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Autismo Projeto Integrar: Um aplicativo móvel para inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista Maico Krause 1 , Levi de Oliveira Cacau 2 , Macilon Araújo Costa Neto 3 1 Especialização em Tecnologias da Informação e Comunicação 2 Núcleo de Tecnologia da Informação 3 Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas Universidade Federal do Acre – Rio Branco – Acre – Brasil {maicokrause,levicacau}@gmail.com, [email protected] Abstract. The use of assistive technologies has been configured as an important tool for personal and educational use, and progressively contributed to the pedagogical framework for the inclusion of people with special needs. This work aims to assess the needs of people with autism spectrum disorder face in their daily activities in order to develop an application for mobile devices that, through scripted sketches, can stimulate communication, autonomy and understanding of situations experienced by them. Resumo. O uso das tecnologias assistivas tem se configurado como uma importante ferramenta para uso pessoal e educacional, além disso, tem contribuído progressivamente no âmbito pedagógico para a inclusão de pessoas com necessidades especiais. Este trabalho tem o objetivo de levantar as necessidades de pessoas com Transtorno do Espectro Autista em realizar suas atividades cotidianas e desenvolver um aplicativo para dispositivos móveis que, através de desenhos roteirizados, possa estimular a comunicação, autonomia e a compreensão das situações vivenciadas por eles. 1. Introdução O avanço das tecnologias móveis, como smartphones e tablets, tem facilitado o cotidiano de um grande número de pessoas. O número cada vez maior de sensores, câmeras e crescente poder de processamento e armazenamento, entre outras características presentes nestes dispositivos, proporcionam o acesso à informação de forma rápida, flexível, em tempo real e a partir de qualquer lugar. Essa configuração nos permite vislumbrar que estes dispositivos se tornem um recurso eficaz no atendimento das necessidades específicas das pessoas com transtornos, ou déficits, como no caso do Transtorno Espectro Autista (TEA) (FERNANDES et al, 2014), um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento que atinge entre 0,7% e 1% da população, sendo que esse percentual tende a crescer devido a maior divulgação do TEA, identificação precoce e crescente conscientização e habilidade de diagnóstico por parte da comunidade médica (BANDIM, 2010, apud SANTOS et al, 2014). Dessa forma, essa pesquisa parte da hipótese de que as tecnologias móveis podem ser utilizadas no enfrentamento e superação das dificuldades encontradas no

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Autismo Projeto Integrar: Um aplicativo móvel para inclusão de crianças com Transtorno do Espectro Autista

Maico Krause1, Levi de Oliveira Cacau2, Macilon Araújo Costa Neto3 1 Especialização em Tecnologias da Informação e Comunicação

2 Núcleo de Tecnologia da Informação 3 Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas

Universidade Federal do Acre – Rio Branco – Acre – Brasil {maicokrause,levicacau}@gmail.com, [email protected]

Abstract. The use of assistive technologies has been configured as an important tool for personal and educational use, and progressively contributed to the pedagogical framework for the inclusion of people with special needs. This work aims to assess the needs of people with autism spectrum disorder face in their daily activities in order to develop an application for mobile devices that, through scripted sketches, can stimulate communication, autonomy and understanding of situations experienced by them.

Resumo. O uso das tecnologias assistivas tem se configurado como uma importante ferramenta para uso pessoal e educacional, além disso, tem contribuído progressivamente no âmbito pedagógico para a inclusão de pessoas com necessidades especiais. Este trabalho tem o objetivo de levantar as necessidades de pessoas com Transtorno do Espectro Autista em realizar suas atividades cotidianas e desenvolver um aplicativo para dispositivos móveis que, através de desenhos roteirizados, possa estimular a comunicação, autonomia e a compreensão das situações vivenciadas por eles.

1. Introdução O avanço das tecnologias móveis, como smartphones e tablets, tem facilitado o

cotidiano de um grande número de pessoas. O número cada vez maior de sensores, câmeras e crescente poder de processamento e armazenamento, entre outras características presentes nestes dispositivos, proporcionam o acesso à informação de forma rápida, flexível, em tempo real e a partir de qualquer lugar. Essa configuração nos permite vislumbrar que estes dispositivos se tornem um recurso eficaz no atendimento das necessidades específicas das pessoas com transtornos, ou déficits, como no caso do Transtorno Espectro Autista (TEA) (FERNANDES et al , 2014), um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento que atinge entre 0,7% e 1% da população, sendo que esse percentual tende a crescer devido a maior divulgação do TEA, identificação precoce e crescente conscientização e habilidade de diagnóstico por parte da comunidade médica (BANDIM, 2010, apud SANTOS et al , 2014).

Dessa forma, essa pesquisa parte da hipótese de que as tecnologias móveis podem ser utilizadas no enfrentamento e superação das dificuldades encontradas no

cotidiano de pessoas no espectro autista, colaborando para melhorias na qualidade de vida, bem como na inclusão dessas pessoas na sociedade.

Diante de tudo isso, este trabalho visa melhorar a interação social de pessoas com TEA por meio do uso de dispositivos móveis. Para isso, é proposto o desenvolvimento de um aplicativo que permita organizar as tarefas e atividades cotidianas desempenhadas por indivíduos com TEA através de desenhos roteirizados com a finalidade de estimular a comunicação, autonomia e compreensão das situações vivenciadas pelos indivíduos autistas.

Antecedendo esse desenvolvimento, foram realizados estudos sobre o tema a fim de se estabelecer requisitos do aplicativo, nestes estudos foram envolvidas três escolas que acolhem autistas na cidade de Rio Branco-AC, sendo duas de ensino especial e uma de ensino regular, onde foram feitas entrevistas com gestores e professores, bem como aplicação de questionários a fim de identificar as necessidades vivenciadas pelos educandos autistas. Posteriormente, o aplicativo foi testado pelos professores e foi feita uma avaliação de usabilidade do sistema através do método System Usability Scale (SUS) (BROOKE, 1996), demonstrando que aplicativo oferece uma boa experiência de usabilidade.

2. Fundamentos Nesta seção serão apresentados alguns conceitos utilizados como base para a construção deste trabalho, como Transtorno do Espectro Autista e o site Autismo Projeto Integrar.

2.1 Transtorno do Espectro Autista

De acordo com a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM V), o Transtorno do Espectro Autista é definido pela presença de “déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, atualmente ou por história prévia” (APA, 2014, p.31). As dificuldades relacionadas à comunicação social e interação social são manifestadas como déficits na reciprocidade socioemocional, nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação social e déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos.

O DSM V também indica que indivíduos autistas possuem “padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades” (APA, 2014, p.31), manifestados por movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos, insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal, interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco, hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente.

2.2. Site Autismo Projeto Integrar

O Autismo Projeto Integrar (GODOY; GIANVECHIO, 2014) é um blog idealizado pelo casal Adriana Godoy e Neimer Gianvechio, pais de uma criança com TEA. No blog, é utilizada uma técnica de Comunicação Alternativa (CA) conhecida como “História Social”, na qual desenhos roteirizados são utilizados como ferramenta de apoio visual a

fim de estabelecer uma comunicação estruturada com pessoas com TEA e ajudá-las a serem capazes de interpretar melhor algumas situações, ações e momentos do cotidiano.

Os idealizadores do blog entendem que o apoio visual ajuda o autista a se organizar, a memorizar e interpretar nossas ações, gerando capacidade e ampliando as habilidades, autonomia e interpretação das situações que o autista vive.

3. Método de Pesquisa Para resolver o problema em questão foram seguidas as seguintes etapas: levantamento do referencial teórico e pesquisa sobre o assunto em questão, levantamento de requisitos, desenvolvimento do aplicativo e avaliação do mesmo como solução para o problema estudado, cuja representação é feita na Figura 1.

Figura 1. Método da pesquisa.

3.1. Seleção e caracterização da amostra

O público-alvo selecionado para a coleta de dados é composto por gestores, professores e terapeutas de alunos com TEA. Assim, foi realizado um levantamento e, posteriormente, visitas à escolas que possuem alunos com TEA em Rio Branco-AC.

De acordo com o levantamento, foi constatado que os alunos com TEA estão incluídos em classe regulares e que, de acordo com o Decreto Nº 6.571 de 2008 (BRASIL, 2008), podem estar matriculados em quaisquer escolas e que os centros de ensino especiais conduziam trabalhos de suporte a esses colégios. Dessa forma foram selecionados a Associação de Pais e Amigos Excepcionais - APAE e Centro de Ensino Especial Dom Bosco - CEEDB, por serem os centros de referência no atendimento de alunos com deficiência, também foi selecionado a Escola Francisco Salgado Filho para representar um dos colégios de ensino regular situados em Rio Branco. Também foram selecionados os professores e psicólogos que trabalhavam diretamente com crianças com TEA nessas instituições.

A APAE possui 293 alunos matriculados, todos com necessidades especiais, destes 23 são autistas, o Centro de Ensino Especial Dom Bosco possui 267 alunos matriculados, todos com necessidades especiais, destes 11 são autistas. Já a Escola Francisco Salgado Filho possui 526 alunos matriculados, sendo 14 com necessidades especiais e 5 autistas conforme a Tabela 1 abaixo.

Tabela 1. Alunos matriculados nas escolas.

APAE Dom Bosco Salgado Filho Total Alunos Especiais 270 256 14 540 Alunos Autistas 23 11 5 39 Alunos Matriculados 293 267 526 1076

Na Tabela 2, verifica-se que a APAE possui uma diversidade maior de profissionais para atender os alunos com necessidades com deficiência, contando com profissionais específicos para atendê-los, enquanto a Escola Francisco Salgado Filho possui um psicólogo e 3 psicopedagogos, porém o Centro de Ensino Especial Dom Bosco possui um déficit de profissionais mais especializados, tendo que recorrer ao encaminhamento para consultórios externos a fim de realizar seus atendimentos.

Tabela 2. Profissionais que atuam nas escolas.

APAE Dom Bosco Salgado Filho Total Psicólogos 2 0 1 3

Pedagogos 20 9 24 53

Psicopedagogos 5 0 3 8

Fonoaudiólogos 1 0 0 1

Total de funcionários 75 99 53 227

A faixa etária dos alunos autistas nos colégios estudados, em sua grande maioria está compreendida entre 4 e 10 anos de idade, dessa forma o foco do desenvolvimento do aplicativo foi voltado para esta faixa etária, delimitando assim requisitos não-funcionais, relacionados a interface gráfica mais atrativa para crianças e efeitos sonoros atrativos para estimular a interação com o aplicativo.

3.2. Instrumentos da pesquisa

Os instrumentos de pesquisa adotados para a coleta de informações foram: entrevistas e questionários, onde foram elaboradas questões destinadas ao levantamento de requisitos para a construção do aplicativo. As entrevistas foram elaboradas de forma a coletar informações mais abrangentes e o Questionário de levantamento de requisitos aos professores e terapeutas foi aplicado para abordar os pontos mais específicos. Um questionário específico para os gestores também foi aplicado, a fim de coletar informações estatísticas da instituição atingida pela pesquisa.

3.3. Identificação das necessidades e estabelecimento dos requisitos

Para realizar o projeto do aplicativo e o seu desenvolvimento, fez-se necessário realizar uma coleta de requisitos nas instituições de ensino abordadas na seção 3.1, onde os instrumentos de pesquisa elaborados foram aplicados. As necessidades coletadas serão abordadas nas subseções a seguir.

3.3.1. Coleta de dados para os requisitos

A coleta de dados foi realizada em três etapas. A primeira foi o através de levantamento de material bibliográfico com a finalidade de instrumentalizar as outras etapas da pesquisa, como por exemplo, a construção dos questionários.

A segunda etapa ocorreu com a pesquisa de campo, através de questionários, que foram direcionados aos gestores das escolas selecionadas, no intuito de obter um diagnóstico inicial, posteriormente foi dada continuidade a coleta de requisitos para o desenvolvimento do aplicativo, através da aplicação de questionários para professores e psicopedagogos que trabalham com pessoas autistas. A todos foi explicado o motivo da pesquisa e aqueles que aceitaram, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

A terceira etapa foi obter a permissão para a utilização, sem fins lucrativos e citadas as fontes, das imagens de desenhos roteirizados contidas no site Autismo Projeto Integrar, para a construção de um aplicativo voltado para o público de crianças com TEA, pois percebeu-se que estas imagens estavam dentro da perspectiva proposta neste trabalho. Nesta etapa também foram pesquisados arquivos de áudio e imagem com licença de uso Creative Commons , que permitem a utilização de conteúdos digitais, desde que citadas as fontes.

3.3.2. Análise dos dados

Após a coleta dos questionários, os dados obtidos foram tabulados e a análise destes foi feita de forma quantitativa. Os pontos de maior destaque foram transformados em requisitos para o desenvolvimento do aplicativo. As entrevistas foram analisadas de forma qualitativa e delas foram extraídos principalmente requisitos não funcionais, como por exemplo, a usabilidade e a forma de apresentação do conteúdo na tela, que não foram abordados nos questionários, dada sua subjetividade.

Foram aplicados questionários a 20 professores das escolas APAE, Centro de Ensino Especial Dom Bosco e Francisco Salgado Filho. Estes profissionais possuem, em média, 8 anos de experiência no trabalho com autistas. Destes, 80% possui título de pós-graduação em nível de especialização, e 20% não possui título de pós-graduação, sendo Educação Inclusiva e Atendimento Educacional Especializado os cursos de especialização com mais ocorrências entre os profissionais que trabalham diretamente com os alunos autistas.

Foram questionadas aos professores quais as áreas as pessoas com autismo apresentam maior dificuldade de compreensão e observou-se que o maior índice de respostas foram para os quesitos manter a atenção nas atividades , comunicação verbal e interações sociais , cada um com 18 ocorrências. Seguido de execução das atividades diárias , com 16 ocorrências. O quesito brincar de faz de conta foi citado 8 vezes, comunicação não verbal 3 vezes e psicomotricidade 2 vezes.

Foram analisadas quais a principais dificuldades enfrentadas pelos alunos com TEA em suas atividades diárias, nesse sentido, observou-se que a orientação tempoespacial é a maior dificuldade encontrada, com 17 ocorrências, seguida de hábitos de higiene , com 14 ocorrências, e alimentar-se , com 6 ocorrências.

Também foram levantados quesitos relacionados às principais dificuldades dos professores na interação com as crianças no espectro autista e observou-se que a principal dificuldade é encontrar recursos pedagógicos para o processo de ensino-aprendizagem, com 15 ocorrências.

Considerando que é necessário certo conhecimento no uso aplicativos para smartphones e tablets , foi investigado se os participantes já haviam utilizado algum recurso pedagógico das novas tecnologias. Assim, 9 participantes responderam que utilizam estes recursos, dos quais, 6 participantes relataram que utilizam computadores ou notebooks e 1 participante afirmou utilizar tablets . Os participantes que responderam que não utilizam as novas tecnologias justificaram dizendo que há muita dificuldade para obter acesso a esses recursos.

Os participantes também informaram que os alunos autistas demonstram interesse por jogos e que, de acordo com as diretrizes pedagógicas, deve-se trabalhar com aquilo que eles demonstram interesse. Segundo eles, os recursos das novas tecnologias são bem indicados para realizar trabalhos que promovam a interação, concentração e divertimento.

Na análise referente às características dos recursos pedagógicos que mais facilitam o aprendizado, os professores afirmaram que os estímulos visuais e a repetição e memorização são as mais importantes no processo ensino-aprendizagem, seguidas por estímulos sonoros , estímulos táteis e comandos de voz .

3.3.3. Diagnóstico Inicial

Após o levantamento de informações, foi identificado que os professores e terapeutas encontram certa dificuldade em obter materiais pedagógicos voltados para crianças com TEA e que esses materiais são de grande importância para o processo de ensino-aprendizagem destes alunos.

Em face à problemática identificada e à hipótese desta pesquisa, acredita-se que é possível prover uma ferramenta educacional parar indivíduos com TEA através da construção de um aplicativo para dispositivos móveis.

3.4. Desenvolvimento do aplicativo

Os requisitos coletados e analisados na fase da investigação das necessidades foram transformados em requisitos funcionais e não funcionais, bem como serviram de base para a elaboração da interface gráfica do aplicativo, esses tópicos serão abordados nas subseções a seguir.

3.4.1 Modelagem do Aplicativo

Após a análise dos requisitos, foi realizada a modelagem do aplicativo, onde foi elaborado um diagrama de classes, Figura 2, que demonstra as entidades e os relacionamentos entre elas. Neste diagrama, temos a entidade Agenda, que possui vários Compromissos, e cada compromisso possui uma Tarefa.

Figura 2. Diagrama de classes.

Para um melhor entendimento das funcionalidades que o aplicativo deverá prover, foi elaborado um diagrama de casos de uso, Figura 3. Nesse diagrama, podemos verificar que o ator Pais , que representa os pais das crianças com TEA, poderá realizar as ações de Gerenciar Agenda , Gerenciar Tarefa , Visualizar Tarefa e Visualizar Agenda . O ator Criança poderá executar as ações de Visualizar Tarefa e Visualizar Agenda .

Figura 3. Diagrama de casos de uso.

3.4.2. Elaboração e validação dos protótipos do aplicativo

Paralelamente a fase de modelagem do aplicativo, foi utilizada a técnica de prototipagem em papel, para definir os requisitos iniciais da interface e a produção de um protótipo de baixa fidelidade. Em seguida, esses desenhos foram refeitos em softwares de edição de imagem e foram produzidas várias imagens representando a as telas da interface gráfica do aplicativo e produzindo elementos para a construção de um protótipo de média fidelidade.

O protótipo foi construído e testado pela equipe de desenvolvimento através do aplicativo POP - Prototype On Paper , para Android, que permite a simulação de protótipos através da inserção de imagens que representam as telas do aplicativo e, nas regiões que representam os botões nessas imagens, a criação de links que as interligam. Assim é possível ter uma experiência próxima à da utilização do produto final e simular os elementos de interface e arquitetura da informação e o fluxo de telas.

A validação do protótipo ocorreu em reuniões com professores do Centro de Ensino Especial Dom Bosco e da APAE de Rio Branco, após a etapa de levantamento de requisitos.

3.4.3. Implementação do aplicativo e ferramentas utilizadas

A implementação do aplicativo foi feita na linguagem Java, utilizando a IDE Android Studio. Essa IDE fornece toda a estrutura necessária para a construção de aplicativos para dispositivos com sistema operacional Android, nesta etapa todos os requisitos levantados nas fases anteriores, foram desenvolvidos.

Para a criação das tarefas, foram utilizadas as imagens disponibilizadas no blog Autismo Projeto Integrar . Os áudios utilizados na narração das tarefas foram gravados em estúdio pela idealizadora do blog Autismo Projeto Integrar, Adriana Godoy, e os efeitos sonoros e sons de fundo foram obtidos sob a licença Creative Commons . Por razões de desempenho e economia de recursos computacionais, tanto as imagens quanto os áudios foram tratados digitalmente para reduzir o consumo de memória e obter melhor desempenho do aplicativo, considerando o tipo de dispositivo e o tamanho da tela.

Durante a fase de desenvolvimento, foram conduzidos testes funcionais do aplicativo em cada fase do desenvolvimento. Esses testes foram realizados através do software Genymotion, um emulador de dispositivos móveis, além de diferentes modelos de smartphones e tablets .

3.5. Abordagem Proposta

Como proposta de solução para o problema abordado por este trabalho, foi desenvolvido o aplicativo Autismo Projeto Integrar, disponível gratuitamente na loja Play Store para smartphones e tablet com sistema operacional Android. Esse aplicativo tem por finalidade ser uma ferramenta educacional que possa auxiliar pais e professores no processo de ensino-aprendizagem de crianças com TEA e possa estimular a comunicação, autonomia e a inclusão de pessoas com esse transtorno.

O aplicativo, em sua tela inicial, Figura 4, apresenta duas opções: começar, destinada a utilização do aplicativo pelo autista e leva ao menu principal, Figura 5, e a opção de configurar o aplicativo, destinada aos pais ou educadores. No menu principal, o aluno tem 3 opções de atividades: Comportamento, Higiene/Banheiro e Meus Compromissos .

Figura 4. Tela inicial.

Figura 5. Menu principal.

As opções Comportamento e Higiene/Banheiro agrupam rotinas que não possuem exatamente um horário para acontecer, como por exemplo, alguns comportamentos sociais esperados e a utilização do banheiro, e já estão previamente cadastradas no aplicativo.

A tela Meus Compromissos , Figura 6, descreve as atividades que o aluno realizará ou realizou durante o dia, ajudando-o a organizar os eventos que ocorrerão em seu dia a dia e estabelecendo parâmetros para ajudá-lo a entender o conceito de tempo. Estas tarefas precisam ser previamente cadastradas pelos pais ou professores na opção de configuração da tela inicial.

Esta tela é composta por uma tabela contendo duas colunas: FAZER e FEITO . Na primeira coluna, serão dispostos ícones representando as atividades que o aluno deverá realizar durante o dia e a segunda coluna as atividades que já foram feitas, assim que a atividade for concluída, o ícone da atividade que estava na coluna FAZER vai para a coluna FEITO e uma estrela acenderá ao lado da atividade realizada.

A passagem do tempo também pode ser destacada com alguns elementos visuais na interface, como:

➢ As atividades são agrupadas por período: manhã, tarde e noite, com um texto com cores características ao lado dos ícones das atividades.

➢ Uma indicação textual do dia da semana e do ano, para que se possa navegar entre os dias ou ver a agenda semanal e mostrar os eventos futuros.

➢ Se o aluno arrastar a tela para os lados ou tocar sobre as setas laterais, será possível exibir para consulta as tarefas cadastradas para os próximos dias ou consultar o que foi feito nos dias anteriores, dando as ideias de “Amanhã” e “Ontem”.

Quando o aluno tocar sobre um ícone representando uma atividade deve abrir a tela Detalhe da Tarefa , Figura 7, que descreve detalhadamente aquela atividade. Essa tela irá apresentar as imagens roteirizadas de cada atividade. As imagens serão exibidas em um slideshow , onde o aluno terá que utilizar o movimento de arrastar as imagens para o lado para visualizar ou tocar nas setas anterior ou posterior.

Ao final da atividade, são exibidos na tela uma estrela grande, efeitos sonoros alegres e frases parabenizando o aluno. Estes efeitos representam reforços positivos à criança autista no intuito de motivá-la e incentivar que conclua novas tarefas.

Figura 6. Tela “Meus compromissos”.

Figura 7. Tela "Detalhe da tarefa”.

Após a finalizar, caso a tarefa esteja no mural Meus Compromissos , esta passará do lado FAZER para o lado FEITO , e acenderá a estrela correspondente àquela tarefa. Em todas as figuras da tela Atividade Detalhe são reproduzidos sons narrando a ação representada pela figura e o texto dessa fala. Essas características são opcionais e ajustáveis no menu de configurações, de acordo com a orientação dos professores ou terapeutas da criança.

A agenda semanal pode ser configurada no menu de configurações. O responsável pela criança autista seleciona um dia na agenda e tem um menu onde pode escolher uma atividade, seu horário e os dias em que ela se repete. As atividades

inseridas nesta tela irão aparecer, em seu respectivo dia e ordenadas pelo horário, na tela Meus Compromissos .

3.6. Avaliação de usabilidade e aceitação do aplicativo

Foram realizados testes com os professores das instituições selecionadas a fim de verificar se o aplicativo desenvolvido tem um nível aceitável de usabilidade e se poderá ser utilizado como ferramenta educacional para auxiliar as crianças com TEA.

Utilizou-se o método System Usability Scale (SUS) para avaliar o nível de usabilidade do aplicativo, esse método foi elaborado por John Brooke, e pode ser aplicado para avaliar qualquer tipo de interface com o usuário, seja ela um hardware , website , produtos, etc., os critérios do SUS avaliam efetividade, eficiência e satisfação. É recomendável que o método seja aplicado após a execução de algumas tarefas no sistema. As tarefas foram elaboradas a fim de atingir as funcionalidades principais do aplicativo, totalizando 5 tarefas (BROOKE, 1996).

Sabendo das peculiaridades do TEA e das dificuldades impostas àqueles que possuem esse transtorno, como por exemplo as limitações em se comunicar e em relacionar-se com outras pessoas, principalmente aquelas fora de seu convívio diário, onde a equipe de pesquisadores deste trabalho se encaixa; bem como as características do método SUS, que exigem que o usuário repita uma série de tarefas e depois responda à um questionário, os testes foram conduzidos somente com os professores e terapeutas das instituições selecionadas.

Os professores selecionados para a avaliação do aplicativo pelo método SUS foram divididos em grupos de 4 pessoas, para que houvesse maior organização. A avaliação foi executada em três etapas: apresentação do aplicativo, execução de tarefas no aplicativo e avaliação do aplicativo com base no método SUS.

Primeiramente, foi apresentado o aplicativo, demonstradas suas funcionalidades e o passo a passo de como executar o cadastro de tarefas. Após realizar essa apresentação aos professores, foi feita a instalação do aplicativo nos smartphones e tablets dos testadores para que eles pudessem explorar suas funcionalidades. Em seguida, foram distribuídas as 5 tarefas para serem realizadas no aplicativo. Essas tarefas consistiam em: cadastrar uma atividade qualquer , alterar o horário de uma atividade previamente cadastrada , excluir uma atividade previamente cadastrada , visualizar uma tarefa do grupo “higiene ” e visualizar uma tarefa do painel “Meus Compromissos” .

Ao completar as tarefas, os professores responderam os questionários do SUS para avaliar o aplicativo. Este questionário consiste de 10 afirmações, às quais os entrevistados deveriam avaliar, assinalando com um “X”, a alternativa que representa seu grau concordância com cada afirmação: concordo plenamente , concordo parcialmente , neutro , discordo parcialmente e discordo plenamente .

3.6.1. Resultados

Durante as entrevistas com os pais e professores de crianças autistas, identificamos alguns benefícios que o uso do aplicativo Autismo Projeto Integrar pode trazer, tanto às crianças quanto para quem convive com elas. Entre os benefícios, podemos citar a

facilidade em ter diversos desenhos roteirizados reunidos em um dispositivo móvel, sempre acessível e com maior mobilidade em relação ao uso de cartões impressos.

Com o aplicativo desenvolvido, espera-se que o aluno autista consiga obter alguns benefícios através da repetição e memorização dos estímulos visuais e auditivos e seja capaz de internalizar suas tarefas diárias, reduzindo sua ansiedade perante o que fazer ou como se comportar, obtendo maior autonomia ao inserir-se no meio social.

Foi realizada uma avaliação de usabilidade com o objetivo de verificar se o aplicativo desenvolvido neste trabalho está em um nível aceitável de usabilidade para ser disponibilizado aos pais e professores. A avaliação foi aplicada através da técnica SUS, na qual os participantes puderam expressar seu ponto de vista em relação à satisfação e usabilidade de software através de um questionário com apenas 10 questões relacionadas. Após a contabilização das respostas do questionário, obteve-se a pontuação de 79,42, onde o nível de variação da pontuação do método é de 0 a 100, dessa forma a pontuação obtida mostra que a atual interface do aplicativo oferece uma boa experiência de usabilidade e satisfação do usuário.

4. Conclusões A utilização de dispositivos móveis no dia-a-dia das pessoas está cada vez mais presente, permitindo o acesso rápido e fácil a um universo de coisas, como redes sociais, notícias, bate papos, etc. Este trabalho explorou essa nova tendência, buscando melhorar a interação social dos indivíduos com Transtorno do Espectro Autista.

Após a investigação desse problema, verificou-se que a utilização de tecnologias assistivas produz resultados significativos no desenvolvimento das atividades diárias por pessoas com deficiência, melhorando suas capacidades funcionais e promovendo maior autonomia e inclusão destas no meio social.

O presente trabalho alcançou o objetivo proposto, que era encontrar um meio de melhorar a interação social de indivíduos com TEA através do uso de dispositivos móveis, o que culminou no desenvolvimento do aplicativo Autismo Projeto Integrar.

Com este estudo, é possível concluir que há a necessidade de criação ferramentas pedagógicas que auxiliem a inclusão e o processo de ensino-aprendizagem, não somente de pessoas com TEA, mas também de pessoas com todos os tipos de deficiência. Essa realidade é encontrada pelos familiares e profissionais que trabalham no ensino de pessoas com deficiência e está longe de ser solucionada, porém as tecnologias assistivas podem proporcionar um grande auxílio para a educação e inclusão social destas pessoas.

Tendo em vista o público-alvo desta pesquisa, podem-se destacar alguns pontos que dificultam sua execução, onde a coleta de informações ficou limitada apenas aos pais e professores. Considerando, inclusive, as características do Transtorno do Espectro Autista, a inserção de novos elementos na rotina do autista precisa ser feita com cuidado, respeitando o tempo que cada sujeito necessita para tal assimilação. Dessa forma, para realizar uma coleta de dados mais profunda, seriam necessários vários meses de investigação e análise junto às crianças autistas, o que não foi possível, considerando as limitações deste trabalho.

Este trabalho pretendia abranger, direta ou indiretamente, um quantitativo de pelo menos 60 pessoas. Considerando o total de funcionários envolvidos diretamente no cuidado e educação de autistas nas escolas estudadas (psicólogos, pedagogos, psicopedagogos e fonoaudiólogos), e o número de crianças autistas matriculadas nos colégios estudados, vide Tabela 1 e 2, temos um total de 65 profissionais e 39 crianças autistas atingidos diretamente pelo trabalho, em um total de 104 pessoas, sem considerar os pais, familiares e cuidadores das crianças autistas, a respeito dos quais não foram obtidos dados sobre o quantitativo.

Dessa forma, novas pesquisas poderão ser conduzidas, tanto para melhorar este trabalho, quanto para desenvolver novos meios que facilitem a inclusão, autonomia e aprendizado de pessoas com deficiência.

Referências American Psychiatric Association [APA]. (2014) DSM-V: Manual diagnóstico e

estatístico de transtornos mentais. 5. ed. Porto Alegre: Artmed. 992p.

BRASIL. Decreto nº 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dispõe sobre o Atendimento Educacional Especializado, regulamenta o parágrafo único do art. 60 da lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e acrescenta dispositivo ao Decreto nº 6.253, de 13 de novembro de 2007. Brasília, 2008. Disponível em: <https://goo.gl/8GlUP2>. Acesso em 10 Set. 2015.

BROOKE, John. (1996) SUS-A quick and dirty usability scale. Usability evaluation in industry, v. 189, n. 194, p. 4-7.

FERNANDES, Flávia Gonçalves; OLIVEIRA, Luciene Chagas de; RODRIGUES, Mylene Lemos; VITA, Stéfano Schwenck Borges Vale. (2014) Sistema para auxílio na alfabetização de crianças com autismo utilizando realidade aumentada para dispositivos móveis. Disponível em: <https://goo.gl/ila57I>. Acesso em 29/10/2015.

GODOY, Adriana; GIANVECHIO, Neimer. (2014) Autismo Projeto Integrar | De Pais para Pais. Disponível em <https://goo.gl/k7eRnC>. Acesso em 30 Out. 2015.

SANTOS, C. L. S. C.; GOMES, C. M. L.; BARROS, V. P. H.; CELINO, M. L. S. Conhecendo o Autismo no Contexto da Inclusão Social: na Flexibilidade Curricular e Métodos Pedagógicos. 2016. Disponível em <https://goo.gl/3Vd0Ge>. Acesso em 23 Set 2016.