artigo fausto borem - musicologia da performance

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 7 COOK, N. Fazendo música juntos ou improvisação e seus outros. Per Musi , Belo Horizonte, n.16, 2007, p. 07-20 Recebido em: 12/07/2007 - Aprovado em: 25/11/200 7  Fa zendo mús ica juntos ou improvi sação e seus outros Nicholas Cook (Royal Holloway, Eghan, Inglaterra) [email protected] Tradução de Fausto Borém (UFMG, Belo Horizonte) [email protected] Resumo: Ingrid Monson, entre outros, defende que falta à música de “arte” ocidental a dimensão interativa e colaborativa do jazz. Esse artigo parte da interação no jazz e de abordagens deste tema por seus teóricos, em direção a um modelo mais geral de música enquanto atividade social. Sugiro uma ampla valorização da música – qualquer música – enquanto instrumento por meio do qual aprendemos a trabalhar co m os outros, a negociar caminhos de ação c ompartilhados dentro de estruturas composicionais que são mais bem compreendidas como pontos de partida, ao invés de especicações de ação. Vislumbrar a música de “arte” ocidental nessa perspectiva e levar a sério a consideração sobre a dimensão social que Alfred Schutz há muito tempo enfatizou - em um artigo cujo título tomei emprestado - ajuda a dar uma nova roupagem à excessiva orientação pelo texto escrito que, questionavelmente, tem provido os musicólogos com uma visão deturpada da música. Palavras-chave : improvisação, performance musical, comunidade, musicologia, tradição oral e auditiva. Making music together, or improvisation and its others Abstract: It has often been claimed, for instance by Ingrid Monson, that Western ‘art’ music lacks the interactive, collaborative dimension of jazz. This article works from interaction in jazz, and approaches to such interaction by jazz theorists, towards a more general model of music as social action: I suggest that we value music—-all music—-largely as a medium through which we learn how to work with others, how to negotiate shared courses of action within compositional frameworks that are better understood as prom pts to rather than specications of action. Seeing Western ‘art’ music from such a perspective, and so taking seriously the social dimension of music that Alfred Schutz long ago emphasized in the paper whose title I have borrowed, helps to redress the excessive orientati on towards the written text that has arguably given musicologists such a lop-sided view of music. Keywords:  improvisation, music performance, community, musicology, aural/oral tradition. 1 - Música enquanto performance Abordarei meu assunto a partir de duas citações diametralmente opostas, ambas sobre a relação entre o jazz e a música da “arte” européia tradicional. De um lado, Ingrid MONSON (1996, p.74) diz que “a teorização de signicado na improvisação nos grupos de jazz deve considerar, como ponto de partida, o contexto interativo e colaborativo da invenção musical. Este contexto não tem paralelo na prática dos compositores clássicos ocidentais do período da prática comum” . Por outro lado, Alfred SCHUTZ (1964, p.177) diz que “em princípio, não há diferença entre a performance de um quarteto de cordas e as improvisações em uma  jam session de jazzistas experts ”. Uma re-conciliação entre esse dois pontos de vista divergentes é impossível; nada mais apropriado do que declarar um empate técnico. Enquanto Monson não precisa ser apresentada (voltarei a esta autora no momento apropriado), os escritos do sociólogo Alfred Schutz são menos conhecidos do que deveriam entre os musicólogos, o que se aplica particularmente ao ensaio de onde tirei ambas a minha citação e a primeira parte de meu título. Making music together: a study in social relationship  (Fazendo música  juntos: um estudo sobre relação social ) foi publicado inicialmente em 1951, e trata especicamente de questões de interação e de performance em grupo em tempo real, assuntos que estão muito presentes na pauta dos estudos atuais sobre jazz (uma das minhas posições no presente artigo é que este assunto deveria ter um espaço signicativo também na agenda da musicologia voltada para a “arte erudita” ocidental). O objetivo de Schutz neste ensaio não é tanto escrever sobre música quanto, por meio da música, escrever sobre as dinâmicas das relações sociais e, particularmente, sobre a idéia da inter-subjetividade: em uma surpreendente antecipação da linguagem do nal dos anos de 1960, ele argumenta que toda comunicação é baseada no que denomina de “relação mútua de ajuste”, e que signica um tipo de engajamento direto e inter-pessoal que acontece quando PER MUS I – Revista Acadêmica de Música – n.16, 86 p., jul. - dez., 2007

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COOK, N. Fazendo música juntos ou improvisação e seus outros. Per Musi , Belo Horizonte, n.16, 2007, p. 07-20

Recebido em: 12/07/2007 - Aprovado em: 25/11/2007

 Fazendo música juntos ouimprovisação e seus outros

Nicholas Cook (Royal Holloway, Eghan, Inglaterra)[email protected]

Tradução de Fausto Borém (UFMG, Belo Horizonte)[email protected]

Resumo: Ingrid Monson, entre outros, deende que alta à música de “arte” ocidental a dimensão interativa e colaborativado jazz. Esse artigo parte da interação no jazz e de abordagens deste tema por seus teóricos, em direção a um modelomais geral de música enquanto atividade social. Sugiro uma ampla valorização da música – qualquer música – enquantoinstrumento por meio do qual aprendemos a trabalhar com os outros, a negociar caminhos de ação compartilhados dentrode estruturas composicionais que são mais bem compreendidas como pontos de partida, ao invés de especicações deação. Vislumbrar a música de “arte” ocidental nessa perspectiva e levar a sério a consideração sobre a dimensão socialque Alred Schutz há muito tempo enatizou - em um artigo cujo título tomei emprestado - ajuda a dar uma novaroupagem à excessiva orientação pelo texto escrito que, questionavelmente, tem provido os musicólogos com uma visãodeturpada da música.Palavras-chave: improvisação, perormance musical, comunidade, musicologia, tradição oral e auditiva.

Making music together, or improvisation and its othersAbstract: It has oten been claimed, or instance by Ingrid Monson, that Western ‘art’ music lacks the interactive,collaborative dimension o jazz. This article works rom interaction in jazz, and approaches to such interaction by jazz

theorists, towards a more general model o music as social action: I suggest that we value music—-all music—-largelyas a medium through which we learn how to work with others, how to negotiate shared courses o action withincompositional rameworks that are better understood as prompts to rather than specications o action. Seeing Western‘art’ music rom such a perspective, and so taking seriously the social dimension o music that Alred Schutz long agoemphasized in the paper whose title I have borrowed, helps to redress the excessive orientation towards the written textthat has arguably given musicologists such a lop-sided view o music.Keywords: improvisation, music perormance, community, musicology, aural/oral tradition.

1 - Música enquanto performanceAbordarei meu assunto a partir de duas citaçõesdiametralmente opostas, ambas sobre a relação entre

o jazz e a música da “arte” européia tradicional. De umlado, Ingrid MONSON (1996, p.74) diz que “a teorizaçãode signicado na improvisação nos grupos de jazz deveconsiderar, como ponto de partida, o contexto interativoe colaborativo da invenção musical. Este contexto nãotem paralelo na prática dos compositores clássicosocidentais do período da prática comum”. Por outro lado,Alred SCHUTZ (1964, p.177) diz que “em princípio, não hádierença entre a perormance de um quarteto de cordase as improvisações em uma   jam session de jazzistasexperts ”. Uma re-conciliação entre esse dois pontos devista divergentes é impossível; nada mais apropriado do

que declarar um empate técnico.

Enquanto Monson não precisa ser apresentada (voltareia esta autora no momento apropriado), os escritosdo sociólogo Alred Schutz são menos conhecidos do

que deveriam entre os musicólogos, o que se aplicaparticularmente ao ensaio de onde tirei ambas a minhacitação e a primeira parte de meu título. Making music 

together: a study in social relationship (Fazendo música  juntos: um estudo sobre relação social ) oi publicadoinicialmente em 1951, e trata especicamente dequestões de interação e de perormance em grupo emtempo real, assuntos que estão muito presentes na pautados estudos atuais sobre jazz (uma das minhas posiçõesno presente artigo é que este assunto deveria ter umespaço signicativo também na agenda da musicologiavoltada para a “arte erudita” ocidental). O objetivo deSchutz neste ensaio não é tanto escrever sobre músicaquanto, por meio da música, escrever sobre as dinâmicasdas relações sociais e, particularmente, sobre a idéia da

inter-subjetividade: em uma surpreendente antecipaçãoda linguagem do nal dos anos de 1960, ele argumentaque toda comunicação é baseada no que denomina de“relação mútua de ajuste”, e que signica um tipo deengajamento direto e inter-pessoal que acontece quando

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“marchamos juntos, dançamos juntos, azemos amor  juntos” - e, é claro, “azemos música juntos” (SCHUTZ,1964, p.161-162).

Schutz dene uma relação mútua de ajuste de modo a

revelar suas credenciais de enomenólogo (ele é autorde um dos mais extensos ensaios em enomenologia damúsica [SCHUTZ, 1976]): estar engajado em música tantocomo perormer quanto ouvinte é estar engajado no queSchutz chama de “tempo interno”, a durée  de Bergson,uma temporalidade subjetiva não ligada ao tempo“externo” mostrado pelo relógio.

Ele explica isto numa passagem que nos lembra quãolonge se vai o ano de 1951 (SCHUTZ, 1964, p.171):

Deixe-nos imaginar que os movimentos lento e rápido de umasinonia preenchem um disco de 30,48 centímetros cada. Nossos 

relógios mostram que tocar qualquer uma destas aixas leva três minutos e meio cada. Este é um ato que poderia interessar o pro-gramador de uma estação de transmissão de rádio. Para o ouvinte observador, isto não signica nada. Para ele, não é verdade que otempo em que ele vivenciou o movimento lento teve a “mesma du-ração” do tempo que dedicou ao movimento rápido.

Ele explica as dierentes qualidades destes tempos: o“tempo externo” pode ser dividido em porções iguais, aopasso que, no “tempo interno”, não há subdivisões, medidasde tempo distintas do conteúdo da experiência duranteaquele tempo. Para Schutz, então, azer música juntossignica o engajamento de dois ou mais indivíduos dentrode um tempo interno compartilhado: “esta comunhão dofuxo de experiências do tempo interno do outro, estevivenciar de um presente vívido comum, constituindo. .. a relação mútua de ajuste, a experiência do ‘Nós’, queestá na base de qualquer possível comunicação” (SCHUTZ,1964: 173). Quando ele utiliza esta idéia como basepara descrever uma perormance de um instrumentistasolista com acompanhamento de teclado, o resultado (senos permitirmos uma terminologia husserliana) é quaseindistinta dos relatos sobre interação em perormanceapresentados por Monson e outros autores de estudossobre jazz: cada perormer “tem de prever o Outro pormeio da audição, atrasos e antecipações, qualquer virada

na interpretação do Outro, é estar preparado, a qualquermomento, para ser líder ou acompanhador” (SCHUTZ,1964, p.176). Dois parágraos adiante, Schutz deendeo ponto de vista de que, em princípio, não há dierençaentre um quarteto de cordas e uma  jam session.

Neste ensaio, Schutz desenvolve suas idéias atacandoparcialmente as idéias do sociólogo rancês MauriceHalbwachs. Como Schutz, Halbwachs também vêmúsica como um campo de experiências para teoriassociais mais amplo - no caso de Halbwachs, o de uma“memória coletiva” socialmente construída – mas

no caso de Schutz, para usar suas próprias palavras,Halbwachs dividiu “o campo da música em duas partesdistintas: música enquanto experiência do músico comboa ormação e música enquanto experiência do homemcomum” (SCHUTZ, 1964, p.163). Halbwachs considera

que a experiência do músico com boa ormação estábaseada na “possibilidade de traduzir música em símbolosvisuais – ou seja, o sistema de notação musical – o qualpossibilita a transmissão da música”; vista desta maneira,a composição torna-se literalmente uma questão de

manipular símbolos, e a experiência do homem comum setorna, de certa maneira, parasitária da “linguagem musicalsocialmente condicionada” dos músicos de boa ormação.Assim, cabe a Halbwach mostrar no seu argumentoque, sem o acesso à notação, os leigos são incapazes delembrar da própria música: ao contrário, se lembram deuma melodia por meio da letra da canção, se lembramde como dançar por meio das ações ísicas que estãocodicadas na dança etc. Mas Schutz pensa dierente. Eleargumenta que isto representa uma alta de compreensãode ambas a experiência musical e a notação musical: “Osímbolo musical não é nada além de instruções para o

perormer produzir, por meio de sua voz ou instrumento,um som de altura e duração denidas” (SCHUTZ, 1964,p.166). Segundo ele, os símbolos da notação – comooutros conhecimentos discursivos musicais – existemsomente no tempo externo; eles são suplantados ouapagados pelos valores prenhes de nuanças coneridos àsalturas ou durações durante a perormance e assimiladosdentro da experiência subjetiva do tempo interno.

Obviamente, o que Schutz ala sobre a notação não é bemverdade: quando ele diz que “O símbolo musical não é nadaa não ser instruções para o perormer”, esta armaçãose aplicaria mais à tablatura e não à notação na pauta.Como vejo esta questão, a “arte” erudita ocidental viveum estranho tipo de vida dupla na medida em que, por umlado, unciona como uma cultura do som experienciado(descrito por Schutz) mas, por outro, como uma culturade símbolos visíveis, uma orma esotérica de literatura(em meu livro Music, Imagination, and Culture me reroa isto como “os dois lados do mesmo tecido musical” ).A dierença entre a notação na pauta e a notação natablatura é central para esta questão, porque é atravésda notação na pauta – como uma maneira estilizadade representar padrões de som, e não simplesmenteuma série de instruções para execução imediata – que

a música é capaz de circular como um texto inteligível.Acrescentaria que, por razões que remontam ao século XIXe à ormação da disciplina a partir do modelo da lologia,a musicologia (quero dizer, a musicologia “erudita”ocidental) constituiu-se majoritariamente de estudossobre textos escritos, estudos sobre apenas um lado dotecido musical, mas não sobre o outro. Um outro ladode tareas não cumpridas, em que a musicologia de hojeterá que se haver com a música enquanto perormance– ou seja, a música que se experimenta como parte davida diária de praticamente qualquer pessoa (exceto dosmusicólogos, sou tentado a dizer).

É aí que pretendo contribuir com o presente artigo. Oproblema de tentar desenvolver uma musicologia daperormance é que, como a etimologia do termo sugere,ser um “musicólogo” é pensar a música enquanto texto

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(o que, desta maneira, ao contrário do meu comentáriosupercial na sentença anterior, está proundamenteundamentado em atores disciplinares e não em umaerudição descabida e responsável pelo distanciamentodos musicólogos da perormance). E se você pensa a

música como texto, então, é quase inevitável que vocêpense sobre a perormance como reprodução, comorepresentação em som e no tempo de algo que tem suaexistência autônoma, independentemente da perormance(e ambos os termos “reprodução” e “representação” sãoutilizados aqui como sinônimos de “perormance” quandose escreve sobre a tradição da “arte” ocidental). Então,há aí uma necessidade de se valorizar, separadamente, asnoções de música e texto. Uma das maneiras de se azeristo é por meio de comparação com outras tradições, nasquais a música não é identicada da mesma maneiracom textos escritos, ou naquelas em que a unção do

texto é dierente de sua unção dentro da tradição da“arte” ocidental – ou pelo menos, da maneira com que osmusicólogos a vêm agindo dentro da tradição da “arte”ocidental. Em diversos momentos (COOK, 2003a), tenhobuscado esta comparação dentro da tradição do gin (ouzíter longo chinês), o qual possui uma orma altamentedesenvolvida de notação – mas que unciona de umamaneira muito distinta da notação da pauta ocidental.Nele, por contraste, devo buscar uma comparação comuma tradição musical na qual a relação entre a notaçãoe a prática de perormance é mais solta, uma tradiçãoque geralmente é identicada (talvez inconscientemente)com improvisação: o jazz.

– o – o – o – o – o – o – o – o – o –

A controvérsia entre Schutz e Halbwachs pode parecerobscura como ponto de partida para um estudo destanatureza, mas o argumento de Schutz possui ramicaçõesmuito amplas: essencialmente, ele diz que, se querermoscompreender como as pessoas azem música juntas – sequerermos compreender música enquanto perormance –então precisamos pensar na música como algo dierenteda tradição letrada, baseada no texto. E a impermeáveldistinção que Halbwachs tentou erigir e à qual Schutz

se opôs – entre a música letrada da tradição da “arte” ea música puramente auditiva do cidadão comum – estáortemente relacionada com a distinção igualmenteimpermeável que se tornou lugar-comum nos textossobre jazz: aquela entre a tradição da música de “arte”baseada na partitura e a tradição oral e auditiva do jazz.Um exemplo recente e surpreendente é a contribuição deBruce JOHNSON (2002) para o Cambridge Companion toJazz , ao qual deu o título de Jazz as cultural practice .

O argumento básico de Johnson é que a sociedadeinstitucionalizada de hoje é “centrada na visão”: o visualé privilegiado sobre o auditivo e o oral para “manter umregime de conhecimento-como-controle” (JOHNSON, 2002,p.100). Como uma expressão autorizada desta sociedadeinstitucionalizada, a música de “arte” está centrada no texto,o qual representa “o objeto do oco visual-mental de cada

músico que se dirige diretamente ou é conduzido a partir do‘altar’ central”. O programa está centrado no “opus ”: é ummonóculo de escopo hegemônico, um olho engajado emum ‘produto’ “(JOHNSON, 2002, p.102). Por contraste, “jazzdistingue-se dos modelos da música-de-arte por priorizar o

ouvido na perormance de improvisações coletivas. O jazz éum ponto auditivo dentro de uma epistemologia dominadapela visão” (JOHNSON, 2002, p.104). Desta maneira, o jazzé marginalizado por uma economia de cultura orientadapara a obra “acabada” da música, e por aquilo que Johnsonchama de “estética musical autorizada” (JOHNSON,2002, p.105), o que pode ser epitomizado pelo “eminentemusicólogo de Sorbonne André Pirro”, que armou que“nunca mais irei a concertos. Porque ouvir música? Lê-la já é o bastante” (JOHNSON, 2002, p.103). Johnson,conseqüentemente, deplora qualquer reconciliação entre o

 jazz e a musicologia, a qual ele descreve como “um dos mais

conservadores de todos os discursos críticos” (JOHNSON,2002, p.112), martelando sem piedade quando deendeque “o jazz, em aspectos muito relevantes, tem mais emcomum com as práticas improvisatórias não-musicais doque com as práticas musicais não-improvisatórias e, poristo, é melhor compreendido em relação a estas últimas”(JOHNSON, 2002, p.103).

A expressão de Johnson sobre esta distinção reratária entreo literato e o auditivo-oral, entre música de “arte” e o jazzpode ser extrema, mas suas preocupações estão disseminadasna literatura sobre jazz. Duas áreas particularmente sensíveisestão relacionadas com o que é percebido como tentativas

da indústria do conhecimento institucionalizado de invadiro jazz. Uma delas é a institucionalização da educação do

 jazz, percebida como uma insinuação dos valores da culturaletrada a partir de seu interior, produzindo, assim, músicos de

 jazz que pensam como os músicos de “arte” – músicos paraos quais o jazz é um estilo ou uma habilidade ao invés de um“jeito artístico particular de viver a vida” (BERLINER, 1994,p.486). O outro, mais obscuro, mas talvez mais insidioso poresta razão, é a tentativa de abraçar o jazz dentro das práticasde análise da música de “arte”, colocando o jazz dentro docânone, demonstrando como ele também é, à sua maneira,uma música de “arte” (uma inspiração que tem, claro, servido

de motivação para certos músicos de jazz, a partir da época de‘Duke’ Ellington). Os argumentos a respeito de como, porquee se devemos analisar o jazz são muito antigos; alguém poderecordar, por exemplo, Sonny Rollins jurando nunca mais leras críticas sobre suas perormances depois de ler a análisede Gunther Schüller do Blue 7 , no qual Schuller elogia ainterpretação de Rollins, mostrando como ele sintetiza osvalores da música de “arte”: integração, coesão estruturale organicidade. É diícil articular o que está sendo debatidoaqui sem levantar a distinção (permeável ou não) que estápor trás de tudo: raça.

Talvez mais infuente do que a tradição da análiserepresentada por Schuller (e, depois dele, pela adoçãode métodos teóricos como conjunto de notas por Je Pressing Steve ou de métodos schenkerianos por SteveLarson, por exemplo)  tem sido a tradição representada

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por Ben Sidran e Samuel Floyd Jr. A abordagem de Sidrané explicitamente baseada no mapeamento da distinçãoentre as tradições letrada e auditiva-oral, e aquelas entreo branco e o negro: reverbera aqui um eco de Schutzquando ele escreve que “não apenas é possível que a

tradição oral do homem oral seja ‘incompreendida’ pelohomem letrado – uma alha na comunicação – mas queo homem literato alhe mesmo em reconhecer que umatentativa de comunicação está, de ato, em curso” (In:WALSER, ed. 1999, p.298). Algumas sentenças depois, eleacrescenta que “assim, um desentendimento completo estáno coração da relação entre a América negra e a Américabranca”. Os ecos de Schutz continuam quando Sidrandescreve “a abordagem ‘negra’ peculiar do ritmo” como“em unção de uma abordagem oral maior da época” (In:WALSER, ed. 1999, p.299), o que é, em si mesmo, o produtode uma “natureza de comunhão inerente à improvisação

oral” 

(Por causa disto, ele acrescenta: “Capturar os ritmosda música aricana ou aro-americana moderna com anotação ocidental é muito parecido com tentar capturaro mar com uma rede”). Floyd desenvolve a idéia de umasensibilidade inerente aos negros por meio de sua evocaçãodo amplamente diundido conceito de “Signiyin(g) ” deHenry Louis Gates Jr. Segundo ele, a qualidade centraldo discurso negro é a intertextualidade dierentementegurada que, em música, dá margem para Floyd chamarde série de “declarações, armações, alegações, buscas,retomadas, implicações, simulacros e simultaneidadesmusicais”, por meio das quais os músicos reerenciam apeça que estão tocando, reerenciam a perormance umdo outro e reerenciam a tradição auditiva do jazz comoum repositório de perormances de outros músicos – cujoresultado, Floyd arma, é o eeito de “narrar” dos “músicosnegros quando dizem que ‘contam uma história’ quandoimprovisam” (In: WALSER, 1999, p.409).

Isto certamente teve um impacto sobre a posição dosmúsicos de jazz brancos (ao quais, discute-se, tenderama ser marginalizados na historiograa do jazz), masnão estou sugerindo que esta consideração racial dadistinção entre o literato e o auditivo-oral seja umacolocação racista, no sentido de que é baseada em valores

biológicos e não culturais. Ao mesmo tempo, isto traz àtona uma orma de essencialismo, expresso, por exemplo,por meio de conceitos abstratos como “homem oral”(o qual Sidran opõe ao “homem letrado”). O resultado éum entrincheiramento destas categorias que se opõe– e assim, porque é mapeado nelas, um entrincheiramentoda oposição entre jazz e música de “arte”. Isto cria umatendência para o pensamento estereotipado que discutiem relação ao capítulo de Johnson. Por um lado, o jazzé visto como paradigmaticamente auditivo-oral – e, porisso, puramente auditivo-oral -, apesar da evidência deseu papel ubíquo desempenhado na prática do jazz nos

textos escritos, que vão desde notações musicais até livrossobre teoria; reqüentemente tem sido apontado que aimprovisação, no jazz e em diversas outras maniestaçõesmusicais, é uma das mais miticadas de todas as práticasculturais (STERRITT, 2000). Por outro lado, temos uma visão

da música de “arte” que não deixa espaço para o papelcriativo do perormer, no qual o ouvido não tem prioridadee no qual a armação esnobe do musicólogo rancês sobrenão ir mais a concertos (certamente uma parárase deBrahms) é apresentada como se osse representativa da

vida cotidiana dos amantes da música clássica.

Meu argumento é mais especíco. O estereótipo “letrado”pode ser aplicado à música de “arte”, concebida comoum tipo de texto literato, mas não se aplica à música– qualquer música, incluindo a música de “arte” - naperormance. Meu argumento é que azer música juntosenvolve precisamente aquelas características que oramdescritas como auditivas-orais, ao invés de letradas, comonegra ao invés de branca, com pertencente ao jazz aoinvés de música de “arte”. A distinção real, para resumir,está entre a música enquanto texto e a música enquanto

perormance.

2 - Performance enquanto improvisaçãoA improvisação, elemento geralmente considerado comodenidor do jazz, não é apenas altamente miticada, mastambém ortemente marcada em termos ideológicos.  Opróprio termo ocupa um espaço perigoso: em dierentesculturas, a idéia de “improvisação” tem sido vista comosubjacente à idéia de “obra” ou “composição”, de tal ormaque a improvisação é o “outro” da composição, um termo“marcado” e, por isso, subordinado (BLUM, 1998, p.36).Paul BERLINER (1994, p.2) observa que a improvisação

é geralmente descrita “em temos do que não é, ao invésdo que é”; Leo TREITLER (1991, p.66-67) a caracterizacomo “a exceção de algo normal e mais consolidado,algo com todos os atributos que altam à improvisação:preparação, orientação, um planejamento anterior, umprogredir previsto e fuente”, acrescentando “algo que, éclaro, é ‘composição’ ”. Este tipo de valorização negativaoi proclamada de muito conspicuamente em um livrode 1944, com o título ameaçador de Verdict on Índia(SUTTON 1998, p.72): “A música indiana é quase queexclusivamente improvisatória. A arte não é, nem nuncaoi, e nunca poderá ser uma questão de improvisação”. Ficadiícil, então, não ver traços de um, talvez não intencional,

racismo na comum visão de outrora de que os músicos de jazz são “iletrados em relação à expressão verbal de suaprópria arte”. É particularmente assustador que visõescomo essa podem ser encontradas em contextos ondeuma agenda ideológica seria menos provável, como nomodelo computacional para improvisação bebop de PhilipJohnson-Laird (cujo propósito é vericar, da maneiramais parcimoniosa possível, a variedade com que osimprovisadores tocam). JOHNSON-LAIRD (1991, p.292)arma, como se isto osse uma verdade evidente, que

“A característica psicológica essencial da improvisação musical, seja elano jazz moderno, na música clássica, da Índia, da Árica ou de qualquer outro tipo, é que os próprios músicos não tem um acesso consciente aos processos que sublinham sua produção musical. Uma pessoa comumpode achar esta armativa surpreendente, mesmo inacreditável; umpsicólogo cognitivista achará isto prosaico.” 

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A consolidada pesquisa etnográca de BERLINER(1994) tem alseado visões como esta da maneiramais abrangente que se possa imaginar: os músicos de

  jazz possuem uma etno-teoria elaborada e altamentearticulada, e que se relaciona diretamente e em grande

extensão com temas undamentais da análise do jazz.Por exemplo, JOHNSON-LAIRD (1991, p.292-293)diz que “Um mal entendido reqüente é dizer que [aimprovisação] depende da aquisição de um repertório demotivos. . . que, depois, são alinhavados um após o outropara ormar uma improvisação. . . qualquer músico de

 jazz competente sabe que é muito mais ácil criar novasrases do que tentar aprender um vasto repertório delese utilizá-los em solos”. É provável que o ponto de vista deJohnson-Laird refita uma estética romântica titubeante(possivelmente, na linha da crítica de Collingwood sobre“arte alsa”) e os princípios lingüísticos chomskynianos,

ao invés de discussões reais com músicos de jazz,competentes ou não, uma vez que os inormantes deBerliner disseram justamente o contrário: “Veteranos sereerem aos padrões discretos que armazenam nos seusdepósitos de repertório como vocabulário, idéias, licks,truques, pet patterns, crips, clichês e, na linguagem maisuncional, coisas que você consegue azer”, ao passo que“Para alguns músicos, este é o oco total de seus primeirosprogramas de estudo” (BERLINER, 1994, p.102, 101). Masé provável que a posição de negação de Johnson-Laird,enquanto consideração sobre o papel de elementosaprendidos na análise do jazz, também refita umaabordagem excessivamente redutiva da repetição: paraele, um padrão ou é repetido literalmente ou é dierente– e, desta orma, seria diícil imaginar como músicos de

 jazz poderiam memorizar padrões sucientes para supriras improvisações de uma vida inteira.

  Várias características relevantes na minha argumentaçãoestão incorporadas no modelo esquemático de improvisaçãode Je PRESSING (1988), reproduzido no Ex.1.

Trata-se de uma representação do processo por meiodo qual um improvisador vai de um evento E 

i  para um

evento E i+1

; em que o papel central é desempenhado

pelo “Gerador de Cadeias” (array generator ) central,cuja saída (output ) determina o evento E 

i+1, e para

o qual tudo dentro de E i 

é uma entrada (input ). Decerta maneira, o modelo pode ser visto como umdesenvolvimento das implicações de Ted GIOIA (1988,p.60), quando ele caracteriza a improvisação no jazzcomo uma “retrospectiva”: o improvisador reage ouresponde ao evento E 

i , analisando-o ou “decompondo-

o” em um certo número de aspectos, cada um tendopotencial para uma possível continuação. Estadecomposição é um processo em várias camadas, noqual o evento é analisado primeiro como “Acústico”,

“Musical” (o que se reere à representação cognitiva),“Movimento” (gesto) e “Outros” aspectos, e no qualcada um destes aspectos é analisado, por sua vez, comoO(bjetos), C(aracterísticas) e P(rocessos). Dentro dequalquer uma destas dimensões, a relação entre E 

i e E 

i+1 

pode ser de similaridade ou contraste. Comparado coma categorização simplista do igual ou do dierente deJohnson-Laird, o modelo de Pressing tem a fexibilidadenecessária para capturar todo o espectro de técnicastransormacionais que BERLINER (1994, p.186-) chama

de emparelhamento (coupling ), usão, cruzamento decontorno (contour   crossover ), recobrimento (overlap),truncamento (truncation), substituição e um tipo depermutação de aspectos de um motivo para outro: comoBERLINER (1994, p.146) coloca – e isso é, em essência,exatamente o que o modelo de Pressing representa– “os músicos trazem infexões e ornamentos de rasesespecícas para ornamentar outras rases”, de ormaque “virtualmente, todos os aspectos podem servir comomodelos composicionais”.

Mas esta abordagem concatenacionista (para tomar

um termo emprestado de Jerrold Levinson [1997] paracaracterizar a natureza seqüencial da escuta cotidianada música) representa apenas um aspecto do modelode Pressing, cujo elemento mais conhecido é o que elechama de “reerente”. De acordo com Bruno NETTL (1998,p.15), “pode-se armar, como um ato crível, que osimprovisadores sempre têm um ponto de partida, algo queeles utilizam para improvisar”. Charles Mingus expressoua mesma idéia mais sucintamente quando disse a TimothyLeary: “Você não consegue improvisar sobre o nada, cara.. .você tem de improvisar sobre alguma coisa” (KERNFELD,1995, p.11). Da mesma orma, Pressing dene o reerentecomo um “guia subjacente e especíco de uma obra ou umesquema utilizado pelo músico para acilitar a geração docomportamento improvisado” (PRESSING, 1998, p.153),uma ormulação que inclui diversos princípios comumentechamados de parárase, improvisação motívica e órmulasde improvisação.  Cada um destes princípios envolve umareerência ao modelo abstrato em um ponto qualquer daimprovisação, contrário ao movimento seqüencial de E

para E i+1

, e é por esta razão que o reerente é mostrado naparte de baixo do Ex.1, como uma entrada separada parao gerador de cadeia. Vale a pena notar que a improvisaçãotambém envolve reerência a construtos que não sequalicam como reerentes no senso estrito de Pressing

(pois, para ele, a reerência é especíca de cada peça),mas que exercem um papel comparável no processoimprovisatório: rero-me, por exemplo, a expectativaspadronizadas em relação à moldagem temporal dos solose ao “repertório de composições, solos clássicos e rasesdiscretas” (BERLINER, 1994, p.493) que representam atradição do jazz internalizada pelo instrumentista, assimcomo o estoque pessoal de “licks , piruetas, pet patterns ,crips , clichês. . . e coisas que você consegue azer”, aoqual me reeri anteriormente.

A característica do reerente que quero enatizar neste

contexto – e ao qual retornarei mais à rente – é afexibilidade da relação entre o reerente e a improvisaçãonele baseada e, por isso, da natureza do próprio reerente.PRESSING (1998, p.52) diz que, no jazz, “o reerente é aorma canção, que inclui melodia e acordes”, mas que,

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   E  x .   1

  –   M  o

   d  e

   l  o  e  s  q  u  e  m

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   d  e

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   d  e

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  ;   R  e  p  r  o

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   ã  o

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   d  a  p  o  r

   C   l  a  r  e  n

   d  o  n

   P  r  e  s  s

   ) .

   A  c   ú  s   t   i  c  o  s

   M  u  s   i  c

  a   i  s

   M  o  v   i  m  e  n   t  o

   O  u   t  r  o  s

      E   1

      E   i  -   2

      E   i  -   1

      E   i

   A  s  p  e  c   t  o  s

      I     n      t     e     g     r     a      d     o

   A  c   ú  s   t   i  c  o  s

   M  u  s   i  c  a   i  s

   M  o  v   i  m  e  n   t  o

   O  u   t  r  o  s

   D  e  c  o  m  p  o  s   i  ç   ã  o

  e  m    C  a   d  e   i  a  s

   E  n   t  r

  a   d  a   d  e  g  r  u  p  o  s

   d  e  e  v

  e  n   t  o  s  a  n   t  e  r   i  o  r  e  s

   T  e  s   t  a   d  o  r

   d  e   i  n

   t  e  r  r  u  p  ç   ã  o

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     {                 P     r     e      t     e     n      d      i      d     o

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   P

   G  e  r  a   d  o  r   d  e   C  a   d  e   i  a  s

   D   i  s  p

  a  r  a   d  o  r

   d  e   M  o

  v   i  m  e  n   t  o

   S  o  n  s   d  e  o  u   t  r  o  s

     P    e    r     f    o    r    m    e    r    s

   R  e   f  e  r  e  n   t  e

   O   b   j  e   t   i  v  o  s

   M  e  m   ó  r   i  a

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     E   i  +   2

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   O

   C

   P

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claro, é muito fexível: no bebop, a orma canção pode serrepresentada somente por meio da progressão harmônica e,mesmo assim, há uma enorme fexibilidade nas disposiçõesdos acordes (voicings ) e substituições. Ed Sarath se reere

à “desconstrução do reerente” (SARATH, 1996, p.20),trazendo eetivamente a própria idéia de “decomposição”de Pressing para relacionar com o reerente, mas ocandoparticularmente em aspectos da consciência do tempo,desta maneira provendo uma ligação que nos leva de voltaao ensaio Making music together  de Schutz. Correndo orisco de uma simplicação exagerada, a idéia centralda abordagem de Sarath é que os improvisadores nãotrabalham em termos de notas individuais, à maneira domodelo computacional de Johnson-Laird, mas em termosde grupos signicativos de notas – os “motivos” cujaexistência Johnson-Laird negou. Somente nos pontos de

  junção entre estes grupos é que o instrumentista seriacapaz, nas palavras de Sarath, “revigorar” ou, em outraspalavras, avaliar se ouve e determina a próxima rase daimprovisação apropriadamente.

O Ex.2 mostra o que está em questão: os echa-parêntesesindicam pontos de revigoramento, enquanto que o colchetehorizontal mostra uma rase prolongada, não interrompidapor pontos de revigoramento. Uma vez embarcado nestarase, o instrumentista está comprometido a continuar atéseu nal, independentemente do que ocorra. Em suma, éum “clichê de jazz” (SARATH, 1996, p.10) e esta situaçãocorresponde aos relatos de David SUDNOW (1978, p.32)

sobre os primeiros estágios da perormance do piano no jazz (“A mão postada em uma direção, se dirigindo para otodo, primeiro, comprometida com seu movimento de saídae, depois, comprometida com sua inalterada continuaçãonaquela direção particular”). Em contraste, o Ex.3 mostraa mesma música, concebida dierentemente: a longarase é quebrada em grupos menores de notas, cada umcom um ponto de revigoramento, criando, a cada vez, apossibilidade de outras continuações, outras decisões emtempo real, baseadas no desenrolar dos eventos (cadaponto de revigoramento de Sarath poderia ser vistocomo correspondente a um dos “eventos” do modelo de

Pressing). Esta ligação muito mais íntima do ouvir e dotocar corresponde ao que SUDNOW (1978, p.152) chamade “cantar com os dedos”: é esta experiência que Sarathchama de “transcendência” e que Berliner evoca quando

diz que “Sob os extraordinários poderes de concentraçãodo solista, as aspectos do cantar e da visualização damente atingem uma pereita união entre concepção ecorpo. . . Nenhum tempo autônomo separa concepção deexpressão e o hiato entre intenção e realização desaparece”(BERLINER, 1994, p.217). Neste ponto, torna-se óbvio quea concepção de Sarath poderia ser acilmente traduzidana linguagem do tempo-consciência husserliano, dandoorigem a algo próximo da articulação do tempo internode Schutz. Obviamente, é de Schutz a visão de que isto seaplica igualmente à perormance do jazz e à perormanceda música “de arte” ocidental. Através da mesma habilidadede revigorar e responder aos eventos correntes, os membrosde um quarteto de cordas mantêm o andamento entre si,a anação entre si, o equilíbrio sonoro entre si, em suma,azem música juntos.

Mas há algo que venho rodeando, mas que não devo adiarmais: as implicações, segundo as quais, a improvisaçãono jazz pode ser compreendida tanto como um solo oucomo uma atividade coletiva. Talvez o mais limitante dospressupostos de Johnson-Laird seja que a improvisaçãono jazz é uma atividade puramente solística; mas não hánada dele que eu possa citar diretamente neste sentido,porque ele nem mesmo levanta a possibilidade de que

a improvisação possa ser outra coisa. PRESSING (1988,p.154) permite, dentro do seu esquema, a infuência deoutros instrumentistas no início da improvisação (porisso, a entrada no gerador de cadeia denominada “Sons deoutros instrumentistas”, vide Fig.1 acima), mas na prática,ele não dá tanta ênase; “Para simplicar. . .” diz ele, “. . .alamos primariamente em termos de improvisação solo noque segue, acrescentando os eeitos de outros perormersdiretamente quando necessário, em certos pontos”. Naverdade, suspeito que aça mais sentido ver a improvisaçãosolo como um caso especial de improvisação coletiva doque o contrário: o elemento central em ambos os modelos

Ex.2 – Frase improvisada com pontos de revigoração(SARATH, 1996, p.10, Fig.8; Reprodução autorizada pelo autor)

Ex.3 – Frase improvisada com mais pontos de revigoração(SARATH, 1996, p.12, Fig.12; Reprodução autorizada pelo autor).

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de câmara, e música de câmara é precisamente “umveículo para uma orma de socialização musical”. Possodeender este ponto em termos de uma perormance doQuarteto de Cordas em Sol Maior, K.387 de Mozart (comopraticamente qualquer outro quarteto de cordas serviria

como exemplo). Os músicos podem muito bem tocar asnotas exatamente como Mozart as escreveu. Mesmoassim, eles não as tocam exatamente como Mozart asescreveu, porque cada nota na partitura está sujeita a umanegociação contextual de anação, de valores precisos dedinâmica, de articulação, de qualidade tímbrica etc. Porexemplo, os perormers mantêm o andamento não porquecada um acomoda a sua maneira de tocar a uma pulsaçãoexterna (como acontece com músicos de estúdio com oclick track ), mas porque cada um está continuamenteescutando o outro, acomodando seu andamento ao dosoutros, resultando em uma temporalidade compartilhada,

comunal – o “tempo interno” compartilhado da “relaçãomútua de ajuste” de Schutz (o que literalmente tambémse aplica, claro, à esera dos ajustes da anaçãodos músicos). MONSON (1996, p.186) advoga umacompreensão da estrutura musical que tenha “como umade suas unções centrais a construção de um contextosocial” e o K.387  (ou qualquer outra obra de câmara)ilustra o que isto pode signicar: a partitura de Mozartcoreograa uma série de envolvimentos sociais contínuosentre os músicos, ormando uma estrutura ou objetivocompartilhado (uma missão compartilhada, se preerir),mas delegando decisões detalhadas a serem realizadasem tempo real por indivíduos em destaque e à luz dascondições locais – condições a serem improvisadas,assim como acontece na vida cotidiana. 2 Como tudo istodepende da interação entre os perormers, é também uminsulto acusar um músico erudito de não estar escutando,como se az no jazz.

De acordo com SARATH (1996, p.21),“. . .mesmo as perormances de repertório. . . podem ser consideradas como uma espécie de improvisação. Pois, mesmonas obras inteiramente compostas, os perormers terão algumas opções criativas quanto ao volume das dinâmicas, infexões,andamento, reqüência do vibrato e outras nuanças expressivas.Se os perormers intérpretes não mudam as notas ou os ritmos 

delineados pelo compositor, certamente des-constroem padrões de interpretação pessoais ao buscar espontaneamente a realização de peças que eles já tocaram incontáveis vezes” 

O argumento inicial e provocativo de Sarath não é de ormaalguma único: Carol GOULD e Kenneth KEATON (2000,p.143), por exemplo, argumentam que “tanto os perormersde jazz quanto os eruditos interpretam suas peças e, aoazerem isso, improvisam”, concluindo que “as perormancede jazz e eruditas dierem mais quanto ao grau do que tipo”.De ato, pode-se reclamar que Sarath não avança muito,quando diz que os peromers intérpretes “não mudam asnotas ou os ritmos”, pois, como já expliquei, eles, de ato,

mudam (e todo o processo de ensaio são negociaçõespara mudá-los). Ou, talvez, osse melhor dizer que elestransormam os valores puramente indicativos da partitura(onde um Dó# está exatamente a meio caminho entre o

de Pressing e Sarath é a resposta do improvisador à suaprópria perormance, como nas palavras de Lonnie Hillyer,nas quais improvisar “é realmente como um cara tendouma conversa consigo mesmo” (BERLINER, 1994, p.192)e uma das experiências características da improvisação

fuente no jazz é que – como SUDNOW (1978, p.xiii)coloca – “os dedos azem a música por conta própria”  

1. Isto pode soar como um tipo de personalidade dupla,mas pode ser mais bem compreendido nos termos dareerência de Schutz (a qual citei anteriormente) sobre “amútua relação de ajuste, a experiência do ’Nós’, que estána base de toda possível comunicação”. O “Nós” inter-subjetivo de Schutz, ativado por meio da experiência deum “tempo interno” comum, abarca não apenas o Eu eos outros instrumentistas, mas também o público. ComoBERLINER (1994, p.459) coloca, “os perormers e ouvintesormam um circuito de comunicação no qual as ações

de cada um aetam continuamente o outro”. Nessascircunstâncias, az sentido ver a improvisação solo comoum caso especial da improvisação em grupo, na qual os“outros” estão invisíveis o que, conseqüentemente, colocadiculdades maiores, e não menores, para o analista.

De toda orma, tanto para os que o praticam quantopara os que o comentam, o aspecto de comunhão noato da improvisação do jazz é essencial: para Sidran, “Asvantagens do modo oral se maniestam na habilidade derealizar atos espontâneos, geralmente improvisados, denatureza grupal” (citado por WALSER ed. 1999, p.298),

enquanto que para Matthew BUTTERFIELD (2000, p.3), “aperormance ao vivo do jazz é uma interação social porexcelência”. MONSON (1996, p.68, 84) compara tocar umgroove  com “andar pela rua” com alguém, expressandoa primazia do ouvido nessa interação, quando mencionaque “Dizer que um músico ’não escuta’. . . é um insultograve”. Esta autora também enatiza a indissolubilidadeentre o groove  e o solo: “o vocabulário melódico dosolista de jazz que improvisa”, diz, “deve sempre servisto como emergindo em um complexo diálogo entreo solista e a seção rítmica” (MONSON, 2002, p.114). Amesma idéia é expressa sem meias-palavras por WadadaLeo Smith, um virtuoso debochado segundo o qual ”amaioria dos ‘analistas de música’ que, alegadamente,transcreveram as linhas de solo dos grandes mestres. .. não os representaram bem, porque não transcreveramo todo da linha mas, ao contrário, isolaram somenteum elemento da linha. Nas avaliações desta música, aopinião corrente tem sido que a linha do solo é a criaçãodo ‘solista’ e os outros improvisadores envolvidos sãomeros acompanhadores. Essa avaliação não é correta”(citado por WALSER, 1999, p.321). É previsível queJOHNSON (2002, p.106) – por quem começo a tercompaixão por se destacar como quem não se sustenta– se agarra a esta outra divisão reratária entre jazz e

música de “arte”: “A improvisação coletiva contínua é. . .um veículo para uma orma de socialização musical queé periérica à tradição do artista-indivíduo, do ‘solista’“.

Então, haveria, na tradição da “arte”, isto que é a música

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Dó e o Ré, e uma semínima é exatamente duas vezes maislonga do que uma colcheia) em valores com nuanças daperormance. Ou, para traduzir isso em termos schutzianos,as categorias abstratas de tempo externo são apagadas ousuplantadas pelos valores subjetivos, pessoalmente situados,

do tempo interno: a partitura é deixada para trás e passaa ser não mais que uma pré-história da perormance – eeste é o sentido no qual, no tempo real da perormance,não há dierença, em princípio, entre uma perormance deum quarteto de cordas e as improvisações em uma  jam

session por músicos de jazz experts . 3 MONSON (1996, p.80)expressa um pensamento quase idêntico: “No momentoda perormance, a improvisação no jazz simplesmente nãotem nada a ver com o texto (ou seu equivalente musical,a partitura)”. MONSON (1996, p.81), entretanto, segue paramarcar uma distinção com “a música clássica ocidental”, naqual “geralmente não é permitido aos perormers alterar. . . a

notação musical”: sem desejar negar as dierenças óbvias ouaparentes entre as tradições do jazz e clássica (voltarei a istomais à rente), espero que o argumento de Monson não maispareça evidente, plausível ou, mesmo, talvez, sustentável.

Poderia ter escolhido um caminho muito menos cheio devoltas para argumentar, contra a armação de Monson,que “o contexto interativo e cooperativo da invençãomusical [no jazz]. . . não tem paralelo nas práticas doscompositores clássicos ocidentais”: poderia simplesmenteter justaposto duas descrições de músicos que combinama carreira acadêmica com um alto nível de realização na

perormance. O primeiro é a própria Monson (que tocatrompete de jazz). Ela relata (MONSON, 1996, p.141-143),sobre um momento particular na gravação de Bass-ment Blues pelo Jaki Byard Quartet, que

Dawson antecipa e reorça as quiálteras contínuas de Tucker nos compassos 5 e 6 ao preencher, com ritmos baseados em quiáltera,os espaços entre a caixa, os tom-toms e o bumbo. . . [Dawson] reorça a continuidade das quiálteras de colcheias do solo na linhado baixo. . . seus acentos na caixa articulam uma quiáltera de semínima contra esta continuidade que avança para se completar no terceiro tempo deste compasso. Dawson não teria como saber com certeza se Tucker continuaria com colcheias no compasso6, mas corretamente antecipou que ele continuaria. . . Enquantoque a decisão de Dawson de tocar quiálteras no compasso 6 possa

ser prevista em um sentido sintático. . . não há nada com o que pudéssemos predizer as escolhas exatas eitas por este músicoindividualmente. Momentos tão espontâneos e ortuitos comoesses, em que se chega junto ou que se vai junto, são altamente valorizados pelos músicos.” 

E agora, compare a descrição de John POTTER (1998,p.178-182) do canto de uma passagem da Missa Victimae Paschali de Antoine Brumel:

O superius e o bassus entram juntos, mas têm de negociar oandamento, uma vez que não há atividade rítmica no segundotempo. Isso signica, imediatamente, que os dois cantores devemestar com um contato auditivo muito próximo entre si. O altus imitao superius no meio do próximo compasso, por isso, deve ter estadoem contato semelhante com o superius, o qual lhe passou a música.Ao nal do primeiro compasso, por um breve momento, os três cantores cantam um Sol, um Lá e um Si bemol simultaneamente.É apenas uma passagem momentânea, mas que cria um momentode orte prazer que, talvez, queiram prolongar. . . Há um alto grau

de conança mútua à medida que a escala sobe e desce. . . As vozes estabelecem padrões de tensão e relaxamento com uma agudaconsciência do outro, tanto procurando se acomodar aos desejos do outro, quanto satisazendo os próprios”.

Monson e Potter podem estar alando sobre tradições

musicais bastante distintas, mas não vejo uma dierençaessencial entre os tipos de interação de perormance quedescrevem. Parece que no tempo interno de Schutz, notempo real da perormance, as distinções entre músicade “arte” e jazz, entre composição e improvisação, entreo literato e o oral – e talvez, mesmo, entre o branco e opreto – são deixadas para trás.

3 – O som da comunidadeNo início da seção anterior, me reeri à improvisação comoo outro da composição. Na realidade, esta é uma relaçãoque transita em três mãos de direção e as tentativas de

mostrar as conexões (e dierenças) entre improvisação,composição e perormance ainda está rouxa na literatura.O potencial para conusão é eloqüentemente ilustrado poruma passagem da introdução de Bruno NETTL (1998, p.5)à sua edição de In the Course o Perormance, no qual elecita a armação de Derek Bailey, de que “a improvisaçãose deleita com a curiosa distinção de ser, ao mesmo tempo,a mais amplamente praticada das atividades musicais e amenos reconhecida e compreendida”, ao comentar que

“A armação de Bailey sugere a conclusão de que um paradigmaadequado do azer musical teria a improvisação (com um nome dierente? “Composição”? – mas, anal de conta, é perormance 

também) como peça central, com uma divisão denominadacomposição (renomeada “pré-composição”?) sob a qual colocaríamos a perormance não-improvisada do pré-composto(se puder existir sem alguns elementos de improvisação).” 

Com o risco de ser reducionista, me parece que a relaçãoentre improvisação e composição não é realmenteproblemática. Há muitas características em comum: comodizem Andreas LEHMANN e Reinhard KOPIEZ (2002),“ambos os processos batem no mesmo mecanismo mentale requerem pré-requisitos similares” (pré-requisitos que,eles acrescentam, explicam porque é geralmente impossívelter a certeza se um dado arteato musical oi improvisado

ou composto 4). David STERRITT (2000, p.165) argumentaque as práticas de improvisação tipicamente envolvemelementos signicativos de “planejamento, deliberação,pré-conceituação e outras atividades mentais que nãosão completamente espontâneas, individualistas nemautotélicas, no sentido sugerido por discursos idealizadosde invenção extemporânea” (em outras palavras, ele dizque é a misticação da improvisação que a az parecertão dierente da composição). E, por outro lado, grandeparte da atividade composicional poderia ser descritacomo envolvendo a transormação do reerente, ou deuma cadeia de reerentes, o que é muito parecido com a

maneira com que Pressing descreve improvisação. Tendodito tudo isso, há uma dierença undamental, que quasenão admite casos limítroes e na qual a improvisaçãoacontece on-line  (no tempo-interno schutziano),

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enquanto que a composição acontece o-line  (notempo externo). A partir desta dierença, outras seguem.Falando de uma maneira muito geral, alguém poderiadizer que a improvisação é amplamente caracterizadapelo processamento seqüencial e concatenacionista,

modelado na parte superior do Ex.1 acima, no qual acomposição coloca uma ênase maior na reestruturaçãotemporal, acilitada por um meio representacional (anotação permite repartir ou duplicar o tempo, por assimdizer, como se dobra ou desdobra olhas de papel).Traduzido na linguagem da teoria musical, isso signicaque as composições tendem a avorecer a organizaçãohierárquica, enquanto que a improvisação tende aavorecer a organização heterárquica. Essa não é umadistinção cristalina: há elementos composicionais nasimprovisações e há elementos improvisatórios nascomposições. Mas em termos de processo, a dierença

é categórica: se você improvisa o-line então, trata-sede composição; se você compõe on-line, então, é umaimprovisação.

Por essa razão, me parece que o outro mais signicativoda improvisação é a perormance, como denido pelatradição ocularmente centrada, que Johnson descreve. Emoutras palavras, é como um processo de reprodução de umtexto autônomo. Não há uma simples distinção categórica,pois ambos os processos acontecem em tempo real eambos envolvem certo grau de reerência a modelos pré-existentes, provavelmente se estendendo até a intençãode realizar uma obra especíca (o K.387  de Mozart, o Take the “A” train ou qualquer outra coisa). Em que ponto,então, a relação essencialmente fexível nos modelospré-existentes encarnados no “reerente” de Pressingse transormam na essencialmente infexível relaçãoimplícita na idéia de perormance enquanto reprodução?Podemos tentar responder esta questão considerandobrevemente uma série de reerentes gradativamentemais detalhados. Na perormance de um standard  de

  jazz – o mais tradicional veículo para a improvisaçãodo jazz -, uma reerência para o modelo tipicamenteenvolve uma progressão harmônica (possivelmente commuita fexibilidade em temos de substituição de acordes

e voicing ); como disse anteriormente, pode, muito bem,haver muito pouca reerência, ou nenhuma, à melodia, e aorma é repetitiva e aberta. Por contraste, a perormancede um movimento lento das Sonatas para violino Op.5  de Corelli não é tão ormalmente aberta (embora asrepetições de seções não sejam sempre tratadas comoobrigatórias) e a parte do baixo provavelmente serátocada como está escrita (mas não teria sido no séculoXVIII); a progressão harmônica se mantem, mas a melodiaextemporaneamente ornamentada pode não mais guardaruma relação evidente com a notação, ao passo que aspráticas de realização das vozes no basso continuo são,

de várias maneiras, semelhantes àquelas do jazz (comodescrito em PRESSING, 1998, p.58-9).5 Meu terceiroexemplo, emprestado de Ian MACKENZIE (2000, p.175),é a perormance de danças tradicionais irlandesas, nasquais estruturas essencialmente xas são repetidas de

uma maneira aberta, com a improvisação acontecendo deorma intensa, em um nível que poderia ser denominadosub-notacional. Ele explica,

“A xidez destas ormas leva os não-acionados (como minha

amília e vizinhos) em insistir que toda música celta soa a mesmacoisa. Ainda assim, os habilidosos instrumentistas tradicionais acrescentam muitos ornamentos e rulas como slides, paradas súbitas, reqüentes arpejos e quiálteras de apojaturas.” 

No caso do meu último exemplo, uma perormanceprevisível do K.387  de Mozart, a improvisação podeocorrer exclusivamente no nível sub-notacional – o quenão é uma razão para negar o status  de improvisação. Atentativa de localizar um ponto onde a improvisação dálugar à reprodução, na medida em que o reerente torna-se mais detalhado, alha porque a idéia da obra musicalcompletamente autônoma, que não necessita de nada a não

ser reprodução, é uma quimera: como Richard COCHRANE(2000, p.140) coloca, “A prática da improvisação de atoexiste em todas as perormances, exceto naquelas realizadaspor máquinas”. Em outras palavras, para responder a Nettl,a perormance do que é pré-composto nunca existirá semalgum elemento de improvisação.

Mas não seria esta uma conclusão totalizadora e inrutíera?Não seria óbvio que há uma distinção undamental deproporção entre a improvisação em um standard de jazze um quarteto de Mozart? De acordo com Pressing (queexpande seu próprio conceito de reerente até a notaçãográca avant garde ), as notações para improvisação

devem ser “substancialmente indeterminadas. Deve havercerta indenição, ambigüidade, confito ou incompletudeno conjunto de símbolos, e deve ser de uma ordem demagnitude maior do que a indenição associada aqualquer tradição da notação composicional (PRESSING,1998, p.58). Poderíamos argumentar que, se todas asnotações musicais são, em certo grau, indenidas,ambíguas, confitantes ou incompletas em relação àperormance, 6 então a “ordem de magnitude’ de Pressing écrucial. Ainda assim, parece diícil de sustentar a intuiçãode que os standards de jazz envolvem improvisação emuma escala maior do que os quartetos de Mozart. Por

um lado, a escala envolvida não é de maneira algumatemporal: os pers de andamento não notados napartitura típicos das perormances de Furtwängler dasSinonias de Beethoven (COOK, 1996) envolvem espaçosestruturais os mais amplos possíveis (e FURTWÄNGLER[1991, p.13, 36], incidentalmente, insistia na naturezaundamentalmente improvisatória da perormanceadequada, descrevendo-a como um “processo de re-criação” no qual o perormer deveria “re-experienciare re-viver a música de uma maneira nova a cada vez”).Pequeno não quer dizer sem importância: Eve HARWOOD(1998, p.123) escreve sobre os jogos de cantar de garotasaro-americanas nos quais “As improvisações podem serminiaturas, mas são signicativas dentro da comunidade,em que os inormantes são sensíveis e altamente críticosaos menores desvios dos textos, canções e métodos debrincadeiras prescritos”.

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Anderson SUTTON (1998, p.73) argumenta que “setomarmos um exemplo absoluto. . . talvez cadainstrumentista, de alguma orma, improvisa” e, assim, “azmais sentido reservar a palavra improvisação para escolhasmais substanciais eitas no momento da perormance” – e

“substancial” ele explica, são as escolhas que “o perormerpretende que sejam apreendidas pelo público”. 7 É claroque, com este critério, as dimensões improvisatórias daperormance de música de “arte” são substanciais.

De ato, seria mesmo possível argumentar que omais alto grau de fexibilidade e espontaneidade naperormance musical é atingida precisamente naquelastradições em que os reerentes abordam a condição detextos e, principalmente, quando esses textos tornam-se um repertório mais ou menos xo ou canônico.Um dos princípios básicos das abordagens de ambos

Johnson-Laird e Pressing é a maximização de recursoscognitivos limitados: como PRESSING (1998, p.52)coloca, “Uma vez que o reerente orneça material paravariação, o perormer precisa alocar menos capacidadede processamento (atenção) para a seleção e criação demateriais”. Visto por este prisma, o relativamente pequenonúmero de obras reqüentemente tocadas que compõe orepertório ocidental de concertos unciona como o quepoderia ser chamado de “super-reerentes”: esquemassuper-aprendidos que permitem aos perormers ocarsua atenção em um grau excepcional de nuanças e deinteração em tempo real, naqueles elementos musicais que

não são capturados pelo texto notado, mas que mantêmo público ouvindo a mesma música muitas e muitas vezes(e os mesmos músicos tocando-a muitas e muitas vezes)porque, na perormance, não é a mesma música. O que égeralmente descrito em termos negativos como “museu”– como qualidade da cultura musical de “arte” ocidentalde hoje – sua interminável replicação de um minguadorepertório de “obras-de-arte” - poderia ser interpretadomais positivamente como expressando a implicação naqual o oco do interesse criativo muda da composição paraa perormance. Neste caso, a intuição de que o escopo daimprovisação na perormance da “arte” ocidental é muitomais restrito do que tradições como o jazz pode refetir,

acima de tudo, uma identicação ocularmente centradana partitura com o que é a música. Desta orma, aimprovisação que ocorre nos interstícios da notação – queé audível, mas não visível – parece signicar muito menosdo que uma improvisação que é suscetível à transcrição,na qual a improvisação pode se tornar visível. Se esteor o caso, então existe um descompasso entre a práticamusical e o discurso ocularmente centrado por meiodo que é representado. Uma maneira de pensar sobre arelação entre as dimensões reprodutivas e interpretativas(ou improvisatórias) da perormance da “arte” ocidental,az reerência ao modelo de Erving Goman da “interação

social ace-a-ace” (BUTTERFIELD, 2000, p.127). Goman,sociólogo que trabalha com a tradição de Schutz, teorizaa interação social em termos do que chama de canais deatenção: o canal da “linha principal” ou canal do “enredo”contem o conteúdo explícito da interação, enquanto

que os canais secundários – aos quais Gomann sereere como canais “direcionais” e canais “desatentos”(BUTTERFIELD, 2000, p.130-131) – comportam mensagensde atitudes que correm paralelamente, contextualizam,modicam, qualicam ou, talvez, contradizem o conteúdo

explícito (por exemplo, por meio do contato visual,movimentos de cabeça, giros de corpo ou ruídos). Se esseesquema é aplicado à perormance musical, o “enredo”corresponde ao item do repertório que está sendo tocado,enquanto que o ato da perormance corresponde aoscanais secundários, gerando signicados que corremparalelamente, contextualizam, modicam, qualicamou, talvez, contradizem aqueles inerentes ou associadasà composição. Visto dessa maneira, alguém poderia dizerque música é um meio através do qual os normalmentesilenciosos canais secundários da interação social sãotransormados em som, em algo diretamente perceptível,

e esse é realmente o caso quando uma composição – aestória – é tão amiliar que a atenção do ouvinte estámenos na composição do que na maneira como é tocada.Talvez o que você ouve, quando escuta o Quarteto deCordas K.387, seja precisamente o som da interaçãosocial, o som da comunidade – e talvez a habilidadeda música de apresentar relações interpessoais de umamaneira despojada e abstrata repousa não apenasno coração de sua estética, mas também no seu valoreducacional, no seu status como um bem social. Isso éverdade tanto para a música de “arte” ocidental quantopara o jazz, como coloca MONSON (1996, p.26): “semprehá personalidades interagindo, não apenas notas,instrumentos ou ritmos”. Mas não estaríamos agorabeirando outra conclusão totalizadora e inrutíera, umaque alha em reconhecer a dierença entre grupos deperormers – como quartetos de cordas ou quartetos de

  jazz – nos quais sempre há personalidades interagindoe aqueles grupos mais arregimentados, nos quais osperormers têm um signicado não em unção de suaatuação, mas em virtude das notas ou instrumentosou ritmos que eles tocam? (alguns exemplos incluemorquestras sinônicas - pelo menos da época de Beethovenpara cá – e big bands). SCHUTZ (1964, p.176) reconheceo problema, ao escrever que “Qualquer músico de câmara

sabe o quão perturbador pode ser um arranjo que impedeos co-perormers de ver um ao outro”. Algumas sentençasdepois, ele acrescenta que “Esta relação ace-a-ace podeser estabelecida de imediato somente entre um pequenonúmero de co-perormers”. Uma solução óbvia seriadividir a música em duas categorias impermeavelmentedistintas, uma aural e outra letrada (o que aqui, é claro,não corresponde à divisão entre jazz e música de “arte”).Mas Schutz resiste: ele vê os maestros de orquestrasatuando no “mundo externo”, mas, por meio de seusgestos, estabelecendo uma relação de tempo interno comcada músico chee e membro de naipe, resultando em um

tipo de rede de relações ace-a-ace eetivas. Com basenisso, conclui (SCHUTZ, 1964, p.177) que, ”em princípio,não há dierença entre a perormance de uma orquestramoderna ou côro e as pessoas sentadas ao redor de umaogueira cantando ao som de um violão” (este trecho vem

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logo antes de sua comparação entre um quarteto de cordase uma jam session). Um argumento alternativo (que não éde Schutz) poderia ser que a experiência de azer músicaem uma situação ace-a-ace é prototípica, e seus valoressão, assim, generalizados para a perormance orquestral,

de orma que nós escutamos a música de grupos maiorescomo que encarnando a interação social, mesmo quandonão é literalmente o caso: música, para resumir, simbolizauma interação social mesmo quando ela realmente nãoacontece. Isso, incidentalmente, pode se relacionaraos receios que mencionei anteriormente a respeito dainstitucionalização do ensino do jazz: os valores do azera música em conjunto continuaram mesmo quando osperormers da música de “arte” do século XIX migraramdos salões para os teatros de concerto, da mesma ormaque os valores undamentais do jazz continuarão mesmoque seu treinamento migre dos já quase extintos clubes

para as universidades ou conservatórios.

E a respeito do desencontro entre a prática musical e odiscurso ocularmente centrado ao qual me reeri? Emboranão haja espaço aqui para tratar disto em detalhes, aterminologia recebida da musicologia e teoria permanecebaseada na idéia da perormance enquanto reproduçãodo texto. Para dizer a verdade, termos como ”reprodução”e “representação” não são mais comuns como eram: osanalistas e os perormers analiticamente inclinados dehoje alam mais sobre “projetar” ou “expressar” a estruturamusical. Mas, se isso pode signicar algo muito maissosticado do que “reprodução” no sentido de simplesmentetocar as notas (com’e scritto, nas palavras de Toscanini),ainda se apóia na idéia de que a perormance signica trazerà tona algo que já está lá na partitura, composto dentrodela e apenas esperando para ser liberado pelo perormer.As visões sobre como enxergar a perormance de orma arefetir o papel undamentalmente criativo do perormerterão que vir de algum lugar que não seja a tradiçãoanalítica da música de “arte” ocidental. O jazz pode muitobem ser um deles. Há duas razões para se pensar assim.Uma é que, se em termos das práticas de perormance nãose pode traçar claramente uma linha entre o reerentedo jazz e a obra musical autônoma da tradição da “arte”,

então o modelo de improvisação de Pressing torna-sedisponível como um modelo de perormance em geral,articulando, por um lado, a dimensão concatenacionistaque caracteriza todas as perormances e, por outro, umadimensão reerencial, que se expande a partir das alusõesintelectuais para algo tão próximo quanto possível dareprodução. A segunda é que, como sugeri, se azer música

  juntos envolve precisamente as características que têmsido descritas como auditivas-orais ao invés de letradas,

negra ao invés de branca, pertencente ao jazz ao invésda música de “arte”, então a linguagem desenvolvidapara caracterizar as qualidades perormáticas do discursonegro torna-se disponível como um vocabulário paraa perormance em geral: citei a reerência de Floyd às

“declarações, armações, alegações, buscas, retomadas,implicações, simulacros e simultaneidades musicais”, mastambém estou pensando em outros termos como citação,comentário, crítica, paródia, ironia ou travestismo. Em suma,sugiro que se pense a perormance não como reprodução,mas como Gates dene “Signiyin(g)”: “repetição com umsinal de dierença”. 9

Em um nível mais geral, minha conclusão é que, narealidade da vida tal como ela é vivida, as distinçõesbinárias – como entre o literato e o auditivo-oral, entrea improvisação e a perormance – raramente são tão

impermeáveis quanto parecem ser. Nesse caso, a raiz doempate técnico entre as divergências do jazz e da músicade “arte”, divergências epitomizadas, dierentemente,por ambos Monson e Johnson, pode ser uma consciênciainsucientemente crítica das dierenças entre a teoriae a prática. Recentemente, Peter MARTIN (2002,p.141) ez a surpreendente declaração de que “Emboraa literatura sobre jazz e seus músicos tenha crescidoenormemente nos últimos anos, relativamente muitopouco trata de práticas musicais de verdade” (emboraele cite o livro de Berliner como uma exceção). Apesarde uma literatura ainda maior e, talvez, com menosexceções, penso que o mesmo poderia ser dito sobre atradição da “arte” de hoje, particularmente em relaçãoàs práticas de perormance; o resultado é uma situaçãona qual é muito ácil citar as prescrições da estéticaormal e a observação esnobe de um musicólogo rancêssobre não ir mais a concertos com se representassemadequadamente a música de “arte” ocidental, enquantouma arte da perormance que é. O problema é que, comodisse, porque uncionam em uma tradição ocularmentecentrada – porque sua disciplina se tornou uma disciplinabaseada no estudo do textos notados – é muito ácilpara os musicólogos esquecerem o ato de que a músicaé uma arte da perormance (pelo menos enquanto eles

estiverem azendo musicologia). Ao nal, então, me vejoconcordando com Johnson, apesar de tudo, exceto peloato de que ele dispara sua crítica aleatoriamente aotodo da cultura da música de “arte” ocidental, enquantoque penso que o alvo deveria ser menor e mais denido,e porque não dizer altamente reratário e apenas um: asmaneiras de alar sobre música que não dizem o tantoque queremos dizer e deveríamos dizer.

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Nicholas Cook, eleito Membro da British Academy em 2001, é Pesquisador Associado e Proessor no Departamento deMúsica da Royal Holloway - University o London, onde coordena o grupo de pesquisa CHARM (Centro de História e Análiseda Música Gravada). Foi editor do Journal o the Royal Musical Association, co-editor do Cambridge History o Twentieth-Century Music (2004) e, atualmente, é Editor Associado do Musicae Scientiae. Lecionou em universidades de Hong Kong,Sydney e Southampton. Sua produção acadêmica é interdisciplinar, incluindo livros e artigos relacionados com estética,sociologia, psicologia e análise das músicas erudita e popular. Entre seus livros publicados pela Oxord University Press,estão A Guide to musical analysis  (1987); Music, imagination, and culture  (1990); Beethoven: Symphony No. 9  (1993);Analysis through composition (1996); Analysing musical multimedia (1998); Rethinking music  (1999; co-edição comMark Everist) e Empirical musicology: aims, methods, prospects  (2004; co-edição com Eric Clarke) e Music: a very short introduction (1998), este último publicado em mais de 10 idiomas. Seu mais recente livro é The Schenker project: culture,race, and music theory in n-de-siècle Vienna. Atualmente, escreve o livro In Real Time: Music as Perormance e pesquisaanálise da perormance em gravações das Mazurkas de Chopin.

Fausto Borém é Proessor da Escola de Música da UFMG e pesquisador do CNPq. Coordena os grupos de pesquisaECAPMUS (Estudos em Controle e Aprendizagem Motora na Perormance Musical) e PPPMUS (“Pérolas” e “Pepinos” daPerormance Musical), criou e edita a revista Per Musi, implantou o Mestrado em Música na UFMG. Publica trabalhosnas áreas de perormance, composição, musicologia, etnomusicologia e educação musical. Como contrabaixista, recebeudiversos prêmios no Brasil e no exterior.

Notas1 Para outras reerências obre este enômeno, veja BERLINER (1994, p.218-219) e MONSON (1996, p.68) e para um exemplo trans-cultural SUTTON (1998, p.82).2 Desenvolvi a analogia implícita a partir da teoria de gerenciamento em COOK (2004), no qual este parágrao oi parcialmenteretirado.3 A primeira vez que apresentei este trabalho no 2003 Leeds International Jazz Festival, membros da platéia apontaram que Schutzrealmente não deve ter se reerido a uma jam session: sua comparação diria respeito a um grupo de músicos de jazz acostumados atrabalhar juntos regularmente.4 Daí a distinção reqüentemente eita na literatura entre “improvisado” e “improvisatório” (veja, por exemplo, NETTL, 1998, p.3;SUTTON, 1998, p.87).5 Uma discussão mais aproundada sobre a natureza das partituras de Corelli enquanto reerentes (embora sem utilizar a terminologiade Pressing), baseada em notações do século XVIII, pode ser encontrada em COOK (1999).6

Discuto a questão da comletude notacional em um contexto trans-cultural em COOK (2003ª).7 Peter MARTIN (2002, p.139-140) exprime essencialmente o mesmo argumento em uma linguagem dierente: “Em certo sentido,é claro, há um elemento improvisatório em todas as perormance musicais. . . o que está em questão, então, não é o princípio daimprovisação, mas em que extensão os indivíduos têm autonomia dentro do contexto de tradições de perormance especícas”.8 Aproundo esta idéia em COOK (2003b).9 Para uma discussão, com citações, sobre este assunto, veja MONSON (1996, p.103)