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1 UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO ATIVIDADES ESCOLARES ENVOLVENDO ALUNOS AUTISTAS NA ESCOLA ESPECIAL JOSIANE MARIA BONATTO BRAGIN PIRACICABA, SP 2011

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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

ATIVIDADES ESCOLARES ENVOLVENDO ALUNOS AUTISTAS NA ESCOLA ESPECIAL

JOSIANE MARIA BONATTO BRAGIN

PIRACICABA, SP

2011

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ATIVIDADES ESCOLARES ENVOLVENDO ALUNOS AUTISTAS NA ESCOLA ESPECIAL

JOSIANE MARIA BONATTO BRAGIN

ORIENTADOR: PROF. DR. MARIA INÊS BACELLAR MONTEIRO

Dissertação apresentada à

Banca Examinadora do

Programa de Pós-Graduação

em Educação da UNIMEP

como exigência parcial para

obtenção do título de Mestre

em Educação

PIRACICABA, SP

2011

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BANCA EXAMINADORA

Orientadora: Maria Inês Bacellar Monteiro

Lúcia Helena Reily

Maria Cecília Rafael de Góes

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AGRADECIMENTOS

Dirijo meus agradecimentos à Maria Eduarda e Rodolpho pela paciência, pelo

apoio e por serem fontes de força em minha vida.

Às Revmas. Irmãs Cecília e Maria, Dr. Fritz, Francisca e todos integrantes da

equipe de trabalho da amiga Ana.

Aos meus amigos e professores do Núcleo de Pesquisas de Práticas Educativas e

Processos de Interação e do grupo de estudos do PROESP que sempre colaboraram com

discussões construtivas durante minhas apresentações

À colega Rosana que me ensinou como “enxergar” a vida através de seu exemplo.

À professora Anna Maria Lunardi Padilha que me transmitiu não apenas aulas de

conteúdo teórico importantíssimos, mas também, possibilitou espaços significativos de

discussões construtivas sobre a temática da realidade educacional brasileira.

À CAPES, PROESP e UNIMEP pelo apoio financeiro.

Aos funcionários da secretaria PPGE que sempre prontamente e educadamente

atenderam minhas solicitações.

À minha orientadora Professora Doutora Maria Inês Bacellar Monteiro pela

paciência, dedicação e ensinamentos transmitidos de uma maneira singular.

À Ana Carolina pelo respeito e companheirismo de hoje e sempre, pela confiança

sobre meus ideais e também pela dedicação e grande sensibilidade ao tratar de assuntos

que fogem à razão humana.

Ao meu querido aluno Bruno, sujeito autista, força motriz pela busca deste estudo.

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RESUMO

Questões referentes às práticas educacionais com alunos autistas geralmente

restringe-se a um trabalho voltado para funções elementares fundamentadas na

modificabilidade de comportamentos. Os programas educacionais oferecidos a estes

alunos voltam-se para a formação de hábitos que visam treinos de repertórios de apoio,

verbais e treinos de interação social tendo como objetivo a redução de comportamentos

excessivos, controle de comportamentos considerados inadequados, assim como a

manutenção de comportamentos aceitos socialmente, a ampliação da atenção e a

concentração do sujeito. Neste estudo, fundamentado na perspectiva histórico-cultural,

busco conhecer quais são as experiências que estão sendo proporcionadas aos alunos com

diagnóstico de Transtorno Invasivos do Desenvolvimento (autistas), pelas práticas

educacionais atuais, compreender que concepções orientam essas práticas e apontar

possibilidades alternativas de educação destes alunos. O trabalho de campo consistiu no

acompanhamento dos programas oferecidos para alunos diagnosticados como autistas em

uma escola de Educação Especial localizada no interior do Estado de São Paulo por um

período de um ano. Neste período realizei observações de práticas educativas realizadas

em duas salas de aula de alunos diagnosticados autistas, que foram registradas em diário

de campo e através de filmagens que foram selecionadas e posteriormente transcritas.

Realizei também alguns encontros com duas professoras e duas monitoras nas quais

conversamos sobre suas práticas pedagógicas. Estes encontros foram gravados e

posteriormente transcritos. A análise do material levou ao estabelecimento de duas

unidades temáticas relacionadas aos objetivos propostos neste estudo, ou seja, refletir

sobre as atividades escolares que atualmente estão sendo desenvolvidas com autistas.

Assim, identifiquei duas unidades temáticas onde minha participação em momentos de

práticas pedagógicas levou professores a não apenas retratar a atual condição destes

momentos educativos, mas sim colocar em prática uma nova maneira de atuação:

1) Práticas convencionais

2) Práticas desejáveis

As análises das observações e entrevistas realizadas permitiram concluir que os

alunos autistas vivem experiências escolares, de ensino-aprendizagem, extremamente

limitadas, centradas em atividades repetitivas, descontextualizadas e que não permitem

aos mesmos o acesso ao conhecimento. Os professores mostram-se insatisfeitos e

descontentes com suas ações, mas inseguros para propor mudanças e para criar novas

possibilidades de atuação. As marcas históricas de influência do modelo médico-

pedagógico e de uma concepção de ensino-aprendizagem baseada no pressuposto de que

o ambiente e a experiência determinam o comportamento e a aprendizagem de conteúdos

e habilidades, foram identificadas tanto nas observações das atividades realizadas em

situações pedagógicas, como nas conversas com os professores e monitores. Foi

observada também a possibilidade de mudanças importantes nas práticas pedagógicas

quando é dada ao professor a oportunidade de refletir sobre suas práticas e quando suas

iniciativas são valorizadas e incentivadas. A simples conversa com as professoras e

monitoras envolvidas nesta pesquisa foi suficiente para provocar mudanças, ainda que

sutis, em suas ações pedagógicas realizadas com seus alunos autistas. Esta é uma reflexão

necessária e ainda muito preliminar sobre a educação de pessoas autistas.

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Palavras-chave: autismo – atividades educacionais – abordagem histórico-cultural

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ABSTRACT

Questions concerning the educational practices with students with autism

generally restricted to elementary functions based on the modifiability of behavior.

Educational programs offered to these students turn to the formation of habits designed to

support training of repertoires, verbal and social interaction practice having as its goal the

reduction of excessive behavior, controlling behavior deemed inappropriate, as well as

the maintenance of behavior socially accepted, the increase in attention and concentration

of the subject. In this study, based on historical-cultural perspective, I seek to know what

are the experiences that are being offered to students diagnosed with Pervasive

Developmental Disorder (autism), the current educational practices, understand concepts

that guide these practices and point out alternatives for education of autistic children.

Field work consisted in monitoring the programs offered for students diagnosed as

autistic at a school for Special Education located in the State of São Paulo for a period of

one year. During this period realized observations of some situations of practical

educational activities in two classrooms of students diagnosed with autism, which were

recorded in daily field and shooted that were selected and transcribed. I conducted several

meetings with two teachers and two monitors in which we talked about their teaching.

These meetings were recorded and later transcribed. The data analysis led to the

establishment of two thematic units related to the objectives proposed in this study, ie,

reflect on the school activities that are currently being developed with autism. Thus, I

identified two thematic units:

1) Repeat to learn and

2) Discovering possibilities.

The analysis of the observations and interviews showed that the autistic students

school experiences living, teaching and learning, extremely limited, focusing on repetitive

activities, decontextualized and not allow them access to knowledge. The Teachers are

dissatisfied and unhappy with his actions, but unsafe to propose changes and to create

new possibilities for action. Brands historical influence of the medical-educational and a

conception of teaching and learning based on the assumption that the environment and

experience determine the behavior and learning content and skills were identified in both

the observations of the activities performed in teaching situations and therapeutic as in

conversations with teachers and counselors. There was also the possibility of major

changes in teaching practices when the teacher is given the opportunity to reflect on their

practice and when their efforts are valued and encouraged. A simple conversation with

the teachers and caregivers involved in this research was enough to cause changes, even

subtle, in their pedagogical actions taken with their autistic students. This is a necessary

reflection and still very preliminary education of autistic people.

Key-words: autism - educational activities - cultural historical approach

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SUMÁRIO

Apresentação ................................................................................................................ 9

CAPÍTULO 1: Fundamentos históricos para a compreensão do autismo ................11

1.1 Caracterização do autismo ...........................................................................11

1.1.1 Início da escolarização de autistas no Brasil ..................................12

1.1.2 Autismo: pesquisas e teorias ..........................................................17

1.2 Espaço educacional de alunos autistas .........................................................20

CAPÍTULO 2 – Possibilidades que se abrem com a perspectiva histórico-cultural.26

2.1 A perspectiva histórico-cultural ....................................................................26

2.2 Conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal ..........................................28

2.3 A ação educativa para autistas focada nas práticas sociais ............................32

CAPÍTULO 3 - Atividades educacionais com autistas na escola especial ...............36

3.1 Caracterizando o ambiente de pesquisa e os sujeitos .....................................36

3.2 Explorando o ambiente educacional para alunos autistas .............................39

3.3 Observando as práticas pedagógicas e conversando sobre elas com as

professoras.........................................................................................................44

CAPÍTULO 4 - Da manutenção de modelos às possibilidades de novas

perspectivas..................................................................................................................63

4.1 Experiências escolares dos autistas: Práticas convencionais.......................63

4.2 Práticas desejáveis ......................................................................................67

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................71

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................73

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INTRODUÇÃO

Durante a graduação em Pedagogia tive o primeiro contato com a literatura sobre

autistas. Muitas dúvidas me levaram a dar continuidade nos estudos de especialização em

Educação Especial com foco no atendimento a alunos portadores de condutas típicas

decorrentes de Transtornos Invasivos do Desenvolvimento. Neste curso tive oportunidade

de ampliar os conhecimentos, porém, foi a partir do ano de 2006 que pude vivenciar as

experiências educacionais com alunos autistas, na função de professora de Educação

Especial.

Durante este período pude conhecer como outras escolas e instituições atendiam

estes alunos, e quais eram as metodologias utilizadas. Participei também de alguns

cursos, seminários e programas de capacitação de professores para atuarem com alunos

autistas, dentro do programa TEACCH.

Mais questionamentos foram surgindo durante minha prática, principalmente no

que diz respeito ao olhar sobre a síndrome do autismo focado na incapacidade,

extremamente enquadrados às características rígidas dos diagnósticos e também às

práticas pedagógicas estruturadas à partir da modificação de comportamentos. Constatei

então que tinha necessidade de mais estudos e que o curso de mestrado em educação

pudesse me oferecer condições para repensar estas questões pedagógicas com alunos

autistas.

Esta pesquisa assume um olhar ancorado na abordagem histórico cultural e

pretende apontar novas possibilidades educacionais para alunos autistas como uma

alternativa viável para o desenvolvimento de atividades educacionais.

Organizei o texto desta dissertação em quatro capítulos.

No primeiro capítulo, é abordada a questão da educação do autista no Brasil e as

teorias de desenvolvimento e aprendizagem que acompanharam a história de educação

destas pessoas em nosso país.

O segundo capítulo aponta um novo olhar sobre as práticas pedagógicas para

alunos autistas com foco na perspectiva Histórico Cultural.

O acompanhamento das práticas pedagógicas em uma escola de educação especial

faz parte do terceiro capítulo. Organizei os dados apresentados neste capítulo em duas

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unidades temáticas que procuram responder aos meus questionamentos iniciais, ou seja,

conhecer quais as experiências proporcionadas aos alunos autistas pela escola,

compreender que concepções orientam essas práticas e apontar possibilidades alternativas

de educação de crianças autistas. No quarto capítulo, teço algumas considerações

preliminares sobre os dados a partir das unidades temáticas, procurando relacionar

práticas, concepções e perspectivas, de maneira a propor novos caminhos para a educação

de autistas.

Seguem-se as considerações finais.

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CAPÍTULO 1

FUNDAMENTOS HISTÓRICOS PARA A COMPREENSÃO DO AUTISMO

1.1 Caracterização do autismo

A primeira descrição do autismo ocorreu em 1943 por Kanner1 referido-se como

um distúrbio de contato afetivo, evidenciado pela ausência de reciprocidade nas relações

com outras pessoas, em conjunto com as falhas relacionadas à linguagem e a fascinação

por objetos. No ano de 1953, o problema principal apontado tinha como foco a área

social “A principal patologia permanece na área da inabilidade de se relacionar de

maneira ordinária com outros seres humanos” (EISENBERG & KANNER, 1956,

pp.558).

O autismo é denominado de acordo com a 10ª Classificação Internacional de

Doenças CID -102 como um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento (TID), com

etiologia desconhecida, porém, com evidências de influências genéticas. O diagnóstico do

autismo é baseado principalmente nas dificuldades apresentadas em três grandes áreas:

interação social recíproca, linguagem e habilidade criativa (OMS, 1993; APA, 1994).

Essas três áreas são referidas como uma “tríade de comprometimento social, da

linguagem e do comportamento” (WING, 1997). Várias teorias foram desenvolvidas na

tentativa de esclarecer os diversos sintomas do autismo em termos de disfunção cognitiva

básica, entre elas o defeito na integração sensório-motora de Ornitz (1976),

comprometimento no pensamento simbólico de Wing (1975), e incapacidade para

interpretar sinais sociais ou emocionais de Rutter (1983).

Várias pessoas começam a enxergar outros aspectos ligados ao autismo, como por

exemplo, durante a década de 70 o autismo é visto como um distúrbio cognitivo. Alguns

autores relacionam o autismo com um transtorno do desenvolvimento envolvendo déficits

cognitivos severos com origem em alguma forma de disfunção cerebral. No final da

década de 80 houve um aprofundamento de estudos sobre os prejuízos sociais e passam a

1 Leo Kanner foi um psiquiatra austríaco radicado nos Estados Unidos.

2 CID-10 Organização Mundial da Saúde. Classificação dos Transtornos Mentais e de comportamento.

Porto Alegre, Artes Médicas, 1993.

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adotar um enfoque desenvolvimentista atribuindo ao autismo uma incapacidade inata de

se relacionar com as pessoas.

Estas diferentes posições têm em comum a idéia de que na base do autismo

encontra-se um prejuízo biológico.

Atualmente, Schwartzman (1995), Facion (1995), Steiner, Guerreiro e Marques-

de-Faria (2000), apontam condições clínicas que podem estar associadas ao autismo,

como a epilepsia, esclerose tuberosa, hipomelanose de Ito, deficiência mental, síndrome

de Down, X-Frágil, fenilcetonúria, síndrome de Rett e infecções (como toxoplasmose,

sífilis e citomegalovírus).

De acordo com os estudos epidemiológicos, a incidência do autismo varia de

aproximadamente 2-3 até 16 em cada 10.000 crianças. A prevalência de crianças com

autismo típico, no Reino Unido, por exemplo, é de 4-5 em cada 10.000 crianças. Porém,

se forem levados em conta indivíduos que mostram características dos autistas, esta taxa

aumenta para 15-20 em cada 10.000 (WING, 1975).

No Brasil, não existem dados estatísticos sobre o número de pessoas autistas,

porém, de acordo com a ABRA3

(Associação Brasileira de Autismo), calcula-se que

existam, aproximadamente, 600 mil autistas com diagnóstico fechado. De acordo com o

Projeto Autismo do Instituto Nacional Psiquiatria4 do Hospital das Clínicas da

Universidade de São Paulo no ano de 2007, estimava-se que no Brasil havia cerca de 1

milhão de casos de autismo. Estes dados partiram do relato de instituições ligadas ao

atendimento de famílias de crianças com autismo em todas as regiões brasileiras.

1.1.1 Início da escolarização de autistas no Brasil

3 A Associação Brasileira de Autismo - ABRA é uma entidade civil sem fins lucrativos, com sede e foro

em Brasília-DF, fundada em 10 de outubro de 1988, destinada a congregar Associação de Pais e Amigos de

Autistas, existentes no País, ou que venham a existir, tem por finalidade a integração, coordenação e

representação, a nível nacional e internacional, das entidades filiadas voltadas para a assistência do autista. 4 A Universidade de São Paulo (USP) criou o Instituto Nacional de Psiquiatria do Desenvolvimento para

Crianças e Adolescentes, coordenado pelo professor Eurípedes Constantino Miguel, da Faculdade de

Medicina (FMUSP). O objetivo do instituto é de prevenir o aparecimento de doenças mentais em adultos a

partir de ações dirigidas à infância e adolescência. Entre os transtornos mentais envolvidos no projeto estão:

transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno de conduta, transtorno de ansiedade,

transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno do humor bipolar, autismo e transtorno de aprendizagem, entre

outras. São ao todo 16 projetos de pesquisa, envolvendo 70 pesquisadores.

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Em relação aos dados históricos sobre o início da escolarização de alunos autistas,

constata-se a escassez de referências, uma vez que o diagnóstico de autismo é recente e,

provavelmente esses alunos foram diagnosticados, a priori, como deficientes mentais, o

que determinou inicialmente o predomínio de uma educação semelhante a que era

oferecida às pessoas deficientes mentais. Rivière (2004) situa os anos de 1943 a 1963

como um período em que a maior preocupação era descobrir as causas do autismo e não

focalizar as ações educacionais. A partir de 1963 a 1983, passou-se a valorizar o papel da

educação e surgem nas escolas especializadas, criadas por pais e familiares de autistas, os

procedimentos de modificação de conduta, terapias comportamentais e programas para

ajudar as pessoas com autismo a se desenvolverem. No Brasil, na história mundial da

educação especial, tivemos uma forte influência da medicina na educação do deficiente e

a educação dos autistas não constituiu uma exceção a esse fato. Lembremo-nos de que a

descrição do autismo só ocorreu em 1943 e antes disso, essas pessoas eram

provavelmente diagnosticadas como deficientes mentais. Neste contexto, a história da

educação brasileira para autistas foi balizada pelas concepções presentes em cada época

sobre a educação de crianças deficientes e foi marcada não só pela atuação direta dos

médicos nos anos de 1878 a 1895, como também pela atuação dos diretores do INSM

(Instituto Nacional de Surdos-Mudos), professores e também pela repercussão de

ensinamentos fundados na área.

Devido à esta forte influência da medicina na educação, produziram-se tratados

teóricos e pedagógicos, assim como a criação de um setor da Inspeção Médico-Escolar

através do Serviço de Higiene e Saúde Pública. Em 1900, foi apresentado um estudo

intitulado “Da educação e tratamento médico-pedagógico” pelo Dr. Carlos Fernandes

Eiras que trazia preocupações pedagógicas ligadas às ações médicas.

Em 1917, Dr. B. Vieira Mello publicou “Débeis mentais na escola pública e

Higiene escolar e pedagogia”, contendo normas de trabalho para todos os profissionais,

seleção dos anormais, especificação das deficiências e criação de classes. O critério para

avaliar a anormalidade contida na publicação do estudo de B. Vieira de Mello, seria o

grau de inteligência em relação aos alunos da mesma idade e a observação da atenção do

aluno, da sua memória (JANNUZZI, 2006). Os resultados destas avaliações identificavam

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os sujeitos como sendo anormais intelectuais (tardios, precoces ou com exagero das

faculdades em comparação com os da sua idade), os morais (subdivididos entre os que

tinham moral dependente de anomalia intelectual) e os pedagógicos (dotados de

inteligência com grau inferior à sua idade). A deficiência, principalmente intelectual

passou a estar relacionada á problemas básicos de saúde, causadores de nossa

degenerescência, tuberculose e doenças venéreas (MAGALHÃES, 1913 apud

JANNUZZI, 2006 p. 44).

Nesta época, os médicos perceberam a importância da pedagogia, e passaram a

criar instituições escolares ligadas à hospitais psiquiátricos. Em 1913 as crianças bem

comprometidas e taxadas de mentecaptas por Basílio de Magalhães em sua obra:

“Tratamento e educação das crianças anormais de inteligência: contribuição para o estudo

desse complexo problema científico e social, cuja solução urgentemente reclama, - a bem

da infância de agora e das gerações porvindouras – os mais elevados interesses materiais,

intelectuais e morais, da Pátria Brasileira”, permaneciam segregadas com os adultos tidos

como loucos. Somente no ano de 1921 passaram a ter orientação pedagógica, junto com

o atendimento clínico através da criação do pavilhão para crianças no Hospício de

Juquery, criado pelo doutor Franco da Rocha que mais tarde recebeu uma escola, Pacheco

e Silva. A educação dessas crianças deveria ser feita em classes separadas, coletivamente

com uma base metodológica do aprender a aprender, a ortopedia mental, corrigindo a

atenção, memória, percepção, juízo e vontade através da listagem das diversas técnicas

comportamentais para educar a vontade: treinamento para distinguir objetos diferentes,

repetição de palavras e números, ordem crescente de complexidade. Em outros casos as

crianças aprendiam artesanato e atividades como vestir, comer, etc. Estas instruções

seriam dadas por mestres vindos da Europa e Estados Unidos para médicos, auxiliados

pelos pedagogos.

Para Jannuzzi (2006), a defesa desta educação foi feita em nome da “Ordem e

Progresso” através da forte influência do positivismo no Brasil que teve como sua

representação, o emprego da frase positivista, extraída da fórmula máxima do

positivismo: “O amor por princípio, a ordem por base, o progresso por fim”, que passa a

imagem de que cada coisa em seu devido lugar conduziria para a perfeita orientação ética

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da vida social. Desta maneira, evitaria a germinação de criminosos e desajustados de toda

espécie (MAGALHÃES 1913, apud JANNUZZI 2006 p.47). Para trabalhar com estas

crianças, no ano de 1929, Ulysses Pernambucano organizou a primeira equipe

multidisciplinar composta por psiquiatra, pedagogo e psicólogo.

Durante a década de 70, a institucionalização da Educação Especial ocorre como

uma preocupação do sistema público educacional de oferecer a garantia ao acesso à

escola aos portadores de deficiência5. Neste período a escola especial passou a obter os

avanços da Pedagogia e da Psicologia da Aprendizagem no enfoque comportamental.

Suas técnicas passavam a focar os princípios de modificação de comportamento e

controle de estímulos, abordagem esta que predomina até os dias atuais.

O atendimento educacional das pessoas com autismo e psicoses no Brasil foi

historicamente oferecido pela educação especial6, em instituições especializadas, porém a

maioria destas instituições não realizava este atendimento, justificando pela

complexidade da síndrome. A primeira escola formada para atender exclusivamente

alunos autistas em território brasileiro foi a AMA (Associação dos Amigos do Autista) de

São Paulo, que foi fundada por um grupo de pais de crianças autistas, promovido pelo Dr.

Raymond Rosenberg no dia oito de agosto de 1983.

Desde o ano de sua fundação até o ano de 1988, a AMA não teve grandes

progressos no desenvolvimento de pesquisas para encontrar uma metodologia adequada

para o desenvolvimento das crianças autistas, até que um grupo de mães conseguiu uma

verba governamental para visitar instituições dos Estados Unidos e da Europa com a

finalidade de conhecer as atividades realizadas com os autistas. Estes países já se

encontravam em um nível mais avançado de conhecimento. A primeira associação

mundial de autismo foi criada em 1962 na Inglaterra.

5 De acordo com a LDB 5692/71, artigo 9º, recomendava-se que alunos com deficiências físicas ou

mentais, os que se encontrassem em atraso considerável quanto à idade regular de matricula e os

superdotados deveriam receber tratamento especial de acordo com as normas do Conselho de Educação. 6 Por educação especial, modalidade de educação escolar, entende-se um processo educacional definido por

uma proposta pedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizados

institucionalmente para apoiar, complementar e, em alguns casos, substituir os serviços educacionais

comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover o desenvolvimento das potencialidades dos

educandos que apresentam necessidades educacionais, em todas as etapas e modalidades da educação

básica (BRASIL, 2001).

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No mesmo período que ocorreu a visita do grupo de pais à estes países o programa

TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Communication Handicapped

Children) vinha sendo implantado em um número crescente, e isto fez com que a AMA

passasse a implantar no Brasil este programa a partir de 1991, orientada por profissionais

da Dinamarca e da Suécia.

O programa TEACCH visava estimular o aluno mediante a organização e

planejamento das atividades rotineiras. Trata-se de um programa de ensino

comportamental que busca propiciar comportamentos previsíveis. Para atingir estes

objetivos, o programa TEACCH procura adaptar um currículo pedagógico, associando

técnicas de reeducação comportamental e dando ênfase ao desenvolvimento e preparação

para a vida adulta.

A AMA recebeu o Prêmio Bem Eficiente, da Kanitz e Associados (1997), o

Prêmio Direitos Humanos, da UNESCO e Poder Executivo Federal (1998) e tornou-se

referencial nacional no atendimento ao autista, e na formação de professores para atuar na

Educação Especial através de cursos presenciais regulares, presenciais sob demanda e

cursos à distância. A AMA também presta serviços de assessoria para as escolas que

buscam estruturar-se para o atendimento TID.

Atualmente estão cadastradas na ABRA (Associação Brasileira de Autismo), 117

instituições de atendimento educacional específico para alunos autistas que se utilizam de

programas de ensino focados em teorias comportamentais como o TEACCH e o ABA

(Applied Behavior Analysis) e também na prática de terapias que compõem a maior parte

do tempo das atividades escolares, mas, que não são caracterizadas como atividades

pedagógicas. Entre estas terapias estão: musicoterapia, equoterapia, hidroterapia, terapia

ocupacional, terapia fonoaudiológica, psicoterapia.

Além destas terapias, algumas escolas adotam o Floor Time7 e o Relation Play

8

como medidas também de cunho terapêutico.

7 Desenvolvido pelo psiquiatra infantil Stanley Greenspan. Esta atividade não é considerada como um

momento para ensinar, mas sim, explorar a espontaneidade, iniciativa da criança e suas verbalizações. 8 O Relation Play foi desenvolvido na Inglaterra entre 1950 e 1990 por Veronica Sherbone. Foi

desenvolvido com base na teoria e filosofia de movimento humano de Rudolf Laban. Os trabalhos de Laban

influenciaram fortemente Sherborne durante um período de mais de 30 anos (inicialmente quando ela

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1.1.2 Autismo: Pesquisas e teorias

Para Bereohff, Leppos e Freire (1994), que atuam na área de psicologia clínica e

atendimento de pessoas com diagnóstico de autismo (Transtornos Invasivos do

desenvolvimento – TID), os principais aspectos a serem trabalhados com estes sujeitos,

estão relacionados aos seguintes pontos: redução dos distúrbios comportamentais,

desenvolvimento do repertório comunicativo, maximização do aprendizado funcional e

maior independência nas atividades de vida diária. Isto demonstra a pouca atenção dada

para o desenvolvimento da relação do sujeito autista com os outros sujeitos de seu grupo

social. As avaliações e testes dos alunos são valorizados em conseqüência desta visão e

os espaços educativos se instrumentalizam de uma série de avaliações específicas com

escalas e inventários que buscam testar suas habilidades. Entre estes testes, escalas e

inventários destacam-se o IBSE - Behavioral Summarized Evolution Scale

(BARTHÉLÉMY, C. 1992) escala para crianças de 6 a 48 meses de idade, o CHAT -

Checklist for Autism in Toddlers (Baron-Cohen e AL. 1992) utilizado com crianças de

18 a 36 meses de idade, o CARS - Childhood Autism Rating Scale (Schopler e AL. 1988)

questionário com observações comportamentais e entrevistas aplicáveis em qualquer

idade, o DISCO - Diagnostic Interview of Social and Communication Disorders (Wing,

1997) que engloba a avaliação de diversos domínios do desenvolvimento (motor,

linguagem, auto-cuidados, imitação, comunicação, bem como comportamentos com

características autísticas) e o ABC - Autism Behavior Checklist que compõe o Autism

Screening Instrument for Educational Planing (ASIEP) (Miranda-Linné F.M., 2002) que

se caracteriza por uma escala de avaliação dos comportamentos não adaptativos. Estas

avaliações e escalas ajudam a identificar o desempenhos dos alunos.

Em relação às concepções teóricas que orientam as práticas terapêuticas e

educacionais com autistas destacam-se três perspectivas principais: a cognitivista, a

psicanalítica e a comportamental.

A teoria cognitivista aponta para um déficit cognitivo de base, em que as

características de comportamento observadas são apenas repercussores de uma disfunção.

trabalhava com crianças com dificuldades de aprendizagem severas e posteriormente quando estendeu a sua

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As propostas de ação nesta perspectiva indicam como meta o favorecimento de

transformações no funcionamento cognitivo.

As teorias psicanalíticas defendem que a patologia deriva de colapsos

psicológicos. O indivíduo autista é movido por uma falha em sua função estruturante do

ser, dentro de uma experiência afetiva de vínculo, que leva a uma conseqüente falha no

universo da simbolização.

A teoria comportamental teve suas primeiras pesquisas com foco no indivíduo

autista realizadas em laboratório por Ferster (1961) e Ferster e DeMyer (1961, 1962).

Ferster demonstrou a aplicabilidade dos princípios da teoria da aprendizagem ao estudo

de crianças com distúrbios de desenvolvimento e concluiu que com arranjos cuidadosos

de certas conseqüências ambientais, o comportamento destas crianças poderia ser

alterado, aumentando-se seus repertórios comportamentais e diminuindo os

comportamentos inadequados.

Vários pesquisadores começaram a estender suas pesquisas ao ambiente natural

em que as crianças viviam: suas casas, clínicas, hospitais, instituições; escolas maternais,

pré-primárias e primárias; escolas especiais e residências terapêuticas. Estes estudos

tinham como objetivo a instalação ou modificação de comportamentos sociais, verbais,

de auto-cuidados, acadêmicos e a substituição de comportamentos problema, como hetero

e auto-agressão, birras e estereotipias, de crianças diagnosticadas como autistas,

esquizofrênicas e/ou com retardo mental (WINDHOLZ, 2005).

Com o passar do tempo, programas curriculares foram desenvolvidos e

aperfeiçoados em muitos locais, todos eles envolvendo tanto atividades em escolas ou

instituições, como trabalho com os familiares.

Estas pesquisas preocupam-se com a instalação, manutenção e generalização de

comportamentos funcionais ao lado da redução ou eliminação de comportamentos que

interferem em novas aprendizagens.

Neste sentido, a aprendizagem é concebida como uma mudança observável no

comportamento do indivíduo que envolve o reforçamento, a punição, o controle de

estímulos, a generalização, o controle de contingências e as regras verbais. Os professores

abordagem para pessoas com todas as idades e para todo o tipo de necessidades especiais).

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manipulam as condições do espaço educativo e os alunos passam a ser receptores do

conhecimento.

As ações educativas nesta teoria voltam-se para instruções dirigidas ao aluno

daquilo que ele necessita realizar de maneira clara e objetiva com o intuito de facilitar seu

entendimento, em seguida, observa-se a conduta emitida pela criança e consequentemente

é constatado o seguimento ou não da instrução fornecida. Caso a resposta seja correta, é

disponibilizado um reforçador, ao contrário, se a resposta não for considerada funcional

este comportamento é ignorado. Se ocorrer uma resposta incorreta, mas funcional, o

terapeuta ou professor vai auxiliar a criança, através de contato físico, para que responda

da maneira esperada. Esta dinâmica é intercalada por um breve intervalo, a pausa

discreta, dando um espaço de tempo de 3 a 5 segundos entre a próxima instrução para a

criança.

Em relação às pesquisas relacionadas ao autismo no Brasil, de acordo com

Vasques (2008), a produção científica acadêmica brasileira dos programas de pós-

graduação de 1978 a 2006, correspondem ao número de 264 produções, sendo que 123

estudos são da área da psicologia, 53 da educação e 35 da medicina. Para a pesquisadora,

esta quantidade afirma que a temática do autismo e das psicoses infantis não constitui um

tema frequentemente estudado pelos pesquisadores brasileiros.

Segundo esta autora, as concepções sobre autismo nestes estudos, vinculam-se a

noções de desvio e anormalidade. Na área da educação constatou que o autismo é

remetido frequentemente, às significações de doença e incapacidade. Nota-se um uso

indiscriminado de termos como avaliação e diagnóstico. Estas expressões congregam

práticas, conceitos e objetos bastante heterogêneos (VASQUES, 2008).

As pesquisas relacionadas ao tema ensino-aprendizagem contemplam

prioritariamente reflexões sobre como ensinar e o que estes alunos podem aprender.

Identificam, avaliam e descrevem os comportamentos considerados típicos desses sujeitos

para adequarem planos de ensino e metas de aprendizagem. Alguns pesquisadores

analisam programas de ensino e treinamento estruturados e consideram os mais

adequados, o TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Communication

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Handicapped Children), o CFN (Currículo Funcional Natural) e o PEI (Programa de

Ensino Individualizado).

Ao contrário das concepções teóricas apresentadas e mais estudadas até hoje no

Brasil em relação à educação de alunos autistas, neste estudo busco um novo olhar para a

educação destes alunos que considere a importância da ação do outro e das relações

sociais para o processo de ensino-aprendizagem.

1.2- O espaço educacional de alunos autistas.

Na maioria dos espaços educacionais do Brasil e do mundo os programas estão

voltados para o atendimento de alunos autistas no modelo comportamental que está

centrado na interdependência entre intervenção e avaliação. A questão do diagnóstico é

focado mediante a observação das competências e dificuldades apresentadas por meio de

testes, escalas e questionários com base em critério e observação do comportamento, que

a curto prazo passarão a identificar as atividades que os alunos deverão realizar tendo em

vista suas limitações.

Dentre estes métodos que focam a modificação do comportamento o Applied

Behavior Analysis (ABA), que teve seu conceito apresentado no ano de 1938, avançou

suas aplicações em 1950, com a publicação do livro Princípios da Psicologia (Keller and

Schoenfeld, 1950) e veio acrescentar dados obtidos em laboratório, aos métodos,

conceitos e princípios apresentados por Skinner em 1938.

O aumento no número de pesquisas realizadas na década de 50 na área de

educação especial e comportamento delinqüente contribuíram para a criação do Journal of

Applied Behavior Analysis (JABA) em 1968 que passou a publicar pesquisas relevantes

na área da Análise Comportamental Aplicada.

No ano de 1987, Ivar Lovaas publicou um primeiro estudo realizado na Califórnia,

Estados Unidos, com o uso de princípios comportamentais no ensino de crianças

diagnosticadas com autismo.

O ABA possui como objetivos aumentar, diminuir, melhorar, criar ou eliminar

comportamentos previamente observados e identificados segundo critérios de

funcionalidade para um determinado indivíduo em relação a seu ambiente. A habilidade

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que ainda não faz parte do repertório da criança é ensinada em etapas e caso seja

necessário, faz-se uso, de reforçadores. A análise do comportamento pressupõe que é

fundamental conhecer as variáveis que mantém o comportamento, e a partir desse

conhecimento, propor formas alternativas de se conseguir a mesma consequência com um

comportamento diferente.

Entre as escolas que utilizam a metodologia gerada pela pesquisa na área de ABA

e educação especial, as mais conhecidas em todo o mundo e embora apresentem aspectos

diferenciados são: PCDI (New Jersey, EUA), NECC (Massachusetts, EUA), Spectrum

Center (Califórnia, EUA), Jericho School (Flórida, EUA), STARS (Califórnia, EUA),

Ann Sulivan (Peru e Brasil), e mais recentemente a AMA (São Paulo, Brasil). Algumas

dessas escolas trabalham apenas com crianças diagnosticadas com autismo e outras

atendem um público mais diversificado.

O autismo e sua complexidade sindrômica traz muitos questionamentos no âmbito

educacional em relação às suas dificuldades, os métodos de ensino restringem-se a

modelos como ABA que visam treinos e a modificação de comportamento, acreditando

que este recurso é o meio mais importante para fazer com que o aluno tenha autonomia e

portanto atinja seus objetivos educacionais.

Além do ABA, o programa TEACCH vem sendo implantado em instituições de

muitos países em todo o mundo e em cada uma delas são feitas adaptações para o

atendimento de autistas.

Este programa se desenvolveu a partir de um grupo de profissionais formado no

departamento de psiquiatria da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, foi

criado para atender crianças autistas. Os estudos iniciais emergiram na década de 60 a

partir de propostas terapêuticas que tratavam pais e crianças separadamente. Anos depois,

Eric Schopler juntou-se ao grupo de pesquisas propondo uma abordagem diferente que

consistia basicamente em uma proposta individualizada de ensino contando com os pais

como co-terapeutas. Schopler também demonstrou que ambientes estruturados eram mais

positivos na adaptação destas crianças (Schopler, Bhehm, Kinsbourne e Reichler, 1971).

Conforme mais estudos iam sendo realizados, as teorias que culpavam os pais pela causa

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do autismo foram aos poucos abandonadas, e a educação foi assumindo um papel cada

vez mais importante.

A meta fundamental do programa é o desenvolvimento da comunicação e da

independência e o meio principal para isto é a educação. A avaliação é a ferramenta para

a seleção de estratégias, que deverão ser estabelecidas individualmente.

Neste programa, a organização da sala de aula tem com objetivo a necessidade de

organização de cada um de seus alunos, sendo um local com área de aprendizado, área de

trabalho independente e também de descanso. As sequências de atividades individuais

encontram-se disponíveis de modo claro para cada aluno, bem como a forma de transição

entre uma atividade e outra. Os materiais e as atividades devem oferecer ao aluno

possibilidade de atuar independentemente do professor.

O TEACCH leva em conta que o aluno precisa aprender em pequenos passos,

inclusive a aumentar a sua tolerância ao tempo de trabalho e por isso é montado a partir

de uma avaliação PER-R (Perfil Psicoeducacional Revisado), levando em consideração as

características dos alunos.

A técnica deste programa baseia-se em criar um ambiente organizado para a

criança através de rotinas expostas em quadros, agendas ou murais. A criança após

reconhecer onde ficam as atividades relacionadas a ela (pelo nome ou algo, como figura

ou posição na sala, que a faça discriminar que aquilo se refere a ela), pode ver através de

desenhos ou anotações a atividade que deve realizar e, em seguida, colocá-las em prática.

Isto torna o ambiente mais fácil de ser compreendido pela criança, assim como o que se

espera que ela faça.

Nos Estados Unidos, o programa TEACCH, tem recebido reconhecimento

nacional e internacional e é visto por um grande número de pessoas como um modelo de

serviços, treinamento e pesquisa de excelência. No ano de 1972, recebeu o Gold

Achievement Award da Associação Americana de Psiquiatria “pelo estabelecimento de

pesquisas produtivas sobre distúrbios de desenvolvimento e implementação de sua efetiva

aplicação clínica”.

O TEACCH foi reconhecido pela divisão de patologias da infância da Associação

Americana de Psicologia como programa modelo nacional em serviços dirigidos a

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crianças e seus familiares. Além disso, um grande número de serviços de atendimento e

treinamento que utilizam esse método tem sido premiados pelos seus resultados.

Outro aspecto relevante no que diz respeito às características do espaço

educacional de alunos autistas é a maneira como que questões ligadas à comunicação é

realizada: através do reforçamento.

Segundo o DSM IV (APA, 1994), uma das características de indivíduos

diagnosticados com autismo é a dificuldade na comunicação por não desenvolverem a

linguagem oral. Assim, uma das propostas mais usadas, nas escolas que utilizam o

programa TEACCH é o sistema através de troca de figuras PECS (Picture Exchange

Communication System). O Sistema foi desenvolvido com o intuito de ajudar indivíduos

autistas a adquirirem uma comunicação funcional.

Os criadores do PECS Bondy e Frost (1994) tinham como objetivo encontrar uma

maneira de ajudar as crianças com autismo a se comunicar de uma forma funcionalmente

fácil e socialmente aceitável. A preocupação também se estendia em relação à

compreensão dos pais neste processo.

Inicialmente, o treino do PECS ensina o indivíduo a pedir por algo que lhe

interesse, e assim aprende a dar uma figura que representa um objeto ou uma situação

para outra pessoa, que por sua vez lhe entregará o que foi pedido. Durante esse treino os

alunos aprendem rapidamente novos comportamentos, pois são imediatamente reforçados

pelas conseqüências de suas respostas, estes procedimentos encontram-se estruturados em

5 fases de aplicação BONDY E FROST (1994).

A primeira fase do PECS é caracterizada pelo ensino de troca de figuras e tem

como objetivo ensinar o aluno a trocar a figura de um item por seu referente. Na segunda

fase o objetivo é ensinar a criança a mover-se em direção à prancha de comunicação,

fazer a seleção da figura que representa o item desejado, mover-se em direção ao

professor e entregar-lhe a figura. A distância entre o professor e o aluno deve ser

aumentada gradualmente para que a criança tenha que se locomover em direção ao

professor. A distância entre o aluno e a prancha de comunicação também deve ser

aumentada gradualmente, para que ele tenha que se locomover em direção à prancha de

comunicação para obter a figura.

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A terceira fase tem como objetivo a compreensão do aluno de diferentes figuras.

Na quarta fase, o objetivo é ensinar o aluno a estruturar sentenças com figuras no intuito

de obter os itens desejados. O objetivo da quinta fase é ensinar o aluno a selecionar a

figura "Eu quero", a figura do item desejado, colocá-las no cartão-sentença e entregá-las

ao professor quando este perguntar à criança o que ele quer. Nesta fase, pretende-se

também que o aluno nomeie o objeto.

Uma das características do sistema PECS é o uso de materiais simples na sua

confecção. Garante a portabilidade para poder ser usado por indivíduos em variadas

situações e locais. Os materiais incluem basicamente um fichário, usado como prancha de

comunicação e figuras ou fotos. Os símbolos de comunicação Mayer-Johnson (1981,

1985, 1990) são os mais utilizados com alunos autistas.

A associação entre o símbolo apresentado no sistema PECS e o significado da

informação a ser veiculada nem sempre é requerida em situações dialógicas nas relações

sociais, ao contrário, ocorre de maneira mecanizada e condicionada assim como a

maneira de atuação pedagógica predominante nas escolas brasileiras.

As características da abordagem comportamental, nas escolas que atendem alunos

autistas, de acordo com Orrú (2006), determina uma concepção mecanicista de mundo e

de homem que compreende a aprendizagem e o desenvolvimento como processos

semelhantes, em que a aprendizagem corresponde, reciprocamente, ao desenvolvimento.

O desenvolvimento resultado de uma reação do sujeito aos estímulos do meio ambiente,

similar a um reflexo mecânico da aprendizagem. A aprendizagem e o desenvolvimento

são resultados do condicionamento do meio, e a educação dirige-se ao treinamento de

alunos passivos, para a obtenção de comportamentos e ações desejáveis para conviverem

em sociedade.

Os programas e os métodos da abordagem comportamental visam a modificação

do comportamento focalizam os comportamentos desejáveis e indesejáveis e não

consideram a possibilidade de desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Uma

vez que a síndrome remete às dificuldades no relacionamento social, passam a restringi-

las de novos espaços e experiências sociais diferenciadas.

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Procurei neste capítulo mostrar como o atendimento educacional aos alunos

autistas foi e é marcado por um modelo educacional que busca a aprendizagem funcional.

O sujeito autista é reduzido aos seus sintomas e comportamentos atípicos e os

educadores, médicos e psicólogos se orientam pela racionalidade técnica e instrumental.

Certa psicanálise, psicologia e psiquiatria, oferecem a

certa educação conceitos que acabam por justificar

uma lógica objetivamente e classificatória, o que

apaga o lugar de responsabilidade dos sujeitos e das

instituições implicadas na escolarização. Se clarear,

definir, estabelecer o perfil de alunos autistas é

fundamental para que o professor construa práticas e

expectativas coerentes e realistas, resta-lhe um lugar

de impotência diante do seu aluno. Este, por sua vez,

não pode fazer mais do que desdobrar, na relação com

seu professor e colegas, aquilo que ele não é.

(RICKES, 2004 apud VASQUES 2008 p. 13).

Considero que esta visão sobre as classificações médicas e as limitações de

processos de intervenção terapêutica e comportamental na educação de sujeitos autistas,

precisa ser transformada, indagada e estar aberta para novos caminhos, possibilitando

uma revisão do termo incapacidade presente ainda hoje no atendimento educacional para

alunos autistas no Brasil.

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CAPÍTULO 2

POSSIBILIDADES QUE SE ABREM PARA A EDUCAÇÃO DE AUTISTAS

2.1 A Perscpectiva histórico – cultural

Ao assumir a perspectiva histórico-cultural de Vigotski como referencial teórico

neste estudo e neste capítulo, busco apresentar uma alternativa viável para aprimorar as

atividades pedagógicas no âmbito educacional para alunos autistas através de um olhar

diferenciado para esse sujeito e para as concepções metodológicas e pedagógicas atuais

que focam sua atuação no condicionamento de comportamentos.

Lev S. Vigotski (1896 – 1934) teve como principal temática em seus trabalhos a

constituição do psiquismo humano. Seus estudos foram marcados inicialmente pela

constatação da existência na época de uma ciência baseada em tendências materialistas,

mecanicistas ou subjetivistas. Em sua opinião a crise da psicologia, em 1927 tinha como

razão principal um agrupamento de teorias particulares e parciais que resultava a falta de

uma metodologia que tornasse possível construir uma ciência geral.

Para Vigotski (1991), nenhuma teoria psicológica representava um modelo

satisfatório da psicologia humana. A psicologia objetiva, representada pelo Behaviorismo

de Skinner, fundamentava-se em tentativas de reduzir a atividade consciente a esquemas

simplistas baseados nos reflexos. A psicologia subjetiva, como a Gestalt de Koffka,

estudava as funções humanas complexas de modo puramente descritivo e

fenomenológico. A Psicologia Construtivista de Piaget, entendia o ser humano como

abstrato e construindo-se a partir da maturação.

Para a superação dessa crise, propõe a construção de uma nova psicologia,

fundamentada no materialismo histórico e dialético, que não reduz o ser humano,

entendendo-o como uma unidade da totalidade.

Para Vigotski, mais do que tentar explicar os fatos psicológicos, o importante

seria criar uma metodologia que seria capaz de permitir estabelecer leis históricas, para

isso. Pino (2005), descreve que Vigotski serviu-se do exemplo de Marx em O Capital em

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que evidencia-se mais uma metodologia que lhe permite estabelecer as leis históricas que

determinam os fatos econômicos do que propriamente a crítica do sistema capitalista.

Vigotski fundamenta-se no materialismo histórico e dialético como seu referencial

teórico, epistemológico e metodológico que se configura sobre as leis gerais do

desenvolvimento da natureza, da sociedade e do pensamento humano.

Para Viotto (2007), a importância da dialética está tanto na explicitação da

interdependência entre os fenômenos naturais, humanos e sociais, o que implica

compreender as complexas relações mantidas pelos sujeitos ao tecerem sua existência

social, como na necessidade de mostrar que a fonte de desenvolvimento humano baseia-

se na unidade e luta de contrários, ou seja, cada fase na história gera sua fase contrária e

esse é o alimento do movimento histórico. Este movimento que deveria ser

definitivamente compreendido na escola especial, partindo da complexidade de relações

que lá são estabelecidas e que estão diretamente relacionadas com o desenvolvimento dos

alunos.

Embora em seus escritos Vigotski não tenha se referido especificamente a sujeitos

autistas (o diagnóstico e o termo autista são posteriores a sua morte), seus estudos sobre

defectologia apontam possibilidades de apropriação de seus pressupostos para refletir

sobre a educação de autistas.

Na perspectiva histórico-cultural defende-se a idéia de que desde o momento em

que o indivíduo começa a agir no mundo, são estabelecidos vínculos cada vez mais

dinâmicos entre as necessidades e os objetos que a elas atendem. Os objetos responsáveis

pelo atendimento das necessidades do sujeito precisam ser por ele descobertos, tornando-

se assim, motivo, ou seja, função estimuladora e orientadora da sua atividade.

Os fenômenos psíquicos, tendo origem social, não podem ser reconhecidos como

naturais, eternos e imutáveis. Faz-se necessário reconhecer o desenvolvimento histórico

do psiquismo humano em sua relação intrínseca com a vida e com a atividade social dos

homens, uma vez que a história desse psiquismo deve ser reconhecida como a história

social de sua constituição. Assim, as necessidades humanas precisam ser compreendidas

para além da mera satisfação orgânica, passando a ser reconhecidas no seu encontro com

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os objetos materiais e simbólicos, construídos pelo homem ao longo da história da

humanidade.

Pensar em atividades escolares com alunos autistas, fundamentadas na abordagem

histórico cultural, significa pensar em uma prática oposta às que contemplam programas

de mudança comportamental fundamentadas no behaviorismo, nas quais o aluno precisa

adaptar-se às condições da escola e da sociedade como foram apresentadas no capítulo

anterior ao relatar as concepções teóricas que orientam as atuais práticas pedagógicas

desenvolvidas com estes alunos. Olhar para a educação de autistas sob esse prisma

significa reconhecer que toda criança aprende e se desenvolve na relação que estabelece

com o outro e com os bens materiais e simbólicos que fazem parte da sua cultura. Assim,

podemos deixar de ver o aluno autista como um ser passivo no processo educativo e

desenvolvemos um olhar para além de suas condições sindrômicas. Este aluno passa a ser

um sujeito social que assume essa posição no processo de aprendizagem e na apropriação

da cultura como produtor de sua história na sociedade da qual faz parte.

2.2 O conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal

De acordo com seus pressupostos, Vigotski (1993) critica toda tentativa de

atomização da ciência em campos opostos, partindo da gênese dialética do movimento

entre o social e o natural. O homem deve ser visto como composto por ambos os fatores,

tanto sociais, como naturais, sem hierarquização de um sobre outro, todavia, atribuído um

papel determinante aos fatores sociais e culturais se são comparados aos estabelecidos

pelas leis da natureza. Parte deste pensamento, a unidade dialética do homem, a qual se

expressa também em termos da linguagem e do pensamento, da aprendizagem e do

desenvolvimento e da zona de desenvolvimento atual e proximal.

Vigotski afirma a existência de dois níveis de desenvolvimento que denomina de

nível de desenvolvimento real, que diz respeito às funções mentais da criança e que

resulta de ciclos de desenvolvimento já completos; e o nível de desenvolvimento

potencial, que determina as funções mentais que as crianças apresentam em situações de

atividades conjuntas sob orientação de um adulto ou em colaboração com pares mais

capazes.

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Da distância entre o nível de desenvolvimento real e o nível do desenvolvimento

potencial resulta a ZDP caracterizando o desenvolvimento mental prospectivamente.

Quando determinada função acontece na interação, possibilita-se que ela seja

apropriada e se torne uma função individual. Ao proporcionar este momento de interação

em que o aluno, com ajuda do professor ou com a ajuda de outra criança mais experiente,

realiza uma determinada atividade estamos antecipando o seu desenvolvimento.

A mediação realizada proporciona experiências no plano intersubjetivo, e a

imitação no aprendizado é descrita como recriação e não como mera reprodução o que

permite a Vygotsky atribuir a esse processo um papel fundamental, mais amplo e que não

se reduz a uma atividade mecânica, sem significado.

A imitação observada como uma recriação demonstra-se como uma ação contrária

a um dos princípios da psicologia clássica, em que a atividade imitativa da criança não é

indicativa de seu desenvolvimento mental. Desta forma, se torna também uma ação

contrária aos vários sistemas de teste de inteligência que consideram somente aquelas

soluções de problemas que os sujeitos realizam sem modelos, sem a ajuda de outros, sem

demonstração e sem fornecimento de pistas (FREITAS, 2001).

Vigotski iniciou seus estudos sobre ZDP em 1931, no laboratório, na Academia de

Educação Comunista em Moscou, no qual seu grupo estava envolvido em um programa

de pesquisas empíricas fundamentado na teoria histórico-cultural. Enquanto permaneceu

em Moscou, dedicou-se a conferenciar no Instituto Pedagógico Estatal de Leningrado.

Estas conferências eram principalmente associadas à disciplina da pedologia (conhecida

como “o movimento de estudo da criança” na literatura americana – a ciência

interdisciplinar sintética do desenvolvimento).

A mais antiga versão documentada sobre ZDP pode ser encontrada numa

conferência em Moscou, no Instituto Epshtein de Defectologia Experimental em 17 de

março de 1933 que teve como título: “Sobre a análise pedológica do processo

pedagógico”. Sua próxima versão está na síntese de Vigotski sobre a estrutura dos

processos do desenvolvimento sobre as questões de diagnóstico pedológico.

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Após estes eventos Vigotski utiliza-se do conceito de ZDP inúmeras vezes e em

uma de suas palestras no Instituto de Leningrado, voltada para a questão do brincar,

Vygotsky a considerou como tendo importância tanto quanto ao do ensino e da

aprendizagem na interdependência com o desenvolvimento, portanto, a brincadeira cria a

ZDP da infância.

Nos estudos sobre a ZDP, Vigotski afirma que o essencial em uma prática

pedagógica não é apenas os resultados de uma intervenção unilateral, mas sim todo o

processo que ocorre durante esta prática que determinam um estado de desenvolvimento

contínuo e conjunto. Vigotski faz a seguinte comparação:

Igual que el horticultor, que deseando determinar el estado

de su huerto, no tendrá razón si se limita a valorar los

manzanos que ya hay madurado y han dado fruto, sino que

debe tener también en cuenta los árboles en maduración, el

psicólogo, al valorar el estado del desarrollo, debe tener

obligatoriamente en cuenta no solo las funciones maduras,

sino también las que están en trance de maduración. No solo

el nivel actual, sino también la zona de desarrollo próximo

(VIGOTSKI, 1993 p.189).

O conceito de ZDP refere-se a como a participação do outro (professor ou criança

mais experiente) são fundamentais para a aprendizagem de todas as crianças. Para

Vigotski 1993 “la zona de desarrollo próximo tiene un valor más directo para la

dinámica de la evolución intelectual y para el éxito de la instrucción que el nivel actual

de su desarrollo” (p.239). Assim, as ações que inicialmente são exercidas com a ajuda do

outro, nas relações sociais, são internalizadas e transformadas em pessoais.

Wertsch (1985) considerou a noção de ZDP em duas direções – através de um

domínio teórico da atividade (amplamente leontieviano) e de um domínio semiótico

(bakhtiniano).

No domínio teórico da atividade, a ligação do conceito de ZDP com a noção de

“definição da situação” e “estruturas do objetivo” de parceiros na interação estabelece

contextos para investigações empíricas e leva o conceito para novos domínios.

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O domínio semiótico evidencia-se quando suas primeiras elaborações do conceito

de ZDP tomam a forma de análise das ações conjuntas adulto-criança ao mesmo tempo, o

reconhecimento da ênfase original de Vigotski na internalização e mediação semiótica

tem guiado o foco para os processos interpessoais que conservam suas raízes culturais nas

versões internalizadas – como processos dialógicos internos (Wertsch, 1985; Wertsch &

Stone, 1985).

Valsiner (1987) integrou o conceito de ZDP em seu sistema de explicação do

desenvolvimento sócio-cognitivo denotando o conjunto das possíveis transformações no

futuro mais próximo dos processos psicológicos presentes, condicionais com relação à

organização presente da estrutura. A ZDP é orientada a explicar as raízes sociais das

experiências individuais.

Rogoff (1990) desenvolveu o conceito de ZDP caracterizado por uma região

dinâmica de sensibilidade para aprender experiências em contextos de participação onde

os participantes estabeleceram seus papéis ativamente. Este processo de ação conjunta é

guiado por significados e propósitos e pode ser estudado adequadamente apenas em sua

forma dinâmica de processo que conduz ao desenrolar gradual dos eventos. Introduziu a

pesquisa microgenética sobre cenários da dinâmica conjunta de solução de problemas

onde a criança e o “outro social mais experiente” buscam seus objetivos. As pesquisas de

Rogoff se caracterizam por um sistema conceitual que une, a tradição em teoria da

atividade com a orientação e ênfase da abordagem histórico-cultural de Vigotski, aos

processos psicológicos.

Freitas (2001) caracteriza a ZDP como relevante parte inseparável de um

programa de investigação do desenvolvimento como processo dialético que unido a um

modelo teórico que se configura como sociogenético. Passa a ser orientado para o

movimento e para a história dos processos e que se funda nas dimensões cultural e

semiótica do funcionamento humano. Refere-se ainda sobre ZDP como um

desenvolvimento que ainda está em processo, que está por se consolidar no espaço

educativo.

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Fontana (1996) observa o espaço educativo como um local onde as mediações

intencionais promovidas pelo professor devem trabalhar com a heterogeneidade visando a

promoção de interações entre alunos. As prática educacionais que permitem o trabalho

em grupo proporciona o reconhecimento do outro e o de si mesmo que passam a atingir

níveis de desenvolvimento. O papel do professor mediador é o de atuar na zona de

desenvolvimento proximal dos alunos com o objetivo de desenvolver as funções

psicológicas superiores.

No espaço educativo evidencia-se que o conceito de ZDP apesar de ser utilizado

com uma freqüência muito grande, é caracterizado por uma visão muito simplificada.

Alguns autores contemporâneos passaram a utilizar o conceito de ZDP, com o intuito de

elaborarem diretrizes teóricas para práticas educativas.

Através dos processos de mediação e ZDP, as atividades educacionais com alunos

autistas, favorecem a construção de aprendizagens significativas que criam condições

favoráveis a estes alunos e não de maneira condicionada.

O conceito de ZDP na atuação pedagógica para autistas deve ser um fator

importante no processo educativo. Esta maneira de atuação faz com que estes alunos

sejam beneficiados com condições reais de aprendizagem. Seria viável se estes espaços

educativos passassem por um processo de transformação no sentido de proporcionar ao

aluno condições de acesso às questões sociais, deixando de lado os modelos educacionais

individualizados e independentes de forma que possa ampliar possibilidades reais de

desenvolvimento.

2.3 A ação educativa para autistas focada nas práticas sociais.

O diagnóstico do autismo é pautado nas dificuldades e limitações orgânicas

através de classificações que entre outras, partem das esferas sociais, ou seja, da falta de

interação social. Isto se torna visível, ao analisar os critérios de diagnósticos como o

CID-10 (Classificação Internacional de Doenças) publicado pela World Health

Organization (WHO,1992), ítem a:

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a- Lesão marcante na interação social recíproca,

manifestada por pelo menos três dos próximos cinco

itens:

1. dificuldade em usar adequadamente o contato ocular,

expressão facial, gestos e postura corporal para lidar com

a interação social.

2. dificuldade no desenvolvimento de relações de

companheirismo.

3. raramente procura conforto ou afeição em outras

pessoas em tempos de tensão ou ansiedade, e/ou oferece

conforto ou afeição a outras pessoas que apresentem

ansiedade ou infelicidade.

4. ausência de compartilhamento de satisfação com

relação a ter prazer com a felicidade de outras pessoas

e/ou de procura espontânea em compartilhar suas próprias

satisfações através de envolvimento com outras pessoas.

5. falta de reciprocidade social e emocional

(WHO,1992).

No DSM-IV - Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (Manual

Diagnóstico e Estatístico dos Distúrbios Mentais), da Associação Americana da

Psiquiatria (APA, 1994) a questão da lesão na interação social é econtrada no item 1:

1. Marcante lesão na interação social, manifestada por

pelo menos dois dos seguintes itens:

a. destacada diminuição no uso de comportamentos

não-verbais múltiplos, tais como contato ocular,

expressão facial, postura corporal e gestos para lidar com

a interação social.

b. dificuldade em desenvolver relações de

companheirismo apropriadas para o nível de

comportamento.

c. falta de procura espontânea em dividir satisfações,

interesses ou realizações com outras pessoas, por

exemplo: dificuldades em mostrar, trazer ou apontar

objetos de interesse.

d. ausência de reciprocidade social ou emocional

(APA, 1994).

Partindo dos critérios contidos nestes documentos, é possível observar a

classificação que envolve as pessoas autistas, rotulando e ampliando números de

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diagnósticos, através de uma visão de indivíduo imutável em relação ao seu

desenvolvimento.

Ao contrário, neste estudo, o que pretendo abordar é o fato que as dificuldades que

dizem respeito às relações com o outro e o mundo externo, presentes no autismo e que

trazem algum tipo de limitação ao ser humano, também é meio para que o sujeito autista

encontre maneiras de superar os obstáculos e alcançar o desenvolvimento de outra forma.

De acordo com Martins (2009), o papel constitutivo das relações sociais para

indivíduos autistas, que pode demonstrar um impedimento de reconhecimento da atuação

do outro, torna-se evidente a partir de sua formação que é afetada por este outro.

Vigotski (1997) mostrou uma nova forma de ver o homem, a deficiência, o

diagnóstico psicológico, enfocando no processo de desenvolvimento a esfera social como

imprescindível para a constituição da pessoa. As possibilidades de desenvolvimento e

aprendizagem ampliam-se quando se trabalha com a heterogeneidade, com atividades

significativas para o aluno na sua relação com o mundo e, com uma concepção de

deficiência que funciona como motivadora de mudanças. Critica a análise quantitativa da

deficiência e rejeita as abordagens voltadas à mensuração de graus e níveis de

incapacidade igualmente a suas criticas às teorias do desenvolvimento que concebem a

criança em referência ao adulto.

Em sua linha de estudos denominada defectologia9, sobre as anomalias congênitas

que afetavam os processos de socialização, considerou a deficiência um problema social,

através de uma ótica de que a criança não é menos desenvolvida, mas apresenta um

desenvolvimento especial.

Conforme já mencionado, apesar de Vigotski não ter um estudo voltado

especificamente para o autismo, em seus estudos de defectologia propõe explicações

analíticas sobre a deficiência que possibilitam um olhar diferente para a educação dos

autistas. Suas idéias sugerem ir além dos limites/impossibilidades do deficiente,

destacando as inúmeras potencialidades/possibilidades que podem surgir mediante a

9 As terminologias (deficiente, defeito, defectologia, débeis, retardados) utilizadas por Vigotski pode, à

primeira vista, parecer um tanto quanto pejorativos e estereotipadas em relação a estas pessoas, todavia, não

podemos nos esquecer do contexto histórico que influenciava este autor e dos objetivos libertários e

humanizadores tecidos sobre a edificação de cada um destes termos em particular.

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criação de caminhos alternativos de ensino-aprendizagem e um novo olhar que considere

que a criança autista não é menos desenvolvida do que outra criança tida por normal, mas,

sim, uma criança que se desenvolve diferentemente.

Orrú (2006) descreve que o autismo mesmo podendo gerar alterações temporárias

ou permanentes e que, em decorrência dele, possam surgir incapacidades refletidas no

desempenho e na atividade funcional da pessoa, os quais implicarão em desvantagens

para sua adaptação e interação com a sociedade, existe a possibilidade de haver

compensação para se conseguir um desenvolvimento psicológico significativo, nos casos

de deficiência e suas conseqüências.

Esta compensação vai depender da existência de relações sociais e das mediações

semióticas que tornam possível vencer os déficits. O social passará a sobrepor ao

biológico, Vigotski acaba atribuindo certas potencialidades aos deficientes, desde que as

condições materiais lhes ofereçam a possibilidade de se apropriarem do patrimônio sócio-

cultural produzido historicamente pelo homem.

Ainda analisando os estudos da defectologia, estes demonstraram que não era

suficiente determinar os níveis de gravidade e de insuficiência, sem organizar processos

compensatórios que podem ser substitutivos e niveladores no desenvolvimento. O meio

social tem papel fundamental no desenvolvimento da criança com deficiência, a partir do

momento que este possa possibilitar subsídios compensatórios sobre suas dificuldades

que visam equilíbrios nas funções adaptativas ao convívio social “el niño con defecto no

es inevitablemente un niño deficiente. El grado de su defecto y su normalidad depende

del resultado de la compensación social, es decir, de la formación final de toda su

personalidad” (VIGOTSKI, 1997, p. 20).

Esta compensação social consiste na reação do sujeito diante da deficiência e, no

caso dos autistas, deveria ter como finalidade superar suas limitações com base em

instrumentos como a mediação simbólica. Partindo deste pressuposto, as práticas

pedagógicas podem criar oportunidades para que a compensação social efetivamente se

realize, promovendo o processo de apropriação cultural. Estes caminhos alternativos que

buscam o desenvolvimento das funções psicológicas superiores devem ser apoiados em

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uma ação mediada que possa promover a substituição das funções lesadas por formas

superiores de organização psíquica.

A compensação também passa a ser justificada pela plasticidade do cérebro que

permite a criação de novas formações psíquicas e pelo caráter essencialmente social e

coletivo do ser humano. Para Vigotski (1993), os processos de compensação não são

guiados para uma suposta cura ou complementação do defeito, mas, sim, a sua superação

através de novas conexões inter-funcionais, uma supressão das dificuldades originadas

pelo defeito.

Desta maneira, a compensação e a plasticidade não se localizam no orgânico,

estão no indivíduo e no grupo social, são mediadas pelo grupo social e se realizam a

depender das relações sociais e das práticas sociais vivenciadas.

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37

CAPÍTULO 3

ATIVIDADES EDUCACIONAIS COM AUTISTAS NA ESCOLA ESPECIAL

3.1Caracterizando o ambiente de pesquisa e os sujeitos.

O trabalho de campo desenvolvido foi realizado com o intuito de identificar quais

eram as atividades educacionais propostas, como estas ocorriam, qual a atuação dos

profissionais envolvidos e quais os métodos de ensino utilizados com os alunos autistas

na escola.

Considero que olhar para as singularidades do processo de ensino-aprendizagem

de uma escola em específico pode mostrar indícios do processo geral que permeia a

educação de sujeitos autistas.

A escola especial focalizada situa-se no interior do Estado de São Paulo; trata-se

de uma instituição pública que direciona seu atendimento aos Transtornos Invasivos do

Desenvolvimento e todos os alunos são diagnosticados como autistas. A escola possui

oito salas de aula TID, uma equipe profissional que envolve oito pedagogas especialistas

em educação especial, oito monitoras educacionais, um educador físico, uma

fonoaudióloga, uma terapeuta ocupacional, uma psicóloga e uma assistente social, além

da equipe gestora composta por diretor, vice-diretor e coordenador pedagógico.

Pelo período de um ano acompanhei alguns programas educacionais oferecidos

para alunos diagnosticados como autistas na escola. Neste período realizei observações de

algumas situações de atividades educacionais realizadas em duas salas de aula. A sala de

aula 1 é composta por dois alunos, e a sala de aula 2 por três alunos. Estas observações

foram registradas em diário de campo e através de filmagens que posteriormente foram

transcritas.

Realizei também encontros com duas professoras (Márcia e Ana)10

e duas

monitoras (Alice e Sabrina) nos quais conversamos sobre suas práticas pedagógicas.

Estes encontros foram gravados e posteriormente transcritos.

A composição das aulas está organizada conforme mostra a Tabela 1:

10

Os nomes utilizados neste estudo são fictícios para preservar a identidade dos sujeitos.

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Sala 1 Sala 2

Professora: Márcia Professora: Ana

Monitora: Alice Monitora: Sabrina

Alunos: Adriano e Vinícius Alunos: Eduarda, Francisca e Priscila

TABELA 1: COMPOSIÇÃO DAS SALAS DE AULA.

Informações sobre os profissionais participantes estão relacionados na Tabela 2,

dos alunos na Tabela 3 e o número de sessões na Tabela 4.

Professoras e Monitoras

Professoras Formação Acadêmica Tempo de atuação

Sala 1 Márcia Pedagogia com Pós – Graduação em Educação Especial

– D.I.

2 anos e 6 meses

Sala 2 Ana Pedagogia com Pós – Graduação em Educação Especial

– D.I.

1 ano

Monitoras Formação Profissional Tempo de atuação

Sala 1 Alice Ensino Médio completo 6 anos

Sala 2 Sabrina Ensino Médio completo 4 anos

TABELA 2: PROFISSIONAIS PARTICIPANTES DA PESQUISA

Alunos

Alunos Idade Diagnóstico Tempo que freqüenta a Escola

Sala

1

Adriano 5 Autismo 3 anos e 6 meses

Vinícius 8 Autismo 4 anos

Sala

2

Eduarda 12 Autismo 8 anos

Francisca 8 Autismo 2 anos

Priscila 15 Autismo 7 anos

TABELA 3: ALUNOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

Sessões realizadas

Situação com os alunos em

sala de aula (Sala 1)

vídeo-gravado.

Situação com os alunos em sala

de aula (Sala 2)

Vídeo-gravado.

Reunião com professores e monitores

Áudio – gravada.

12 12 15

TABELA 4: SESSÕES REALIZADAS.

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Foram selecionados para apresentar neste estudo 20 episódios, sendo que 9

correspondem a situações com os alunos em sala de aula e 11 envolvendo reuniões com

as professoras e monitoras das salas de aula 1 e 2.

A análise do material levou ao estabelecimento de duas unidades temáticas

relacionadas aos objetivos propostos neste estudo, ou seja, conhecer quais são as

experiências que estão sendo proporcionadas aos alunos com diagnóstico de Transtorno

Invasivo do Desenvolvimento (autistas) pelas práticas pedagógicas atuais e apontar /

proporcionar possibilidades alternativas de educação destes alunos.

3.2-Explorando o ambiente educacional para alunos autistas na educação especial.

O ambiente educacional encontrado nas visitas realizadas à escola evidencia

práticas pedagógicas voltadas para a correção e manutenção de comportamentos. O

programa utilizado para o atendimento dos alunos é o TEACCH que foi implantado desde

a formação destas classes no ano de 2002. Nesta escola os alunos estão agrupados em

turmas de duas ou até três crianças. Cada classe possui um monitor educacional que

auxilia o professor e o terapeuta durante as atividades.

Os professores são orientados e capacitados pela AMA – SP, através de um curso

de formação continuada do programa TEACCH que é realizado periodicamente na

própria escola. Segundo informações destes professores, a maioria dos profissionais que

estão atuando na educação especial com os alunos autistas, não escolheu esta área de

deficiência para trabalhar. Seis professoras (do total de oito) estão atuando nestas salas

por estas estarem vagas e não possuírem a pontuação necessária para a escolha em outras

deficiências ou salas de recursos. Todas as professoras são especialistas em Educação

Especial, porém nenhuma possui formação específica para o atendimento ao TID. A

rotatividade de professores nestas salas também acaba tornando-se um problema, pois o

índice de desistência destas aulas, pedidos de afastamento ou transferência são constantes,

chegando a atingir uma média de quatro casos por ano de pedidos de afastamento.

Segundo a coordenadora pedagógica da escola, esta rotatividade de professores se

dá em função da alta complexidade sindrômica do autismo, as professoras normalmente

não se adaptam ao trabalho que é considerado por elas como um desafio muito grande.

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As atividades dos alunos estão focadas em uma rotina composta por atividades

que compõem o programa TEACCH, treinamentos com atividades de vida diária (AVD)

e terapias com fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional e educador físico.

As salas de aula são organizadas conforme o programa TEACCH de forma a

desenvolver comportamentos nos alunos que promovam a futura autonomia dos mesmos.

As estações de trabalho que também podem ser chamadas de área de trabalho individual

e até mesmo baia é um local onde os alunos permanecem trabalhando, individualmente e

cada vez mais independentemente. Quanto menos ajuda o professor precisar oferecer,

melhor a independência do aluno é avaliada. A figura 1 representa a área de trabalho

individual na escola campo.

FIGURA 1: ÁREA DE TRABALHO INDIVIDUAL I

A montagem de área de trabalho individual de uma sala de aula pode estar

estruturada de diferentes formas, porém, todas elas estão localizadas de frente para as

paredes com a finalidade de eliminar os “distratores” e estímulos visuais. As figuras 2, 3

e 4, são exemplos de estrutura utilizada para esta finalidade em diferentes escolas que

utilizam o programa TEACCH.

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FIGURA 2: ÁREA DE TRABALHO INDIVIDUAL II

FIGURA 3: ÁREA DE TRABALHO INDIVIDUAL III.

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FIGURA 4: ÁREA DE TRABALHO INDIVIDUAL IV.

As imagens apresentadas nas figuras acima mostram que os alunos permanecem

em uma posição que não favorece a relação com o outro (professores ou colegas) o que

impossibilita a aprendizagem nas relações sociais, que conforme Vigotski, constituem a

base para a significação do mundo e constituição do sujeito.

Recentemente, Martins (2009) destacou a importância da qualidade das interações

para a superação das dificuldades encontradas pela criança. Segundo a autora é o o meio

social que pode criar situações que impulsionam à superação de conseqüências do déficit.

Ao invés de possibilitar a interação com o outro as situações retratadas nas figuras

1, 2, 3 e 4, mostram que o aluno permanece o tempo todo olhando para a parede e para a

atividade que o aluno foi treinado para realizar de forma independente obedecendo a uma

série de critérios contidos no programa TEACCH em relação aos sistemas individuais de

trabalho.

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43

Nestas salas de aula, as mesas dos alunos são identificadas por cores para facilitar

a localização do aluno e as atividades são representadas por símbolos gráficos e cores

para que o aluno saiba, visualmente qual será a próxima atividade.

O planejamento das atividades ocorre de acordo com o nível de desenvolvimento

dos alunos, assim como seus interesses individuais e as necessidades familiares que

obedece três regras principais: manter as habilidades já existentes (comportamentos já

instalados e adequados), instalar as habilidades inexistentes (comportamentos que

precisam adequar-se) e re-educar as habilidades deficitárias (remodelar e ajustar os

comportamentos que não estejam satisfatoriamente adaptados ao meio.

Todas as salas da escola possuem uma agenda semanal de material variável e que

contem as atividades que serão realizadas. Esta agenda é situada em local bem visível

para orientar o aluno. As atividades são: dizer bom dia, atividades em mesas de trabalho

dependente (referentes ao que o aluno ainda está aprendendo naquele momento),

atividades nas mesas independentes, cozinha, oficinas, educação física, treino de rua,

treino de escola, musicoterapia, AVD (atividade de vida diária), AVP (atividade de vida

pessoal), apoio fonoaudiológico e comportamental.

Os objetos que compõem estas atividades são basicamente confeccionados com

sucatas e recicláveis.

Nas atividades realizadas na sala de aula é feito um registro pelo professor para a

comprovação de resultados com a finalidade de confirmar ou refutar hipóteses iniciais,

para realizar mudanças caso seja necessário. Os registros são anotados em um diário de

classe e mensalmente passados para um relatório de evolução padronizado da escola.

Os conteúdos dos relatórios abrangem anotações sobre as capacidades e as

habilidades que o aluno desenvolveu, manteve ou as dificuldades que revelou. Nestes

relatórios, é possível identificar quais as maiores dificuldades dos alunos e quais as

expectativas que superou e em quais aspectos o professor deve dar mais atenção.

Psicólogo, terapeuta ocupacional, fonoaudiólogo e educador físico fazem seus

atendimentos nas salas de aula e em outros momentos individualmente (conforme a

necessidade individual do aluno). Suas funções e objetivos de atuação estão determinados

pelo programa TEACCH. O psicólogo realiza a aplicação do programa TEACCH, nos

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sistemas de trabalho na sala de aula. Realizam a análise do comportamento dos alunos e

oferecem também assistência e treinamento aos pais. Realizam ainda intervenções grupal

em sala de aula na estimulação de habilidades comunicativas, controle de estereotipias e

aprimoramento das interações sociais. O fonoaudiólogo auxilia os professores em relação

à estimulação da fala, supervisiona os momentos de alimentação e higiene dental. A

professora de educação física estimula a parte motora dos alunos através de técnicas

próprias para desenvolver cada habilidade e atividades de psicomotricidade. O serviço

social orienta as famílias em relação à aplicação do TEACCH nas residências dos alunos

realiza também encaminhamentos médicos e solicitações de preenchimento de

documentos de caráter administrativo.

Neste cenário educacional, foram realizados 24 sessões de vídeo-gravação

envolvendo duas salas de aula com alunos autistas e 15 sessões áudio-gravado realizadas

com as respectivas professoras e monitoras.

Para melhor organizar o estudo, selecionei 20 sessões: 09 vídeo-gravado com

alunos e 11 audio-gravado com professores e monitores (outras observações foram

registradas em diário de campo e depois transcristas) e as dividi em duas unidades

temáticas: Práticas convencionais e Práticas desejáveis.

3.3 Observando as práticas pedagógicas e conversando sobre elas com as

professoras

Durante a pesquisa pude constatar inicialmente como encontravam-se as práticas

pedagógicas na escola, quais as concepções das professoras em relação às atividades

escolares e sobre os alunos. Com o passar dos meses estas atividades escolares passaram

a ser questionadas pelas próprias professoras que foram impulsionadas por minha

presença durante as aulas que fez com que elas passassem a repensar outras atividades

descobrindo novas possibilidades educacionais.

Visando um maior aprofundamento nestes dois momentos, dividi todo o conteúdo

registrado em duas unidades temáticas que permitem em um primeiro momento constatar

a realidade educacional vivenciada pelos professores da escola através da unidade

temática Práticas convencionais . Em um segundo momento, a unidade temática é

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denominada Práticas desejáveis onde justamente estas professoras passam a criar

momentos diferenciados de aprendizagem.

1. Práticas convencionais.

Episódio 1: “Trabalho individual ” .minha presença como motivo de desencader

Ao iniciar as filmagens, Eduarda e Priscila fixaram-se com o olhar sobre o

equipamento de filmagem e se recusavam a ficar em suas posições. Após a monitora

colocar as alunas em seus respectivos lugares, a aula teve seu início.

Naquele momento estas alunas foram levados até a agenda e logo foram

conduzidas à área de trabalho individual.

Priscila posiciona-se em sua estação de trabalho e começa a realizar pranchas.

Uma sequência de atividades de depósito, encaixe e pareamento de cores já havia

sido colocada pela professora sobre um espaço visível para que a aluna iniciasse

independentemente a atividade colocando o material em cima da mesa a sua frente.

Percebo em determinado momento, que a aluna realiza as atividades de maneira

automática e em certos momentos não realiza de maneira correta (mesmo assim não há

interferência do professor); durante o período de atividade não existe nenhum contato

com a professora.

Ao finalizar a atividade pergunto para a professora: Quais os objetivos destas

atividades?

Professora: Eu acho que o mais importante aqui é ela saber que tem que ficar

sentadinha fazendo a atividade porque antes ela não sentava sozinha, tinha que eu, a

monitora, forçar ela sentada. Mas ela ta discriminando cor e forma nestas pranchas.

Permaneci por cerca de vinte minutos na classe e as atividades permaneciam as

mesmas, porém, com objetos de outros formatos. Logo a atividade terminou, neste

momento os alunos passariam para a atividade de musicoterapia.

Episódio 2: “Treino de escola ” .

Seguindo o esquema da rotina de agenda diária, acompanhei uma atividade

chamada Treino de escola, onde os alunos autistas passaram a andar pela escola na

companhia da Professora e da Monitora.

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Ficaram caminhando por cerca de 20 minutos e retornaram à sala de aula passando

a aguardar pelo atendimento com fonoaudióloga.

Episódio 3: “Apresentação da escola pelos professores”.

Este episódio refere-se a uma reunião que ocorreu na sala dos professores após o

período da aula, 15 minutos antes de darem início às reuniões de HTPC (Horário de

Trabalho Pedagógico Coletivo) da escola. O intuito do encontro foi o de me apresentar e

conhecer um pouco do trabalho que estas professoras desenvolviam em sala de aula com

os autistas, assim como sua trajetória profissional.

Após a apresentação da pesquisadora, as professoras demonstrando ansiedade,

passaram a se apresentar e falar como iniciaram a atuação profissional com alunos

autistas.

Márcia: Olha, pra mim ta valendo muito essa nova oportunidade de conhecer

outras áreas de deficiência e aprender como trabalhar de outro jeito. Na verdade eu só

tinha ouvido falar em autista na faculdade quando um grupo apresentou um trabalho

sobre autismo... como eles eram, assim, quem descobriu.

Pesq.: Você escolheu trabalhar com os alunos autistas?

Márcia: Imagina... [risos e uma breve pausa] Não tenho pontuação suficiente para

estar em outro lugar, mas nunca se sabe né, era para eu estar aqui, apesar de muita

coisa como falei antes o bom é que tô tendo experiências novas. Já tô aprendendo

trabalhar com estes alunos, tem bastante material. A escola também é boa, bem

organizadinha.

Ana: Eu já to trabalhando com autista dois anos e meio. Já to acostumada [risos].

No começo é tudo diferente, eles são diferentes, o jeito de trabalhar é diferente, mas

acostuma e a gente aprende. As meninas [apontando para as monitoras] dão a maior

força pra gente aqui.

Márcia: Acho que eles já acostumaram comigo, no começo foi difícil, pensei em

largar tudo mas logo a coordenadora foi explicando o porque dos alunos serem daquele

jeito e fui entendendo como se trabalha com eles também. A Alice me ajudou muito no

começo viu, ela conhecia bem os alunos.

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Alice: Aaaa, esses meninos eu conheço bem viu [risos].

Episódio 4: “Sobre os alunos”.

Ana: Eu trabalho com 2 alunos: o Adriano e o Vinícius, um tem 5 e o outro 8. Os

dois são só autistas. O Adriano não para quieto, no ano passado deu maior trabalho

para a professora dele. Saia correndo pra escola, tinha que segurar ele na cadeira e aí

vai... Olha que já é o terceiro ano dele aqui na escola.

Márcia: Eu to com 2 meninas e 1 menino : A Eduarda, a Priscila e o Murilo. To

com todas as meninas da escola [risos]. Só a Eduarda é autista e cega, a Priscila e

Murilo são só autista mesmo. Meu problema é a Eduarda que do nada se não toma

cuidado leva um tapão. Ela é bem agressiva e tá ficando grande demais.

Pesqu.: Qual é a idade deles?

Márcia: A Eduarda ta com 15, a Priscila tem 12 e Murilo, 13.

Ana: Já tive muitos problemas aqui com essa questão da agressão, ainda bem que

o Adriano parou com isso, daquele tamainho, 5 não segura pra conter. O problema é que

daí os outros também começam a surtar. E o dia de aula já era.

Pesqu.:Me fala sobre o dia de aula.

Ana: Aaaaa, é aquilo que você já sabe, né! Os alunos possuem uma agenda que

na verdade é a mesma de dois anos atrás com as atividades. Aprender, escovar dentes,

lanche e aí vai. Só que estamos exigindo mais do Adriano, no sentido de pegar os

sinalizadores. Ele não ta fazendo direito, toda hora tem que fazer mão na mão.

Márcia: A minha maior dificuldade é com a Eduarda mesmo. Por ser cega to

usando objetos concretos pra agenda, mas ta muito difícil trabalhar isso com ela. Ela

não demonstra interesse por nada, fica cantando e querendo fazer treino de escola. Só

quer passear. Não ta querendo nem ir pra fono, aliás ela ta com um comportamento

muito difícil.

Episódio 5: “Rotina diária ”

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Professora: Todo dia é a mesma coisa, sempre tem uma coisa para consertar

[risos]. Tem que estar tudo bem arrumadinho aqui para eles. [a professora segura uma

prancha de transporte que foi descolada pelo aluno]

Pesqu.: Você está falando em relação à organização da sala?

Professora: Sim, uma das coisas que temos que tomar cuidado é com isso. Tem

que estar tudo bem organizado. Só não sei como é na casa deles [risos].

Pesqu.: Vocês possuem grupo de pais aqui?

Professora: Nada, desistimos! Não dá pra saber nem o que se passa em casa. Tem

dia que o caderninho de comunicação não vem vistado. Mas sobre o que estávamos

falando, acho que em casa não tem como deixar desse jeito não, a mãe falava que ele

destruía tudo. Poréeeeeeeem, aqui tem que tá tudo certinho, se não eles não aprendem.

Pesqu.: E o dia como foi hoje?

Professora: O mesmo de sempre. O que eles já sabem fazer, já fazem é dar

manutenção para não regredir. Com o Adriano estou fazendo uma prancha nova para

trabalhar a discriminação de cores e o com o Vinícius transporte e encaixe.

Professora: Do resto tudo bem, eles estão fazendo toda a rotina do dia, AVD, mas

tem hora que tem que forçar um pouco. Ainda bem que as meninas [referindo-se às

monitoras] ajudam bastante. Amanhã seria um dia bom pra você começar com sua

pesquisa aqui; a T.O. não vem e vou passar mais tempo com ele na sala de aula. Ai você

vê o que tem que fazer. Se quiser filmar a aula tudo bem.

Combinamos para o dia seguinte uma sessão de filmagem com os alunos.

Episódio 6: “Outra atividade ”.

A reunião deste episódio ocorreu na sala de aula da professora Ana, no final da

aula.

Participantes: 1 Professora (Ana) e Pesquisadora.

Professora: Gostou da atividade ontem? Elas estão uma belezinha né! Precisa ver

como melhoraram o comportamento.

Pesqu.: Elas realizaram as atividades com pranchas.

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Professora: Agora você precisa ver os meus meninos. Que também estão bem

(tirando os imprevistos)[risos]

Pesqu.: Será que amanhã posso acompanhar uma atividade com a sua sala?

Professora: Sim claro. Só não sei como eles irão reagir com a sua presença. Pode

ser que eles nem te notem mas também pode ser que você mude um pouco da rotina deles

[risos]. Mas não se preocupa não, eu e a Sabrina [monitora] colocamos a sala em ordem

novamente e eles sabem que tem que fazer tudo certinho.

Pesqu.: O que os alunos vão fazer amanhã?

Professora: Nada de novo, completar a rotina diária, de novo já basta sua

presença né Josi [risos]. Não podemos ficar fazendo surpresas para eles não tudo que sai

da rotina, tipo, o “novo” não é muito bom não. Os autistas têm essa coisa com a rotina,

não pode sair dela, aqui na escola e nos cursos de formação, sempre falam que os

autistas não possuem entendimento igual o nosso, precisam de tudo bem previsível. Igual

o método proporciona né. Principalmente a organização visual.

2. Práticas desejáveis

Episódio 7: “Práticas pedagógicas ”.

Professora: Para amanhã, pensei em uma atividade mais prática para aplicar em

sala de aula. Suas visitas aqui na escola estão me levando a pensar que toda vez que

você vem sempre é feito a mesma coisa e talvez você esteja procurando novidades [risos]

, aqui não tem novidades mas eu acho que seria interessante pra você alguma coisa

diferente.

Pesq.: O que você chama de diferente?

Professora: Não sei também, mas algo que não seja tudo o que você já viu e que

nós fazemos diariamente. Na verdade nem sei se posso fazer algo diferente com estes

alunos, mas vou tentar.

Pesq.: Amanhã estarei aqui.

Professora: Vou pensar em alguma coisa bem legal pra gente fazer, mas se der

errado, não conte pra ninguém [risos].

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A professora demonstrava certa ansiedade, porém era visível a vontade de propor

algo novo para realizar em sala de aula.

Achei melhor encerrar a conversa e deixar a professora preparar sua “aula

diferente”, pois não queria interferir em suas escolhas.

Episódio 8: “Aprender diferente ”.

A atividade diferente foi o trabalho com o conceito de quente e frio, através de

dois recipientes contendo água gelada e água quente.

Quando entrei na sala a mesa do “aprender” estava em local diferente e nela os

potes de água e a professora estava dando início à aula:

Professora: Olha, põe a mão. Aqui ta gelado. Gelado! [apontando para os

recipientes de água].

Professora: Quente! Põe a Mão aqui. Quente e gelado.

O aluno coloca as mãos na água e leva à boca.

Professora: Qual ta mais gostosa?[Neste momento o aluno tenta levanta-se da

cadeira].

Professora: não, senta aqui. [O aluno levanta-se e vai até a janela da sala de aula].

Professora: Vinícius, vem aqui, vem! Se não você não vai ganhar docinho!

Professora: Você quer docinho? Vinícius! [O aluno permanece olhando pela

janela fora].

Professora: Vinícius! Ó, o que estamos fazendo? Estudando, ó.

Professora: Vamos estudar. Vem sentar aqui. [a professora demonstra um certo

nervosismo

Pega o aluno pela mão].

Professora: Estudar! [Conduz ele até a mesa onde estavam realizando a

atividade].

Professora: Vem, vamos estudar. [A professora solta o aluno e ele volta até a

janela, novamente a professora dirige-se até o aluno, segura pela mão e o conduz para sua

cadeira].

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Professora: [iniciando novamente a atividade] Qual você gosta mais? Desta ou

desta? [O aluno emite alguns sons, tira as mãos da água e leva até a boca. A professora

enxuga as mãos do aluno e encerra a atividade].

Episódio 9: “Repensar suas práticas ”.

Professora: Sabe, semana passada a atividade da água me fez pensar muita coisa,

de início achei que aquilo nunca fosse dar certo mas até que foi bom por ser diferente.

Mas também não sei até que ponto o diferente é bom nestes casos.

Pesqu.: Nestas práticas “diferentes”?

Professora: Sim, na verdade não é assim que devemos trabalhar mas eu acho que

poderia ser bem legal ousar neste sentido.

Neste momento a monitora passa a participar da reunião:

Monitora: Viu que aquele dia o Vinícius adorou brincar com a água.

Professora: Depois da aula deixei ele ficar colocando a mão na água, sabe né,

autista adora água.

Monitora: O problema foi tirar a água dele [risos].

Episódio 10: “Possibilidades” .

Professora: Nós aqui da escola queremos tentar fazer algo diferente porque a

gente sente que eles estão cansados já, ficamos pensando: será que pode fazer algum

outro tipo de atividade sem estar no método TEACCH? O que passam aqui na escola e

também quando a gente freqüenta os cursos de autismo é que autista só pode ser

trabalhado com esse método porque de acordo com o diagnóstico deles eles não

conseguem aprender de outra forma mas pensamos que podemos tentar realizar uma

outra atividade, tipo meia hora por dia.

Pesq.: Como seriam estas atividades?

Professora: Ainda não sabemos, queremos deixar eles um tempo junto com os

outros alunos da escola, pensamos em dar alguma brincadeira.

Pesq.: E dentro da sala, vocês pensaram em alguma outra atividade?

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Professora: Ainda não sabemos mas tenho vontade de colocar música de criança

e não música de musicoterapia.

Pesq.: E em relação às atividades pedagógicas?

Professora: Vamos fazer o seguinte: primeiro vou deixar eles brincarem com as

crianças e também vamos dar música diferente de criança pra eles. Vou tentar falar mais

com eles na sala, primeiro com o Adriano e dar a música, depois eu vou pensar em

alguma coisa no aprender de diferente.

Monitora: “uma coisa de cada vez né”

Episódio 11: “Experiências ”.

Professora: Então, hoje foi legal! [risos].

Monitora: Achamos que eles iam surtar

Professora: Na hora da musicoterapia, coloquei um CD da Xuxa e comecei a

dançar, o Vinícius tapou os ouvidos e o Adriano adorou!!!”. Tirei ele e começamos a

dançar ele pulava, pulava. Ai tinha uma música que mandava bater palmas eu batia e ele

também batia, ai eu percebi que ele fazia o que eu fazia, me imitava”

Monitora: Ele gostou porque ria toda hora o Vinícius agiu indiferente

permaneceu sentado, mas vamos pegar ele também.Preferimos não mexer nele.

Pesq.: Conseguiram realizar mais alguma atividade?

Professora: Deixamos eles brincarem também, gostaram, viu!

Pesq.: E em relação ao pedagógico?

Professora: ele o Adriano faz pasta com as letras do nome dele eu acho que

poderia fazer algo com relação ao nome dele o que podemos fazer sem ser na prancha?

O que você acha do alfabeto móvel e encaixe?

Pesq.: Eu acho que seria uma boa sugestão, mas como iriam ser feitas estas

atividades? Será que podemos fazer diferente? Juntos professor e aluno?

Professora: Ah acho que da pra fazer no aprender e ir falando com ele, diferente

de um aprender, mas vou tentar amanhã então.

Episódio 12: “Mudança da mesa aprender ” .

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A atividade teve início com a apresentação de uma caixa contendo um alfabeto

móvel. A proposta para a atividade seria a de proporcionar um momento de aprendizagem

diferente do que ocorria anteriormente.

O que me chamou a atenção foi que a mesa do aprender que antes ficava em um

canto da sala de aula, passou a ocupar seu centro, a professora também passa a se

comunicar e tentar interagir com o aluno a todo momento:

Professora: Adriano eu quero o A [após tirar todas as letras da caixa].

Professora: A

Adriano: A [identificou a letra e ficou segurando na mão].

Professora:E

Adriano: E [fixou o olhar na caixa].

Professora: Cadê o e

Adriano: E [identificou a letra e segurou com a outra mão].

Professora: isso querido.. agora o i

Adriano: i [identificou também a letra i, neste momento colocou as duas outras

letras na mesa e segurou a letra i]

Professora: o

Adriano: o[pegou a letra “o” juntou com as letras “a” e “e” que estavam na mesa].

Professora: u [já apontando a letra e colocando junto com as outras].

Professora: então fala agora, fala. A, e, i, o, u.

Adriano: a, e, i, o, u, u, o, i, e, a. [falando e apontando a letra com o dedo].

Professoras: [risos].

Neste momento a professora juntou todas as letras e separou as letras do nome de

Adriano e colocou-as em sequencia:

Professora: e aqui, o que ta escrito?

Professora: o que q ta escrito aqui [apontando].

Adriano: água

Professora: não,ta escrito Adriano.

Professora: Adriano.

Adriano: Adriano

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Professora: onde ta escrito Adriano? [apontou o nome do aluno]

Agora a professora juntou todas as letras novamente, mas propôs algo diferente:

Professora: então escreve água

Professora: a

Professora: o a [apontou a letra “a”]

Adriano: a [separando a letra]

Professora: água

Adriano: água

Professora: é, vamos escrever água

Adriano: água, água

Professora: a

Adriano: água

Professora: o g cadê o g

Professora: o g aqui

Adriano: g [juntou a letra “g”].

Professora: e agora?

Adriano: g

Professora: u cadê o u, u

Adriano: u [localizou a letra “u” e também juntou á palavra que estava sendo

formada].

Professora: a

Professora: outro a?

Adriano pegou a letra a e segurou na mão fazendo alguns movimentos.

Professora:coloca o a aqui, isso mesmo [o aluno colocou a letra no loca].

Professora: agora lê

Professora:água, então lê

Adriano: água [apontando com o dedo a palavra].

Professora: [risos].

Adriano: [risos].

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Episódio 13: “Um espaço para a brincadeira”.

Nesta atividade, a professora colocou os alunos frente a frente no espaço de

descanso e ofereceu a estes alunos uma porção de objetos, jogos de encaixe e bonecos.

Esta foi uma atividade nova, uma vez que a área de descanso não era usada com o intuído

de desenvolver uma atividade lúdica coletiva.

A professora, junto com a monitora, também sentaram-se e passaram a oferecer

estes objetos aos alunos.

Vinícius segurou um sino com detalhes em metal e passou a utilizá-lo com

movimentos repetitivos. Adriano por sua vez começou a empilhar peças de um jogo de

encaixe.

A todo momento a professora e a monitora passavam “tentando” estabelecer

algum contato com eles diante destas situações. A professora passou a procurar peças de

encaixe e entregá-las para Adriano que passou a esperar pela professora toda vez que

precisava da peça. Já Vinícius foi levado a trocar de objeto uma vez que a monitora

passou a fazer sons com outros objetos (tampinha de panela e chaveiro).

De uma forma diferente, aqueles alunos permaneceram por 15 minutos

manipulando objetos, empilhando e também explorando todo o conteúdo desses objetos

através de uma grande interatividade com a professora e com a monitora.

Episódio 14: “Mudanças”.

Professora: Depois que introduzimos estas atividades na rotina.

Pesqu.:Quais atividades?

Professora: Musicoterapia diferente, a hora de brincar/lazer e o aprender com a

mesa diferente. A no aprender não fazemos só as pranchas que eles irão trabalhar, como

aquele exemplo da água outras coisas, o alfabeto, já fizemos um jogo também. Então

esse tipo de atividade que deu uma nova inspiração no trabalho [risos]. Sei que é pouco

mas é algo diferente, então eu conversei com a Marcia sobre o que eu estava fazendo

aqui e depois conversei com a coordenadora. Tive que falar pra ela né.

Pesqu.: A coordenação da escola sabe destas alterações que você está fazendo na

rotina das crianças?

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Professora: Sabe sim, aliás não tinha como não saber, minha sala ta muito

barulhenta – a música, os brinquedos pro chão, gritaria ( no bom sentido lógico)[risos].

Pesqu.: E o que a coordenação da escola está achando deste novo tipo de

atividade?

Professora: Sabe, apesar da escola usar o método TEACCH, na verdade o

professor tem bastante credibilidade, não sei se é medo da gente sair da escola ou pedira

afastamento ou outra coisa. Prefiro acreditar na credibilidade como profissional, então

se ela percebe que ta dando certo, tem que investir, mas assim como nós, não sabemos se

isso tem algum nome difernte, ou como enquadraríamos estas atividades. Nem a

coordenadora não sabe, mas se ta fazendo bem então vale a pena.

Vale ressaltar que esta sessão foi realizada cerca de 15 dias após as primeiras

mudanças de atividades. Combinamos que as próximas sessões seriam realizadas

mensalmente.

Episódio 15: “Continuidade com a proposta”.

Pesqu.: Pode me falar sobre as práticas pedagógicas?

Professora: Agora posso. Posso falar que não são as mesmas de dois anos atrás

[risos]. Não só minha sala, mas todas da escola, agora possuem além do espaço lúdico

em sala de aula, possuem também um espaço com parquinho na área externa da escola,

onde foi instalado um escorregador, dois balaços e um gira-gira.

Professora: Percebemos essas crianças que antes ficavam mais quietas, agora

estão mais falantes. Até entre eles parece que existe uma “troca”. Não é que estamos

fazendo milagre não. É que tá bem nítido como estes alunos estão bem melhor. Lógico

que o tempo pra isso é ainda bastante curto por conta de todas as terapias, mas melhor

que antes está.

Pesqu.: Todas as professoras aprovaram estas mudanças?

Professora: Com quem eu converso e tenho mais contato, sim. Ainda tem bastante

coisa pra mudar, não sei como nem quando mas que tá melhorando, tá sim.

Episódio 16 “Brincar e aprender”

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Professora: Venha Eduarda, vamos brincar! Olha o sininho aqui que você gosta!

A professora pega uma caixa que contem diferentes brinquedos e espalha sobre o

chão. A aluna senta-se e começam a pegar diferentes brinquedos.

Professora: O seu sininho tá aqui, mas olha, aqui tem outras coisas que você

gosta que também faz barulho diferente olha esse colar. É bonito? [a professora coloca o

colar em seu pescoço] . Fiquei bonita Eduarda?

Eduarda: Fiquei bonita Eduarda?

Professora: Olha, aqui tem um espelho. Vou colocar em você e aí você vai se ver

no espelho! [a aluna não quis colocar o colar no pescoço, ficou segurando na mão e

estava atento ao barulho que o colar produzia ao ser manipulado pela aluna].

Professora: Põe o colar, olha que bonito vem [a aluna permite que a professora

coloca o colar, em seguida olha para o espelho por alguns segundos, tira o colar e coloca

no pescoço da professora].

Professora: você quer que eu use o colar? Vou usar então.

Eduarda sorriu e sentou-se novamente no chão. Pegou uma boneca e ficou

segurando-a pelos cabelos olhando para o espelho, em seguida deu a boneca para a

professora.

Episódio 17 “Brincar de imitar”

A professora da classe permanece sentada ao chão com Eduarda e Priscila.

Eduarda segura um sino nas mãos e Priscila uma tampa de io io quebrado. A monitora

chega com uma caixa contendo brinquedos (copos e xícaras).

Monitora: Olha bem o que eu trouxe pra gente brincar de tomar cafezinho!

Professora: Que delícia! Eu quero! Você quer Eduarda?[Eduarda afasta-se da

professora e continua a manipular o sino].

Professora: Vem Eduarda, vem tomar chazinho. Que gostoso esse chá ! [A

professora senta-se em frente a aluna e leva a xícara até a boca simulando beber chá.

Eduarda fica observando a situação].

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Monitora: Segura na sua mãozinha a xícara. [Coloca a xícara na mão de Eduarda,

em seguida Eduarda leva a xícara até a boca].

Professora: Isso! Você está fazendo igualzinho a mim de novo. Estamos brincando

de tomar chá.

Pesquisadora: Por que de novo? Ela está imitando você em outros momentos?

Professora: Você sabe né, quando estamos brincando estamos falando com eles a

todo momento para dar sentido no que estão fazendo e também além de ficar falando,

vamos fazendo gestos com objetos que usamos e muitas vezes eles imitam o que fazemos.

E isso não é só enfileirar ou empilhar objetos como fazíamos antes para ensiná-los a

brincar, estamos incentivando eles a pegar outras coisas. Na musicoterapia eu vi que o

Adriano também imita a professora dançar e pensamos que eles também poderiam imitar

alguma coisa na brincadeira. Isso é bom porque parece que eles estão entendendo

mesmo sem muito sentido, só imitando.

Episódio 18 “Playgrond”

Professora: Vamos brincar lá fora crianças [ Adriano já levanta-se da cadeira e

sai correndo da sala para o local de lazer externo: o playground].

Professora: Sem correria, pode esperar.

A monitora sai correndo atrás do aluno que já estava sentado em um balanço.

Professora: Adriano, que pressa é essa? Toda vez é isso!

Professora: É só falar vamos brincar lá fora que ele sai correndo e nem nos

espera. Nem da tempo de olhar na agenda pegar o sinalizador11

, nem mesmo dar o apoio

visual com a figura que fizemos. Eu falo: vamos brincar lá fora, e ele sai correndo com

os ouvidos tampados com suas próprias mãos e tem hora também que ele olha pra mim

fecha os olhos por alguns segundos e em seguida sai correndo pois sabe também que eu

vou gritar para ele não sair correndo. Parece que ele fica me esperando. O problema

“ou não” é que estamos falando mais com eles e quando vou até a agenda para ver a

11

Método utilizado pelo programa TEACCH que indica mudança de atividade.

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próxima atividade falo o que vai fazer e antes de eles estarem conferindo eu já falei o que

vai ser feito e aí acontece isso que você acabou de ver.

Monitora: Eles estão ficando espertos isso sim. Tá dando trabalho pra gente!

Professora: Estão dando trabalho mas pelo menos parece que estão entendendo e

mostrando que são espertos.

Os alunos juntamente com a professora e a monitora ficaram cerca de 30 minutos

no playground. Adriano ficou o tempo todo no balanço, enquanto Vinícius dividiu seu

tempo permanecendo um certo período próximo a grade (observando e tocando-a com um

pedaço de madeira) e depois na escada do escorregador.

A professora disse que em outros dias, as classes juntam-se nesta área de lazer e

são proporcionados momentos de brincadeiras coletivas.

Episódio 19 “Tinta e papel”

Buscando realizar outros tipos de atividades, as professoras oportunizaram aos

alunos um momento diferente em sala de aula, onde coletivamente os alunos participaram

de uma atividade onde os alunos iriam preencher com tinta verde um cartaz sobre o tema

meio ambiente que seria usado para decorar a escola.

Segundo a professora da classe esta atividade seria bastante ousada, mas estavam

pensando em olhar positivo para os aluno.

Sabiam que Adriano não gostava da textura da tinta, pois em outra escola a

psicóloga tentou carimbar a mão do aluno com o uso de tinta e ele entrou em crise (consta

em registro de acompanhamento psicológico).

Professora: Agora vamos pintar com o pincel. Olha que lindo a cor verde da

mata.

Adriano passou a fixar o olhar para a tinta que estava em um recipiente no centro

da mesa de atividades coletivas. A professora iniciou a pintura e ofereceu o pincel ao

aluno:

Professora: Olha Adriano, segure o pincel para pintar.

Adriano: Sai daí. [Recusou o pincel e continuou com olhar fixo para a tinta].

Professora: Eu vou pintar, olha que bonito que está ficando? É tinta Adriano.

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A professora com o uso do pincel, passou um pouco de tinta sobre a mão de

Adriano que ficou parado olhando para a tinta em sua mão.

Adriano permaneceu olhando a tinta por cerca de 5 minutos e depois limpou a

tinta em sua calça.

Professora: Não Adriano, não limpar na calça!

A professora continuou pintando e todo momento descrevendo o que fazia.

Novamente a professora passou um pouco de tinta sobre a mão de Adriano que

imediatamente limpou sua mão na folha onde estava sendo pintado.

Professora: Isso Adriano, pinta com a mão então!

A professora da classe comentou estar satisfeita por fazer uma atividade que já

pensava em fazer com eles. Apesar de não terem uma participação efetiva na pintura, a

professora comentou que ficou surpresa com as atitudes de Adriano em relação ao contato

com a tinta:

Professora: Juro que pensei que ele fosse surtar. Olha só, se eu ficasse presa

nesses relatórios eu nunca iria fazer esse tipo de atividade com ele de medo q ele tivesse

uma crise. Isso me indica que posso aperfeiçoar e oferecer outras atividades para eles,

não só a brincadeira e a música de criança, mas estas atividades com papel e tinta

também. Quem sabe uma colagem?

Episódio 20 “Mudanças”

Nesta reunião passamos a rever como foram as mudanças nas práticas

pedagógicas que ocorreram e como contribuíram para momentos diferentes nas atividades

escolares.

Professora Márcia: Eu acho que tudo está sendo muito válido, foi válido. Não sei

te falar o que eu fiz em termos de método,mas eu acho que passamos a acreditar mais

nos alunos mesmo com todas as limitações deles. Eu to pensando muito nisso e também

como podemos repassar essas experiências para outros alunos.

Professora Ana: Ta mais natural. Nós temos o método TEACCH mas eu acho que

a maneira que passamos a conduzir as aulas foi bem mais produtivo. Eu confesso que no

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início eu estava falando com as paredes e que proporcionar alguma coisa diferente pra

eles era impossível porque a gente sabe das limitações dele. Mas também já estávamos

cansadas de trabalhar daquela maneira mecanizada, você sabe que tem professor que

não agüenta isso. Aliás nem os alunos também.

Pesquisadora: O que é que vocês acharam que foi bom e o que foi ruim neste

período que como a Márcia disse, vocês ousaram com os alunos.

Professora Márcia: Então Josi, foi ousar mesmo. Ousamos mudar um pouco

aquilo que estávamos fazendo há alguns anos e que nunca enxergamos um avanço

significativo. Eu chamo aqui de significativo quando eles não estão repetindo de maneira

mecanizada um movimento, um encaixe ou um comportamento de uma forma dentro do

nosso programa. Quando ela me imita numa brincadeira por exemplo eu consigo ver que

é numa situação onde eu não tenho o objetivo de fazer ela repetir mas sim ela teve a

iniciativa. É bem diferente quando a gente quer condicionar um comportamento e

quando ela imita por iniciativa dela própria. Parece que ela ta aprendendo assim por ela

com a nossa ajuda claro. Ela não ta aprendendo só pela gente quando estamos

moldando alguma coisa.

Professora Márcia: Voltando à questão do que estávamos conversando é isso que

eu acho de bom, mudar o jeito de ensinar de trabalhar com mais prazer, olhando para os

alunos e começar a pensar que eu posso dar aula de outro jeito. Mas por outro lado, fico

totalmente perdida de como registrar isso porque as atividades antes só no TEACCH,

apesar que ainda estamos nesse método, mas proporcionando estas outras atividades

fica difícil como eu apresentar de uma maneira formal nos relatórios como estou

trabalhando. Não posso colocar brinquedoteca, área de lazer da maneira que estou

fazendo, porque não estou ensinando brincar nem musicoterapia como foi passado pra

gente e do jeito que fazemos para quem não vê esses progressos é tudo muito solto. As

pessoas vão falar: mas não está seguindo como é para seguir? Enfim, não sei registrar e

nem me fundamentar para escrever meus relatórios. Eu sei que estou trabalhando e estou

vendo que meus alunos podem sim se relacionar comigo e eu posso falar muito com eles

sem eles entrarem numa crise, mas quem vai entender que um autista pode se interar

socialmente numa brincadeira? Então se ele faz isso não é autista?

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Professora Ana: Eu já penso que de bom nisso tudo foi o meu olhar que mudou

sobre eles. Eu trabalhei estes últimos meses com outro olhar, esquecendo que são

autistas. É difícil viu, porque apesar das outras professoras estarem gostando de ver

nosso empenho e também oportunizar estas outras atividades, eu vejo que ainda existe

muita gente, digo, professora que acha que devemos sempre lembrar que eles são

autistas e eu não concordo, porque se eu fosse ficar presa nesta visão eu não conseguiria

propor outra atividade diferente. Oras se ele tem tanta dificuldade nas áreas que estamos

trabalhando é porque tem que mudar alguma coisa no jeito de ensinar focado nessas

dificuldades e não da mais ênfase nessas dificuldades, isolar ele mais ainda, não

comunicar com ele ou então deixar ele com o objeto de apego o tempo todo. Acho que já

respondi o que é bom e ruim né.

Professora Márcia: É, nossa maior dificuldade é como falar que o que estamos

fazendo é bom e como registrar e seguir um programa assim. Não sei o que vai ser no

ano que vem, se a coordenadora da escola vai permitir que continuemos com estas

atividades ou simplesmente vai manda seguir o TEACCH através de alguma assessoria,

porque se for assim, a assessoria vai até deixar usar a brinquedoteca e a área de lazer,

mas vai ter que seguir os passos que ensinam eles a fazer as coisas. Não vai Ser tudo no

espontâneo, vai ser no dirigido.

Professora Ana:O papel continua sendo uma coisa bem ruim pra gente. Muito

papel para pouca atividade produtiva. Muita avaliação e pouco envolvimento com o

aluno nas suas maiores dificuldades. Outra coisa, como você acompanhou tudo, deu

para perceber que com os mais prejudicados estamos bem devagar com isso,

precisávamos sentar e rever como fazer isso com eles também porque ajuda, mas temos

que pensa muito.

Professora Márcia: O primeiro passo foi dado e foi o mais importante: descobrir

que dá pra fazer de outro jeito. Só não sabemos como continuar, qual o caminho para

oferecer isso a todos os alunos e também como registrar.

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CAPÍTULO 4

DA MANUTENÇÃO DE MODELOS ÀS POSSIBILIDADES DE NOVAS

PERSPECTIVAS

Passo agora a realizar uma análise dos dados obtidos durante as atividades e

reuniões do campo de pesquisa dentro dos núcleos “Práticas convencionais” e “Práticas

desejáveis”.

4.1- Experiências escolares dos autistas: Práticas convencionais.

Nesta unidade temática evidenciam-se as experiências escolares realizadas com os

alunos autistas dentro do programa TEACCH. O silêncio e o comprometimento com a

organização do espaço predominam durante todo o período de aula. O aluno é levado a

todo o momento a realizar suas atividades de maneira independente.

As professoras encontram-se nestas salas de aula não por escolha para exercerem

sua profissão com estes alunos, mas pelo motivo de não possuírem pontuação necessária

para a atuação em salas de recursos. A escola possui um alto índice de rotatividade de

professores.

Os dizeres das professoras reunidos nesta unidade temática demonstram a

concepção que possuem dos alunos e como são desenvolvidas as atividades educacionais

com os mesmos.

Os professores revelam que consideram que os alunos autistas são diferentes e que

por esse motivo não conseguem aprender através dos mesmos métodos como outros

alunos: autista só pode ser trabalhado com esse método porque de acordo com o

diagnóstico deles, eles não conseguem aprender de outra forma”.

É importante destacar que o fato dos alunos serem diferentes não significa que as

leis gerais que regem o desenvolvimento e a aprendizagem sejam diferentes. Conforme

apontado por Vigotski (1995) as leis gerais do desenvolvimento são iguais para todas as

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crianças o que ocorre é que há peculiaridades na organização sociopsicológica da criança

com deficiência e que seu desenvolvimento requer caminhos alternativos e recursos

especiais. Isto significa que a criança com deficiência aprende nas relações sociais, na

interação com o outro. Significa que o que deve ser diferente são os caminhos para

alcançar os objetivos educacionais e não os princípios que regem o desenvolvimento. De

acordo com Góes (2002):

No plano sociopsicológico, as possibilidades

compensatórias do indivíduo concretizam-se na

dependência das relações com outros e das experiências

em diferentes espaços da cultura. O desenvolvimento

constitui-se, então, com base na qualidade dessas

vivências. A questão compensatória, assim concebida, não

é uma iniciativa complementar da formação da criança

com deficiência; ao contrário, deve ser assumida como

central (p. 99).

Se considerarmos que as possibilidades compensatórias concretizam-se na

dependência das relações com os outros e das experiências em diferentes espaços da

cultura, um método que prive os alunos autistas da interação social, do contato com o

outro não pode ser visto como uma alternativa de ensino.

O ensino de unidades mínimas passíveis de registro, ensino de habilidades simples

e complexas em pequenos passos também são demonstrados ao trabalhar a

discriminação de cores, transporte e encaixe. Os treinos são constantes e as estratégias de

desenvolvimento destas atividades sempre ocorrem na seqüência esquerda / direita e de

cima / para baixo, obedecendo uma convenção metodológica natural na cultura ocidental

presente no programa TEACCH. De acordo com uma das professoras: “tem que tá tudo

certinho, se não eles não aprendem”.

Para Vigotski (1995) esta forma de proceder baseia-se em uma concepção

quantitativa que se caracteriza pela preocupação apenas com aquilo com que a criança

não é capaz de fazer, pelas suas inabilidades, defeitos, pela falta, por sua negação em

relação a um padrão e uma normalidade estabelecida hierarquicamente, em geral,

essencialmente homogênea e pouco adaptada.

O uso do programa TEACCH acaba contribuindo para que as atividades

educacionais passem a ser focadas sobre a condição biológica, física e sensorial, sem criar

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possibilidades de compensação e sem considerar a plasticidade neurológica destes

indivíduos.

Com relação a esta unidade temática, observamos em nossos dados o predomínio

de abordagens comportamentais que são constatadas não só pelo método assumido pela

escola para organizar as práticas pedagógicas, mas também no formato das atitudes dos

professores diante de algumas situações.

A ênfase na importância da consistência entre as pessoas que têm contato com o

aluno, de acordo com as teorias comportamentais, torna-se evidentes nas seguintes frases:

“ tinha que segurar ele na cadeira e aí vai...”;“daquele tamanho, cinco pessoas não

seguram pra conter”; “Ele não tá fazendo direito, toda hora tem que fazer mão na

mão”; “ela tá com um comportamento muito difícil” e “o mais importante aqui é ela

saber que tem que ficar sentadinha fazendo a atividade porque antes ela não sentava

sozinha, tinha que eu a monitora forçar ela sentada.”

As falas da professora revelam uma preocupação maior com a forma do que com

o conteúdo a ser ensinado. Valoriza-se o “ficar sentadinha” como um pré-requisito para

aprender posteriormente alguma coisa.

Nota-se que a experiência pedagógica é restrita e os professores estão em uma

posição onde a fixação da aplicação do programa TEACCH é a única alternativa de

trabalho sem novas perspectivas:

Pesquisadora.: E o dia como foi hoje?

Professora: O mesmo de sempre. O

que eles já sabem fazer, já fazem é

dar manutenção para não regredir.

Com o Adriano estou fazendo uma

prancha nova para trabalhar a

discriminação de cores e o com o

Vinícius transporte e encaixe.

Estas experiências acabam traduzindo as atividades escolares em assimilações de

conceitos condicionados que objetivam atividades sistematizadas e intensivas visando a

manutenção de comportamentos aprendidos.

Não vemos nas falas e ações das professoras atividades educacionais que

valorizem as relações sociais, ao contrário, estas práticas buscam o treino dos alunos por

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não possuírem um comportamento funcional. Reforçamento, esquemas, extinção,

punição, controle de estímulos, generalização, equivalência de estímulos, controle por

contingências, controle por regras verbais, são característicos deste atendimento.

A programação diária de atividades também foca a atuação direta nos

comportamentos - alvo os assim chamados comportamentos inadequados, que interferem

tanto na aprendizagem como no ajustamento social do autista e na sua interação com as

pessoas (estereotipias, birras, comportamento hetero e auto-agressivos), substituindo-os

por comportamentos funcionais. Os professores então passam a atuar diretamente com

este tipo de preocupação.

Esta atuação possui maneiras e procedimentos próprios para tratar

comportamentos a serem diminuídos e/ou eliminados. É usado principalmente duas

maneiras de ensinar, baseado nos estudos de Windholz, 1988, Windholz e Meyer, 2000

que as denominam de situação formal de ensino e situação informal de ensino.

Na situação formal de ensino, que corresponde ao ensino através de tentativas

discretas é normalmente realizado numa situação um-para-um, com a criança e o

professor frente-a-frente, sendo os comportamentos apresentados seguidamente, em

número previamente estipulado.

O ambiente é controlado para evitar estimulação indesejável, o reforço é

programado e provido, registros são feitos regularmente para facilitar a análise dos

resultados obtidos e determinar o curso das intervenções. A manutenção do que foi

aprendido e seu uso em diferentes situações que podem também ser denominada de

generalização também é valorizada.

A situação informal de ensino é caracterizada por ocorrer dentro e fora da escola

(centros de saúde e na própria residência do aluno). Este procedimento se assemelha ao

que Sundberg e Partington (1998, 1999) chamam de treino em situação natural (NET -

natural environment training). O ensino é realizado em situação natural, mais espontânea,

as atividades guiadas mais pelos interesses da criança. Os registros são realizados

imediatamente e em outros casos são feitas posteriormente.

As limitações destas atividades educacionais refletem a concepção dos

profissionais e do método utilizado em sua prática que apenas reconhecem os déficits, as

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dificuldades e impossibilidades destes alunos. Apesar de certas dificuldades não poderem

ser negadas ao aluno autista, as capacidades existentes devem servir de fonte para a

formação de novas capacidades através de um trabalho interativo e coletivo.

As imagens apresentadas no capítulo anterior revelam o foco da preocupação dos

professores no controle de comportamentos e a pouca possibilidade de interação social

proporcionada aos alunos autistas.

4.2- Práticas desejáveis.

Durante as realizações das sessões era possível notar certa preocupação ou

“incômodo” da professora quando eu perguntava como foi o dia de trabalho, o que ela

pretendia trabalhar no dia seguinte, ou até mesmo questionando o objetivo das atividades.

As atividades dos alunos segundo a Professora, giram em torno “de uma agenda que na

verdade é a mesma de dois anos atrás com as atividades. Aprender, escovar dentes,

lanche e ai vai”. Os dias de atividades eram considerados “o mesmo de sempre. O que

eles já sabem fazer, já fazem, é dar manutenção para não regredir”.

Ao longo do período em que observei as atividades rotineiras da instituição

percebi uma inquietação e posterior mudança na postura da professora. No início ela

fixava-se sobre uma rotina de trabalho pedagógico focado na manutenção ou fixação de

comportamentos aceitáveis, no investimento de atividades que visavam a independência

do aluno e no seguimento contínuo e sistemático do programa TEACCH, mas a partir de

nossas conversas percebi indícios de mudança em suas concepções, ou seja, minha

presença em sala de aula impulsionou as professoras a repensarem suas atitudes e práticas

em sala de aula.

Nota-se uma mudança na postura da professora que também passa a gerar certa

insegurança, que é expressa no seguinte trecho:

“Professora: Para amanhã, pensei em uma atividade

mais prática para aplicar em sala de aula. Suas

visitas aqui na escola estão me levando a pensar que

toda vez que você vem sempre é feito a mesma coisa

e talvez você esteja procurando novidades [risos] ,

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aqui não tem novidades mas eu acho que seria

interessante pra você alguma coisa diferente.

Pesq.: O que você chama de diferente?

Professora: Não sei também, mas algo que não seja

tudo o que você já viu e que nós fazemos

diariamente. Na verdade nem sei se posso fazer algo

diferente com estes alunos, mas vou tentar.

Pesq.: Amanhã estarei aqui.

Professora: Vou pensar em alguma coisa bem legal

pra gente fazer, mas se der errado, não conte pra

ninguém [risos].”

Esta iniciativa de mudança, vontade de fazer algo novo, passou a ampliar novos

momentos com os alunos, apesar de ainda possuir uma prática enraizada ao método

trabalhado em relação ao uso do reforçamento positivo.

Após algumas tentativas a professora passa a refletir sobre sua prática. A

professora havia realizado na semana anterior da reunião uma atividade que fugia dos

padrões da rotina do programa conforme consta no Episódio 8: “Aprender diferente ” e

conforme faz o seguinte relato: “Sabe, semana passada a atividade da água me fez

pensar muita coisa, de início achei que aquilo nunca fosse dar certo mais até que foi bom

por ser diferente”.

Mesmo sem possuir ainda embasamentos teóricos concretos, a professora acabou

proporcionando momentos diferenciados ao criar um ambiente favorável para a situação

de aprendizagem mediada passando a utilizar meios instrumentais ou simbólicos nestas

atividades. Nesta nova dinâmica de aula, foi desencadeadora de momentos de construção

motivadores e de interação que buscavam melhor entendimento e interação entre os

sujeitos envolvidos.

As práticas que foram sendo criadas e o discurso da Professora muda:“Aí tinha

uma música que mandava bater palmas eu batia e ele também batia, aí eu percebi que

ele fazia o que eu fazia, me imitava” e “Não é que ele tá gostando? Tava morrendo de

medo que não fosse dar certo! É muito interessante ele falar assim durante a atividade

parece até que está interagindo comigo. Pode isso?”

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As atividades pedagógicas ficaram bem caracterizadas por uma maior

preocupação da professora em interagir com seus alunos e a comunicação passou a ser

mais exploradas.

As atividades foram realizadas em conjunto, o espaço físico da sala de aula passou

por algumas alterações e a professora passou a valorizar a comunicação de maneira

espontânea.

Algumas atividades que antes eram realizadas na área de trabalho individual

passaram a ser realizadas em conjunto em uma mesa coletiva que passou a ocupar o

centro da sala.

Os professores e monitores passaram a interagir com os alunos de maneira

diferente, conversavam a todo momento e sempre incentivavam os alunos a dividir

objetos e também a demonstrar o uso destes.

As atividades lúdicas que também foram surgindo na rotina destes alunos

passaram a oferecer um processo de significações, atribuindo sentido às ações,

propiciando novas experiências em relação com o outro.

A brincadeira, de acordo com Vigotski (1997), possui bases no que já foi

vivenciado pela criança, mas não se constitui pela reiteração desta realidade, mas de

ações que adquirem uma função representativa que contruibui para a elevação dos

processos mentais na infância.

No caso de crianças autistas a brincadeira é considerada inexistente ou ainda é

considerado bizarro ao não estar dentro de um padrão normal sobre a brincadeira. Em

muitas escolas a brincadeira ocupa lugar insignificante nas ações educativas, inclusive na

escola onde foi realizado a pesquisa, porém, a partir dos episódios 17 e 18 as situações

com brincadeiras se deram a partir de mudanças sobre a concepção das professoras em

relação aos alunos e com o intuito de buscar novas atividades.

Estas atividades envolvendo a brincadeira oportunizaram momentos de relação

com o outro e com isso, através da mediação as professoras passaram a dar sentido ao uso

dos objetos e também no contexto que foram desenvolvendo estes momentos.

Martins (2009) realizou um estudo em que questionou não apenas como os

autistas se relacionam com o outro, mas sim como o outro se relaciona com o autista,

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como as atividades lúdicas influenciam nas práticas educacionais destes alunos e

destacou a necessidade urgente de inovar o trabalho realizado com alunos autistas.

Na mudança de postura da professora e ao abandonar a rigidez em seguir o

método TEACCH esta inovação foi evidenciada através do investimento na brincadeira

como foco pedagógico e também através da quebra do paradigma que para atividades

pedagógicas para alunos autistas só podem ser realizadas através do programa TEACCH.

As professoras mudaram de posição e agora passaram a refletir sobre suas práticas e

como estas antes evidenciavam a necessidade de modificações comportamentais, agora

passam a valorizar práticas mediadoras.

Uma prática pedagógica fundamentadas na abordagem histórica cultural, em

relação aos alunos autistas, deve levar em consideração que é coletivamente, na interação

com o outro que o aluno pode superar suas dificuldades e desenvolverem formas

organizadas de relações sócio-comunicativas.

Estas práticas passaram a ampliar as perspectivas para uma redefinição do papel

da escola e do trabalho pedagógico dos autistas, principalmente partindo da concepção de

que aprendizagem é essencialmente social e que é nas apropriações dos conhecimentos

socialmente disponíveis que as funções psicológicas humanas são constituídas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

“O primeiro passo foi dado e foi o mais

importante: descobrir que dá pra fazer de

outro jeito” (Professora Márcia).

Como foi descrito no capítulo 1, no ano de 1921 quando iniciou-se no Brasil um

processo de orientação pedagógica junto com o atendimento clínico através da criação do

pavilhão para crianças no Hospício de Juquery, a educação dessas crianças possuía como

linha metodológica uma listagem das diversas técnicas comportamentais para educar

através do treinamento. Na década 70, a escola especial também passa a tender seus

alunos no enfoque comportamental. O que observa-se é que após quase 90 anos, o Brasil

não avançou no sentido de ampliação de perspectivas educacionais nas práticas

pedagógicas no enfoque da educação especial principalmente na educação dos alunos

autistas onde os princípios de modificação de comportamento e de controle de estímulos,

predominam até os dias atuais.

Diante dos dados apresentados neste trabalho o foco na concepção do déficit

impossibilita o aluno a desenvolver-se no âmbito das funções psicológicas superiores, na

medida em que as práticas educativas tornam-se reduzidas.

O contato que tive com as professoras durante este estudo demonstrou o quanto

estes profissionais estavam despreparados e desmotivados para atuar com os alunos

autistas. Suas dificuldades centravam-se na cobrança que se tinha no trabalho escolar para

atingir os objetivos traçados nos planos individuais de ensino que muitas vezes não eram

atingindo principalmente pela visão complexa e reducionista que estes professores

possuíam de seus alunos.

Minha participação em suas aulas, fizeram com que estas posturas mudassem com

o passar do tempo, levando as professoras a observar criticamente o método utilizado até

o momento.

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Vigotski (1989) indica que uma educação tecnicista e hegemônica impossibilita o

pleno desenvolvimento do aluno. Ao contrário, uma prática educacional ancorada na

abordagem histórico cultural, favorece uma nova concepção de atuação com sujeitos

autistas, que prioriza e oferece condições e acesso à cultura (produzida historicamente) e

prioritariamente ao social.

Este estudo procurou relevar ações educativas que possibilitam trocas e que estas

ações podem colaborar para uma nova maneira de pensar a educação de alunos autistas.

Segundo Góes (2001), nem sempre as ações são harmoniosas diante das diferentes

definições do conceito de ZDP, uma vez que o diálogo nem sempre segue uma única

direção o que implica certos limites, possibilidades, oposição, dispersão e estabilização

de sentidos. No caso das trocas estabelecidas com os alunos durante esta pesquisa, além

de possibilitar um caminho pedagógico alternativo, aproximou as professoras de algo que

era desconhecido por possuírem uma visão única de que estes alunos, devido às

dificuldades comunicativas e sociais próprias da síndrome, seriam incapacitados de

seguirem um programa educacional diferenciado do que vinha sendo aplicado.

No decorrer da pesquisa, quando as professoras passaram primeiramente a se

questionarem sobre suas práticas e, posteriormente a mudar a visão sobre seus alunos, as

possibilidades educacionais em sala de aula passaram a ampliar gradativamente o que

passou a oferecer momentos que antes nunca havia sido privilegiado durante o programa

de ensino que vinha sendo aplicado desde o início do atendimento aos autistas nesta

escola.

Atividades lúdicas, música, jogos coletivos, investimentos na comunicação e

socialização dos alunos passaram a fazer parte do cotidiano. Com isso, os professores

conquistaram a ruptura de um paradigma caracterizado pelo conceito que tinham de que o

aluno autista só aprende através de um programa que tem como eixo a modificação do

comportamento e onde a equipe pedagógica deve valorizar o diagnóstico e o quadro

clínico do aluno.

Novas possibilidades de interação e de práticas pedagógicas se ampliaram nas

salas de aula durante a pesquisa de campo, porém estas não ocorreram de uma maneira

planejada e sustentada por uma fundamentação teórica. Estas possibilidades pautadas na

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abordagem histórica cultural em um programa de capacitação específica são indicativas

de que muitas contribuições e descobertas na educação destes alunos poderão ocorrer

principalmente no que diz respeito às condições pedagógicas realizadas através de

relações sociais.

A partir do momento que o professor deixa de ter como foco da atividade

pedagógica a simples modificação comportamental e passa a oferecer condições de

interações e de acesso aos conhecimentos, o trabalho da escola ganha uma outra

dimensão. A escola deixa de seguir a linha da menor resistência, acomodação e adaptação

ao atraso do aluno, criticada por Vigostski (1997) e passa a oferecer possibilidades de

superação das dificuldades e/ou déficits primários existentes.

Este estudo ainda muito preliminar sobre a educação de pessoas autistas, pretende

contribuir para uma reflexão urgente e necessária, em que a abordagem histórico-cultural

se torna uma possibilidade viável nesta prática educacional.

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