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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO LUCY JULIANA REITER KLEINOWSKI. Itajaí, 08 de novembro de 2006.

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO

LUCY JULIANA REITER KLEINOWSKI.

Itajaí, 08 de novembro de 2006.

i

UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO

LUCY JULIANA REITER KLEINOWSKI

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como

requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc Marcus Pina Mugnaini.

Itajaí, 08 de novembro de 2006.

ii

AGRADECIMENTO

Primeiramente, a Deus, fundamental na travessia de qualquer jornada.

Ao meu orientador professor Msc. Marcus Pina Mugnaini, exemplo de dedicação ao ensino e estudo do Direito, pelo estímulo e pelo apoio

durante esta caminhada.

Aos demais professores da Universidade do Vale do Itajaí ( UNIVALI) que colaboraram direta ou

indiretamente para o êxito deste trabalho.

E, aos meus colegas da vida acadêmica, pela amizade e companheirismo demonstrados ao

longo do curso.

iii

DEDICATÓRIA

Aos meus pais Dionísio e Amália pelo amor incondicional, paciência, estímulo e de quem

herdei todos os valores que me levam sempre adiante.

Ao Sérgio, meu companheiro desta e de outras jornadas, que compreendeu os momentos de ausência durante a realização deste trabalho.

A todos aqueles que de alguma forma auxiliaram na concretização deste trabalho.

iv

TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 08 de novembro de 2006.

Lucy Juliana Reiter Kleinowski Graduando

v

PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale

do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Lucy Juliana Reiter Kleinowski,

sob o título Assédio Moral no Trabalho, foi submetida em 08/11/06 à banca

examinadora composta pelos seguintes professores: Msc Marcus Pina Mugnaini (

Orientador e Presidente da Banca), Dr. Rosni Ferreira ( membro da banca), Silvio

Noel de Oliveira Junior ( membro da banca) e aprovada com a nota [ 10 ] ( dez ).

Itajaí , 08 de novembro de 2006.

Professor Msc Marcus Pina Mugnaini Orientador e Presidente da Banca

[Professor Título Nome] Coordenação da Monografia

vi

ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

UNIVALI Universidade do Vale do Itajaí

CLT Consolidação das Leis do Trabalho

OIT Organização Internacional do Trabalho

CF Constituição Federal

STF Superior Tribunal do Trabalho

TRT Tribunal Regional do Trabalho

ART. Artigo

PL Projeto de Lei

vii

ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Ambiente de Trabalho:

é o local em que empregados e empregadores convivem boa parte de seu viver.

Ou seja: Ambiente significa “todos aqueles elementos externos à personalidade,

mas que guardam com ela relação imediata”. PASOLD, Cesar Luiz.

Personalidade e Comunicação,p.26.

Assédio Moral:

“é definido como qualquer conduta abusiva que atente, por sua repetição ou

sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma

pessoa ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho”.

Hirigoyen,Marie-France. Mal-Estar no Trabalho,p.17.

Dignidade da Pessoa Humana:

“a dignidade nasce com a pessoa. É-lhe inata. Inerente à sua essência”. NUNES,

Rizzato. O Principio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, p. 49.

Empregado:

”considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviço de natureza não

eventual a empregador sob a dependência deste e mediante salário”. Decreto-Lei

nr. 5.452/43 – Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, artigo 3° .

Empregador:

“considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os

riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação do

viii

serviço”.Decreto-Lei n. 5.452/43 – Consolidação das Leis do Trabalho – CLT ,

artigo 2° .

Personalidade:

“é uma organização e como tal ela e um complexo, subjetivo e dinâmico,

integrado por quatro blocos (ou departamentos), a saber: (1) biológico, (2)

psicológico, (3) cultural e a (4) inteligência, interagindo com um ambiente” .

PASOLD, Cesar Luiz. Personalidade e Comunicação, p. 24

Princípios:

“diz-se dos fundamentos normativo da Ciência Jurídica. Preceitos adotados em

determinada cultura como fundantes da Convivência Social. Neste sentido o

mesmo que Regras Jurídicas. Axiomas da legislação protetora dos Direitos

Humanos ”MELO, Osvaldo Ferreira de.Dicionário de Política Jurídica, p. 79.

Principio da Proporcionalidade:

“a proporcionalidade ai comparece para auxiliar na resolução, mas sempre

guiada pela luz da dignidade. Se todavia, no exame do caso, este revelar um

claro e completo conflito de dignidades, então, nessa hipótese, aqueles elementos

que compõem o principio da proporcionalidade voltam inteiros para possibilitar a

solução - difícil, é claro – do conflito” . NUNES, Rizzato. O Principio

Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana, pp. 56-57 .

Relação de Emprego:

é espécie do gênero e, sob o ponto de vista técnico-jurídico, como uma

modalidade de Relação de Trabalho, no sentido especifico, ou seja, utiliza-se esta

expressão para designar os típicos institutos concernentes àquela.DELGADO.

Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, p. 280.

ix

Relação de trabalho:

tem aspecto genérico em razão de que, seu escopo, concentra-se todas as

modalidades de contratação de trabalho Humano modernamente admissível. A

Relação de Trabalho abrange a relação de Emprego, Relação de Trabalho

Autônomo, Relação de Trabalho Eventual, de Trabalho Avulso entre outras

modalidades de prestação de labor como o estágio.DELGADO, Maurício Godinho.

Curso de direito de Trabalho, pp. 279-280.

Trabalhador:

é gênero, cuja espécie é o Empregado. Em sentido amplo designa “toda pessoa

que, executando um esforço físico, ou intelectual, no desempenho de uma

atividade, ou de uma profissão , realiza um empreendimento, promove um obra,

ou obtém um resultado, tendo em mente satisfazer uma necessidade

economicamente útil”. SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, p. 391.

Trabalho:

Trabalho que teve sua designação do língua francesa travail e no espanhol

trabajo,vinculados à origem latina no vocábulo trepalium ou tripalium, que era um

instrumento de tortura composto de três paus ferrado ou, ainda um aparelho que

servia para prender grande animais domésticos enquanto eram ferrados. Na

verbalização dessa palavra – tripaliare – passava a representar qualquer ato de

dor e sofrimento. COUTINHO, Aldacy Rachid. Trabalho e Pena, Revista da

Faculdade de Direito da UFPR, p. 07.

x

SUMÁRIO

RESUMO........................................................................................... XI

INTRODUÇÃO ................................................................................... 1

CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3

ASSÉDIO MORAL.............................................................................. 3 1.1 HISTÓRICO DO ASSÉDIO MORAL.................................................................3 1.2 CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL ..................................................................4 1.3 ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO:..................................144 1.4 ESPÉCIES DE ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO ..........166 1.5 ASSÉDIO SEXUAL: .....................................................................................233

CAPÍTULO 2 .................................................................................. 255

SUJEITOS DO ASSÉDIO MORAL................................................. 255 2.1 SUJEITOS ....................................................................................................255 2.2 ASSEDIADOR ................................................................................................25 2.3 ASSEDIADO.................................................................................................333

CAPÍTULO 3 .................................................................................. 388

O ASSÉDIO MORAL ASPECTOS JURÍDICOS: .............................. 38 3.1 PRINCÍPIOS NO CONTEXTO DO ASSÉDIO MORAL...................................38 3.2 DIREITO COMPARADO...............................................................................477 3.3 DIREITO BRASILEIRO.................................................................................500 3.4 JURISPRUDÊNCIA ......................................................................................577

CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................. 61

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS .......................................... 63

ANEXOS......................................................................................... 688

xi

RESUMO

Esta monografia tem por objeto a análise do fenômeno do

Assédio Moral no Trabalho, cujo estudo se tornou relevante, porque atinge grande

parcela de trabalhadores em nosso país e que não possui, ainda, legislação

federal específica em nosso ordenamento jurídico.

A idéia do Assédio Moral, como gerador de conseqüências

sociais e trabalhistas, é nova no universo do trabalho, contudo humilhações e

maus tratos são praticados desde os tempos mais remotos no universo do

Trabalho.

Até bem pouco tempo não era dada a devida importância ao

Assédio Moral, que somente mereceu atenção, no Brasil, a partir da publicação

da tese de mestrado da médica do trabalho Margarida Barreto, em 22.05.2000,

intitulada “Jornada de Humilhações”,

Contudo, existem, atualmente, algumas manifestações que

demonstram a intenção de coibir tais atos. Leis e projetos de leis estão em

tramitação no Brasil tanto no âmbito federal quanto no estadual e municipal, pois

a violência no ambiente de trabalho está se tornando cada vez mais freqüente

É importante considerar, por outro lado, que o Assédio Moral

não atinge somente os trabalhadores, pois toda vez que determinada situação

ameaça o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, toda a sociedade é

afetada.

Verifica-se a necessidade e urgência de se criar

instrumentos para inibir a ocorrência do fenômeno, ou, ao menos, para reparar ou

compensar os danos morais e psicológicos que são causados aos trabalhadores

pelo Assédio Moral .

1

INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o Assédio Moral no

Trabalho.

O seu objetivo é pesquisar o fenômeno e suas

conseqüências, bem como investigar se há uma legislação capaz de inibir a sua

ocorrência ou reparar os efeitos dele resultantes.

Para tanto, principia–se, o Capítulo 1, tratando do histórico

do Assédio Moral, em seguida diversos conceitos de Assédio Moral são

expostos,logo após analisou-se as espécies de Assédio Moral e fez-se uma

comparação com o Assédio Sexual.

No Capítulo 2, foram analisados os sujeitos envolvidos no

fenômeno do Assédio Moral; o assediador, seu perfil e atitudes e o assediado.

No Capítulo 3, foram estudados os aspectos jurídicos do

Assédio Moral, fez-se uma análise de princípios constitucionais, Direito

Comparado e Direito Brasileiro e, por fim, foram expostos julgados de nossos

tribunais relacionados ao tema.

Ressalta-se a dificuldade de um estudo aprofundado devido

a restrita literatura disponível sobre o tema, sobretudo na área jurídica, além da

escassez de entendimentos jurisprudenciais e dispositivos legais com aplicação

em todo o território brasileiro.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos

destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões

sobre Assédio Moral no Trabalho.

Para a presente monografia foram levantadas as seguintes

hipóteses:

2

� Considerando-se que o Assédio Moral atinge a dignidade da pessoa humana, ele deve ter estado presente nos mais diversos setores da vida, e em todas as épocas.

� Dada a condição de inferioridade e submissão em que se encontra o empregado, a ocorrência do Assédio Moral deve ser sentida, mais amiúde, nas relações de trabalho subordinado.

� Dada a revelação crescente de casos de sua ocorrência, é possível que a legislação inibidora do Assédio Moral seja inexistente ou ineficiente.

Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na fase

de investigação foi utilizado o Método Indutivo, na fase de tratamento de dados o

Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente

Monografia é composto na base lógica Indutiva.

Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as

Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa

Bibliográfica.

3

CAPÍTULO 1

ASSÉDIO MORAL

1.1 HISTÓRICO DO ASSÉDIO MORAL

A violência contra o trabalhador e consequentemente contra

sua família , fenômeno que surgiu ainda no início da Sociedade de Trabalho

Organizada1, tornou-se objeto de estudos inicialmente na Suécia e na Alemanha,

através de Heinz Leymann, um pesquisador em psicologia do trabalho, que

identificou pela primeira vez o fenômeno em 1984.

Em 1988, na França, a psiquiatra Marie-France Hirigoyen,

uma das pioneiras a desenvolver estudos do assédio moral no trabalho,

descreveu em seu livro: Assédio Moral, e depois em 2001, na sua obra Mal Estar

no Trabalho, que esse tipo de assédio envolvendo abuso de poder e manipulação

perversa, é uma espécie de “guerra psicológica” que causam prejuízos à saúde

física e mental das pessoas envolvidas.

No Brasil, a médica do trabalho Margarida Barreto foi quem

fez a primeira pesquisa sobre o tema ao concluir, em 22.05.2000, sua tese de

mestrado “Jornada de Humilhações”, na realização da pesquisa ouviu 2.072

pessoas , das quais 42% declaram ter sofrido humilhações repetitivas no trabalho.

O assédio moral vem atingindo tais proporções, que vários

países, a exemplo de Suécia, Alemanha, Itália, Austrália, Estados Unidos e

França, vêm se preocupando em inserir, em seus ordenamentos jurídicos,

1 FERREIRA, Hádassa Dolores Bonilha. Assédio Moral nas Relações de Trabalho,p.37.

4

dispositivos legais para coibi-lo. Há, também, projetos de lei em discussão em

Portugal, Suíça e Bélgica2.

Até bem pouco tempo não era dada a devida importância ao

assédio moral, contudo existem atualmente algumas manifestações que

demonstram a intenção de coibir tais atos. Leis e projetos de leis estão em

tramitação no Brasil tanto no âmbito federal quanto no estadual e municipal, pois

a violência no ambiente de trabalho está se tornando cada vez mais freqüente.

1.2 CONCEITO DE ASSÉDIO MORAL

O Assédio moral caracteriza-se por um jogo de poder que

violenta, inferioriza,humilha e intimida pelo medo, vergonha e sofrimento que

sobretudo afeta a saúde de trabalhadores e trabalhadoras. Prática antiga, apesar

de pouco difundida, o tema não é um problema exclusivo do ambiente de

trabalho, encontra-se esse tipo de violência na vida política e social e até mesmo

no lar e na família.

Pode-se dizer que o Assédio Moral é tão antigo quanto o

trabalho, contudo, a reflexão e o debate sobre o tema são recentes no Brasil,

tendo ganhado força somente após a divulgação da pesquisa brasileira realizada

pela Dra. Margarida Barreto. "Uma jornada de humilhações".foi o tema de sua

dissertação de Mestrado em Psicologia Social, defendida em 22 de maio de 2000

na PUC/ SP,que tem como assunto o Assédio Moral.

Como consta no dicionário Houaiss da Língua

Portuguesa, a palavra “assédio” significa “insistência impertinente, perseguição,

sugestão ou pretensão constantes em relação a alguém”.3

2 ZIMMERMANN,Silvia Maria.O assédio moral e o mundo do trabalho. Disponível em:

<http:www.prt12.mpt.gov.br/prt/ambiente/ arquivos/assedio_moral_texto.pdf> acessado em: 23.abril.2006.

5

O assédio moral tem uma ligação estreita com o

conceito de humilhação, que, segundo o dicionário Aurélio, significa

“rebaixamento moral, vexame, afronta, ultraje. Ato ou efeito de humilhar (-se).

Humilhar. Tornar humilde, vexar, rebaixar, oprimir, abater, referir-se com

menosprezo, tratar desdenhosamente, com soberba, submeter, sujeitar (...)”.

A psicanalista francesa Marie-France Hirigoyen define

o assédio moral como um processo de psicoterror, ou seja, de práticas em que se

exercita o terrorismo psicológico contra determinada pessoa, e se manifesta sob

diversas formas de conduta, todas abusivas, e sempre com o objetivo de

humilhar, de desestabilizar emocionalmente e de prejudicar a sua vítima. Três

são, então, os elementos centrais extraídos desse conceito: a repetitividade

(vinculada à idéia de processo), a violência psicológica e a finalidade destrutiva. 4

Segundo Margarida Barreto, assim pode ser definido o

Assédio Moral:

É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego.5

Para Vilja Marques Asse, é “(...) a exposição dos

trabalhadores e das trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras,

3 Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, disponível em:

<http://houaiss.uol.com.br/busca.jhtm?verbete=ass%E9dio&x=0&y=0&stype=k>, acesso em: 21 abril. 2006.

4 HIRIGOYEN,Marie-France. Assédio moral: a violência perversa no cotidiano. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002. p.63.

5 BARRETO, Maria. Uma Jornada de Humilhações. 2000. Dissertação (Mestrado em Psicologia Social) – PUC/SP. Disponível na Internet via WWW.URL: http://www.assediomoral.org/site/assedio/Amconceito.php. Acesso em 12 de jun. de 2006.

6

repetitivas e prolongadas, durante a jornada de trabalho e no exercício das

funções profissionais”. 6

Já Hádassa Dolores Bonilha Ferreira, define o assédio

moral a partir dos comportamentos que o caracterizam, das fases do processo de

violência e das conseqüências que gera à vítima. Segundo ela, o assédio moral

destaca-se como:

um processo composto por ataques repetitivos que se prolongam no tempo, permeado por artifícios psicológicos que atingem a dignidade do trabalhador”, acrescentando que esse processo se manifesta por meio de humilhações verbais, psicológicas, públicas, tais como o isolamento, a não-comunicação ou a comunicação hostil, o que acarreta sofrimento ao trabalhador, refletindo-se na perda de sua saúde física e psicológica.7

A violência, sempre com um caráter sutil e furtivo, merece

destaque também de Cláudio Armando Couce de Menezes, para quem “ o

assédio é um processo conjunto de atos, procedimentos destinados a expor a

vítima a situações humilhantes. De regra, é sutil, no estilo ‘ pé de ouvido’”.8

Assédio moral, segundo o psicólogo do trabalho sueco Heinz

Leymann, consiste na “deliberada degradação das condições de trabalho através

do estabelecimento de comunicações não éticas que se caracterizam pela

repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um

superior desenvolve contra o indivíduo, o qual apresenta como reação, um quadro

de miséria física, psicológica e social duradoura” 9.

6 ASSE, Vilja Marques. Um fenômeno chamado psicoterrorismo. Revista LTr- Legislação do

Trabalho: publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência, São Paulo,v.68,n.7,p.819,julho 2004.

7 FERREIRA,Hádassa Dolores Bonilha. Assédio moral nas relações de trabalho. Campinas: Russel Editores, 2004.p.49.

8 MENEZES, Cláudio Armando C. de Assédio moral e seus efeitos jurídicos. Revista LTr- legislação do trabalho, São Paulo,v.67,n.3, p.292. mar. 2003.

9 SPARAPANI, Lígia Maura. A criminalização do assédio moral. Jus Vigilantibus, Vitória, 26 out. 2004. Disponível em: <http://jusvi.com/doutrinas_e_pecas/ver/2430>. Acesso em: 23 abr. 2006.

7

Alguns autores, para melhor defini-lo e compreendê-lo,

valem-se de exemplos, como faz Cláudio Armando Couce de Menezes:

Todavia, o assédio também tem lugar por meio de procedimentos mais concretos, como rigor excessivo, confiar tarefas inúteis ou degradantes, desqualificação, crítica em público, isolamento, inatividade forçada, ameaças, exploração de fragilidade psíquica e física, limitação ou coibição de qualquer inovação ou iniciativa do trabalhador, obrigação de realizar autocríticas em reuniões públicas, exposição ao ridículo (impor a utilização de fantasia, sem que isso guarde relação com sua função; inclusão em rol de empregados de menor produtividade); divulgação de doenças e problemas pessoais de forma direta e/ou pública.10

Outros exemplos de práticas agressivas são trazidos por

Sebastião Vieira Caixeta:

As constantes humilhações, a exposição do trabalhador ao ridículo, a supervisão excessiva, as críticas cegas, o empobrecimento das tarefas, a sonegação de informação e as repetidas perseguições são notas características do assédio moral, cuja prática está relacionada geralmente a uma relação de poder, como ocorre também com o assédio sexual. O fenômeno deteriora, sensivelmente, o meio ambiente do trabalho, com repercussão na produtividade e na ocorrência de acidentes.11

Podem-se citar, como formas de exteriorização do assédio

moral, alguns gestos, comportamentos obsessivos e vexatórios, humilhações

públicas e privadas, amedrontamento, ameaças, ironias, sarcasmos, difamações,

exposição ao ridículo, sorrisos, suspiros, trocadilhos, palavras de cunho sexual,

indiferença à presença do outro, silêncio forçado, sugestão para pedido de

demissão, ausência de serviço e tarefas impossíveis ou de difíceis de realizar,

controle de tempo no banheiro, divulgação pública de detalhes íntimos, etc...

10 MENEZES, Cláudio Armando C. de Assédio moral e seus efeitos jurídicos. Revista LTr-

legislação do trabalho, São Paulo,v.67,n.3, p.292. mar. 2003. 11 CAIXETA, Sebastião Vieira. O assédio moral nas relações de trabalho. Revista do TRT 10ª

Região, Brasília, v.11,n. 11,p.60-70, jan./dez.2001;p.10,jan./dez.2002.

8

Martha Halfeld Furtado de Mendonça Schmidt ressalta que:

existem várias definições que variam segundo o enfoque desejado (médico, psicológico ou jurídico). Juridicamente, pode ser considerado como um abuso emocional no local de trabalho, de forma maliciosa, não- sexual e não-racial, com o fim de afastar o empregado das relações profissionais, através de boatos, intimidações, humilhações, descrédito e isolamento.(...) o assédio pode ser visto também pelo ângulo do abuso de direito do empregador de exercer seu poder diretivo ou disciplinar.12

É compreensível que as definições e conceitos até agora

apresentados sejam um pouco subjetivos, pois deve-se levar em consideração o

universo de possibilidades e a diversidade de contextos em que se pode

desenvolver . Contudo pode-se retirar um denominador comum das definições e

conceitos apresentados: a natureza psicológica das agressões, a repetitividade e

o objetivo de destruir a vítima.

Assim, o assédio moral é uma experiência subjetiva, que

interfere nos sentimentos e emoções, altera o comportamento, agrava doenças

pré-existentes ou desencadeia novas doenças, podendo, inclusive, culminar no

suicídio.

O assédio moral se caracteriza por ações revestidas de

maldades e hostilizações, que impõem medo e sofrimento para a vítima e acaba

por desestabilizar as relações de trabalho e em família, aumenta a violência

doméstica , o isolamento social e algumas vezes leva ao uso de drogas.

A classificação utilizada pela psiquiatra e psicóloga Marie-

France Hirigoyen, serve para analisarmos atitudes hostis que podem ser

classificadas como assédio moral :

1) Deterioração proposital das condições de trabalho:

*Retirar da vítima a autonomia.

12 SCHMIDT Martha Halfeld Furtado de Mendonça. “O assédio Moral no Direito do Trabalho”, In

Rev. TRT 9ª R. Curitiba, n. 47, p. 177-226, jan/jun 2002.

9

*Não lhe transmitir mais as informações úteis para a

realização de tarefas.

*Contestar sistematicamente todas as suas decisões.

*Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada.

*Privá-lo do acesso aos instrumentos de trabalho: telefone,

fax, computador, etc.

*Retirar o trabalho que normalmente lhe compete.

*Dar-lhe permanentemente novas tarefas.

*Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas superiores

às suas competências.

*Pressioná-la para que não lhe faça valer seus direitos

(férias, horários, prêmios).

*Agir de modo a impedir que obtenha promoção.

*Atribuir à vítima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos.

*Atribuir à vítima tarefas incompatíveis com sua saúde.

*Causar danos em seu local de trabalho.

*Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de

executar.

*Não levar em conta recomendações de ordem médica

indicada pelo médico do trabalho.

*Induzir a vítima ao erro.

2)Isolamento e recusa de comunicação:

*A vítima é interrompida constantemente.

*Superiores hierárquicos ou colegas não dialogam com a

vítima.

*A comunicação com ela é unicamente por escrito.

*Recusam todo o contato com ela, mesmo visual.

*É posta separada dos outros.

*Ignoram sua presença, dirigindo-se apenas aos outros.

*Proíbem os colegas de falar com ela.

*Não a deixam falar com ninguém.

*A direção recusa qualquer pedido de entrevista.

10

3)Atentado contra a dignidade:

*Utilizam insinuações desdenhosas para qualificá-la.

*Fazem gestos de desprezo diante dela ( suspiros, olhares

desdenhosos, levantar os ombros, etc.).

*É desacreditada diante dos colegas, superiores ou

subordinados.

*Espalham rumores ao seu respeito.

*Atribuem-lhe problemas psicológicos ( dizem que é doente

mental).

*Zombam de suas deficiências físicas ou de seu aspecto

físico; é imitada e caricaturada.

*Criticam sua vida privada.

*Zombam de sua origem ou sua nacionalidade.

*Implicam com suas crenças religiosas ou convicções

políticas.

*Atribuem-lhe tarefas humilhantes.

*É injuriada com termos obscenos ou degradantes.

4) Violência verbal, física ou sexual:

*Ameaças de violência física.

*Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve; é empurrada

fecham-lhe as portas na cara.

*Falam com ela aos gritos.

*Invadem sua vida privada com ligações telefônicas ou carta.

*Seguem-na na rua, é espionada diante do domicílio.

*Fazem estragos em seu automóvel.

*É assediada ou agredida sexualmente (gestos e propostas).

*Não levam em conta seus problemas de saúde.13

13 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2005.p.108-109.

11

Existe hoje uma diversidade de denominações para o

fenômeno do assédio moral, fenômeno típico da sociedade atual. São eles:

mobbing, bullying e harassment.

a)mobbing: segundo a maioria dos autores consultados, o

termo mobbing foi criado pelo étologo Konrad Lorenz, para descrever o

comportamento agressivo de um grupo de animais contra outro. Na década de 80

do século passado, o psicólogo alemão radicado na Suécia, Heinz Leymann,

utilizou o termo para descrever práticas que se desenvolvem entre grupos

humanos similares às observadas nas organizações entre animais. Também foi ,

mais tarde, usado pelo médico sueco Peter Paul Heinemann para definir o

comportamento hostil de determinadas crianças em relação às outras no

ambiente escolar.14

Proveniente do verbo inglês to mob, pode ser traduzido

como molestar, ou ainda, como: maltratar, atacar, perseguir e sitiar, diferente do

substantivo mob, que significa multidão, turba.15. Por isso sua vinculação, por

Marie-France Hirigoyen, ao fenômeno de grupo, uma vez que, segundo ela, “o

termo mobbing relaciona-se mais a perseguições coletivas ou à violência ligada à

organização, incluindo desvios que podem acabar em violência física.”16

b)bullying: O bullying é um termo de origem inglesa

utilizado para descrever atos de violência física ou psicológica, intencionais e

repetidos, praticados por um indivíduo (bully) ou grupo de indivíduos com o

objetivo de intimidar ou agredir outro indivíduo (ou grupo de indivíduos) incapaz

de se defender.No uso coloquial entre falantes de língua inglesa, bullying é usado

com maior freqüência para descrever uma forma de assédio perpetrado por

14 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.77. 15 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.77. 16 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.85.

12

alguém que está, de alguma forma, em condição de exercer seu poder sobre

alguém ou um grupo mais fraco.17

O termo também pode ser simplesmente traduzido como

tiranizar e, segundo Marie-France Hirigoyen:

O termo bulling nos parece de acepção mais ampla do que o termo mobbing . Vai de chacotas e isolamento até condutas abusivas de conotação sexual ou agressões física. Refere-se mais a ofensas ou violência individual do que a violência organizacional. Em estudo comparativo entre mobbing e bulling, Dieter Zapft considera que o bulling é originário majoritariamente de superiores hierárquicos, enquanto mobbing é muito mais um fenômeno de grupo.18

O conceito de bullying seria, então, mais amplo que o

conceito de mobbing,pois, também de acordo com Marie-France Hirigoyen,

aquele transita “ de chacotas e isolamento até condutas abusivas de conotação

sexual ou agressões físicas. Refere-se mais a ofensas ou violência individual do

que à violência organizacional”.19

c)Harassment: termo introduzido por Heinz Leymann, em

artigo de revista publicado em 1990, nos Estados Unidos, serve, segundo Marie-

France Hirigoyen, para descrever “ataques repetidos e voluntários de uma pessoa

a outra, para atormentá-la , mina-la, enfim, provocá-la.” Esse fenômeno, segundo

a autora, vinha sendo estudado desde 1976 pelo psiquiatra americano Carrol

Brodski, que o aborda sob a ótica dos efeitos que desencadeia na saúde do

trabalhador.20

17 Disponível em :< http://pt.wikipedia.org/wiki/Bullying> . Acessado em 18 jun.2006. 18 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.80. 19 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.85. 20 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrant Brasil,2002.p.81.

13

A exteriorização do Harassment ocorre através de gestos,

agressões verbais, comportamento , comportamentos obsessivos e vexatórios,

humilhações públicas e privadas.

Existem outras espécies de violência relacionadas com o

trabalho, mas que não poderiam ser utilizadas como sinônimo do assédio moral.

Temos como exemplo : wistlebower e ijime21.

Embora parte dos autores diferencie assédio moral de

mobbing, de bullying e de harassment, assim como de ijime e wistlebower ,outra

parte os trate como sinônimos, todos remetem ao mesmo denominador comum: a

violência psicológica reiterada que adquire contornos de verdadeiro fenômeno

social,disseminando-se cada vez mais.

Constata-se, pelo exposto, que todas as manifestações de

violência , independentemente da terminologia que utilizem, exibem elementos

comuns com o assédio moral, em especial a repetitividade dos atos, a subjugação

da vítima, o terror psicológico e a humilhação22.

21 “Vítimas desse sistema educacional severo, as crianças japonesas mais antigas teriam passado

a reproduzir contra as mais jovens todas as pressões que sofreram ao longo de sua jornada estudantil,conforme Marie-France Hirigoyen. Este termo,portanto, de origem japonesa, é comumente usado para retratar a violência infligida por uma criança contra outra no ambiente escolar.Esse fenômeno, prossegue a psicanalista francesa, repetia-se nas empresas nipônicas, nas quais o grupo mais antigo reproduzia sobre o grupo mais novo de trabalhadores recém-contratados as pressões que sofrera, com o objetivo de amoldá-los, submete-los e adapta-los às regras vigentes, reprimindo os focos de resistência por meio da pressão e repressão.Disseminou-se na década de 70,segundo informa a mesma autora, citando K. Yamanaka, quando a indústria nipônica via como essencial ao crescimento do país a necessidade de um sistema em que os jovens trabalhadores de amoldassem a uma organização do trabalho estandardizada, sem lugar para a individualidade , para as idéias próprias, para as distintas personalidades e, consequentemente para as críticas.Com a chegada da recessão, nos anos 90, os métodos de administração modificaram-se, explica a mesma autora. Não se tratava mais de preparar os melhores estudantes para as melhores carreiras e empregos para toda a vida.O sujeito não precisava mais ser educado para se amoldar a determinado sistema, mas ser flexível e adaptar-se a novas e diferentes formas de organização. O individualismo veio, então, a ser mais importante e a capacidade de produzir idéias próprias surge como um diferencial.O mérito e a produtividade ditam as regras. A violência se instala.Nas suas palavras “passa-se assim do ijime,cujo propósito é acima de tudo estruturar a comunidade de trabalho ao assédio moral mais cruel, que ainda não encontrou equivalência em algum termo japonês”. In:HIRIGOYEN, Marie-France.Mal-estar no trabalho: redefinido do assédio moral.Trad.Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002 .p.83-85.

22 Segundo Margarida Barreto a humilhação “é o sentimento de ser ofendido, menosprezado, rebaixado,inferiorizado, submetido, vexado, e ultrajado pelo outro. È sentir-se um ninguém, sem valor, inútil; magoado, perturbado, mortificado, indignado, com raiva. As emoções em nova

14

1.3 ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO:

Com sua origem vinculada à existência do trabalho, o

assédio moral no ambiente de trabalho é um fenômeno que vem ocorrendo com

freqüência, tanto na iniciativa privada quanto nas instituições pública.

O Assédio Moral dentro do direito do trabalho detêm seu

quantum de dificuldade, pois tal agressão é extremamente sutil e muito difícil de

ser apurada. Contudo foi no ambiente do trabalho que o assédio moral ganhou

visibilidade. Com a globalização que traz consigo modelos de gestão

administrativas que visam ao lucro e ao crescimento a qualquer preço e

consequentemente a flexibilização das relações trabalhistas que trouxeram a

generalização, banalização e intensificação do problema.

A flexibilização das relações de emprego torna o

empregado, ironicamente, responsável pelo próprio desemprego, pois o

empregador buscará pessoal mais dócil, manejável, capaz de assumir funções

sem protestar e dispensará os que já não são convenientes. As atuais relações de

emprego exigem do trabalhador um novo perfil: autônomo, flexível, capaz,

competitivo, criativo, qualificado e empregável.

Com isso a realidade impõe ao trabalhador um ônus que, na

verdade, é conseqüência principalmente das mudanças tecnológicas e das

políticas econômicas.

O ritmo impressionante da economia, a terceirização, o

interesse em reduzir custos de trabalho, a tendência a contratar por tempo

determinado, o existência do subemprego e do desemprego podem ser causas da

tendência do crescimento do assédio moral.

O crescimento do assédio moral traz consigo a degradação

das condições de trabalho, o medo , manipulação para aumentar a produção e

ordem poderem ser causa de liberdade ou servidão. In: BARRRETO,Margarida. Violência, saúde e trabalho: uma jornada de humilhações. São Paulo: Educ, 2003.p.188.

15

reforçar o autoritarismo, a submissão, a disciplina, e o pacto de silêncio coletivo,

gerando um clima de instabilidade emocional coletiva, insegurança e

desconfiança entre todos.

O ambiente de trabalho23 acaba se desumanizando,

acirrando a competitividade e dificultando assim a proliferação do espírito de

cooperação e solidariedade entre os trabalhadores.

Para uma empresa poder sobreviver à pressão da economia

requer-se produtividade e as pressões por produtividade acabam distanciando os

órgãos dirigentes e os trabalhadores o que resulta na impossibilidade de

comunicação e degradação do ambiente laboral.

Surgem, então, através da cultura da coisificação do

trabalhador as práticas de humilhação e maus tratos e a exigência do novo perfil

do empregado solicitado pela cultura organizacional que busca o empregado

perfeito: flexível, maleável, polivalente e não questionador.

No Brasil uma particularidade sócio-cultural histórica facilita

a disseminação do assédio moral foi observada por André Luiz Souza Aguiar24,

abaixo transcrita:

Pedagogos e filósofos como Paulo Freire (1987) e Leonardo Boff (1999), historiadores como Caio Prado (1972), Raymundo Faoro

23 Para Fernando José Cunha Belfort, o meio ambiente de trabalho pode ser entendido “ como

sendo qualquer local onde se desenvolve a prestação dos serviços, quer interna ou externamente, e também o ambiente reservado pelo empregador para o descanso do trabalhador, dotado de condições higiênicas básicas, regras de segurança capazes de preservar a integridade física e a saúde das pessoas envolvidas no labor, com o domínio, o controle, o reconhecimento e a avaliação dos riscos concretos ou potenciais existentes, assim considerados agentes químico, físicos e biológicos, no objetivo primacial de proporcionar qualidade de vida satisfatória e a proteção secundária do conjunto de bens móveis e imóveis utilizados na atividade produtiva.” In:BELFORT, Fernando José Cunha.Meio ambiente do trabalho: competência da justiça do trabalho.São Paulo: Ltr, 2003.p.54. Já para Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, o ambiente de trabalho engloba “ o conjunto de objetos ,suas características, pessoas e posturas, condutas e vestuários, os quais também moldam os comportamentos numa relação de fluxo e refluxo” In: FONSECA, Ricardo Tadeu Marques da.Saúde Mental para e pelo trabalho.Revista Ltr- Legislação do Trabalho: publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência,São Paulo,v.67,n.1,p.676,janeiro de 2003.

24 Informação disponível em:< http://www.assediomoral.org/site/biblio/MD_02.php> Acesso em: 23 abr. 06.

16

(1979), Sérgio Buarque de Holanda (1984) e Darcy Ribeiro (1995), economistas como Celso Furtado (1964) e Francisco de Oliveira (1990), sociólogos como Florestán Fernandes (1978) e Otávio Ianni (1987), antropólogos como Roberto DaMatta (1980; 1982; 1991) e Lívia Barbosa (1992), administradores como Guerreiro Ramos (1996). Mais recentemente, Prestes Motta (1997), entre outros, todos coincidem em afirmar que a base da cultura brasileira é o engenho, reconhecendo a relevância das relações sociais estabelecidas na Casa Grande e a Senzala como foram relatadas por Gilberto Freyre (1973) e indo mais além: a ambigüidade das relações propiciou o "jeitinho brasileiro", que faz com que o conflito seja omitido e a situação dos privilegiados perpetuada.

Os traços presentes na cultura organizacional brasileira

trazem traços típicos e característicos do estilo paternalista e autoritário de

administrar no engenho , na casa- grande e na senzala, e que foram fortalecidos

pelo coronelismo.

As formas de dominação do passado ainda estão vivas nas

organizações brasileiras, o que dificulta superar o velho estilo paternalista de

dominação.As organizações atuais, apesar do distanciamento histórico do início

da colonização, continuam a repetir ou a permitir que comportamentos

humilhantes, como o assédio moral, façam parte de seu cotidiano.

Verifica-se este problema, não só em países em

desenvolvimento como o Brasil, este fenômeno está presente no cenário

internacional. E não atinge apenas trabalhadores braçais, atinge homens,

mulheres, altos executivos, tanto da iniciativa privada quanto no setor público.

1.4 ESPÉCIES DE ASSÉDIO MORAL NO AMBIENTE DE TRABALHO

O processo de assédio moral é passível de se desenvolver

em qualquer ambiente relacional, pois a violência pode transitar por todos os

espaços e por todos os contextos que se conhece. No universo acintoso do

17

trabalho, essa forma de agressão rompe os laços de solidariedade entre todos,

surgindo sob diferentes modelos de assédio moral.

O fenômeno do assédio moral se apresenta sob as mais

variadas formas, e é motivado pelas mais variadas razões.

Analisa-se abaixo algumas espécies de assédio moral:

a)assédio moral horizontal

O assédio moral horizontal25 desenvolve-se em relações

assimétricas, podendo ocorrer de um grupo contra outro, de um colega contra

outro ou de um grupo contra determinado indivíduo, enfim aquele praticado entre

colegas de trabalho, geralmente ocorre em função de disputas para obtenção de

um mesmo cargo ou de uma promoção26

Márcia Novaes Guedes identifica esse tipo de assédio da

seguinte forma:

25 DALLEGRAVE Neto, José Affonso. Direito do Trabalho Contemporâneo, p.11, faz uma

observação ao comentar sobre o Toyotismo que obriga o trabalhador a se tornar polivalente e versátil, com a existência de tarefas repetitivas e estressantes. Para que esse sistema funcione, os dirigentes colocam em prática os Círculos de Controle de Qualidade – CCQs e os Controles de Qualidade Total – CQTs. Como isso, os próprios grupos de empregados ficam incumbidos da fiscalização mútua, desaparecendo a figura do gerente superior hierárquico. Percebe-se assim, que essa fiscalização eventualmente pode gerar o Assédio Horizontal. Isso porque não se sabe se a fiscalização pretendida pelo colega de trabalho estaria para servir os proósitos institucionais ou se era para a satisfação de sua perversidade em relação à vítima, o que gera problemas no Ambiente de Trabalho.

26 HIRIGOYEN,Marie-France.Mal-Estar no Trabalho,p.113, apresenta o relato do seguinte caso que exemplifica a definição de Assédio Moral Horizontal: “ Amélia começa a trabalhar em uma pequena empresa como assessora comercial. Nicole, a colega que ocupa a mesma mesa junto da sua, é encarregada de ensinar-lhe o trabalho. As duas fazem um trabalho equivalente. Quando Amélia faz perguntas sobre um programa de computador,Nicole resmunga, dizendo que não tem o dia todo para ficar à disposição dela e, em seguida dá-lhe explicações rapidíssimas, de um jeito que Amélia nunca consegue anotar o que é dito. Se Amélia pergunta de novo, Nicole adota um ar impaciente: ‘eu já lhe expliquei isso!’ Após várias semanas,Amélia surpreende Nicole falando de seus erros aos superiores e comentando: ‘Decididamente, ela não aprende depressa! Eu até chego a duvidar que ela tenha trabalhado com informática antes!’ Ela termina se aproveitando de um erro em um relatório financeiro para acusar Amélia de desonestidade e fraude. De início, Amélia não compreende a razão do comportamento tão agressivo da colega. Ela reflete bastante e tenta ser mais gentil, até o dia em que encontra a secretária precedente , que havia pedido demissão em conseqüência da hostilidade de Nicole. Então, Amélia se dá conta de que não é sua culpa o fato de a colega ser tão hostil”.

18

[...] a ação discriminatória é desencadeada pelos próprios colegas de idêntico grau na escala hierárquica. Os fatores responsáveis por esse tipo de perversão moral são a competição, a preferência pessoal do chefe porventura gozada pela vítima, a inveja, o racismo, a xenofobia e motivos políticos. [...] a vítima pode ser golpeada tanto individual como coletivo. 27

Marie-France Hirigoyen acredita que as razões apóiam-se

nas mais variadas motivações, embora a mais comum seja a diferença em razão

de sexo, raça, cor , religião, classe social, ect.,caso em que a violência possui

uma motivação discriminatória. Para a autora, ainda, a motivação da violência

entre pares surge do fato de que “os grupos tendem a nivelar os indivíduos e têm

dificuldade em conviver com a diferença”,28 recusando-a , então, por

comportamentos nitidamente discriminatórios.29

Concordam com essa idéia Ana Cristina Limongi França e

Avelino Luiz Rodrigues, para quem “o comportamento humano é determinado

pela inter-relação do indivíduo com o grupo do qual faz parte”30.

Segundo Marie-France Hirigoyen, um grupo não constitui o

somatório dos comportamentos individuais de seus integrantes; apresenta-se

como um ente novo e diverso, e que tende a nivelar os indivíduos que o

compõem, ensejando também novas formas de comportamento coletivo.31 A

mesma autora expõem que o comportamento de um indivíduo difere quando o

mesmo faz parte de uma coletividade. Um sujeito pacífico pode praticar atos de

violência por influência do grupo a que está inserido. Nas empresas não é

diferente.

27 GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003, p. 36. 28 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de

Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.70. 29 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.:

Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,2002.p.37. 30 FRANÇA, Ana Cristina Limongi. RODRIGUES, Avelino Luiz. Stress e trabalho: uma

abordagem psicossomática. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2002.p.26.

19

Quando agrupadas, segundo explica Marie-France

Hirigoyen, as pessoas agem com imaturidade, pois estabelecem uma relação de

dependência na qual são impulsionadas pela necessidade de aprovação. O

grupo, portanto, representa “um sistema de pensamento completo”, o que implica

dizer que, quando um sujeito ingressa em um meio, deve seguir as regras e os

valores que esse meio propõe, deve adequar-se, amoldar-se aos demais. Quando

os valores de um indivíduo conflitam com o do coletivo, a violência assume lugar

privilegiado. 32

Para Vilja Marques Asse o fenômeno horizontal é também

atribuído a organização do trabalho, mas sob outra perspectiva. Para ele, as

pressões por produtividade e a redução de custos, aliadas ao temor ao

desemprego, não apenas fomentam o individualismo, mas também disseminam o

discurso da discórdia, da intolerância. Servem de exemplo as situações em que

trabalhadores sadios interiorizam uma imagem deturpada dos trabalhadores

doentes, exergando-os como improdutivos e, consequentemente, como se

fossem defeitos na engrenagem do sistema, cujo funcionamento foi

comprometido, passando a reproduzir e a perpetuar as humilhações e os

comportamentos da chefia.33

b)assédio moral vertical

Pode verificar o assédio moral vertical nas relações laborais

, nas quais o assediado e o assediador estão colocados em posições hierárquicas

diferentes, é reconhecido pela maioria dos autores como assédio moral vertical

ascendente e assédio moral vertical descendente.

31 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de

Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.69. 32 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.: Rejane

Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,2002.p.270-272. 33 ASSE, Vilja Marques. Um fenômeno chamado psicoterrorismo. Revista LTr – Legislação do

Trabalho: publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência, São Paulo, v.68,n.7,p.820,julho 2004.

20

O assédio moral vertical ascendente verifica-se quando a

violência é praticada por um ou mais subordinados contra a pessoa ou a função

de seu superior. Utiliza-se , por exemplo, de uma falsa acusação de Assédio

Sexual34. È pouco comum devido a ausência de um fator importante, o poder,

porém tem o mesmo efeito devastador que as outras modalidades de Assédio

Moral..

Quanto ao assédio moral vertical descendente é, uma das

suas formas mais freqüentes nas relações de trabalho, porque se apóia,

fundamentalmente, no poder. Pelo poder pode o superior hierárquico manipular e

perseguir os indesejados. Márcia Novaes Guedes entende e define o assédio

moral descendente como:

A violência psicológica é perpetrada por um superior hierárquico [...] pode este contar com a cumplicidade dos colegas de trabalho da vítima e através destes a violência pode ser desencadeada. [...] o grupo tende a se alinhar com o perverso, creditando à vítima a responsabilidade pelos maus-tratos. 35

Para Vilja Marques Asse, esse fenômeno “se caracteriza por

relações autoritárias, desumanas e aéticas, em que predominam os desmandos,

a manipulação do medo, a competitividade, os programas de qualidade total,

associados à produtividade”.O autor atribui à organização do trabalho com suas

novas características , na qual se deve ser qualificado, competente, produtivo,

flexível, polifuncional, autônomo, eficiente , criativo, responsável, a culpa pelo

34 HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio Moral, p.80, a autora define Assédio Sexual da forma que

será transcrita a seguir: “ O assédio sexual não é senão um passo a mais na perseguição moral. Tem relação com os dois sexos, mas a maior parte dos casos descritos, ou de que há queixas, refere-se a mulheres agredidas por homens, frequentemente por seus superiores hierárquicos. Não se trata tanto de obter favores de natureza sexual quanto de afirmar o próprio poder, de considerar a mulher como seu objeto (sexual). Uma mulher assediada sexualmente é considerada por seu agressor como estando ‘a disposição’. Ela deve aceitar e até sentir-se lisonjeada, realçada, por ter sido ‘escolhida’. O assediador não admite que a mulher visada possa dizer não. Aliás, se ela o faz, sofre em revide humilhações e agressões. Não é raro que o agressor diga que foi ela quem provocou, que ela era permissiva ou que ela quem tomou a iniciativa”.

35 GUEDES, Márcia Novaes. Terror Psicológico no Trabalho. São Paulo: LTr, 2003, p. 36.

21

surgimento da violência laboral, porque se transfere, com isso , para o

trabalhador, a responsabilidade pela manutenção do seu próprio emprego.36

Ana Cristina Limongi França e Avelino Luiz Rodrigues,

também posicionam-se nesse sentido, para eles o trabalho alienante é exercido

de forma coercitiva, impedindo o desenvolvimento das qualidades individuais e o

controle do próprio processo de trabalho. O trabalho alienante, segundo esses

autores:

(...) contém o potencial de produzir, ou despertar, nas pessoas, uma experiência emocional que possua as seguintes características: sensação de falta de poder,sentimentos de insatisfação, frustração, sensação de viver em um mundo insensível e hostil às pretensões e necessidades dos trabalhadores.37

Segundo Sônia A.C.Mascaro Nascimento, o assédio moral

também instrumentaliza estratégias empresariais de eliminação a que uma

empresa recorre quando pretende afastar determinado funcionário indesejável,

situação em que se verifica o “abuso de direito do poder diretivo e disciplinar”,por

meio do qual o agressor objetiva esquivar-se das obrigações trabalhistas,

forçando a auto-exclusão do empregado.38

O assédio moral vertical descendente encontra igualmente

terreno fértil nas empresas que sofrem da ilusão de que quanto maior a pressão ,

maior a rentabilidade, ignorando o fato de que funcionários insatisfeitos e infelizes

produzem menos e são mais suscetíveis a erros, a acidentes e a afastamentos

por doença, argumenta Marie-France Hirigoyen. Segundo ela, é bastante comum

o chefe recorrer ao assédio moral como meio de sentir-se valorizado, compensar

36 ASSE, Vilja Marques. Um fenômeno chamado psicoterrorismo. Revista LTr- Legislação do

Trabalho: publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência, São Paulo,v.68,n.7,p. 819-820,julho 2004.

37 FRANÇA,Ana Cristina Limongi.RODRIGUES, Avelino Luiz. Stress e trabalho:uma abordagem psicossomática. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2002.p.100.

38 NASCIMENTO, Sônia A. C.Mascaro. O assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTr- Legislação do Trabalho:publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência, São Paulo,v.68,n.8,p.923, agosto 2004.

22

a sua “fragilidade identitária” e a sua necessidade de dominar, o que o leva a

tomar atitudes abusivas, como impingir sobrecarga de trabalho, impor a prática de

jornadas extenuantes ou fazer exigências desnecessárias. Essa falta de visão

empreendedora, alerta, pode contaminar todos os níveis de gerenciamento,

produzindo o que chama de efeito cascata , com a repetição do assédio desde os

mais altos postos até a menor chefia na escala hierárquica da empresa.39

No assédio moral vertical descendente a vítima se sente

mais isolada e sente dificuldades para achar a solução do problema ,

consequentemente trazendo mais danos a saúde.

Marie-France Hirigoyen divido o assédio moral vertical

descendente em três sub-grupos:

a)assédio perverso40, cujo objetivo é eliminar o outro para,

com isso, enaltecer seu próprio poder; é típico de assediadores perverso-

narcisistas.

b) assédio estratégico, “que se destina a forçar o empregado

a pedir as contas e assim contornar os procedimentos legais de dispensa”41.

c)assédio institucional, “que é um instrumento de gestão do

conjunto pessoal”42.

Por fim, existem, ainda, os casos de assédio moral misto43,

em que mesclam manifestações de assédio horizontal e de assédio vertical

39 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de

Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.82-83. 40 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral, a respeito da Perversão define que essa é oriunda “

do latim per-vertere: virar ao contrário, revirar, definida como transformação do bem em mal. Atualmente, para o senso comum, a palavra perverso subentende um juízo moral”

41 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho,p.112. 42HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral.Trad.: Rejane

Janowitzer.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,2002.p.113. 43 Chistophe Dejour traz em sua obra o relato de um caso real que ilustra bem o assédio moral

misto, ou ascendente e descendente, A situação abusiva é demonstrada pelo isolamento promovido tanto pelos colegas como pelos superiores, conforme conta o autor: Trata-se de um engenheiro, recentemente designado para uma garagem da SNGF ( Societé Nationale dês Chemis de Fer Français). Alguns dias após sua chegada, toma conhecimento de informações sobre um incidente ocorrido no setor da ferrovia pelo qual é responsável. A cancela de uma

23

descendente. Alice Monteiro de Barros explica que, nessa modalidade de

violência, o superior hierárquico se une ao grupo de subordinados para assediar

um determinado empregado.44

O assédio moral misto, mais difícil de acontecer, pode existir

em ambiente onde há alta competitividade , onde impera a gestão por

estresse,onde o chefe ou patrão imprime um alto nível de exigência e má

gerenciamento de recursos humanos.

1.5 ASSÉDIO SEXUAL:

Apesar de apresentarem semelhanças, pois tanto o assédio

moral quanto o assédio sexual se traduzem em comportamentos, atos,palavras,

gestos ou escritos que tornam o meio ambiente de trabalho hostil, são institutos

distintos.

Pode-se conceituar assédio sexual como uma conduta não

desejada de natureza sexual. Assédio sexual ocorrido nas relações de emprego é

passagem de nível não abaixou à passagem de um trem. Nesse momento não havia ninguém na estrada, nem a pé nem de carro. Em reunião de trabalho, o engenheiro relata o incidente. Os dispositivos automáticos não funcionaram. Após o incidente, a cancela voltou a funcionar normalmente sem nenhuma intervenção técnica ou reparo específico. Porém o fato é inquestionável. Qual é a causa? Onde está o defeito? Silêncio geral entre os colegas. O novo engenheiro insiste, mas os demais minimizam a importância do fato.O engenheiro não pensa assim e, entendendo que o incidente é grave, exige uma investigação técnica completa. O grupo vai aos poucos isolando o novato insistente. Por quê? As mudanças estruturais e o enxugamento de trabalho que eles “ deixam pra lá” Não podem, é claro, admitir tal situação oficialmente e limitam-se a recusar a investigação proposta pelo novo colega porque ela demandaria muito tempo e trabalho. Além disso, insistem no fato de que, desde o ocorrido, a cancela aparentemente funciona sem mais incidentes. Os ânimos se exaltam. O engenheiro se recusa a desistir da investigação. Vê-se obrigado a sustentar a gravidade do incidente, enquanto os outros a minimizam. Por fim, o chefe da garagem vem e decide: como não ouve colisão com outro veículo, nem feridos e nem mortos o caso estava encerrado. Ao sair da reunião, o engenheiro não se sente bem , está arrasado, não entende a atitude dos outros, tampouco sua unanimidade. Fica em dúvida, não sabe se está seguindo o regulamento e o bom senso ético (enquanto seus colegas se opõem, negando uma realidade) ou se, ao contrário, está dando mostras de perfeccionismo e teimosia descabida, cumprindo-lhe nesse caso, rever toda a sua vida profissional . Nos dias seguintes, seus colegas evitam comer à mesa que ele e dirigir-lhe a palavra. O infeliz não compreende mais nada. O cerco se aperta. Ele se sente cada vez mais angustiado e perplexo. Dois dias depois, no seu local de trabalho, ele se joga do vão de uma escada, transpondo o parapeito. È hospitalizado com fraturas múltiplas, depressão, confusão mental e tendência suicida. DEJOURS, Chistophe. A banalização da injustiça social. Tradução de Luiz Alberto Monjardim, 4º ed.,Rio de Janeiro: Editora FVG, 2001.

44 NASCIMENTO, Sônia A. C. Mascaro. O assédio moral no ambiente do trabalho. Revista LTr- Legislação do Trabalho: publicação mensal de legislação, doutrina e jurisprudência, São Paulo v.68,n.8,p. 923, agosto de 2004.

24

a única forma criminalizada, pois se encontra tipificada no Código Penal com a

seguinte redação: "Assédio sexual. Art. 216-A. Constranger alguém com o intuito

de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua

condição de superior hierárquico ou ascendência inerente ao exercício de

emprego, cargo ou função."

Maria Aparecida Alkimim determina os elementos que

caracterizam o assédio sexual:

De acordo com esta conceituação legal, três são os elementos básicos caracterizadores do assédio sexual: a) constrangimento consciente e contrário ao ordenamento jurídico, pois obriga, impõe à vítima atitude contrária à sua vontade; b) finalidade de obtenção de vantagens ou favorecimento sexual; c) abuso do poder hierárquico.45

A partir de análises estatísticas pode-se perceber que em

ambos os institutos o maior número de vítimas é do sexo feminino e que

comumente o assédio moral ocorre com mais freqüência no ambiente de trabalho.

Em seu estudo a médica Margarida Barreto apresenta que: 65% das mulheres

entrevistadas tem histórias de humilhações, contra 29% dos entrevistados

homens.46.

A conduta do assédio sexual visa,de forma clara ou através de

insinuações, a obtenção de favores sexuais. Diferentemente do assédio moral

que exige uma conduta reiterada sua caracterização, para caracterizar o assédio

sexual basta apenas uma conduta . Outro traço distintivo é que no assédio sexual

fica evidente a intenção do assediador e, ao passo que no assédio moral a

violência se instala “silenciosamente”, ou seja, de forma muito sutil e que deixa o

ofendido em dúvida acerca da intenção do agente.

45 ALKIMIM, Maria Aparecida. Assédio Moral na Relação de Emprego.2º tiragem.Curitiba:

Juruá,2006 p.59.

25

CAPÍTULO 2

SUJEITOS DO ASSÉDIO MORAL

2.1 SUJEITOS

No assédio moral existem os sujeitos que agridem e sujeitos

que são vítimas. Pode-se verificar que tanto a chefia quanto os empregados

podem ocupar o lugar de assediado quanto o de assediador. É fundamental para

o estudo do fenômeno que se entenda que tanto o assediador quanto o

assediado são seres humanos. E como seres humanos apresentam perfis

psicológicos distintos e por isso importantes para a análise do assédio moral.

Para o operador de direito é importante analisar e conhecer

os envolvidos no assédio moral.

2.2 ASSEDIADOR

O assediador tanto pode ser uma pessoa quanto um grupo

de pessoas. Seria muito mais simples de se estudar os sujeitos envolvidos no

assédio moral sob a perspectiva do bem e do mal. Determinados indivíduos,

devido ao seu perfil psicológico, podem atuar potencialmente como assediador. O

perfil psicológico do assediador foi traçado com clareza por Marie-France

Hirigoyen47. Em primeiro lugar, a personalidade do assediador é narcísica. Como

46 BARRETO, Margarida. Uma jornada de humilhações. Dissertação de mestrado –

Departamento de Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 2000, p.157.

47 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.142.

26

tal, a autora descreve a pessoa que apresenta, pelo menos, cinco dos seguintes

comportamentos:

- o sujeito tem um senso grandioso da própria importância;

- é absorvido por fantasias de sucesso ilimitado, de poder;

- acredita ser “especial” e singular;

- pensa que tudo lhe é devido;

- explora o outro nas relações interpessoais;

- não tem a menor empatia;

- inveja muitas vezes os outros;

- dá provas de atitudes e comportamentos arrogantes.

A doutrina é unânime em traçar o perfil psicológico do

assediador como de uma pessoa “perversa”, que se utiliza de meios perversos

para se defender.

Na maioria dos casos trata-se de um indivíduo narcisista

que ataca a auto- estima transferindo a dor e as contradições que não admite em

si mesmo, como a falta de empatia. Possui um ego grande e uma necessidade

de ser admirado, não esta apto a superar a solidão que o separa do mundo,sente

inveja das pessoas que são felizes com a própria vida e é insaciável em busca de

gratificação. Para o narcisista, diz Euler Sinoir de Oliveira “todos devem se

espelhar em seu comportamento, em suas atitudes, pois precisam saber que ele

é o melhor [...] “48 Devido a crise existencial que cerca a vida do narcisista, busca

vítimas para assim preencher suas fraquezas passando a elas a responsabilidade

pelo mal que causa a si mesmo. Primeiro contamina a vítima com sua visão

pessimista do mundo, até levá-la a depressão, depois passa a criticá-la pelas

suas fraquezas.

48 OLIVEIRA, Euler Sinoir de; MANNRICH, Nelson (coord.). Assédio Moral: sujeitos, danos à

saúde e legislação.Revista de Direito do Trabalho, São Paulo, V.30, n114,p.53,abr./jun.2004.

27

Geralmente o assediador tem como objetivo assediar

alguém mais fraco, cujo medo gere conduta de obediência, não só nele como

também nos outros empregados, que se encontram em seu lado. Assim, sendo

temido por todos, a possibilidade de receber auxílio dos outros dos que o cercam

é praticamente remota. O que o assediador quer é o domínio da organização, é

controlar os outros.

Esclarecedor é o perfil do narcisista apresentado por

Hirigoyen:

Os grandes perversos são também seres narcisistas e, como tal, vazios, que se alimentam da energia vital e da seiva do outro. O perverso narcisista depende dos outros para viver; sente-se impotente diante da solidão, por isso, agarra-se a outra pessoa como verdadeira sanguessuga. Esta espécie é movida pela inveja e seu objetivo é roubar a vida de suas vítimas. Como sujeito megalômano, o perverso tem um senso grandioso da própria importância, é absorvido por fantasias de sucesso ilimitado e de poder. Acredita ser especial e singular, pensa que tudo lhe é devido; tem excessiva necessidade de ser admirado, e age como um vampiro. Não tem empatia, alimenta-se da energia dos que se vêem seduzidos pelo seu charme; sente profunda inveja daqueles que parecem possuir coisas que lhe faltam, ou que simplesmente sabem extrair prazer da vida. São críticos ferinos; sentem prazer em criticar os outros, assim, provam-se onipotentes, diante da nulidade dos outros. Vazios e despossuídos de subjetividade, os perversos são seres irresponsáveis; por isso, ocultam-se, jogando os seus erros e limitações nos outros. Afinal, tudo que acontece de mau é sempre culpa dos outros49.

Os perversos narcisistas, ainda de acordo com Marie-France

Hirigoyen, agem como parasitas, que sugam e que vampirizam a qualidade que

existe no outro e da qual desejam apropriar-se , porque dela se sentem

desprovidos e, por isso, inferiorizados; motivo determinante de sua conduta

descambada na inveja, e seu objetivo, a apropriação. A inveja, explica a

autora,enquanto pesar e descontentamento diante da felicidade alheia e, ao

49 HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio moral: a violência perversa no cotidiano. 5. ed. São

Paulo: Bertrand Brasil, 2002. p.143.

28

mesmo tempo, enquanto cobiça o que é do outro, tem como conseqüência lógica

a apropriação e, insatisfeito mesmo assim, a destruição de quem possui o bem

que é cobiçado.50

Alguns perfis de assediador são enumerados e

“personificados”, baseados em observações dos trabalhadores, no site da

internet: http:// www.assediomoral.org :

1-Profeta - Considera que sua missão é demitir

indiscriminadamente os trabalhadores para tornar a máquina mais enxuta

possível. Para ele demitir é uma “grande realização”. Gosta de humilhar com

cautela, reserva e elegância.

2- Pit-Bull – Humilha os subordinados por prazer, é

agressivo,violento e até perverso no que fala e em suas ações.

3- Troglodita – É aquele que sempre tem razão. As normas

são implantadas sem que ninguém seja consultado, pois acha que os

subordinados devem obedecer sem reclamar. É uma pessoa brusca.

4- Tigrão – Quer ser temido para esconder sua

incapacidade. Tem atitudes grosseiras e necessita de público para recebê-las,

sentindo-se assim respeitado (através do temor que tenta incutir nos outros).

5- Mala- babão – É um “capataz moderno”. Bajula o patrão e

controla cada um dos subordinados com “mão de ferro”. Também gosta de

perseguir os que comanda.

6- Grande irmão – Finge que é sensível e amigos dos

trabalhadores não só no trabalho, mas fora dele.Quer saber dos problemas

particulares de cada um para depois manipular o trabalhador na “primeira

oportunidade” que surgir,usando o que sabe para recebê-lo.

7- Garganta – Vive contando vantagens (apesar de não

conhecer bem o seu trabalho) e não admite que seus subordinados saibam mais

que ele.

8- Tasea – ( “tá se achando”) – É aquele que não sabe agir

em relação as demandas de seus superiores; é confuso e inseguro. Não tem

50 HIRIGOYEN,Marie-France.Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de

Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.147.

29

clareza de seus objetivos, dá ordens contraditórias. Se algum projeto ganha os

elogios dos superiores ele apresenta-se para recebê-lo, mas em situação inversa

responsabiliza os funcionários pela “incompetência”.

Já Márcia Novaes Guedes em seu livro Terror Psicológico

no Trabalho identificou outras 13 denominações para os assediadores: “1 ) O

instigador; 2 ) O casual. 3 ) O colérico. 4 ) O megalômano. 5 ) O frustado.6 ) O crítico. 7 )

O sádico. 8 ) O puxa-saco. 9 ) O tirano.10 ) O aterrorizado. 11 ) O invejoso. 12 ) O

carreirista. 13 ) O pusilânime”51.

Analisando-se as denominações acima pode-se verificar que

apesar de diferentes tem sempre o mesmo objetivo que é de humilhar,destruir e

acabar com a auto-estima da vítima e que acabam afetando a saúde física e

mental da pessoa agredida, desencadeando num pedido de demissão ou até

mesmo num suicídio.

O Prof. Jorge Luiz de Oliveira da Silva ensina que:

"De uma forma ou de outra, qualquer que seja o perfil do

assediador, tudo converge para uma mesma constatação: é ele um fraco, porque

demonstrou ser incapaz de construir sua própria felicidade, deixando de praticar

atitudes que o conduziriam à conquista do bem."52

Em uma publicação do Sindicato dos servidores do Poder

Judiciário Federal do Estado do Espírito Santo – SINPOJUFES são elencadas

algumas atitudes hostis e propositais do assediador no ambiente de trabalho,

quais sejam:

Retirar da vítima a autonomia; Não repassar informações úteis para a realização de tarefas; Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada; Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores ou muito superiores à sua competência; Agir de modo a impedir uma promoção;

51 GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p.59-60. 52 Jorge Luiz de Oliveira da Silva, Ética e Assédio Moral: uma visão filosófica, disponível em:

http://www.sociologia.org.br/tex/pscl82ibes.htm, acesso em: 16 jun. 2006.

30

Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de executar; Induzir a vítima ao erro; Enviar comunicados apenas por escrito; Colocar a vítima em lugar separado dos outros; Superiores ou subordinados desacreditam a vítima perante os colegas, que zombam de suas deficiências; Ameaçar com violência física ou tratar aos gritos, e Atribuir-lhe tarefas humilhantes53.

A forma mais comum de o assediador agir é através do uso

de palavras dirigidas ao assediado que o façam sentir menor, humilhada e sem

valor , porém existem diversas formas de se exteriorizar o assédio moral

,Menezes explica isso quando diz que:

A exteriorização do harcelement moral, portanto, ocorre através de gestos, agressões verbais, comportamentos obsessivos e vexatórios, humilhações públicas e privadas, amedrontamento, ironia, sarcasmos, coações públicas, difamações, exposição ao ridículo (tarefas degradantes ou abaixo da capacidade profissional (p. ex: servir cafezinho, lavar banheiro, levar sapatos para engraxar ou rebaixar médico para atendente de portaria), sorrisos, suspiros, trocadilhos, jogo de palavras de cunho sexista, indiferença à presença do outro, silêncio forçado, trabalho superior às forças do empregado, sugestão para pedido de demissão, ausência de serviço e tarefas impossíveis ou de dificílima realização, controle do tempo no banheiro, divulgação pública de detalhes íntimos, agressões e ameaças, olhares de ódio, instruções confusas, referências a erros imaginários, solicitação de trabalhos urgentes para depois jogá-los no lixo ou na gaveta, imposição de horários injustificados, isolamento no local de trabalho; transferência de sala por mero capricho, retirada de mesa de trabalho e pessoal de apoio, boicote de material necessário à prestação de serviços e supressão de funções. O estilo específico de agressão varia de acordo com os meios socioculturais e profissionais. Nos setores de produção, a violência é mais direta, verbal ou física. Por outro lado, quanto

53 SINDICATO DOS SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL DO ESTADO DO

ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. Assédio moral: fique ligado. Informativo, Vitória, p. 6-7, jul. 2003.

31

mais se sobe na hierarquia e na escala social, mais as agressões são sofisticadas, perversas e difíceis de caracterizar.54

Existem inúmeras frases usadas pelo assediador contudo as

principais são as seguintes:

Você é mesmo difícil... Não consegue aprender as coisas mais simples! Até uma criança faz isso... e só você não consegue!

É melhor você desistir! É muito difícil e isso é pra quem tem garra!! Não é para gente como você!

Não quer trabalhar... fique em casa! Lugar de doente é em casa! Quer ficar folgando... descansando.... de férias pra dormir até mais tarde....

A empresa não é lugar para doente. Aqui você só atrapalha!

Se você não quer trabalhar... por que não dá o lugar pra outro?

Teu filho vai colocar comida em sua casa? Não pode sair! Escolha: ou trabalho ou toma conta do filho!

Lugar de doente é no hospital... Aqui é pra trabalhar.

Ou você trabalha ou você vai a médico. É pegar ou largar... não preciso de funcionário indeciso como você!

Pessoas como você... Está cheio aí fora!

54 MENEZES, Cláudio Armando Couce de. Assédio moral e seus efeitos jurídicos. Síntese

Trabalhista, Porto Alegre, n. 169, p. 140-150, jul. 2003.

32

Você é mole... frouxo... Se você não tem capacidade para trabalhar... Então porque não fica em casa? Vá pra casa lavar roupa!

Não posso ficar com você! A empresa precisa de quem dá produção! E você só atrapalha!

Reconheço que foi acidente... mas você tem de continuar trabalhando! Você não pode ir a médico! O que interessa é a produção!

É melhor você pedir demissão... Você está doente... está indo muito a médicos!

Para que você foi a médico? Que frescura é essa? Tá com frescura? Se quiser ir pra casa de dia... tem de trabalhar à noite!

Se não pode pegar peso... dizem piadinhas "Ah... tá muito bom para você! Trabalhar até às duas e ir para casa. Eu também quero essa doença!"

Não existe lugar aqui pra quem não quer trabalhar!

Se você ficar pedindo saída eu vou ter de transferir você de empresa... de posto de trabalho... de horário...

Seu trabalho é ótimo, maravilhoso... mas a empresa neste momento não precisa de você!

Como você pode ter um currículo tão extenso e não consegue fazer essa coisa tão simples?

Vou ter de arranjar alguém que tenha uma memória boa, pra trabalhar comigo, porque você... Esquece tudo!

33

A empresa não precisa de incompetente igual a você!

Ela faz confusão com tudo... É muito encrenqueira! É histérica! É mal casada! Não dormiu bem... é falta de ferro!

Vamos ver que brigou com o marido! ��

2.3 ASSEDIADO:

A pesquisadora Maria Alkimin prefere chamar o assediado

de vítima ou sujeito passivo e traz a seguinte definição em seu livro:

Vítima ou sujeito passivo do assédio moral é aquele que sofre agressões reiteradas e sistemáticas, visando hostilizá-lo, inferiorizá-lo e isolá-lo do grupo, comprometendo sua identidade, dignidade pessoal e profissional; além dos danos pessoais que somatiza e reverte em dano à saúde mental e física, o que acaba gerando, conseqüentemente, incapacidade para o trabalho e afastamento, desemprego, depressão e até o suicídio56.

As pessoas já discriminadas pela sociedade são geralmente

as que mais sofrem com o assédio moral. As mulheres grávidas, as mães

solteiras, os trabalhadores com mais de 40 anos de idade, são alguns dos

principais alvos dos assediadores, sem esquecer dos assediados em virtude de:

religião, raça, deficiência física, doença ou orientação sexual.

As mulheres grávidas, os empregados representantes

sindicais e os acidentados , devido a estabilidade provisória, são vítimas

constante do empregador que tem como objetivo fazer a vítima pedir demissão.

Neste mesmo raciocínio complementa Coutinho:

55 Disponível em:< http://www.assediomoral.org/site/assedio/AMfrases.php > .Acessado em :16 de

jun.2006

34

Fato é que as pressões psicológicas são usadas tanto para afastar da empresa aquele trabalhador que não se adapta ao modelo de gestão, como para conformá-lo aos objetivos da organização, fixados em torno do aumento da produtividade e sua resultante, o lucro. Tais pressões também são utilizadas contra os empregados que gozam de estabilidade de emprego - representante sindical, cipeiro, acidentado do trabalho, ou empregada grávida - sempre com o intuito de contaminar o ambiente de trabalho, tornando insuportável sua permanência na empresa.57

O assédio moral praticado contra as mulheres é praticado de

forma diversa do praticado contra os homens, aquele geralmente quase sempre

apresenta conotações machistas ou sexistas.58

Em um levantamento, feito por Marie- France Hirigoyen em

seu livro : Mal Estar no Trabalho, apresenta os seguintes resultados em relação

as faixas etárias das vítimas do Assédio Moral:

“* nenhum caso antes de 25 anos;

*8% entre 26 e 35 anos;

*29% entre 36 e 45 anos;

*43% entre 46 e 55 anos (sendo 21% entre 46 e 50 e 24%

entre 51 e 55 anos);

*19% com mais de 56 anos.”59

O pelo levantamento confirma-se a predominância do

assédio moral aos trabalhadores acima dos 40 anos, muitas vezes julgados não

56 ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na relação de emprego. Curitiba: Juruá, 2005.p.

45-46. 57 COUTINHO, Maria Luiza Pinheiro. Discriminação na Relação de Trabalho: uma afronta ao

princípio da igualdade. Rio de Janeiro: AIDE Editora, 2003.p.49 58 Segundo Marie-France Hirigoyen, a incidência de assédio moral entre mulheres e homens varia

de acordo com o ambiente sócio-cultural, ainda que as mulheres, mais frequentemente, sejam as vítimas , ou em razão de uma recusa sexual (que é mais freqüente entre as mulheres), ou por puro machismo. In: HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinido o assédio moral. Trad.:Rejane Janowitzer.Rio de Janeiro:Bertrand Brasil,2002.p.95-106.

59 HIRIGOYEN, Marie-France.Mal-estar no trabalho:redefinindo o assédio moral. Trad.:Rejane Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005.p.95.

35

adaptáveis e menos produtivos. Além disso o empregador acredita que

empregados nesta faixa etária estão mais propensos a doenças e atestados

médicos então utiliza-se do assédio moral para se desfazer desta mão-de-obra.

FURTADO ainda acrescenta:

[...] ante a fragilidade ínsita à idade, a violência moral encontra terreno propício perante o idoso, sendo de fácil dedução que aquele que se encontra debilitado por conta da idade é presa fácil para o que, desonestamente, quer-lhe retirar vantagem, com escudo na pressão psicológica, de mais fácil consecução em relação ao depauperado.60

Pode notar que “prevalece entre os estudiosos da questão

do assédio moral, segundo Cinzia Frascheri, o entendimento de que não existe

uma predisposição para ser vítima ou que personalidade, comportamento e agir

do agredido atuem como agentes provocadores da violência sofrida. Para a

autora,qualquer classificação tipológica da vítima, ou, mesmo, do assediador

exibe sempre uma conotação pejorativa, uma visão particularmente redutiva do

fenômeno.”61

Marie-France Hirigoyen ressalta que: “quando se estuda o

assédio moral pelo lado dos protagonistas, é preciso desconfiar de toda

caricatura; não existem de um lado os malvados assediadores , e do outro, as

vítimas, pobres inocentes.” Ela assevera ainda que uma pessoa “ pode ser muito

produtiva e agradável em um contexto favorável e se tornar inapta e

desagradável, se o meio for hostil. Cada um tem sua patologia ou sua

vulnerabilidade, mas a patologia dos dirigentes é tolerada por mais tempo que a

dos empregados.”62

60 FURTADO, Emmanuel Teófilo. Preconceito no Trabalho e a Discriminação por Idade. São

Paulo: LTr, 2004. p.304. 61 SALVADOR, Jane. Assédio moral no trabalho. Curitiba, 2005. Dissertação (Mestrado)-

Universidade Católica do Paraná. 62 HIRIGOYEN,Marie-France.Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Trad.:Rejane

Janowitzer. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.p.215.

36

Há, ainda assim, um posicionamento minoritário que

discordam de tal entendimento, como Euler Sinoir de Oliveira, que apresenta uma

classificação arbitrária da própria vítima: o distraído, o prisioneiro, o paranóico, o

severo, o presunçoso, o passivo dependente, o brincalhão, o hipocondríaco, o

verdadeiro colega, o ambicioso, o seguro de si, o camarada, o servil. 63

Existem também fatores psicológicos desencadeadores do

assédio moral. Quando existem tais fatores o assediado é vítima, pois foi

escolhida pelo assediador porque possui atributos64 que causam insegurança ao

assediador.

Segundo GUEDES:

A vítima do terror psicológico no trabalho não é o empregado desidioso, negligente. Ao contrário, os pesquisadores encontraram como vítimas justamente os empregados com um senso de responsabilidade quase patológico, são ingênuas no sentido de que acreditam nos outros e naquilo que fazem, são geralmente pessoas bem-educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais. De um modo geral, a vítima é escolhida justamente por ter algo mais. E é esse algo mais que o perverso busca roubar. As manobras perversas reduzem a auto-estima, confundem e levam a vítima a desacreditar de si mesma e a se culpar. Fragilizada emocionalmente, acaba por adotar comportamentos induzidos pelo agressor. Seduzido e fascinado pelo perverso o grupo não crê na inocência da vítima e acredita que ela haja consentido e, consciente ou inconscientemente, seja cúmplice da própria agressão.65

Mesmo entendimento tem a Dra. Lydia Guevara Ramires :

63 OLIVEIRA, Euler Sinoir de; Nelson Mannrich (Coord.). Assédio Moral:sujeitos, dano à saúde e

legislação. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo, v.30,n.114,p.57-58, abril/junho. 64 “Por vezes, o assédio é suscitado por um sentimento de inveja em relação a alguém que tem

alguma coisa que os demais não tem (beleza, juventude,riqueza,relações influentes).È também o caso dos jovens portadores de vários diplomas que ocupam um posto em que tem como superior hierárquico alguém que não possui o mesmo nível de estudos”.In:HIRIGOYEN, Marie-France. Assédio moral: a violência perversa no cotidiano.4 ed.Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.p.69-71.

65 GUEDES, Márcia Novaes. Terror psicológico no trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p.63

37

Em geral, a pessoa assediada é escolhida porque tem características pessoais que perturbam os interesses do elemento assediador, com ganância de poder, dinheiro ou outro atributo ao qual lhe resulta inconveniente o trabalhador ou trabalhadora, por suas habilidades, destreza, conhecimento, desempenho e exemplo, ou simplesmente, quando estamos em presença de um desajustado sexual ou psíquico (...)66

Também são vítimas em potencial as pessoas transparentes

e apegadas a ordem , pois estas pessoas julgam o próximo por seu próprio

comportamento. Analisam sempre se de alguma forma não deram causa ao

problema. Assim preleciona Alkimim :

Instalado o processo de assédio moral, o sujeito ativo visa destruir a vítima e afastá-la da organização do trabalho, vítima que, a princípio, não acredita na perversidade do sujeito, imagina-se culpada e busca em si suas falhas, tenta uma melhor solução para evitar o desemprego e a instabilidade do clima de trabalho, podendo apresentar queda na produtividade pelo desgaste emocional, que evolui para gerar stress, fadiga e outros efeitos maléficos sobre a saúde física e mental em razão da somatização.67

66 Disponível em :< http://conjur.estadao.com.br/static/text/11900,1> . Acessado em 18 jun. 2006 67 ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na Relação de Emprego. Curitiba: Juruá, 2005.p.47

38

CAPÍTULO 3

O ASSÉDIO MORAL ASPECTOS JURÍDICOS:

3.1 PRINCÍPIOS NO CONTEXTO DO ASSÉDIO MORAL

O direito do trabalho é um ramo autônomo que reúne uma

série de requisitos, entre os quais estão os seus princípios norteadores,

conhecidos como princípios gerais. Estes têm por função atuar supletivamente e

preencher lacunas que porventura a lei possua, bem como servir de auxílio à

interpretação da própria lei. Podemos dizer então que os princípios gerais do

direito apresentam-se, inicialmente, com a função de importante fonte subsidiária

do direito.

Tais princípios trazem ao operador do direito o meio pelo

qual identificará os componentes novos que a sociedade trouxe para a efetiva

tutela, em nosso caso o assédio moral e a forma como deverá ser interpretado

dentro do mundo jurídico. De Plácido e Silva define a princípios como sendo os

pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do direito. 68 Tais princípios trazem ao operador do direito o meio pelo qual identificará os

componentes novos que a sociedade trouxe para a efetiva tutela, em nosso caso

o assédio moral e a forma como deverá ser interpretado dentro do mundo jurídico.

68 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico, p.447, apresenta o seguinte entendimento para a

Categoria Princípios: “No sentido jurídico, notadamente no plural, que significa as normas elementares ou requisitos primordiais instituídos com base, como alicerce de alguma coisa.E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixaram para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica.Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-se em perfeitos axiomas”.

39

Oportuna a lição do renomado professor Vicente Ráo, sobre

princípios de direito, na sua forma mais ampla:

O Direito contém princípios implícitos ou explícitos na sua definição, quais sejam: a existência de direitos inerentes à personalidade humana e, consequentemente, sua inviolabilidade por qualquer norma jurídica; a comunhão social como modo natural da vida do homem; a finalidade do direito visando, através da disciplina das relações entre os homens, o aperfeiçoamento destes, e, por este modo, o da sociedade; a equação proporcional entre as faculdades e os deveres; a sociedade e o Estado considerados como meios e não como fins de direito. (...) Esses princípios fundamentais estão consagrados em diversos diplomas legais, tais como: a Constituição dos Estados Unidos da América do Norte, de 1787, e, em especial, as emendas de número I a X, XIII, XIV, XV e XIX; a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, adotada pela Assembléia Nacional Constituinte, na França em 1789, baseada na afirmação da existência de direitos naturais, inalienáveis, imprescritíveis e sagrados do homem; a Declaração Universal dos Direitos do Homem proclamada pela Organização das Nações Unidas – ONU , em 1948, considerado o mais importante documento contemporâneo de cunho social e político acerca dos direitos e deveres fundamentais do homem, apresentando-se como um ideal comum a ser alcançado por todos os povos e por todas as nações, uma vez que assegura direitos da personalidade humana iguais e inalienáveis, como fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.69

O direito ao trabalho, está inserido no Título II, que versa

sobre os direitos e garantias fundamentais, do texto constitucional, por isso trata-

se de um direito fundamental. Porém essa garantia não se refere apenas ao

direito ao trabalho, mas a um trabalho digno70 . Portanto atitudes que violem esse

mandamento, como o Assédio Moral, precisam ser repelidas, respeitando-se

assim a dignidade da pessoa humana, inclusive no ambiente de trabalho.

69 RAÓ, Vicente. O Direito e a Vida dos Direitos. 5 ed. Anotada e atual por Ovídio Rocha Barros

Sandoval .São Paulo: Ed.Revista dos Tribunais, 1999.p.56-67. 70 SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo. 24 ed.São Paulo: Malheiros,

2005. p.282.

40

A violência moral afronta diretamente o “princípio dos

princípios”71 e um dos principais pilares da Constituição Federal de 1988, o

princípio da Dignidade da pessoa humana, por isso deve-se combate-lo pois

denigre verdadeiros atributos ao indivíduo enquanto ser humano. Em face disto,

cabe aqui ressaltar algumas definições para “dignidade”:

Dignidade: derivado do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral que, possuída por uma pessoa, serve de base ao próprio respeito em que é tida. Compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa, pelo qual se faz merecedor do conceito público.72

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas como seres humanos(...)73

Continuando sua linha de pensamento a professora Flávia

Piovesan:

O valor da dignidade humana impõe-se como núcleo básico e informador do ordenamento jurídico brasileiro, como critério e parâmetro de valoração a interpretação e compreensão do sistema constitucional instaurado em 1988. A dignidade humana e os direitos e garantias fundamentais vêm a constituir os princípios

71 José Afonso da Silva entende que “ o princípio da dignidade da pessoa humana , unificador de

todos os direitos, encontra-se presente ao longo do texto da Carta Magna a fim de garantir a cidadania – lato sensu- que é um dos fundamentos do Estado brasileiro(...)” e prossegue afirmando que “ a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida (...) “ (in Curso de Direito Constitucional Positivo . 24. ed. São Paulo: Malheiros , 2005 p.105.

72 SILVA,De Plácido e. Vocabulário Jurídico/ atualizadores: Nagib Slaibi Filho e Gláucia Carvalho. 24 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004.

73 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 6 revista , ampliada e atualizada.São Paulo: Max Limonad, 2004.p 56-57.

41

constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico ao sistema jurídico brasileiro. Os direitos e garantias fundamentais passam a ser dotados de uma especial força expansiva, projetando-se por todo o universo constitucional e servindo como critério interpretativo de todas as normas do sistema jurídico nacional74

Vale lembrar que a Carta Magna traz em seu art. 1º a

Dignidade da Pessoa Humana como um dos fundamentos da República,

Emmanuel Teófilo Furtado ressalta a amplitude dessa expressão:

É de se concluir, que dar fundamento ao Estado da dignidade da pessoa humana patenteia o reconhecimento do valor do homem enquanto ser livre, ao mesmo tempo em que o próprio Estado reconhece ter suas próprias pilastras na observância do princípio em baila em favor do ser humano, abrangendo tal princípio não somente os valores individuais, mas os direitos dos outros, de natureza econômica, social e cultural. 75

A professora Maria Aparecida Alkimin assim se posiciona

sobre o atentado ao princípio da dignidade do trabalhador e de como valorar o

Assédio Moral resultante:

Se considerarmos que o assédio moral atinge a esfera da dignidade humana do trabalhador e a personalidade moral, profissional, social, familiar, integridade física e psíquica do mesmo, enfim, dá origem aos denominado pelo direito italiano dano existencial ,forçosamente concluímos que será impossível mensurar a intensidade do sofrimento psicológico e , consequentemente, estabelecer critérios matemáticos para a fixação da indenização. O mesmo não ocorre com a fixação do dano material , pois o prejuízo material garante o ressarcimento do que a vítima efetivamente perdeu (dano emergente) e o que deixou de ganhar (lucro cessante), restabelecendo o status quo ante, conforme se infere do disposto no art.402 do CC (...) No

74 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 6 revista ,

ampliada e atualizada.São Paulo: Max Limonad, 2004.p 319. 75 FURTADO, Emmanuel Teófilo. Preconceito no trabalho e a discriminação por idade. São

Paulo: LTR , 2004. p.120.

42

caso do dano proveniente do assédio moral , a questão ainda é mais delicada, pois a vítima busca no trabalho a realização pessoal , profissional e familiar, e toda essa realização o dinheiro não compra (...) .76

O Assédio moral, tema do presente estudo, até o presente

momento não possui lei federal que o trate de forma específica, por isso torna-se

indispensável um conhecimento geral dos princípios que servem de base para a

prestação jurisdicional. Faz-se aqui uma exposição de alguns princípios

aplicáveis, tendo como referência as idéias apresentadas na obra de César Luiz

Pacheco Glockner77:

a) Princípio da Razoabilidade:

Também denominado princípio da proporcionalidade diz que

o ser humano deve agir conforme sua razão. Este princípio faz com que fiquem

limitadas certas faculdades que, se exacerbadas poderiam dar margem a

arbitrariedades. Fundamental torna-se este princípio no direito do trabalho,

regulando relações jurídicas onde verificamos realçada desigualdade em torno da

prestação do trabalho humano mediante remuneração e subordinação.

O poder disciplinar do empregador deve ser orientado por

critérios razoáveis. Se a possível punição apresentar-se injusta ou exagerada,

poderá ser desfeita, valendo-se o juiz, neste caso, do princípio da razoabilidade.

No direito do trabalho o princípio da razoabilidade ora limita

faculdade, ora estende direitos. Ao limitar faculdades, limita a margem de

arbitrariedade conferida pela lei às partes, notadamente o empregador, que

possui o poder diretivo e que mantém o trabalhador sob a sua subordinação

jurídica.

b) Princípio da Boa-Fé:

76 ALKIMIN, Maria Aparecida. Assédio Moral na Relação de Emprego . Curitiba: Juruá ,

2005.p.118-119. 77 GLOCKNER, César Luís Pacheco. Assédio Moral no Trabalho. São Paulo: IOB Thomson,

2004.

43

O princípio da boa-fé, muito aplicável ao direito do trabalho,

garante direitos e obrigações a ambas as partes. De um lado o empregado deve

fidelidade ao seu patrão, devendo empenhar-se ao máximo na execução de suas

tarefas. Por outro lado, o empregador deve fornecer segurança ao trabalhador

remunerando todo o trabalho tomado e não exigindo de seu empregado mais do

que o plenamente suportável. Este princípio aplica conteúdo moral à situação

fática, no caso o Assédio Moral.

c) Princípio da Realidade:

A liberdade na contratação entre pessoas de poder e

capacidade econômica desigual pode conduzir a diferentes formas de exploração,

inclusive às mais abusivas e iníquas.

O princípio da realidade consiste na primazia da realidade

sobre os fatos consignados por escrito no contrato e somente aplicável no direito

do trabalho. O que vale é a realidade, muitas vezes distante de formulações

legais, ou mascaradas pelo manto da liberdade contratual.

Os efeitos jurídicos não surgem da vontade acordada no

contrato de trabalho, mas sim da execução diária deste. Assim, no caso de

discrepância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou

acordos, deve-se dar preferência ao primeiro, isto é, ao que acontece no terreno

dos fatos. É o chamado “contrato realidade”. No momento de sua formação, o

contrato de trabalho é consensual, porém no tocante à sua execução, vai

assumindo outras formas, distanciando-se daquilo que foi pactuado inicialmente.

d) Princípio da não- discriminação:

O empregador deve tratar igualmente a todos os seus

funcionários, vedando-se concessão de benefício a apenas alguns trabalhadores

em detrimento de outros que se encontram exatamente na mesma situação.

Tal igualdade pretendida neste princípio não é absoluta. A

igualdade deve ser considerada levando-se em conta circunstâncias objetivas e

subjetivas, não medindo todos pelo mesmo método, mas apenas os que estão

44

nas mesmas condições (há diferenças de capacidade, atividade, condições

psicofísicas,...). É preciso verificar-se caso a caso.

e) Princípio da Proteção:

Como verifica-se no direito do trabalho uma evidente

desigualdade entre as partes é dispensada ao trabalhador uma necessária

proteção e amparo.Isto não é observado nos outros ramos do direito, onde se

busca a todo custo a igualdade entre as partes. Saliente-se, porém, que essa

aparente proteção tem por fim exatamente igualar as condições no âmbito do

direito laboral, pois nas relações trabalhistas existe natural desigualdade entre as

partes, principalmente de cunho econômico, o que se demonstra facilmente nos

casos de assédio moral.

Em relação a essa questão, afirmam Cintra, Grinover e

Dinamarco:

A absoluta igualdade jurídica não pode, contudo, eliminar a desigualdade econômica; por isso, do primitivo conceito de igualdade, formal e negativa (a lei não deve estabelecer nenhuma diferença entre os indivíduos), clamou-se pela passagem à igualdade substancial. E hoje, na conceituação positiva da isonomia (iguais oportunidades para todos, a serem propiciadas pelo Estado), realça-se o conceito realista, que pugna pela igualdade proporcional, a qual significa, em síntese, tratamento igual aos substancialmente iguais. A aparente quebra do princípio da isonomia, dentro e fora do processo, obedece exatamente ao princípio da igualdade real e proporcional, que impõe tratamento desigual aos desiguais, justamente para que, supridas as diferenças, se atinja a igualdade substancial.78

Ensina o professor Sérgio Pinto Martins79 que o referido

princípio desdobra-se em três regras: in dubio pro operário, norma mais favorável

e condição mais benéfica:

78 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido

Rangel. Teoria geral do processo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 53-54. 79 MARTINS, Sérgio Pinto. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: Dialética, 2001., p. 42.

45

- In Dubio Pro Operário

Transportada a partir do in dubio pro réu, possui a finalidade

de proteger a parte presumidamente mais frágil na relação jurídica, sendo no

direito do trabalho, o empregado-credor.

Esta regra aconselha o intérprete a escolher entre duas ou

mais interpretações viáveis, a mais favorável ao trabalhador, desde que não

afronte a nítida manifestação do legislador, nem se trate de matéria probatória. É

claro que neste caso, o intérprete não pode considerar a matéria de forma

extensiva onde não seja cabível, bem como não pode procurar interpretações que

fujam da norma legal.

- Norma Mais Favorável

No seu sentido próprio, esta regra será observada quando

existirem diversas normas aplicáveis à mesma situação jurídica. Neste caso,

dever-se-á optar pela norma que seja mais favorável ao trabalhador,

independente de sua colocação na escala hierárquica de normas jurídicas.

A maior dificuldade na aplicação desta regra é a

identificação da norma mais favorável, levando em consideração a gama de

normas aplicáveis ao caso concreto, tais como leis, convenções, acordos

coletivos,...

Vejamos o que diz Amauri Mascaro Nascimento sobre a

regra:

Ao contrário do direito comum, em nosso direito entre várias normas sobre a mesma matéria, a pirâmide que entre elas se constitui terá no vértice não a Constituição Federal, ou a lei federal, ou as convenções coletivas, ou o regulamento de empresa, de modo invariável e fixo. O vértice da pirâmide da

46

hierarquia das normas trabalhistas será ocupado pela norma mais favorável ao trabalhador dentre as diferentes em vigor80.

- Condição Mais Benéfica

A alteração de normas trabalhistas não pode piorar as

condições de trabalho do empregado. Ainda que vigore ou sobrevenha norma

jurídica imperativa prescrevendo menor nível de proteção aos trabalhadores, por

essa regra deve haver a prevalência das condições mais vantajosas ajustadas no

contrato de trabalho ou resultantes do regulamento de empresa.

Alguns autores entendem que essa regra encontra guarida

na própria Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXVI.

Nesse sentido entende Odonel Urbano Gonçales:

“...a lei não pode tirar do trabalhador condições e benefícios já

concedidos e adquiridos, exatamente por ser o trabalhador a parte hipossuficiente da

relação de trabalho. Do contrário, o trabalhador não teria nenhuma segurança em sua

vida quotidiana”.81

Segundo Plá Rodriguez,

“... a regra da condição mais benéfica pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que seja mais favorável ao trabalhador que a norma aplicável”.82

Importante ressaltar que a inobservância dos princípios, ,

tem como conseqüência um desequilíbrio na Relação de Trabalho e

consequentemente o Assédio Moral.

80 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Compêndio de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1977, p.

23 81 GONÇALES, Odonel Urbano. Direito do trabalho para concursos. São Paulo: Atlas, 2000, p.

310. 82 RODRIGUEZ, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1993, p. 60.

47

3.2 DIREITO COMPARADO

A discussão acerca do assédio moral começou

recentemente, principalmente no âmbito jurídico. Devido a isso a legislação,

inclusive a estrangeira, não possui muitas normas a respeito do problema. Em

todo o mundo projetos que visam combater o assédio moral tem sido

desenvolvidos.

Alguns países saíram na frente, como exemplo temos a

França que foi um dos primeiros a ter uma lei específica abordando o assunto. Foi

introduzido no Código do Trabalho Francês através da Lei de Modernização

Francesa, onde há um capítulo exclusivo sobre assédio moral, que em 17 de

janeiro de 2002 foi publicado no Diário Oficial Francês. Existem nesse código

diversos dispositivos com o intuito de viabilizar a luta contra o assédio moral no

trabalho.

Verifica-se a necessidade de uma legislação

específica,conforme conclui Lydia Guevara Ramírez:

Até meados da década de 80 eram poucos os países que haviam adotado normas específicas sobre assédio moral.Mas nos últimos 20 anos tem sido significativo o aumento de casos, já há normas específicas que consideram o assédio sexual ilícito e inaceitável nos lugares de trabalho, e inclusive há códigos de trabalho que se referem ao tema dos direitos humanos e equidade que regulam todos os aspectos da discriminação em razão do sexo. Não obstante, ainda há poucos instrumentos que abordem especificamente o assédio e hostilização sexual em escala internacional, como a Recomendação Geral de 1992, adotada no marco das Nações Unidas sobre a eliminação da Discriminação contra a mulher (...) Sendo cada vez mais freqüente o assédio moral nos locais de trabalho, requer-se adotar a legislação correspondente para que as vítimas possam denunciar os fatos na

48

segurança de que haverá uma sanção, não se vendo na obrigação de encobrir os assediadores com desculpas.83

Na legislação internacional identifica-se uma série de

normas jurídicas sobre o assédio moral, conforme quadro abaixo:

França Lei de Modernização Social

Suíça Projeto de Lei Federal

Bélgica Projeto de Lei Federal

Parlamento Europeu Resolução 20 de setembro de 2001

Chile Projeto de Lei

Uruguai Projeto de Lei

Portugal Projeto de Lei

Noruega Código do Trabalho

Fonte: http://assediomoral.org

Interessante destacar trecho da legislação trabalhista norueguesa por seu pioneirismo no trato do assunto:

Código do Trabalho (Working Environment Acts, 1977)

Artigo 12 - Planejando o trabalho

1. Condições Gerais

A tecnologia, a organização do trabalho, a execução do trabalho, o horário de trabalho e os regimes salariais deverão ser organizados de forma a não expor os trabalhadores a efeitos físicos ou mentais adversos e de maneira a garantir as suas possibilidades de exercer cautela e de se assegurar que as suas condições de segurança não são prejudicadas.

83 RAMÍREZ, Lydia Guevara. Reflexões sobre assédio moral no trabalho. Secretaria da Diretoria

Nacional. Sociedade Cubana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. UNJC.

49

Os meios necessários para prevenir os efeitos físicos adversos serão colocados à disposição dos trabalhadores. Os trabalhadores não serão submetidos ao assédio ou a qualquer outra conduta imprópria.

As condições de trabalho serão organizadas de tal forma que os trabalhadores possam ter oportunidades para um desenvolvimento profissional e pessoal no trabalho.

2. Organização do Trabalho

Quando do planejamento e da organização do trabalho será levado em consideração a possibilidade de cada trabalhador ter auto-determinação e possibilidade de exercer sua responsabilidade profissional.

Esforços deverão ser feitos para evitar trabalho pouco diversificado, repetitivo e trabalho que seja comandado por máquinas ou correia de transporte de tal forma que os trabalhadores estejam protegidos no caso de variação de ritmo de trabalho.

Outros esforços deverão ser feitos para organizar o trabalho de forma a dar possibilidades de variação e oportunidade de contatos com outros, para ligar tarefas individuais de trabalho e para oferecer aos trabalhadores informações sobre exigências da produção e sobre resultados.O trabalho deve ser organizado para não ofender a dignidade do trabalhador.84

Já o Projeto de “Lei das faltas laborais graves” do Uruguai

destaca o Assédio Moral praticado pelo empregador de maneira inovadora e

clara, podendo ser usada como modelo de legislação para o Brasil.

84 Disponível em :< http://www.assediomoral.org> Acessado em: 30 ago. 06.

50

Também servem de fonte para o nosso legislador as

diretivas do Assédio Moral aprovadas pelo Parlamento Europeu, que foram

aprovadas em 20 de setembro de 2001.

3.3 DIREITO BRASILEIRO

No Brasil ainda não existe lei ou alteração na Consolidação

das Leis do Trabalho para reprimir o Assédio Moral. Porém , apesar de recente, já

existem esforços articulados em relação a legislação. A grande maioria das leis

atualmente existentes são municipais e amparam os servidor público.85 Na

competência federal existem projetos de lei específicos em andamento. Conforme

art. 41, I, da Lei Federal nº 9.029/95 no Brasil, o assédio moral além da nulidade

da despedida e da reintegração no emprego , pode dar ensejo também à

resolução do contrato do empregado por descumprimento dos deveres legais e

contratuais, conforme art. 483,d, da CLT . E ainda autoriza a justa causa devido

ao agir ilícito ( art. 482,b, da CLT).

A Constituição garante no que diz respeito à Dignidade

humana, à cidadania, à imagem, e ao patrimônio moral do trabalhador, inclusive

com a indenização por danos morais. (art. 51,V, e X da CF). Por isso existe a

possibilidade de gerar a reparação dos danos patrimoniais e morais pelos

gravames da ordem econômica ( perda do emprego, despesas com psicólogos,

médico, ...) e na esfera da honra, da fama, da auto-estima, da saúde psíquica e

física e do auto-respeito.

Algumas Leis Municipais em vigor:

85 Municípios com leis acerca do Assédio Moral : Americana –SP,Amparo –SP,Cruzeiro-

SP,Guarulhos – SP,Guaracema –SP,Guaratinguetá –SP, Iracenópolis –SP, Jaboticabal – SP, Ribeirão Pires- SP,São Jose dos Campos –SP, São Paulo- SP,Vitória –ES, Cascavel –PR,Curitiba- PR,São Gabriel do Oeste –MS, Sidrolândia – MS, Porto Alegre –RS, Reserva do Iguaçu- RS, Natal –RN.

51

1-Lei Municipal de Americana – SP: Lei n° 3.671, de 07 de

junho de 2002, dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de 'assédio

moral' nas dependências da Administração Pública Municipal Direta e Indireta por

servidores públicos municipais.

2- Lei Municipal de Campinas – SP: Lei nº 11.409 de 04 de

novembro de 2002, veda o assédio moral no âmbito da administração pública

municipal direta, indireta, nas autarquias e fundações públicas.

3- Lei Municipal de Cascavel – PR: Lei nº 3.243/2001, de 15

de maio de 2001, dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio

moral nas dependências da administração pública municipal direta, indireta,

autárquica e fundacional, por servidores ou funcionários públicos municipais

efetivos ou nomeados para cargos de confiança.

4- Lei Municipal de Guarulhos – SP : Lei nº 358/2002,

Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de "assédio moral" nas

dependências da administração pública municipal direta e indireta por servidores

públicos municipais.

5- Lei Municipal de Iracemápolis – SP : Lei nº 1163/2000, de

24 de abril de 2000, dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de

assédio moral nas dependências da Administração Pública Municipal Direta por

servidores públicos municipais.

6- Lei Municipal de Jaboticabal – SP: Lei n° 2.982, de 17 de

dezembro de 2001 - n° 388, Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática

de assédio moral nas dependências da Administração Pública Municipal Direta,

Indireta, Autárquica e Fundacional, por servidores ou funcionários públicos

municipais efetivos ou nomeados para cargos de confiança.

7- Lei Municipal de Natal – RN: Lei nº 189/02, de 23 de

fevereiro de 2002, Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio

moral nas dependências da administração pública municipal direta, indireta,

autárquica e fundacional, por servidores públicos municipais nomeados para

cargos de confiança.

52

8- Lei Municipal de Porto Alegre – RS: projeto de lei nº

02549 /2001, que altera a lei complementar N.º33, Estatuto dos Funcionários

Públicos do Município de Porto Alegre, inserindo a proibição de assédio moral e

definindo a correspondente ação administrativa.

9- Lei Municipal de São Gabriel do Oeste – MS: Lei nº 511,

de 4de abril de 2003,dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de

assédio moral no âmbito da administração pública do Município de São Gabriel do

Oeste e dá outras providências.

10- Lei Municipal de São Paulo – SP: Lei nº 13.288, de 10

de janeiro de 2002, dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de

"assédio moral" nas dependências da Administração Pública Municipal Direta e

Indireta por servidores públicos municipais.

11- Lei Municipal de Sidrolândia – MS : Lei municipal n°

1078/2001, Dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral

no âmbito da administração municipal e dá outras providências.

Projetos de Leis Municipais:

1-Município de Amparo – SP:projeto de lei nº 02/2002, que

veta o assédio moral no âmbito da administração pública municipal direta, indireta

e autarquias , com penas de advertência, suspensão e demissão.

2 – Município de Cruzeiro – SP : projeto de lei que veta o

assédio moral no âmbito da administração pública municipal direta, indireta ,

autárquica e fundacional, com penas de: advertência escrita ,

suspensão,cumulativamente com obrigatoriedade de participação em curso de

comportamento e multa e exoneração.

3-Município de Curitiba - PR: projetos de lei ordinária

n.º05.00112 / 2001 e 05.00013 /2004 que dispõem sobre a aplicação de

penalidades à prática de assédio moral nas dependências da Administração

Pública Municipal Direta e Indireta por servidores públicos municipais. As

penalidades previstas no primeiro projetos são as seguintes: curso de

53

aprimoramento profissional; suspensão; multa; exoneração. As penalidades

previstas no segundo projeto são as de: advertência, suspensão e demissão.

4-Município de Guararema- SP – projeto de lei nº. 41/2001,

que dispõe sobre a caracterização do assédio moral nas dependências da

administração pública municipal, e institui as seguintes penalidades aos

servidores públicos (assim entendidos aqueles que exercem, mesmo que

transitoriamente ou sem remuneração, emprego público, cargo ou função): curso

de aprimoramento profissional; multa pecuniária;suspensão ao trabalho, que em

caso de conveniência para o serviço público, poderá ser convertido em multa.

5- Município de Guaratinguetá – SP- projeto de lei que

dispõe sobre a aplicação de penalidades à prática de assédio moral nas

dependências da administração pública municipal direta, indireta, autárquica e

fundacional, por servidores ou funcionários públicos efetivos ou nomeados para

cargos em comissão ou de confiança, com penas de: advertência escrita,

suspensão,cumulativamente com a obrigatoriedade de participação em cursos de

comportamento profissional e multa; exoneração ou demissão.

6-Município de Presidente Venceslau - SP: projeto de lei nº

2377/2003, que dispõe sobre a aplicação de penalidades para a prática de

assédio moral nas dependências da Administração Pública Municipal Direta e

Indireta , por servidores públicos municipais (assim considerados todos aqueles

que exercem, ainda que transitoriamente e ou sem remuneração , emprego

público, cargo ou função ), a saber: curso de aprimoramento profissional;

suspensão; multa;demissão.

7- Município de São José dos Campos - SP: projeto de lei nº

252/2001, que dispõe sobre a caracterização do assédio moral nas dependências

da administração pública municipal, e aplicação das seguintes penalidades: curso

de aprimoramento profissional; multa; suspensão.

8- Município de Vitória - ES: projetos de lei nº 2464/2002 e

463/2004, que dispõe sobre a aplicação de penalidades a prática de assédio

moral nas dependências da administração pública direta, indireta, autárquica e

54

fundacional, por servidores municipais, com penalidades de: advertência escrita,

cumulada com obrigatoriedade de participação em curso de comportamento

profissional ; suspensão; multa; exoneração ou demissão.

Convém lembrar que a competência para legislar sobre

direito do trabalho é privativa da União, conforme preceito contido no artigo 22,

inciso I da CF/88. Assim, as leis municipais supra citadas são normas

administrativas que visam a regulamentação de condutas havidas entre a

Administração Pública e seus contratados.

No Brasil infelizmente só existem mudanças nas

condições de trabalho quando da existência de uma lei expressa que regulamenta

determinada condição e que a infringência do dispositivo gere prejuízo ao

empregador. Faz-se então imprescindível a criação de uma lei federal que

contemple o assédio moral como fenômeno e que tenha aplicação em qualquer

relação de emprego. Espera-se que esta lei reprima não só o abuso do

empregador assediador, mas também se preocupe com o empregado litigante de

má-fé, aquele que se diz assediado moralmente. Esta norma legislativa serviria de

anteparo ao esclarecer as pessoas de que o assédio moral existe e é inaceitável.

Leis Estaduais:

Temos como a primeira lei estadual aprovada no Brasil : a

Lei nº 3921, de 23 de agosto de 2002, que veda o assédio moral no trabalho, no

âmbito dos órgãos, repartições ou entidades da administração centralizada,

autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, do

poder legislativo, executivo ou judiciário do Estado do Rio de Janeiro, inclusive

concessionárias e permissionárias de serviços estaduais de utilidade ou interesse

público, e dá outras providencias.

No estado de São Paulo temos o Projeto de Lei

n°0422/2001 de iniciativa do Antonio Mentor, deputado estadual que foi aprovada

em 13 de setembro de 2002 pela Assembléia Legislativa e vetada em 08 de

novembro de 2002 pelo governador do estado.

55

Temos também alguns projetos de lei nos estados da Bahia,

Ceará, Espírito Santo, Pernambuco e Rio Grande do Sul.

Existem no Congresso projetos de Leis Federais em

tramitação pretendendo regulamentar o Assédio Moral, dentre os quais cita-se

alguns abaixo:

1-PROJETO DE LEI FEDERAL Nº 4742/2001 que introduz -

artigo 146-A, no Código Penal Brasileiro - Decreto-lei nº 2848, de 7 de dezembro

de 1940 - , dispondo sobre o crime de assédio moral no trabalho.

2- Projeto de lei federal nº. 5.972/2001- altera dispositivos da

Lei nº 8.112/90,acrescentando o inciso XX ao art. 117, que passará a vigorar com

a seguinte redação: “ Art.117 (...) XX Coagir moralmente subordinado , através de

atos ou expressões reiteradas que tenham por objetivo atingir a sua dignidade ou

criar condições de trabalho humilhantes ou degradantes , abusando da autoridade

conferida pela posição hierárquica”. 86

3- Projeto de lei federal nº. 4591/200187 dispõe sobre a

aplicação de penalidades à prática de "assédio moral" por parte de servidores

públicos da União, das autarquias e das fundações públicas federais a seus

subordinados, alterando a Lei nº. 8.112, de 11 de dezembro de 1990.

Acrescentando a mesma a alínea A do artigo 117, com o seguinte teor: “Art.117 A

É proibido aos servidores públicos praticarem assédio moral contra seus

subordinados, estando estes sujeitos às seguintes penalidades disciplinares: I –

Advertência; II – Suspensão; III – Destituição de cargo em comissão; IV –

Destituição de função comissionada; V – Demissão. § 1º Para fins do disposto

86 Disponível em : <http: // assediomoral.org> Acessado em: 26 jul. 2006. 87 O PL n.4.591/2001 apresenta a seguinte definição para o assédio moral: “Para fins do disposto

neste artigo considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que atinja, pela repetição a auto-estima e a segurança de um indivíduo , fazendo-o duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho, à evolução profissional ou à estabilidade físico, emocional e funcional do servidor incluindo,dentre outras:marcar tarefas com prazos impossíveis;passar alguém de uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de outros; ignorar ou excluir um servidor só se dirigindo a ele através de terceiros; sonegar informações necessárias à elaboração de trabalhos de forma insistente; espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; segregar fisicamente o servidor, confinado-o em local inadequado, isolado ou insalubre; subestimar esforços.”

56

neste artigo considera-se assédio moral todo tipo de ação, gesto ou palavra que

atinja, pela repetição, a auto estima e a segurança de um indivíduo, fazendo-o

duvidar de si e de sua competência, implicando em dano ao ambiente de trabalho,

à evolução profissional ou a estabilidade física, emocional e funcional do servidor

incluindo, dentre outras: marcar tarefas ou prazos impossíveis, passar alguém de

uma área de responsabilidade para funções triviais; tomar crédito de idéias de

outros; ignorar ou excluir um servidor, só se dirigindo a ele através de terceiros;

sonegar informações necessárias à elaboração de trabalhos de forma insistente;

espalhar rumores maliciosos; criticar com persistência; segregar fisicamente o

servidor,confinando-o em local inadequado ou insalubre ;subestimar esforços .

(...).”

4- Projeto de Lei nº. 6161/2002: insere o inciso V ao artigo

27 da Lei nº. 8.666/93. O art. 27 regulamenta o artigo 37 da CF, que, por sua vez ,

dispõe sobre as regras a serem observadas nas licitações e contratos da

Administração Pública . O projeto insere mais uma exigência: “ Art. 27 (...) V-

Comprovação de que não há registros por prática de coação moral contra seus

empregados nos últimos cinco anos. “Também institui o Cadastro Nacional de

Proteção contra a Coação Moral no Emprego”.88

5-Projeto de Lei 1610/2003 e 06/2003 que pretendem alterar

a Lei 8.112/90, que trata do regime jurídico dos servidores públicos da União, das

Autarquias e das fundações públicas e federais, no artigo 117 inserindo-lhe a

alínea A , passando assim a proibir a prática de assédio moral dos entes acima

mencionados, instituindo penalidades do tipo : advertências , suspensão,

destituição do cargo em comissão, destituição de função comissionada e

demissão. “Art. 117 A – é proibido aos servidores públicos praticarem assédio

moral contra seus subordinados, estando estes sujeitos às seguintes penalidades

disciplinares: I – Advertência; II – Suspensão; III- Destituição de cargo em

comissão; IV – Destituição de função comissionada; V - Demissão.”89

88 Diário da Câmara dos Deputados de 5 de abril de 2002.p.13390. 89 Disponível em :< http://www.camara.gov.br> Acessado em: 18 ago. 06.

57

É importante ressaltar que não serão apenas dispositivos

legais que solucionarão o problema, mas sim a conscientização da vítima, do

agressor, que considera sua conduta normal e da própria sociedade, que precisa

ser despertada da sua indiferença e omissão.

3.4 JURISPRUDÊNCIA

Por ser matéria recente, poucas foram as lides que

chegaram aos TRT’s e TST. É de se salientar que decisões que arbitram

indenizações por dano moral, inclusive em situações comuns de ocorrer durante o

assédio moral, existem, mas poucas utilizam e conceituam corretamente o termo.

O primeiro acórdão reconhecendo a existência do fenômeno

foi o nº 2.276/2001, do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região – Espírito

Santo, que teve como relatora a Juíza Sônia das Dores Dionísio:

ASSÉDIO MORAL - CONTRATO DE INAÇÃO - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - A tortura psicológica, destinada a golpear a auto-estima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corroia a sua auto-estima. No caso dos Autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por conseqüência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer trabalho, fonte de dignidade do empregado.

Após este, vários outros acórdãos começaram a surgir , e

grande números deles tem com fundamentação o artigo 5º, V e X da Constituição

Federal e os artigos 461§ 2º e 483 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Citamos alguns abaixo:

58

ASSÉDIO MORAL – RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR JUSTA CAUSA DO EMPREGADOR – INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – CABIMENTO.. (Tribunal Regional do Trabalho 15ª Região, AC. 05807/2003, RO 1711-2001-111-15-00-9, pub. 21 de março de 2003, Rel. Mariane Khayat Fonseca do Nascimento)

QUALIFICAÇÃO CONTRATUAL CARGO TÉCNICO REBAIXAMENTO DE FUNÇÕES DIMINUIÇÃO MORAL . (Tribunal Superior do Trabalho, 1ª t, RR 562158/1999, p. 08 de agosto de 2003, rel. Ministro convocado Vieira de Mello Filho )

No TRT da 12º Região, foram localizadas algumas decisões.

O acórdão 8591/200490, do qual foi relator o Juiz Godoy Ilha decidiu:

ASSÉDIO MORAL. EXPRESSÕES PEJORATIVAS E PRECONCEITUOSAS. Trabalhador que, por repetidas vezes, é tratado em público por superior hierárquico de forma pejorativa e preconceituosa, procedimento que beira à discriminação racial, tem assegurado o direito de perceber indenização por dano moral.

O acórdão 134/200491, cujo relator foi o juiz Geraldo José

Balbinot é pioneiro em Santa Catarina, ao determinar o assédio moral como uma

das causas de rescisão indireta do contrato de trabalho:

RESILIÇÃO INDIRETA. Constitui justa causa para ruptura do liame empregatício por iniciativa do empregado a circunstância de ser submetido à constrangedora situação de ir trabalhar e ser privado pelo empregador do desempenho de suas atividades na intenção de forçar o obreiro a pedir a resilição do contrato, dando margem, inclusive, à tipificação da figura de assédio moral.

90 SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso Ordinário nº 00357-

2003-024-12-00-3. Relator: Juiz Godoy Ilha. Florianópolis, 10 de agosto de 2004. disponível em: <http://www.trt12.gov.br/>.Acesso em 22 jul. 2006, 19:25:00.

91 SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso Ordinário nº 00357-2002-025-12-00-9. Relator: Juiz Geraldo José Balbinot. Florianópolis, 13 de janeiro de 2004. disponível em: <http://www.trt12.gov.br/>.Acesso em 22 jul. 2006, 19:31:22.

59

Temos também o acórdão 4319/200692, que teve como

relatora a juíza Gisele Pereira Alexandrino :

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ASSÉDIO MORAL. A comprovação de que a zombaria praticada pelos sócios da reclamada no ambiente de trabalho contra o autor configurava muito mais do que uma simples brincadeira, pois tinha o intuito de menosprezar o empregado e escarnecer dele em razão de seu problema de visão, configura assédio moral, também conhecida como "mobbing", "bullying" ou "harcèlement moral", no direito internacional. Os efeitos da exposição prolongada e repetitiva a situações humilhantes e vexatórias são deletérios à auto-estima da pessoa e, no ambiente de trabalho, a prática tem a agravante de ocorrer em uma relação hierarquizada, com forte dependência econômica do trabalhador. Os danos decorrentes de tais atitudes devem ser indenizados, servindo a condenação também para obtenção de um efeito didático-pedagógico, a fim de que a conduta não mais se repita no empreendimento.

Finalmente, dentre as decisões selecionadas, cumpre

mencionar o Acórdão 2004007112493, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª

Região, do qual foi relator o Juiz Valdir Florindo:

Assédio moral. Repercussões sociais. A questão da ofensa à moral conflagra um subjetivismo oriundo da própria condição de cada indivíduo. Não se sente menos constrangido o trabalhador que escolhe adotar uma postura conciliadora, preferindo não detonar uma crise no ambiente de trabalho que fatalmente o prejudicará, pois a questão aqui transcende a figura do ofendido, projetando as conseqüências pela supressão do seu posto de trabalho a quem dele eventualmente dependa economicamente. O fantasma do desemprego assusta, pois ao contrário da figura indefinida e evanescente que povoa o imaginário popular, este pesadelo é real. É o receio de perder o emprego que alimenta a

92 SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso Ordinário nº00745-

2005-008-12-00-7. Relatora: Juíza Gisele Pereira Alexandrino. Florianópolis, 27 de março de 2006. disponível em: <http://www.trt12.gov.br/>.Acesso em 23 jul. 2006, 19:25:00.

93 SÃO PAULO. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário nº 01117-2002-032-02-00-4. Relatora: Juíza Sônia das Dores Dionísio. São Paulo, 17 de fevereiro de 2004. Disponível em <http://www.trt02.gov.br>. Acesso em 22 jul. 2006, 19:20:25.

60

tirania de alguns maus empregadores, deixando marcas profundas e às vezes indeléveis nos trabalhadores que sofrem o assédio moral. Exposta a desumanidade da conduta do empregador, que de forma aética, criou para o trabalhador situações vexatórias e constrangedoras de forma continuada através das agressões verbais sofridas, incutindo na psique do recorrente pensamento derrotistas originados de uma suposta incapacidade profissional. O isolamento decretado pelo empregador, acaba se expandindo para níveis hierárquicos inferiores, atingindo os próprios colegas de trabalho. Estes, também por medo de perderem o emprego e cientes da competitividade própria da função, passam a hostilizar o trabalhador, associando-se ao detrator na constância da crueldade imposta. A busca desenfreada por índices de produção elevados, alimentada pela competição sistemática incentivada pela empresa, relega à preterição a higidez mental do trabalhador que se vê vitimado por comportamentos agressivos aliado à indiferença ao seu sofrimento. A adoção de uma visão sistêmica sobre o assunto, faz ver que o processo de globalização da economia cria para a sociedade um regime perverso, eivado de deslealdade e exploração, iniqüidades que não repercutem apenas no ambiente de trabalho, gerando grave desnível social. Daí a corretíssima afirmação do Ilustre Aguiar Dias de que o "prejuízo imposto ao particular afeta o equilíbrio social." Ao trabalhador assediado pelo constrangimento moral, sobra a depressão, a angústia e outros males psíquicos, causando sérios danos a sua qualidade de vida. Nesse sentido, configurada a violação do direito e o prejuízo moral derivante.

Pode-se verificar que apesar de o Assédio Moral não estar

presente na legislação trabalhista, ou em qualquer outra lei federal, vem

ganhando espaço nos tribunais brasileiros que têm dado ganho de causa, na

grande maioria das vezes, ao trabalhador.

61

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Assédio Moral é um fenômeno praticado há tempos e que

não se manifesta apenas no ambiente de trabalho, mas também nos domicílios,

nas escolas, nos locais de lazer, enfim em todo tipo de ambiente, embora tenha

ficado mais evidente nas relações entre empregados e empregadores.

Apesar de ser um tema de existência antiga, é novo e de

grande relevância no mundo do trabalho. Desde o trabalho escravo, o homem já

sofria agressões à dignidade, contudo a moderna organização do trabalho, que

precisa se adaptar ao mercado globalizado, a produtividade e a competitividade

contribuem para a prática do assédio moral.

Com a busca da tutela das relações dentro do ambiente de

trabalho, procura-se conservar um dos maiores direitos dos empregados e,

sobretudo, dos cidadãos - a dignidade humana. Vale aqui ressaltar que incumbe

ao Direito disciplinar as relações humanas, a pacificação social e o resguardo

das garantias fundamentais. O Assédio Moral no Trabalho impede a convivência

pacífica, por isso o operador do Direito deve pensar em medidas para garantir a

dignidade do trabalhador. Faz-se necessária, assim, a criação de lei específica

para combater e evitar todas as formas de Assédio Moral no trabalho.

As hipóteses levantadas foram confirmadas, porquanto

constatou-se que o Assédio Mortal esteve presente nos mais diversos setores da

vida, e em todas as épocas; que revelou-se mais freqüente dentro da relações de

trabalho subordinado; e que é insuficiente a legislação brasileira destinada a

combater o fenômeno.

Enquanto não há legislação sobre o assunto, a doutrina e a

jurisprudência se contorcem para solucionar os conflitos que são submetidos ao

judiciário. Contudo, vale ressaltar que não será apenas a regulamentação do

Assédio Moral que solucionará o problema, mas também a conscientização da

sociedade e da própria vítima.

62

O tema merece a reflexão e a preocupação dos operadores

do direito, restando evidente a necessidade do aprofundamento de seu estudo.

Espera-se, por fim, que a presente pesquisa sirva de apoio

para aqueles que se interessarem sobre o tema, e de ponto de partida para novas

investigações.

63

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SINDICATO DOS SERVIDORES DO PODER JUDICIÁRIO FEDERAL DO

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Informativo, Vitória, p. 6-7, jul. 2003

SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso

Ordinário nº 00357-2003-024-12-00-3. Relator: Juiz Godoy Ilha. Florianópolis, 10

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2006, 19:25:00.

SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso

Ordinário nº 00357-2002-025-12-00-9. Relator: Juiz Geraldo José Balbinot.

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SANTA CATARINA. Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região. Recurso

Ordinário nº00745-2005-008-12-00-7. Relatora: Juíza Gisele Pereira Alexandrino.

Florianópolis, 27 de março de 2006. disponível em:

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SÃO PAULO. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário nº 01117-2002-

032-02-00-4. Relatora: Juíza Sônia das Dores Dionísio. São Paulo, 17 de

fevereiro de 2004. Disponível em <http://www.trt02.gov.br>. Acesso em 22 jul.

2006, 19:20:25.

68

ANEXOS

1 - PROJETO DE LEI Nº 2.369, DE 2003. (Do Sr. MAURO PASSOS)

Dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho.

O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º É proibido o assédio moral nas relações de trabalho.

Art. 2º Assédio moral consiste no constrangimento do

trabalhador por seus superiores hierárquicos ou colegas, através de atos

repetitivos, tendo como objetivo, deliberado ou não, ou como efeito, a degradação

das relações de trabalho e que:

I - atente contra sua dignidade ou seus direitos, ou

II - afete sua higidez física ou mental, ou

III – comprometa a sua carreira profissional.

Art. 3º É devida indenização pelo empregador ao empregado

sujeito a assédio moral, ressalvado o direito de regresso.

§ 1º A indenização por assédio moral tem valor mínimo

equivalente a 10 (dez) vezes a remuneração do empregado, sendo calculada em

dobro em caso de reincidência.

§ 2º Além da indenização prevista no § 1º, todos os gastos

relativos ao tratamento médico serão pagos pelo empregador, caso seja

verificado dano à saúde do trabalhador.

Art. 4º O empregador deve tomar todas as providências

necessárias para evitar e prevenir o assédio moral nas relações de trabalho.

69

§ 1º As providências incluem medidas educativas e

disciplinadoras, entre outras.

§ 2º Caso não sejam adotadas medidas de prevenção ao

assédio moral e sendo esse verificado, o empregador está sujeito a pagamento

de multa no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais) por empregado, sendo o valor

elevado ao dobro na reincidência.

Art. 5º O assédio moral praticado por empregado, após ter

sido orientado sobre a sua proibição, enseja sanção disciplinadora pelo

empregador.

Parágrafo único. A sanção disciplinadora deve considerar a

gravidade do ato praticado e a sua reincidência, sujeitando o empregado à

suspensão e, caso não seja verificada alteração no seu comportamento após

orientação do empregador, à rescisão do contrato de trabalho por falta grave, nos

termos do art. 482 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

Art. 6º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

2- JUSTIFICAÇÃO DO PL 2.369/2003.

A nossa histórica herança colonial e escravocrata ainda é

latente nas relações de trabalho e se manifesta na falta de dignidade durante o

contrato e no desrespeito ao trabalhador.

Essa herança se manifesta de forma expressa (como

as divisões entre área social e área de serviço, elevador social e de serviço etc) e

também de forma velada (preconceito e discriminação contra o trabalhador braçal,

por exemplo).

A exploração da mão-de-obra beira a barbárie e nos reporta

à época dos escravos. A nossa proposição visa romper com isso e discutir um

70

novo padrão de relações de trabalho, amenizando os conflitos existentes no

mundo do trabalho no Brasil, dando maior dignidade a essas relações.

O Direito do Trabalho (e ao trabalho) é direito fundamental,

reconhecido em todo o mundo como tal. Não basta garantir o direito à vida, deve

ser garantido o direito à vida e ao trabalho dignos.

Por isso, o nosso projeto proíbe o assédio moral.

O tema tem sido debatido pela sociedade, sendo bastante

discutido pela União Européia e pela Organização Internacional do Trabalho –

OIT.

Com efeito, as pessoas sujeitas a assédio moral são muito

mais suscetíveis ao stress do que as que trabalham em ambiente adequado em

que sejam respeitadas. O stress causado pode gerar outras doenças e representa

um risco para a saúde do trabalhador.

As causas do assédio moral estão relacionadas aos

problemas de organização do trabalho, falta de informação, ausência de política

de pessoal adequada a respeitar o indivíduo dentro da instituição ou empresa.

É necessário combater o assédio moral que tem

conseqüências devastadoras para a saúde física e psíquica do trabalhador, afeta

a sua vida familiar, social e profissional, resultando em ausências ao trabalho.

Isso sem mencionar o total desrespeito ao direito

fundamental do trabalho e à dignidade na prestação de serviços. Pode ser

seriamente afetada a carreira profissional de um indivíduo, que se sentirá

desestimulado a dedicar- se ao trabalho.

Assim, decidimos apresentar o projeto de lei que não

configura o assédio moral como crime, mas sim como ilícito trabalhista, que pode

gerar o direito à indenização.

Julgamos que a empresa é responsável pelo ambiente de

trabalho, que deve ser saudável. É o empregador que determina a política de

71

pessoal e que decide sobre a qualidade das relações dentro de seu

estabelecimento. Deve, portanto, adotar ações educativas para que o ambiente

seja efetivamente livre de assédio moral. Caso não adote, o empregador é

responsável pelo assédio moral praticado.

No entanto, caso um empregado ainda pratique o assédio,

apesar de o empregador ter adotado as medidas cabíveis a fim de evitar tal

prática, pode o empregado vir a ser sancionado, podendo, em última instância, vir

a ser configurada a falta grave, em virtude, por exemplo, de insubordinação e

indisciplina.

A maior dificuldade quanto ao termo assédio moral é a sua

definição, apesar de todos intuirmos o seu significado.

Em nosso projeto, definimos como o constrangimento do

trabalhador, que deve se sentir importunado com a conduta tanto de superiores

hierárquicos como de colegas.

O comportamento deve ser repetitivo, pois é óbvio que

apenas uma brincadeira de mau gosto não configura o assédio. O stress causado

por esse tipo de comportamento depende da sua repetição.

O agente pode ter ou não a intenção de constranger o

trabalhador. Cumpre à empresa evitar que aconteça o ato. Caso o agente o

pratique deliberadamente, pode sofrer sanção disciplinadora, que inclui a

suspensão e pode ser fundamento para uma rescisão por justa causa.

O principal aspecto do assédio moral é que tem como objeto

ou efeito a degradação das relações de trabalho. A sua proibição e a sanção,

caso seja praticado, visam tão somente à melhoria das relações trabalhistas,

trazendo dignidade e respeito à execução do contrato de trabalho.

Tal conceito representa efetivo avanço no Direito do

Trabalho, cuidando da qualidade das relações, contribuindo para que as pessoas

se conscientizem da importância de um bom ambiente de trabalho para o pleno

desenvolvimento do indivíduo.

72

O ato pode atentar contra a dignidade do trabalhador ou

seus direitos, ou afetar a sua saúde física ou mental (cumpre lembrar que o stress

gera doenças), comprometendo a carreira profissional.

Sendo verificado o assédio moral, é devida indenização a

ser paga pela empresa e que tem como base de cálculo o valor da remuneração

do empregado, que é multiplicado por dez, e que pode ainda ser dobrado se

houver reincidência.

Também devem ser ressarcidas pela empresa as despesas

médicas, caso a saúde do trabalhador tenha sido afetada.

Ressalte-se que o nosso projeto tem a preocupação com os

aspectos relacionados à saúde do trabalhador, mas não se limita a isso. Deseja-

se contribuir para a evolução das relações do trabalho, enfocando a dignidade do

trabalho e a garantia dos direitos fundamentais.

É responsabilidade do empregador tomar todas as

providências para evitar o assédio. Se não forem adotadas, sujeita-se o

empregador à multa no valor de R$ 1.000,00 por empregado, valor que pode ser

dobrado em caso de reincidência.

A nossa proposta teve inspiração na lei francesa, com as

alterações que julgamos cabíveis, tanto de técnica legislativa como de contexto,

adequando ao ordenamento jurídico brasileiro.

O prejuízo causado pelo assédio moral para o mundo do

trabalho e para a sociedade em geral pode ser evitado mediante a adoção de

medidas educativas.

É exatamente o que pretendemos ao conceituar o assédio

como ilícito trabalhista. Talvez aqueles que o pratiquem percebam a gravidade de

seus atos e o alcance negativo na vida do trabalhador.

73

Diante do exposto, contamos com o apoio de nossos ilustres

Pares a fim de aprovar o presente Projeto de Lei, que certamente marcará a

evolução das relações de trabalho no Brasil.

Deputado MAURO PASSOS.

3 – PARECER ACERCA DO PL 2.369/2003:

COMISSÃO DE TRABALHO, DE ADMINISTRAÇÃO E

SERVIÇO

PÚBLICO

PROJETO DE LEI No 2.369, DE 2003.

“Dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho”.

Autor: Deputado MAURO PASSOS

Relator: Deputado VICENTINHO

I - RELATÓRIO

O Projeto em epígrafe, de autoria do ilustre Deputado

Mauro Passos, dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho,

caracterizando como ilícito trabalhista.

Nos termos do art. 1º do PL, o assédio pode ser praticado

tanto por superiores hierárquicos quanto por colegas, consistindo no

constrangimento mediante atos repetitivos que degradam as relações de trabalho.

74

A degradação pode ser deliberada ou não.

Para que fique configurado o assédio moral, tais atos devem

atentar contra a dignidade do trabalhador ou seus direitos; ou afetar sua higidez

física ou mental; ou comprometer a sua carreira profissional.

A proposição garante indenização ao empregado assediado

e que deve ser paga pelo empregador, ficando-lhe assegurado o direito de

regresso contra o assediador.

O valor mínimo da indenização é de dez vezes o valor da

remuneração do empregado, incluindo, portanto, não apenas o salário, mas todas

as verbas pagas ao trabalhador com habitualidade. É devida em dobro no caso de

reincidência.

Além dessa indenização, ainda é devido o ressarcimento de

todas as despesas médicas, caso tenha ocorrido dano à saúde do empregado.

É responsabilidade do empregador a adoção de todas as

medidas necessárias para evitar e prevenir o assédio moral nas relações de

trabalho, incluídas as medidas educativas e disciplinadoras.

Caso medidas preventivas não sejam adotadas e seja

verificado o assédio, o empregador está sujeito a multa no valor de mil reais por

empregado, elevado em dobro no caso de reincidência.

O empregado que vier assediar outro, mesmo após ter sido

orientado em sentido contrário, está sujeito à sanção disciplinadora por parte do

empregador.

O assediador está sujeito a suspensão e, não havendo

alteração no seu comportamento, pode ser demitido em virtude da falta grave

cometida.

Foi apensado o PL nº 2.593, de 2003, da nobre Deputada

Maria do Rosário, que “altera dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho –

75

CLT, para dispor sobre a proibição da prática do assédio moral nas relações de

trabalho”.

Essa proposição caracteriza o assédio moral como falta

grave do empregador, justificando, portanto, a rescisão do contrato pelo

empregado.

O assédio moral é definido na alínea h do art. 483 da CLT

como prática do empregador ou de seus prepostos que, mediante gesto ou

palavra, venha a atingir a auto-estima e a segurança do trabalhador, que passa a

duvidar de sua competência e capacidade laboral, prejudicando a sua saúde. Há

dano para o ambiente de trabalho, à evolução da carreira profissional ou à

estabilidade do vínculo empregatício.

Verificado o assédio moral, o empregado está autorizado a

rescindir o seu contrato por justa causa e, portanto, sem prejuízo de qualquer das

verbas rescisórias, como já ocorre nas outras hipóteses do art. 483 da CLT.

Poderá ser pleiteado o pagamento em dobro das verbas

rescisórias devidas, caso o assédio moral tenha sido baseado em gênero, raça ou

etnia, ou ainda, idade.

No prazo regimental não foram apresentadas emendas aos

projetos.

É o relatório.

II - VOTO DO RELATOR

O assédio moral degrada as relações de trabalho,

usurpando a dignidade do trabalhador, e deve, obviamente, ser proibido.

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A definição de assédio do PL nº 2369/2003 engloba os seus

principais elementos, conforme já mencionado no relatório.

A prática deve ser proibida, mas, antes de tudo, devem ser

adotadas medidas preventivas, educacionais e disciplinadoras, a fim de alterar a

cultura dentro das empresas.

A justa causa, nos termos do projeto apensado (PL nº 2.593,

de 2003), já pode ser alegada conforme a legislação vigente, que permite o

trabalhador rescindir motivadamente o contrato sem prejuízo de qualquer verba

rescisória.

O Projeto original, por outro lado, além da previsão de

pagamento de indenização ao trabalhador vítima de assédio, sujeita o

empregador ao pagamento de multa caso não adote as medidas preventivas.

Nesse sentido, julgamos conveniente a modificação do

dispositivo relativo à multa a fim de vincular à decisão judicial. Assim, o juiz

verifica a existência de assédio moral e a não adoção de medidas preventivas

mediante o devido processo legal. O Ministério do Trabalho e Emprego é, então,

comunicado oficialmente sobre a infração e deve aplicar a multa administrativa.

Não apenas o empregador pode ser punido, o empregado

que assedia moralmente outro trabalhador está sujeito à medida disciplinar,

podendo, nos termos da legislação vigente, ser enquadrado na hipótese de justa

causa prevista na alínea b do art. 482 da CLT, isto é, incontinência de conduta ou

mau procedimento ou, ainda, na alínea h como ato de indisciplina ou de

insubordinação.

A demissão por justa causa do empregado caso assedie

moralmente outro já está prevista. No entanto, o Projeto impõe a adoção de

medidas educativas e disciplinares antes de o empregador demitir

justificadamente.

É a cultura da empresa, na qual o assédio é tolerado, que

deve ser mudada. A falta grave do empregado somente é cometida na hipótese

77

de não se adequar e não corrigir a sua conduta, tratando com dignidade os

demais.

Propomos algumas emendas aditivas ao projeto. A primeira

visa dispor sobre fórmula de reajuste da multa, que pode vir a perder o seu valor

com o decorrer dos anos.

A segunda e mais importante, inclui aspectos processuais,

visando inverter o ônus da prova e permitir a substituição processual.

A inversão do ônus da prova, a critério do juiz, deve ser

determinada sempre que a alegação de assédio moral for verossímil. É óbvio que

a prova dificilmente será produzida por um empregado que trabalhe em um

ambiente onde a prática de assédio moral seja constante. Deve, sim, ser ônus do

empregador, em virtude de sua maior facilidade em produzir a prova.

A substituição processual pelo sindicato representativo da

categoria profissional é fundamental para a defesa dos direitos coletivos e difusos.

Muitas vezes é penoso demais para um trabalhador individualmente considerado

enfrentar a situação, denunciando o assédio moral.

Deve, portanto, ser autorizado o sindicato a fazê-lo. Pode,

inclusive postular a obrigação de fazer da empresa, no sentido de adotar medidas

preventivas.

O tema é atual e tem sido debatido pela sociedade. Várias

das idéias aqui mencionadas decorrem desse debate.

Em 25 de novembro de 2004, por exemplo, ocorreu um

seminário sobre o assédio moral nas relações de trabalho organizado por essa

Comissão temática. Participamos do evento na condição de coordenador de um

dos painéis, função também desempenhada pelo Deputado Mauro Passos, autor

do projeto principal, e Deputada Selma Schons.

Participaram representantes do Ministério Público do

Trabalho, da ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas,

78

da OAB - Ordem dos Advogados do Brasil, do Centro Feminista de Estudos e

Assessoria – CFEMEA, da Secretária Especial de Políticas de Promoção da

Igualdade Racial, do Sindicato dos Químicos e Plásticos de São Paulo e da

Confederação Nacional da Indústria – CNI.

Todos salientaram a importância do Projeto e a oportunidade

de sua apresentação. Foram apontados os aspectos que podem vir a aperfeiçoar

o texto, aqui apresentados na forma de emenda.

Diante do exposto, somos pela aprovação do PL nº 2.369,

de 2003, com as emendas ora apresentadas; e pela rejeição do PL nº 2.593, de

2003.

Deputado VICENTINHO.

Relator.