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Web-Revista SOCIODIALETO www.sociodialeto.com.br Núcleo de Pesquisa e Estudos Sociolinguísticos, Dialetológicos e Discursivos NUPESDD-UEMS Mestrado em Letras UEMS / Campo Grande ISSN: 2178-1486 Volume 6 Número 17 Novembro 2015 NUPESDD UEMS Web-Revista SOCIODIALETO Mestrado Letras UEMS/Campo Grande, v. 6, nº 17, nov. 2015 85 AS CAUSATIVAS SINTÉTICAS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA ABORDAGEM MINIMALISTA 1 Glenda Aparecida Queiroz Milanio (FALE/UFMG) 2 [email protected] Lorenzo Vitral (FALE/UFMG) 3 [email protected] RESUMO: Este artigo tem como objetivo discutir a formação das sentenças causativas sintéticas com verbos transitivos no Português Brasileiro. Para a consecução de tal análise, adotamos os pressupostos teóricos do Programa Minimalista, sobretudo, os trabalhos de Pylkkänen (2002; 2008) e de Blanco (2010; 2011). Com base nesses estudos, buscamos descrever as propriedades sintáticas e semânticas dessas sentenças. Em relação às propriedades semânticas, desenvolvemos um teste para a identificação dessas causativas, pois constatamos que apenas verbos motores de segunda ordem (com instrumentos alienáveis) licenciam sua construção. Quanto às propriedades sintáticas, assumimos que essas sentenças são derivadas de causativas analíticas e que apresentam o padrão selecional vP fásico e o padrão Non-Voice-Bundling, em que VoiceP ocorre cindido de vP. Finalizando, esperamos que essas descrições semânticas e sintáticas possam contribuir para os estudos translinguísticos sobre as causativas. PALAVRAS-CHAVE: Causativas sintéticas. Verbo transitivo. Estrutura argumental. ABSTRACT: This article aims to discuss the formation of synthetic causative sentences with transitive verbs in Brazilian Portuguese Language. In this analysis, we adopted the framework of the Minimalist Program, especially the works of Pylkkänen (2002; 2008) and Blanco (2010; 2011). Based on these studies, we described the syntactic and semantic properties of these sentences. In relation to the semantic properties, we developed a test to identify these causatives, since we noted that only motor verbs of the second order (with inalienable instruments) license these constructions. In relation to the syntactic properties, we assumed that these sentences are derived from the analytic causatives and require the selectional parameter vP phasic and parameter Non- Voice-Bundling, where VoiceP occurs split of vP. Finally, we hope that these semantic and syntactic descriptions contribute to the crosslinguistic analysis on the causatives. KEYWORDS: Synthetic Causatives. Transitive verb. Argument structure. 1 Introdução O presente trabalho tem como objetivo examinar a formação das sentenças causativas sintéticas no Português Brasileiro (PB). Para a execução de tal empreitada, adotaremos as 1 Este trabalho foi extraído da dissertação de mestrado intitulada As causativas sintéticas do português brasileiro: de acordo com o modelo minimalista”, sob a orientação do professor Dr. Lorenzo Teixeira Vitral. 2 Doutoranda em Linguística Teórica e Descritiva, pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos (POSLIN), da Faculdade de Letras (FALE), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 3 Professor Associado 4 da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (FALE/UFMG).

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Page 1: AS CAUSATIVAS SINTÉTICAS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA ABORDAGEM MINIMALISTA · Programa Minimalista, sobretudo, os trabalhos de Pylkkänen (2002; 2008) e de Blanco (2010; 2011)

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NUPESDD – UEMS – Web-Revista SOCIODIALETO – Mestrado – Letras – UEMS/Campo Grande, v. 6, nº 17, nov. 2015 85

AS CAUSATIVAS SINTÉTICAS DO PORTUGUÊS BRASILEIRO: UMA

ABORDAGEM MINIMALISTA1

Glenda Aparecida Queiroz Milanio (FALE/UFMG)2

[email protected]

Lorenzo Vitral (FALE/UFMG)3

[email protected]

RESUMO: Este artigo tem como objetivo discutir a formação das sentenças causativas sintéticas com verbos

transitivos no Português Brasileiro. Para a consecução de tal análise, adotamos os pressupostos teóricos do

Programa Minimalista, sobretudo, os trabalhos de Pylkkänen (2002; 2008) e de Blanco (2010; 2011). Com base

nesses estudos, buscamos descrever as propriedades sintáticas e semânticas dessas sentenças. Em relação às

propriedades semânticas, desenvolvemos um teste para a identificação dessas causativas, pois constatamos que

apenas verbos motores de segunda ordem (com instrumentos alienáveis) licenciam sua construção. Quanto às

propriedades sintáticas, assumimos que essas sentenças são derivadas de causativas analíticas e que apresentam

o padrão selecional vP fásico e o padrão Non-Voice-Bundling, em que VoiceP ocorre cindido de vP.

Finalizando, esperamos que essas descrições semânticas e sintáticas possam contribuir para os estudos

translinguísticos sobre as causativas.

PALAVRAS-CHAVE: Causativas sintéticas. Verbo transitivo. Estrutura argumental.

ABSTRACT: This article aims to discuss the formation of synthetic causative sentences with transitive verbs in

Brazilian Portuguese Language. In this analysis, we adopted the framework of the Minimalist Program,

especially the works of Pylkkänen (2002; 2008) and Blanco (2010; 2011). Based on these studies, we described

the syntactic and semantic properties of these sentences. In relation to the semantic properties, we developed a

test to identify these causatives, since we noted that only motor verbs of the second order (with inalienable

instruments) license these constructions. In relation to the syntactic properties, we assumed that these sentences

are derived from the analytic causatives and require the selectional parameter vP phasic and parameter Non-

Voice-Bundling, where VoiceP occurs split of vP. Finally, we hope that these semantic and syntactic

descriptions contribute to the crosslinguistic analysis on the causatives.

KEYWORDS: Synthetic Causatives. Transitive verb. Argument structure.

1 Introdução

O presente trabalho tem como objetivo examinar a formação das sentenças causativas

sintéticas no Português Brasileiro (PB). Para a execução de tal empreitada, adotaremos as

1 Este trabalho foi extraído da dissertação de mestrado intitulada “As causativas sintéticas do português

brasileiro: de acordo com o modelo minimalista”, sob a orientação do professor Dr. Lorenzo Teixeira Vitral. 2 Doutoranda em Linguística Teórica e Descritiva, pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos

(POSLIN), da Faculdade de Letras (FALE), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). 3 Professor Associado 4 da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (FALE/UFMG).

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pressupostos teóricos do Gerativismo, sobretudo, os desenvolvimentos recentes do Programa

Minimalista (CHOMSKY, 1999, PYLKKÄNEN 2002, 2008; BLANCO, 2010, 2011;

CAMARGOS, 2013; SCHÄFER, 2008). A partir desse cenário, investigaremos sentenças

como Mara cortou o cabelo, Pedro operou o pé e Caetano reformou o apartamento,

assumindo que se tratam de sentenças causativas sintéticas, uma vez que possuem o evento

causador e o evento causado (BITTENCOURT, 1955, 2001). Nesse contexto, defenderemos

que essas causativas sintéticas formadas com verbos transitivos são derivadas da causativa

analítica.

Para explicarmos as propriedades sintáticas das causativas sintéticas com verbos

transitivos, adotaremos a proposta de Blanco (2010, 2011), baseada em Pylkkänen (2002,

2008), que propõe uma parametrização universal para as sentenças causativas. Diante disso,

vamos assumir que as causativas sintéticas formadas com verbos transitivos, em relação ao

núcleo causativo, apresentam padrão selecional fásico, ou seja, é formada por meio de uma

estrutura mais articulada capaz de selecionar um argumento externo no domínio encaixado.

Além disso, assumiremos também que as causativas sintéticas formadas com verbos

transitivos possuem padrão Non-Voice-Bundling, em que VoiceP ocorre cindido de vCAUSE.

Em relação às propriedades semânticas, consideraremos Levin (1993) e Levin Rapport

(1995) e ainda a representação modular da mente (STILLINGS et al, 1995). Partindo desses

estudos, buscaremos distinguir as propriedades dos verbos que possibilitam a formação das

causativas sintéticas com verbos transitivos e proporemos o reconhecimento de critérios

semânticos para a identificação dessas sentenças.

Este texto está dividido em quatro seções. Na seção segunda, apresentamos o

referencial teórico, baseado, sobretudo, em Pylkkänen (2002, 2008) e em Blanco (2010,

2011). Na terceira seção, examinamos as propriedades sintáticas e as semânticas das

causativas sintéticas. Na quarta e última seção, tecemos as nossas considerações finais.

2 Quadro Teórico

As sentenças causativas compõem um quadro fértil de discussões, pois, na literatura,

inúmeros trabalhos buscam descrever essas estruturas. Dentre os diversos trabalhos

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realizados sobre as causativas, o estudo de Bittencourt (1995, 2001) para os dados do PB

possui bastante relevância, ao propor uma taxonomia para as causativas. A autora apoia-se

em correntes teóricas distintas, como a Gramática Tradicional, a Teoria Gerativa e,

sobretudo, os trabalhos funcionalistas (SHIBATANI 1975, 1976 e GIVÓN, 1975 e 1990)

para analisar essas sentenças. Bittencourt (1995), considerando Shibatani (1976), esclarece

que o processo causativo apresenta dois eventos, que ocorrem em momentos distintos: o

evento causador ocorre num primeiro momento (t1), enquanto o evento causado ocorre num

segundo momento (t2). A partir disso, Bittencourt (1995, 2001) caracteriza três estruturas

básicas para os dados do PB: as causativas analíticas, as semianalíticas e as sintéticas.

Segundo a autora, as causativas analíticas dispõem necessariamente de um verbo

causativo como mandar, fazer, deixar, seguido de uma oração completiva (ex.: João fez

(com) que Maria varresse a casa). De acordo com Bittencourt (1995, 2001), as causativas

semianalíticas também apresentam duas orações, uma com verbo causativo e outra oração

completiva. Contudo, a autora destaca que, nesse tipo de causativa, o causado, geralmente, é

expresso por um oblíquo, indicando uma relação mais estreita entre a oração principal e o

predicado causativo (ex.: João nos fez varrer a casa/João te fez varrer a casa). Bittencourt

(1995, 2001), por fim, descreve a causativa sintética, cuja estrutura não possui um verbo

necessariamente causativo. Conforme a autora, esse tipo de estrutura pode ser formada a

partir de verbos intransitivos (ex.: A mãe correu os meninos da sala) e verbos transitivos

(ex.: Maria fez as unhas pela manicure/ João consertou o carro pelo mecânico).

Tomando como base o trabalho de Bittencourt (1995, 2001), Silva (2009) investiga as

sentenças causativas sintéticas, analisando as estruturas formadas a partir de verbos

transitivos e intransitivos. A autora defende, baseada na teoria semântica (CANÇADO, 2003;

2006) e na Teoria Gerativa (CHOMSKY, 1999; HALE & KEYSER, 1993; 1998), que as

causativas sintéticas formadas com verbos transitivos necessitam de um sintagma

preposicional (SP) para licenciá-las (SILVA, 2009, p. 103):

(1) a. A Luma de Oliveira fez sua fantasia de madrinha da bateria pelas costureiras da própria escola.

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b. Eu consertei o carro por aquele mecânico de nome maluco.4

Silva (2009) considera fundamental, na causativa sintética, o SP que projeta o terceiro

argumento da sentença, isto é, o causado. Assim, para a autora, é o DP que abriga

costureiras e mecânico que possibilita a interpretação semântica do agente da ação expressa

pelo verbo transitivo tanto em (1a) quanto em (1b). Diante disso, Silva (2009) defende que é

o SP que possibilita o licenciamento das causativas sintéticas, uma vez que é a preposição

que permite a valoração do Caso abstrato ao terceiro argumento.

Estudos recentes desenvolvidos à luz do Programa Minimalista discutem a formação

das sentenças causativas (CHOMSKY, 1999, PYLKKÄNEN 2002, 2008; BLANCO, 2010,

2011; CAMARGOS, 2013; SCHÄFER, 2008). Nesse cenário, a pesquisa realizada por

Pylkkänen (2002, 2008) ganha destaque, ao discutir a formação das causativas, propondo

uma parametrização, por meio de uma análise translinguística, baseada, sobretudo, em dados

do finlandês, do inglês e do japonês. Além disso, Pylkkänen (2002, 2008) discute a formação

de construções aplicativas e desenvolve uma tipologia universal dos núcleos aplicativos,

fundamentada na pesquisa de Marantz (1993) sobre as construções de duplo objeto.

Em relação aos núcleos aplicativos, Pylkkänen (2002, 2008), ao investigar dados de

línguas como o inglês e o chaga, distingue dois tipos de núcleos: o aplicativo alto e o

aplicativo baixo. A autora elucida que o núcleo aplicativo alto, que ocorre em línguas chaga, é

projetado acima da raiz verbal ou de VP, conforme pode ser visto em (2a). Esse núcleo que

ocorre abaixo de VoiceP (wife) é interpretado como beneficiário do evento. Isso ocorre em

chaga, porque um argumento que denota semanticamente o beneficiário pode ser relacionado

a verbos inergativos5. Já o núcleo aplicativo baixo, conforme pode ser visto em (2b), é

4 Cabe descartar que a preposição pelas e por presentes nos dados (1a) e (1b), respectivamente, se substituídas

pela preposição com, parece formar sentenças mais aceitáveis no PB. Por exemplo, “A Luma de Oliveira fez sua

fantasia de madrinha da bateria com as costureiras da própria escola” e “Eu consertei o carro com aquele

mecânico de nome maluco. 5 No PB, esse tipo de causativa não é licenciada, pois verbos inergativos não projetam um segundo argumento

capaz de ser interpretado semanticamente como beneficiário. Por exemplo, em O Marido chorou/nadou a

esposa, verbos como chorar e nadar não projetam um segundo argumento que possa ser interpretado como

beneficiário do evento descrito, visto que os verbos inergativos, no português, são considerados verbos

intransitivos que dependem do controle de um agente (MIRA MATEUS, 2003).

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projetado abaixo de VP, expressando uma relação dinâmica de transferência de posse, em

que o DP mais alto estabelece uma relação possessiva direcional ao DP-tema mais baixo.

Dados do inglês como John baked Bill a cake e John sent Mary a letter (= John assou um

bolo para Bill e João enviou uma carta para Maria) exemplificam essa relação, na qual o DP

Bil e o DP Mary podem ser semanticamente interpretados como recipiente ou beneficiário do

evento descrito (PYLKKÄNEN, 2008, p. 14):

(2) a. APLICATIVO ALTO (CHAGA)

VoiceP

he

Voice

wife

ApplBen

eat food

b. APLICATIVO BAIXO (INGLÊS)

VoiceP

I

Voice

bake

him

Appl cake

(PYLKKÄNEN, 2008, p. 14)

Em relação às construções causativas, Pylkkänen (2002, 2008) define que todas as

construções causativas envolvem os núcleos funcionais: VoiceP e vCAUSE. Inicialmente, a

autora revisa a proposta teórica de Kratzer (1996), que prevê que toda sentença formada com

verbos transitivos, que expressam ação, possuem um núcleo funcional para abrigar o agente,

VoiceP. Pylkkänen (2002, 2008) esclarece que esse núcleo é responsável por projetar o

argumento externo nas sentenças causativas. De acordo com a autora, além de VoiceP, as

sentenças causativas também possuem o núcleo causativo (vCAUSE), que emerge da fusão com

VP, tornando possível a introdução do argumento causador do evento, que, em geral, é

relacionado, semanticamente, ao papel de agente da ação verbal. Com base nisso, a autora

descreve os parâmetros para a realização de VoiceP e de vCAUSE nas sentenças causativas.

Partindo de uma análise translinguística, Pylkkänen (2002, 2008) identifica que há

duas variações para a realização das causativas, a saber: Voice bundling e Selection. Segundo

a autora, em línguas, como o finlandês e o japonês, ocorre uma cisão entre vCAUSE e VoiceP

(i.e. Non-Voice-bundling), conforme pode ser observado em (3a). Já em línguas como o inglês,

VoiceP é sintaticamente dependente de vCAUSE, (i.e. Voice bundling), conforme pode ser visto

em (3b).

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(3) VARIAÇÃO: VOICE BUNDLING

a. Causativa non-voice-bunling (Japonês, finlândes)

x

Voice

CAUSE

b. Causativa voice-bunling (Inglês)

x

[Voice, cause]

(PYLKKÄNEN, 2008, p. 84)

Quanto à variação Selection, Pylkkänen (2002, 2008) divide em três tipos: i) Root-

selecting, seleção de uma raiz (cf. 4a), Verb-selecting, seleção de um VP (cf. 4b), e Phase-

selecting, seleção de um vP fásico, que possibilita a formação de uma estrutura mais

articulada, capaz de projetar um argumento externo no domínio da sentença encaixada (cf. 4c).

(4) VARIAÇÃO: SELECTION (SELEÇÃO)

a. Root-selecting Cause

(Seleção de raiz)

x Root

b. Verb-selecting Cause

(Seleção VP)

Cause

v Root

c. Phase-selecting Cause

(Seleção vP fásico)

Cause

Ext

(PYLKKÄNEN, 2008, p. 85)

Com base nos estudos de Pylkkänen (2002, 2008), Blanco (2010, 2011) investiga as

sentenças causativas em línguas como o hiaki e o espanhol. Assim como Pylkkänen (2002,

2008), Blanco (2010, 2011) propõe um estudo translinguístico, no qual que verifica como os

argumentos das construções causativas são estruturados, além de buscar reconhecer possíveis

restrições sintáticas e semânticas no processo de formação dessas sentenças. Destacaremos

aqui, a análise comparativa realizada por Blanco (2010, 2011) sobre as propriedades das

causativas analíticas (perifrásticas) construídas a partir do verbo make, em inglês, e das

sentenças causativas formadas com o verbo hacer em espanhol. Para a realização dessa

análise, Blanco (2010, 2011) considera o diagnóstico das causativas com padrão selecional

fásico, proposto por Pylkkänen (2002, 2008). Segundo Pylkkänen (2002, 2008), no processo de

formação das causativas com padrão selecional fásico é possível6:

6 Pylkkänen’s diagnostics for Phase-selecting causatives

a. VP modification of caused event is possible

b. Verbal morphology is possible between the Root and vCAUSE

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(5) a. Modificação da raiz por advérbios modificadores de VP;

b. Morfologia verbal entre a Raiz e vCAUSE;

c. Modificadores orientados para agente do evento causado;

d. Morfologia do aplicativo alto entre a Raiz e vCAUSE;

e. Causativas a partir de verbos inergativos e transitivos.7

Diante disso, Blanco (2010, 2011) indaga a análise de Pylkkänen (2002, 2008), ao

parametrizar que, em línguas como o inglês e o espanhol, as causativas possuam o padrão

selecional raiz. Blanco (2010, 2011) elenca argumentos para justificar a necessidade de

reformulação da proposta de Pylkkänen (2002, 2008) e defende que as causativas formadas

com verbo make, em inglês, assim como com verbo hacer, em espanhol, apresentam o padrão

selecional fásico. Assim, Blanco (2010, 2011) discute algumas propriedades compartilhadas

por essas causativas, em relação ao padrão selecional vP fásico, para sustentar a aplicação do

diagnóstico preconizado por Pylkkänen (2002, 2008). Inicialmente, Blanco (2010, 2011)

destaca que as causativas formadas com make expressam uma leitura ambígua, visto que o

espoco do advérbio pode incidir sobre o evento causador introduzido por vCAUSE, conforme

pode ser observado em (6a). Enquanto, em (6b), o advérbio não possui escopo sobre o evento

causador, pois parece ser gerado na base do evento causado, ligado ao vP mais baixo Blanco

(2011, p. 122).

(6) I made John cry in his room (=Eu fiz John chorar no quarto)

a. John and I were in his room and I made him cry (high attachment)

(=John e eu estávamos em seu quarto e eu o fiz chorar (ligação alta))

b. I made John cry and he did it in his room (low attachment)

(=Eu fiz John chorar e ele estava em seu quarto (ligação baixa))

Blanco (2010, 2011) esclarece que outra evidência que corrobora o padrão selecional

fásico para as causativas, em inglês, refere-se à possibilidade de projetar um material

interveniente entre o evento causador e o causado. Para a autora, a causativa formada com o

verbo make, não só possui um argumento interveniente, como o exige, uma vez que é a

c. Agent oriented modification of caused event is possible

d. High applicative morphology is possible between the Root and vCAUSE

e. Causatives based on unergatives and transitives are possible

(Pylkkänen (2002, 2008) apud Blanco (2010, 2011), p. 122)

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ausência do causado intermediário que explica a agramaticalidade de sentenças como *Mary

made run (*Maria fez correr). Assim, Blanco (2010, 2011) argumenta que as causativas

compostas com make requerem um argumento externo, ainda que não seja necessariamente o

agente da sentença encaixada. Em contrapartida, sentenças como as passivas, por exemplo,

possibilitam a ausência do argumento externo na posição de especificador, segundo a autora.

Outra propriedade que Blanco (2010, 2011) discute refere-se à permissão de

modificadores orientados para agente do evento causado (BLANCO, 2011, p. 125):

(7) Verbal modification (agentive) (= Modificadores orientados para agente do evento causado)

I made John cry on purpose (= Eu fiz John chorar de propósito)

a. I, on purpose, made John cry (high attachment) (= Eu, de propósito, fiz João chorar (ligação alta)

b. I made him [cry on purpose] (low attachment) (= Eu o fiz chorar [chorar de propósito] (ligação

alta)

Conforme pode ser observado, em (7a), o modificador on purpose (de propósito)

provoca uma leitura ambígua, na qual pode ser orientado para o agente ou para o argumento

externo da sentença encaixada. Para Blanco (2010, 2011), essa é mais uma evidência da

seleção desse argumento externo como parte da estrutura encaixada do verbo make. Além

disso, torna-se mais uma prova da seleção do padrão vP fásico nessas causativas.

Blanco (2010, 2011) ainda ressalta como outra propriedade dessas causativas o fato de

licenciarem, no domínio encaixado, orações formadas a partir de verbos inergativos e de verbos

transitivos, conforme pode ser observado, abaixo, (BLANCO, 2011, p. 127):

(8) Phase (productive) causatives (= Causativas produtivas – seleção fásica)

a. unergative (inergativa)

I made John cry (= Eu fiz João chorar)

b. transitive (transitiva)

I made Mary eat chocolate (= Eu fiz Maria comer chocolate)

(9) Root (lexical) causatives (= Causativas – seleção raiz)

a. unergative (inergativa)

*I cried John (= *Eu chorei John)

b. transitive (transitiva)

*I ate Mary chocolate (i.e. I made Mary eat chocolate)

(= * Eu comi Maria chocolate – i.e. Eu fiz Maria comer chocolate)

Os dados apresentados, em (8a), requerem um argumento externo para introduzir

VoiceP, de acordo com Blanco (2010, 2011). Em uma análise contrastiva com as causativas

lexicais, em (9), é possível verificar que as sentenças causativas que selecionam uma raiz não

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podem conter um argumento externo abaixo de vCAUSE. Para a autora, isso acarreta na

impossibilidade de verbos transitivos e inergativos no domínio encaixado. Assim, ao analisar a

representação, em (10), Blanco (2010, 2011) ressalta que o verbo make requer um sentença

encaixada capaz de projetar mais VoiceP, abaixo do verbo da oração principal. Esse VoiceP

será associado ao evento que pode ser sintaticamente licenciado pelo argumento externo Mary

(BLANCO, 2011, p. 127):

(10) transitives under ‘make’ (= verbo transitivo abaixo de make)

VoiceP

I Voice’

VoiceACTIVE vPCAUSE

VCAUSE VoiceP

made

Mary Voice’

Voice vP

v P

EAT chocolate

Segundo Blanco (2010, 2011), esse é mais um indício que as causativas formadas com

make apresentam padrão selecional vP fásico. Assim, como base, sobretudo, nas propriedades

levantadas sobre as causativas formadas com o verbo make, Blanco (2010, 2011), assume que

essas sentenças possuem uma fase VoiceP (em vez de CP/TP). Por meio de uma explicação

acurada, a autora defende que VoiceP é uma fase, que pode estar envolvida em todos os tipos

de construções, sejam elas ativas ou passivas. Blanco (2010, 2011) argumenta que VoiceP, ao

ser identificado como uma fase, possibilita a concordância com T, permitindo que traços não-

interpretáveis (uT) sejam valorados e excluídos antes de Spell-out. Isso possibilita que o DP

alocado na posição de especificador concorde com T, para receber Caso nominativo, alçando,

assim, para [Spec, TP]. Desse modo, Blanco (2010, 2011) assume que as causativas formadas

com o verbo make possuem uma fase VoiceP, que licencia a introdução de uma sentença

encaixada. Portanto, a autora concebe que as causativas com o verbo make possuem uma

padrão selecional vP fásico, em que vCAUSE seleciona uma fase VoiceP como complemento,

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bem como apresentam a parametrização Non-Voice-Bundling. A partir disso, Blanco (2010,

2011) passa analisar as causativas com o verbo hacer (i.e. FI, Faire-infinitive – Fazer-

infinitivo – c.f. KAYNE, 1975), em espanhol:

(11) FI

Le he hecho a Juan comer chocolate

3s.D have(1s) made to John eat chocolate

‘I made John eat chocolate’ (= Eu fiz João comer chocolate)

Segundo a autora, dados do espanhol, como em (11), compartilham as mesmas

propriedades destacadas sobre as causativas formadas com o verbo make em inglês. Isso

significa que as sentenças causativas formadas com o verbo hacer, em espanhol, apresentam

o padrão selecional vCAUSE fásico e o parâmetro Non-Voice-Bundling, ou seja, VoiceP

ocorre cindido de vCAUSE. Blanco (2010, 2011) argumenta a favor dessa parametrização,

considerando as mesmas propriedades sobre as causativas formadas com o verbo make, uma

vez que as causativas formadas com o verbo hacer possibilitam modificadores da raiz por

advérbios modificadores de VP, pois o advérbio pode ter escopo sobre o evento causador ou

sobre o evento causado. Além disso, há um material interveniente, ou seja, um argumento

externo entre o verbo hacer e a raiz. As causativas com hacer também apresentam

interpretação ambígua em relação ao escopo dos modificadores, visto vez que eles podem ser

orientados para o agente da oração principal ou para o argumento externo da sentença

encaixada. Por fim, essas causativas possibilitam orações completivas formadas a partir de

verbos inergativos e de transitivos, enquanto não licenciam causativas com os verbos

inacusativos, sem a presença de um argumento externo no domínio da sentença encaixada.

Diante dessas exposições, adotaremos a análise de Blanco (2010, 2011) para os dados

PB, assumindo que as sentenças causativas analíticas formadas com o verbo fazer possuem o

padrão selecional vCAUSE fásico e o parâmetro Non-Voice-Bundling. Essa adoção deve-se ao

fato das causativas analíticas compartilharem propriedades semelhantes às discutidas por

Blanco (2010, 2011), tanto para os dados do inglês e do espanhol, quanto para os do PB.

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3 As causativas sintéticas do PB

Baseada em trabalhos desenvolvidos à luz do Programa Minimalista (CHOMSKY,

1999, PYLKKÄNEN 2002, 2008; BLANCO, 2010, 2011; CAMARGOS, 2013; SCHÄFER,

2008), Milanio (2014) examina as sentenças causativas sintéticas do PB (MILANIO, 2014, p.

70):

(12) a. Mara cortou o cabelo

b. Pedro operou o pé

c. Caetano reformou o apartamento

d. José consertou o carro

e. Tereza pintou a casa

f. O fazendeiro inseminou as vacas

g. Ester transplantou a córnea

h. Artur podou a grama

De acordo com a análise de Silva (2009), discutida na seção anterior, os dados acima,

para serem licenciados no PB, necessariamente requerem um SP. Para a autora, os dados,

como em (12a)(12-h), é esse SP que introduz o argumento responsável pelo evento causador,

como com cabelelereiro, em (12a), com cirurgião, em (12b), com o pedreiro/empreiteira, em

(12c), e assim sucessivamente. Entretanto, Milanio (2014) contrapõe essa análise, uma vez

que assume que as causativas sintéticas não requerem um SP para serem licenciadas, visto

que são derivadas de uma estrutura causativa analítica. Para o desenvolvimento deste estudo,

Milanio (2014) busca investigar as propriedades sintáticas e semânticas dessas sentenças, que

serão discutidas nas próximas seções.

3.1 Propriedades semânticas das causativas sintéticas

Milanio (2014), no que se refere às propriedades semânticas das causativas sintéticas,

baseia-se, inicialmente, em Levin (1993) e Levin e Rappaport (1995) para assumir que essas

sentenças são formadas por verbos transitivos (cortar, operar, reformar, consertar, etc.),

reconhecendo como propriedade semântica a necessidade de um instrumento para execução

da ação. Desse modo, postulamos que um verbo como cortar requer um instrumento

cortante, como tesoura, lâmina e estilete, para a realização da ação, já o verbo operar requer

instrumentos cirúrgicos, como bisturi, pinça, tesoura, etc. Por fim, o verbo reformar requer

instrumentos da construção civil, como marreta, martelo, talhadeira, etc.

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Apoiando-se na visão global da arquitetura cognitiva (STILLINGS, et al.,1995),

Milanio (2014) busca reconhecer as propriedades dos verbos que formam as causativas

sintéticas. Nesse contexto, Milanio (2014) fundamenta-se na tese da modularidade, para

distinguir os verbos que permitem a construção de sentenças causativas formadas a partir de

verbos transitivos. Assim, são identificadas três classes de verbos, sendo apenas uma

categoria específica de verbos motores que permitem tais construções causativas. Vejamos a

proposta (MILANIO, 2014):

Verbos sensoriais relacionados ao sistema sensorial, como ver, ouvir, enxergar, cheirar. As ações

descritas por esses verbos requerem partes específicas do corpo, como olhos, ouvidos, isto é,

instrumentos biológicos inalienáveis.

Verbos de processamento relacionados ao sistema central, como pensar, refletir, memorizar, amar,

lembrar. Esses verbos também necessitam de instrumentos biológicos inalienáveis (ex.: diferentes

regiões cerebrais).

Verbos motores Esta categoria contém duas subclasses:

Primeira ordem: verbos relacionados ao sistema motor, como beijar, arranhar e chutar.

Esses verbos também requerem instrumentos biológicos inalienáveis (ex.: boca, unha, pés).

Segunda ordem: relacionados ao sistema motor, como cortar, reformar e operar. Esses

verbos requerem, semanticamente, instrumentos artificiais alienáveis (ex.: tesoura, lâmina,

bisturi, pinça, marreta, martelo, etc.).

Considerando a visão global da arquitetura cognitiva (STILLINGS, et al.,1995),

Milanio (2014) constatou que apenas os verbos motores de segunda ordem licenciam

construções causativas sintéticas formadas a partir de verbos transitivos. Esses verbos

requerem semanticamente um instrumento, assim como analisado por Levin (1993) e Levin e

Rappaport (1995), contudo deve ser um instrumento alienável, isto é, deve ser passível a

transferência de posse entre indivíduos. Desse modo, uma sentença como Mara cortou o

cabelo pode ser classificada como causativa sintética, uma vez o verbo cortar requer

necessariamente um instrumento artificial alienável (ex.: tesoura, navalha). Ou seja, o

instrumento, além de ser, semanticamente fundamental, para realização da ação, pode ser

alienável. Nesse caso, é absolutamente possível uma pessoa cortar o cabelo de outra,

deslocando as tesouras, aparadores e pentes de um agente para outro. Entretanto, a sentença

Mara beijou Bernardo (com a boca), apesar de ser formada com um verbo motor, requer um

instrumento biológico (no caso, a boca), que, embora seja indispensável à realização da ação,

não pode ser alienado, ou seja, transferido de posse entre indivíduos. Diante disso, Milanio

(2014, p. 39-40) propôs um teste que possibilita julgar e decidir, com maior segurança,

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quando uma sentença poderá ser identificada como causativa sintética formada a partir de

verbo transitivo. O teste é composto por cinco etapas, a saber:

1ª) Etapa – Verificar a transitividade do verbo:

Para a formação de uma causativa sintética, é necessário que seja construída com verbos transitivos.

2ª) Etapa – Verificar se o verbo está associado ao sistema sensorial, ao processamento ou ao Motor:

Para a formação de uma causativa sintética, é necessário que o evento descrito seja relacionado a um

verbo motor.

3ª) Etapa – Identificar se há ambiguidade de papel temático:

É necessário que ocorra uma interpretação ambígua. Inicialmente, deve haver duas interpretações: i) o

argumento externo pode ser interpretado como o agente do evento descrito; ou ii) o argumento

intermediário que, embora não seja realizado fonologicamente, seja interpretado como agente do

evento descrito.

4ª) Etapa – Verificar se há a necessidade da utilização de instrumento artificial (tesoura, bisturi,

alicate etc.) para a realização da ação:

É fundamental que o verbo expresso requeira semanticamente um instrumento artificial.

5ª Etapa – Conferir se o instrumento é alienável, ou seja, se ele pode ser deslocado de uma pessoa

para outra:

É imprescindível que o instrumento requerido, semanticamente, possa ter sua posse transferida, isto é,

um instrumento artificial alienável.

Assim, consideramos que por meio da aplicação do teste proposto, é possível verificar

as propriedades semânticas que as causativas sintéticas apresentam, permitindo reconhecer

com maior confiabilidade uma causativa sintética formada a partir de verbo transitivo.

3.2 Propriedades sintáticas das causativas sintéticas

Neste trabalho, em relação às propriedades sintáticas, assumimos que as causativas

sintéticas formadas com verbos transitivos são derivadas de uma construção analítica. Dessa

forma, concebemos que causativas sintéticas possuem uma estrutura subjacente que é

interpretada como nos dados apresentados, em (15b)-(17b):

(13) a. Mara cortou o cabelo

b. Marai fez [alguém cortar [seu]i cabelo]

(14) a. Pedro operou o pé

b. Pedroi fez [alguém operar [seu]i pé]

(15) a. Caetano reformou o apartamento

b. Caetanoi fez [alguém reformar [seu]i apartamento]

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Nos dados acima, é possível observar que a estrutura subjacente (15b)-(17b) é

formada a partir do verbo fazer. Além disso, apresentam uma estrutura mais articulada para

abrigar dois argumentos externos. O primeiro argumento externo é relacionado ao verbo

fazer, sendo interpretado como o causador do evento, já o segundo argumento externo está

relacionado ao verbo da sentença encaixada. Assim, assumimos que as causativas sintéticas

formadas a partir de verbos transitivos são licenciadas, justamente, em função do

licenciamento do argumento externo na sentença encaixada, embora ele não seja realizado

fonologicamente, ele será o responsável pela a execução do evento expresso pelo verbo

transitivo. Desse modo, consideraremos que, apesar de esse argumento ser identificado como

o evento causado, ele apresenta um traço [+ agentivo], uma vez que é interpretado como um

sujeito indeterminado (como um cabeleireiro, cirurgião, pedreiro, por exemplo) capaz de

executar a ação verbal. Essas propriedades são consonantes com as propriedades discutidas

por Blanco (2010,2011), baseada em Pylkkänen (2002, 2008), para sentenças causativas

formadas com o verbo make e o verbo hacer. Desse modo, partindo da investigação de

Blanco (2010,2011), adotamos que as causativas sintéticas apresentam o padrão selecional

vCAUSE fásico e o parâmetro Non-Voice-Bundling, conforme é possível observar na estrutura

sintática, abaixo, (MILANIO, 2014, p. 77):

(16) a. Mara cortou o cabelo

b. VoiceP

DP Voice’

Mara

Voiceº vP CAUSE

Vº CAUSE VoiceP

DP Voice’

proarb

Voiceº VP

Vº vP

cortar DP

o cabelo

Nessa estrutura, o DP que está alocado em [Spec, VoiceP] é o argumento externo do

verbo, que na causativa sintética não é realizado fonologicamente, uma vez que é um verbo

agente

Causado

[+ agentivo]

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leve. Nesta análise, assumimos que esse DP, por ser causador do evento, é interpretado como

um agente, pois ele é responsável por causar o evento expresso pelo verbo da sentença

encaixada, entretanto, não é o agente da ação de cortar. Por isso, há a seleção do vPCAUSE,

pois a causatividade está relacionada também a agentividade da fase VoiceP tomada como

complemento.

Assim, na causativa sintética, em (16b), o VoiceP projetado abaixo de vPCAUSE é

identificado como um sujeito indeterminado, isto é, um proarb

. O proarb

é uma categoria vazia,

interpretada como o indivíduo, o cara, a pessoa, que possui traços semânticos [+animado] e

[+genérico] (DUARTE, 1995). Diante disso, vamos defender que o proarb

é projetado na fase

VoiceP, complemento do vPCAUSE. O proarb

será, portanto, interpretado como um sujeito de

referência arbitrária responsável por executar o evento descrito pelo verbo da sentença

encaixada (como cortar, operar, reformar). Assumimos também que, nessa causativa, o

proarb

não é visível na Forma Fonológica (FF), porém é processado na Forma Lógica (FL).

Desse modo, vPCAUSE, por estar em concordância com Voiceº, que está no domínio

encaixado, possibilita a checagem de Caso Nominativo do DP proarb na LF. Esse DP tem seu

Caso checado e apagado antes da PF, uma vez que não demonstra traços fonológicos

interpretáveis. É importante ressaltar que a relação de Concordância parece ser a condição

preponderante para a valoração de Caso Nominativo ao DP proarb (VITRAL, 1987). No

entanto, apesar de citarmos essa condição para a atribuição de Caso nessas estruturas, não

aprofundaremos essa discussão.

Além disso, em (16b), o verbo transitivo cortar está de acordo com Restrição de

Movimento de Núcleo (Head Movement Constraint), prevista por Chomsky (1999). Esse

movimento é visível na FF, possibilitando com que o DP (Mara) seja interpretado como

sujeito do verbo (cortar). Na estrutura analítica, o verbo transitivo (cortar) não se

movimenta, pois a posição de argumento externo desse verbo já está preenchida por um DP

(o cabeleireiro, o cirurgião, o pedreiro, por exemplo).

Assumimos também como propriedade semântica das causativas sintéticas com

verbos transitivos, a necessidade de que sejam formadas com verbos motores de segunda

ordem. Consequentemente, essas causativas requerem um instrumento, apesar de ser uma

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propriedade semântica fundamental, esse argumento nem sempre será realizado

fonologicamente. Com base em Pylkkänen (2002, 2008), postulamos que o instrumento será

projetado por meio de um núcleo aplicativo alto, nas causativas sintéticas. Vale destacar,

aqui, a análise de Naves e Lima-Salles (2011), na qual as autoras investigam a realização do

instrumento em sentenças que o agente possui o controle da ação não permitem alternância

(Joana costurou o vestido com a agulha/ * A agulha costurou o vestido). Nessas estruturas

não-alternantes, as autoras esclarecem que, se o instrumento for realizado, será introduzido

pela preposição com como núcleo lexical. Desse modo, estabelecemos que as causativas

sintéticas formadas com verbos transitivos, caso o instrumento seja realizado

fonologicamente, será projetado em adjunção ao vP (MILANIO, 2014, p. 79):

(17) a. João cortou o cabelo com a navalha

b. VoiceP

DP Voice’

João

Voiceº vP CAUSE

Vº CAUSE VoiceP

DP Voice’

proarb

Voiceº VP

vP ApplP

Vº VP Appl PP

Ø

cortar DP P DP

com

o cabelo a navalha

Assim, apesar de considerarmos o instrumento uma propriedade semântica

fundamental para a formação da causativa sintética com verbo transitivo, se esse instrumento

ocorrer, será projetado em um núcleo aplicativo adjunto ao vP. O fato de esse argumento ser

projetado em posição de adjunção pode ser explicado com base em Ernst (2004). Para o

autor, os adjuntos, embora sejam capazes de modificar internamente o evento, podem ser

excluído de vP, como, por exemplo, no caso do sintagma preposicional.

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Por fim, apresentamos o quadro 1, abaixo, que sintetiza as propriedades gerais da

causativas sintéticas formadas com verbos transitivos discutidas ao longo deste texto

(MILANIO, 2014, p. 87):

Quadro 1 – Resumo das propriedades semânticas e sintáticas das sentenças

causativas sintéticas formadas a partir de verbo transitivo

Propriedades Semânticas Propriedades Sintáticas

i) Requer verbo transitivo:

a. ser verbo motor de segunda ordem;

b. requer instrumento artificial alienável

(como precondição semântica).

ii) Requer ambiguidade de papel temático na

posição de argumento externo.

i) Requer VoiceP mais alto para projetar o argumento

externo do verbo leve;

ii) Requer vPCAUSE nucleado por v0 CAUSE;

iii) Requer VoiceP mais baixo (complemento de

v0CAUSE) para projetar o DP pro

arb;

iv) Requer vP para projetar o P:

a . P projeta verbo e DP argumento interno;

Quando há realização fonológica do instrumento:

v) Requer ApplP (projetado em adjunção ao vP) para

licenciar PP:

a. PP aloca a preposição e o DP.

4. Considerações Finais

Esta pesquisa tinha como objetivo analisar a formação das causativas sintéticas

formadas com transitivos no PB. Para a realização desta empreitada, investigamos as

propriedades sintáticas e semânticas dessas estruturas. Em relação às propriedades

semânticas, baseamo-nos em Levin (1993) e em Levin Rapport (1995) e ainda na

representação modular da mente (STILLINGS, et al, 1995), para identificarmos os critérios

semânticos que possibilitam as causativas sintéticas. Diante disso, constatamos que apenas

os verbos motores de segunda permitem o licenciamento das causativas sintéticas com

verbos transitivos. Nesse contexto, propusemos um teste que, por meio de critérios

semânticos, permite julgar e o reconhecer, com maior precisão, as causativas sintéticas com

verbos transitivos no PB.

Para discutirmos as propriedades sintáticas das causativas sintéticas formadas como

verbos transitivos, no PB, adotamos a análise de Blanco (2010, 2011), baseada em Pylkkänen

(2002, 2008). Isso posto, destacamos a importância da discussão de Blanco (2010, 2011), ao

examinar o diagnóstico proposto por Pylkkänen (2002, 2008), em relação ao padrão

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selecional fásico. Nessa perspectiva, Blanco (2010, 2011) defende que causativas formadas

com os verbos make, em inglês, e com os verbos hacer, em espanhol, apresentam o padrão

selecional fásico, em que o vCAUSE é capaz selecionar como complemento um vP fásico.

Além disso, essas causativas apresentam o padrão de Non-Voice-Bundling em relação à

realização de VoiceP. Assim, Blanco (2010, 2011) argumenta que VoiceP é uma fase que

pode ser selecionada por vCAUSE e possibilita projetar um argumento externo no domínio da

sentença encaixada. Ao adotarmos a parametrização vP fásico e Non-Voice-Bundling,

conforme a discussão de Blanco (2010, 2011), foi possível assumir que as causativas

sintéticas são derivadas de causativas analíticas. Dessa forma, postulamos que as causativas

sintéticas com verbos transitivos apresentam dois argumentos externos, um projetado pelo

VoiceP acima de vCAUSE e outro argumento externo, complemento do núcleo causativo. No

segundo VoiceP, será projetado um DP proarb

, interpretado como um causado que carrega

traço [+agentivo]. Esse DP proarb

torna-se fundamental à causativa sintética, pois é esse DP

que permite a interpretação de um sujeito indeterminado capaz de executar o evento descrito

pelo verbo transitivo projetado na raiz. Além disso, assumimos que, semanticamente, as

causativas sintéticas requerem um instrumento para a realização da ação verbal. Assim, com

base em Pylkkänen (2002, 2008), postulamos que, se o instrumento for realizado nessa

sentença, será projetado por meio de um núcleo aplicativo alto, que virá em posição de

adjunção ao vP.

Em suma, diante dessas considerações, passamos a reconhecer que as causativas

sintéticas formadas com verbos transitivos, no PB, não são resultantes de um tipo de

alternância lexical ou sintática, mas se tratam de uma derivação de uma estrutura analítica

subjacente. Por fim, esperamos que essa análise contribua para os estudos translinguísticos

sobre as sentenças causativas.

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Recebido Para Publicação em 30 de outubro de 2015.

Aprovado Para Publicação em 03 de fevereiro de 2016.