armazenamento refrigerado

9
Frutas do Brasil, 39 Maçã Pós-colheita 58 7 ARMAZENAMENTO REFRIGERADO Auri Brackmann César Luis Girardi Renar João Bender Osni Roberto Caron Filho INTRODUÇÃO As frutas são organismos vivos que utilizam substâncias de reserva no proces- so de respiração, sendo a intensidade res- piratória influenciada pela temperatura em que são mantidas. Temperaturas baixas retardam as alterações típicas do amadure- cimento, bem como a síntese de etileno (hormônio do amadurecimento) e o desen- volvimento de microrganismos (fungos). A rápida remoção do calor que a fruta traz do campo, através do pré-resfriamento, associada às condições ideais de conser- vação, são fatores importantes no prolon- ga-mento da vida útil das frutas. PRÉ-RESFRIAMENTO O pré-resfriamento é uma operação importante no processo de conservação de maçãs, devendo ser realizado logo após a colheita. Com o pré-resfriamento, a tem- peratura da polpa da fruta é baixada rapi- damente, reduzindo assim o processo res- piratório, a perda de água e, indiretamente, o desenvolvimento de podridões. O equi- pamento de refrigeração deverá ter condi- ções de manter constante a temperatura do meio refrigerante. Se essa condição não for satisfeita, as maçãs sairão do pré-resfri- amento com uma temperatura acima da programada. Havendo uma demora maior para atingir a temperatura de armazena- gem, ocorrerá um maior consumo de açú- cares e ácidos acumulados durante o de- senvolvimento das maçãs. O tempo gasto para atingir a tempe- ratura de armazenamento depende de fa- tores como capacidade de refrigeração, temperatura inicial das frutas, meio utili- zado para retirar o calor (água ou ar), temperatura desse meio, contato entre o meio e o produto a ser resfriado e velocida- de do produto ao passar pelo equipamento de resfriamento (Fig. 1). Foto: C. L. Girardi Fig. 1. Conjunto de compressores. Os principais métodos de pré-resfria- mento empregados para maçã são: resfria- mento na câmara frigorífica, ar forçado e água (hydrocooling ). No Brasil, utiliza-se ape- nas o pré-resfriamento em água, embora a maior parte das maçãs seja resfriada na câ- mara de armazenagem. Pré-resfriamento em câmara O pré-resfriamento pode ser feito numa câmara frigorífica com um sistema de refrigeração dimensionado para a remo- ção de grande quantidade de calor em pouco tempo. Essa forma de pré-resfria-

Upload: ricardobicudo

Post on 13-Jul-2016

218 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Armazenamento refrigerado

Frutas do Brasil, 39Maçã Pós-colheita58

7 ARMAZENAMENTOREFRIGERADO

Auri BrackmannCésar Luis GirardiRenar João Bender

Osni Roberto Caron Filho

INTRODUÇÃO

As frutas são organismos vivos queutilizam substâncias de reserva no proces-so de respiração, sendo a intensidade res-piratória influenciada pela temperatura emque são mantidas. Temperaturas baixasretardam as alterações típicas do amadure-cimento, bem como a síntese de etileno(hormônio do amadurecimento) e o desen-volvimento de microrganismos (fungos).A rápida remoção do calor que a fruta trazdo campo, através do pré-resfriamento,associada às condições ideais de conser-vação, são fatores importantes no prolon-ga-mento da vida útil das frutas.

PRÉ-RESFRIAMENTO

O pré-resfriamento é uma operaçãoimportante no processo de conservação demaçãs, devendo ser realizado logo após acolheita. Com o pré-resfriamento, a tem-peratura da polpa da fruta é baixada rapi-damente, reduzindo assim o processo res-piratório, a perda de água e, indiretamente,o desenvolvimento de podridões. O equi-pamento de refrigeração deverá ter condi-ções de manter constante a temperaturado meio refrigerante. Se essa condição nãofor satisfeita, as maçãs sairão do pré-resfri-amento com uma temperatura acima daprogramada. Havendo uma demora maiorpara atingir a temperatura de armazena-gem, ocorrerá um maior consumo de açú-cares e ácidos acumulados durante o de-senvolvimento das maçãs.

O tempo gasto para atingir a tempe-ratura de armazenamento depende de fa-

tores como capacidade de refrigeração,temperatura inicial das frutas, meio utili-zado para retirar o calor (água ou ar),temperatura desse meio, contato entre omeio e o produto a ser resfriado e velocida-de do produto ao passar pelo equipamentode resfriamento (Fig. 1).

Foto

: C. L

. Gira

rdi

Fig. 1. Conjunto de compressores.

Os principais métodos de pré-resfria-mento empregados para maçã são: resfria-mento na câmara frigorífica, ar forçado eágua (hydrocooling). No Brasil, utiliza-se ape-nas o pré-resfriamento em água, embora amaior parte das maçãs seja resfriada na câ-mara de armazenagem.

Pré-resfriamentoem câmara

O pré-resfriamento pode ser feitonuma câmara frigorífica com um sistemade refrigeração dimensionado para a remo-ção de grande quantidade de calor empouco tempo. Essa forma de pré-resfria-

Page 2: Armazenamento refrigerado

59Frutas do Brasil, 39 Maçã Pós-colheita

mento apresenta a vantagem de permitir ouso da câmara para o armazenamento nofinal do período de safra. Após o resfria-mento de um lote de bins, eles são removi-dos para outra câmara, para o armazena-mento. Para um rápido e eficiente resfria-mento, é importante um empilhamentocompacto dos bins de forma a forçar apassagem da corrente de ar por dento dosmesmos. O espaço entre as paredes late-rais e as pilhas de bins deve ser o menorpossível. A câmara recebe 20% a 30% desua capacidade de armazenagem, sendo osbins dispostos de maneira a formar umabarreira, em toda a largura da câmara, emsua porção intermediária. O ar empurradopelos forçadores passa por sobre o topodas pilhas e bate na parede da câmara,provocando o deslocamento em sentidoinverso. Isso obriga o ar a passar por entreos bins e, assim, retirar o calor das frutas.Neste método de pré-resfriamento é im-portante uma grande superfície do evapo-rador para a obtenção de um baixo ∆T(diferença entre a temperatura de evapora-ção do refrigerante e o ar circulante) parareduzir a transpiração das frutas. A umidi-ficação do ar diminui a perda de peso dasfrutas, mas aumenta a necessidade de de-gelos do evaporador.

Ar forçado

Neste sistema são formadas pilhas debins ou caixas, por entre as quais o ar friocircula retirando o calor. O movimento dear através das pilhas ocorre graças a umadiferença de pressão criada por forçadoresde ar, que funcionam sempre sugando o arfrio pelo produto. Para se obterem bonsresultados, é importante que as caixas te-nham aberturas suficientes para a pas-sagem de ar e que as caixas sejam dis-postas de modo a propiciar a passagem doar e, assim, refrigerar as frutas.

O maior problema apresentado pelométodo são as perdas de água, que depen-dem principalmente da umidade relativa eda velocidade do ar utilizadas no processo.

Para diminuir o problema, pode-se utilizaruma atmosfera praticamente saturada comágua e até molhar as frutas antes de iniciar oresfriamento. É importante que o equipa-mento seja instalado e operado de forma areduzir substancialmente o fluxo de ar tãologo o produto esteja resfriado, evitandodesperdício de energia e a perda de água dasfrutas, ou mesmo o seu congelamento. Paraum resfriamento mais homogêneo das fru-tas, é necessária a inversão do fluxo doequipamento, evitando-se o congelamentodas frutas num lado da pilha de caixas etemperaturas mais elevadas no outro ladoda pilha.

Água (hidrocooling)

O sistema de pré-resfriamento por águaé um dos mais rápidos para eliminar o calorde campo de maçãs, sendo a sua eficiênciabaseada no maior coeficiente de transferên-cia de calor da água e também na ausência dedesidratação do produto. É, assim, apro-priado para o resfriamento de maçãs queainda não estão na embalagem de comerci-alização, diferentemente do sistema de res-friamento por ar, que pode resfriar produtosque estão na embalagem definitiva.

O pré-resfriamento com água pode seraplicado por aspersão, ducha (Fig. 2), ouimersão. O sistema de ducha é o mais utili-zado, porque proporciona uma melhor dis-tribuição da água sobre o produto. Porém,um problema que pode surgir nesse sistemaé a ocorrência de caminhos preferenciais daágua entre o produto, resultando em umresfriamento desuniforme. Isso pode ser evi-tado com uso de maiores volumes de água emaior superfície de distribuição.

O sistema de pré-resfriamento comimersão não apresenta a desvantagem doscaminhos preferenciais da água, mas causaalgumas dificuldades por conta da menordensidade das frutas em relação à água,levando-as a flutuar, o que requer adapta-ção no equipamento para manter o produtodentro da embalagem. É importante tam-bém que, mesmo com o deslocamento das

Page 3: Armazenamento refrigerado

Frutas do Brasil, 39Maçã Pós-colheita60

frutas, ocorra um contínuo bombeamentoda água, para homogeneizar sua tempera-tura e garantir bons resultados.

fica inativo. É importante evitar também oexcesso de argila e matéria orgânica nosreservatórios que podem inativar o cloro oufungicidas. Por isso, é recomendável que osbins contendo maçãs sejam lavados com umjato de água antes de entrar no pré-resfriadorpara remover a terra proveniente do pomar,aderida à base destas embalagens. A água dopré-resfriador, quando muito suja, deve sertrocada para evitar que ela suje as frutasdurante o pré-resfriamento e para reduzir afonte de inóculo.

No Brasil, dispõe-se de poucas infor-mações de pesquisa sobre o pré-resfriamen-to de maçãs, e, em alguns trabalhos com ascultivares Golden Delicious e Fuji, verificou-seque o pré-resfriamento em água reduziu aperda de peso e o murchamento de frutas dacv. Fuji, além de manter maior firmeza depolpa (3 a 5 libras) nas duas cultivares, apóso armazenamento. Em outros trabalhos,verificou-se que o pré-resfriamento aumen-tou o peso das frutas em 1,0% e 1,7%, paraas cultivares Golden Delicious e Fuji, respecti-vamente. Nos dois trabalhos, não foi obser-vado nenhum efeito do pré-resfriamento namanifestação de distúrbios fisiológicos. Cons-tatou-se, porém, que a adição de CaCl2 à águado pré-resfriamento diminui a incidência depodridões durante o armaze-namento damaçã.

Vale lembrar que o pré-resfriamento,para propiciar resultados positivos, deve serexecutado de maneira correta. Entretanto,pouco vale um perfeito sistema de pré-resfri-amento se a armazenagem ocorrer em tem-peratura, umidade relativa do ar ou concen-trações de gases inadequadas.

ARMAZENAMENTOREFRIGERADOCONVENCIONAL

Qualidade da fruta parao armazenamento

A maçã a ser armazenada deve serrecém-colhida e de boa qualidade, isenta

Fig.2. Sistema de pré-resfriamento de maçãs por ducha.

Foto

: O. C

. Filh

o

Uma das desvantagens do sistema depré-resfriamento por água é a possibilida-de de contaminação. O inóculo de maçãsprocedentes de pomares com problemasde podridões estará sendo disperso pelaágua e poderá contaminar frutas sadias.Além disso, o inóculo pode penetrar nafruta quando receber o impacto da águamuito mais fria do que a temperatura dapolpa. Isso leva a uma contração do ar dosespaços intercelulares, succionando a águapara as camadas mais periféricas da polpaA sucção é maior quanto maior for a dife-rença entre a temperatura da polpa e daágua de pré-resfriamento. A presença deentradas naturais, como as lenticelas, amalformação da camada de cera que en-volve a maçã, ou a existência de pequenosferimentos causados na colheita ou trans-porte facilitam a entrada da água paradentro dos tecidos e, com ela o inóculo.Para evitar que isso ocorra, a água dosistema deverá ser tratada com produto deação fungicida ou fungistática.

O hidrorresfriamento requer umfreqüente monitoramento do pH da água(quando da utilização de produtos à basede cloro), que deve ficar em torno de 7,0.Em pH baixo (< 6,5) os problemas de corro-são e liberação de cloro tóxico aumentammuito e, em pH alto (>7,5) o cloro utilizado

Page 4: Armazenamento refrigerado

61Frutas do Brasil, 39 Maçã Pós-colheita

de distúrbios fisiológicos e sem sinais visí-veis de ataque de fungos e bactérias. Comoregra geral, é fundamental que a padroni-zação do produto a ser armazenado nacâmara frigorífica seja a mais perfeita pos-sível, proporcionando uma melhor condi-ção de armazenagem e estabelecendo umcritério adequado para a comercialização.Esta uniformidade diz respeito a cultivar,ponto de maturação e ocorrência de podri-dões. O tempo de armazenamento é deter-minado pelo estádio de maturação dasmaçãs no momento da colheita, devendo-se evitar armazenar frutas verdes ou muitomaduras. Não é recomendado o armaze-namento de lotes de maçãs com matura-ção ou qualidade muito diferentes entre si,pois a abertura da câmara sempre deve serfeita de acordo com o produto mais madu-ro ou de mais baixa qualidade.

Dimensionamentoda câmara frigorífica

O leiaute do frigorífico para maçãsdeve facilitar as diversas operações decarga e descarga, classificação e expedi-ção, movimentação de empilhadeiras epessoal. Da mesma forma, toda câmarafrigorífica deve ser projetada para receberuma quantidade máxima de fruta por dia,na pior condição de temperatura de polpa.O volume de colheita e a capacidade decomercialização podem e devem definir otamanho ideal da câmara para cada produ-tor. A carga térmica utilizada pelo equipa-mento frigorífico deverá ser calculada deforma que possa retirar o calor da fruta atéo nível desejado, levando em considera-ção o calor transmitido através das pare-des, o piso e o teto, a infiltração de ar nointerior da câmara, o calor das frutas eembalagens, além da carga térmica trans-mitida por motores, empilhadeiras, ilumi-nação, aberturas de portas e pessoal. Porisso, para uma boa operação do sistemafrigorífico, é importante a escolha e odimensionamento correto dos componen-tes do sistema, tais como compressores,

condensadores, evaporadores, ventilado-res e motores.

O isolamento térmico adequado dacâmara, por meio de painéis de poliureta-no ou de poliestireno com no mínimo 100mm de espessura, reduz o consumo deenergia elétrica pelos compressores e man-tém uma umidade relativa mais alta, redu-zindo a perda de peso das maçãs peladesidratação. Um isolamento térmico de-ficiente exige um maior período de aciona-mento dos forçadores do evaporador, ex-pondo as frutas à circulação de ar por ummaior período e, além disso, o maior perí-odo de funcionamento dos evaporadoresprovoca maior condensação de água noevaporador, o que reduz a umidade relati-va dentro da câmara.

As câmaras frigoríficas para maçãsgeralmente utilizam como gás refrigerantea amônia e R-22. Este último será substi-tuído pelos gases R-407 e SUVA 9000 nospróximos anos, para evitar danos à camadade ozônio. Para câmaras de pequena capa-cidade, um sistema de refrigeração comgás R-22 é o mais indicado, enquanto, paracâmaras de grande porte, principalmenteem complexos frigoríficos que reúnem di-versas câmaras, a amônia é a alternativamais viável.

Para se manter um ∆T inferior a 5oC,é necessária uma superfície de no mínimo2m2 de evaporador para cada tonelada decapacidade da câmara. Na Europa, reco-menda-se que a maçã deva perder emtorno de 3% de água por transpiraçãodurante o período de armazenamento paranão ser afetada por distúrbios fisiológicos,como a degenerescência interna. Diversostrabalhos feitos com maçãs brasileiras dascultivares Gala, Fuji e Golden Deliciousnão apresentaram distúrbios fisiológicosapós a conservação numa umidade relati-va de 96%. No entanto, observou-se que aredução da umidade para 92% diminui aincidência de podridões, principalmentena cultivar Fuji, embora a perda de massaseja expressiva. A cultivar Gala, quandoexposta a uma umidade acima de 96% na

Page 5: Armazenamento refrigerado

Frutas do Brasil, 39Maçã Pós-colheita62

fase final de armazenamento, acelera aperda da firmeza da polpa e, muitas vezes,apresenta aspecto farináceo, chegando arachar.

Carregamento da câmarae resfriamento

Durante o carregamento da câmara,os forçadores de ar do evaporador devemfuncionar em alta velocidade, circulando oar frio rapidamente entre os bins. O tempode resfriamento depende do dimensiona-mento correto da capacidade de refrigera-ção, considerando-se o volume de produtoa ser resfriado por jornada de trabalho.Esse sistema tem a vantagem de reduzir anecessidade de movimentação de bins ouembalagens dentro do packing-house, masapresenta uma grande desvantagem, que éa lenta diminuição da temperatura dasfrutas armazenadas, que apresentam osci-lações de temperatura, principalmentequando há uma demora no carregamentoda câmara. Essas oscilações, associadas auma maior movimentação de ar dentro dacâmara, para garantir uma mais eficienteretirada do calor das maçãs, podem levar auma maior desidratação das maçãs arma-zenadas, motivo por que deve-se utilizarum bom sistema de umidificação do ar.Outro problema associado ao resfriamen-to na câmara de armazenamento é a formade carregamento da unidade (Fig. 3). Du-rante o tempo de carregamento, mesmocom uma velocidade do ar maior, podem-se criar rotas preferenciais do ar, que per-mitem a formação de bolsões de tempera-tura mais elevada, resultando em produtocom taxa de metabolismo e de transpira-ção maiores. Barreiras à movimentação doar, como o uso de plástico de bolhas nasparedes internas dos bins, para diminuirdanos de abrasão e impacto nas maçãs,contribuem para um resfriamento maislento. Bins com paredes muito fechadastambém dificultam a passagem do ar frionas camadas de maçãs mais internas. Oaumento de mais ou menos 5% nas abertu-

ras da embalagem resulta em uma diminui-ção de aproximadamente 25% do tempode resfriamento.

Fig. 3. Empilhamento de bins na câmarafrigorífica.

Foto

: L. C

outo

Como o período de colheita das prin-cipais cultivares de maçã é relativamentecurto, causando uma grande entrada diáriade frutas a serem armazenadas, toma-se comoum parâmetro aceitável, um tempo de res-fria-mento nunca superior a 24 horas, sendorecomendadas 7 a 8 horas, com o uso de umpré-resfriamento. Para que isso ocorra, ovolume diário de fruta que entra na câmaranunca poderá ser maior que 20% da capaci-dade total da câmara, devendo-se, por umperíodo de 5 dias, manter a câmara fechadapara conservação. Embora seja recomenda-do um resfriamento das frutas por 5 dias, issomuitas vezes não é possível numa câmaracomercial, por causa de uma série de fatores.Um deles, que deve ser levado em conta paraobter uma boa taxa de resfriamento, é umaeficiente taxa de circulação de ar, associadaa uma temperatura conveniente, o que mui-tas vezes limita a eficiência do método.

Page 6: Armazenamento refrigerado

63Frutas do Brasil, 39 Maçã Pós-colheita

Outra possibilidade para acelerar o res-friamento é destinar câmaras para fazer opré-resfriamento e, quando as frutas atingi-rem a temperatura desejada, elas serão remo-vidas para a câmara de armazenamento.Apesar da maior velocidade de resfriamento,existe o inconveniente do excessivo manu-seio dos bins dentro do packing-house.

Em trabalho realizado comparando-seo resfriamento lento em 8 dias com o rápidoem 3 dias, maçãs da cultivar Gala apresen-taram, com o resfriamento rápido, maiorfirmeza de polpa (3,5 libras), cor da epidermemais verde e menor incidência de polpafarinácea, após 8,5 meses de armazenamen-to a 0,5ºC e mais sete dias a 20ºC.

Temperaturade conservação

O limite mínimo de temperatura paraser utilizado com segurança depende davariedade de maçã, devendo-se evitar tem-peraturas que possam causar distúrbiosfisiológicas pelo frio (chilling) e tempera-turas de congelamento. Flutuações de tem-peratura são, na maioria dos casos, respon-sáveis pela condensação de água sobre osprodutos armazenados, favorecendo odesenvolvimento de podridões. Para umsatisfatório controle de temperatura dasfrutas, é recomendável que a câmara sejadotada de termostato com regulagem datemperatura, com intervalos de 0,1°C. Otermostato deve dispor de diversos senso-res de temperatura que acompanham atemperatura na parte superior e inferior dacâmara, abaixo do evaporador, onde ocor-re o retorno do ar quente, no fundo dacâmara (lado oposto do evaporador) e dapolpa de uma maçã colocada dentro de umbin. Quando a temperatura do local maisfrio da câmara (em cima e no fundo) chegarpróximo ao ponto de congelamento a gera-ção de frio deve ser desligada pelo termos-tato. Em períodos de baixas temperaturasexternas poderá ocorrer um acionamentopouco freqüente da refrigeração, o que

poderá gerar um gradiente acentuado detemperatura entre a parte superior e inferi-or da câmara (> 0,5ºC) por conta da con-vecção do ar. Nesse caso, o termostatodeve acionar apenas os forçadores de ar doevaporador, sem permitir a entrada derefrigerante no evaporador. Se a tempera-tura da câmara se elevar acima do set pointregulado no termostato, ele então deveacionar a entrada de gás refrigerante e osforçadores de ar do evaporador para ageração de frio. Os termômetros e os ter-mostatos eletrônicos, por melhores que se-jam, sempre estão sujeitos a erros de leitura.Por isso, deve-se realizar, pelo menos umavez ao dia, a medição da temperatura comtermômetro de mercúrio, com escala de in-tervalos de 0,2°C, com o bulbo introduzidona polpa de uma fruta. Deve-se tomar cuida-do para não ocorrer congelamento em ne-nhum local da câmara.

Para obtenção de condições satisfa-tórias de armazenamento, evitando varia-ções de temperatura na câmara, algunscuidados devem ser observados antes edurante o armazenamento:

• Resfriar a câmara um dia antes docarregamento.

• Concluir o enchimento o mais rápidopossível.

• Não armazenar com meia carga porlongos períodos.

• Manter ventiladores em alta velocida-de até a obtenção da temperatura desejada.

• Manter baixa a diferença de tempera-tura entre o ar da câmara e o fluido noevaporador.

• Fazer corretamente a estiva, permi-tindo, que o ar se desloque por entre os binsno sentido do fundo da câmara para o evapo-rador.

• Dimensionar corretamente a circula-ção do ar e a pressão estática nos forçadoresde ar do evaporador.

• Restringir ao mínimo o tempo deabertura de portas das câmaras e dispor asportas de cortinas plásticas ou de vento, paraevitar a entrada de calor.

Page 7: Armazenamento refrigerado

Frutas do Brasil, 39Maçã Pós-colheita64

Umidade relativa

A ocorrência de umidade relativamuito baixa é comum no interior de câma-ras frigoríficas, causando perdas de peso,murchamento, amarelecimento e um as-pecto esponjoso à fruta (não-crocante).Essas perdas também estão relacionadascom a temperatura e a taxa de circulaçãode ar. Para uma determinada dimensão decâmara e carga, a umidade relativa é tantomaior quanto maior for a superfície doevaporador. Como regra geral, a diferençade temperatura entre o ar da câmara e atemperatura de evaporação (Dt) deve ser amenor possível, não ultrapassando 5°C.Durante o enchimento e o resfriamento,esse valor pode ser ultrapassado. Casocontrário, o resfriamento é muito demora-do, acelerando a maturação da maçã. Por-tanto, deve-se manter uma umidade nointerior da câmara entre 90% e 96%; acimadisso, pode ocorrer condensação de águasobre as frutas, podendo favorecer o de-senvolvimento de microrganismos (fun-gos). A precisa medição dessa umidade embaixas temperaturas é uma das dificulda-des do seu adequado controle, devendoutilizar-se para a sua determinação umpsicrômetro não aspirado e uma tabelapsicrométrica. Psicrômetros eletrônicos eumidostatos, quando de boa qualidade ebem aferidos, também são bastante confi-áveis.

Durante o resfriamento, a maçã per-de, geralmente, acima de 1% do seu pesoem água, quantidade que, às vezes, é supe-rior à perda que ocorre no restante doperíodo de armazenamento. Por isso, du-rante o resfriamento deve-se manter o arda câmara o mais úmido possível, por meiode nebulização, molhamento dos bins e dopiso da câmara. Um bin de madeira podeabsorver 4,5 litros de água durante asprimeiras semanas de armazenamento, oque significa que em torno de 6500 litrosde água são absorvidos numa câmara de500 t de maçãs. O molhamento das frutastambém diminui a perda de peso e acelera

o resfriamento, mas pode aumentar, emalguns casos, a ocorrência de podridões.Na fase final do período de armazena-mento, a perda de água das maçãs aumentaem virtude da maturação avançada dasfrutas que transpiram mais.

Circulação dear na câmara

O ar é o meio transportador de calor dafruta e do calor que penetra pelas paredes,piso e teto da câmara para o fluído refrigeran-te no evaporador. A quantidade de calor a sereliminada depende também da intensidaderespiratória das frutas e da abertura de por-tas. Por isso, a circulação de ar deve ser cons-tantemente verificada, devendo deslocar-sena mesma direção que os corredores entre aspilhas dos bins. A circulação do ar por con-vecção natural ou forçada deve ser suficientepara manter uma uniformidade razoável datemperatura e da umidade na câmara, deven-do-se deixar espaço para permitir a descidado ar ao longo da parede oposta ao evapora-dor, para o seu regresso através das pilhas atéo evaporador. O uso de lonas na parte supe-rior da câmara, onde está sendo lançado todoo ar que irá circular pela câmara, protege asfrutas nessa região, evitando a desidratação,o congelamento e a formação de gelo quandohá queda de gotas de água dos bicos doumidificador (Fig. 4).

Fig. 4. Orientação de carregamento e des-locamento do ar em câmaras friasFonte: Adaptado de Chapon e Westercamp, 1996.

Page 8: Armazenamento refrigerado

65Frutas do Brasil, 39 Maçã Pós-colheita

Como o ar segue o caminho de menorresistência (curto-circuito), quando os espa-ços entre as pilhas forem irregulares, os mai-ores espaços admitem um maior volume dear que os mais estreitos. Portanto, quandocertas passagens estiverem parcialmenteobstruídas, formam-se zonas de ar paradocom elevação da temperatura nesses locais.A medição da velocidade do ar pode ser feitacom anemômetro de pás logo acima da su-perfície das maçãs dentro do bin.

Quando se utiliza a própria câmara pararesfriar as frutas, deve-se utilizar os forçado-res em alta velocidade de 3,0 a 4,0 m/s ouestabelecer uma relação de 50 a 60 vezes ovolume da câmara por hora. Já durante oarmazenamento, deve-se utilizar os força-dores com baixa rotação, proporcionandouma velocidade do ar de 0,2 m/s entre os binsdesejáveis ou uma relação que correspondeà metade da proporcionada na alta veloci-dade. Para isso, é fundamental o dimensio-namento correto dos forçadores, bem comoo tamanho do evaporador em relação à quan-tidade de calor a eliminar, para a manutençãode temperaturas baixas e constantes e evitara variação de umidade relativa na câmara.

Renovação do ar

A renovação de ar em câmaras frigo-ríficas é uma prática recomendável duran-te o armazenamento refrigerado. No casoda maçã ‘Fuji’, a renovação do ar reduz aconcentração de CO2, que numa concen-tração de 1% durante um longo períodopode causar a degenerescência da polpa.Tal prática também reduz a concentraçãode alfa-farneseno, que, nas maçãs ‘Fuji’ e‘Granny Smith’, entre outras, pode causarescaldadura. A renovação do ar com afinalidade de retirar etileno tem poucoefeito sobre a conservação de maçãs, ten-do em vista que mesmo com a renovaçãodo ar a concentração de etileno fica próxi-ma ou superior a 10 ppm, que é uma doseque apresenta um efeito próximo ao máxi-mo sobre a aceleração do metabolismo damaioria das cultivares de maçã. A queima

catalítica de etileno também não é viável,durante o armazenamento, refrigerado emvirtude da alta síntese desse gás na presen-ça do alto teor de oxigênio do ar atmosfé-rico.

Quando se introduz ar exterior numacâmara frigorífica, ele deve ser direciona-do diretamente para o evaporador, a fim dese evitar condensação de água na superfí-cie das frutas.

Degelo do evaporador

O degelo do evaporador é feito quan-do a camada de gelo obstrui a passagem dear entre as aletas, e deve ser realizado omais rápido e no menor número de vezespossível. Degelos prolongados causamgrande aumento da temperatura do ar dacâmara, o que também causa o aumento datemperatura das frutas, podendo provocaraté condensação de água sobre a superfíciedas mesmas, aumentando a ocorrência depodridões.

O degelo em câmaras comerciais ge-ralmente é feito de três formas diferentes.A forma mais comum para grandes câma-ras é a injeção de gás refrigerante quente,sob alta pressão, no evaporador. Para câ-maras menores pode ser usado o aqueci-mento do evaporador com uma resistênciaelétrica ou um banho com água, com tem-peratura ambiente até a completa fusão dogelo.

A água do degelo pode ser coletada naparte externa da câmara, e sua mediçãopermite um cálculo da perda de massa damaçã armazenada. Em países europeus,onde o custo da água é elevado, a água dodegelo é aproveitada na umidificação dacâmara por meio de nebulização.

Condições de armazena-mento

As condições adequadas de armaze-namento refrigerado variam conforme acultivar, a maturação na colheita, o local eo ano de produção. Na Tabela 1, são apre-

Page 9: Armazenamento refrigerado

Frutas do Brasil, 39Maçã Pós-colheita66

sentadas recomendações para o armaze-namento, baseadas em trabalhos de pes-quisa desenvolvidos pelo Núcleo de Pes-

Tabela 1. Condições para o armazenamento refrigerado de maçãs.

Cultivares

Gala e mutantesFujiGolden DeliciousBelgoldenBraeburn

Temperatura (ºC)

0,5-1 a 0

000

Umidade relativa (%)

94 – 9692 – 9694 – 9694 – 9692 – 96

Período de armazenamento

4 – 5 meses6 – 7 meses5 – 6 meses5 – 6 meses6 – 7 meses

quisa em Pós-Colheita da UniversidadeFederal de Santa Maria – UFSM –, comalgumas variedades de maçãs cultivadasno Brasil.

Fonte: Brackmann, 2003.