arquivo ex machina: arquivo e identidade na américa latina

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Reinventando conceitos se chega a um novo lugar. Ressignificando arquivos, imagens e pontos de vis- ta, a exposição Arquivo Ex Machina e o IV Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo realizados pelo Itaú Cultural – promovem um espaço de discussão e construção das imagens que retratam e traduzem um território: a América Latina, cada vez mais próxima do continente real, não mais um mundo novo idealizado. Compõem a mostra dez conjuntos de imagens de ar- quivos/artistas, representações de nuances da história da vasta região e de seus múltiplos habitantes. Para resumir os sentidos dessa diversidade, uma solução mágica – esse deus do teatro grego, ex machina – foi chamada à cena. Nas imagens de arquivos, temas como revoltas popu- lares, criminalidade, escravidão, extermínio indígena e repressão política. Fantasmas que insistem em existir, sempre acuados pelo olhar crítico da arte. Sobressaem no conjunto o tema da identidade – seja ela real ou ale- górica, imposta ou natural – e sua constante elabora- ção. Outro dado relevante é a maturidade que o pensar e o fazer a fotografia latino-americana adquiriram nes- tes anos de fórum. Convidamos o visitante a ver com os próprios olhos a potência desse retrato de nosso continente. A esperan- ça de um mundo novo. Itaú Cultural Memória e identidade na América Latina

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A mostra coletiva, realizada de 16 de junho a 7 de agosto de 2016, no Itaú Cultural, provoca reflexão e discussão a partir da união de imagens de diferentes países da América Latina. Nos arquivos revisitados, temas como revoltas populares, criminalidade, escravidão, extermínio indígena e repressão política – fantasmas que insistem em existir.

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Page 1: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

Reinventando conceitos se chega a um novo lugar. Ressignificando arquivos, imagens e pontos de vis-ta, a exposição Arquivo Ex Machina e o IV Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo – realizados pelo Itaú Cultural – promovem um espaço de discussão e construção das imagens que retratam e traduzem um território: a América Latina, cada vez mais próxima do continente real, não mais um mundo novo idealizado.

Compõem a mostra dez conjuntos de imagens de ar-quivos/artistas, representações de nuances da história da vasta região e de seus múltiplos habitantes. Para resumir os sentidos dessa diversidade, uma solução mágica – esse deus do teatro grego, ex machina – foi chamada à cena.

Nas imagens de arquivos, temas como revoltas popu-lares, criminalidade, escravidão, extermínio indígena e repressão política. Fantasmas que insistem em existir, sempre acuados pelo olhar crítico da arte. Sobressaem no conjunto o tema da identidade – seja ela real ou ale-górica, imposta ou natural – e sua constante elabora-ção. Outro dado relevante é a maturidade que o pensar e o fazer a fotografia latino-americana adquiriram nes-tes anos de fórum.

Convidamos o visitante a ver com os próprios olhos a potência desse retrato de nosso continente. A esperan-ça de um mundo novo.

Itaú Cultural

Memória e identidade na América Latina

Page 2: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

Esta exposição não trata apenas de rever a ideia de América Latina proposta por arquivos elaborados em processos cheios de vícios coloniais. Arquivo Ex Machina revisita, de maneira contundente, os critérios que denominam aquilo que definimos como local de guarda de um conjunto de indícios documentais.

Quem define? Quem nomeia? Para quem define? Para quem nomeia?

A exposição aponta ainda o dedo para outros formatos que podem ser inventados e nomeados como arquivo.

A América Latina, incluindo o luso-Brasil, construiu sua história sobre paradigmas que interessavam muito mais àqueles que falavam do outro do que aos que tentavam falar de si mesmos.

Cabe no escopo do IV Fórum Latino-Americano de Fotografia de São Paulo a tarefa de escolher outras cápsulas, para outros futuros. Ou de renomear velhas cápsulas, de futuros antigos.

Se, por um lado, nenhuma das cápsulas lançadas em décadas passadas sequer esbarrou no presente, por outro lado, no território desta mostra, elas servem para

dizer ao índio mapuche [população autóctone do sul do Chile e da Argentina] que – como definiu Cesare Lombroso [criador da antropologia criminal] – crimino-so ou suspeito é aquele que o aparenta ser nos arquivos que solidificam o status quo, o estado das coisas, e não o status quae sera tamen, uma liberdade criativa.

Como método de trabalho para a consolidação de Arquivo Ex Machina, fomos ao encontro de pesqui-sadores, curadores, colecionadores e artistas envolvi-dos com material de arquivo. De início, interessava-nos qualquer releitura dos paradigmas tradicionais. Poste-riormente, estabelecemos três linhas de pesquisa: uma nova forma de olhar velhos arquivos, a manipulação dos sais de prata e o documento inventado.

Claudi Carreras e Iatã Cannabrava

[O título da exposição deriva da expressão latina deus ex ma-

china. Criada no teatro antigo grego, definia a entrada em cena

de um deus cuja missão era solucionar de forma arbitrária um

impasse vivido pelos personagens. Por extensão, virou reso-

lução inverossímil para um problema dramático. Em sentido

figurado, algo que inesperadamente propicia uma solução para

uma situação difícil.]

Arquivo Ex Machina

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Page 4: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

É possível criar documentos para interpretar o passado, ainda que sejam documentos contemporâneos.

A reconstrução da passagem de um furacão histórico quase desconhecido e não retratado: a Revolta dos Cabanos, na selva ao norte do Brasil. O trabalho mostra que, em qualquer tempo – ontem, hoje e amanhã –, o abandono dos dirigentes e dos trópicos gera ódio e violência.

André Penteado, nascido em São Paulo, é fotógrafo e artista plástico. Em 2013, venceu o Prêmio Nacional de Fotografia Pierre

Verger. Em 2014, teve seu projeto Tudo Está Relacionado selecionado pelo Rumos Itaú Cultural 2013-2014. Em 2015, publicou o

livro Cabanagem, incluído na lista de melhores do ano dos sites Time LightBox e Photo-eye.

Documents can be created to interpret the past, even if they are contemporary documents.

André Penteado traces back events of a nearly unknown and not portrayed historical hurricane: the Revolt of the Cabanos, in the Northern forest of Brazil. This work shows that, at any time - yesterday, today, tomorrow - the abandonment by the government authorities and by the tropics lead to hatred and violence.

André Penteado, born in Sao Paulo, is a photographer and

fine artist. In 2013, he won the Pierre Verger National Award of

Photography. In 2014, his project Tudo Está Relacionado was

selected to take part in the 2013-2014 Rumos Itaú Cultural pro-

gram. In 2015, his book Cabanagem was published and was

included in the year’s top best list of Time LightBoxlist and

Photo-eye web sites.

Es posible crear documentos para interpretar el pasado, aunque sean documentos contemporáneos.

La reconstrucción del paso de un huracán histórico casi desconocido y no retratado: la Rebelión de los Cabanos en la selva al norte de Brasil. El trabajo muestra que, en cualquier tiempo —ayer, hoy y mañana—, el abandono de los dirigentes y de los trópicos genera odio y violencia.

André Penteado, fotógrafo y artista plástico, nació en São

Paulo. En 2013, recibió el Premio Nacional de Fotografía Pierre

Verger. En 2014, su proyecto Tudo Está Relacionado [Todo

Está Relacionado] fue seleccionado por Rumos Itaú Cultural

2013-2014. En 2015, publicó el libro Cabanagem, incluido en la

lista de los mejores del año de las páginas web Time LightBox

y Photo-eye.

Cabanagem – André Penteado | BrasilO documento inventado

Sem Título, Série Cabanagem, 2014, André Penteado

Page 5: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
Page 6: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

Cabanagem – André Penteado | BrasilO documento inventado

[texto original]

Caros Iatã e Claudi, tudo bem?

Dentre toda a loucura que está sendo o começo deste ano, será que consigo responder com clareza a per-gunta de vocês?

Como cheguei no Cabanagem? Como cheguei no Ca-banagem... bom... aqui em casa está começando a festa de aniversário de quarenta anos da Karlla e, entre a mú-sica, os amigos e um copo de cerveja, vou tentar contar como tudo se deu.

Parece-me uma situação apropriada para explicar um projeto que tenta investigar – fotograficamente – um momento de revolução de nossa história e suas ondas que ainda chacoalham o presente.

Acho que o Cabanagem é sobre isto: ver como as on-das do passado ainda movimentam o presente. O que daquilo que sempre existiu em nossa história continua a existir. Pense na imagem de uma espiral: em diferentes momentos, passamos sempre sobre os mesmos pon-tos. É bom olhar para eles, compreender quão fundo eles vão, em qual camada de nosso substrato está o começo de tudo. Isto se for possível chegar lá.

Talvez um projeto de investigação como esse seja uma boa imagem para ajudar a (re)pensar, (re)significar o que é pensar a nossa história. O que é a narrativa histórica? Se a história que fica é a dos vencedores e os revolucio-nários nunca venceram no Brasil, qual é a narrativa que se construiu dos muitos levantes, revoltas, revoluções que aqui ocorreram?

Quando ocorreram as manifestações de 2013, eu havia acabado de voltar ao Brasil, e tive vontade de pesquisar nossa história e ver em que outros momentos este povo – dito pacífico, acolhedor, amoroso – se rebelou contra os poderes instituídos. Para a minha surpresa, a lista era mui-to maior do que eu lembrava de meus tempos de escola.

Muito maior! E não era só isso, havia a Cabanagem, uma revolução que, além de ter sido bem-sucedida por um tempo – afinal, os revolucionários, após matarem o governador (!), conquistaram e mantiveram o poder no

Grão-Pará por mais de um ano –, causou a morte de mais de 30 mil pessoas! Como seria possível que eu não soubesse nada dela? Fiquei espantado. Quanto mais lia, mais me interessava. Foi esse o começo de tudo.

A partir daí, o processo foi de ler muito sobre a Cabana-gem e, nessas leituras, conheci a professora Magda Ricci da Universidade Federal do Pará (UFPA), que é especialis-ta no assunto. Além de outros textos sobre a Cabanagem, ela me introduziu o conceito de micro-história e as obras de Carlo Ginzburg e de Natalie Davies. Deles veio a ideia de que existem outras narrativas que não as dos gran-des feitos, dos grandes personagens, uma outra forma de olhar a “história”. Foi com tudo isso na cabeça que criei, ainda aqui em São Paulo, uma lista de fotografias possíveis para o projeto, uma lista de lugares para ir. Esse roteiro serviu basicamente para permitir que o acaso – esse fator que sempre considerei como o preponderante na vida – fi-zesse a sua parte. É assim que trabalho em todos os meus projetos: as ideias servem somente para me colocar no lugar em que as imagens se oferecerão a mim.

Dessa forma, fui ao Pará, vocês sabem, duas vezes. A primeira, por 15 dias, para aprofundar a pesquisa e testar minhas hipóteses e a segunda, algum tempo depois, por dois meses. O intervalo foi muito importante para olhar para/pensar sobre o que havia produzido. Foram essenciais, também, as conversas que tivemos, pois me ajudaram a ver o que havia no material.

Percorrer Belém e o interior do Pará buscando rastros, traços e vestígios de algo de que quase nada sobrou: uma ideia, um pensamento, 30 mil mortes...

Depois de um ano editando as fotos para o livro – vocês também sabem bem desse processo! – e chegando na seleção final, acredito que o Cabanagem, com suas ima-gens que se repetem – burocracia, violência, religião, natureza, desgaste, passagens –, não é um livro sobre um fato histórico em si, mas uma ferramenta para ajudar a pensar o presente. Acho que, como artista, é isso que posso oferecer: uma mola propulsora de pensamentos. Nenhuma explicação.

Fez sentido? Respondi?

Abraços fortes,André

Sem Título, Série Cabanagem, 2014, André Penteado

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If some of the works displayed here present the pure and plain document, some others mirror the hyperbolized language used by the artists for an absolute political approach to repression, disrespect for civil liberties and ethnic equalities.

Colombian Andrés Felipe Orjuela Castañeda, while in-vestigating drugs, finds in the obsessive green a way to reaffirm denunciation over repression. A Colombian artist settled in Mexico, Andrés Felipe Orjuela

Castañeda holds a degree in fine and visual arts from Univer-

sidad Nacional de Colombia. He has participated in a number

of exhibitions in different countries – Colombia, United States,

Mexico, Panama, Cuba, Peru, France, Spain, England and Brazil.

Si en algunos trabajos aquí expuestos se presenta el do-cumento in natura, puro, en otros los artistas hiperbolizan sus lenguajes hacia un enfoque totalmente político de la represión, de la falta de respeto a las libertades civiles y las igualdades étnicas.

El colombiano Andrés Felipe Orjuela Castañeda, al in-vestigar sobre las drogas, encuentra en el verde obse-sivo la reafirmación de la denuncia sobre la represión.

Artista colombiano radicado en México, Andrés Felipe Orjuela

Castañeda está licenciado en artes plásticas y visuales por la

Universidad Nacional de Colombia. Participó en exposiciones en

diversos países —Colombia, Estados Unidos, México, Panamá,

Cuba, Perú, Francia, España, Inglaterra y Brasil—.

Arquivo Morto – Andrés Felipe Orjuela Castañeda | Colômbia A manipulação dos sais de prata

Se em alguns trabalhos aqui expostos apresenta-se o documento in natura, puro, em outros os artistas hiperbolizam suas linguagens para uma abordagem absolutamente política da repressão, do desrespeito às liberdades civis e às igualdades étnicas.

O colombiano Andrés Felipe Orjuela Castañeda, pesquisando sobre as drogas, encontra no verde obsessivo a reafirmação da denúncia sobre a repressão.

Artista colombiano radicado no México, Andrés Felipe Orjuela Castañeda é formado em artes plásticas e visuais pela Univer-

sidade Nacional da Colômbia. Participou de exposições em diversos países – Colômbia, Estados Unidos, México, Panamá, Cuba,

Peru, França, Espanha, Inglaterra e Brasil.

“Se Hacia Pasar por Zapatero”, 2013

impressão jato de tinta preto e branco sobre papel de algodão;

intervenção à mão com pigmentos Marshall’s | B&W inkjet print

on cotton paper; manual intervention with Marshall’s pigments |

impresión de chorro de tinta blanco y negro sobre papel de algodón;

intervención a mano con pigmentos Marshall’s, de Andrés Felipe

Orjuela Castañeda

arquivo | archive | archivo: El Espacio

Page 9: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
Page 10: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

[texto original em espanhol]

Prezado Claudi,

No meu site estão todas as imagens disponíveis e os textos. Ou você precisa que lhe envie separadamente um PDF? Em uma hora, enviarei as duas fotos que ainda não pintei, mas que seria ótimo exibir pela primeira vez. http://www.andresorjuela.co/archivo-muerto.html

Enviado do meu iPhone

Texto extraído do site Cai “distribuidora geral” de maconha na capital

Em 15 de agosto de 1966, o jornal El Espacio, de Bogotá, Colômbia, intitulava assim o seu artigo policial após a intensa operação do F-2, em que foi capturado Juan de Jesús Cifuentes Bautista, de 27 anos, oriundo de Girar-dot e identificado com o documento de identidade C.C. 2902118, e que, conforme o jornal, levava em seu poder pouco mais de meia arroba de droga, o suficiente para

5 mil cigarros do entorpecente, com um valor de 7 mil pesos, que até a presente data seriam aproximadamente 3 milhões de pesos (1.500 dólares).

É dessa aparentemente banal notícia, muito habitual nos jornais da época, que surge o meu projeto Cantidad Su-ficiente [Quantidade Suficiente].

Na Colômbia, foi assinado um acordo para evitar o estí-mulo à violência por meio de imagens midiáticas no ano de 1999, como resposta às sangrentas cenas deixadas pela guerra e à já maciça dor de uma sociedade que, àquela altura do conflito, havia transposto as fronteiras socioeconômicas: pobres, ricos, políticos, jornalistas, pessoas comuns morreram em meio a uma guerra sem quartel, em que não era permitido nem andar pela rua.

Foi precisamente na rua que um reciclador, no ano de 2011, viu caixas de fotografias diante do velho edifício do jornal, nas quais foram encontradas estas fotos. Todo o arquivo foi abandonado como lixo, mas a perspicácia do senhor Jaime Rueda o levou a comprá-lo e depois, em um esquema de permuta tradicional, a ceder-me algumas das fotos, que hoje fazem parte da minha obra.

Arquivo Morto – Andrés Felipe Orjuela Castañeda | Colômbia A manipulação dos sais de prata

Alias “El Mexicano”, 2014, Andrés Felipe Orjuela Castañeda

impressão jato de tinta preto e branco sobre papel de algodão;

intervenção à mão com pigmentos Marshall’s | arquivo: El Espacio

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Page 12: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

Bajo Sospecha: Aqui Todos Somos Suspeitos –

Bernardo Oyarzún | ChileO documento inventado

Criminoso e suspeito, Bernardo Oyarzún completa a visão de arquivo proposta por esta mostra. Ao misturar fotografia/documento, fotografia/arte e fotografia/performance, lembra a todos de que estamos prontos para aceitar visões equivocadas, desde que elas apareçam documentadas em fotografias com carimbos oficiais.

Bernardo Oyarzún, nascido no Chile, é artista visual. Formado em arte pela Universidade do Chile, participou de mais de trinta

exposições internacionais, incluindo duas bienais. Seus trabalhos podem ser encontrados em importantes coleções de arte, como

a Daros Latinamerica (Zurique, Suíça), e no Blanton Museum (Austin, EUA).

A criminal and suspect, Bernardo Oyarzún is the last stop of this overview of the archive proposed by this show. By putting together photography/document, photography/art and photography/performance, he reminds all of us that we readily accept mistaken views, provided that they are fixed in photographs bearing official stamps.

Bernardo Oyarzún, born in Chile, is a visual artist. A gradu-

ate in arts of the Universidad de Chile, Oyarzún has taken part

in over thirty international exhibitions, including two biennials.

His works can be seen in mainstream art collections, such as

Daros Latinamerica (Zurich, Switzerland) and Blanton Museum

(Austin, USA).

Delincuente y sospechoso, Bernardo Oyarzún completa la visión de archivo propuesta por esta muestra. Al mez-clar fotografía/documento, fotografía/arte y fotografía/performance, nos recuerda a todos que estamos listos para aceptar visiones equivocadas, siempre y cuando estén documentadas en fotografías con sellos oficiales.

Bernardo Oyarzún nació en Chile y es artista visual. Licen-

ciado en arte por la Universidad de Chile, participó en más de

treinta exposiciones internacionales, incluyendo dos bienales.

Sus trabajos pueden encontrarse en importantes colecciones

de arte, como Daros Latinamerica (Zúrich, Suiza), y en Blanton

Museum (Austin, EE.UU.).

El Delincuente, o por el (d)Efecto, 1998

foto | photo | foto: Pamela San Martín

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[texto original em espanhol]

Olá, Claudi,

Vou enviar o material amanhã, sábado. Estou ciente da urgência, mas estou trabalhando fora de Santiago e chegarei hoje à noite em minha casa. Vou revisar o material e o enviarei a você. Sinto muito, mas essa é a minha realidade; não posso fazê-lo antes, já que tenho de trabalhar em outras coisas que me ocupam bastante.

Atenciosamente, bernardoyarzun

El Delincuente, o por el (d)EfectoA obra é construída menos de um ano depois que a po-lícia me deteve como suspeito e fui submetido à aca-reação com algumas perturbadas testemunhas de um violento assalto. Vivi a fragilidade candente e sofri a in-

certeza mais delirante, porque esse episódio poderia ter mudado totalmente a minha vida se eu fosse indiciado como criminoso. A minha situação, o meu futuro nesse minuto dependia de um procedimento policial.

Desse acontecimento extraí uma ficção de criminoso como ideia de obra, uma construção por meio da per-formance de um criminoso comum, com ficha policial, retrato falado e parentesco do criminoso. Se pensarmos no martírio e no abuso de muitos, como os indígenas e os imigrantes, pelas perversões sociais e racistas instaladas no Chile, não é difícil entender a situação anedótica e dramática que desencadeia esta obra. Ao que parece, o estigma de um criminoso em potencial caminha comigo, amaldiçoado pelos pre-conceitos superficiais, não se encaixa na sociedade chilena, uma aura maléfica de um “marginal” que aflora obstinadamente por seus traços fisionômicos indíge-nas, com sua matriz central de antissocial, “defeito” de criminoso.

El Delincuente, o por el (d)Efecto, 1998

foto: Pamela San Martín

Bajo Sospecha: Aqui Todos Somos Suspeitos –

Bernardo Oyarzún | ChileO documento inventado

Page 15: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
Page 16: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

La Huella Invertida – José Domingo

Laso (fotógrafo) e François “Coco” Laso

(pesquisador do arquivo) | Equador Uma nova forma de olhar velhos arquivos

Uma frase do fotógrafo José Domingo Laso (1870-1927) sobre a cidade de Quito é a antecipação explícita da gen-trificação executada nas modernizações urbanas dos dias de hoje. “El elemento indígena, afeándolo todo y dando pobrísima idea de nuestra población y de nuestra cultura.”

O material produzido por José Domingo entre 1911 e 1925 foi recuperado pelo bisneto François “Coco” Laso. Nas imagens, para eliminar os indígenas, o fotógrafo riscou as placas de vidro, os negativos do passado, e cobriu as marcas com vestidos brancos e sombreiros largos.

“Coco” Laso, fotógrafo e curador, nasceu na Bélgica. Estudou artes na Escola Superior de Artes e Imagem Le 75, em Bruxelas, e

comunicação na Universidad Central del Ecuador. Radicado no Equador, participou de diversas exposições mundiais. Premiado

inúmeras vezes, é autor de diversos livros, entre os quais La Mirada y la Memoria, Otro Cielo no Esperes e Nunca un Río.

A statement of photographer José Domingo Laso (1870-1927) about the city of Quito is the explicit anticipation of the gentrification that took place in today’s urban modern-ization processes. “El elemento indígena, afeándolo todo y dando pobrísima idea de nuestra población y de nuestra cultura.” [The indigenous element, disfiguring everything and giving the faintest sense of our people and our culture]

The material produced by José Domingo from 1911 to 1925 was retrieved by his great-grandson François “Coco” Laso. In order to erase the indigenous from the images, the photographer scrached the glass plates, the negatives in the past, and covered the marks with white dresses and big Mexican hats.

“Coco” Laso, photographer and curator, was born in Belgium.

He took arts at the École Supérieure des Arts de l›Image Le 75,

in Brussels, and communications at the Universidad Central del

Ecuador. Settled in Ecuador, he has participated in a number

of world exhibitions. Recipient of a myriad of awards, Laso has

written several books, which include La Mirada y la Memoria,

Otro Cielo no Esperes and Nunca un Río.

Una frase del fotógrafo José Domingo Laso (1870-1927) sobre la ciudad de Quito es la anticipación explícita de la gentrificación ejecutada en las modernizaciones urba-nas de los días actuales. «El elemento indígena, afeán-dolo todo y dando pobrísima idea de nuestra población y de nuestra cultura».

El material producido por José Domingo entre 1911 y 1925 fue recuperado por su bisnieto François «Coco» Laso. En las imágenes, para eliminar a los indígenas, el fotógrafo tachó las placas de vidrio, los negativos del pasado y cubrió las marcas con vestidos blancos y sombreros anchos.

«Coco» Laso, fotógrafo y curador, nació en Bélgica. Estudió

artes en la Escuela Superior de Artes e Imagen Le 75, en Bru-

selas, y comunicación en la Universidad Central del Ecuador.

Radicado en Ecuador, participó en diversas exposiciones

mundiales. Premiado innumerables veces, es autor de diver-

sos libros, entre los cuales La Mirada y la Memoria, Otro Cielo

no Esperes y Nunca un Río.

Mulheres e Jovens Indígenas Amazônicos

(Album Antropométrico de Tipos), ca. 1920, José Domingo Laso Acosta

arquivo | archive | archivo Histórico del Ministerio de Cultura

y Patrimonio del Ecuador

Page 17: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
Page 18: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

[texto original em espanhol]

Claudi,

Envio nos documentos anexos uma apresentação em PDF sobre a fotografia de Laso. Além do que vocês já viram na exposição, acrescentei uma fotografia de “los locos en el manicomio” (os loucos no manicômio) que não estava na mostra do museu e que é impressionante...

Acho que exagerei nos textos...

Um grande abraço como sempre e nos vemos amanhã para jantar.

Coco

O texto abaixo foi reproduzido do livro Quito a la Vista, de J. D.

Laso e J. R. Cruz (Quito, 1911).

AVISO

Quando anunciamos ao público a próxima aparição de Quito a la Vista e manifestamos qual era o propósito que nos motivava a empreender a edição deste álbum, dissemos que, na medida das nossas forças, quería-mos preencher uma das lacunas que sentíamos que havia entre nós em termos de publicações ilustradas referentes à capital da república.

Agora, quando temos o prazer de apresentar a conclu-são da primeira série da nossa obra, queremos chamar a atenção das pessoas imparciais para o cuidado es-pecial que dedicamos para oferecer-lhes uma coleção de vistas isenta do principal defeito do qual geralmente padecem e padeceram todas ou quase todas as foto-grafias da capital tiradas por turistas estrangeiros e que circularam no exterior.

Poucos, pouquíssimos se preocuparam em escolher o objetivo daquelas vistas, de forma que nos apresentaram como um país praticamente selvagem ou conquistável. Poderiam ter exibido edifícios ou os costumes populares, as paisagens etc. Porém, em seus trabalhos, o que apa-rece predominantemente, para não dizer exclusivamen-te, é o elemento indígena, enfeando tudo e dando uma paupérrima ideia da nossa população e da nossa cultura.

Além disso, nem sempre foi possível para os filhos deste país – talvez por falta de aviso – se livrar daquele empe-cilho nas poucas ocasiões nas quais resolveram formar uma série metódica, de maior ou menor interesse, de vistas da capital ou dos seus arredores.

Pois bem, achamos que faríamos uma obra de reivindica-ção, uma obra de perfeito patriotismo ao demonstrar grafi-camente que a capital do Equador, tanto por sua população quanto por seu aspecto externo, não deixa nada a desejar se comparada com as cidades do nosso continente.

Esse é o objetivo da nossa obra. Por isso, além do nosso cuidado escrupuloso para que todas as nossas fotografias saiam limpas e livres daqueles grupos aos quais acabamos de nos referir, quisemos incluir neste álbum quão notável é a capital no âmbito político, social, literário, industrial etc.

Como já dissemos, a obra completa terá várias séries, cada uma disposta de tal forma que, uma vez terminada a coleção, poderá ser formado com elas um único volume. Para que se diferencie pela atratividade e pelo interesse do conjunto, consultamos a variedade, de forma que, em cada série, juntamente com as vistas, haja retratos e, ao lado dos grupos, as paisagens e os monumentos mais famosos.

Dependendo do sucesso obtido pelo álbum dedicado à capital, prometemos estender o mesmo método de informação gráfica às províncias, nas quais as indústrias e a beleza esplêndida do solo equatoriano oferecem ob-jetos dignos de ser perpetuados pela arte.

Os editores

La Huella Invertida – José Domingo

Laso (fotógrafo) e François “Coco” Laso

(pesquisador do arquivo) | Equador Uma nova forma de olhar velhos arquivos

Iglesia de la Compañia de Jesús – Quito, 1922,

José Domingo Laso Acosta

Arquivo Histórico del Ministerio de Cultura y Patrimonio del Ecuador

Page 19: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
Page 20: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina

A Boa Aparência – Eustáquio Neves | BrasilA manipulação dos sais de prata

O fotógrafo Eustáquio Neves pesquisa a partir de textos periódicos e classificados de oferta de empregos o hábito cotidia-

no de se julgar os negros pela aparência – podia se chamar “boa esperança”, nome que se dava aos navios negreiros que

buscavam uma saída no final da travessia dessa destruição de povos chamada escravidão.

Nascido em Minas Gerais, Eustáquio Neves é fotógrafo e videoartista. Considerado um dos grandes nomes da fotografia con-

temporânea, seu trabalho tem sido amplamente divulgado em mostras no Brasil e no exterior. Em 1994, recebeu o Prêmio Funarte

Marc Ferrez de Fotografia com trabalho voltado para fotografia de caráter étnico-cultural.

Using periodical articles and classified ads offering jobs, photographer Eustáquio Neves investigates the daily habit of judging black people by their looks - it could be called “good hope”, a name given to the slave ships that, at the end of their voyage, attempted to swerve from this destruction of peoles called slavery.

Born in Minas Gerais, Eustáquio Neves is a photographer and

video artist. Considered one of the big names of contemporary

photography, his work has been made widely known in shows

both in and out of Brazil. In 1994, he won the Funarte Marc Fer-

rez Award of Photography for his photographic work with an

ethnic-cultural approach.

El fotógrafo Eustáquio Neves investiga en textos periódi-cos y clasificados de oferta de trabajo el hábito cotidiano de juzgar a los negros por su apariencia —podría llamar-se «buena esperanza», nombre que se daba a los navíos negreros que buscaban una salida al final de la travesía de esa destrucción de pueblos llamada esclavitud.

Nacido en Minas Gerais, Eustáquio Neves es fotógrafo y vi-

deoartista. Considerado uno de los grandes nombres de la foto-

grafía contemporánea, su trabajo se ha difundido ampliamente

en muestras en Brasil y en el exterior. En 1994, recibió el Premio

Funarte Marc Ferrez de Fotografía por un trabajo dirigido a la

fotografía de carácter étnico-cultural.

Sem Título, Série A Boa Aparência, 1999-2000, Eustáquio Neves

Page 21: Arquivo Ex Machina: Arquivo e Identidade na América Latina
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[texto original]

No meu trabalho, não acredito na ideia de perder uma imagem de determinada cena porque, em determinado momento de uma cena “imperdível”, eu não estava munido de equipamento fotográfico. Eu acredito na interpretação de todo o universo de coisas e informações à minha volta para transformar isso em fotografias e criar um diálogo maior com os outros. Além da ideia daquilo que eu quero discutir, preciso criar uma estratégia de abordagem, pro-cedimentos e meios para chegar a um resultado.

Além do conceito, me interessam muito os meios e o processo como pesquisa. Por isso, uma boa ideia é im-portante para que meu trabalho não fique resumido ao processo e à utilização dos meios. Sobre a linguagem, eu acredito que ela vem da pesquisa, da inquietação e da necessidade de expressão de cada criador.

Sempre recorro a arquivos e, na maioria das vezes, já tenho as imagens que faço pré-concebidas. Mas nun-ca quis me acomodar a um determinado processo, até porque ideias diferentes, às vezes, pedem processos diferentes. Sistematizo aquilo que me interessa e recorro àquele mais coerente à ideia de um novo trabalho. Penso a estratégia como forma de pensar no futuro e como um procedimento articulador de resultados.

Quase todas as minhas séries surgem da inquietação e da pesquisa.

Quando chego a uma cidade que para mim é nova, vou logo para o mercado, se houver um, para as conversas nas ruas em lugares muito pequenos ou para os arquivos e instituições públicas nas cidades que os tenham. Com a série A Boa Aparência não foi diferente. Em uma ida a Diamantina na década de 1990, descobri uma série de textos sobre escravos fugidos na biblioteca pública lo-cal. Notei que alguns desses textos traziam a expressão “boa aparência” para descrever o escravo, visto ali como um bem precioso.

No final dessa mesma década, em 1999, recebi uma bolsa para passar um tempo em Londres como artis-ta residente. Fiquei acomodado no bairro de Brixton, que tem uma população negra bastante expressiva, um mercado e um black archive no qual acabei des-cobrindo textos sobre escravos fugidos e que também usavam os termos “boa aparência” em alguns anúncios. Voltando para o Brasil e folheando um jornal local por curiosidade, lembrei que os classificados de oferta de emprego desses jornais também traziam os termos “boa aparência”. Essa série surgiu do confronto desses dois usos de “boa aparência”.

Eustáquio Neves

A Boa Aparência – Eustáquio Neves | BrasilA manipulação dos sais de prata

Sem Título, Série A Boa Aparência, 1999-2000, Eustáquio Neves

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Arquivo Nuñez De Arco/

Javier Nuñez De Arco (pesquisador) | BolíviaUma nova forma de olhar velhos arquivos

De uma perspectiva eurocêntrica, não há figura mais exótica possível da América Latina do que um pequeno indígena boliviano posando de rei, com o mundo aos seus pés. Essa figura – explorada pela literatura, pelo cinema no mítico O Grande Ditador (1940), de Charles Chaplin, e parafraseada na série Game of Thrones (2011- ) – serve aqui para reafir-mar a esquizofrenia construída ao longo dos anos por aqueles que não se deram o trabalho de entender o diverso.

As imagens são de Muñoz Reyes (um dos primeiros engenheiros de mineração na Bolívia, formado em 1985 pela Escola de Construção Civil e de Mineração em Lima) e formam parte do tesouro gráfico achado em uma velha caixa de sapatos há 15 anos em um antiquário boliviano: o arquivo perdido do fotógrafo, cinegrafista, escritor e correspon-dente de guerra alemão Hans Ertl, que posteriormente fixou residência na Bolívia.

Javier Nuñez De Arco é considerado o maior colecionador de imagens bolivianas. Pesquisador dos fotógrafos pioneiros dos

séculos XIX e XX em seu país, em 1994, recebeu pelo Círculo de Fotógrafos Profesionales da Bolívia o reconhecimento por seus

trabalhos de preservação e restauração de material fotográfico antigo.

From an Eurocentric standpoint, there is no more exotic figure in Latin America than a little Bolivian indigenous posing as a king with the world at his feet. This figure - explored in literature, cinema, in the mythical The Great Dictator (1940), by Charles Chaplin, and paraphrased in the Game of Thrones series (2011- ) – is used here to reaffirm the schizophrenia built over the years by those who do not care to try to understand the diversity.

The images are from Muñoz Reyes (one of the first min-ing engineer in Bolivia, formed in 1985 at the School of Construction and Mining in Lima) and an integral part of the graphic treasure found in an old shoe box 15 years ago in a Bolivian antique shop: the lost archive of German photographer, cinematographer, writer and war corre-spondent Hans Ertl, who later settled down in Bolivia

Javier Nuñez De Arco is considered the greatest collector of

Bolivian images. A researcher of pioneer photographers from

the 19th and 20th centuries in his country, he is the recipient of

an acknowledgment from the Círculo de Fotógrafos Profesio-

nales, from Bolivia, in 1994, for his efforts to preserve and restore

old photographic material..

Desde una perspectiva eurocéntrica, no hay figura más exótica posible de América Latina que un pequeño indí-gena boli viano con pose de rey y el mundo a sus pies. Esa figura —explorada por la literatura, el cine, en el mítico El Gran Dictador (1940), de Charles Chaplin, y parafrasea-da en la serie Juego de Tronos (2011- )— sirve aquí para reafirmar la esquizofrenia que construyen a lo largo de los años quienes no se dedicaron a entender lo diverso.

Las imágenes son de Muñoz Reyes (uno de los prime-ros ingenieros de minería en Bolivia, graduado en 1985 en la Escuela de Construcciones Civiles y de Minas en Lima) y forman parte del tesoro gráfico encontra-do hace 15 años en una vieja caja de zapatos, en un anticuario boliviano: el archivo perdido del fotógrafo, cámara, escritor y corresponsal de guerra alemán Hans Ertl, quien después se estableció en Bolivia.

Javier Nuñez De Arco es considerado el mayor coleccionista

de imágenes bolivianas. Investigador de los fotógrafos pioneros

de los siglos XIX y XX en su país, recibió del Círculo de Fotógrafos

Profesionales de Bolivia, en 1994, el reconocimiento por sus traba-

jos de preservación y restauración de material fotográfico antiguo.

Con el Mundo a Mis Pies, 1900, Juan L. Muñoz Reyes

arquivo | archive | archivo: Javier Nuñez De Arco

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[texto original em espanhol]

Querido Claudi,

Envio uma pequena resenha escrita há algum tempo que espero que lhe seja útil.

Envio também uma fotografia de retrato e uma cópia es-caneada do passaporte, que a Júlia pediu. Ela me disse que estaria de férias.

Em relação às fotos dos anões, é uma série feita pelo en-genheiro Muñoz Reyes no início do ano de 1900. Desde a primeira vez que as vi, e foram as minhas primeiras pla-cas, eu as achei fantásticas, especialmente quando co-mecei a imaginar como havia sido a produção das fotos.

Fazendo os cálculos, eu me dedico à fotografia há 45 anos, primeiro como fotógrafo e, pouco a pouco, cole-cionando tudo o que se refere à fotografia e a fotógrafos, assim como a diferentes arquivos, câmeras, papéis e materiais fotográficos, desde Lumière. Comecei com a restauração digital de placas de vidro e a fundação do primeiro museu fotográfico na Bolívia, que infelizmente durou muito pouco por falta de apoio.

Espero que seja útil.

Envio um forte abraço.Javier

As quatro imagens do arquivo Nuñez De Arco apresen-tadas aqui fazem parte de um acervo reunido, com pa-ciência e cuidado, ao longo de 35 anos dedicados à sua recuperação, à sua restauração e à recente exposição

de material representativo de mais de cem fotógrafos da Bolívia e do mundo, dedicados a captar com a lente uma diversidade de imagens desde 1850 até 1960.

Entre os acervos mais importantes, sem dúvida está o do engenheiro naval e arqueólogo austríaco-boliviano Arthur Posnansky (1873-1946), que se empenhou muito para destacar Tiwanaku e questionar o passado dos seus habitantes, explorando a vida e a organização social dos diversos grupos do altiplano (aymaras, urus, chipayas) em mais de 160 livros e folhetos ilustrados. Seus negativos em placas de vidro (excepcionalmente de 24 x 30 cm), seus álbuns de apresentação e seus fil-mes (8 mm) são conservados como testemunho de uma intensa atividade arqueológica e etnográfica.

Este material é complementado com as fotografias tira-das em Tiwanaku e no Lago Titicaca na segunda metade do século XIX pelos exploradores pioneiros do Ocidente. Por exemplo, o vulcanologista alemão Alphonse Stübel (1835-1904) e o linguista e arqueólogo alemão Max Uhle (1856-1944), enviados ao país pelo Königliches Museum für Völkerkunde. Além disso, há fotografias de dois im-portantes pesquisadores do Museu de História Natural: o etnólogo suíço-estadunidense Adolf Bandelier (1842-1914) e o arqueólogo norte-americano Wendell Clarck Bennett (1905-1953).

Os acervos também contêm, entre muitas fotografias, as tiradas para o jornal apartidário La Nación (La Paz). A partir delas é possível fazer um acompanhamento da atividade política, social e esportiva. Têm destaque, por sua importância técnica, as tomadas feitas por Max Ch. Vargas, que foi professor do fotógrafo cusquenho Chambi. O mesmo vale para as tomadas feitas pelos irmãos Valdez – Rodrigo, Talvot, Sterling e Sintich, entre outros nomes.

Arquivo Nuñez De Arco/

Javier Nuñez De Arco (pesquisador) | BolíviaUma nova forma de olhar velhos arquivos

Enano a Caballo, 1900, Juan L. Muñoz Reyes

arquivo: Javier Nuñez De Arco

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Como um detetive particular a serviço da história, João Pina pesquisa aquele que foi um dos mais obscuros acordos feitos pela repressão em diversos países do continente americano. Seu trabalho baseado em imagens históricas e absolutamente contemporâneas é o mais impactante relato que temos da Operação Condor.

João Pina, nascido em Lisboa, é fotógrafo. Formado em fotojornalismo e fotografia documental pelo International Center of Pho-

tography (ICP), em Nova York (EUA), tem trabalhos publicados nos jornais The New York Times e El País e nas revistas The New

Yorker, Time e Newsweek. Em 2011, recebeu o Prêmio Leão de Ouro do Festival de Publicidade de Cannes.

Operação Condor – João Pina | PortugalO documento inventado

Like a private detective at the service of history, João Pina investigates a campaign that was one of the most obscure operations of political repression implemented in a number of countries in the Americas. His work based on absolutely contemporary, historic images is the most impacting report available on the Operation Condor.

João Pina, born in Lisboa, is a photographer. Holding a degree

in photojournalism and documentary photography from the

International Center of Photography (ICP), in New York (USA),

his works have been published on The New York Times and El

País newspapers and The New Yorker, Time and Newsweek

magazines. In 2011, Pina received the Gold Lion of the Cannes

Lions International Festival of Creativity.

Como un detective particular al servicio de la historia, João Pina investiga el que fue uno de los más oscuros acuerdos hechos por la represión en diversos países del continente americano. Su trabajo basado en imágenes históricas y totalmente contemporáneas es el más im-pactante relato que tenemos de la Operación Cóndor.

João Pina, fotógrafo, nació en Lisboa. Licenciado en fotope-

riodismo y fotografía documental por el International Center of

Photography (ICP), en Nueva York (EE.UU.), publicó trabajos en

los periódicos The New York Times y El País y en las revistas

The New Yorker, Time Magazine y Newsweek. En 2011, recibió

el premio León de Oro del Festival de Publicidad de Cannes.

Londres 38, 2008, João Pina

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[texto original em português de Portugal]

Em 2005, estava eu a terminar o meu primeiro livro, Por Teu Livre Pensamento – no qual retratei 25 ex-presos políticos portugueses –, quando descobri pela primeira vez a existência da Operação Condor, um plano secre-to que em 1975, no auge da Guerra Fria, uniu seis paí-ses latino-americanos (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Uruguai e Paraguai) que viviam sob regimes militares de extrema-direita. Através da partilha de informações, recursos, técnicas de tortura e prisioneiros políticos, es-ses países pretendiam aniquilar a oposição política, que chamavam de “ameaça comunista” ou de “subversivos”.

Sabendo, por via familiar, dos efeitos que um longo re-gime ditatorial pode provocar na sociedade e nas víti-mas diretas dos abusos cometidos pelos repressores, a minha curiosidade persistiu o suficiente para eu con-cluir que essas experiências podiam e deviam ter uma existência visual. Assim, decidi usar a fotografia, que é a minha linguagem, para observar as vítimas da Condor. Durante os oito anos seguintes, com a máquina fotográfi-ca numa mão e o gravador na outra, pude entrar proviso-riamente na vida de algumas pessoas, a quem pedi que partilhassem comigo tanto as suas memórias como os lugares onde viveram experiências realmente terríveis.

Durante vários anos, falei com pessoas, tentando com-preender os pormenores e as principais diferenças entre as várias ditaduras, bem como os processos de demo-cratização. Já a viver na Argentina, pude ver de perto o sofrimento de muitos dos familiares das vítimas, que não sabem até hoje o que aconteceu com seus parentes queridos. Os Estados criminosos, liderados pelas mais altas patentes militares, fizeram tábua rasa de todos os tratados sobre o acesso à justiça, a advogados, e de for-ma covarde executaram milhares de pessoas, negando às famílias até o direito de velar os seus mortos. Mas, até hoje, a grande maioria dos responsáveis pelas mortes e desaparições forçadas nunca foi levada à justiça.

Testemunhei ainda como alguns dos sobreviventes e familiares lidam com os profundos traumas, que vão des-de depressões agudas a estados de paranoia e outros problemas psíquicos menos visíveis, mas que de alguma maneira transformaram a vida de várias gerações. Milha-res de pessoas lutam todos os dias em silêncio contra os fantasmas do passado e as suas sombras.

Quase todos os Estados envolvidos negam até hoje um dos mais elementares direitos humanos, o de a vítima ser realmente considerada como tal. Não bastam as campanhas de propaganda eleitoral de alguns parti-dos que, para chegarem ao poder, usam a bandeira dos direitos humanos, nem que alguns dos antigos revo-lucionários estejam hoje na presidência. É realmente necessário um sentimento de justiça plena. No campo jurídico, julgando e condenando todos aqueles que te-nham irrefutavelmente participado nos crimes contra a humanidade, o que até agora apenas a Argentina está fazendo. No plano econômico, assumindo o Estado o dever de indenizar as vítimas e seus familiares, tanto pelos crimes cometidos como pelos traumas causa-dos. E, finalmente, no plano moral e histórico, assumin-do publicamente esses Estados, hoje democráticos, o mal que fizeram no passado. Isso é exequível através da investigação de todos os casos de desaparições, criando programas de memória histórica e educação pública e, naturalmente, reeducando e refundando as forças armadas. Acredito que seja essa a única forma de evitar que planos como o Condor se repitam no futuro, mesmo que sob outras bandeiras.

Ainda hoje, da selva amazônica no Brasil até as terras geladas da Patagônia, milhares de vítimas continuam enterradas em fossas não identificadas. As fotografias aqui expostas fazem parte de um projeto que tenta pres-tar homenagem a todas as vítimas das ditaduras que governaram com mão de ferro esta região.

Atenciosamente,João Pina

Operação Condor – João Pina | PortugalO documento inventado

Esteban Echeverria, 2011, João Pina

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Arquivo Rikio Sugano – Centro de la Imagen –

Jorge Villacorta (pesquisador) | PeruUma nova forma de olhar velhos arquivos

Rikio Sugano (1887-1963) foi um aventureiro japonês que viajou o mundo inteiro, retratando-se em planos inusitados, em busca do exótico, e que integra a mostra como o primeiro obcecado com o selfie. O material aqui exposto foi achado e pesquisado primeiramente pelo Centro de la Imagen de Lima, no Peru.

Centro de la Imagen, instituto dedicado à formação de fotógrafos e à difusão da fotografia, foi criado em 1999, no Peru. Além da programação acadêmica, o centro conta com um departamento de restauração e conservação que abriga vários acervos e com um espaço de exposição – a galeria El Ojo Ajeno –, também sendo organizados eventos como a mostra fotográfica LimaPhoto e a Bienal de Fotografia de Lima.

Jorge Villacorta é pesquisador, crítico e curador do Centro da Imagem, em Lima, no Peru. Foi curador-chefe da Bienal de Fo-

tografia de Lima em 2014 e da exposição permanente do Lugar de la Memoria, la Tolerancia y la Inclusión Social (LUM), antigo

Museu da Memória do Peru.

Rikio Sugano (1887-1963) was a Japanese adventurer who traveled around the world portraying himself in un-usual shots in his quest for the exotic. He appears in this exhibition as the first man obsessed with selfies. The ma-terial showcased here was first found and investigated at Centro de la Imagen de Lima, in Peru.

Centro de la Imagen, an institute dedicated to the education of photographers and dissemination of pho-tography, was set up in 1999 in Peru. Aside from the ac-ademic programming, the center also has a restoration and conservation department that houses several col-lections plus an exhibition hall – El Ojo Ajeno gallery – and promotes events such as the LimaPhoto photography show and the Bienal de Fotografía de Lima.

Jorge Villacorta is a researcher, critic and curator with Centro

de la Imagen, in Lima, Peru. He was the chief curator of the

Bienal de Fotografía de Lima in 2014 and of the permanent

exhibition of Lugar de la Memoria, la Tolerancia y la Inclusión

Social (LUM), former Museo de la Memoria of Peru.

Rikio Sugano (1887-1963) fue un aventurero japonés que viajó por todo el mundo, retratándose en planos inusita-dos, en busca de lo exótico y que forma parte de la mues-tra como el primer hombre obcecado por la autofoto. El material aquí expuesto fue encontrado e investigado primero por el Centro de la Imagen de Lima, en Perú.

Centro de la Imagen, instituto dedicado a la formación de fotógrafos y a la difusión de la fotografía, creado en 1999, en Perú. Además de la programación académica, el centro cuenta con un departamento de restauración y conservación que alberga varios acervos, con un espa-cio de exposición —la galería El Ojo Ajeno— y organiza-ción de eventos, como la muestra fotográfica LimaPhoto y la Bienal de Fotografía de Lima.

Jorge Villacorta es investigador, crítico y curador del Centro

de la Imagen, en Lima, Perú. Fue el curador jefe de la Bienal de

Fotografía de Lima en 2014 y de la exposición permanente del

Lugar de la Memoria, la Tolerancia y la Inclusión Social (LUM),

antiguo Museo de la Memoria de Perú.

En Grupo Junto a un Chuillo (Weberbauerocereus Rauhii), ca. 1923-1924

Estudio Shirasaka | arquivo | archive | archivo: Inmigrantes Japoneses

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[texto original em espanhol]

Prezado senhor Huarcaya, Bom dia. Obrigado. O senhor Yanaguida, professor da Universidade de Keio (que domina o idioma espanhol), enviou-me resposta e comenta o seguinte:

– É verdade que parece que as fotos foram tiradas na co-munidade dos imigrantes japoneses por volta de 1922, mas parece que há algumas fotos tiradas após 1922, já que vemos uma imagem do edifício da Escola Japonesa Lima Nikko com o jogo de beisebol.

– O senhor de óculos e barba que aparece em vá-rias fotos se chama Rikio Sugano, um aventureiro japonês que visitou o mundo todo. No Japão, foi pu-blicado um livro sobre ele recentemente, em 2010. Há um site de um grupo de pesquisa sobre sua vida: http://tankenka.j-wak.com/index.html.

– O senhor Sugano chegou ao Peru em 10 de agosto de 1923 e, em 4 de abril de 1924, partiu para o Chile. Ele é da prefeitura de Fukushima, no Japão. Em sua estadia no Peru, visitava os imigrantes provenientes de Fukushima. Viajava por Huaral, Chankai, Chiklayo, pela serra e pela floresta. No final, por Canhete e Mo-liendo. Ele costumava tirar as fotos com a colaboração dos fotógrafos locais. No Peru, contava com a ajuda de uma loja de fotografia de imigrantes japonesa chamada Shirasaka. Ele costumava deixar as fotos na região que visitava para divulgar a sua aventura. Às vezes, dava de presente cartões com as suas imagens. Em todos os lugares do mundo são encontradas suas fotos e seus cartões. No Japão são conservadas 5.700 imagens em 20 álbuns, além de algumas cópias das fotos do Centro da Imagem de Lima. O professor Yanaguida

tem todos os dados escritos sobre ele digitalizados em sua universidade. É possível que se encontrem mais fotos parecidas nas famílias nikkeis provenientes de Fukushima, já que o senhor Sugano costumava dar as fotos de presente às famílias que o recebiam.

– Do ponto de vista de um historiador, o senhor Yana-guida comenta que é importante confirmar quem são os donos dessas fotos. (Devem ser famílias imigrantes provenientes de Fukushima.) E também digitalizar os da-dos para que possa ser feita uma pesquisa comparativa entre as fotos do centro e as imagens já guardadas no Museu de Imigrantes da Associação Peruana Japonesa (APJ) ou no Japão, com as famílias parentes do senhor Sugano. Após essa pesquisa, poderá ser discutida a forma mais adequada para a conservação das fotos. Vou entrar em contato com o museu contando o resumo do que conversamos, para ver se eles têm algum inte-resse nessas fotos.

Com relação ao equipamento para este projeto, por fa-vor, continue coordenando diretamente com Shimpei Otake, encarregado da doação cultural do governo do Japão. (Pelo que entendi, estamos esperando o envio do dossiê do projeto.) Atenciosamente, Naomi KURODA

* * * * * * * * * * * * * * * * * * * 在ペルー日本国大使館 広報文化班 一等書記官 黒田なおみ Naomi KURODA

Primeira-secretária/Agregada cultural e de imprensa

Departamento Cultural e de Imprensa

Embaixada do Japão no Peru

* * * * * * * * * * * * * * * * * * *

Arquivo Rikio Sugano – Centro de la Imagen –

Jorge Villacorta (pesquisador) | PeruUma nova forma de olhar velhos arquivos

En Isla de Guano, entre Aves Guaneras, ca. 1923-1924

Rikio Sugano/Estudio Shirasaka | arquivo: Inmigrantes Japoneses

Cementerio Prehispánico Saqueado, en Nazca, Ica, ca. 1923-1924

Estudio Shirasaka | arquivo: Inmigrantes Japoneses

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1968, o Fogo das Ideias –

Marcelo Brodsky | Argentina

A manipulação dos sais de prata

Na Argentina, na documentação dos movimentos libertários de 1968, a representação plástica daquele que foi um dos mais importantes movimentos em rede de uma época em que não se falava de redes. Marcelo Brodsky alinha, com suas letras e cores, cada uma das diversas imagens com a força do historiador que o artista é.

Marcelo Brodsky é fotógrafo, artista e ativista político argentino. Em 2008, recebeu o Premio de Derechos Humanos, concedido

pela organização B’nai B’rith Argentina. Em 2014, fundou a Visual Action, plataforma digital dedicada a incorporar a cultura visual

em campanhas de direitos humanos.

Digging out documents of the 1968 libertarian move-ments, Marcelo Brodsky found in Argentina the plas-tic representation of one of the most important net-work-based movements that emerged at a time when speaking of networks was not a fad. With letters and colors, he aligns each of the many images with his pow-erful background as a historian.

Marcelo Brodsky is a photographer, artist and political activ-

ist from Argentina. In 2008, he received the Premio de Dere-

chos Humanos, granted by the B’nai B’rith Argentina. In 2014,

Brodsky founded Visual Action, a digital platform dedicated to

incorporate visual culture into human rights campaigns.

En Argentina, en la documentación de los movimientos libertarios de 1968, la representación plástica del que fue uno de los más importantes movimientos en red de una época en la que no se hablaba de redes. Marcelo Brodsky alinea, con sus letras y colores, cada una de las diversas imágenes con la fuerza del historiador que es el artista.

Marcelo Brodsky es fotógrafo, artista y activista político

argentino. En 2008, recibió el Premio de Derechos Humanos

otorgado por la organización B’nai B’rith Argentina. En 2014,

fundó Visual Action, plataforma digital dedicada a incorporar

la cultura visual en campañas de derechos humanos.

Paris, 1968, 2014

fotografia de arquivo de © Manuel Bidermanas, 1968,

intervenção à mão por Marcelo Brodsky, 2014

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[texto original em espanhol]

Querido Iatã,

Estive com o Claudi na Guatemala e mostrei a ele o meu recente trabalho sobre 1968 em diferentes capitais do mundo e suas ideias, com fotos de arquivo – cujos direi-tos negociei com os fotógrafos ou suas famílias – nas quais fiz intervenções à mão com textos.

Elas seguem anexas para que você as considere para a exposição, por sugestão do Claudi. Faltando dois anos para 2018, quando serão lembrados os 50 anos de 1968, acredito que este seja o momento ideal para discutir as ideias desse movimento na América Latina, especial-mente agora que está vindo uma onda de direita em todo o mundo e que a repressão está sendo incentivada após os atentados que sofremos em Paris.

Em 1968, as ideias que foram levantadas eram as mes-mas debatidas até hoje, ideias que marcaram diversas gerações e influenciaram poderosamente a transforma-ção da sociedade.

De Paris a México, de Praga a Córdoba, de São Paulo a Santiago do Chile, de Washington a Bogotá, os jovens

do mundo se manifestam exigindo mais liberdade de expressão e ainda outras liberdades: de sonhar, de amar livremente, de imaginar um mundo melhor, de abrir as comportas do pensamento e de ir para a ação.

Muitos dos lemas propostos em 1968 foram se transfor-mando em realidade em algumas sociedades. Segue-se lutando por outros. Enquanto a luta pelos direitos indivi-duais e sociais continua, de alguma forma somos todos filhos das mobilizações de 1968.

A imaginação ao poder, os mesmos direitos para todas as raças e todos os gêneros, a liberdade individual – o que então parecia um sonho impossível hoje está ao al-cance das mãos… “O pessoal é político”, voltam a ecoar aqui as palavras de 1968. Nicolás Casullo disse que tal-vez os jovens do Maio Francês não tenham inventado novas ideias, mas sim novos modos de viver e sentir ideais herdados. No tocante às novas sensibilidades éticas e políticas que aquelas gerações inventaram, é difícil encontrar – se quisermos caracterizar as áreas mais relevantes da produção artística atual – um campo de referências que seja hoje mais vivo e determinante. Marcelo Brodsky

1968, o Fogo das Ideias –

Marcelo Brodsky | Argentina

A manipulação dos sais de prata

USP, SP, 1968, 2014

fotografia de arquivo de © Marcelo Brodsky, 2002,

intervenção à mão pelo autor, 2014

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Arquivo Fototeca Nacional de México –

Mayra Mendoza (pesquisadora) | México

Uma nova forma de olhar velhos arquivos

Se o mítico sombreiro mexicano é o ícone mundial do país, transitando entre a representação da alegria e da violência, na pesquisa de Mayra Mendoza fica evidente a construção desse discurso na encenação fotográfica fora dos riscos da guerra, instrumento comum na produção contemporânea. Ou seja: nada disso é acidental.

Sistema Nacional de Fototecas (Sinafo), instituição mexicana que reúne mais de trinta fototecas que, juntas, contêm mais de 3 milhões de imagens, de mais de 2 mil autores, em coleções públicas e privadas. Criado em 1993, o Sinafo tem como principal missão resguardar, conservar, catalogar, digitalizar e difundir o patrimônio fotográfico do México.

Mayra Mendoza, pesquisadora e curadora mexicana, é subdiretora da Fototeca Nacional do Instituto Nacional de Antropologia

e História (Inah), no México. É coautora dos livros Hugo Brehme y la Revolución Mexicana e Imágenes de Cámara: Identifica-

ción y Preservación.

While the mythical Mexican hat is the country’s world-fa-mous icon which embodies feelings ranging from joy to violence, Mayra Mendonza evidences in her research the construction of such speech in the photographic representation out of the risky boundaries of the war, a common instrument in the contemporary output. That is: none of this is accidental.

Sistema Nacional de Fototecas (Sinafo), a Mexican institution gathering over thirty photo libraries. Altogeth-er, they have over 3 million images made by more than 2 thousand photographers kept in public and private collections. Created in 1993, Sinafo’s main mission is to protect, preserve, catalog, digitize and disseminate Mexico’s photographic heritage.

Mayra Mendoza Avilés, Mexican researcher and curator, is

deputy director with Fototeca Nacional at the Instituto Nacional

de Antropología e Historia (INAH), in Mexico. She co-authored

the books Hugo Brehme y la Revolución Mexicana and Imá-

genes de Cámara: Identificación y Preservación.

Si el mítico sombrero mexicano es el icono mundial del país, transitando entre la representación de la alegría y la violencia, en la investigación de Mayra Mendoza queda evidente la construcción de ese discurso en la puesta en escena fotográfica sin los riesgos de la guerra, ins-trumento común en la producción contemporánea. Es decir: nada de eso es accidental.

Sistema Nacional de Fototecas (Sinafo), institución mexicana que reúne más de treinta fototecas, que juntas contienen más de 3 millones de imágenes, de más de 2 mil autores, en colecciones públicas y privadas. Creado en 1993, Sinafo tiene como principal misión resguardar, conservar, catalogar, digitalizar y difundir el patrimonio fotográfico de México.

Mayra Mendoza Avilés, investigadora y curadora mexicana,

es subdirectora de la Fototeca Nacional del Instituto Nacional

de Antropología e Historia (INAH), en México. Es coautora de

los libros Hugo Brehme y la Revolución Mexicana e Imágenes

de Cámara: Identificación y Preservación.

Manuel Mondragón y Felix Díaz Preparan Ataque a la Ciudadela,

México, 1913, Eduardo Melhado

©Secretaria de Cultura.Nah.Sinafo.FN.México

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[texto original em espanhol]

Muito boa tarde do México, Segue o texto que tive muita dificuldade para resumir em uma lauda, são quase duas.

Atenciosamente,Mayra Mendoza

Formas de representação: o retrato individual po-sado e a encenação coletiva durante o período revolucionário no acervo da Fototeca Nacional do México Não é novidade afirmar que a Revolução Mexicana (1910-1920) foi um acontecimento bélico que teve ampla cobertura da imprensa da época em diversas regiões do país, e que o acompanhamento das notícias foi além das fronteiras do México, não somente para os Estados Uni-dos, como também para diversos países do continente europeu. A iconografia do acontecimento que circulou em nível geral dentro e fora do país durante a segunda metade do século XX é, em grande medida, herdeira da chamada história oficial, nutrida, por sua vez, da proposta editorial de Gustavo Casasola, filho de Agustín Víctor Casasola, fundador de uma emblemática agência de fotografia na segunda década desse século – que, por volta dos anos 1960, se tornou uma indústria visual. Entretanto, o último decênio do século XX testemunhou o surgimento da foto-história: pesquisa desenvolvida a partir da fotografia como fonte documental. Em razão do centenário da Revolução Mexicana, em 2010, foram se somando ao panteão de autores, encabeçado pelo sobrenome Casasola, mais de 30 nomes envolvidos nessa produção fotográfica. Novas imagens refresca-ram o contexto editorial e de exibição com fins comemo-rativos, resgatadas da imprensa ilustrada da época ou que haviam circulado de mão em mão em impressões realizadas em papel fotográfico ou em postais, enquanto outras haviam permanecido entorpecidas em coleções públicas e privadas. Em termos gerais, por meio das imagens desse período revolucionário é possível observar os momentos prévios

ou posteriores às batalhas, com numerosas cenas em que os retratados percebem a presença da câmera, algu-mas vezes até posando para ela, enquanto são escassas as imagens feitas por fotógrafos mexicanos ou residen-tes no país que puderam permanecer na linha de fogo com a câmera em mãos para deixar um testemunho dos acontecimentos bélicos. No âmbito mundial, a fotografia de guerra apresentava características formais similares, apesar de avanços técnicos que implicavam a transição no uso da placa seca de gelatina para a de nitrocelulose e o uso de câmeras mais leves e menos volumosas. É no retrato que os fotógrafos mexicanos capturam espa-ços que permitem oferecer um testemunho fidedigno dos sujeitos atuantes e, em menor medida, incluem tecidos improvisados ao modo de ciclorama para cumprir os pa-drões de representação. O retrato individual ou de casal se destinou, em sua maioria, aos principais atores da revolu-ção: os chefes militares e os caudilhos, conforme o bando do qual o fotógrafo estivesse participando. Também há rostos outrora identificáveis que, com o tempo, perde-ram nome e sobrenome e, em menor medida, figuras cujo anonimato lhes conferiu uma carga simbólica a partir da tomada. Todas elas imagens visualmente poderosas. No tocante ao retrato coletivo, a chamada encenação en-volve não só uma preparação do espaço para a tomada, como também a utilização adequada da câmera e uma composição desejada que teve os seus adeptos desde o início do conflito armado. Estes contaram com o espaço, o tempo e as pessoas que fizeram parte da tomada. Apesar da montagem da cena, o valor documental da fotografia não foi questionado; a imagem, com a sua “evidente” carga de fidelidade, já era o testemunho da realidade visível. Um exemplo disso é a maior parte das encenações coletivas aqui apresentadas – que circularam na pós-revolução sob o selo do fotógrafo alemão Hugo Brehme, residente no México desde 1906 e cuja produção mais conhecida se centra no retrato de estudo e na paisagem do altipla-no mexicano. Todas essas encenações foram tomadas no local do conflito, mas sem os riscos inerentes à ação bélica, e não há desordem ou dramatismo; pelo contrário, são afáveis, aprazíveis e harmoniosas, composicional-mente mais próximas do estudo fotográfico. Imagens de guerra sem que nelas seja mostrado o conflito, mas as inscrições no verso, a cena e os personagens constatam sua veracidade, embora ainda existam muitas histórias a ser conhecidas e analisadas.

Arquivo Fototeca Nacional de México –

Mayra Mendoza (pesquisadora) | México

Uma nova forma de olhar velhos arquivos

Revolucionários, México, 1914, Sosa

©Secretaria de Cultura.Nah.Sinafo.FN.México

Mujeres en la Estación de Buenavista, México, 1912, Gerónimo Hernández

©Secretaria de Cultura.Nah.Sinafo.FN.México