b mpeg_ morí_ a festa do rapé ant n12 1961 frikel

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Mori a Festa do Rapé

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  • CONSELHO NACIONAL DE PESQUISAS

    INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMZNIA

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMIUO GOElDI t NOVA SRIE

    BELM - PAR - BRASIL

    - ANTROPOLOGIA N.O 12 JULHO DE 1961

    MOfi1-A FESTA DO RAP ..

    NDIOS KACHYANA; RIO TROMBETAS

    PROTSIO FRIKEL Museu Goeldi

    O uso do rap, seja le fabricado de tabaco ou de paric, tem difuso bastante ampla na Amrica do SuL Como se pode observar, mo de mapas respeetivos, a sua maior rea de

    encontra-se nas regies andinas, chaquenses e FAl.ANGOI..A guianenses e, a, especialmente, ao Noroeste da Amaznia.

    Imprimiu ~~~~~~~~w~~~~~~~ Amaznica, poucos dados existem, entre os quais o caso mais conhecido o dos Mau. O assunto tratado, quase sempre, mui resumidamente e pouco se sabe Das cerimnias que acompanham as funes de rap. Existe, pois, uma certa falta de literatura sbre o assunto. Apreseutando ste trabalho descritivo sbre as cerimnias de entre uma tribo karib das florestas do rio Trombetas, fao-o com a inteno de preencher, em parte, esta lacuna. A transcrio dc trmos indgenas referentes ao mod, est includa no apndice H.

    I - NOTAS GERAIS SBRE O MOR1

    t Mor, na lngua dos Ingarne-Kachyana tem um significado: Primeiramente o rap indgena, o e, porit extenso, o rap feito de tabaco; em segundo lugar, a festa do rap. O trmo mori, nste sentido, estende-se sbre todas as cerimnias, direta ou indiretamente ligadas ao ritual

    Mor uma festa puramente religiosa, mas de um aspecto mais grave. Da, nada de alegres msicas ou danas das festas comuns; nada de mulheres e por conseguinte, nada de gritaria,

  • 12 BOLETIM DO MUSEU P ARAENSE EMLIO GOELDI;FRlKEL, P. - MOR - A FESTA DO RAP

    haja H""HiVbarulho, bebedeiras e amores clandestinos. A festa do no forasteiro uma impresso sbria e sria, embora no reli como

    ns mesmos: um mixto egiosa, no sentido comumente usado entre ns. Esta seriedade somente abrandada pelo final mais alegre: o banho com calda 2) Em relao aos de frutas.

    A religiosidade desta festa se revela tanto por sua fina ,,lidade como por seu estilo. No seu aspecto externo, a festa tda

    no passa de uma grande cura geral contra epidemias e molstias contagiosas, como gripe, catarro, sarampo, reumatismo e uutras. Considerando esta finalidade, ela pode ter um valor atual contra doenas existentes na tribo ou, tambm, um valor preventivo. Na ocasio, quando assisti ao mori, le foi feito nste ltimo sentido, de valor preventivo. Parte dos homens ia baixar comigo at zona habitada do rio Pela experincia, os ndios j sabiam que quase outro adoecia. Para evitar isto, fizeram essa cura o mori.

    Mas o mori no uma cura plesmente, ao combate do efeito do procura as causas e os causadores que llH1Ut)Hl.:lctl> irradiadas pelas foras dos espritos, tos-animais, os chamados workiem. O mor possue, um fundo essencialmente que cousas dste mundo com as do alm-mundo, os com as suas causas esotricas.

    O mor, enquanto cura, um duplo efeito: 1) em relao aos espritos workiem e, 2) em relao aos homens.

    1) Em relao aos UJorkiemi : O mor deve espantar os espritos-animais, quebrar e diminuir as suas fras nocivas, interromper e afastar as suas ms influncias, produtores do m:;)l que so a doena e a prpria morte e, portanto, deve pacificar os workiem, abrandar a sua clera, excitar e estimular as suas fras benfazejas, aumentar e dirigir as suas influncias boas para o indivduo ou a comunidade tribal, pois, e isto acho importante -, embora

    O mor deve afastar e

    consequncias das inflUt:Hl.:ict~

    venir contra elas e aumentar e 10rtlllCar as

    fras e efluncias individuais para assim vencer, ou,

    pelo menos, neutralizar as ms influncias dos wor

    kiem e imunizar-se contra os efeitos daquelas, isto ,

    os males que possarp. produzir.

    stes efeitos so alcanados, materialmente, pelo mor, o rap de paric ou de tabaco e pelo ritual da sua aplicao; espiritual ou ideologicamente, porm, por Uhhtarre. Esta figura mito religiosa, por assim dizer, o medianeiro entre os dois mundos, o dos espritos e o dos homens. um dos poucos considerados essencialmente bons e no pertence, diretamente, classes dos workiem. Uhhtarre pidzpore, isto , "chefe dos pajs" do mundo inteiro, com fra suprema sbre os seres, especialmente os workiem. No , porm, o que ns chamamos

    vezes me falaram dle como de um filho veremos no decorrer da u.V,J'-.L.L,,~'V

    por

    os

    Justamente estas qualidades de uhhtarre. E o faz todo com o auxlio e a fra do uhhtarre. ste, smbolo do bem e das fras boas do mundo, age, pois, por um veculo material, o mor; torna-se centro dste culto, centro secreto que no se revela primeira vista ao espectador, em parte j porque s mulheres e crianas o sentido e a participao ativa em tudo isso vedada.

    32

  • --

    FRIKEL, P. - MOR A FESTA DO RAPf:

    Creio que esta ligeira explicao do sentido fundamental do mor - talvez um pouco antecipada -, todavia. facilitar a compreenso destas cerimnias.

    Como ficou dito, tda a ao das cerimnias do mor dirige-se, hoje em dia, contra as fras dos espritos produtores de

    Mas no era sempre assim. De certas tradies e . consta o e seus objtos principais, o iwaraw, eram tambm usados para fins de guerra no mesmo sentido j supra mencionado: para quebrar a fra e resistncia do inimigo, incarnao dos espritos adversos e para aumentar a fra pr pria e afastar do indivduo os males, ferimentos e a morte. Mas os gloriosos dias de guerra j se passaram para os Ingarne e existem smente nas lendas e tradies da tribo. a razo por-

    est em desuso o mor e iwaraw para fins blicos. (* 1) No conceito dos ndios, Mor, a festa do rap, uma

    mnia antiqussima. A sua origem atribuida direta instituio pelo uhhtarre, o pidz-chefe. Disseram-me a ste respeito: "Ns fazemos isto desde os tempos do pdzpore (uhhtarre) que nos ensinou assim". E quero mesmo crer que entre as ceri mnias religiosas dos Kachyana, o mor seja uma das mais antigas. Notase uma grande diferena entre o mor e as outras festas. Ouso at dizer que o mor cai completamente fera do quadro das outras festas karib como as pude observar pessoalmente, ou como so descritos por pesquisadores e viajantes. O mor, como j fiz notar, diferencia-se pela atitude psicolgica com que realizada; em parte, tambm, pelos adrnos e eufei

    especialmnte a penugem de gavio, grudada ao corpo com breu vermelho de uruc; pelas danas que so poucas, mas inteiramente diferentes das das festas de "come e bebe"; pelos movimentos dos danarinos, com o iwaraw e outras armas nas mos, movimentos excntricos e exticos, executados com rictos de um certo "estaccato", acompanhados por meias voltas do corpo inteiro, marchando ora em p, ora de ccoras ao redor

    (* 1) Gumila assinala entre os Otomac o uso de rap como fazendo parte dos costumes de guerra: "The Otomac use it before going into battle with the Carib". Gumilla, apud: Roth, 1924:244.

    -4

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDl; ANTROPOLOGIA, 12 ----------------_.....

    dos nekw, as cousas sagradas ou objtos de encanto e encanpelas cantigas e respostas em cro, em frases curtas e

    palavras soltas, etc., etc. Tudo isso, em seu conjunto, deixa uma 1'I""""c">.-. fra do comum. Quando vi os ndios naquela noite

    de luar a primeira vez danarem o kwarur, julgava, por um momento, ter na minha frente uma pequena galeria daquelas esttuas de deuses mexicanos, porm, vivas, com suas coras

    de penas na cabea e suas insgnias nas mos. O mor conservou esta sua originalidade primitiva pelo de ser uma parte - e talvez a parte mais importante?

    de um culto antigamente secreto dos homens, hoje porm, com sintomas de decadncia. Pois outrora, assim me disseram, s mulheres nem era lcito olhar e a festa fazia-se fra da aldeia, na mata. Hoje, nestes dois pontos os ndios j relaxaram o regulamento. Mas mesmo assim: Mor exclusivamente festa e cerimnia dos homens. As mulheres no tm participao ativa. No danam; no pegam no iwaraw; no tomam rap. certas partes, especialmente, s invocaes gerais, elas n o podem assistir e tm que retirar-se para dentro de casa. Outra parte, a chegada de uhhtarre, ainda de absoluto segrdo e por isso, passa-se na beira da mata, mas dentro dela, fra da vista da aldeia e das mulheres. .. s cerimnias restantes, _elas podem assistir, porm, como simples expectadoras, "atrs da

    formada pelos homens. A maior parte das mulheres, po rm, j assistiu algumas vezes a estas cerimnias, conhece j a "rotina" de tudo isso e, para no se aborrecerem com a sua inatividade, nem comparecem mais. Ficam na sua rede na wordz-kumane, a casa das mulheres, donde tambm podem ouvir e apreciar tudo, porque as casas, afinal de contas, no tm paredes.

    Mor uma cerimnia religiosa dos homens. Como todos os ritos indgenas ligados religio, tambm, o mor implica em obrigaes que les chamam: "dieta" ou "resguardo". Esta dieta entra em vigor logo que termina.a festa. Quanto eu saiba, a dieta do mor no se estende sbre um resguardo sexual f' sim, unicamente, a uma absteno de certas comidas. Durante um ms no se come "bucho" de caa alguma, carne de anta e

    -5

  • II

    FRIKEL, P. MOR! - A FESTA DO RAP

    de jabot, o peixe matu, o puraqu, o yey e mais alguns outros; dos peixes lcitos no se aproveita a cabea. Tambm a pimenta entra na lista das cousas proibidas. Da lua nova em diante podem se comer, primeiro o jej, depois os outros peixes. Em seguida, jabot, etc., at chegar carne de anta, graduando, assim, a aceitao dos alimentos, conforme as prescries gerais da dieta

    PREPARATIVOS DA FESTA

    a) Preparativos preliminares

    uns dois ou trs dias antes das cerimnias comeam os preparativos. a preparao remota para o mor. Alguns homens vo mata cortar paus rolios que depois de descascados tm ,que servir de estrado sbre o qual so colocados os nekw.

    Da mesma forma ajeitam pequenos toros de madeira para servirem de assentos, quando os banquinhos no so suficientes. Outros se empenham em flechar araras vermelhas e gavies, a

    de completar os adrnos de penas ou vo colhr resinas para 'fazer tintas de breu para as pinturas. Os pajs, porm, ocupamse com os instrumentos de mor, consertando-os, renovando algumas amarraes, etc.

    O estojo completo dos instrumentos de mor abrange uma meia dzia de peas. So :

    a) o puyru, uma espcie de pequena esteira redonda, tecida de fibras de murumur e que serve de frro para os objetos de mOr, como tambm de invlucro para o iwaraw;

    b) o wom, um pedao de tecido de algodo, atualmente, j pequeno e velho, gasto e sujo pelo uso. Sbre le amontoa-se o tabaco ou outra matria de rap, cortada antes de ser pilada

    rap. Com le limpa-se, tambm, os instrumentos do mori; c) o wm, uma espcie de pincel, feito de cabelos de

    porco silvestre. Com le junta-se o rap slto e espalhado; d) o karwe, cuinhas feitas do ourio de castanha de ma

    caco. Elas servem de pilo e de depsito para fazer e guardar o rap;

    -6

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    e) o wich-tchhu, o instrumento prprio para aspirar ou tragar o mor. Consiste em dois tubos paralelamente ligados um ao outro. ~stes dois tubos, de crca de 20 em. de comprimento, so cortados de wutgi, a taquara-rna do Amazonas que por latureza j ca. pontas de cima so imbutidos dois caro

    os de tucum (yawr-intpere) furados, os quais, na ocaSIaO do uso, so encostados ventas e pelos quais se puxa. com """,,,."nda aspirao, o

    f) o iwaraw, instrumento que por sua importncia religiosa nestas cerimnias merece uma descrio mais minuciosa.

    O iwaraw consiste em duas : o yar-kukru e o kurm-kukru. Ambas so esculpidas em madeira, parece-me

    pau-mulato. Na ocasio existiam dois pares, um velho, antiqussmo e outro de fabricao mais recente. ~ste ltimo consegui comprar. Ainda est bem pintado e pouco usado, enquanto no mais velho as pinturas j se tinham apagado. Mas, no resto, eram idnticos. Apenas, o antigo era mais perfeito e mostrava muito melhor o estilo arcico, qUi os ltimos vestgios de uma cultura no mais em vida. So formas simples e rgidas.

    t=J Cabo do iwaraw com jigums de felinos mitolgicos.

    O yar-kukru tem a forma de uma p. O cabo se compe de duas esculturas de onas mitolgicas, os "yar" que so "bichos do fundo" (da gua). Como particularidades indicaramme que yar no tem as orelhas na cabea e sim em cima do ombro. So as duas protuberncias que se podem notar nos

    do desenho. O termo yar-kukru significa imagem ou

    -7

  • FRIKEL, P. MOR - A FESTA DO RAPI,

    figura de yar. Tambm, num trmo geral, chamado kaiktskukru, isto , imagem de ona. Essas duas onas so um casal, macho e fmea. So colocados um contra o outro e tm a boca amarrada "para no morder". A p representa, igualmente, uma figura mitolgica, koroh ou koreh, tambm denominado antchkre. Essa p mostra uma concavidade e de beiras alteiadas, formando duas pernadas. A parte superior da concavidade separada por uma faixa de madeira e forma a cabea um pouco oval de beiras externas entrecortadas. O nariz, em meio relevo chato e quasi triangular. Os olhos so feitos por duas vrtebras de peixe. Essa a figura do kurah ou koreh, personagem sbre o qual no consegui colher informaes amiudadas. O mor a tomar colocado na concavidade maior aue o ventre do Koreh.

    81

    c o

    A

    UTENSLIOS DAS CEIUMNJAS DO MOR A~Ku}'m-kllk1ru; B--Wml; C~Karwe. D-Wich-tchhu; E- Yart-Kukru

    -2

    EOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    A segunda pea do iwaraw o kurm-kukru, isto , figura ou imagem do kurum, o urub-rei. O cabo desta pea liso, mas na parte central onde se segura o kurm-kukru, achase mbutido um osso. Ensinaram-me que para ste fim s serve osso de ona, veado ou porco (talvez por ser um osso co ?) ou tambm uma certa qualidade de taboca. l!.:ste cabo encosta no tchkrka, enrolado,' formando quasi um retngulo. Tchkrka uma cobra mitolgica com semelhante anomalia como os yar, pois ela possue um par de orelhas atraz da cabea (Foto). A cobra toda pintada de vrios desenhos. Em cabea. A cobra toda pintada de vrios desenhos. Em cima

    finalmente, est sentado. o url;lb-rei, kurum. Esta pea, o kurm-kukru no serve diretamente

    tomar rap. Mas faz parte integrante do estojo para o cerimonial, nas danas e cantigas ou, melhor, nas invocaes e esconjuramentos. Pois kurum e tchkrka tem que enfrentar e quebrar as ms influncias dos worokiem, da mesma forma como yar e koreh. So usados, unicamente, pelos pajs durante o cerimonial e constituem uma espcie de armas ou defesa contra os worokiem.

    Outra "arma" que figura entre os objetos do cerimonial o tomnu, ou, como les mesmos traduzem: a "bengala do paj". O tomnu no pea particular do mor, mas empregado tambm em todos os outros trabalhos do paj. a sua defesa contra os worokiem, pois, quando necessrio, "o tomnu vira cobra grande" para defend-lo. Porisso, durante as cerimnias, ste bculo fica sempre ao seu lado .

    Para alguns encantamentos especiais, os antigos usavam de certas cantigas de iwaraw, chamados iwaraw-yormuru. Mas os pidze de hoje j no conhecem mais tdas. Perderamse muitos textos. Smente dois pajs, Matchuhaya e Nyornyor, conheciam ainda, parcialmente, alguns dstes iwarawyormuru.

    O iwaraw mais antigo que mencionei, como tambm aquele pedao de pano tem uma histria. Disseram-me que so peas muito antigas, passadas de gerao gerao e que os avsdles j os tinham recebido assim como atualmente esto. Con

    -9

  • FRIKEL, P. MORt - A FESTA DO RAP

    ta a tradio que era um casal que os fez .. O nome do homem era Ptekm, o da mulher Kuydjine. Tot, o homem fez os kukru, as esculturas de madeira; Wordze, a mulher, teceu o wom, o pano que naquele tempo era grande. Calculam les que o wmu tenha servido tambm para embrulhar o iwaraw e que,

    se desfez, foi substitudo pelo puyru. pedacnho de pano uma atrao para os prprios ndios. E um tecido grosso, de fios de algodo tambm grossos. Asseguraram-me que o tecdo, isto , o sistema de tecelagem -lhes completamente desconhecido e que no h mulher kachn-yana que o fazer hoje em dia. Atualmente, resta somente um pedao tamanho um palmo em quadrado, sujo e gasto, mas sem vestgios de urucu ou outra tinta.

    Na vspera da cerimnia prepara-se a cousa principal: o mor~ ou rap. Durante dia inteiro o pidze est a sentado, pulverizando os ingredientes do mor. :t5::ste Dode ser feito trs modos:

    1.0) Mor feito simplesmente de tabaco. :t5::les o acham melhor por ser mais fraco.~t..s folhas verdes do tabaco so primeiro secas ao calor do sollou na beira do fogo, pedras

    Em so cortadas em pedacinhos e stes, depois, pilados e reduzidos a um p fino. Serve de pilo de mor o mencionado karwe, a cuinha de ourio. Como mo de

    do cabo do kurum-kukru. O segundo modo consiste numa mistura de casca sca

    e ralada de uma rvore e de uma qualidade de Ut1.LH.. d. tras substncias tiradas de caroos ou sementes de

    de frutas da mata. O modo de preparao no o mesmo. Esta mistura fortssima e possui alguns efeitos narcticos, produzindo certa alucinao, provvelmente, pela grande quantidade em que tomado. (*2)

    3.) O terceiro modo um mixto dos dois primeiros, talvez com o fim de abrandar os fortes do produto do se~mndo.

    :t5::ste servio de preparar o mor feito ou na beira da mata, da aldeia ou no tot-kumune, a casa dos homens. contanto

    (*2) Embora assistisse festa, no tive oportunidade de identificar a casca e as sementes usadas no preparo do rap kachyana.

    -10

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    ag mulheres no entrem ou venham perto nessa ocasio. E mais : obrigatoriamente, durante todo o tempo da preparao do mor, o pidze tem que cantar invocaes e outras cantigas sagradas, meia voz, cOhjurando e esconjurando os espritos, os workiem. .

    Nessa mesma vspera comeam tambm os primeiros preparativos pessoais, a saber as pinturas com genipapo, pela de que a tinta de genipapo aparece e mais depois um dia, quando j de tdo sca.

    Preparao prxima.

    :t5::stes preparativos contimam no dia da festa. De manh, as mulheres e a crianada fazem uma limpeza geral no terreiro. Pedacinhos de pu ou de cuia quebrada, cascas de frutas e as imundcies dos cachorros so removidos, ervas e capim arl':meados e as beiras do terreiro bem acertadas.

    Durante o resto do dia come-se e dorme-se bem, porque vai-se passar a noite em claro e todos precisam ficar descansados. Pois no sendo festa de "come e bebe", devem precaver-se com antecedncia.

    A ltima refeio servida muito cdo neste dia, pelas 4 horas da tarde. Com certa pressa o pessoal come para logo depois entregar-se ao trabalho de enfeitar-se. Pril}leiro armam os tchama-tchama, as coras ou capacetes de penas para no sujlos com uruc com que em seguida se pintam. Mudam de roupa, i.: de seus balaos os homens tiram o melhor mam ou tanga e vestem-na. Ela segurada por um trplice cinturo feito de ktmu, a casca do pau-gaivota, folha de murumur ou per, e tecido de algodo, amarrados um em cima do outro. As ligas nos braos e nas pernas so renovadas e pintadas. Brincos so colocados nas orelhas. O corpo inteiro besuntado de uruc. Nas

    testa e nariz fazem-se com esptulas apropriadas alguns desenhos, ahu, com tinta de breu, prta e vermelha. Com esta

    m~sma de breu, wyu, fazem-se tambm desenhos mais ou menos simtricos no corpo, especialmente na frente. Mas aqui o wy no tem diretamente valor decorativo. Serve simplesmente de cola. Pas sbre le grudado o marto, flocos de penugem

    11

  • FRIKEL, P..-- MOR A FESTA DO RAP

    e I:>ranca dO gavio real, de forma que aqules aparecem em branco e se destacam sbre o

    e o escuro do genipapo no corpo. as de rabo de arara vermelha sao colocados nos

    Todos os homens se enfeitam, uns pois todos tomam parte nas cerimnias do mais crescidos, que nessa ocasio vestem uma Pois em at o tempo da puberdade, andam ns.

    Tambm as mulheres que querem apreciar as devem se enfeitar. Mas os seus adrnos so muito mais A pintura tambm de genipapo e urucu, mas no usam de marto no corpo. Unicamente pem uns flocos brancos de marito no seu cabelo negro, grudando-os com wy, caso no queiram segurar. Brincos tambm elas pem, mas adrnos de penas, tcham-tcham e kuyyem, elas no podem trazer. Isto di

    r~ito exclusivo dos homens. Assim prontos, fazem-se os ltimos arranjos no terreiro,

    pror, onde a cerimnia tem lugar. Um pouco alm do meio do terreiro, para o lado Oeste,

    colocam-se os paus cortados que formam um estreito, mas comprido, estrado. Atrs dle so postos em fileira os dos homens: dois banquinhos pintados, cortados de uma

    pajs e para o resto dos homens pequenos que, sentados, todos olham para o na:sce:ntiE',

    onde mora e donde vem Uhhtarre. Atrs desta linha de assentos dos homens preparam-se os assentos consistindo em uma espcie de colchas de castanheira bem batida e ffa. Somente de dos homens, elas podem assistir funo.

    Finalmente os dois pidze trazem os seus balaios com todos os seus nekw e pem-nos sbre o estrado. Por ltimo vo buscar os objetos do mor. O iwaraw, enrolado no puyru, com os apetrechos necessrios para aspirar o rap e fumar; os karwe, cheios de rap; algumas cuias com tabaco migado, pois enquanto no esto tomando rap, fumam a noite inteira; mais ainda: facas, fsforos, tabaco em rlo, papelinho e taual' (que o papelinho indgena). Tudo isso colocado sbre um ou doIs

    -12 -

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, [2

    kahdze, tecidos de palha que diferem do puyru smente por sua forma quadrada.

    Assim, tudo pronto, um pouco as oito horas da noite, com as cerimnias comeam.

    UI - CERIMNIAS DO MOR!

    em Na frente Ton. isso tambm chamado Junto dle Ent, o se

    sendo o tuxua

    dade, conforme a sua ou jJmm,;au

    na mo. Por fim uns meninos. So 9 os ~o~+;,,;~

    Mais homens no h nesta maloca. As IIlumeI

    de sua casa, na wordz-kumane. No podem assistir ainda~

    Reina completo silncio.

    Em tdas . as funes e curas, a primeira cousa a chamada do dano Ton.hirma, o mor-itno, levanta-se devagar, fica um momento em p numa atitude de concentrao, olhando direito para o nascente. Levemente bate palma e pronuncia a palavra da chamada: Kuma!... Casa! Clan! ... Todos repetem: Kuma!... Novamente o pidze bate palmas, duas vezes, e chama: Kuma!... Kuma! . " E todos respondem, repetindo: Kuma!... Kuma! ...

    O mor-itno, ento senta-se sbre o seu banquinho. Os tiram flautas do tipo worere e comeam a tocar.

    dos nekw, das fras-espritos, espemediante um dueto de flautas. As me

    e prprias para evocar uns 10 minutos les tocam.

    em cima do estrado e pegam nos tommu, suas "bengalas" ou bculos de encantamento. Comea, a chamada dos nekw prpriamente dita, de uhhtarre e e especialmente de todos aqules espritos dos quais os pidze possuem um objeto de encantamento ou feitio nos seus balaios ou puhu. Nessa chamada ou invocao dos grandes nekw h uma certa ordem a observar,'

    -13 -.

  • FRIKEL, P. - MOR I A FESTA DO RAP

    comeando com os espritos das grandes foras do cu, da terra, da gua, findando com os de menor importncia.

    Perto do fim dessas invocaes, o iwaraw desembrulhado e posto de prontido. Finda a grande chamada, as mulheres podem se aproximar, sentar-se nas colchas de estopa, olhar e escutar. A nica tarefa que lhes cabe durante a noite tda vigiar o fogo, para que no se apague e para que, ao menos, sempre haja brasa para acender os cigarros.

    Seguem-se agora 4 danas obrigatrias. O seu caracterstico comum que so danas lentas e vagarosas, prosseguindo passo por passo ao redor dos nekw esto sbre o estrado.

    l.a dana. Terminada a grande invocao geral, o mais velho dos homens, L: o subtuxaua recebe os dois tomnu dos pidze e fica com Ton.hirma e Ent, porm, pegam no iwaraw, cada qual em um dos dois pares, segurando o kurmkukru na esquerda e o yar-kukru na direita. Todos os homens acompanham o gesto, tomando por sua vez o waih, a maa de guerra que estava na sua frente no estrado. O waih segurado em p, entre os joelhos, com a ponta encostada no cho. Os meninos que ainda no tm waih (por no serem homens) seguram uma pena de arara ou qualquer outro objeto. O mOr-itno comea a cantar. le tira os versos que variam e os outros respondem com o mesmo verso. As frases so muito curtas. As vezes, parecem smente palavras soltas. Ao mesmo tempo comea a ao do mOr-itno. Primeiramente consiste num leve movimento das mos que seguram os dois kukru, para a direita e para a esquerda, conforme o rtmo do encantamento. O pidze est sentado no seu banquinho e somente mos e braos se movem. Depois, stes movimentos tornam-se mais acentuados e determinados. O pidze escorrega, devagar, do seu assento, vai em posio de ccoras e o corpo todo comea a acompanhar stes movimentos num contnuo crescendo. Todos os homens, repetindo os versos, da mesma forma ficam de ccoras, comeando tambm a movimentar-se da mesma maneira. Numa contnua acelerao os movimentos do mor-itno aumen tam at ficarem veementes e abruptos. Os kukru movem-se, alternadamente, num ngulo de 90 entre leste e sul. No auge

    - 14 __o

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    , NO+E S

    F: 8. oJ O

    F:E. O t o o O Cl oC. M. C.H. o o

    o 02 o 01

    ESQUEMA DO TRAJETO DAS 4 DANAS OBRIGATRfAS C.H. Casa dos homens; C . M. Casa das mulheres; F.E. Fila de esteiras das mulheres; F.E. - Fita de banqU'inhos dos homens; G. lirall dos "nekwd"; 1. Lugar do "mor. itno"; 2. Luga1r do segundo paJe: Lmha cheia Trajeto da dana, avanando; Linha interrompida - idem,

    recuando.

    dstes movimentos, quase espasmdicos e extticos, o pidze se levanta e faz volta para o sul. Todos seguem o seu exemplo. Comea, ento, a dana ao redor dos nekw. Esta dana antes uma marcha vagarosa, de passos curtos, nos quais a cada movimento do iwaraw corresponde o movimento de uma das pernas. Somente a perna direita avana para dar o passo e a esquerda o completa, sendo juxta-posta direita e no adiantada. Todos levam as suas armas. Os pidze os iwaraw, as armas mgicas, yar e kurum que devem enfrentar as ms fras dos espritos; o sub-chefe carrega os dois tomnu que tambm so defesas mgicas e os homens os seus waih ou claves de guerra. Tudo isso faz a impresso de uma fila organizada de homens em mar

    -15 -

  • FRIKEL, P. - MOR - A FESTA DO RAP!?' ~I

    cha de guerra. E talvez tenha sido mesmo parte de uma antiga cerimnia de guerra, hoje, naturalmente, simblica, contra os maus espritos e seus efeitos malignos.

    O mor-itno conduz. Faz volta, rumo N. e passa na frente dos nekw at o fim do estrado. A, le e s le se vira em sinal que a marcha vai a r. E a fileira dos homens, olhando para a frente, recua no mesmo passo de marcha vagarosa. Chegando outra vez na parte sul do estrado, o pidze-chefe torna a virar-se para a frente e a turma, novamente avana e completa o crculo ao redor dos nekw, passando entre o estrado e os assentos. Chegando os homens nos seus lugares, o mor-itno interrompe os seus versos de entonao. Pra uns instantes e todos gritam, ao mesmo tempo, um alto: Tur!... o fim da primeira dana. Todos se sentam e descansam um pouco.

    2.a dana . . Na ao, nos movimentos, na marcha em redor dos nekw, esta segunda dana idntica primeira. Unicamente o texto mostra diferenas, principalmente nas frases que so mais compridas. E na entonao, que l}m pouco mais animada.

    3.a dana. Ela pode ser chamada "dana-kurur", devido a palavra inicial com que todos os versos, tambm os de repetio comeam. Texto, entonao e parcialmente o rtmo diferem das duas anteriores. Os movimentos iniciais do moditno e do grupo so os mesmos, como tambm o trajeto da marcha ao redor dos nekw. O que, porm, d a esta dana uma expresso tda particular e grotesca o fato de que o trajeto da marcha tda feita em posio de ccoras, tanto avanando como recuando. Devido posio e os movimentos, esta dana bastante cansativa e com um: Tur!... de alvio, os homens sentam nos seus banquinhos.

    4.a dana. E' quase idntica s duas primeiras. Smente o texto das canes diferente.

    Com estas quatro danas obrigatrias e indispensveis finda a primeira parte da festa do mor. O tempo gasto para estas cerimnias perto de duas horas.

    Faz-se, ento, uma pausa mais demorada para descansar e fuma-se um cigarrinho. Depois comea a grande cerimnia do

    -16

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12.

    encantamento do mor. Durante esta cerimnia no se usa mais o kurm-kukru. O mOr-itno pe um montinho de rap na concavidade maior da p do yar-kukru (o ventre de Koreh), segura o iwaraw na mo esquerda, porm, com a abertura da p virada para si. Com a mo direita toma o wich.tchhu, encosta os caroos de tucum nas ventas e comea a mexer com a ponta inferior do wich. tchhu no montinho de mor. Mexe de uma forma que se tem a impresso de que le esteja esfregando, triturando ou moendo alguma cousa. Ao mesmo tempo le canta as invocaes ou esconjuramentos, le s, durante uns vinte minutos, sempre com o wich.tchhu em movimento. Ningum res~ ponde. Todos observam um -rigoroso silncio. Durante ste ato, todo o mal, tda a for:a e matria de doena que se acham espalhadas nesta zona e que os purh-yna e os worokiem mandaram, so encantadas, esconjuradas, presas no mor e depois banidas. a primeira parte do encantamento do mor: o afastamento do mal pelo mor ou rap.

    Findas as frmulas de encantamento, ditas num tom meio cantado, meio recitado, mas muito montono, o mor-itno se levanta. Devagar, com passo solene, murmurando ainda frases a meia voz, le atravesa o terreiro, levando consigo o mor encantado para jog-lo na mata. Houve nessa ocasio um pequeno incidente, fra do ritual. No meio do terreiro, Ton.hirma parou, um pouco indeciso. Virou-se para mim e perguntou: "Diga, em que rumo fica Santarm. Mas rumo certo ... ". Indiquei-lhe mais ou menos SE. le, em seguida, avanou nessa direo at a beira do terreiro e com um forte soprar despachou o mor, com tdas as doenas e males encantados para Santarm, para os "bichos, os worokiem que moram por l, no fundo e na mata".

    Feito isso, sob absoluto silncio, o mor-itno volta a seu lugar. Segue, ento, a segunda parte do mor: O refro das qualidades Mas, naturais, pelo encantamento das foras purificadoras e imunisadoras "sobrenaturais" de uhhtarre, para o uso pessoal ou individual.

    Ambos os pidze pegam em iwaraw e wich.tchhu, repartem todo o mor e colocam-no sbre as duas ps dos yar

    -17

  • FRIKEL, P. MOR - A FESTA DO RAPl?,

    kukru. Ambos comeam a cantar. So as : Hakm! Chamo-as assim, porque todos os versos de resposta, em tom meio recitativo comeam com as palavras: Hakm ! . .. Hakm ! . " Enquanto os pidze cantando e os homens respondendo, o wich.tchhu no pra. movimentado na

    acima descrita. Mas os pidze ainda no fica. intato. Depois de uns outros tantos minutos de encantamento, o mor parece no ponto, e para ser aplicado individualmente.

    s vezes finda aqui a parte invarivel do mor. vezes, porm, ainda h um entreto: o aparecimento de uhhtarre.

    no vem sempre, a tdas as festas do mor. Mas quando le vem, neste lugar.

    Os dois pidze levantam-se, levam um iwaraw com atravessam o terreiro e entram na mata pelo caminho do nascente. les so os primeiros a se encontrarem com uhhtarre. demora muito e, vindo do nascente, como de muito longe, ouvese o som de uma flauta-worere. Mas-no a comum. a flauta sgrada. Exteriormente, ela no difere das outras. Mas os

    sabem distingu-la. O som da flauta a voz de uhhtarre, ou melhor: le mesmo. Pois le quem fala sagrada lngua musical da flauta. Entretanto, uhhtarre sempre mais se aproxima, mais forte se torna a voz da flauta. Chega, afinal, at a beira do terreiro. Mas dal no passa. Uhhtarre no sai, no vem ao e no se mostra por causa das mulheres, especialmente: pra al, dentro da no lado Este do terreiro. E enquanto uhhtarre est cantando com sua voz de flauta, em sua linguagem musical, vem o segundo pidze e anuncia: "Uhhtarre est chamando ! ... " O mais velho se levanta e vai ao encontro de uhhtarre, acompanhado pelo segundo pidze. L, na escurido da mata, clareada um somente pelo luar, est o pidz-pore, o chefe de todos os pidze dste e do alm-mundo. est ornado como nas festas, com tcham-tcham na cabea e kuyayem nos braos. Denso "yhu " , cabelo humano, cortado das cabeas de inimigos mortos e aumentado por um abelo artificial de fibras de curau

    cai-lhe da cabea e encobre-lhe em grande parte as costas,

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    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12 \

    o pescoo e o rosto. Seu cinto ornado com pequenas campainhas de metal que a cada passo e movimento tilintam. Assim se apresenta Alguns, assim me disseram, vm a figura adornada de um pidze (do mOr-itno). Outros nem isto, quando fala de longe ou escondido na mata escura. Mas

    mesmo, em no enxergam. Ver o uhhtarre, o um dom que nem todos possuem. E muitos

    sem terem visto o propriamente dito. Falaram com le, mas no o viram.

    O que se passa, estritamente, nesses poucos minutos entrevista, no o posso dizer com exatido; pois no assist.

    as vrias informa.es colhidas condensam-se em dois pontos:

    1.0 Uhhtarre "conversa com todos". Pergunta, d e conselhos e responde a feitas. Trata-se, talvez,

    de uma espcie orculo. Uhhtarre, porm, no fala no fala com voz humana. Fala pela linguagem de flauta,

    secreta que os pidze entendem. O segundo serve ento de entre o homem e o uhhtarre,

    traduzindo as frases da linguagem musical para o vernculo, o idioma tribo.

    2.0 Uhhtarre "d mori" aos homens. Parece que de modo comum, como ainda ser descrito, embora por intermdio do segundo pidze.

    da entrevista, a pessoa volta, acompanhada pelo !JLCtu'c;-a U~UH',v e outro homem chamado. E assim, todos, um por um, a sua idade e posio social, vo e voltam e tm a sua entrevista com o pidze.pore.

    Terminada a dos homens ao uhhtarre, ste vai-se Ouve-se o som do worere afastando-se, tornando-se

    at se extinguir. Depois de alguns minutos voltam pidze e sentam-se nos seus lugares. Uhhtarre j se

    Aps uma pausa comea, ento, o mor de todos os homens, individualmente. a parte varivel do mori. Varivel neste sentido que no h mais ordem prescrita quanto invocao dos espritos, os "bichos". A chamada varia individualmente con.

    -19

  • FRIKEL, P. - MORt A FESTA DO RAPE,

    forme a vontade e a confiana (OU desconfiana) de cada um. Invocam-se os worokiem dos quais se quer ou se espera mais proteo, fra e influncia benvola, ou os quais se quer abrandar pelo mor. At certo ponto talvez dependa isso da "descendncia" (totmica?) de cada um. Pois daro que todos esperam mais favores de sua gente, seu clan, no alm.

    Os primeiros a tomarem mori so os dois pidze. 1l:1e's se servem a si mesmos de rap, enquanto os outros so servidos por les. O pidze senta-se oll; acocra-se na frente de quem vai tomar rap e segura o yar-kukru com o mor, estendendo-lho, enquanto o respectivo homem tema o wich.tchhu com ambas as mos e o leva ao nariz. (*3 )

    cerimnia de aspirar o paric obedece a um esquema, . invarivel na sua estrutura bsica:

    A chamada individual do workiem; b) A conversa com o workiem; c) O ato de aspirar. Tendo-se tomado um profundo trago de rap, muda-se o

    workiem, q. d. chama-se outro e a cerimnia repete-se, com os mesmos ritos, embora com invocaes parcialmente diferen, tes, at se acabar o montinho de mor no iwaraw.

    O ritual, porm, fixo e determinado at em seus ltimos detalhes. A primeira cousa a chamada do workiem. Ela feita unicamente pelo pidze, no costumeiro tom recitativo. O homem se mantm quieto. Segura o wich.tchhu com ambas as mos, encosta-o ao nariz e a outra ponta no montinho de mor

    . que o pag colocou no iwaraw e que lhe estende, mas no mexe com o wich.tchhu. Escuta simplesmente nesta atitude fixa at o pidze acabar a chamada. Finda esta, o paj o avisa, dizendo :

    . Na ! . .. uma exclamao, chamando a ateno e significa , mah; ou menos: Agora!... J! . .. Diga!... Com isto, a

    cerimnia entra na ~ma segunda fase.

    (*3) Humboldt descreve alguns objetos para o uso do "niopo", o rap como tambm o modo de aspir-lo: "When it is to be used it is to a fine powder and placed on a 5 or 6 inches wide. The Otomac

    this dish, which has a handle, his right hand, while he inhalcs niopo by the nose, through the forked bone of a bird, the two extre

    ,mities of which ai applied to the nostrils". Humboldt, apud: Roth, 1924:244.

    - 20-

    [:OLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    Comea agora a conversa ou conversao do workiem. O pidze diz as frases e o homem as repete, palavra por palavra. Durante todo ste ato, desde aqule: Na! ... , pe-se wich. tchhu em movimento, do modo j conhecido. A pessoa fala, repete as palavras do pidze, mas no funga ainda. Notei que em tdas essas conversas duas frases sempre voltam :

    mnga tamn. pidz, tra-Ia-Ia mnga morn. pidz, tra-Ia-Ia

    L: Cad meu cigarro, pidze, tra-Ia-Ia .. . cad meu rap, pidze, tra-Ia-Ia .. .

    notvel, ainda, que todo workiem tem uma exclamao particular, posposta geralmente s frases. s vezes, dita tambm isoladamente. Pertence isso s particularidades dos "bichos" pelos quais so reconhecidos e que, por isso mesmo, variam de um para o outro. Tais exclamaes so o j referido . tra-Ia-Ia ! . .. e outros, como :

    ldrri ...

    hum-tum-pum ...

    tya-tyu ...

    watchikutn-h ... , etc., etc.

    Algumas destas exclamaes so bastante difceis para serem repetidas, mesmo para a boca e lngua exercitadas dos ndios. No raras vezes les se atrapalham e... acham graa! Com um curto, mas alto riso, um pouco nervoso, dizem, ento: Ke?! ... Nana 1. .. Como ?!... Isso no sei dizer!. .. Mas os pajs no querem risada nesta hora e num caso dstes encurtam considervelmente a "conversa dos bichos". Depois de mais duas ou trs frases deixam-na findar. Na mdia, essa conversa demora Ims 5 minutos.

    Segue, ento, o ato de fungar. O pidze se cala; o cliente tambm; e o wich. tchhu pra. E com uma nica, profunda, mas lenta e demorada aspirao, o homem traga o rap pelo wich.tchhu.

    - 21-

  • FRlKEL, P.- MORf A FESTA DO RAP

    Depois dste nico trago de mor, chama-se outro "bicho", escolha do cliente. Mas o processo da cerimnia idntic Esta mudana de workiem feita tantas vezes o montinho

    mor no iwaraw se acabar. Em seguida, o pidze vai buscar mais mor para d-lo ao

    homem seguinte. E assim continua at se acabar a fileira dos homens, recomeando, depois, durante a noite inteira at o se levantar ou o mor se acabar.

    Somente em duas ocasies este contnuo fungar interompido na sua monotonia sem fim. meia noite, mais ou menos, e de madrugada, pelas 4 horas. Nessas duas ocasies tambm se funga, mas. o cerimonial muito diferente. 1l': o mor das Wor-yana, ou "povo de mulheres" e dos kayar e waiH-tchaw, os guerreiros.

    W or-yan, a "tribo de mulheres" somente vem de meia uma hora da madrugada. 1l': a hora prpria delas. Para

    compreender tda a ao mister conhecer alguns traos da JJHLV1V",Jla Kachyana a ste respeito.

    uma lenda segundo a qual existe uma tribo de mulheres (da a expresso geral: wor-yan, L: tribo de mulheres! ), cujo nome verdadeiro Mwa-yna (mawa sapo). Antigamente moravam elas na bacia do Trombetas, mas depois emigraram, e moram agora no poente, (itsdz.wmtohu twe := onde o sol senta), num lugar chamado p-iraw. Essas mulheres no tm homens e so governadas por sua me e chefe . de nome Inware. Como particularidade se conta que ficou "prenha na buchecha" (no se sabe como, nem de quem!) e da pariu um filho, um homem, chamado Petaritp. Essas mulheres, em certa ocasio foram pedir mor de uhhtarre.

    ento, de seu lugar, caminhando sempre pra o nascente, onde uhhtarre mora, chegarem l com le. Pediram mod e uhhtarre deu-lhes. Em seguida voltaram pelo mesmo caminho para PirawL (Pode ser que lenda falte um trao, a saber que as Mwa-yna se disfararam em homens para assim alcanar o modo Pois, sabendo da excluso absoluta da mulher quanto ao mor, perguntei aos ndios pela razo porque deu mor s mulheres. Responderam-me: "Talvez enganado!

    - 22

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOQ1A, 12

    Elas so pidze tambm!. .. " No estou certo da interpretao resposta. Dou:a como anotao e possvel suplemento). Tda a festa do mor com suas cerimnias parece ser uma

    concretizada do que se passa no outro mundo, no dos espritos. Creio que, quanto dramatizao, a dana ",1';_""1'1 cen~ mais expressiva e mais fcil comprecn

    so. A primeira cousa que se nota que o terreiro se torna

    reproduo do mundo. A casa dos homens (tot-kumane), ao lado Este do terreiro torna-se a casa de uhhtarre; a casa das mulheres (wordz.kumane), situada ao lado Oeste, a casa Wor-yan. .

    Dado o momento, todos os homens se levantam. Desta vez, Ent, o segundo pidze (talvez por ser dono da casa ) o do uhhtarre. Leva consigo o iwaraw com uma poro de mor e espera ao lado do tot-kumane, enquanto Ton.hirma, o mor-itno, ser o chefe das Wor-yan: Inware. Todos os homens vo com para de trs da casa das mulheres, tomam posio. Colocam-se em fila, um ao lado do outro, no atrs. Comeam a cantar e a andar, em passo de dana. Mas imitam em tudo os modos e o jeito das mulheres. Engatando os braos, formam fileira de dana, tpica das mulheres. Do passinhos curtos e rpidos como as mulheres e, no por ltimo, imitam o leve requebro de mulher, o tpico gingar dos quadris, das ndegas e do peito. Danam assim para frente e para trs, aproximando-se, devagar, do lugar, onde uhhtarre est. 1l:ste, logo que avista o grupo das Wor-yan, comea a falar altamente, em frases curtas e bem acentuadas, pondo o acento principal sempre na ltima slaba da frase, cuja vogal se torna bastante prolongada. O modo tpico das chamadas e invocaes!. Fala sem parar, enquanto as Wor-yan vm se aproximando. ~4~W, por algum tempo, danam ao seu redor, formando crculo, com uhhtarre no centro. Tambm "elas" cantam, ao mesmo tempo, sem parar. Esto pedindo mori. Afinal, uhhtarre d-lhes o mor. Durante o ato de fungar "elas" no param, mas movimentam-se no mesmo lugar e a pessoa tem que tragar o rap, do modo costumeiro, danando. O primeiro a tomar mor l'on.

    ~23-

  • FRIKEL, P. - MORt- A FESTA DO RAP

    'NO+E S

    r.B. Oi. ()

    n. O G ~ O

    O O

    C.H.C.M. I [J O

    [J O

    O O O O

    ~ J /~"--. ~ .~ ~

    ~ ~ TRAJETRIA NA DANA DE "WORfl-YANA"

    C.H. _ C(lSa dos homens; C.M. Casa das mulheres; F.E. Fila dI.' esteiras das mulheres; F. B. - Fila de banquinhos dos homens; G. - Jirau dos "m!kwd"; U. - Lugar de "Uhh-tarre"; Linha cheia trajeto da dana.

    papel de Inware); depois oshlrma sua idade. Acabada a cerimnia, as Wor-yan

    agradecendo,

    de mulher, virando as costas ao uhhtarre, voltam nara o para a casa delas. Uhhtarre acompanha-as at o ro, andando devagar atrs delas, falando sem parar at que as Mwa-yan se sumam atrs da wordz.kumane. E com isso, a dana e o mor das Wor-yan esto encerrados.

    (De manh pedi que repetissem essa cena por causa de umas fotografias. Depois de alguma reflexo, os pidze acede

    24

    l;LE1 IM DO MUSEU PARAENSE bMILIO GOELDI; ANTROPOLOGIA. .\:2

    ram ao meu pedido, mas advertiram que no podiam cantar, porque "Mwa-yan s canta meia noite" ..Fez-se, ento, uma cena muda, da qual provm os retratos respectivos).

    Interessante e parcialmente diferente o modo do mor dos kayar e waiH-tchaw. So duas espcies de "guerreiros" do alm, ambos temidos e terrveis, sendo os kayar um pouqui

    melhores que os waiH-tchaw. Tambm entre os dois, (J modo de tomar rap difere um pouco. O tempo prprio de

    quando aparecem os primeiros clares do dia at o sol se i., das 4 6 horas, mais ou menos. ( essa,

    a hora ataque e assalto, quando os ndios esto em guerra).

    Kayar toma o mor da : O pl

  • FRIKEL, P. MOR - A FESTA DO RAP

    ao redor, os pidze encerraram o mor. Mas em outras ocasies, informaram-me, as cerimnias podem continuar mais um dia. O encerramento inclui trs partes distintas :

    A marcha ao redor do terreiro; b) As invocaes finais; c) O banho ritual com calda de frutas seguido

    outro, comum, n0 igarap. Primeiramente os homens se juntam e sentam em seus

    lugares. Dado o sinal pelo mori-itno, ficam em formam fila, um atrs do outro e assim, cantando naquele tom recitativo versos e frases de invocao, pem-se em marcha. Os carregam o iwaraw inteiro, o Kurm-kukru na esquerda,o yar-kukru na direita. O terceiro leva os dois tomnu dos pidze e os outros homens as suas armas, waih. A marcha lenta e, nos seus movimentos, semelhante 1.a e 2.a danas obrigatrias. O grupo dos homens vai assim abeirando o terreiro e com especial inteno e expresso, os kukru so postos contra as bocas dos caminhos que vm da mata ao terreiro e

    so em nmero de trs. Feita a volta inteira pelo terreiro, o pessoal vai at seus lugares, onde a marcha e cantoria findam. E a sentam.

    Comeam, depois de curta pausa, as invocaes finais. Assemelham-se em tudo s grandes invocaes iniciais. Os pidze fazem as chamadas ou invocaes do grandes nekw da natureza (cu, terra, gua) e dos que esto nos seus balaios ou

    A modulao e o rUmo, s vezes mudam, talvez conforme a espcie do nekw. O moritno canta e todos os outros repetem. E enquanto esto cantando e recitando, todos os objetos usados no mor, novamente so embrulhados e guardados nos puahu. Isso demora perto de meia hora.

    Durante essas preces finais, algumas mulheres preparam na wordz.kumane o banho ritual. Dentro de um makw, um vaso de tarub com gua, so raladas mediante um tchumri ou ralo, feito de pedras de quartzo imbutidas numa tboa, vrias frutas doces como ananaz, bananas, mames e outras que tiverem mo. Delas se faz uma grande salada de frutas. Pronta essa, uma das mulheres leva o makw e pe-no juntamente com

    -26

    ljOLETIM DO MUSEU P ARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    algumas cuias, no meio do terreiro. Isto j pelo fim das invoca es.

    Entrepe-se agora uma pausa maior. Neste espao de fazem-se as mudanas de roupas e posies. Primeiro, os

    pidze levam os seus puahu' com os nekw e penduram-nos em seus lugares na tct-kumane. Todos tiram os seus adrnos de

    e guardam-nos dentro da casa. Mudam tambm de tanga, a substituda por uma bem velha ou at por um pedao de pano qualquer. Agora, nesta ltima cerimnia, as mulheres tambm tomaro parte. Da mesma forma, elas mudam de tanga e trocam os seus monenh de miangas por uns farrapos de

    Feito tudo isso, trocam tambm a posio dos assentos no terreiro. Os homens mudam os paus de estrado para o outro lado do makw, para o lado Este, de forma que, sentando-se em cima dos paus de estrado, todos olham para o poente, o . lado Oeste. E todos sentam, sem exceo, conforme a sua idade : \)S homens, as mulheres, as crianas, pois todos so includos no banho, at os cachorrinhos que as mulheres e as meninas tm no colo.

    Os dois pidze tiram o yukuru, o caldo, cuiadas cheias do makw, colocam-se atrs do povo sentado e, andando devagar de um a outro lado, murmurando e palavras nas quais sempre se repetem os nomes dos trs grandes pidze: Tskyan, Tchanuar e 'funahidzere, uma espcie de asperso. No derramam o lquido e haurindo-o com os dedos, jogam-no

    a cabea da pessoa. Aos poucos, todo corpo fica lambusado dessa salada de frutas, especialmente os cabelos, pescoo, ombros e costas. O quadro geral torna-se mais alegre. Ouvemse risadas, quando o caldo frio toca a pele e as crianas procuram aparar, com as mozinhas, os pedacinhos de fruta para sorvlos com estalos de lngua. Os pidze continuam com esta cerimnia at o makw quase vazio. As ltimas

    so reservadas para les mesmos. Mandam o pessoal levantar-se e sentam-se. Ento os homens mais velhos da comunidade asperg-los.

    Findo isso, debaixo de alegres risadas e brincadeiras, tovo ao porto, no igarap para tomar banho na gua fria e

    27

  • FRIKEL, P. MORt A FESTA DO RAP!

    lmpida, tirando os pedaos de banana e mamo dos cabelos uns dos outros.

    Segue-se, ento, um banquete com tudo que h de melhor na maloca, evitando-se, porm, as comidas pesadas para salvaguardar os preceitos da dieta que entra em vigor daqu em diante. Assim termina a festa do mor, talvez a cerimnia mais expressiva em seu contedo religioso que jamais v entre homens e tribos guianenses.

    AP1!:NDICES

    1

    Esquema da estnl,tura da festa do mor

    A. Preparao a) preliminar: 1. aquisio e preparao de materiais

    para os objetos, adrnos, etc., de uso na festa;

    2. preparao dos instrumentos de mori (os nekw);

    3. preparo do mori.

    b) prxima: 1. limpeza do terreiro; 2. arranjos pessoais ( pintura corporal,

    enfeites de penas, etc.); 3. preparao do local das cermnias

    (estrado para os nekw, assentos para o pessoal, etc.).

    B. Parte principal 1.a parte: 1. Entrada: Invocao do cl e dueto

    de flautas; 2. Invocaes gerais; 3. As 4 danas obrigatrias.

    2.a parte: 1. Encantamento do mor, parte primeira: afastamento das fras ms e da matria de doenas;

    -28

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMLIO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    2. Encantamento do mor, parte segunda: atrao de fras benfazejas, salutares:

    a) pelas cantigas Hakmj b) pela chegada de Uhh. tarre

    3.a parte: 1. mor geral, para todos os homens; 2. mor das wor-yana 3. mor de kayar e waiH.tchaw

    C. Final 1. invocaes gerais; 2. banho de frutas; 3. banho no igarap.

    -II-

    Notas para a transcrio dos trnws indgenas

    Vogais: a-e-i-o abertas --u fechadas

    como no alemo, porm muito curto.

    Semiconsoantes : w- como "w" no ingls, mas com um leve "u"

    preposto. y - como "y" brasileiro (em "yay") ,mas com

    um leve "i" preposto.

    Consoantes: b-d-g-k-m-n-p-t: como no alemo, (portanto g sempre como em "gago")

    s - sempre forte z - sempre brando r - sempre dental f - sempre bilabial j como "j" em portugus (jardim)

    ch- como em portugus (ch)

    -29

  • FRIKEL, P. - MOR - A FESTA DO RAP

    o grupo H h- sempre bem aspirado como no alemo (Hand)

    hh como "ch" no alemo, por ex.: "ach", "Bach", porm, um pouco mais brando.

    H- como "ch" no alemo, p. ex.: em "ich", "nicht", porm, um pouco mais brando.

    -1 Stocklaut ou glottal stop (em muitos casos est em lugar de uma slaba supressa com "h" inicial; p. ex.: o/ko por oh.ko = vem c) .

    Africatas: dz-ts-dj-tch O acento tnico no constante; donde certas variaes

    na acentuao, segundo a eufonia.

    -III-

    Termos referentes ao mor

    ahuH pintura de rosto Antchkre personagem mitolgica; o mesmo que koreh nti nome prprio de um paj (informante) do rio

    Trombetas hakm, cantigas hakm tipo de cantigas que comeam com a palavra hakm lnware nome prprio da mulher-chefe das Wor-yana Ingarune pequeno grupo tribal do rio Trombetas, hoje quase

    totalmente assimilado pelos Kachyana iwaraw as peas principais nas cerimnias do rap; consislem

    em duas peas: o yar-kukru (ver) e o kurmkukru (ver)

    iwaraw-yormuru cantiga de iwaraw Kachyana grupo tribal dos rios Trombetas e Cachorro kahdze tecido de palha, comparvel com uma bandeja

    quadrada kaikus Qna (trmo geral) kaikts-kukru imagem, figura de ona (ver: kukru) karwe ourio de castanha de macaco kayar tipo de guerreiro Koreh, Koroh Kurah personagem e figura mitolgica ktmu pu gaivota kuma casa; cl

    -30

    BOLETIM DO MUSEu PARAENSE EMILlO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    kururu, dana kufuru tipo de, danas, executadas em pOSlao de ccoras' e cujas cantigas comeam com a palavra kururn

    kukru imagefu, figura, efgie; retrato, fotografia kurum urub rei kurm-kukru imagem, figura de urub rei Kuydjine nome prprio de uma mulher kachyana (lendria?)

    que teceu um tipo de pano hoje desconhecido entre les

    kuyyemu penas da cauda de arara, usadas como enfeites nos braos

    makw panela de bebidas mam tanga dos 'homens marto penugem branca d gavlao real, usada como enfeite MatchuhHaya nome pr-prio de um paj (informante) do rio

    Cachorro maw sapo

    Mwa-yna "gente-sapo"; nome tribal do "povo de mulheres"

    monen.h tanga das mulheres

    mor 1) paric, rap; 2) festa e cerimnias de rap mor itno dono do rap; chefe da festa do mor na! exclamao de convite para ilceitar, pegar ou come

    ar com alguma cousa

    nekw objetos ou instrumentos sagrados das cerimnias

    xamanistas Nyornyor nome prprio de um paj do rio Cachorro, falecido

    'em 1945 onomto-hmu nome de u'a maloca kachyana. Significa literal

    mente: lugar de muito uruc. per murumur

    Petartpo, Petaritp nome prprio, filho de Inware (ver)pidze,. pize paj, mdico-curandeiro, mdico-feiticeiro (Trmo

    aplicado tanto aos pajs humanos como aos pajs-espritos)

    pidz-pore, piz-pore paj-chefe, curandeiro-chefe (tanto humano como esprito)

    P-iraw lugar e residncia da tribo de mulheres pror terreiro Ptkma nome prprio de um kachyana (lendrio?) que fez

    os kukru (ver) ntigos da tribo puahu

    cestinha em forma de caixa, balaio dos homens Pur

    nome prprio e trno de ampla significao: ancestral da tribo, heri clturaI, sr supremo ("Deus")

    purh genipapo

    -31

  • FRIKEL, P. - MOR - A FESTA DO RAP

    Purh-yna

    puyru

    tchamatcham Tchanuar tchkrka, tskrka tchumri tomnu

    Ton.hirma

    tot6 tot6-kumane Tskyana Tunaidzere tur!

    ttkehtpo

    uhhtarre

    waih waiHtchaw wm. wy wichtchhu wm wor, wordze wordzkumane Woryana wor6kiema

    worere

    wutgi -yna yar yar.kukru yukuru yhu

    "gente genipapo", nome de um tipo de espritos de fras ms

    espcie de pequena esteira redonda, tecida de murumur

    cocar de penas, em forma de cora dupla

    esprito, pajchefe das fras da terra

    cohra grande, mitolgica

    ralo

    "bengala do paj", bculo de encantamento dos

    pajs

    nome prprio de um paj (informante) do rio

    Trombetas, falecido em 1947 homem casa dos homens esprito, paj-chefe das fras do cu esprito, paj chefe das fras da gua exclamao final, depois das danas cerimoniais na

    festa do rap estopa de castanha; esteira de casca de castanheira

    bem batida e ffa e que serve de assento para as mulheres

    esprito-chefe das serras da mata; pajchefe, com quem os pajs kachyana trabalham; o "CUrtlpira" dos pajs kachyana

    clave de mago, curta de guerreiro (que mata com a clave

    pincel de rap, feito de cabelos de porco silvestre 1) breu; 2) tintas dc breu (para a pintura do rosto) intrument de 2 tubos para aspirar o rap pano de algodo nativo mulher casa das mulheres povo, tribo de mulheres espritos-animais, os "bichos" dos kachyana;

    fras personificadas da natureza'

    tipo de flauta dc taboca; dste tipo tambm

    flauta sagrada

    taqura-rana

    povo, tribo, gente (usado como sufixo)

    ona mitol6gica ("do fundo")

    . imagem, figura da ona mitolgica yar bebida, calda cabelo cerimonial; antigamente: cabelo humano,

    cortado do inimigo morto e usado nas cerim nias fcstivas; hoje: cabelo altificial de fibras de carau (bromeliacea) , tintas de prto.

    -32

    BOLETIM DO MUSEU PARAENSE EMUJO GOELDI; ANTROPOLOGIA, 12

    IV --

    Citeratum para o estudo co-mpamtivo sbre o 'uso de paric e as fo'r-mas de instm-mentos de rap do tipo iwaraw

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    SUMMARY

    The presenl paper describes lhe ceremonies of a paric (Piplacler,ia) snuffing ritu al am ong the KachClyana lndians on lhe middle Trom betas Riv"r, Par, BraziI. As an inlrcduction some general notes about, the finality and lhe relat ionship of th" snuff ing ceremonies are given with some old warrior customs and lhe religiolls beliefs of the Kachyana lribe. After describing ':hc preparations of the set-up, lhe participans and the paraphernalia used , a description of lhe ceremonies is made. A condensed scheme of the r it ual procedurc together with a Iist of Kachyana lerms relared to snu ffing ceremonies and a general index of lhe Iiterature closes lhe paper.

    J,;dios Kacillyol/{/. oc!C/"Ilo(/OS pro o festa do rap.

    ......

    Dana KI/r~/IU. -34

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