÇÃO DAS RIQUEZAS –

DESENVOLVIMENTO LOCAL

ÊXODO RURAL E PERIFERIAS URBANAS INCHADAS PERMANÊNCIA, RESISTÊNCIA NA TERRA E

MIGRAÇÃO URBANO - RURAL.

CAMPO COM POUCA GENTE CAMPO COM MUITA GENTE, COM CASA, COM

ESCOLA...

CAMPO DO TRABALHO ASSALARIADO (EM

DECRÉSCIMO)

CAMPO DO TRABALHO FAMILIAR E DA

RECIPROCIDADE

PARADIGMA DA EDUCAÇÃO RURAL PARADIGMAS DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

PERDA DA DIVERSIDADE CULTURAL RIQUEZA CULTURAL DIVERSIFICADA – FESTAS,

DANÇAS, POESIAS – MUSICA – EXEMPLO: O

MATO GROSSO É O MAIOR PRODUTOR

BRASILEIRO DE MILHO E NÃO COMEMORA AS

FESTAS JUNINAS. JÁ NO NORDESTE...

AGRO-NEGÓCIO AGRI-CULTURA

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É importante ressaltar que esta educação é um direito conquistado historicamente e,

portanto, é dever do Estado provê-la. No entanto, ainda é grande a luta para que de fato esse direito

seja efetivado.

Para fazer valer de fato esta proposta de transformação social, o MST acredita que é

fundamental construirmos uma educação orientada para o trabalho e à cooperação social, assim,

esta concepção passou a ser o segundo princípio filosófico, determinando a importância de

desenvolver relações coletivas de trabalho.

O MST tem refletido sobre uma educação diferenciada para atender as necessidades dos

camponeses, em especial para os acampamentos e assentamentos constituídos através da ocupação

de terras. Caldart (1997) explica que a questão educativa dentro do Movimento estava, num

primeiro instante, vinculada à presença das crianças no acampamento, mas, num segundo momento,

o interesse por levar a educação à população do campo constitui-se em mais uma bandeira de

reivindicação por compreender que sem uma educação emergida pelos próprios sujeitos do campo,

a tão sonhada transformação social seria impossível.

Esta preocupação com uma educação que contribua com a formação de novos seres

humanos conscientes de seu papel, enquanto sujeitos históricos, constitui o primeiro princípio

filosófico que orienta toda e qualquer ação educativa dentro das escolas dos assentamentos. Como

diz Bezerra (1997):

[...] o principal objetivo é transformar as escolas de 1º grau dos assentamentos em

instrumentos de transformação social [...] desenvolver uma proposta de educação

que proporcione [...] conhecimentos de experiências concretas de transformação da

realidade, a partir dos desafios do assentamento ou acampamento, preparando-se

crítica e criativamente para participar dos processos de mudança da realidade [...].

(1997, p 75).

A educação do campo reafirma a importância da escola no processo político e organizativo

da comunidade, partindo do princípio de como a escola no assentamento surge, para quem ela surge

e que homens e mulheres ela deve forjar.

2.3 – A EDUCAÇÃO DO CAMPO NAS ÁREAS DE ASSENTAMENTOS E

ACAMPAMENTOS NO ESPÍRITO SANTO

As primeiras escolas surgem nos acampamentos e assentamentos vinculados ao MST, se

efetivando na década de 1980 com a implementação das séries iniciais do ensino fundamental (1ª a

4ª série). A educação nas áreas de acampamentos e assentamentos rurais no Espírito Santo teve seu

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impulso a partir do primeiro Congresso Nacional, realizado em Curitiba - Paraná, em janeiro de

1985.

A educação escolar em áreas de acampamentos e assentamentos rurais no Espírito

Santo teve o seu ápice a partir do primeiro Congresso Nacional, realizado em

Curitiba - Paraná, em janeiro de 1985. Neste mesmo ano, precisamente no mês de

abril, foi realizado no Espírito Santo, um encontro com lideranças de base,

pastorais, sindicatos e representantes do MST, em nível nacional, no qual se

definiu pela implementação das metas delineadas no Congresso. [...]. Esse trabalho

teve seu início nos municípios de Nova Venécia e de Ecoporanga, ambos

localizados a oeste do estado, durante um período de aproximadamente seis anos

(1975/81), quando representantes das CEB‟s realizaram um trabalho pioneiro em

benefício às famílias mais necessitadas, mesmo enfrentando ameaças dos

latifundiários da região. (KOLLING; NERY; MOLINA, 1999, p. 37).

Foram, então, realizados vários encontros com as organizações envolvidas a fim de definir

quais eram as características da escola que estavam querendo construir nos acampamentos e

assentamentos. Nesta proposta, a intenção é que depois que o acampamento se transforma em

assentamento, a escola passa a ser uma referência para as famílias assentadas, assim como para as

demais instâncias da organização, desencadeando uma inter-relação entre a comunidade escolar

(família escola e comunidade) e o conjunto do MST.

Como na luta pela terra, a luta por escola também deve ser consistente e conquistada

pelo/para o povo. Sua metodologia deve ser alimentada por valores que desenvolva nos homens e

mulheres do campo os princípios do trabalho e da coletividade. Que seja então capaz de fomentar

uma proposta de educação diferenciada, vinculada à realidade do campo, pois para o MST, a

educação nas áreas de acampamentos e assentamentos rurais, é mais que o

Processo de escolarização, sendo, na verdade, uma valiosa escola de vida, que faz com que a

integridade das famílias seja o contraponto das dificuldades vivenciadas no cotidiano. Construindo

assim, uma organização interna que eleve cada vez mais a autoestima das famílias, na esperança e

na luta por uma sociedade diferente.

Portanto, o anseio pelas escolas de assentamentos do estado do Espírito Santo já traz, desde

o início, a concepção de que a educação é mais do que escola, e que escola não se restringe apenas

ao local onde alguém ensina e alguém aprende. Por isso, a elaboração de uma proposta de educação

capaz de fomentar a inter-relação entre família, escola, comunidade e o conjunto do MST deve, na

verdade, se fundamentar nos valores ainda desenvolvidos na luta pela terra iniciada no período de

acampamento.

A Educação do Campo é o resultado de toda essa trajetória histórica na busca por uma

educação que atenda às necessidades do homem do campo sem se desvincular do campo,

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resgatando sua cultura e implementando práticas que incorporem o conhecimento sem se

desprender do seu desenvolvimento cotidiano, assegurando o que diz no Texto Base – Por Uma

Educação Básica do Campo (KOLLING; NERY; MOLINA,1999).

Atualmente, as escolas mantidas pelo Estado sofreram algumas alterações em sua estrutura

física, mas não foi o suficiente para atender a demanda de uma Educação do Campo, ainda há

deficiência de salas de aulas, carteiras e mesas, “merenda escolar”, alguns materiais didáticos e

pedagógicos, entre outras necessidades5.

2. 4 - A PEDAGOGIA DA ALTERNÂNCIA E A FORMAÇÃO DE JOVENS CAMPONESES

As primeiras experiências com a Pedagogia da Alternância, no Brasil, surgem no meio

rural em 1969, no Espírito Santo, com as Escolas Famílias Agrícolas – EFAs. A Pedagogia da

Alternância não é resultado de uma experiência na área de educação realizada por alguma

universidade européia, norte-americana ou mesmo brasileira. E, sim, foi pensada a partir da

realidade dos agricultores somando à práxis pedagógica ao desenvolvimento e permanência do

homem e da mulher no campo.

A Pedagogia da Alternância está estruturada como um conjunto de instrumentos que

orienta o educando a se vincular à realidade da família e da comunidade. Em primeiro momento, de

diagnóstico da problemática; em segundo, de reflexão, a partir de elementos teóricos; em terceiro de

ação, de acordo as possibilidades de intervenção no meio onde vive. Então, se a PA propõe a

produção do conhecimento a partir da realidade, a dinâmica da realidade passa a ser a dinâmica da

PA. Segundo as contribuições de Gimonet (1999):

A alternância significa, sobretudo, uma outra maneira de aprender, de se formar,

associando teoria e prática, ação e reflexão, o empreender e o aprender dentro de

um mesmo processo. A alternância significa uma maneira de aprender pela vida,

partindo da própria vida cotidiana, dos momentos experienciais, colocando assim a

experiência antes do conceito. A alternância, em comparação com a escola

tradicional, inverte a ordem dos processos, colocando em primeiro lugar o sujeito

que aprende suas experiências e seus conhecimentos, e, em segundo lugar, o

programa. O jovem ou o adulto em formação não è mais, neste caso, um aluno que

recebe um saber exterior, mas um ator socio-profissional que busca e que constrói

seu próprio saber. Ele è sujeito de sua formação, ele è produtor de seu próprio

saber. (p. 44-45).

5 Vamos discutir mais especificamente esta questão em nosso estudo de caso na EEEF Valdício Barbosa dos Santos.

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A expansão da Educação do campo através da Pedagogia da Alternância tem sido

estimulada e articulada em vários espaços comprometidos com o desenvolvimento da agricultura

camponesa com resultados positivos dentro da realidade do campo. O envolvimento da EFA no

processo de discussão das escolas dos assentamentos, fez com que essa pedagogia fosse absorvida

pelas escolas de assentamentos, adaptada a realidade dos assentamentos.

Outro elemento importante da Pedagogia da Alternância é a permanência e relação que

deve ser estabelecida entre os educadores/as e a comunidade, além da permanecia a escola em

período integral contribuindo para além da sala de aula nos diversos setores da escola . O educador

de escola de assentamento é responsável, de forma coletiva, pelo funcionamento da escola em todas

as suas dimensões: administrativa, pedagógica, integração escola x comunidade. Além da

importância de estarem sempre inseridos politicamente nas atividades do Movimento Sem Terra.

Com a pedagogia da alternância deixa-se deixa para traz uma pedagogia plana para

ingressar numa pedagogia no espaço e no tempo e diversificam- se as instruções,

bem como os autores implicados. Os papéis destes não são mais os da escola

costumeira. O jovem (pré-adolescente, adolescente, ou jovem adulto) em formação

isto é o “alternante” não é mais um aluno na escola, mas já um autor num

determinado contexto de vida e num território. Sua família é convidada a participar

ativamente de sua educação, de sua formação, acima de tudo porque é jovem

(GIMONET, 2007, p.19).

A Pedagogia da Alternância é uma ferramenta na formação dos jovens do campo, pois sua

práxis pedagógica é fundamentada na agricultura camponesa, na cultura dos povos e na formação

da identidade. A escola é um espaço importante para a Educação do Campo. Reconhece-se que ela

é fundamental como fator de reelaboração dos saberes da vida e das relações sociais estabelecidas

entre homens e mulheres, referência básica para a socialização e a compreensão do meio onde vive

os sujeitos do campo.

Assim, prevalece o entendimento sobre a importância da escola, sem que se neguem as

influências estranhas que ela poderá trazer para esse universo. Não é só na escola que a socialização

desses homens e mulheres se efetivam, mas ela é um importante espaço de acessos ao conhecimento

o que possibilita a esses sujeitos o domínio dos instrumentos necessários para ampliar sua condição

de cidadãos. Trata-se de um desafio para os educadores compreenderem como a escola pode

contribuir no processo de formação política e pedagógica dos jovens, assim como sua permanência

no campo.

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2.5 - A PROPOSTA DE EDUCAÇÃO DO ESTADO: ENCONTROS E DESENCONTROS

COM A PROPOSTA DO MST

De acordo com a proposta de educação do estado do Espírito Santo, devem ser

reconhecidas as diversidades humanas, entre elas, está contemplada a Educação do Campo. Assim,

a educação deve ser regida e executada, a partir de suas necessidades básicas capazes de garantir a

todos e a todas o direito a igualdade na esfera do ensino, respeitando as especificidades e o contexto

sociocultural de seus sujeitos. Este fato significa uma conquista ainda que tenhamos uma longa

caminhada para conseguirmos construir uma educação que contemple os anseios do MST:

A construção de um currículo estadual para a educação básica busca garantir que

os estudantes capixabas tenham acesso de escolarização nos níveis Fundamental e

Médio, reconhecendo ainda as diversidades humanas que caracterizam as

modalidades de Educação de Jovens e Adultos – EJA, Educação Especial e

Educação do Campo, que serão contempladas com diretrizes curriculares próprias.

Um currículo que promova a equidade como oportunidade a todos de alcançar e

manter um nível desejável de aprendizagem. (CURRÍCULO DO ESTADO, 2009,

p.11).

É necessário que seja respeitado as especificidades dos sujeitos envolvidos na educação,

pois a educação com princípios políticos, filosóficos e pedagógicos iguais aos da cidade não dão

conta de responder as necessidades e desigualdades que devem ser respeitadas, como afirma

Frischeisen.

A conjugação de ambos os aspectos do princípio da igualdade leva o estado a criar

políticas universalizantes, garantindo a todos acesso universal aos bens e serviços

em patamares mínimos, mas leva também á necessidade de criação de políticas

específicas, que têm como alvo prioritário determinados grupos vulneráveis dentro

da sociedade.

Engels (1986) argumenta que o Estado, como ordenamento político de uma comunidade,

teria surgido na passagem da comunidade primitiva fundada pelos laços de parentesco para a

comunidade civil. Se a origem da denominação e da instituição Estado é controversa, a ligação da

educação ao Estado é um fenômeno tipicamente moderno.

O sistema educacional brasileiro, desde seu surgimento, tem privilegiado um grupo social

dominante neste nosso país. Pode-se dizer que o sistema educacional foi pensado e estruturado no

Brasil para atender uma camada social que dominava e ainda domina a nação brasileira, visando a

manutenção da desigualdade social.

Sendo assim, a história da educação brasileira é marcada pelo descaso ao direito de acesso

à educação que deveria ser ofertada e assegurada a todas as pessoas. Esse descaso ainda se faz mais

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presente na população do campo. Mesmo que a educação seja um direito, assegurado como política

pública, e que no âmbito legal o Estado deva garantir uma escola pública e de qualidade à

sociedade. Neste sentido é que as famílias assentadas e o Setor de Educação do MST tem defendido

a escola pública para a formação dos educandos (as) das escolas de assentamento.

Nesta perspectiva, afirma Kolling: “Fortalecer a luta pela educação do campo dentro do

sistema de ensino é importante porque é na esfera da atuação do estado, do público que temos que

fortalecer nossa demanda”. (ET al., 2002, p.40). É dever do Estado a garantia da escola pública e de

qualidade também no Campo, qualidade negada na estrutura da Educação no Campo, pois não basta

que tenha só as escolas no campo, o Estado deve garantir o ensino específico para os camponeses,

pois no conjunto das relações sociais a educação se materializa através de princípios pensados para

determinados públicos que nem sempre tem as mesmas necessidades ou concebe a educação da

mesma maneira.

As políticas públicas de educação, desenvolvidas para educação básica brasileira, são

políticas quantitativas, onde o principal elemento a ser avaliado na educação é o índice quantitativo

e não qualitativo. Esse atrofiamento do Estado se opõe fortemente ao modelo intervencionista e

desenvolvimentista que o país vinha adotando desde 1930, gerando uma nova forma de regulação

estatal que se dá não mais pela execução direta, mas pela transferência de encargos, gastos e

responsabilidades para outras instâncias administrativas subnacionais, para as escolas e mesmo para

as famílias, ao mesmo tempo em que os marcos regulatórios do Estado são redefinidos a partir da

lógica típica do mercado, de prescrição de metas, objetivos, controle de produtos e resultados

(ARAÚJO, 2009).

Exemplo desses novos marcos regulatórios nas políticas educacionais atuais são o Plano de

Desenvolvimento da Educação (PDE), a criação de indicadores como o IDEB (Índice de

Desenvolvimento da Educação Básica), a expansão (muitas vezes com sobreposição) dos testes

padronizados em larga escala com ênfase no rankeamento entre instituições e sistemas de ensino –

Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), Prova Brasil e Exame Nacional do Ensino

Médio (ENEM), que desconsideram os processos educativos e valorizam apenas os resultados

obtidos (ARAÚJO 2009).

Outro exemplo é a proposta pedagógica ofertada pelo currículo da base comum do estado

que constitui em seu cronograma uma proposta única de fundamentação teórica, conteúdos,

competências e habilidades para as escolas em geral, fundamentadas apenas nas disciplinas da base

comum do estado.

Nas escolas de assentamento do Estado do Espírito Santo as disciplinas da base comum

não dão conta de fundamentar política, pedagógica e filosoficamente as disciplinas ofertadas nas

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escolas, pois o currículo escolar do estado vem ofertando as escolas, as áreas de: Ciências Humanas,

Naturais, Linguagens e códigos. Estas áreas de conhecimento contemplam apenas as escolas

urbanas e às do campo que implementam somente as disciplinas da base comum.

Porém, as escolas de assentamento, especificamente as turmas de 5º à 8ª série, não são

contempladas por completo no currículo. Sendo necessária, assim, a criação de outra área de

conhecimento que seja capaz de ofertar subsídios teóricos, metodológicos e legais que abarquem a

todas as disciplinas ofertadas nas escolas, pois a fim de atender as necessidades básicas do campo as

escolas de assentamento, também, programam em sua proposta de educação as disciplinas de

Zootecnia; Agricultura; PPF (Prática na Propriedade Familiar) e Educação Familiar, que com base

no novo currículo escolar do estado não são considerados especificamente.

Concebemos a criação da área de Ciências Agrárias como necessidade. No sentido de

pensar a Educação do Campo uma maneira de propor para a comunidade rural um novo espaço

cultural e social, que valorize a prática da agricultura de subsistência e familiar na escola, sendo

capaz de desenvolver a formação de novos hábitos dentro de um processo social e educativo,

contemplando conceitos de sustentabilidade ambiental, cultura, valores, coletividade e valorização

da vida no campo.

A disciplina de Zootecnia vem sendo desenvolvida como apoio técnico, propondo aos

educando (as) conhecimentos teóricos e práticos da criação de animais. Porém, essa disciplina,

assim como a agricultura, é ainda muito fragmentada por falta de subsídios teóricos e

metodológicos do currículo escolar do estado.

As disciplinas de Agricultura, Prática na Propriedade Familiar (PPF) e Educação Familiar

objetiva subsidiar os temas geradores trazendo para ser estudados temas da realidade local e geral,

pertinentes às vivências dos educandos. Preocupa-se também com o bem-estar das famílias

assentadas, motivando os educandos/as a organização comunitária e a vida no campo. Por isso,

estas disciplinas são necessárias para formação dos camponeses.

Desse modo, por mais que se dê uma abertura para que as escolas de assentamento

elaborem seu próprio plano de ensino através dos princípios da educação do MST, ainda temos

diversas barreiras a serem superadas. Pois, quando a escola não contempla a história de luta dos

camponeses, este fato se torna uma contradição nas escolas de assentamento que emergiram da luta

pela terra e prejudica o fortalecimento do território camponês, pois não podemos aceitar a

implementação de políticas que excluem as relações socioculturais estabelecidas nestes espaços.

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3 – A EDUCAÇÃO NO ASSENTAMENTO VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS: A

ESCOLA ESTADUAL DE ENSINO FUNDAMENTAL E SEUS DESAFIOS

“É preciso mudar o jeito da escola, suas práticas e sua estrutura de organização e funcionamento, tornando-a

coerente com os nossos objetivos de formação de cidadãos, capazes de participar ativamente do processo de

construção da nova sociedade”. (Pistrak).

3.1 – A CONQUISTA DA EEEF VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS POR MEIO DA

LUTA PELA TERRA6

O MST ao longo de sua caminhada vem fazendo história por meio da luta pela terra -

Reforma Agrária, socialismo e educação. Nessa trajetória a favor da educação, foram conquistadas

inúmeras escolas e muitos cursos de formação política e profissional para os educadores e

educadoras das escolas de assentamentos. As conquistas são grandes, mas insuficientes pelo

número de Sem Terras que ainda não conseguiram sentir o gosto desse direito.

Uma das escolas do MST resultado desta luta é a EEEF Valdício Barbosa dos Santos, que

há quinze anos vem contribuindo na formação dos educandos/as do Assentamento e das

comunidades vizinhas. A Escola está localizada no Assentamento “Valdício Barbosa dos Santos”

em Conceição da Barra, extremo norte do Espírito Santo.

A escola no assentamento é fruto da luta pela terra, feita pelas famílias, educandos/as e vai

se constituindo através da persistência das famílias em ter a escola no assentamento. Ela começa

debaixo da lona, no curral, em barraco de madeira, até chegar a uma estrutura maior, todo esse

processo se dá através da luta dos Sem Terra, através das mobilizações de movimentos sociais

articulados pelo sonho da escola para além das quatro paredes, através da marcha, dos mutirões, das

reuniões, assembléias etc.

A Escola Estadual de Ensino Fundamental “Valdício Barbosa dos Santos”, surgiu a partir

de uma ocupação organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na

Fazenda Água Preta, situada ao leste do município de Conceição da Barra, Estado do Espírito

Santo, em 22 de outubro de 1995. Assim que as famílias estabeleceram-se na terra iniciou-se a

discussão em relação à criação de uma escola que pudesse contribuir e dar continuidade a luta dos

trabalhadores (as) rurais, além de ensinar a ler, escrever e calcular a realidade.

Nesta época, já existia o Setor de Educação do MST no Estado do Espírito Santo,

composto por educadores das escolas dos assentamentos existentes, que tinha (e ainda tem) como

uma das principais tarefas, acompanhar junto aos conselhos de educação dos acampamentos e

assentamentos recém - criados, todo o processo de luta pela conquista da escola.

6 A história aqui contada é fruto da vivência empírica no assentamento do qual a autora mora e de trabalhos de campo

para desenvolver a pesquisa onde entrevistamos moradores.

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Sendo assim, o Setor de Educação do MST/ES e os pais imediatamente procuraram o

subnúcleo (Secretaria de Educação Estadual que existia em cada município capixaba - órgão

responsável pelas escolas da rede estadual de educação) do município de Conceição da Barra para

viabilização do processo de criação da escola e de condições imediatas para o funcionamento das

aulas para as crianças acampadas. Enquanto isso, no acampamento, aproximadamente 150 crianças

ocupavam o curral onde o boi, antes, era tratado, para transformá-lo em salas de aula.

Felizmente, essa realidade não durou muito tempo, pois a emissão de posse foi dada às

famílias, após seis meses de ocupação da Fazenda e a construção do prédio escolar foi iniciado e

concluído um ano depois da conquista da terra.

Dada à emissão de posse, a área foi dividida em oitenta e nove lotes de produção e apenas

um terço das famílias optou pela construção de suas casas na agrovila do assentamento, devido o

sistema de agrovila adotada (agrovila única), dificultar o acesso da família ao lote de produção,

como não houve consenso, somente as famílias que concordaram com o sistema de agrovila, ali se

instalaram.

No primeiro ano de criação do assentamento, foi construído um prédio escolar na agrovila

(construção realizada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA)

facilitando o acesso à escola apenas às crianças moradoras da agrovila. Como não havia um

transporte escolar para deslocar as crianças moradoras nos lotes de produção para a agrovila as

famílias decidiram construir uma escola em uma área mais central do assentamento, fora da

agrovila, com recursos próprios, aproveitando os materiais de uma antiga casa existente na fazenda.

Como mostra a foto 01 abaixo:

Foto 01 - Salas de aula: um barraco de palha e outro de madeira

Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (1997)

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Enquanto isso, as famílias continuavam suas reivindicações ao Estado, pela construção de

outro prédio escolar para atender as outras crianças. Pois, a escola do campo surge junto com a luta

pela terra e seus protagonistas são os próprios acampados/as, pois ela inicia ainda no acampamento

e vai ganhando corpo no assentamento. Não faz parte dos princípios do MST espera que se faça

primeiro a escola para depois iniciar as aulas. O caminho é justamente o inverso a este. A educação

é fruto da luta, ela chega na terra junto as famílias e seu processo de construção pedagógico e

estrutural vai expandindo junto aos seus sujeitos, até ser reconhecido pelos órgãos públicos o que

não finaliza seu processo de construção coletiva, pois as práticas coletivas continuam como os

mutirões, o trabalho voluntário, a construção da proposta pedagógica da escola e outros, o que

muda são as novas reivindicações, os novos desafios as novas forma de ser organizar.

Esta foto 02 mostra educandos/as em mutirão limpando o pátio da escola quando ainda

estudavam em um barraco de palha e um barraco de tábua.

Foto 02 - Mutirão com educandos na escola Valdício Barbosa dos Santos

Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (1997).

A reivindicação tornou-se realidade no ano de 1998, quando foram construídas salas de

aula anexas a Escola de Primeiro Grau Valdício Barbosa dos Santos, funcionando até o ano 2000

apenas com turmas de 1ª à 4ª série e Educação de Jovens e Adultos - EJA.

Em meados do ano 2000, uma nova preocupação pairava nas famílias assentadas, o que

fazer com as crianças que estavam concluindo a 4ª série, pois não havia por parte das famílias a

mínima vontade de colocar seus filhos para estudar na cidade ou em outro assentamento, pois nessa

época os adolescentes (5ª a 8ª série) estudavam na escola União em outro Assentamento. Na

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íntegra, a necessidade no momento era dar continuidade aos estudos das crianças, sem retirá-las do

assentamento, assim surgiram várias reivindicações na luta pela criação das turmas de 5ª à 8ª série,

que passa a ser uma realidade a partir do ano de 2001 funcionando em sistema de alternância.

Vale ressaltar, que essa conquista foi motivada por um grupo de assentados (os que

moravam nos lotes de produção), que questionavam que as benfeitorias estavam se concentrando na

agrovila do assentamento e que isso era em virtude da escola está localizada neste espaço. Mas, com

o tempo essa percepção foi sendo superada.

Como a vida não é feita só de vitórias, entre o ano de 2001 a 2003, houve um marco

negativo para a história desta comunidade, haja vista que devido à venda de lotes de produção

ocorrida em alta porcentagem no assentamento Valdício Barbosa dos Santos, muitas famílias

conhecedoras do Projeto de Educação do MST mudaram do assentamento e outras famílias

chegaram. Isso, de certa forma, forçou a comunidade escolar a desenvolver atividades para divulgar

e, ao mesmo tempo, fortalecer a proposta de educação da escola que estava sendo consolidada.

Essas atividades eram desde a realização de mutirões para limpeza e ornamentação do espaço

escolar, às visitas a casa das famílias dos educandos, realizadas pelos educadores membros do setor

de educação e o conselho de escola para conversar com os pais sobre a educação.

Para fortalecer o envolvimento da comunidade na vida escolar, esta escola vem, nestes 15

anos, desenvolvendo uma série de atividades em conjunto com a comunidade. Podemos destacar:

atividades culturais como sarau de poesias realizado pelos educandos (as), festas de datas

comemorativas, apresentação de teatros, festa de aniversário do assentamento (vejam nas fotos 03 e

04), assembléias de pais, mutirões para pintura do prédio escolar, gincana, campanha de alimentos e

sementes, visitas de estudo para conhecer outras atividades, concurso de desenho e redação,

pesquisa de campo sobre os temas geradores, principalmente, temáticas que debatam e discutam a

situação vivenciada no assentamento ou sobre um assunto ligado a uma disciplina, planejamento,

místicas, projetos de leitura na família e participação da escola nas atividades do MST com o

Encontro do Sem Terrinha, Encontros de jovens e Encontros Regionais e estaduais de educadores

da Reforma Agrária.

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Foto – 03 e 04 - Aniversário dos 13 nos do Assentamento

Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (2009)

A escola no assentamento continua se constituindo através dos mutirões e trabalhos

cotidianos como mostra a foto 05 abaixo:

Foto- 05- Educandos pintando o refeitório da escola

Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (2010)

Assim como os níveis de ensino, a escola também mudou sua estrutura física ao longo

destes 15 anos. Sendo que o assentamento conta com dois prédios, um na agrovila funcionando com

as turmas de 1º ano, 1ª série, 2º ano, 2ª série e 3º ano e uma turma da EJA (Educação de Jovens e

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Adultos). O prédio que está localizado ao centro do assentamento (foto 06) funciona com uma

turma de Educação Infantil, duas turmas do 4º e 5º ano (turma multisseriada), turmas do 6ª ao 9º

ano e uma turma da EJA.

Foto 06 – Prédio da escola atualmente

Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (2011)

Aumentar o número de educandos da escola é sempre um desafio, pois a escola conta com

quatro comunidades vizinhas para completar o número de educandos da escola. É possível observar

através do quadro 01 como o número de educandos foi variando durante estes 15 anos de escola. O

quadro abaixo demonstra quantitativamente o número de alunos (as) ao longo da existência da

escola de acordo as séries7.

7 Os dados mais recentes ainda não foram organizados pela secretaria da escola.

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Quadro 1 -Número de alunos (as) ao longo da existência da escola de acordo as séries

1ª à 4ª 5ª à 8ª EJA TOTAL

1996 115 - - 115

1997 127 - - 127

1998 93 - - 93

1999 90 - - 90

2000 60 - - 60

2001* 56 31 15 102

2002** 66 40 - 106

2003*** 58 53 13 124

2004 37 48 - 85

2005 32 34 16 82

2006

2007

2008

2009

2010

41 49 16 106

*Inicia-se o ensino de 5ª à 8ª série atendendo à 5ª e 6ª;

** Ensino 5ª à 7ª;

***A partir de 2003, turmas completas, de 5ª à 8ª. Fonte: Arquivo da EEEF Valdício B. dos Santos (2011)

O fato de a escola receber educandos das comunidades vizinhas ao assentamento traz um

desafio, pois com a mudança de público, mesmo sendo eles todos moradores do campo, é preciso

ser feito várias alterações na proposta político-pedagógica da escola para atender a diversidade de

moradores do campo, tendo como educandos filhos/as de assentados, de meeiros, empregados

assalariados, vaqueiros etc.

No entanto, o que temos em comum é o objetivo de a escola potencializar uma educação

que desenvolva valores humanistas e socialistas, capazes de gerar novos homens e mulheres.

3.2 – ARTICULAÇÃO E CONFLITUALIDADE NA PROPOSTA POLÍTICO-

PEDAGÓGICA DA EEEF VALDÍCIO BARBOSA DOS SANTOS: A DISPUTA DE

PROJETOS ENTRE O MST E O ESTADO PARA A FORMAÇÃO DO EDUCANDO-

CAMPONÊS

A escola tem causado mudanças no Assentamento Valdício Barbosa dos Santos nos

aspectos: culturais, políticos, econômicos e sociais, mas ainda há muito que mudar. A cada dia

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nascem pessoas no assentamento e chegam pessoas novas. As influências ocorridas através do

sistema capitalista estão presentes na vida da comunidade sufocando os sinais de emancipação dos

trabalhadores assentados. Neste sentido, a escola também vem se esforçando para dá conta de seu

papel político pedagógico através de seu processo organizativo.

Segundo a assentada Vivaldina, a escola no assentamento é um instrumento que auxilia no

processo de continuidade da luta do Movimento Sem Terra. Pois, além de possibilitar a formação

dos filhos/as dos assentados/as, se torna um importante espaço de diálogo e socialização das

famílias no assentamento. Além de contribuir na organização da comunidade.

A escola no assentamento é a nossa segunda casa, a escola é o coração do

assentamento porque ela é a responsável pela continuidade de nossa luta, através da

formação de nossos filhos, de fortalecer neles o vigor da luta. Além disso, ela é

também um espaço onde reunimos para debater assuntos relacionados ao

assentamento, mais também para fortalecer a pertença das famílias ao MST.

(Entrevista realizada em 23/09/10).

Dessa forma, a escola precisa e deve estar enraizada/territorializada nas organizações

sociais. Precisa ser pensada a partir de seus sujeitos, vinculada a um projeto popular de escola do

campo fortalecendo sua gênese que advêm da conquista do assentamento através da luta pela terra.

Dessa maneira, podemos dizer que a escola é um espaço importante para a educação dos povos do

campo, sendo uma referencia básica para a socialização e compreensão do território camponês.

A comunidade deve ser parte da escola e a escola parte da comunidade. Assim como a

proposta político pedagógica da escola deve ser elaborada através dos princípios da Educação do

Campo e da realidade do assentamento que deve ser elaborada não só para ensino escolar, mas

também para contribuir na organicidade da comunidade.

Ela ocupa um espaço fundamental na vida do assentamento, pois ela é um espaço, onde se

dão as relações sociais da comunidade, sendo ponto de referência para a mulher e o homem do

campo, com novos valores, e novos ideais. No sentido de mostrar que a escola no assentamento

deve proporcionar a permanência do homem e da mulher no campo, não vinculando apenas a

escolarização, mais sim a formação política, social e cultural de seus sujeitos.

No entanto, apesar dos avanços, a escola pertence à rede pública estadual de ensino, e isso

até o momento tem facilitado, em alguns pontos, e dificultado em outros, a implementação da

proposta pedagógica do MST das escolas de assentamento. Temos conseguido a participação,

discussão e o acompanhamento do coletivo de educação do MST sobre essas escolas.

A gestão da escola é feita de forma coletiva pela equipe de educadores/as junto com o

Coordenador Pedagógico e Conselho de Escola. O acompanhamento pedagógico da escola é feito

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pelo Coordenador Pedagógico, por meio do Setor de Educação do MST e da Superintendência

Regional de Educação do Litoral Norte de São Mateus.

Para desempenhar a função de regência de classe a escola conta com dez educadores/as e

uma auxiliar de secretaria. O serviço de apoio é realizado por uma servente e uma merendeira. A

escola vem tentando garantir na prática a implementação de seu projeto político-pedagógico,

direcionando na escola e no assentamento toda sua proposta pedagógica.

Assim, a escola Valdício Barbosa dos Santos está inserida em um território onde existe

uma conflitualidade no que concerne a sua proposta político-pedagógica que se vincula a dois

projetos: um da gestão coletiva, das mobilizações, encontros, mutirões e dos princípios da Educação

do Campo e o outro pautado na educação básica e dita de “qualidade” do Estado que nega os povos

do campo, através de seus princípios e propostas, mesmo assinando decretos, desenvolvendo

secretarias do campo, não dispõe de algo condizente com as comunidades, como adequação ao

campo de materiais didáticos, infraestrutura, gestão, Projeto Político Pedagógico, currículo, entre

outros elementos que são construídos a partir das relações sociais que se dão nestes territórios e não

são levados em consideração pelo estado.

Nesta disputa entre os dois projetos distintos de educação, podemos mencionar como as

conquistas do MST implementadas no Projeto Político Pedagógico da escola Valdício Barbosa dos

Santos e os princípios pedagógicos da educação do estado se confllitualizam e se articulam.

É a partir dessa necessidade de construção de uma educação do campo que tenha os

princípios políticos, pedagógicos e filosóficos do MST que vamos refletir acerca da proposta

político-pedagógica implementada na escola EEEF “Valdício Barbosa dos Santos”.

A Proposta Pedagógica EEEF “Valdício Barbosa dos Santos'' diz respeito à construção de

uma concepção e prática de escola pública de educação fundamental cujo objetivo é educar

crianças, adolescentes e jovens e adultos da área de assentamento e redondezas, cujos valores,

princípios e diretrizes são arraigados de um projeto de luta consistente, o ''Projeto de Educação do

MST”, pelo fato da referida escola ser constituída de sujeitos que emergiram da luta pela terra e de

valores específicos.

A Proposta Política Pedagógica tem em caráter geral todos os elementos que compõem a

escola, devendo fazer parte dela suas finalidades, concepções e diretrizes de funcionamento

(organização dos espaços educativos, os pressupostos políticos e pedagógicos, o regimento escolar,

a grade curricular, enfim uma série de quesitos).

É orientada pelos objetivos pedagógicos propostos às escolas de assentamentos. Esses

objetivos são: ensinar a ler, escrever e calcular a realidade, ensinar fazendo através da prática,

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construir o novo, preparar igualmente para o trabalho manual e intelectual, ensinar a realidade local

e global, gerar sujeitos da história e valorizar a terra como fonte de sobrevivência.

A Pedagogia da Alternância (Pedagogia da Terra) é a base pedagógica das turmas de 5ª a

8ª série, a qual se consiste em dois tempos: Escola e Comunidade. O tempo escola é marcado pelo

período de uma semana na qual os educandos permanecem na escola num período de dez horas ao

dia durante uma semana desenvolvendo os estudos propostos acerca da realidade. Já o tempo

comunidade consiste na permanência do aluno junto a sua família durante uma semana,

desenvolvendo atividades educativas e práticas propostas pela escola.

Assim, de acordo com o Projeto Político Pedagógico da escola Valdício Barbosa dos

Santos (2010), a Pedagogia da Alternância nas escolas de assentamentos tem por finalidade:

Integrar escolas, família e comunidade num processo de produção do conhecimento através da

organização coletiva dentro da escola e sua relação com a comunidade. Possibilitando a escola

espaços para o trabalho técnico-pedagógico agropecuário, limpeza, artesanato e outros, tanto na

escola quanto na família. Aplicando o conhecimento científico adquirido, a partir dos elementos da

pedagogia da alternância que são: a pesquisa da realidade, o tema gerador, o caderno da realidade, o

trabalho prático e cooperação, as visitas às famílias, as viagens de estudo, o planejamento coletivo,

as oficinas e avaliações.

A Pesquisa da realidade é um instrumento que permite aos educandos/as buscarem na

família e na comunidade informações, baseadas no conhecimento empírico, que dão subsídios para

que a escola possa desenvolver o conhecimento cientificamente acumulado. Essa pesquisa é

realizada e baseada em temas geradores que são assuntos significativos para a família e

comunidade. Seu desenvolvimento se dá a partir da escolha do tema gerador, onde é feito uma

motivação com os educandos/as, sobre o tema gerador, estes em pequenos grupos levam questões

para serem discutidas com a família.

Em uma plenária é feita uma síntese das questões levantadas pelos educandos/as. No

tempo família, os educandos/as trabalham estas questões na família ou na comunidade (de acordo

com o tema gerador). De volta à escola, os trabalhos são apresentados individualmente,

sistematizados em pequenos grupos e é elaborado uma síntese final da turma, onde é feito um

resgate dos questionamentos que surgiram. Essa síntese é utilizada como subsídio para o

planejamento bimestral da escola.

O Tema Gerador é responsável por fundamentar o plano de estudo da escola, através de

temas que venham debater questões que contribua no processo organizativo da comunidade. Esses

temas geralmente estão relacionados à produção do assentamento, a identidade cultural, o

organização da comunidade, ao ambiente e à política.

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O Caderno da Realidade é onde os educandos/as registram as experiências adquiridas no

período de alternância, e atividades desenvolvidas sobre os temas geradores, além de servir como

elemento de reflexão crítica da realidade em que o educando vive.

O Trabalho Prático e Cooperativo têm como objetivo desenvolver a prática relacionada ao

tema gerador, dando oportunidade aos educandos de expor suas experiências e ao mesmo tempo

levar experiências para sua família. Além disso, é o espaço em que o educando/a verifica e

experimenta as teorias estudadas, exercitando a cooperação e a auto – organização através de novas

habilidades realizadas através dos trabalhos manuais como: cultivo de horta alimentar e medicinal,

cultivo de outras culturas, plantio de árvores, limpeza e embelezamento da escola etc.

A foto abaixo mostra os educanos/as no horário do trabalho prático trabalhando na limpeza

dos canteiros na horta da escola.

Foto 07 – Educandos trabalhando na horta da escola

Fonte: Arquivo da escola (2010).

A Visita às Famílias é uma prática que permite conhecer a realidade individual da família e

sua contribuição com o processo educativo, além facilitar a avaliação do processo de ensino

aprendizagem. As visitas acontecem duas vezes ao ano, ou quando ocorre um problema específico

com um determinado educando/a.

A Viagem de Estudo é uma prática que visa tirar o educando/a da sala de aula, levando-o a

conhecer outras realidades, enriquecendo desta forma a sua experiência pessoal. Estas viagens

sempre acontecem relacionadas a um tema gerador. Assim, o educando/a realiza o intercâmbio de

experiências, desenvolve a capacidade crítica e reflexiva e desperta o gosto em conhecer o novo.

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Oficinas de Capacitação são atividades, relacionadas a um tema gerador, que buscam

capacitar os educandos em uma determinada área: artesanato, saúde popular, alimentação

alternativa, etc.

As Assembleias e Seminários são potencializados nas discussões de questões relacionadas

ao funcionamento geral da escola, avaliação e planejamento de temas de interesse da comunidade.

O planejamento de ensino do 1º ao 9º ano, é elaborado periodicamente a partir de temas

geradores. Temas geradores que são assuntos, questões ou problemas tirados da realidade dos

educandos e de sua comunidade. Eles permitem direcionar toda aprendizagem para a construção de

um conhecimento concreto e com sentido real (DOSSIÊ MST/Escola 1990-2001, p. 55).

O trabalho prático é realizado através da disciplina de Prática na Propriedade Familiar

durante três horas semanais, ministrada apenas nas turmas do 6º ao 9º ano. O trabalho é dividido em

cinco setores, assim como os educandos/as. Os educandos são divididos por setores, cada setor tem

um coordenador e um secretário e o planejamento do trabalho é feito pelos educandos sob a

orientação do educador responsável pelo setor.

Para a realização do trabalho prático, temos os cinco setores como partes integrantes do

espaço educativo da escola: o Viveiro, onde são guardada as sementes e as mudas de plantas para a

área da escola; a Horta, que produz hortaliças para ajudar na merenda escolar; a Lavoura, onde é

usada uma área maior para o plantio de mandioca, amendoim, milho e outras culturas agrícolas; o

Embelezamento, que é representado pela jardinagem e ornamentação das salas; o Horto Medicinal,

onde plantamos algumas ervas medicinal para uso da escola.

Todos educadores/as participam do trabalho prático e são responsáveis pelos setores. A

função dos educadores é a de planejar e encaminhar todos os processos educativos, buscando a

contribuição dos outros segmentos, além de discutir e encaminhar os problemas que acontecem no

cotidiano da escola. Para desempenhar suas funções essa equipe reúne ordinariamente uma vez por

semana nas segundas-feiras, sempre após o horário letivo.

Nesse sentido, elaborar um Projeto Político Pedagógico (PPP) exige da escola autonomia e

participação, elementos essenciais, pelo fato dessa elaboração demandar um conjunto de idéias de

um grupo: pais, alunos, educadores, comunidade escolar, conselho de escola, direção, dentre outros.

Isto implica da escola assumir com flexibilidade todas as partes que integram a escola, desde o

planejamento, aquele que será aplicado em sala de aula, até a forma que é pensada o cronograma de

aula, as intervenções, as reuniões, os projetos desenvolvidos pela escola, ou seja, é levar em

consideração tudo aquilo que existe na instituição, os quais serão objetos de estudos e avaliações

para se chegar ao novo. O novo é o redirecionamento do que existe em estratégias de progresso-

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inovação escolar. O PPP é um instrumento de planejamento que tende a facilitar a autonomia da

gestão escolar (MALHEIRO, 2005).

A autonomia pressupõe um exercício de diálogo entre os diversos atores envolvidos na

prática educativa, sejam docentes ou não, representando uma sucessiva troca de saberes para

melhorar o cotidiano escolar e superar os seus desafios. A construção permanente do projeto

pedagógico, numa perspectiva freireana em que o diálogo se faz numa relação horizontal, gera

naturalmente a confiança entre sujeitos. Somente o diálogo, que implica um pensar crítico, é capaz,

também, de gerá-lo. (FREIRE, 1987, p.83).

Defende-se aqui uma educação contrária a da racionalidade taylorista, a qual separa quem

decide de quem executa, além de fragmentar as ações em projetos desprovidos de sentido político.

Além de ser um instrumento educativo a escola deve valorizar a vivência e a identidade do

trabalhador e trabalhadora do campo. Fornecendo-lhes condições reais de desenvolvimento cultural

e produção de conhecimentos necessários para implementar um novo modelo de desenvolvimento

no campo.

É um grande desafio para a Escola difundir a cultura e os conhecimentos científicos nas

diferentes áreas do saber, pois ela não pode restringir a sua atuação somente em sala de aula, ela

precisa estar integrada a comunidade, promover atividades culturais, pedagógicas e participar

ativamente das mesmas. Nessa perspectiva, de acordo com Molina e Jesus: “Compreender o lugar

da escola na Educação do Campo, é compreender o tipo de ser humano que ela precisa ajudar a

formar e como pode contribuir com a formação dos novos sujeitos sociais que vêm se constituindo

no campo hoje”. (2005 p.37)

Está claro que a função social da escola se completará à medida que a sociedade vai sendo

transformada socialmente. Porém, enquanto esse processo de transformação social vai sendo

elaborado, cabe à escola a construção das partes necessárias a condição da formação de um ser

humano. Em sua proposta de Educação do Campo, o MST tem defendido conhecer a realidade da

qual o sujeito faz parte, para poder fazer as intervenções necessárias à sua mudança.

Pensar a escola é concebê-la para além do espaço escolar. Significa pensá-la através das

relações que se dão no território onde a mesma está inserida. Mas, a estrutura de escola montada

pelo Estado não atende a lógica camponesa de maneira específica.

Podemos mencionar como exemplos desta contradição presente no processo educativo

organizado pelo Estado: a terceirização da merenda escolar, que nega a agricultura fornecendo aos

educandos uma alimentação escolar que não condiz com a realidade dos educandos/as. Através de

um cardápio determinado por uma nutricionista que desconhece os hábitos alimentares dos

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camponeses e ainda não implementou junto a empresa a lei que regulamenta a utilização de no

mínimo 30% dos recursos do FNDE para a compra da merenda escolar da agricultura familiar.

A Lei nº 11.947/2009 determina a utilização de, no mínimo, 30% dos recursos

repassados pelo FNDE para alimentação escolar, na compra de produtos da

agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações,

priorizando os assentamentos de reforma agrária, as comunidades tradicionais

indígenas e comunidades quilombolas (de acordo com o Artigo 14).

(SECRETARIA DA AGRICULTURA FAMILIAR, 2011, p.12)

Outros problemas também são: com a terceirização da merenda o uso da cozinha é restrito

apenas a empresa contratante e a merendeira, que segue as ordens apenas da empresa, neste caso o

que é desconsiderado é justamente a construção coletiva do espaço da cozinha assim como a toda

escola que foi uma conquista coletiva feita das famílias; os transportes escolares, também, são

sempre os piores destinados para trafegar nas estradas, também, em péssimas condições; toda

infraestrutura e equipamentos são que qualidades inferiores.

Todos estes elementos são necessidades oriundas de políticas públicas que não atendem as

especificidades do campo, por isso, entendemos que é dever do Estado propiciar que essas políticas

sejam condizentes com a realidade dos educandos/as camponeses. Segundo Molina e Jesus (2005):

A Educação do Campo não cabe em uma escola, mas a luta pela escola tem sido

um de seus traços principais. Isso ocorre por que: a negação do direito à escola é

um exemplo emblemático do tipo de projeto de educação que se tenta impor aos

sujeitos do campo; o tipo de escola que está ou nem está mais no campo tem sido

um dos componentes do processo de dominação e de degradação das condições de

vida dos camponeses. (p. 40).

São muitos os desafios ainda a percorrer para construir a escola que queremos, e o

principal deles hoje para nós é a criação do ensino médio em nossas escolas com o intuito de dar

seqüencia ao ensino no próprio assentamento, pois acreditamos que seria mais uma maneira de

assegurar o jovem no assentamento. As políticas públicas devem ser executadas para atender as

necessidades da Educação do Campo, dar ao campo o que lhe é de direito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo do presente estudo consistiu em entender as articulações e conflitualidades das

políticas de Educação do Campo entre o Estado e o Movimento Sem Terra na escola do

assentamento Valdício Barbosa dos Santos.

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Para tanto, foi necessário uma análise do Projeto Político Pedagógico da escola, a fim de

verificar se a proposta de educação da escola contribui ou não na organização do assentamento, pois

compreendemos que toda sua base teórica e metodológica está pautada na realidade do

assentamento e seus elementos fundamentais nos princípios da Educação do Campo, o que fortalece

a importância da formação do camponês através da escola materializada na sua proposta

pedagógica. Essa formação se expressa nos conteúdos trabalhados, na organização do trabalho, no

vínculo orgânico com a terra, na atuação do MST através dos encontros, mobilizações e formação,

como princípios importantes para contribuição no processo organizativo do assentamento.

Tomar a Escola Estadual de Ensino Fundamental “Valdício Barbosa dos Santos” como

objeto de pesquisa foi muito importante porque nos possibilitou entender o processo da escola de

um ângulo que ainda não tínhamos experimentado. Por fazermos parte de seu processo de

construção como educadora, esse olhar de fora possibilitou enxergar os grandes desafios que a

escola ainda precisa superar, além de perceber como se dá o envolvimento dos sujeitos que fazem

parte do processo educativo na construção do Projeto Político Pedagógico da escola.

Os sujeitos participantes da pesquisa demonstraram conhecer a proposta pedagógica da

escola e qual a sua intencionalidade pedagógica e social. Isso foi notável através dos registros

obtidos ao responder o questionário.

É importante ressaltar que a percepção dos pesquisados em relação ao PPP é resultado do

envolvimento destes sujeitos desde as primeiras discussões movidas pela construção da escola na

comunidade e no decorrer de sua trajetória.

Mesmo assim, foi detectado que há uma falta de compreensão no sentido de perceber a

importância do PPP para a organização do fazer pedagógico na escola, por parte da comunidade e

educadores. Isso se dá devido a vários fatores como: a falta de interesse dos funcionários que se

integram ao corpo docente em conhecer o PPP da escola; a falta de se ter uma visão ampla da

função social da escola, no sentido de entender o que se quer com a escola de assentamento; há

ainda pouca preocupação por parte dos educadores em reconhecer que são parte do coletivo escolar

e que tem o compromisso de participar efetivamente da construção do PPP, até porque o mesmo é

algo inacabado, em processo constante de elaboração e reelaboração e que é um objeto de estudo.

Acredita-se que o desafio maior a ser enfrentado/superado na escola pesquisada é fazer

com que o PPP torne-se um instrumento que sirva de base para o educador planejar seu trabalho de

modo que atenda os objetivos/metas/ações da escola, entendendo que cada um precisa assumir sua

tarefa educativa, que é individual, mas ao mesmo tempo, faz-se necessário ser coletiva por defender

que o PPP deve também deve propor as metas da escola com relação à contribuição da escola no

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processo organizativo da comunidade, sendo um objeto de estudo e diagnóstico da comunidade, de

maneira a intervir diretamente em seu processo construtivo.

É, também, a elaboração e execução do Projeto Político Pedagógico da escola que vai

apresentar ao Estado os principais entraves das escolas do campo, assim como a falta de

implementação das políticas públicas nestas escolas, o que é percebível ao longo da história. Além

de reforçar ao Estado o princípio da Educação do Campo como política, na formação dos povos do

campo, valorizando suas culturas, identidades e respeito ao território camponês.

Por fim, a Proposta Político Pedagógica da escola deve servir de ferramenta para contribuir

com a comunidade reforçando a importância da relação da escola com a comunidade, participando

de todo seu processo organizativo, garantindo em sua Proposta Político Pedagógica metas e ações

que contribuam na organização da comunidade, na formação da juventude, pois os Jovens filhos de

assentados precisam estar vinculados em atividades políticas do assentamento ou do MST de

maneira geral, além de conseguirem desenvolver junto a famílias atividades agrícolas. Porém, ainda

há falta de garantia de renda permanente, ou seja, é necessário pensar no trabalho agrícola que

viabilize a vida econômica além das safras anuais de produção e que seja administrado pelo próprio

jovem.

Assim, a viabilidade de políticas que garantam a inserção e continuidade dos jovens em

todas as etapas do processo formativo da educação e no processo produtivo parece ser o grande

desafio do conjunto do MST, em geral, à escola, às famílias e a própria juventude.

Movimento Sem Terra

Por Escola

Terra e

Dignidade!

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