artigo - um divã para dois
TRANSCRIPT
Centro Universitário de Várzea Grande
Curso de Psicologia
Turma PSI11/1
Várzea Grande – MT
Novembro - 2013
Trabalho apresentado à disciplina de Técnicas
de Intervenção em Psicanálise
Orientador: Prof ª Ms. Caroline Weiss
Acadêmicos: Keila Maria Cavalheiro
Tamires de Freitas Ferreira
1. INTRODUÇÃO
Esse trabalho tem o objetivo de mostrar alguns conceitos psicanalíticos
articulando à obra “Um divã para Dois”. Visa relacionar os conceitos de transferência
positiva e transferência negativa e ainda sobre a pulsão de vida e pulsão de morte, para
que assim o leitor tenha um breve entendimento sobre os mesmos, sendo todos esses
conceitos descritos formulados por Freud.
1.1 Objetivo Geral
No presente artigo pretendemos trabalhar alguns conceitos psicanalíticos
articulando os mesmos à obra “Um divã para dois” (2012) do diretor David Frankel.
1.2 Objetivos Específicos
Análise e descrição de transferência positiva e transferência negativa na relação
dual analista-paciente
Análise de pulsão de vida e pulsão de morte
Descrição e análise de recalque
1.3 Justificativa
A partir de um referencial psicanalítico, esse trabalho visa proporcionar um
melhor entendimento ao leitor sobre os dois tipos de transferências, sobre as pulsões de
vida e de morte e ainda sobre os desejos recalcados, relacionado aos personagens.
1.4 Metodologia
Neste trabalho será desenvolvido um estudo psicanalítico das relações
transferenciais que ocorrem na relação dual analista-paciente, referente aos
personagens; sobre a pulsão de vida e a pulsão de morte relacionadas aos mesmos e
sobre o recalque, que ocorre na personagem principal.
3. APRESENTAÇÃO DO CASO
A obra “Um Divã para Dois” nos mostra as dificuldades de um casal de meia
idade. Onde nos mostra uma mulher insatisfeita com o seu relacionamento, que foi
desgastado pelo decorrer dos anos, e também pelo desinteresse de seu esposo. Após 30
anos de casamento, eles não parecem ter mais interesses em comum. Ela já viu os filhos
crescidos saírem de casa, e ele ainda trabalha como contador, numa vida “pacata”; ela
cozinha, ele assiste a programas de golfe. Dormem em quartos separados. Diante deste
fato, ela resolve pagar uma terapia intensiva com um terapeuta de casais; e mesmo
revoltado, seu esposo o acompanha.
3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1 Transferência
A transferência é um instrumento fundamental para que tenha a análise, pois
trata-se de uma relação dual, analista-analisando, sendo esta relação dinâmica, ou seja,
viva. Destaca-se ainda que a transferência advém do contato emocional dos pacientes
com a situação psicanalítica. E ainda, a mesma leva o analista a apresentar uma resposta
emocional frente ao seu paciente. Sendo, é necessário que se destaque que esse encontro
envolve duas pessoas, logo, duas vivências. E desse relacionamento surgirão afetos,
sentimentos, vivências inconscientes que vão produzir mutualidade, tratamento
relacional que está inserido na esfera da intersubjetividade.
“A transferência é, antes de mais nada, a colocação em ato das mesmas
fantasias que outrora se expressaram sob a forma dos primeiros laços
afetivos. Portanto, convém entender que a transferência não é a repetição de
uma antiga relação, mas a atualização de uma fantasia. [...] O manejo da
transferência exige do analista não só uma grande habilidade e experiência,
mas também uma constante atividade de autopercepção. O instrumento do
psicanalista não é apenas o saber, mas acima de tudo, seu próprio
inconsciente, único meio que ele dispõe para captar o inconsciente do
paciente.” (NASIO, 1995, p. 46)
Logo, pode-se afirmar que, para que uma análise ocorra e para que continue, tem
que haver a relação transferencial, pois a transferência é condição de sucesso de análise,
logo, sem a mesma, a análise iria ao fracasso, pois assim não obteria um contato com o
inconsciente do paciente, que é o ponto central da teoria psicanalítica.
E na obra “Um Divã para Dois”, essa relação transferencial acontece, porém
pelo fato de ser uma terapia para casal, a transferência ocorre de formas diferentes. Com
a personagem de Meryl Streep, Kay, a transferência ocorre de forma positiva; já com o
personagem de Tommy Lee Jones, a transferência ocorre de forma negativa.
3.1.2 Transferência Positiva
Em “A dinâmica da Transferência” (1912), Freud formula dois tipos de
transferência. A transferência positiva é aquele no qual há a transferência de
sentimentos ternos, amigáveis. Sendo assim, essa transferência é relacionada com o
desejo de colaborar, de trabalhar com determinação na situação analítica, para que
assim, seguir adiante com a psicanálise, apesar das resistências ou da transferência
negativa. Observa-se ainda que, para Freud, a análise centra-se na ideia da transferência
positiva sublimada, que é aquela relação transferencial baseada na confiança e na
simpatia.
“A transferência positiva decompõe-se ainda na dos sentimentos amigáveis
ou ternos que são capazes de consciência, e na dos prolongamentos destes no
inconsciente.” (FREUD, 1912, p. 143)
Logo, nesse aspecto, relacionado à obra, afirma-se então que a personagem Kay
em sua relação transferencial com o analista, obteve a transferência positiva, pois ela
estava tentando de todas as formas contribuir com a análise, para que assim conseguisse
um relacionamento “melhor” ao que ela estava vivenciando. E a relação dela com o
analista é fundamentada na confiança, pois ela conta coisas que ela não contaria para
ninguém, até mesmo seus desejos recalcados.
3.1.3 Transferência Negativa
Essa transferência é carregada de sentimentos hostis por parte do analisando para
o analista. Aqui a resistência não permite que o analista tenha contato com o
inconsciente do analisando. E também reflete o deslocamento de impulsos agressivos.
Mas, algo importante a ser ressaltado é que, na verdade, os sentimentos hostis
costumam se esconder por detrás dos afetuosos; ou seja, tendem a se revelar mais tarde,
embora possa também encontrar a convivência de ambos, marcando assim, o que Freud
chama de ambivalência. E não podem desconsiderar os sentimentos hostis como relação
transferencial, pois mesmo que seja um sentimento hostil, com um sinal de “menos”,
não deixa de ser um vínculo terapêutico.
E é justamente isso que ocorre com o personagem Arnold; o mesmo, ao chegar
na primeira sessão de análise, estava totalmente hostil com o terapeuta, não colaborando
com o processo de análise. Porém, no decorrer das sessões, o mesmo foi deixando os
sentimentos hostis, até ele chegar a colaborar na análise. E mais ainda, chega num
estágio em que ele não se satisfaz mais com o relacionamento do jeito que está e vai
atrás de um “recomeço”.
3.2 Pulsões de vida e Pulsões de morte
Segundo Freud, as pulsões de vida tendem a investir tudo libidinalmente e a
manter a coesão das partes da substância viva. Essas pulsões não tem o caráter
regressivo característico das pulsões, mas sim um caráter construtivo, uma vez que um
princípio fundamental de tal pulsão é o princípio de ligação, que consiste em instituir
unidades cada vez maiores e conservá-las, princípio este que está associado a nova
concepção de Freud sobre a sexualidade.
Já as pulsões de morte tendem ao desligamento, ao desprendimento da libido dos
objetos e ao retorno inelutável do ser vivo a tensão zero, ao estado inorgânico. Nessa
pulsão, compreende-se assim à castração libidinal.
Logo, percebe-se então que, enquanto a pulsão de vida é representada pelas
ligações amorosas que estabelecemos com o mundo, com as outras pessoas e até mesmo
com nós mesmos, podemos também perceber que na pulsão de morte seria mais
manifestada pela agressividade que poderá estar voltada para si mesmo ou até mesmo
pelo o outro, e, além de ser caracterizada pela agressividade traz a marca da compulsão
a repetição do movimento de retorno à inércia pela morte também.
Comparando com o filme “Um Divã para dois” podemos perceber o estado de
pulsão de morte no esposo, pelo fato dele ser um pouco agressivo com sua esposa e não
dar muita atenção para ela. Ele sempre faz as mesmas coisas, é sempre o mesmo tipo de
ritmo, desde quando acorda até a hora de dormir, tornando-se “satisfeito” com a vida
que tem, vida essa que se torna desgastante e desconfortável para a esposa. Percebe-se
nele uma inércia, querendo apenas o repouso e o silêncio, fato que representa a
tendência da pulsão de morte.
Freud formula isso em suas últimas teorias das pulsões, onde as pulsões de
morte representam a tendência fundamental de todo ser vivo a retornar a um estado
anorgânico. E mais, ele elabora o conceito de pulsões de morte ao observar os
fenômenos de repetição, que o levou a ideia do caráter regressivo da pulsão.
Ao falar desse fenômeno de repetição, podemos comparar com uma cena do
filme, no momento do café da manhã, onde a personagem Kay sempre faz as mesmas
coisas para o seu esposo e até mesmo quando vai se deitar antes de dormir, o esposo
assiste “seu” jogo como todas as noites e logo vão dormir em quartos separados.
As pulsões de morte representam um retorno a um estado anterior ou, em ultima
análise, o retorno ao repouso absoluto do anorgânico. O princípio de prazer parece estar
a serviço da pulsão de morte.
Já na personagem Kay, percebemos o estado de pulsão de vida, pois percebe-se
nela a pulsão libidinal e a autopreservação do Ego. E também pelo fato do objetivo dela
ser a ligação libidinal ou atamento dos laços, que foi “perdido” durante os anos de
casamento.
3.3 Recalque
De acordo com Freud, o recalque é um dos conceitos cruciais da psicanálise.
Consiste em um mecanismo que remete eliminar do seu consciente representações que
considera inaceitável. É um processo ativo no qual o indivíduo tenta manter ao nível do
inconsciente, emoções, desejos, lembranças, pulsões e afetos que são considerados
repugnantes para um determinado indivíduo ou para sociedade.
Articulando com o filme, podemos perceber na esposa que ela recalca seus
desejos e suas emoções, para não “afetar” o seu companheiro e com isso ela acaba
resguardando pra si mesmo tudo o que ela está sentindo. Em muitas das vezes ela tenta
conversar com ele mais quando ela percebe que ele começa a ficar estressado, ela deixa
de lado e não termina o que tinha começado a falar a ele.
Até mesmo quando o casal vai à terapia, ela recalca as lembranças de prazer que
tinha com o seu esposo. A partir do memento que ele começa a falar de alguns
momentos em que eles estavam sozinhos no momento de prazer que ela começa a falar.
E é interessante que mesmo após tantos anos juntos, ela ainda deixa alguns desejos
recalcados e que depois da terapia de casal, eles tentam colocar esses desejos recalcados
em prática.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse artigo teve o intuito de esclarecer alguns conceitos importantes e cruciais
para a teoria psicanalítica articulando os mesmos com a obra “Um Divã para Dois”.
Percebemos então o quão importante é a transferência para a análise, seja ela
positiva ou negativa; o importante mesmo é que ela ocorra para que assim a análise
continue a fluir, ou seja, para que assim o analista possa ter um contato com o
inconsciente do analisando.
Há ainda os conceitos de pulsão de vida e pulsão de morte, concluindo assim que
o par pulsões de vida/pulsões de morte é regida pela ação conjunta de dois princípios
fundamentais: o de encontrar o passado e encontrar o prazer.
E finalizando pelo recalque, que conclui-se que seja uma defesa automática e
inconsciente com que são repelidas do consciente as ideias que são perigosas,
“inaceitáveis” pelo próximo ou pela sociedade.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FREUD, Sigmund. (1912). A dinâmica da transferência. In: Edição Standard
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Vol. XII. Rio de
Janeiro: Imago, 1996.
NASIO, J. D. Introdução as Obras de Freud, Ferenczi, Groddeck, Klein, Winnicott,
Dolto, Lacan. Rio de Janeiro: Zahar, 1995.
ROBERT, Priscila P., KUPERMANN, Daniel. Dor e resistência na clínica
psicanalítica. O manejo das transferências negativas em Freud – Rio de Janeiro,
2012. Cad. Psicanálise - CPRJ, Rio de Janeiro, 2012.
SANTOS, Manoel Antonio dos. A transferência psicanalítica: a abordagem
freudiana. Universidade de São Paulo – Ribeirão Preto, 1994. Disponível em:
<http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1413-389X1994000200003&script=sci_arttext>