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    A ORQUESTRA SINFNICA NACIONAL POR SUAS CORDAS:COMPOSIO E PROCESSO DE SELEO

    Raul Martinho S dOliveiraUNIRIOPPGM

    MestradoMusicologiaSIMPOM: Subrea de Musicologia

    Resumo:Esta comunicao parte da pesquisa de mestrado em andamento, sobre a histria egravaes da Orquestra Sinfnica Nacional (OSN) na Rdio MEC (RMEC), entre 1961 e1964. Primeira e nica orquestra federal e profissional do Brasil, a OSN foi criada em 1961,atravs de decreto do ento presidente Juscelino Kubitschek, com a misso institucional dedifuso da msica brasileira de concerto. Lotada na RMEC e destinada a ocupar uma posiode destaque no cenrio da msica de concerto nacional na dcada de 60, a OSN foi

    cuidadosamente composta por msicos renomados, oriundos das principais orquestrassinfnicas cariocas. Usando como guia o texto institucional presente no programa de estriada OSN (Miranda, 1961), pretende-se examinar a estrutura e composio da orquestra a partirdo levantamento dos quadros de msicos da Orquestra Sinfnica da Rdio Nacional,Orquestra Sinfnica Brasileira e Orquestra Sinfnica do Teatro Municipal do Rio de Janeiro,em confronto com a primeira formao da OSN. Dados percentuais tambm so apresentadosao longo do artigo. A leitura crtica dos testemunhos, proposta por Marc Bloch (2001), utilizada como ferramenta bsica para entendimento do processo de seleo dos msicos. Aoconcentrar o foco nos instrumentistas de cordas ncleo principal de uma sinfnica e seapropriando do conceito de habitus inerente teoria de Pierre Bourdieu (1983), a presentecomunicao conclui que, em sua maioria, os msicos eram pr-dotados de qualidades

    fundamentais para desempenharem suas funes com xito. Logo, gerando condiesfavorveis para a afirmao da Sinfnica Nacional como instituio de relevo no campo damsica de concerto brasileira.Palavras-chave: Sinfnica Nacional; Rdio MEC; Msicos; Cordas; Habitus.

    The National Symphonic Orchestra by their strings: composition and selection of themusicians

    Abstract:This paper is part of an ongoing masters degree research on the history and therecordings of the National Symphonic Orchestra (NSO) of Radio MEC (RMEC), between1961 and 1964. First and only professional Brazilian orchestra, sponsored by the Federal

    Government, the NSO was created in 1961 by decree of President Juscelino Kubitschek withthe institutional mission of disseminating Brazilian classical music. Placed at RMEC andintended to take a leading position in the classical music national scene during the 1960decade, the NSO was carefully formed by renowned musicians from the main Rio de Janeirosymphonic orchestras. Using as guideline the official text of the NSO opening program(Miranda, 1961), the present research intends to examine the orchestra's structure andcomposition by means of identifying the staff of musicians from the National RadioSymphonic Orchestra, the Brazilian Symphonic Orchestra and the Rio de Janeiro MunicipalTheater Symphonic Orchestra, in opposition to NSO first formation. Percentage figures arealso presented during the article. The critical review of the testimonies, proposed by MarcBloch (2001), is used as a basic means to understand the selection of the musicians. By

    focusing on the string instrumentalists main core of an orchestra and by adopting theconcept of habitusbasic to the theory of Pierre Bourdieu (1983), this paper concludes that

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    most of the musicians were already skilled with fundamental qualities to perform theirfunctions successfully. Thus, engendering favorable conditions to the consolidation of the

    NSO as an important institution in the field of Brazilian classical music.Keywords: National Symphonic; Radio MEC; Musicians; Strings;, Habitus.

    A ORQUESTRA SINFNICA NACIONAL surge no cenrio artstico do pascomo resultado das aspiraes comuns da classe musical e da Direo daRdio Ministrio da Educao [RMEC], acrescentando-se agora como uma novae importante unidade artstica a servio da nossa cultura (...) 1.

    Foi com estas palavras que o diretor Murilo Miranda anunciou oficialmente o

    surgimento do mais novo conjunto sinfnico brasileiro. Celebrada como um verdadeiro

    acontecimento, ansiada pela classe musical brasileira, a OSN estria no dia 19 de outubro de

    1961, em meio s festividades do Jubileu de Prata da RMEC. Para Miranda, sem dvida, um

    dos pontos altos das comemoraes2.Ainda segundo o diretor,

    (...) empenhada em assegurar o melhor nvel artstico ao conjunto [OSN], dedicou-se a Direo da Rdio MEC (sic) tarefa de promover a seleo dos melhoresprofissionais do pas, credenciados pela longa prtica nos mais importantesconjuntos sinfnicos nacionais e estrangeiros e por sua capacidade tcnica eartstica sobejamente comprovada.

    Assim constituda, contando em suas fileiras com instrumentistas de escol (sic),encontra-se a OSN equipada para cumprir a misso cultural que lhe est reservadae cujas diretrizes so traadas por um Conselho Artstico integrado por figuras dedestaque do nosso meio musical.

    A OSN, mais do que um novo conjunto sinfnico, representa ainda um testemunhode trabalho profcuo das vrias orquestras sinfnicas do pas, sobremaneira aOrquestra Sinfnica Brasileira, a Orquestra Sinfnica do Teatro Municipal[RJ], a Orquestra Sinfnica da Rdio Nacional e a Orquestra do TeatroMunicipal de So Paulo e a Orquestra Sinfnica de Porto Alegre, representadasna OSN pela presena auspiciosa de muitos de seus mais destacadosintegrantes do presente ou do passado3.

    Dessa forma, para verificar a validade da propaganda realizada por Miranda em favorda OSN, cumpre recuar alguns meses no tempo para investigar a composio da orquestra,

    com foco na estrutura e processo de seleo dos msicos.

    Aos 12 de janeiro de 1961, Juscelino Kubitschek assinava seu ltimo decreto-

    presidencial4, criando a Orquestra Sinfnica Nacional. Segundo tal documento a OSN,

    1Miranda, 1961, p. 3. Grifo meu.2Ibidem.3

    Ibidem. Grifos meus.4BRASIL. Dirio Oficial da Unio. Lei n 49.913 de 12 de janeiro de 1961. Disponvel em Acesso em: 10 Jun.2012.

    http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=113193http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=113193
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    componente da Campanha Nacional de Radiodifuso Educativa5, ratificando os princpios

    definidos pela mesma, ter como finalidade precpua cultivar e difundir a msica sinfnica

    do pas6.

    Primeira e nica orquestra federal e profissional do Brasil, a OSN nasce, portanto,

    com a misso especfica de fomentar a produo sinfnica brasileira. Quanto estrutura do

    conjunto, o decreto determina em seu artigo 3 que

    A O.S.N. ser organizada de acordo com os seguintes preceitos:a) ser constituda de noventa profissionais, admitidos como contratados;b) para o efeito da fixao de salrios, seus integrantes sero classificados emcategorias instrumentais (grifos meus).

    De acordo com o Oxford Dictionary of Music, a

    orquestra sinfnica composta (geralmente) por mais de 90 msicos, capazes deexecutar obras elaboradas (...). Ao longo dos sculos a orquestra mudou e sedesenvolveu, e atualmente a verso estandardizada compreende instrumentos decordas, sopros de madeira, metais e percusses7.

    Portanto, a OSN seguiria o padro das orquestras sinfnicas modernas, organizando

    seus noventa msicos atravs de categorias instrumentais, como estabelecido na alnea bdo

    artigo 3. Na presente comunicao no ser possvel abranger todas as quatro categorias, aqui

    denominadas famlias. Sendo assim, optou-se por privilegiar a famlia mais representativa da

    orquestra, aquela que ocupa mais da metade das cadeiras, e da qual fazem parte os violinos,

    violas, violoncelos e contrabaixos: as cordas.

    Em janeiro de 1961, pouco antes de deixar a direo da RMEC, Mozart de Arajo 8

    declarou ao Correio da Manhque a qualidadeartstica da OSN parece estar assegurada pela

    rigorosa seleo de msicos que o decreto impe para o ingresso dos professores no grupo9.

    Entretanto, no texto do decreto no h qualquer meno forma como deveriam ser realizadas

    as provas ou critrios de seleo.

    Na busca pelo entendimento de como foi organizado o processo de seleo dos

    msicos, depoimentos podem indicar pistas valiosas. De acordo com o compositor Edino

    Krieger, maestro-assistente da OSN em 1961,

    5Idem, artigo 2.6Ibidem.7Orchestra. In: [s.a.]. The Oxford Dictionary of Music. Disponvel em Oxford Music OnlineAcesso em: 23 mai. 2012. Traduo e grifos meus.8Diretor da RMEC entre 11/07/58 e 20/02/61 (Milanez, 2007:224).9Frana, 22 jan. 1961, p. 3.

    http://www.oxfordmusiconline.com/subscriber/article/opr/t237/e7507?q=orchestra&search=quick&pos=2&_start=1#firsthithttp://www.oxfordmusiconline.com/subscriber/article/opr/t237/e7507?q=orchestra&search=quick&pos=2&_start=1#firsthithttp://www.oxfordmusiconline.com/subscriber/article/opr/t237/e7507?q=orchestra&search=quick&pos=2&_start=1#firsthithttp://www.oxfordmusiconline.com/subscriber/article/opr/t237/e7507?q=orchestra&search=quick&pos=2&_start=1#firsthit
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    para efeito de formalizao dos novos msicos, inclusive os oriundos da RdioNacional [RN], foram feitas audies pra compor a nova orquestra. Os principaismsicos do Teatro [Municipal] e OSB [Orquestra Sinfnica Brasileira] foramdispensados de provas10.

    Da mesma maneira, Alceo Bocchino, principal maestro da OSN em seus vinte

    primeiros anos, relembra:

    Fizemos uma seleo entre aqueles que vieram da RN, um grupo pequeno eirregular muitos trompetes e trombones, e pouqussimos violinos. Ecompletamos a OSN com os melhores msicos das congneres11.

    Para o contrabaixista e fundador da orquestra, Sandrino Santoro,

    a OSN foi criada com msicos que vinham da Rdio Nacional e depois teve umconcurso, do qual eu participei e fui aprovado, graas a Deus. Eu acredito que noteve avaliao para algumas pessoas, at porque msicos como Peter Dauelsberg,Nanny12 [violoncelistas], meus colegas Agostino Paglia, Renato Sbragia[contrabaixistas] j tinham nome como grandes artistas e no devem ter precisadofazer provas13.

    Portanto, a leitura dos depoimentos acima sugere que o processo de seleo da OSN

    aconteceu em trs etapas distintas. Na primeira etapa foram avaliados os msicos oriundos da

    RN14. Em seguida foram convidados os instrumentistas mais destacados do Rio de Janeiro, ou

    seja, msicos que j atuavam nos conjuntos de cmara da RMEC e os principais solistas das

    duas maiores orquestras da cidade: OSB e OSTM. Na terceira etapa, foram realizadas provas,

    abertas aos msicos em geral, para preencher as vagas ainda ociosas15. Essa ordenao foi

    estabelecida para melhor organizao do processo, no significando que tenha ocorrido nessa

    sequncia cronolgica. Muito provavelmente as etapas se alternaram de acordo com as

    particularidades de seleo de cada instrumento.

    Comeando pela avaliao dos msicos que vieram da RN, nota-se que os

    depoimentos de Bocchino e Krieger se assemelham ao lembrarem que a relao desses

    msicos era to numerosa quanto heterognea, com muitos trompetes e trombones e

    pouqussimos violinos e cordas em geral16. Sabe-se que a similitude dos testemunhos pode ser

    10Krieger, 2011.11Bocchino, 1998, grifo meu.12Apelido de Ana Devos.13Santoro, 2011.14Devido Lei 2.193, de 9 de maro de 1954, funcionrios das Empresas Incorporadas da Unio (incluindo osmsicos da RN), puderam optar pelo servio pblico federal, sendo transferidos, em 1961, para a RMEC e,consequentemente, deixando a RN.15

    Conforme narrado por Santoro, que na poca ainda no fazia parte de nenhuma das principais orquestrassinfnicas do RJ.16Bocchino, 1998 e Krieger, 2003.

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    um forte indcio da autenticidade dos mesmos17. Entretanto, a passagem da lembrana atravs

    das geraes, deve sempre ser confrontada. A anlise dos dados levantados para essa

    pesquisa18 reafirma o estado de alerta no sentido de no aceitar cegamente todos os

    testemunhos histricos19. De acordo com a tabela 2, dos 29 violinistas da OSN, 16

    pertenciam a RN, ou seja, mais de 50% do naipe, diferentemente dos pouqussimos violinos

    fixados pelas memrias. Em relao totalidade das cordas (violinos, violas, violoncelos e

    contrabaixos), a proporo se mantm prxima: 44% vieram da RN.

    Tabela 1. Percentual de msicos oriundos da OSRN na famlia das cordas.

    Naipe OSN OSRN Percentual

    Violinos 29 16 55,17%

    Violas 10 4 40%

    Violoncelos 9 2 22,2%

    Contrabaixos 8 3 37,5%

    Total 56 25 44,64%

    Logo, a partir da hiptese de que os exames de seleo primaram pelo rigor na buscados melhores profissionais disponveis no meio musical de ento, conclui-se que a OSRN

    contava, em sua maioria, com instrumentistas de alto nvel, capazes de atender s expectativas

    da banca mais exigente. De acordo com Bocchino,

    a banca examinadora era composta pelo Mignone, Eleazar, eu, Edino Krieger eMarina Moura, representante do diretor. Os testes tinham livre escolha e leitura escritas pelo Mignone e por mim. Escrevi para trompa e violino, uma cadncia quedepois aproveitei em uma composio minha20.

    Para ilustrar a qualidade dos avaliadores, situando a posio no campo de cada umdos seus componentes, basta dizer que Francisco Mignone (1897-1986) era professor de

    17Bloch, 2001, p. 107.18A partir daqui, todos os dados apresentados so resultado do confronto das seguintes fontes: programa originaldo concerto de estria da OSN (19 de out. 1961. Acervo pessoal do contrabaixista Sandrino Santoro); programade concerto da OSTM (1962. Acervo pessoal do clarinetista Jos Botelho); coleo de programas da OSB(1960/1961. Acervo Fundao Orquestra Sinfnica Brasileira); listagem intitulada Alguns dos nomes quecontriburam para o sucesso da Rdio Nacional(Pinheiro, 2005:178-225); artigo: A Rdio MEC como Centro

    Difusor da Msica de Concerto no Brasil(Azevedo, 2000); encarte do Cd Repertrio Rdio MEC III (Acervopessoal do autor); livro Escola de Msica da Universidade Federal do Rio de Janeiro: Histria & Arquitetura(De Paola & Gonsalez, 1998) e depoimentos coletados ao longo da pesquisa.19Bloch, 2001, p. 89.20Bocchino, 1998.

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    regncia da Escola Nacional de Msica da ento Universidade do Brasil, e um dos principais

    compositores da segunda gerao nacionalista. Para Vasco Mariz Mignone foi talvez o

    msico mais completo que possumos. Compositor de primeira plana, excelente professor,

    experimentado regente, virtuoso do piano, acompanhador insupervel, hbil orquestrador,

    notvel intrprete de msica de cmara21 (...). Eleazar de Carvalho (1912-1996) era o

    maestro titular da OSB e j desenvolvia intensa carreira internacional, realizando freqentes

    tournespela Europa e EUA22. Alceu Bocchino (1918), alm de pianista destacado por suas

    atuaes com o Trio da RMEC, era maestro assistente da OSB e constantemente regia a

    Orquestra de Cmara da Rdio MEC (OCRMEC). Completando a banca, o compositor Edino

    Krieger (1928), crtico musical e um dos principais redatores da RMEC. provvel que

    alguns instrumentistas da RMEC tenham participado da banca de acordo com o instrumento

    em questo, porm a pesquisa no encontrou registros sobre quem seriam esses msicos, e os

    depoimentos tambm no os revelaram.

    importante dizer que, exceo dos msicos da RN que, por opo, eram

    servidores pblicos, os demais instrumentistas seriam admitidos como contratados23, no

    havendo a obrigatoriedade de um concurso pblico. Logo, a direo da Rdio teria a liberdade

    para realizar convites e dispensar alguns msicos do processo de seleo.

    Ento, definido o primeiro ncleo da OSN, formado pelos msicos provenientes da

    RN selecionados pela banca, o prximo passo seria, naturalmente, convidar os msicos que j

    integravam os conjuntos da RMEC, comeando pela Orquestra de Cmara. Criada em 1957, a

    OCRMEC pode ser considerada a precursora da Sinfnica Nacional, em relao filosofia de

    escolha do repertrio. De acordo com texto institucional de 1958, divulgado pela Rdio, a

    Orquestra de Cmara tinha por hbito apresentar,

    (...) ao lado das obras mestras do repertrio clssico universal, inmeras primeirasaudies de autores antigos e modernos do Brasile de outros pases. Constituiainda uma de suas finalidades precpuas propiciar o aparecimento de novas

    obras de autores nacionais, de modo a enriquecer o repertrio brasileiro demsica para orquestra de cmara gnero ainda pouco explorado por nossoscompositores24.

    Ou seja, o comprometimento com a difuso da msica brasileira, princpio bsico da

    OSN, era prtica comum na RMEC, principalmente atravs da sua orquestra de cmara.

    21Mariz, 2005, p. 229.22Frana, 15 jan. 1961, p. 3.23

    Idem, artigo 4.24Orquestra de Cmara da Rdio Ministrio da Educao . Histria da Rdio MEC, Pasta I. Rio de Janeiro:Setor de Pesquisa. Rdio MEC, 1958. Grifos meus.

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    A OCRMEC era essencialmente uma orquestra de cordas, formada por onze msicos

    especialmente escolhidos. Como um quarteto de cordas25ampliado, a orquestra era composta

    por seis violinos, duas violas, dois violoncelos e um contrabaixo. Dos onze componentes da

    OCRMEC nove esto na primeira formao da OSN26. Desses, se destacam: Marcelo

    Pompeu, violinista, membro do Quarteto de Cordas da RMEC, da OSTM e da OSRN;

    Arlindo Penteado, violista, concertino da OSB; Peter Dauelsberg, violoncelista, tambm

    membro do Quarteto de Cordas da RMEC e solista da OSB; Giorgio Bariola, violoncelista,

    concertino da OSB; e Renato Sbragia, contrabaixista, solista da OSTM.

    Alm deles, o spalla da OCRMEC, Gian Carlo Pareschi, tambm concertino dos

    primeiros violinos da OSB, veio a ingressar na OSN posteriormente, entre 1962 e 1963. Em

    suma, todos os naipes da Orquestra de Cmara possuam msicos renomados, assegurando o

    alto nvel artstico do conjunto.

    Finalizando a pesquisa dos msicos pertencentes aos conjuntos de cmara da RMEC,

    a OSN foi reforada ainda por dois instrumentistas que dispensam comentrios: Anselmo

    Zlatopolsky, violinista do Trio da RMEC27e spalla da OSB e o violista Gza Kiszely, diretor

    do Collegium Musicum28da RMEC e solista da OSTM.

    Entretanto, no universo de uma orquestra sinfnica, onze excelentes solistas de

    cordas representavam apenas 20% dessa numerosa famlia. Sabe-se que j haviam sido

    selecionados 25 msicos oriundos da RN, significando 44,64% do total de cordas da OSN. E

    dentre esses msicos, alguns so dignos de realce, em virtude das posies ocupadas nas

    demais orquestras e conjuntos de cmara cariocas. So eles: Clio Nogueira, violinista,

    membro do Trio da RN29e da OSB; Eduardo Patan, violinista, maestro e arranjador, regente

    da Orquestra de Tangos da RN; Germano Lucano, violista, solista da OSB e Pedro Vidal,

    contrabaixista, membro do Sexteto de Radams Gnattali e da OSB.

    Logo, visando sempre a excelncia artstica da OSN, o processo deveria seguir com

    convites aos principais solistas da OSB e OSTM. Da OSB vieram: Jorge Faini, violinista,concertino dos segundos violinos; Jeremias Waschitz, violista, solista dos segundos

    25Dois violinos, uma viola e um violoncelo.26Apenas dois violinistas - Alberto Jaff e Salomo Rabinovitz - no integraram a OSN.27Ao lado de Alceo Bocchinopiano e Iber Gomes Grosso.28

    Conjunto de msica antiga da Rdio.29Com Radams Gnattali piano e Iber Gomes Grosso violoncelista, que mais tarde formaria o Trio daRMEC.

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    violinos30; Ana Devos, violoncelista, concertino; Agostino Paglia, contrabaixista, solista. Da

    OSTM: o spalla, Francisco Corujo e Raphael Jannibelli, violoncelista, solista.

    Alm dos solistas listados, fizeram parte da fundao da OSN mais 18

    instrumentistas de cordas oriundos da OSTM (8) e OSB (10).

    No possvel afirmar, porm, acredita-se que a grande maioria dos msicos citados

    at aqui, referenciados pela experincia e posio de destaque ocupada no cenrio da msica

    de concerto de ento, foram dispensados das provas de seleo.

    Concluindo a anlise da origem e status31das cordas da primeira formao da OSN,

    em termos quantitativos, percebe-se que a base era, de fato, composta pelos msicos oriundos

    da RN (48%), seguidos pelos msicos da OSTM (34%) e OSB (30,7%). Por outro lado,

    somados os percentuais das duas principais orquestras cariocas, pode-se dizer que a maioria

    da OSN provinha da combinao dos quadros da OSTM e OSB (64,7%). E 21% atuavam

    simultaneamente na OSRN e OSTM ou OSB32.

    Deve-se destacar que os spallas da OSTM e OSB eram violinistas da OSN. Assim

    como os solistas das violas, violoncelos e contrabaixos dessas orquestras. Os violoncelos

    contavam ainda com os concertinos de ambas.

    Em termos numricos, quase 30% dos msicos da OSN exerciam funes de solistas

    nas demais orquestras.

    Quanto msica de cmara, tanto o Trio da RN quanto o Trio da RMEC tinham

    representantes na OSN, alm da metade do Quarteto de Cordas da RMEC.

    Portanto, observando os msicos que compunham a primeira formao da orquestra

    nota-se que, em sua maioria, eram pr-dotados das qualidades fundamentais para realizarem

    suas funes com xito. Alm de talento e competncia tcnica, possuam larga experincia

    orquestral. Ou seja, tinham uma disposio estvel para se operar numa determinada direo

    (...) um habitus que enfatiza a dimenso de um aprendizado passado33. Adota-se aqui a

    noo de habitus definida por Bourdieu como:

    sistema de disposies durveis, estruturas estruturadas predispostas a funcionaremcomo estruturas estruturantes, isto , como princpio que gera e estrutura as prticase as representaes que podem ser objetivamente regulamentadas e reguladassem que por isso sejam o produto de obedincia de regras, objetivamente adaptadas

    30Por serem instrumentos tecnicamente muito prximos, ainda hoje comum que o msico inicie seus estudospelo violino e, mais tarde, faa a opo pela viola. Alguns msicos se mantm atuando profissionalmente com osdois instrumentos, como no caso do Jeremias Waschitz, violista na OSN e violinista na OSB.31Statusser entendido como a posio de destaque ocupada pelos msicos no campo da produo erudita, seja

    pelas atividades camersticas ou pelos cargos de solistas que ocupam nas orquestras.32A OSB e a OSTM ensaiavam pela manh, enquanto a OSRN ensaiava tarde, assim como faria a OSN.33Ortiz, 1983, p. 14.

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    a um fim, sem que se tenha necessidade da projeo consciente deste fim ou dodomnio das operaes para atingi-lo, mas sendo, ao mesmo tempo, coletivamenteorquestradas sem serem o produto da ao organizadora de um maestro34.

    Dessa forma, o detalhamento da composio da maior parte da OSN a famlia das

    cordas confirma a propaganda positiva realizada por Murilo Miranda em outubro de 1961,que definia a OSN como mais do que um novo conjunto sinfnico, (...) um testemunho de

    trabalho profcuo das vrias orquestras sinfnicas do pas35 (...). Ou seja, uma verdadeira

    catalisadora dos melhores profissionais existentes no campo da msica de concerto carioca.

    Sabe-se que uma orquestra sinfnica um organismo bastante complexo dependente de uma

    estrutura slida para funcionar adequadamente. Quando destinada a representar seu pas,

    atravs da difuso de sua msica, deveria ser composta por msicos qualificados por seu

    virtuosismo e experincias acumuladas, no intuito de alcanar os melhores resultadospossveis. Profissionais detentores de um conhecimento previamente adquirido que, no caso

    especfico da OSN, est presente em todos os nveis da sua estrutura: desde o corpo orquestral

    at a direo artstica. Em suma, uma verdadeira seleo nacional.

    Referncias

    AZEVEDO, Cludia. A Rdio MEC como centro difusor da msica de concerto no Brasil.BrasilianaRevista da Academia Brasileira de Msica, Rio de Janeiro, ano 2, n. 5,maio, p. 2-13, 2000.

    BLOCH, Marc.Apologia da histria, ou, O ofcio de historiador. Rio de Janeiro: Zahar,2001.

    BOCCHINO, Alceo. Entrevista realizada por Cludia Azevedo, na Escola de Msica da

    UFRJ. Rio de Janeiro, 18 set. 1998. 1 fita cassete (50 min).

    DE PAOLA, Andrely Quintella & GONSALEZ, Helenita Bueno. Escola de Msica daUniversidade Federal do Rio de Janeiro: Histria & Arquitetura. Rio de Janeiro:UFRJ, SR5, 1998.

    FRANA, Eurico Nogueira. Eleazar de Carvalho em tourne. Correio da Manh. Rio deJaneiro, 15 jan. 1961. 2 caderno, p.3. Acervo de microfilmes da Biblioteca Nacionaldo Rio de Janeiro

    34Bourdieu, apud Ortiz, 1983, p. 15.35Miranda, 1961, p. 3.

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    ANAIS DO II SIMPOM 2012 - SIMPSIO BRASILEIRO DE PS-GRADUANDOS EM MSICA

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    http://www.soarmec.com.br/edino.htmhttp://www.soarmec.com.br/edino.htm