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AS MENINAS Da obra de Lygia Fagundes Telles Um projeto cinematográfico de David Neves ROTEIRO Roteiro Adaptado de ONÉZIO PAIVA e DAVID E.NEVES 3.2 Um Filme Produzido por Carlos Moletta Dirigido por Emiliano Ribeiro

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AS MENINAS

Da obra de Lygia Fagundes TellesUm projeto cinematográfico de David Neves

R O T E I R O

Roteiro Adaptado de

ONÉZIO PAIVAe

DAVID E.NEVES

3.2

Um Filme Produzido por Carlos MolettaDirigido por Emiliano Ribeiro

AS MENINAS Versão 3.2/Copyright YPEARTS AUDIOVISUAL LTDA.1995

SEQ 01 (Flashback) FAZENDA EXT/DIA Tiro no Irmão 60”

CEDIDO PELO AUTOR PARA EXIBIÇÃO INTERNET EXCLUSIVA NO SITE CINEMABRASILNÃO REPRODUZA OU DISTRIBUA SEM AUTORIZAÇÃO EXPRESSA.

Anos 60. A cena é vista à distância. Dois garotos correm nas imediações de uma casa de fazenda. O que vem atrás tem uma espingarda. Um trem vai passando próximo. O garoto da espingarda aponta a arma e dispara, sorrindo, sem saber o que está fazendo. O da frente dá passos incertos e cai.. O garoto da arma avança e examina o outro, caído. Não sabe o que aconteceu. O trem passa. Passageiros nas janelas. Uma mulher sai da casa da fazenda, aflita. Corre em direção aos dois garotos. Um empregado da fazenda, acompanhado de uma velha cozinheira e uma mocinha (LORENA jovem) correm em direção aos garotos. A mulher (MÃE DE LORENA) se debruça sobre o garoto caído, desesperada. Os empregados abraçam o menino que atirou, o empregado toma-lhe a arma, enquanto a cozinheira aperta o seu rosto contra o próprio colo, como que protegendo-o de ver o irmão baleado. LORENA (jovem) assiste a tudo chocada._________________________________________________________________

SEQ 02 (Flashback) HOSPITAL INT/DIA Lorena se Apaixona 60”

Enfermeira empurra maca. Garoto deitado na maca, soro no braço. Médico acompanha, preocupado. É o Dr.MARCUS NEMESIUS, mais jovem. Veste um jaleco branco com as iniciais M.N. gravadas no bolso.

No movimento, a câmera pega a mulher que antes víramos socorrendo o garoto ferido. Está aflita. Ergue-se quando a maca passa. A mocinha da fazenda está ali perto, sentada, silenciosa, assustada.

O médico e a equipe tentam salvar o garoto na sala de cirurgia. Vemos a cena através de um vidro. Pelo movimento do médico - Dr.Nemesius - vemos que o garoto morreu. O médico sai da sala de cirurgia. A câmera fecha sobre o corpo ensangüentado e inanimado do garoto.

O pessoal do hospital cercando a mulher (MÃE DE LORENA), que é a mãe da mocinha e do garoto morto, procurando consolá-la. O Dr.NEMESIUS está ali. Ele volta o rosto. Vê LORENA mocinha, num canto, traumatizada. O médico se encaminha para ela. Olha-a com carinho. Acaricia seus cabelos e seu rosto. Silencio. Close de LORENA jovem olhando para o Dr.Nemesius._________________________________________________________________________

Meninas3.2 SEQ 03 QUARTO DE LORENA INT/DIA

De Volta ao Presente 50” Fotos sobre mesinha, de pé, em molduras. Numa vemos o DR.NEMESIUS e família: mulher e dois filhos. Na outra, a família de LORENA na época da fazenda. Homem, mulher e os três filhos - LORENA, RÔMULO e REMO. Estão encostados e trepados numa cerca de madeira. Ao fundo da foto, a casa de fazenda. Ao lado,numa ampulheta, antiguinha, vê-se o tempo passar como a areia pelo gargalo de cristal.

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LORENA, 19/25 anos, rosto de menina, pele muito branca e saudável, pouco busto, vestida com um camisão tipo T-Shirt grandão e malha de ballet, olha as fotos, ao mesmo tempo em que coloca carta que recebeu sobre pilha de outras cartas. Ouvimos gritinhos e risos de moças, e toques de sino. LORENA vira a ampulheta, reiniciando o movimento. Vai saltitando até a janela do quarto, olha para fora.

PV de LORENA: Geral de um pátio de Pensionato, com jovens despedindo-se de um grupo de 3 freiras. (SUPERPÕE LETREIRO: “SÃO PAULO, 1971”). Volta para close de LORENA, que vai até uma geladeira tipo console dentro do quarto._________________________________________________________________

SEQ 04 PENSIONATO / VARANDA DOS QUARTOS EXT/INT/DIA Despedida das Colegas 210”

Conjunto de construções que formam um pensionato, o que inclui uma pequena igreja ou capela. Quatro moças se encaminham através de um pátio aberto em direção ao portão de saída. Carregam malas, sacolas, embrulhos. Estão agitadas, comunicam-se entre si, brincam, riem. Despedem-se das freiras que estão no meio do pátio. Ouve-se musica de coral feminino.

LORENA acabou de sair de seu quarto. Está numa espécie de varanda que conduz a outros quartos.Traz nas mãos um prato com uma maçã, biscoitos de água e sal, uma cenoura crua e um triângulo de queijo. É o seu desjejum. Uma das garotas passa por ela.

GAROTA Ô, Lorena. Você não vai não? Vai ficar aí?

LORENA Vou ficar pra descansar.

GAROTA Essa greve vai demorar pra acabar, Lorena. Vai ficar trancada aqui? Não vai aproveitar as férias extras?

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LORENA (BRINCANDO) Vou fazer meditação.

GAROTA Vai ficar sozinha?

LORENA Tem outras que também vão ficar .

GAROTA Essa não! Ficar fechada nessa prisão! Já vivo o ano todo aqui dentro. Eu vou é aproveitar a greve. Tchau!

Aproxima-se pela varanda uma outra freira, mais idosa, MADRE ALIX. Nota-se que é a madre superiora do Pensionato, por seu rosto mais severo, embora cordial. Com sua chegada, cai o tom de euforia das meninas que partem.

LORENA (PARA A GAROTA)Aproveita bastante, depois me conta. Tchau.

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As garotas vão saindo, somem. A música de coral vai parando. Ouve-se um sino. Uma das três freiras, a mais jovem, IRMÃ BULA, observa a última garota que sai. A freira mais velha, MADRE ALIX, aproxima-se de LORENA.

MADRE ALIX (INQUISIDORA) Você está com o olho comprido. Tem certeza de que não está com vontade de ir com as

outras?

LORENA Não, Madre. Eu estou bem aqui. Vou aproveitar para descansar.

As duas observam IRMÃ BULA que, à distância, acena para as moças que já saíram. Depois, ela gira e caminha um pouco devagar na direção de MADRE ALIX e LORENA.

LORENA Irmã Bula está engordando novamente.

MADRE ALIX (CRÍTICA) Se ela conseguisse esquecer aqueles docinhos... Mas não consegue.

IRMÃ BULA pára, mete mão numa bolsinha, retira um doce, mete-o na boca. Olha para os lados com ar culpado, percebe que está sendo observada por LORENA e MADRE ALIX, que balança a cabeça em desaprovação. IRMÃ BULA ri do “flagrante”.

MADRE ALIX E sua mãe, Lorena? Como é que ela está?

LORENA Está bem.(P) Eu estive lá em casa ontem, ela falou muitoMeninas3.2

na senhora.

MADRE ALIX Estou sentindo falta dela. Ela andava sempre por aqui, de repente desapareceu. LORENA Ela mandou pedir desculpa, Madre. Disse que aparece

na semana que vem.

IRMÃ BULA abaixa-se e começa a mexer num pequeno jardim. MADRE ALIX Sua mãe é a pessoa que mais ajuda esse pensionato.

Gosto que ela ajude mas também gosto da presença dela. (T) Olha! Sua amiga Lia está chegando.

Quem vem chegando da rua é LIA, 20/25 anos, vestida um pouco como uma “guerrilheira”dos anos 70: gorro, calça jeans surrada, camisa cáqui, sandália de pneu, bolsão de couro cru. Tem ar juvenil, saudável, mas uma preocupação de mostrar-se decidida, como quem assume o próprio destino. Pára um pouco para falar com IRMÃ BULA e acena para LORENA na varanda, que responde.

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Palhares, 03/01/-1,

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IRMÃ BULA Pensei que não fosse voltar mais.

LIA Que é isso, Irmã? Eu sempre volto ao local do crime. (OLHA EM TORNO) Já foi todo mundo embora?

IRMÃ BULA Todo mundo. E eu não gostei nada.

IRMÃ BULA volta a mexer no jardim. LIA Não gostou porquê, Irmã Bula?

IRMÃ BULA Isso aqui fica muito triste quando tem greve. Eu sinto falta das meninas.

LIA A senhora tem que falar é com os militares. A culpa é deles.(CITA MANCHETE DE JORNAL SOBRE

SEQÜESTRO DE UM EMBAIXADOR)

IRMÃ BULA (REPREENSÃO SUAVE) Que é isso, menina?

LIA avança na direção do balcão da varanda onde estão LORENA e MADRE ALIX. Sobe a escada em 3 passadas largas.

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LIA Satisfeita com a greve, Madre Alix? Ficou livre da legião de bárbaras? (AVANÇA, BEIJA LORENA)

Oi, Lorena. Tudo bem?

IRMÃ BULA grita lá de longe, abaixada no jardim.

IRMÃ BULA Lorena! Já viu isso aqui? As plantinhas estão nascendo de novo. A gente arranca todo dia, mas elas voltam a crescer.

LORENA Depois eu vou aí. (P/LIA) Vamos entrar, Lia. _________________________________________________________________

SEQ 05 QUARTO DE LORENA INT / DIA A Fresca e a Guerrilheira 200”

LORENA e LIA entram no quarto. LIA começa a mexer em sua sacola. LORENA a olha com interesse. Gosta da amiga, se interessa por ela, parece ter vontade de ser como ela.

LIA Como é que estão as coisas?

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LORENA Tudo igual. Que é que você trouxe aí? Uma metralhadora?

LIA Que metralhadora. Por enquanto é só trabalho chato. O tiroteio é pra mais tarde.

LORENA Quando começar você me avisa. Vou comprar um capacete pra me proteger.

Procurando algo na sacola, LIA tira um livro lá de dentro e o coloca ao lado. LORENA o examina, com interesse muito superficial.

LIA (MAIS PARA SI) Mas onde é que meti meu cigarro?

LORENA (LIVRO NAS MÃOS) O que é isso aqui?

LIA É o Manual do Guerrilheiro.

LORENA Pra que serve isso?

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LIA Ensina tudo que a gente precisa saber. Mostra como são as armas, que armas usar, ensina a fazer coquetel Molotov, essas coisas.

LORENA (COMO SE ACHASSE QUE AQUILO É UMA BRINCADEIRA UM TANTO PERIGOSA) E você vai aprender isso tudo mesmo, Lia?

LIA Pode ser que seja preciso. Se for, eu estou aí pro que der e vier. (T) Ah! Achei o cigarro. Tá aqui. (PEGA O LIVRO DAS MÃOS DE LORENA) É melhor guardar esse Manual. Me dá aqui. Isso não é pra ficar exposto por aí não.

LIA mete o Manual bem no fundo da sacola.

LORENA Às vezes eu fico assustada com essas coisas, sabia?

LIA Não vamos falar disso não. Eu estou morta decansaço. Essas correrias estão me matando.

LIA cai no sofá e acende o cigarro. LORENA a olha como se não acreditasse que a amiga está realmente envolvida com armas, guerrilhas,”essas coisas”, e muito menos fumando em seu quarto. LORENA faz uma expressão brincalhona de nojo.

LORENA Quer tomar um banho de sais, Lia? Eu preparo um banho pra você. Tenho um “Badedas” novinho.

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LIA Banho não. Eu quero descansar.

LORENA Quer tomar um chá?

LIA (ENROSCANDO-SE, IRÔNICA) Só se for bem exótico...

LORENA (COMPREENDE A CAÇOADA) Eu tenho um novo. Olha aqui. (EXIBE EMBALAGEM) Chá do Ceilão.

LIA (RISO) Eu nem sabia que o Ceilão fazia chá. Chá doCeilão... (REFLEXIVA) Você é muito fresca.

LORENA se mexe, vai preparar o chá. Olha com simpatia para LIA.

LORENA Fresca, Lião? Você acha que eu sou fresca ?

LIA (RINDO) Eu não acho que você seja fresca. Você é fresca.Meninas3.2

LORENA (RINDO) Você acha mesmo? Fala sério?

LIA Claro que falo. Se não é fresca, que é que significa tudo isso? (APONTA PARA VIDRINHOS, CAIXINHAS, OBJETOS, TUDO ESPALHADO PELO QUARTO) Perfumes importados, cosméticos do outro mundo, lenços finíssimos que ninguém usa porque custam os olhos da cara. Um monte de coisas sofisticadas e inúteis. Sabe de uma coisa? Você vai acabar casada com um nobre do Principado de Mônaco.

LORENA (RINDO) Você tá cruel hoje, hem? Tá atacada outra vez.

LIA dá uma gargalhada, ergue-se, vai abraçar a amiga por trás, afetuosa.

LIA Atacada nada. Vem cá. Eu gosto de você, criatura. Você éminha melhor amiga

LORENA volta o rosto, mas vê algo e dá um grito.

LIA Que foi?

LORENA Uma barata.

LIA Onde?

LORENA Ali. Do lado do sofá. É daquelas grandes, voadoras!

LIA Cadê o chinelo? Me dá o chinelo.

LIA pega um chinelo, rápida, eficiente. Atira-se ao chão. LORENA procura algo para matar a barata, sem muito empenho. Acaba pegando uma revista, que dobra, mais

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para mostrar coragem para LIA. Estão enojadas, mas indignadas e furiosas com a barata.

LORENA Tá ali. Correu pro outro lado.

LIA Onde? Eu não tou vendo.

LORENA Tá saindo. Aqui. Aqui.

LIA Pega. Pega. Não deixa fugir.

Saraivada de golpes. LIA acaba matando a barata.

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LORENA Matou?

LIA Matei... Olha só. É um monstro. Arghhh... Não vou mais querer chá do Ceilão, não.

Olham-se. Explodem em gargalhadas._________________________________________________________________________

SEQ 06 IMEDIAÇÕES DO PENSIONATO EXT / DIA Chegada de Ana Clara 25”

Um de carro de luxo (JK, Simca Chambord, Itamaraty, nessa linha) avança um pouco e pára. Pensionato bem mais adiante. Um homem ao volante. Desce ANA CLARA, 19/25 anos, bonita, bem vestida, mini-saia, pinta de modelo. Exibe um ar cansado, olhos machucados de quem virou a noite. Triste.

ANA CLARA Aqui tá bom. (BATE A PORTA) Obrigada, tá? Depois a gente se vê. (AFASTA-SE, VAI NA DIREÇÃO DO PENSIONATO. PÁRA.VOLTA-SE. O CARRO PARTE)

Anda mais, uns oito passos. Mexe nas coisas que carrega: sacola, pasta de papelão, revistas de moda, etc. A câmera move-se e enquadra uma placa no muro por onde ANA CLARA passa: PENSIONATO NOSSA SENHORA DE FÁTIMA._________________________________________________________________

SEQ 07 QUARTO DE LORENA INT / DIA Confissões de Lia/Lorena 150”

(CONT.de 05) LORENA ao lado do toca-discos, onde gira “Carolina”, de Chico Buarque. LIA está no sofá, tomando chá, imersa em si mesma, ausente.

LORENA Eu tenho certa fixação nessa música, não sei direito por que.(NOTA A AUSÊNCIA DA OUTRA) Que é que está havendo,

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Lia?

LIA Estou cheia de dúvidas, Lena.

LORENA Qual é o problema?

LIA Não sei se estou certa, se estou errada... Essa luta tododia, o dia inteiro... Eu não vejo os resultados, sabe? Tenho

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a impressão de que a gente tá sempre no mesmo lugar... Perdi meu Miguel e... Será que tudo isso adianta alguma coisa?...O povo está cada vez mais longe de nós, não quer nem saber... E se souber ainda fica com raiva.

LORENA Você sempre diz que o povo faz o que pode.

LIA Enquanto isso a burguesia está aí, toda esplendorosa. Nunca os ricos foram tão ricos. Nunca foram tão egoístas.Tudo para eles é dinheiro, ouro, poder. Não pensam emmais nada. Acho uma barra mudar isso tudo.

LORENA Como é que seus companheiros se sentem?

LIA Eles reagem bem... Mas o cerco vai se apertando aos poucos... Acho que vai acabar todo mundo na cadeia.

LORENA Ah, Lião, vira essa boca pra lá.

LIA se ergue, anda, pega em coisas de LORENA. As fotos sobre a mesinha. A foto do DR. NEMESIUS com a família. LIA a pega.

LIA É. A gente não tem que reclamar de nada, sabe? Quem escolhe essa vida tem que estar preparado para tudo.(T) Chegou outra carta do M.N.?

LORENA Lindas essas iniciais, não é? (MEIO SUSSURRANDO, COMO UM SEGREDO) Marcus Nemesius. Dr. Marcus Nemesius. Chegou carta sim. Essa aqui.

LIA Alguma novidade?

LORENA O mesmo de sempre. Diz que gosta de mim, as cartas sãodelicadíssimas, carinhosas, mas tudo continua na mesma. É pura literatura. Nunca vai se separar daquela mulher.

LIA Não dá pra esquecer não, Lorena?

LORENA Não.

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LIA Não dá pra dar aquele salto mortal e sair pra outra?

LORENA Por enquanto não. Mas até que seria bom, sabe?

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LIA (OLHANDO A FOTO DO DR.NEMESIUS) Ele é muito bonito.

LORENA Lindo de morrer. Você precisava ver de perto.

LIA Mein Gott! Como é que pode existir uma paixão assim?

LORENA Existindo. Não existe a sua?

LIA (IMPACIENTE) Mas ele é casado, cheio de filhos. Você acha que...

LORENA Não acho nada, Lião. Às vezes acho que vai dar certo, às vezes acho que não. Às vezes eu imagino que ele vailargar aquela mulher e correr atrás de mim. Às vezes achoque vai ficar com ela a vida toda.

LIA Há quanto tempo dura essa história, hem Lorena?

LORENA (SINCERA) Ah, é uma história muito velha, Lião. Muito velha. (OLHA PELA JANELA, VÊ ALGO, MUDA O TOM) Ana Clara chegou!

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SEQ 08 PENSIONATO / JARDIM EXT / DIA Ana Clara Mostra Foto 25”

ANA CLARA, trazendo sua “tralha”debaixo do braço. parou para conversar com IRMÃ BULA e MADRE ALIX. Mostra a capa de uma revista a IRMÃ BULA.

IRMÃ BULA Oi, Clarinha, vi você numa capa de revista, linda!

MADRE ALIX (AR DE REPREENSÃO) Você dormiu fora outra vez,minha filha?

ANA CLARA Fotografando, Madre... A noite inteira...

MADRE ALIX Cuidado com esses trabalhos noturnos, Ana Clara.

ANA CLARA Depois a gente conversa, Madre. Deixa eu dormir umpouquinho...

ANA CLARA se afasta. IRMÃ BULA comenta com MADRE ALIX.

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IRMÃ BULA (ADMIRANDO ANA) Ela não é linda, Madre?

MADRE ALIX faz um ar de reprovação._________________________________________________________________

SEQ 09 QUARTO DE LORENA EXT e INT / DIA Lia/Lorena Comentam Ana 20”

LORENA e LIA na janela, olhando para fora. LIA bebe o chá.

LIA Como é que ela tem andado?

LORENA A mesma coisa. Tem dias que está gloriosa, tem dias quetá um lixo.

LIA Continua a tomar droga?

LORENA Está pisando cada vez mais fundo.

LIA Com um rosto daquele, mein Gott! Com um corpo daquele!

LORENA Se eu tivesse o que ela tem, não teria problemas de amor. O M.N. estaria aqui todo dia, entrando nesse quarto.

LIA Lá vem ela._________________________________________________________________

SEQ 10 VARANDA DOS QUARTOS EXT e INT/DIA Nomes Completos 90”

As duas se afastam da janela. LORENA abre a porta e sai para a varanda. ANA CLARA aproxima-se. Troca beijinhos com LORENA e LIA. Parece com sono.

ANA CLARA (MEIO IRÔNICA) Lia de Melo Schultz! (BEIJA LIA) Lorena Vaz Leme!(BEIJA LORENA).

LORENA (VOZ CAPCIOSA, PONTA DE IRONIA) Ana Clara!

ANA CLARA Ana Clara Conceição. Pode dizer o nome todo que eu não tenho vergonha.

LORENA e LIA (QUASE AO MESMO TEMPO, RINDO) Ana Clara Conceição!!!.

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ANA também ri. Olha para IRMÃ BULA, que vem chegando.

ANA CLARA Acha que o nome Conceição é vergonhoso, Irmã Bula?Meninas3.2 Meninas3.2

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IRMÃ BULA Nomes são sagrados. Não há vergonha em nenhum deles.

ANA CLARA A senhora é uma santa, Irmã.

IRMÃ BULA Bom, deixa eu voltar pras minhas plantas que elas precisam de mim. As ervas daninhas nunca dão paz. Até já.

IRMÃ BULA se afasta. ANA CLARA olha em torno.

ANA CLARA Já foi todo mundo embora?

LORENA Todo mundo. Vem. Vamos entrar. Tem um chazinho especial pra você.

Movem-se, param na porta do quarto de Lorena.

ANA CLARA Eu não quero chá, não.

LORENA Nem um bolinho?

ANA CLARA Lorena, será que você podia me emprestar um pouco de perfume?

LORENA Empresto. Mas cadê aquele que você levou anteontem?

ANA CLARA Ah, o Astronauta entrou lá no quarto e derrubou. Você me desculpe.

LORENA Eu vou buscar pra você.

LORENA vai para o interior do quarto. Ficam LIA e ANA CLARA, na porta.

ANA CLARA Por falar no gato, cadê ele?

LIA Acho que sumiu. Não vejo há dois dias.

ANA CLARA (GRITA PARA LONGE) Irmã Bula, a senhora viu o Meninas3.2

Astronauta? Ele desapareceu.

IRMÃ BULA O gato?... Não desapareceu não. Ontem de noite eleestava andando por aí. Gato não some assim não.

LORENA reaparece com o perfume para ANA CLARA

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LORENA Olha seu perfume. Pode gastar tudo. Eu não vouprecisar.

ANA CLARA Imagina, Lorena. Eu vou gastar só um pouquinho. Depois eu devolvo.

ANA CLARA caminha para seu quarto, ao lado do de LORENA. Pára, procura a chave. Está sendo observada por LIA e LORENA. Olha para elas, enquanto luta para achar a maldita chave.

ANA CLARA Que é que há? Estão me reparando?

LIA (DISFARÇANDO) Estamos achando você lindíssima.

ANA CLARA Estão me achando maluca, isso sim.

LIA e LORENA riem, e entram no quarto._________________________________________________________________

SEQ 11 QUARTO DE LORENA INT / DIA É Ana Turva 15”

LORENA e LIA entram. A seqüência continua a anterior.

LORENA Essa história de gato que entornou é mentira. Ela usou o perfume todo num dia só. Ela se encharca de perfume.

LIA E nem precisava disso, entende?

LORENA (SOPRANDO UM SEGREDO) Dizem que tá tomando...ó...ó.

LORENA faz um gesto de quem injeta algo no braço.

LIA Meu Deus! Como é que pode?

LORENA Não é mais Ana Clara. É Ana Turva...Meninas3.2

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SEQ 12 QUARTO DE ANA CLARA INT / DIA Travada de Pó 80”

ANA abre a porta, depois de alguma dificuldade com a chave. Pela porta entreaberta, entra uma faixa de luz que clareia um belo poster de ANA CLARA. Éuma foto profissional.

ANA entra. Sem olhar para nada, gira o corpo e fecha a porta. Escurece, pois há uma cortina na janela.

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Ela acende a luz. A claridade revela uma série de objetos que ajudam a definir a personalidade de ANA CLARA: bichos de pelúcia, revistas de moda, roupas sofisticadas, penduradas de qualquer maneira.

ANA olha o quarto e se assusta. Há um rapaz deitado em sua cama, de bruços. É MAX, rapaz de 25/28 anos, alto, magro, belo, traços trágicos. Está nu, mas um lençol cobre-lhe o corpo até a cintura.

ANA CLARA (AVANÇA, TOCA NO CORPO) Meu Deus, Max! Como é que você entrou aqui?... Max, acorda. Não pode

entrar homem aqui dentro, Max. Que é que há com você? Acorda, Max!

MAX acorda, gira o corpo, sorri para ela. Procura atraí-la para ele.

MAX Ô, Coelha. Você está linda.

ANA CLARA Max, você não podia estar aqui dentro. Isso é um pensionato para moças.

MAX Que é isso, Coelha? A gente tá sempre aqui... Olha, tenho uma coisa aqui pra nós.

Ele exibe um vidrinho com uma colherzinha na tampa.

ANA CLARA Não, Max. Agora não.

Ele abre o vidrinho. É cocaína. Prepara duas doses.

MAX Uma dose adamada pra Coelha, outra pra mim, ahn? Com isso a gente engrena.

Meninas3.2 ANA CLARA Não, Max. A essa hora não vale a pena.

MAX Não tem hora pra isso, Coelha. Toma.

Ele cheira, ela também. Ele a atrai para a cama.

MAX Ai, Coelha. Eu te amo tanto.

ANA CLARA (ABRAÇA-O) Ah, Max. É tão ruim.

MAX O que é que é ruim, Coelha? Amar é ruim?

ANA CLARA Eu não sinto nada, Max. Nem com você nem com ninguém. Faz tempo que eu já não sinto nada. Estou travada, Max. Travada.

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MAX Isso vai passar, Coelha. Vai passar. Foram esses psicanalistas que fizeram isso com você.

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SEQ 13 (FLASHBACK) CONSULTÓRIO INT / DIA Estupro Ana Clara 1 18”

Detalhes de corpos num consultório de dentista. Um homem tenta violentar uma garota. Ele é o dentista. Ela resiste. Gemidos , luta, ruídos, respirações ofegantes._________________________________________________________________

SEQ 14 (FLASHBACK) ATELIÊ FOTOGRÁFICO INT / DIA Inicio da Carreira 25”

ANA CLARA, mais jovem, em plano aproximado. Ela usa uma espécie de túnica que cobre seu corpo parcialmente. Está deslumbrante. Explodem dois, três flashes. ANA aparece em outra posição, com a túnica em novo arranjo. Mais flashes. Novas posições de modelo. Um FOTOGRAFO atrás da câmera, em plano aproximado. Cliques, flashes.

FOTOGRAFO Assim, isso. De novo. Vai mais.________________________________________________________________

SEQ 15 QUARTO DE ANA CLARA INT / DIA Ana e Max Brincam como Crianças 150”

Meninas3.2 (CONT.de 12) ANA CLARA e MAX na cama. Ele deitado de costas. Ela, uma perna sobre ele, acaricia seu rosto.

ANA CLARA Infância pobre, cabelo pobre, família miserável, pai peão-de-obra... Tenho um metro e setenta e sete. Sou modelo. Uma beleza de modelo. O que mais você quer?... Se essa cabeça me desse uma folga, pomba, deixasse de pensar só coisas chatas(IMITA RUÍDO DE ROER) Roque, roque, roque...

MAX Que é que há, Coelha?

ANA CLARA (ERGUE-SE, NÃO SABE O QUE FAZER) Queria ter uma abóbora no lugar da cabeça. Uma abóbora bem grande e amarelona.

MAX Quer mais uma dose?

ANA CLARA (MOVE-SE, INQUIETA) Por que minha cabeça tem que ser minha inimiga, pomba? Só penso pensamento

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que me faz sofrer. Por que essa droga de cabeça tem tanto ódio de mim? Isso nenhum analista me explicou,isso da cabeça. Só de porre essa sacana me deixa em paz.

MAX Quer casar comigo, Coelha?

ANA CLARA Vou me casar com o Escamoso.

MAX Pára de falar nesse Escamoso. Vem cá. Você não vaicasar com ninguém...

ANA CLARA Vou sim. Ele é escamoso, mas tem dinheiro. Não precisa ter amor... Em dezembro me costuro, em janeiro me caso... Quero vestido branco. Estilo medieval. Pérolas. Um fio de pérolas brancas. Enormes... É bom viver, pomba. Sou linda, brilhante, vou sair em mil capas de revista. Revistas importantérrimas. Deixa os piolhentos uivarem de inveja.(IMITA UIVOS) Uuh, uuh, uuh....

MAX ri. Muda de posição. Coloca ANA deitada de costas, acaricia-lhe os cabelos, o pescoço, o rosto. Tenta iniciar uma relação sexual. ANA se esquiva. Meninas3.2

ANA CLARA Essas duas aí do lado não entendem nada.

MAX Que duas?

ANA CLARA Minhas amigas que moram aí do lado.

MAX Que é que tem elas?

ANA CLARA Você conhece. Já te mostrei no bar.

MAX Ahn, sei.

INSERT: Plano fechado de LIA com o ouvido colado à parede tentando ouvir o que se passa no quarto ao lado.

Continuação no Quarto de ANA CLARA.

ANA CLARA A Lorena é podre de rica, imagina. Tem tudo o quer. Tem aquele quarto de luxo com uma banheira de. princesa. Tem mãe pra socorrer quando ela precisa. Tem dinheiro sobrando. Ela empresta pra gente. Pra mim e pra Lia.

MAX E essa Lia faz o que?

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ANA CLARA É revolucionária. Comunista. Vive metida com um bando de subversivos, correndo de cima pra baixo, sempre afobada. Qualquer dia vai parar na cadeia... É uma dupla que eu não entendo. Uma é rica e fresca, come até caviar. A outra é comunista. Elas pensam que eu não valho nada. Que sou uma burra. Que só tenho beleza... Mas elas vão ver.

MAX Casa comigo, Coelha.

ANA CLARA Vou me casar com o Escamoso, já falei, pomba!

MAX Que escamoso! Você é doida! Doida!

Faz cócegas nela. Aperta-a. Ela procura se desvencilhar, se diverte. Os dois riem. Brincam como crianças.(T)_________________________________________________________________

M eninas3.2 SEQ 16 QUARTO DE LORENA INT / DIA

O Traficante Tá Aí 30”

(CONT. de 11) LIA está recostada, perto da parede. LORENA prepara uma iguaria.

LIA Ele está aí de novo.

LORENA Quem?

LIA O tal do Max, o traficante.

LORENA Imagina se as freiras pegam esse homem aquidentro.(EXIBE A IGUARIA PARA LIA)

LIA O que é isso agora?

LORENA Caviar do Irã. (LIA COMEÇA A RIR) Está rindo de que? Caviar iraniano é coisa fina.(RI TAMBÉM)

LIA Já pensou o que o pessoal ia dizer se me visse assim, deitada, burguesona, comendo caviar?

LIA pega a torrada, morde-a. Ouve-se a voz de IRMÃ BULA vinda do pátio.

IRMÃ BULA (OFF) Lia! Telefone pra você!

LIA (GRITANDO) Já vou! (P/LORENA) Pera aí que` eu já volto.

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LIA sai do quarto apressada.________________________________________________________________

SEQ 17 PENSIONATO/JARDIM EXT/DIA Lia Vai Pro Telefone 07”

Lia passa apressada por IRMÃ BULA.

LIA (IRÔNICA) Deus lhe pague, Irmã Bula. Ela anda depressa, viva, dinâmica._________________________________________________________________Meninas3.2

SEQ 18 QUARTO DE LORENA / BANHEIRO INT/DIA Lorena Inicia Banho 15”

(CONT.de 16) LORENA acaba de colocar um disco na vitrola. É Gal Costa. Ouve-se música. Ela dá passinhos de dança enquanto morde a torrada de caviar. Põe atorrada em algum lugar. Move-se enquanto dança. Entra no banheiro do quarto, todo decorado e cheio de vidrinhos, sabonetes e xampús, liga a torneira da banheira._________________________________________________________________

SEQ 19 PENSIONATO / SECRETARIA INT/DIA Telefonema de Lia 20”

LIA chega afobada numa espécie de guichê, ou balcão envidraçado. Uma mão empurra o telefone, que fica mais exposto. LIA atende o telefone.

LIA Alô? Sou eu... Que foi que houve? (OUVE) Tá...Tá tudo bem(OUVE. REAÇÃO DE SERIEDADE CRESCENDO EM SEUROSTO) (P) Ah! O carro...(SÉRIA) Tá, não se preocupe...

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SEQ 20 QUARTO DE LORENA / BANHEIRO INT/DIA Lorena Entra n’Água 20”

(CONT.de 18) A música continua. LORENA vai tirando a malha de ballet e entrando na banheira. O contato com a água a faz suspirar. Ela entra e senta-se. A água que jorra da torneira vai enchendo a banheira, subindo pelas pernas de LORENA._________________________________________________________________

SEQ 21 PENSIONATO / JARDIM EXT/DIA Saída de Max 20”

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(IGUAL a 17) LIA cruza o pátio preocupada com o telefonema. Avista algo.

MAX está saindo do quarto de ANA CLARA, meio agachado. Oculta-se como um ladrão. Avança.LIA oculta-se um pouco para não ser vista. Observa com um sorriso. Olha para IRMÃ BULA, que está afastada, como para ver se a freira não vai perceber a escapada de MAX. Este some. LIA continua para o quarto de LORENA.Meninas3.2

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SEQ 22 QUARTO DE LORENA / BANHEIRO INT/DIA Fresca mas Generosa 105”

(CONT.de 20) LIA entra no quarto e logo avista LORENA na banheira, cantarolando. Ouve-se ainda a musica do disco de Gal Costa, vinda da vitrola do quarto.

LIA (OBJETIVA) Escuta, Lorena. Será que a sua mãe pode meemprestar o carro outra vez?

LORENA (DIVAGANDO) Lião, Lião, ando tão apaixonada... Se o M.N.não telefonar, me mato.

LIA Lena, escuta, eu não estou brincando.

LORENA (EM CIMA) É pra alguma ação armada?

LIA Por que? Se fosse, você não emprestava?

Pausa. Ao fundo, o disco de Gal inicia a faixa “Baby”.

LORENA Acho o Caetano muito mais poético que o Gil, você nãoacha?

LIA ( IRRITADA) Putz, Lorena! É pra uma ação do aparelho,pombas. Mas, pra te dizer a verdade, eu nem sei direito oque é, entende?

LORENA Vocês deviam seqüestrar o M.N., Lião. Por que é que nãoseqüestram o M.N.? Ele ficaria escondidinho debaixo daminha cama, “per omnia secula seculorum. Amem”.

LIA (JÁ MEIO MAGOADA) Tudo bem, Lena. Se você não puder emprestar, não empresta. Mas não brinca com essa historiade seqüestro, que isso é sério, tá?

LORENA (CONCILIADORA) Eu não disse que não ia emprestar, Lia,disse?

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Tempo de mal estar.

Meninas3.2 LIA (MUDANDO DE ASSUNTO) Eu vi o namorado da Ana Clara

lá fora, fugindo.

LORENA (AINDA MEIO AUSENTE) Que namorado, Lia?

LIA (SEM PACIÊNCIA) O Max, Lorena, o traficante. Tava saindotodo sorrateiro. Parecia um ladrão. Aliás até que ele não éfeio, não.

LORENA Vamos chamar a Ana Clara pra cá?

LIA Deixa que eu chamo. (ANDA, BATE NA PAREDE COM OSNÓS DOS DEDOS). Clara! Você tá bem?

ANA CLARA (OFF, MEIO CAVERNOSA) Tô, Lia.

LIA (MEIO GRITANDO) Vem pra cá. Vem comer um caviar.

ANA CLARA (OFF) Tô indo.

LORENA Lia, você não vai precisar de algum oriehnid pra essasua ação... desarmada?

LIA não se digna a responder.

LORENA Oriehnid, Lião. Dinheiro dito de trás pra diante dá sorte!

LIA A menina é fresca, mas é generosa. (VAI ATÉ UMACAIXINHA DE PRATA, NO QUARTO, ABRE e RETIRA DUAS NOTAS).

Batem na porta do quarto. LIA guarda o dinheiro depressa, num movimento instintivo. ANA CLARA abre a porta. Coloca só a cabeça para dentro do quarto.

A.CLARA Oi, meninas. Tem lugar pra mais uma?

LORENA (OFF, LÁ DO BANHEIRO) Claro. Senta aqui, Clarinha.

LIA vem para o banheiro e apanha uma torrada com caviar. ANA CLARA entra e fecha aporta do quarto. Veste um quimono curto e tem os cabelos molhados do banho recente. Vai até o banheiro. Vê as outras duas com torradas nas mãos.

Meninas3.2 Meninas3.2 Meninas3.2

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A.CLARA Que é isso que vocês estão comendo?

LORENA (IRÔNICA) Caviar do Irã.

A.CLARA (BRINCANDO) É uma coisa de alto nível?

LIA Altíssimo nível.

A.CLARA Então eu quero.

As três riem. A musica segue na vitrola._________________________________________________________________

SEQ 23 PENSIONATO/ JARDIM EXT / DIA As Freiras Felizes 15”

(CONT. de 21) IRMÃ BULA pára de arrancar matos ao ouvir o riso das moças, que se mistura à música. Sorri e olha para MADRE ALIX que está ali perto.

IRMÃ BULA Elas estão rindo.

MADRE ALIX Ainda bem, Deus seja louvado.

Os risos ,e a música continuam. IRMÃ BULA volta a arrancar seus matinhos. MADRE ALIX anda devagar por ali, sem ir a lugar nenhum._________________________________________________________________

SEQ 24 PRISÃO MILITAR INT / DIA Visita à Prisão 180”

Dia seguinte. Detalhe de tranca, antiga e pesada sendo aberta. Câmera revela LIA, ao lado de um POLICIAL militar, entrando numa sala. Ela constrangida, ele entediado. É uma sala pequena com mesa, cadeira e uma janela com grade. No lado oposto aonde LIA entra há uma segunda porta. Tempo. Por esta segunda porta entram um jovem SOLDADO e MIGUEL, 30 anos, barba rala, calça jeans e paletó de pijama velho e entreaberto. Ar de cansaço. Seu rosto se ilumina ao ver LIA, esta vai até ele, se abraçam em silêncio. LIA beija-lhe o rosto todo e se afasta um pouco para olhá-lo de cima a baixo. O SOLDADO sai. O POLICIAL olha para LIA como se perguntando o que ela vê naquele preso.

Meninas3.2 POLICIAL (VAI ATÉ A PORTA, E SE DIRIGE A LIA AO

SAIR) Nada de besteira, que eu tô de olho, heim?

O POLICIAL sai, fecha a porta e fica assistindo a cena por uma janelinha na própria porta.

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MIGUEL e LIA voltam a se abraçar e se beijar, agora de forma sexuada. Sentam à mesa. Falam em tom baixo.

MIGUEL Como foi pra entrar?

LIA O mesmo de sempre. Espera. Revista. Espera...E você? Pararam os interrogatórios? Tem comido melhor?

MIGUEL Pararam de bater. Acho que o seqüestro tá fazendo efeito. Como é que tá na opinião pública?Nos jornais?

LIA Apesar da censura, não falam noutra coisa. Todomundo acha que os militares vão ceder. (P) (INSEGURA) Tudo vai acabar bem.

MIGUEL Claro. Agora... eu talvez saia daqui... eu não queria... eu não quero... te perder, e eu não sei o que que eu vou fazer. Para onde vão me mandar.Que tarefas...

LIA O que é que você quer dizer, Miguel? Diz de uma vez.

MIGUEL olha para a janelinha da porta para verificar se o POLICIAL está ouvindo o que eles conversam. Mas o POLICIAL está bocejando, distraído.

MIGUEL Talvez eu tenha que desaparecer, Lia. Vou participar de ações mais pesadas. Talvez eu tenha que sumir por uns tempos...

LIA Vou com você.

MIGUEL Pois é... Não acho uma boa idéia. Você não estátreinada. Não está pronta.

LIA Porra, eu não sou mais criança, Miguel. Que que Meninas3.2

é? Não tem confiança?

MIGUEL Você é muito nova... E depois, eu gosto muito devocê. Não quero te ver envolvida em... em situações de grande risco.

LIA Sei... eu sou melhor namorada que soldado, não éisso?

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MIGUEL Ô meu amor... Cada um tem sua hora. (P) A genteprecisa que você leve isso (OLHA PARA O BOLSO DO PALETÓ, ONDE SE NOTA UM PAPEL DOBRADO).

LIA olha para o policial na janelinha da porta. Ele continua entediadamente distraído.

LIA Me dá. É pra imprensa? É pra quem?

MIGUEL Me dá um beijo.

LIA se levanta, dá a volta na mesa e abraça MIGUEL contra o peito, beijando-lhe a cabeça. Ele pega o papel dobrado no bolso e coloca-o no decote dela. Vê-se que é uma carta. Ela se arruma enquanto ele se levanta. Beijam-se apaixonadamente. Pinta um clima de tesão.

O POLICIAL dá uma olhadela para a cena e bate na porta cortando o amor dos dois. Eles se afastam, sem graça e voltam a sentar na mesa.

MIGUEL Mostra pra todo mundo. É a verdade.

LIA Claro. (P). Eu passo pro Bugre.

O POLICIAL abre a porta.

POLICIAL Vambora, menina.

LIA e MIGUEL se levantam, dão um beijinho rápido e ficam se olhando, parados.

POLICIAL Como é que é?

LIA sai rápido, quase correndo. MIGUEL fica parado no meio da sala. O POLICIAL sai e bate a porta. MIGUEL fica só. Entra um ruído em off de água jorrando, forte.Meninas3.2

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SEQ 25 QUARTO DE LORENA INT/DIA Banho de Lia 70”

A banheira acaba de encher. LORENA prepara um banho de imersão para LIA, com ar tenso e cansado. Coloca sabonetes, xampu e escova em lugares estratégicos. LIA está por ali, sentada, meio pensativa.

LORENA Pronto, dona Lia de Melo Schultz. Tá tudo preparado. Agora é só mergulhar. Vai em frente. Esses banhos curam

qualquer infelicidade.

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LIA Ainda bem...

LIA vai tirando a roupa, até ficar quase inteiramente nua. LORENA a observa, a princípio sem muito interesse. Depois interessa-se mais. Mas seu olhar não tem nada de luxurioso. E não se trata também de simples admiração. Ao ver aquele corpo, LORENA está pensando em si mesma, em seus problemas com seu próprio corpo.

LIA joga sua ultima peça de roupa para o lado. Está nua. Dá um passo em direção à banheira, percebe o olhar de LORENA, que olha para seu próprio corpo com um olhar meio triste, indagador.

LIA Que foi?

LORENA Estou olhando seu corpo... Estou pensando se algum diaeu vou ficar assim.

LIA (RI) Assim como, Lena?

LORENA É que ainda sou... Ah, deixa pra lá. Entra logo nesse banho.

LIA anda, entra na banheira. LORENA fica olhando aquele corpo por trás. LIA afunda devagarinho, deixa a cabeça pousar na beira da banheira. Suspira.

LIA Ah... A paz de Deus deve ser isso.

LORENA Deus existe mesmo, dona Lia.

LIA É... É bem capaz...

Meninas3.2 Lia afunda-se na banheira, sumindo na água. Depois de pequena pausa, ressurge na superfície com expressão aliviada. Entram em off os diálogos da próxima seqüência._________________________________________________________________________

SEQ 26 DEPOIMENTO DE LIA INT / DIA 180”

LIA diante de MADRE ALIX. Lugar indefinido. LIA fala sem se preocupar com a organização do discurso. É uma espécie de desabafo, de confissão. Planos fechados sobre as duas.

LIA Já me disseram que minha crença na justiça é uma coisa religiosa... Lorena diz que sou uma crente.

MADRE ALIX Talvez seja verdade. Você acredita em Deus, não é?

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LIA Não sei, Madre. (P) Queria acreditar mas... Vejocertas coisas que... não dá para achar que Deus existe.

MADRE ALIX (IMPESSOAL) E você acredita em que?

LIA Na gente, entende? Em lutar pra modificar o mundo. (T) No que as pessoas são capazes de fazer. É nisso que eu acredito.

MADRE ALIX E na sua gente?... Seus pais, por exemplo. Vocêtem se comunicado com eles?

LIA Às vezes eu escrevo... Meu pai é alemão, a senhora sabe, né? E minha mãe é da Bahia. (RI) Mistura estranha, né? Alemanha com Bahia... Eles são pessoas simples...Eles não entendem essas coisas, Madre. É difícil conversar com eles...Eu não sei nem se eu devia estar dizendo isso...

MADRE ALIX Tinha tanta coisa que lhe dizer, filha. Você já está conosco há tanto tempo...e nem sei por onde começar. Essa sua política, por exemplo.Me pergunto se você está em segurança.

Meninas3.2 LIA Segurança? Mas quem é que está em segurança?

Aparentemente a senhora parece estar seguraaqui nessa sua “redoma” mas é bastante bem informada para saber “do que” essa redoma estálhe protegendo. Putz, o país está um caos e a senhora fala em segurança!

MADRE ALIX Mas não estou na redoma, Lia. É nesse ponto quevocê se engana. Temos um Condutor Supremo edo Seu (DÁ UMA DISCRETA OLHADA PARA OALTO) esquema transcendente a violência foiriscada. A espiritualidade...

LIA Madre, o Bezerro de Ouro está instalado na praçae a senhora vem me falar em espiritualidade. Osadoradores não são espirituais porque são adoradores, entende? O povo está desesperado.Essa miséria, esses crimes tudo isso é desespero... Eu estava assim desorientada. Agorasei o que eu quero fazer.

MADRE ALIX Violência também?

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LIA Não, Madre Alix. Confesso que estou mudando, aviolência não funciona, o que funciona é a uniãode todos nós para criar um diálogo. Mas já quea senhora falou em violência vou lhe mostrar uma.(PEGA UM PAPEL NA BOLSA. É O MESMO QUERECEBEU DE MIGUEL NA PRISÃO. DESDOBRACOM CUIDADO E LÊ)

LIA (LENDO) Primeiro me perguntaram se eu pertencia a algum grupo político. Neguei. Enrolaram então alguns fios ao redor dos meus dedos, iniciando-se a tortura elétrica. Obrigaram--me então a aplicar choques em mim mesmo e em meus amigos. Para que eu não gritasse, enfiaram um sapato dentro da minha boca. Outras vezes, panos fétidos. Após algumas horas, a cerimônia, atingiu seu ápice. Penduraram-me no pau-de-arara: amarraram minhas mãos diante dos joelhos, atrás dos quais enfiaram uma vara, cujas pontas eram colocadas em mesas. Fiquei pairando no ar.(LIA GUARDA O PAPEL COM AR VITORIOSO, AGUARDANDO A REAÇÃO DA MADRE).

Meninas3.2 MADRE ALIX (INABALÁVEL) Conheço isso, filha. Esse moço

chama-se Bernardo. Tenho estado muito com amãe dele, fomos juntas falar com o Cardeal.

LIA (MEIO SEM GRAÇA) Agora é que não sei mesmoo que pensar. Nunca ninguém me deu tanto essaidéia de união de gelo e fogo como a madre me dá. Boa noite, Madre Alix.

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SEQ 27 ATELIÊ FOTOGRÁFICO INT / DIA

Cheirando no Ateliê 40”

ANA CLARA, contra um fundo neutro, faz poses de modelo enquanto ouvimos os cliques de uma máquina fotográfica. Tempo atual. Ao contrário do que vimos na SEQ 13, ela agora parece meio presa, sem a desenvoltura necessária para as fotos.

O fotógrafo aciona a câmera e observa os movimentos de ANA CLARA. Parece insatisfeito.

FOTÓGRAFO Não, não, assim não. Faz movimentos mais suaves. Você está muito dura.

ANA CLARA Bota um pouco de música. Uma coisa suave.

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FOTÓGRAFO (VIRA-SE PARA UMA VITROLA) Que é que você quer ouvir?

Ele olha de volta. Não vê nada. ANA CLARA sumiu.

Ela está atrás de um biombo. Tira cocaína de uma bolsinha, é o vidrinho de Max,cheira. Procura se compor, sai de onde está.

O fotógrafo ao lado da câmera, esperando, como se já soubesse do que se trata.Ouve-se a música. ANA CLARA volta ao lugar onde posava.

FOTÓGRAFO Tudo bem, Aninha?

ANA CLARA Tudo bem. Agora vai ser melhor.

O fotógrafo recomeça a série de fotos, enquanto ANA CLARA faz movimentos apropriados.Meninas3.2

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SEQ 28 (FLASHBACK) CONSULTÓRIO INT / DIA Estupro Ana Clara 2 15”

(Igual a SEQ.13) Homem tenta violentar menina em consultório de dentista. Lutam. Percebemos, de repente, que se trata de ANA CLARA, mais jovem aqui._________________________________________________________________

SEQ 29 DEPOIMENTO DE ANA CLARA INT / DIA 100”

(Seqüência idêntica a 26, com ANA CLARA no lugar de LIA)

ANA CLARA A gente chamava ele de Dr. Algodãozinho, Madre...Ele ficava botando algodãozinho no dente e não curava nada. O dente estava sempre ruim, nunca ficava bom. E ele sempre com a broca, furando, furando, furando. (IMITA A BROCA) Fuinnn, fuinnn, fuinnn... E botando algodãozinho... Ele queria arrancar dinheiro da mãe, né? E também queria...

MADRE ALIX Você tem um namorado mais velho, não tem?

ANA CLARA É o Escamoso... É, ele é mais velho do que eu, sim. Podia ser meu pai... É rico também... Eu vou me casar com ele. Vai ser bom pra mim.

MADRE ALIX (IMPESSOAL) Você gosta dele, minha filha?

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ANA CLARA O problema é esse, Madre... Não gosto não...Mas não é porque ele seja feio não. Ele não é o homem que eu queria, compreende?

MADRE ALIX E como é o homem que você queria?

ANA CLARA Ah, não sei. Eu penso muito nisso, mas não sei. Eu não sei qual é o homem que eu queria... Às vezes eu vejo um filme e fico pensando, ah, que homem maravilhoso, era isso que eu queria, mas depois eu penso isso é filme, que bobagem, não tem nada a ver...Eu não sei qual é

Meninas3.2 o homem. Mas o Escamoso eu sei que não é.

MADRE ALIX Por que você o chama de escamoso?

ANA CLARA Sei lá, Madre Alix. Ele tem uma pele esquisita. O corpo é meio coberto de escamas, as escamas começam aqui na barriga e vão subindo, subindo e quando chegam aqui debaixo do braço, está vendo?(LEVANTA OS BRAÇOS) Aqui tem escama à beça.(PASSA A MÃO NA AXILA, RI)

MADRE ALIX (CORTANDO) Mas você tem um outro namorado, jovem, não tem?

ANA CLARA (DISFARÇANDO)Não é bem um namorado. É mais um companheiro.

MADRE ALIX E as fotografias que você tira para as revistas?

ANA CLARA Ah, isso eu gosto. Isso é o meu sonho. É o sonho acontecendo de verdade... Mas não é tudo. É só uma parte. O sonho todo tem riqueza, muita riqueza. Eu tô dizendo besteira, não estou?

MADRE ALIX Por que você fala tanto em sonho?

ANA CLARA Por que a realidade é muito ruim, Madre. Não vale nada.

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SEQ 30 PRÉDIO E RUA EXT / DIA Ana Clara Cruza com Lorena 20”

ANA CLARA sai do prédio onde fica o ateliê fotográfico. Apressada. Meio tonta. Procura algo com o olhar. Vê. Ruídos de trânsito.

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ANA CLARA anda depressa, vai encontrar um homem que a espera dentro de um carro (mesmo estilo do da SEQ 06, mas outro carro) com a porta aberta. Ela entra no carro. Panorâmica da rua, lojas, propaganda da época (São Paulo, 1972). A câmera desvia, enquadra LORENA, que passa distante, carregando sacolas de compras. Ela se encaminha para uma loja, logo adiante._________________________________________________________________

Meninas3.2 SEQ 31 JOALHERIA EXT / DIA

Lorena na Joalheria 15”

(Continuação da SEQ. anterior) LORENA aproxima-se, vê objetos na vitrine, interessa-se por um deles, move-se, entra na joalheria.

Um par de brincos visto através do vidro da vitrine. Um vendedor o apanha.

LORENA sai da loja com mais uma pequena sacola._________________________________________________________________

SEQ 32 TELEFONE PÚBLICO EXT / DIA Telefonema para Mãe 15”

(Continuação da SEQ anterior) LORENA chega a um telefone público. Disca. As sacolas a atrapalham. Pessoas vão passando. Passa casal jovem. Estão abraçados, brincam, riem.

LORENA Alô, mãezinha. Sou eu, Lorena. Queria dar uma passada aí.(OUVE E IRRITA-SE UM POUCO) Sei, sei, mãezinha, tudobem. Agente conversa aí. Tá. Tchau.

Desliga. Anda. Vê novamente o casal jovem. Eles brincam, se empurram, parecem viver um momento de grande felicidade. LORENA fica olhando,. como setivesse vontade de estar vivendo um momento como o deles. Anda._________________________________________________________________

SEQ 33 CASA DA MÃE EXT / DIA Chegada na Casa da Mãe 08”

Casarão em rua residencial. LORENA desce de um taxi e entra na casa._________________________________________________________________

SEQ 34 QUARTO DA MÃE INT/DIA Mãe Deprê no Quarto 170”

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Quarto do casarão. A MÃE DE LORENA está sentada diante da penteadeira. Durante toda a cena, ela vai retirando uma máscara facial, terminando com o rosto nú ao final da sequencia. É uma mulher de uns 50 anos. Tem alguma beleza, mas exibe ar de cansaço, de tristeza pesada, de profunda insatisfação. Meninas3.2 Ela fala enquanto se olha no espelho. LORENA ao lado. Os presentes que ela trouxe estão sobre a penteadeira. A mãe vai abrindo os pequenos embrulhos e retirando coisas como brincos, cosméticos, etc.

MÃE Como estão as coisas lá no pensionato, Loreninha?

LORENA Estão bem, mãezinha.

MÃE As freiras têm perguntado por mim?

LORENA Sempre perguntam.

MÃE Estou em falta com elas, Loreninha. Há muito tempo que nãoapareço por lá. Elas devem estar pensando que sou umapessoa egoísta.

LORENA Não pensam não. Elas sabem que você é generosa.

MÃE Eu não sou generosa.

LORENA` É sim, mãezinha. Você ajuda o pensionato. Ajuda muito.Deve ser a pessoa que mais contribui pra manter aquilo funcionando.

MÃE Talvez eu faça isso só pra ajudar você. Talvez eu não mepreocupe com mais nada. Só com você... Eu não queriaque fosse assim, queria que fosse como antigamente, seu pai era vivo, eu era cheia de vida e me interessava por tudo. Você se lembra como eu era, Lorena? Se lembra?

LORENA Você ainda é a mesma.

MÃE Não sou não. Eu mudei muito. Sou outra pessoa. Não sou um décimo do que fui nos bons tempos. Estou destruída, Lorena. Desde a tragedia dos meninos...da morte do seu pai,

` que eu...Fui destruída por esse homem, minha filha.

LORENA Por favor, mãe...

MÃE É verdade. Foi Mieux quem me destruiu. Foi Mieuxquem me deixou nesse estado. Se não fosse ele, tudo teriacorrido bem. Eu teria chegado a essa idade sem sofrimentosEu era uma pessoa realista, tinha perfeita consciência dascoisas. Foi Mieux que fez isso comigo. Ele não presta,

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Meninas3.2 Lorena, não vale nada. Só casou comigo por dinheiro,Era o meu dinheiro que ele queria. Na verdade, ele meodeia.

LORENA Por que você não pára de falar em Mieux?

MÃE (JÁ FORA DE CONTROLE) Ele podia ser compreensivo comigo. Podia ser paciente, pelo menos. Ele não quer uma relação harmoniosa. Quer o ódio.

LORENA Mamãe, por favor. Tente compreender as coisas.

MÃE Ele foi àquela festa comigo, eu te contei. E fez aquela crueldade monstruosa. Tinha aquela megera. Ela começou a falar nas pessoas que estão envelhecendo. Começou a dizer a idade de todo mundo. Queria que eu dissesse a minha. Só pra me humilhar, para me expor ao ridículo. Eu não ia dizer, claro. Ia me sair bem daquela conversa. Não ia dizer minha idade, imagina se ia dizer minha idade. E Mieux, que estava prestando atenção na conversa o tempo todo, arranjou um jeito de chegar perto e dizer minha idade. Ele disse, Lorena. E disse alto. Pra todo mundo ouvir. Que necessidade ele tinha de fazer isso, Lorena?

Um barulho do lado de fora. Alguém mexe na maçaneta da porta.

LORENA Ele está aí, mamãe.

MÃE Quem?

LORENA Mieux.

MÃE (BAIXO, PERTURBADA) Ele já chegou?

A porta se abre. Aparece MIEUX, alto, bonitão, uns 40 anos. Não entra. Dá apenas uma olhada.

MIEUX Boa tarde, Lorena.

LORENA Boa tarde, Mieux.

A MÃE se transfigura. Procura mostrar que está bem, que está satisfeita. Vê-se que ainda pensa em conquistar aquele homem.

Meninas3.2 MÃE Eu não sabia que você tinha chegado, Mieux. Você chegou

tão devagarinho, tão silencioso.

Meninas3.2 Meninas3.2

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MIEUX Depois eu volto aqui pra falar com você.

Recua, fecha a porta.

MÃE Você viu, Loreninha? Viu como ele faz? Ele nem disfarça opouco caso que tem por mim.

LORENA não tem o que responder. Baixa os olhos. A MÃE faz girar entre os dedos um par de brincos.

MÃE Adorei esse brinco, Loreninha.________________________________________________________________

SEQ 35 CASA DA MÃE INT/DIA Telefonema para Lia 15”

(Continua SEQ. anterior) LORENA anda pela sala da casa, vai ao telefone. Começa a discar. Olha. Vê MIEUX distante, metade do corpo aparecendo na porta. Vê-se que MIEUX a espiona, talvez interessado nela, como mulher. LORENA faz ligeira cara de nojo.

LORENA (TEL.) Alô. É do D.C.E.? Eu queria falar com a Lia, por favor.(P) Oi, Lia. Sou eu. Queria te encontrar. Tá muito ocupada aí? (P) É, agora.(P) Tô pegando o carro aquicom mãezinha.(P) É... vai ficar comigo, direto.

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SEQ 36 RUA : CARRO DE LORENA EXT/DIA Biscoito no Carro 25”

O carro de LORENA avança. Vai parar ao lado de LIA, que espera na calçada. Abre-se a porta. LIA entra.

LIA Que foi que houve?

LORENA Você vai ficar chateada comigo, Lião, mas... Eu te chameipra uma besteira. Já estou arrependida.

LIA Besteira nada. Tudo é besteira. Todo mundo vive de besteiraQue é que houve?

LORENA (MUDANDO DE ASSUNTO) Tem biscoito aí no porta-luvas.Quer?

LIA percebe a brusca mudança de assunto, mas não contraria a amiga. Abre o porta-luvas. Uma lata de biscoitos.

LIA Uh. Biscoitos ingleses. Coisa fina.(COME UM POUCO E

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OLHA PARA LORENA QUE ESTÁ ABSORTA) (T) Como é,Lorena? Vai ficar aí parada?

Close de LORENA distraída._________________________________________________________________

SEQ 37 (FLASHBACK) FAZENDA EXT/DIA Tiro no Irmão 08”

(Igual a SEQ. 01) Dois garotos correm nas imediações de uma casa de fazenda. O que vem atrás carrega uma espingarda. Aponta a arma e atira no primeiro. Este cai.

MÃE, EMPREGADO, COZINHEIRA e LORENA, ainda menina, saem correndo do casarão da fazenda._________________________________________________________________

SEQ 38 (FLASHBACK) HOSPITAL EXT/DIA Lorena se Apaixona 08”

(Igual a SEQ. 02) O momento da morte do garoto. DR.NEMESIUS sai da sala.

MÃE de LORENA e de REMO, o garoto ferido, sendo consolada por pessoas.

DR.NEMESIUS consola LORENA menina, acariciando-lhe o rosto._________________________________________________________________________

SEQ 39 INSERÇÃO DE FOTO (Truca) Foto da Família de Lorena 03”

Foto da família de LORENA, na fazenda, a mesma que aparece anteriormente._________________________________________________________________________

Meninas3.2 SEQ 40 DEPOIMENTO DE LORENA INT / DIA

130”(Igual a SEQS 26 e 29) LORENA no lugar de LIA e ANA CLARA.

LORENA Eu tenho tudo que eu queria, Madre Alix. Nunca me faltounada. Nasci numa família rica, sempre tive dinheiro. Mas

depois comecei a sentir que não tinha tanto assim... A gente pensa que tem tudo, depois vê que não tem grande coisa. Estou chateando a senhora com essa conversa?

MADRE (DOCE, DESTA VEZ) Não, minha filha. Continue.

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LORENA Eu acho que tudo começou a mudar quando meu irmãomorreu. Eu ainda era menina. Acho que a senhoraconhece a história. Eu tinha dois irmãos. Um deles matou o outro, sem querer, com um tiro de espingarda. Ele não teveculpa. Foi um acidente. Ele sabe disso e não foi destruídopela culpa. Pelo contrário. Está bem, vive na Europa, édiplomata... Mas ficou tão longe, tão distante... O curiosoé que fui eu que sofri mais com a morte do Rômulo. Era esseo nome dele, Rômulo. O que está na Europa se chama Remo... Rômulo e Remo... (PAUSA) Ainda hoje eu sofro comaquela morte, Madre. Toda vez que eu olho as fotos da família sinto aquela mesma dor. É como se eu também tivesse levado aquele tiro.

MADRE Talvez você sinta falta da família. Daquelas pessoas que tecercavam o tempo todo.

LORENA (UM TANTO ENVERGONHADA) Talvez eu nunca tenhacrescido direito. Talvez tenha ficado lá atrás, no corpodaquela menina.

MADRE Isso é natural, minha filha. Você ainda é jovem. Vaiacabar crescendo. Todos crescem.

LORENA Minha mãe nunca cresceu, Madre Alix. Talvez eu seja como

ela... Ela tem uma ligação amorosa que nunca se resolve.Sofre pra burro com isso. Mas não consegue dar um jeito navida dela.

MADRE Sua mãe é uma boa pessoa.

Meninas3.2 LORENA Não sei. Eu estive lá outro dia, conversei com ela... Pela

primeira vez eu tive a impressão de que ela é a pessoamais horrendamente egoísta que já vi na minha vida. Edepois pensei em mim. Fiquei achando que eu talvez sejaigual a ela. Se não for, vou acabar ficando.

MADRE Não seja tão severa com as pessoas. Nem com você mesma

LORENA (MUDA O TOM) A senhora sabe, Madre... Eu vivo pensandonum homem. Num homem que... é tudo pra mim. É uma paixão. Quer dizer, eu penso que é uma paixão, nem sei. Ele é bem mais velho que eu, é casado, tem três filhos e parece que nunca vai largar a família para viver comigo.

MADRE (MEIO CHOCADA) É isso o que você quer?

LORENA (DOLORIDA, POR TER FEITO A CONFISSÃO) Ele é o

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médico que tentou salvar a vida do meu irmão. De Rômulo...Ele... Desde aquela época eu fiquei... (NÃO ENCONTRA ASPALAVRAS).

MADRE Sim?

LORENA Desde aquela época eu fiquei... Como é que eu vou dizer?Fica idiota eu dizer que fiquei enfeitiçada? (ESPANTODISCRETO DA FREIRA) Fica. Fica idiota sim... Ai, meuPai! Eu não devia ter dito nada disso.

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SEQ 41 RUA : CARRO DE LORENA EXT / DIA Sou Virgem 70”

(Cont. SEQ. 36) Carro de LORENA avança. LORENA conduz, LIA ao lado.O carro pára subitamente, pois LORENA freou de maneira brusca. Freou e olha para LIA, que vai levando um biscoito inglês à boca.

LORENA Eu sou virgem, Lia.

O biscoito de LIA fica parado a meio caminho, imobilizado. LIA fica um pouco de boca aberta, depois sorri.

LIA (COM SIMPATIA) Você me chamou só pra dizer isso?

Meninas3.2 LORENA (ENVERGONHADA) Você acha ridículo eu ser virgem?

LIA Acho ótimo.

LORENA Por quê?

LIA (TENTANDO LEVAR PARA UM LADO BOM) Bom...Deixa eu te contar uma história...Um dia, um jovem chegou perto de um velho intelectual e disse, meio envergonhado: “Eu nunca li Balzac.” O velho intelectual disse: “Que bom. Eu invejo você.”. “Por quê?”, perguntou o rapaz. O intelectual explicou: “Porque você vai ter o grande prazer de mergulhar num mundo maravilhoso. Eu, não. Eu já conheço tudo.”(RI)

LORENA Não achei muita graça. Isso não tem nada a ver com Balzac.Além do mais, não acredito que você conheça tanto assim a... uh...

LIA Balzac.

LIA ri mais largo. LORENA também.

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LORENA Você avacalhou tudo.

LIA Não avacalhei não. Vamos em frente. Eu sei o que vocêquer.

LORENA E o que é que eu quero, Lião?

LIA Quer me levar pra ver o M.N., não é isso?

LORENA E se for?

LIA Acho ótimo. Eu vou lá com você... Mas qual é a sua intenção? Não é só me mostrar ele.

LORENA Não... Eu queria... Eu queria dar uma decisão. Exigir deleuma decisão. Ou fica comigo ou não fica. Uma coisadefinitiva. Ou fica ou então acaba.

LIA Perfeito. Vamos lá, dona Lorena Vaz Leme. Eu dou uma força, até as 5 estou à sua disposição. (NOUTRO TOM)O que você fizer eu aprovo. Depois eu tenho um assuntoimportante.

Meninas3.2 O carro parte._________________________________________________________________

SEQ 42 ATELIÊ FOTOGRÁFICO INT / DIA Cadê a Carinha 70”

Poses de ANA CLARA em sessão de fotos. Está metida em veste meio sumária (talvez um biquíni) e com maquiagem pesada demais para seu rosto jovem. Ponta de mau humor. Fotógrafo dá seus cliques.

FOTÓGRAFO Pronto. Por hoje chega.

ANA CLARA Só isso? Pensei que tivesse mais.

FOTÓGRAFO Você está de mau humor.

Ele anda, arruma coisas. ANA CLARA mexe-se, põe as mãos no rosto com visível desagrado.

ANA CLARA Eu não estou de mau humor. É que cada vez que me fotografam vão tirando minhas roupas cada vez mais.

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FOTÓGRAFO Deixa de paranóia, Clarinha. São roupas de verão. Tá todo mundo fotografando pro verão.

ANA CLARA Então pra que essa maquiagem pesada dessamaneira? O que é que tem a ver o verão com umquilo de pó-de-arroz na minha cara?

Anda. Mete-se atrás do biombo. Cheira uma colherzinha de cocaína. Fala, mas não vemos o fotógrafo.

ANA CLARA (MAIS PARA SI) Pro verão! Eu sei que é pro verão!(ALTO) No ano passado também era pro verão e havia mais roupa que agora... Eu sei o que está acontecendo. (MAIS PARA ELA) Eu estou ficando fora de moda e vão querer me arrastar pra tirar foto pelada... Mas nessa eu não entro não. Nem por um monte de dinheiro. (ALTO) Você viu minha sandália? Cadê minha sandália?

Meninas3.2 Mexe-se. Pára diante de um espelho e assusta-se um pouco com sua imagem refletida. Avança. Vai ver o rosto de perto. Olha com certo horror para o próprio rosto, como uma mulher que descobrisse sinais de decadência física em sua fisionomia. Mete as mãos no rosto, desmancha a maquiagem, borra a cara, faz uma expressão de horror.

ANA CLARA (FIO DE VOZ, UM POUCO COMO UMA CRIANCINHA) Ah, meu Deus, cadê aquela carinha, aquela carinha?...

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SEQ 43 RUA : CARRO DE LORENA EXT / DIA Desencontro Lorena/MN 65”

(Cont.SEQ 41) DR.NEMESIUS sai de um prédio. Vai a uma banca de jornal. Na banca, jornais dão noticias sobre o seqüestro do Embaixador.

LIA e LORENA no carro da segunda. Espionam.

LIA Lá vem ele.

LORENA Deu pra reconhecer?

LIA Está igualzinho à foto. (PAUSA) Como é? Vai lá?

LORENA É pra já.

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LIA Lorena! (A OUTRA VOLTA-SE) Faz o que você bemquiser. Mas faz com calma. Não se perturbe não.

LORENA Tô mais fria do que gelo.

LORENA sai rápido do carro, mas sem precipitação. LIA observa. O que vemos agora é o ponto de vista de LIA.

LORENA avança. DR.NEMESIUS afasta-se da banca e toma direção inesperada.

LORENA hesita, perde o passo, procura se recompor. Pára ligeiramente, como se refletisse. Olha para o carro.

LIA faz-lhe um sinal com a mão, procurando dizer que “tudo bem, é isso mesmo, vai em frente”.

Meninas3.2 LORENA vai em direção do DR.NEMESIUS, que aperta o passo e novamente muda de direção. LORENA tem que reduzir e fazer manobra que quase a desequilibra. Avança para ele. Surge uma MULHER que, de brincadeira, segura-o por trás. Ele se vira, surpreso. Reconhece a MULHER de imediato. Abraçam-se. LORENA volta para o carro, entra, prepara-se para ligar o motor.

LORENA Era a mulher dele.

LIA Foi o que eu pensei.

O carro parte. Da janela, LIA vê o DR.NEMESIUS conversando animadamente com a MULHER. Ao partir, o carro passa pela banca de jornal, podendo-se ler uma das manchetes falando sobre o seqüestro do embaixador._________________________________________________________________

SEQ 44 BARZINHO EXT / DIA (TARDE) Ana Clara Pega Pó 50”

Um carro de luxo (mesmo tipo do da SEQ 06, mas outro carro), que pegou ANA CLARA no ateliê, pára diante de um barzinho com cadeiras e mesinhas ao ar livre. ANA CLARA desce, meio apressada. Anda. Volta-se para o carro. Um homem lá dentro, ao volante.

ANA CLARA Só dois minutinhos.

ANA CLARA anda, some das vistas do homem do carro, vai localizar MAX num ponto qualquer. Em uma das mesas um dos freqüentadores do bar lê um jornal, cuja primeira página mostra manchete sobre o seqüestro do embaixador. ANA CLARA fala com MAX sem ao menos se sentar.

MAX Chegou rápido, hem, Coelha?

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ANA CLARA (OBJETIVA) Você trouxe?(ELE A OLHA, SEM SE MEXER) Anda, Max. Tou com pressa.

Relutante, MAX tira um papelote do bolso e o estende a ANA CLARA. Ela o pega e dá dinheiro a MAX, que está insatisfeito, ferido em seus sentimentos. Ele segura o braço dela, firme.

ANA CLARA Que é que há?

MAX Você não tem nada pra me dizer? Chega correndo e vai embora correndo?

Meninas3.2 ANA CLARA Eu tenho que ir, Max. Solta meu braço.

MAX Quem é aquele homem que veio com você?

ANA CLARA Que homem?

MAX O homem que te trouxe de carro.

ANA CLARA É o Escamoso.

MAX Ah, é? O escamoso muda de cara todo dia? Cada dia o escamoso é um homem diferente?!

ANA CLARA (OFENDIDA) Que é que você está querendo dizer, Max? Que eu vivo saindo com tudo quanto é homem todo dia?

MAX (CONTEMPORIZANDO) Eu só perguntei quem era o cara, Ana Clara. Não estou criticando.

ANA CLARA Depois a gente se vê. Tchau.

ANA CLARA gira e se afasta.

MAX Eu vou lá no pensionato hoje à noite, tá?

ANA CLARA Não, Max. (ANDA UM POUCO, VIRA-SE, MUDA DE IDÉIA) Tá bom, te espero lá, vai.

Ela segue, some. MAX fica meio deprimido.

ANA CLARA entra no carro que a trouxe. O carro sai._________________________________________________________________

SEQ 45 CAMPUS DA UNIVERSIDADE INT/EXT/ENTARDECER

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Lia Entrega Carta 25”

LIA, com mais tres colegas, pinta uma faixa extendida no chão. As paredes ao fundo estão pichadas com palavras de ordem da greve. Chega um rapaz. É BUGRE, 30 anos, tenso.

BUGRE Oi. Você tem alguma coisa pra mim, né?

Meninas3.2 Lia se afasta dos colegas, se isolando com BUGRE. Tira da bolsa a carta que recebeu de MIGUEL, toda dobradinha, e passa ao rapaz.

LIA O texto é lindo, Bugre. Uma barra, mas... super bem escrita.Vale ouro.

BUGRE (PEGANDO A CARTA) Ótimo. (COMO SE FALASSE COM APRÓPRIA CARTA) Todo mundo te lerá. (GUARDA A CARTANO BOLSO) Outra coisa: a Argélia já aceitou receber o pessoal. A guerra tá na composição da lista dos que vão sertrocados

LIA Mas os milicos já aceitaram a troca?

BUGRE Claro, ora! Desde o primeiro momento. Que que eles iamdizer pro mundo? Que perderam o embaixador? Que não dão garantias ao corpo diplomático internacional? Hein?!Hein?! Que que cê acha?

LIA (MEIO CÉTICA) Sei lá... só sei que o Miguel tá lá... preso e...sei lá.

BUGRE Tudo vai dar certo. Lá fora esses militares não podemcensurar os jornais. Você vai ver. A opinião pública mundialtá do nosso lado. As pressões sobre os homens é pesada.A ditadura tem que cair. (T).

LIA O Miguel tá na lista?

BUGRE Calma. Tem muitas listas. O Miguel tá na beirada. Sabecomo é? Entra não entra. Entra e sai. Só ali ó... vai e volta.(P) Agora é o seguinte: tenho que trabalhar. Depois de amanhã no Museu, OK?

LIA Claro. Tô lá.

Plano geral: BUGRE sai em direção oposta a LIA. Ela volta ao trabalho da faixa com os colegas._________________________________________________________________

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SEQ 46 PENSIONATO / JARDIM EXT / NOITE Luar no Pensionato 04”

Meninas3.2 O pensionato, visto do alto. O pátio. Luar forte._________________________________________________________________

SEQ 47 PENSIONATO / CAPELA INT / NOITE Bula Rezando 1 04”

IRMÃ BULA está ajoelhada. Reza. Levanta-se, faz o sinal da cruz, vai saindo da capela._________________________________________________________________

SEQ 48 PENSIONATO / JARDIM EXT / NOITE Max no Pensionato 06”

(Cont. da SEQ 46) Câmera avança na escuridão. Um vulto passa. Câmera procura acompanhá-lo. É MAX, que avança sorrateiro até o quarto de ANA CLARA. Agacha-se, olha para os lados, entra pela janela. Consegue evitar ser visto por IRMÃ BULA, que cruza o pátio._________________________________________________________________

SEQ 49 QUARTO DE ANA CLARA INT / NOITE Amor e Pó 30”

Câmera avança na obscuridade. ANA CLARA e MAX na cama. Fazem amor. A câmera avança, mostra o vidrinho de cocaína aberto sobre a mesinha de cabeceira._________________________________________________________________

SEQ 50 PENSIONATO INT e EXT / DIA Documentário Cotidiano do Pensionato 60”

Diversas cenas curtas do cotidiano do Pensionato. As três meninas no refeitório, na capela, etc. Na última, LORENA, ANA CLARA, LIA e IRMÃ BULA jogam vôlei no pátio. Um vôlei improvisado. Correm, pulam, gritam, dão risadas._________________________________________________________________

SEQ 51 QUARTO DE LORENA/BANHEIRO INT/DIA(TARDE) Banho de Ana Clara 160”

Meninas3.2 Televisão ligada, sem som. Ouvimos barulho de água e som de risos. Roupas femininas (do jogo de vôlei) espalhadas pelo chão. Câmera anda, entra no banheiro, Meninas3.2 Meninas3.2

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mostra LORENA e LIA, enroladas em toalhas, copos nas mãos, e ANA CLARA dentro da banheira cheia, tomando um banho.

A. CLARA Não tem coisa melhor do que isso... Se a vida fosse sempreassim era uma maravilha.

LIA (IMITANDO AS FREIRAS)”Tudo o que é bom dura pouco,minha filha”.

A. CLARA Mas pra mim vai durar muito. Vou me casar com um homem rico e vou ter o que quiser. Vou viajar, vou conhecer todos os países do mundo, vou me hospedar em hotéis cinco estrelas, vou ser feliz em tempo integral. E ainda vou posar pra fotos belíssimas que vão aparecer nas maiores revistas do mundo... Pra isso basta apenas me costurar. Me costuro num mês, no outro estou casada.

LIA Que história é essa de se costurar?

A. CLARA Ficar virgem outra vez, ué. (PERPLEXIDADE FLAGRANTEDAS OUTRAS DUAS). Ué! Que é que tem? Meu noivo queruma moça virgem, que é que eu vou fazer? Se ele quer, vaiter.

LIA e LORENA, que não param de se entreolhar, começam a rir.

LORENA Ana Clara, que absurdo!

A. CLARA Novinha em folha para o casamento. Igual à VirgemMaria.

Todas riem.

LIA Você não fica com pena de enganar o homem?

A. CLARA Ele quer ser enganado. Todo homem quer ser enganado.

LORENA e LIA se entreolham. ANA CLARA não gosta muito.

LIA (CONCILIATÓRIA) Talvez seja verdade mesmo.

ANA CLARA (P/LIA) Você disse outro dia que casamento não era meio de vida, não foi? (SILÊNCIO. ESSE

Meninas3.2 SILÊNCIO IRRITA ANA CLARA) Não foi, Lia?

LIA Foi. Eu disse.

ANA CLARA Lorena também acha isso, não acha?

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LORENA (QUERENDO DESVIAR) Eu nem sei mais o que é que eu acho.

ANA CLARA Pode dizer o que pensa, Lorena. Eu não vou meofender não.

LORENA Eu estou falando sério. Eu não sei mais o que é que eu acho.

ANA CLARA Mas acha que casamento por interesse não pode dar certo.

LORENA Bom, isso eu acho.

ANA CLARA Mas pode dar certo sim. Se a mulher for esperta,pode.

LORENA (CONCILIADORA) E você é esperta, Ana Clara?

ANA CLARA Não sou, mas posso ser. Tudo é possível. Depende da cabeça que a gente tem. Tem mulher que é prostituta e se dá bem na vida.

LIA Mas não é pra qualquer uma. Tem prostituta feliz, eu sei, mas tem prostituta desgraçada que tem horror ao que faz. Entrar em qualquer uma não é pra todo mundo.

ANA CLARA Eu posso entrar em qualquer uma. É só eu querer. É tudo uma questão de cabeça.

LIA (QUASE SEM QUERER) Então por que é que você vive tomando... (ENGOLE O QUE IA DIZER).

ANA CLARA Tomo o quê? (OLHA PARA AS DUAS, QUE FICAM EM SILÊNCIO) O que é que eu vivo

tomando?...Diz.

Meninas3.2 LIA Droga.

Um silêncio. ANA CLARA olha para as duas, alternadamente. As duas evitam olhá-la.

ANA CLARA Eu não gostei de você ter dito isso.

LIA Desculpe, Ana. Eu não devia ter dito.

ANA CLARA Mas disse.

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LIA (NO IMPULSO, TENTANDO CORRIGIR) Eu só estava querendo ajudar. Eu...

ANA CLARA Eu não preciso da ajuda de vocês. Vocês não têmcondição de ajudar ninguém, né?Olha como é que vocês vivem. (P/LIA) Você é quase uma marginal, Lia, desculpe dizer. Pode até acabar na cadeia... Você, Lorena, nasceu em berço de ouro. Não precisa fazer força pra viver. Vive sonhando com um homem casado, como se fosse a Bela Adormecida.(PÁRA, FICA CONFUSA, OLHA PARA AS DUAS) Vocês duas têm é preconceito, eu sei muito bem. Eu vejo isso toda hora. Quem são vocês para terpreconceito comigo?

Levanta-se, sai da banheira, pega um roupão, que veste apressadamente, preparando-se para sair. LORENA ergue-se, tenta consertar.

LORENA (CONCILIADORA) Você tem razão, Ana Clara.

ANA CLARA Eu não tenho razão droga nenhuma. Nem quero ter. Mas vocês também não têm. Ninguém tem razão.

Sai, rápida. LORENA e LIA ficam tontas, sem ação. Entreolham-se.

LIA A culpa foi minha.

LORENA faz um movimento para sair.

LORENA Eu dou um jeito nisso. Deixa que eu falo com ela.

Meninas3.2 LIA Eu vou com você.

As duas saem do banheiro. Na televisão, um cinejornal, que mostra noticia sobre o seqüestro do embaixador, tipo “posição oficial do governo”._________________________________________________________________________

SEQ 52 QUARTO DE ANA CLARA INT / DIA (ANOITECER) As Meninas Fazem as Pazes 15”

ANA CLARA deitada de lado, olhos fechados. LORENA aproxima-se, devagar, olhar amistoso, compreensivo. LIA vem mais atrás. LORENA ajoelha-se e toca os cabelos de ANA CLARA.

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LORENA Ana Clara.

ANA CLARA Hum?

LORENA Vamos voltar pra lá.

ANA CLARA ergue um braço e toca com a mão no braço de LORENA. LIA agacha-se ao lado de LORENA e, por sua vez, toca e acaricia o braço de ANA CLARA. Esta toca o braço de LIA, em retribuição._________________________________________________________________

SEQ 53 CAPELA DO PENSIONATO INT / NOITE Bula Rezando 2 04”

IRMÃ BULA está ajoelhada. Reza. Levanta-se, faz o sinal da cruz, vai saindo da capela._________________________________________________________________

SEQ 54 PENSIONATO / JARDIM EXT / NOITE Bula Passa 04”

IRMÃ BULA sai da capela e caminha pelo pátio. Ela olha para o alto e vê a lua. Ouve música que vem do quarto de LORENA. Caminha naquela direção._________________________________________________________________

Meninas3.2 SEQ 55 VARANDA DOS QUARTOS EXT/NOITE

Bula Inspeciona as Meninas 1 06”

IRMÃ BULA aproxima-se do quarto de LORENA. Vai passar direto. Quer apenas dar uma olhada. Ouvimos a música. Ela pára em frente à porta entreaberta. Olha. _________________________________________________________________

SEQ 56 QUARTO DE LORENA INT/NOITE Lorena & Poesia

LORENA, no seu canto de estudo, copia algo de um livro para um caderno.

LORENA (OFF) Aproveitar o tempo!Ah, deixem-me não aproveitar nada!Nem tempo, nem ser, nem memorias de tempo ou de ser!...

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SEQ 57 VARANDA DOS QUARTOS EXT/NOITE Bula Inspeciona as Meninas 2

IRMÃ BULA caminha da porta do quarto de LORENA em direção aos quartos das outras meninas.

LORENA (OFF, CONTINUANDO)Deixem-me ser uma folha de árvore, titilada por brisas,

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SEQ 58 QUARTO DE LIA INT/NOITE O Clipping do Sequestro

LIA, ao lado da porta, arrumando uma coleção de recortes de jornal sobre o sequestro do embaixador.

LORENA (OFF, CONTINUANDO)A poeira de uma estrada, involuntária e sozinha,O vinco deixado na estrada pelas rodas enquanto não vêm/

/outras,_________________________________________________________________

Meninas3.2 SEQ 59 QUARTO DE ANA CLARA INT / NOITE

Pó e Lágrimas 08”

ANA CLARA soluça baixinho na escuridão. Na mesinha de cabeceira, um pedaço de papel aberto. É um laudo de laboratório: TESTE DE GRAVIDEZ : POSITIVO. Ao lado, o vidrinho de cocaína aberto, resíduos de uma dose cheirada.

LORENA (OFF, CONTINUANDO)O pião do garoto , que vai aparar,E oscila, no mesmo movimento que o da Terra,E estremece no mesmo movimento que o da alma,

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SEQ 60 QUARTO DE LORENA INT/NOITE A Ampulheta

Detalhe da ampulheta de LORENA, com sua areia que escorre.

LORENA (OFF, CONTINUANDO)E cai, como caem os deuses, no chão do Destino.Fernando Pessoa.

A imagem escurece lentamente.

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SEQ 61 RUA E PRÉDIO EXT / DIA Lorena Espiona 1 12”

LORENA pára o carro. Lá adiante, o prédio de onde costuma sair o Dr.Nemesius (SEQ 43). Ela vai até o jornaleiro, compra uma revista. Coloca-se em ponto estratégico, meio oculta, como se esperasse alguém aparecer. Gente entra e sai do prédio._________________________________________________________________

SEQ 62 BARZINHO EXT / DIA Ana Clara Chega no Bar 15”

ANA CLARA chega ao barzinho da SEQ.44. MAX a espera em uma das mesinhas. Barulho de trânsito. MAX a recebe com um beijo. Ela se senta.

Meninas3.2 MAX Quer beber alguma coisa, Coelha?

A. CLARA Hum-hum.

MAX a examina, não gostando do seu clima desligado, um tanto insatisfeito.

MAX Tá chateada?

A. CLARA (MEIO DESAGRADÁVEL) Claro que não, Max. Por que é que eu estaria chateada, pombas?

MAX Tudo bem, tudo bem... Vai querer o quê?

A. CLARA Pode ser um chope.

MAX sacode a mão para um garçom que não vemos.

MAX Garçom!

A.CLARA Pede um stainhegger também._________________________________________________________________

SEQ 63 RUA E PRÉDIO EXT / DIA Lorena Espiona 2 14”

LORENA ainda observa o prédio onde provavelmente Dr.Nemesius trabalha. De súbito ela vê a MULHER do DR.NEMESIUS. A MULHER anda, entra no prédio. LORENA fica meio inquieta, meio perturbada. Mas não sai de onde está. Aguarda.

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SEQ 64 BARZINHO EXT / DIA O Presente de Max 70”

(Cont. de 58) ANA CLARA e MAX continuam no barzinho. Há dois copos de chope em cima da mesa e varias “bolachas”. MAX olha fixamente para ANA CLARA, que toma um pequeno gole do terceiro stainhegger e derrama o resto todo no chope. Parece ausente. Aquilo irrita MAX.

MAX Que é que há com você? Por que é que você está assim?

A. CLARA Nada.

Meninas3.2 MAX Como, nada? Tem que ter alguma coisa. Você muda de

repente, ninguém sabe porque. Outro dia de tarde estavahorrível. De noite ficou um amor de pessoa. Agora está horrível novamente. Tá chateada comigo?

A. CLARA Não, Max. Eu gosto da sua companhia. Você é bonzinho.

MAX Bonzinho é o cacete. Eu não quero ser bonzinho, eu não soubonzinho. Quero saber o que está acontecendo com você.

A. CLARA Eu quero me casar com o Escamoso. (T) Eu vou me casarcom o Escamoso.

MAX Pelo amor de Deus, Ana Clara! Não fica chateada comigo,mas... esse escamoso não existe. Eu não acredito na existência desse personagem.

A. CLARA (COM ÓDIO) Ele existe sim. E eu vou me casar com ele.

MAX (DESCONTROLA-SE, MAS MANTENDO CERTA CALMA)Então vai. Vai agora logo de uma vez. Vai embora. (UM SILÊNCIO) Não ouviu o que eu disse? Vai embora daqui. Eunão quero mais saber de você. Some daqui. Cai fora!

ANA CLARA levanta-se, vagarosa. MAX, sentado, controla sua crise. Mete a mão no bolso, retira dois papelotes, joga em cima da mesa.

MAX Toma. Pode levar. Eu trouxe pra você.

ANA CLARA assusta-se, pois há gente por perto. Ela pega os papelotes rapidamente, procurando ocultá-los, e os coloca na bolsa. De lá retira dinheiro.

MAX Não precisa pagar não. É um presente meu pra você.

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Ela põe o dinheiro em cima da mesa. Gira para ir embora. Max muda completamente.

MAX Desculpe, Coelha.

A. CLARA Não foi nada, Max. A culpa foi minha.

Ela vai andando. Max a olha, angustiado. Quer chamá-la, mas não sabe se deve.

MAX (SEM CONVICÇÃO) Ana Clara!M eninas3.2 Desiste. Ela vai andando até desaparecer._________________________________________________________________

SEQ 65 RUA E PRÉDIO EXT/DIA Lorena Cruza com Dr.Nemesius 60”

(Cont. de 59) LORENA no mesmo lugar, observando a entrada do prédio. DR.NEMESIUS aparece. Está em companhia da MULHER. Os dois caminham,. Dirigem-se a um carro. Ele vai abrir a porta do carro, enquanto a MULHER encaminha-se para o outro lado.

LORENA toma coragem e avança. Pela sua disposição, vemos que está decidida a falar com ele ali mesmo e resolver tudo.

Ela vai se aproximando. DR.NEMESIUS a vê e fica sem ação, a mão suspensa segurando a chave do carro. Ela avança. Ele aguarda. A MULHER dele parece perceber que algo está para acontecer.

LORENA avança mais, chega bem perto dele, mas não pára. Vai passando. O DR.NEMESIUS engole em seco. Parece sentir que escapou de uma situação difícil. A MULHER dele o observa, desconfiada. LORENA vai seguindo, ficando cada vez mais distante._________________________________________________________________

SEQ 66 MUSEU EXT/DIA Passagem para Argélia 60”

LIA entra em campo, caminhando para um lado e para o outro, esperando. Chega BUGRE, o rapaz que vimos na SEQ.45. Pára ao lado de LIA.

BUGRE Lia.

LIA Oi, Bugre.

BUGRE Tenho boas notícias pra você.

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LIA Boa notícia pra mim? Fala.

BUGRE Miguel está na lista dos que vão ser trocados.

LIA Na lista? Miguel está na lista?Meninas3.2

BUGRE Seu namorado vai embarcar. Argélia. Queria estar no lugar dele... A notícia sai amanhã.

LIA Argélia... Argélia... Demais, Bugre, demais. Não sei explicar, mas estou atordoada.

BUGRE A organização já deixou instruções para mim e pra você. Toma. É o teu passaporte. E a passagem . Você vai viajar amanhã, junto com um pessoal aí. E bôca de siri. Nada de comentários sobre o Miguel, hum? A lista é segredo de estado.

LIA (SONHANDO) Eu na Argélia... Com Miguel... A gente vai ficar juntos? Ô, Bugre. Você me turbilhonou completamente. Estava com pensamentos horríveis, sei lá. Tenho que arrumar um dinheiro. Perdão, oriehnid! Mas como foi isso, como foi?

BUGRE É longo, Lia. Fica por enquanto com a boa notícia, depois agente conversa. Vocês vão levar uma vida dura.

LIA Eu sei. Eu sei.

BUGRE A gente precisa de um carro pra levar o pessoal. Você pode arranjar aquêle carro outra vez? Vê se arranja algumas roupas também. O que você puder.

LIA Claro. Nossa amiga Lorena sempre apoiará a revolução! BUGRE Tá, Lia. Vô nessa.

BUGRE se afasta. LIA fica sozinha.

LIA (QUASE RINDO) Argélia!

Reação de alguem que estranha LIA falando sozinha._________________________________________________________________

SEQ 67 RUA : FRENTE DO BARZINHO EXT / DIA(TARDE) Encontro com Valdomiro 25”

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ANA CLARA tenta pegar um taxi numa esquina. Tráfego intenso, ruídos de hora do rush. Ela localiza um taxi que parou e corre para ele, agitada, impaciente. Outra pessoa entra. O carro arranca.

ANA CLARA Cretino! Filho da puta!

Faz um movimento para voltar à calçada, mas é interpelada pelo motorista de umMercedes. Homem de uns 50 anos, aparência razoável, pinta de cafajeste. É VALDOMIRO.

VALDOMIRO Ei, moça! Quer uma carona? Estou indo pra lá.

Ela faz rápida avaliação da situação e avança para o carro. O homem abre a porta, ela entra._________________________________________________________________

SEQ 68 M eninas3.2 RUAS:CARRO DE VALDOMIRO EXT/INT/DIA(ANOITECER)

São Paulo by Night 90”

O carro avança. VALDOMIRO dirige. ANA CLARA ao lado. O carro passa pelas ruas de São Paulo, vêem-se monumentos e prédios característicos.

ANA CLARA Estou há meia hora nessa esquina sem conseguir condução. Um inferno

VALDOMIRO Mas já são mais de seis horas, minha filha.

ANA CLARA (MÃOS NA CABEÇA) Ai meu Deus, que dor de cabeça. O senhor por acaso tem uma aspirina? E pode me arranjar um cigarro também?

VALDOMIRO Tem tudo aí no porta-luva. Pode pegar. Só não tenho água. (RISINHO) Mas tenho uísque...

Ela abre o porta-luva, pega o envelope de aspirina, rasga-o. Põe uma aspirina naboca, tenta engoli-la. A aspirina arranha a garganta e ANA CLARA toma um gole de uisque para ajudar. Pega também um cigarro. O homem a observa, achando-a estranha e vendo a possibilidade de ter um bom programa para aquela noite.

VALDOMIRO Conseguiu engolir?

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ANA CLARA Eu estava numa festa quando me avisaram. Tenho medo de que seja muito tarde, nem sei se ele está vivo.

VALDOMIRO Ele quem, minha filha?

ANA CLARA Meu pai. Ele teve um enfarte no escritório.

VALDOMIRO É o primeiro que ele sofre?

ANA CLARA Acho que é o segundo. O primeiro foi quando minha irmã foi presa. Ela é terrorista. Até hoje ninguém sabe se está viva ou não. Sumiu.

VALDOMIRO Olha, eu não sou médico, sou industrial. Mas sepuder ajudar, disponha.

ANA CLARA Onde é que o senhor mora?

VALDOMIRO Bem, eu estou morando praticamente na minha chácara. (INSINUANTE) Mas tenho umapartamentinho na São Luís...

ANA CLARA Sua industria é de que?

VALDOMIRO Frigoríficos. O escritório do seu pai é no centro?

ANA CLARA É um andar inteiro. Meu pai é um grandeadvogado. Francisco de Paula Vaz Leme.

VALDOMIRO Acho que já ouvi falar. Bom, eu me chamo Valdomiro. E você?

ANA CLARA Lorena. Lorena Vaz Leme._________________________________________________________________

SEQ 69 QUARTO DE LORENA INT/NOITE Lorena só com as Cartas 40”

LORENA entra no quarto. Está vindo da rua, cansada, meio excitada. Acende a luz. Está séria, mas não triste. Parece ter passado por experiência dolorosa e decisiva.

M eninas3.2 Anda. Olha a fotografia do DR.NEMESIUS com sua família. Aproxima-se. Olha mais de perto. Tem uma expressão de desilusão, mas também de alguém que, com um problema, tem vontade de superá-lo. Move-se. Coloca um disco. Ouve-semúsica popular brasileira.

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LORENA junta as cartas do DR.NEMESIUS. Algumas ao lado do retrato dele. Outras, numa gaveta. Ela faz um montinho com as cartas e o coloca ao lado da foto. Senta-se e fica olhando o conjunto formado pela foto e pelas cartas. Acende um cigarro. Parece refletir intensamente. A música prossegue. O conjunto carta-fotos parece adquirir uma forma intensa aos olhos de LORENA._________________________________________________________________

SEQ 70 APTO. DE VALDOMIRO INT/NOITE Chegam na Garçoniére 90”

VALDOMIRO fecha a porta e dá passagem a ANA CLARA, que entra. Ele a segue e fecha a porta. Estão numa sala bem mobiliada.

VALDOMIRO É esse o apartamento. Não é nenhum palácio, mas também não é de se desprezar. Meu uísque é de primeira. A gente pode beber e ouvir um pouco de tango. Tenho uma coleção de Gardel, sou apaixonado por Gardel.

Serve duas doses de uísque e dá uma delas a ANA CLARA, que bebe rapidamente. Ela olha as coisas, movimenta-se devagar. O homem a observa obsessivamente.

VALDOMIRO Meu Deus! Você é linda mesmo! Parece uma deusa.

Avança, abraça-a. Ela sente-se incomodada, procura safar-se.

VALDOMIRO Que foi, minha deusa? Que é que aconteceu?

Ela se afasta, meio trôpega, tropeça e cai. Ele a socorre.

VALDOMIRO Opa! Calma, calma. Não foi nada. Foi só o susto. Tem que ter cuidado, boneca. Você pode quebrar uma perna. Se machucou?

ANA CLARA Não foi nada. Eu estou bem.

M eninas3.2 Sentada no chão, ela abraça as pernas, encosta a testa nos joelhos.

VALDOMIRO Está chorando, minha bela? Hum? Está sentindodor?

ANA CLARA Meu nome é Lorena. Lorena Vaz Leme.

VALDOMIRO Pra mim é Bela. Só isso: Bela. Só vou te chamar de Bela. Vem levanta. Segura em mim. Torceu o

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pèzinho? Se torceu, eu faço uma massagem. Já fui massagista. Massagista, corretor, radialista, cronista esportivo, tudo. Já fui tudo. Vem. Senta aqui no sofá.

ANA CLARA, lânguida, parece fora do ar.

ANA CLARA Minha família! Minha família!

Ele a recosta no sofá. Esticada, suas pernas aparecem.

VALDOMIRO Que físico, Bela! Que físico! Essas pernas... Nãoquero que tire as meias nem os sapatos. Tenhopaixão por meias, assim, bem compridas. Essas vão até lá em cima? Hum? Vão sim. Vão até lá em cima.

ANA CLARA Meu gato sumiu.

VALDOMIRO Deixa o gato. Eu te arranjo outro. Quer mais umuísque?

ANA CLARA Tenho que ir embora. Que horas são?

VALDOMIRO Que é isso, Bela? Ainda é cedo. A noite é umacriança.

Ele começa a beijá-la em várias partes do corpo. Ela se contorce um pouco, olhando para longe.

ANA CLARA Meu gato! Meu gato sumiu!_________________________________________________________________

M eninas3.2 SEQ 71 QUARTO DE LORENA INT/NOITE Vou pra Argélia 95”O rádio ligado. Ouve-se música. A pilha de cartas ao lado do retrato do Dr.Nemesius. LORENA no sofá, dormindo sentada. Barulho na porta. LIA entra.

LIA (BAIXO) Lorena.

LORENA (ACORDA) Lia.

LIA Tenho boas notícias, Lorena.

LORENA Que foi que houve?

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LIA Vou viajar pra Argélia, desembarco em Casablanca, e não me peça mais detalhes. Vou pra Argélia, Lena!

LORENA Argélia? Ai, meu Pai! Mas que coisa maravilhosa, Lião.

Vamos ver já no mapa.

LORENA pega o mapa e abre sobre o tapete.

LORENA Está aqui. Alger. Vizinha da Tunísia, está vendo?

LIA senta no chão, se aproximando de LORENA.

LIA O problema é o seguinte: Oriehnid, entende? Você podeme emprestar algum?

LORENA Mas é lógico, Lião. (PREENCHE UM CHEQUE E ENTREGA)Ai, Lia. Eu não consigo entender isso. Parece um pesadelo.Argélia? Que que você vai fazer na Argélia?

LIA Escuta, Lorena. Agora não dá pra te explicar nada. (P)(OLHA SÉRIA PARA LORENA) Você tá cansada de saber porque eu vou pra Argélia.(P) Eu preciso de uma outra coisa sua. Preciso do carro pra transportar o pessoal amanhã. E ainda tenho que trocar isso (MOSTRA CHEQUE).

LORENA (SÉRIA) O carro eu já trouxe. Tá aí fora.

LIA Eu também precisava de umas roupas. Roupas usadas.Você podia me arranjar algumas?

LORENA Claro! Eu telefono pra mamãe, ela separa... Me dá dinheiroMeninas3.2 LORENA (Cont.) vivo...E resolve tudo.

LIA Isso. Depois a gente pega o carro e vai pra lá.

LORENA e LIA ameaçam sair do quarto para telefonar do prédio principal do Pensionato. LORENA pára no meio do caminho. Pensa melhor.

LORENA Acho melhor eu ir sozinha, Lia. Você deve ficar aqui paranão se expor.

LIA Não, não. Eu vou com você. Não agüento ficar sozinha aqui dentro, agora. (AO FALAR, LIA DÁ COM A PILHA DE CARTAS). (T) O que é isso aqui?

LORENA Estou fazendo uma arrumação mental. Acho que de agoraem diante vai ser diferente.

LORENA e LIA saem.

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SEQ 72 APTO. DE VALDOMIRO INT/NOITE Lendo Valentino 40”

(Cont. de 66) ANA CLARA deitada no sofá, pernas à mostra. Abandonada, distante. Ouve-se tango de Gardel, de quem VALDOMIRO pôs um disco na vitrola. Ele está de cuecas. Pega um livro e acerca-se de ANA CLARA.

VALDOMIRO Ah, está aqui. (PEGA O LIVRO... VEM PARA ANACLARA) Quero que você fique bem quietinha, assim mesmo como está, de roupa e tudo. Vou ler uma coisa pra você. Está confortável, minha Bela?

ANA CLARA (FIO DE VOZ) Estou.

VALDOMIRO (FOLHEIA O LIVRO, ACHA) Vamos ver... Aqui... (LÊ) “Ninguém contestará que Rodolfo Valentino foi o maior conquistador de nosso tempo alucinante... Conquistou o coração de todas as mulheres que o viram na tela... E, mal o viram, experimentaram esse delíquio de platonismo amoroso que é, segundo os fisiologistas, a forma sutil de paixão mais temível.”

Enquanto VALDOMIRO delira, ANA CLARA, discretamente, joga um papelote de cocaína dentro do uisque e toma de um gole só.Meninas3.2

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SEQ 73 PENSIONATO / JARDIM EXT/NOITE Lia/Lorena Despistam Madre 25”

LORENA e LIA saem da Secretaria e avançam pelo pátio. Rápidas. O carro está perto do portão, do lado de fora do Pensionato. LORENA faz uma rápida verificação de suas roupas.

LORENA Estou decente?

LIA Claro que está.

LORENA Eu nem devia perguntar, né?

Assustam-se com voz feminina que sai do escuro.

MADRE ALIX (INQUISIDORA) Tudo bem, meninas?

LORENA Madre Alix! Que susto a senhora me deu!

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MADRE ALIX Estão com algum problema?

LORENA Não, não. Vamos na casa de mamãe.

MADRE ALIX Mas a essa hora, Lorena? Não acha um pouco tarde?

LORENA Foi culpa minha, Madre. Marquei com ela e meatrasei. A gente volta logo.

MADRE ALIX Não voltem muito tarde. Dê lembranças a sua mãe.

LORENA Boa noite, Madre.

MADRE ALIX Boa noite, Lorena.

LIA Boa noite, Madre. Sua benção.

MADRE ALIX Deus te abençoe, Lia. Boa noite.

LORENA e LIA afastam-se.Meninas3.2

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SEQ 74 PERTO DO PENSIONATO EXT / NOITE Lia/Lorena Saem de Carro 10”

LORENA e LIA chegam ao carro de Lorena. Vão abrir portas, entrar, etc.

LORENA Ela ficou lá atrás olhando?

LIA Já sumiu.

LORENA Madre Alix é boa pessoa. Só não tem cabeça pra entender gente como nós.

LIA Será que não?...

O carro parte, avança na noite._________________________________________________________________

SEQ 75 APTO. DE VALDOMIRO INT / NOITE Valdomiro Dorme 30”

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(Cont. de 68) Mesma situação. ANA CLARA deitada no sofá. Gardel na vitrola. VALDOMIRO lendo para ANA.

VALDOMIRO pára, dando sinais de exaustão emocional. Deixa cair o livro, morde uma almofada com força. Depois tem um tremor forte e deixa a cabeça tombar, enfiando a cara na almofada. Só então ANA CLARA move a cabeça e olha para ele. Um olhar inexpressivo, neutro.

O disco de Gardel chega ao fim, mas não pára de girar. ANA CLARA levanta-se, anda, vai até lá e desliga a vitrola. Dá um passo. Vê sua cara no espelho. Olha-se demoradamente, como tentando reconhecer aquele rosto que vê refletido._________________________________________________________________

SEQ 76 RUA / CARRO DE LORENA EXT / NOITE Polícia no Sinal 40”

Os faróis avançam, brilhando na escuridão. Rua deserta. LORENA ao volante, LIA ao lado.Meninas3.2

LORENA Quanto tempo você acha que fica na Argélia?

LIA Até o fim da ditadura, eu acho. Mas quantotempo isso vai durar? Quatro anos? Oito? Vinte anos?

LORENA A situação pode melhorar mesmo com a ditadura. Aí vocêvolta.

LIA Nada vai melhorar com a ditadura, Lena. Tem uma porção

de perguntas que ficam me perseguindo. O que é que a gente vai fazer na Argélia? Será que vou me adaptar?...

Há um sinal vermelho na frente. O carro pára. Não há outros carros. Não há ninguém.

LORENA Maldito sinal! Sempre muda na hora errada.

Um carro de polícia desliza silenciosamente e pára ao lado.

LORENA Há um carro da polícia do seu lado.

LIA (SEM OLHAR) Não olha não. Se a gente olhar, Kaput!entende? Não vai acontecer nada, não.

O sinal muda para verde. O carro da polícia parte na frente.

LORENA Putsgrila, Lião! Eu pensei que eles fossem nos abordar.

LIA Já acabou. Vãobora.

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O carro parte, devagar._________________________________________________________________

SEQ 77 APTO. DE VALDOMIRO INT / NOITE Telefonema para Max 05”

ANA CLARA discando no telefone. Dá uma olhada. VALDOMIRO deitado de bruços ao lado do sofá, a cara enfiada na almofada.

ANA CLARA (TEL) Alô. Max?_________________________________________________________________

M ENINAS3.2 SEQ 78 CASA DA MÃE DE LORENA INT/NOITE O FAMOSO MIEUX 35”

O empregado abre a porta. Entram LORENA e LIA.

EMPREGADO Boa noite, dona Lorena.

LORENA Mamãe está?

EMPREGADO Está no quarto esperando pela senhora.

LORENA Mieux está aí?

A pergunta fica sem resposta, pois ela logo avista Mieux, lá adiante. Ele veste um robe e mantém postura elegante.

MIEUX Boa noite, .

LORENA Tudo bem, Mieux? (P/ LIA) Vamos, Lia?

LORENA e LIA avançam rápido. Passam por Mieux, cuja presença deixa LORENA meio irritada. Começam a subir uma escada.

LORENA (BAIXO) Esse é o famoso Mieux, o homem que inferniza minha mãe.

LIA Ele se chama Mieux, mesmo?

LORENA É uma piada. Uma vez, falando de mamãe, ele disse a seguinte grossura: “Faute de Mieux on couche avec sa femme”. Ele usa esse “faute demieux” pra tudo.

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LIA (COMO SE ESFORÇANDO UM POUCO PARATRADUZIR) “Na falta de coisa melhor, a gente dorme com a própria mulher”. É, é demais...Acho melhor eu não entrar lá com você, não.

LORENA Entra, sim. Senão mamãe vai ficar falando deMieux o tempo todo.

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SEQ 79 QUARTO DA MÃE DE LORENA INT/NOITE TENHO 50 ANOS 130”

M ENINAS3.2 LORENA entra no quarto, LIA logo atrás. LORENA irá conversar com a mãe ao lado da cama, enquanto LIA permanecerá distante, de pé, quase imóvel. A mãe está na cama. Exibe um estado de infelicidade lamentável. Comporta-se como se estivesse muito doente.

MÃE Oh, Lorena. Pensei que não viesse mais. Você demorou tanto. (AVISTA LIA) Oi, Lia. Como vai você?

LIA Bem, obrigada. A senhora está bem?

MÃE Eu nunca estou bem, minha filha. Já se foi o tempo que eu me sentia bem, que eu tinha saúde. (ESTENDE OS BRAÇOS, PEGA A MÃO DE LORENA, ATRAI A FILHA PARA SI. AS DUAS SE BEIJAM). Ô, minha filha, que saudade. Foi bom você ter vindo.

LORENA Mamãe, eu estou com muita pressa, não posso demorar. Já está tudo separado? O dinheiro e as roupas?

A mãe a atrai, puxando-a pela mão, para muito perto de si. Procura falar baixo, como se quisesse fazer uma confidência, mas não consegue falar muito baixo. LIA, à distância, consegue ouvir o que as duas dizem.

MÃE Ele está aí, Lorena.

LORENA Quem, mamãe?

MÃE Mieux.

LORENA Eu vi ele lá embaixo.

MÃE Eu não agüento mais a presença dele aqui dentro, Lorena. Ele está me enlouquecendo.

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LORENA Manda ele embora.

MÃE Não é isso, minha filha. Eu não quero que ele vá embora.

LORENA Mamãe, por favor. Não vamos falar nisso agora. Tem gente aí.

Meninas3.2 MÃE Ele me deu o golpe do baú, Lorena. Eu não me

conformo com isso.

LORENA Se livra dele, mãe. .A mãe aperta o braço de LORENA, como se tivesse receio de que ela escapasse. LORENA quer se livrar daquilo, mas procura não ser rude.

MÃE Não é tão fácil assim.

LORENA (IMPACIENTE) Mamãe, olhe-se no espelho. Mas olhe-secom coragem e diga "eu tenho cinquenta anos, não posso me submeter a uma situação dessas". É só isso. Manda esse homem embora.

A mãe olha para LORENA com estupor. Parece ter ouvido algo indizível.

MÃE (PERPLEXA, TEATRAL) Lorena! Você teve a coragem de me dizer isso...Cinquenta anos.

LORENA (MEIO FEROZ) Solta meu braço, mamãe. Você já está me machucando.

A mãe obedece e sente-se terrivelmente ofendida.

MÃE Eu machucando você? Como pode me dizer isso?

LORENA Mamãe, eu e Lia estamos numa situação difícil. Onde está o dinheiro e onde estão as roupas? A gente precisa disso pra já. Agora.

MÃE (MESMA ATITUDE, PERPLEXA) Na gaveta da penteadeira.

LORENA vai à penteadeira, pega o dinheiro numa gaveta. A mãe olha para LIA, desamparada, tentando conseguir um aliado.

MÃE Às vezes ela é rude comigo, Lia...Ela não faz força para me compreender...Eu sei que para um jovem é muito difícil. Mas eu também fui jovem. Eu vivi muitas experiências. Eu sei como são as coisas.

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LORENA E as roupas, mamãe? Onde estão?

Meninas3.2 MÃE Essas malas aí do lado.

Há duas malas ao lado da penteadeira. LORENA move-se para pegá-las.

LORENA Me ajuda aqui, Lia. Eu levo uma, você leva a outra.

LIA avança, rápido, e vai pegar uma das malas. LORENA pega a outra.

MÃE Eu acho que você poderia me compreender, Lia. Se eu pudesse conversar com você com mais calma. Você é uma moça inteligente. Lorena me contou muitas coisas sobre você.

LORENA Estamos saindo, mamãe. Amanhã eu volto.As duas moças caminham para a porta, quando esta se abre aparece MIEUX. Posudo, calmo, canastrão.

MÃE Ô, Mieux. Você está aí? Vem cá. Vem conversar comigo. Estou precisando de você.

MIEUX avança devagar em direção à cama. LORENA e LIA param para olhar. MIEUX chega ao lado da cama. A MÃE o pega pela mão, mas ele permanece ereto, distante.

MÃE Estou tão sozinha aqui, Mieux. Não sei por que você fica tanto tempo lá fora e me deixa aqui sozinha. Fica comigo Mieux. Eu estou doente.

LORENA (P/ LIA) Vamos embora, Lia.

As duas saem. A mãe continua agarrada à mão de Mieux.

MÃE Senta um pouquinho, senta Você fica sempre assim, tão distante de mim. Senta aqui, Mieux. Não fica assim. Parece um mordomo.

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SEQ 80 RUA / CARRO EXT/NOITE DESABAFO DE LORENA 60”

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LORENA e LIA aproximam-se do carro estacionado em lugar escuro. Colocam as malas lá dentro. Entram. Fecham as portas.

LORENA curva-se sobre o volante, metendo a cabeça entre as mãos. Seu corpo é estremecido por um movimento brusco. LIA coloca as mãos em suas costas.

LIA Lorena. .

LORENA ergue a cabeça. Teve ligeiro acesso de riso histérico, mas contido.

LORENA Eu não estou chorando, . Estou rindo. Mas é difícil rir de uma situação dessas. (PAUSA) Ela é minha mãe, pombas! Eu queria rir disso tudo, mas não posso. É difícil...você compreende?

LIA Claro.

LORENA O mundo em crise...uma ditadura massacrando as pessoas...você fugindo pra Argélia...Pode ser presa de

repente, pode ser morta...E essa mulher absurda deitada naquela cama sofrendo por um cafajeste.

LORENA se recupera, liga o motor, vai dando partida no carro.

LIA (SEM SABER O QUE DIZER) Um dia essas coisas vão mudar.

LORENA Não! Não vão mudar, não! Vai ser difícil mudar alguma coisa... Olha o meu caso. Estou indo pelo mesmo caminho de minha mãe. Talvez pior do que ela. Eu, com aquele retrato em cima da mesinha de cabeceira, virgem, sonhando com um homem que...Eu...Você acha que eu posso mudar, Lia?

LIA Eu tenho certeza de que você vai mudar.

Olham-se nos olhos durante um tempo. Ouvimos apenas o motor do carro. LIA ergue o braço e acaricia o rosto de LORENA. Depois o beija. Olham-se um pouco mais. LORENA sorri. LIA também. O carro parte._________________________________________________________________

SEQ 81 PRAÇA / CARRO EXT/NOITE PICO NA VEIA 25”

M ENINAS3.2 ANA CLARA caminha pela praça escura. Um carro. A porta é aberta e MAX a recebe.

MAX Olá, coelha.

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Ela entra, aflita.

ANA CLARA (TRINCADA) Você trouxe, Max?

MAX Trouxe. Tá com pressa?

ANA CLARA Estou.

MAX Que foi que houve?

ANA CLARA Não estou a fim de muita conversa, Max. Cadê?

Ele abre uma bolsa, retira uma seringa hipodérmica e um vidrinho contendo um líquido transparente.

MAX Aqui mesmo?

ANA CLARA Anda. Estou com pressa.

MAX cumpre o ritual dos viciados, facilitando o trabalho de ANA CLARA de “se aplicar”._________________________________________________________________________

SEQ 82 PENSIONATO/JARDIM E SECRETARIA EXT/NOITE Chegam com a Mala 20”

LORENA e LIA caminham pelo jardim na direção dos quartos. Carregam as duas malas. IRMÃ BULA aparece de repente, em trajes de dormir.

IRMÃ BULA Lia, minha filha. Telefonaram para vocêagorinha.

LIA vira-se, abalada pela notícia.

IRMÃ BULA (CONTINUANDO) O rapaz disse que é muitoimportante. Pra você ligar a qualquer hora. Quevocê sabe o número.

Meninas3.2 LORENA Eu te espero no quarto, OK? (SAI COM AS

MALAS).

LIA Mein Gott...

Vai, visivelmente abalada, até o telefone e disca. IRMÃ BULA afasta-se, candidamente reprovando o gesto de LIA._________________________________________________________________

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SEQ 83 QUARTO DE LORENA INT/NOITE ELE VAI SER SOLTO!

80”LORENA delicadamente retira a foto do Dr.NEMESIUS da moldura e a coloca junto à pilha de cartas dele. Vira a ampulheta, retomando o movimento da areia.

LORENA (PARA A FOTO) Tempus Edax Rerum... “O tempo tudo devora...”.

Toma uma pequena dose de vinho do Porto. Olha as malas, recosta-se no sofá e começa a fazer massagem nos pés. LIA entra sem bater, afogueada.

LIA Ah, eu preciso beber alguma coisa!

LORENA (OFERECENDO SEU CÁLICE A LIA) Um porto.

LIA Lena, Lena. Agora já posso falar. Tá confirmado. O Miguel vai pra Argélia também...Ele entrou na lista. Vai ser trocado pelo embaixador.

LORENA Como é? Trocado por um embaixador?

LIA Ô Lorena, se toca! Você não sabe que tem um embaixadorseqüestrado? Que estão negociando a devolução dohomem por uma porção de presos? Você não sabe denada, pombas?

LORENA Sei não, só sei que é melhor para você que o Miguel tá indo e vocês vão se encontrar. Já basta, né?

LIA O último da lista... o último foi o meu Miguel. (CONTROLANDO A EMOÇÃO). Acho que ainda vousentir falta disso aqui, Lorena.

LORENA Só durante alguns dias. Depois vai se acostumar e vai esquecer. E vai dar graças a Deus por estar na Argélia Meninas3.2

com o teu Miguel.

LIA Seria tão bom se fosse assim.

LORENA Vai ser assim. Toma.

Serve outro vinho do porto a LIA, que bebe. Ela também bebe, olhando para a moldura vazia e o retrato do Dr. NEMESIUS com as cartas ao lado.

LIA (APONTANDO A MOLDURA VAZIA). Que é que houve como retrato do M.N.?

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LORENA Hoje eu fui procurar ele.

LIA E o que aconteceu?

LORENA Nada. Eu passei por ele sem falar e fui andando. Ele também me viu e não falou. Estava com a família. Com a mulher e os filhos.

LIA E daí?

LORENA Acho que acabou. Acho que me livrei dele.

LIA Será, Lorena? Seria uma maravilha se você deixasse esse homem pra lá.

Pausa com LORENA levemente ausente. LIA ergue-se. Movimenta-se. Pega as malas.

LIA Bom. Deixa eu arrumar minhas coisas. (SONHADORA) Argélia...Algerie...Alegria...

Ouve-se um baque surdo vindo do exterior do quarto. LORENA assusta-se Com o barulho. LORENA e LIA saem apressadas._________________________________________________________________

SEQ 84 PENSIONATO / VARANDA E ESCADA INT.EXT / NOITE A Volta de Ana Clara 35”

LIA e LORENA encontram ANA CLARA caída na escada. ANA CLARA está umtrapo humano. Respira com dificuldade e tem manchas no braço. Blusa molhada como alguém que lavou o rosto e o colo.

LORENA Ana Clara! Que foi que houve?

LIA Cê tá se sentindo mal?

ANA CLARA (FIO DE VOZ) Não quero mais...

LORENA Calma, querida. (PEGA ANA CLARA COM A AJUDA DE LIA, LEVANTAM-NA COM DIFICULDADE) Se apoia aqui, vem. (VÃO SUBINDO O RESTO DA ESCADA, EM DIREÇÃOAOS QUARTOS).

ANA CLARA Me dá um uisque.

LIA Como é que você agüenta isso?

LORENA Onde você esteve?

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ANA CLARA Numa festa...

LIA Que festa...heim?

LORENA Vão acabar essas curtições, viu, Clarinha? Temque ter juízo.

ANA CLARA Eu não quero ter juízo.

LORENA Vai querer na marra, agora você vai na marra.Madre Alix já cansou, todo mundo já cansou.

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SEQ 85 QUARTO DE LORENA INT/NOITE Morte de Ana Clara 75”

Chegam ao quarto de LORENA. Entram e colocam ANA CLARA recostada numa poltrona ou sofá. Recostada, ela tem uma breve crise de tosse. LIA pega seus pés para melhor acomodá-la.

LIA Seus pé estão duas pedras de gelo. Deixa eu fazer uma massagem.(ESFREGA AS MÃOS AOREDOR DOS PÉS, ATIVANDO A CIRCULAÇÃO.

Meninas3.2 ANA CLARA TOSSE E PIGARREIA.) Calma, Ana,sossega!

LORENA termina de ajeitar a cabeça de ANA CLARA numa almofada.

LORENA Vou fazer um chá forte para você. Bem forte.

ANA CLARA dá uma relaxada aparentando melhora. LIA pega-lhe o braço esquerdo para melhor acomodá-lo contra o seu corpo. Vê marcas de picada e sente uma forte rejeição.

LIA (PARA LORENA) Tá com o braço cheia de marcasde picada. Não foi uma só não.

LORENA O chá vai reanimá-la. Vai passar.

ANA CLARA (ACORDANDO)O Max! O Max sumiu...Cadê o Max?

LORENA Calma, Clarinha. Não tem Max nenhum aqui. Vai,relaxa. (FAZ-LHE UM CAFUNÉ, MATERNAL.FALA COM LIA) Vai arrumar tua mala que dessa

aqui cuido eu. Vai.

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LIA Claro. Eu vou para a Argélia, Ana Clara. Argélia!E você, vê se te cuida. (DÁ-LHE UM BEIJINHONA TESTA E SAI).

ANA CLARA fica só, LORENA está preparando o chá, ANA CLARA parece dormir. Por instantes reina paz. LORENA chega com o chá e a acorda. ANA CLARA se assusta e num gesto estabanado joga o braço para o alto derrubando o chá e assustando LORENA.

ANA CLARA Mais... eu quero mais! Muito mais Max... Tudo!Todos!! (FALA AOS ARRANCOS) Em dezembrome costuro, em janeiro me caso...

LORENA Calma... Calma.

ANA CLARA (AGARRANDO LORENA PELO PESCOÇO)Tira Lorena. Tira a faca do meu peito. A faca...cravada. Dói. Eu procurei... Eu procurei...

LORENA deixa-se levar pelo gesto de ANA CLARA, pousando sua testa na testa da amiga. Ficam face a face. ANA CLARA arfando com olhos sem foco definido. LORENA, neutra, como quem não estivesse ali.Meninas3.2 Flash rápido do tiro que matou REMO. Só o instante em que o irmão recebeu a bala.

Novo gesto incontido de ANA CLARA derruba a ampulheta que cai e parte-se em duas. Cacos e areia pelo chão. Tempo._________________________________________________________________

SEQ 86 QUARTO DE LIA INT / NOITE Ela Morreu 20”

LIA arrumando pilhas de livros e roupas. A porta se abre abruptamente. LORENA está parada, estranhamente calma.

LORENA Lia, ela morreu.

LIA O quê?

LORENA Ela está morta, Lia. Ana Clara morreu.

LIA refaz-se do susto, anda para a porta.

LIA Não é possível. Você deve ter se enganado.

LORENA Não me enganei, não. Ela está morta, Lia.

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LIA sai. LORENA a acompanha._________________________________________________________________

SEQ 87 QUARTO DE LORENA INT/NOITE

MAQUIANDO A FALECIDA 75”

ANA CLARA deitada, imóvel. Seu rosto irradia tranqüilidade. LIA e LORENA entram. LIA precipita-se para o corpo. Abaixa-se ao lado da cama, pega o braço de ANA CLARA. Movimenta-o. Dobra-o, deixa-o cair repetidas vezes.

LIA Meu Deus! Ela está morta. Ela morreu, .

LORENA Morreu, ...Ela morreu estupidamente...

LIA coloca as mãos no rosto e começa a chorar baixinho. Duas lágrimas escorrem pelo seu rosto.Meninas3.2

LIA Ela não merecia isso, meu Deus! Que coisa cruel!...Como é que vai ser agora, Lorena? Queé que nós vamos fazer? Vamos chamar asfreiras?

LORENA, agora decidida a resolver problemas com objetividade (apesar de estar sofrendo), vai até LIA e, pegando-a pelos ombros, chama a amiga à realidade.

LORENA Não. Isso não. As freiras não merecem isso...Vai ter polícia, jornalista, vai ser um escândalo.

Um silêncio. Elas olham o corpo e se entreolham.

LIA Mas o que que nós vamos fazer com ela?... Como corpo?

LORENA Vamos agir com calma. Vamos contornar essa situação de algum modo.

LIA Como?

LORENA Vamos tirar o corpo daqui.

LIA Mas pra entregar a quem? Ela não tem parente, nada. Aquele noivo nunca existiu, Lorena! Vamos levar pra onde?

LORENA Qualquer lugar. Me ajuda aqui.

LORENA pega a bolsa de . Retira de lá escova de cabelos, cosméticos, etc.

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LIA Que é que você vai fazer?

LORENA Eu quero que ela fique bem bonita. Perfeita. Vem, me ajuda.

LORENA debruça-se sobre o corpo. Tem nas mãos um batom, uma caixinha de base de maquiagem, pente, etc. LIA acompanha seus movimentos, fascinada e horrorizada. retoca todo o rosto de ANA CLARA com cuidados de profissional.

LORENA Ela é linda. E vai ser linda até o fim. Ela gostaria disso. (TOM) Vai lá fora e vê se tem alguém. Se não tiver, traz o carro pra cá.

Meninas3.2 LIA Vai botar o corpo no carro?

LORENA Vamos tirá-la daqui agora. Vai depressa.

LIA recua um pouco, hesitante. Depois decide-se e sai depressa. LORENA continua retocando o rosto de ANA CLARA._________________________________________________________________

SEQ 88 FRENTE DO PENSIONATO EXT/NOITE LIA PEGA O CARRO 10”

O carro em zona sombria. LIA vem andando depressa, abre a porta e entra. Liga o motor. O barulho a inquieta. Ela olha para os lados, como para verificar se há alguém por ali. Recua com o carro para chegar o mais perto possível do portão. Sai do carro, deixa o motor ligado, abre o portão, volta para o carro e entra um pouco com a traseira do mesmo dentro do pátio. Desliga o motor, fecha a porta com cuidado e sai._________________________________________________________________

SEQ 89 QUARTO DE LORENA INT/NOITE VAMOS LEVAR O CORPO 25”

LORENA está terminando de ajeitar uma roupa limpa em ANA CLARA . LIA entra.

LIA O carro já está aí.

LORENA Fiz uma mala com as coisas dela. É como se ela tivesse viajado, compreende?

LIA Sei.

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LORENA Me ajuda. Vamos levar o corpo. Você viu alguém lá fora? Tem alguma luz acesa?

LIA Não.

LORENA Vem. Pega comigo.

Com dificuldade, elas pegam o corpo de e procuram levá-lo para fora.

LIA Que horror! Eu não consigo olhar para o rosto dela.

Meninas3.2 LORENA Não fala nada. Vamos levar.

Elas saem com o corpo._________________________________________________________________

SEQ 90 PENSIONATO / JARDIM EXT / NOITE Levam o Corpo 15”

LORENA e LIA passam carregando o corpo de ANA CLARA, uma de cada lado. LORENA olha para todos os lados, certificando-se que elas não estão sendo vistas. ANA CLARA tem a cabeça inerte deitada no ombro de LORENA._________________________________________________________________

SEQ 91 PENSIONATO/JARDIM EXT/NOITE PARTEM NO CARRO 30”

O carro parado onde LIA o deixou. LORENA e LIA aparecem carregando o corpo. LIA procura controlar uma careta de horror. LORENA está bem mais calma e decidida. Colocam o corpo no carro, no assento traseiro.

LORENA Vamos colocar ela sentada...Assim...Cuidado pra não cair. (O CORPO É COLOCADO) Você vai aí atrás com ela. Eu dirijo... Me espera aí queeu vou pegar as coisas dela.

LORENA sai. LIA fica olhando para o rosto de ANA CLARA, que está sereno e muito bonito.

LORENA volta, trazendo a mala. Coloca-a em algum lugar do carro.

LIA Quer que eu dirija? Eu dirijo muito bem.

LORENA Eu também. Deixa que eu levo._________________________________________________________________

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SEQ 92 RUAS / CARRO EXT/NOITE O CARRO NA NOITE 15”

O carro de LORENA avança por uma rua vazia.

M eninas3.2 LORENA dirige. No assento traseiro, LIA abraça ANA CLARA, procurando impedir que ela caia. LORENA parece outra pessoa, mais madura.

LIA Pra onde é que nós vamos?

LORENA Vamos pra um lugar que eu conheço.

LIA Daqui a pouco vai clarear.

LORENA Vai dar tempo.

O carro dobra uma esquina, segue seu caminho. Não há ninguém nas ruas._________________________________________________________________

SEQ 93 PRAÇA / CARRO EXT/NOITE ANA CLARA NA PRAÇA 60”

O carro aproxima-se. No interior, LORENA, LIA e o corpo de ANA CLARA. Chegam a uma pracinha.

LORENA É aqui. Vou parar o carro daquele lado.

LIA Onde?

LORENA Perto daquela árvore.

O carro avança, pára perto da árvore.

LORENA Vê se vê alguém.

LIA desce do carro, olha em torno. Não há ninguém. Tudo deserto. Volta-se para o carro.

LIA Não tem ninguém. Que é que você vai fazer?

LORENA Vamos botar ela sentada no banco. É assim que ela vai ser encontrada. Sentada. Como setivesse morrido aqui. Vem. Me ajuda.

As duas tiram o corpo de ANA CLARA do carro e o levam para um banco de madeira. Agem com certa rapidez, aflições sob controle.

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LORENA Aqui...Pronto. Vamos pegar as coisas dela.M eninas3.2 O corpo é colocado. LORENA dá os últimos retoques, colocando o corpo em posição que parece natural. É como se ANA CLARA dormisse sentada no banco. Depois, as duas voltam ao carro e pegam as coisas de ANA, que são colocadas ao lado do corpo. LIA fica olhando para o rosto de ANA CLARA.

LIA Tão linda...Serena...Parece viva.

LORENA Vem, Lia. Vamos embora.

LORENA vai para o carro. LIA a segue. Entram no carro. O carro sai. ANA CLARA fica sozinha, sentada no banco._________________________________________________________________

SEQ 94 PENSIONATO / JARDIM EXT/NOITE Vai Amanhecer 15”

O carro pára no portão do Pensionato. LORENA e LIA descem, olham para os lados, caminham em direção aos quartos.

LORENA Daqui a pouco vai amanhecer

LIA Tenho que preparar minhas coisas para aviagem.

Andam, entram no quarto de LORENA._________________________________________________________________

SEQ 95 QUARTO DE LORENA INT/NOITE A MAIOR AMIGA 40”

LORENA e LIA entram. Param, cansadas, ainda sob o choque dos acontecimentos. LORENA respira fundo, como se tomasse uma decisão.

LORENA Escuta. Vamos combinar uma coisa. (PAUSA) Não se fala mais do que aconteceu, okay?

LIA Javol.

LORENA A partir de agora, até a hora da sua partida, não vamos mais falar sobre Ana Clara. Certo?

LIA Certo.Meninas3.2 LORENA anda, pega sua bolsa, retira de lá um maço de dinheiro. Entrega-o a LIA.Meninas3.2 Meninas3.2

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LORENA Toma. Não é muito mas dá para sobreviverdurante um bom tempo.

LIA recebe o dinheiro, olha-o, depois olha para LORENA. As duas se encaram, amigas, cúmplices. LORENA avança um passo e abraça LIA com força. LIA corresponde. Ficam abraçadas num aperto prolongado, os olhos fechados.

LIA Você foi a maior amiga que eu tive.

LORENA E você a minha.

Ficam abraçadas, imóveis. Ouve-se um sino batendo._________________________________________________________________

SEQ 96 PENSIONATO/JARDIM EXT/NOITE Amanhecendo em São Paulo 05”

O dia amanhece. Os primeiros raios de sol tocam o alto das árvores e os telhados das construções. O sino continua batendo._________________________________________________________________

SEQ 97 AEROPORTO INT/DIA LIA NO AEROPORTO 13”

Balcão de aeroporto, movimento habitual de passageiros. Alto falante convoca passageiros para o embarque.

LIA está por ali, sozinha, na expectativa de partir. Abre sua bolsa, retira uma foto. Dá uma olhada. É um grupinho alegre, que posa de frente para a câmera: LIA, LORENA e ANA CLARA._________________________________________________________________

SEQ 98 (FLASHBACK) PENSIONATO/JARDIM EXT/DIA FOTO PIRÂMIDE 30”

M eninas3.2 A foto da seqüência anterior parece adquirir vida. LORENA, LIA e ANA CLARA procuram fazer pose para uma fotografia. Riem, empurram-se, divertem-se. IRMÃ BULA tem uma câmera nas mãos. Ela é quem vai fazer a foto.

IRMÃ BULA "Ana Clara, não envesga. Enfia a blusa na calça, Lia, depressa. E não faça careta, Lorena,

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você está fazendo careta! Vamos lá. Vamos fazer a pirâmide."

As três moças formam o conjunto que está na foto. Uma espécie de pirâmide: ANA CLARA e LORENA na frente, agachadas, e LIA por trás, mais acima.

IRMÃ BULA Parece um time de futebol.

As três riem. A foto é batida._________________________________________________________________

SEQ 99 AEROPORTO INT/DIA JUNTA-SE AO GRUPO 15”

LIA no mesmo lugar, olhando a foto. O alto falante continua a convocar os passageiros. LIA coloca a foto na bolsa e encaminha-se para o portão de embarque. Junta-se a um grupinho de três jovens que, vemos, vão viajar com ela._________________________________________________________________

SEQ 100 QUARTO DE LORENA INT/DIA LORENA RASGA FOTO 12”

A foto do Dr. NEMESIUS sobre a mesinha de cabeceira, fora da moldura. A mão de LORENA a pega e rasga. Em seu lugar, na moldura, coloca a mesma foto que LIA olhava no aeroporto. A moldura é colocada novamente sobre a mesinha de cabeceira. LORENA a contempla com um sorriso, afasta-se e sai._________________________________________________________________

SEQ 101 PENSIONATO / JARDIM EXT/DIA BOA VIAGEM LIA 45”

IRMÃ BULA está agachada, arrancando ervas daninhas do jardim. MADRE ALIX passeia ali por perto, braços cruzados no peito. LORENA aproxima-se.

LORENA Posso ajudar, Irmã?

Meninas3.2 IRMÃ BULA Claro. Com duas vai mais depressa do que com

uma.

LORENA agacha-se e começa a fazer o mesmo que faz IRMÃ BULA. MADRE ALIX olha para as duas e sorri.

MADRE ALIX O gato da Ana Clara apareceu.

LORENA Mentira.

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IRMÃ BULA Apareceu, sim. A Clarinha vai adorar quando souber. Olha ele lá.

Aponta. LORENA olha. Astronauta está em algum lugar, quieto. LORENA levanta-se e vai apanhá-lo. As duas freiras a observam quando ela pega o gato e o coloca no colo. LORENA volta para junto das freiras.

LORENA Está limpinho. Está lindo.

IRMÃ BULA Os gatos sabem se cuidar.

LORENA acaricia o gato. Ouve-se o barulho de um avião. LORENA sente que pode ser o avião que conduz LIA. Ergue o rosto para o alto, procurando nas nuvens. O barulho do avião torna-se mais alto. LORENA sorri. E afaga o gato.

LORENA (MUITO BAIXINHO) Boa viagem, Lia._________________________________________________________________

SEQ 102 PRAÇA EXT/DIA SENTADA SÓZINHA 15”

Movimento na rua que corre ao longo da praça. A praça está quase vazia. Passam duas ou três pessoas com ar distraído. ANA CLARA está sentada no banco, na posição em que foi deixada por LORENA e LIA. A aproximação da câmera torna-a mais visível. Está imóvel, serena, parece viva._________________________________________________________________

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Roteiro AS MENINAS anexo 1

SEQ 50 (FLASHBACK) PARQUE DE DIVERSÕES EXT/NOITE

Tempos Felizes - Roda Gigante15”

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