avaliação e caraterização por métodos computacionais de...

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Francisco Diogo Carvalho Guerra Liberal Avaliação e Caraterização por Métodos Computacionais de Diferentes Radioisótopos no Contexto da Terapia Paliativa de Metástases Ósseas Julho 2013

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  • Francisco Diogo Carvalho Guerra Liberal

    Avaliao e Caraterizao por

    Mtodos Computacionais de

    Diferentes Radioistopos no

    Contexto da Terapia Paliativa de

    Metstases sseas

    Julho 2013

  • Avaliao e Caracterizao por Mtodos

    Computacionais de Diferentes Radioistopos no

    Contexto da Terapia Paliativa de Metstases

    Monografia do Curso de Mestrado em Engenharia Biomdica da

    Universidade do Porto

    Francisco Diogo Carvalho Guerra Liberal

    Licenciado em Engenharia Biomdica pela Universidade

    de Trs-os-Montes e Alto Douro (2013)

    Orientador:

    Joo Manuel R. S. Tavares

    Professor Associado do Departamento de Engenharia

    Mecnica da Faculdade de Engenharia da

    Universidade do Porto

    Coorientador:

    Adriana Alexandre S. Tavares

    Investigadora da Molecular Neurolmaging (MNI), LLC New

    Haven, Connecticut, USA

  • Agradecimentos Ao Professor Joo Manuel R. S. Tavares pela orientao e disponibilidade fornecidos ao

    longo deste documento, fundamentais para a correta elaborao do mesmo.

    A Dr.. Adriana Alexandre S. Tavares pelo apoio prestado, bem como, pelo auxlio e

    ajuda fornecida para a realizao do mesmo.

    E a todos aqueles de que forma direta e indireta contriburam de forma positiva para o

    desenvolvimento deste trabalho.

  • Sumario

    A finalidade deste trabalho avaliar os efeitos radiobiolgicos de alguns

    radiofrmacos utilizados na radioterapia paliativa de metstases sseas, bem como

    inferir sobre a sua eficincia teraputica, atravs do recurso a mtodos

    computacionais.

    As metstases sseas podem ocorrer em 30 a 70% dos doentes portadores de

    neoplasias. Os tumores malignos que mais frequentemente metastizam para o tecido

    sseo incluem o carcinoma da mama, prstata e pulmo. Nos doentes com metstases

    sseas, a radioterapia externa ou interna pode ser utilizada como um mtodo de

    tratamento paliativo, cuja finalidade o alvio dos sintomas, promovendo a melhoria

    da qualidade de vida do doente.

    A radioterapia interna com utilizao de radioistopos tem sido amplamente utilizada

    para terapia paliativa das metstases sseas, encontrando-se mltiplos radioistopos

    em utilizao como, por exemplo, o Samrio-153, o Estrncio-89, o Rnio-186 e 188, o

    Fsforo-32, o Tecnnio-99m, o Hlmio-166, o Estanho-117m, o Lutcio-177, o

    Samrio-153 e o Rdio-223.

    Para a realizao da Dissertao final de Mestrado necessrio proceder a uma

    recolha e pesquisa bibliogrfica de estudos cientficos previamente realizados na rea

    de interesse, com posterior sntese num nico documento, que servir de apoio ao

    estudo a realizar. A presente Monografia serve como o ponto de partida para a

    realizao da Dissertao final e tem por objetivo descrever o estado da cincia da

    terapia de metstase sseas com recuso a radiofrmacos, bem como descrever

    adequadamente conceitos essenciais nesta temtica.

  • Indice CAPTULO 1 ....................................................................................................................................... 12

    1.1. INTRODUO ................................................................................................................................... 14

    1.2. PRINCIPAIS OBJETIVOS ....................................................................................................................... 15

    1.3. ESTRUTURA ORGANIZATIVA ................................................................................................................. 16

    1.4. CONTRIBUIES PRINCIPAIS ................................................................................................................ 17

    CAPTULO 2 ....................................................................................................................................... 19

    2.1. INTRODUO ................................................................................................................................... 21

    2.2. PRINCPIOS DO CICLO CELULAR ............................................................................................................ 22

    2.3. CARCINOGNESE ............................................................................................................................... 25

    2.4. RADIOBIOLOGIA CELULAR ................................................................................................................... 32

    2.4.1. Efeitos Celulares da Radiao ............................................................................................. 34

    2.4.2. Efeitos Direto e Indiretos da Radiao ................................................................................ 35

    2.4.3. Tipos de Danos Celulares Radioinduzidos ........................................................................... 36

    2.4.4. Destino das Clulas Radioinduzidos .................................................................................... 37

    2.4.5. Mecanismos de Reparao do ADN .................................................................................... 38

    2.4.6. Curvas de Sobrevida ........................................................................................................... 41

    2.5. APOPTOSE E NECROSE............................................................................ ERROR! BOOKMARK NOT DEFINED.

    2.6. SUMRIO ........................................................................................................................................ 43

    CAPTULO 3 ....................................................................................................................................... 45

    3.1 INTRODUO ................................................................................................................................... 46

    3.2 CARACTERSTICAS DAS CLULAS SSEAS NORMAIS E TUMORAIS ................................................................. 46

    3.2.1 Morfologia e Cintica das clulas do Tecido sseo e Tumorais ......................................... 52

    3.3 METSTASES SSEAS ......................................................................................................................... 55

    3.3.1 Sinas e Sintomas das Metstases sseas ........................................................................... 56

    3.3.2 Mtodos de Deteo das Metstases sseas ..................................................................... 57

    3.3.3 Tratamento ......................................................................................................................... 59

    3.3.3.1 Tratamento Sistmico .................................................................................................... 60

    3.3.3.2 Tratamento Local ........................................................................................................... 62

    3.4 SUMRIO ........................................................................................................................................ 63

    CAPTULO 4 ....................................................................................................................................... 65

    4.1 INTRODUO ................................................................................................................................... 67

    4.2 TIPOS DE DECAIMENTO RADIOATIVO ..................................................................................................... 68

    4.2.1 Decaimento por Emisso de Partculas Alfa ....................................................................... 68

  • 4.2.2 Transformaes Isobricas ................................................................................................. 69

    4.2.3 Transformaes Isomricas ................................................................................................ 71

    4.3 RADIOISTOPOS UTILIZADOS EM TERAPIA PALIATIVA DAS METSTASES SSEAS ............................................ 73

    4.3.1 Fsforo-32 ........................................................................................................................... 74

    4.3.2 Estrncio-89 ........................................................................................................................ 75

    4.3.3 trio-90 ................................................................................................................................ 75

    4.3.4 Estanho-117m ..................................................................................................................... 76

    4.3.5 Samrio-153 ....................................................................................................................... 76

    4.3.6 Hlmio-166 ......................................................................................................................... 77

    4.3.7 Tlio-170 ............................................................................................................................. 77

    4.3.8 Lutcio-177 ......................................................................................................................... 78

    4.3.9 Rnio-186 ............................................................................................................................ 78

    4.3.10 Rnio-188 ....................................................................................................................... 79

    4.3.11 Rdio-223 ....................................................................................................................... 79

    4.4 RADIOFRMACOS PARA TERAPIA PALIATIVA DE METSTASES SSEAS .......................................................... 80

    4.4.1 Mecanismos de Captao do Radiofrmaco ...................................................................... 81

    4.4.2 Sumrio das Evidencias Clinicas Aps Tratamento Paliativo de Metstases sseas com

    Radiofrmacos .................................................................................................................................. 89

    4.5 SUMRIO ........................................................................................................................................ 91

    CAPTULO 5 ....................................................................................................................................... 93

    5.1 INTRODUO ................................................................................................................................... 94

    5.2 RESPOSTA A IRRADIAO .................................................................................................................... 94

    5.3 MODELOS DE TRACKING ..................................................................................................................... 95

    5.4 SUMRIO ........................................................................................................................................ 99

    CAPTULO 6 ..................................................................................................................................... 101

    6.1 CONCLUSES FINAIS ........................................................................................................................ 102

    6.2 PERSPETIVAS FUTURAS ..................................................................................................................... 103

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ........................................................................................................ 104

  • Captulo 1

    Introduo ao Trabalho e Estrutura

    da Monografia

  • 1.1. Introduo

    As metstases sseas so uma das mais importantes complicaes associada ao

    desenvolvimento e proliferao de clulas malignas. Estas so tambm um dos

    maiores problemas que um doente com cancro pode experienciar, sendo que cerca de

    80-100% dos doentes que morrem de cancro da prstata, mama e pulmo possuem

    metstases sseas. De entre esses doentes, mais de 75% experienciam significativas

    dores sseas e 50 % dos mesmos reportam analgia inadequada (Maini, Sciuto,

    Romano, & Bergomi, 2003; Via, 2005).

    O alvio dos sintomas induzidos pelas metstases sseas pode ser conseguido por via

    de um tratamento de corpo inteiro ou meio corpo com feixes de radiao externo de 8

    Gy, com uma taxa de sucesso a rondar os 80%. Contudo com o uso desta modalidade

    de irradiao corporal externa, todos os tecidos do corpo esto expostos a elevados

    nveis de radiao de forma semelhante, o que pode causar efeitos secundrios

    considerveis, em particular para os tecidos saudveis que se encontram volta do

    tecido tumoral maligno (Salazar, n.d.; Sivaprasad & Rajagopal, 2012).

    A terapia com radiofrmacos menos invasiva, tipicamente melhor tolerada e produz

    resultados no alvio da dor ssea, com a vantagem de limitar a exposio da radiao

    aos tecidos alvos (Volkert & Hoffman, 1999). Contudo, estudos so necessrios para

    investigar, nomeadamente, quais as melhores vias de administrao, dose, frequncia

    de administrao e radioistopos que resultaro numa melhor captao do

    radiofrmaco por parte do tecido alvo (Maini et al., 2003; Sivaprasad & Rajagopal,

    2012).

    Atualmente vrios estudos tm vindo a apresentar dados favorveis ao tratamento

    paliativo de metstases sseas quando este aplicado em estados menos avanados

    da doena oncolgica e muitos radiofrmacos novos tm sido apontados como tendo

    elevado potencial teraputico (Maini et al., 2003). Outros estudos tm demonstrado

    que os radioistopos que decaem por emisso de partculas - e por captura eletrnica

    so os que apresentam maior potencial teraputico, bem como, alguns radioistopos

    com decaimento , como o caso do rdio-223, onde a sua elevada energia

  • depositada num volume muito reduzido (Neves, Kling, & Oliveira, 2005; Tomblyn,

    2012).

    Irradiao de clulas tumorais com recurso a partculas radioativas como as acima

    mencionadas, por via de uso de radiofrmacos, pode induzir leses na estrutura do

    ADN da clula alvo, as quais podem subsequentemente levar morte da mesma por

    um processo de morte celular programada designado de apoptose (Maini et al., 2003).

    Tal resultaria numa destruio seletiva de clulas tumorais por um processo de morte

    celular controlado. Uma variedade de fatores contribui para a eficincia dos

    radiofrmacos, dado que os efeitos da radiao nas clulas um processo complexo e

    vrios esforos tm vindo a ser realizados para melhor compreender todo este

    processo atravs de estudos in vitro e in vivo, bem como avanos cientficos na rea da

    radiobiologia. Para alm disso, nos ltimos anos foram desenvolvidos, com sucesso,

    vrios simuladores computacionais que tm vindo a acelerar a obteno de resultados

    in silico e melhorar o conhecimento cientfico atual na rea de radiobiologia celular,

    nomeadamente na rea de efeitos da radiao ionizante em clulas.

    1.2. Principais Objetivos

    Estudos recentes documentam interesse da aplicao de diversos radiofrmacos em

    mltiplas patologias oncolgicas com fins teraputicos, constituindo um tema cada vez

    mais atual. Neste sentido, acredita-se que estudos radiobiolgicos como os que se

    pretendem realizar no mbito desta Dissertao so absolutamente pertinentes.

    Tornando-se de extrema utilidade para caracterizar, de uma forma que se espera mais

    circunstanciada e completa possvel, a natureza dos efeitos e eficcia dos diferentes

    radiofrmacos em diferentes cenrios patolgicos. Assim, espera-se, uma vez

    concluda esta Dissertao com o tema Avaliao e Caraterizao por Mtodos

    Computacionais de Diferentes Radioistopos no Contexto da Terapia Paliativa de

    Metstases sseas, contribuir para um maior conhecimento cientifico sobre:

    A avaliao dos efeitos radiobiolgicos das principais emisses de cada

    radioistopo em vrios cenrios de simulao.

  • A eficincia teraputica de cada radiofrmaco estudado, nomeadamente

    atravs da comparao dos efeitos radiobiolgicos produzidos pelas

    principais emisses de cada radioistopo;

    Por seu lado, aps a concluso desta Monografia, espera-se conseguir abordar de

    forma correta e global o estado da arte, no que toca utilidade de diferentes

    radiofrmacos utilizados na radioterapia paliativa das metstases sseas, pela recolha

    de informao cientfica que funciona como introduo de alguns dos conceitos

    utilizados na rea em estudo e guia de investigao a desenvolver para a Dissertao.

    1.3. Estrutura Organizativa

    Pretende-se organizar a presente Monografia de uma forma autnoma e

    independente para facilitar o acesso s diversas reas estruturas em 7 captulos.

    Assim, descreve-se sumariamente de seguida o que ser abordado em cada captulo:

    Captulo 2. Princpios do Ciclo Celular, Radiobiologia Celular e Apoptose

    Neste captulo realiza-se uma descrio global, dos principais conceitos do ciclo

    celular, com acessria relao deste com a morte celular programada, isto , apoptose.

    Este captulo reveste-se de capital importncia pois para o desenvolvimento desta

    Dissertao fundamental o conhecimento da cintica celular, em particular, as suas

    relaes com o processo apopttico, bem como dos efeitos da radiao no mesmo.

    Captulo 3. Metstases sseas

    Neste terceiro captulo so explicados os conceitos bsicos associados ao

    desenvenvolvimento de metstases sseas, bem como s alteraes que estas

    provocam na morfologia e cintica celular. Neste captulo tambm sero apresentados

    os diferentes mtodos de deteo e tratamento das metstases sseas.

    Captulo 4. Radiofrmacos para Terapia Paliativa de Metstases sseas

  • Neste quarto captulo so introduzidos os princpios da radioatividade e decaimento

    radioativo. Para alm disso, so tambm descritas as principais caractersticas fsicas

    de cada radioistopo com potencial na rea da terapia paliativa de metstases sseas,

    nomeadamente o seu esquema de decaimento e principais partculas emitidas .

    Captulo 5. Modelos de Radiobiologia Celular

    Neste quinto captulo so enumerados e descritos os modelos radiobiolgicos mais

    relevantes para a execuo da Dissertao final, bem como todos os parmetros

    necessrios para a sua compreenso.

    Capitulo 6. Concluses Finais e Perspetivas Futuras

    Neste ltimo captulo so apresentas algumas concluses finais sobre o trabalho

    desenvolvido, indicando igualmente quais as perspetivas futuras da continuao do

    desenvolvimento deste trabalho para posterior apresentao como Dissertao.

    1.4. Contribuies Principais

    Como principais contribuies desta Monografia, enquanto introdutrio respetiva

    Dissertao, salientam-se o estudo aprofundado de vrias investigaes conduzidas no

    mbito da teraputica com radiofrmacos de metstases sseas e a reviso e

    organizao da informao mais pertinente num nico documento.

    No que diz respeito Dissertao espera-se que esta contribua para melhorar o

    conhecimento cientfico neste tema em particular, pois um campo de intensa

    pesquisa e interesse crescente.

  • Captulo 2

    Princpios do Ciclo Celular,

    Radiobiologia Celular e Apoptose

  • 2.1. Introduo

    De um modo geral, as clulas crescem, aumentam o seu contedo e por fim dividem-

    se. Cada clula origina duas clulas-filhas que, se tudo ocorrer dentro da normalidade,

    sero geneticamente idnticas clula-me. Por sua vez, estas clulas-filhas podem

    tornar-se clulas-mes da gerao seguinte. Assim, a vida de uma clula comea

    quando esta surge a partir da clula-me e acaba, quando ela prpria se divide para

    originar duas clulas-filhas.

    O conjunto de transformaes e processos que decorrem desde a formao da clula

    at ao momento em que ela prpria se divide constitui um processo dinmico e

    continuo, denominado ciclo celular.

    Durante a diviso celular, os organelos, enzimas e outros constituintes da clula so

    distribudos pelas clulas-filhas. O cido desoxirribonucleico (ADN) exatamente

    autoduplicado e as cpias rigorosamente divididas. esta fidelidade na duplicao e

    na distribuio do material gentico pelas clulas-filhas que assegura a continuidade

    gentica.

    Todo o procedimento do ciclo celular controlado por diversas protenas e enzimas

    que alm de garantirem a ausncia de erros, asseguram a coordenao da cintica do

    ciclo, isto , a durao de cada fase especfica do processo e o tempo total necessrio

    para que todo o processo ocorra. Uma mutao numa protena ou enzima de controlo

    pode ter consequncias dramticas na cintica celular. Por exemplo, as clulas

    carcinognicas, em geral, tm uma durao do ciclo celular muito inferior s clulas

    normais, devido a alteraes em genes elementares no controlo do ciclo celular,

    designados por oncogenes.

    Um dos destinos finais que as clulas podem experienciar a morte celular

    programada ou apoptose. Este destino final importante do ponto de vista

    teraputico, dado que este tipo de morte celular tem um efeito mnimo ou mesmo

    ausente sobre as clulas vizinhas. A apoptose um mecanismo de segurana presente

    nas clulas que desencadeado sempre que as clulas so danificadas de forma

    irreversvel, garantindo assim a integridade da continuidade gentica. O processo

  • apopttico controlado por um vasto nmero de enzimas e protenas especficas que

    iniciam todo o processo assim que algum recetor ativado.

    A radiao ionizante quando interage com material biolgico, nomeadamente as

    clulas, provoca algumas alteraes nos seus constituintes, em particular no ADN, por

    ser o componente mais sensvel a radiao. Os efeitos provocados pela radiao nas

    clulas podem ser diretos, isto , energia radioactiva interage directamente com o

    ADN, provocando alteraes no mesmo; ou por mtodos indiretos, onde a energia

    depositada pela radiao no meio reage comas molculas de gua originando a

    formao de radicais livres, que por sua vez interagem com os constituintes celulares.

    2.2. Princpios do Ciclo Celular

    As clulas crescem e dividem-se de acordo com o seu ciclo celular. Este ciclo o

    processo atravs do qual uma clula somtica duplica o seu material gentico e o

    reparte igualmente s suas clulas-filhas, e dividido em interfase e fase mittica. A

    interfase corresponde ao perodo entre o fim de uma diviso celular e o incio da

    diviso seguinte, enquanto, a fase mittica enquadra o perodo durante o qual ocorre

    a diviso celular propriamente dita.

    Para que o ciclo celular seja iniciado, uma sequncia ordenada de eventos necessita de

    ocorrer, que inclui:

    Ligao de um fator de crescimento a um recetor especfico na membrana

    plasmtica;

    Ativao deste recetor, que subsequentemente ativa protenas transdutoras de

    sinais presentes no citoplasma;

    Transmisso do sinal at ao ncleo;

    Ativao de protenas reguladoras nucleares;

    Iniciao e progresso do ciclo celular.

    So conhecidas aproximadamente 50 protenas que atuam como fatores de

    crescimento. As clulas que possuem o recetor especfico para um determinado fator

  • de crescimento sero iniciadas no ciclo, enquanto as que no expressarem esse

    recetor permanecero inativas. Existem processos e componentes que controlam o

    ciclo celular podem ser divididos em duas amplas categorias (Park & Lee, 2003; Sherr,

    1996):

    Controladores Positivos: estimulam a progresso da clula no ciclo celular, a

    fim de que ocorra a diviso normal em duas clulas-filhas. Estes controladores

    positivos incluem:

    o Quinases dependentes da ciclina (CDKs): esto presentes durante todo

    o ciclo celular e so ativadas em determinadas fases do mesmo aps

    ligao s ciclinas. Este complexo CK-ciclina fosforila protenas

    especficas.

    o Ciclinas: so sintetizadas somente em fases especficas, de acordo com

    os requisitos do processo de diviso celular, e destrudas aps a sua

    utilizao. Ligam-se s CDKs para que estas possam exercer as suas

    funes.

    Controladores Negativos: inativam as funes dos controladores positivos, o

    que conduz interrupo do ciclo celular ou induo da apoptose;

    o Inibidores de quinases dependentes da ciclina (CKIs): so protenas

    que interagem com as CDKs ou complexos ciclina-CDK, bloqueando a

    sua ao.

    o Complexo ubiquitina: degrada ciclinas e outras protenas, impedindo a

    progresso do ciclo celular.

    o Fostatases: atuam na desfosforilao de CDKs e complexos cilcina-

    CDKs, tornando-os inativos.

    A interfase, que antecede a fase mittica, divide-se em trs subfases: G1, S e G2. O

    intervalo G1, ou ps-mittico, inicia-se quando a clula estimulada a multiplicar. Este

    intervalo corresponde ao perodo entre o fim da mitose e o incio da sntese de ADN

    (fase S), e caracteriza-se por um amento do volume celular e intensa sntese de

    protenas e enzimas. Na fase S, ocorre a autorreplicao de cada uma das molculas de

  • ADN, a fim de que cada cromossoma seja formado por dois cromatdeos ligados por

    um centrmero. O intervalo G2, ou pr-mittico, ocorre aps a sntese de ADN (fase S)

    e antes do incio da mitose. Neste perodo ocorre sobretudo a sntese de biomolculas

    e cido ribonucleico (ARN) necessrios diviso celular, consultar Figura 1.

    Figura 1: Progresso do ciclo celular depende de uma sequncia de ativao e desativao de diversos complexos

    CDKs e CDKIs (Stewart & Kleihues, 2003)

    Durante o ciclo celular existem etapas de avaliao interna que determinam a

    progresso ou a interrupo do ciclo celular, designados por checkpoints. O checkpoint

    1 ocorre no final do intervalo G1 e o checkpoint 2 ocorre no final do intervalo G2. Se o

    resultado da avaliao for negativo, as clulas param o seu processo de diviso e

    permanecem no estdio denominado G0 por tempo indeterminado ou at sua

    morte. Se pelo contrrio, a avaliao efetuada for positiva, estas prosseguem para a

    fase seguinte do ciclo celular, isto , a fase mittica.

    Relativamente fase mittica esta comummente dividida em duas etapas principais:

    a mitose, que corresponde diviso do ncleo, e a citocinese, que corresponde

    diviso do citoplasma. A mitose, embora seja um processo contnuo, dividido

    didaticamente em prfase, metfase, anfase e telfase. A prfase , de um modo

    geral, a etapa mais longa da mitose. Nesta fase, sucede a condensao dos

    cromossomas, tornando-se mais espessos e curtos, e os dois centrolos comeam a

    afastar-se em sentidos opostos, formando-se o fuso acromtico. Na metfase os

    cromossomas atingem o mximo de encurtamento, o fuso acromtico fica completo e

    os centrolos atingem os plos da clula. Para alm disso, os cromossomas orientam-se

  • com os centrmeros no plano equatorial, voltados com as terminaes para o exterior.

    Durante a anfase surge a clivagem dos centrmeros, separando-se os dois

    cromatdeos que passam a constituir dois cromossomas independentes. Durante nesta

    fase ocorre a ascenso dos cromossomas filhos aos polos da clula. Por ultimo, na

    telfase, a membrana nuclear reorganiza-se em torno dos cromossomas de cada

    clula-filha, o fuso mittico degradado e os cromossomas descondensam, terminado

    assim a mitose. A citocinese carateriza-se pela diviso do citoplasma e consequente

    individualizao de cada clula-filha. Este processo comea a ser preparado durante a

    mitose com a formao do anel contrtil de filamentos proteicos. Durante a citocinese

    estes filamentos contraem-se e puxam a membrana celular para o interior da clula,

    causando um sulco de clivagem, que vai lentamente estrangulando o citoplasma at

    separar as clulas-filhas.

    A durao das subfases do ciclo celular varia com o tipo de espcie animal ou vegetal,

    tipo de tecido e com o estado de desenvolvimento do organismo. Tipicamente o

    tempo de duplicao celular animal (humana?) varia entre 10 a 40 horas com a fase G1

    a durar 30%, fase S 50%, fase G2 15% e a mitose 5% do tempo do ciclo celular.

    2.3. Carcinognese

    O crescimento e multiplicao das clulas carcinognicas so diferentes do

    crescimento e multiplicao das clulas normais. As clulas carcinognicas esto

    continuamente a proliferar, ao contrrio das clulas normas que tem um nmero

    limitado de divises celulares. Ao contrrio das clulas normais, as clulas

    carcinognicas conseguem invadir e proliferar noutros tecidos que no os seus de

    origem. O crescimento sem controlo e a proliferao noutros tecidos so

    caractersticos que demarcam as clulas carcinognicas das clulas normais. Assim,

    estas clulas crescem geralmente em massas altamente desorganizadas e todo o seu

    processo de crescimento e diviso aparenta ser independente dos fatores de

    crescimento. Existem seis alteraes na estrutura e biologia celular que caraterizam o

    crescimento celular maligno. Estas alteraes esto presentes em todos os tipos de

  • cancro e incluem: 1) sinalizao autossuficiente de desenvolvimento; 2) insensibilidade

    aos inibidores de crescimento; 3) evaso apoptose; 4) potencial replicativo ilimitado;

    5) vascularizao muito sustentada; e 6) invaso tecidular e metstases. A instabilidade

    genmica, liderada pelo crescimento mutagnico, considerada o principal fator para

    a manifestao destas alteraes celulares (Sefried & Shelton, 2007).

    As clulas tornam-se cancerosas devido a leses no seu ADN, que est presente em

    todas as clulas e media todas as suas aes. Nas clulas normais, quando ocorre uma

    leso no ADN esta tende a ser reparada com sucesso ou, caso tal no acontea, a

    clula pode entrar em morte celular. Nas clulas carcinognicas, tipicamente a leso

    no ADN no reparada, porm a clula tambm no morre como deveria acontecer.

    Em vez disso, esta continua em diviso, produzindo clulas mutadas e com grande

    instabilidade genmica. A instabilidade gentica pode ser hereditria ou advir de erros

    na reproduo das clulas ou ainda ser induzida por fatores presentes no meio

    ambiente envolvente, consultar Figura 2.

    Figura 2: A carcinognese um processo com mltiplas etapas, envolvendo diversos eventos genticos e

    epigenticos nos proto-oncogenes, genes supressores tumorais e genes antimetastticos (Stewart & Kleihues, 2003)

    O processo de converso de uma clula normal para uma clula carcinognica

    dividido em duas fases principais: iniciao e promoo. Durante a fase de iniciao da

  • carcinognese, uma alterao permanente no genoma da clula garante-lhe uma

    vantagem no crescimento em relao as clulas vizinhas. A maioria das mutaes

    iniciais ocorrem em genes supressores tumorais ou em proto-oncogenes. Os proto-

    oncogenes codificam uma vasta gama de fatores de crescimento, recetores de fatores

    de crescimento, enzimas ou fatores de transcrio que promovem o crescimento ou

    diviso celular, consultar Tabela 1. Verses mutadas de proto-oncogenes que

    promovem a proliferao de clulas anormais so designados por oncogenes. Os

    oncogenes ativam as cascatas de sinalizao continuamente, resultando num aumento

    da produo de fatores de crescimento que estimula os crescimento celular. Por

    exemplo, o myc um proto-oncogene que atua como fator de transcrio. Uma verso

    mutada do myc converte-o num oncogene associado a 70% dos cancros. Outro

    oncogene o ras que normalmente funciona como um interrutor das cascatas de

    sinalizao. Uma mutao no ras causa a abertura permanente da via de sinalizao,

    levando a um crescimento celular descontrolado. Cerca de 30% dos tumores

    apresentam uma mutao no ras, incluindo os carcinomas do pncreas, tiroide, colon

    e pulmes. Por sua vez os genes supressores tumorais evitam a carcinognese e

    inibem o crescimento celular, pelo que, a perda destes genes facilita o

    desenvolvimento tumoral. As protenas codificadas pelos genes supressores tumorais

    atuam, geralmente, ao nvel da membrana celular, do citoplasma ou do ncleo. O RB e

    o p53 so exemplo de genes supressores tumorais. O p53 o gene supressor tumoral

    mais comumente relacionado com os cancros e o mais amplamente investigado,

    consultar Figura 3. Alteraes nestes genes so encontradas em aproximadamente

    70% dos cancros do colon e em 50% dos cancros da mama e pulmo (Park & Lee,

    2003).

    Nome Funo/Descrio Tipo de gene

    APC Regulao da transcrio de genes Supressor tumoral

    BCL2 Estimulao da angiogenese Oncogene

    BRCA1 Controlo o ciclo celular Supressor tumoral

    BRCA2 Reparao do ADN Supressor tumoral

  • HER2 Receo de fatores de crescimento Oncogene

    myc Regulao da interao entre protenas e fatores celulares

    Oncogene

    p16 e p21 Inibio da quinase Supressor tumoral

    p53 Regulao da apoptose e fator de transcrio

    Supressor tumoral

    ras Sinalizao da cascata do ciclo celular Oncogene

    RB Regulao do ciclo celular Supressor tumoral

    SIS Fator de crescimento Oncogene

    Tabela 1: Exemplos de genes importantes no processo de carcinognese celular (genes supressores tumorais e oncogenes).

    Figura 3: Via de sinalizao com mltiplas respostas desencadeadas com a acumulao de p53 no ncleo celular

    (Stewart & Kleihues, 2003)

    As alteraes de funo dos proto-oncogenes e genes supressores tumorais podem ser

    causadas por:

    Carcinognicos qumicos: a maioria dos agentes qumicos que causam cancro

    so mutagnicos, isto , alteram a estrutura do ADN. Alguns carcinognicos

    qumicos contm um grupo electroflico altamente reativo que ataca o ADN.

  • Radiao: alguns tipos de radiao (ultravioleta, raios-X e raios-) tem potencial

    carcinognico, podendo provocar leses no ADN, que incluem, quebras simples

    ou duplas das cadeias de ADN, perda de bases ou formao de dmeros de

    pirimidina. A radiao tambm pode provocar a formao de radicais livres,

    sendo estes os responsveis pela maioria dos efeitos carcinognicos indiretos

    da radiao.

    Vrus: podem contribuir para a mutao celular de diversos modos. Alguns

    introduzem oncogenes nos cromossomas da clula hospedeira, outros podem

    afetar a expresso dos proto-oncogenes celulares, pela introduo de

    mutaes que podem inativar ou alterar os locais de codificao de sequncias

    dos mesmos.

    O tumor depois de iniciado passa fase de promoo, isto , o seu desenvolvimento

    incentivado por agentes qumicos ou hormonais, designados por promotores tumorais.

    Estes agentes no so por si s mutagnicos mas aceleram ou promovem a

    transformao provocada pelo agente carcinognico. Os promotores mutagnicos

    atuam atravs da ativao de componentes das vias de sinalizao intracelulares,

    garantindo assim vantagens no seu desenvolvimento em relao s clulas vizinhas.

    Aps a iniciao e promoo tumoral, a clula pre-cancergena entra num processo

    referido como progresso. Durante a fase de progresso, clulas pr-cancerosas

    geneticamente vulnerveis, com vantagem no desenvolvimento em relao s clulas

    normais, so continuamente lesadas, atravs da repetida exposio a fatores ou

    promotores carcinognicos.

    FALAR da METASTIZAO

    2.4 Apoptose e Necrose

    Apoptose, ou morte celular programada, carateriza-se por ocorrer de forma individual,

    no infligindo, por isso, morte s clulas vizinhas. A morte celular por apoptose

    participa em mltiplas situaes fisiolgicas. A combinao da apoptose com a

  • proliferao celular responsvel pelo delineamento de tecidos e rgos nos

    embries. Por exemplo, a apoptose regula a separao dos dedos nos fetos. Problemas

    na regulao da apoptose podem conduzir ao aparecimento de inmeras patolgicas,

    nomeadamente cancro, (Tavares 2009).O processo apopttico tem o seu incio aps a

    captao de um sinal ou estimulo pelas clulas para entrarem em apoptose, realizando

    um vasto conjunto de alteraes. Uma famlia de protenas denominada caspase

    tipicamente ativada nas fases iniciais do processo, sendo responsveis pela

    degradao de componentes celulares fundamentais para o funcionamento celular

    normal, incluindo enzimas responsveis pela reparao do ADN. Por outro lado, as

    caspases podem ativar enzimas destruidoras, tais como, ADNases, que iniciam a

    quebra do ADN.

    A clula em apoptose apresenta uma morfologia distinta e caraterstica, que tem incio

    com o encurtamento celular devido a destruio dos filamentos de actina e lminas do

    citoesqueleto. Posteriormente o ncleo celular apresenta uma aparncia em ferradura

    devido a quebra da cromatina e condensao nuclear e um contnuo encurtamento

    celular observado de forma a permitir a posterior remoo dos restos celulares pelos

    macrfagos. Na fase final da apoptose surgem pequenas bolsas membranares, que

    formam vesculas, denominados corpos apoptticos. Estas alteraes morfolgicas so

    comuns a todas as clulas em apoptose explcita, independentemente do agente

    indutor do processo. Quer isto dizer que a ao das caspases representa uma via

    comum, que opera em todas as clulas programadas para morrer, (Anazetti & Melo

    2007).

    A sensibilidade da clula face a um estmulo apopttico depende de um nmero de

    fatores como a expresso de protenas indutoras e anti-apoptticas, a intensidade do

    estmulo e o estdio do ciclo celular. Existe um extenso nmero de mecanismos que

    induzem apoptose. A apoptose pode ser desencadeada por estmulos extrnsecos, tais

    como, a ligao de indutores de apoptose a recetores da membrana celular,

    denominados recetores de morte celular. Para alm dos processos referidos, a

    apoptose pode ser induzida por sinais intrnsecos que produzem stresse celular, devido

    exposio radiao, a qumicos ou vrus. Pode igualmente resultar de uma privao

    de fatores de crescimento ou stresse oxidativo induzido pela formao de radicais

    livres.

  • Existe uma grande correlao entre o ciclo celular e a apoptose, reconhecida pelos

    genes que codificam as protenas c-Myc, p53, Rb, ras, PKA, PKC, Bcl-2, NF-kB, CDK,

    ciclinas e CKI. Aps estimulao, estas protenas podem induzir proliferao celular,

    interrupo do ciclo celular ou morte celular programada. A resposta celular

    fortemente influenciada pela informao gentica existente, o microambiente, a

    extenso de dano no ADN e a concentrao de diferentes protenas.

    A morte celular por necrose ocorre, geralmente, em resposta a danos severos nas

    clulas e caraterizada, morfologicamente, por um aumento do volume

    citoplasmtico e mitocondrial, seguido da rutura da membrana plasmtica e

    extravasamento do contedo celular, induzindo deste modo uma resposta

    inflamatria, que pode causar dano e, por vezes at morte s clulas vizinhas. Deste

    modo, quando a morte celular ocorre por via da necrose, um grande nmero de

    clulas afetado e lesado durante o processo inflamatrio. Contrariamente ao

    processo de retrao celular observada aquando do processo apopttico, na necrose

    observa-se um edema celular devido s leses no citoesqueleto e inibio das bombas

    de Na+/K+, o que origina a perda da permeabilidade seletiva da membrana.

    Em sntese, na apoptose, ou morte celular programada, as clulas morrem como

    resultado de uma grande variedade de estmulos, contudo, o processo controlado e

    regulado. Contrariamente a necrose, corresponde morte celular descontrolada, que

    conduz ao aparecimento de lise celular e consequente resposta inflamatria, consultar

    Figura 9.

  • Figura 4: Apoptose e a necrose so distinguidas por alteraes morfolgicas caractersticas

    (Stewart & Kleihues, 2003)

    2.5. Radiobiologia Celular

    A radiobiologia a cincia que estuda a ao da radiao ionizante nas clulas, nos

    tecidos biolgicos e nos organismos completos, combinando para tal, a fsica da

    radiao e a biologia.

    Em radiobiologia a qualidade de um feixe de radiao ionizante caraterizada pela

    transferncia linear de energia (LET), que expressa a energia transferida ao meio por

    unidade de comprimento do percurso, expressa geralmente em .

    Segundo a International Comission on Radiation Units (ICRU), a LET pode ser definida

    pelo quociente , no qual a energia mdia localmente depositada no meio

    por uma partcula ou radiao de energia especificada ao longo de uma distancia .

    medida que a intensidade da ionizao aumenta, aumenta tambm a probabilidade

    de deposio da energia diretamente no material biolgico, ou seja, de ocorrer

    interao biolgica.

    Comparada com a radiao eletromagntica, as radiaes particuladas tem maior

    poder ionizante, logo maior probabilidade de interagir com os tecidos. Para alm disso,

    as partculas radioativas perdem a sua energia rapidamente produzindo numerosas

  • ionizaes numa curta distncia, como se comprova pelos valores apresentados na

    Tabela 2.

    Tipo de Radiao LET ( ) Cobalto-60 0.25

    Eletres de 1 MeV 0.3 Raio-X diagnstico 3.0 Fotes de 10 MeV 4.0

    Neutres de 2,5 MeV 20.0 Partculas de 5 MeV 100.0

    Ncleos pesados 1000.0 Tabela 2: Diferentes tipos de radiao e correspondente valor LET.

    Historicamente, a eficincia biolgica relativa (RBE) descreve quantitativamente o

    efeito relativo da LET, atravs de uma comparao da dose de radiao em estudo com

    uma dose de raios-X de 250 KeV. Mais recentemente tem sido proposta uma alterao

    da quantificao da RBE, no qual a dose de radiao padro so os raios- do 60C e no

    os raios-X de 250 keV. Em termos gerais, quando a LET aumenta a RBE tambm

    aumenta. Em termos matemticos, a RBE definida pela razo:

    =

    A RBE varia no s com o tipo de radiao utilizada, mas tambm com diferentes tipos

    de clulas e tecidos, condies fisiolgicas, efeito biolgico em estudo, dose, taxa de

    dose e fracionamento. Um aumento da RBE apenas apresenta interesse teraputico

    quando a RBE para o tecido normal inferior do tumor, aumentando assim, o nvel

    de morte celular no tumor e a razo alvo:no alvo, melhorando assim a eficcia

    teraputica, (Suntharalingam, 2002).

    Outro parmetro importante a avaliar no efeito da radiao a relao do

    enriquecimento em oxignio (OER), que descreve numericamente o efeito do oxignio,

    uma vez que a resposta dos tecidos biolgicos radiao maior quando so

    irradiados em situao aerbica do que em condies de anoxia ou hipoxia. O oxignio

    necessrio para a formao de radicais livres durante a ionizao da gua, os quais

    induzem a formao de H2O2. O OER descrito matematicamente pela equao:

  • =

    O valor de OER fortemente dependente da LET, uma vez que o OER maior para

    radiaes de baixo LET e menos eficaz com radiaes de alto LET.

    2.5.1 Efeitos Estocsticos e Determinsticos da Radiao

    Pelas leis de Bergonie e Tribondeau (1906), conclui-se que quanto mais diferenciada

    a clula, maior a sua radiorresistncia e quanto maior a taxa de proliferao, de

    crescimento e atividade metablica da clula, maior a radiossensibilidade. Assim,

    tecidos ou rgos em desenvolvimento e proliferao ativa so mais radiossensvel

    que tecidos ou rgos totalmente desenvolvidos e diferenciados, Figura 4.

    Em 1925, Ancel e Vitemberger modificam a lei de Bergonie e Tribondeau, introduzindo

    a noo de tempo de latncia, afirmando que a suscetibilidade das clulas leso por

    radiao o mesmo, mas o tempo de aparecimento das leses produzidas pela

    radiao vria de acordo com o tipo de clula, influenciadas pela quantidade de

    stresse biolgico que a clula est sujeita, pela necessidade de diviso, e pelas

    condies de pr e ps-radiao da clula exposta.

    Figura 5: Relao entre a radiossensibilidade das clulas e as suas caractersticas de diviso e diferenciao celulares.

    Vida curta Indiferenciadas Dividem-se regularmente

    Muito Alta

    Dividem-se um nmero limitado de vezes Algum grau de diferenciao Alta

    Dividem-se ocasionalmente Esperana de vida muito variavel Mdia Vida longa No se dividem muitas vezes Grau variavel de diferenciao

    Baixo No se dividem Altamente diferenciadas Muito Baixo

  • Os efeitos celulares da radiao podem ser classificados com base na sua

    probabilidade de ocorrncia, sendo divididos em dois tipos distintos:

    Efeitos estocsticos: Podem aparecer a partir da leso de uma ou vrias clulas,

    no existe limiar, pelo que os efeitos so de natureza aleatria, isto , assume-se

    que existe sempre a probabilidade de ocorrerem, mesmo para pequenas doses

    de radiao. Um aumento da dose implica um aumento da frequncia do efeito e

    no da sua gravidade.

    Efeitos determinsticos: esto associados a um limiar a partir do qual surgem, so

    os efeitos cuja severidade aumenta com o aumento da dose.

    2.1.1. Efeitos Direto e Indiretos da Radiao

    Quando as clulas so expostas a radiao ionizante, ocorrem primeiramente efeitos

    fsicos entre os tomos e molculas da clula e a radiao, e s mais tarde se verificam

    os danos biolgicos. Os efeitos biolgicos da radiao resultam sobretudo de leses

    provocadas ao ADN, o qual o componente mais sensvel da clula no que toca a

    radiao ionizante. Contudo, existem outros componentes da clula, que uma vez

    danificados, podem produzir efeitos biolgicos na clula como por exemplo enzimas,

    lpidos estruturais, entre outros.

    Quando a radiao incidente interage com o material biolgico, transfere energia para

    a clula, provocando danos que podem ser resultado de efeitos diretos ou indiretos da

    radiao. No efeito direto, a radiao interage diretamente com a molcula alvo, ou

    seja o ADN. Os tomos do ADN so ionizados ou excitados, conduzindo a uma cascata

    de eventos fsicos e qumicos, que eventualmente produzem o dano biolgico. O efeito

    direto o processo dominante em interaes de radiao de alta LET.

    No efeito indireto, a radiao interage com outas molculas ou tomos,

    principalmente molculas de gua, no interior da clula, produzindo radicais livres, os

    quais posteriormente provocam a ionizao da molcula alvo. As interaes da

    radiao com as molculas de gua no interior da clula produzem radicais livres de

    curta vida, nomeadamente, o H2O+ e o OH. Os radicais livres em causa podem induzir

    danos no ADN, os quais conduzem a danos biolgicos. Cerca de dois teros do dano

  • biolgico provocado por radiao de baixa LET devido ao efeito indireto da radiao,

    consultar Figura 5 (Tavares, 2009).

    Figura 6: Efeitos diretos versos efeitos indiretos (Hall & Giaccia, 2006)

    2.1.2. Tipos de Danos Celulares Radioinduzidos

    As clulas expressam os danos radioinduzidos aquando da sua diviso e multiplicao.

    Leses que provocam aberraes cromossmicas e mutaes genticas nas clulas

    podem levar morte celular, inibio da diviso celular ou a transformaes malignas.

    Estas alteraes celulares podem ter como consequncias finais a alterao da funo

    tecidular, morte tecidular ou induo de cancro.

    A interao de radiao ionizante com material biolgico provoca uma cascata de

    eventos nefastos para a estrutura e funo do material em causa. Quando existe

    interao entre radiao e o ADN, um dos seguintes efeitos biolgicos na estrutura do

    ADN podem ocorrer: 1) alterao das ligaes entre as bases, devido a substituio de

    bases, adio de novas bases ou remoo de bases existentes, substituio cruzada de

    bases; 2) Single Strand Break (SSB), quebras simples da cadeia; ou 3) Double Strand

    Break (DSB), quebras duplas da cadeia. Estes danos do ADN podem conduzir a

    alteraes na funo do ADN levando a uma das seguintes consequncias: inibio

    temporria ou permanente da sntese de ADN, sntese de ADN incorreto, inibio ou

    preveno da mitose ou mesmo sntese de protenas incorretas. Por outro lado

  • quando a interao da radiao ocorre com enzimas, alteraes da estrutura terciria

    ou disrupo das ligaes qumicas das enzimas podem ocorrer, levando inibio da

    atividade enzimtica ou a alteraes do metabolismo celular. Se as interaes ocorrem

    nas membranas celulares, pode ocorrer um aumento da permeabilidade aos ies,

    resultando em potenciais alteraes da composio intracelular e extracelular da

    clula.

    Suntharalingam e colegas em 2002 classificaram os danos provocados em clulas de

    mamferos em trs grandes grupos (REF):

    Danos letais: os quais so irreversveis, conduzindo morte da clula;

    Danos subletais: podem ser reparados em algumas horas exceto se outros

    danos subletais forem adicionados durante a reparao celular, o que

    conduzir ao aparecimento de um dano letal;

    Danos potencialmente letais: podem ser processados pelos mecanismos de

    reparao quando as clulas so retidas no estdio G0.

    2.1.3. Destino das Clulas Irradiadas

    A irradiao da clula pode resultar em nove possveis destinos finais,

    (Suntharalingam, 2002):

    Ausncia de efeito;

    Atraso na diviso: clula fica retida no estdio G0;

    Apoptose: a clula morre por fragmentao;

    Falha reprodutiva: a clula morre na tentativa de executar mitose;

    Instabilidade genmica: carateriza-se por um atraso da falha reprodutiva como

    resultado da introduo de instabilidade genmica;

    Mutao: a clula sobrevive, mas est mutada;

    Transformaes: a clula sobrevive, mas a mutao leva a alteraes de

    fentipo e possibilidade de carcinognese;

    Efeito bystander: a clula irradiada envia sinais as clulas vizinhas no

    irradiadas, induzindo danos genticos nas mesmas;

  • Resposta adaptativa: a clula irradiada estimulada para reagir e tornar-se

    mais resistentes radiao.

    2.1.4. Mecanismos de Reparao do ADN

    Quando a radiao ionizante interage com o material biolgico, principalmente o ADN,

    provoca alteraes na sua estrutura num curto espao de tempo, entre 10-3 e 10-5

    segundos, estimulando a quebras de ligaes qumicas do ADN. Contudo, os efeitos

    biolgicos de tal leso surgem tardiamente, aps um perodo de latncia quem pode

    demorar desde algumas horas at vrios anos. Como consequncia dos danos no ADN

    a clula pode sofrer uma mutao, entrar em apoptose ou tornar-se numa clula

    carcinognica. Caso a morte celular seja o destino final da clula irradiada, esta pode

    ocorrer dentro de algumas horas, isto , efeitos precoces da radiao. Contudo, se o

    dano for oncognico, a sua expresso pode ser adiada durante anos, isto , efeito

    tardio da radiao. Dependendo da energia depositada pela radiao ionizante na

    clula irradiada podem ocorrer quebras de apenas uma cadeia de ADN ou quebras nas

    duas cadeias de ADN (mencionadas anteriormente). Em termos biolgicos as SSBs so

    tipicamente de fcil reparao, no apresentando assim grandes consequncias

    celulares, a no ser em caso de reparao incorreta a qual pode conduzir ao

    aparecimento de uma mutao. Tambm as DSBs separadas por vrios pares de bases

    so frequentemente facilmente reparados pelos mecanismos celulares. Porm as DSBs

    complexas, separadas por poucos pares de bases so uma das leses mais toxicas e

    mutagnicas nas clulas humanas. Uma nica DSB tem potencial para remover mais de

    100 milhes de pares de base de informao gentica.

    O nmero de leses no ADN geradas pela radiao elevado, mas o nmero de clulas

    que morrem devido as leses substancialmente mais reduzido. O nmero de leses

    induzidas no ADN por uma radiao de 1-2 Gy aproximadamente de 1000 SSBs e 40

    DSBs. Dados experimentais demonstram que as DSBs induzidas por radiaes de baixo

    LET so tipicamente mais facilmente reparadas que as DSBs provocadas por radiaes

    de alto LET. Conhecimento relativo interao e trajeto da radiao (track structure)

  • com a matria tem vindo a ser utilizado para explicar as variaes e diferentes

    distribuies das leses no ADN.

    Existem mltiplos mecanismos enzimticos de reparao do ADN nas clulas que

    atuam em diferentes tipos de leses. Para as leses DSBs, os principais mecanismos de

    reparao so a recombinao homloga (Homologous Recombination) e a

    recombinao no homloga (Non-Homologous End Joining, NHEJ) (Helleday, Lo, Van

    Gent, & Engelward, 2007). A recombinao homloga requer que parte do ADN no

    esteja danificado para servir como molde para sntese de novo ADN, um mecanismo

    raro, sem erros, e que acontece essencialmente aps a replicao, na fase final do

    estdio S e G2 do ciclo celular. Este tipo de reparao inicia-se com a ligao de um

    complexo proteico aos locais das leses. De seguida ocorre a sntese dos nucletidos

    em falta, de forma a criar um complexo cruzado entre as cadeias de ADN lesadas e

    normais, designado de juno de Holliday. Por ltimo occore a quebra da juno

    Holliday, que o passo final no processo de reparao por recombinao homloga. A

    recombinao no homloga provoca leses pr-mutagnicas, as quais podem ser

    letais no caso de aberraes em anel, dicntricas ou pontes de anfase; ou no-letais

    se forem pequenas delees ou translocaes simtricas. Este mecanismo opera na

    ponta do fragmento de ADN, aps a identificao por parte da protena Ku70/Ku80 do

    local da leso. De seguida a protena de reparao liga-se ao DNA-PK, o qual promove

    uma re-coneo dos fragmentos de ADN. Este mecanismo ocorre essencialmente na

    fase final do estdio G1 e fase S do ciclo celular.

    A radiossensibilidade celular depende da fase do ciclo celular no qual a clula se

    encontra quando irradiada. Em geral, a fase final do estdio S a mais

    radiorresistente, a fase G2 e M so as mais radiossensveis e a fase G1 tem uma

    radiosenssibilidade intermdia (Figura 6). A reparao de danos celulares durante a

    fase final do estdio S preferencialmente executada por via do mtodo de reparao

    HR em vez do mtodo NHEJ, o que poder ser atribudo elevada radioressistncia

    desta fase do ciclo celular. .

  • Figura 7: Frao de clulas que sobrevivem a uma dose de 6.6 Gy de raio-X em funo do tempo. Note-se que a

    sobrevivncia celular cresce at um mximo na fase final do estdio S (Wang, 2000).

    Existem mecanismos de reparao mais simples que so utilizados principalmente nas

    quebras simples como o caso da reparao por exciso de bases (Base Excision Repair,

    BER) que permite corrigir problemas em bases individuais atravs da produo de um

    local AP (local apurnico ou apirimidnico), reparao por exciso de nucldeos

    (Nucleotide Excision Repair, NER) que corrige dmeros de timina atravs da remoo de

    oligonucldeos e reparao de erros de emparelhamento (Mismatch Repair, MMR).

    O mecanismo BER um processo celular que repara leses no ADN fora do ciclo celular

    (G0). responsvel primeiramente pela remoo de leses pequenas e simples nas

    bases do genoma, que de outra forma poderiam causar mutaes por reparaes

    incorretas ou quebras na duplicao do ADN. O processo BER iniciado pela glicosilase

    (DNA glycosylases), que reconhece e remove as bases lesadas ou alteradas da cadeia

    de ADN, formando locais AP. Estes locais so ento clivados pela endonuclease AP (AP

    endonuclease). A quebra simples resultante pode ento ser processada pelo

    denominado Short-patch BER (SP-BER, onde um nico nucletido substitudo) ou

    pelo Long-patch BER (LP-BER, onde so sintetizados 2-10 novos nucletidos). Estudos

    sugerem que fatores como o tipo de leso, a fase do ciclo celular e o grau de

    diferenciao da clula influencia a deciso celular na escolha entre reparao por SP-

    BER ou LP-BER.

    Por outro lado, o processo NER um mecanismo de exciso importante que remove

    mutaes resultantes da radiao como dmeros de timina. O reconhecimento da

    leso leva remoo de um pequeno segmento da cadeia de ADN que a contm. A

  • cadeia de ADN sem leso utilizada pela ADN-polimerase como molde para a sntese

    da sequncia complementar em falta. Por fim a ligao que completa o processo e

    origina a dupla cadeia de ADN reparada est a cargo ADN-ligase. A Figura 7

    apresentada abaixo sintetiza de forma simples os processos BER e NER que ocorrem

    em clulas dos mamferos.

    Figura 8: Esquema dos mecanismos de reparao BER (A) e NER (B) (Blakely, 2011)

    2.1.5. Curvas de Sobrevida

    O procedimento padro utilizado para medir a radiossensibilidade de uma populao

    celular a reteno da sua integridade reprodutiva. Este referido como a sobrevida

    celular e percentagem de sobrevida aps irradiao, assumindo que existe uma

    relao clara entre a apoptose, o crescimento celular e a sobrevivncia celular para um

    vasto intervalo de doses.

    O tipo de radiao influencia a forma da curva de sobrevida celular, sendo que

    radiaes densamente ionizantes apresentam curvas de sobrevida quase exponenciais

  • face dose absorvida, enquanto radiaes pouco ionizantes apresentam uma pequena

    diminuio inicial, seguida de uma regio denominada em ombro e de um decrscimo

    constante para altas doses, consultar Figura 8.

    Figura 9: Curvas de sobrevida celular tpica para radiao de alta LET e baixa LET: (a) Primeiro modelo e (b)

    modelo atual (Tavares, 2009)

    As curvas de sobrevida so melhor expressas em grficos semi-logartmicos de

    sobrevivncia celular versus dose de radiao, geralmente com doses de 1 a 10 Gy por

    clula. O modelo mais utilizado na atualidade o modelo linear-quadrtico, o qual

    utiliza um polinmio de segunda ordem, em que as constantes representa a

    inclinao inicial da curva e a componente quadrtica de morte celular para

    descrever o declive da sobrevida (S) com o aumento da dose (D):

    = (+2)

    A razo / fornece a dose para a qual os componentes quadrticos e lineares da

    morte celular so iguais.

    A taxa de sobrevivncia celular maior quando uma dose administrada de forma

    fracionada num perodo superior a 2 horas, comparado com uma nica dose. Esta

    variao atribuda s reparaes das leses subletais entre fraes. Em geral o

    perodo de reparao de metade das leses subletais varia entre 0.5 a 1 hora para

    clulas em cultura podendo ser maior em tecidos. E a reparao completa pode

    demorar entre 6 a 8 horas, podendo tambm ser mais moroso em tecidos. O sucesso

    da reparao do dano depende da dose absorvida e do tempo de exposio, existindo

    uma velocidade mxima de reparao observada quando a leso atinge nveis de

  • saturao, anlogo cintica enzimtica. A reparao menos bem-sucedida para

    irradiaes de altas taxas de doses, apresentado maior sucesso para baixas taxas de

    doses. O sucesso crescente da sobrevivncia celular a baixas doses ou com doses

    muito espaadas no tempo consistente com a importncia dada ao tempo de

    reparao das leses subletais. Outro efeito importante na sobrevida celular o

    chamado efeito bystander, em que as clulas prximas das clulas irradiadas, mas que

    no foram atingidas diretamente pela radiao, exibem leses similares quelas

    observadas em clulas diretamente atingidas pela radiao.

    2.2. Sumrio

    Deste captulo conclui-se que a clula comea a sua vida quando se origina a partir da

    diviso da clula-me e termina quando ela prpria se divide em duas clulas-filhas. O

    ciclo celular, bem como toda a cintica a este associado, desempenha um papel

    fundamental na resposta celular irradiao pois aquando de um dano pode iniciar o

    processo de reparao celular, pode ativar o processo de morte celular ou pode retirar

    essas clulas danificadas do ciclo celular, colocando estas num estdio quiescente

    designado G0. A apoptose o processo de morte celular que menos danos causa s

    clulas vizinhas, sendo o processo controlado de morte celular, desejvel em cenrios

    de terapias com recurso radiao. Tambm neste captulo se observa que a radiao

    provoca efeitos nefastos nas clulas e que estes dependem em muito da qualidade da

    radiao e dos mecanismos de reparao que atuam nas leses. O esquema

    apresentado na Figura 10 sumaria os principais dados apresentados neste captulo,

    sintetizando todo os processos celulares tipicamente observados aps induo de

    danos s clulas.

  • Figura 10: Sumrio dos principais processos de resposta celular a diferentes tipos de danos celulares induzidos.

  • Captulo 3

    Metstases sseas

  • 3.1 Introduo Um dos grandes problemas associados ao processo carcinognico a possibilidade

    deste se disseminar por diversas reas do corpo humano, complicando assim o

    combate as clulas carcinognicas. As metstases so aglomerados de clulas malignas

    que se espalham a partir do primeiro local de desenvolvimento tumoral, para outros

    locais do corpo, sendo um processo fisiolgico muito pouco eficiente, pois a habilidade

    das clulas cancerosas promoverem a proliferao de metstases com sucesso

    depende das suas caractersticas individuais e do meio, incluindo as clulas do sistema

    imunolgico, as propriedades que as clulas vo encontrar no sistema linftico e

    corrente sangunea e no seu local de destino.

    As metstases sseas podem ocorrer em 30 a 70% dos doentes portadores de

    neoplasias. Os tumores malignos que mais frequentemente metastizam para o tecido

    sseo incluem o carcinoma da mama, prstata e pulmo. Clinicamente a dor o

    sintoma mais frequentemente associado a metstases sseas. As metstases sseas

    podem ainda conduzir a fraturas sseas e a hipercalcemia.

    A deteo dos locais metastticos pode ser realizada com recurso a diversas tcnicas

    de imagiolgica mdica, das quais se destacam a cintigrafia ssea, radiografias e

    tcnicas tomogrficas de emisso ou transmisso. Vrios tratamentos tm sido

    utilizados para erradicar as metstase sseas ou para melhorar a qualidade de vida do

    doente, sendo que estes dependem do estado da doena e da sade geral do doente,

    podendo ser divididos em tratamentos sistmicos ou locais.

    3.2 Princpios Gerais do Processo Metasttico O tumor formado por clulas cancerosas metastticas designado de tumor

    metasttico ou metstase (Kaplan et al., 2006). Um tumor metasttico tem

    frequentemente o mesmo tipo de clulas do tumor original, partilhando assim com o

  • tumor original algumas caractersticas moleculares em comum, tais como a expresso

    de certas protenas ou a presena de algumas alteraes cromossmicas especificas.

    A metstase o resultado final de vrias etapas interdependestes, um processo

    multifacetado que inclui uma complexa interao entre o tumor e o local hospedeiro,

    uma sequncia de acontecimentos que ainda hoje no est completamente

    esclarecida. Os principais passos associados ao processo metasttico incluem (Figura

    14):

    Invaso local: as clulas cancerosas invadem tecido vizinho normal;

    Invaso dos vasos: as clulas cancerosas invadem e movem-se atravs das

    paredes dos vasos linfticos e sanguneos adjacentes;

    Circulao: as clulas cancerosas movem-se pelo sistema linftico e corrente

    sangunea para outros locais do corpo;

    Extravaso: as clulas cancerosas param de se mover em pequenos capilares,

    onde invadem a parede dos capilares e migram pelo tecido envolvente;

    Proliferao: as clulas cancerosas multiplicam-se no novo local e formam

    pequenos tumores, micrometstases;

    Angiogenese: os pequenos tumores estimulam o desenvolvimento de vasos

    sanguneos, fundamentais para a obteno de oxignio e nutrientes,

    permitindo assim o desenvolvimento contnuo do tumor metasttico.

    Figura 11: As fases principais do processo metasttico (Stewart & Kleihues, 2003)

  • A habilidade das clulas cancerosas promoverem a proliferao de metstases com

    sucesso depende das suas caractersticas individuais, das caractersticas das clulas

    no cancerosas (incluindo as clulas do sistema imunolgico presentes no local

    original) e das caractersticas do meio que as clulas vo encontrar no sistema

    linftico, na corrente sangunea e no seu local de destino final. A Figura 15 demonstra

    alguns dos mecanismos envolvidos no desenvolvimento e proliferao das metstases

    sseas.

    Figura 12: Mecanismos que induzem o desenvolvimento e proliferao das metstases sseas. IL-interleucina, TNF- fator de necrose tumoral, TGF- fator de cresimento tumoral, EGF- fator de crescimento epidermal, PTHrP- protena relacionada com a hormona tiroideia, PGE- prostaglandina E, MCSF- fator estimulador de colnias de

    macrfagos (Bczyk, 2011)

    Fisiologicamente, a metstase um processo ineficiente. Sabe-se, por exemplo, que

    aps injeo intravenosa experimental de clulas tumorais altamente metastticas,

    apenas 0.01% destas iro conseguir formar um foco tumoral (Meohas et al., 2005).

    Alguns pacientes com tumores metastticos no apresentam sintomas, porm quando

    ocorrem sintomas, estes variam consoante a localizao e tamanho da metstase.

    A maioria dos cancros tem capacidade de se espalharem por vrios locais diferentes do

    corpo simultaneamente. As metstases sseas surgem com maior frequncia dos

    carcinomas da mama, pulmo, rim, prstata e tiroide. Localizando-se mais comumente

    nas vertebras, arcos costais, na pelve e no fmur, embora qualquer osso possa ser

    disseminado (Kaplan et al., 2006).

  • 3.3 Caractersticas das Clulas sseas Normais e

    Metastticas

    O tecido sseo constitudo essencialmente por dois tipos distintos de clulas, que

    asseguram a qualidade do tecido atravs da sntese e degradao contnua do mesmo:

    os osteoblastos e os osteoclastos.

    Os osteoblastos, clulas osteognicas, tem aproximadamente 3 meses de vida e

    provm das clulas pluripotentes da matriz mesenquimal. A sua principal funo a

    produo de colagnio tipo I e proteoglicanas que formam a estrutura orgnica

    intracelular do osso que vai ser calcificada. Para alm disso, os osteoblastos so

    tambm responsveis pela sntese de vrios tipos de proteinases, (osteonectina,

    osteopontina e osteocalcina).

    Os osteoclastos, com um tempo de vida de aproximadamente de 2 semanas, derivam

    da linhagem moncito-macrofagal das clulas hematopoiticas. Aps diferenciao em

    contacto com a matriz ssea, conectam-se e produzem uma forma polinuclear ativa. A

    adeso do osteoclasto com a matriz ssea cria um microambiente em que a libertao

    de cidos (H+) ou hidrolases inicia o processo de ostelise. Os osteoclastos tm a

    habilidade de fagocitar a matriz ssea e digerir no seu citoplasma. Um fator

    importante no funcionamento dos osteoclastos o feedback negativo atravs do qual

    os indutores de apoptose so estimulados, induzindo a degradao da matriz ssea. A

    Figura 11 demonstra a organizao e estrutura do tecido sseo (imagem direita) e

    expem uma imagem histolgica do tecido sseo e as suas clulas (imagem

    esquerda).

    Figura 13: Representao da estrutura e organizao do tecido sseo e imagem histolgica do tecido sseo com as principais clulas sseas: osteoblastos, osteoclastos e ostecitos.

  • Os produtos de degradao da matriz ssea bem como fatores de crescimento sseo, a

    protena morfognica do osso (bone morphogenetic protein - BMP),o fator

    transformador de crescimento (transforming growth factor - TGF-) e o fator de

    crescimento dos fibroblastos (fibroblast growth factor - FGF) estimulam de formas

    diferentes a maturao das diversas clulas do tecido sseo, sendo que algumas

    destas, aps a estimulao produzem osteoprotegenina (osteoprotegerin - OPG), o

    principal inibidor da maturao dos osteoblastos (Kaplan, Psaila, & Lyden, 2006).

    Em 1889 Stephen Paget reconhece a predisposio das clulas carcinognicas dos

    tumores da mama para disseminarem para o esqueleto, apresentando a teoria das

    sementes (clulas carcinognicas) e da sua dependncia do solo (tecido alvo) no

    processo metasttico. Paget comparou o processo de metastizao ssea com o

    processo de plantao de sementes: When a plant goes to seed, its seed are carried in

    all directions: but they only live and grow if they fall on congenial soil (Sterling,

    Edwards, Martin, & Mundy, 2011). As clulas tumorais, uma vez estabelecidas no osso,

    segregam vrios fatores de crescimento e fatores que mediam a absoro ssea, os

    quais iniciam ou aceleram a destruio ssea pelos osteoclastos, produzindo assim um

    ciclo vicioso (Figura 12). Por exemplo, as clulas cancerosas da prstata expressam o

    fator de crescimento TGF-, o qual ao aderir matriz ssea pode afetar a maturao

    dos osteoblastos. As clulas carcinognicas reagem presena de TGF- atravs da

    libertao de protenas relacionadas com a hormona paratiroideia (parathyroid

    hormone related protein - PTHrP), que est fortemente associada ao aumento da

    absoro ssea tanto em humanos como em animais. O fator de crescimento EGF, por

    seu lado, pode aumentar a facilidade a migrao das clulas carcinognicas da

    corrente sangunea para o osso.

  • Figura 14: Ciclo vicioso da interao tecido metasttico-tecido sseo que favorece a estabilizao e crescimento

    do tumor. Quando as clulas tumorais (azuis) atingem o osso, estas segregam fatores que estimulam os osteoclastos (roxos) para a degradao ssea. Esta degradao estimula a libertao de fatores de crescimento a

    partir do osso que favorecem o desenvolvimento das clulas tumorais. (Sterling et al., 2011)

    O conhecimento cientfico sobre a interao das clulas carcinognicas com o

    microambiente sseo tem vindo a aumentar e sabe-se que os diferentes tipos de

    clulas, bem como interaes complexas entre o osso, as clulas tumorais e o estroma,

    tm um papel distinto na regulao da destruio ssea durante o processo de

    metastizao ssea. Por exemplo, dados experimentais tm demostrando que a rigidez

    ssea tem um papel preponderante na primeira fase de desenvolvimento das

    metstases sseas, sendo que a rigidez do osso aumenta a expresso de PTHrP,

    facilitando a invaginao das clulas carcinognicas na matriz ssea. Os osteoblastos

    tambm apresentam um papel importante neste ciclo vicioso, pois so as clulas

    precursoras dos osteoblastos que produzem o RANKL, que estimula a diferenciao

    dos osteoclastos. Tambm a diferenciao dos osteoblastos inibida na presena de

    TGF-, resultando assim na inibio de formao de novo osso, consultar Figura 12.

    Vrios grupos de investigao tm demostrado tambm que os fibroblastos podem

    alterar o fentipo invasivo de algumas clulas tumorais tramsformando clulas

    tumorais benignas em clulas tumorais com fentipo maligno (Sterling et al., 2011).

    Estudos realizados anteriormente com o objetivo de investigar os tempos de

    duplicao das clulas metastticas sseas demonstraram que, caso todas as clulas

    do tumor se encontrassem em diviso e no houvesse perda de clulas, o tempo de

    duplicao do volume do tumor iria refletir o tempo do ciclo celular das clulas

  • tumorais (TC). A frao reduzida de crescimento significa que o tempo potencial de

    duplicao de volume (Tpot) do tumor superior ao ciclo celular das clulas

    carcinognicas, devido sua heterogeneidade e a perda de clulas significa que o

    tempo mdido de duplicao (TD) ainda superior. Os tumores humanos tem um TD

    mdio de 2 a 3 meses, dependendo do tipo de tumor, contudo as clulas tumorais

    apresentam TC de 2 a 3 dias e um Tpot de 4 a 20 dias.

    3.3.1 Morfologia e Cintica das Clulas do Tecido sseo e

    Tumorais

    O ciclo celular de cada tipo de clula controlado por diversos marcadores, enzimas e

    protenas que lhes proporciona uma cintica particular, pode ser alterada se ocorrer

    alguma alterao gentica, como no caso das clulas carcinognicas da prstata e

    mama.

    As clulas carcinognicas metastticas da prstata, tal como as clulas normais que as

    originam, so sensveis a estimulao por hormonas de crescimento. Na presena de

    certas hormonas, a percentagem de proliferao (Kp) destas clulas estimulada,

    enquanto na ausncia de hormonas a taxa de morte celular (Kd) aumenta. Na

    presena das hormonas estimuladoras do crescimento, ocorre o contnuo crescimento

    das clulas metaststicas da prstata, uma vez que, a taxa de proliferao supera a

    taxa de morte celular (Berges et al., 1995).

    O Kp calculado atravs da diviso do valor GF para um dado tipo de clula pelo

    perodo intermittico Tc desse mesmo tipo de clula (expresso em dias), com posterior

    multiplicao do resultado por 100. O GF determinado por anlises

    imunocitoquimicas para detetar clulas em ciclo celular, atravs da deteo do

    antigene Ki67 presente em clulas em proliferao (G1, S, G2) e ausente em clulas fora

    de ciclo (G0). Ou seja, o GF a poro de clulas da amostra marcadas positivamente

    com o antigene Ki67. Por outro lado, o Tc determinado pela observao de culturas

    de clulas atravs de um vdeo com subsequente determinao e quantificao do

    tempo entre mitoses. O valor Kd, que expressa em percentagem a taxa de morte

    celular diria, calculado dividindo a frao de clulas cuja extremidade do ADN est

    marcada com TTF exgena (terminal transferase) pela semi-vida das clulas marcadas

  • e depois multiplicado por 100. Por ltimo, a taxa de crescimento celular dada pela

    subtrao de Kd a Kp para cada tipo particular de clula. Quando Kd < Kp o tempo de

    duplicao dado pela formula:

    =2

    [ ]

    Quando Kd = Kp, o tempo de renovao de todo o tecido calculado por:

    = 1

    Estudos realizados por Carter e colaboradores concluram que o tempo necessrio de

    duplicao da populao das clulas da prstata de 2.40.6 anos, por outro lado,

    para clulas metastticas este valor era de 1.80.2 anos. Outros estudos realizados por

    Schmid e colaboradores determinaram que os tempos de duplicao das clulas

    normais e metastticas de prstata eram de 5.8 e 3.6 anos, respetivamente.

    Num estudo realizado por Berges e colaboradores, concluiu-se que o Tc das clulas da

    prstata normais e carcinognicas era de 485 horas. Este estudo tambm

    demonstrou que o valor de semi-vida das clulas normais e metastticas da prstata

    era de 122 horas e 123 horas, respetivamente.

    A percentagem de proliferao das clulas normais da prstata baixa, contudo,

    suficiente para contrabalanar a baixa percentagem de morte celular espontnea. As

    clulas da prstata apresentam um Tt de 50079 dias, contudo, quando as clulas da

    prstata entram numa fase inicial de carcinognese, ocorre um aumento de 6.9 vezes

    o valor normal de Kp, e com um aumento de 4 vezes o valor de Kd, levando assim

    acumulao diria de um excesso de 0.450.11% de clulas. Assim, o tempo de

    duplicao destas clulas da prstata num processo inicial de carcinognese de

    15422 dias. Os resultados do estudo de Berges et al. 1995 tambm demostraram que

    o valor Kp das clulas metastticas da prstata 10.7 vezes superior comparado com

    as clulas normais e o valor de Kd unicamente 3.8 vezes superior ao das clulas

    normais, levando a uma taxa de crescimento celular adicional das clulas metastticas

    de 1.280.23%. Este crescimento celular adicional das clulas metastticas no tecido

    sseo traduz-se num tempo de duplicao de 545 dias, consultar Tabela 3. [REF

    Berges et al. 1995]

  • Tabela 3: Principais parmetros da cintica das clulas da prstata (adaptado Berges 1995)

    Tipo celular Kp (%) Kd (%) Tempo de

    duplicao (dias) Clulas epiteliais

    da prstata 0.190.03 0.200.03 50079

    Clulas de elevado valor neoplstico 1.250.30 0.800.24 15422

    Clulas metastticas da prstata no osso

    2.040.29 0.790.16 545

    Na Figura 13 possvel observar diferenas na morfologia das clulas normais da

    prstata e alguns tipos de clulas carcinognicas da prstata. Nas imagens A, C e E, so

    detetadas clulas da prstata no ciclo celular proliferativo, por seu lado, as imagens B,

    D e F demonstram clulas da prstata a iniciar o processo de apoptose. Na imagem A

    apresentado tecido glandular da prstata normal, nas imagens C e D apresenta-se

    clulas de um tumor da prstata primrio e na imagem F apresenta-se clulas

    metastticas da prstata no osso.

  • Figura 15: Imagens histolgicas de clulas normais da prstata e clulas metastticas da prstata em diferentes estdios de desenvolvimento (Berges et al., 1995)

    3.4 Principais Mtodos de Deteo e Tratamento

    de Metstases sseas

    As clulas tumorais alojadas no osso causam uma dupla reao: a destruio ssea

    (aumento da atividade osteoclstica) e a formao ssea (aumento da atividade

    osteoblstica). A formao ssea tem por objetivo a reparao da leso, no entanto, o

    novo tecido sseo no possui a resistncia do osso lamelar normal, nem a avidez por

    determinadas molculas, tais como os bifosfonatos. Por outro lado, as clulas tumorais

    libertam substncias que ativam os osteoclastos, o que resulta num enfraquecimento

    do tecido sseo, criando assim uma leso designada por osteoltica ou ltica. Em

    contrapartida, por vezes, as clulas tumorais libertam substncias que promovem a

  • formao ssea, produzindo reas de osso mais duro, sendo ento designadas por

    leses osteoblsticas ou blsticas.

    3.4.1 Sinas e Sintomas das Metstases sseas

    Vrios sintomas e sinais esto associados presena de metstases sseas. Abaixo so

    apresentados os principais sintomas e sinais envolvidos nesta patologia.

    Dor ssea

    Clinicamente a dor ssea o mais importante sintoma associado a metstases sseas,

    podendo apresentar diferentes intensidades conforme o estdio de progresso da

    patologia. Estima-se que a dor ssea atinge cerca de 30% dos doentes em fases iniciais

    da patologia, podendo chegar aos 60-90% nas fases terminais da doena (Bodei et al.,

    2008). Geralmente a dor ssea o primeiro sintoma quando cancro atinge o osso.

    Inicialmente a dor intermitente, tornando-se mais regular e intensa medida que o

    estado da doena avana.

    Fraturas

    O enfraquecimento dos ossos devido s metstases pode levar fratura dos mesmos.

    As fraturas podem acontecer devido a uma queda ou mesmo durante uma atividade

    diria normal. Os locais mais comuns para ocorrem as fraturas so os ossos longos e os

    ossos da coluna vertebral.

    Compresso da medula ssea

    O crescimento da metstase ssea localizada na coluna vertebral pode resultar em

    compresso da medula ssea. Dado que a medula ssea contm vrios nervos e

    terminais nervosos que coordenam os movimentos e a capacidade sensorial do corpo,

    a compresso medular no s causa dor, como tambm pode lesar, enfraquecer ou

    conduzir perda de nervos e terminais nervosos, podendo mesmo resultar em

    paralisia de uma ou mais regies do corpo.

    Hipercalcemia

  • Quando o cancro atinge o tecido sseo, o clcio presente no osso libertado para a

    corrente sangunea, levando assim a um aumento da concentrao de clcio no

    sangue, que pode causar nuseas, perda de apetite e sede extrema. Os elevados nveis

    de clcio tambm provocam o aumento da necessidade de urinar, podendo resultar

    numa possvel desidratao.

    3.4.2 Mtodos de Deteo das Metstases sseas

    Existem muitas tcnicas de imagem que possibilitam a deteo de metstases sseas,

    das quais se destacam a cintigrafia ssea, radiografias e tcnicas tomogrficas de

    emisso ou transmisso. Os mtodos mais comumente utilizados so a cintigrafia

    ssea e a radiografia. A primeira tem maior sensibilidade, dado que deteta danos

    funcionais em vez de danos estruturais, pelo que consegue detetar as leses sseas

    mais precocemente. No entanto, esta tcnica baseia-se na distribuio e captao

    ssea do radiofrmaco, o qual se concentra no s na matriz ssea saudvel, mas

    tambm em reas de nova formao ssea normal, bem como nas metstases sseas.

    Consequentemente, as imagens cintigrficas devem ser devidamente analisadas e a

    idade do doente considerada, pois doentes cuja matriz ssea no esteja totalmente

    calcificada podem apresentar reas de captao anormal que coincidem com reas de

    formao ssea nova e no reas de metstases.

    Radiografia ssea

    Geralmente a radiografia 2D o primeiro exame realizado por um paciente com

    cancro quando este tem dores sseas ou outro sintoma associado s metstases

    sseas. Quando as leses provocadas so leses lticas, isto , as clulas cancerosas

    dissolvem o osso, estas alteraes aparecem no exame como zonas escuras na

    imagem. Por outro lado, as metstases blsticas, que causam o aparecimento de zonas

    densas, aparecem na imagem como zonas claras em relao ao osso envolvente.

    Cintigrafia e Tomografia de Emisso de Foto Simples (SPECT) ssea

  • Para a realizao deste exame, um radiofrmaco injetado por via endovenosa e

    subsequentemente captado pela matriz ssea. Aps a injeo, vrias imagens so

    adquiridas numa gama-camara e posteriormente analisadas para deteo de reas de

    captao ssea anmala. Este exame til porque possibilita a visualizao de todo o

    esqueleto, pelo que, por vezes deteta metstases sseas que ainda no provocam

    sintomas. As reas de atividade ssea aumentada, aparecem como hot spots no

    esqueleto, podendo indicar a presena de cancro ou outra doena ssea. A

    confirmao de metstase ssea pode ser realizada por via da realizao de biopsias. A

    deteo de leses lticas sseas por via de cintigrafia ssea pode exigir a aplicao da

    tcnica de imagem tomografia de emisso de foto simples (SPECT), em vez da

    imagem planar de corpo inteiro, dado que estas podem ser mais difceis de detetar na

    imagem planar que as leses blsticas.

    Tomografia Computorizada (CT)

    O exame de Tomografia Computorizada (CT) caracteriza-se pela aquisio de imagens

    recolhidas em vrios ngulos em torno da parte anatmica em estudo, obtidas pela

    rotao de 360 de uma ampola de raios-X. O computador combina as imagens

    recolhidas numa imagem tridimensional, que pode subsequentemente ser secionada e

    interpretada pelo mdico. Este tipo de exame importante na avaliao do tamanho e

    forma da metstase ssea, bem como no estudo da estabilidade do osso que contm a

    metstase.

    Ressonncia Magntica (MR)

    O exame de Ressonncia Magntica (MR) usa campos eletromagnticos elevados para

    adquirir imagens de uma rea anatmica de interesse, em vez de radiao ionizante.

    Essencialmente, esta tcnica determina as propriedades de um determinado tecido

    com base nos nveis de energia rotacionais dos diferentes ncleos presentes nos

    tecidos em estudo, pela magnetizao e subsequente desmagnetizao dos mesmos.

    Este exame muito utilizado para avaliao de suspeita de compresso da medula

    espinhal induzida pela metstase ssea.

    Tomografia de Emisso de Positres (PET)

  • Para a realizao de um exame de Tomografia de Emisso de Positres (PET), um

    radiofrmaco injetado por via endovenosa e imagens tridimensionais so adquiridas

    de todo o corpo ou de uma rea anatmica de interesse, utilizando uma camara PET.

    No contexto de pesquisa de metstases sseas, duas abordagens so frequentemente

    utilizadas: (1) administrao de 18F-FDG (18F-Fluodeoxiglucose) para avaliao da

    proliferao e metabolismo da leso ssea; e (2) administrao de 18F-cloreto para

    estudo da matriz ssea. A elevada sensibilidade das imagens PET permite a deteo

    mais precoce de metstases sseas, comparado com outras tcnicas de imagem

    anatmica, tais como radiografia, CT e MR.

    Exames ao sangue

    Quando um cancro atinge o osso, pode causar a libertao de algumas substncias na

    corrente sangunea que podem ser detetadas atravs de exames sanguneos de rotina.

    Por exemplo, a presena de metstases sseas leva a um aumento dos nveis de clcio

    no sangue, bem como aumento da concentrao de fosfatase alcalina. Para alm disso,

    alguns tipos de cancros libertam substncias designadas por marcadores tumorais na

    corrente sangunea, pelo que, um aumento na concentrao destes marcadores pode

    indicar que o cancro se disseminou para reas secundrias ao tumor primrio.

    Biopsia

    A confirmao de tecido metasttico frequentemente conseguida por via de exames

    histopatolgicos, nomeadamente atravs da recolha e anlise de uma amostra de

    tecido por recurso biopsia.

    3.4.3 Tratamento

    Atualmente, a maioria dos tumores metastticos no tem cura, porm existem

    tratamentos alternativos cujo principal objetivo o controlo do desenvolvimento do

    cancro e o alvio dos sintomas provocados por este atravs de cuidados paliativos. A

    teraputica paliativa centrada no controlo sintomtico e preservao da qualidade

    de vida do doente, no sendo portanto uma terapia com objetivo de cura. Assim, os

  • principais objetivos dos tratamentos paliativos so: alvio da dor, manuteno da

    funo ssea e controlo do crescimento tumoral local tanto quando possvel. O

    tratamento paliativo tem duas vertentes principais: analgesia e estabilizao. A

    analgesia pode ser conseguida pelo uso de, por exemplo, anti-inflamatrios no

    esteroides, analgsicos potentes (morfina) e tratamentos que diminuam a reabsoro

    ssea, tais como os bifosfanatos ou radioterapia local. Por outro lado, a estabilizao

    da patologia pode ser conseguida atravs da estabilizao de fraturas, cirurgia e

    monitorizao dos ossos em risco. A escolha do tratamento das metstases sseas

    depende de inmeros fatores, tais como, tipo de cancro, nmero e locais dos ossos

    afetados, fragilidade dos ossos ou presena de fraturas, historial clnico do doente e

    idade e condio de sade geral do doente. Tipicamente, os tumores metastticos so

    tratados com terapias sistmicas (por exemplo, quimioterapia, radioterapia interna e

    terapia hormonal), terapia local (por exemplo, cirurgia e radioterapia externa

    localizada) ou uma combinao de vrios tratamentos.

    3.4.3.1 Tratamento Sistmico

    Em muitos casos, especialmente quando o cancro se disseminou para muitos ossos, os

    tratamentos sistmicos so o mtodo de tratamento preferido, pois conseguem atingir

    as clulas carcinognicas espalhadas por todo o corpo. Abaixo so apresentados os

    principais mtodos de tratamento sistmico de metstases sseas.

    Quimioterapia

    Utiliza frmacos anticancerosos que entram na corrente s