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Universidade Presbiteriana Mackenzie 1 ARQUITETURA, ECLETISMO E BELLE ÉPOQUE: REFERÊNCIAS CULTURAIS PARA A COMPREENSÃO DE UM ESTILO Arthur Girotto Noronha Mansur (IC) e José Geraldo Simões Junior (Orientador) Apoio: PIBIC/Mackenzie Resumo A pesquisa teve por objetivo estudar a relação entre a arquitetura e o contexto social de um período bastante emblemático da história contemporânea: aquele que vai do final do século XIX até meados da década de 1910, período marcado por grande prosperidade econômica, estabilidade política e progresso no campo científico, artístico e cultural – período conhecido como Belle Époque. A metodologia do trabalho se fundamentou em um extenso levantamento bibliográfico, apurando as seguintes temáticas: a Europa contextualizada na Rev. Industrial, Ecletismo, Belle Époque, e os reflexos da cultura européia no Brasil, com enfoque em São Paulo e Rio de Janeiro. Em uma segunda etapa ocorreu uma classificação de projetos que permitissem uma análise prática do assunto, incidindo uma pesquisa de campo tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro. Os projetos são os seguintes: Casa das Rosas, Edifício Sampaio Moreira e Teatro Municipal (São Paulo) e Real Gabinete Português de Leitura, Teatro Municipal e Edifício Seabra (Rio de Janeiro). Como resultado alcançado ao longo do processo, obteve-se uma série de informações decorrentes de análises técnicas sobre diversos projetos arquitetônicos (inserindo-as no contexto social, político e econômico) e material iconográfico (fotos e desenhos técnicos) que comportaram a criação do trabalho como um todo. Conclui-se que a pesquisa permitiu uma apreciação intimista do tema, procurando expor informações pouco interpretadas através de estudos práticos correlacionados a teorias. Palavras-chave: Belle Époque, ecletismo, arquitetura eclética Abstract The aim of the research is to study the relationship between architecture and the social context of a period quite emblematic of contemporary history: one that runs from the end of the 19th century until the mid-1910s, a period marked by great economic prosperity, political stability and progress in the field of scientific, artistic and cultural- period known as the Belle Époque. The methodology of work is grounded in an extensive bibliographical, noting the following themes: Europe contextualized in Industrial Revolution, Eclecticism, Belle Époque, and reflections of European culture in Brazil, with a focus in São Paulo and Rio de Janeiro. The second step was choosing projects that allowed a practical analysis of the subject, focusing a field research in São Paulo and in Rio de Janeiro. The projects are the following: Casa das Rosas, Sampaio Moreira Building and Theatro Municipal (São Paulo) and the Royal Cabinet of Reading, Teatro Municipal and Building Seabra (Rio de Janeiro). As a result reached throughout the process, was obtained a series of theoretical information (technical analyses of various architectural projects and contexts of social, political and economic) and iconographic (photos and technical drawings) that allowed the creation of the work as a whole. It is concluded that the research has permitted an intimate appreciation of the theme, seeking to expose information little interpreted through case studies correlated the theories. Key-words: Belle Époque, eclectic, eclectic architecture

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Universidade Presbiteriana Mackenzie

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ARQUITETURA, ECLETISMO E BELLE ÉPOQUE: REFERÊNCIAS CULTURAIS PARA A COMPREENSÃO DE UM ESTILO

Arthur Girotto Noronha Mansur (IC) e José Geraldo Simões Junior (Orientador)

Apoio: PIBIC/Mackenzie

Resumo

A pesquisa teve por objetivo estudar a relação entre a arquitetura e o contexto social de um período bastante emblemático da história contemporânea: aquele que vai do final do século XIX até meados da década de 1910, período marcado por grande prosperidade econômica, estabilidade política e progresso no campo científico, artístico e cultural – período conhecido como Belle Époque. A metodologia do trabalho se fundamentou em um extenso levantamento bibliográfico, apurando as seguintes temáticas: a Europa contextualizada na Rev. Industrial, Ecletismo, Belle Époque, e os

reflexos da cultura européia no Brasil, com enfoque em São Paulo e Rio de Janeiro. Em uma segunda etapa ocorreu uma classificação de projetos que permitissem uma análise prática do assunto, incidindo uma pesquisa de campo tanto em São Paulo como no Rio de Janeiro. Os projetos são os seguintes: Casa das Rosas, Edifício Sampaio Moreira e Teatro Municipal (São Paulo) e Real Gabinete Português de Leitura, Teatro Municipal e Edifício Seabra (Rio de Janeiro). Como resultado alcançado ao longo do processo, obteve-se uma série de informações decorrentes de análises técnicas sobre diversos projetos arquitetônicos (inserindo-as no contexto social, político e econômico) e material iconográfico (fotos e desenhos técnicos) que comportaram a criação do trabalho como um todo. Conclui-se que a pesquisa permitiu uma apreciação intimista do tema, procurando expor informações pouco interpretadas através de estudos práticos correlacionados a teorias.

Palavras-chave: Belle Époque, ecletismo, arquitetura eclética

Abstract

The aim of the research is to study the relationship between architecture and the social context of a period quite emblematic of contemporary history: one that runs from the end of the 19th century until the mid-1910s, a period marked by great economic prosperity, political stability and progress in the field of scientific, artistic and cultural- period known as the Belle Époque. The methodology of work is grounded in an extensive bibliographical, noting the following themes: Europe contextualized in Industrial Revolution, Eclecticism, Belle Époque, and reflections of European culture in Brazil, with a focus in São Paulo and Rio de Janeiro. The second step was choosing projects that allowed a practical analysis of the subject, focusing a field research in São Paulo and in Rio de Janeiro. The projects are the following: Casa das Rosas, Sampaio Moreira Building and Theatro Municipal (São Paulo) and the Royal Cabinet of Reading, Teatro Municipal and Building Seabra (Rio de Janeiro). As a result reached throughout the process, was obtained a series of theoretical information (technical analyses of various architectural projects and contexts of social, political and economic) and iconographic (photos and technical drawings) that allowed the creation of the work as a whole. It is concluded that the research has permitted an intimate appreciation of the theme, seeking to expose information little interpreted through case studies correlated the theories.

Key-words: Belle Époque, eclectic, eclectic architecture

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INTRODUÇÃO

A arquitetura pode expressar não somente o ideário de um sistema político vigente, como

também um meio de referência para o mesmo, por exemplo: em um período marcado por

uma monarquia absolutista, como quando a realeza francesa produziu Versalhes, cria-se

uma arquitetura que expresse a imponência e o esplendor do governo; entretanto em uma

sociedade democrática, a arquitetura pode se anunciar com maior liberdade e diversidade

estilística.

A partir dessa premissa cria-se o questionamento: de que maneira esse aspecto se propaga

dentro de uma sociedade, mudando e implicando não só a atitude estética e conceitual da

arquitetura, bem como a postura moral e ética das pessoas. Para tanto, escolheu-se o

período da Belle Époque, cujo contexto se caracterizou por uma liberdade de expressão

muito grande, não só no campo da arte, mas também nas outras ciências, além de

estabilidade política e econômica.

Um dos principais objetivos da pesquisa foi avaliar o quadro histórico europeu, numa

sociedade que na época servia de referência para todo o mundo. Por sua vez, investigou-se

de que maneira esse panorama tomou forma na arquitetura, e como serviu de referência

para a construção da cidade brasileira, tanto do ponto de vista arquitetônico quanto na

criação de um ideário social, focando principalmente as cidades de São Paulo e Rio de

Janeiro.

REFERENCIAL TEÓRICO

O referencial teórico se fundamentado em duas vertentes principais:

a – sobre a temática da Europa contextualizada na Revolução Industrial e na Belle

Époque, focando nas conseqüências do meio urbano: livros de Benevolo e Patetta, e

dissertação de mestrado de Ramalho.

b – sobre a temática do reflexo da cultura européia no Brasil, com destaque as

referências ecléticas: livros de Fabris, Lemos, Needell, Homem e dissertação de mestrado

de Ramalho e Pereira.

Europa

A Revolução Industrial se iniciou por volta de 1760 na Inglaterra acarretando num conjunto

de mudanças tecnológicas, inovações de materiais e mão de obra. Ao longo do processo

substitui-se o meio agrícola pelo industrial, criando a produção em massa, o trabalho manual

pelo maquinário, e criou-se um novo panorama regional onde haviam grandes cidades

ocupadas por uma alta densidade demográfica, fábricas e ferrovias. Esse quadro estava

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prestes a alterar profundamente a Europa, ocorrendo uma expressiva transformação nos

aspectos econômicos, políticos e sociais

Essa crescente população que habitava o meio urbano começou a criar novas necessidades

de adequação ao meio industrial, tendo como conseqüência uma maior demanda por

hospitais, escolas, aumentos na malha ferroviária e novos edifícios. Para se ter uma noção,

no período de um século entre 1800 e 1900 a população européia passou de 187 milhões

para 420 milhões de habitantes.

Frente a esse novo quadro geral surgem paradoxos, de um lado a racionalidade industrial

aprimorada nas conquistas tecnológicas e materiais, de outro, os valores antigos que se

manifestavam através de um caráter romântico idealizando épocas anteriores; de acordo

com Ramalho (1989) essa oposição cria um fator marcante para a arquitetura:

“Esse sentimento difuso de perda de dignidade, de menosprezo pelas conquistas materiais

contemporâneas, teve influência decisiva no desenvolvimento da arquitetura do período,

caracterizada pelo gosto pela citação e pela evocação, por referências históricas e

associações emocionais. São resgatados então elementos da Antiguidade Clássica, da

Idade Média, de civilizações distantes, etc., combinados e interpretados das mais diversas

maneiras.” (início das primeiras manifestações ecléticas)

A nova configuração da cidade, relacionada à nova arquitetura que surgia, junto às

infindáveis necessidades da população, mais a crítica questão da salubridade somada ao

nascimento da classe operária, requeria um novo planejamento urbano adequado as essas

novas necessidades. Para tanto surgiram diversas propostas para a organização da cidade

industrial, nas quais se destacou o plano de Haussmann para Paris.

Basicamente a idéia de Haussmann fundamentava-se na criação de grandes eixos de

comunicação que cortavam a cidade e implantação de grandes espaços abertos. Esse

planejamento serviu de inspiração e referência para o mundo todo, como veremos adiante

nas reformas urbanas de São Paulo e Rio de Janeiro. Os arquitetos desempenhavam um

papel pequeno nas decisões do plano de Paris, limitando-se a dar forma aos edifícios

encomendados. Sem poderem questionar ou opinar, limitavam-se a reprodução de algum

estilo, como o gótico ou o neoclássico, seguindo a tendência eclética da época. Os

arquitetos viam-se em crise, apesar de estarem em um período de relativa liberdade

estilística, eram rotulados a padrões escolhidos pela burguesia construindo uma arquitetura

banal.

Foi aproximadamente nesse período que o ecletismo tornou-se predominante, em que

gradativamente os arquitetos começaram a ter a possibilidade de escolher variados estilos

arquitetônicos, procurando entender todos os tipos de arquiteturas construídas ao longo da

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história. Para os ecléticos não deveria ocorrer à legalidade de um sistema filosófico, e sim a

escolha racional de qual estilo era mais adequado de acordo com o contexto a qual o projeto

fosse implantado. Divide-se o ecletismo em duas tipologias: aquele em que o arquiteto

escolhe qual estilo se adapta mais ao local e o ecletismo sintático, no qual havia uma

combinação de elementos de variados estilos.

Surgiram aqueles que eram contrários ao ecletismo, afirmando que o “novo estilo”

proclamava a cópia ou a banalização dos estilos passados, fazendo uma catalogação com

prós e contras. Os defensores sugerem que o período dá ao arquiteto uma maior liberdade

de expressão, evitando qualquer modismo que pudesse surgir no meio das artes. Havia

ainda os defensores de uma escolha racional e objetiva de um estilo, que se adequasse

melhor ao contexto. Dentre eles destaca-se Viollet Le Duc, que imprimiu uma ótica racional

ao movimento neogótico, que serviu de grande influência para a geração seguinte.

Com o tempo o ecletismo se encontrou em crise pela sua incapacidade de acompanhar as

dinâmicas do mundo industrial, em que a arquitetura deveria ser agradável a primeira vista,

de fácil construção, ter a possibilidade de ser repetida muitas vezes e se adaptar aos novos

materiais, como o ferro, que permitia a criação de estruturas para obras grandiosas, e o

vidro ou aço.

A crise ainda alterou a relação entre arquitetos e os engenheiros e construtores; os

engenheiros produziam com as novas técnicas e materiais projetos antes inimagináveis, que

tentavam se adaptar ao estilo historicista. Nota-se ainda que o uso de novos materiais por

parte dos engenheiros tornou-se freqüente em programas que surgiram com a

industrialização: ferrovias, estufas, mercados, pavilhões e etc.. Além disso, materiais como

ferro tornaram-se bastante populares pela possibilidade de os componentes serem vendidos

separadamente, capacitando à construção em localidades onde não havia indústria ou mão

de obra qualificada. Sendo assim o ecletismo ficou reservado a certos tipos de edifícios,

bem como ãs inovações.

A crise estende-se ainda ao meio acadêmico: na École Beaux Arts em Paris ocorre o

incessante confronto entre os racionalistas ecléticos e os conservadores da academia,

tentando-se criar um curso livre de tendências e estilos, baseado na liberdade de escolha.

A crise compreendendo não somente a teoria, mas também os projetistas, criou magnitudes

significativas entre 1880 e 1890, a partir daí ocorre intimas relações entre arquitetos e

artistas, em que movimentos inovadores ganham certa força no período da Belle Époque,

devido um panorama econômico e político favorável.

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Brasil

A princípio o Brasil era somente uma colônia onde se montou um aparato produtivo que

gerava lucro para a metrópole, onde tudo era importando e destinado para a venda no

exterior. O único traço intelectual se localizava na catequese aplicada pela companhia de

Jesus, notando-se o caráter supérfluo da cultura. De acordo com Ramalho (1989) esse

quadro geral agregou características que até hoje se verificam: gosto pelas generalidades, a

preocupação excessiva com a forma e o abandono do conteúdo, a desvinculação com a

realidade, o gosto pela erudição, a associação entre cultura e ociosidade e a desvinculação

entre trabalho físico e trabalho intelectual.

Somente quando houve a descoberta do ouro em Minas Gerais que esse quadro se altera;

ocorre um significativo desenvolvimento urbano, acompanhado de um elevado crescimento

demográfico, junto à ampliação da divisão do trabalho e da cultura. Gradativamente a partir

do séc. XVIII que se inicia um pensamento cultural português na elite intelectual da colônia,

fato que se aguçou com a vinda de Dom João VI em 1808.

Sua vinda acarretou a abertura dos portos, a criação do primeiro jornal, dos primeiros livros,

da primeira biblioteca e etc.. Dom Pedro tinha por objetivo transformar o Rio de Janeiro em

uma cidade à altura de seu status, importou-se uma variedade enorme de materiais para

substituir o ar orientalizante e grotesco, mudando até mesmo diversas determinações legais

sobre construção.

Criaram-se cursos superiores e instituições culturais de acentuado cunho europeizante,

inserindo-se a Missão Francesa. Interessante ressaltar que essa grande reforma acarretava

apenas uma troca de paradigmas, o referencial cultural passou de Portugal (como no

colonialismo) para França (literatura e filosofia) e Inglaterra (quase tudo que era exportado,

marcando o séc. XIX pela presença inglesa).

A Missão Francesa comentada acima trazia através dos artistas o estilo neoclássico, que

correspondia à etapa inicial da prática eclética na Europa, uma vez que a arquitetura

colonial era extremamente simples, além de não haverem escolas de arquitetura até 1826,

ano de fundação da Belas Artes do Rio de Janeiro.

A Belas Artes mostrou-se inútil do ponto de vista de necessidades requeridas pelo país,

frente à formação pouco técnica dos alunos tornando-se um grande entrave para arquitetos

como Grandejean de Montigny, professor da Imperial Academia de Belas Artes do Rio de

Janeiro e egresso da Beuax Arts de Paris, que encontrou diversas peripécias, tanto

econômicas quanto pessoais, ao tentar aplicar seus projetos.

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Suas obras causaram polêmica por divergirem do pensamento português que atuava na

corte até então. Suas idéias traziam projetos grandiosos que sacrificavam a praticidade e

originalidade por um ideal neoclássico, confrontando-se com a avaliação em termos práticos

dos portugueses. A transplantação direta do neoclassicismo francês para o Brasil não

ocorreu sem qualquer contestação, o que aconteceria mais tarde com o ecletismo no fim do

séc. XIX para o início de XX.

Sendo assim a Missão Francesa correspondeu a uma implantação direta do ecletismo

europeu da época, que foi possível somente por que os arquitetos saíram da França (esta

que vivia um período conturbado com a queda de Napoleão). A missão correspondeu a uma

das tentativas mais precoces de trazer a modernidade européia para o Brasil.

Rio de Janeiro

“A Belle époque carioca pode ser considerada quer como o apogeu de tendências

específicas de longa duração, quer como fenômeno inédito, assinalando uma fase única da

história cultural brasileira.” (Needell, 1993)

A Belle Époque no Rio de Janeiro tem início com a ascensão de Campos Salles ao poder

(sucessor de Prudente de Morais), em 1898, tornando-se o quarto presidente da República,

e com a recuperação da tranqüilidade sob a proteção das elites regionais. Neste ano

registrou-se uma mudança sensível no clima político, que logo afetou o meio cultural e

social. O seu governo foi marcado pela busca de soluções financeiras, implementando um

conjunto de medidas para deflacionar a economia e aumentar a arrecadação.

Importante ressaltar que antes desse período, o Brasil sofria profundas instabilidades

políticas, marcadas por uma variedade de questões. Antes da proclamação da República, a

Monarquia passava por uma série de problemas que abalavam a sua credibilidade: crise

econômica (devido os autos gastos da Guerra do Paraguai), a questão abolicionista, a

questão religiosa, a questão militar e a forte atuação das idéias republicanas. Com isso, em

1889 deu-se o golpe militar ocorrendo à proclamação da República, que de início teve um

governo provisório militar, comandado pelo marechal Deodoro da Fonseca.

Esse governo provisório destacou-se pelo esforço da implantação de um regime republicano

e por grande instabilidade política e econômica. Esse quadro de crise forçou os novos

governantes a recorrerem aos poderes de São Paulo, como preço a pagar pela

sobrevivência da República, elegendo em 1894 Prudente de Morais, que representava a

ascensão da oligarquia cafeicultora e dos políticos civis ao poder nacional.

Por meio de uma nova composição política, reinstituiu-se uma ordem favorável ás estruturas

sociais e econômicas tradicionais. Os setores urbanos e médios, em processo de

fortalecimento desde as transformações sócio-econômicas nos meados do século, sofreram

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uma dura derrota. Todo o contexto da Belle Époque é compreensível se analisarmos todos

os acontecimentos citados. O final do séc. XIX marca a permanente vitalidade, e mesmo, o

predomínio de padrões que podem ser percebidos em todo o eu transcurso.

Seguindo o exemplo das grandes civilizações européias (Inglaterra e França), o Rio de

Janeiro espelhou-se nas colossais reformulações urbanas de Haussmann, tentando

igualmente resolver problemas de saneamento e circulação. Após anos de reformas parciais

e frustradas, o Rio recorreu a uma reforma urbana definitiva em sua história, que seria

marca registrada de sua Belle Époque.

No governo de Rodrigues Alves principiou-se a cogitar uma grande reforma urbana,

colocando em pauta a necessidade de um porto mais moderno para atrair o comércio, o

capital e a imigração européia. Um dos primeiros passos para tanto, foi a nomeação de

Pereira Passos, encarregando de implementar o aspecto urbanístico de sua política.

Destaca-se também a nomeação de Oswaldo Cruz, para liderar o esforço de erradicação da

peste bubônica, febre amarela e da varíola na cidade.

Pereira Passos recorrendo a um esforço conjunto das autoridades ministeriais e municipais

encarregou-se do planejamento global da cidade (com exceção dos postos e vias

adjacentes), enquanto a mais notável das reformas foi entregue a Paulo Frontin, cujo

trabalho foi à abertura da Av. Central, que conectava o Porto e o centro da cidade, além de

dar acesso à outra nova avenida, a Av. Beira Mar (facilitando a conexão coma Zonal Sul).

Além delas abriu-se também o que hoje são a Av. Rodrigues Alves e a Av. Francisco

Bicalho.

As reformas feitas pelo governo transfiguraram totalmente boa parte do mundo proletário; o

alargamento de ruas permitia a maior entrada de luz e ventilação, a alteração no traçado de

antigas ruas e abertura de novas permitia uma melhor circulação e maior interconexão entre

elas. Além disso, houve um aumento significativo na qualidade e na quantidade de

mecanismos urbanos, como a pavimentação das ruas, a construção de calçadas, estradas

asfaltadas, a abertura do túnel do Leme, iniciou a construção da Av. Atlântica, a demolição

do mercado municipal que desfigurava o bairro da Glória e ergueu outro perto das

instalações portuárias, embelezou locais como as praças Quinze de Novembro, Onze de

Junho, largo do Machado, o passeio público e etc.

A reforma não abrangia apenas o plano físico da construção civil, mas também o campo

social: proibindo a venda ambulante de alimentos, a criação de porcos dentre limites

urbanos, o descuido com a pintura das fachadas, entre outras medidas consideradas

inapropriadas, de costume “bárbaro” e “inculto”.

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Conclui-se então que não se pouparam esforços para assemelhar a reforma urbana ao

plano haussmanniano de Paris; além da abertura de novas vias, alargamento delas, maior

iluminação e ventilação, destaca-se ainda: a preocupação na escolha de um estilo

arquitetônico, a criação de uma ampla perspectiva causada por uma avenida central, a

execução de jardins nas praças, a particular atenção na versão carioca da Opera de Paris, e

etc. Todos esses aspectos parisienses foram primordiais para o significado da Belle Époque

carioca que emergia no governo de Rodrigues Alves.

A Avenida Central

A Av. Central é o melhor exemplo do que é a Belle époque carioca, um imenso boulevard

cortando as construções coloniais da Cidade Velha. O seu traçado foi definido pelo ministro

dos transportes Lauro Müller, deixando o planejamento e construção para Paulo Frontin.

Sua concepção foi formulada ultrapassando excessivamente as necessidades viárias da

época, tornado-se não apenas uma avenida, mas o cartão postal do Rio de Janeiro. O

objetivo era que a Avenida se tornasse uma vitrine da civilização.

Frontin assim como Haussmann, estipulou a altura e a largura de cada fachada e

determinou que os projetos fossem analisados por um júri. As fachadas eram uma exaltação

ao ecletismo francês, consagrando a visão da Beaux-Arts de Paris.

O ecletismo tardio (1860-1920) sofrera influências de diversas correntes arquitetônicas: do

romantismo, tanto no seu sentido exótico como histórico; do classicismo, em função de seus

diversos vínculos com as diversas manifestações européias deste estilo; e do barroco, no

uso de “contraponto de ritmos visuais”. Um exemplo típico seria a Opera de Paris, de

Charles Garnier, cujos pensamentos afirmavam que “arquitetura era uma propiciadora de

experiências de conforto principesco e espetáculo imperial, capaz não somente de provocar

um impacto naqueles que a contemplavam, como também de moldar a percepção das

pessoas sob sua influência”.

Os fatos descritos acima eram os princípios que pairavam o discernimento do júri,

encarregados de julgar as fachadas. Fortemente marcados pela Beaux Arts, 14 projetos

levavam a assinatura de Adolfo Morales de Los Rios, ex-aluno da faculdade, destacando-se

dentre suas obras o Palácio Episcopal, os prédios de “O Paiz”, o café Mourisco, o “Edifício

das Águias” e a nova sede da Escola Nacional de Belas Artes.

Determinados prédios se destacavam mais que outros, como: O Teatro Municipal (1909) de

clara influencia da ópera de Paris, O Palácio Monroe (1906), a Biblioteca Nacional (1910) e

a Escola Nacional de Belas Artes (1908). Os edifícios ao longo da avenida reforçavam a

idéia de progresso e civilização. Com isso podemos perceber: a interpretação, dos

brasileiros, do que é civilizado a partir de uma ótica parisiense; a adaptação dessa visão no

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nosso contexto urbano e social, ou seja, como essa arquitetura se moldava, o que de forma

geral não passava de uma construção simples e funcional completamente desconexa

(esteticamente e funcionalmente) de sua fachada. Apesar desses fatores os edifícios

mantinham certa afinidade com os ensinamentos da Beaux-Arts.

Outro fato a ser destacado é que, os traçados das avenidas de Paris tornaram-se

reveladores por freqüentemente conduzirem os olhos a um monumento que exaltava a

grandeza histórica francesa. No Rio de Janeiro não foi diferente, duas extremidades da Av.

Central formavam um contraste simbólico: cada uma delas une a “Colônia” a “Metrópole”,

sugerindo uma articulação na Belle Époque. Cada monumento marcava uma extremidade:

ao norte havia uma coluna com uma estátua de Visconde de Mauá, pioneiro da industria e

das finanças brasileiras,ao sul havia um obelisco para celebrar a conclusão da avenida. A

Avenida exaltava dois pólos: a realidade colonial e o dinamismo da Metrópole tornando

possível a fantasia de civilização compartilhada pelos cariocas de elite na Belle Époque.

De forma geral, todas essas reformas e remodelações manifestavam o início da afirmação

do Brasil como civilização reconhecida internacionalmente. No Rio, mesclou-se a antiga

predisposição colonial aos valores europeus, concretizando as contradições e pressupostos

implícitos na Belle Époque carioca.

São Paulo

Carlos Lemes coloca o ecletismo como uma somatória de produções arquitetônicas surgidas

a partir do final do segundo quartel do século retrasado (XIX), que veio juntar-se ao

neoclássico histórico, surgido por sua vez em contraposição ao Barroco. Ele diz: “Naqueles

dias, primeiramente vieram às obras neogóticas em contraposição às neoclássicas e dessa

coexistência inicial é que veio à tona no panorama arquitetônico a expressão filosófica

“Ecletismo”, que designava primordialmente a tolerância a duas idéias ou dois

comportamentos concomitantes. ”(Lemos, 1987). Cria-se então uma liberdade para criar.

Esse quadro geral se manifestava de forma diferenciada em São Paulo, devido os trezentos

anos de isolamento serra acima. Inicialmente havia uma arquitetura arcaica, feita pela taipa

de pilão introduzida pelo Pátio do Colégio. Portanto, desde os anos finais do séc. XVIII até

1850 não havia nenhum novidade arquitetônica.

O fato que serviu de propulsor para crescimento de São Paulo foi à proliferação do café.

Primeiramente ele levou prosperidade ás cidade do Vale do Paraíba, então só quando

suplantou a cana de açúcar no antigo quadrilátero de açúcar e quando houve a instalação

da estrada de ferro pelos ingleses (1867) é que São Paulo iniciou sua caminhada ao

desenvolvimento. Esse período é muito importante, pois é a partir daí que São Paulo

assumiu sua liderança político e econômico.

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Esse contexto era perfeito para a recepção do ecletismo, sinônimo de progresso e

linguagem do poder econômico. “Era o capitalismo inaugurado com o café que chegava a

cidade” (Lemos, 1987). Com isso definiu-se o alto comércio, lojas, restaurantes, luxuosas

confeitarias, hotéis de alta categoria, sempre com fortes referências francesa. A velha taipa

foi substituída pelo tijolo, reconstruindo São Paulo em alvenaria; a maioria dos materiais

usados era estrangeira, colocando-nos em uma situação inesperada: o uso de materiais e

técnicas desconhecidas junto a uma estética importada.

Em 1875, praticamente no início dessa expansão urbana, tinha-se menos de três mil

prédios em São Paulo, já em 1886 (ano em que Ramos de Azevedo inicia seu trabalho na

capital) tinha-se mais de sete mil prédios. Em 1900 passava-se de vinte e um mil prédios.

Eliminado o cenário provinciano, a variedade e a quantidade passaram a compor o cenário,

sem repetições, mas ao mesmo tempo homogeneizado pelas regras de composição. Era o

ecletismo retratado pela “superposição de elementos semânticos do vocabulário historicista”

(Lemos, 1987).

Podem-se classificar as construções paulistanas, a partir da segunda metade do séc. XIX

através de algumas definições estilísticas, com repertórios classicizantes, historicistas, ou

então movimentos ligados a renovação artística, como o Art Nouveau ou Floral, New Style, o

Secessão, etc.. A partir de uma categorização feita por Carlos Lemos podemos localizar as

construções ecléticas em:

1- Neoclássicas ditas ortodoxas (1850/60)

2- Neoclássica na primeira intenção, mas comprometidas principalmente pela

composição renascentista.

3- Muitas construções neo-renascentistas, despoliciadas e não executadas por

profissionais qualificados. Esse terceiro grupo é o que possui maior variedade de

manifestações. , uma análise dele é uma análise do próprio ecletismo. Nesse

período surgem muitas obras que se resumiam no arremate de obras feitas em taipa,

colocando alguma decoração francesa.

4- Obras Art Nouveau, mas que também incluem trabalhos de inspiração alemã ou

austríaca ligadas ao movimento Secessão. O Art Nouveau contaminou toda a

produção de objetos, móveis e etc. Exigia arquitetos sensíveis e jamais se

popularizou. Podem-se destacar como arquitetos somente Dubugras e Ekman.

5- Ecletismo historicista, sendo o neogótico mais presente nesse grupo. Foi na

arquitetura residencial que praticamente não havia limites, a Av. Paulista tornou-se

palco da arquitetura eclética historicista, onde se podem encontrar residências

arabizastes, otomanas, românicas, góticas, neoclássicas, etc.

6- Construções Neocoloniais.

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7- Obras populares nascidas da reprodução simplificada dos modelos eruditos

neocoloniais.

8- Art Déco, trazido no final da década de 1920.

Dentre os arquitetos que se destacaram, tem-se Ramos de Azevedo que vem de Campinas

a São Paulo em 1886, e projeta os dois primeiros edifícios destinados a administração

pública: a Secretaria da Fazenda e a Secretaria da Agricultura, decoradas com estilo

renascentista, mas com volumetria, frontão e colunata neoclássicas. Figurou-se como um

dos principais arquitetos brasileiros daquele tempo, transfigurando a paisagem urbana do

centro de São Paulo.

MÉTODO

O método de pesquisa procurou manter uma intrínseca relação entre contexto histórico e

seus reflexos no meio urbano, considerando a movimentação da realidade, focando

prioritariamente no caráter arquitetônico.

A primeira etapa compreendeu um extensivo levantamento bibliográfico, cujas temáticas

foram desenvolvidas detalhadamente na introdução e no referencial teórico. Numa segunda

etapa buscou-se a classificação de edifícios que se caracterizavam pelo estilo eclético,

recolhendo dados teóricos, fotos e desenhos técnicos (plantas, cortes e elevações),

procurando um entendimento tanto conceitual quanto estético das obras, analisando os

estilos mesclados, os espaços de circulação e permanência, além da estrutura projetual.

Dentro desse processo ocorreu uma pesquisa de campo, em São Paulo e Rio de Janeiro,

que permitiu uma observação mais detalhada dos projetos escolhidos e uma descrição mais

intimista das obras. Em São Paulo escolheu-se a Casa das Rosas, o Edifício Sampaio

Moreira e o Teatro Municipal, e no Rio de Janeiro, o Real Gabinete Portugues de Leitura, O

Teatro Municipal e o Castelinho do Flamengo.

Por fim, criou-se uma análise conclusiva, cujo objetivo foi relacionar e situar esses projetos

com seus contextos históricos, e como a arquitetura buscou se expressar nesse período tão

emblemático.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Teatro Municipal

O surgimento do Teatro Municipal deve muito ao seu contexto histórico, que proporcionou

diversos fatores favoráveis para uma necessidade latente da criação de um grande teatro

para a cidade de São Paulo. O café e a indústria impulsionavam o comércio paulistano

criando uma verdadeira elite paulistana, fortemente influenciada pelos valores culturais

europeus, logo havia um grande desejo de construir um lugar a altura das grandes

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companhias estrangeiras; além disso, o único grande teatro da cidade (bem mais simples

que o Teatro Municipal), o Teatro São José, havia incendiado em 1898.

O projeto foi encabeçado pelos italianos Cláudio Rossi e Domiziano Rossi e pelo brasileiro

Ramos de Azevedo. As obras tiveram início em 1903 e duraram oito anos de trabalho,

sendo inaugurado pela ópera Hamlet.

A arquitetura do teatro transfigura uma mistura de estilos que combinadas com a estrutura

total demonstra fortes referências da Opera de Paris, de Charles Garnier. Em ambos

podemos reparar o uso de colunas e colunatas contracenado com arcos e diferentes

esculturas, além do uso de referências do teatro e da música para a criação de elementos

que compõe a fachada. Destaca-se ainda a grande cúpula ao fundo que indiretamente

compõe a fachada.

De acordo com o arquiteto Ricardo Severo: "A arquitetura exterior do edifício é composta no

estilo do renascimento barroco, ao qual os artistas italianos chamam 'seiscento'. E o estilo

clássico, com tipos e módulos da renascença grego-romana, mais variada, porém, na

apropriação desses tipos e com maior liberdade imaginativa no emprego da linha curva, nos

motivos e detalhes ornamentais". (Lemos,Carlos.Ramos de Azevedo e seu

escritório.Op.Cit.,p.69.)

Além dos estilos havia ainda os materiais, que foram encomendados pelo escritório do

Ramos de Azevedo, por toda a parte do mundo. Como exemplos pode-se citar: a armadura

de ferro e o ferro artístico que vieram de Düsseldorf e Frankfurt respectivamente, o bronze

artístico de Berlim, Paris e Milão; já os mosaicos vieram de Veneza e os mosaicos de

pavimento, de Nova York e Berlim, os mármores de Siena, Verona e Carrara.

Até os dias atuais o Teatro passou por duas grandes restaurações, a primeira foi feita por

Tito Raucht, em 1951, que criou novos pavimentos para ampliar os camarins, reduziu os

camarotes e instalou o órgão G. Tamburini. A segunda foi feita em 1986 a 1991, sendo

comandada pelo Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura,

restaurando o Teatro e implementando equipamentos mais modernos.

Atualmente o teatro passa por uma nova reforma, dando prioridade a área do bar e

restaurante, o salão nobre e a fachada do prédio. Baseou-se em fotos antigas para recriar a

pintura interna e restaurar partes que estavam deterioradas. Também foram reformados

todos os vitrais do teatro, originalmente fabricados na cidade de Stuttgart, na Alemanha.

Ao longo dos anos, o Teatro foi responsável por inúmeras apresentações e marcos

históricos, destacando-se a semana de Arte Moderna de 1922 que iniciou uma nova era nos

campo das artes e da literatura no Brasil.

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Sampaio Moreira

Considerado o primeiro arranha-céu de São Paulo, o edifício Sampaio Moreira foi

inaugurado em 1924 com seus 13 andares e 50 metros de altura. Localizado na Rua Líbero

Badaró, sua construção inaugurou um novo padrão de edificações rompendo com a

horizontalidade da cidade.

Projetado pelo arquiteto Cristiano Stockler das Neves, que convenceu o comerciante José

de Sampaio Moreira a bancar uma iniciativa civil de significativa magnitude para época, o

edifício foi implantado a dedo de modo que ficasse de frente para o espaço entre dois

pavilhões gêmeos do parque do Anhangabaú, já demolidos.

Sobre o edifício algumas considerações podem ser feitas:

“(...) na década de 20 floresceu uma segunda etapa do Ecletismo- não mais o historicista,

mas um Ecletismo fixado na decoração, sem evocações, e mais atento às vantagens das

novas técnicas construtivas, especialmente o concreto armado. (...) Foi o estilo de espírito

eclético que se adaptou aos novos programas dos edifícios em altura, porque as novidades

agora eram os prédios comerciais de escritórios e os apartamentos residenciais.

Fachada Frontal

Fachada Lateral

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Houve quem procurasse adaptar à nova programação dos

prédios altos o receituário historicista como Cristiano das Neves

que, no edifício da Rua Líbero Badaró, de treze pavimentos

mais o ático, denominado “Sampaio Moreira” e inaugurado em

1924, insistiu no estilo Luis XVI, usando, inclusive, pequenas

janelas, não tomando partido das possibilidades dos grandes

vãos que o concreto lhe permitia. Mas o corrente

posicionamento dos arquitetos foi aquele que aconselhava

discreta decoração entre as vidraças e um “coroamento” da

obra com alguma cimalha mais trabalhada amparando alguma

alegoria ou ornamento moldado em cimento. Nunca o

paramento vertical era interrompido em sua uniformidade de

baixo a cima, como fez Cristiano das Neves em seu prédio

“Sampaio Moreira” pegando em meia altura um saliente balcão.

Em fim um critério de composição rarissimamente usado ”.

(LEMOS: 1999, p.99)

Além disso, o projeto inaugurou o conceito de aranha-céu em

SP, vindo das cidades norte-americanas, principalmente Nova Iorque e

Chicago, abrindo porta a pensamentos como o de Henri Louis Sullivan, considerado o pai

dos aranhas céus.

Casa das Rosas

Projetada em 1928, pelo arquiteto Francisco Paula Ramos de Azevedo, a casa localizada na

Av. Paulista, local que reunia a maioria dos milionários da época, foi feita para a sua filha no

canto mais intimista da avenida, terminando sua construção em 1935.

A partir do livro O palacete paulistano, podemos retirar importantes considerações para o

entendimento da moradia burguesa da época:

“O palacete paulistano do ecletismo constitui a manifestação do processo civilizador, sendo

o espaço independente do estilo de arquitetura. Esse tipo de residência definiu-se na

república, com a instituição da higiene pública e a separação dos papeis femininos e

masculinos. Os programas do palacete revelaram o ideário burguês, atendido por uma

arquitetura que propunha a individualização da casa e a conciliação dos estilos, espalhando

o êxito socioeconômico do proprietário. Foram consagrados a casa em meio a jardins, a

distribuição a partir do hall e um espaço para cada função a fim de evitar a sua

superposição. Observaram-se a ordem, uma decoração profusa, baseada no excesso de

móveis, tecidos, e objetos, ...” (Maria Cecília Naclério Homem, 2010)

Fachada Frontal

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A casa conta com o estilo eclético na sua composição, variando desde o neoclássico até

referências do Art Déco. Localizada em um terreno de 5.500 metros quadrados, a casa

possui 30 cômodos no estilo clássico francês, retomando elementos da renascença e do

estilo Luis XV. Podendo ser considerada menos majestosa e colossal do que os outros

casarões existentes na época, a casa tem como fato marcante e diferenciador o grande

jardim exterior caracterizado pela simetria e limpeza.

O Interior da casa é mais heterogêneo do que o exterior, mesclando elementos decorativos

ingleses, principalmente nas aplicações em gessos. A casa é claramente dividida em área

social, intima e serviço; logo na entrada a varando conta com um chamativo piso de

pastilhas formando a área social externa, no térreo temos a presença da cozinha, salas e

serviço. Transferindo-se ao piso superior, depara-se com um grande vitral que dá iluminação

a escada, cuja imagem traduz um grande jardim com uma construção clássica. No nível

superior localizam-se os quartos, os banheiros (muito marcantes pelos seus mármores rosa

e verde) e a uma grande varanda que dá vista ao jardim. Interessante notar que há duas

escadas de acesso ao segundo piso, uma localizada na sala central, e outra que dá acesso

à cozinha e área de serviço.

Até meados dos anos 80 a casa foi ocupada pelos netos de Ramos de Azevedo e

evidentemente o local já não era mais o mesmo; os centros empresariais ocuparam o seu

entorno bem como outras casas da Av. Paulista, criando a cara da modernização e

progresso. Em 1985 a Casa das rosas foi tombada pelo Condephaat e hoje em dia serve

como um centro cultural dedicado à poesia e literatura.

Teatro Municipal do Rio de Janeiro

Localizado na Praça Floriano, no centro da

cidade, mais conhecida como Cinelândia, o

Teatro foi inaugurado em 14 de julho de 1909.

Tornou-se ao longo do tempo um ícone cultural

e arquitetônico da cidade, juntamente com a

Biblioteca Nacional, o Palácio Pedro Ernesto, o

Museu Nacional de Belas Artes e a própria Av.

Central.

O Teatro Municipal surge em um contexto de renovação do planejamento urbano, que

pretendia transformar a imagem, a salubridade e a economia da capital federal, tornando-a

um ícone do progresso material. Ele seria não só um exemplo da estética moldada aos

costumes franceses, bem como uma figura pragmática do entretenimento da elite

aristocrática da época e um rompimento dramático com o passado colonial.O concurso do

Fachada frontal

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projeto teve como resultado dois primeiros lugares, um de Francisco Oliveira Passos, filho

do prefeito, e outro de Albert Guilbert, o que gerou grande polêmica em torno da escolha do

projeto. No final das contas optou-se por uma fusão das duas propostas, pois ambas

correspondiam a uma mesma tipologia.

Assim como o de São Paulo, o Teatro Municipal do Rio de Janeiro seguiu as mesmas

premissas estéticas academicistas implantadas na Opera de Paris, aplicando o equilíbrio da

estética clássica junto a harmonia expressiva do barroco. A fachada monumental é

fortemente caracterizada pelas grandes colunas coríntias, pela visão dos dois pavimentos e

pelas três cúpulas da cobertura. Nota-se ainda as esculturas de Rodolpho Bernardelli,

fazendo referência a poesia, a música, a dança, ao canto, a tragédia e a comédia. Em cada

uma das laterais chamam a atenção às loggie com seus balaustres, seus tetos em

cerâmicas, seus pisos de mosaico e as seis colunas de mármore com seus capitéis em

ouro.

No interior há o corpo central que é dividido em vestíbulo de entrada, feito dos mais diversos

mármores, as escadas, que dão acesso aos pavimentos superiores, e o foyer, todo

decorado em Luis XVI; pelas laterais encontram-se as rotundas que servem de descanso

para o público que chamam atenção nas pinturas no teto de Henrique Bernadelli e os

painéis de Rodolpho Amoedo. No pavimento inferior encontra-se o restaurante Assyrio,

inteiro revestido de cerâmica esmaltada inspirado na antiga Babilônia. Por fim a sala de

espetáculos com 2244 assentos, marcada pelo grande lustre central de bronze dourado,

com suas 118 lâmpadas, e pelas obras de Elyseu Visconti.

Inicialmente o Teatro recebia apenas companhias estrangeiras, principalmente da França e

Itália, hoje possui os seus próprios corpos artísticos, sendo a única instituição brasileira a

manter ao mesmo tempo um coro, uma orquestra sinfônica e uma companhia de ballet.

Real Gabinete Português de Leitura

O Real Gabinete de Leitura surgiu com o

intuito de reunir e agrupar os portugueses

residentes no Rio de Janeiro, que tinham

certos interesses em comum, podendo criar

uma identidade lusitana fora de sua terra

natal, que seria alcançada através da leitura.

Após sucessivos lugares que serviram de

sede para o Gabinete e com o contínuo crescimento do acervo,

em 1861 começou-se a pensar na construção de um lugar próprio que pudesse

corresponder às expectativas dessa instituição que se consolidava. Constantes mudanças e

Interior da sala principal

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indecisões marcaram a escolha do projeto, mas em 1880 os responsáveis pelo Gabinete

optaram por aquele que tinha os desenhos caracterizados pelo estilo manuelino, do

arquiteto Rafael da Silva Castro. Essa escolha representava de forma geral um desejo de se

obter um espaço que fosse rico em referências culturais, traduzindo um patriotismo

português.

Importante ressaltar que a arquitetura manuelina surgiu no reinado de D. Manuel I (1491-

1521) no auge da expansão marítima, manifestando-se por uma liberdade criativa muito

exuberante, carregada de uma complexidade plástica, naturalismo, dinâmica de curvas e

referências da flora marítima e náutica. Muitos dizem que as manifestações manuelinas são

interpretações portuguesas do gótico tardio. O aspecto mais significativo dessa arquitetura

será a decoração que compõe o ambiente, cujos ornamentos são indispensáveis para as

significações de exaltação real e religiosa. No século XIX há um ressurgimento desse estilo,

como forma de nacionalismo.

No dia 22 de dezembro de 1888 inaugurou-se oficialmente o Gabinete Real de Leitura, que

mesclava o historicismo manuelino com o ferro do século XIX, sendo o primeiro edifício em

estrutura metálica no Rio. No Brasil além do Real Gabinete, os principais edifícios

manuelinos são o Gabinete Português de Leitura de Salvador e o Centro Português de

Santos.

Hoje em dia o Real Gabinete representa uma das mais importantes bibliotecas portuguesas

fora de Portugal, além de ser a única que recebe o “depósito legal” (uma cópia das obras

publicadas em Portugal). Além disso, possui diversos livros raríssimos, dentre eles uma

primeira edição de “Os Lusíadas” de 1572.

Castelinho do Flamengo

O “Castelinho do Flamengo”, como é popularmente

chamado, é hoje o Centro Cultural Oduvaldo Vianna Filho,

responsável por diversas atividades culturais gratuitas e por

abrigar uma Videoteca de mais de três mil filmes. Durante 32

anos serviu como residência familiar, até que em 1983,

através do apoio da comunidade do flamengo e do Conselho

Municipal de Proteção ao Patrimônio, o Castelinho foi

tombado.

O projeto foi feito pelo arquiteto italiano Gino Copede em 1916, com o intuito

de ser a residência do grande empreendedor da época Joaquim Silva Cardoso. A edificação

conta com um estilo eclético, de tendência italiana, que mescla art-noveau, barroco,

renascimento e neogótico francês, formando o “estilo castelinho”.

Fachadas

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A fachada é constituída basicamente de dois volumes retangulares separados pela torre na

diagonal da residência, que cria a verticalidade do projeto. Logo na entrada destaca-se o

portão com fortes referências do art-noveau (bem como todas as grades que estão nas

janelas da casa) e o vestíbulo circular, envolto por pilares que misturam nos seus capitéis

elementos renascentistas e barrocos.

O pavimento inferior é composto por uma grande escadaria e duas salas principais, que

hoje servem para exposição e videoteca. Dirigindo-se ao pavimento superior notam-se

grandes vitrais em formas de filetes, que dão uma iluminação amena a escadaria. O

segundo pavimento é composto por três salas, que também servem de exposição, nas quais

os complexos ornamentos que compõe as sancas e os roda-tetos enriquecem os ambientes.

Aos fundos encontra-se ainda uma espécie de varanda circular que permiti uma ampla

visualização da rua.

O principal aspecto da residência é o alto nível de

detalhamento dos adornos, das caixilharias e dos

elementos estruturais presentes nos ambientes, desde os

mosaicos que compõe os pisos nas partes externas, até

as esculturas presentes em quase todos os ambientes da

casa, criando um clima de requinte e ostentação.

CONCLUSÃO

Dentro do panorama apresentado, podemos considerar o ecletismo como a arquitetura que

anunciou e representou uma fase revolucionária da história da humanidade, tornando

concreta a evolução originada pela Rev. Industrial, cujas inovações transformaram todo o

cenário mundial, num lema de modernidade e progresso material, alcançando o seu auge no

período da Belle Époque.

Referente ao reflexo desse panorama arquitetônico no Brasil pode-se considerar que, não

só um estilo foi importado, mas também algumas justificativas teóricas dessa nova

concepção, que criaram a idéia tanto de arquitetura como do próprio estilo no meio nacional.

Pode-se dizer que dentro desse contexto criava-se a concepção de que a arquitetura era

uma maneira para se alcançar certo pedante econômico, servindo de espelho para o novo

mundo capitalista.

Quanto aos estudos referentes a São Paulo e Rio de Janeiro, nota-se a grande diferença no

processo de adaptação do estilo em ambas as cidades. Enquanto no Rio de Janeiro o

ecletismo correspondeu a um desenvolvimento de mais de um século, em São Paulo, ele se

estabeleceu numa rapidez colossal, graças à fervorosa expansão do café. Porém

Ornamento do roda-teto

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alcançaram os mesmo resultados: a construção de uma arquitetura altamente ligada a

modernidade européia.

Por fim, evidencia-se que esse período foi fortemente marcado por uma conturbação de

valores, nos quais as buscas pelo lucro e pela modernidade tiverem forte influência na

arquitetura do séc. XIX, criando um estilo baseado nas evocações do passado e sustentado,

literalmente, pelas inovações do séc., tanto de caráter construtivo como social e político.

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