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ASSUNTA DO 21 Texto de Nery Gomide 1971

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Page 1: ASSUNTA DO 21 · 2016-01-28 · janela e olha pra fora; volta pra dentro e vê a conta de luz sobre a mesa; põe os ... mais a cesta de ovo. Ela olhou pra mim, né, assim de cima,

ASSUNTA

DO 21 Texto de Nery Gomide

1971

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PERSONAGEM

ASSUNTA - Imigrante italiana de meia idade, dona de

uma pensão no Bras.

CENÁRIO

À direita do palco, um aparador com uma foto antiga de

Genaro em cima, e um telefone ao lado. À esquerda do

palco uma cristaleira com uma fruteira em cima. No

centro do palco uma mesa com três cadeiras. De um lado

da boca de cena um janela. Nas laterais do palco, de um

lado a entrada da rua, do outro lado o corredor interno

que dá para as outras dependências. A casa é antiga,

com bandeira nas portas e em cima da janela. Os móveis

devem ser da década de 50. Época atual.

TEMA DE ENTRADA

Assunta entra com duas sacolas, fecha a porta e pega a

conta de luz no chão e põe em cima da mesa e vai até a

cozinha, onde deixa as sacolas. Volta para a sala, indo

em direção ao espelho da cristaleira; examina-se

cuidadosamente. Em seguida olha lentamente para o

cenário vazio.

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ASSUNTA - Ma que silêncio aqui dentro... (Vai até a

janela e olha pra fora; volta pra dentro e

vê a conta de luz sobre a mesa; põe os

óculos, pega a conta e examina) Ma é um

roubo! (Vai até a fruteira em cima da

cristaleira e pega mais duas contas; em

seguida pega um lápis na gaveta do

aparador. Vai até a mesa, senta e começa

a fazer as contas) Cento e quarenta e oito

e duzentos mais cento e trinta e um conto

e quatrocentos mais duzentos e cinqüenta

e nove, mais trinta e quatro conto e

quinhentos...

TEMA GIUSEPINO

Não, hoje eu não tô boa pra fazê conta.

(Cobre o rosto com as mãos, arranca o

lenço, em seguida levanta-se elétrica e

vai até a janela gritando para fora)

Giusepino, Giusepino, filho mio, vem cá...

Já. Mas anda vá... (Sai da janela e vai até

o centro da sala) Riqueza da mamma!

Mas vem cá, desgraçado. Já não te disse

que não queria que tu ficasse brincando

com os moleques da rua? Quantas vezes

eu te disse isso, hein? Quantas vezes? E tu

me escuta? Eu vivo dizendo que não

quero que tu fique brincando na rua! Não

quero que tu fique brincando com os

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moleques! Olha o filho da Concceta, que

riqueza, que bambino de ouro! E tu, e tu?

Maledeto, desgraçado! E não foge, hein?

Porco cane. Se eu te pego, te mato, te

mato! Não adianta se escondê... Se

esconde, te pego e te dou umas bolachadas

na cara que é pra tu aprendê a escutá a

mamma. Vem cá... Me diz uma coisa: que

é que tu tinha que jogá pedra nos outros,

hein? Jogô, jogô sim! Eu não vi, me

contaram. Me contaram, é... Cadê o

estilingue? Eu quero ele. Ah, é? E atrás,

está escondendo o quê? Me deixa vê as

mão... As duas! Ah, ah... Me dá aqui. Ma,

ma que bruta ferida em teu braço. Mas

olha! Quem foi o sem-vergonha que te

bateu? Quem foi, hein? Ah, é? E tu bateu

nele, né? Só apanhou? Tu vai apanhá de

novo em casa pra aprendê a se defendê

na rua! E para de chorá! Nem te bati

ainda! Vamos consertar este braço, vamo.

Psiu, vai aonde? Fica! Vem cá, covarde.

Vem cá, medroso. Ah Giusepino,

Giusepino... Mas que vontade de fazer tu

engolir o estilingue com elástico, pau e

tudo! Por que tu foi quebrá as vitrina da

venda do Seu Bonifácio? Por que, hein? O

maledeto me entregou a conta. É tu que

vai pagá a conta, é? Não, sou eu! E onde é

que a gente vai tirá dinheiro pra pagá

ele eu quero só vê. Teu papá vai te bater,

viu? Vai... eu não vou segurá ele... Não,

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não vou. Quero ver se assim tu aprende a

sê gente. Vai trabalhá, vai, como teu

papá trabalha na marcenaria, vai pra tu

vê uma coisa. Pensa que é fácil? Ou tu

acredita que as roupas, comida, a gente

encontra na rua, que o dinheiro cai do

céu? Ou tu pensa que somo tudo

milionários? E vai estudá, vai! Se tranca

no quarto e só sai de lá quando eu

mandar, entendeu bem? (Começa a

arrumar a casa) Ah, madona mia, que é

que eu vou fazê da minha vida? Tudo tão

caro, caríssimo... A gente luta, luta, mas

não vê resultado. A gente se amassa, se

mata, mas o dinheiro não dá... Pussulenta

ela... feridenta! Mandei ela embora. Mas

também, né? Pagar em dia ninguém

paga. Que é que é Adolfo? Vai pagá, é?

(Vai pro corredor) Pode falar, tô

escutando... Não! Não espero! Não,

desculpa, eu não quero, eu quero

dinheiro. Mas eu já estou cheia de

desculpa! E eu vou desligá o chuveiro.

Vou... De hoje em diante só banho gelado.

Este mês a conta de luz foi um roubo,

uma absurdo! Gente porca... No banheiro,

de porta aberta... (Grita para dentro) Me

deixa a banheira toda cheia de pentelho!

A Neuza cabeluda, sabe? Peguei ela no

banheiro, raspando a perna de porta

aberta, e com o meu bambino Giusepino

espiando. Espiando, é! Raspava e espiava.

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Descarada! Que é que tava pensando ela,

vagabunda! É... em dia ela pagava, mas

que era uma vagabunda, era! Eu via ela

chegando tarde todas as noite, mas

tardíssimo. Cada noite num automóvel e

com um homem diferente. Pensei né,

pensei... e mandei ela embora, mandei

eu... Pecado, né Madona? Porque em dia

ela pagava. Era a única! É... também ela

podia pagá, é... também né, Madona...

pois é... Mas será que ela tava pensando

que isto aqui era uma casa alegre? Não

senhor, isto aqui é uma casa de respeito,

uma pensão familiar. Aqui dentro se

come pão e honra! (Volta a arrumar a

casa) A senhora sabe, né Madona que o

meu Genaro tem hora certa pra entrá no

serviço. Então eu faço o almoço dele mais

cedo. Mas eles tudo reclama. Cada um

quer almoçar numa hora diferente do

outro. Será que tão pensando que isto

aqui é a casa da sogra? Pagá em dia

ninguém sabe, mas reclamá eles sabem. E

como! Eu faço todo serviço sozinha,

ninguém me ajuda. Nem mesmo a cama

que eles dorme eles fez. Podia pelo menos

arrumá a cama, varrê o quarto... (Vai

até o corredor e grita pra dentro) E

quando vocês fosse tomá banho, vocês

podia aproveitar e jogá água no chão,

não podia? Aproveitava e lavava, não

era nada de mais, era? Ou será que tão

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pensando que eu sou massa bruta? E isto

aqui não é albergue, não vou sustentar

vagabundo. Se não pagá, eu ponho tudo

na rua, não quero nem sabê. Pego as

roupas e jogo tudo na rua e passo a

tranca na porta. Ouviram bem? Ou todo

mundo paga hoje ou ninguém come. Tão

me escutando? (Volta pra sala) Mas

ninguém me ajuda, até a feira, sozinha.

Vou bem tarde né, pra ver se pego as

coisa mais barata, e fico pechinchando,

pechinchando. Passo cada vergonha,

passo eu. Na feira de sexta-feira, a Dona

Emengarda... Não conhece a Dona

Emengarda, Madona? Conhece... Aquela

que tem uma bambina magricela. A

professora do Grupo Escolar, a maestra.

Aquela que o marido trabalha no Banco.

Ecco! Pois é, ela passou por mim, com a

empregada do lado, puxando um

carrinho cheio... E eu com duas sacolas,

mais a cesta de ovo. Ela olhou pra mim,

né, assim de cima, e ainda ela teve o

descaramento de me comprimentá: como

é que vai a senhora Dona Assunta... Tá

pesado, né Dona Assunta? Cuidado pra

não quebrá os ovos. Antipática ela... eu

não gosto daquela mulher, e não gosto,

pronto! O que é que a Dona Emengarda

pensa que é? Só porque tem dinheiro, se

veste bem, tem empregada, pensa que é a

dona do mundo, que tem o rei na

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barriga? Tem alguém cantando... (Ouve

uma cantoria fora; Assunta ri) Ah, é a

Dona Augustinha, a peituda... Estas

mulher, hein Madona, que depois de

acabá o serviço fica varrendo a porta de

casa pra fuxicá com a vizinhança. Mas

eu não! Lazarenta ela... vive me

chamando de escandalosa. Escandalosa é

ela. Nunca fiz mal pra ela. Ah, mas há de

nascê uma ferida na língua dela, uma

ferida, ó, pra ela aprendê a nunca mais

falá mal dos outros. Aonde já se viu?

Falei pro marido dela que ela tava dando

em cima do meu Genaro... Não, tava

mesmo. O marido deu uma surra nela...

toda a vila viu. Mas ela bem que

mereceu. (Vai pra janela e debruça) Mas

essa Dona Augustinha aí não me engana

não. Vive encontrando as coisa na rua, só

ela encontra... (Aumentando a voz) E o

cornudo do marido, coitado dele, nem

desconfia de nada o chifrudo. (Sai da

janela) O meu Genaro foi fazê um serviço

pra ela na casa dela, né? Consertá os pé

da cama. Aí, né Madona, a senhora sabe

como é... conserta daqui, conserta dali e

pronto! Experimentaram a cama, eles...

Hehe, ma que? Por baixo do meu Genaro,

não. O que é que ela tava pensando?

Contei pro marido dela mesmo e pronto!

E daí, sabe Madona, na sexta-feira, ela

fez macumba pra mim. É, macumba na

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minha porta. Galinha preta, vela preta,

fita preta, tudo preto. (Ri) Ah, mas a

galinha era gorda, deu um caldo! Os

pensionistas comeram tudo e lamberam

os beiço. Não, eu não comi nada. Não é

por nada, mas a gente nunca sabe, né?

Ah, mas no sábado eu peguei ela pelos

cabelo e dei uma cusparada na cara dela.

Não, eu não falei nada... não falei... É...

falei mesmo... uma palavra bruta... uma

palavra bruta... Eu falei catzo, catzo,

catzo e pronto. Pecado! A senhora é

virgem! Ah, mas a senhora sabe, né

Madona? Não sabe? E pronto... Eh,

Giusepino, vai aonde? Pra que estudá

com os colega? Fica! Como não sabe

estudá sozinho? Mas eu te explico. O quê?

Burra? Eu, burra? Repete se tem

coragem! Não, eu quero ver tu repetir.

Repete, vai, porco cane. Ah Madona, a

senhora escutou o que ele disse? Ah filho

meu, que Deus te perdoe e que não me

faça eu te amaldiçoar. Sem vergonha.

Dizê que a mamma é burra. Ah, se eu te

amaldiçôo, tu vai vê o castigo que Deus

te manda. Aí tu vai vê quanto pesa uma

maldição da tua mamma. Eu não preciso

de estudo. Conheço as letras, e se tu não

entende o que os livros quer dizê, é

porque tu é que é ignorante. Me dá o

livro que eu te explico tudo, até mesmo o

que não foi escrito. Vá, andiamo via, me

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dá o livro. (Lendo) Teorema de Pitágoras,

com relação à figura equivalente... o

quadrado construído sobre a hipotenusa

de um triângulo retângulo... Entendeu

agora, Giuseppe? O que? Mas como não

terminei de ler? Não terminei? Ah, é

mesmo, me desculpa, é que eu achei tão

fácil. Tá bom, tá bom, eu termino de ler e

pronto! (Lendo) O quadrado construído

sobre a hipotenusa de um triângulo

retângulo é equivalente à soma dos

quadrados construídos sobre os... cadetes?

Pronto, agora resolve tu os problemas.

Ah, Giusepino, não é difícil... pensa um

pouco... Olha que até a mamma que não

estudou muito, sabe. O que? Tu quer que

eu te explique? Mas eu não me lembro

mais... Faz tanto tempo, e depois, na

Itália, é tão diferente... Tá bom, eu te

explico, pronto... Quando se diz que os

quadrado... os cadetes... catzo de

hipotenusa? (Explodindo) Eu não sou

obrigada a te explicar nada, teu

professor é que é. Se eu te pus na escola

foi pra ele te ensinar, e não eu. Mas como

o professor não sabe ensinar? Mas tem

que sabê, o professor é formado, é pago

pra isso. O homem é que precisa de

estudo. Pra que uma mulher precisa

estudá? O que ela precisa sabê é cuidar

da casa, do marido, dos filho. É por isso

que as moça de hoje não arrumam

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marido. Pra casá é um custo. E me deixa

eu falá, me deixa... Me diz uma coisa: que

é que tu fica fazendo na escola,

ignorante... eu vou falá com teu papá... e

não fica me olhando assim não... Eu não

sou obrigada a sabê de tudo. Eu não tive

escola, é certo, mas eu aprendi com a

vida. E a vida é a maior escola que

existe. Nenhum livro vai me ensiná a

cozinhá melhor que eu cozinho, então

pra que é que eu vou lê eles? Tá bom, tá

bom, vá... Pode ir, vai estudá com os seus

colega. (Cobre o rosto com as mãos. Está

sentada na mesa, com as contas de luz

nas mãos. Começa a fazer contas) Cento

quarenta e oito conto e duzento, mais

cento trinta e um conto e quatrocento,

mais duzento quatro conto e quinhento...

Hoje eu não estou boa pra fazê conta.

(Guarda as contas de luz na fruteira em

cima da cristaleira, e o lápis na gaveta

do aparador) Giusepino já deve de estar

chegando, tendo que me trocá. (Assunta

tira o vestido e coloca um peignoir de

cetim) Ai, tô tão cansada, Dio mio, tão

cansada... (Pega uma garrafa de vinho

na cristaleira).

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TEMA DO PIC-NIC

Um gole de vinho não vai me fazê mal...

(Serve e começa a beber) Minha cabeça

está estourando... (Fundo do palco. Cobre

o rosto com as mãos, em seguida sorri)

Ah, Madona, mas eu tô tão nervosa... É

que amanhã nós vamos pra Santos... É...

pic-nic de fim de semana, nós tudo, a vila

toda. (Cantarola; vai até a janela e se

debruça) Não, não vai chover... (Sai da

janela) Estamos fazendo os preparativo

há uma semana. Até um ônibus nós

alugamos. A gente parte lá pelas cinco da

manhã. Não... é pra chegar bem cedo pra

aproveitá bem a praia... Ah, eu não vou

dormi esta noite. Não vô consegui. Nossa!

Tanto tempo faz que nós não viajamo,

nem me lembro mais... (Cantarola) A

gente só trabalha, trabalha... não sobra

tempo pra se distraí. Agora se eu fosse

que nem a Dona Angelina, a dos fundo...

Aquela sim, hein? Sabe viver. Não liga

pra nada. Gosta de uma rua que eu vou

te contá. Sai de manhã e só volta de

noite. Madona, a senhora sabe o que

aquela mulher tanto arranja pra fazê na

rua? Não? Ah, eu também não, né? Não

Madona, se eu soubesse eu contava pra

senhora, eu lhe conto tudo. Não que eu

esteja fazendo mal juízo dela, não. Deus

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que me perdoa. A senhora sabe que eu

sou incapaz de uma coisa desta. Eu não

queria convidar ela, né, pra nossa

excursão, mas ela disse que faz os

sanduíche, e ela faz bem, eu gosto tanto...

Vai vê que ela tá andando com o padeiro.

Não, é que não falta nada na casa dele...

Heee... mas por que eu fico falando assim

dela? (Cantarola) Cada um vive como

pode, né? Ela não é mais criança... é

viúva... tem uma experiência da vida...

Bem dizia minha nona: quanto mais dá,

mais quer... que é que a gente pode fazer,

né? (Cantarola e vai até a janela)

Carmela... Carmela... Heee, mas tu não

dorme? Precisa deitá cedo pra levantá

cedo amanhã... Escuta, tem certeza que

tá tudo certo? Ah... falou com elas? Com

elas... a dos fundo, a peituda... Tá bom...

Escuta, a Dona Odete do 29 me falou que

já preparou a parte dela mas deixou na

geladeira do empório do Seu Joaquim.

Amanhã ela pega, um pouco antes da

gente parti. Ah, Carmela, vou te falá

uma coisa: amanhã eu não quero sabê de

confusão. Afinal de contas nós dividimos

tudo os gasto, a comida tem que dá pra

todos. Hein? Mas por que eu vou falá

baixo, estou na minha casa... Ah, certo,

certo... Tá bom, tchau, até amanhã. Ah,

Carmela, atenção: você come bastante,

viu? Não, agora não, amanhã antes de

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sair de casa. E não se esquece de ir no

banheiro. Não, no ônibus não tem e o

chofer não para na estrada. Não é, né,

mas a gente tem que ser prevenida. E não

esquece de levar papel higiênico pra não

passar aperto na hora... Mas é lógico que

eu vou levá um pequeno lanchinho pra

comê no ônibus: bolinho de carne, ovo

cozido, laranja descascada... Sei, eu sei

que tu tá fazendo regime, vá. Não

esquece de levá café na garrafa térmica,

viu? Lá em Santos é tudo tão caro,

melhor levá daqui, né? Sacola? Mas eu te

empresto. Quer já? Amanhã? Tá bom...

Viu como está contente a Creuza do

Nelson... O quê? Não diga, é? Mas que

sem vergonha! Não foi com mulher? Saiu

com uma bicha? Ai credo, Madona mia!

Amanhã você me conta o resto. Vá

dormi, vai. Mas não fica zanzando, vá

dormi... (Começa a cantarolar) Ah

Madona, eu fiquei com pena da Creuza,

mas agora ela está contente. Ela não ia

com a gente, porque nem pra passagem

ela tinha. Mas a gente se reuniu e pagou

a parte dela. Pobrezinha, além de cuidá

dos filho, tem que sustentá o Nelson

bêbedo e irado, aquele vagabundo. Volta

e meia ele bate nela... Eu já perdi a conta

das vezes que a gente teve de chamar as

radiopatrulha por causa dele. Mas ele se

emenda? Se emenda? Até na Delegacia

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eu já fui pará como testemunha.

Também, né, o que é que a gente pode

fazê. Ela e ele, né, fugiram. Ela solteira,

Madona. Não, donzela, donzelíssima,

ecco. E o Nelson já era casado! A mulher

dele é que foi esperta, se livrou logo

daquela merda, mas a Creuza nem ligou.

Tinha que acabá mal. Mas ela vai com a

gente, amanhã, tá tudo arranjado e não

se fala mais nisso... (Começa a cantarolar)

Me arrepia toda só de pensar que

amanhã eu vou vê o mar. Tanto tempo

faz, hein Madona? A senhora veio com a

gente da Itália naquele navio. Mas que

bruta viagem... Eu pensava que não ia

chegá viva. Mas que enjôo, meu Deus. Eu

tava com a impressão que ia botá as

tripa pra fora, tanto que eu vomitava,

lembra? Mas nem mesmo quando eu

fiquei gorda do Giuseppe eu ficava

passando tão mal... Genaro ficava tão

preocupado comigo. Não sabia o que

fazê... no navio foi a mesma coisa. Eu não

conseguia comê e Genaro dizia: calma

Assunta, calma... mas eu chorava e

vomitava em cima dele... chorava e

vomitava. Quero voltá, Genaro... quero

voltá, não agüento mais, não agüento

mais... Me atiro no mar, mas no navio

não continuo mais, não continuo mais...

(Cantarola) Lembra? Pobrezinho...

Quando o Giusepino estava pra nascê foi

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a mesma coisa... (Cantarola) Genaro era

tão gentil... depois... A senhora sabe que

eu tenho saudades daqueles tempo? Era

capaz de viajá de barco o resto da minha

vida, vomitando como uma vaca só pra

vê o Genaro se preocupando comigo. Hoje

ele é tão diferente... passa por mim e ó...

Arma cada escândalo quando as coisas

tão fora do lugar, a senhora precisava de

vê... Ah, Madona, dá um jeitinho... Heee,

tá bom, até amanhã as cinco da manhã.

(Vai saindo) Ah, Madona, mas eu tava

me esquecendo de falá do meu maiô de lã.

Tingi ele de preto e apertei ele. Tava

velho, né? Com o tempo ele esticou. Agora

todo mundo vai pensa que é novo. Não

posso me esquecer de comprá óleo. Eu fico

tão ardida que não pode nem encostá.

Mas também com maiô de lã o que é que

não fica ardida? O meu desgosto,

Madona, é que o meu Genaro não vai. Eu

insisti com ele, mas... Giusepino também

não queria ir... Ah, mas aonde já se viu,

sozinha eu não podia ir, não ficava bem.

E depois a filha da Carmela tá muito

interessada nele. Eu queria tanto que eles

namorassem, a Bianca e o Giusepino. Um

dia meu bambino vai tê que se casá, né? E

eu queria que fosse com a Bianca. A

Bianca é como se fosse filha minha...

(Cantarola) Ah, mas eu já tô vendo

amanhã todo mundo na praia. Os moço

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jogando bola, as garota, peteca, os

bambino brincando na areia, e a gente

sentado, falando e comendo, falando e

comendo. Quero tomá um banho de mar

pra vê se eu melhoro das perna. Ando

com uma dor... Acho que são as varize...

(Vai saindo de cena e para no corredor e

se vira para a porta da rua) Genaro? É

você? Mas pra que tanto barulho? Assim

vai acordá a vizinhança toda... Mas isso

lá é hora de cantá? Entra de uma vez,

entra vai. Mas outra vez bêbado? A puta

que me pariu... Por que Genaro? Pra que

fazê isto comigo? Por que, hein? Ah,

Madona, que mal eu fiz a Deus? Vai ficá

sentado aí, é? Vamo dormi, vai. Já é

tarde, muito tarde. Se o Giusepino acorda

e te vê assim bêbado, que é que eu vou

dizer pra ele? E vamo curá esta

bebedeira, vamo. Vou te fazê um café

bem forte. (Pausa) Eu sei que tu tá alegre,

mas não é motivo né Genaro, pra encher

a cara. (Pausa) Mas como desgraçado,

não tá alegre? Afinal de contas, o que foi

que aconteceu? (Pausa) Fala alguma

coisa... Ma como bebeu pra esquecê?

Esquecê o quê? Ah, vá, tu não tem motivo

pra se queixá! Não, não tem! Nosso filho

está forte, estudando, comida não falta,

as coisa tão andando bem, a gente tá com

saúde, graças a Deus, que mais Genaro,

que mais, hein? (Roda em volta da mesa)

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Vai embora? Heee... mas por que ir

embora? A gente tem um filho, Genaro,

não é justo. A gente tem que pensar nele.

Tá cansado, é? De quê? De mim? O que é

que eu fiz de errado, hein? Fala, fala,

fala, fala, fala! Porque se eu fiz alguma

coisa, qualquer coisa, me bate. Vamos, me

bate! Cheio da vida, é? E eu Genaro? Ahn?

E eu? É, mas eu não conta. Tenho que

cuidá de ti, do Giusepino, da pensão e não

posso nem ao menos reclamá... Tá bom...

vá viver com aquela vagabunda.

Vagabunda sim. É, é uma vagabunda. Tá

pensando que eu sou boba? Tá? Tá

pensando, que eu não sei nada nas coisa,

é? Uma vagabunda putona! (Cospe no

chão) Vai pegá as suas coisas e vai

embora de uma vez! Mas não tá

querendo? Vai! Já não faz mais nada

aqui em casa por causa dela. Deu até pra

bebê, coisa que antes não fazia. Pensa que

eu não sei também que é tu que sustenta

a vagabunda? Uma dona assim a gente

pega nas esquina. (Pausa) Pega, usa, paga

e vai embora. E não se atreva a levantá

a mão pra mim. Tu não me achou na rua,

não. Tu me tirou da casa dos meus pai, e

eu nunca trepei com outro homem a não

sê contigo! Que mais Genaro, que mais?

Me sacrifiquei, me sacrifiquei... que mais

Genaro? E me deixa falá! Eu tô certa, a

Madona tá de prova! Você quer, eu trago

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a vizinhança toda pra confirmá.

Pergunta pra quem quiser quem é a

Dona Assunta do 21, pergunta! Sou

honesta, honestíssima! Que mais Genaro?

(Vira-se para o corredor) Não Giusepino,

não... não foi nada não meu filho, vai

dormi, vai... Ma que bêbado! Isso lá é jeito

de falá com teu papá? Não, a gente bebeu

um pouco de vinho, ficamo conversando e

esquecemo da hora, né Genaro? Vai

dormi, vai, tá tudo bem... Como vergonha

do teu pai? Não! Não, meu filho! Genaro,

ele não sabe o que está dizendo. Ah,

Madona, me ajuda! Me deixa falá

Giusepino, escuta... (Vai até o corredor) E

vocês que tão fazendo aqui? Nunca

viram uma briga de família? Ah, tão

rindo, é? Rindo do quê? Por acaso somo

palhaços, somo? Por que não vão se

enfiar no rabo da madre que os pariu?

Deixa ele ir Giusepino... ele tá querendo

ir, que vá! (Vai até a janela) E vocês aí

fora, tão querendo o quê? Grito quando

eu quisé, tô na minha casa... Chama, pode

chamá a polícia, ai que medo. Pode

chamá até o Papa! (Sai da janela) Que

história é esta de trocá a fechadura, o

que é que você tá pensando, hein

Giuseppe? E não berra que eu te encho a

cara de bolachada! Vai dormi, vai...

(Pausa) Vai, Genaro... ninguém vai trocá

a fechadura não, vai sossegado... Esta

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casa continua sendo tua... mas se é com a

vagabunda que tu que ficá, fica... (Pausa.

Janela. Pausa) Genaro... vem cá... quando

quisé voltá, volta viu? Eu te recebo... Não

como meu marido, mas como pai do meu

filho... (Assunta passa os braços como se

fosse abraçar a si mesma) Ah, como eu te

gosto... (Pausa) Giuseppe? Tu não foi

dormi? Vai, vai, a mamma tá bem, vá.

(Pausa) Giuseppe, vem cá vem... Não fica

com raiva dele não, viu? É um sem

vergonha, é... mas é teu pai! (Assunta

pega a caneca e bebe vinho) A única

coisa que eu entendi foi esta caneca...

(Amarra um lenço na cabeça e coloca um

avental; toca a campainha do telefone,

ela vai atender) Alô, Giuseppe? Não é o

Giuseppe? Aqui é 32-6411. Não, não tem

ninguém aqui com este nome não... É, é

meu vizinho, mas não vou chamá. Não

vou e pronto. (Estoura música, depois em

back ground. Desliga o telefone e vai até

a cristaleira) Pra mim ninguém telefona,

é só engano... (Olha no espelho) Ma que

bruta figura, mamma mia... (Se troca,

põe saia, outra blusa, tamanco e avental.

Vai até a cozinha. Fala de dentro) Ah,

que vergonha, que vergonha. Se o Genaro

não tivesse me largado, eu não tava

passando esta vergonha! Ah, não tava

não! (Entra na sala com uma frigideira

na mão) Imagina, Madona... Ah, mas eu

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não tenho coragem de contá isso pra

senhora. Eu fui no açougue, né, comprá

carne... daí o Seu Onofre, o açougueiro,

aquele que rouba no peso... eco! Me passou

a mão, lá na... lá na... (Faz o gesto)

Viadão! Ah, mas eu não tive dúvida,

sentei a sacola na cara dele com gosto. A

sacola tava cheia, esparramou tudo pelo

chão. Ah, mas eu fiz ele catá tudo, e

quase que ele me pisa no cheiro verde.

Mas o que ele tá pensando? Por que não

vai passá a mão lá, na da mãe dele? Por

que eu não tenho marido? Mas eu não sou

uma mulher da vida! Pussulento,

cafajeste, ordinário, cornudo, viado!

Culpa do Genaro, né? Sim, porque se ele

não tivesse me abandonado eu não tava

passando esta vergonha! Não, não tava

não! Mas já não basta a vergonha que eu

tô passando por causa do Giuseppe? Criei

ele com tanto carinho, com tanto

cuidado, me sacrifiquei tanto! Quando ele

ficava doente, Madona, eu ficava quase

louca, de tanta preocupação, eu nem

dormia. A senhora acha que depois de

tudo ele tem o direito de fazer isto

comigo? Todos os rapazes da idade do

Giuseppe procuram um trabalho seguro,

honesto, né? Estão estudando direitinho,

mas o Giuseppe, não! Não agüentei, né, e

fui falá com o Frei Homero a respeito das

loucura do Giuseppe... Frei Homero riu

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na minha cara, e me disse que eu tô

fazendo tempestade num copo d'água,

que eu devo de deixar o meu bambino

livre pra fazê tudo o que bem entende...

Mas como, como? Sou ou não sou a mãe

dele? Se eu não me preocupá com o futuro

dele, quem é que vai se preocupá? O

Genaro? Pois sim, o Genaro... Pensa que

eu não sei que ele não anda se

encontrando com o Giuseppe? Que não

anda se encontrando com ele? Vai vê que

foi o Genaro que andou enfiando estas

idéia maluca na cabeça do meu filho.

Madona, no outro dia o meu bambino me

disse que quer ser... artista! Não, não

Giuseppe. Isto lá é profissão de gente

honrada? Ah, vá Giusepino, pensa noutra

coisa, vai! Mas ele me escuta? Se a

senhora me perguntá pra que é que ele

está estudando, eu não sei respondê.

Madona... artista! Mas como é que eu vou

dizê pra vila toda que o Giusepino quer

ser artista? Eu me mato, Madona, me

mato se ele não mudá de idéia! Eu sempre

quis que o Giusepino fosse doutor, com

placa dourada na porta e tudo! Eu vivo

dizendo pra ele: pode escolhê a profissão

que tu quisé, desde que seja doutor! Mas

ele fica perdendo tempo com uns desenho

maluco, com umas estátua sem pé nem

cabeça. Eu pergunta pra ele: o que é que

tu vai ser na vida? E ele me responde:

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arquiteto! Eu digo: engenheiro? Ele me

diz: não, arquiteto! Mas eu insisto: mas

por que não engenheiro? E ele me

responde que vai ser arquiteto! Que coisa

faz um arquiteto? É um engenheiro

artista! Ah, vai Giusepino, mas pra que

essa mania de grandeza? Só engenheiro

basta! Mas adianta falá alguma coisa?

Ele me disse, mas eu não entendi, que o

arquiteto ajuda o engenheiro. Por pouco,

pouco eu batia nele. Preguiçoso, aonde é

que já se viu? Será que ele não é capaz de

fazê o serviço sozinho? E depois quem

leva a fama é o engenheiro! Enquanto ele

tava fazendo cinzeiro, copo, vaso de

cerâmica, ainda vá lá, né? Não é bonita

a caneca que ele me fez? Juro que foi a

única coisa que eu entendi: é uma caneca!

Outro dia o meu bambino me disse que ia

fazer o meu retrato. Mas eu fiquei tão

contente, dei logo um jeito no cabelo e até

batom passei na boca, e pedi pra ele

depois pintá a senhora, Madona. E fiquei

ali, duas horas posando pra ele. Até o

bolo que tava no forno queimou e eu nem

vi, tão emocionada que tava. Meu

bambino pintava o retrato de sua

mamma! (Tira o avental e se pinta.

Posando) Assim?... Assim...? Ah, assim...

Heee, vai me pintar de costas, é? Pronto?

Ah, me deixa vê... Quem é esta? Como?

Esta sou eu? Mas como eu? Mas eu não

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sou um monstro! Tudo fora de lugar, o

nariz, a boca, os olhos... Tu me vê assim,

é? Tu não tá enxergando bem?

(Desagrado) Quem é esta? Tá vendo, vou

te levá pro oculista! Precisa, tu tá cego!

Mas que eu o quê, nem de cabeça pra

baixo. Sabe o que eu fiz com os desenhos

dele? Rasguei tudo e ainda enchi a cara

dele de bolacha. E proibi ele de pintá a

senhora, e de continuá com esta loucura!

Ah, mas o Giusepino anda numa pose,

acha todo mundo burro. Disse que aqui

na vila ninguém presta pra ele, que somo

tudo ignorante. Nem na Missa ele vai

mais... A tarde está chorando por você,

ela sabe que o senhor partiu pra sempre.

Que é Giuseppe? As abotoadura tão no

lugar de sempre, bem na frente do seu

nariz, na gaveta. Se fosse uma cobra já

tinha te mordido! Vai sair, é? Mas como

não volta pra casa jantá? Mas por que

não tem tempo? Fica comendo essas

porcariada na rua, fica pra tu vê uma

coisa. Quer ficá doente, pegá uma bruta

anemia, dar trabalho e preocupação pra

tua mamma? Não senhor, trata de voltar

pra casa jantá. Sem prometê, não sai! Que

tenho eu a vê com os teus compromisso?

Que falta de respeito é essa? Te dou uns

tapa na boca que te arrebento todos

dente! Se teu papá tivesse aqui, queria

ver se tu falava comigo assim. Não, não

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falava não. Mas que negócio de encontro

é este? Vai se encontrá com quem? Mas

tu tá chegando tarde todas noite! Eu fico

preocupada, fico! Não consigo dormi

enquanto tu não chega. Não tem pena da

mamma? Quero vê quando eu morrê, aí

tu vai senti remorso, vai, mas aí vai ser

muito tarde, vai ser. Como que não tem

que dar satisfação? Sou ou não sou tua

mamma? Pensa que eu acredito que tu

fica com os colega depois que termina a

aula na faculdade? Fazendo o quê?

Estudando, é? Pensa que eu sou boba,

pensa? Aposto que nesta estória tem rabo

de saia, ah se aposto. Vai me contá quem

é a garota, me conta, vai! Conta pra

mamma! Eu sei que tu tá enrabichado

por uma dona... Não tá, tá sim! Conta

Giusepino, vamo! Luzia? Não é a filha da

Dona Emengarda, a professora do Grupo

Escolar, é... Mas justo aquela? Não é

mulher pra você... Tão fraca, magrinha,

seca... Ah, vá... até porco a gente escolhe

a raça antes de cruzá! Não, não é isto

meu filho, eu não estou querendo ofendê

ela não. Vá, vá, tu gosta dela. Tu é uma

criança, um bambino, meu filho. Não

senhor, só tem vinte e quatro anos... (Cai

em si) Tá bom, pode ir, vai, mas vê se não

volta depois das onze, sabe, é que eu fico

preocupada, fico. E não bate a porta.

(Pausa) Tenho um pressentimento mal...

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(Vai até a janela) Carmela... Carmela,

vem cá. Não, já, súbito. Se tu não vier eu

não falo mais contigo. Carmela,

aconteceu, é... Mas não faz esta cara que

tu não sabe o que é. Vem cá que eu te

conto tudo. (Sai da janela) Ah, Madona,

eu acendi vela, rezei tanto pra senhora...

até promessa e novena eu fiz. Ah,

Carmela, Carmela... sabe o meu

bambino... Ma que morreu? Já é um

homem. É, quer casar, mas é tão novo, 24

anos... Eu nem vi que ele tinha crescido,

Carmela. Pra mim ele continua o meu

bambino de sempre. O tempo passou e eu

nem vi. Me sinto velha. Eu gosto tanto do

meu bambino, mas ele cresceu... Ah, eu

tenho medo de perder ele... (Música.

Assunta pega o terço e reza em italiano)

Ave Maria piena de grazie, o Signor é

con voi... Mas também, né Genaro, a

saúde que eu tenho pra te aguentá,

nenhuma outra vai ter, não... e não

adianta ficá me olhando com esta cara,

viu Genaro? Uma mulher como Assunta

não tem mesmo. Deus fez a amostra e

perdeu a receita. Roupa passada, camisa

engomada, comida na hora certa, casa

limpa, etc., etc., etc. É, Madona, o meu

finado Genaro jamais teve queixa de

mim: nunca me neguei pra ele, nem

naqueles dias. Assunta, tu é uma mulher

perfeita. Só a senhora sabe o quanto eu

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gostava dele... (Continua rezando)

Benedetta sei entre le donne. Benedetto il

fruto de vostro ventre... (Vai até a janela)

Genaro, vem cá. Quando quisé voltá,

volta. Eu te recebo, não como meu

marido, mas como pai do meu filho... Ah,

Genaro, como eu te gosto... (Recomeça a

rezar) Santa Maria madre de Dio roga

per noi... (Vai até a porta do corredor)

Carmela, Carmela! Viu? Carmela, tá

lembrada que quando o meu Genaro ficou

doente, a Marli, aquela vagabunda que

morava com ele sumiu, tá lembrada?

Não foi você que me contou? Pois é, ele

não apareceu mais aqui. Achei estranho,

mas achei que ele não quisesse mais ver a

gente, né. Mas ele não voltava de

vergonha. É, vergonha pelo bruto papel

que fez comigo. E ele ficou jogado,

largado por aí como um cão que não tem

dono. Hoje eu soube, então fui procurá

ele, e trouxe ele pra casa. Toda a vila me

censurou, mas ele é meu marido. Mas já é

tarde, Carmela, muito tarde. O doutor

disse que ele não tem mais remédio. Como

tá mal, Carmela, como está... (Vai até

uma cadeira, senta e recomeça a rezar)

Ahora e na hora de la morte, ámen...

Não, não fala Genarino, dorme vá. Tá

sem sono? Tá bom, conversamo então...

Ah, lembra da Nena Linguaruda? Eco!

Ah, meu Deus do céu, ela tava sempre

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falando de todo mundo. Ninguém

prestava pra ela, ninguém... Uma boca

tão pequena e uma língua tão comprida,

não sei como cabia. Pois é, vou te contá:

ela vivia dizendo: filha minha não fica

por aí não, se esfregando nos canto

escuro. Nem mesmo no portão chega

sozinha. Se quisé namorá, tem que sê

dentro de casa, na sala de visita, e com

eu do lado. Não que eu seja maldosa, você

me conhece, né Genaro. Mas sabe que

aconteceu tudo lá dentro mesmo, na sala

de visita, e com ela do lado, é... Como foi?

Mas quem sabe explicar? Vai ver que a

velha dormiu e a garota, a filha, a das

espinhas na cara, casou de barriga, sim

senhor, que eu vi com esses olhos que a

terra há de comê. Toda apertada, vestida

de branco. De branco, imagina que coisa

Genaro. Mas que pouca vergonha! Eu

tava vendo a hora que a imagem da

Madona despencava lá do altar! E

quando o padre perguntou se tinha

alguém ali que sabia de alguma coisa,

mas foi um tal de todo mundo se cotucá

lá na igreja, que eu cheguei a ficá

vermelha de vergonha. Que bruta coisa! E

depois na festa - sim, porque além de tudo

teve festa - o noivo estava com uma cara,

e tava todo mundo apostando pra saber

quem era o pai da criança... A neta? A

linguaruda disfarçava o tempo todo.

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Sinceramente! Sabe que ela não sai mais

na rua? Por quê? Acho que é de tanta

vergonha que ela passou... É, mas eu

vivia dizendo: um dia esta mulher ainda

vai pagá a língua que tem. Tá vendo?

Pagou mesmo! Mas eu fiquei com pena da

filha dela, é boa moça, coitada, errou é

verdade, deu um mau passo, mas merecia

de casá. Mas não ria, Genaro, merecia

casá, mas não ria, é sério! Genaro,

Genaro... (Música tema da morte. Tapa a

boca com as duas mãos. Recomeça a

rezar) Benedetta sei tu entre le donne,

Benedetto il fruto... Sabe Genaro que eu

tenho sentido a tua falta? Ainda mais

com o tempo que anda fazendo agora.

Que bruto frio, eu não sei o que eu tenho,

uma hora dá uma onda de calor, outra

hora uma onda de frio, acho que é a

menopausa. Vinte anos, né, a gente

dormindo junto com um homem do lado,

né? Não é fácil dormir sozinha. Ontem eu

pus uma bolsa de água quente nas costas,

mas não é a mesma coisa, não é não, te

digo eu... Descansa em paz, meu velho.

(Assunta está em frente à cristaleira se

olhando no espelho) Pro almoço do

Giusepino de hoje, o vestido preto do

Genaro. Heee, que preto que nada... o

vestido do casamento. Se eu te pego com

outra eu te mato. (Se arruma e sai

cantarolando pro quarto e volta com o

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vestido, peruca, sapato e bolsa. Veste

combinação, coloca peruca e sapato) Não

obrigada, eu não bebo, só um pouco de

vinho nas refeições, mas se a senhora tivé

um cafezinho, eu aceito. Com bastante

açúcar, tem creme. Não, mas pra que

mandar a Rosa empregada fazê, eu

mesmo faço. Bolacha? Não obrigada, já

jantei. Refresco? Tá bom, eu gosto. Mas tá

gelado, Luzia, tô um pó gripada... Mais

que noivado o meu bambino teve, que

noivado merda o do Giusepino. Nem

convidado teve. Eu não via a hora de sair

de lá correndo... Heee, mas tá rindo de

quê? Mas Luzia, mas fui eu que escolhi o

modelo, foi... Cafona? Tá bom, deixa eu vê

as revista que você trouxe. Credo,

comprido, é? Mas por quê? Moda, é? Mas

eu quero vermelho, eu gosto. Heee, que

preto, não vou num velório. Cor de rosa,

então? Branco? Ah, só a noiva? Você é

que sabe. Madona, fui eu que escolhi o

modelo, e vermelho (veste o vestido) e

decotado. Porca miséria, mas até peruca

eu tive eu tive que usá, mas por que, se a

Jandira cabeleireira da vila podia ter me

penteado? Mas como não vamos convidá

ninguém? Não fica bem! A gente sempre

morou na vila. Eles tudo viram o

Giusepino crescer desde pequeno. Mas

Luzia, tão esperando tanto este

casamento! E aqueles sapatos, Madona,

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amassavam todo os dedo do meu pé. Vou

comê bastante, só pra descontá a raiva

que eu sinto, e vou trazer uma travessa

deste tamanho cheia de doce pra casa e

vou distribuir pela vila toda. Mas como

não convidar ninguém? Mas nem mesmo

a Carmela, nem mesmo ela? Ah, mas se

me der na veneta, e me deu na veneta,

pronto. (Corre pra janela) Carmela,

Bianca, como é, vocês não tão pronta?

Heee, pra que convite, e vocês precisam?

É tudo de casa. Avisa as outra, a peituda,

a dos fundos, o Seu Bonifácio, a Odete...

Que não falte ninguém, senão eu vou

tomá satisfação. Ai de quem me fizer esta

desfeita. (Sai da janela) Que foi Nena?

Entra, vai, entra. Que foi? O zíper

arrebentou? Dona Odete vai ajudá a

Nena, vai. Tem linha e agulha lá no

quarto. Aproveita e pega os meu chinelo

debaixo da cama. Vou levar eles na bolsa,

lá na hora da festa eu boto. Não é, né,

mas eu tenho que ficar à vontade na

festa do meu filho. Creuza, você botou

laço de fita na cabeça da meninada toda

da vila, como eu te mandei? Bravo,

bravíssimo... eu vou mandá eles carregá o

véu da noiva magricela, vocês vão ver só.

Não sei por que Sofia? Ah, não tem com

quem deixar? Mas leva junto. Não, mas

pra que mamadeira, é transtorno, Sofia.

Na hora você tira os peito pra fora e ele

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mama!... Ah, Madona, Madona... depois

de tudo isto... Madona... mas eu não sei

como contá pra senhora, tenho vergonha.

Mas se eu não contá acabo estourando.

Quando o Giusepino voltou da lua-de-mel

eu fiz os prato que ele mais gostava, e um

pudim de leite, ó... Ele veio, sem a

magricela, disse que ela estava cansada

da viagem, mas a Rosa, a empregada da

mãe dela, encontrou comigo na feira e me

contou, né, que ela jurou de nunca mais

pisar os pé nesta casa. Hoje eu fui na

feira, né, e encontrei com a Rosa. Fui

fazê umas comprinha pro almoço do

Giusepino, e aí a Rosa me disse... A

senhora sabe, né Madona, que toda sexta-

feira ele almoça comigo, porque eu disse

pra ele: em vez de comer qualquer coisa

na rua, vem pra casa da mamma quando

quiser... Mas aí a Rosa, né, aí ela... Ah,

Madona, eu misturo tudo! Tô tão confusa,

tão chocada... Madona, a senhora tá

lembrada que antes de casá o Giusepino

vivia me dizendo que ia sair daqui do

Brás, e que eu ia morá com eles no

apartamento novo? Ah, mas é tão lindo.

Eu fui ver. E o porteiro me chamou de

senhora. Imagina. Eu, senhora. Pois é, até

fechei a pensão, ele não gostava mesmo,

né? Mas no outro dia ele me disse

almoçando, que não, porque o quarto... o

quarto que eu ia dormir, lá na casa dele,

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ele ia fazê de escritório. Mas aí a Rosa

me contou... Eu não fiquei contente, né?

Mas eu não dei o braço a torcer... Eu sei

que sogra com nora não combina

mesmo... Eu não gosto da Luzia e ela

também não gosta de mim. É uma víbora!

Puxou a víbora da mãe dela também...

Eu não ia mesmo... Ainda mais depois do

escândalo do casamento... A senhora sabe

que eles não quiseram convidá a vila,

mas na hora levaram um bruta susto:

levei a vila inteira comigo, até o Nelson

viado, aquele vagabundo. A magricela

parecia uma santa... Santa, é? Mas vai

comer um saco de sal com ela pra ver se é

bom! Viu Madona, pro almoço do

Giusepino de hoje eu me vesti como tava

no dia do casamento... Eu tava tão bem...

Pelo menos me disseram, né? "Mas olha a

mamma do noivo"... "Olha a mamma do

noivo"... todo mundo falava rindo. E

quando o Giusepino chegá e me vê assim

distinta, aí ele, né... aí ele... Ah, Madona,

eu tô misturando tudo! Madona, a Rosa

me contô hoje na feira, que o Giusepino

vai montá o escritório dele lá no centro...

então por que ele me disse que ia

transformar o quarto que era meu, no

escritório dele? O quarto, a Rosa contô...

Ah, Madona, eu não sei como contar... Eu

sei que eu não sou a única mamma do

mundo. A senhora deve de estar cansada

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de tanta súplica de tanta Assunta. Me

desculpa, viu, se eu encho tanto o saco da

senhora com tanta lamúria... mas eu não

precisava ficá sabendo pela Rosa, né?

Sabe, Madona, sabe que eu vô ser nona?

É, avó... a magricela ela já está de quatro

meses... Mas por que o Giusepino não me

deu a notícia? Não, não me disse nada,

nem mesmo quando telefonou avisando

que não vinha almoçar na semana

passada! Hoje ele me conta? Madona, ele

vem? Ou telefona?... Foi a Rosa, a

empregada que me contô... (Senta-se. Tira

o vestido, peruca e fica de combinação)

Bruta coisa, né Madona? É, eu também

acho... Ah Madona, por tanta coisa tenho

passado eu... Por quê? Mas por quê? Não,

eu não tô culpando a senhora de nada,

mas... eu contava com a senhora... Não é

justo, não é justo... não é justo! Mas a

senhora quer me pôr à prova, a minha

força não acabô, Madona, não acabô.

(Tira a roupa, levantando) Se ele mudou,

eu não mudei! Continuo a mesma

Assunta de sempre... Burra, cafona,

ignorante, tudo, tudo que ele quiser... E

velha! Se a vila não é pra eles, eles não

prestam pra mim. Se eles não gostam de

mim assim... eu também não gosto deles

também e pronto! Levei vinte anos

cuidando da pensão, e vou levá mais

vinte anos cuidando da mesma pensão... o

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resto da minha vida! Fico sozinha,

pronto! Heee... ma que sozinha... tenho a

senhora, Madona, a Carmela, a Bianca...

e os filho todos da Bianca que vão nascê...

A vizinhança toda! (Corre para a janela)

Carmela!

FIM