Introduo

Bem vindo ao Mdulo IX do nosso Curso.

Trataremos aqui do tema "Justia Restaurativa", o qual vai ser apresentado atravs das seguintes Unidades:

1 - Marcos histricos e jurdicos da Justia Restaurativa

2 - Fundamentos ticos e Princpios bsicos dos Programas de Justia Restaurativa

3 - Dimenses prticas e modelos de programas de Justia Restaurativa

4 - Justia Restaurativa no contexto da Justia Juvenil: marco jurdico e aplicabilidade

5 - Prticas e experincias Restaurativas no Sistema Socioeducativo: dos procedimentos aos resultados

6 - Formao de Recursos Humanos, mobilizao institucional, social e comunitria

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Professores Conteudistas

Este Mdulo foi elaborado pela equipe de conteudistas composta pelos professores:

Leoberto Brancher, Juiz de Direito no RS, Coordenador do Ncleo de Estudos em Justia Restaurativa na Escola Superior

da Magistratura da Associao dos Juzes do Rio Grande do Sul (Coordenador). Clique aqui para ver a apresentao do

professor em vdeo.

Afonso Konzen, Procurador de Justia no RS, Mestre em Cincias Criminais pela PUCRS, Coordenador do Curso de

Ps-Graduao em Direito da Criana e do Adolescente da Fundao Escola do Ministrio Pblico do Rio Grande do Sul

(Colaborador).

Beatriz Aguinsky, Doutora em Servio Social, Diretora da Faculdade de Servio Social da PUCRS, Coordenadora do Grupo

de Estudos e Pesquisas em tica e Direitos Humanos da mesma Faculdade (Colaboradora).

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Objetivos do Mdulo

Ao final do Mdulo o cursista dever mostrar-se capacitado a:

- Reconhecer as principais diferenas conceituais entre Justia Retributiva e Justia Restaurativa;

- Identificar a manifestao de valores, prticas e atitudes retributivas no contexto do atendimento socioeducativo;

- Levantar oportunidades de aplicao dos princpios e das prticas restaurativas com vistas a humanizao da Justia

Juvenil e do atendimento socioeducativo.

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Mapa conceitual do mdulo

(para as definies, consulte o glossrio)

Justia Retributiva

Justia Restaurativa

Culpa

Responsabilidade

Punio

Perseguio Penal

Dilogo

Encontro

Reparao do dano

Coeso social

Coero social

Autonomia

Heteronomia

Hierarquia

Circularidade

Responsabilidade ativa

Responsabilidade passiva

Mediao vtima ofensor

Crculo Restaurativo

Conferencias de Justia Restaurativa

Redes sociais

Rede Primria/secundria

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JR em ao: as prticas restaurativas

A Justia Restaurativa prope metodologias baseadas em encontro, dilogo e reparao do dano, as quais no devem ficar

restritas aos processos judiciais.

A expresso prticas restaurativas define as mais diversas formas de tratar com conflitos a partir da viso, dos valores e dos

processos restaurativos, em qualquer situao em que forem aplicados.

Segundo Paul McCold, os processos restaurativos em geral guardam algumas similiaridades, embora possam variar a forma

de serem abordados os fatos, o formato dos encontros, ou os mtodos adotados na sua conduo. Apesar dessas variaes,

costumam ter em comum as seguintes etapas:Reconhecimento da injustia (fatos discutidos)Compartilhamento e

compreenso dos efeitos prejudiciais (sentimentos expressados)Acordo sobre termos de reparao (reparao concordada)

Atingir compreenso sobre o comportamento futuro (reforma implementada).

A observncia dessas etapas, associada fidelidade aos valores restaurativos, que vai estabelecer em que grau uma

prtica pode ser considerada restaurativa.

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Conciliao

A conciliao vtima-ofensor uma das aplicaes mais rudimentares da denominada "Justia Consensual", e, at certo grau,

pode representar uma variante dos encontros presenciais entre ofensor e vtima.

Via de regra aplicada no curso de um processo judicial.

O conciliador procede com menor compromisso de neutralidade, orientando as partes no sentido de um acordo, no qual

costuma ser mais comum a nfase na soluo do processo do que do conflito em si.

O modelo da conciliao vigora no Brasil, para os delitos de menor potencial ofensivo praticados por ofensores maiores de

idade, desde a Lei 9.099 de 1995. Como porm a conduo desses encontros costuma ser bastante objetiva e superficial com

relao ao conflito, dificilmente assumem vis restaurativo.

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Mediao

A mediao desenvolve-se mediante um encontro presencial entre a vtima e o agressor, previamente preparado, e conduzido

por uma terceira pessoa, que deve manter neutralidade com relao aos envolvidos.

Esse terceiro, que pode um profissional ou um voluntrio, auxilia no estabelecimento de um dilogo em que a vtima e o

agressor compartilham informaes sobre ocorrido e refletem sobre como isso os afetou, objetivando a celebrao de um

acordo para definir a reparao dos danos, que pode ajustada de forma material (p. ex., uma indenizao) ou simblica (p.ex,

um pedido de desculpas).

De caractersticas bastante mais pragmticas e funcionais, os modelos de mediao se tornaram bastante utilizados em

programas norteamericanos e tambm em grande parte dos pases europeus. Mais recentemente, porm, o Frum Europeu

de Justia restaurativa tem dedicando maior interesse ao modelo das conferncias.

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Conferncias de Justia Restaurativa

As conferncias de Justia restaurativa surgiram na Nova Zelndia, como produto da absoro pelo sistema de justia oficial

das prticas de justia tribal da tradio dos indgenas maoris. Seu principal trao distintivo reside na composio do

encontro, cuja participao ampliada a membros das famlias, amigos e outras pessoas de referncia das partes do conflito

(ofensor e vtima), designados como suas comunidades de apoio. Tambm so acolhidos representantes dos servios

assistenciais que estejam relacionados ao atendimento do infrator . prevista tambm a participao de um policial. As

conferncias promovidas pela justia juvenil neozelandesa so conduzidas por um facilitador indicado pela justia e se

destinam a casos de relativa gravidade (embora no sejam aplicadas aos crimes mais graves, como homicdios), ou quando o

infrator reincidente.

Acolhidos os participantes, o facilitador cede a palavra ao policial, que apresentar o relato dos fatos. Infrator e vtima so

ouvidos, seguidos da manifestao dos respectivos acompanhantes. Segue-se um momento em que o infrator e seus

familiares se retiram para elaborar, de forma reservada, uma proposta de soluo. Aps, retornam e apresentam essa

proposta na presena da vtima e dos demais participantes, objetivando sua concordncia. Ao fim o policial tambm se

manifesta sobre a adequao da proposta do ponto de vista legal. Na Nova Zelndia desde 1989 esse processos

restautarativos so aplicados na Justia Juvenil. Desde 2002, foi prevista tambm a aplicao, em carter optativo, de

processos restaurativos na Justia Criminal.

Conferncias semelhantes s neozelandesas so tambm caractersticas dos programas de Justia restaurativa australianos.

Vrios Estados desse pas adotam abordagens tipo conferncias, com a peculiaridade de serem aplicadas por parte da

polcia em determinadas situaes por iniciativa prpria, noutras, por encaminhamento da promotoria. A aplicao

concentrada em infraes mais leves e o objetivo conscientizar os jovens infratores, que so chamados pelos policiais, com

a presena da famlia, para se responsabilizarem por seus atos e melhorarem seus comportamentos. Esse procedimento

restaurativo policial se notabilizou com o nome de modelo Wagga Wagga - nome da cidade onde teve origem .

Em regra as conferncias restaurativas observam as mesmas etapas identificadas no incio da Unidade, comuns aos

processos restaurativos de uma maneira geral. No obstante, embora mais trabalhosas em sua implementao, tem-se

reconhecido em favor do modelo das conferncias diversas vantagens comparativas com relao ao modelo da mediao

vtima-ofensor. Entre essas vantagens pode-se alinhar um distensionamento na polarizao da relao ofensor-vtima, a

maior facilidade de manter-se o fluxo das comunicaes, pela ajuda dos apoiadores s manifestaes dos envolvidos, a maior

riqueza de pontos de vista na discusso dos fatos, e a diversidade de sugestes que podem surgir quanto ao plano de

reparao.

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Crculos de resoluo de conflitos e de prolao de sentena

Os crculos de resoluo de conflitos surgem associados ao resgate de tradies indgenas norteamericanas e canadenses,

nos quais a comunidade atingida pelo problema se reune para se manifestar sobre o ocorrido e propor solues. A principal

caracterstica desses encontros est em que a palavra colocada disposio dos presentes, de forma sequencial e rotativa.

Coloca-se em circulao entre os presentes um objeto (basto falador), que passa de mo em mos, e cuja posse autoriza

o portador a fazer uso da palavra nico momento em que cada pessoa poder se manifestar, exceo feita apenas ao

coordenador do encontro. A cada rodada, os participantes so convidados a manifestarem-se a respeito de um tema

diferente. comum essas etapas aparecerem relacionadas aos quadrantes do crculo, por sua vez indicando etapas rituais de

um processo simblico de transformao.

Os crculos de prolao de sentena surgiram no Canad, como estratgia de ampliar a participao de pessoas envolvidas

na administrao da justia em casos envolvendo jovens indgenas. Ocorrem quando h um processo em andamento, o qual

suspenso antes de ser prolatada a sentena para realizar-se uma reunio das partes do conflito, suas pessoas de

referncia e outros representantes da comunidade, o quais, na presena dos operadores jurdicos juiz, promotor, advogado

discutiro como poderia ser melhor solucionado o caso.

Nesses encontros, tanto pode ser realizado um acordo cujo cumprimento ir dispensar a prolao da sentena, quando, se o

acordo no ocorrer ou no for possvel (a gravidade do caso e as condies pessoais do infrator exigem uma medida privativa

da liberdade, p. ex), as contribuies do encontro podero ser levadas em conta na definio das providncias que sero

determinadas pelo juiz.

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Crculos de paz - Modelo Zwelethemba

Os Crculos de Paz de Zewlethemba representaram um desdobramento da experincia das Comisses de Verdade e

Reconciliao, que se realizaram na frica do Sul aps o trmino do regime do apartheid, como estratgia de recomposio

social do pas, abalado pela memria de inmeros e dolorosos crimes motivados pelas disputas raciais. Lideranas como

Nelson Mandela e Desmond Tutu acreditavam que, para que as feridas da sociedade, principalmente das famlias das vtimas

fossem curadas, os fatos violentos vividos pela populao no poderiam ser simplesmente anistiados. Por outro lado, o

sistema convencional de justia nem daria conta de processar eficazmente todos os culpados, nem as respostas punitivas

trariam a satisfao e a pacificao social necessria. Ao contrrio, ao mesmo tempo que fariam perdurar o clima de

hostilidades e confrontaes, as feridas continuariam abertas. As comisses de verdade e reconciliao foram ento criadas

como uma espcie de anistia, concedida como alternativa ao processo convencional aos ofensores que se dispusessem a

confessar seus crimes e tentar obter o perdo das vtimas ou seus familiares. A deciso ocorria mediante reunies pblicas,

que funcionaram como verdadeiros jris populares no qual se decidia se o ofensor seria perdoado ou se deveria ser

processado.

Os Comits da Paz nasceram posteriormente, inspirados na marcante experincia das Comisses de Verdade e

Reconciliao. Zwelethemba o nome de uma localidade da frica do Sul, situada prxima Cidade do Cabo, cuja

Universidade articulou a expanso da experincia para diversas outras cidades. Nesse modelo, cidados comuns recebem

um treinamento para atuarem como facilitadores de um encontro das partes, que comparecem acompanhados de familiares e

apoiadores. O objetivo do encontro gira em torno da identificao do que denominam de raiz do problema. Auxiliados por

esses facilitadores, ofensor e ofendido so ouvidos separadamente pela comunidade dos comparecentes, e ao final se

estabelece uma discusso visando melhor compreenso do problema e a construo de um acordo.

Dica: anote a e qualquer hora assista o filme "Em Minha Terra", de John Boorman, com Samuel Jackson e Juliette Binoche,

disponvel nas locadoras, e que mostra o trabalho de reconciliaes na frica do Sul ps apartheid.

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Boas Vindas

Ol!

Seja bem vindo Unidade IV do nosso Mdulo sobre Justia Resturativa. Nessa Unidade vamos abordar os seguintes

pontos:JR, Garantismo e Responsabilidade Penal JuvenilJR no ECA e mecanismos diversriosMecanismos extrajudiciais de

autocomposioRemisso e Justia RestaurativaA execuo do acordo restaurativoJustia Restaurativa no Projeto de Lei do

SINASE Prticas Restaurativas na execuo das MSE

Nosso objetivo ser explorar as possibilidades jurdicas e prticas de aplicao da Justia Restaurativa nos processos de

apurao de ato infracional e no atendimento execuo de medidas socioeducativas.

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JR e Responsabilidade Penal Juvenil

At aqui, apresentamos a Justia Restaurativa sem polemizar em torno da afirmao de que essas ideias tm sua origem no

seio e em razo das crticas ao Sistema de Justia Penal - cuja relao com as medidas socioeducativas nem sempre

reconhecida.

Lembre das Janelas de Disciplina Social que estudamos na Unidade 2 deste Mdulo.

Ao insistir excessivamente nos objetivos pedaggicos, assistenciais, e teraputicos da medida socioeducativa, alm de

promover uma disciplina social permissiva, arriscamos desprezar que essas medida so consequentes prticas de crimes,

e portanto expressam a fora coercitiva do Estado que se sobrepe aos direitos inviduais do adolescente, privando ou

restringindo sua liberdade.

Nosso desafio ao introduzir a Justia Restaurativa no Sistema de Atendimento Socioeducativo ser explorar novas estratgias

para manter ativado o vetor fora (ou seja, controle), sem que se deteriore, abusivamente, em violncia.

O exerccio de uma fora no-violenta ser to mais possvel quanto mais aprendermos a substituir a fora unilateral e

autoritria da coero estatal pela fora multilateral e democrtica da coeso social. Quando formos bem sucedidos nessas

prticas, estarems promovendo democracia e empoderamento, fundando um princpio de autoridade sustentada em valores

ticos e abrindo uma perspectiva de esperana para o Sistema de Justia Juvenil.

Mas antes de avanar, precisamos estar vacinados contra o contgio por uma cultura autoritria que ainda nos rodeia.

Sempre que a fora se exerce de forma vertical e impositiva, ou seja, de forma coercitiva, temos o risco de que ela se torne

abusiva e violenta. E no podemos esquecer que as medidas socioeducativas so por definio coercitivas. Portanto

qualquer interveno na esfera da liberdade do adolescente, por maior que seja a inteno pedaggica, deve ser cercada das

garantias legais (tais como os princpios da legalidade ou do devido processo legal, que voc j estudou no Mdulo IV),

destinados a proteger os direitos individuais contra os riscos de abusos de autoridade.

Na dvida entre sermos garantistas ou restaurativos, sejamos garantistas. Porque, se no pudermos ser ao mesmo tempo

garantistas e restaurativos, arriscaremos a usar as prticas restaurativas apenas como uma novo disfarce para velhas

prticas autoritrias.

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JR no ECA e mecanismos diversrios

Muito tem-se debatido a respeito de qual seria a melhor posio da Justia Restaurativa com relao justia convencional.

Deveria substitu-la? Seria uma justia alternativa? Seria apenas um conjunto de meios a serem utilizados de forma

complementar a ela?

Ao menos por ora, no seria produtivo pretender que a Justia Restaurativa esteja predestinada a substituir a atuao da

justia convencional. Isso talvez possa ser um horizonte futuro, to utpico quanto desejvel. Mas isso nem sempre seria

possvel como por exemplo, quando o ofensor negue a autoria da infrao, ou quando as partes no queiram de modo

algum se encontrar.

No obstante, essas idias j podem ocupar espao e, portanto, j podem produzir efeito imediato na nossa justia juvenil.

Em termos imediatos, as prticas inspiradas pela Justia Restaurativa podem ser vistas ora como complementares justia

convencional, servindo para humanizar o sistema, qualificar o atendimento e reduzir os danos da sua interveno, ora como

alternativas para buscar solues mais satisfatrias e gratificantes para os envolvidos, mais produtivas e seguras para a

sociedade, e menos gravosas para o infrator do que seria a responsabilizao penal, dispensando seu percurso pelas vias

tradicionais.

Quando coincidirem com alguma etapa processual anterior sentena, as prticas restaurativas podem ser compreendidas

como alternativa atuao convencional da justia, o que equivale dizer que pode ser considerada como um mecanismo

diversrio.

A adoo de mecanismos (ou meios, ou recursos, ou procedimentos, ou estratgias) diversrios representam uma das

diretrizes mais relevantes da normativa da ONU em matria de Justia Juvenil - decorrente do reconhecimento de que,

mesmo quando conduzido com a melhor das intenes, o contato do jovem com o sistema de justia e, pior, sua sujeio aos

respectivos mecanismos de responsabilizao, sempre ter um efeito contaminante negativo , e tender a produzir maiores

malefcios do que vantagens.

So chamados de diversrios os mais variados mecanismos legais tendentes a fazer desviar um processo penal do seu

fatdico caminho destinado a impor e fazer cumprir as sanes punitivas.

Nesse contexto, as prticas restaurativas podem ser relacionadas como uma alternativa ao sistema de justia convencional,

visto que oferecem possibilidade de agregar contedo, consistncia e confiabilidade aplicao desses meios.

Como veremos a seguir, o ECA permite flexibilidade jurdica suficiente para que as prticas restaurativas sejam amplamente

disseminadas na Justia Juvenil brasileira, e isso sem necessidade de qualquer alterao legislativa.

O maior desafio no est na lei, mas na necessidade de superar as barreiras culturais que empobrecem sua interpretao e

aplicao. So barreiras que se erguem tanto no mbito jurdico, onde predomina uma cultura retributiva, quanto no mbito do

atendimento tcnico, onde predomina uma cultura reabilitadora.

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Mecanismos extrajudiciais de autocomposio

comum que adolescentes sejam encaminhados ao sistema de justia por situaes de to pouca gravidade que muitas

vezes pairam dvidas sobre a caracterizao de ato infracional, ou se, mesmo caracterizado, teriam relevncia jurdica para

justificar a mobilizao do aparato judicial.

Por exemplo, imagine que, numa escola, um adolescente quebrou intencionalmente uma cadeira ou uma vidraa, ou que,

numa briga no recreio, dois garotos trocaram empurres, sem no entanto se ferir. Se casos assim forem encaminhados

polcia, eles acabariam por receber enquadramento infracional (crime de danos ou vias de fato, respectivamente). A questo a

definir ento ser a respeito da maior utilidade em restringir a ocorrncia a uma abordagem exclusivamente pedaggica, ou

da necessidade de apresentar o caso s autoridades de segurana e justia.

Supondo que a opo fosse resolver no mbito pedaggico, um processo restaurativo poderia ser utilizado como forma de

evitar o contato com o sistema de justia.

Este seria o exemplo de um mecanismo diversrio funcionando em sua mais completa expresso, uma vez que a soluo

restaurativa ocorreria antes mesmo do registro da ocorrncia policial.

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Remisso e Justia Restaurativa

Em diversos momentos da tramitao de um processo por ato infracional e inclusive antes e depois que o processo ocorra

o ECA abre espao para que sejam introduzidas prticas restaurativas. Essas oportunidades so representadas pela

possibilidade, a qualquer tempo, de ser ajustada a remisso, e pela modificabilidade da medida j em execuo.

A remisso pode ser ajustada como forma de excluso do processo (ECA, art. 126), ou para sua suspenso ou extino, a

qualquer tempo (ECA, art. 188), depois que instaurado o processo e at que seja prolatada a sentena. Conforme o art. 127

do ECA, a remisso pode incluir eventualmente o cumprimento de alguma das medidas protetivas ou socioeducativas que

no as privativas da liberdade.

Como vimos no tpico anterior, todas as oportunidades de ajustar-se a remisso representam oportunidades de aplicao das

prticas restaurativas. Se utilizadas de modo restaurativo, essas oportunidades processuais, traro grandes vantagens

comparando com o modo como tem sido aplicado o instituto da remisso nesses 20 anos de vigncia do ECA.

A ambientao de um encontro restaurativo, seja com ou sem a participao da vtima, sempre proporcionar melhores

condies para uma livre pactuao de compromissos do que uma tratativa, por mais cuidadosa que seja, estabelecida

diretamente entre o adolescente e os operadores do sistema de justia (promotor, defensor, juiz).

Considerando que j existam pessoas habilitadas preparao e conduo dos processos restaurativos, a maior dificuldade

na sua implantao estar em como organizar os encaminhamentos, ou seja, como inserir a prtica restaurativa dentro do

fluxograma dos encaminhamentos tradicionais.

Prtica restaurativa como forma de excluso do processo.Prtica restaurativa como forma de suspenso ou extino

processo.Prtica restaurativa como forma de suspenso ou extino processo.Acordo restaurativo e execuo da medida.

Acordo com cumulao com medida socioeducativa. Em qualquer das hipteses referida, e como usualmente se procede em

casos de remisso, a homologao do acordo, caso contemple a incluso do adolescente em acompanhamento

socioducativo, dar incio ao processo de execuo da medida socioeducativa. J no mbito do processo de execuo, se

tiver sido suficientemente completo, o acordo deve ser adotado como substitutivo do PIA, ou, ao menos, definir as bases

para a sua elaborao do PIA. Ao orientador caber considerar o conjunto dos compromissos contemplados no acordo como

condies de cumprimento da medida socioeducativa. Caso descumpridas essas condies, ou a prpria medida

socioeducativa, a situao ensejaria apreciao das consequencias do descumprimento em sede judicial. Pelas

caractersticas descritas, a medida que melhor se afeioa ao acordo restaurativo a de liberdade assistida.

Acordo com cumulao apenas de medida protetiva. No havendo o acordo restaurativo, ou seja, a remisso, contemplado a

aplicao de medida socioeducativa, mas apenas eventual medida de proteo, legalmente o acompanhamento do caso

deveria passar responsabilidade do Conselho Tutelar (ECA, art. 136, inc. VI). Pelas caractersticas descritas, as medidas

protetivas que melhor se afeioa ao acompanhamento do acordo restaurativo a de orientao, apoio e acompanhamento

temporrio (ECA, art. 101, inc. II).

Acordo sem cumulao de medida. No tendo sido acrescentada ao plano qualquer medida legal com relao ao adolescente

(protetiva ou socioeducativa), a remisso dada em carter puro e simples. Implicaes jurdicas do acordo restaurativo.

Se a remisso foi ajustada como forma de excluso ou extino do processo, sejam acrescidos ou no de medidas, o

eventual descumprimento do acordo poder ocasionar sua modificao, a pedido do adolescente ou do Ministrio Pblico

(ECA, art. 128), porm, caso o acordo no tenha sucesso, no poder ensejar sanes jurdicas .

Apenas a retomada do processo de apurao do ato infracional ocorrer, caso a remisso tenha sido adotada como forma de

suspenso do processo. Ou seja, se os compromissos do acordo restaurativo foram definidos sob a expressa ressalva de que

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deveriam ser cumpridos como condio para extino do processo, e o adolescente no os cumpriu, depois de ouvido para

justificar-se a respeito, o processo poder retomar seu percurso em direo sentena impositiva da medida .

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Execuo do Acordo Restaurativo Acordo com cumulao com medida socioeducativa.

Em qualquer das hipteses referida, e como usualmente se procede em casos de remisso, a homologao do acordo, caso

contemple a incluso do adolescente em acompanhamento socioducativo, dar incio ao processo de execuo da medida

socioeducativa. J no mbito do processo de execuo, se tiver sido suficientemente completo, o acordo deve ser adotado

como substitutivo do PIA, ou, ao menos, definir as bases para a sua elaborao do PIA. Ao orientador caber considerar o

conjunto dos compromissos contemplados no acordo como condies de cumprimento da medida socioeducativa. Caso

descumpridas essas condies, ou a prpria medida socioeducativa, a situao ensejaria apreciao das consequencias do

descumprimento em sede judicial. Pelas caractersticas descritas, a medida que melhor se afeioa ao acordo restaurativo a

de liberdade assistida.Acordo com cumulao apenas de medida protetiva.

No havendo o acordo restaurativo, ou seja, a remisso, contemplado a aplicao de medida socioeducativa, mas apenas

eventual medida de proteo, legalmente o acompanhamento do caso deveria passar responsabilidade do Conselho Tutelar

(ECA, art. 136, inc. VI). Pelas caractersticas descritas, as medidas protetivas que melhor se afeioa ao acompanhamento do

acordo restaurativo a de orientao, apoio e acompanhamento temporrio (ECA, art. 101, inc. II).Acordo sem cumulao de

medida.

No tendo sido acrescentada ao plano qualquer medida legal com relao ao adolescente (protetiva ou socioeducativa), a

remisso dada em carter puro e simples. Portanto, no estar sujeita a acompanhamento nem pelo Poder Judicirio, nem

pelo Conselho Tutelar. Os desdobramentos do acordo dependero apenas do que ficar combinado entre a coordenao do

encontro e os participantes. Implicaes jurdicas do acordo restaurativo.

Se a remisso foi ajustada como forma de excluso ou extino do processo, sejam acrescidos ou no de medidas, o

eventual descumprimento do acordo poder ocasionar sua modificao, a pedido do adolescente ou do Ministrio Pblico

(ECA, art. 128), porm, caso o acordo no tenha sucesso, no poder ensejar sanes jurdicas .

Apenas a retomada do processo de apurao do ato infracional ocorrer, caso a remisso tenha sido adotada como forma de

suspenso do processo. Ou seja, se os compromissos do acordo restaurativo foram definidos sob a expressa ressalva de que

deveriam ser cumpridos como condio para extino do processo, e o adolescente no os cumpriu, depois de ouvido para

justificar-se a respeito, o processo poder retomar seu percurso em direo sentena impositiva da medida .

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Prticas Restaurativas na Execuo das MSE

Vimos at aqui as possibilidades associadas utilizao de prticas restaurativas como mecanismo diversrio, ou seja, como

alternativas ao prosseguimento do processo judicial pela vias convencionais.

Alm da ampla abertura criada pelo ECA para introduzir prticas restaurativas, antes da sentena, atravs do instituto da

remisso, a lei nos concede uma ampla margem de oportunidades para aplic-las tambm depois de proferida a sentena,

caso em que podero ser compreendidas como mecanismos complementares atividade jurisdicional.

Isso ocorre porque, em respeito sua natureza peculiar de pessoa em desenvolvimento, o ECA estabelece tambm grande

flexibilidade no que se refere ao cumprimento das sentenas impositivas de medidas socioeducativas.

Tal orientao definida em lei tendo por base as medidas mais gravosas. Dentre as medidas de meio aberto, estabelece o

art. 118 2, com relao medida de liberdade assistida, que ela pode ser a qualquer tempo prorrogada, revogada ou

substituda por outra medida. J com relao s de meio fechado, o art. 121 2, diz que a internao no comporta prazo

determinado, devendo sua manuteno ser reavaliada, mediante deciso fundamentada, no mximo a cada seis meses.

A partir dessas regras, combinadas com a do art. 128 do ECA no que se refere medidas ajustadas por remisso,

estabelece-se uma interpretao sistemtica segundo a qual, respeitados determinados limites definidos em favor do

adolescente, qualquer medida pode ser objeto de ajustes e modificaes a qualquer tempo.

Evidenciado esse permissivo legal, pode-se afirmar que toda e qualquer oportunidade de reviso do PIA representa uma

oportunidade de introduzirem-se as prticas da justia restaurativa.

Isso porque o PIA, tanto na oportunidade de elaborao, quanto nas suas posteriores modificaes e ajustes, deve partir de

um levantamento das necessidades do adolescente vista da infrao cometida e suas consequencias.

Nada mais adequado para um refinamento dessa abordagem do que a aplicao das prticas restaurativas resultando em

acordos que podero substituir, ou ao menos subsidiar, tanto a elaborao dos planos de atendimento quanto os pareceres

tcnicos relativos definio dos objetivos, metas e condies de cumprimento da medida.

Melhor ainda, os compromissos assumidos em um processo restaurativo sero seguramente mais autnticos do que sua

concordncia em cumprir objetivos traados pelo juiz na sentena ou pelo tcnico na elaborao unilateral do plano. Alm

disso, a pactuao desses compromissos no se limitar ao adolescentes e aos objetivos a serem assumidos por ele, mas

envolvero todos os participantes do encontro num processo de co-responsabilizao.

Na Unidade 5 exploraremos melhor as formas de aproveitar essas oportunidades.

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Projeto de Lei do SINASE e a Justia Restaurativa

Como j vimos, no se faz necessria qualquer modificao no ECA para que as prticas da justia restaurativa possam ter

espao na Justia Juvenil brasileira.

Apesar disso, o Projeto de Lei que institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, e regulamenta a execuo das

medidas destinadas a adolescente que pratique ato infracional - j aprovado pela Cmara dos Deputados (PL 1627/2007) e

em tramitao no Senado (PLC 134/209) - contempla dispositivos que vo consagrar a Justia Restaurativa entre ns.

A primeira e mais importante contribuio da lei em tramitao, no que se refere ao contedo das medidas socioeducativas,

est em definir os objetivos dessas medidas (melhor diramos, objetivos do atendimento ou do cumprimento das medidas) .

Segundo o art. 1 , 2 desse projeto de lei,

Entende-se por medidas socioeducativas as previstas no art. 112 da Lei n 8.069, de 13 de julho de 1990, Estatuto da Criana

e do Adolescente, as quais tm por objetivos:

I - A responsabilizao do adolescente quanto s conseqncias lesivas do ato infracional, sempre que possvel incentivando

a sua reparao;

II - A integrao social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de seu

plano individual de atendimento; e

III - A desaprovao da conduta infracional, efetivando as disposies da sentena como parmetro mximo de privao de

liberdade ou restrio de direitos, observados os limites previstos em lei.

Ao definir, no inciso I, como objetivo prevalente das medidas socioeducativas a responsabilizao do adolescente quanto s

consequencias lesivas do ato infracional, sempre que possvel incentivando sua reparao, o projeto imprime uma diretriz

essencialmente restaurativa como justificao da medida socioeducativa.

O conjunto desses objetivos, alis, merece uma observao conjunta.

Recorrendo mais uma vez sistematizao oferecida pelo modelo terico das janelas da disciplina social, possvel

compreender melhor a conjugao desses objetivos. O inciso II, que refere como objetivo da medida a integrao social do

adolescente, est nitidamente relacionado ao eixo apoio. J o inciso III, que refere como objetivo da desaprovao da

conduta infracional, est relacionado ao eixo controle. Resultado da interseco entre eles, e assumindo carter prevalente,

o inciso I se refere responsabilizao, como produto final de um sistema de justia juvenil restaurativa.

Podemos rever agora o grfico das Janelas de Disciplina Social que estudamos na Unidade 2, adaptando-o ao atendimento

das medidas socioeducativas segundo regulamentadas Projeto de Lei do SINASE. Clique aqui.

Tambm ao definir os princpios regentes das medidas socioeducativas, atravs de 2 dos 9 princpios prescritos, a lei

projetada refora a inteno de incorporar as prticas restaurativas ao nosso sistema de justia juvenil:

Art. 35 A execuo das medidas socioeducativas reger-se- pelos seguintes princpios:

II - excepcionalidade da interveno judicial e da imposio de medidas, favorecendo-se meios de autocomposio de

conflitos;

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III - prioridade a prticas ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possvel atendam s necessidades das vtimas;

Como voc pode concluir, estamos bastante prximos de instituir no Brasil um novo modelo de Justia Juvenil Restaurativa.

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Prticas de JR nos Programas Socioeducativos

Os procedimentos restaurativos completos, principalmente envolvendo encontros entre ofensores, vtimas e suas

comunidades, nem sempre sero possveis. Mas mesmo que realizemos uma quantidade limitada de encontros, o estudo e a

experimentao das ideias sobre JR podem modificar muito o nosso modo de VER e, portanto, de FAZER a justia.

Esse novo olhar envolve (a) participao dos envolvidos, (b) foco na consequencia da infrao, (c) escuta das necessidades

das vtimas e (d) reparao danos, e, independentemente da realizao dos encontros, podem nortear a proposta pedaggica

do programa.

Afinal, qual deve ser o diferencial do atendimento pedaggico a um adolescente autor de ato infracional? Educao,

assistncia e sade so devidos a qualquer jovem de sua idade. Ento, o que deve estar no centro da medida? Que

perguntas devem ser feitas nas reavaliaes? O que levar em considerao? Se o adolescente foi bem na escola, se

comportou-se bem, se manteve bons hbitos de higiene, mostrou-se participativo nas atividades? Sim, isso importante. Mas

o que teve isso a ver com a superao do ato infracional?

Retornemos s perguntas fundamentais formuladas pelo Prof. Howard Zher, que vimos na Unidade 2:

provvel que o adolescente tenha na ponta da lngua o artigo do Cdigo Penal em que foi enquadrado. E dir que cumpre a

medida para "pagar a sua". A tradio retributiva no deixa dvidas sobre as perguntas que faz e imprime suas respostas de

forma indelvel.

Mas ser que a abordagem do programa est ajudando a refletir sobre quais as causas e consequencias da infrao, de

modo que o adolescente possa compreend-las e evit-las no futuro, elaborando um plano de comportamentos mais

saudvel para si e para os outros? Ser que ele sabe dizer quem foi prejudicado pela infrao? Saber o que a vtima sofreu,

ou que dificuldades ela enfrentou, em consequencia do seu ato? Alguma vez ele se colocou no lugar da vtima? Pde

compreender que no s a vtima direta foi atingida, mas que seus familiares, seus amigos, e at ele prprio esto sofrendo

essas consequencias? Ser que ele teria como pagar os danos materiais e emocionais da vtima? Alis, ser que ele chegou

a se perguntar o que poderia fazer, ainda que indiretamente, para reparar os danos que causou?

em torno dessas perguntas dever girar o foco de um atendimento socioeducativo baseado no princpio da

responsabilidade ativa sugerido pela Justia Restaurativa.

Certa ocasio, um adolescente que cumpria internao por latrocnio numa Unidade Socioeducativa em Porto Alegre,

perguntou sua tcnica se poderia se oferecer para doar sangue quando obtivesse autorizao para atividades externas.

"Porque?" - Ela perguntou. "Porque eu vi na TV que quem doa sangue pode salvar vidas. E como eu participei de um fato em

que uma pessoa perdeu a vida, eu poderia doar sangue para salvar vidas..."

Ser que ele entendeu?

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Boas Vindas

Ol!

Seja bem vindo Unidade 5 do nosso Mdulo sobre Justia Restaurativa. Nesta Unidade mostraremos como voc poder

transformar a teoria em prtica, a exemplo do que vem ocorrendo em Porto Alegre desde 2005: A experincia do Projeto

Justia para o Sculo 21Central de Prticas RestaurativasEstrutura e Passos do ProcedimentoTipos de ProcedimentoJustia

Juvenil Restaurativa na ComunidadeOutras sugestes de aproveitamento

Nosso objetivo ser ilustrar concretamente como se pode converter as idias sobre Justia Restaurativa em novas estruturas

e procedimentos, busca de resultados que humanizam e do maior efetividade ao atendimento socioeducativo.

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A experincia do Projeto Justia para o Sculo 21

Conforme j referimos na Unidade I deste mdulo, a Justia Restaurativa ingressou oficialmente no Sistema de Justia

brasileiro a partir de 2005, atravs dos trs Projetos Piloto apoiados pela Secretaria da Reforma do Judicirio do Ministrio da

Justia e do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD.

O Piloto de Porto Alegre, denominado Justia para o Sculo 21, tem por objetivo a implantao das prticas da Justia

Restaurativa na pacificao de conflitos e violncias envolvendo crianas e adolescentes. O foco prioritrio aplicar a JR nos

processos por atos infracionais e no atendimento das medidas socioeducativas, ponto de partida para uma estratgia de

difuso que atravessa, de forma transversal, toda a rede de atendimento infncia e juventude.

Passados cinco anos do seu incio, o Projeto assumiu a forma de Programa, j capacitou mais de 600 pessoas em cursos

presenciais, e abrange aplicaes por diferentes situaes de conflitos, conduzidas pelos diversos parceiros institucionais.

Foram essas experincias que permitiram a sistematizao das motodologias que apresentamos na lminas a seguir.

Para uma apresentao em vdeo das principais aprendizagens trazidas pela Justia Restaurativa ao Projeto Justia para o

Sculo 21, clique abaixo: Entrevista com o Prof. Leoberto TV Senado - Primeira parte

Entrevista com o Prof. Leoberto TV Senado - Segunda parte

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A Central de Prticas Restaurativas

Criada a partir de 2006 para sediar as aes prticas do Projeto, a Central de Prticas Restaurativas assumiu as seguintes

caractersticas e funes:Espao de servio interinstitucional, sob a coordenao do Juizado, destinado a promover as

prticas restaurativas no atendimento ao adolescente autor de ato infracional;Espao de capacitao em servio, voltado

formao continuada de novos coordenadores de prticas (reunies de autosuperviso, campo para estgios

supervisionados);Espao de difuso operacional das prticas restaurativas na Rede da Infncia em Porto Alegre, mediante a

participao induzida de profissionais da rede de atendimento nos crculos restaurativos, sempre que o adolescente tivesse

contato com outros programas sociais antes de ingressar no ato infracional.

A partir dessa experincia, e seguindo o modelo organizacional a sistematizado, outras instituies parceiras passaram a

estabelecer as respectivas centrais, respeitados alguns compromissos e condies:Haver um grupo de pessoas com

formao mnima em Justia Restaurativa, sendo ao menos uma delas com habilidades para a coordenao de encontros;Ter

apoio institucional, inclusive com carga horria disponvel para os procedimentos e reunies de estudos e de superviso;

Seguir o procedimento previamente definido para a realizao dos encontros;Documentar os encontros;Realizar encontros de

superviso (relato e discusso dos casos para avaliao dos passos, fidelidade aos valores, etc); Realizar encontros de

estudos e aprofundamento da teoria e da prtica.

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Estrutura e Passos do Procedimento

O procedimento restaurativo no mbito do Programa Justia para o Sculo 21 est estruturado em trs etapas (Pr-Crculo,

Crculo, Ps-Crculo), e a realizao do encontro est igualmente organizada em trs passos (compreenso mtua,

autoresponsabilizao, e acordo):Pr-Crculo: Propicia e organiza as pr-condies que permitiro a convergncia de todos

os participantes de crculo em torno de um mesmo fato. Os participantes so convidados pessoalmente ou atravs de

contatos telefnicos ou correspondncia.Crculo: Propicia que as pessoas possam falar e serem ouvidas, com respeito,

esclarecendo suas dvidas e anseios sobre o fato que iniciou o conflito, e definido os termos de um acordo voltado

reparao direta ou indireta do dano e integrao social do ofensor. A realizao do encontro subdividida em trs

momentos distintos:1 Momento - Compreenso Mtua - Est voltado para as necessidades atuais dos participantes em

relao ao fato ocorrido, e orientado para a compreenso mtua, entre os participantes, destas necessidades.2 Momento -

Auto-responsabilizao - Est voltado para as necessidades dos participantes ao tempo dos fatos, e orientado para a

auto-responsabilizao dos presentes.3 Momento - Acordo - Est voltado para as necessidades dos participantes a serem

atendidas, e orientado para o acordo.Ps-Crculo: Objetiva verificar o cumprimento das aes e o grau de restauratividade

alcanado com relao a todos os envolvidos, alm de ressignificar a ao cumprida, e ou adaptar o acordo a novas

condies.

Para visualizar uma apresentao mais detalhada dos passos do Crculo, CLIQUE AQUI. Para referncias da fonte, clique

aqui.

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Tipos de Procedimentos

A estrutura do procedimento (pr-crculo, crculo e ps-crculo), assim como o passo a passo da realizao dos encontros

(compreenso mtua, auto-responsabilizao, acordo), apresentados no slide anterior, so aplicveis s mais diversas

situaes: desde uma briga no ptio da escola, at um homicdio.

Mas acontece de a sua aplicao acontece em diferentes ambientes, ou envolvendo diferentes participantes, ou com

diferentes propsitos. Em razo disso, com o tempo, foram sendo sistematizadas algumas variaes do procedimento, que

apresentamos a seguir: Crculos Restautativos Encontros com a participao direta ou indireta da vtima, infrator e

respectivas comunidades de apoio, tendo por objeto a confrontao dos envolvidos com as respectivas responsabilidades

pelas consequncias do ato infracional, e acordo contemplando alternativas para sua reparao.Crculos Familiares -

Encontros sem participao da vtima direta, abrangendo apenas o infrator e respectiva comunidade de apoio, os quais

comparecem na condio de afetados pela infrao (vtimas indiretas) tendo por objeto a confrontao dos envolvidos com as

respectivas responsabilidades pelas consequncias do ato infracional, e acordo contemplando alternativas para sua

reparao.Crculo de Compromisso Variante do Crculo Familiar, sem participao da vtima, sem participao da vtima,

abrangendo apenas o infrator e respectiva comunidade de apoio, tendo por objeto a pactuao do PIA - Plano Individualizado

de Atendimento especificando as condies de cumprimento da medida socioeducativa, em qualquer de suas etapas de

elaborao, ajustamento ou implementao.Crculos de Sentena Variante dos procedimentos anteriores, com ou sem

participao da vtima, aplicvel a situaes em a gravidade dos fatos e ou a presena de interesses indisponveis tornem a

soluo final ou algum de seus aspectos insuscetvel de acordo, caso em que as proposies dos participantes tero por

objeto subsidiar a prolao da sentena mediante indicao de alternativas de reparao ou compensao dos danos da

infrao.Dilogos Restaurativos - Encontros informais entre os envolvidos na infrao ou do infrator com a respectiva

comunidade de apoio. So encontros que resultam do aproveitamento da presena simultanea e ocasional dos envolvidos (

sem observncia dos requisitos preparatrios do pr-crculo), nos quais segue-se o passo a passo dos crculos, mas de forma

mais rpida e superficial.

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Justia Juvenil Restaurativa na Comunidade

Em 2010, o Programa Justia para o Sculo 21 est avanando para a criao dos Ncleos de Justia Juvenil Restaurativa

na Comunidade.

Nos quatro bairros com maiores ndices de violncia de Porto Alegre, seguindo o modelo organizacional sistematizado na

experincia do Juizado, sero criadas Centrais Comunitrias de Prticas Restaurativas.

As novas Centrais atendero na prpria comunidade, mediante procedimento restaurativo, situaes envolvendo atos

infracionais de menor potencial ofensivo como ameaas, leses leves, danos, injria, calnia, difamao, furtos de pequeno

valor. Esse procedimento ter reconhecimento oficial, e, sempre que o acordo restaurativo for possvel, e enquanto ele estiver

sendo cumprido, vai evitar o encaminhamento do adolescente para os trmites tradicionais ( Delegacia de Polcia, Promotoria

e Juizado).

O projeto liderado pelo Ministrio Pblico do Estado do Rio Grande do Sul, tem financiamento da Secretaria da Reforma do

Judicirio e da Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica, e tem como parceiros executores duas das

principais entidades no-governamentais da rede da infncia e da juventude em Porto Alegre: o CPCA (Centro de Proteo

da Criana e do Adolescente) e a ACM (Associao Crist de Moos).

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Outras sugestes de aproveitamento

O atendimento socioeducativo um terreno frtil para que sejam criadas diversas atividades de vis restaurativo, ainda que

no envolvendo dinmicas com a participao direta dos envolvidos num determinado conflito ou ato infracional.

Como estudamos na Unidade 3, uma prtica pode ser considerada restaurativa na medida em que se mantenha fiel aos

valores restaurativos (estudados ao final da Unidade 2), bem como que proporcione:O reconhecimento da injustia O

compartilhamento e a compreenso dos efeitos prejudiciais dos fatosUm acordo sobre como reparar o dano e Uma

compreenso mais qualificada sobre comportamentos futuros.

Seguem alguns exemplos para servir de inspirao para voc, dosando os ingredientes acima, passar a utilizar criativamente

os conhecimentos que est adquirindo aqui:Painis com vtimas:

Voc pode promover um encontro de pessoas voluntrias, que j tenham sido vtimas de fatos como assaltos, por exemplo.

Infelizmente no ser difcil encontrar pessoas que j tenham passado por isso entre colegas servidores da instituio, ou de

familiares dos prprios adolescentes. Organize para essa ou essas pessoas prestarem um depoimento, relatando com a mais

viva emoo a experincia de ter sido vitimizada, os prejuzos que sofreu, os abalos emocionais que certamente enfrentou

depois.

Aps o relato, pea aos adolescentes que repitam o que ouviram essa vtima dizer, e promova uma reflexo objetivando que

se coloquem no lugar dela.Encontros com familiares:

A exemplo da reflexo promovida nos Crculos Familiares, mais atuando de forma mais aberta, voc pode promover um

encontro com a participao de diversos adolescentes e respectivos familiares, pedindo alguns desses familiares tragam o

seu depoimento sobre como foi afetado pela prtica do ato infracional pelo seu filho. Proponha que essa pessoa conte como

soube da ocorrncia (ou da apreenso) do adolescente, como se sentiu ao v-lo na polcia (ou detido), como est convivendo

com a situao agora, etc. A seguir, pea que algum adolescente, de outra famlia, conte com suas palavras o que acabou de

ouvir, e assim por diante.Reflexes individuais e em Grupos operativos

O tema das conseqncias do ato infracional, envolvendo o sofrimento trazido para a vtima, a perda de seus bens ou

eventuais dores fsicas ou emocionais que lhe foram impostos pelo infrator pode ser um ingrediente muito rico para um

processo reflexivo em atendimentos individuais ou em grupo, principalmente quando utilizando da metodologia dos grupos

operativos.

Esses exemplos so apenas ilustrativos. Outros como a leitura de textos, a exibio de filmes, seguidos de uma reflexo de

vis restaurativo nos moldes sugeridos, se puderem ser incorporados s rotinas do atendimento socioeducativo, ajudaro a

produzir uma responsabilizao no-culpabilizante e bastante eficiente.

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Ttulo

Caro Cursista.

Sabemos que voc est quase exausto. Quase, porque ainda ter flego para mais um importantssimo Mdulo antes de

concluir o curso. Mas dizem que quem faz o que gosta no cansa, e esperamos que voc tenha gostado e, portanto, no

tenha se cansado dessas horas que passamos ao redor da fogueira restaurativa.

Se voc quiser mais lenha para manter essa chama acesa, sugerimos que voc ainda possa acessar os seguintes materiais:

VDEOS

Convite para os Crculos Restaurativos: parte 1, parte 2

Justia Restaurativa nas Escolas: parte 1, parte 2

JR na TV Senado: parte 1, parte 2

TEXTOS DE APOIO

Em Busca de um Paradigma: Uma Teoria de Justia Restaurativa - Paul Mc Cold e Ted Wachtel (clique aqui)

Apostila do Curso de Iniciao em Justia Restaurativa do Projeto Justia para o Sculo 21 - Leoberto Brancher (org) (clique

aqui)

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Boas vindas

Ol!

Seja bem vindo Unidade 1! Nesse primeiro contato vamos tratar dos seguintes pontos:O que Justia Restaurativa?Razes

histricas da Justia Restaurativa As primeiras experincias restaurativasA institucionalizao de Conferncias e Crculos O

lugar da vtima no processo penalOs primeiros Pilotos e Programas de JR no Brasil A Justia Restaurativa e as Naes

Unidas.

Nosso objetivo nessa Unidade dar uma viso panormica sobre as origens, desenvolvimento e importncia da Justia

Restaurativa.

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Para comeo de conversa

Para aquecer nossa conversa, assista agora um filme (17 minutos) que faz um grande resumo das idias que vamos

desenvolver nesse mdulo sobre Justia Restaurativa.

Link 01 - Projeto Justia para o Sculo 21 - Semeando Justia, Pacificando Violncias - Parte 1

Link 02 - Projeto Justia para o Sculo 21 - Semeando Justia, Pacificando Violncias - Parte 2

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O que Justia Restaurativa?

Na Unidade 2 estudaremos mais a fundo o conceito de Justia Restaurativa. Mas como estas ideias ainda so novidade para

muita gente, vamos adiantar um pouco.

Para comeo de conversa, vamos definir Justia Restaurativa como "Um novo modelo de justia, focado nas relaes

pessoais prejudicadas pela infrao, suas consequncias e danos, e no na definio de culpados e punies. A Justia

Restaurativa valoriza a autonomia das pessoas e o dilogo entre elas, criando oportunidades para os envolvidos e

interessados (ofensor, vtima, familiares, comunidades) se expressarem e interagirem. Assim, viabiliza a criao de aes que

possibilitam prevenir a violncia e lidar com suas implicaes(*)".

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Razes histricas da Justia Restaurativa

Justia Restaurativa (JR) um conceito recente, surgido h no mais do que trs dcadas, mas que vem-se difundindo muito

rapidamente no mundo inteiro.

A velocidade da sua difuso justificada por muitos em razo de que a JR seria apenas aparentemente uma novidade. Na

prtica, ela representaria um reavivamento de modelos ancestrais de justia e de prticas de justia tribal, em razo disso

presentes na memria coletiva da humanidade. Uma referncia nessa linha consta inclusive de Resoluo da ONU. Tambm

h autores que identificam suas concepes com os preceitos bblicos sobre Justia. Segundo esse ponto de vista, a JR um

modelo intuitivo, visto que j vrias sociedades primitivas adotavam procedimentos semelhantes.

Na verdade, uma retomada de tradies indgenas pode ser identificada no surgimento de vrias das experincias atuais de

Justia Restaurativa, e isso contribuiu para dar um sentido atemporal sua existncia.

Por exemplo, as tradies indgenas norteamericanas e canadenses inspiraram os procedimentos restaurativos denominados

Crculos de Paz e Crculos de Sentena, modelos que sero melhor apresentados na Unidade IV. Mas o exemplo principal

dentre eles o da Nova Zelndia, onde prticas tribais das comunidades Maori, descendentes dos habitantes originais da

regio, foram incorporadas oficialmente aos processos da Justia Juvenil no ano de 1989, atravs da promulgao do

Estatuto das Crianas, Jovens e suas Famlias uma espcie de ECA neozelands.

Dicas:

Selecionamos para voc assistir quando puder uma apresentao de slides ("A Cano dos Homens", com durao em torno

de 3 minutos), que ilustra uma prtica tradicional, de inspirao restaurativa, adotada por uma tribo africana.

Tambm como atividade opcional, sugerimos que voc assista um filme mostrando uma Conferncia de Justia Restaurativa

da Nova Zelndia, que reala a relao dessas prticas com as tradies maoris:

Link 01 - Filme Justia Restaurativa Nova Zelndia - Parte 1

Link 02 - Filme Justia Restaurativa Nova Zelndia - Parte 2

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As primeiras experincias restaurativas

Segundo Howard Zher, professor norteamericano que considerado um dos fundadores tericos da Justia Restaurativa, o

primeiro caso judicial resolvido de modo restaurativo, segundo os moldes atuais, teria ocorrido em 1974, na provncia de

Ontrio, no Canad.

Dois jovens eram processados por danos contra o patrimnio, quando um grupo de voluntrios que atuava junto Justia

local, sugeriu ao juiz a realizao de um encontro entre os dois rapazes com suas vtimas. O juiz aceitou a sugesto e

determinou, na sentena, que fosse realizado o encontro. O resultado foi um acordo para que os rapazes reparassem os

danos, e a experincia originou o primeiro programa de mediao penal do Canad.

Aos poucos as novas idias foram sendo formuladas teoricamente e testadas na prtica em diferentes lugares. Por exemplo,

atravs de grupos religiosos que atuavam em presdios ajudando detentos a expressar arrependimento atravs de cartas ou

encontros presenciais para se desculparem com as vtimas dos seus crimes, ou familiares delas.

medida em que amadureciam e apresentavam bons resultados, experincias ocasionais se transformavam em projetos

melhor organizados, que por sua vez evoluam, gerando maior volume de casos e permitindo sua sistematizao, at

transformar-se em programas e incorporarem-se s rotinas institucionais.

Essa tendncia a se constiturem de baixo para cima vem sendo um importante fator de sucesso e sustentabilidade dos

programas de Justia Restaurativa.

Aos poucos, outras contribuies viriam a enriquecer o processo, como veremos a seguir.

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A institucionalizao de Conferncias e Crculos

Inicialmente as prticas da Justia Restaurativa, com suas feies atuais, se propagaram mais amplamente em pases de

lngua inglesa.

que nestes pases vigora um sistema jurdico denominado Common Law, onde as prticas jurdicas so baseadas mais

nos costumes e nas decises dos tribunais do que na lei, o que lhes permite uma relativa flexibilidade e abertura para

incorporar procedimentos inovadores.

A experincia da Justia Juvenil da Nova Zelndia, nesse sentido, referencial e singular, porque foi o primeiro pas do

mundo a oficializar a Justia Restaurativa, com a introduo das Conferncias de Grupo Familiar como instrumentos do

prprio processo judicial, o que ocorreu ainda em 1989,

A experincia neozelandeza tambm referencial porque foi nesse pas que o modelo da mediao vtima-ofensor foi

enriquecido pelo mobilizao de um grupo ampliado de participantes para os encontros, em respeito tradio dos

aborgenes Maori.

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O lugar da vtima no processo penal

No campo terico, alguns autores situam o surgimento do conceito de Justia Restaurativa como datado do final dos anos 60

e incio dos anos 70 do sculo passado, resultante da confluncia de trs importantes fatores scio-histricos:A intensificao

das crticas disfuncionalidade das instituies totais, especialmente por parte de intelectuais da esquerda norte americana;

A mobilizao pelo resgate do sentido de pertencimento a uma comunidade; eA redescoberta do papel das vtimas dentro do

processo penal .

Sem desconsiderar a importncia dos demais aspectos, vamos nos dedicar um pouco mais questo da vtima e seu lugar

dentro de um processo da Justia Penal.

Atualmente, as vtimas ocupam um lugar secundrio nos processos da Justia Penal. So chamadas para depor sobre os

fatos, como meras testemunhas da acusao.

O Sistema de Justia no costuma se preocupar com elas como pessoas, com o que sentiram, com o que sofreram ou

perderam em razo dos acontecimentos. Se perguntas a esse respeito forem feitas, possivelmente no sero na inteno de

buscar solues para os problemas da vtima, mas para reunir mais elementos a fim de endurecer o castigo a ser aplicado ao

ofensor.

Ao contrrio da Justia Tradicional, a participao ativa da vtima e a reparao dos danos sofridos por ela so pilares

conceituais do modelo restaurativo. Alm de reformular conceitos tericos, a participao da vtima sugere uma nova

metodologia, colocando o conceito em ao: um encontro entre ofensor e vtima.

Embora essa posio secundria das vtimas seja parte da realidade atual, ela resulta de sculos de evoluo das instituies

penais, uma evoluo relacionada ao prprio modelo civilizatrio que vivemos.

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Os primeiros Pilotos e Programas de JR no Brasil

No Brasil, a introduo oficial da Justia Restaurativa ocorreu no ano de 2005, quando a Secretaria da Reforma do Judicirio

do Ministrio da Justia, com patrocnio do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PNUD, apoiou a criao

de trs projetos pilotos.

Como parte dessa mesma iniciativa, tambm foram realizados dois importantes Seminrios Internacionais (Braslia, 2005 e

2006), traduzidos diversos textos que serviriam como materiais de estudo aos integrantes dos projetos-piloto, e tambm foram

publicados dois livros com artigos especializados, tanto de autores estrangeiros quanto prestigiando a incipiente produo

nacional.

Esses primeiros projetos-piloto foram assim localizados:Juizado Especial Criminal do Ncleo Bandeirantes, em Braslia, DF -

Aplicao originalmente restrita a casos de delitos de menor potencial ofensivo praticados por infratores maiores); Juizado da

Infncia e da Juventude de So Caetano do Sul, SP - Aplicao originalmente enfatizando casos de violncia escolarJuizado

da Infncia e da Juventude de Porto Alegre (Projeto Justia para o Sculo 21) - Aplicao originalmente enfatizando a

execuo das medidas socioeducativas, mas tendo como objetivo mais amplo "difundir as prticas da Justia Restaurativa na

pacificao de conflitos e violncias envolvendo crianas e adolescentes."

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Resolues da ONU

O tema da Justia Restaurativa entrou formalmente na pauta das Naes Unidas em 28 de julho de 1999, quando o Conselho

Econmico e Social aprovou a Resoluo n. 1999/28, intitulada Desenvolvimento e Implementao de Medidas de Mediao

e Justia restaurativa na Justia Criminal.

Atravs dessa Resoluo, o Conselho passou a recomendar a formulao de padres das Naes Unidas no campo da

mediao e da justia restaurativa.

Evoluiu da a Resoluo 2000/14, de 27 de julho de 2000, intitulada Princpios Bsicos para utilizao de Programas

Restaurativos em Matrias Criminais. Esse instrumento props que a ONU mobilizasse a comunidade internacional para

estabelecer princpios comuns na utilizao de programas de justia restaurativa em matria criminal.

A Justia Restaurativa tambm foi contemplada, embora superficialmente, na Resoluo da Assemblia-Geral n. 56/261, de

31 de janeiro de 2002, intitulada Planejamento das Aes para a Implementao da Declarao de Viena sobre Crime e

Justia Respondendo aos Desafios do Sculo Vinte e Um.

Finalmente, com base no trabalho de um Grupo de Especialistas em Justia restaurativa reunido em encontro ocorrido em

Ottawa, Canad, de 29 de outubro a 1 de novembro de 2001, sobreveio a promulgao da Resoluo n. 2002/12, do

Conselho Econmico e Social da ONU, que o documento-sntese da Justia Restaurativa na normativa internacional sobre

o tema.

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Perspectivas da JR na Justia Juvenil brasileira

No que se refere Justia Juvenil e aos adolescentes em conflito com a lei, as iniciativas de Justia Restaurativa tm

referencias muito concretas na poltica de atendimento socioeducativo do nosso pas.

Para encontr-las, basta examinar as inovaes da pauta normativa do Sistema de Justia Juvenil e do Sistema Nacional de

Atendimento Socioeducativo, SINASE (2006) que guardam relao direta com princpios de responsabilizao prprios da

Justia Restaurativa.

Nessa mesma direo, o PLC 134/2009 tambm privilegia a Justia Restaurativa e seus meios de autocomposio de

conflitos como resposta prioritria atuao infracional juvenil. o que dispe o Projeto nos seus arts. 1, 2, inc. I e o art.

35, incs. II e III, dos quais voltaremos a nos ocupar ao longo da Unidade IV.

Numa perspectiva eminentemente prtica, a tendncia incorporao da Justia Restaurativa na Justia Juvenil brasileira

tem como destaque a institucionalizao da Central de Prticas Restaurativas, em funcionamento desde 2005 em bases

experimentais no Sistema de Justia Juvenil do Juizado da Infncia e Juventude de Porto Alegre.

Em abril de 2010 esse espao, at ento considerado meramente experimental, foi incorporado como instncia de

atendimento nos processos judiciais no mbito das medidas socioeducativas, guardando interface desde o atendimento inicial

do adolescente em conflito com a lei, bem como com os processos de conhecimento e de execuo de medidas .

Outro dado importante que no pode passar desapercebido j que estamos bem no meio dele: que no ano de 2010, ao

desencadear o processo de formao continuada de operadores do SINASE, do qual estamos fazendo parte nesse exato

momento, a SEDH sinalizou tambm para uma matriz de formao dos operadores da Poltica de Atendimento da

Socioecuao que inclui entre seus itens a Justia Restaurativa.

Ora, no fosse por mais nada, somos todos herdeiros de muita responsabilidade: tornarmos concretas as possibilidades de

uma cultura restaurativa no mbito do atendimento socioeducativo.

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Boas Vindas

Ol!

Seja bem vindo Unidade 2 do nosso Mdulo sobre Justia Restaurativa. Nesta Unidade vamos tratar sobre:Conceito de

Justia RestaurativaPerspectivas bsicas e transformao de papisModelos de Justia: Punir, Tratar e Restaurar As

Janelas de Disciplina SocialPrincpios de JR segundo a ONUValores Fundamentais da Justia Restaurativa

Nosso objetivo ser aprofundar a compreenso dos principais conceitos, princpios e valores sobre Justia Restaurativa e

definir sua contribuio potencial na transformao do Sistema de Justia Tradicional.

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Conceito de Justia Restaurativa

O conceito mais difundido atualmente define Justia Restaurativa como

Um processo atravs do qual todas as partes envolvidas em um ato que causou ofensa reunem-se para decidir

coletivamente como lidar com as circunstancias desse ato e suas implicaes para o futuro" .

(Para aprofundar a anlise dos elementos conceituais, clique aqui.)

No seu livro "Trocando as Lentes" o professor Howard Zher destaca que a principal mudana de perspectiva conceitual ocorre

a partir da mudana na compreenso do conceito de crime .

Segundo ele, do ponto de vista tradicional,

O crime uma violao ao Estado, definida pelo descumprimento da lei e pela culpabilidade. A Justia determina a culpa e

administra a pena mediante procedimento contencioso entre o ofensor e o Estado, dirigido por regras sistemticas.

(Para aprofundar a anlise dos elementos conceituais, clique aqui. )

Ao contrrio disso, do ponto de vista restaurativo, considera-se que

O crime uma violao das pessoas e dos relacionamentos. Cria obrigaes para fazer as coisas bem feitas. A justia

envolve a vtima, o ofensor e a comunidade na busca de solues que promovem acordo, reconciliao e segurana.

(Para aprofundar a anlise dos elementos conceituais, clique aqui. )

Continuando e sintetizando os ensinamentos do Prof. Zher, segundo apresentados por ele no "Pequeno Livro da Justia

Restaurativa", vale destacar dentre os elementos analisados que a abordagem restaurativa permite uma compreenso

diferente dos fatos e das suas implicaes porque, alm de reunir as pessoas envolvidas para discutirem e decidirem a

respeito da ofensa, ela far trs perguntas fundamentalmente diferentes das que seriam feitas no contexto da Justia

tradicional :

Perguntas RETRIBUTIVAS Perguntas RESTAURATIVAS

Que lei foi violada? Quem foi prejudicado?

Quem foi o culpado? Quais as suas necessidades?

O que ele merece? Quem dever satisfazer?

A mudana de ponto de vista, e conseqentemente, de percepo da realidade, potencialmente presentes por detrs dessas

perguntas, a contribuio maior da Justia Restaurativa.

Para uma sntese comparativa entre os principais traos distintivos entre a JR e a Justia Tradicional, clique aqui.

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Perspectivas bsicas e transformao de papis

Para Daniel Van Ness e Karen Strong, uma abordagem restaurativa pressupe trs perspectivas bsicas, devendo

compreender:Participao dos envolvidos

Reunir as pessoas afetadas pela infrao: ofensor, vtima, familiares, amigos e outras pessoas de seu relacionamento, e

membros da comunidade.Reparao de Danos

Ter o foco nas conseqncias da infrao, nas necessidades das vtimas e nas formas de compensao das perdas.

Transformaes dos papis

Repensar os papis e as responsabilidades das pessoas envolvidas, das pessoas relacionadas, dos servios e das

autoridades diante dos conflitos, da violncia e do crime.

Alis, para esses mesmos autores, referindo-se s condies para promoo de segurana, O Governo responsvel por

manter a ordem, mas somente a comunidade pode ser responsvel por estabelecer a paz.

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Modelos de Justia: Punir, Tratar e Restaurar

Muito se tem debatido sobre como responder violncia e s transgresses.

As posies normalmente so extremadas. Enquanto um lado defende o endurecimento das aes represssivas, o outro

insiste em aes preventivas e um tratamento mais digno para os infratores.

Esse impasse entre punio X tratamento perpassa a prpria histria das doutrinas penais, e representa um ponto crtico que

precisa ser superado se quisermos restaurar o verdadeiro valor da Justia aprisionado por trs dessas vises estanques. A

Justia Restaurativa prope uma terceira via capaz de superar esse impasse.

Um quadro resumo elaborado por Lode Walgrave permite a visualizar, comparativamente, a essncia de cada um dos

modelos de Justia tradicionais, relacionados ora ao Direito Penal, ora ao Direito Reabilitador, e traar um paralelo com o

que ele chama de Direito Restaurativo.

Para visualizar, clique aqui.

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As Janelas de Disciplina Social

Segundo os autores Paul Mc Cold e Ted Wachtel, os fatores representados pela dicotomia apresentada na lmina anterior

(punio X tratamento) no aparecem em estado puro, mas podem assumir diferentes combinaes, que eles denominam de

Janelas de Disciplina Social.

A combinao entre essas foras representada graficamente segundo coordenadas nas quais o vetor vertical ("controle") se

combina com o vetor horizontal ("apoio") formando quatro quadrantes, cada qual representando um tipo de disciplina social,

que pode ser negligente, punitiva, permissiva e restaurativa.

Se uma comunidade exerce baixo controle e oferece baixo apoio, o resultado ser uma disciplina social negligente. Com alto

controle e baixo apoio, a disciplina social ser punitiva. Com baixo controle e alto apoio, a disciplina social permissiva. Com

alto controle e alto apoio, a disciplina social restaurativa.

Para visualizar a representao grfica das Janelas de Disciplina Social, clique aqui.

Para uma video-aula sobre o tema desta Unidade, clique aqui (aguarda up load gravao Leoberto feita em Braslia aos

cuidados Optimidia)

Usando da mesma linguagem, vejamos o que acontece entre ns.

Muitas pessoas alegam que com menor no d nada: esto acusando o ECA de promover uma disciplina social negligente.

Outro discurso comum : menor tem que ir pr cadeia com os maiores: a voz dos partidrios de uma disciplina social

punitiva, na linha da reduo da idade penal. H ainda os que reclamam de que menor s tem direitos, acusando o sistema

do ECA de promover uma disciplina social permissiva.

Uma combinao equilibrada entre "controle" e "apoio" (ou "desaprovao" e "integrao social", na linguagem do projeto de

lei do SINASE, como veremos na Unidade 4), abre espao para um modelo de responsabilidade restaurativa e, com ele, de

um modelo de justia juvenil restaurativa. Ou seja, uma disciplina social restaurativa, capaz de solucionar esses impasses

entre punio x tratamento que, enquanto no forem superados, colocaro sempre sempre em risco a manuteno da idade

da menoridade penal aos 18 anos.

Para visualizar outras correlaes entre os vetores "controle x apoio", clique aqui.

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Princpios de JR segundo a ONU

As Naes Unidas, atravs do seu Conselho Econmico e Social, em 24 de Julho de 2002, editaram a sua Resoluo

2002/12, que trata dos Princpios bsicos para utilizao de programas de Justia restaurativa em matria criminal. Essa

Resoluo recomenda a adoo da Justia Restaurativa pelos Estados Membros e sugere as principais diretrizes a serem

observadas na sua implementao.

Em seu anexo, esta Resoluo estabelece os seguintes critrios norteadores para a utilizao de programas de Justia

Restaurativa, que podemos adotar como uma verdadeira carta de princpios:

Maleabilidade. Podem ser usados em qualquer estgio do sistema de justia criminal;

Reserva legal. S podem ser usados quando houver prova da autoria suficiente para denunciar o ofensor;

Consonncia. A vtima e o ofensor devem normalmente concordar sobre os fatos.

Confidencialidade. A participao do ofensor no dever ser usada como prova de admisso de culpa em processo judicial

ulterior.

Voluntariedade da participao. Exige o consentimento livre e voluntrio da vtima e do ofensor em participar.

Retratabilidade da participao. O consentimento dado participao pode ser revogado por qualquer das partes, a

qualquer momento, durante o processo.

Voluntariedade e proporcionalidade dos acordos. Os acordos s podero ser pactuados voluntariamente e devem conter

somente obrigaes razoveis e proporcionais.

Respeito e equalizao das diferenas. As disparidades, desequilbrios e diferenas culturais entre as partes devem ser

consideradas ao se derivar e conduzir um caso no processo restaurativo.

Segurana. A segurana das partes dever ser considerada ao se derivar qualquer caso ao processo restaurativo e durante

sua conduo.

Subsidiariedade. Quando no for indicado ou possvel o processo restaurativo, o caso deve ser encaminhado s autoridades

do sistema de justia criminal para a prestao jurisdicional sem delonga.

Transversalidade. Mesmo quando no for possvel o processo restaurativo, as autoridades devero estimular o ofensor a

responsabilizar-se frente vtima e comunidade e apoiar a reintegrao da vtima e do ofensor comunidade.

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Valores Fundamentais da Justia Restaurativa

Segundo a Rede de Justia Restaurativa da Nova Zelndia, a viso e a prtica da Justia restaurativa so formadas por

diversos valores fundamentais que a distinguem de outras abordagens mais adversariais de justia para a resoluo de

conflitos.

Os mais importantes desses valores incluem:ParticipaoRespeitoHonestidadeHumildadeInterconexoResponsabilidade

EmpoderamentoEsperana

(Para a definio de cada um desses valores, clique aqui.)

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Boas Vindas

Ol!

Seja bem vindo Unidade VI do nosso Mdulo sobre Justia Restaurativa. Nessa Unidade vamos abordar os seguintes

pontos:Mobilizao para capacitar pessoas e implantar JRComponentes de uma mobilizaoPlanejamento de aes

Nosso objetivo ser oferecer subsdios para quem pretender organizar um processo de implantao de Justia Restaurativa,

abrangendo mobilizao da sua comunidade e a capacitao de pessoas para apoiarem e difundirem as novas ideias e

coordenarem os encontros restaurativos.

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Mobilizao para implantar JR

Estamos chegando ao final do Mdulo. Imaginamos que voc gostou das idias sobre Justia Restaurativa e acredita que

elas poderiam ser colocadas em prtica dentro do seu ambiente de trabalho.

Se voc est pensando nisso, s temos a comemorar: nosso principal objetivo ao elaborar esse curso, que era contagiar os

alunos com essas idias, foi atingido. Antes de concluir o Mdulo, dedicaremos esse encontro para ajudar voc a

desenvolver algumas estratgias capazes de levar em frente essas idias, e a coloc-las em prtica.

A introduo da Justia Restaurativa em qualquer comunidade implica uma importante mudana cultural, diante da qual so

necessrios esforo, estratgia e, principalmente, uma pacincia histrica.

Antes de avanar na prtica, preciso amadurecer as idias mediante muito estudo e reflexo sobre a realidade. Tambm

necessrio adquirir habilidade para conduzir os encontros de forma a proporcionar aos participantes um ambiente seguro e

protegido.

Para que isso tudo acontea e de modo que a inovao possa prosperar, preciso mobilizar a comunidade para proporcionar

uma ambientao receptiva e propcia.

Para isso, vamos pensar o processo de avano em termos de uma estratgia de mobilizao social, inspirado em Bernardo

Toro e Nsia Werneck, autores que propem uma sistematizao bsica definindo os componentes que devem ser fazer

presentes num processo de mobilizao.

Segundo eles, as instncias ou componentes que no podem faltar num processo de mobilizao social so os seguintes:

Imaginrio convocanteInstncia de Produo SocialEditoresReeditoresColetivizaoAcompanhamento

Dedicaremos as prximas lminas a analisar um a um esses componentes que no podero faltar para garantir o sucesso da

implantao de um projeto de Justia Restaurativa.

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Componentes de uma mobilizaoImaginrio convocante

Qual a ideia?

Antes de mais nada, necessrio formular uma ideia-sntese, ideia-fora ou horizonte sedutor em torno da qual se

desencadear e se norterar todo o processo de mobilizao. Como exemplo, referem os autores o imaginrio bblico

proposto por Moiss ao povo judeu em seu xodo a partir do Egito em busca da terra prometida: uma terra onde jorra leite e

mel.

Usando um exemplo mais prximo, no projeto Justia para o Sculo 21, que voc conheceu na unidade anterior, a justia

como poder da comunidade foi o imaginrio formulado para resumir o objetivo de difundir as prticas da Justia Restaurativa

na pacificao de conflitos e violncias envolvendo crianas e adolescentes.

Um imaginrio convocante parecido com um slogan, mas vai alm de uma mera frase de efeito, pois ao mesmo tempo em

deve (ou tenta) resumir a ideia, tambm remete a um conjunto de fundamentos histricos e cientficos que lhe do

consistncia e contedo no caso do segundo exemplo, representado pela difuso dos referenciais tericos e prticos da

justia restaurativa.Instncia de Produo Social

Quem move a ideia?

Uma pessoa, um grupo, uma instituio ou grupo de instituies, enfim, algum haver de impulsionar o processo. Uma

instncia de produo, porm, vai alm da idia de liderana, pois a referncia responsvel pelo planejamento, articulao

poltica, financiamento, e, em se tratando de um processo de mudana cultura, com alta densidade de contedos, ter

tambm a responsabilidade de promover o aprofundamento de estudos e formao de pessoal, formulao e difuso desses

novos conhecimentos.

Editores

Quem traduz a ideia?

Para ser melhor compreendida e aceita, uma ideia precisa ser adaptadas aos meios de comunicao disponveis, redigida ou

ilustrada, enfim, apresentada de maneira compreensvel, e quanto mais possvel, de forma concreta e relacionada realidade

dos destinatrios. Algum portanto dever cuidar da organizao e elaborao dos contedos, responsabilizando-se pela

melhor maneira de preparar apresentaes, conferncias, palestras e outros materiais de comunicao. Reeditores

Quem comunica a ideia?

Como uma andorinha s no faz vero, um processo social depender de um grupo de voluntrios que se aliem ideia, e se

mostrem disponveis para multiplic-la nas mais diversas oportunidades e espaos de trabalho. Assim, os contedos

disponibilizados a partir da instncia de produo, cuja reproduo j foi facilitada pelo trabalho dos editores, alcanaro os

destinatrios finais por intermdio dos reeditores.

Num processo de mobilizao social, os reeditores so compreendidos como mais do que multiplicadores, pois, a exemplo

dos editores, tambm a eles caber trazer os contedos ainda mais para perto dos destinatrios finais.

Portanto, os reeditores novamente adaptam a linguagem, traduzem as idias em exemplos da sua realidade. No apenas

transmitem o contedo recebido, mas assumem com ele uma relao de co-autoria, enriquecendo-o com suas prprias idias

e atribuindo a elas o matiz especial e a autenticidade que advir de ser traduzida atravs dos seus prprios pontos de vista e

enriquecidos pela sua prpria experincia pessoal.Coletivizao

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Quem se liga na ideia?

Como uma andorinha s no faz vero, um processo social depender de um grupo de voluntrios que se aliem ideia, e se

mostrem disponveis para multiplic-la. A contribuio principal das pessoas num processo de mobilizao acontece quando

elas forem capazes de levar as novas idias e introduzir novas prticas na sua rotina do dia-a-dia.

Cursos, seminrios, encontros e outros eventos sero parte importante do processo, mas correspondem mais liturgia da

mobilizao, e no se confundem com ela. Diversas estratgias devem ser conjugadas para que se estabelea esse

compartilhamento e esse senso de participao mesmo quando a ao de cada pessoa se d em um contexto difuso,

capilarizado nos afazeres do seu dia-a-dia. Para isso as pessoas precisam ser realimentadas com informaes, que permitam

sentirem-se includas e participantes de um processo maior, mesmo que centradas em aplicaes aparentemente restritas

aos seus afazeres cotidianos. preciso criar uma comunidade de sentido, na qual as pessoas se sintam reforadas pelo

senso de pertencimento e pela validao das idias compartilhadas. Acompanhamento

Por onde anda a ideia?

Para um processo de mobilizao social ser eficiente, no basta soltar garrafas com mensagens ao mar. preciso saber

onde est chegando a mensagem, e que diferena ela faz. Para isso, importante que todo processo de mobilizao seja

acompanhado de um trabalho de monitoramento e avaliao. Recolher informaes sobre o andamento do processo e seus

resultados vital para realimentar o prprio movimento.

Para isso importante estabelecer mecanismos de coleta de informaes (dados) que permitam posteriormente visualizar,

quantificar e avaliar os resultados alcanados, sejam eles quantitativos relacionados ao prprio processo de mobilizao (p.

ex, quantas pessoas j participaram?) quanto aplicao das idias (p.ex, quantos encontros restaurativos foram realizados?

Quais as combinaes mais freqentes? Os acordos foram cumpridos?), ou, ainda, sejam eles indicadores de qualidade do

processo (p. ex, qual o ndice de satisfao dos participantes em determinadas atividades?). Expor atravs de dados objetivos

e concretos o desenvolvimento e a evoluo de um processo de mobilizao uma prova de competncia, capaz de

conquistar reconhecimento, legitimidade e confiana em torno da proposta.

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Planejamento de aes

Transpondo e adaptando a sistematizao anterior para aplicaes prticas de uma mobilizao pela difuso e aplicao das

prticas restaurativas num determinado ambiente ou comunidade, podemos sugerir um planejamento de aes abrangendo

as seguintes etapas:Sensibilizao

Antes de mais nada, preciso quebrar o gelo. Muita gente nunca ouviu falar da idia. Outros ouviram e, por isso mesmo,

desconfiam. Onde j se viu colocar uma vtima para conversar com o infrator? Ela quer quebrar a cara dele! Outros

ouviram, mas de forma ocasional, e ainda no tiveram oportunidade de compartilhar a notcia.

Por isso, em algum momento, que pode ser antes, durante ou depois das demais atividades, importante contemplar o

conjunto dos integrantes da sua comunidade com alguma atividade de sensibilizao. Denominamos assim um encontro para

um grande grupo, heterogneo, com a inteno de apresentar as idias e, se j existente um plano de aplicao prtica,

noticiar sua existncia.

A sensibilizao usualmente acontece atravs de um encontro que pode durar algumas horas, ou pode ser uma jornada de

um dia, tem a inteno de abrir caminho, quebrar resistncias e conquistar aliados, mas ainda sem a pretenso de dar

formao e, menos ainda, aprofundamento.

Dica 1Formao de Lideranas

Identificados os simpatizantes da idia, hora de reunir um grupo para os primeiros estudos. Esse grupo provalmente reunir

o pessoal que aos poucos acabar atuando nas vrias instncias da mobilizao: produtores, editores, reeditores. preciso

que esse grupo possa estabelecer um mnimo de aquisio e de alinhamento conceitual em torno das idias e, tambm, um

processo de compartilhamento de suas percepes e pontos de vista a respeito, que permitam uma (re)identificao entre os

parceiros, entre si e em torno da ideia.

Esse grupo pode ter por ponto de partida a oferta de um curso mais estruturado, como por exemplo, uma capacitao

presencial, ou distncia, ou organizar-se como um grupo de estudos auto-didatas, para leitura, reflexo e discusso de

textos obtidos pelos organizadores dos encontros.

Dica 2

Dica 3Formao de Coordenadores

Justia Restaurativa para ser feita, no apenas para ser estudada e pensada. Mas para fazer, e preciso adotar algum

mtodo que proporcione aos participantes condies mnimas de proteo e segurana. para isso que os programas de

Justia Restaurativa costumam adotar um roteiro predefinido para orientar o passo a passo dos encontros. Para isso,

preciso buscar qualificar os coordenadores dos encontros .

Dica 4Prticas Supervisionadas

Por mais que possamos escrever e teorizar sobre a Justia Restaurativa, seu verdadeiro potencial s se revela quando

colocada em prtica. Via de regra no possvel contar com uma pessoa experiente, a quem chamar de fora para nos

ajudar resolver os conflitos da nossa comunidade. E ainda que por uns tempos possamos contar com esse tipo de ajuda, logo

precisaremos aprender a nos virar por conta prpria. Para saber como fazer, no h outro modo de aprender seno fazendo.

A introduo das prticas restaurativas num determinado contexto exige a adoo de estratgias de formao em servio.

Portanto, mos obra. Mas com um alerta. Todo cuidado sempre pouco quando se testa uma ideia nova e, principalmente,

quando essa testagem envolve pessoas em conflito e, consequentemente, pessoas expostas a algum sofrimento em razo

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disso. Por isso as prticas envolvendo encontros presenciais entre as partes de um conflito sempre devem ser encaradas

com cuidado e responsabilidade.

Uma forma de incentivar e sedimentar a introduo das prticas restaurativas mediante a organizao de encontros de

superviso, nos quais possam ser discutidos os encontros realizados, revisando-se criticamente o passo a passo como foi

conduzido. Para isso possvel ouvir o relato verbal dos coordenadores e, sempre que possvel, seria til utilizar gravaes

em vdeo ou ao menos em udio do encontro. sempre possvel que isso ocorra num processo do auto-aprendizagem, que

seja preferencialmente coletivo mediante encontros de autosuperviso em grupo. A presena de um colega com alguma

experincia prvia, que pudesse atuar como supervisor ao menos nas etapas iniciais da aprendizagem, seria sempre de

grande importncia. Outra estratgia importante seria a participao de um coordenador em treinamento como

co-coordenador em crculos coordenados por um colega mais experiente, fazendo uma espcie de estgio supervisionado.

Avaliao e Feed Back

Costuma-se avaliar a aplicao das prticas restaurativas mais por critrios processuais do que por resultados. Isso significa,

em estgios iniciais, mais importante avaliar o que e como foi feito, do que aquilo que se conseguiu fazendo isso. A opo

se justifica porque so mltiplos, e incontrolveis, os fatores que influenciam nos resultados. Por exemplo, no se pode

esperar que o fato de ter participado em um encontro restaurativo possa evitar que um adolescente venha a reincidir

praticando outra transgresso ou ato infracional. O encontro pode ter surtido importantes efeitos, mas outros fatores ou

causas podem ter pressionado o adolescente a reincidir.

A avaliao pode ter mltiplos enfoques. A prtica da superviso ou autosuperviso j em si um instrumento de avaliao,

embora mais preocupado ao aperfeioamento, mas que pode se prestar a algum registro. Nesse contexto que se aplica a

idia exposta na Unidade 3 a respeito da importncia da fidelidade aos valores restaurativos: o tratamento foi respeitoso? As

falas foram honestas? Houve compreenso da interdependncia? A igualdade foi preservada? O sentido de responsabilidade

foi apreendido e compartilhado? Seria til tambm adotar um questionrio para avaliao do grau de satisfao dos

participantes. O registro do procedimento vital para poder-se documentar quais os pontos de acordo, e posteriormente

monitorar se foram cumpridos ou no, etc .

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