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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I CURSO DE PEDAGOGIA Michele Oliveira do Vale Carvalho AS CONTRIBUIÇÕES DA CLASSE HOSPITALAR NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO / PACIENTE SALVADOR 2009

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I

CURSO DE PEDAGOGIA Michele Oliveira do Vale Carvalho

AS CONTRIBUIÇÕES DA CLASSE HOSPITALAR NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO / PACIENTE

SALVADOR

2009

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FICHA CATALOGRÁFICA – Biblioteca Central da UNEB Bibliotecária : Jacira Almeida Mendes – CRB : 5/592

Carvalho, Michele Oliveira do Vale As contribuições da classe hospitalar no processo de escolarização do aluno/paciente / Michele Oliveira do Vale Carvalho .- Salvador, 2009. 53f. Orientadora: Luciene Maria da Silva. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Educação. Colegiado de Pedagogia . Campus I. 2009. Contém referências e apêndices,. 1. Crianças hospitalizadas - Educação. 2. Educação especial. 3. Pacientes hospitalizados -

Educação. 4. Prática de ensino. I. Silva, Luciene Maria da. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação. CDD: 370.11

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MICHELE OLIVEIRA DO VALE CARVALHO

AS CONTRIBUIÇÕES DA CLASSE HOSPITALAR NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO / PACIENTE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da graduação em Pedagogia do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Drª Luciene Maria da Silva.

SALVADOR 2009

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MICHELE OLIVEIRA DO VALE CARVALHO

AS CONTRIBUIÇÕES DA CLASSE HOSPITALAR NO PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO DO ALUNO / PACIENTE

Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção da graduação em Pedagogia do Departamento de Educação da Universidade do Estado da Bahia, sob orientação da Profª Drª Luciene Maria da Silva.

Local: Salvador 11 de setembro de 2009

__________________________________________ Professora Drª Luciene Maria da Silva

__________________________________________ Professora Msc Adelaide Rocha Badaró

__________________________________________ Professora Msc Jaciete Barbosa dos Santos

SALVADOR 2009

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Dedico este trabalho ao grande amor da minha vida Ricardo Martins Carvalho e a toda minha família, que sem dúvidas alguma é tudo que tenho de mais importante.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço em primeiro lugar a Deus pai todo poderoso e ao meu guia e protetor Sr do Bonfim

pela força, determinação e coragem para enfrentar todos esses anos de luta. Aos meus pais,

Egberto e Iraci, por todo suporte, todo cuidado, toda abdicação, amor, carinho, ajudando-me a

aprender, a crescer, construindo e edificando os meus valores de vida. Ao grande amor da

minha vida Ricardo, companheiro de todas as horas, obrigada pela paciência, compreensão,

pelo amor e incentivo, sem você a minha felicidade com certeza não seria completa. As

minhas queridas irmãs Ivana e Débora, pelo carinho, confiança, apoio e motivação.E é claro

não poderia deixar de agradecer a Andressa Nelli, Carlos Alfredo Costa, Caroline Melo, Joel

Cotts, Joivan do Vale, Márcia Cordeiro, Agripino Carvalho, Maria da Conceição, que no

decorrer dessa caminhada estiveram presentes e me ajudaram no momento em que mais

precisei, a coordenação, professora e alunos/pacientes da Casa de Apoio Erik Loeff e as

professoras Luciene Silva e Adelaide Badaró por todo aprendizado proporcionado e,

sobretudo, pelo exemplo a ser seguido. Enfim, para todos aqueles que direta ou indiretamente

contribuíram para essa grande conquista.

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“Todos os seres humanos têm direito de que respeitem sua

vida, e só existe respeito quando a vida além de ser

mantida, pode ser vivida com dignidade”.

Dalmo Dallari

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo verificar as contribuições da classe hospitalar para o aluno / paciente, como se dá essa escolarização em ambiente hospitalar e / ou domiciliar, como também ressaltar a relevância desta modalidade de ensino para a criança ou adolescente durante o seu tratamento médico. Farei um breve panorama da Educação Especial e do trabalho pedagógico realizado na classe hospitalar, bem como as práticas educativas desenvolvidas pelas docentes. Esta pesquisa qualitativa do tipo exploratória, baseia-se nos registros do diário de bordo, nas observações da rotina de uma classe hospitalar e entrevistas realizadas com docentes, aluno / paciente e profissional da área de saúde. Esta pesquisa possibilitou que fosse evidenciada a importância do aprendizado em um contexto diferenciado de alunos impossibilitados de frequentar a classe regular em virtude do seu adoecimento.

Palavras-chave: Educação especial .Classe Hospitalar. Prática educativa

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RESUMEN

Este trabajo tiene por objeto verificar las contribuciones de la clase de hospital para el

estudiante / paciente, ya que esta escuela está en un hospital y / o de casa, pero también

subrayar la importancia de esta modalidad de educación para el niño, niña o adolescente

durante su tratamiento médico. Voy a hacer una breve reseña de la Educación Especial y la

labor realizada en el hospital docente de la clase, y las prácticas educativas desarrolladas por

los profesores. Este tipo de exploración de la investigación cualitativa, basada en los registros

del cuaderno diario de pesca, las observaciones de la rutina de una clase de hospital y

entrevistas con profesores, estudiantes y profesionales de la salud del paciente y en la zona.

Esta investigación ha demostrado que sea la importancia del aprendizaje en un contexto

diferente de los estudiantes no pueden asistir a clase regularmente a causa de su enfermedad.

Palabras clave: Educación especial.Clase Hospital. La práctica educativa

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 09

2 O QUE É CLASSE HOSPITALAR.................................................................... 12

2.1 Breve histórico da Educação Especial........................................................................... 16

2.2 Aspectos históricos da Classe Hospitalar...................................................................... 19

2.3 Legislação e direitos da criança hospitalizada............................................................... 20

3 A PRÁTICA PEDAGÓGICA EM CLASSE HOSPITALAR................... 23

3.1 Formação profissional para o trabalho pedagógico na Classe Hospitalar..................... 23

3.2 A rotina docente com os Alunos / Pacientes.................................................................. 26

3.3 Relação docente X Aluno / Paciente.............................................................................. 29

4 DADOS DA PESQUISA DE CAMPO............................................................... 32

4.1 A história da criança “Lua”............................................................................................ 35

4.2 O trabalho pedagógico da professora “Estrela” na Classe Hospitalar da Casa de

Apoio Erik Loeff..................................................................................................................

37 4.3 Síntese da entrevista com a professora “Sol” no contexto

hospitalar.............................................................................................................................

41 4.4 O que pensa a Terapeuta Ocupacional “Vênus” sobre as Classes

Hospitalares..........................................................................................................................

44 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 46

REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 49

APÊNDICES ................................................................................................. 51

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1 INTRODUÇÃO

Este trabalho faz uma abordagem em relação à atuação docente em um ambiente onde

prevalece o cuidado com a saúde de quem adoece. O atendimento pedagógico para crianças

hospitalizadas ou em tratamento médico domiciliar, surge da necessidade de garantir a

continuidade da escolarização de alunos / pacientes, que se encontram impossibilitados de

freqüentar a escola por motivo de doença. A criança que precisa ter as suas necessidades

educacionais atendidas no momento em que se encontra afastada da sua escola por motivo de

doença, se caracteriza também como alunado da Educação Especial, que por sua vez é uma

modalidade de ensino prevista na Lei de Diretrizes e Bases, e possui amparo legal na

Constituição Nacional Brasileira de 1988.

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, o direito a educação é dever

não só do Estado, mas da escola, da família e da sociedade, onde juntos devem buscar

alternativas que amenizem as dificuldades encontradas pelos alunos, proporcionando a

igualdade de direito em relação ao acesso à educação.

Através de intervenções pedagógicas previamente planejadas, sabe-se que os

educadores podem contribuir no desenvolvimento das potencialidades dos seus alunos,

estando estes doentes ou não, para que a sua necessidade especial possa ser percebida a partir

das possibilidades, não como a marca da enfermidade, da desvalorização e do preconceito. O

docente atuante em classe hospitalar deverá elaborar uma proposta de trabalho que possa

contemplar as necessidades de maneira específica, interagindo paciente, escola e família, de

modo que possa conceber uma nova realidade no contexto hospitalar com características

lúdicas e educativas. O professor no hospital tem como papel primordial estimular o seu aluno

e promover o seu desenvolvimento curricular e cognitivo. Por essa razão não deve ser visto

como um recreador porque o seu trabalho não se limita a preencher o tempo livre da criança.

Essa proposta de educação pedagógica tem como objetivo a continuidade da

escolarização para crianças em idade escolar que, por conta da enfermidade, necessitam se

afastar da escola, gerando atrasos no aprendizado e ou abandono da escolaridade.

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A significância deste trabalho funda-se na importância de ampliar os estudos sobre a

escolarização no ambiente hospitalar, em virtude do tema ser ainda restrito, o que evidencia a

necessidade de enriquecer ainda mais os estudos e o debate sobre o assunto para uma melhor

percepção e entendimento acerca das contribuições que o atendimento pedagógico no hospital

proporciona as crianças, quando é inevitável o seu afastamento da escola por problemas de

saúde. Algumas dessas contribuições já podem ser facilmente notadas não somente sob o

ponto de vista pedagógico, por possibilitar ao aluno-paciente a construção do seu

conhecimento, mediado pelo professor no hospital, mas por contribuir no processo de

recuperação que também é de suma importância, oferecendo através da metodologia da

ludicidade e a partir de uma abordagem sócio-construtivista, subsídios que possam amenizar a

dor e o sofrimento da criança. Além disso, o tema escola para os pacientes hospitalizados faz

alusão a sua vida saudável antes do seu adoecimento.

Segundo Ceccim (1999, p.44), a possibilidade de saída do leito, bem como a

proposição de atividades motivadoras e a observação de que outras crianças também

vivenciam tais experiências, contribuiu para um melhor desenvolvimento e mais rápida

recuperação de crianças que participaram desta modalidade de ensino.

Sabe-se que muitas são as dificuldades a serem enfrentadas pelo professor no hospital,

visto que este precisa conquistar o seu espaço dia a dia na realização do seu trabalho com os

alunos, estabelecer parceria com a família e os profissionais que trabalham no hospital, que

por sua vez servirão de aliados nesse processo. Atualmente, os próprios médicos que

acompanham os alunos-pacientes, surpreendem-se ao ver a recuperação favorável, em

decorrência da classe no hospital. Os familiares também compartilham dessa mesma opinião e

atestam que o acompanhamento pedagógico obtido dentro do ambiente hospitalar, oferece um

novo sentido a vida das crianças enquanto internadas e, sobretudo, fora do contexto hospitalar

ao receberem alta médica, pois estas retornam a sua série de origem capazes de dar

continuidade aos seus estudos sem maiores dificuldades.

Ao longo desta pesquisa, pretendo não somente compreender as contribuições da

educação no resgate da saúde da criança na classe hospitalar ou grupos de apoio, mas

proponho a análise de situações pedagógicas enquanto interações sociais no que concerne a

escolarização do aluno-paciente nesse momento da sua vida, respeitando as suas limitações,

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individualidade, conhecimentos prévios e levando em consideração o quadro clínico das

crianças hospitalizadas que se encontram em processo de tratamento de doenças crônicas

como câncer, cardiopatias e doenças renais graves, dentre outras.

O principal objetivo desta pesquisa foi identificar aspectos sobre a classe hospitalar a

partir das percepções dos envolvidos: professor, aluna / paciente e o profissional da área de

saúde. Trata-se de uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória em que utilizei a entrevista e

observações como fonte de dados.

Foram consideradas nessa pesquisa, portanto, as impressões dos sujeitos entrevistados

e envolvidos no contexto, isto é a aluna / paciente nomeada Lua, a professora nomeada Estrela

e a profissional da área de saúde nomeada Vênus.

A partir destas reflexões o presente trabalho pretende através da abordagem teórica

fundamentada sobre a temática e pesquisa de campo realizada na Casa de Apoio Erik Loeff,

realizar um diagnóstico sobre o atendimento ao educando com necessidades educacionais em

classe hospitalar.

Num primeiro momento, o estudo discorre sobre os conceitos de classe hospitalar, um

breve histórico da educação especial, os aspectos históricos da classe hospitalar e o que diz a

legislação e os direitos da criança e adolescente hospitalizados. A seguir, descreve a Prática

Pedagógica em Classe Hospitalar e suas especificidades. E finalmente, busca refletir os dados

obtidos com os entrevistados no que concerne às contribuições do processo de escolarização

da criança doente.

Para tanto, autores como Ceccim (1999), Fonseca (2000), Fontes (2007), Freire

(1996), Gabardo (2004), Porto (2008), dentre outros, assim como a análise de documentos

oficiais como, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Estatuto da Criança

e do Adolescente (ECA), Política Nacional de Educação Especial. Brasília : Secretaria de

Educação Especial, 1994 deram fundamento ao marco teórico conceitual.

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2 O QUE É CLASSE HOSPITALAR

Este primeiro capítulo traz importantes considerações acerca da temática sobre

escolarização de crianças que se encontram impossibilitadas de estudar em ambiente

“convencional”, bem como, oportunamente vem nos mostrar que não se trata de caridade ou

assistencialismo, oferecer a criança durante o seu processo de adoecimento a continuidade dos

seus estudos em ambiente hospitalar ou domiciliar. Nos tópicos a seguir haverá algumas

abordagens sobre o conceito da terminologia Classe Hospitalar, um breve histórico da

Educação Especial, os aspectos históricos da Classe Hospitalar e finalizando este capítulo

trataremos dos aspectos legais e os direitos da criança hospitalizada.

Classe Hospitalar é um espaço dentro do hospital com propostas pedagógicas

destinadas às crianças e aos adolescentes em tratamento médico ou após o seu término, que

possui como principal objetivo propiciar a continuidade da escolarização da criança doente.

A hospitalização na infância pode alterar significativamente o desenvolvimento infantil, uma vez que restringe as relações de convivência da criança por afastá-la de sua família, de sua casa, de seus amigos e também de sua escola. Num ambiente onde a dor e a doença são presenças constantes, ela passa a ter contato com uma realidade que não estava acostumada. (GABARDO e MEDEIROS, 2004, p.65).

Como podemos observar, a rotina de uma criança durante o seu período de internação,

sem dúvidas não é uma situação das mais confortáveis, visto que há uma carência de

estímulos capazes de promover o desenvolvimento psíquico e sensório-motor infantil. Por

esta razão, faz-se necessário através das propostas desta modalidade de ensino, desmistificar

toda concepção negativa que o ambiente hospitalar traz, para uma melhor aceitação da criança

em relação a sua hospitalização.

Para Freitas e Ortiz (2001, p.71-72), falar em escola, no hospital, veicula uma

aparência de normalidade na anormalidade. A situação de enfermidade dilui-se na tentativa de

tornar bom o desagradável. Nesse contexto, a intervenção pedagógica se constitui como uma

força motriz para superação mesmo que provisória dos momentos dolorosos dos

procedimentos no tratamento médico, bem como oportuniza o contato com o saber. Que por

sua vez, é um velho conhecido da criança dentro da sua realidade fora do hospital.

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A educação no hospital pode oportunizar o desenvolvimento cognitivo e psíquico do

aluno / paciente, atuando diretamente na questão afetiva e intelectual durante o adoecimento,

que por sua vez acaba adquirindo características peculiares em decorrência da experiência

vivenciada no contexto hospitalar pelo discente. Durante o tratamento, o aluno não tem a sua

escolarização prejudicada e o seu ano letivo comprometido, pois a existência da classe no

hospital propicia que sejam superados e minimizados os efeitos oriundos do seu afastamento

da escola.

Para Fontes e Vasconcelos (2007, p.296), a hospitalização é uma situação que altera a

rotina da criança e sua família. É natural à criança apresentar uma fragilidade emocional que

pode prejudicar a sua compreensão do real. Por isso, refletir sobre as causas que estão na

origem da emoção é uma das funções da educação no hospital.

Não há como negar que o professor da classe hospitalar será o maior responsável em

possibilitar que a criança possa ser tratada de seu problema de doença, sem esquecer as

necessidades pessoais. Além disso, o contato com a escolarização em ambiente hospitalar faz

do hospital uma agência educacional para que se desenvolvam atividades que permitam à

criança a construção de um percurso cognitivo, emocional e social para manter uma ligação

com a vida familiar e a realidade no hospital. No que se refere às estratégias de crescimento

cognitivo e intelectual, a Classe Hospitalar vem oferecer à criança ferramentas de

comunicação com sua realidade familiar, com outras pessoas de sua idade e com outros

pacientes. Por outro lado, oferece situações de jogos e entretenimentos que garantem a

continuidade didática com a escola de origem, favorecendo a criança e a família o

aprendizado de novos ritmos e novos projetos de vida enquanto está internada. Conforme

elucida Fonseca (1999, p.33):

A classe hospitalar ratifica e afirma o acesso da criança ou adolescente aos direitos de cidadania relativos à saúde e à educação, conforme estipulam a Constituição Nacional, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei Orgânica da Saúde e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em que o atendimento a saúde deve ser integral (promoção, prevenção, recuperação, reabilitação e educação da saúde) e a educação escolar deve ser adequada às necessidades especiais dos educandos (criação de processos de integração entre sociedade, instituições e escolas e provisão de meios para a progressão pedagógico-escolar sistemática).

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Para Fonseca, enquanto a escola, a família e a sociedade, todos precisam se empenhar

na construção das condições necessárias, de modo a tornar acessível a qualquer aluno,

independentemente da necessidade educacional que o mesmo possa vir a apresentar, o seu

direito à educação, que se configura como um direito à aprendizagem e a escolarização.

Vale destacar que no ambiente hospitalar é dada uma relevante importância ao lúdico e

ao brincar para promoção da saúde, mas estes não substituem e não dispensam a necessidade

da abordagem das questões didático-pedagógicas.

Por outro lado, no momento da estruturação física do ambiente escolar no hospital,

três pontos são observados e são de fundamental importância: ser atrativa, ter aparência de

uma sala de aula e obedecer às normas da Comissão de Infecção Hospitalar.

As salas devem estar organizadas com mesas, cadeiras, quadro branco, estantes,

televisor, vídeo, computadores, som, jogos, colchonetes, suporte para soro, telefone,

brinquedos, livros de literatura, livros didáticos, mapas, material didático, materiais de sucata,

entre outros.

Vale mencionar que muitas crianças realizam atividades escolares mediadas pelo

professor no próprio leito, em virtude das limitações impostas pela enfermidade que possuem.

Nestes casos, embora esses alunos não possam utilizar os recursos didáticos disponibilizados

na classe existente no hospital o (a) professor (a) busca realizar atividades que contemplem a

leitura de histórias para o desenvolvimento de determinadas habilidades tais como a

imaginação, a criatividade e a linguagem oral da criança. No quesito planejamento, embora o

(a) professor (a) já tenha elaborado previamente as atividades que serão realizadas, este

precisa ser bastante flexível e passível de modificações emergenciais para que possa atender

satisfatoriamente os anseios e questionamentos do público a que se destina, pois em muitas

situações o professor se depara com diversos questionamentos dos alunos que buscam retirar

dúvidas e obter informações sobre a sua doença. Fontes e Vasconcelos (2007, p.285), falam

da importância e ao mesmo tempo da falta de informação prestada a criança em relação ao seu

estado de saúde quando nos diz que:

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A formação dos primeiros conceitos relacionados à doença da criança hospitalizada se dá comumente a partir do discurso dirigido ao seu acompanhante ou a outro membro da equipe de saúde; raramente é dirigido à própria criança, numa linguagem em que ela possa compreender.

Conseqüentemente, é necessário que o profissional atuante nesta modalidade de ensino

seja submetido a uma capacitação e preparo psicológico adequado para saber a melhor forma

de lidar com essa demanda.

Mesmo doente, elas continuam interagindo, apropriando-se das informações disponíveis no meio e transformando-as em conhecimento.O papel da educação é, então, estimular essa construção, possibilitando a cada criança uma reflexão sobre o meio, sua doença, seus sentimentos e ajudando-as a entender o que acontece ao seu redor. Dessa forma, a educação no hospital pode fortalecer a auto-estima das crianças para o enfrentamento da situação de hospitalização (FONTES e VASCONCELLOS, 2007, p.281).

Para que tal situação se concretize, inicialmente o (a) professor (a) necessita ter acesso

às informações prévias em relação ao estado de saúde da criança, fazendo uma leitura do

prontuário do aluno paciente, para a partir daí tomar conhecimento sobre a doença, evolução,

prognóstico, bem como sobre as informações prestadas pelo próprio aluno e pelo seu

acompanhante quanto às experiências escolares vivenciadas antes do internamento. Tais

informações, serão de suma importância e consideradas na elaboração do planejamento e na

realização do seu trabalho como docente, pois a assistência pedagógica do profissional de

educação no hospital se ocupa não apenas com as operações cognitivas, mas também com as

operações pedagógicas do aprender e realizando intervenções para superar os problemas de

aprendizagem freqüentes em crianças que se afastam da escola.

A partir destas considerações conclui-se pertinentes as considerações de Gabardo e

Medeiros (2004, p.66) em relação à importância da atuação do professor na classe hospitalar

quando nos diz que “[...] o processo de ensinar-aprender, nesta perspectiva, corresponde,

respectivamente, ao que faz um professor e à conseqüência que este produz no

comportamento do aluno”.

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Quanto mais abrangente for o conhecimento do professor a respeito da realidade e

possibilidade do aluno, mais apto ele estará para planejar condições eficazes de aprendizagem

e saber lidar com as particularidades sem maiores dificuldades.

2.1 BREVE HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

A Educação Especial responde à necessidade de proporcionar a igualdade de

oportunidades, mediante a diversificação dos serviços educacionais prestados, de modo a

atender às diferenças individuais dos alunos. Coloca à disposição dos alunos com

necessidades especiais que possuam algum déficit, carência, disfunção ou limitação física,

sensorial ou psíquica, elementos que possibilitem um satisfatório e adequado

desenvolvimento pedagógico.

Trata-se de uma modalidade de ensino assegurada no Sistema Educacional dos

diferentes níveis, que procura promover o desenvolvimento pleno dos portadores de

necessidades educacionais especiais e está assegurada na Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional nº 9394 de 20/12/1996, Cap. 5. Seu objetivo é garantir o acesso e a

permanência de alunos em todas as etapas da educação, constituindo-se de uma proposta

pedagógica que assegura recursos, serviços de apoio para complementar, suplementar e

substituir serviços educacionais comuns. Por essa razão é oportuno afirmar que as escolas não

devem se adaptar a doença, mas sim encontrar mecanismos capazes de oportunizar a sua

devida e adequada superação.

Sendo o aprendizado, o principal objetivo da escola, este precisa ser visto como

poderosa força que direciona todo o desenvolvimento da criança, inclusive para aquela com

necessidade educacional especial e no contexto hospitalar.

A educação especial possui estreita ligação com os interesses dos docentes visto que

surge da necessidade e importância de que seja prestado um atendimento pedagógico

satisfatório, para aqueles que não se adaptam aos recursos educacionais oferecidos. Nesse

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sentido, oferece mecanismos para disponibilizar aos discentes, recursos educacionais

adequados que contemplem possíveis necessidades especiais.

A declaração de Salamanca (1994, p.01), vem reforçar junto à sociedade o seu

compromisso com a Educação Especial ao reconhecer que:

Toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; Toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas; Sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam ser implementados no sentido de se levar em conta à vasta diversidade de tais características e necessidades; Aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de satisfazer a tais necessidades; Escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional.

Durante muitos anos, a educação especial foi vista dissociada das classes regulares,

mas contemporaneamente passou a ser vista no contexto da educação regular, com a

implantação de uma proposta conhecida como Educação inclusiva que visa promover a

inserção dos alunos com necessidades especiais em classes regulares.

Ao realizarmos uma breve retrospectiva sobre a Educação Especial no nosso país, vale

ressaltar que vivenciamos fases como da negligência, da omissão em relação ao deficiente e

posteriormente com a implantação da Constituição de 1988, foi defendida a integração

escolar, enquanto preceito constitucional, na rede regular de ensino.

A efetivação de uma prática educacional inclusiva não será garantida por meio de leis, decretos ou portarias que obriguem as escolas regulares a aceitarem os alunos com necessidades especiais, ou seja, apenas a presença física do aluno deficiente mental na classe regular não é garantia de inclusão, mas sim que a escola esteja preparada para dar conta de trabalhar com os alunos que chegam até ela, independentemente de suas diferenças ou características individuais (MIRANDA, 2003, p.06).

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Neste contexto, a busca de conhecimento, seguida de uma revisão da prática,

constituem-se em importantes critérios para que mudanças qualitativas, no sentido de uma

educação inclusiva, não se restrinja apenas à escola convencional, mas também possibilitando

essa prática em ambiente hospitalar através da escola no hospital. Conseqüentemente o

favorecimento da aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais especiais

condiciona-se, sobremaneira, pela concepção, preparo e sensibilidade dos (as) professores (as)

em relação aos elementos que envolvem o processo de aprendizagem.

Desta forma, a educação especial não se justifica a não ser como utilização de

mecanismos e recursos que não estão disponíveis na escola comum e que são essenciais a

alunos com necessidades educacionais específicas.

Na verdade, a sociedade precisa compreender que a lei assegura igualdade de direito

aos indivíduos com necessidade especiais visto que são seres humanos dotados de inúmeras

possibilidades a serem exploradas no trabalho educativo e não há nada que possa justificar o

seu isolamento do convívio com outras pessoas dentro ou fora da escola. Salvo em situações

onde este convívio por algum motivo de ordem física (acessibilidade) ou mão de obra não

qualificada que possa vir a prejudicar o desenvolvimento das potencialidades destes alunos.

Portanto, alguns fatores precisam ser levados em consideração no processo, pois a educação

especial, carece de condições mínimas para adaptação do aluno em determinadas

circunstâncias.

Sem dúvida, a inclusão se faz necessária e deve se tornar realidade em todas as

instituições de ensino, seja ela pública ou privada, a fim de que as nossas escolas possam se

configurar como um espaço democrático e que não seja excludente.

A educação especial pode atuar em outros ambientes que não sejam as instituições

escolares propriamente ditas, a exemplo da classe hospitalar, desde que esta atenda aos

interesses e anseios do aluno a ser assistido.

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2.2 ASPECTOS HISTÓRICOS DA CLASSE HOSPITALAR

O modelo de classe hospitalar teve sua origem em Paris no ano de 1935, com a

inauguração da primeira escola destinada a crianças com necessidades educacionais especiais

e serviu de exemplo para implantação deste modelo na Europa, nos Estados Unidos e

Alemanha. (VASCONCELOS, 2006, p.01).

A segunda guerra mundial tornou-se um grande marco, isto é, um divisor de águas no

que se refere à implantação da escola em ambiente hospitalar, visto que as crianças vitimadas

pela guerra que se encontravam impossibilitadas por motivo de saúde de freqüentar as aulas,

tinham a sua escolarização continuada no hospital.

No Brasil, o trabalho pedagógico-educacional desenvolvido no ambiente hospitalar

teve seu início no Hospital Municipal Jesus, hospital público infantil que desde o dia 14 de

agosto de 1950 na cidade do Rio de Janeiro, vem prestando assistência educacional à criança

hospitalizada e tornou-se referência para outras classes hospitalares no restante do país.

A partir do ano 1981, observa-se um aumento significativo no atendimento em Classe

Hospitalar e tal fato deve-se a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em pesquisa

realizada pela Professora Drª Eneida Simões da Fonseca em 1998, foram detectadas 30

Classes Hospitalares em todo o território brasileiro com predominância na região sudeste.

(FONSECA, 1998, p. 121-122).

Vale destacar que o MEC (Ministério da Educação e Cultura) instituiu como

terminologia oficial para o trabalho pedagógico desenvolvido em hospitais como Classe

Hospitalar e não o da Pedagogia Hospitalar, por considerar que esta última possui

características muito amplas, mas que por sua vez incorpora os conceitos de Classe Hospitalar

(FONTES, 2005, p.22).

Desde o surgimento desta modalidade de ensino, observa-se que embora a educação

no hospital seja um direito e que traz consigo inúmeros benefícios, na prática nem todas as

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crianças desfrutam deste tipo de atendimento. Não podemos negar que muitos avanços

ocorreram desde o seu surgimento, mas ainda é fato a necessidade de ampliação da oferta

deste tipo de assistência à criança internada no nosso país.

2.3 LEGISLAÇÃO E DIREITOS DA CRIANÇA HOSPITALIZADA

O acesso à educação se configura como um direito, esteja à criança e o adolescente

hospitalizados ou não. Por esta razão, torna-se de suma importância mencionar, ainda que de

forma breve, as leis que asseguram esse direito.

A nossa carta magna de 1988, em um dos seus artigos legitima que “a educação é um

direito de todos”, assim sendo, a criança hospitalizada faz jus a este direito e o governo não

deverá medir esforços para assegurar a sua aplicabilidade. Conforme o seguinte artigo:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Por sua vez, o Estatuto da Criança e do Adolescente Lei 8069 de 13 de junho de 1990,

estabelece que seja garantido o direito à criança e ao adolescente que se encontram no

contexto hospitalar, conforme os artigos a seguir:

Art. 11. É assegurado atendimento integral à saúde da criança e do adolescente, por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantido o acesso universal e igualitário às ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde. Art. 57. O poder público estimulará pesquisas, experiências e novas propostas relativas a calendário, seriação, currículo, metodologia, didática e avaliação, com vistas à inserção de crianças e adolescentes excluídos do ensino fundamental obrigatório. Art. 58. No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade da criação e o acesso às fontes de cultura.

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Este último artigo deixa explícito que a criança quando afastada da escola por motivo

de saúde não deve ter a sua aprendizagem, muito menos o seu tratamento médico prejudicado.

Conseqüentemente prevê que todos os esforços sejam empenhados no intuito de que seja

assegurado este direito.

Neste contexto, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente na

Resolução de Nº 41/95 assegura, o “direito de desfrutar de alguma forma de recreação,

programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo escolar durante sua

permanência hospitalar”.

Por sua vez, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional em 1996 propõe que

sejam garantidas oportunidades para as crianças e jovens hospitalizados, para que não seja

perdido durante o período de afastamento por motivo de doença, o elo do aluno em tratamento

médico com a escola. Além disso, a lei determina que este serviço poderá ser ofertado em

outros ambientes, quando houver qualquer impossibilidade nas classes regulares. Tais direitos

são descritos da seguinte forma:

Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para educandos portadores de necessidades especiais. §1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender as peculiaridades da clientela de educação especial. §2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular.

Deste modo, os alunos que necessitam de um acompanhamento pedagógico hospitalar

de acordo com as suas necessidades, com base no que preconiza de forma clara o Art 58 §2º,

não ficarão sem a devida assistência.

Ceccim (2000, p.55), nos apresenta uma significativa contribuição acerca da

importância da assistência aos alunos / pacientes quando diz que:

O reconhecimento de que todas as crianças apresentam necessidades educacionais próprias ao seu desenvolvimento integral, implica o reconhecimento de que o projeto terapêutico disponibilizado às crianças

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hospitalizadas inclui o atendimento pedagógico no ambiente hospitalar durante a sua internação para tratamento de saúde.

Entendo que a melhoria e expansão da educação em Classe Hospitalar está muito além

do que estabelece o direito à educação e o direito a saúde, pois ela deverá ter como premissa

básica o reconhecimento da importância e necessidade do atendimento intelectual e sócio-

interativo da criança internada.

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3 A PRÁTICA PEDAGÓGICA EM CLASSE HOSPITALAR

O referido capítulo e os tópicos que o sucedem, vem elucidar os aspectos mais

significativos que contemplam a prática pedagógica em Classe Hospitalar e traz a tona

questões sobre a formação docente dos que atuam com os alunos / pacientes, o relato da rotina

do trabalho pedagógico, e como se dá a importante relação entre a docente e o aluno /

paciente em um contexto onde se faz tão presente a dor, o sofrimento e por muitas vezes o

sentimento de impotência frente aos tratamentos médicos tão invasivos que acabam por

propiciar o afastamento da criança dos seus familiares, dos seus amigos, da sua escola, da sua

rotina e da sua vida antes do adoecimento.

3.1 FORMAÇÃO PROFISSIONAL PARA O TRABALHO PEDAGÓGICO

NA CLASSE HOSPITALAR

O processo de adoecimento traz fortes conseqüências à saúde emocional da criança.

Por essa razão, é de suma importância que os profissionais em ação multidisciplinar busquem

compreender a situação vivenciada pelo aluno / paciente e possibilitem situações de

aprendizagem na classe hospitalar.

A nomenclatura classe hospitalar não se restringe apenas à denominação do espaço

físico, mas sim qualquer espaço onde seja possível a realização de atividades pedagógicas que

promovam o desenvolvimento cognitivo e potencialidades dos alunos que se encontram

internados ou em tratamento prolongado, tais como: bibliotecas dos hospitais, refeitórios em

horários ociosos, casas de apoio, ambulatório e leitos.

Algumas premissas em voga que apontam para a superação do modelo tradicional de escola, como respeito pelo ritmo próprio de cada aluno, vinculação dos conteúdos à realidade vivida e educar mais do que apenas ensinar conceitos e noções, devem ser reforçadas nas circunstâncias em que o aluno é ao mesmo tempo um paciente. Ao se tentar reproduzir uma prática educativa que satisfaça as condições de um contexto hospitalar, deve se manter o cuidado atento para que não seja importado do contexto escolar o que há de ultrapassado e decadente. (BARROS, 1999, p.87).

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Assim, o hospital é um ambiente que se difere da escola e por essa razão faz-se

necessário uma adaptação da prática docente para atuação neste contexto. “Falar em educação

pautada na atenção à diversidade é falar, também, em práticas educativas em espaço não-

convencional e professor, igualmente, não convencional” (Freitas e Ortiz, 2001, p.74). Neste

ambiente, onde se exclui a rotina de qualquer indivíduo, a singularidade do hospitalizado fica

limitada ao seu leito.

Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática. O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. (FREIRE, 1996, p.39).

Assim como nas classes regulares o trabalho docente em ambiente hospitalar exige

preparo profissional e afetivo em virtude dos diversos perfis, doenças e fragilidades que os

alunos possam apresentar. Por esta razão, muitos professores acabam por desistir de atuar com

esse perfil de discentes, por que não se encontram preparados para lidar com um público tão

heterogênio.

Assim como em diversas instituições, o ambiente hospitalar possui normas e

procedimentos que devem ser cumpridos, com o objetivo de cumprir o andamento das suas

atividades dentro da mais absoluta tranqüilidade. Neste sentido, Porto (2008, p.51-52) nos

apresenta algumas normas de conduta a serem observadas também pelo docente que trabalha

na classe hospitalar para o bom andamento do seu trabalho, tais como:

Observar todos os setores e a dinâmica hospitalar: rotinas médicas da equipe de enfermagem, procedimentos, hora das refeições, hora de visita. Não interferir no trabalho de outro profissional, você pode até discordar; Dependendo do tipo de hospital, seja geral, especializados em determinadas patologias, procure sempre estudar sobre as doenças ale encontradas porque, em nossa profissão iremos sempre encontrar barreiras. É este estudo o constante aperfeiçoamento que farão o nosso diferencial como profissionais; Entre no hospital com um sorriso no rosto, procurando diluir o clima que quase sempre é pesado, distribua energia positiva; Leia sempre os prontuários para ver a evolução do quadro e as recomendações médicas; Importante: quem transmite notícias de doença e de morte, quando for o caso, é o médico.

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É importante esclarecer que as potencialidades apresentadas pelos professores desta

modalidade de ensino, não foram construídas únicas e exclusivamente a partir da sua

formação como educadores, muito menos da sua formação continuada, mas sim dos saberes

adquiridos através da sua prática.

[...] o repensar a concepção da formação dos professores, que até a pouco tempo objetivava a capacitação destes, através da transmissão do conhecimento, a fim de que "aprendessem" a atuar eficazmente na sala de aula, vem sendo substituído pela abordagem de analisar a prática que este professor vem desenvolvendo, enfatizando a temática do saber docente e a busca de uma base de conhecimento para os professores, considerando os saberes da experiência. (NUNES, 2001, p12).

Neste sentido, os saberes vão sendo construídos ao longo da carreira docente, partindo

da reflexão gradativa da sua prática, tendo em vista a necessidade de melhorias constantes na

sua atuação como educador.

Exceto o Hospital Sarah Kubitschek, que é o único hospital que realiza concurso

público destinado a pedagogos, nas demais Classes Hospitalares em funcionamento na cidade

de Salvador-Ba, destacam-se alguns requisitos obrigatórios para que o profissional possa fazer

parte do seu quadro funcional. Onde se faz necessário possuir graduação completa no curso de

Pedagogia e que seja professor(a) concursado do município. Este último deve-se ao convênio

entre a Secretaria Municipal de Educação, Cultura, Esporte e Lazer (SECULT) juntamente

com o Instituto Escola Hospitalar e Domiciliar Criança Viva, sob a coordenação da

idealizadora e responsável pelo instituto a Pedagoga Sra Veruska Andrade.

Vale destacar, que a professora Veruska Andrade não possui qualquer vinculo com os

hospitais públicos onde são ministradas as aulas para os alunos pacientes, sua função se

restringe apenas ao ato de coordenar as atividades realizadas com os alunos hospitalizados e

capacitar os professores do município que exercem a docência na Classe Hospitalar, através

do curso de extensão denominado, Atendimento Escolar no Ambiente Hospitalar, com carga

horária de 80h. O referido curso é regulamentado e validado pela Faculdade da Cidade de

Salvador. Cabendo ao Instituto Escola Hospitalar Criança Viva como gestora, a

responsabilidade de promovê-lo nas dependências da faculdade no bairro do Comércio. As

aulas são ministradas por docentes graduadas em Pedagogia, com curso de especialização na

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área de Psicopedagogia institucional e clínica que por sua vez também atuam como docentes

nas classes hospitalares coordenadas pelo instituto. O custo é de R$ 80,00 (Oitenta Reais),

incluindo todo material didático necessário disponibilizado aos alunos do curso via e-mail,

exceto o avental que deve ser adquirido no valor de R$ 25,00 (Vinte e Cinco Reais),

indispensável para frequentar o estágio na Classe, a fim de que o estagiário possa ser

identificado e adequadamente trajado nas dependências do hospital ou Casas de Apoio.

Os candidatos interessados em lecionar em uma das classes hospitalares existentes na

cidade de Salvador, além dos requisitos básicos citados são submetidos à entrevista prévia

pela coordenação do Instituto Criança Viva, para que seja avaliado o perfil dos interessados

em atuar nessa modalidade de ensino.

3.2 A ROTINA DOCENTE COM OS ALUNOS / PACIENTES

A prática pedagógica em Classe Hospitalar tem como princípio básico trabalhar as

potencialidades, desenvolvendo atividades onde mesmo estando doentes as crianças sejam

capazes de realizá-las sem comprometimento do seu estado de saúde. No ambiente hospitalar,

aprendizagem é uma forte aliada, a criança precisa percebê-la como algo que não está

relacionada à idéia de doença, mas sim ao que é saudável.

O trabalho pedagógico no contexto hospitalar possui contornos próprios e condutas

específicas que precisam estar adequadas ao espaço físico que ocupa, aos recursos que dispõe

e, sobretudo, aos anseios dos alunos / pacientes. Além disso, deve-se tomar como base uma

abordagem lúdica articulada ao conhecimento. Na visão de Freitas e Ortiz (2001, p. 74), “As

práticas das Classes Hospitalares devem estar centradas em encaminhamentos pedagógico-

educacionais que não deixam de incluir programações lúdico-educativas”.

As práticas pedagógicas realizadas com as crianças hospitalizadas se possível devem

estabelecer um elo com a escola já freqüentada pelo aluno / paciente antes da sua internação,

tendo em vista a importância de dar continuidade aos conteúdos da série em que se

encontravam antes do adoecimento. Além disso, não podemos deixar de considerar o caráter

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terapêutico da Classe em oportunizar aos seus alunos um enfrentamento em relação ao seu

estado de saúde. Neste contexto, Barros (2007, p.03) nos diz que:

O atendimento prestado em uma Classe Hospitalar é, também, fator que contribui para o enfrentamento do estresse da hospitalização. Esta contribuição é, em parte, alcançada graças ao significado e ao valor simbólico da escola na composição das experiências infantis e juvenis que, então resgatadas apesar da condição de hospitalização, reequilibram o desenvolvimento psíquico daquelas crianças e adolescentes.

Por outro lado, as intervenções no contexto hospitalar são marcadas pela

aplicabilidade do elemento lúdico, onde se utiliza fortemente a criatividade do aluno /

paciente como ferramenta no processo de ensino aprendizagem, que acaba por favorecer no

êxito do tratamento que a criança está sendo submetida.

Aparentemente nem sempre sente-se a exata dimensão do resultado desse tipo de trabalho, devido ao curto período da atuação do profissional com a criança, porém, as sementes são lançadas e criam raízes profundas que com certeza contribuirão muito para o desenvolvimento integral do educando, a superação de suas dificuldades e para o aumento de sua auto-estima. (SILVA, 2000, p.32).

A rotatividade dos alunos é outro ponto que merece destaque na Classe hospitalar, pois

cada criança possui um tempo de internamento diferenciado, o que acentua a preocupação de

se obter o objetivo almejado em um curto espaço de tempo. Além disso, trata-se de uma

classe multisseriada onde as demandas pedagógicas também são bastante distintas.

[...] A função do professor de classe hospitalar não é a de apenas “ocupar criativamente” o tempo da criança para que ela possa “expressar e elaborar” os sentimento trazidos pelo adoecimento e hospitalização, aprendendo novas condutas emocionais, como também não é a de apenas abrir espaços lúdicos com ênfase no saber pedagógico para que a criança “esqueça por alguns momentos” que está doente em um hospital. O professor deve estar no hospital para operar com processos cognitivos afetivos de construção da aprendizagem cognitiva e permitir aquisições escolares às crianças[...] (CECCIM, 1999, p.03).

O professor precisa ter clareza do seu papel como educador e o entendimento de que a

sua prática no hospital não deve ser confundida como uma recreação e muito menos deve ser

vista como uma forma de ocupar o tempo ocioso da criança. É preciso saber como utilizar

ferramentas como a recreação e demais elementos presentes na rotina da criança

hospitalizada, a serviço do trabalho educacional que se pretende realizar. O aluno recebe

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estímulos que propiciam a solução de problemas e o desenvolvimento do raciocínio lógico

que ajudarão a minimizar os efeitos oriundos da internação.

[...] Ao fazer uma brincadeira, ao levar um brinquedo, um livro, um jogo, lápis e papel, ele vai envolvendo a criança, até conquistar sua confiança. Depois ela vem pedir outro lápis, outra folha... Ela própria procura o professor. Esse é um processo de sedução que tem que envolver os pais também [...] (FONTES, 2005, p.27).

O ponto de partida para o trabalho na Classe Hospitalar ocorre a partir de uma

entrevista com o aluno / paciente, cujo objetivo é realizar uma breve sondagem em relação a

vida escolar da criança ou adolescente hospitalizado, identificando as suas preferências, as

suas expectativas em relação a classe, enfim buscando aproximar-se deste sujeito para que se

possa dar inicio ao seu processo de escolarização.

Assim sendo, é indispensável que o primeiro contato do professor para o início da

prática pedagógica no hospital deve partir de um convite sutil. De forma gradativa, a criança

vai sendo seduzida por um ambiente colorido, acolhedor que a remete a uma realidade fora do

hospital. Neste prisma, Fontes (2005, p.27) nos diz que:

O importante é não excluir a criança que está no leito, mesmo que ela não possa se locomover. Deve-se ir até o seu leito, deixar uma atividade com ela e voltar para a sala de recreação, retornando, de vez em quando, para ver se ela precisa de alguma coisa, se quer trocar um brinquedo ou o livro.

A criança internada que por algum motivo não possa freqüentar a Classe por

impossibilidade de se ausentar do leito, não deixa de usufruir desta modalidade de

atendimento pedagógico oferecido pelo professor em ambiente hospitalar. Por esse motivo,

estas crianças devem ser assistidas, desde que sejam cumpridos os mesmos critérios de

contato inicial aplicado com o alunado que freqüenta a classe, mas nesse caso as atividades

serão realizadas no leito com o acompanhamento do docente.

Toda atividade realizada com o aluno hospitalizado deve ter início, meio e fim. O

propósito desta conduta é avaliar em curto prazo os avanços obtidos com as crianças e se for o

caso realizar possíveis adaptações no planejamento inicial. É preciso que o professor se

informe com antecedência acerca do estado de saúde da criança doente, verificando o

prontuário e ampliando o seu conhecimento a respeito da doença, bem como se possível

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estabelecer contato com a escola de origem para dar continuidade aos conteúdos que estão

sendo trabalhados fora do contexto do hospitalar.

O estresse da hospitalização composto pela angústia da definição diagnóstica, evolução prognostica, ansiedade pela resposta do organismo, a terapêutica empreendida e o afastamento do lar são eventos desruptivos. Nestas condições, exigências acadêmicas formais, com programas curriculares de cursos a cumprir, associados à demanda, geralmente familiar, para que o jovem paciente não sofra reprovação no ano letivo cursado, podem se somar àquele estresse já estabelecido pela hospitalização. (BARROS, 1999, p.12).

A partir do convite inicial feito ao aluno / paciente para participar das atividades na Classe, a abordagem pedagógica ocorre em grupo com o propósito de fazer com que as crianças possam interagir e socializar conhecimentos. Posteriormente, as crianças serão instigadas a se expressar através de desenhos ou histórias. “É dessa forma que se vai introduzindo sutilmente uma atividade pedagógica sistematizada num contexto, de brincadeira”

Em verdade, no que se refere ao planejamento das atividades, este sem dúvidas deve

ser flexível, sempre levando em consideração a relevância do conteúdo, a faixa etária e

situações adversas de um público tão heterogêneo, que permita a análise de uma possível

reestruturação. O planejamento precisa ser elaborado fazendo com que o aluno possa

caminhar respeitando o seu próprio ritmo. Não existe um planejamento perfeito e um roteiro a

ser seguido, mas sim desafios a serem traçados, através de recursos individualizados.

O planejamento precisa ser feito, mas deve ser bem flexível e é regulado pelo interesse e disposição da criança. Deve-se lembrar que as atividades muito longas podem ser cansativas para a criança fragilizada pela doença. Muita atenção precisa ser dada ao prontuário médico para saber o que a criança pode fazer ou não fazer, se ela pode, por exemplo, participar de trabalho corporal, de uma dança [...] (FONTES, 2005, p.27).

3.3 RELAÇÃO DOCENTE X ALUNO / PACIENTE

Para que se construa um conhecimento coletivo, a relação entre a professora e o aluno

/ paciente precisa está pautada no diálogo, despertando no discente o interesse pelo

aprendizado.

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Como toda relação humana, esta também carece de um olhar especial em relação as

pessoas envolvidas, mas no contexto em que elas encontram-se inseridas e fazem parte. Visto

que a depender do ambiente onde essa relação possa ocorrer, iremos nos deparar com

possíveis restrições ou desabrochar de possibilidades.

A responsabilidade do professor, de que às vezes não nos damos conta, é sempre grande. A natureza mesma de sua prática eminentemente formadora, sublinha a maneira como a realiza. Sua presença na sala é de tal maneira exemplar que nenhum professor ou professora escapa ao juízo que dele ou dela fazem os alunos. E o pior talvez dos juízos é o que se expressa na “falta” de juízo. O pior juízo é o que considera o professor uma ausência na sala. (FREIRE, 1996, p.65).

A atitude que qualquer educador (a) precisa desenvolver seja de classe regular e

principalmente da classe hospitalar é a escuta, o acolhimento, indispensáveis na relação com o

seu aluno sadio ou doente, pois somos movidos e envolvidos por emoções e afetos.

O docente que atua na classe hospitalar, por meio de atividades pedagógicas

oportuniza o elo entre a escola e o hospital. Através da sua prática, estabelece uma relação

praticamente individualizada com os seus alunos, oferecendo não só o acompanhamento da

sua escolaridade, como também explica procedimentos médicos e auxilia no processo de

adaptação da criança frente ao internamento.

O professor da classe hospitalar precisa estar preparado para lidar com as demandas,

inquietações e particularidades dos alunos / pacientes, possibilitando a reinserção do aluno

após alta médica, bem como a sua devida adaptação a sua escola de origem.

O aprendizado, enquanto instância individual, tornou-se mais aptos como espécie a sobreviver no mundo; enquanto instância na coletividade, permitiu-nos o educar para viver em sociedade. Antes de tudo, o acontecer dessa relação passa pela alteridade e extrapolando daí para sua inserção na sociedade e vice-versa. Enquanto relação, passa pela interação (como o imaginário social) e a aprendizagem (inteligência e afetividade) os envolvidos. É nesse contexto, no processo relacional com o outro, que o homem busca ser reconhecido como tal, ou seja, é somente pelo olhar da ontologia que se propiciará o homem a ser sujeito e não outra coisa qualquer. (PORTO, 2008, p.23).

Conseqüentemente, a relação professor x aluno deve ser a mais estreita possível, de

modo a possibilitar que o docente conheça o repertório do seu aluno e possa elaborar

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atividades que possibilitem novos aprendizados. Vale destacar que nessa relação, o

comportamento do docente tende a variar à medida que a criança doente interage e participa

ativamente das atividades propostas na classe. “[...] A abordagem procura ser sutil para que a

criança não se sinta obrigada a fazer algo que ela não goste. O importante é proporcionar à

criança o momento de se expressar [...]” (FONTES, 2005, p.28).

Como podemos observar, caso o aluno não queira interagir com o professor, essa

postura deve ser respeitada. O aluno paciente não deve se sentir obrigado a participar das

atividades, muito menos a interagir com os demais colegas da classe.

A criança hospitalizada enxerga o professor como algo que se contrapõe à realidade

vivenciada durante o seu adoecimento, desviando a sua atenção para o estudo e o

aprendizado.

Enquanto a criança doente participar das atividades da classe hospitalar, por um dado

momento ela irá se desvincular das restrições que o tratamento médico a impõe. Tal situação

tende a modificar o estado do aluno de “paciente” para o de “agente” transformador, de uma

realidade dolorosa para qualquer criança durante o processo de hospitalização.

O aprender é processo de significação subjetiva do ser, ou seja, necessita ser exercido com liberdade, e não por imposição, pela simples razão de que, em uma relação dialógica entre sujeitos, sempre ocorrerão como trocas – o processo contínuo de reconhecer o outro. (PORTO, 2008, p. 240).

O papel do professor neste contexto é o de agregar aprendizado e oferecer um novo

sentido à vida do aluno / paciente, considerando que ele não é obrigado a participar das

atividades da classe e por isso, de modo algum estas devem ser impostas. Desta forma, o

docente deverá estar atento às singularidades do seu público e suas necessidades especiais.

Além disso, deverá evitar utilizar-se de atitudes punitivas, recorrendo ao diálogo com o

propósito de superar atitudes imprevisíveis de “mau comportamento” do aluno.

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4 DADOS DA PESQUISA DE CAMPO

Trata-se de uma pesquisa qualitativa do tipo exploratória em que utilizei as entrevistas

realizadas com uma aluna / paciente, duas professoras e profissional da área de saúde e

observações da rotina na classe hospitalar como fonte de dados para condução desta pesquisa.

Tendo em vista a dinâmica da pesquisa e a necessidade de um ambiente a ser

observado, o presente estudo se desenvolveu na Classe Hospitalar da Casa de Apoio Erik

Loeff, situado na Rua Jogo do Carneiro, nº 410, no bairro da Saúde, Salvador-Ba.

Os sujeitos dessa pesquisa foram as docentes, discente e profissional da área de saúde

que compõem o contexto observado na pesquisa, de modo a possibilitar uma análise das

práticas pedagógicas utilizadas com as crianças afastadas da escola por motivo de tratamento

médico, objetivando a percepção dos resultados do método.

Os sujeitos envolvidos nessa pesquisa tiveram a sua verdadeira identidade preservada

e por este motivo foram utilizados nomes fictícios. Assim sendo a discente entrevistada foi

nomeada de “Lua”, a docente entrevistada que leciona na Casa de Apoio, nomeada de

“Estrela”, a docente que atua na classe hospitalar de um hospital público, nomeada “Sol” e

por último a terapeuta ocupacional, nomeada “Vênus”.

A lista de variáveis da pesquisa na classe hospitalar e/ ou domiciliar contempla a

história da criança entrevistada, o trabalho pedagógico das docentes da classe, a relação

professora e aluno / paciente e a relação da professora com os profissionais da área de saúde,

dada a escassez da abordagem deste último aspecto nas pesquisas realizadas sobre esta

temática.

Os instrumentos de pesquisa utilizados neste trabalho foram basicamente roteiro de

entrevista com a coordenação da instituição, aluna / paciente, docentes da classe e profissional

da área de saúde. No que concerne à coleta de dados, procedeu-se através das anotações

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detalhadas contidas no diário de campo e observações da rotina da casa de apoio e

principalmente da classe hospitalar que nela funciona.

Os dados obtidos através da transcrição das entrevistas, bem como a categorização dos

dados coletados a partir de anotações sistemáticas em diário de campo, foi de suma

importância para compor as categorias que se tornaram o foco de reflexão a fim de

fundamentar o trabalho.

Na instituição onde foi realizada a pesquisa de campo, funciona uma das classes

hospitalares existentes na cidade de Salvador. Trata-se de uma casa de apoio que presta

acolhida a crianças e adolescentes do interior baiano vitimadas pela anemia falciforme e os

mais diversos tipos de câncer. Vale destacar que na “casinha”, assim como é carinhosamente

chamada pelos funcionários, voluntários e moradores provisórios, presta acolhida na sua

totalidade a crianças em tratamento contra o câncer. A Instituição pouco tempo depois da sua

criação foi doada para a Santa Casa de Misericórdia, atual responsável pela sua administração.

A referida instituição foi fundada por Srª Solange Ribeiro, esposa do holandês,

radicado na Bahia durante 48 anos o Sr Erik Loeff o idealizador da casa de apoio fundada em

Outubro de 2006. Lamentavelmente, Sr Erik não pôde vislumbrar em vida um projeto social

de tamanha magnitude, mas a Srª Solange cuidou pessoalmente de cada detalhe, motivada

pelo propósito de oferecer moradia e assistência às crianças carentes em tratamento médico,

oriundas de cidades distantes.

A Casa de Apoio Erik Loeff, conta com uma estrutura que possui 12 quartos, para a

criança ou adolescente e seu acompanhante, 09 sanitários, cozinha, brinquedoteca, dispensa,

refeitório, escritório, sala de aula e lavanderia. Esta última destina-se apenas a lavagem de

roupas pessoais daqueles que residem na casa, pois as peças de cama e banho são

devidamente lavadas e passadas no Hospital Santa Izabel, um grande parceiro da casa de

apoio. Além disso, o hospital oferece as crianças residentes na casinha o tratamento de

quimioterapia, radioterapia, acompanhamento nutricional, médico, psicológico e quando se

faz necessário também realiza intervenções cirúrgicas nas crianças e adolescentes em

tratamento.

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No que concerne à estrutura física, trata-se de uma construção antiga, onde a fachada é

a mesma de uma casa convencional na cor rosa. Após a compra do imóvel, a parte interna e

seus cômodos foram submetidos a uma grande reforma, onde foram construídos 12 quartos

que acolhem 24 crianças e adolescentes em tratamento médico com os seus respectivos

acompanhantes. O interessante é que cada quarto possui o nome da pessoa que fez a doação

dos recursos necessários para a construção do cômodo. Uma singela e justa homenagem da

fundadora da Casa de Apoio aos colaboradores e parceiros que contribuíram financeiramente

para concretização deste sonho. Limpeza é algo facilmente notado por aqueles que visitam as

instalações da Casa de Apoio, desde o fardamento das funcionárias até o asseio impecável de

todos cômodos. As funcionárias que manipulam os alimentos na cozinha usam luvas e touca

na cabeça. Além disso, não somente na pia disponibilizada no refeitório como também em

todos os sanitários, utiliza-se apenas sabonete líquido, tendo em vista a fácil proliferação de

bactérias através dos sabonetes em barra.

A sua missão é de acolher a criança doente, encaminhá-la para o tratamento médico

hospitalar e ambulatorial, acompanhar o seu pronto restabelecimento, conceder moradia

gratuita durante todo o tratamento ao paciente e acompanhante, assistência de urgência e

emergência médica (parceria com o Hospital Santa Izabel), seis refeições diárias,

escolarização na Classe Hospitalar, doação de material de higiene pessoal e oferece também

transporte para o deslocamento da criança, para realização de exames e intervenções médicas.

Por esta razão, foi montada uma equipe de funcionários, subordinados e mantidos pela Santa

Casa de Misericórdia composta por duas higienizadoras, uma cozinheira, um motorista e uma

funcionária que coordenadora a Casa de Apoio.

Durante a pesquisa de campo foi possível acompanhar de perto o dia a dia da Casa de

Apoio Erik Loeff e todas as dificuldades enfrentadas por uma instituição filantrópicas, sem

fins lucrativos. A instituição é mantida na sua totalidade por doações de pessoas jurídicas,

físicas e pelo recurso financeiro obtido através da troca de notas fiscais doadas pela

população, que garantem o pagamento de despesas como: água, luz e telefone. Vale ressaltar,

que infelizmente não são todos os meses que se torna possível o pagamento de tais despesas

mensais, tendo em vista que nem sempre as notas arrecadadas semanalmente nas redes de

supermercados são suficientes para levantar a quantia necessária para realização dos

pagamentos mensais. Por essa razão, torna-se inevitável o ato de priorizar o pagamento de

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determinadas contas de consumo e protelar o pagamento de outras em virtude da

impossibilidade financeira da casinha.

O tratamento conta o câncer é prolongado, dura cerca de dois anos e meio, o que

garante a criança um auxílio mensal do governo de um salário mínimo durante o período em

que se encontra sob os cuidados médicos. Essa quantia é muito importante para custear não

somente as visitas eventuais que o paciente realiza a sua cidade de origem, quando reage bem

ao sofrido tratamento, como também possibilita a compra de medicamentos e roupas, enfim o

objetivo é possibilitar uma melhor qualidade de vida a criança.

4.1 A HISTÓRIA DA CRIANÇA “LUA”

Como toda garota de sua idade, Lua é uma adolescente cheia de expectativas em

relação à vida, no auge de seus 16 anos de idade vem cumprindo religiosamente todas as

etapas do seu tratamento contra um câncer na cabeça e tentando se adaptar a sua nova rotina.

Antes da necessidade de buscar tratamento na cidade de Salvador, levava uma vida

tranqüila no interior da Bahia até que a doença deu os seus primeiros sinais: dores de cabeça

eventuais que com o passar do tempo foi se tornando uma constante na vida da adolescente.

Os analgésicos ingeridos a cada nova crise de dor de cabeça já não surtiam o resultado

almejado. Com o agravamento do sintoma inicial Lua perde subitamente a visão. Inicia-se a

maratona com o objetivo de diagnosticar e tratar a doença que causava os sintomas

indesejáveis.

Sem a menor condição financeira, a mãe de Lua é aconselhada por um médico da sua

cidade de origem a deslocar-se para a cidade de Salvador, onde segundo ele apresentava os

recursos necessários para o diagnóstico e tratamento, caso se confirmasse as suas suspeitas de

um tumor na região intracraniana comprimindo a região ocular.

Emocionada, Lua relata todos os percalços que precisou superar juntamente com a sua

mãe até o acolhimento da Casa de Apoio. Inúmeras foram às noites que precisou dormir na

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rua por não dispor de recursos financeiros para custear um local para sua moradia, sem contar

os maus tratos sofridos como moradora de rua. Quando finalmente foi possível o atendimento

médico no Hospital Santa Izabel, a assistente social do hospital intermediou a sua ida para a

Casa de Apoio Erik Loeff.

Desde o diagnóstico a adolescente tem encontrado todo suporte necessário na luta

contra o câncer, desfrutando de todos os recursos oferecidos pela casinha, dentre eles a Classe

Hospitalar que se encontra em funcionamento.

No decorrer da pesquisa de campo foi possível não somente conhecer a história de

Lua, como foi possível à obtenção de informações preciosas sobre o que pensa, como se sente

e as suas expectativas.

Na entrevista a adolescente relatou que só soube da doença quando o diagnóstico se

confirmou pela equipe médica da unidade de onco-hematologia pediátrica Erik Loeff em

funcionamento no Hospital Santa Izabel. Por essa razão, quando foi perguntado se ela sabia

porque estava na casinha, a adolescente respondeu que estava cuidando da saúde.Quando

questionada em relação ao que achava das aulas na classe, Lua se entusiasma e responde:

“gosto muito de frequentar às aulas, não gosto de faltar, só falto quando não tem jeito”. Na

seqüência, quando perguntada se ela se sente melhor quando vai às aulas na classe, relatou a

alegria que sente quando está na classe e a tristeza nos horários em que a classe não funciona,

por que vem às lembranças ruins, a preocupação com a doença e acaba por ficar sem uma

ocupação prazerosa.

Embora a aluna / paciente tenha demonstrado o quanto à rotina na classe interfere

positivamente na maneira como ela se sente desde que veio do interior do estado para cuidar

da enfermidade, quando perguntada do que mais sente falta desde que foi para a casinha, diz:

“sinto falta das minhas irmãs e do meu pai, se toda a família estivesse junta seria melhor”. A

resposta evidencia o quanto é difícil para a adolescente administrar a grande saudade que

sente da sua família e o quanto a valoriza. Como se não bastasse ter que enfrentar uma doença

tão agressiva e os inconvenientes do tratamento, precisa conviver com a saudade dos entes

queridos que estão distantes.

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Quando questionada se achava que estava aprendendo na classe, disse: “sim, estou

aprendendo muitas coisas novas e as aulas ajudam a melhorar as minhas vistas”. No caso de

Lua, o tumor embora tenha sido removido após intervenção cirúrgica, restaram seqüelas,

dentre elas podemos mencionar o comprometimento parcial da visão. Neste sentido, as

atividades pedagógicas realizadas na classe serviram de estímulo para a significativa melhora

na visão da adolescente e na capacidade de raciocínio e memorização, que também haviam

sido afetados pela patologia e intervenção cirúrgica de altíssimo risco.

Quando lhe foi perguntado sobre o que mais gostava nas aulas da classe, a aluna não

hesitou em declarar as atividades relacionadas à disciplina de Matemática, artes e Língua

Portuguesa principalmente.

4.2 O TRABALHO PEDAGÓGICO DA PROFESSORA “ESTRELA” NA

CLASSE HOSPITALAR DA CASA DE APOIO ERIK LOEFF

A classe encontra-se em funcionamento desde 2007, mas a professora entrevistada que

possui 29 anos de idade, leciona há apenas cinco meses na Classe Hospitalar da Casa de

Apoio Erik Loeff, sendo essa a sua primeira experiência com o alunado desta modalidade de

ensino pertencente à educação especial.

Graduada em Pedagogia com habilitação nas séries iniciais, possui uma rotina com

carga horária de 20 horas semanais apenas no turno vespertino e no turno oposto é

coordenadora pedagógica de uma escola do município. Vale salientar que a docente alega

possuir remuneração diferenciada apenas na função de coordenadora pedagógica na outra

instituição que trabalha e finaliza dizendo que recebe a mesma remuneração e benefícios das

professoras concursadas do município que possuem a mesma carga horária de trabalho como

docente.

Para atuação na classe da Casa de Apoio Erik Loeff, assim como todas as professoras

que atuam em Classes hospitalares na cidade de Salvador, realizou em junho de 2008, o curso

de extensão promovido pelo Instituto Criança Viva, cujo título é: Atendimento Escolar no

Ambiente Hospitalar, com carga horária de 80h. Vale lembrar que o Instituto Criança Viva,

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além de promover o curso na área de Classe Hospitalar é o responsável por coordenar as

atividades realizadas nas classes hospitalares em funcionamento nos hospitais públicos e / ou

casa de apoio na capital baiana.

Como todo profissional em educação concursado da prefeitura, a docente entrevistada

recebe remuneração por conta da sua atividade docente na classe, tendo em vista o convênio

entre o Instituto Escola Hospitalar e Domiciliar Criança Viva e a Secretaria Municipal de

Educação, Cultura, Esporte e Lazer (SECULT).

A professora entrevistada quando perguntada sobre o modo como inicia as suas

atividade na classe, relatou que primeiramente verifica o quantitativo de alunos que se

encontram na casa no momento da aula, faz visita aos cômodos, fazendo o convite para que o

aluno participe das atividades na classe.

Quando questionada sobre o que ela faz na classe, respondeu que por iniciativa

própria, inicia a sua rotina com uma oração, na seqüência estabelece uma conversa informal

que ela chama de sondagem, com o objetivo de verificar se haverá necessidade de modificar o

que havia sido planejado no que ela chama de um pré-planejamento.

Tendo em vista, que grande parte das atividades realizadas na sala partem do interesse

dos alunos / pacientes sobre um determinado assunto. A entrevistada exemplificou o ocorrido

através de um fato que havia acontecido no dia anterior, onde estava planejado trabalhar com

medidas de comprimento e os alunos despertaram para uma canção que tocava na rua, como

coincidiu com o gosto musical da maioria que estava presente e todos cantavam em uma só

voz, a professora resolveu direcionar a aula para o interesse despertado pelos alunos,

sugerindo que eles fizessem uma relação das suas músicas e ritmos prediletos, com o objetivo

de trabalhar a escrita e a ortografia dos discentes.

No momento que foi perguntado à entrevistada sobre o que ela faz na Classe,

informou que além de realizar atividades pedagógicas que garantam o aprendizado dos

conteúdos escolares correspondente a idade do aluno / paciente, planeja as atividades, escolhe

os recursos que serão utilizados nas aulas e realiza uma espécie de sondagem de modo a

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identificar diretamente com o aluno o assunto que estava sendo estudado na escola de origem

antes do seu afastamento.

A professora afirmou que com o alunado do ensino fundamental ela investiga

diretamente com o discente o seu aproveitamento ao desenvolver atividades que abordem

conteúdos básicos de Língua Portuguesa que contenham leitura e interpretação de textos,

separação de sílabas, classificação das palavras, gêneros, dentre muitos outros assuntos e na

disciplina de matemática trabalha com conteúdos, a exemplo das quatro operações e

problemas matemáticos.

Para os alunos da educação infantil, a professora declarou que realiza atividades que

contemplam noções de quantidade, numeral, identificação das letras, nomes, desenhos, cores

e histórias infantis. Além disso, trabalha com todo o seu alunado tanto do ensino fundamental,

quanto educação infantil, assuntos emergentes tais como: dengue, meio ambiente, dentre

muitos outros assuntos presentes no nosso cotidiano.

Como se trata de uma classe multisseriada, onde se encontram crianças de idades e

séries distintas, a professora realiza o seu trabalho abordando conteúdos escolares, com base

na série de cada aluno, oferecendo suporte de diferentes níveis.

A docente Estrela quando questionada sobre como são as suas aulas, respondeu que as

aulas são dinâmicas, dialogadas e atraentes. Sem perder o foco, relatou que procura

desenvolver atividades com temas que possam ser adaptados para todas as idades com muita

criatividade, pois reconhece a importância de manter os alunos na sala da forma mais

prazerosa possível.

Em relação aos tipos de atividades desenvolvidas na classe hospitalar, Estrela

respondeu que trabalha com atividades de construção de revistas em quadrinhos, pinturas,

recortes, atividades xerocopiadas ou mimiografadas e construção de painéis.

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Sobre os recursos utilizados durantes às atividades realizadas na classe, a professora

informou que utiliza com os seus alunos, recursos como: revistas, jornais, tintas, lápis de cor,

papel metro, cadernos, aparelho de som, DVD, TV, artigos, brinquedos e livros de história.

A docente quando perguntada quais os benefícios da escolarização hospitalar, nos diz

que:

É o momento que os alunos tem contato com uma realidade não relacionada a sua enfermidade. É uma espécie de estímulo, onde se trabalha com a individualidade e com outros aspectos fora da doença. O aluno / paciente avança não somente no tratamento, mas na escolarização também. Não deixa de ser um suporte psicológico, por que oferece um sentido diferente a vida daquele que sofre com um tratamento doloroso, sem data para terminar e que interrompe a sua rotina existente antes da doença.(ESTRELA, 2009).

As dificuldades encontradas para atuação no ambiente hospitalar, segundo a

entrevistada é a falta de alguns recursos materiais que acaba por limitar a execução de

algumas atividades planejadas para realizar com o seu alunado, mas completa dizendo que

não chega a se configurar como um problema, apenas inviabiliza o diversificar das atividades.

No que concerne à relação entre o professor e os profissionais da área de saúde e como

este profissional percebe o seu trabalho na classe hospitalar, Estrela responde que embora a

existência da classe hospitalar tenha um amparo legal e se configure como um direito da

criança e adolescente hospitalizado, ressaltou que o funcionamento da classe nos hospitais

públicos e casas de apoio, devem-se na maior parte dos casos ao reconhecimento da

importância do trabalho realizado com as crianças e os adolescentes em tratamento médico,

pela diretoria do hospital ou casa de apoio e finaliza dizendo que nutricionistas realizaram

uma palestra na classe, quando estava sendo trabalhado com os discentes o tema alimentação.

Neste contexto é importante mencionar que o respeito ao trabalho realizado pela

professora na classe hospitalar e a contribuição relatada pela docente Estrela em relação à co-

participação dos profissionais da área de saúde, vem sendo conquistada pelas professoras que

trabalham na classe, com muita seriedade, dedicação e eficiência, mas não se trata de um fato

corriqueiro.

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A entrevistada relatou que durante o seu estágio no curso preparatório para a docência

na classe, presenciou atos que demonstram grande desrespeito em relação ao trabalho

realizado pela educadora na classe. Prossegue descrevendo que presenciou muitas

interrupções das atividades por parte do profissional da área de saúde, entra e sai da sala de

aula durante a realização de atividades com os alunos. Isso quando não invadiam a classe e

opinavam nas atividades escolares realizadas com os discentes, pois muitos não conseguem e

não se esforçam para perceber que até mesmo nas brincadeiras e jogos realizados na classe,

possuem um cunho pedagógico e um objetivo específico que pretende ser alcançado.

Complementa fazendo um relato de um fato que aconteceu em uma das classes que

freqüentou no período que fazia o curso de extensão e diz:

Uma certa vez uma médica adentrou na sala de aula, durante o meu estágio como docente na classe e soltou a primeira piada: professora, eu trouxe B para brincar um pouco. E de forma irônica, continuou dizendo: “as crianças estão fazendo dever somente? Cadê os brinquedos e os desenhos?”. (ESTRELA, 2009).

Através deste relato a professora entrevistada quis deixar muito claro que

embora existam intervenções negativas como a que foi relatada, no geral o que se observa em

maior número são mais intervenções positivas do que as negativas. As educadoras estão

procurando se impor como profissionais e mostram na prática, através dos resultados obtidos

com os alunos o verdadeiro valor do seu trabalho com as crianças e adolescentes

hospitalizados.

Hoje quando o profissional da equipe médica entra na classe para observar o quadro

clínico do aluno / paciente e tenta interromper uma atividade, sem qualquer cordialidade e

respeito ao trabalho que está sendo realizado, a docente se manifesta educadamente, pergunta

o nome do aluno / paciente e diz que a criança será encaminhada ao leito.

4.3 SÍNTESE DA ENTREVISTA COM A PROFESSORA “SOL” NO

CONTEXTO HOSPITALAR

Dessa vez a professora entrevistada leciona na classe hospitalar de um hospital público

de grande porte em Salvador, também coordenado pelo instituto Escola Hospitalar e

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Domiciliar Criança Viva. Será preservada a identidade e o nome do hospital onde trabalha a

docente, pois não tenho autorização de mencionar. A relevância desta entrevista deve-se a

importância de se abordar à atuação da professora no contexto hospitalar tendo em vista que

diferente da casa de apoio, a criança e o adolescente internado encontra-se sob cuidados

médicos mais intensos, participando de toda a rotina de um hospital.

Embora a classe hospitalar do Hospital M esteja em funcionamento há três anos, a

docente entrevistada com 30 anos de idade, possui o 3º grau completo em Pedagogia e

especialização em psicopedagogia. Na classe hospitalar da referida instituição, leciona apenas

no turno matutino há um ano e meio, com carga horária de 20 horas semanais. No turno

oposto é professora de classe regular em uma escola da rede municipal em Salvador.

Para o seu trabalho como docente na classe hospitalar, assim como ocorreu com a

professora entrevistada da Casa de Apoio Erik Loeff, realizou o curso de extensão em

Atendimento Escolar no Ambiente Hospitalar, ministrado pelo Instituto Escola Hospitalar e

Domiciliar Criança Viva, com carga horária de 80h, em Janeiro de 2008 e recebe

remuneração da prefeitura como toda professora concursada em exercício, pelo trabalho

pedagógico que realiza na classe hospitalar.

Segundo a entrevistada, o trabalho na classe inicia-se com uma visita nas enfermarias,

convidando os alunos / pacientes que podem e querem participar da aula em sala-de-aula.

Caso o aluno não tenha condições de ausentar-se do leito, é atendido nesse respectivo espaço.

Diferente da professora Estrela, que leciona na casa de apoio, a docente relatou que inicia as

atividades na classe com uma conversa informal para conhecimento e explicação ao grupo

sobre a importância em participar de uma escola no hospital.

Trata-se de uma conduta relevante à postura adotada pela docente Sol, no que se refere

a propiciar o adequado entendimento por parte do aluno, sobre a importância do trabalho

realizado na classe quando inicia as atividades durante o diálogo informal.

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Quando questionada em relação ao que ela faz, diz: “em sala de aula a metodologia se

diversifica de acordo com a necessidade de cada aluno paciente”. Além disso, procura motivar

o seu alunado a participar das aulas e expor suas impressões acerca das atividades aplicadas.

A docente entrevistada no momento em que é perguntada sobre como são suas aulas,

relata que costumam ser interessantes e planejadas de forma a envolver todos os alunos /

pacientes nas propostas desenvolvidas.

Na seqüência, responde os tipos de atividades que desenvolve com seus alunos, são

elas: conversa informal, produção textual, pesquisas em sala de aula, leituras diversas e

exercícios xerocopiados.

No que se refere aos recursos utilizados, a professora Sol relata que utiliza desde os

recursos de multimídia (CD’s, DVD’s e TV), cartazes, panfletos, livro didático, jogos lúdicos

e materiais para pintura.

Desta vez a pergunta feita a docente é sobre os benefícios da escolarização em

ambiente hospitalar e a entrevistada diz: “além da continuidade ao processo de escolarização,

é possível destacar a melhora da auto-estima, o envolvimento com mais interesse no processo

de aprendizagem e avanço no processo de recuperação”.

As dificuldades encontradas citadas pela professora Sol na atuação no ambiente

hospitalar, foi o reconhecimento do seu trabalho por parte das escolas regulares e também por

parte de alguns familiares.

No quesito sobre como se dá à relação entre os profissionais da área de saúde e como

percebem seu trabalho, a entrevistada responde: “acontece de forma muito tranqüila, sempre

reconhecendo a rotina um do outro. Embora, existam alguns profissionais que desconheçam a

importância do trabalho”.

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4.4 O QUE PENSA A TERAPEUTA OCUPACIONAL “VÊNUS” SOBRE AS

CLASSES HOSPITALARES

O desejo que alimentei durante toda a minha pesquisa era o de finalmente entrevistar

os sujeitos envolvidos diretamente com o meu objeto de estudo, refiro-me ao aluno,

professora e o profissional da área de saúde. Felizmente, a entrevista com este último sujeito,

vem possibilitar uma melhor percepção, em relação à atuação do educador em um ambiente,

onde prevalecem os cuidados com a saúde do paciente e onde se torna possível à

aprendizagem do aluno / paciente.

A entrevistada é a terapeuta ocupacional intitulada como Vênus, que trabalha no

mesmo hospital onde a professora Sol é docente. Vale destacar que essa foi à única

profissional da área de saúde que se prontificou a participar desta pesquisa e as suas respostas

e impressões são de grande valia para este trabalho.

Quando questionada sobre o que achava da atuação do professor no ambiente

hospitalar e se considerava necessária à atividade da classe hospitalar para o aluno / paciente

hospitalizado. Vênus diz: “Sim. Uma vez que a hospitalização pode vir a prejudicar os

estudos da criança, em virtude do longo período de internação que o paciente está sujeito”.

No momento em que foi perguntado se havia identificado algum avanço do aluno /

paciente em decorrência do trabalho realizado na classe, a entrevistada disse que percebe

avanços significativos no humor e na disposição que o aluno apresenta em relação à execução

das atividades desenvolvidas na classe, reforçando que tal comportamento por parte do aluno

é bastante satisfatório e faz com que o aluno / paciente de certa forma apresente constantes

melhoras no seu quadro clínico. Além disso, surpreendentemente, a entrevistada enxerga a

atuação do professor muito digna e o considera como um dos membros da equipe

multidisciplinar existente no hospital.

Para Vênus, quando perguntada sobre de que forma os profissionais da área de saúde

contribuem para o funcionamento da classe hospitalar, responde que a melhor forma de

colaborar é respeitando a rotina da escola, os seus horários, não retirando o aluno da classe

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antes do término das atividades e, sobretudo, estimulando o aluno / paciente a frequentar a

classe.

De um modo geral, ainda se observa no hospital, o desconhecimento em relação à

importância da prática docente para a continuidade da escolarização e das suas contribuições

na vida da criança e do adolescente hospitalizado.

Diante das informações prestadas pela terapeuta ocupacional e os relatos das docentes

entrevistadas no que concerne a relação existente entre os profissionais da área de saúde e as

professoras da classe hospitalar, podemos concluir que muito se avançou na forma como o

educador é visto no ambiente hospitalar, sobretudo pelos profissionais que nele trabalham,

mas se observa a necessidade do professor ser visto como um dos membros da equipe que

trabalha no hospital e que embora o seu trabalho possua um foco diferenciado em relação à

criança e adolescente em tratamento médico, não podemos esquecer que o hospital não deve

se resumir a um espaço onde se realiza apenas procedimentos e condutas que promovam o

tratamento de enfermidades, mas também de intervenções pedagógicas com ludicidade e

aprendizagem por parte da profissional qualificada para esta função.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa exploratória possibilitou a reflexão dos aspectos que envolvem a classe

hospitalar desde a sua rotina, atividades pedagógicas, recursos utilizados e dificuldades

observadas, até as transcrições de entrevistas e discursos da aluna / paciente, da professora e

da profissional da área de saúde, objetivando a coleta de dados com a maior riqueza de

detalhes e profundidade possível.

O trabalho docente no contexto hospitalar e ou domiciliar, cada vez mais, vem

expandindo a sua área de atuação; a inserção do pedagogo na área hospitalar contribui não

somente para a continuidade da escolarização do aluno durante o seu tratamento médico, mas

observa-se também o suporte psicológico que o trabalho docente acaba alcançando.

Sendo o principal objetivo deste estudo identificar as contribuições da classe

hospitalar no processo de escolarização da criança doente, dentre os quais a aprendizagem faz

parte e encontra-se presente em todas as atividades de nossas vidas, ela não se exclui no

contexto hospitalar.

Durante longos períodos de internação ou tratamento domiciliar que resulta no

distanciamento da criança ou adolescente da escola, necessita da intervenção do profissional

de educação, para dar-lhe todo o suporte pedagógico necessário durante o seu afastamento da

escola regular.

Como viver é um aprendizado constante, a presença do professor de certa forma dá

voz ao aluno hospitalizado, ensina, aprende e reaprende em um eterno movimento. Se a

aprendizagem é responsável pela mudança no comportamento das pessoas, nós educadores

somos profissionais das mudanças, oriundas das trocas estabelecidas na relação dialógica

entre a professora e o aluno.

A referida pesquisa, apresenta os aspectos mais importantes da prática pedagógica em

Classe Hospitalar e traz a tona questões sobre a formação docente dos que atuam com as

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crianças e adolescentes / pacientes, o relato e a descrição da rotina do trabalho pedagógico

realizado, e sobre a relação entre a docente e o aluno / paciente em um contexto onde

predomina a dor, incertezas em relação ao futuro, frente aos recorrentes internamentos que

acabam por afastar a criança, contra a sua vontade, do convívio com os seus familiares,

amigos, escola de origem, enfim da sua rotina e da sua vida como um todo, antes do desolador

diagnóstico.

De acordo com minhas observações realizadas na classe hospitalar, pude perceber

claramente a importância das atividades pedagógicas com o aluno / paciente e a

representatividade desta modalidade de ensino para os discentes em tratamento médico. Não

poderia deixar de mencionar todo cuidado, carinho, esforço empenhado pelas docentes na

elaboração do seu planejamento, na escolha dos recursos e a preocupação com o aprendizado

dos alunos.

É significativo o que a discente Lua relata sobre a importância da classe hospitalar na

sua vida, ao mesmo tempo em que ela descreve, sob sua ótica, algumas das contribuições da

classe na sua vida, que vai desde o prazer de frequentar as aulas, o aprendizado

proporcionado, os benefícios ofertados de forma surpreendente pelas atividades pedagógicas

que serviram de estímulo para a significativa melhora da sua visão, da capacidade de

raciocínio e memorização, que haviam sido afetados pela sua doença e pós-cirúrgico, até o

aumento da auto-estima e melhora do seu estado emocional como um todo. No decorrer da

entrevista evidenciei através de cada gesto, de cada relato emocionado, o quanto a

escolarização tem feito a diferença na vida desta aluna / paciente e pode fazer na vida de

tantos outros discentes na mesma situação em que ela se encontra.

Do mesmo modo, gostaria de destacar o trabalho primoroso realizado pela docente

Estrela na casa de apoio e da docente Sol no contexto hospitalar propriamente dito, visto que

são profissionais comprometidas, dedicadas na tarefa de educar os seus alunos doentes e que

dignificam a profissão que escolhi exercer. Durante o relato das educadoras entrevistadas

constatei em diversos momentos a significância do trabalho realizado para cada uma e o

quanto é gratificante exercê-lo. Assim como foi oportunamente citado pela discente Lua, as

professoras evidenciam na sua prática todos os avanços obtidos pelos alunos / pacientes, não

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somente no êxito da continuidade da sua escolarização em ambiente não “convencional”, mas

a melhoria do quadro clínico dos freqüentadores da classe.

As contribuições evidenciadas pela existência da classe hospitalar são facilmente

notadas também pela profissional entrevistada, que atua na área de saúde. Felizmente tive a

alegria e o prazer de entrevistar a terapeuta ocupacional aqui nomeada Vênus, que trouxe para

essa pesquisa o olhar e o entendimento daqueles que trabalham na área de saúde em relação

ao trabalho pedagógico realizado pelo professor no contexto hospitalar, diga-se de passagem

um ponto de vista escasso nos trabalhos que abordam esse tipo de temática. Nos seus relatos,

Vênus não somente qualifica o trabalho realizado pela educadora na classe, dada a

abrangência do trabalho realizado no que se refere à melhoria do quadro clínico do paciente

que freqüenta a classe, como reconhece a docente como membro da equipe multidisciplinar

do hospital, mas deixou pistas que não é essa percepção da maioria dos profissionais que

trabalham no hospital.

Tendo em vista o pouco tempo disponível para realização deste trabalho, sinto a

grande necessidade de dar continuidade à pesquisa dentro da temática abordada. Contudo, não

poderia deixar de expressar a minha alegria e satisfação na realização deste trabalho, pois a

área de saúde ainda é muito restrita para realização de pesquisas e pude vivenciar essa

situação de muito perto. Desde o difícil consentimento para realização das visitas, até a coleta

dos dados indispensáveis para validar e trazer respostas a minha pergunta problema.

Reconheço que há muito a avançar na prática pedagógica com os alunos

hospitalizados, visto que nem todas as crianças hospitalizadas no Estado da Bahia e no

restante do país desfrutam desta modalidade de atendimento pedagógico, mas com a

dedicação, aperfeiçoamento, determinação, ousadia e coragem, consigo vislumbrar o caminho

de muito sucesso a ser conquistado.

Não poderia finalizar este trabalho sem mencionar, que em rede hospitalar não se

trabalha sozinho e, nós educadores para conseguirmos nosso espaço neste ambiente que se

abre para a prática docente, temos que conquistá-lo com nosso saber, sensibilidade, afeto,

dedicação e estarmos sempre abertos para novos aprendizados.

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REFERÊNCIAS

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MIRANDA, Arlete Aparecida Bertoldo. Reflexões desenvolvidas na tese de doutorado: A Prática Pedagógica do Professor de Alunos com Deficiência Mental, Unimep, 2003. NUNES, Célia Maria Fernandes. Saberes docentes e formação de professores: um breve panorama da pesquisa brasileira. Educ. Soc., Campinas, v. 22, n. 74, 2001 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302001000100003&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 06 de julho 2009. ORTIZ, Leodi Conceição Meireles e FREITAS, Soraia Napoleão. Classe Hospitalar : Um Olhar Sobre Sua Práxis Educacional. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v.82, n. 200/201/202, p. 70-78, Jan/Dez 2001. PORTO, Olívia. Psicopedagogia hospitalar: intermediando a humanização na saúde.Rio de Janeiro, Wak Editora, 2008. RESOLUÇÃO Nº 02/1998 – Conselho de Educação do Distrito Federal. CEDF. Estabelece normas para o Sistema de Ensino do Distrito Federal, em observância às disposições da Lei nº 9.394/1996, dedicando o capítulo IV a Educação Especial. Disponível na Internet via http://portal.mec.gov.br/seed/arquivos/pdf/tvescola/leis/lein9394.pdf.Arquivo capturado em 31/03/2009. VASCONCELOS, Sandra Maia Farias. Intervenção escolar em hospitais para crianças internadas: a formação alternativa re-socializadora.. In: I CONGRESSO INTERNACIONAL DE PEDAGOGIA SOCIAL, 1., 2006, . Proceedings online... Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, Available from: <http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC0000000092006000100048&lng=en&nrm=abn>. Acesso em: 12 de Agosto de 2009.

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APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA REALZADA COM A ALUNA / PACIENTE

1. Você sabe porque está aqui?

2. O que você acha das aulas?

3. Você se sente melhor quando vai as aulas?

4. O que mais você sente falta desde que veio para cá?

5. Acha que está aprendendo aqui?

6. O que mais você gosta nas aulas daqui?

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APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA REALIZADA COM AS DOCENTES DA CLASSE HOSPITALAR

1. Qual o tempo de funcionamento da Classe na instituição?

2. Há quanto tempo trabalha na Classe?

3. Qual a sua carga horária?

4. Qual a sua idade?

5. Qual a sua formação?

6. Passou por alguma formação específica para atuar com classe hospitalar? Onde?

Quando?

7. Recebe remuneração?

8. Trabalha em outro lugar?

9. Como se inicia o trabalho na Classe Hospitalar?

10. O que você faz?

11. Como são aulas?

12. Quais os tipos de atividades que são desenvolvidas?

13. Quais os recursos utilizados?

14. Quais os benefícios da escolarização em ambiente hospitalar?

15. Quais as dificuldades encontradas para atuação no ambiente hospitalar?

16. Como se dá à relação entre o professor e os profissionais da área de saúde? Como o

profissional de saúde percebe seu trabalho?).

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APÊNDICE C – ROTEIRO DE ENTREVISTA REALIZADA COM A PROFISSIONAL DA ÁREA DE SAÚDE

1. Você considera necessária a atividade da classe hospitalar para o paciente / aluno

hospitalizado?

2. Você identificou algum avanço obtido pelo paciente / aluno em decorrência do

trabalho realizado na Classe? Quais?

3. Como se dá à relação entre o professor da Classe Hospitalar e os profissionais atuantes

na área de saúde?

4. De que forma os profissionais da área de saúde contribuem para o bom funcionamento

da Classe no contexto Hospitalar?