bainita

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A MORFOLOGIA DA BAINITA MARCOS DOMINGOS XAVIER Eng.º Metalurgista, M.Sc. , Doutorando do Departamento de Metalurgia e Materiais daEscola Politécnica da USP; Técnico de Ensino do SENAI – CFP 1.19 RESUMO O presente texto traz uma revisão bibliográfica sobre a morfologia da bainita nos aços e a influência de alguns elementos de liga em sua formação. Pesquisas realizadas sob caráter isotérmico mostram que os aços hipereutetóides são susceptíveis a formação das bainitas nodular e inversa além das clássicas superior e inferior. No âmbito anisotérmico, comumente aplicado na produção comercial dos aços bainíticos, são descritos os sistemas de classificação morfológica atualmente vigentes para este constituinte microestrutural. Palavras-chaves: Aços, Bainita, Morfologia 1

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Page 1: Bainita

A MORFOLOGIA DA BAINITA

MARCOS DOMINGOS XAVIER Eng.º Metalurgista, M.Sc. , Doutorando do Departamento de Metalurgia e Materiais daEscola Politécnica da USP; Técnico de Ensino do SENAI – CFP 1.19

RESUMO

O presente texto traz uma revisão bibliográfica sobre a morfologia da bainita nos aços

e a influência de alguns elementos de liga em sua formação. Pesquisas realizadas sob

caráter isotérmico mostram que os aços hipereutetóides são susceptíveis a formação das

bainitas nodular e inversa além das clássicas superior e inferior. No âmbito anisotérmico,

comumente aplicado na produção comercial dos aços bainíticos, são descritos os sistemas

de classificação morfológica atualmente vigentes para este constituinte microestrutural.

Palavras-chaves: Aços, Bainita, Morfologia

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Page 2: Bainita

I INTRODUÇÃO

O processo convencional de laminação dos aços produz estruturas compostas

basicamente de ferrita equiaxial e algumas colônias de perlita, caso o aço seja de baixo teor

de carbono. Há também os aços IF (intersticial free), onde a cementita torna-se ausente pela

utilização combinada da desgaseificação a vácuo e adição de fortes formadores de

carbonetos, caso do titânio e do nióbio(1).

Atualmente, há tendência de alguns setores na utilização de aços baixo carbono com

resistência mais elevada. Este é o caso dos fabricantes de rodas, que buscam assim

contribuir para a redução do peso dos veículos. O advento dos aços ferritico- bainiticos, de

baixo carbono, obtidos por resfriamento contínuo e constituídos por 10 a 20 % de bainita,

vem atendendo com sucesso este mercado.

O propósito desta revisão bibliográfica é trazer uma visão sobre as morfologias de

bainita passíveis de formação em aços hipoeutetóides de baixo e de médio teor de carbono

e em aços hipereutetóides. A influência de alguns elementos de liga na formação deste

constituinte microestrutural também é delineada..

II MORFOLOGIA DA BAINITA

Davenport e Bain(1) introduziram as estruturas bainíticas no universo das microscópias

óticas de alta resolução considerando amostras de aço transformados isotermicamente em

faixas de temperaturas intermediárias aquelas em que a perlita e a martensita são formadas.

Duas morfologias diferentes de bainita foram observadas em aços de médio teor de carbono

e batizadas por Mehl(2) em 1939 como bainita superior e bainita inferior. Aaronson(3)

definiu a bainita como um produto não lamelar, formado por um processo de crescimento

não cooperativo, resultante da decomposição eutetóide. No caso dos aços, a fase de origem

é a austenita e as fases eutetóides são a ferrita e a cementita.

A bainita superior consiste de feixes ou grupos de cristais ferríticos paralelos, na forma

de ripas, com partículas de cementita descontínuas entre estes cristais, tendo o plano de

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Page 3: Bainita

hábito austenita/ferrita próximo de {111}λ/ {110}α (3) . Na bainita inferior, os cristais de

ferrita tem morfologia do tipo plaquetas e contem carbonetos finos alinhados em seu

interior, formando ângulos de 55 a 60 graus com seu eixo maior(3). O carboneto épsilon

também pode ser encontrado na bainita inferior.

Em muitos aços de baixo carbono, contudo, a cementita não esta associada com a

transformação da austenita em temperaturas intermediárias aquelas de formação isotérmica

de perlita e martensita(1;4). Assim, classificações mais amplas das microestruturas bainiticas

tem sido propostas para incorporar microestruturas sem cementita. Por exemplo, Ohmori et

al.(5) examinaram várias microestruturas desenvolvidas de modo isotérmico e sob

resfriamento contínuo e reconheceram que a ferrita da bainita superior em aços de baixo

carbono sempre tem uma morfologia tipo ripas (acicular), mas a bainita pode estar livre de

carboneto (BI), com um filme de austenita retida e/ou martensita nos contornos das ripas,

ou que carbonetos (cementita) podem estar presentes entre as ripas de ferrita (BII) ou

dentro das ripas de ferrita (BIII). Na bainita BIII a ferrita preferivelmente foi encontrada na

forma de ripas ao invés de plaquetas. A tabela 1(5) lista as morfologias de bainita segundo

Ohmori et al, e a figura 1(1) mostra as regiões de transformação isotérmica referentes a três

tipos de bainita superior formados em aço baixo carbono ligado ao cobre; níquel; cromo e

molibdênio. De acordo com Ohmori(1) , a morfologia BI é a primeira a formar-se durante o

resfriamento contínuo, seguida por BII ou BIII conforme a taxa de resfriamento utilizada.

Davenport e Bain usaram o termo bainita para descrever microestruturas que consistiam

de uma dispersão de carbonetos em ferrita widmanstatten(3) . Contudo, Aaronson e seus

colaboradores(3) em trabalho subsequente revelaram que uma ampla variedade de

microestruturas não lamelares constituídas de ferrita e de cementita é comum e que a

restrição a definição de bainita considerando a morfologia widmanstatten é especificamente

desnecessária. Por exemplo, uma redução suficiente no tamanho de grão austenítico pode

resultar na substituição da morfologia widmanstatten da bainita para alotriomorfa de

contorno de grão(3;6) . Alem disto, foi observado que em algumas ligas não ferrosas, a fase

eutetóide de maior fração volumétrica (análogas à ferrita dos aços) não exibe uma

morfologia de placas ou agulhas. Isto confirmou a não obrigatoriedade da ferrita

widmanstatten na bainita. Adicionalmente, observações de nódulos de bainita

aproximadamente equiaxiais em liga Ti-Cr e em aços(7) conduziram a conclusão recente que

3

Page 4: Bainita

tais formas equiaxiais são a morfologia fundamental da bainita, e que estruturas bainiticas

tipo widmanstatten formam-se como resultado da influência dominante de uma das fases

proeutetóides, por exemplo, placas ou ripas de ferrita proeutetóides

Conforme a visão supra citada (6;7) , a morfologia externa da bainita depende do modo

como suas fases constituintes nucleiam e crescem. Em outras palavras, a extensão na qual

as duas fases produto ferrita e cementita ajudam ou interferem-se entre si determina a forma

externa da mistura eutetóide quando avançam na fase mãe.

As morfologias externas da bainita e seus mecanismos de formação referentes às

pesquisas de Aaronson e colaboradores(3) são detalhados a seguir:

Bainita nodular

Este termo é usado para descrever a bainita cuja morfologia externa não é

prederterminada pela morfologia de uma das fases pró eutetóides. Assim, as duas fases pró

eutetóides exercem funções aproximadamente equivalentes na evolução da morfologia

externa(3;8) . O crescimento da bainita nodular ocorre de modo aproximadamente isotropico

e a forma final da mistura eutetóide é aproximadamente uma esfera ou uma porção desta

quando o crescimento é desimpedido, conforme a figura 2(a)(3) . Por esta razão, volumes

adjacentes extensos de matriz não transformada, isto é, de austenita, são comumente

necessários para formar a bainita nodular(3;9) . Em aços de baixo carbono, a formação de

ripas de ferrita pouco espaçadas inibe a formação da bainita nodular. Os nódulos de bainita

foram observados em ligas hipereutetóides Ti-Cr(7); Fe-C (3;10) e Fe-C-Mn(8) . A bainita

nodular também foi observada em ligas hipoeutetóides Fe-C-Mo(11) e Fe-C-Ni(12;13). Nestas

ultimas ligas, os nódulos de bainita desenvolveram-se após extensiva precipitação de

alotriomorfos e “side plates” de ferrita proeutetóide(13).

Bainita colunar

A bainita colunar, fig. 2(b)(3) é uma modificação da bainita nodular, cuja morfologia

externa é alterada por algum aspecto microestrutural. Nos aços por exemplo, forma-se entre

estruturas em forma de placas de bainita inversa descrita a seguir(8;9) ou ao longo de

contornos de grãos austeníticos, adotando forma alongada ao invés da aproximadamente

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Page 5: Bainita

esférica da bainita nodular. A bainita colunar foi observada por Nilan(3;14) em aços com 0,44

%C e 0,82 % C transformados sob pressões hidrostáticas altas e em aços hipereutetóides

transformados na pressão atmosférica(3;8;11).

Morfologias bainíticas ditadas por fases pró eutetóides

(a) Bainita superior

A transformação ocorrida em temperaturas bem próximas a Ar3 conduz a formação de

ferrita pró eutetóide do tipo alotriomorfa de contorno de grão. Porém, se esta transformação

dá-se abaixo da temperatura Ws, referente ao início da morfologia Widmanstattem, ocorre a

formação principalmente de placas de ferrita desenvolvidas a partir dos alotriomorfos de

contorno de grão previamente originados. Em temperaturas ainda mais baixas, há também a

formação de placas ou ripas intragranulares quando o tamanho dos grãos austeníticos é

suficientemente grande (ASTM 0 - 1 ou maior)(14). A precipitação de carbonetos ocorre

quando a temperatura de transformação é menor que a temperatura eutetóide e dá-se nas

interfaces entre o filme remanescente da austenita e as placas (ripas) de ferrita pró

eutetóide, formando a bainita superior.

(b) Bainita inferior

Em temperaturas ainda mais baixas que aquelas correspondentes a formação da bainita

superior há a formação de feixes bainíticos com outra morfologia, contendo carbonetos

alinhados em ângulos de 55 a 60 graus com o eixo principal das ripas (placas) de ferrita

próeutetóide, tal como já dito anteriormente(3) . Um mecanismo difusional recentemente

proposto para a formação da bainita inferior(15) impõe que uma placa de ferrita livre de

carbonetos forma-se inicialmente e então outras placas de ferrita secundária formam-se

sobre uma face mais ampla desta placa inicial por nucleação simpática “edge to face”(16). As

faces principais, mais extensas, das placas secundárias localizam-se segundo um ângulo

agudo em relação a face principal, mais extensa, da placa inicial de ferrita. Os carbonetos

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Page 6: Bainita

formam-se ao longo das faces mais extensas das placas secundárias de ferrita, durante a

transformação do filme de austenita remanescente existente entre estas placas.

( c ) Bainita alotriomorfa de contorno de grão

Em aços hipoeutetóides, a precipitação de carbonetos freqüentemente ocorre em

associação com alotriomorfos ferríticos de contorno de grão em temperaturas abaixo da

eutetóide. Se houver crescimento cooperativo destes carbonetos forma-se a perlita, e caso

contrário tem-se a bainita. A literatura(3;6) traz que a circunstancia em que a bainita superior

convencional é substituída pela bainita alotriomorfa com o decréscimo do tamanho de grão

em uma dada temperatura de reação realça a importância da morfologia do componente pró

eutetóide na determinação da morfologia média da bainita. A forma externa desta bainita é

então obviamente ditada pelos cristais alotriomorfos ferríticos pró eutetóides a partir dos

quais desenvolve-se.

(d) Bainita inversa

A morfologia externa desta microestrutura, que foi originalmente relatada por Hillert(3;17)

, é controlada pela reação da cementita pró eutetóide. As placas de cementita primária(18) ou

alotriomorfos de contorno de grão iniciam a formação da bainita inversa(8). A cementita é

prontamente circundada por envolucro de ferrita e uma mistura eutetóide não lamelar de

carboneto e ferrita desenvolve-se então a partir deste envólucro ferrítico.

(e) Outras terminologias

Investigações anteriores usaram uma variedade de outros nomes para descrever várias

estruturas que poderiam ser consideradas como bainita nodular ou colunar conforme as

considerações de Aaronson e colaboradores (3) . Dentre estas incluem-se a estrutura em

forma de leque (“fan structure”); nódulos degenerados ; pseudonódulos . Habrakem usou o

termo bainita granular referindo-se a uma microestrutura constituída por ferrita, martensita

e austenita retida. A definição de bainita(3;12) já citada mostra que o termo bainita granular é

inadequado pois o carboneto pode estar ausente desta estrutura e a presença de martensita e/

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Page 7: Bainita

ou austenita retida é inaplicável nesta definição. Buchi et al.(19) e Townsend(20) sugerem que

a bainita granular é essencialmente uma bainita superior não formada completamente.

Transições entre as morfologias de bainita (3)

A literatura(8;20) traz algumas pesquisas que buscaram mapear a morfologia da bainita em

função da temperatura e do teor de carbono dos aços. A figura 3 referente ao trabalho de

Aaronson e colaboradores(8) , considerando a decomposição isotérmica da austenita em uma

liga Fe-C-2% Mn, mostra as faixas de concentração e temperatura onde a bainita superior;

bainita inferior; bainita nodular e bainita inversa ocorrem. Observa-se que as bainitas

nodular e inversa firam típicas dos aços hipereutetóides.

Nilan e colaboradores(21) estudaram um aço hipoeutetóide 0,44 % C e outro de

composição aproximadamente eutetóide, com 0,82 % C. Observaram que aumentos na

pressão, atingindo valores além da pressão atmosférica, conduzem estes aços ao

comportamento de aços hipereutetóides, favorecendo a transição desde bainita superior ou

inferior para a bainita nodular. Explicam este fato pelo aumento da força motriz para a

nucleação e crescimento da cementita (∆Gc) em detrimento da força motriz para a

nucleação da ferrita (∆Gf ) e assim, ∆Gf / ∆Gc reduz, o mesmo ocorrendo com a relação

entre os contornos austenita/ferrita e austenita/cementita.

A concordância entre os resultados de Aaronson(8) e Nilan(21) permite concluir que as

morfologias bainíticas nodular e inversa são típicas de aços de composição hipereutetóides.

Em aços hipoeutetóides, tais morfologias podem ocorrer se pressões altas, superiores a 1

atm, forem utilizadas.

Bainita em aços comerciais

A bainita em aços transformados isotermicamente encontra-se bem caracterizada.

Assim, para os aços hipoeutetóides há as morfologias bainita superior e inferior(1;3) . Em

aços hipereutetóides(3) , morfologias do tipo nodular e inversa ocorrem. Porém, a

transformação bainítica em aços comerciais, hipoeutetóides, dá-se via de regra sob

resfriamento contínuo, sendo comum observar misturas de produtos de transformação e

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Page 8: Bainita

desta forma, as morfologias bainíticas nestes aços não podem ser definidas simplesmente

por superior e inferior.

Ohmori (22) demonstrou que a reação bainítica também ocorre em aços com carbono

extremamente baixo, da ordem de 41 ppm, ficando evidenciada por curvas C. Além disto,

confirma a presença de relevo superficial bem definido nestas estruturas bainiticas. O

sistema de classificação definido por este pesquisador no início dos anos 70 (23) e

reapresentado recentemente (5) , traz a não obrigatoriedade da presença dos carbonetos para

caracterizar uma estrutura bainítica, bastando ter estrutura acicular, tal como já citado

anteriormente neste texto. A figura 4, publicada por este pesquisador em 1971, traz a

representação esquemática do diagrama de resfriamento contínuo de um aço ligado ao Ni -

Cr - Mo mostrando as três formas de bainita BI, isenta de carbonetos; BII, similar a bainita

superior e BIII, similar a bainita inferior.

Habrakem e Economopoulos (4;24) estudaram na década de 60 a morfologia de uma série

de aços bainiticos comerciais (2,22 CR - 1 Mo; 1,5 Mn - 0,5 Mo - B; 1 Cr - 0,5 Mo; 1 Cr -

0,5 Mo - B; 2,5 Ni - 1 Cr - 0,25 Mo - B; 9 Ni - 4 Co ). Observaram bainita com as

morfologias clássicas superior e inferior, mas freqüentemente encontraram uma mistura de

microestruturas variando desde acicular isenta de carbonetos até uma aparência não

acicular, consistindo de uma matriz ferritica contendo ilhas de martensita/austenita. Esta

última estrutura foi chamada então de bainita granular devido a aparência “granular” do

constituinte austenita / martensita. Estes pesquisadores resumiram suas conclusões

esquematicamente no diagrama CCT reproduzido na figura 5. Em taxas de resfriamento

relativamente baixas, representadas pela curva I, a bainita granular é formada. Entretanto,

em taxas intermediárias de resfriamento mencionaram a formação de bainita superior e para

formar bainita inferior, sugeriram que uma retenção isotérmica imediatamente acima da

temperatura Ms é necessária, tal como indicado pelo caminho III da figura 5.

Buchi et al. (25) realizaram na década de 60 pesquisas praticamente simultâneas aquelas

de Habraken e Economopoulos (4;24) , resfriando continuamente um aço Cr - Mo - V.

Observaram em taxas de resfriamento da ordem de 120 o C/ min, uma microestrutura com a

aparência de bainita inferior, isto é, cementita alinhada segundo um ângulo em relação ao

eixo longitudinal das agulhas de ferrita, e também a presença de uma microestrutura com a

aparência de bainita superior, com filmes de austenita e também cementita nos contornos

8

Page 9: Bainita

das ripas. em taxas de resfriamento mais baixas, observaram ilhas de austenita retida em

uma matriz de ferrita acicular, similar aquela morfologia que Habraken havia chamado de

bainita granular. Foi sugerido (25) que a bainita granular forma-se porque o carbono difunde

rapidamente para longe da interface austenita / ferrita em taxas baixas de resfriamento,

prevenindo a formação de cementita entre ripas. O aumento do teor de carbono na austenita

pode estabiliza-la quanto a transformação difusional, isto é, tem-se austenita retida e a

conseqüente formação da bainita granular.

Biss e Cryderman (26) propuseram em 1971 um modelo de evolução bainitica sob

resfriamento contínuo similar aquele de Buchi et al. (25) . A figura 6 (a) traz a variação da

concentração de carbono na interface austenita/ ferrita em função da distância,

considerando uma taxa de resfriamento elevada dentro da região bainitica. Em função da

supersaturação de carbono nesta interface ocorre a precipitação de cementita durante o

processo de crescimento. O caso oposto é mostrado na figura 6 (b), conduzindo a

formatação da bainita granular. Biss e Cryderman (25) usaram microscopia eletrônica de

transmissão acoplada a técnica de folhas finas e mostraram a subestrutura em ripas da

matriz ferritica da bainita, elucidando que tal ferrita não é massiva (27) .

Bojarski e Bold (28) estudaram em 1974 as microestruturas desenvolvidas durante o

resfriamento contínuo de um aço Cr - Ni - Mo, usando réplicas e folhas finas. Eles

essencialmente confirmaram os resultados de Buchi e colaboradores, que usaram apenas

réplicas. Houve constatação também da passagem de estrutura martensitica auto revenida

para bainita inferior, bainita superior e bainita granular com o decréscimo contínuo da taxa

de resfriamento. Em algumas taxas, mais que uma morfologia de bainita esteve presente em

seus experimentos.

É interessante notar que todas as pesquisas supra citadas falam em bainita granular,

exceto aquelas de Ohmori.

Bramfitt e Speer (29) estudaram a morfologia da bainita em 1990 utilizando aços

comerciais com teores de carbono entre 0,12 e 0,46 %, constituídos ainda por combinações

entre os elementos Mn ; Ni; Cr; Mo; B; Ti; Al; Si; Nb; Cu. A técnica aplicada foi a

microscopia eletrônica de transmissão com utilização de folhas final. Verificaram que

muitas conclusões dos pesquisadores anteriores repetiram-se em suas experiências. O fruto

das pesquisas então realizadas foi um sistema de classificação para a bainita conforme

9

Page 10: Bainita

mostrado na figura 7. Três principais tipos de bainita, todos baseados em uma morfologia

acicular da ferrita, são apresentados. As diferenças nestes tipos propostos de bainita situam-

se no tipo e associação de outras fases com a ferrita acicular. As morfologias B2 e B3

trazem a martensita situada entre os cristais ferriticos e oriunda da transformação da

austenita retida. Este fenômeno é freqüentemente observado em aços baixo carbono

resfriados de modo contínuo e a austenita parcialmente transformada entre ripas é

comumente referida como constituinte martensita - austenita ( M/A ) de microestruturas

bainiticas. Krauss e colaboradores (1) afirmam que o sistema Bramfitt - Speer de

classificação das bainitas com morfologias aciculares de ferrita é o mais abrangente nos

dias atuais. A tabela II traz os termos usados para descrever a morfologia da bainita(29) .

Em 1990, Thompson et al. (30) levantaram um diagrama de transformação sob

resfriamento contínuo conforme a figura 8 para um aço baixo carbono HSLA, de

composição em % massa 0,06 C - 1,45 Mn - 1,25 Cu - 0,97 Ni - 0,72 Cr - 0,42 Mo, citando

todas as morfologias presentes de ferrita, designando-as por ferrita poligonal ( PF ); ferrita

widmanstatten ( WF ); ferrita granular ( GF ) e ferrita acicular ( AF ). Um trabalho similar

foi feito em 1992 pelo Comitê de Bainita do ISIJ (31) , considerando um aço de ultra baixo

carbono, cuja composição química e a sua curva CCT correspondente são dados pela figura

9, designando as morfologias de ferrita por ferrita poligonal ( αp ), ferrita quase poligonal

( αq ); ferrita widmanstatten ( αw ); ferrita bainitica granular ( αb ); ferrita bainítica ( αob )

e martensita cúbica ( α, m ).

A ferrita widmanstatten caracteriza-se por cristais alongados e grossos de ferrita. Não

apresenta evidências de subestrutura dentro dos cristais individuais. Apresenta-se como

ripas ou placas (1) . A ferrita quase poligonal ou massiva em aços de carbono muito baixo é

obtida por resfriamentos suficientemente rápidos que possibilitem transformar austenita

para ferrita sem alteração de composição química. a microestrutura então formada consiste

de grãos grosseiros de ferrita, com contornos irregulares e subestrutura (1) . A ferrita acicular

ou bainítica ocorre em taxas de resfriamento bem menores que aquelas correspondentes à

formação das ferritas widmanstatten, apresentam cristais ferriticos alongados muito mais

finos, com alta densidade de discordâncias, com contornos de baixo angulo (1) . Assim, os

termos ferrita acicular deve ser restrito a bainita, diferindo-o de ferrita widmanstatten. A

ferrita bainitica granular (31) ou simplesmente ferrita granular (30) também forma-se em faixa

10

Page 11: Bainita

intermediária de temperaturas, tal como a ferrita acicular, porém em taxas menores de

resfriamento (1) .

III EFEITO DOS ELEMENTOS DE LIGA

Os elementos de liga em geral, exceto o cobalto, aumentam a temperabilidade dos aços.

Entretanto, certas quantidades de alguns elementos ais como Mo; Mn e Ni deslocam

efetivamente o campo ferritico dos diagramas CCT para a direita, favorecendo a

transformação da austenita superesfriada em bainita (32). Além disto, estes elementos

abaixam a temperatura Bs de início de transformação da austenita superesfriada em baini-

ta (32) . A figura 10 traz as curvas CCT para diferentes teores de molibdênio (32) .

Adicionalmente, a figura 11 indica a relação entre os teores de níquel; molibdênio e

manganês, as taxas de resfriamento críticas para evitar a formação de ferrita poligonal e a

temperatura Bs (32). O abaixamento da temperatura Bs eleva os limites de resistência e de

escoamento da bainita (32). Entretanto, as adições crescentes de molibdênio deterioram a

tenacidade da bainita, enquanto que adições de manganês praticamente a mantém constante

e adições de níquel melhoram-na (32).

O boro, elemento químico bastante efetivo no aumento da temperabilidade dos aços,

também retarda a transformação da austenita em ferrita primária durante o resfriamento dos

aços hipoeutetóides (32) . A resistência mecânica dos aços ao boro apresenta um aumento

significativo associado com a transformação bainítica porém, há deterioração sensível na

tenacidade a fratura quando o teor de boro supera 40 ppm (32) visto que ocorre segregação

ou precipitação intensa de borocarbonetos nos contornos dos grãos austeníticos.

Os mecanismos propostos para explicar o efeito retardados do boro sobre a nucleação da

ferrita (33) são os seguintes:

(a) redução da energia de superfície dos contornos dos grãos austeníticos. Assim, o boro

torna-os sítios menos favoráveis para a nucleação da ferrita.

11

Page 12: Bainita

(b) redução da difusividade do ferro nos contornos dos grãos austeníticos. O boro

diminui a freqüência de saltos dos átomos de ferro e por conseqüência, diminui a taxa de

nucleação da ferrita.

(c ) segregação de átomos de boro ou precipitação fina nas regiões de menor densidade

atômica dos contornos de grão austenítico, as quais são sítios mais favoráveis para a

nucleação da ferrita.

(d) precipitação de borocarbonetos de ferro antecedendo a nucleação da ferrita. A

nucleação e o crescimento dos borocarbonetos passa a controlar a transformação ferrítica.

A literatura (34;35) cita a existência de um efeito sinergético entre boro e nióbio para a

obtenção de microestrutura bainítica. Diversos mecanismos tem sido propostos:

(a) o nióbio atrasa a recristalização da austenita e o boro solúvel tem tempo suficiente

para difundir para os contornos austeníticos, prevenindo a formação de ferrita (35) .

(b) o nióbio dissolvido na austenita pode diminuir a difusividade a e atividade do

carbono na austenita e assim, proteger o boro da formação de borocarboneto de ferro (36) .

A efetividade do boro sobre a transformação bainítica é degenerada com o aumento do

conteúdo de carbono do aço pois há a possibilidade de sua retirada de solução sólida pela

formação de borocarbonetos de ferro. O efeito sinergético B + Nb na transformação

bainítica também é prejudicado pela elevação do teor de carbono em razão da promoção da

precipitação de carbonitretos de nióbio (35) . Assim, a elevação do teor de carbono favorece a

formação da ferrita poligonal em aços com teores similares de nióbio e boro. A temperatura

Bs também é aumentada quando o teor de carbono cresce (36) .

A adição simultânea de B - Ti também tem mostrado um efeito sinergético notável na

melhora das propriedades mecânicas dos aços através da obtenção de microestrutura

bainítica fina mas com perda da tenacidade provavelmente devido à formação de

carbonitreto de titânio (37) e ao menor poder do titânio como refinador de grão (38) . A adição

12

Page 13: Bainita

de B - V é menos efetiva no aumento da resistência mecânica e afeta negativamente a

tenacidade.

Evidências experimentais mostram que o efeito sinergético do boro em termos de atraso

da recristalização da austenita pode ocorrer com outros elementos de liga e que este efeito

sinergético em retardar a mobilidade dos contornos aumenta na seguinte ordem (39) : Ni < Cr

< Mn < V < Mo < Ti < Nb.

IV REFERÊNCIAS

(1) Krauss, G. et al. - “Ferritic microstructures in continuously cooled low and ultralow carbon steels”. IN: ISIJ International, , vol. 35 , (1995) , nº 8.

(2) Mehl, R. F. - “Hardenability of alloy steels”, ASM, Metals Park. OH, (1939), 1.

(3) Aaronson, H. I. et al. - “A summary of the present diffusionist views on bainite”. IN: Mater. Transactions, JIM, vol. 32, nº 8 (1991), pp 737 - 746.

(4) Habraken, L. J. et al. - “Transformation and hardenability in steels”, Climax Molybdenum Co. , Ann Arbor, MI, (1967), 69 - 106.

(5) Ohmori, Y. et al. IN: Metall. Trans., 21 A, (1990), 877.

(6) Aaronson, H. I. - “The mechanism of phase transformations in crystalline solids”. IN: Inst. of Metals, London, (1969), Monograph 33 , pg 270.

(7) Lee, H. J. et al. - IN: Acta Metall. , 36 (1988), 1141

(8) Spanos, G. et al. - IN: Metall. Trans. , 21 A (1990), 1391.

(9) Reynolds, W. T. et al. - IN: Metall. Trans. , 21 A (1990), 1343.

(10) Villela, J. R. - IN: Trans. AIME , 140 (1940), 332

(11) Aaronson, H. I. et al. - IN: Phase Transformations 87 , ed. by Lorimer, G. W., Inst. of Metals, London (1988), p. 330.

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(21) Nilan, T. G. - IN: Transformation and Hardenability in Steels , Climax Molybdenum Co. , Ann Arbor, MI, (1967), p. 57.

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Tabela 1: Morfologia da bainita na transformação isotérmica (1) .

Microconstituinte Morfologia da ferrita Distribuição de carbonetos

ferrita acicular (ripas) isenta

bainita superiorBIBIIBIII

interface das ripas

bainita inferior acicular (plaquetas) dentro das plaquetas

Tabela 2: Termos usados para descrever a morfologia da Bainita (29)

Bainita superior Bainita IBainita inferior Bainita IIBainita de alta temperatura Bainita IIIBainita colunar em bloco Bainita aparenteBainita em bloco Bainita como formadaBainita granular Bainita revenidaBainita em ilhas Bainita superior revenidaBainita com aspecto de penas Bainita inferior revenidaBainita massiva -----------------------Bainita acicular Bainita isenta de carbonetosBainita de baixo carbono Bainita “limpa”Bainita de alto carbono Bainita de contorno de grão

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Figura 1: Representação esquemática do diagrama de transformação isotérmica de um aço

baixo carbono, mostrando as regiões relativas a três morfologias de bainita superior,

segundo Ohmori (1) . BI é a forma constituída por feixe de ripas de ferrita,livre de

carbonetos, e com filme de austenita retida entre as ripas; BII e BIII também possuem

ferrita na forma de ripas, porém, com carbonetos entre e dentro das ripas,

respectivamente (1) .

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Page 17: Bainita

Figura 2: Ilustrações dos vários tipos de bainita, sendo a fase clara ferrita e a fase escura

cementita: (a) bainita nodular; (b) bainita colunar; © bainita superior; (d) bainita

inferior; (e) bainita alotriomorfa de contorno de grão; (f) bainita inversa (1).

Figura 3: Mapa morfológico , indicando as regiões composição x temperatura onde as várias formas de bainita predominam (3) .

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Figura 4: Representação esquemática do diagrama de resfriamento continuo de um aço

ligado ao Ni - Cr - Mo, mostrando as três formas de bainita: BI, isenta de

carboneto; BII, similar a bainita superior e BIII, similar a bainita inferior(29) .

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Page 19: Bainita

Figura 5: Representação esquemática de um diagrama CCT mostrando a formação de bainita granular (caminho I); bainita superior (caminho II) e bainita inferior (caminho III) (24;29).

Figura 7: Sistema de classificação morfológica da bainita, proposto por Bramfitt e Speer(29).

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Page 20: Bainita

Figura 8: Diagrama de transformação sob resfriamento contínuo de um aço HSLA contendo em % massa: 0,06 C; 1,45 Mn; 1,25 Cu; 0,97 Ni; 0,72 Cr; 0,42 Mo (1;30) .

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Figura 9: Diagrama de transformação sob resfriamento contínuo de um aço ultra baixo carbono (1;31) .

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Figura 10: Diagramas de transformação sb resfriamento contínuo de aços com diferentes teores de molibdênio (32) .

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Figura 11: Variação da taxa de resfriamento crítica para evitar a formação de ferrita e comportamento da temperatura Bs em função do conteúdo de Mn; Mo e Ni (32) .

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Page 24: Bainita

ABSTRACT

This paper presents a literature review on the morphology of bainite in steels and the

influence of certain elements of alloy in their training. Research carried out under

isothermal character hipereutetóides show that steels are susceptible to formation of inverse

bainite nodular and beyond traditional upper and lower. Under anisotérmico, commonly

applied in commercial production of bainitic steels, are described the morphologic

classification systems currently in force for this microstructural constituent.Keywords: steels, bainite, Morphology

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