artroscopia e osteotomia extensora do primeiro metacarpo · osteoarthritis arthroscopy/utilization...

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rev bras ortop. 2016;51(Suppl 1):S24-S31 www.rbo.org.br 0102-3616/© 2016 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados. Artigo original Artroscopia e osteotomia extensora do primeiro metacarpo para tratamento da rizartrose nos estágios iniciais I Ricardo Kaempf de Oliveira a,b, *, Rafael Pêgas Praetzel a,b , Leohnard Roger Bayer a,b , Pedro José Delgado c a Grupo de Cirurgia da Mão, Hospital Mãe de Deus, Porto Alegre, RS, Brasil b Grupo de Cirurgia de Mão, Hospital Santa Casa de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil c Grupo de Cirurgia de Mão, Hospital Universitário Montepríncipe, Madri, Espanha RESUMO Objetivo: Descrever a técnica e os resultados da artroscopia associada à osteotomia extensora do primeiro metacarpo para o tratamento da rizartrose em suas fases iniciais. Métodos: Foram incluídos e analisados neste trabalho 14 pacientes submetidos à artroscopia e osteotomia extensora do primeiro metacarpo para o tratamento de rizartrose dos tipos I e II de Eaton, no período entre janeiro de 2004 a dezembro de 2009, com avaliação completa e mínimo de 60 meses de evolução pós-operatória. A indicação da técnica descrita foi de dor e incapacidade funcional há mais de seis meses, sem melhora com o tratamento conservador. Resultados: A média de idade dos pacientes foi de 49,7 anos. A análise radiográfica no momento da cirurgia evidenciou que cinco pacientes apresentavam rizartrose tipo I de Eaton e nove, tipo II. Todas as osteotomias consolidaram, com uma média de 4,9 semanas. O tempo de seguimento médio entre a cirurgia e a avaliação final foi de 100,7 meses. Dois pacientes permaneceram com dor e foram submetidos à nova cirurgia. Dos 12 pacientes restantes, houve melhora dos sintomas em todos. A avaliação radiográfica final mostrou um bom alinhamento articular. Conclusões: O uso de artroscopia e osteotomia no tratamento das fases iniciais da rizartrose mostrou-se eficaz, levando a resultados satisfatórios. Houve melhora da estabilidade articular e correção do posicionamento do metacarpo em relação ao trapézio. É uma cirurgia preservadora, minimamente invasiva, com baixa morbidade e que evita a progressão do processo degenerativo na maioria dos pacientes. I Trabalho desenvolvido no Hospital Mãe de Deus e Hospital Santa Casa de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil. * Autor para correspondência. E-mail: [email protected] (R.K. Oliveira). informações sobre o artigo Histórico do artigo: Recebido em 23 de julho de 2015 Aceito em 25 de janeiro de 2016 Palavras-chave: Polegar/patologia Doenças musculoesqueléticas/cirurgia Osteoartrite Artroscopia/utilização Trapézio/cirurgia Osteotomia/utilização

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rev bras ortop. 2016;51(Suppl 1):S24-S31

www.rbo.org.br

0102-3616/© 2016 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia. Publicado por Elsevier Editora Ltda. Todos os direitos reservados.

Artigo original

Artroscopia e osteotomia extensora do primeiro metacarpo para tratamento da rizartrose nos estágios iniciaisI

Ricardo Kaempf de Oliveiraa,b,*, Rafael Pêgas Praetzela,b, Leohnard Roger Bayera,b, Pedro José Delgadoc

a Grupo de Cirurgia da Mão, Hospital Mãe de Deus, Porto Alegre, RS, Brasilb Grupo de Cirurgia de Mão, Hospital Santa Casa de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasilc Grupo de Cirurgia de Mão, Hospital Universitário Montepríncipe, Madri, Espanha

R E S U M O

Objetivo: Descrever a técnica e os resultados da artroscopia associada à osteotomia

extensora do primeiro metacarpo para o tratamento da rizartrose em suas fases iniciais.

Métodos: Foram incluídos e analisados neste trabalho 14 pacientes submetidos à artroscopia

e osteotomia extensora do primeiro metacarpo para o tratamento de rizartrose dos tipos I

e II de Eaton, no período entre janeiro de 2004 a dezembro de 2009, com avaliação completa

e mínimo de 60 meses de evolução pós-operatória. A indicação da técnica descrita foi de

dor e incapacidade funcional há mais de seis meses, sem melhora com o tratamento

conservador.

Resultados: A média de idade dos pacientes foi de 49,7 anos. A análise radiográfica no

momento da cirurgia evidenciou que cinco pacientes apresentavam rizartrose tipo I de

Eaton e nove, tipo II. Todas as osteotomias consolidaram, com uma média de 4,9 semanas.

O tempo de seguimento médio entre a cirurgia e a avaliação final foi de 100,7 meses. Dois

pacientes permaneceram com dor e foram submetidos à nova cirurgia. Dos 12 pacientes

restantes, houve melhora dos sintomas em todos. A avaliação radiográfica final mostrou

um bom alinhamento articular.

Conclusões: O uso de artroscopia e osteotomia no tratamento das fases iniciais da rizartrose

mostrou-se eficaz, levando a resultados satisfatórios. Houve melhora da estabilidade

articular e correção do posicionamento do metacarpo em relação ao trapézio. É uma cirurgia

preservadora, minimamente invasiva, com baixa morbidade e que evita a progressão do

processo degenerativo na maioria dos pacientes.

I Trabalho desenvolvido no Hospital Mãe de Deus e Hospital Santa Casa de Porto Alegre, Porto Alegre, RS, Brasil.* Autor para correspondência.E-mail: [email protected] (R.K. Oliveira).

informações sobre o artigo

Histórico do artigo:

Recebido em 23 de julho de 2015

Aceito em 25 de janeiro de 2016

Palavras-chave:

Polegar/patologia

Doenças musculoesqueléticas/cirurgia

Osteoartrite

Artroscopia/utilização

Trapézio/cirurgia

Osteotomia/utilização

rev bras ortop. 2016;51(Suppl 1):S24-S31 S25

Keywords:

Thumb/pathology

Musculoskeletal diseases/surgery

Osteoarthritis

Arthroscopy/utilization

Trapezium bone/surgery

Osteotomy/utilization

Arthroscopy and extensor osteotomy of the first metacarpal for the treatment of early-stage rhizarthrosis

A B S T R A C T

Objective: To describe the technique and the results of arthroscopy associated to extensor

osteotomy of the first metacarpal for the treatment of early-stage rhizarthrosis.

Methods: Fourteen patients who were submitted to arthroscopy and extensor osteotomy of

the first metacarpal for the treatment of Eaton types I- and II-rhizarthrosis, from January

2004 to December 2009 were included and evaluated, with a comprehensive, 60 month-

minimum, postoperative assessment. The indication for the described technique consisted

of pain and functional impairment for more than six months, along with no improvement

with conservative treatment.

Results: Mean patient age was 49.7 years. Radiographic analysis at the time of surgery

showed that five patients had Eaton type-I, and nine patients had Eaton type-II

rhizarthrosis. All osteotomies healed at a mean time of 4.9 weeks. Average follow-up

between the surgery and final assessment was 100.7 months. Two patients remained with

pain, and were submitted to a new surgical procedure. Of the 12 remaining patients, all

had symptom improvement, and the final radiographic assessment demonstrated a good

joint alignment.

Conclusions: The use of arthroscopy and osteotomy for the treatment of early-stage

rhizarthrosis has been demonstrated to be effective, leading to satisfactory outcomes.

There has been an improvement of joint stability and correction of metacarpal positioning

as regards to the trapezium bone. It is a preserving, minimally invasive and low-mortality

procedure that can avoid the progression of the degenerative process in most patients.

Introdução

A peculiar anatomia da articulação carpometacárpica do pole-gar (ACP), que permite movimentos em três planos, pode sofrer um processo degenerativo precoce, principalmente em pessoas com instabilidade articular.1–4 A maioria desses pacientes não necessita de tratamento específico, já que não apresentam sin-tomas ou incapacidade.5–7

Para os pacientes sintomáticos com rizartrose existem várias possibilidades de tratamentos, cirúrgicos ou não. Quando ocorre falha no tratamento conservador, a técnica ope-ratória escolhida depende mais da preferência do cirurgião do que de uma avaliação clínica da gravidade da doença ou por característica do paciente.8,9

As indicações clássicas de artrodese para os jovens e artro-plastias com implantes para os idosos já não são a regra no tratamento, em função do alto índice de complicações e mor-bidade.10 Com isso, a maioria dos pacientes tratados cirurgi-camente para rizartrose é submetida à trapeziotomia, com ou sem plastia de suspensão. Porém, uma técnica cirúrgica não pode ser aplicada a todos os pacientes, independente da fase de evolução da doença.11–13 Os estágios iniciais da rizar-trose ocorrem principalmente em mulheres jovens e ativas, que podem se beneficiar de um procedimento reconstrutivo e minimamente invasivo que preserve o trapézio.3

A osteotomia extensora do primeiro metacarpo (OEPM) para o tratamento das fases iniciais de rizartrose foi descrita por Wilson14 e tem sido pouco utilizada até hoje, devido à neces-

sidade de imobilização e da utilização de material de síntese para a estabilização óssea.14,15

Nos últimos 10 anos houve uma evolução dos materiais de artroscopia para pequenas articulações (fig. 1). Isso permitiu um diagnóstico preciso das patologias articulares degenerati-vas com mínima morbidade.16–22

Figura 1 – Evolução das ópticas para artroscopia.

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Este trabalho descreve a técnica e analisa os resultados de pacientes com rizartrose do tipo I e II de Eaton que não tive-ram boa resposta após seis meses de tratamento conservador e foram submetidos à artroscopia e OEPM.

Métodos

No período entre janeiro de 2004 e dezembro de 2009, 16 pacientes foram submetidos à artroscopia e OEPM para o tra-tamento de rizartrose do tipo I e II de Eaton. Por falta de segui-mento adequado, dois pacientes foram excluídos. Portanto, foram analisados neste trabalho 14 pacientes, com avaliação completa e com mínimo de 60 meses de evolução pós-opera-tória. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética Institucional.

Os pacientes apresentavam estágios iniciais de rizartrose, com hipermobilidade na ACP. O diagnóstico da patologia e seu estadiamento foram feitos por meio de exames radiográficos da ACP nas incidências anteroposterior com antebraço pronado (incidência de Robert) e perfil (fig. 2).

Figura 2 – Radiografias em incidência anteroposterior (A) e perfil (B) demonstrando rizartrose grau II de Eaton (com subluxação entre o trapézio e o primeiro metacarpo) de uma paciente de 42 anos de idade.

A indicação da técnica descrita foi de dor e incapacidade funcional há mais de seis meses, sem melhora com tratamento conservador. O procedimento é contraindicado em pacientes idosos e em estágios avançados de rizartrose.

Além dos 16 pacientes operados, houve outros cinco pacien-tes para os quais foi indicado o procedimento, porém durante a realização da artroscopia foi diagnosticado um grau de degene-ração articular avançado, o que contraindicou a realização de osteotomia. Tais pacientes foram, então, submetidos à trapezio-tomia e plastia de suspensão do primeiro metacarpo com uso do abdutor longo do polegar, e não foram incluídos no trabalho.

Técnica cirúrgica

O procedimento é realizado com bloqueio regional de plexo braquial e com uso de garrote pneumático. Inicialmente, o paciente é posicionado em decúbito dorsal para a realização da artroscopia da ACP. Uma malha chinesa é fixada no pole-gar, para facilitar seu posicionamento e a colocação de tração contínua ao zênite, com dois ou três quilos. O braço deve ser fixado à mesa por um esparadrapo largo, servindo como con-tratração (fig. 3).

Figura 3 – Correto posicionamento para a realização da artroscopia do polegar. Observe a tração realizada no polegar e a colocação da torre de artroscopia e o intensificador de imagem no lado contrário ao membro superior operado.

A ACP é encontrada por palpação. Inicialmente, a articulação é dilatada com a infiltração de 1 a 3 mL de soro fisiológico. A inserção da agulha deve ter uma angulação de 20° de proximal para distal, seguindo a anatomia da articulação. Isso facilita a entrada da óptica, evitando dano iatrogênico ao tecido carti-laginoso.

A artroscopia é realizada com a utilização de dois portais, um radial, chamado de 1R, e outro ulnar, o 1U. O 1R se localiza volar ao abdutor longo do polegar; já o 1U é ulnar ao extensor curto do polegar (fig. 4).

Utiliza-se uma óptica de 1,9 mm de diâmetro, com 30° de angulação. Devido ao pequeno tamanho da articulação, a ins-peção é realizada principalmente com o giro da angulação da óptica.

Na artroscopia, inicialmente se realiza a sinovectomia, com auxílio de um shaver adequado para pequenas articulações. Esse debridamento inicial permite o acesso a toda a articula-ção, com visualização do tecido condral, cápsula e ligamentos (fig. 5). O portal 1U é utilizado principalmente para visualização do ligamento oblíquo anterior. O retensionamento ligamentar térmico, com uso de radiofrequência, é controverso. Os autores não recomendam seu uso isolado como estabilizador articu-lar. Deve-se lembrar que em pequenas articulações pode haver risco de lesão térmica aos tecidos sadios.

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*

Figura 4 – Parâmetros utilizados para a confecção dos portais da artroscopia da base do polegar. EPL, extensor longo do polegar, *, extensor curto do polegar; Setas, portais da artroscopia.

Figura 5 – Visão artroscópica de lesão cartilaginosa na base do primeiro metacarpiano juntamente com sinovite e corpos livres articulares.

Após a artroscopia, a tração é retirada e a mão é posicionada em uma mesa lateral ao corpo do paciente, para a realização da osteotomia do primeiro metacarpo. A incisão previamente

realizada para o portal 1U da artroscopia é estendida dis-talmente para a exposição da base do primeiro metacarpo. Recomenda-se uma dissecção cuidadosa a fim de evitar lesão aos ramos sensitivos do nervo radial.

Inicialmente, coloca-se um fio de Kirschner localizando a articulação. Em seguida, são colocados mais dois fios, que serão usados como guias para os cortes da osteotomia: o primeiro a 1 cm distal à articulação e paralelo a ela; o segundo deve ser inserido 3 mm distal ao primeiro e deve formar um ângulo de 30° com este, fazendo com que encontre o primeiro antes da cortical volar (fig. 6). Depois, realizam-se os cortes com serra oscilante (fig. 7). Deve-se ter cuidado para não romper a cortical volar, o que causará instabilidade na osteotomia.

Figura 6 – Após a realização da artroscopia, colocação de fios de Kirschner como guia para a realização da osteotomia extensora do primeiro metacarpo em cunha de fechamento (A). Observe que um fio de Kirschner está no interior da articulação servindo como parâmetro para o local e a angulação da osteotomia (B).

Figura 7 – Ressecção da cunha óssea no dorso da base do metacarpo com uma serra óssea delicada (A e B).

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A osteotomia é fixada com um único fio de Kirschner de 1,2 mm. O fio é inserido inicialmente de forma oblíqua, através da osteotomia, na diáfise do metacarpo, de proximal para distal, saindo na região tenar. Em seguida, reduz-se a osteotomia, e o mesmo fio é inserido de forma retrógrada, fixando a osteoto-mia e a articulação. A fixação permite a redução da subluxação articular (fig. 8). A ressecção da cunha dorsorradial da metáfise proximal do metacarpo leva o polegar para uma posição mais estendida e abduzida (fig. 9).

Figura 8 – Fixação percutânea com fio de Kirschner de 1,2 mm para a estabilização da osteotomia. Observa-se o correto alinhamento da articulação e a melhora da subluxação articular (A e B).

Figura 9 – Mobilidade completa com três meses de evolução após a realização de artroscopia e osteotomia do primeiro metacarpo (A, B e C).

Após o término da cirurgia, coloca-se uma tala gessada envolvendo o polegar. Os pacientes são acompanhados de forma ambulatorial semanalmente até a retirada do fio, que se dá em média em cinco semanas. Com a remoção do fio, os pacientes são submetidos a um protocolo de reabilitação, com terapeuta de mão, por um período de quatro a seis semanas, para ganho de mobilidade e força.

Resultados

Todos os 14 pacientes acompanhados eram do sexo feminino. A média de idade foi de 49,78 anos, variando de 43 a 57 anos. A análise radiográfica no momento da cirurgia evidenciou que cinco pacientes apresentavam rizartrose tipo I de Eaton, e nove, tipo II. O intervalo médio entre o início dos sintomas e a cirur-gia foi de 11,28 meses, variando de 6 a 24 meses.

Quanto ao método de fixação da osteotomia, 10 pacientes foram fixados com um único fio de Kirschner; três pacien-tes com um fio de Kirschner e cerclagem com fio de aço; e um paciente foi fixado com placa e parafusos de 2,0 mm. Todas as osteotomias consolidaram, com uma média de 4,92 semanas. Não houve casos de pseudoartrose ou retardo de consolidação.

O tempo de seguimento médio entre a cirurgia e a avalia-ção final dos resultados foi de 100,71 meses, variando de 65 a 132 meses.

Entre os 14 pacientes, dois permaneceram com dor após a retirada do fio da osteotomia, não apresentando resposta ao tratamento medicamentoso e fisioterápico. Para eles foi indi-cada nova cirurgia, com trapeziotomia e plastia de suspensão do metacarpo, com boa evolução. Outro paciente evoluiu com parestesia do ramo sensitivo do nervo radial, que melhorou espontaneamente após seis semanas. Não houve casos de infec-ção, cicatriz hipertrófica ou síndrome da dor regional complexa.

Dos 12 pacientes restantes, o resultado com relação à mobili-dade do polegar foi bom, com todos os pacientes apresentando oponência completa, tocando a polpa do polegar na prega de flexão proximal do dedo mínimo. Não houve qualquer perda de mobilidade da ACP relacionada ao procedimento cirúrgico.

A força de preensão foi medida com o dinamômetro Jamar®, colocado na posição três, e a força de pinça chave (lateral) foi mensurada com o pinch meter. Todas as medidas foram realiza-das conforme a técnica padrão, com o cotovelo fletido em 90° e sem apoiar o membro superior na mesa. Observou-se a força média de preensão de 83,48% quando comparado com o mem-bro contralateral, variando de 65% a 124%. Já a força de pinça chave foi de 79,54% quando comparado com o lado contrala-teral, variando de 68% a 118%. A avaliação radiográfica final mostrou um bom alinhamento da ACP em todos os pacientes, sem subluxação. Todos os pacientes com o tipo II de rizartrose permaneceram nele, e três pacientes que apresentavam o tipo I evoluíram para o tipo II, porém todos assintomáticos.

A avaliação da dor foi feita por meio de uma escala analó-gica-digital, na qual o paciente apontava, em uma régua, de zero (sem dor) a 10 (pior dor possível). No pré-operatório, a média de dor foi de 7,57, variando de 5 a 10. Já no pós-operató-ria, a média foi de 1,08, variando de zero a 3.

Com relação ao resultado do tratamento informado pelos 14 pacientes, solicitamos a escolha entre as seguintes opções: muito satisfeito, satisfeito, pouco satisfeito e insatisfeito. Do total dos pacientes, 13 se consideraram muito satisfeitos e um, satisfeito.

Discussão

A rizartrose é uma patologia comum, que causa grande inca-pacidade, com dor, fraqueza e deformidade. Em suas fases

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iniciais, ocorre principalmente em mulheres ativas de meia--idade. Após os 55 anos de idade, a rizartrose ocorre em 33% das mulheres e em 11% dos homens; não se sabe, porém, quais pacientes serão sintomáticos.9

Apesar da sua grande prevalência, a exata etiologia para o aparecimento do processo degenerativo ainda é desco-nhecida. Recentemente, sua origem tem sido relacionada à lassidão ligamentar. O complexo ligamentar localizado na ACP gera extraordinária estabilidade, sem restringir a mobi-lidade, apesar da grande força gerada nos movimentos de pinça.23,24 Ele é formado por cinco ligamentos principais: o ligamento oblíquo anterior, também chamado de volar beak; o ligamento dorsorradial; o primeiro ligamento intermeta-carpal; o ligamento oblíquo posterior; e o ligamento cola-teral ulnar. A falha da estabilidade ligamentar gera sinovite e hipermobilidade, que causarão dor, mesmo quando ainda não há dano à cartilagem, como nos pacientes do tipo I de Eaton. Pelegrine6 considera o ligamento oblíquo anterior o estabilizador primário da articulação, e sugere a direta cor-relação da sua integridade com o aparecimento da artrose. O ligamento volar oblíquo apresenta importante função na cinemática do polegar, permanecendo tenso em oposição, sendo um pivô durante a pronação e a abdução. Portanto, a suficiência do ligamento oblíquo anterior gera instabilidade articular volar, com translação dorsal do metacarpo, redu-zindo a área de contato articular, levando à lesão condral. A função do ligamento dorsal radial na estabilidade articular ainda é motivo de debate, mas se crê que ele também impeça a translocação dorsal do metacarpo.3,8

Pacientes com rizartrose com falha no tratamento con-servador se beneficiam da reconstrução cirúrgica. Diferentes procedimentos foram propostos para se obter um polegar funcional e sem dor. Existe grande controvérsia sobre qual o melhor método de tratamento, principalmente porque a maioria deles apresenta ótimos resultados. A maioria das técnicas descritas revela mais de 80% de bons resultados. O problema está em determinar qual a melhor técnica para cada tipo de paciente.5

Em 2012, Wolf e Delaronde25 publicaram uma pesquisa com cirurgiões americanos de mão mostrando que em pacientes jovens, com rizartrose em fases iniciais, alguns preferem manter o tratamento conservador, apesar do fracasso inicial, enquanto outros partem para a opção cirúrgica, dividindo-se entre a reconstrução ligamentar proposta por Eaton, a osteo-tomia e a artroscopia.

Eaton e Littler26 descreveram uma reconstrução ligamen-tar aberta para as fases iniciais de rizartrose, utilizando uma porção do tendão do flexor radial do carpo, que é considerada até hoje uma técnica útil, reprodutível, durável e que retarda o aparecimento da artrose. Eaton et al.27 e Freedman et al.28 evi-denciaram que apenas 8% dos pacientes submetidos à recons-trução ligamentar evoluíram para artrose tipo III e IV após uma média de 15 anos; porém, 71% dos pacientes revelaram que permaneceram com dor moderada após a cirurgia. A técnica de Eaton até hoje não é amplamente utilizada, principalmente devido à demanda técnica durante a cirurgia, à necessidade de fixação articular provisória com fio de Kirschner e ao longo período de recuperação.24

Apesar da importância prática da classificação da rizartrose proposta por Eaton e Glickel,2 existe uma dificuldade em defi-nir o estágio da lesão baseando-se exclusivamente em uma avaliação radiográfica. Barron et al.7 concluíram que o uso da tomografia computadorizada ou da ressonância magnética não auxilia nessa classificação e, portanto, não ajudam na definição do tratamento. Para os pacientes nas fases inicias de rizartrose, quando sintomáticos e com instabilidade da ACM, pensamos que a artroscopia possibilita um exame completo da articu-lação com mínima morbidade. Foi um método inicialmente indicado apenas como auxílio diagnóstico, mas que aos poucos foi incorporado no tratamento de patologias degenerativas e traumáticas.16–18

A artroscopia tornou-se uma técnica essencial no trata-mento ortopédico das grandes articulações. Com o avanço tecnológico, a artroscopia das pequenas articulações, como da ACM, torna possível uma visualização direta de todos os componentes articulares, incluindo a sinovial, a superfície arti-cular, os ligamentos e a cápsula.16–21 Assim, com um procedi-mento minimante invasivo consegue-se definir o real estágio degenerativo e tratar a patologia ao mesmo tempo. Além disso, permite uma mudança no plano de tratamento durante o pro-cedimento, caso a avaliação radiológica não esteja de acordo com o dano articular, como ocorreu em cinco pacientes trata-dos por nós.

O tratamento da rizartrose por artroscopia foi descrito ini-cialmente por Menon.19 Ela indicou para pacientes em está-gios avançados, com subluxação articular maior que 1/3, não a mencionando para estágios iniciais. Badia17 definiu uma classificação artroscópica para a rizartrose e determinou um algoritmo de tratamento. Na classificação artroscópica, foi observada uma diferença entre os achados cirúrgicos e os critérios radiológicos utilizados para a classificação de Eaton e Glickel.2

A osteotomia extensora do metacarpo é outra opção pouco invasiva para o tratamento dos pacientes com estágio inicial de rizartrose. É uma técnica simples e não muito utilizada, porém continua útil para os pacientes jovens. A realização da osteotomia não impede ou dificulta outro procedimento que possa ser realizado nessa articulação.29

Concordamos que uma das causas principais da rizartrose seja a incapacidade do ligamento oblíquo anterior, que gera instabilidade e dano condral. Com a osteotomia ocorre uma modificação do eixo de carga da articulação, da porção volar para a dorsal. Isso muda a área de apoio, promovendo alívio da dor, redução da contratura em adução e melhora da força de pinça. Além disso, a OEPM restaura a estabilidade articular. Shrivastava e Koff30 concluíram que a osteotomia de 15° de extensão reduz a instabilidade articular em todas as direções durante o movimento de pinça.

Nossos resultados com o uso de artroscopia e osteotomia são superiores aos de Toimano,24 que utilizou a osteotomia iso-lada para os pacientes com rizartrose. Ele avaliou 12 pacientes, com um acompanhamento médio de 25 meses, tendo obtido consolidação em todos, com um tempo médio de sete semanas. Todos os pacientes ficaram satisfeitos com o procedimento. A força de gripe e pinça aumentaram em média 8,5 e 3,0 kg. Achamos que a realização da artroscopia antes da osteotomia seja uma segurança, garantindo que o grau de degeneração

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articular esteja numa fase inicial. Para obter resultados favo-ráveis com o uso da osteotomia é importante selecionar cor-retamente os pacientes. Tal procedimento não é indicado para indivíduos com artrose avançada quando a porção dorsal da articulação.

Quanto ao uso da termocoagulação isolada do ligamento volar oblíquo, indicada por Yao e Park3 e Badia,16 acreditamos ser uma técnica arriscada para o tratamento da instabilidade articu-lar, e carece ainda de comprovação científica. Por isso, indicamos a osteotomia como estabilizador da instabilidade articular.

A fixação para estabilizar a osteotomia pode ser feita com placa e parafusos de minifragmentos, fio de Kirschner e cer-clagem e somente fio. Nos casos iniciais desta série, utilizamos placa e parafusos e fios de Kirschner com cerclagem. Com o passar do tempo, com a experiência adquirida, começamos a realizar a fixação com um único fio de Kirschner, sem qualquer tipo de problema com a consolidação do metacarpo.17

O uso da artroscopia e da osteotomia para o tratamento da rizartrose deve ser feito por médicos capacitados e com treinamento adequado. É recomendado, antes de começar a utilizar a técnica, realizar cursos em cadáveres, evitando riscos de complicações e lesões iatrogênicas à articulação. Também é importante salientar o custo do procedimento, uma vez que é necessário material de artroscopia específico para peque-nas articulações e do intensificador de imagem para realizar a osteotomia.

Conclusão

A artroscopia e a osteotomia no tratamento das fases ini-ciais da rizartrose mostraram-se eficazes, levando a resul-tados satisfatórios. Houve melhora da estabilidade articular e correção do posicionamento do metacarpo em relação ao trapézio. É uma cirurgia preservadora, minimamente invasiva, com baixa morbidade e que evita a progressão do processo degenerativo na maioria dos pacientes. Estudos prospectivos e com maior número de pacientes são necessários para defi-nir o papel da artroscopia e da osteotomia no tratamento da rizartrose.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

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