arquitetura de museu

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    12 ARQTEXTO 1

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    Flvio Kiefer

    ARQUITETURA DE MUSEUS

    Em seu sentido lato, os museus so to antigos quanto a prpria histria da

    humanidade. Pode-se considerar que eles existem desde que o ser humano comeou

    a colecionar e guardar, para si ou seus deuses, objetos de valor em salas construdas

    especialmente para esse fim. A palavra museu tem origem antiga, provm do

    gregoMuseion, e significa santurio dos templos dedicados s musas, que recebem

    doaes, ex-votos, oferendas...1 . Entretanto, so as colees reais ou privadas,

    como a reunida no palcio dos Mdici2 , formadas a partir da Renascena, que vo

    constituir o ncleo inicial dos museus nacionais no sculo XVIII. Tambm no

    Renascimento que se desenvolve, ainda, uma verdadeira paixo pelosgabinetesde curiosidades ou cmaras de maravilhas, onde so amontoados objetos

    exticos trazidos por exploradores: animais, objetos ou obras raras, fabulosas ou

    inslitas.3 Esboa-se, assim, a diviso que se far notar mais adiante entre as

    artes e as curiosidades, duas direes a partir das quais surgiro, a seu tempo, o

    museu de belas-artes e o museu de histria natural.4

    Se o Palcio Mdici pode ser considerado o primeiro museu privado

    da Europa, pela quantidade de objetos e pela ornamentao ostensiva, o

    primeiro espao dedicado exclusivamente s artes, desvinculado do objetivo

    decorativo, surge em Florena, no ltimo quartel do sculo XVI, quandoFranois I resolve aproveitar o ltimo andar de seu edifcio de escritrios,

    que servia de passagem, como um grande corredor a unir diferentes palcios,

    para reunir toda a sua grande coleo de obras de arte que antes se

    encontrava espalhada por diversos lugares. O nome adotado para esse

    espao, galerie, acabou, com o tempo, tornando-se sinnimo de sala

    reservada para as colees de arte e a Galerie des Uffizi uma referncia

    importante para a construo de um imaginrio burgus de prestgio e

    importncia. Os burgueses vo considerar, no perodo revolucionrio, de

    fundamental importncia a abertura de museus pblicos nos moldes da

    famosa galeria.Os prprios reis, antes disso, j haviam se preocupado em imitar o

    gesto de Franois I, organizando suas colees em alas de seus prprios

    palcios5 , o que acabou facilitando a tarefa de expropriao6 dos

    revolucionrios e a organizao dos primeiros museus pblicos do final do

    sculo XVIII. Na verdade, lembra-nos Pevsner, nem to pblicos assim, j

    que havia uma srie de limitaes e dificuldades que restringiam o acesso

    aos museus de grande parte da populao, diferentemente do que vai

    acontecer no sculo XX, quando os museus, de fato, tornam-se um fen-

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    meno de massas7 .

    O final do sculo XVIII, quando nascem os primeiros museus, foi

    uma poca de mudanas importantes. Esse perodo, chamado de Era da

    Razo por Gombrich8 , destri todas as certezas acumuladas pela tradio

    barroca e rococ. o incio, para Alan Colquhoun9 , da diviso entre

    cincia e arte. Na arquitetura isso vai significar a perda da autolegitimao

    do estilo clssico. Todos os estilos histricos passam a ter validade. Poroutro lado, renasce com fora a idia de busca e recuperao do verdadeiro

    estilo grego em substituio ao que foi considerado grosseira deturpao

    do estilo clssico que vinha ocorrendo desde a Renascena. Nascia assim

    um novo estilo clssico ou neoclssico.

    Para a arquitetura, a aceitao de uma razo natural para justificar

    a arquitetura clssica d lugar a um racionalismo pragmtico, que a

    desvincula de uma idia de verdade universal. O conceito de composio

    a partir de elementos que se encontram disposio do arquiteto, ofereci-

    dos pela histria da arquitetura, a chave, nos ensina Colquhoun, para o

    entendimento do pensamento arquitetnico no final do sculo XVIII. E J.N.L. Durand que vai se tornar o principal propagador dessas idias ao

    escrever o livro Prcis des leons darchitecture. Esse tratado ou manual

    de arquitetura teve vrias edies e tradues que se espalharam por toda

    a Europa no incio do sculo XIX.

    Desde pelo menos a Roma Antiga, os arquitetos dedicam-se a dar

    receitas escritas de como fazer a boa arquitetura. A simples leitura dos

    principais tratados de cada poca, ou o significado de sua ausncia, do

    uma boa medida da evoluo ou transformao por que passou a

    arquitetura. Evidentemente Vitrvio10 , que escreveu o primeiro desses tra-

    tados de que se tem notcia, no se dedicou aos museus porque essessimplesmente no existiam. s no livro de Durand11 , que os museus

    ganham um verbete com alguns desenhos. Segundo ele, os museus deveriam

    ser erigidos dentro do mesmo esprito das bibliotecas, ou seja, um edifcio

    que guarda um tesouro pblico e que , ao mesmo tempo, um templo

    consagrado aos estudos.

    importante ressaltar essa associao com as bibliotecas, porque

    ela d a justa medida do carter educativo que predominava nos primeiros

    museus. Maurice Besset12 lembra que os museus vieram a substituir as

    catedrais na funo de bblia pauperum, dentro da idia jacobina de que

    a viso do Belo conduziria idia do Bem. Mas essa funo educativatambm era muito mais literal, pois os museus eram verdadeiras escolas

    onde os aprendizes montavam seus atelis e passavam o dia todo em

    frente das telas que deveriam copiar (fig.1). o que se v no projeto de

    Durand, exemplificando o verbete museus, em Prcis des leons

    darchitecture, em que, ao longo das galerias de exposio, distribui-se

    uma infinidade de cabinets des artistes assinalados com a letra G na

    planta baixa (fig. 2 ).

    Essas duas maneiras de ver os museus, como templo guardio de

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    tesouros sagrados ou como escola, vo estar presentes, de alguma forma,

    em todos os projetos de seus novos edifcios. Uma v a arte como fruto de

    uma essncia atemporal, e a outra como de feitos histricos perfeitamente

    determinados. A forma de panteon, circular e monumental, vai responder

    aos anseios da primeira viso; as galerias, seqenciando a visita, vo

    responder segunda.

    Em a Arte de projetar em arquitetura, um dos poucos livros dapoca moderna onde se encontra, segundo seu autor Neufert13 , tudo

    que essencial para projetar e construir, o verbete museus, curiosamente

    ainda inserido entre escolas de arte e bibliotecas, resume-se a questes

    funcionais extremamente especficas:

    1. Proteger as obras contra a destruio, o roubo, o fogo, a umi-

    dade, a secura, o sol e o p, e (...) mostr-las com a luz mais favorvel(...)

    Alm disso, Neufert recomenda salas espaosas, faz algumas con-

    sideraes sobre ngulos visuais e, o que mais interessante, pois mostra

    a grande mudana conceitual do museu modernista, prescreve para cada

    parede, um nico quadro. A parede do museu deixa de ter realidadematerial, espessura que contm janelas, para se transformar em fundo

    neutro que ressalta objetos autnomos.

    MUSEUS NACIONAIS

    Apesar de os museus, em sua especificidade de colecionar e prote-

    ger objetos preciosos ou de interesse de indivduos ou da coletividade,

    serem to antigos quanto o prprio homem, eles, na verdade, so uma

    criao recente. Os museus, tal como os entendemos hoje em dia, nasce-

    ram apenas no sculo XVIII. Uma descontinuidade abrupta pode ser

    identificada, a inveno da cultura democrtica. O museu foi criadocomo um dos instrumentos que expunha, ao mesmo tempo, a decadncia

    e a tirania das velhas formas de controle, o ancien rgime e a utilidade

    pblica e democrtica do novo, a repblica.14

    As idias iluministas que vo desaguar na Revoluo Francesa so

    as mesmas que esto por trs da criao dos primeiros museus. Os Museus

    Nacionais, criados em resposta crescente demanda de participao nos

    negcios do estado por uma burguesia ascendente, encontram na tipologia

    dos palcios sua primeira forma de expresso arquitetnica. Muitas vezes,

    verdade, os prprios palcios, sedes das monarquias, foram transformados

    em museus. O exemplo mais notrio, o caso do Museu do Louvre, emParis, que ocupou parte do palcio do governo, em 1793, pouco depois,

    portanto, da Revoluo Francesa.

    Desde que Franois I reuniu sua grande coleo de obras de arte

    na Galerie desUffizi, essa passou a ser uma referncia para os amantes e

    interessados em arte. natural que os primeiros museus burgueses se

    inspirassem em seus antepassados poderosos e procurassem apoderar-se

    das grandes galerias dos palcios para organizar as colees pblicas.

    Na Inglaterra, a coroa inglesa, antecipando-se aos ventos

    1

    The Sheakespeare Gallery, George Dance, 1789. Observar ocarter de ateli de trabalho dos estudantes de pintura.SOANE, John. Architectural Monographs. London: Academy Editions, 1983.

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    revolucionrios, propiciou uma histria singular para o museu considerado

    como o mais antigo do mundo. SirHans Sloane, mdico e colecionador,

    resolveu vender a baixo custo sua grande coleo de objetos e obras de

    arte, uma verdadeira miscelnea, Coroa inglesa, com o intuito de ser

    conservada para uso e aperfeioamento das artes e cincias e benefcio

    da humanidade15 . A proposta de criao, nesses termos, do Museu Bri-

    tnico foi viabilizada e aprovada pelo parlamento ingls em 1753. A sedeencontrada para ele foi uma residncia particular em Montagu House, o

    que lhe deu um carter essencialmente privado, apesar de ser uma propri-

    edade pblica, no o caracterizando muito diferentemente de seus prede-

    cessores, os antigos cabinets de curiosits. A fundao do Museu Britni-

    co uma exceo em termos de arquitetura. Os recm criados museus

    passaram a ocupar edifcios pblicos existentes, de preferncia os palcios

    que se encontravam recheados de obras de arte. Os projetos de museus

    ideais, criados sob o signo do utilitarismo dominante na virada do sculo,

    vo demorar a se viabilizar materialmente. No que interessa aqui nesse

    estudo, o Museu Britnico s vai se constituir como um verdadeiro MuseuNacional quando SirRobert Smirke desenha e comea a construir sua

    nova sede, ocupando o mesmo terreno da antiga residncia, em 1823.

    Os primeiros projetos de museus so apenas intenes tericas sem

    qualquer vnculo com encomendas efetivas. Entre os principais tericos

    est a figura de tienne-Louis Boulle (Paris, 1728-1799) que, segundo

    Emil Kaufmann, figura-chave para o entendimento da arquitetura da

    poca da formao dos museus nacionais16 . Em seu livro Arquitectura.

    Ensayo sobre el arte17 , alm de abordar a relao da arquitetura com a

    arte, Boulle apresenta modelos de projetos para os mais diversos fins.

    Sintoma de um programa ainda no bem dominado, o projeto de museudo seu livro (fig. 3 ) o nico que no vem com uma descrio detalhada,

    como os demais, sobre seu carter e programa. O museu de Boulle tem

    uma escala gigantesca, organizado com quatro eixos de simetria espe-

    cular e no d a menor indicao de que tipo de obras abrigaria ou de

    como essas seriam expostas nesses imensos espaos praticamente com-

    postos por colunas e cobertura.

    Se em 1783, ano em que Boulle desenhou esse projeto de museu,

    estas instituies ainda no tinham tradio suficiente para gerar um

    conhecimento sobre suas necessidades programticas, por outro lado, como

    fica evidente pelo livro de Boulle, atraam os arquitetos pela importnciaque estavam tendo na sociedade do final do sculo XVII.

    Durand, em Prcis des leons drchitecture18 , editado em 1819,

    define com muito mais preciso os museus a partir de uma comparao s

    bibliotecas, que so por um lado, como um tesouro pblico encerrando o

    depsito mais precioso, o do conhecimento humano; de outro, como um

    templo consagrado ao estudo. Tal edifcio deve ento ser disposto de maneira

    que reine nele a maior segurana e a maior calma19. Mas enquanto as

    bibliotecas guardam o mesmo tipo de objeto, os museus mesmo os

    2

    Projeto para um museu genrico de J.N.L.Durand, 1803.SEARING, Helen. New American Art Museums. Nova York: Whitney Museum of American

    Art, 19 82.

    3

    E.L. Boule, projeto de um museu, 1783.SEARING, Helen. New American Art Museums. Nova York: Whitney Museum of American Art, 1982.

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    destinados unicamente a abrigar as produes das artes, se contm objetos

    de diferentes espcies e so compostos de partes destinadas a estudos

    diferentes, devem, para que a calma que deve reinar em cada uma delas

    no seja quebrada, oferecer, alm da entrada principal, tantas entradas

    particulares quanto as partes distintas que contenha20 (fig. 2). As grandes

    cidades, achava Durand, podem ter muitos museus destinados a abrigar

    objetos os mais raros produzidos pela natureza e as obras mestras dasartes. Nas cidades menores, aconselha reunir tudo num mesmo edifcio,

    inclusive a biblioteca.

    O Museu do Louvre , de fato, em 1793, o primeiro Museu Nacio-

    nal da histria ocidental e ganha, como sede, parte do palcio real do

    Louvre. Inaugurado pelos revolucionrios franceses como Museu Central,

    com Napoleo, que chegou a batiz-lo com seu prprio nome e tinha a

    pretenso de transform-lo num museu continental, que o Louvre vai sofrer

    um grande impulso. Sua sede, o Palcio do Louvre, tem uma histria que

    remonta Idade Mdia, mas o edifcio que hoje abriga o museu comeou

    a ser construdo em 1546, quando Francisco I mandou demolir o velhopalcio medieval e deu incio a uma srie infindvel de obras, reformas e

    ampliaes, que a rigor, foi concluda muito recentemente, quando I.M.

    Pei projetou uma grande reforma modernizadora. Nesta jornada de cinco

    sculos, arquitetos de renome como Pierre Lescot, Mansard, Perrault e Pei,

    alm de Bernini, que fez um projeto no aproveitado para a fachada prin-

    cipal do Louvre, estiveram ligados histria desse edifcio. A importncia

    de seu acervo, rapidamente aumentado com as pilhagens de Napoleo, e

    a magnitude de suas instalaes, alm de sua privilegiada localizao em

    pleno centro de Paris, fez com que esse museu se tornasse uma referncia

    permanente para todos os museus que foram abrindo suas portas desdeento, desbancando, nesse papel, a Galerie des Uffizi.

    Um dos primeiros museus pblicos que se inspirou no Louvre foi o

    Museu del Prado, em 1819, em Madrid, Espanha. Inicialmente foi chamado

    de Museu Real de Pinturas. Como o museu francs, foi fruto de um efmero

    governo republicano ou de um bisonho governo revolucionrio21.

    Projetado inicialmente pelo arquiteto Juan Villanueva para ser o Museu

    Real de Cincias Naturais, terminou, ainda inacabado, sendo ocupado

    pelas tropas napolenicas, que o deixaram em runas, utilizando at mesmo

    o chumbo dos telhados para fazer balas. Antonio Lpez Aguado, discpulo

    de Villanueva, encarregou-se de concluir o edifcio para a nova funo demuseu de arte. Mas, assim como o Louvre, esse museu tambm estava

    destinado a sofrer sucessivas reformas e adaptaes. Alis, por causa do

    crescimento constante dos acervos, essa uma marca de quase todo museu

    que se conhece. O edifcio original estava estruturado em trs corpos

    principais que formavam o vestbulo, a baslica e o palcio.

    A organizao das salas en suite, tpica dos palcios, convinha

    muito bem aos Museus Nacionais, j que a sucesso de grandes salas

    interligadas que caracterizavam essas edificaes era adequada para a

    4

    Glyptothek de Munique, Leo von Klenze, 1816-1830 e JosefWiedemann, 1967-1972.SEARING, Helen. New American Art Museums. Nova York: Whitney Museum of American

    Art, 19 82.

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    exposio de telas e de todo tipo de objeto que os museus de ento

    abrigavam. Alm disso, a tradicional segurana com que esses edifcios j

    contavam, garantia o controle dos tesouros que abrigavam. Mas, como

    vimos, esse no foi o nico motivo. A questo poltica e de propaganda

    tambm pesou muito. A imagem de edifcio importante, j sacramentada

    na populao, respondia com eficincia necessidade de mostrar que ali

    estavam guardadas as riquezas da nao e que essas estavam ao alcancede todos. No deixava de ser uma forma de permitir que a burguesia vida

    de poder pudesse, enfim, tomar posse dos palcios, ainda que de forma

    simblica.

    As lies de Durand vo ser usadas por Leo von Klenze (1784-

    1864) na Glyptothek de Munique (fig. 4). Helen Searing diz que essa obra

    demonstra a persuaso internacional dos paradigmas de Durand, devido,

    sem dvida, oportunidade que eles ofereciam a uma interpretao

    individual e flexibilidade com que podiam ser realizados pela combinao

    de diferentes aspectos de muitos projetos22. Klenze eliminou por completo

    qualquer tipo de espao secundrio, organizando todas as salas ensuite.As rotundas recebem luz zenital, enquanto as galerias recebem luz atravs

    de janelas que abrem para o ptio interno. Na fachada, h um interessante

    jogo de colunata e fronto grego para marcar de forma imponente o acesso

    e os nichos das falsas janelas de carter renascentista.

    Muito mais prximo dos ensinamentos de Durand, ou, como quer

    Helen Searing23 , uma variao livre desses ensinamentos, est o Altes

    Museum de Berlim (fig. 5) projetado por Karl Friedrich Schinkel (1781-

    1841) em 1823. Ao invs de vrias salas em forma de rotunda, como na

    Glyptothek, Schinkel, como Durand, projetou uma nica no centro

    geomtrico do edifcio, tornando-a, desconsiderada a colunata frontal,um verdadeiro clmax da composio. Schinkel no deixa transparecer

    exteriormente a presena dessa grande rotunda de p-direito triplo. Pelo

    contrrio, disfara-a com muros que formam um quadrado completo,

    ressaltado em seus vrtices pela estaturia, criando a impresso de um

    ptio interno.

    A frmula de museu-palcio conseguiu resultados significativos em

    termos urbanos e simblicos durante mais de um sculo, tendo por base os

    prottipos criados por Klenze e Schinkel24 , que permitiam tanto um circuito

    seqencial de visitao quanto o estabelecimento de subcircuitos

    independentes e especializados. Por outro lado, essa acomodao tipolgicafacilitou o aparecimento de problemas crnicos, como o amontoamento

    das salas e depsitos e uma dificuldade de comunicao com o pblico.

    As salas eram repletas de objetos apresentados, muitas vezes, sem nenhum

    comentrio.

    MUSEU MODERNISTA

    Maurice Besset25 aponta duas datas para o nascimento da arte

    moderna: 1912, com as pinturas de Picasso e Braque, quando a pintura

    5

    Altes Museum Berlin, Karl Friedrich Schinkel, 1823-30.SEARING, Helen. New American Art Museums. Nova York: Whitney Museum of American

    Art, 19 82.

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    deixa de ser uma relao perceptiva entre a imagem como fico e o

    espao como realidade; ou 1917, quando Duchamp expe um mictrio e

    a arte deixa de ser uma relao entre o objeto e o espao que o contm

    para criar uma nova relao entre artista-museu-expectador. Duchamp

    chega a dizer que o pblico e a instituio museu que fazem a arte, e

    no o artista. No entanto, as idias modernistas na arquitetura de museus

    s vo aparecer em forma de projeto no segundo quartel do sculo XX,quando Le Corbusier projeta para os arredores de Paris o Museu Sem Fim

    (fig. 6). O questionamento aos museus nacionais j vinha ocorrendo desde

    o final do sculo XIX quando os movimentos de vanguarda passaram a

    chamar os velhos museus de necrpole da arte em seus inflamados

    manifestos e panfletos modernistas, pela sua imagem de lugar conservador

    que abriga a arte oficial26.

    Lcio Costa, em viagem pela Europa em 1926, no deixa dvidas

    sobre a m impresso que os Museus Nacionais causavam na sensibilidade

    de um modernista quando faz a descrio do Museu do Louvre em uma

    carta para sua me:Levei dias para me aclimatar com o Louvre. Que mundo, que

    inestimvel tesouro. Pena ser to francamente museu - prefiro apreciar as

    obras de arte em palcios ou antigos hotis. menos catalogado, menos

    arrumado, empilhado. Por maior que seja o prazer que se tenha de ver

    cada quadro de per si, o conjunto, assim em massa, amontoado, cansa,

    aborrece. A vizinhana destri, a quantidade desvaloriza... E os velhos

    guardas que se arrastam naquela atmosfera de catacumba, de coisa

    morta...27

    Crticas mais isentas de emoes tambm os apontavam como

    lugares cansativos, pesados e meramente instrutivos - no mau sentidopedaggico da palavra. A crise das sucessivas guerras, retardando a

    realizao de novos edifcios para os museus, fez com que os arquitetos

    entrassem tardiamente na discusso dessas questes. O revolucionrio

    projeto do Museu Sem Fim, de Le Corbusier, em forma de uma espiral

    quadrada que podia crescer indefinidamente, s foi idealizado em 1931:

    Deixe eu lhes trazer minha contribuio idia de criao de um museu

    de arte moderna em Paris. No um projeto de museu que eu lhes dou

    aqui, no mesmo. um meio de conseguir construir, em Paris, um museu

    em condies que no sejam arbitrrias, mas, ao contrrio, que sigam as

    leis naturais do crescimento, de acordo com a ordem que a vida orgnicamanifesta: um elemento sendo suscetvel de se juntar idia de harmonia,

    idia da parte. (...) O museu no tem fachada; o visitante nunca ver

    fachadas; ele somente ver o interior do museu. Porque ele entra no cora-

    o do museu por um subterrneo (...) O museu expansvel vontade:

    sua planta uma espiral; verdadeira forma de crescimento harmoniosa e

    regular.28 O Museu Sem Fim jamais foi construdo.

    Em 1943, Wright deu incio ao projeto do museu Guggenheim em

    Nova York (fig.7), adotando uma idia parecida, que transforma a proposta

    7

    Frank Lloyd Wright, Museu Guggenheim, Nova York. Desenho de 1951.SEARING, Helen. New American Art Museums. Nova York: Whitney Museum of American

    Art, 19 82.

    6

    Le Corbusier, Maquete do "Muse de la Connaissance" ou "MuseuSem Fim", Saint Die, Paris, 1939.Arquitetura na Bienal de So Paulo. So Paulo: Edies Americanasde Arte e Arquitetura, 1 952 .

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    de Le Corbusier em uma espiral curva e ascendente, girando em torno de

    um grande vazio banhado pela luz natural. Bruce Brooks Pfeiffer levanta a

    discusso, na qual no vamos entrar aqui, de que Wright j carregava

    desde 1924, quando projetou um acesso a uma montanha em Maryland,

    a idia de um sistema de espirais e que, em 1929, teria se correspondido

    com empreendedores franceses - sem comprovao admite Pfeiffer - para

    a construo de um museu em solo francs adotando esse sistema. Oprojeto do Guggenheim teve as obras iniciadas apenas em 1955 e foi

    concludo em 1959. Nesse longo perodo, Wright desenvolveu vrias verses

    do projeto, at chegar ao que seria construdo. Wright manteve sempre

    firme a idia de que um museu deve ser extenso, contnuo e bem

    proporcionado, desde o nvel inferior at o superior; que uma cadeira de

    rodas possa percorr-lo, subir, baixar e atravess-lo em todas as direes.

    Sem interrupo alguma e com suas sees gloriosamente iluminadas

    internamente desde cima, de maneira apropriada a cada grupo de pinturas

    ou a cada quadro individual, segundo se queira classific-los.29

    Entretanto, apesar de se pretender funcionalista e a epgrafe a for-ma segue a funo ser muito comum nesse perodo, a arquitetura moder-

    na nunca teve uma relao pacfica com as questes funcionais.

    Com o museu Guggenheim no foi diferente: a par da preocupa-

    o expressa por seu arquiteto, sua funcionalidade foi severamente criticada

    desde sua inaugurao, tanto pela obrigatria linearidade de qualquer

    exposio quanto pela dificuldade de exposio de obras de grande tama-

    nho. Com a ampliao empreendida por Gwathmey entre 1982 e 1992,

    esses problemas deixaram de ser crticos e os valores da arquitetura de

    Wright, hoje reverenciada pela mdia americana, sobrepujam qualquer

    dificuldade que ainda persista.Outro museu moderno digno de nota a Fundao Maeght

    (fig. 8), construdo entre 1959 e 1964, na costa azul francesa. Sert mostrou,

    nesse projeto, toda a possibilidade do concreto armado para potencializar

    a iluminao e ventilao dos museus. O concreto deixado vista, com as

    marcas das formas, assume desenhos no comuns com seus sucessivos

    sheds em curva, criando um novo elemento de arquitetura que poderia se

    constituir em uma nova tipologia de coberturas de museus. Walter Gropius

    vai utilizar esse mesmo elemento de arquitetura criado por Sert para a

    cobertura dos Arquivos da Bauhaus (fig. 9), em 1979. O prprio Sert

    voltou a utilizar esse mesmo elemento de cobertura na Fundao Mir (fig.10), tornando-o um dos poucos elementos repetitivos na arquitetura mo-

    dernista.

    Poucos arquitetos tm tanta capacidade de estar em dia com as

    correntes mais em voga da arquitetura como Philip Johnson. Atuante

    incentivador das vanguardas, foi ao mesmo tempo discpulo e promotor

    de Mies van der Rohe e de sucessivas geraes de arquitetos e arquiteturas.

    O seu Projeto para a Kunsthalle (fig. 11), na Alemanha, por isso mesmo,

    pode ser visto como expoente das ambies da arquitetura da poca:

    8

    Sert, Fundao Maeght(1964), Nice, Frana.Figura da INTERNET, endereo www.maeght.fr

    9

    Walter Gropius, arquivos da Bauhaus (1979), Berlin, Alemanha.KLOTZ, Heinrich e KRASE, Waltraud. New Building in the Federal Republic of Germany.

    Stuttgart: Goethe Institute, 1988.

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    transparncia, continuidade espacial entre salas e circulaes, explicitao

    da estrutura e descontextualizao urbana.

    Tambm explorando o concreto vista, Reidy, em 1954, cria no

    Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro um grande salo de 26 x 130m

    livre de pilares e com perfeito controle da iluminao natural e artificial

    (fig. 12). Lina Bo Bardi, em 1957, dentro do mesmo esprito e em funo

    de peculiaridades do stio, projeta um vo de 70m para o Museu de ArteModerna de So Paulo (fig. 13). Esses dois museus tiveram imediato

    reconhecimento internacional, tendo seus projetos sido publicados em

    revistas como LArchitettura, Guided tour of the great museums, Bauten

    und projekte. Tambm Bruno Zevi, respeitado crtico internacional de

    arquitetura, escreveu um artigo sobre o projeto do MASP para o jornal

    LExpresso em 27 de maio de1973.

    Uma alterao importante na forma do museu modernista vai ser a

    simplificao de seus espaos internos. As circulaes e as salas de exposio

    se integram num continuum espacial. A fluidez e transparncia so as

    marcas dos museus desse perodo. Fluidez e transparncia que a maiorparte das vezes inclui tambm os espaos exteriores desses edifcios (fig.

    14).

    Mas no era apenas a forma do museu que estava mudando, havia

    toda uma nova conceituao por trs desses projetos. Os museus agora

    eram projetados para serem lugares agradveis de ficar at mesmo

    independentemente de seus motivos-objeto, o acervo exposto. Para isso

    foram agregados novos servios como restaurantes, lojas, parques e jardins,

    alm de outras facilidades e, mais do que tudo, em contraposio ao

    museu antigo, muita luz natural iluminando amplas circulaes e grandes

    espaos de exposio muito mais integrados e fluidos. A grande novidadefoi o uso do concreto armado, que passou a ser utilizado em abundncia,

    propiciando solues estruturais inusitadas. A presena da estrutura, muitas

    vezes de forma crua e brutalista, assegurando a possibilidade de grandes

    plantas livres e propiciando o controle da iluminao natural, quase sempre

    porsheds, vai ser uma das grandes marcas desse perodo.

    Mas, apesar de tudo, muita coisa ainda permanecia igual.

    Montaner que aponta: Se verdade que as mudanas promovidas pelo

    movimento avant-garde na virada do sculo foram radicais e qualitativas,

    apenas uma pequena parte do seu trabalho - aquela dos dadastas,

    surrealistas, construtivistas, futuristas soviticos - rompeu com a relaotradicional entre pintura e espao. A maior parte do trabalho de Mondrian,

    Kandisky, Klee, Picasso e o resto, permaneceu dentro dos cnones conven-

    cionais que determinam o que um quadro. As mudanas mais radicais

    tm sido produzidas pelas vanguardas mais recentes. O seu tamanho,

    forma e caractersticas tm exigido a transformao do espao de exibio.

    Art brut, pop art, land art, minimalismo, videoarte, happenings,

    performances, instalaes e tantos outros meios artsticos, mais ou menos

    interativos ou efmeros, comearam a ditar suas prprias leis, que deve-

    10

    Sert, Jackson e Associados, Fundao Joan Mir, 1975, Barcelona.Corte tpico, mostrando a valorizao da luz natural comoelemento de projeto.Fundao Joan Mir. Sert, Jackson e Associados. Reportaje Arquiyectnico. Barcelona:

    Fundaci Joan Mir.

    11

    Philip Johnson, Kunsthalle, Alemanha, 1966.KLOTZ, Heinrich e KRASE, Waltraud. New Building in the Federal Republic of Germany.

    Stuttgart: Goethe Institute, 1988.

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    riam guiar sua exposio em um museu. s vezes uma exibio especfica

    exige um espao especialmente constitudo. Outras vezes, o tamanho e o

    peso do trabalho obrigam o prdio a atender certas condies especiais de

    infra-estrutura. Quase invariavelmente exigido um espao com provises

    tecnolgicas sofisticadas. Resumindo, espaos destinados a abrigar traba-

    lhos de arte contempornea devem possuir certas qualidades cuidadosa-

    mente definidas, provavelmente incluindo flexibilidade, versatilidade e umalto nvel de tecnologia.30

    As novidades introduzidas pelas primeiras geraes de arquitetos

    modernos foram feitas de forma muito mais intuitiva do que cientfica.

    Todos esses exemplos pioneiros de renovao do mtodo de projetar mu-

    seus mostram a grande sensibilidade de seus arquitetos s novas necessi-

    dades surgidas em seu tempo, mas ainda no podemos creditar cincia

    museolgica as mudanas ocorridas. O Museu Sem Fim de Le Corbusier,

    o Guggenheim de Wright, a Fundao Maeght de Sert e muitos outros,

    foram elaborados mais com a sensibilidade e intuio de seus autores do

    que fundamentados em novos preceitos cientficos, j que, poca aindano tnhamos a cincia museolgica estruturada. Entretanto, esses mu-

    seus, ao se contraporem aos velhos museus, muito mais fechados e escu-

    ros, propiciaram a oportunidade de estudos comparativos e desenvolvi-

    mento da cincia museolgica.

    NOVOS MUSEUS

    Assim como a arte se modificou nos ltimos anos, a arquitetura

    tambm passou por um processo de reviso. Todos os dogmas modernistas,

    desde o grande vo at a verdade dos materiais, passaram por uma

    reavaliao conceitual importante. A arquitetura de museus modificou-sebastante. Os arquitetos de hoje, chamados ps-modernos, tm uma grande

    liberdade para propor as mais diferentes solues para seus projetos de

    museus, podendo incluir desde velhos princpios acadmicos at os mais

    audaciosos hightechs. O ponto comum, que une a linguagem de quase

    todos, a preocupao com a insero urbana e o predomnio das grandes

    circulaes internas. Uma referncia importante dessa terceira fase dos

    projetos de museus o trabalho de James Stirling para a Neue Staatsgalerie31

    em Stuttgart (fig. 15), na Alemanha. Esse projeto de 1977, inaugurado em

    1982, uma ampliao resolvida na forma de um anexo autnomo e tem

    uma planta que faz uma clara referncia ao Altes Museum (1823-1830) deSchinkel32 (fig. 5). Os espaos de exposio retomam os percursos em

    enfilade, considerados conservadores pelos modernistas. Por outro lado,

    os espaos de circulao, convivncia e servios no tm nada de

    conservadores. Pelo contrrio, abusam do ecletismo, das citaes, ironias

    e humores. Outro destaque sua insero na cidade: Stirling criou um

    museu que um verdadeiro caminho de ligao entre dois setores da

    cidade, reavaliando a relao da edificao com o urbano.

    Alm da nova atitude dos arquitetos, mais uma novidade contribuiu

    12

    Affonso Eduardo Reidy, Museu de Arte Moderna do Rio de JaneiroMAM - 1954.MAM, foto da maquete. Catlogo de apresentao do projeto, 1954. Centro de

    Documentao do MAM.

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    para modificar a maneira de projetar museus: a cincia museolgica. Nos

    anos 30, comeou a tomar corpo a necessidade de sistematizar os

    conhecimentos dispersos sobre a conservao de objetos em museus. Mas

    a partir do ano de 1950, com a criao do Instituto Internacional para a

    Conservao de Trabalhos Histricos e Artsticos (IIC), que se considera

    constituda a museologia como cincia. Entretanto, sua influncia sobre a

    maneira de projetar museus ainda demorou algumas dcadas para seconcretizar. Somente nos anos 80, com a onda renovadora de museus,

    que vo ser includas as demandas museolgicas cientificamente definidas.

    neste perodo que os museus deixam de ser simples galerias de exposio

    (mal iluminadas no perodo palaciano e exageradamente iluminadas no

    perodo modernista) e os arquitetos passam a enfrentar com muito mais

    rigor toda a complexidade do programa museu, deixando que se perceba,

    como aponta Corona Martinez, um certo paradoxo entre o discurso

    funcionalista dos verdadeiros modernistas e sua prtica.

    Entretanto, cabe ressaltar que, mesmo no tendo sido o resultado

    de um embate cientfico entre muselogos e arquitetos, os museus moder-nistas representaram a maior mudana j ocorrida na forma de projetar

    museus. Fazendo justia aos pioneiros do movimento moderno, a maior

    parte dos novos procedimentos j tinha sido lanada. Aqui mesmo no

    Brasil, no exemplo do MAM do Rio de Janeiro, projetado por Reidy no final

    da dcada de 50, podemos ver na memria de seu projeto toda a preocu-

    pao com iluminao natural e artificial, variedade de tipos de exposi-

    es e mesmo com o controle climtico. Este projeto alcanou um novo

    patamar referencial para os museus brasileiros. Mas a descontinuidade no

    processo de projetar e construir museus, entre ns, faz com que nossa

    atualizao se d aos saltos, depois de longos perodos de repetio deprocedimentos projetuais. O MAM foi, neste sentido, mais do que o MASP,

    o ltimo salto importante em matria de museus.

    Montaner, em seu livro Novos Museus33 , diz que a caracterstica

    predominante dos novos museus a complexidade do programa, a subs-

    tituio do espao flexvel pelas tradicionais salas e galerias, a excelncia

    dos mtodos de conservao, exibio e iluminao dos objetos e o papel

    urbano que assumem, como monumento e lugar de arte.

    Montaner classifica esses novos museus em alguns tipos bsicos:

    a - a grande caixa hightech, de forma prismtica, onde todas as

    funes so distribudas em seu interior homogneo. o caso do CentroCultural Georges Pompidou (1971-77), de Renzo Piano e Richard Rogers,

    e do Centro de Arte Contempornea de Nmes, de Norman Foster;

    b - a articulao, dentro de uma unidade muito clara, de elementos

    independentes que abrigam diferentes funes, como a Staatsgalerie em

    Stutgart, de James Stirling;

    c - a reciclagem de edifcios histricos ou mesmo de conjuntos de

    edifcios dos centros histricos das cidades, como a Gare dOrsay de Gae

    Aulenti em Paris;

    13

    Lina Bo Bardi, Museu de Arte de So Paulo - MASP - 1957.Masp - desenho feito por Lina Bo Bardi especialmente para a coleo O Mundo dos Museus.

    Rio de Janeiro: Codex, 1968.

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    d - os museus construdos em zonas rurais, que aproveitam a pos-

    sibilidade de disperso, como o Getty Center de Richard Meier, em Los

    Angeles.

    Pode-se acrescentar um quinto tipo, que a atualizao, atravs de

    reformas modernizadoras, muitas vezes superpostas ao longo da histria,

    dos prprios museus tradicionais. O exemplo mais notrio, depois do Museu

    do Louvre, o do Metropolitan de NovaYork.Em qualquer que seja a tipologia adotada, a soluo para a

    complexidade tcnica resultou, e a est uma das grandes novidades

    projetuais, na criao de espaosserventes34 cada vez mais complexos,

    quase sempre escondidos, como gigantescos poches, como no Kunst

    Museum de Bonn de Axel Schultes, ou em andares tcnicos nos entrepisos.

    Uma outra novidade o abandono da soluo estrutural, ou seja, a

    estrutura volta a ocupar o papel de coadjuvante na soluo construtiva do

    edifcio e deixa de ser o elemento de expresso preponderante.

    O Museu do Louvre, mais uma vez, passou a ser a principal

    referncia da revitalizao dos museus quando sofreu uma reformamodernizadora a partir de 1981, que o transformou no Grande Louvre

    doze anos depois. A reforma empreendida pelo arquiteto sino-americano

    I. M. Pei tornou gigantescas as j grandes instalaes desse museu. Partindo

    do princpio de que qualquer museu que se preze oferece 2m2 de rea de

    servio para cada m2 de sala de exposio, Pei aumentou espetacularmente

    a rea de recepo, dos 1.800m2 para 22.300m2, e dos servios tcnicos,

    que passaram de 24.200m2 para 77.200m2.

    A reciclagem da Gare DOrsay (fig. 16), em Paris, no um marco

    menos importante para a arquitetura dos anos 80. Ela significa uma nova

    atitude em relao aos centros histricos e seus edifcios representativos. Ademolio da antiga estao de trens j estava decidida e autorizada desde

    1970 para a construo de um grande hotel internacional, quando em

    1973, por uma nova sensibilidade em relao aos edifcios do sculo XIX,

    inventariada como bem dos monumentos histricos franceses. O governo

    francs, em vez de demolir a velha estao, decidiu, em 1979, empreender

    uma reciclagem desse edifcio, organizando um concurso de arquitetura

    para escolher o projeto de um museu dedicado ao sculo XIX. O projeto

    vencedor foi o de R. Bardon, P. Colboc e J. P. Philippon com a proposta de

    construo de um novo edifcio dentro do antigo. A arquiteta italiana Gae

    Aulenti foi convidada a integrar a equipe e acabou tendo um papelpreponderante no desenvolvimento do projeto.

    Esses so apenas alguns exemplos da grande febre de construo e

    reconstruo de museus que tomou conta dos pases mais ricos do mundo

    a partir dos anos 80. S a Frana tinha, em 1994, mais de 250 canteiros

    de obras simultneos. Os museus adquiriram uma nova importncia

    econmica e social, tornando-se uma das formas de cidades e pases se

    incorporarem nas rotas tursticas internacionais. Uma verdadeira disputa

    iniciou-se nesse setor. O exemplo mais notrio disso o Museu Guggenheim

    14

    Mies van der Rohe, Neue Nationalgalerie, 1965-1968, Berlin,Alemanha. Neste caso, o suporte tradicional, a parede,desapareceu completamente. Um pavimento em subsolo, semaberturas para o exterior, ameniza a radicalidade destaproposta.KLOTZ, Heinrich e KRASE, Waltraud. New Building in the Federal Republic of Germany.

    Stuttgart: Goethe Institute, 1988.

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    James Stirling e Michael Wilford, Neue Staatsgalerie, 1977-1982, Stuttgart, Alemanha.KLOTZ, Heinrich e KRASE, Waltraud. New Building in the Federal Republic of Germany. Stuttgart: Goethe Institute, 1988.

    16

    Gae Aulenti, Muse D'Orsay, 1980-1986. Paris, Frana.Aproveitando uma velha estao de trens desativada, este umdos melhores exemplos do reencontro da arquiteturacontempornea com a arquitetura histrica, apesar dodecorativismo exagerado de sua concepo, que oblitera, muitasvezes, as qualidades arquitetnicas do edifcio original.MONTANER, Josep Maria. Nouveaux Musees. Espaces pour lart et la culture. Barcelona:

    Gustavo Gili, 1990.

    de Bilbao, que colocou esta quase desconhecida cidade nas pginas da

    imprensa internacional. A conseqncia tem sido um grande fluxo tursti-

    co. Tambm Porto Alegre passou a experimentar a potencialidade desse

    fenmeno com a notcia de contratao de lvaro Siza para realizar o

    projeto da nova sede da Fundao Iber Camargo.

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    NOTAS

    1. GIRAUDY, Danile e BOUILHET, Henri.O museu e a vida. Porto Alegre: IEL, 1990.2. O Palcio Mdici, em Florena, considerado por muitos autores, segundo Eilean Hoper-Greenhill em Museums

    and shaping of knowledge, o primeiro museu privado da Europa.3. ENCICLOPDIA LAROUSSE CULTURAL, So Paulo: Universo, 1988.4. Id. ibid.5. No volume dedicado ao Museu do Louvre da coleoO mundo dos museus. Rio de Janeiro: Codex, 1967, conta-se que

    Catarina de Mdicis mandou erguer a Pequena Galeria chamada hoje Apolo e pensava em imitar a coleo dos Uffizino Palcio Pitti de Florena, pela unio, por meio de uma comprida galeria, do Palcio do Louvre e da residncia dasTulherias.

    6. Na maior parte das vezes, os prprios reis se anteciparam e tornaram pblicas as suas colees.7. PEVSNER, Nikolaus. Histria de las tipologias arquitetnicas. Barcelona: Gustavo Gili, 1979.8. GOMBRICH, E. H.A histria da arte. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.9. COLQUHOUN, Alan. Racionalismo: um conceito filosfico na arquitetura. Revista Gvea n.9, Rio de Janeiro: PUC, 1991.10. VITRUVIO, Marco Lucio. Los diez libros de arquitectura. Barcelona: Ibria, 1955.11. DURAND, J.N.L. Prcis des leons darchitecture. Fac-smile da edio de 1819, da Biblioteca de Munique.12. BESSET, Maurice.Obras, espacios, miradas. El museo en la historia del arte contemporneo. Madrid: Revista A&V, n.39,

    1993.13. NEUFERT, Ernest.Arte de proyectar en arquitectura. Barcelona: Gustavo Gili, 1948.14. HOOPER, Eilean - Greenhill.Museums and the shaping of knowledge. Londres: Routledge, 1995. Traduo do autor.15. MUSEU BRITNICO - LONDRES. Enciclopdia dos museus. So Paulo: Melhoramentos, 1967.16. Citao extrada da contracapa da edio espanhola do livro de Boulle.17. BOULLE, tienne-Louis. Arquitectura. Ensayo sobre el arte. Barcelona: Gustavo Gili, 1985.18. DURAND, J.N.L. Prcis des leons darchitecture. Fac-smile da edio de 1819, da Biblioteca de Munique.19. DURAND, op. cit. Traduo do autor.20. DURAND, op. cit. Traduo do autor.21. SERRALLER, Francisco Calvo.Breve histria del Museo del Prado. Madrid: Alianza, 1994.22. SEARING, Helen.New american art museums. Nova York: Whitney Museum of American Art, 1982. Traduo do autor23. Id. ibid.24. BESSET, Maurice. Obras, espacios, miradas. El museo en la historia del arte contemporneo. Madrid: Revista A&V, n.39,

    1993.

    25. Id. ibid.26. ENCICLOPDIA LAROUSSE CULTURAL. So Paulo: Universo, 1988.27. COSTA, Lcio. Registro de uma vivncia. So Paulo: Empresa das Artes, 1995.28. BOESIGER, Willy.Le Corbusier. Barcelona: Gustavo Gilli, 1976. Traduo do autor.29. PFEIFFER, Bruce Brooks et al. El Solomon R. Guggenheim Museum. Nova York: Guggenheim Museum Publications,

    1995. Traduo do autor.30. MONTANER, Josep Maria. New museums. New York: Princeton, 1990. Traduo do autor.31. KLOTZ, Heinrich e KRASE, Waltraud.New museum buildings in the Federal Republic of Germany. Stuttgart: Goethe Institute,

    1988.32. PEVSNER, Nikolaus. Historia de las tipologias arquitetonicas. Barcelonas: Gustavo Gili, 1979.33. MONTANER, Josep Maria. Nouveaux muses. Barcelona: Gustavo Gili, 1990.34. Expresso utilizada pelo arquiteto norte-americano Louis Khan para diferenciar os espaos-meio dos espaos-fim, por ele

    chamados de serventes e servidos, respectivamente.

    Flvio Kiefer

    Arquiteto FAU-UFRGS 1979.Especialista em Transportes Urbanos, Frana 1981.Mestre em Arquitetura PROPAR-UFRGS 1998.Professor de Projeto VI e membro da Comisso Coordenadora daFaculdade de Arquitetura Ritter dos Reis.Projetos premiados em concursos de arquitetura e bienais.Projetos e artigos publicados em jornais e revistas nacionais einternacionais.Scio-gerente da Kiefer Arquitetos S/C Ltda.