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AS GEOTECNOLOGIAS E A ANÁLISE DA QUALIDADE AMBIENTAL COMO INSTRUMENTO PARA O PLANEJAMENTO URBANO Valéria Lima Profa Dra em Geografia, Universidade Estadual de Maringá [email protected] INTRODUÇÃO Atualmente, a geotecnologia está assumindo um importante papel nas análises em ambientes urbanos, considerando a possibilidade da articulação de vários elementos para gerar modelos que possam auxiliar o planejamento urbano e nas políticas públicas. O planejamento urbano assumi importância no processo de desenvolvimento socioespacial, e é bem sucedido quando se constata a melhoria da qualidade de vida da população. Isso corresponde à crescente satisfação de aspectos das necessidades básicas e não básicas, materiais e não materiais de uma maior parcela da população. Um dos aspectos refere-se ao ambiente ecologicamente equilibrado, ou seja, considerando suas características sociais, econômicas, culturais e ambientais. O mapeamento da qualidade ambiental pode contribuir, pois envolve muitas questões, como a complexidade dos elementos culturais, sociais, econômicos, políticos, ambientais e, às vezes, implica em choques conceituais e nos métodos de análises, associando muitas áreas do conhecimento. Neste contexto, este artigo tem como objetivo abordar as vantagens das geotecnologias para analisar de forma integrada ao ambiente urbano e as possibilidades de mapeamento da qualidade ambiental nas cidades, sendo que os resultados poderão ser importantes instrumentos para o planejamento urbano. Um exemplo foi o mapeamento da qualidade ambiental de duas cidades pequenas, sendo estas: Presidente Epitácio/SP e Nova Andradina/MS. Neste caso, foram utilizados recursos das geotecnologias envolvendo imagens de satélite e processamento de dados geográficos. Para mapear a qualidade ambiental dessas duas cidades, utilizou-se os indicadores: tipo de cobertura das construções, classes de renda, saneamento ambiental, temperatura do ar e densidade de vegetação, foram especializados e processados no aplicativo Spring 5.2.1, através da técnica de suporte à decisão AHP.

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AS GEOTECNOLOGIAS E A ANÁLISE DA QUALIDADE AMBIENTAL

COMO INSTRUMENTO PARA O PLANEJAMENTO URBANO

Valéria Lima

Profa Dra em Geografia, Universidade Estadual de Maringá

[email protected]

INTRODUÇÃO

Atualmente, a geotecnologia está assumindo um importante papel nas análises em

ambientes urbanos, considerando a possibilidade da articulação de vários elementos para

gerar modelos que possam auxiliar o planejamento urbano e nas políticas públicas.

O planejamento urbano assumi importância no processo de desenvolvimento

socioespacial, e é bem sucedido quando se constata a melhoria da qualidade de vida da

população. Isso corresponde à crescente satisfação de aspectos das necessidades básicas

e não básicas, materiais e não materiais de uma maior parcela da população. Um dos

aspectos refere-se ao ambiente ecologicamente equilibrado, ou seja, considerando suas

características sociais, econômicas, culturais e ambientais.

O mapeamento da qualidade ambiental pode contribuir, pois envolve muitas

questões, como a complexidade dos elementos culturais, sociais, econômicos, políticos,

ambientais e, às vezes, implica em choques conceituais e nos métodos de análises,

associando muitas áreas do conhecimento.

Neste contexto, este artigo tem como objetivo abordar as vantagens das

geotecnologias para analisar de forma integrada ao ambiente urbano e as possibilidades

de mapeamento da qualidade ambiental nas cidades, sendo que os resultados poderão ser

importantes instrumentos para o planejamento urbano. Um exemplo foi o mapeamento

da qualidade ambiental de duas cidades pequenas, sendo estas: Presidente Epitácio/SP e

Nova Andradina/MS.

Neste caso, foram utilizados recursos das geotecnologias envolvendo imagens de

satélite e processamento de dados geográficos. Para mapear a qualidade ambiental dessas

duas cidades, utilizou-se os indicadores: tipo de cobertura das construções, classes de

renda, saneamento ambiental, temperatura do ar e densidade de vegetação, foram

especializados e processados no aplicativo Spring 5.2.1, através da técnica de suporte à

decisão – AHP.

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Nos mapas de qualidade ambiental, foi possível verificar que o planejamento é

fundamental, já que nestas duas cidades apresentaram como regular em sua maioria e, em

pontos específicos, como ruim. Esse resultado tem relação direta com o saneamento

ambiental, que teve maior influência na quantidade e presença de domicílios com

esgotamento sanitário via fossa rudimentar, ou seja, fossa negra. A análise de forma

integrada do ambiente urbano, através de técnicas das geotecnologias deve ser

considerado uma importante ferramenta para compreensão da complexidade de

elementos do espaço urbano e para o seu planejamento.

1. QUALIDADE AMBIENTAL, PLANEJAMENTO URBANO E AS

GEOTECNOLOGIAS

As preocupações ambientais urbanas, incluindo o saneamento, as áreas verdes e

áreas de preservação permanente, os cursos d’água, os resíduos sólidos e líquidos entre

outros, ficam mais visíveis e passíveis de análise quando representados de forma

integrada num sistema de informação geográfica, associando critérios de análises

espaciais que é um dos elementos da geotecnologia.

De acordo com Mendonça (2004, 197), no planejamento do ambiente urbano devem

ser considerados os fatores naturais, como o relevo, o clima, o solo, a vegetação e os

cursos d’água, pois quando os espaços não são projetados para serem adequados a esses

fatores, podem interferir na qualidade ambiental das cidades.

A crescente preocupação com a qualidade ambiental está relacionada, de acordo

com a construção de um ambiente ecologicamente equilibrado, considerando todos os

elementos da paisagem urbana e conciliando os vários tipos de uso do solo e suas diversas

atividades com a dinâmica natural dos seus elementos físicos.

Para Perloff (1973, p. 09), o interesse sobre a qualidade ambiental constitui-se, em

grande parte, da influência de outros temas, como a preocupação com a qualidade do ar,

da água, das áreas verdes, e claro, não podendo negar, a preocupação com o

desenvolvimento das “comunidades urbanas” e, por fim, sobre a qualidade de vida dos

habitantes da cidade.

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Sendo assim, considera-se a importância da análise da qualidade ambiental urbana

e o uso das geotecnologias para auxiliar nas análises que possam ser passíveis de

propostas de melhoria e como instrumentos do planejamento urbano.

A base do planejamento urbano é o ordenamento das cidades e para alcançá-lo é

necessário tratar de questões relacionadas ao solo urbano. É um instrumento público de

controle das relações sociais; através da regulamentação da ação dos agentes públicos e

provados no processo de produção do espaço urbano.

Planejar significa seguir diretrizes de “funcionalidade urbana para garantir o

equilíbrio espacial na distribuição dos usos urbanos” (VITTE e KEINERT, 2009 p. 24).

Para falar de planejamento não podemos esquecer que há uma certa confusão e entre

os conceitos de planejamento e gestão. O conceito de gestão está ligado, de acordo com

Souza (2003), à administração de empresas e o de planejamento significa tentar prever a

evolução de um fenômeno, tentar simular os desdobramentos de um processo, com o

objetivo de melhor precaver-se contra prováveis problemas.

O planejamento é a preparação para a gestão futura, buscando evitar ou

minimizar problemas e ampliar margens de manobra; e a gestão e a

efetivação, ao menos em parte (pois o imprevisível o indeterminado

estão sempre presentes, o que torna a capacidade de improvisação e a

flexibilidade sempre imprescindíveis), das condições que o

planejamento feito no passado ajudou a construir” (SOUZA, M. L. de.

2003 p. 46)

Para prever, ou supor o que pode acontecer é necessário conhecer os agentes e

elementos que influenciam na produção do espaço urbano. Sendo assim, o diagnóstico

deve ser considerado neste processo, o qual é o conhecimento da realidade atual – neste

caso sobre as cidades – pequenas? Médias? Grandes? Quais suas características? Qual é

a situação atual destes espaços?

Pensando na cidade enquanto sistema que é produzido socialmente, deve-se

considerar, tanto no planejamento quanto na gestão dos recursos a adequação dos usos do

solo urbano considerando o ambiente e não apenas para minimizar os impactos para

buscar caminhos de melhorar a qualidade de vida da população de uma forma geral.

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A qualidade ambiental envolve muitas questões, como a complexidade dos

elementos culturais, sociais, econômicos, políticos, ambientais e, às vezes, implica em

choques conceituais e nos métodos de análises, associando muitas áreas do conhecimento.

Considerando que “qualidade” significa “propriedade, atributo ou condição das

coisas ou das pessoas”1, pode-se dizer que a qualidade ambiental se refere ao padrão a ser

estabelecido e/ou alcançado de satisfação ambiental. Considerada então, como um fator

que pode indicar o grau de comprometimento ambiental, referindo-se à associação dos

fatores ecológicos e socioeconômicos.

Machado (1997) indica que a qualidade ambiental é de difícil definição e está

intimamente relacionada à qualidade de vida, pois deve existir uma interação e um

equilíbrio entre o meio ambiente e as atividades que envolvem a vida do ser humano e

este muda de escala, tempo e lugar.

Os principais fatores ligados ao tema da qualidade ambiental podem ser

identificados através de questionamentos que devem ser solucionados para estabelecer

critérios nas análises da qualidade do ambiente, no caso urbano, como “qual o padrão de

qualidade a ser usado para determinar essa boa qualidade; qual seria o seu mínimo; quais

os critérios a serem empregados para determinar os parâmetros de qualidade ambiental?”

(MACHADO, 1997, p. 17).

Essas são algumas questões que envolvem a preocupação embutida em toda a

construção teórica exposta aqui e nos objetivos da discussão sobre a análise de

indicadores ambientais. Através das geotecnologias, que pode ser considerada como

conjunto de tecnologias para coleta, processamento, análise e disponibilização de dados,

é possível estabelecer critérios para indicadores quantitativos e qualitativos, e com

procedimentos metodológicos capazes de compreender a qualidade ambiental em

paisagens urbanas distintas.

A tecnologia “é a ciência dos meios”, sendo assim a geotecnologia “é a arte e a

técnica de estudar a superfície da terra e adaptar as informações às necessidades dos meios

físicos, químicos e biológicos”, portanto, o processamento digital de Imagens (PDI), a

geoestatística e os SIGs fazem parte da geotecnologia (SILVA, 2003 p. 35).

1 Significado do Dicionário Aurélio, 6ª ed., 2006.

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Entretanto, trabalhar com geotecnologia pode significar a utilização de

computadores como instrumentos de representação de dados espacialmente

referenciados, porém o problema fundamental é o estudo e a implementação de diferentes

formas de representação computacional do espaço geográfico.

As geotecnologias têm revolucionado o conhecimento sobre a realidade territorial,

assim como proporcionado melhor capacidade de planejar o futuro desejável para nossas

cidades, ao permitirem que os gestores públicos tenham uma visão espacializada dos

dados sobre o território e possibilitar a realização de análises espaciais e simulações sobre

uma série de temas que compõem o quadro do desenvolvimento urbano.

2. METODOLOGIA

Os procedimentos para a análise da qualidade ambiental nas duas cidades

(Presidente Epitácio/SP e Nova Andradina/MS), tiveram como base o mapeamento dos

indicadores: tipo de cobertura, classes de renda, saneamento ambiental, temperatura do

ar e densidade de vegetação.

Para o mapeamento da qualidade ambiental, foi necessário representar as variáveis

e indicadores no sistema de informação geográfica. Foram utilizados dados do censo

demográfico do IBGE de 2010 por setores censitários, coleta de dados em campo e

imagens de alta resolução do satélite WorldView-II. Para a cobertura da cidade de

Presidente Epitácio, foram necessárias duas cenas, sendo uma com data de aquisição de

22 de março de 2010, e outra de 13 de abril de 2010, ambas com 0% de cobertura de

nuvens. Para Nova Andradina, a imagem adquirida possui data de imageamento, de 20

de fevereiro de 2011, com 0% de cobertura de nuvens.

O indicador tipos de cobertura das construções têm uma relação direta com a

qualidade ambiental devido a relação de alguns materiais como as telhas de cimento e de

amianto com o aumento da temperatura do ar, influenciando no microclima.

Seu mapeamento teve como base a análise da imagem de alta resolução com relação

a predominância dos tipos de coberturas das edificações, por quadra, nas seguintes

classes: predominância de telhas de cerâmica; predominância de telhas metálicas;

predominância de telhas de cimento; predominância mista de telhas de cerâmica e de

cimento; predominância mista de telhas metálicas e de cerâmica; predominância mista de

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telhas metálicas e de cimento; predominância mista de telhas metálicas de cerâmica e de

cimento. Para este indicador utilizou-se processamento digital no Spring (classificação

supervisionada) e interpretação visual, sendo assim, a classificação foi realizada de

acordo com a proporção da ocupação de cada tipo de cobertura das edificações, em cada

quadra.

Para o mapeamento indicador classes de renda utilizou-se as variáveis de

rendimento per capta por domicílios por setores censitários do censo demográfico do

IBGE de 2010. Foi necessário adaptar a classificação dos resultados de renda domiciliar

das cidades considerando suas realidades socioeconômicas e que estas referem-se a

cidades pequenas. Portanto, as classes de renda foram divididas em: Muito alta – mais de

10 salários mínimos; Alta – 5 a 10 salários mínimos; Média – 2 a 5 salários mínimos;

Baixa – até 2 salários mínimos.

Para classificar as áreas de acordo com essa divisão, foi calculada a porcentagem

dos domicílios que possuíam cada faixa de renda dentro de cada setor. Os setores que

apresentaram mais de 70% dos domicílios com renda mensal de até 2 salários mínimos,

foram classificados como áreas de “classe de renda baixa”. Já os que apresentaram de

50% a 70% dos domicílios com renda mensal de até 2 salários mínimos somados com a

presença de 30% a 50% de renda mensal de 2 a 5 salários mínimos, foram classificados

como áreas de “classe de renda média”.

Os setores que apresentaram maiores porcentagens de domicílios com renda de 5

a 10 salários mínimos foram classificados como áreas de “classe de renda alta” e, por fim,

os setores com porcentagens maiores de domicílios com renda de mais de 10 salários

mínimos, tiveram a classificação de “classe de renda muito alta”.

O indicador de saneamento ambiental incluiu os dados de abastecimento de água,

coleta de lixo, energia elétrica, esgotamento sanitário e pavimentação das vias públicas.

Essas variáveis mostraram situações muitas vezes invisíveis, como o caso do esgotamento

sanitário que influenciam de maneira direta na qualidade ambiental das cidades. Para o

mapeamento deste indicador utilizou-se três classificações, sendo: adequado,

parcialmente adequado e inadequado. Considerou-se como maior fator negativo para o

saneamento ambiental o esgotamento sanitário via fossa rudimentar, as chamadas fossas

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negras que, além de causarem a contaminação do solo e da água, podem trazer

consequências para a saúde humana, assim como o esgotamento sanitário via vala (esgoto

a céu aberto) e também o lixo queimado e enterrado na propriedade.

O lixo jogado em terreno baldio ou em outro logradouro, queimado ou enterrado

na propriedade, assim como o abastecimento de água de poço ou nascente e domicílios

sem energia elétrica, também foi considerado como negativo para o saneamento

ambiental, porém com menos peso.

Levou-se em conta a proporção de domicílios que apresentaram cada um desses

fatores dentro dos setores, ou seja, quanto maior o número de domicílios com fator

negativo, maior a sua influência no setor correspondente. Para classificar os setores com

saneamento adequado, o mesmo não apresentaram fatores negativos. A classificação dos

setores com saneamento parcialmente adequado seguiu o critério de possuírem uma

pequena proporção de domicílios com algum fator negativo, mas que não se referem ao

esgotamento sanitário via fossa rudimentar e nem via vala.

O indicador temperatura e a umidade do ar nas cidades são elementos que fazem

parte do clima urbano. A forma urbana associada à diversidade de atividades

desenvolvidas nessas áreas e a ausência de vegetação podem influenciar no aumento da

temperatura e queda da umidade do ar que interferem diretamente no conforto térmico

das paisagens urbanas.

Para o mapeamento da temperatura do ar intra-urbano utilizou-se de medidas em

transectos móveis nos percursos norte-sul e leste-oeste das cidades, no período noturno,

em condições de tempo atmosférico estáveis. Através de imagens de satélites e trabalhos

de campo, foram escolhidos os trajetos que melhor contemplassem os diferentes tipos de

usos e ocupação das cidades de Presidente Epitácio (coleta dos dados foi realizada no dia

02 de abril de 2012) e Nova Andradina (coleta de dados foi realizada no dia 26 de junho

de 2012). Foram dois trajetos realizados simultaneamente às 21h em carros que se

deslocaram em sentidos opostos a uma velocidade máxima de 20km/h.

Os resultados da espacialização dos dados de temperatura do ar, tanto de

Presidente Epitácio quanto de Nova Andradina, foram classificados de acordo com três

classes: alta, média e baixa temperatura do ar.

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Para classificar a densidade de vegetação, utilizou-se o NDVI – Índice de

vegetação de diferença normalizada, que foi estimada através das imagens do sensor

AVNIR-2 – Advanced Visible and Near-Infrared Radiometer – do satélite Alos

(Advanced Land Observing Satellite) que possui resolução espacial de 10 metros.

Ressalta-se que além dos resultados do NDVI, foi utilizada a análise visual das imagens

para o mapeamento das classes de densidade, resultando em classes de alta, média, baixa

e ausência de vegetação.

2.1 Mapeamento da qualidade ambiental urbana

O mapeamento da qualidade ambiental teve como base a representação de todos

os indicadores e do estabelecimento de pesos diferenciados para cada um, de acordo com

sua relevância.

O estabelecimento dos pesos foi realizado através da técnica de suporte à decisão

– AHP, no software Spring. Nele, fez-se a comparação pareada entre os indicadores e o

estabelecimento da relação de importância entre si. Com isso, foi gerada uma rotina de

programação com os pesos de cada um, para ser implementada no LEGAL – Linguagem

Espacial para Geoprocessamento Algébrico – no software Spring.

O cálculo dos pesos requer uma interação do pesquisador para estabelecer uma

relação de intensidade de importância, de acordo com o conhecimento e múltiplos

critérios que podem ser utilizados. Foi realizada a comparação pareada entre os

indicadores. A atribuição de pesos foi realizada com base na escala de ponderação

proposta por Saaty (1990), que varia de 1 a 9, sendo que o valor 1 tem importância

idêntica e o valor 9 significa importância extrema.

Esses critérios foram aplicados tanto para a cidade de Presidente Epitácio quanto

para Nova Andradina. Considerou-se que os indicadores de densidade de vegetação e,

principalmente, saneamento ambiental possuíram uma intensidade de importância

superior aos demais indicadores, de acordo com a sua relevância para a qualidade

ambiental urbana.

Além desses critérios, outro fator que foi considerado que se refere ao valor da

razão de consistência que foi de 0.009. Esse valor indicou a consistência dos critérios

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utilizados, já que, de acordo com Saaty (1990), se admite um valor de até 10%, ou seja,

de até 0.1.

Os pesos dos indicadores que foram gerados com a técnica AHP, foram

processados numa rotina de programação no LEGAL, no Spring. Assim, os valores

gerados na grade, após o fatiamento, foram representados em cores que identificam o grau

de qualidade ambiental de Presidente Epitácio e de Nova Andradina.

3. RESULTADOS

Os resultados do mapeamento da qualidade ambiental de Presidente Epitácio e de

Nova Andradina, podem ser visualizados nas Figuras 01 e 02.

Considerando os critérios utilizados, verificou-se que nenhuma das duas cidades

possuíam áreas classificadas como boa ou ótima qualidade ambiental. Esse resultado tem

relação direta com a questão do saneamento ambiental, que teve maior influência na

quantidade e presença de domicílios com esgotamento sanitário via fossa rudimentar, ou

seja, fossa negra.

A influência desse tipo de esgotamento sanitário vai além do perceptível e do que

pode ser medido nessas análises, devido a sua probabilidade de contaminação do solo e

água. Além disso, o saneamento ambiental, a baixa densidade ou ausência de vegetação

arbórea também influenciaram nos resultados.

Figura 01 – Mapa de qualidade ambiental de Presidente Epitácio/SP.

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Elaboração: próprio autor

Figura 02 – Mapa de qualidade ambiental de Nova Andradina/MS.

Elaboração: próprio autor

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Não se pode, obviamente, deixar de considerar a importância dos demais

indicadores para tais resultados, tendo em vista suas influências para os estudos de

qualidade ambiental. Por isso, considerou-se, por exemplo, o indicador renda que

interfere de forma indireta, na maioria dos casos, mas que assume sua relevância na

análise, por exemplo, ao ser associado com dados de saneamento e cobertura do solo.

Portanto, este foi considerado, mesmo tendo peso menor do que os demais.

De uma forma geral, Presidente Epitácio, figura 01, apresentou valores que se

enquadram em uma qualidade ambiental regular. Este resultado dá a impressão de

homogeneidade no resultado. Nova Andradina teve uma influência forte da ausência de

vegetação na porção central da cidade e em pequenas áreas, apresentando qualidade

ambiental classificada entre regular e boa, informação que pode ser visualizada na figura

02.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerou-se que para compreender e avaliar a qualidade ambiental na

complexidade dos ambientes urbanos foi importante analisar os que representavam

melhor as duas cidades, pois de acordo com Leff (2006, p. 60) a visão sistêmica e o

pensamento holístico são fundamentais para a reconstrução e análise de uma realidade

total.

Essa visão sistêmica é facilitada quando associada às técnicas das geotecnologias,

com a possibilidade de gerar modelos para integrar vários elementos da paisagem urbana.

Sendo assim, com base nos exemplos tratados neste artigo, foi possível perceber que

através dessas ferramentas, que podem facilitar a leitura atual assim como auxiliar em

previsões futuras, podem ser incorporadas às análises do planejamento urbano.

O planejamento urbano quanto possui um diagnóstico integrado de elementos das

cidades, pode garantir melhor compreensão desse espaço, considerando elementos

visíveis e invisíveis deste. É importante ressaltar que cada realidade é única e a escolha

dos indicadores e de quais técnicas serão utilizadas, vai depender do pesquisador ou

equipe de trabalho, assim como dos aspectos relevantes da área a ser mapeada e analisada.

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