apostila ddhh ctsp 2009

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17º Batalhão de Polícia Militar Professores: Cap Tameirão Ten Arturo Ten Pescara Ten Menezes 1 APOSTILA DE DIREITOS HUMANOS APOSTILA DE DIREITOS HUMANOS CURSO TÉCNICO DE SEGURAÇA PÚBLICA - 2009 CURSO TÉCNICO DE SEGURAÇA PÚBLICA - 2009

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Page 1: Apostila DDHH CTSP 2009

17º Batalhão de Polícia Militar

Professores: Cap Tameirão Ten Arturo Ten Pescara Ten Menezes Sgt Richardson

Uberlândia/MG, fevereiro de 2009.

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APOSTILA DE DIREITOS HUMANOS APOSTILA DE DIREITOS HUMANOS CURSO TÉCNICO DE SEGURAÇA PÚBLICA -CURSO TÉCNICO DE SEGURAÇA PÚBLICA -

20092009

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17º Batalhão de Polícia Militar

Unidade 1- Introdução

Direitos Humanos – Considerações –

A Polícia Militar de Minas Gerais, através da Diretriz de Produção de Serviços de Segurança Pública número 08, estabeleceu uma filosofia institucional no sentido de direcionar a conduta do policial militar em função dos respeitos aos direitos humanos. Assim, durante o Curso de Formação, o estudo da Diretriz é fundamental. E a presente apostila, sem a pretensão de esgotar o assunto, é de fato apenas um guia desta disciplina de dimensão tão importante e necessária ao policial militar no exercício de suas funções.

O que são direitos humanos ?

“’Direitos humanos”, “direitos do homem”, ”liberdades públicas” ou “ direitos fundamentais”, são todos aqueles direitos inerentes e universais destinados ao ser humano. Constitucionalmente, podemos situá-los entre o art. 5º ao art. 17º. Os direitos fundamentais do homem, podem ser classificados em direitos de PRIMEIRA GERAÇÃO: direitos civis e de cidadania, SEGUNDA GERAÇÃO: direitos econômicos, sociais e culturais, TERCEIRA GERAÇÃO: que materializam poderes de titularidade coletiva e que consagra o principio da solidariedade e finalmente, QUARTA GERAÇÃO: assim definidos por Celso Lafer, como sendo aqueles que transcendem a esfera dos indivíduos considerados em sua expressão singular e recaindo, exclusivamente, nos grupos primários e nas grandes formações sociais, por serem todos históricos e nascidos de certas circunstâncias, caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, visando assegurar a manutenção do Estado Democrático de Direito.

Características dos Direitos Humanos

Imprescritibilidade Inalienabilidade Irrenunciabilidade Inviolabilidade Inerência Transnacionalidade Indivisibilidade Historicidade

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O Triângulo dos Direitos Humanos (filosofia institucional da Polícia Militar)

A quem se destinam os direitos humanos ? A todos os seres humanos, indistintamente, independentemente de sexo,

raça, cor, nacionalidade ou religião.

Quem deve protege-los? O Estado e todos os seres humanos, pois os direitos são direitos e deveres

de todos. O policial é a figura emblemática do Estado, e portanto neste mister, cumpre ao mesmo, proteger e garantir os direitos humanos.

Validade no mundo: Os direitos humanos são notadamente dirigidos a todos os seres humanos,

mas nem todos, os tem assegurado, seja em razão dos interesses de grupos hegemônicos (oligarquias), seja pelo não reconhecimento destes direitos, pela frontal violação e outros fatores diversos.

A nova imagem do policial: Os direitos humanos, durante muito tempo, esteve dissociado da figura do

Estado, o que por sua vez refletiu na imagem do policial, e evolutivamente passou por varias transformações, atreladas sistematicamente ao perfil dos valores da sociedade até então vigente. O policial ao longo da evolução, teve que passar por várias mudanças, remodelando a sua função, junto a sociedade.

HISTÓRICO

Os Direitos Humanos têm sua origem naquilo que alguns pensadores da antiguidade chamaram de Direitos Naturais, ou seja, garantias que todos os homens possuem, independentemente de legislações ou convenções criadas na sociedade. Sofrendo, inicialmente, forte influência da igreja, a qual considerava que todo direito é inspiração divina, os direitos do homem passaram, posteriormente, a se adequarem de acordo com as necessidades específicas de cada povo.

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Basicamente, a fundamentação dos Direitos Humanos repousa sobre dois princípios: o reconhecimento e o respeito à dignidade humana e a limitação do poder do Estado. Um rápido sobrevôo sobre três grandes movimentos bastante comentados na história da humanidade, nos fará ver que não é recente a escravização do homem pelo próprio homem em busca de poder, e amparado, senão claramente executado, pelos representantes do próprio povo. Estes movimentos foram: a Independência dos Estados Unidos da América, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. Como sabemos, isso não foi o bastante para provocar uma convivência mais harmônica e equilibrada nas sociedades. As duas grandes guerras mundiais são referências mais recentes da luta pelo poder em detrimento da proteção aos direitos e garantias individuais e coletivas.

A burguesia e sua importância na defesa dos Direitos Humanos.

A discussão sobre Direitos Humanos passa a ocorrer de forma mais aberta através de São Thomas de Aquino, no final da idade média (Séc. XVIII), época em que surge também a burguesia. A fundamentação de São Thomas é no sentido de que os direitos do homem vêm de Deus, no entanto, esta afirmativa passa a ser usada politicamente para justificar o poder dos reis e o absolutismo. Desta forma, abre amplas possibilidades para todo tipo de violação dos direitos das pessoas, culminando numa associação entre a burguesia e os pensadores da época, numa tentativa de defender a liberdade como um valor humano a ser respeitado.

Iniciam-se, então, alguns movimentos sociais em defesa da dignidade humana, e é neste cenário que se dá a criação dos Estados Unidos, através de uma revolução organizada pelas treze colônias da Inglaterra, na América. Esta revolução teve como causa os abusos que lhes eram impostos e como conseqüência a “Declaração de Independência dos Estados Unidos”. As razões que fundamentavam a independência já são um embrião da Declaração Universal dos Direitos Humanos, como vemos abaixo:

“Todos os homens foram criados iguais. Os direitos fundamentais foram conferidos pelo Criador, e entre eles estão o da vida, liberdade e o da procura da própria felicidade”.

Ainda no Séc. XVIII, surge a Revolução Francesa, um movimento também idealizado pelos burgueses em oposição ao absolutismo dos reis contra eles. Este movimento social foi responsável pelo surgimento da “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”. Em sua essência, esta declaração defende que, ao lado dos direitos do homem e do cidadão existe a obrigação do Estado de respeitar e garantir os direitos humanos. Entretanto, as desigualdades continuaram, paralelamente ao progresso da civilização, fazendo com que ocorresse a Revolução Industrial, trazendo fortes transformações sociais e econômicas. As péssimas condições de trabalho a que foram submetidos os assalariados, as explorações que sofriam, nos mostram que, novamente, os direitos humanos foram colocados à margem de interesses econômicos e políticos. Desta vez, os conflitos atingiram proporções

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mundiais, culminando nas duas grandes guerras cujos efeitos todos nós conhecemos.

A 2ª Guerra Mundial trouxe um impacto mais arrasador, posto que, até então, muitos documentos já haviam sido produzidos em favor da humanidade. E o que concluímos é que, com o passar do tempo, mais ofensivos se tornaram os meios através dos quais a sociedade busca a liberdade, a igualdade e o respeito à dignidade. Impressionados com os efeitos desta guerra, algumas nações se uniram e elaboraram a DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS, documento mais importante que temos, nos dias atuais, na luta pelos direitos humanos. Mesmo assim, os fatos ocorridos em 11 de Setembro de 2001 nos fazem pensar que, na essência, muito pouco se caminhou desde a Idade Média.

DOCUMENTOS INTERNACIONAIS EM DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS.

A 1ª Guerra Mundial terminou formalmente com o “Tratado de Versalles”, que também criou a “Liga das Nações” e a “Organização Internacional do Trabalho”, um de seus órgãos. O objetivo da Liga era “promover a cooperação internacional e obter paz e segurança internacionais”. Contudo, a Liga das Nações nunca conseguiu alcançar a aderência de todos os países, além de não ter sido eficaz para impedir uma segunda guerra. Formalmente, a Liga foi dissolvida em 18/04/46, quando já havia sido fundada a “Organização das Nações Unidas” - ONU. A Organização Internacional do Trabalho conseguiu se manter e é hoje uma das agências especializadas da ONU.

ONU

Criada a partir da 2ª Guerra, seu instrumento fundador foi a “Carta das Nações Unidas”. Esta carta é também um tratado multilateral que estabelece os direitos e deveres legais dos Estados Membros da ONU. Esta, por sua vez, não possuía competência legal em questões que envolviam jurisdição nacional de um Estado.

DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS - DUDH

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi aprovada em 10 de Dezembro de 1948 pela Assembléia Geral das Nações Unidas. Possuindo trinta artigos nos quais faz uma súmula dos direitos e deveres fundamentais do homem, a DUDH foi o documento mais amplo que já se produziu, até a atualidade, em defesa dos direitos humanos.

OUTROS INSTRUMENTOS

Após a 2ª Guerra, a ONU vem se empenhando em criar padrões de Direitos Humanos para os países do mundo, através de documentos jurídicos e de outros instrumentos usados como recomendações aos Estados Membros da ONU, ou

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orientações em questões específicas relacionadas às liberdades e direitos do homem.

Faremos uma breve citação dos instrumentos mais importantes.

1. Direito Consuetudinário:Prática recorrente entre os Estados, que se origina de uma convicção da

obrigação legal por parte dos Estados atuantes. É uma das fontes do Direito Internacional utilizadas pela Corte Internacional de Justiça para determinar os direitos e obrigações dos Estados que são partes de uma disputa. Vincula todos os Estados, incluindo aqueles que não reconheceram a norma, desde que não tenham expressa e persistentemente feito objeção a seu desenvolvimento. Ex.: proibição de genocídio, da escravidão, do comércio de escravos, da tortura, da discriminação racial e da privação arbitrária da vida.

2. Carta da ONU:É composta por artigos que estabelecem obrigações para com os direitos

humanos de todos os Estados membros da ONU.

3. Declaração Internacional dos Direitos Humanos:É o termo utilizado para referir-se coletivamente aos seguintes documentos:

Declaração Universal dos Direitos Humanos, Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos - PIDCP, Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais - PIDESC, Primeiro Protocolo Facultativo referente ao PIDCP.

4. Tratados:O significado deste termo é “um acordo internacional firmado entre Estados na

forma escrita e governado pelo Direito Internacional (...)”. Estão sujeitos a interpretação de acordo com normas da “Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados”. Alguns exemplos:- Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio;- Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados;- Protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados;- Convenção Internacional sobre a eliminação de todas as formas de

discriminação racial;- Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a

mulher;- Convenção contra a tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos

ou degradantes;- Convenção sobre os direitos da criança;- Segundo protocolo adicional ao PIDCP com vista à abolição da pena de

morte.

DIREITOS HUMANOS NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA.

A história de violação dos direitos humanos no Brasil data de seu descobrimento e colonização, iniciando-se pela escravização do índio e do próprio

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povo africano, os quais precisaram da assinatura de uma lei para que seu direito à liberdade fosse garantido. Sabemos que muita coisa só ficou no papel e que, na verdade, ainda hoje egros e silvícolas fazem parte do que classificamos como “grupos vulneráveis”, justamente por não terem seus direitos respeitados.

O período da ditadura militar foi outro grande marco de violações de garantias fundamentais, e mesmo após o restabelecimento da democracia, a sociedade ainda tem resistência quanto ao significado de Direitos Humanos. Muitos ainda o vêem de forma deturpada, recusando-se a entender que tratam-se de nossas garantias mais básicas, as quais são diuturnamente marginalizadas pelo Estado. É importante, então, iniciarmos pelo simples conhecimento de que a doutrina de Direitos Humanos busca defender a dignidade de todo ser humano, independente de sua condição sócio-econômico-cultural, limitando o poder do Estado.

Além do Brasil, outros países da América Latina têm sua história marcada por episódios sangrentos de violações, desrespeito, abusos de autoridade. A violência e a pobreza são dois grandes indicadores de como os direitos humanos são tratados nestes países, conforme podemos observar nos exemplos que se seguem.

- na Colômbia, grupos militares, para-militares, guerrilheiros e traficantes se enfrentam constantemente, atingindo a população civil;

- a Guatemala tem em sua história dezenas de milhares de torturados, desaparecidos, assassinados, e 70% da população indígena eliminada;

- no Peru e na Venezuela a tortura ainda é empregada abertamente contra criminosos.

A gravidade deste quadro sombrio se agrava no momento em que percebemos o quanto já não nos assustamos com certas situações de nosso dia-a-dia, que configuram violação de direitos humanos. A violência a que estamos expostos, até mesmo dentro de nossos lares, através da mídia ou de famílias desajustadas, nos tornam insensíveis. Talvez esse seja o maior problema, uma vez que um dos primeiros passos que devemos dar no sentido de reduzir esta situação é nos conscientizarmos de sua gravidade. A partir daí, passaremos a atuar em medidas preventivas e até mesmo curativas para melhorar este mundo que habitamos.

ALGUNS OUTROS CONCEITOS E DEFINIÇÕES

DireitoQuando falamos em direito, estamos preocupados com o relacionamento

entre as pessoas. Assim, direito é um conjunto de normas e regras impostas ou convencionadas, com a finalidade de disciplinar a convivência das pessoas na sociedade.

Direitos Humanos:Direitos humanos derivam da dignidade e do valor inerente à pessoa

humana, e esses são universais, inalienáveis e igualitários. Isto significa que são

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inerentes a cada ser humano, não podem ser tirados ou alienados por qualquer pessoa; e todos têm os direitos humanos em igual medida – independente do critério de raça, cor, sexo, idioma, religião, política ou outro tipo de opinião, nacionalidade ou origem social, propriedades, nascimento ou outro status qualquer.

Direito InternacionalO direito internacional consiste em normas que governam as relações

entre os Estados, mas compreende também normas relacionadas ao funcionamento de instituições ou organizações internacionais, a relação entre elas e a relação delas com o Estado e os indivíduos.

O direito internacional, entre outros atributos, estabelece normas relativas aos direitos territoriais dos Estados (com respeito aos territórios terrestre, marítimo e espacial), a proteção internacional do meio ambiente, o comércio internacional e as relações comerciais, o uso da força pelos Estados, os direitos humanos e o direito internacional humanitário.

Direito Internacional HumanitárioO direito internacional humanitário (DIH) é uma ramificação do direito

internacional público - aplicável em conflito armado - é dividido em duas categorias: o Direito de Genebra e o Direito de Haia.

O direito de Genebra trata da proteção das vítimas de guerra, sejam elas militares ou civis, na água ou em terra. Protege todas as pessoas fora de combate: os feridos, os doentes, os náufragos e os prisioneiros de guerra.

O direito de Haia preocupa-se mais com a regulamentação dos métodos e meios de combate, e concentra-se na condução das operações militares.

Instrumentos Internacionais São todos os textos que englobam os padrões internacionais de direitos

humanos. Alguns desses textos são tratados que obrigam os Estados-Parte que os ratificaram. Esses tratados são chamados de Pactos ou Convenções

CidadaniaA cidadania além de ser um principio fundamental, sob o aspecto formal, é

um status ligado ao regime político, onde a pessoa adquire seus direitos mediante o alistamento eleitoral, na forma da lei.

Nos Estados democráticos, como o brasileiro, a Cidadania vai além do direito de escolha dos governantes ou do poder de ser escolhido governante. A plenitude da Cidadania implica numa situação onde cada pessoa possa viver com decência e dignidade, através de direitos e deveres estabelecidos pelas necessidades e responsabilidade do Estado e das pessoas.

Violação de Direitos Humanos

A violação de direitos humanos somente pode ser cometida por uma pessoa com a autoridade e poder conferida pelo Estado e a exercê-la em seu nome.

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Nenhum criminoso ou terrorista tem essa dignidade ou esse poder. Quando criminosos ou terroristas ferem ou matam pessoas eles cometem atos criminosos, mas não cometem violações de direitos humanos. Isto não reduz o mal que fizeram e devem ser punidos pela lei pelos crimes cometidos.

Poder de PolíciaO poder de policia é um dos poderes conferidos pelo Direito Administrativo,

é a faculdade da qual dispõe a Administração Pública para buscar o bem comum. Deve-se usar o poder de policia de forma discricionária, onde através de critério técnicos, de oportunidade e de justiça, pode fazer cumprir sua ordem.

Como o poder conferido é discricionário, e jamais arbitrário, o policial militar deve manter suas ações exatamente dentro dos limites legais.

Treze Reflexões Sobre Polícia e Direitos Humanos

Durante muitos anos o tema “Direitos Humanos” foi considerado antagônico ao de Segurança Pública.

Produto do autoritarismo vigente no país entre 1964 e 1984 e da manipulação, por ele, dos aparelhos policiais, esse velho paradigma maniqueísta cindiu sociedade e polícia, como se a última não fizesse parte da primeira.

Polícia, então, foi uma atividade caracterizada pelos segmentos progressistas da sociedade, de forma equivocadamente conceitual, como necessariamente afeta à repressão antidemocrática, à truculência, ao conservadorismo. “Direitos Humanos” como militância, na outra ponta, passaram a ser vistos como ideologicamente filiados à esquerda, durante toda a vigência da Guerra Fria (estranhamente, nos países do “socialismo real”, eram vistos como uma arma retórica e organizacional do capitalismo).

No Brasil, em momento posterior da história, à partir da rearticulação democrática, agregou-se a seus ativistas a pecha de “defensores de bandidos” e da impunidade.

Evidentemente, ambas visões estão fortemente equivocadas e prejudicadas pelo preconceito.

Estamos há mais de um década construindo uma nova democracia e essa paralisia de paradigmas das “partes” (uma vez que assim ainda são vistas e assim se consideram), representa um forte impedimento à parceria para a edificação de uma sociedade mais civilizada.

Aproximar a policia das ONGs que atuam com Direitos Humanos, e vice-versa, é tarefa impostergável para que possamos viver, a médio prazo, em uma nação que respire “cultura de cidadania”. Para que isso ocorra, é necessário que

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nós, lideranças do campo dos Direitos Humanos, desarmemos as “minas ideológicas” das quais nos cercamos, em um primeiro momento, justificável , para nos defendermos da polícia, e que agora nos impedem de aproximar-nos. O mesmo vale para a polícia.

Podemos aprender muito uns com os outros, ao atuarmos como agentes defensores da mesma democracia.

Nesse contexto, à partir de quase uma década de parceria no campo da educação para os direitos humanos junto à policiais e das coisas que vi e aprendi com a polícia, é que gostaria de tecer as singelas treze considerações a seguir:

CIDADANIA, DIMENSÃO PRIMEIRA

1ª - O policial é, antes de tudo um cidadão, e na cidadania deve nutrir sua razão de ser. Irmana-se, assim, a todos os membros da comunidade em direitos e deveres. Sua condição de cidadania é, portanto, condição primeira, tornando-se bizarra qualquer reflexão fundada sobre suposta dualidade ou antagonismo entre uma “sociedade civil” e outra “sociedade policial”. Essa afirmação é plenamente válida mesmo quando se trata da Polícia Militar, que é um serviço público realizado na perspectiva de uma sociedade única, da qual todos os segmentos estatais são derivados. Portanto não há, igualmente, uma “sociedade civil” e outra “sociedade militar”. A “lógica” da Guerra Fria, aliada aos “anos de chumbo”, no Brasil, é que se encarregou de solidificar esses equívocos, tentando transformar a polícia, de um serviço à cidadania, em ferramenta para enfrentamento do “inimigo interno”. Mesmo após o encerramento desses anos de paranóia, seqüelas ideológicas persistem indevidamente, obstaculizando, em algumas áreas, a elucidação da real função policial.

POLICIAL: CIDADÃO QUALIFICADO

2ª - O agente de Segurança Pública é, contudo, um cidadão qualificado: emblematiza o Estado, em seu contato mais imediato com a população. Sendo a autoridade mais comumente encontrada tem, portanto, a missão de ser uma espécie de “porta voz” popular do conjunto de autoridades das diversas áreas do poder. Além disso, porta a singular permissão para o uso da força e das armas, no âmbito da lei, o que lhe confere natural e destacada autoridade para a construção social ou para sua devastação. O impacto sobre a vida de indivíduos e comunidades, exercido por esse cidadão qualificado é, pois, sempre um impacto extremado e simbolicamente referencial para o bem ou para o mal-estar da sociedade.

POLICIAL: PEDAGOGO DA CIDADANIA

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3ª - Há, assim, uma dimensão pedagógica no agir policial que, como em outras profissões de suporte público, antecede as próprias especificidades de sua especialidade.

Os paradigmas contemporâneos na área da educação nos obrigam a repensar o agente educacional de forma mais includente. No passado, esse papel estava reservado unicamente aos pais, professores e especialistas em educação. Hoje é preciso incluir com primazia no rol pedagógico também outras profissões irrecusavelmente formadoras de opinião: médicos, advogados, jornalistas e policiais, por exemplo.

O policial, assim, à luz desses paradigmas educacionais mais abrangentes, é um pleno e legitimo educador. Essa dimensão é inabdicável e reveste de profunda nobreza a função policial, quando conscientemente explicitada através de comportamentos e atitudes.

A IMPORTÂNCIA DA AUTO - ESTIMA

PESSOAL E INSTITUCIONAL

4ª - O reconhecimento dessa “dimensão pedagógica” é, seguramente, o caminho mais rápido e eficaz para a reconquista da abalada auto-estima policial. Note-se que os vínculos de respeito e solidariedade só podem constituir-se sobre uma boa base de auto-estima. A experiência primária do “querer-se bem” é fundamental para possibilitar o conhecimento de como chegar a “querer bem o outro”. Não podemos viver para fora o que não vivemos para dentro.

Em nível pessoal, é fundamental que o cidadão policial sinta-se motivado e orgulhoso de sua profissão. Isso só é alcançável à partir de um patamar de “sentido existencial”. Se a função policial for esvaziada desse sentido, transformando o homem e a mulher que a exercem em meros cumpridores de ordens sem um significado pessoalmente assumido como ideário, o resultado será uma auto-imagem denegrida e uma baixa auto-estima.

Resgatar, pois, o pedagogo que há em cada policial, é permitir a ressignificação da importância social da polícia, com a conseqüente consciência da nobreza e da dignidade dessa missão.

A elevação dos padrões de auto-estima pode ser o caminho mais seguro para uma boa prestação de serviços.

Só respeita o outro aquele que se dá respeito a si mesmo.

POLÍCIA E ‘SUPEREGO’ SOCIAL

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5ª - Essa “dimensão pedagógica”, evidentemente, não se confunde com “dimensão demagógica” e, portanto, não exime a polícia de sua função técnica de intervir preventivamente no cotidiano e repressivamente em momentos de crise, uma vez que democracia nenhuma se sustenta sem a contenção do crime, sempre fundado sobre uma moralidade mal constituída e hedonista, resultante de uma complexidade causal que vai do social ao psicológico.

Assim como nas famílias é preciso, em “ocasiões extremas”, que o adulto sustente, sem vacilar, limites que possam balizar moralmente a conduta de crianças e jovens, também em nível macro é necessário que alguma instituição se encarregue da contenção da sociopatia.

A polícia é, portanto, uma espécie de superego social indispensável em culturas urbanas, complexas e de interesses conflitantes, contendedora do óbvio caos a que estaríamos expostos na absurda hipótese de sua inexistência. Possivelmente por isso não se conheça nenhuma sociedade contemporânea que não tenha assentamento, entre outros, no poder da polícia. Zelar, pois, diligentemente, pela segurança pública, pelo direito do cidadão de ir e vir, de não ser molestado, de não ser saqueado, de ter respeitada sua integridade física e moral, é dever da polícia, um compromisso com o rol mais básico dos direitos humanos que devem ser garantidos à imensa maioria de cidadãos honestos e trabalhadores.

Para isso é que a polícia recebe desses mesmos cidadãos a unção para o uso da força, quando necessário.

RIGOR versus VIOLÊNCIA

6ª - O uso legítimo da força não se confunde, contudo, com truculência.

A fronteira entre a força e a violência é delimitada, no campo formal, pela lei, no campo racional pela necessidade técnica e, no campo moral, pelo antagonismo que deve reger a metodologia de policiais e criminosos.

POLICIAL versus CRIMINOSO:

METODOLOGIAS ANTAGÔNICAS

7ª - Dessa forma, mesmo ao reprimir, o policial oferece uma visualização pedagógica, ao antagonizar-se aos procedimentos do crime.

Em termos de inconsciente coletivo, o policial exerce função educativa arquetípica: deve ser “o mocinho”, com procedimentos e atitudes coerentes com a “firmeza moralmente reta”, oposta radicalmente aos desvios perversos do outro arquétipo que se lhe contrapõe: o bandido.

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Ao olhar para uns e outros, é preciso que a sociedade perceba claramente as diferenças metodológicas ou a “confusão arquetípica” intensificará sua crise de moralidade, incrementando a ciranda da violência. Isso significa que a violência policial é geradora de mais violência da qual, mui comumente, o próprio policial torna-se a vítima.

Ao policial, portanto, não cabe ser cruel com os cruéis, vingativo contra os anti-sociais, hediondo com os hediondos. Apenas estaria com isso, liberando, licenciando a sociedade para fazer o mesmo, à partir de seu patamar de visibilidade moral. Não se ensina a respeitar desrespeitando, não se pode educar para preservar a vida matando, não importa quem seja. O policial jamais pode esquecer que também o observa o inconsciente coletivo.

A ‘VISIBILIDADE MORAL’ DA POLÍCIA: IMPORTÂNCIA DO EXEMPLO

8ª - Essa dimensão “testemunhal”, exemplar, pedagógica, que o policial carrega irrecusavelmente é, possivelmente, mais marcante na vida da população do que a própria intervenção do educador por ofício, o professor.

Esse fenômeno ocorre devido à gravidade do momento em que normalmente o policial encontra o cidadão. À polícia recorre-se, como regra, em horas de fragilidade emocional, que deixam os indivíduos ou a comunidade fortemente “abertos” ao impacto psicológico e moral da ação realizada.

Por essa razão é que uma intervenção incorreta funda marcas traumáticas por anos ou até pela vida inteira, assim como a ação do “bom policial” será sempre lembrada com satisfação e conforto.

Curiosamente, um significativo número de policiais não consegue perceber com clareza a enorme importância que têm para a sociedade, talvez por não haverem refletido suficientemente a respeito dessa peculiaridade do impacto emocional do seu agir sobre a clientela. Justamente aí reside a maior força pedagógica da polícia, a grande chave para a redescoberta de seu valor e o resgate de sua auto-estima.

É essa mesma “visibilidade moral” da polícia o mais forte argumento para convencê-la de sua “responsabilidade paternal” (ainda que não paternalista) sobre a comunidade. Zelar pela ordem pública é, assim, acima de tudo, dar exemplo de conduta fortemente baseada em princípios. Não há exceção quando tratamos de princípios, mesmo quando está em questão a prisão, guarda e condução de malfeitores. Se o policial é capaz de transigir nos seus princípios de civilidade, quando no contato com os sociopatas, abona a violência, contamina-se com o que nega, conspurca a normalidade, confunde o imaginário popular e rebaixa-se à igualdade de procedimentos com aqueles que combate.

Note-se que a perspectiva, aqui, não é refletir do ponto de vista da “defesa do bandido”, mas da defesa da dignidade do policial.

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A violência desequilibra e desumaniza o sujeito, não importa com que fins seja cometida, e não restringe-se a áreas isoladas, mas, fatalmente, acaba por dominar-lhe toda a conduta. O violento se dá uma perigosa permissão de exercício de pulsões negativas, que vazam gravemente sua censura moral e que, inevitavelmente, vão alastrando-se em todas as direções de sua vida, de maneira incontrolável.

“ÉTICA” CORPORATIVA versus ÉTICA CIDADÃ

9ª - Essa consciência da auto-importância obriga o policial a abdicar de qualquer lógica corporativista.

Ter identidade com a polícia, amar a corporação da qual participa, coisas essas desejáveis, não se podem confundir, em momento algum, com acobertar práticas abomináveis. Ao contrário, a verdadeira identidade policial exige do sujeito um permanente zelo pela “limpeza” da instituição da qual participa.

Um verdadeiro policial, ciente de seu valor social, será o primeiro interessado no “expurgo” dos maus profissionais, dos corruptos, dos torturadores, dos psicopatas. Sabe que o lugar deles não é polícia, pois, além do dano social que causam, prejudicam o equilíbrio psicológico de todo o conjunto da corporação e inundam os meios de comunicação social com um marketing que denigre o esforço heróico de todos aqueles outros que cumprem corretamente sua espinhosa missão. Por esse motivo, não está disposto a conceder-lhes qualquer tipo de espaço.

Aqui, se antagoniza a “ética da corporação” (que na verdade é a negação de qualquer possibilidade ética) com a ética da cidadania (aquela voltada à missão da polícia junto a seu cliente, o cidadão).

O acobertamento de práticas espúrias demonstra, ao contrário do que muitas vezes parece, o mais absoluto desprezo pelas instituições policiais. Quem acoberta o espúrio permite que ele enxovalhe a imagem do conjunto da instituição e mostra, dessa forma, não ter qualquer respeito pelo ambiente do qual faz parte.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO,

PERMANÊNCIA E ACOMPANHAMENTO

10ª - Essa preocupação deve crescer à medida em que tenhamos clara a preferência da psicopatia pelas profissões de poder. Política profissional, Forças Armadas, Comunicação Social, Direito, Medicina, Magistério e Polícia são algumas das profissões de encantada predileção para os psicopatas, sempre em busca do exercício livre e sem culpas de seu poder sobre outrem.

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Profissões magníficas, de grande amplitude social, que agregam heróis e mesmo santos, são as mesmas que atraem a escória, pelo alcance que têm, pelo poder que representam.

A permissão para o uso da força, das armas, do direito a decidir sobre a vida e a morte, exercem irresistível atração à perversidade, ao delírio onipotente, à loucura articulada.

Os processos de seleção de policiais devem tornar-se cada vez mais rígidos no bloqueio à entrada desse tipo de gente. Igualmente, é nefasta a falta de um maior acompanhamento psicológico aos policiais já na ativa.

A polícia é chamada a cuidar dos piores dramas da população e nisso reside um componente desequilibrador. Quem cuida da polícia?

Os governos, de maneira geral, estruturam pobremente os serviços de atendimento psicológico aos policiais e aproveitam muito mal os policiais diplomados nas áreas de saúde mental.

Evidentemente, se os critérios de seleção e permanência devem tornar-se cada vez mais exigentes, espera-se que o Estado cuide também de retribuir com salários cada vez mais dignos.

De qualquer forma, o zelo pelo respeito e a decência dos quadros policiais não cabe apenas ao Estado mas aos próprios policiais, os maiores interessados em participarem de instituições livres de vícios, valorizadas socialmente e detentoras de credibilidade histórica.

DIREITOS HUMANOS DOS POLICIAIS - HUMILHAÇÃO versus HIERARQUIA

11ª - O equilíbrio psicológico, tão indispensável na ação da polícia, passa também pela saúde emocional da própria instituição. Mesmo que isso não se justifique, sabe-mos que policiais maltratados internamente tendem a descontar sua agressividade sobre o cidadão.

Evidentemente, polícia não funciona sem hierarquia. Há, contudo, clara distinção entre hierarquia e humilhação, entre ordem e perversidade.

Em muitas academias de polícia (é claro que não em todas) os policiais parecem ainda ser “adestrados” para alguma suposta “guerra de guerrilhas”, sendo submetidos a toda ordem de maus-tratos (beber sangue no pescoço da galinha, ficar em pé sobre formigueiro, ser “afogado” na lama por superior hierárquico, comer fezes, são só alguns dos recentes exemplos que tenho colecionado à partir da narrativa de amigos policiais, em diversas partes do Brasil).

Por uma contaminação da ideologia militar (diga-se de passagem, presente não apenas nas PMs mas também em muitas polícias civis), os futuros policiais são,

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muitas vezes, submetidos a violento estresse psicológico, a fim de atiçar-lhes a raiva contra o “inimigo” (será, nesse caso, o cidadão?).

Essa permissividade na violação interna dos Direitos Humanos dos policiais pode dar guarida à ação de personalidades sádicas e depravadas, que usam sua autoridade superior como cobertura para o exercício de suas doenças.

Além disso, como os policiais não vão lutar na extinta guerra do Vietnã, mas atuar nas ruas das cidades, esse tipo de “formação” (deformadora) representa uma perda de tempo, geradora apenas de brutalidade, atraso técnico e incompetência.

A verdadeira hierarquia só pode ser exercida com base na lei e na lógica, longe, portanto, do personalismo e do autoritarismo doentios.

O respeito aos superiores não pode ser imposto na base da humilhação e do medo. Não pode haver respeito unilateral, como não pode haver respeito sem admiração. Não podemos respeitar aqueles a quem odiamos.

A hierarquia é fundamental para o bom funciona-mento da polícia, mas ela só pode ser verdadeiramente alcançada através do exercício da liderança dos superiores, o que pressupõe práticas bilaterais de respeito, competência e seguimento de regras lógicas e supra pessoais.

NECESSIDADE DE HIERARQUIA

12ª - No extremo oposto, a debilidade hierárquica é também um mal. Pode passar uma imagem de descaso e desordem no serviço público, além de enredar na malha confusa da burocracia toda a prática policial.

A falta de uma Lei Orgânica Nacional para a polícia civil, por exemplo, pode propiciar um desvio fragmentador dessa instituição, amparando uma tendência de definição de conduta, em alguns casos, pela mera junção, em “colcha de retalhos”, do conjunto das práticas de suas delegacias.

Enquanto um melhor direcionamento não ocorre em plano nacional, é fundamental que os estados e instituições da polícia civil direcionem estrategicamente o processo de maneira a unificar sob regras claras a conduta do conjunto de seus agentes, transcendendo a mera predisposição dos delegados localmente responsáveis (e superando, assim, a “ordem” fragmentada, baseada na personificação). Além do conjunto da sociedade, a própria polícia civil será altamente beneficiada, uma vez que regras objetivas para todos (incluídas aí as condutas internas) só podem dar maior segurança e credibilidade aos que precisam executar tão importante e ao mesmo tempo tão intrincado e difícil trabalho.

A FORMAÇÃO DOS POLICIAIS

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13ª - A superação desses desvios poderia dar-se, ao menos em parte, pelo estabelecimento de um “núcleo comum”, de conteúdos e metodologias na formação de ambas as polícias, que privilegiasse a formação do juízo moral, as ciências humanísticas e a tecnologia como contraponto de eficácia à incompetência da força bruta.

Aqui, deve-se ressaltar a importância das academias de Polícia Civil, das escolas formativas de oficiais e soldados e dos institutos superiores de ensino e pesquisa, como bases para a construção da Polícia Cidadã, seja através de suas intervenções junto aos policiais ingressantes, seja na qualificação daqueles que se encontram há mais tempo na ativa. Um bom currículo e professores habilitados não apenas nos conhecimentos técnicos, mas igualmente nas artes didáticas e no relacionamento interpessoal, são fundamentais para a geração de policiais que atuem com base na lei e na ordem hierárquica, mas também na autonomia moral e intelectual. Do policial contemporâneo, mesmo o de mais simples escalão, se exigirá, cada vez mais, discernimento de valores éticos e condução rápida de processos de raciocínio na tomada de decisões.

CONCLUSÃO

A polícia, como instituição de serviço à cidadania em uma de suas demandas mais básicas — Segurança Pública — tem tudo para ser altamente respeitada e valorizada.

Para tanto, precisa resgatar a consciência da importância de seu papel social e, por conseguinte, a auto-estima.

Esse caminho passa pela superação das seqüelas deixadas pelo período ditatorial: velhos ranços psicopáticos, às vezes ainda abancados no poder, contaminação anacrônica pela ideologia militar da Guerra Fria, crença de que a competência se alcança pela truculência e não pela técnica, maus-tratos internos a policiais de escalões inferiores, corporativismo no acobertamento de práticas incompatíveis com a nobreza da missão policial.

O processo de modernização democrática já está instaurado e conta com a parceria de organizações como a Anistia Internacional (que, dentro e fora do Brasil, aliás, mantém um notável quadro de policiais a ela filiados).

Dessa forma, o velho paradigma antagonista da Segurança Pública e dos Direitos Humanos precisa ser substituído por um novo, que exige desacomodação de ambos os campos: “Segurança Pública com Direitos Humanos”.

O policial, pela natural autoridade moral que porta, tem o potencial de ser o mais marcante promotor dos Direitos Humanos, revertendo o quadro de descrédito social e qualificando-se como um personagem central da democracia. As organizações não-governamentais que ainda não descobriram a força e a importância do policial como agente de transformação, devem abrir-se, urgentemente, a isso, sob pena de, aferradas a velhos paradigmas, perderem o concurso da ação impactante desse ator social.

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Direitos Humanos, cada vez mais, também é coisa de polícia!

UNIDADE 2 – DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

Direito Internacional Humanitário

1. Introdução

1.1. O que é o Direito Internacional Humanitário (D.I.H.)?

O Direito Internacional Humanitário (ou Direito dos Conflitos Armados) é um ramo do Direito Internacional Público constituído por todas as normas convencionais ou de origem consuetudinária especificamente destinadas a regulamentar os problemas que surgem em período de conflito armado.

Estas podem ser fundamentalmente de três tipos:

O primeiro é constituído pelo chamado Direito de Genebra, isto é, pelas quatro Convenções de Genebra de 1949 para a proteção das vítimas de guerra e dos seus dois Protocolos Adicionais de 1977. Estes seis instrumentos jurídicos perfazem cerca de 600 artigos codificando as normas de proteção da pessoa humana em caso de conflito armado. Estes textos de Genebra foram elaborados (como aliás os próprios títulos das Convenções o comprovam) com o único objetivo de proteção das vítimas de guerra: tanto os militares fora de combate, bem como as pessoas que não participem nas operações militares.

O segundo tipo de regras é chamado o Direito de Haia constituído pelo direito da guerra propriamente dito, ou seja pelos princípios que regem a conduta das operações militares, direitos e deveres dos militares participantes na conduta das operações militares e limita os meios de ferir o inimigo. Estas regras têm vista a necessidade de ter em conta necessidades militares das parte em conflito, nunca esquecendo porém os princípios de humanidade. O Direito de Haia encontra a maior parte das suas regras nas Convenções de Haia de 1899 (revistas em 1907), mas

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igualmente em algumas regras do Protocolo I Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949.

O terceiro tipo de regras (ditas de Nova Iorque) prende-se com a proteção dos direitos humanos em período de conflito armado. São chamadas regras de Nova Iorque por terem na sua base a atividade desenvolvida pelas Nações Unidas no âmbito do direito humanitário. Com efeito é importante referir que em 1968 a Assembléia Geral das Nações Unidas adotou a Resolução 2444 (XXIII) com o título "Respeito dos direitos humanos em período de conflito armado", o que constitui um marco, verdadeiro sinal da mudança de atitude desta organização no que diz respeito ao Direito humanitário. Se, desde 1945 a O.N.U. não se ocupou deste ramo do direito com a justificação de que tal indiciaria uma falta de confiança na própria organização enquanto garante da paz, o ano de 1968 pode ser considerado como o do nascimento deste novo foco de interesse. As Nações Unidas têm desde então vindo ainda a mostrar um grande interesse em tratar questões como as relativas às guerras de libertação nacional, e à interdição ou limitação da utilização de certas armas clássicas.

1.2. A sua evolução histórica

Nas suas origens a guerra caracterizava-se pela ausência de qualquer regra para além da lei do mais forte. As populações vencidas eram massacradas e, na melhor das hipóteses, reduzidas à escravatura.

Mas o progresso das idéias, a necessidade de os beligerantes preservarem o seu potencial humano, o medo de represálias e a tomada de consciência do caráter irracional, inútil e economicamente prejudicial das destruições e massacres totais, levaram os homens a considerar de modo diferente os vencidos. Desta forma começaram a levantar-se vozes de moderação, tolerância e humanidade.

A título de exemplo podem ser referidas as leis de Manou (na India) que proíbem a utilização de flechas envenenadas, exigem que o vencedor poupe os feridos, bem como aqueles que se rendem e que respeite as leis das nações conquistadas.

Na China, um pensador do século IV A.C., Se-Ma, condena as destruições inúteis e recomenda que não sejam atacadas as pessoas que não se possam defender e que os feridos sejam tratados.

Os Incas tinham uma conduta paternal relativamente aos povos vencidos, especialmente se estes fossem estrangeiros: tentando uma reconciliação.

A Europa e a zona do Mediterrâneo beneficiam da influência dos ensinamentos do Cristianismo e do Islão. Mesmo se em certas ocasiões a Igreja Católica parece esquecer os pedidos de não recurso à violência, o que é certo é que ela permanece fiel à vontade de assegurar uma certa humanização das guerras. Santo Agostinho escreveu:

"Se o inimigo que combate deve morrer, que tal seja por necessidade, e não por tua vontade .... O vencido ou o capturado têm direito à compaixão."

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No século X D.C. em vários Concílios é proclamada a inviolabilidade das igrejas, dos mosteiros, dos pobres, dos mercadores, dos peregrinos, dos agricultores e dos seus bens. Estes princípios constituem as regras da Paz de Deus, cuja violação é sancionada pela excomunhão.

O Islão condena igualmente o crime, as mutilações, a tortura e protege os velhos, mulheres, crianças, mosteiros muçulmanos e os seus bens dos efeitos da guerra.

Enfim, em 1762 Jean Jacques Rousseau escreve no seu Contrato Social que a guerra não consiste numa relação de homem para homem, mas sim de Estado para Estado, na qual os indivíduos só acidentalmente são inimigos. Segundo este autor o fim da guerra transforma os antigos inimigos novamente em simples homens, o que implica o respeito pelos soldados feridos e por aqueles que se encontrem em poder do inimigo.

No entanto, o acontecimento que irá levar à criação de um corpo de normas escritas relativas à proteção das vítimas da guerra, que constituirá a contribuição efetiva para o desenvolvimento deste ramo do direito, só terá lugar em meados do século XIX:

1859 - Henry Dunant, cidadão suiço de 31 anos, chega a Solferino no dia 24 de Junho (uma cidade do Norte de Itália) com vista a conseguir obter ajuda de Napoleão III para uns investimentos que efetuara na Argélia. Nesse preciso dia desenrolava-se uma batalha entre os exércitos Austríaco e Francês. Dunant fica horrorizado com a falta de serviços médicos adequados que assegurassem o tratamento das vítimas e improvisa ele mesmo, um apoio aos feridos da batalha.

1862 - De volta a Genebra Henry Dunant passa a escrito as recordações da experiência que viveu, editando um livro com o título "Uma Recordação de Solferino", que se tornou num sucesso imediato. Nesta sua obra Dunant faz duas sugestões: por um lado propõe a criação de sociedades de ajuda a todos os feridos sem distinção quanto à nacionalidade e, por outro lado, a adopção de uma Convenção que assegurasse a proteção dos soldados feridos e do pessoal médico no campo de batalha.

1863 - O Comitê Internacional de Socorro aos Militares Feridos em Tempo de Guerra é criado, sendo os membros fundadores, para além do próprio Dunant, Gustave Moynier, Guillaume-Henri Dufour, Louis Appia, Theodore Maunoir. Em Agosto deste mesmo ano o Comité decide organizar uma Conferência Internacional em Genebra com a participação de representantes governamentais. A conferência revela-se um sucesso, tendo 62 delegados representando 16 Estados, adotado as resoluções que estão na base do Movimento da Cruz Vermelha.

1864 - Primeira Convenção de Genebra. Esta Convenção é ratificada, entre 1864 e 1907 por 57 Estados - um recorde na época.

1868 - Declaração de São Petersburgo - o primeiro instrumento internacional que regula os métodos e meios de combate. A Declaração, considerada como enunciando o direito consuetudinário existente, proíbe o ataque a não combatentes, a utilização de armas que agravem inutilmente o sofrimento dos feridos ou que

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tornem a sua morte inevitável e o emprego de projeteis com menos de 400g contendo uma carga explosiva ou substâncias incendiárias.

1899 - Convenções e Declarações de Haia. Entre aquelas que não serão revistas em 1907 podemos citar a Declaração que proíbe por um lado a utilização de gás asfixiante e por outro a utilização de balas "dum-dum".

1906 - Convenção de Genebra sobre os feridos e doentes nos exércitos.

1907 - 13 Convenções de Haia relativas, entre outros, às leis e costumes da guerra, aos direitos e deveres das potências neutras em caso de guerra terrestre, ao regime dos navios de comércio no início das hostilidades, à transformação dos navios de comércio em navios de guerra, à colocação de minas submarinas automáticas de contacto, ao bombardeamento por forças navais em tempo de guerra, à adaptação dos princípios da Convenção de Genebra à guerra marítima e à proibição de lançar projeteis e explosivos a partir de balões.

1923 - Regras de Haia sobre a guerra aérea (que nunca se tornarão) numa Convenção.

1925 - Protocolo de Genebra de 17 de Junho relativo à proibição de utilizar gazes asfixiantes, tóxicos ou similares na guerra.

1929 - Duas Convenções de Genebra sobre os feridos e doentes em campanha (I) e sobre os prisioneiros de guerra (II).

1949 - Quatro Convenções de Genebra:

1. Convenção para melhorar a situação dos feridos e doentes das forças armadas em campanha (Convenção I);

2. Convenção de Genebra para melhorar a situação dos feridos, doentes e náufragos das forças armadas no mar (Convenção II);

3. Convenção de Genebra relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra (Convenção III);

4. Convenção de Genebra relativa à proteção das pessoas civis em tempo de guerra (Convenção IV).

1954 - Convenção e Protocolo de Haia para a proteção de bens culturais em caso de conflito armado.

1977 - Protocolos Adicionais às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949

1. Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 relativo à proteção das vítimas dos conflitos armados internacionais (Protocolo I),

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2. Protocolo Adicional às Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1949 relativo à proteção das vítimas dos conflitos armados não internacionais (Protocolo II),

1981 - Convenção das Nações Unidas sobre a proibição ou a limitação da utilização de certas armas clássicas que podem ser consideradas como produzindo efeitos traumáticos excessivos ou como atingindo sem discriminação. Esta Convenção era composta de 3 Protocolos anexos.

Em 1996 reuniu-se a Conferência para Exame da Convenção que aprovou alterações ao Protocolo II relativo a minas, armadilhas e outros dispositivos e um Protocolo IV relativo às armas que provocam a cegueira.

Unidade 3 – Direitos Humanos e a legislação brasileira

A CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA E OS DIREITOS HUMANOS

No título I (DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS) da Constituição, proclama que o Brasil se rege em suas relações internacionais pelo princípio da prevalência dos direitos humanos (art. 4º, II), constituindo-se em Estado Democrático de Direito tendo como fundamento a cidadania e dignidade da pessoa humana (art. 1º, II e III). No título II (DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS) enumera os direitos e garantias fundamentais, antecipando-os inclusive à própria estruturação do Estado.

No mesmo título, no capítulo I enuncia os “direitos e deveres individuais e coletivos” (1ª geração). No capítulo II os “direitos sociais” (2ª geração). Esta enumeração é exemplificativa e não terminativa, pois segundo o art. 5º, § 2º os direitos e garantias expressos na Carta Magna não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que o Estado brasileiro seja parte.

No mesmo artigo em seu § 1º acrescenta que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

Assim, pela Constituição de 1988, depreende-se que os direitos nela elencados são bilaterais tendo como sujeitos ativos as pessoas individualmente ou em grupos determinados ou indeterminados, e como sujeito passivo o Estado, a quem deve respeitá-los e cumpri-los. Todos os indivíduos e grupos devem respeitar as liberdades reciprocamente uns dos outros.

A nova Constituição vem assim a fortalecer a tendência das Constituições recentes, de reconhecer a relevância da proteção internacional dos direitos humanos e dispensar atenção e tratamentos especiais à matéria.

O POLICIAL MILITAR E OS LIMITES DA LEI

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Deve-se ter a lei como único caminho, além de exigir que cada companheiro também a tenha como linha de atuação.

Quando um policial militar comete qualquer ato que arbitrariamente atente contra a dignidade humana, responde pôr sanções nas esferas administrativas, civil e penal. Apesar do infrator ser individualmente responsabilizada, toda a Corporação tem sua imagem macula diante da sociedade, e isso refletirá negativamente no trabalho dos outros milhares de companheiros.

1 - Abuso de poder, abuso de autoridadeA Lei Federal 4.898/65, prevê penas para ações de quem, no exercício da

atividade pública, abusa da autoridade que lhe foi conferida.O policial como autoridade deve estar atento ao disposto nessa lei, pois em

regra, ela criminaliza todas as condutas que desrespeitem os direitos da pessoa.Por esta lei, constitui abuso de autoridade qualquer conduta que atente contra

a liberdade de locomoção, contra a inviolabilidade do domicílio, o sigilo de correspondência, a liberdade de crença ou religião, incolumidade física, e outros direitos inerentes à pessoa.

Comete abuso de autoridade quem pratica ação ou deixa de tomar providências que tire a liberdade de locomoção de alguém, ou deixa de pôr em liberdade, quem pôr lei a ela faça jus.

O desempenho de um bom trabalho policial é perfeitamente compatível com o respeito à Cidadania das pessoas.

2 - O crime de torturaA Constituição Federal já proibia expressamente a tortura, e o Estatuto da

Criança e Adolescente também previa pena para essa prática, mas pôr meio da Lei Federal 9.455, de 07/04/97, a tortura passou a ser um crime autônomo.

A tortura é uma prática que afronta os direitos da pessoa, pois a coloca numa situação degradante.

A tortura é caracterizada pôr qualquer ato que cause sofrimento físico ou mental a alguém, com a finalidade de obter informação ou confissão sobre algum fato, ou pôr mera discriminação racial ou religiosa.

O crime de tortura é inafiançável e não dá direito à graça ou à anistia, e sua condenação implica na perda do cargo, função ou emprego público e a interdição para o seu exercício pelo dobro do prazo da pena aplicada.

3 - Responsabilidade administrativa, civil e criminal

A Lei Federal 4.898/65 responsabiliza as autoridades que abusam do exercício do seu poder nas três esferas, ou seja, na administrativa, na civil e na criminal.

Assim, se o policial que cometer uma das condutas classificadas como abuso de autoridade, poderá sofrer punições na esfera administrativa, desde a transferência do local de trabalho até a exoneração do serviço público; na esfera civil, poderá ser

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obrigado a reparar os danos causados à vitima, e também ser penalmente punido, inclusive com pena privativa de liberdade.

Na verdade, se o policial militar estiver consciente do respeito aos direitos inerentes à pessoa e tiver isso como meta, jamais está sujeito às penas previstas nessa lei.

Unidade 4 – Polícia e Direitos Humanos

O policial cidadão é antes de tudo uma pessoa, e como tal, deve ser tratado e deve tratar seus semelhantes.

A sociedade espera que o policial seja equilibrado, coerente, legalista, respeitoso, e principalmente que tenha orgulho em exercer atividade tão importante para a dignidade da pessoa e para que possa conscientizar-se da importância de sua atividade e que ela está diretamente relacionada com o respeito à Cidadania é necessário refletir sobre alguns princípios. 1 - Principio da dignidade

É este principio que garante o respeito à dignidade da pessoa, mesmo quando ela comete infrações puníveis.

Assim, diante de um crime, o policial deve tomar as providências legais que aquela conduta requer, mas jamais poderá desrespeitar a dignidade daquela pessoa.

2 - Principio da legalidadeO policial deve ser uma pessoa serena e convicta da importância da sua

atividade para sociedade.Esta convicção requer entendimento de que a todos é permitido fazer o que

norma jurídica não proíbe, e a não fazer o que alei não manda.Quando o policial age dentro dos parâmetros legais está defendendo os

interesses da sociedade, da sua Corporação e os seus próprios.

3 - Principio da presunção da inocênciaComo importante agente da Cidadania, o policial deve ter preparo físico,

intelectual e emocional para manter a serenidade mesmo atuando em contato com pessoas aflitas, com problemas e necessitadas.

O policial deve partir do principio de que todas pessoas são inocentes, e só deve mudar esse posicionamento, diante de fatos concretos. É claro que considerar alguém inocente não implica em deixar de tomar as necessárias medidas de segurança pessoal. A inobservância desse principio pode levar o policial a cometer abuso de autoridade pôr constrangimento ou violência arbitrária.

4 - Principio da auto-estimaO policial , antes de tudo, é um cidadão comum, e deve estar consciente disso

durante a sua atividade.

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A sociedade espera estar sendo protegida, e para que o policial militar possa proteger os direitos de alguém, é necessário que valorize os seus próprios direitos. Assim é indispensável que ele mantenha elevado seu nível de auto-estima, pois é impossível que alguém respeite a vida alheia quando não se tem amor à própria vida, quando não se valoriza a própria liberdade.

5 - Principio da prestação de serviçoA atividade policial é gratificante, mas, às vezes, ingrata, pois, na prática a

pessoa só procura a policia quando está em dificuldades. Assim, deve-se estar preparado para, principalmente diante de seus eventuais erros, receber criticas , entendendo que faz parte das regras estabelecidas pelo regime democrático. Diante dessas criticas o policial deve reavaliar sua conduta e o nível de prestação de serviços.

6 - Principio do conhecimento e da segurançaO policial moderno deve ser comunitário, conhecendo exatamente o conteúdo

e a importância de sua atividade.É necessário estar bem preparado, para que possa adquirir a segurança

indispensável ao exercício da difícil missão.A sociedade não pode aceitar que, quem tem dever de proteger os bens, a

vida, a liberdade e a integridade física dos cidadãos seja um profissional inseguro, indiscreto, impaciente e desrespeitoso.

A ignorância gera insegurança e precipitação, e isso ocasiona erros que, em regra, representam injustiças e ofensas à dignidade humana. Os possíveis erros pessoais, no exercício da atividade policial militar, além de trazerem conseqüências danosas à

Corporação, podem acarretar prejuízos irreparáveis à pessoa.

Definições

Privação da liberdade é a definição mais ampla da violação da liberdade de ir e vir. Esta inclui a retenção de menores, de pessoas mentalmente doentes, de viciados em drogas ou em álcool e de desocupados. A privação se estende a situações em que esta é causada tanto por pessoas comuns quanto por agentes públicos.

As definições a seguir foram extraídas do Conjunto de Princípios para a Proteção de Todas as Pessoas sob Qualquer Forma de Detenção ou Prisão, aqui designado de O Conjunto de Princípios.

Captura designa o ato de deter uma pessoa sob suspeita da prática de um delito, ou pela ação de uma autoridade;

Pessoa detida designa qualquer pessoa privada de sua liberdade, exceto no caso de condenação por um delito;

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Pessoa presa significa qualquer pessoa privada de sua liberdade como resultado da condenação por um delito;

Detenção significa a condição das pessoas detidas nos termos acima referidos;

Prisão significa a condição das pessoas presas nos termos acima referidos;

Autoridade judicial ou outra autoridade significa uma autoridade judicial ou outra autoridade perante a lei cujo status e mandato assegurem as mais sólidas garantias de competência, imparcialidade e independência.

Razões para Captura

A missão de aplicar a lei e manter a ordem pública pode colocar os encarregados da aplicação da lei e os demais membros da sociedade em lados opostos num dado conflito. Do interesse dos Estados na lei e na ordem resultou o fato que os encarregados da aplicação da lei terem, não somente a responsabilidade, mas também a autoridade para, se necessário, impor as leis do Estado a que servem. Na maioria dos Estados, os encarregados da aplicação da lei têm poderes discricionários de captura, detenção e do uso da força e de armas de fogo, e podem exercê-los em qualquer situação de aplicação da lei.

Ninguém será privado de [sua] liberdade exceto com base em e de acordo com os procedimentos estabelecidos por lei (PIDCP, artigo 9.1). Essa cláusula deixa claro que as razões, bem como os procedimentos para uma captura, devem ser baseados na legislação do Estado. O princípio da legalidade é violado se alguém for capturado ou detido com base em princípios que não estejam claramente estabelecidos na legislação nacional, ou sejam contrários a esta.

No sentido técnico, toda infração da lei ou toda suspeita da prática de um delito (como denominada no Conjunto de Princípios) poderia acarretar a captura da(s) pessoa(s) responsável(eis). Todavia, na prática da aplicação da lei nem toda a suspeita da prática de um delito leva automaticamente (ou deveria levar) à captura da(s) pessoa(s) responsável(eis). Existe um certo número de fatores que influenciam a decisão de efetuar ou não a captura. Por exemplo, a gravidade e as conseqüências do delito cometido, combinadas com a personalidade e o comportamento do(s) suspeito(s), no ato da captura, devem ser consideradas. A qualidade e a experiência (isto é, competência) dos encarregados da aplicação da lei envolvidos também influenciarão, inevitavelmente a resolução de uma situação específica na qual o juízo a respeito da captura ou não terá de ser exercido.

Captura ou Detenção Arbitrárias

....Ninguém será submetido à captura ou detenção arbitrárias.... A proibição da arbitrariedade, na segunda frase do artigo 9.1 do PIDCP, representa uma restrição adicional à privação da liberdade. Isto é direcionado tanto ao legislativo nacional quanto às organizações de aplicação da lei. Não basta que a privação da liberdade esteja prevista em lei: a própria lei não pode ser arbitrária, tampouco deve

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ser a sua aplicação em uma dada situação. Entende-se que a palavra arbitrária, neste caso, contenha elementos de injustiça, imprevisibilidade, irracionalidade, inconstância e desproporcionalidade.

A Conduta dos Encarregados da Aplicação da Lei

Os princípios da legalidade e necessidade, juntamente com a proibição da arbitrariedade, impõem certas expectativas na conduta dos encarregados da aplicação da lei, em situações de captura. Estas expectativas relacionam-se ao conhecimento da lei e dos procedimentos a serem observados em situações específicas e/ou circunstâncias que possam levar à privação da liberdade.

O Conjunto de Princípios declara que captura, detenção ou prisão somente deverão ser efetuados em estrita conformidade com os dispositivos legais e por encarregados competentes, ou pessoas autorizadas para aquele propósito.

Direitos no ato da Captura

Sempre que uma pessoa for capturada, a razão deve ser pela suspeita da prática de um delito ou por ação de uma autoridade (Conjunto de Princípios, Princípio 36.2).

Toda pessoa capturada deverá ser informada, no momento de sua captura, das razões da captura, devendo ser prontamente informada de qualquer acusação contra ela (PIDCP, artigo 9.2; Conjunto de Princípios, Princípio 10).

A pessoa capturada deverá ser levada a um local de custódia, devendo ser conduzida prontamente perante um juiz ou outra autoridade habilitada por lei a exercer poder judicial, que decidirá sobre a legalidade e a necessidade da captura (PIDCP, artigo 9.3; Conjunto de Princípios, Princípios 11 e 37).

Estes dispositivos sobre captura e detenção repetem-se na CADH (artigo 7o) e na CEDH (artigo 5o). A CADHP não contém nenhum destes dispositivos. Não há uma definição clara do que se entende por prontamente. Em muitos Estados o período máximo permitido antes que uma pessoa capturada seja trazida perante um juiz ou autoridade similar é limitado a 48 horas; em outros Estados este período é limitado a 24 horas. Este período de 48 ou 24 horas é mais comumente chamado de custódia policial. O período que o segue é chamado de prisão preventiva.

Uma pessoa detida sob acusação criminal terá direito a julgamento dentro de um prazo razoável, ou aguardar julgamento em liberdade (Conjunto de Princípios, Princípio 38).

As autoridades responsáveis pela captura, detenção ou prisão de uma pessoa devem, respectivamente, no momento da captura e no início da detenção ou da prisão, ou pouco depois, prestar-lhe informação e explicação sobre os direitos e sobre o modo de os exercer (Conjunto de Princípios, Princípio 13).

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Prática Gerencial 2

Um exemplo de boa prática de aplicação da lei é a produção e disseminação de folhetos explicando os direitos de pessoas capturadas. Em muitos países as organizações de aplicação da lei produzem tais folhetos em várias línguas para assegurar sua acessibilidade. Ao ser levada à custódia policial, a pessoa em questão recebe um desses folhetos na sua língua materna, explicando seus direitos e como exercê-los.

Direitos imediatamente após a Captura

A presunção da inocência aplica-se a todas pessoas detidas e deve também refletir-se no tratamento delas.

São proibidas medidas além das necessárias para evitar a obstrução do processo de investigação ou para manter a ordem e segurança do local de detenção (Conjunto de Princípios, Princípio 36).

Uma pessoa detida tem o direito à assistência de um advogado e condições razoáveis devem ser propiciadas para que este direito seja exercido. Um advogado de ofício deve ser providenciado pela autoridade judicial ou outra autoridade caso a pessoa detida não tenha advogado próprio, e de graça caso não tenha condições financeiras (Conjunto de Princípios, Princípio 17).

Os direitos de uma pessoa detida e/ou seu advogado são os seguintes:

ter oportunidade efetiva de ser ouvido por uma autoridade judicial ou outra autoridade;

receber comunicação pronta e completa de qualquer ordem de detenção, juntamente com as razões para tal (Princípio 11);

comunicar-se entre si e ter tempo e condições adequadas para consulta em sigilo absoluto, sem censura e sem demora;

comunicar-se entre si sob vigilância de um encarregado da aplicação da lei, porém sem serem ouvidos;

(...) tais comunicações serão inadmissíveis como prova contra a pessoa detida, a menos que sejam conectadas com um crime em andamento ou em planejamento (Princípio 18);

ter acesso às informações gravadas durante toda a duração de qualquer interrogatório, e dos intervalos entre interrogatórios, e à identidade dos encarregados da condução dos interrogatórios e outras pessoas presentes (Princípio 23);

de tomar medidas, em conformidade com a legislação nacional, perante uma autoridade judicial ou outra autoridade, para impugnar a legalidade da detenção, de forma a obter sua libertação caso seja ilegal (Princípio 32);

de apresentar requerimento ou queixa relativos ao tratamento do detido, em particular no caso de tortura ou tratamento cruel, desumano ou degradante, às autoridades administrativas ou superiores e, quando necessário, às autoridades apropriadas investidas de poderes de revisão ou correção (Princípio 33).

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A proibição da tortura aplica-se às pessoas sob qualquer forma de detenção ou prisão (Conjunto de Princípios, Princípio 6). Esta proibição está mais elaborada no Princípio 21, que proíbe explicitamente que se tire vantagem da situação de uma pessoa detida para obter-se uma confissão, incriminação própria, ou testemunho contra outros.

A pessoa detida tem o direito de informar ou requerer às autoridades competentes que notifiquem membros de sua família ou outras pessoas apropriadas de sua escolha a respeito de sua captura, detenção ou prisão. Este direito é renovado a cada transferência de local da pessoa (Conjunto de Princípios, Princípio 16).

Além dos direitos mencionados acima, que estão diretamente ligados à situação de captura ou o período imediatamente posterior, existe um certo número de disposições no Conjunto de Princípios que se relacionam mais especificamente ao bem-estar da pessoa detenta ou presa. Embora estas disposições sejam de grande importância à aplicação da lei, é mais apropriado que elas sejam apresentadas no capítulo sobre Detenção.

A Situação Especial das Mulheres

O princípio da não discriminação com base no sexo é um princípio fundamental do direito internacional - inserido na Carta da ONU, na DUDH (artigo 2o) e nos principais tratados de direitos humanos. De acordo com este princípio de não-discriminação, toda a proteção oferecida a uma pessoa quando da captura e após esta (apresentada acima) aplica-se igualmente a homens e mulheres.

No entanto, deve ser observado que o respeito pela dignidade inerente da pessoa humana (Conjunto de Princípios, Princípio 1) e a proteção de seus direitos podem ditar que proteção e consideração adicionais sejam dadas à mulher. Tais medidas podem incluir, por exemplo, a garantia de que a captura de mulheres seja feita por agentes femininos sempre que possível, que sua revista e de suas roupas seja feita por uma agente feminina, e que as detidas do sexo feminino sejam postas em locais separados dos detidos do sexo masculino. Essas formas (adicionais) de proteção e consideração pela mulher não devem ser interpretadas como discriminatórias, porque seu objetivo é compensar um desequilíbrio inerente - visam criar uma situação na qual a condição das mulheres de gozarem os direitos que lhes são deferidos é igual à dos homens.

A Situação Especial das Crianças e Adolescentes

A Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) define criança como sendo todo ser humano menor de 18 anos, salvo se, nos termos da lei que lhe for aplicável, atingir a maioridade mais cedo ( artigo 1º ).

As Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing) definem o menor como sendo uma criança ou jovem que, perante os respectivos sistemas jurídicos, é passível de ser tratada por

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um delito de uma forma diferenciada daquela de um adulto (Regra 2.2 a). De acordo com as Regras de Beijing, um infrator juvenil é uma criança ou jovem acusado de haver cometido um delito ou considerado culpado de ter cometido um delito (Regra 2.2 c).

Os infratores juvenis têm os mesmos direitos que os infratores adultos, porém gozam de proteção adicional, em virtude das disposições específicas a este respeito contidas nos instrumentos internacionais. O principal objetivo destas disposições específicas é o de retirar a criança e o adolescente do sistema de justiça criminal e redirecioná-los à sociedade.

Os ditos direitos podem ser traduzidos nas seguintes obrigações para os encarregados da aplicação da lei:

dar informações prontamente NO MOMENTO da captura sobre as razões desta;

informar à pessoa capturada, prontamente, qualquer acusação contra ela;

informar à pessoa capturada, prontamente, seus direitos e de como exercê-los;

registrar devidamente, para cada pessoa capturada:

- as razões para a captura;- a hora da captura;- a condução da pessoa para o local de custódia;- a primeira apresentação daquela pessoa perante a autoridade judicial ou outra autoridade;- a identidade dos encarregados da aplicação da lei envolvidos;- informações precisas sobre o local de custódia;

comunicar este registro à pessoa capturada ou seu advogado na forma prescrita por lei;

trazer a pessoa capturada prontamente à presença de uma autoridade judicial ou outra autoridade, que possa julgar a legalidade e a necessidade da captura;

providenciar um advogado à pessoa capturada e permitir condições adequadas de comunicação entre eles;

reprimir a tortura ou outro tratamento ou pena cruel, desumano ou degradante, durante ou após a captura;

assegurar à pessoa capturada seus direitos posteriores como detida (vide também o Capítulo 9, Detenção);

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observar estritamente as regras para proteção da situação especial das mulheres e das crianças e adolescentes.

Finalmente, deve ser enfatizado que, de acordo com os Princípios de Prevenção e Investigação Eficazes de Execuções Extrajudiciais, Arbitrárias e Sumárias, é da responsabilidade dos governos assegurar um controle rígido (incluindo uma clara linha de comando) sobre todos os agentes envolvidos em capturas, detenções, custódia e prisão - bem como sobre aqueles autorizados a usar força e armas de fogo.

Os agentes policiais com responsabilidades de comando e supervisão estão obrigados a fazer com que as necessárias medidas de controle e a linha de comando estejam estabelecidas, de modo a evitar mortes extrajudiciais durante captura e/ou detenção.

Unidade 5 – Grupos vulneráveis

1. Introdução

O policial em sua rotina de trabalho está habituado a um procedimento padrão, com pessoas que podem se locomover normalmente, que podem entender o que lhes é solicitado, em fim, que não possuem características que dificultam o desenvolvimento de seus procedimentos policiais. Porém, quando se depara com uma pessoa que possui qualquer outra característica que a torna diferente das demais, como por exemplo, uma deficiência física, sua orientação sexual, sua idade avançada, entre outras, encontra, por vezes, dificuldades no trato com estas pessoas.

A atividade de polícia, porém, exige um profissional, que saiba lidar com as pessoas sem discriminá-las ou privilegiá-las, de forma imparcial tratando da garantia de seus direitos, e da resolução dos conflitos de forma serena e igualitária.

A pessoa que possui uma característica que o diferencia dos demais espera ser tratada não como um inútil, desprezível, ou como alguém que necessita tão somente do assistencialismo e indulgência dos demais. Mas, sim, como um cidadão cumpridor de seus deveres para com a sociedade em que vive, sendo respeitado seu clamor pela proteção de seus direitos e por sua dignidade. Por isto, é imprescindível que o policial conheça um pouco sobre as diferenças e procure sempre respeitá-las. O policial deve conhecer os procedimentos que fogem aos padrões, contemplando questões sobre Minorias e Grupos Vulneráveis, de forma a nortear a atuação do policial no trato adequado com as pessoas integrantes destes grupos.

2. Grupo Vulnerável – Conceito –

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Grupo Vulnerável é um conjunto de pessoas, que possuem características especiais, que as tornam mais suscetíveis a violação dos seus direitos.

2.1Os 05 (cinco) principais grupos são:

a) Mulheres;

b) Crianças e adolescentes;

c) Idosos;

d) Homossexuais

e) Pessoas com deficiência física e sofrimento mental.

3 .Minorias

“Um grupo de cidadãos de um Estado, constituindo minoria numérica e em posição não-dominante no Estado, dotada de características étnicas, religiosas ou lingüística que diferem daquelas da maioria da população, tendo um senso de solidariedade um para com o outro, motivado, senão apenas implicitamente, por vontade coletiva de sobreviver e cujo objetivo é conquistar igualdade com a maioria, nos fatos e na lei” .

3.1 Minorias étnicas

“São grupos que apresentam fatores distinguíveis em termos de experiências históricas compartilhadas e sua adesão a certas tradições e significantes tratos culturais, que são diferentes dos apresentados pela maioria”. ( Pouter 1986).

3.2 Minorias Lingüísticas

“São grupos que usam uma língua, quer entre os membros do grupo, quer em público, que claramente se diferencia daquela utilizada pela maioria, bem como da adotada oficialmente pelo Estado. Não há necessidade de ser uma língua escrita. Entretanto, meros dialetos que se desviam ligeiramente da língua da maioria não gozam do mesmo modo que religião, e, a seguir, etnia, precisam ser definidas,o mesmo se dá com a expressão língua, e minorias lingüísticas. Língua é utilizada como sinônimo de linguagem, querendo significar “método humano e não instintivo de comunicar idéias, sentimentos e desejos, por meio de um sistema de sons e símbolos sonoros” (Hornby - 1974)

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3.3 Minorias Religiosas

“São grupos que professam e praticam uma religião (não simplesmente uma outra crença, como o ateísmo, e.g.) Dienstein (1992:156) que se diferencia daquela praticada pela maioria da população”. Esse é outro aspecto de relevo, a conceituação de religião, para fins de proteção. Walker aponta que “religião envolve crença em e conciliação de poderes considerados superiores ao homem os quais são acreditados como reguladores e controladores do curso da natureza, e da vida humana. Envolve elementos de crença, um corpo de dogma, atos de profissão de fé, e ritual” (Dinstein, Yoram e M.Tobory 1992).

No Brasil têm-se as seguintes minorias: judeus, budistas, muçulmanos, evangélicos, espíritas, praticantes de candomblé (religião ioruba) entre outros.

4 Diferença entre grupos vulneráveis e minorias

Os Grupos Vulneráveis são pessoas que podem fazer parte de uma minoria ética, mas possui dentro desta minoria uma característica que a difere dos demais e o torna parte de um outro grupo. Por exemplo, uma pessoa, que faz parte de um pequeno grupo Islâmico em um país católico e também ser uma pessoa com deficiência física. Sendo assim ela pertence a uma minoria religiosa (islã), mas também pertence a um grupo vulnerável por ter uma deficiência física.

A diferença básica é que as minorias estão limitadas aos aspectos éticos, lingüísticos e religiosos. E os grupos vulneráveis estão relacionados às características especiais que as pessoas adquirem em razão de sua tenra idade, gênero, idade avançada, orientação sexual e deficiência física e sofrimento mental.

5 Atuação policial frente aos grupos vulneráveis

5.1 Mulheres

A igualdade é a essência de toda sociedade democrática comprometida com a justiça e os direitos humanos. Em praticamente todas as esferas sociais e de atividade, a mulher está sujeita a desigualdades por lei e de fato. Esta situação é causada e agravada pela existência de discriminação na família, na comunidade e no local de trabalho. A discriminação contra a mulher se mantém através da sobrevivência de estereótipos (do homem assim como da mulher), de culturas tradicionais e crenças prejudiciais às mulheres.”

Entende-se por discriminação contra mulheres qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tenha como efeito ou como objetivo comprometer ou destruir o reconhecimento, o gozo ou o exercício pelas mulheres, seja qual for seu estado civil, com base na igualdade dos homens e das mulheres, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais no campo político, econômico, social, cultural, civil ou qualquer outro campo.

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5.2 Violência contra a mulher

O Comitê da Mulher (CEDM) definiu a violência baseada no gênero como:

“... violência que é dirigida à mulher pelo fato dela ser mulher ou que atinge a mulher desproporcionalmente. Inclui atos que infrinjam sofrimento ou dano físico, mental ou sexual, ameaças de tais atos e outras privações da liberdade...”

A violência contra a mulher um fenômeno tem existido através da história - não sendo notada nem contestada. Após pressão internacional, muito recente para que se considere a violência contra a mulher como uma questão internacional de direitos humanos, a CEDM respondeu com a declaração específica de que a proibição geral da discriminação baseada no gênero que consta na Convenção sobre a Mulher inclui a violência baseada no gênero. O Comitê afirma ainda que a violência contra a mulher constitui uma violação de seus direitos humanos reconhecidos internacionalmente - não importando se quem cometeu a violação seja um policial ou um civil. A responsabilidade do Estado perante a violência contra a mulher pode ser invocada quando um policial está envolvido em um ato de violência baseada no gênero e também quando o Estado deixa de agir com a devida diligência de modo a evitar as violações dos direitos cometidas por particulares ou de investigar e punir tais atos de violência, proporcionando compensação.

A violência doméstica é outra violação dos direitos humanos e um crime (na maioria dos países) que os policiais podem ajudar a prevenir. Os homens que batem nas suas mulheres ou companheiras estão normalmente confiantes de que o podem fazer com impunidade - de que não serão denunciados à polícia e, mesmo que o sejam, conseguirão escapar da punição. As autoridades policiais de uma forma geral contribuíram para esta situação ao se recusarem não só em tratar a violência doméstica como um crime, mas em intervir para acabar com a violência, baseados supostamente na noção de que fosse um problema de família.

A violência doméstica não é um problema só de família - é um problema da comunidade e esta em sua totalidade é normalmente responsável pela continuação da violência: são os amigos e vizinhos que ignoram ou encontram desculpas para as provas evidentes de violência; é o médico que apenas cuida dos ossos quebrados e machucados; é a polícia e o tribunal que se recusam a intervir em assunto particular. Os policiais podem ajudar a prevenir o crime de violência doméstica ao tratá-lo como um crime. Eles são responsáveis por assegurar e proteger o direito da mulher à vida, à segurança e à integridade corporal, ocorrendo uma evidente abdicação dessa responsabilidade quando falharem em proteger a mulher contra a violência no lar.

Na maioria dos países do mundo, os crimes contra a mulher são insignificantes. É dever de toda instituição policial analisar esses crimes, de modo a evitá-los, o máximo possível tratando das vítimas com cuidado, sensibilidade e profissionalismo.

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5.3 Mulher capturada

A não-discriminação rege que a mulher possui os mesmos direitos que o homem no ato da captura. Também existem outras formas adicionais de proteção e consideração a serem oferecidas à mulher durante a captura. Tais medidas incluem:

a) As garantias de que a captura das mulheres seja feita por uma policial do sexo feminino ou por pessoa do sexo feminino, devidamente orientada (sempre que possível);

b) De que as mulheres e suas vestimentas serão revistadas por uma policial do sexo feminino (em todas as circunstâncias) e de que as mulheres capturadas serão mantidas separadas dos homens capturados (sempre quando houver condições logísticas e de segurança).

Deve-se observar que a proteção e consideração adicionais para a mulher em situações de captura não devem ser tidas como discriminatórias, pelo motivo de que se visa contrabalançar um desequilíbrio inerente, de fazer com que a possibilidade da mulher gozar seus direitos seja igual à do homem.

5.4 Mulher detida

A mulher detida esta sujeita a procedimentos destinados a proteger os direitos e a sua condição especial (especialmente da grávida e da lactente). Entre tais medidas incluem-se as instalações médicas especializadas, pois a recusa ao tratamento médico adequado a mulheres detidas constitui maus-tratos, proibido por leis nacionais e internacionais; o alojamento separado para mulheres detidas e a disponibilidade de pessoal do sexo feminino na justiça penal. Outras medidas especiais podem ser necessárias para abranger a criação de filhos e tratamentos durante a gravidez.

5.5 A mulher vítima da criminalidade e do abuso de poder

Verifica-se que a Declaração das Vítimas e as outras disposições importantes em tratados são neutras em gênero. Não chegam nem perto em reconhecer que as necessidades das mulheres vítimas da criminalidade e abuso de poder são, muitas vezes, muito diferentes das necessidades das vítimas do sexo masculino, não somente em termos físicos e psicológicos, mas também porque a vítima feminina provavelmente sofreu um tipo de violação que é peculiar a seu sexo. Em muitos casos, os policiais serão o primeiro contato que uma vítima do sexo feminino de um crime terá, quando seu bem-estar deve ser da mais alta prioridade. Não se pode desfazer o crime cometido, mas o auxílio e a assistência adequados farão com que as conseqüências negativas do crime para as vítimas sejam definitivamente limitadas.

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Caso o incidente for de natureza doméstica ou a vítima conhecer o seu agressor, ela poderá estar relutante em apresentar queixa com medo de represálias. O cuidado e a assistência adequados para as mulheres vítimas de crime podem fazer com que sejam necessárias medidas especiais, incluindo a proteção contra uma vitimização posterior, o encaminhamento a abrigos e a prestação de serviços médicos especializados. O respeito pelo direito à privacidade e à dignidade pessoal da mulher vítima. A disponibilidade de policiais do sexo feminino para conduzir a investigação, e providenciar instalações especiais dentro das delegacias para o conforto e bem-estar da vítima.

No caso das mulheres vítimas de abuso de poder necessitarão também de proteção especial para assegurar que seus direitos não sejam ainda mais violados. Há uma preocupação em particular com a situação das mulheres vítimas de violência nas mãos dos policiais e funcionários do Estado - vítimas que incluem as mulheres que sofrem agressões enquanto capturadas. É nítido o dever das organizações de aplicação da lei de assegurar-se de que qualquer alegação de violência deste tipo imediatamente levada à presença da autoridade policial; que assistência médica, aconselhamento ou outro serviço de apoio sejam oferecidos às vítimas e que a implementação de seu direito à compensação seja facilitado.

5.6 Crianças e adolescentes

Crianças e adolescentes possuem direitos próprios que estão previstos em diversos instrumentos internacionais e na legislação brasileira. A Constituição Federal relaciona em seu art. 227 direitos destinados a conceder às crianças e adolescentes absoluta prioridade no atendimento ao direito à vida, saúde, educação, convivência familiar e comunitária, lazer, profissionalização, liberdade, integridade etc. Além do que, é dever de todos (Estado, família e sociedade) livrar a criança e adolescente de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Crianças e adolescentes possuem primazia em receber proteção e socorro em qualquer circunstância, precedência no atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública, destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude, programas de prevenção e atendimento especializado aos jovens dependentes de entorpecentes e drogas afins.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), estabelece um rol de direitos específicos dessas pessoas, bem como regras especiais para o adolescente infrator. Considera-se criança a pessoa até 12 anos e adolescente aquela entre 12 e 18 anos. O ECA também regula casos excepcionais de jovens que receberam medidas que se esgotarão até depois dos 18 anos, como no caso do prolongamento da medida de internação e no caso de assistência judicial.

5.6.1 Ato infracional

Ato infracional é a ação tipificada como contrária à lei que tenha sido efetuada pela criança ou adolescente. São inimputáveis todos os menores de 18 anos e não

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poderão ser condenados a penas. Recebem, portanto, um tratamento legal diferente dos réus imputáveis (maiores de 18 anos) a quem cabe a penalização.

A criança acusada de um crime deverá ser encaminhada à presença do Conselho Tutelar ou Juiz da Infância e da Juventude. Se efetivamente praticou ato infracional, será aplicada medida específica de proteção como orientação, apoio e acompanhamento temporários, freqüência obrigatória em ensino fundamental, requisição de tratamento médico e psicológico, entre outras medidas.

Adolescente em caso de flagrância de ato infracional será levado até a autoridade policial especializada. Os adolescentes não são igualados a réus ou indiciados e não são condenados a penas (reclusão e detenção), como ocorre com os maiores de 18 anos. Recebem medidas sócias educativas, sem caráter de apenação. É totalmente ilegal a apreensão do adolescente para "averiguação". Ficam apreendidos e não presos. A apreensão somente ocorrerá quando for em flagrância ou por ordem judicial e em ambos o caso esta apreensão será comunicada, de imediato, ao juiz competente, bem como à família do adolescente.

5.6.2 Apreensão do adolescente infrator

A autoridade policial deverá averiguar a possibilidade de liberar imediatamente o adolescente. Caso a detenção seja justificada como imprescindível para as investigações e manutenção da ordem pública, a autoridade policial deverá comunicar os responsáveis pelo adolescente, assim como informá-los de seus direitos como ficar calado se quiser, ter advogado, ser acompanhado pelos seus pais ou responsáveis etc. Após a apreensão, o adolescente será imediatamente conduzido à presença do promotor de Justiça, que poderá promover o arquivamento da denúncia, conceder remissão-perdão ou representar ao juiz para aplicação de medida sócio-educativa.

5.6.3 Medidas aplicadas aos adolescentes

O adolescente que cometer ato infracional estará sujeito às seguintes medidas sócio-educativa: advertência, liberdade assistida, obrigação de reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, internação em estabelecimento, entre outras.

5.7 Homossexuais

O Termo homossexual foi criado por um médico húngaro, Karoly Kertbeny, ao saber que, em 1869 o código penal da Prússia criou alguns artigos que criminalizava o sexo praticado entre homens. O médico insatisfeito com a nova lei enviou uma carta ao Ministro da Justiça prussiano argumentando que a homossexualidade era uma “propensão inata”, ou seja, uma tendência com a qual uma parte dos seres nascia. Essa “propensão era incapaz de seduzir a maioria dos homens porque era

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considerada naturalmente estranha a eles, presumindo que a atração pelo sexo oposto era a” sexualidade normal “A partir de então se passou a designar como homossexual pessoa do mesmo sexo que sentiam atração entre si”.

Em 1974 a Associação Americana de Psiquiatria (AAPP) deixou de considerar a homossexualidade uma doença. Dezenove anos depois, em 1993, a Organização Mundial da Saúde (OMS) retira a homossexualidade da categoria das doenças mentais. Em 1985, o Conselho Federal de Medicina (CFM) reconhece que a homossexualidade não é um desvio nem transtorno mental.

5.7.1 Definições dos homossexuais

a) Gay - Homossexual Masculino:

Não necessariamente afeminado.

Barbie – Gay/homossexual masculino fisiculturista/malhador e ou pratica artes marciais. Ex.: Jiu-Jitsu

Gay afeminado – usa artifícios femininos como peças do vestuário. Ex.: brincos, anéis e trejeitos ao andar e ao se expressar.

b) Lésbica - Homossexual Feminino:

Não necessariamente masculinizada.

Quando profissionais do sexo – trabalham em prostíbulos, boates de strip-tease etc.

Quando masculinizadas – usam artifícios masculinos como peças do vestuário. Ex.: polchete, camisas esporte ou social, camisetas regatas, e trejeitos ao andar e ao se expressar.

c) Homossexual masculino que se traveste de mulher “Travesti”

Estão travestidos geralmente 24 horas por dia, transitam mais durante a noite, e em sua maioria moram em casas de diárias e são “cafetinados” por outra travesti ou mulher. 90% vivem exclusivamente do mercado do sexo nas vias públicas e por telefone destas “agências” de programa.

d) Transexuais – “clinicamente” são heterossexuais e só após análise por equipe multidisciplinar de psicólogos, psiquiatras, médicos de diferentes áreas pode-se diagnosticá-los. Mesmo identificados, existe a dificuldade de se atrelar à nova identificação (quando adequados sexualmente) no jurídico. Fica a critério do Jurista a análise e aprovação de uma nova identidade adequada ao sexo transmutado.

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Transexuais masculinos, adequação genitália ao sexo feminino.

Transexuais femininos, adequação genitália ao sexo masculino.

Obs.: A transexualidade é psíquica e não genital, sendo que existem transexuais que ainda não foram operados ou aguardam a possibilidade da cirurgia.

e) Bissexuais – Pesquisas demonstram que parte da heterossexualidade tende à bissexualidade em algum ou todo o tempo de vida.

Exemplos são homens heterossexuais que procuram realizar “fantasias sexuais” com travestis, garotos de programa, ou mulheres que atuam como homens (usando próteses artificiais para penetração).

A diversidade sexual é uma realidade em nossa sociedade. O cidadão, muitas vezes tem seus direitos desrespeitados pelo fato de ser homossexual. A falta de informação da sociedade, que em sua maioria é homofóbica (discrimina e não gosta do homossexual), o preconceito e o despreparo dos policiais que compõe o sistema de segurança e outros setores públicos e privados, torna a vida do cidadão homossexual extremamente penosa.

O policial como promotor de diretos humanos, e pedagogo da cidadania, deve lidar com o cidadão respeitando sua orientação sexual, dando-lhe a atenção devida quando se fizer necessária à intervenção policial no seu cotidiano.

O cidadão homossexual ordeiro, deve ser tratado de forma respeitosa sem gracejos ou críticas por parte dos policiais que o abordam ou que são acionados, por este,em situação de vítima da criminalidade e abuso de poder.

Em abordagens envolvendo homossexuais do sexo masculino ou feminino o policial deve se pautar nas seguintes orientações conforme a lei estadual número 14.170 de 15/01/02(Determina a imposição de sanções à pessoa jurídica por ato discriminatório praticado contra pessoa em virtude de sua orientação sexual):

Se o cidadão homossexual teve um direito seu desrespeitado como vítima de crimes diversos, o policial que por ele for procurado deve tratá-lo com respeito evitando constrangê-lo, ainda mais, com gracejos ou descrédito aos seus apelos;

Ao suspeitar de uma pessoa homossexual masculino o policial deverá de maneira menos constrangedora possível, proceder à revista evitando apertar-lhe os “seios”, se este os tiver, podendo realizar uma vistoria entre os mamilos como é procedida em uma mulher, no restante do corpo a busca se procede normalmente;

No caso de busca em um homossexual feminino (lésbica) evitar apalpar seios e partes intimas;

Ao detectar um homossexual feminino (lésbica), travesti e ou transexual evitar o constrangimento através da reprodução do preconceito social, exemplo: ao ler o nome de registro Carteira de Identidade em voz alta para outros policiais e ou público presente;

Lembre-se não cabe ao policial externar o que pensa, com posições pessoais, religiosas e morais em relação à homossexualidade, e sim advertir, orientar e cumprir aquilo que por lei for exigido, aplicando assim os devidos procedimentos.

O policial não deve coibir manifestações de afeto entre homossexuais (mãos dadas, beijo na boca, abraços, entre outros) em logradouro público , estabelecimento público, ou estabelecimento aberto ao público,e se solicitado a coibir deve orientar o

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solicitante de que a manifestação de afeto não é crime mas a sua coibição sim.Lembre-se sexo explicito é diferente de manifestação de afeto sendo que no primeiro caso é necessário a providencia policial.

Pessoas com deficiência física e sofrimento mental

DeficiênciaÉ toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica

fisiológica ou anatômica. Tipos:Lingüística: mudo;Sensorial: auditiva, visual;Mental: síndrome de down, oligofrenias, síndrome de autismo, algumas

psicoses entre outros;Física: hemiplegias (paralisia de um dos lados do corpo), paraplegia,

amputados etc;Neurológica: paralisia cerebral;Alterações ao nível de Sistema nervoso Central;Psicológicas: distúrbios, comportamentais do aprendizado e da sociabilidade;Múltipla: Tretraplegia+cegueira+surdez;

DoençaFalta ou perturbações da saúde moléstia, mal, enfermidade, podendo ser

temporárias ou definitivas.

IncapacidadeToda restrição ou falta (devido a uma deficiência) da capacidade de realizar

uma atividade na forma ou na medida que se considera normal a um ser humano.

ImpedimentoSituação desvantajosa para um determinado indivíduo, em conseqüência de

uma deficiência ou de uma incapacidade, que limita ou impede o desempenho de um papel que é normal em seu caso ( em função de idade, sexo e fatores sociais e culturais).

Cuidados no trato com a pessoa deficiente“Existe atualmente um grande número, que aumenta dia a dia, de pessoas

com deficiência. Está confirmada, pelos resultados de pesquisas com segmentos da população e por investigações de respeitados pesquisadores, a estimativa de 500 milhões”.

As causas das deficiências variam em todo o mundo: o mesmo acontece com a predominância e as conseqüências das deficiências. Essas variações são conseqüências das diferentes circunstâncias sócio econômicas e das diferentes disposições que cada sociedade adota para alcançar o bem estar de seus membros.

Segundo estudo realizado por peritos estima-se que pelo menos 350 milhões de pessoas com deficiência vivem em regiões onde não há disponibilidade de serviços necessários para ajudá-las a superar suas limitações. Grande parte destas

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pessoas esta sujeita a barreiras físicas, culturais e sociais que dificultam sua vida, mesmo quando se dispõe de ajuda para sua reabilitação.

Para se alcançar os objetivos de “igualdade” e de “plena participação”, não bastam medidas de reabilitação voltadas para o indivíduo com deficiência. A experiência tem demonstrado que é o meio que determina, em grande parte, o efeito de uma deficiência ou incapacidade na vida diária da pessoa. Uma pessoa se torna vítima do impedimento quando lhe são necessárias aos aspectos fundamentais da vida, inclusive a vida familiar, a educação, o emprego, a moradia, a segurança econômica e pessoal, a participação em grupos sociais e políticos, nas atividades religiosas, nas relações afetivas e sexuais, no acesso a instalações públicas, na liberdade de movimentos e no sistema geral da vida diária.“

O policial atua como um agente da cidadania, e como tal deve sempre que possível saber comportar-se adequadamente em ocorrência que envolva pessoas deficientes físicas e com sofrimento mental, lhes dando um tratamento digno, encaminhando-as corretamente e solucionando seus problemas. Cuidados que o policial deve ter ao abordar ou auxiliar uma pessoa deficiente:

Pessoa que usa cadeira de rodasNão segure nem toque na cadeira de rodas. Ela como se fosse parte do

corpo da pessoa. Apoiar-se ou encostar-se na cadeira é o mesmo que se apoiar ou e encostar-se à pessoa.

Se desejar, ofereça ajuda, mas não insista. Se precisar de ajuda, ele (a) aceitará seu oferecimento e lhe dirá o que fazer. Se você forçar esta ajuda, isso pode às vezes até mesmo causar insegurança.

Não tenha receio de usar palavras como "caminho" ou "correr". As pessoas com deficiência também as usam.

Se a conversa durar mais do que alguns minutos, sente-se, se possível, de modo a ficar no mesmo nível do seu olhar. Para uma pessoa sentada não é confortável ficar olhando para cima durante um período relativamente longo.

Não estacione viatura em lugares reservados às pessoas com deficiência física. Tais lugares são reservados por necessidade, não por conveniência. O espaço reservado é mais largo do que o usual, a fim de permitir que a cadeira de rodas fique ao lado do automóvel e a pessoa com deficiência física, possa sair e sentar-se na cadeira de rodas, e vice-versa; além disso, o lugar reservado é próximo à entrada de prédios para facilitar o acesso dessas pessoas.

Ao ajudar uma pessoa com deficiência física a descer uma rampa inclinada ou degraus altos, é preferível usar a "marcha ré" para evitar que, pela excessiva inclinação, a pessoa perca o equilíbrio e possa cair para frente.

g)Quando se tratar de pessoa suspeita deverá ser seguido todos os procedimentos acima, e efetuado a busca pessoal e na cadeira de rodas.

Pessoa que usa muletasAcompanhe o ritmo de sua marcha.Tome cuidados necessários para que ele(a) não tropece.Deixe as muletas sempre ao alcance das suas mãos.Quando se tratar de pessoa suspeita deverá ser seguido todos os

procedimentos acima, e efetuado a busca pessoal , tomando-se cuidado com

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possíveis golpes de muleta do suspeito, e com pontas ou laminas que possam estar escondidas no interior da muleta.

Pessoa com deficiência visual Ofereça sua ajuda sempre que um(a) cego(a) parecer necessitar.Mas não ajude sem que ele(a) concorde. Sempre pergunte antes de agir. Se

você não souber em que e como ajudar, peça explicações de como fazê-lo.Para guiar uma pessoa cega, ela deve segurar-lhe pelo braço, de preferência

no cotovelo ou no ombro. Não a pegue pelo braço; além de perigoso, isso pode assustá-la. À medida que encontrar degraus, meios fios e outros obstáculos, vá orientando-a. Em lugares muito estreitos para duas pessoas caminharem lado a lado, ponha seu braço para trás de modo que a pessoa cega possa lhe seguir. Ao sair de uma sala, informe o(a) cego(a) pois é desagradável para qualquer pessoa falar para o vazio. Não se preocupe ao usar palavras como "cego", "olhar" ou "ver": os(as) cegos(as) também as usam.

Ao explicitar direções para uma pessoa cega, seja o mais claro e específico possível. Não se esqueça de indicar os obstáculos que existem no caminho que ela vai seguir. Como algumas pessoas cegas não tem memória visual, não se esqueça de indicar as distâncias em metros (p.ex. "uns vinte metros para frente") Mas se você não sabe corretamente como direcionar uma pessoa cega, diga algo como "eu gostaria de lhe ajudar. Mas como é que devo descrever as coisas?" Ele(ela) lhe dirá.

Ao guiar um(a) cego(a) para uma cadeira, guie a sua mão para o encosto da cadeira, e informe se a cadeira tem braços ou não. Num restaurante, é de boa educação que você leia o cardápio e os preços.

Uma pessoa cega é como outra qualquer, só que não enxerga; trate-a com o mesmo respeito que trata uma pessoa que enxerga.

Quando estiver em contato social ou trabalhando com pessoas com deficiência visual, não pense que a cegueira possa vir a ser problema e, por isso, nunca as exclua de participar plenamente, nem procure minimizar tal participação. Deixe que decidam como participar. Proporcione à pessoa cega a chance de ter sucesso e de falhar, tal como qualquer outra pessoa.

Quando são pessoas com visão subnormal (alguém com sérias dificuldades visuais), proceda com o mesmo respeito, perguntando-lhe se precisa de ajuda quando notar que ela está em dificuldade.

Quando se tratar de pessoa suspeita deverá ser seguido todos os procedimentos acima, e efetuado a busca pessoal , tomando-se cuidado de avisar o suspeito que será procedido uma busca por outro policial e que ele fique calmo.

Pessoa com deficiência auditiva Fale claramente, distinguindo palavra por palavra, mas não exagere. Fale

com velocidade normal, salvo quando lhe for pedido para falar mais devagar.Cuide para que o (a) surdo(a) enxergue sua boca. A leitura dos lábios fica

impossível se você gesticula, segura alguma coisa na frente dos seus próprios lábios, ou fica contra a luz.

Fale com tom normal de voz, a não ser que lhe peçam para levantar a voz.Gritar nunca adianta.Seja expressivo. Como os surdos não podem ouvir as mudanças sutis do

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tom de sua voz indicando sarcasmo ou seriedade, a maioria deles(as) "lerão" suas expressões faciais, seus gestos ou os movimentos do seu corpo para entender o que você quer comunicar.

Se você quer falar com uma pessoa surda, chame a atenção dela, sinalizando com a mão ou tocando no seu braço. Enquanto estiverem conversando, mantenha contato visual; se você olhar para outro lado enquanto está conversando, o(a) surdo(a) pode pensar que a conversa terminou.

Se você tiver dificuldades para entender o que uma pessoa surda está falando, sinta-se à vontade para pedir que ela repita o que falou. Se você ainda não entender, peça-lhe para escrever. O que interessa é comunicar-se com a pessoa surda. O método não é o que importa.

Se o (a) surdo (a) está acompanhado (a) por um intérprete, fale diretamente à pessoa surda, não ao intérprete.

Ao planejar um encontro, lembre-se que os avisos visuais são úteis aos participantes surdos. Se estiver previsto um filme, providencie um "script" por escrito, ou um resumo do conteúdo do filme, se não tiver legenda.

Quando se tratar de pessoa suspeita deverá ser seguido todos os procedimentos acima, e efetuado a busca pessoal.

Pessoa com paralisia cerebralA pessoa com paralisia cerebral, anda com dificuldade ou não anda,

podendo ter problemas de fala. Seus movimentos podem ser estranhos ou descontrolados. Pode, involuntariamente, apresentar gestos faciais incomuns, sob a forma de caretas. Geralmente, porém, trata-se de uma pessoa inteligente e sempre muito sensível – ela sabe e compreende que não é como os outros.

Para ajudá-la, não a trate bruscamente. Adapte-se ao seu ritmo. Se não compreende o que ela diz, peça-lhe que repita: ELA O COMPREENDERÁ. Não se deixe impressionar pelo seu aspecto. Aja de forma natural... sorria...é uma pessoa igual a você.

Pessoa com deficiência mentala) Cumprimente a pessoa com deficiência mental de maneira normal e

respeitosa, não se esquecendo de fazer o mesmo ao se despedir. As pessoas com deficiência mental são, em geral, bem dispostas, carinhosas e gostam de se comunicar.

b) Dê-lhes atenção, dirigindo-lhes palavras como: "que bom que você veio", "gostamos quando você vem nos visitar", tentando manter a conversa até onde for possível.

c) Seja natural. Evite a superproteção. A pessoa com deficiência mental deve fazer sozinha tudo o que puder; ajude-a quando realmente for necessário.

d) Lembre-se: deficiência mental pode ser conseqüência de uma doença, mas não é uma doença; é uma "condição de ser". Nunca use a expressão "doentinho(a)" ou "bobinho(a)" quando se dirigir ou se referir a uma pessoa com deficiência mental.

e) Lembre-se: deficiência mental não é doença mental.f) Uma pessoa portadora de deficiência mental é, em primeiro lugar, uma

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pessoa.g) Enquanto for criança, trate-a como criança. Quando for adolescente ou

adulto, trate-o como tal.

Deficiência mental severaExistem deficiências, mais graves como o Autismo e outras, em que

indivíduo não interage com o mundo de forma adequada, apresentam sinais de agitação, não conseguem se comunicar, não tem noção de perigo, e apesar de serem dóceis, são arredias e reagem com agressividade em situações adversas.

O policial não poderá subestimar tais indivíduos que deverão ter total atenção quanto na condução destas pessoas, para evitar que se machuquem ou que causem um acidente;

Ao conduzir estas pessoas a pé, ter cuidados ao atravessar ruas, pois, o indivíduo poderá lançar-se na frente de veículos em movimento;

Estas pessoas deverão ser conduzidas a um centro neuropsiquiátrico até que seus parentes sejam encontrados.

Terceira IdadeUma das principais causas que levam as pessoas da terceira idade, ao

abandono e ao descrédito, é a situação de relaxamento e falta de execução das normas em vigor. Assim, o afastamento das famílias, o internamento destas pessoas em locais inadequados ao seu completo restabelecimento, manutenção do seu estado físico e mental, o abandono por parte da sociedade, a começar da própria família, caracteriza uma situação que coloca em risco a sua garantia e proteção integral, nos termos da Constituição em vigor, desprezando, desta forma, todos aqueles que deram suas vidas, em prol da nossa nação e aqueles que lutam para vencer o preconceito e serem integrados a sociedade.

A pessoa idosa deve ter um tratamento que lhe garanta o direito à vida, participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar. É bom deixar claro que na lei Magna é declarado que a família, depois a sociedade e o Estado têm o dever de amparar os idosos.

Portanto, será necessário o engajamento de todos para que este fundamento seja implementado e se tome realidade.

O policial deve estar ciente destas premissas quando em sua rotina operacional, deparar com uma situação que evolva uma pessoa de terceira idade. Na atuação do policial frente a uma pessoa idosa ele deverá sempre que possível tomar os seguintes cuidados.

O idoso deve ter um tratamento especial dentro de uma delegacia, será convidado a assentar-se;

Também será ótimo lhe oferecer um cafezinho, água, o policial estabelecerá um clima de confiança e respeito;

Se o idoso for suspeito, em respeitar a sua idade e/ou condições de saúde, deve haver uma prévia conversa sobre o ato cometido para que o mesmo comece a refletir nas conseqüências e esteja preparado, resguardados os aspectos de segurança do policial;

Será esclarecida a orientação que o mesmo poderá receber, por parte jurídica do Estado, e outras informações necessárias para os tramites;

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O idoso deverá, sempre que possível, ser acompanhado por algum membro familiar;

O policial deverá evitar agressões verbal ou física aos familiares do idoso, vítima de crime, isto poderá causar problemas sérios e até complicações em sua saúde;

Atuação policial frente às Minorias

DiscriminaçãoPolítica que objetiva separar e/ou isolar no seio de uma sociedade as

minorias raciais, sociais, religiosas, etc.O racismo e a segregação social são estáveis em nossa sociedade, a todo o

momento deparamos com fatos que revelam a triste face do preconceito.O policial deve se pautar sempre nos princípios do bom senso e

profissionalismo ao lidar com situações onde uma pessoa se sinta discriminada por sua cor, religião, etnia, língua ou procedência nacional, demonstrando sempre respeito pela crença e cultura das pessoas envolvidas deixando de lado suas convicções culturais e religiosas e buscando a solução para o problema.

A lei nº 9.459, de 13/05/1997, tipifica o crime de racismo, usando três principais verbos obstar, recusar e impedir alguém de exercer seus direitos previstos pela lei em decorrência de sua cor, religião, etnia, língua ou procedência nacional. O cuidado que o policial deve ter é de não enquadrar incorretamente uma pessoa no crime de racismo, pois, algumas condutas estão tipificadas como crime de injúria e não racismo, apesar das duas condutas ser crime a diferença é que o primeiro é inafiançável.

O aspecto de segurança do policial não deve se confundir com a situação social da suspeição, ou seja , pessoas que se trajam bem também podem ser suspeita de algum crime, não se deve “rotular” as pessoas somente porque são negras e ou pobres.

Em ocorrências que envolvam pessoas de cor negra o policial deve, resguardados os aspectos de fundada suspeita e segurança, sempre que possível agir da seguinte forma:

Não considerar de antemão que os negros são suspeitos (preconceito);Não tratar os cidadãos negros, mesmo em casos suspeito, por apelidos

ofensivos à pertinência racial, o descumprimento da lei, não é uma característica de nenhuma raça ou etnia;

Não discriminar numa atividade policial quando há negros e não negros e só os primeiros são revistados;

Não agir preconceituosamente contra jovens vestidos de acordo com seu grupo cultural (calças largas, bonés, cabelos descoloridos ou pintados, tranças, rastafari , etc.) Em toda abordagem considerar que toda (o) cidadã (o), tem seus direitos assegurados pela lei.

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TEXTOS SELECIONADOS

TEXTO 1 : A POSIÇÃO DA MULHER NA SOCIEDADE

Zuleika d’Alembert - Presidente do Conselho Estadual da Condição Feminina

Permitam-me a liberdade de abordar o tema, não de uma maneira especificamente jurídica, mas da melhor maneira que eu poderia fazê-lo em minha qualidade de mulher, política, escritora e feminista: politicamente.

Não poderíamos falar nos direitos da mulher sem ter uma visão, mesmo que breve, de sua posição atual dentro da sociedade. Baseada em informações concretas, proporcionadas pelo diagnóstico feito por técnicas da Fundação Carlos Chagas e sob a responsabilidade do CECF, para ser levado pela delegação de mulheres ao Fórum 85, recentemente realizado na cidade de Nairobi, no Kenya, podemos dizer que o desenvolvimento político, social, econômico e cultural do país nas últimas décadas influi muito na maneira de existir, viver, pensar e agir de nossas mulheres. A mulher, hoje, constitui metade da população brasileira; 36% de sua força de trabalho ativa; metade do eleitorado e com fortes tendências a se tornar majoritária nesse campo.

Politicamente, também avançou bastante. No que concerne às lutas gerais do nosso povo, ela tem desempenhado um papel marcante, principalmente nas lutas que, pouco a pouco, vão-nos levando à recuperação democrática de nosso país. Nesse terreno, sua participação na luta por eleições diretas com a palavra de ordem Direitos e Diretas é um, exemplo significativo. No que se refere às suas lutas específicas, cabe destacar que cresce no Brasil de hoje a consciência feminista expressa no combate pela igualdade, autonomia e dignidade da mulher. Sobretudo a partir de 1975 o movimento feminista, principalmente em relação à irradiação de suas idéias, tem-se desenvolvido como verdadeira brecha libertária entre as poucas que conseguiram abrir-se, rompendo as barreiras das enormes restrições impostas pelo sistema instaurado em 1964 à liberdade do debate social. Tudo isso somado determinou sensíveis mudanças no comportamento em relação à igualdade de direitos da mulher, principalmente entre a classe média e a aceitação, com menos preconceitos no debate público, de temas candentes e até então proibitivos como o direito à educação sexual das crianças e dos adolescentes, a contracepção, o aborto, a sexualidade feminina, o controle pela mulher de seu corpo, o homossexualismo, etc.

Em síntese, é a aceitação da nova mulher que surge na arena política nacional assumindo com garra e paixão múltiplos deveres e defendendo direitos até então relacionados e válidos somente para os homens. Esse é, realmente, o fenômeno novo de nossa época no mundo e em nosso país; é o grande acontecimento de nosso século e nós, homens e mulheres, temos de estar preparados para aceitá-lo e encaminhá-lo de modo positivo.

O abismo entre os novos deveres e a ausência de novos direitos:

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Apesar das grandes mudanças havidas na vida da mulher, somos obrigadas a reconhecer que isso acontece com enormes sacrifícios de nossa parte, que comumente nos impedem de competir em pé de igualdade com os homens. Na verdade, assumimos novos deveres, mas continuamos, por falta de nossos direitos, a arcar com os velhos deveres que continuam a pesar, fundamentalmente, em nossos ombros. Exemplo: trabalhamos fora, estudamos, participamos do diretório de nosso partido, pertencemos a uma organização de mulheres do bairro, mas continuamos executando aquela velha função de dona-de-casa e socializadora das crianças que nos consome, diariamente, horas e horas de trabalho. A função pública não eliminou, mas tão-somente, somou-se às funções privadas, realizadas entre as quatro paredes da casa. Esse fato nos impede, de um lado, de exercer plenamente nossas novas funções, e de outro, continua a impregnar toda a sociedade de preconceitos em relação ao novo papel que nos esforçamos por desempenhar.

Existe, pois, um abismo entre nossos novos deveres e nossos direitos essenciais, que continua a nos ser sonegados. Vejamos, portanto:

No trabalho: a mulher não goza dos direitos de um trabalhador pleno.

Ganha salários menores; é preterida nas promoções a cargos de maior responsabilidade; sua formação profissional tem um profundo viés sexista; as empresas e demais locais de trabalho, em sua infra-estrutura, ignoram a existência da mulher; o conceito de que o trabalho feminino é sempre um complemento ao trabalho masculino desqualifica as atividades que exercem, que são, em geral, secundárias e mal remuneradas. Na verdade, a mulher é um trabalhador pela metade.

Na família: a mulher não partilha em pé de igualdade com o homem a direção do núcleo familiar. Ela é tão-somente a “colaboradora” do marido, que continua como o chefe legal da casa. Assim sendo, ele é quem arca, prioritariamente, com a administração dos bens comuns e os da mulher, com o pátrio poder, com a escolha do domicílio e pode até interferir no exercício ou não do direito ao trabalho por parte da esposa, de acordo com suas conveniências.

A maternidade: (gravidez, parto e amamentação) é função que a mulher continua a exercer solitariamente, sem nenhuma ajuda da família ou da sociedade. Isto é, a maturidade não é considerada uma função social de magna importância como o é produzir bens materiais para a sobrevivência da sociedade humana. E, assim, a mulher, que reproduz o ser humano que fará as máquinas funcionares, em vez de ser ressarcida pelo ônus que lhe acarreta pôr um filho no mundo, é, na verdade, castigada (é posta fora do emprego quando está grávida; impedem-na de ir ao banheiro com maior freqüência; não tem onde deixar o filho depois que ele nasce, já que não existem equipamentos sociais nesse terreno, ou seja, creches, berçários, pré-escolas, jardins de infância), etc.

Nega-se também à mulher o direito de escolher se quer ou não ter filhos ou quantos desejaria ter, desde que a educação sexual nas escolas é ainda um tabu; faltam informações científicas e culturais para que a mulher tenha um melhor

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conhecimento sobre seu corpo; o aborto é duramente penalizado pelo código penal, etc.

Finalmente, a mulher que trabalha fora de casa arca com a dupla jornada de trabalho exercendo uma atividade – a de doméstica – que não é reconhecida como trabalho, apesar de exigir da mulher suas melhores energias físicas e espirituais e contribuir para a renovação da força de trabalho.

Na sociedade: a mulher ainda está bastante distanciada do poder político, dos centros de decisões governamentais e dos postos-chave da administração pública. Temos no país uma única vice-governadora, uma senadora, oito deputadas federais, 37 estaduais, umas quatro centenas de vereadoras e algumas prefeitas. Não chega a cinco o número de mulheres que ocupam cargos nos diretórios nacionais dos partidos e em suas comissões executivas. E na administração pública elas raramente passam do terceiro escalão.

A cultura da submissão

Ao refletirem sobre esse quadro, as mulheres – principalmente as feministas – botam a nu as raízes de sua opressão e exploração específicas, isto é, o ponto de partida para seu status de inferioridade social em relação ao homem. Através de estudos, pesquisas, entrevistas e análises, chegamos a uma conclusão: a mulher não ocupa na sociedade um lugar desconfortável em relação ao homem, graças às suas condições físicas, biológicas, naturais... como durante milênios nos fizeram crer. Nada disso. Esse status de inferioridade, essa condição de cidadão de segunda classe nos é imposta através de uma cultura milenar que a sociedade nos impinge ainda quando estamos no ventre materno e nos condiciona e orienta para a execução de um papel social de segunda categoria e a ocupar um lugar secundário na sociedade e sem nenhuma manifestação de rebeldia”.

TEXTO2 : MEDIDAS SÓCIO EDUCATIVAS E DIREITOS HUMANOS*

* Roteiro da exposição do Deputado Marcos Rolim nos painéis do Congresso Nacional da ABMP ( Gramado, Nov. 99) e na III Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Brasília, Nov. 99)

Nota inicial - Minha participação recente em dois dos mais importantes eventos na área dos direitos da criança e do adolescente no Brasil - o Congresso da ABMP e a Conferência Nacional - me permitiu um contato mais sistemático com a polêmica aberta em torno da necessidade de uma Lei de Execução das Medidas Sócio Educativas. Minha intervenção naqueles eventos seguiu o roteiro que segue. A decisão de publicá-lo aqui deve-se, basicamente, a um conjunto de solicitações que tenho recebido de militantes da área, de diferentes estados brasileiros. É preciso, não obstante, destacar as limitações de um roteiro que me foi útil apenas na medida em que estruturou minha fala. Na verdade, eu deveria - a partir dele - conceber um texto devidamente fundamentado, o que ainda não pude fazer. De outra parte, devo dizer que as idéias básicas do roteiro reproduzem as principais conclusões da Tese de Mestrado, "Retórica e Realidade dos Direitos da Criança no Brasil" apresentada

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por Sinara Porto Fajardo na Universidade de Saragoza (Espanha). Ao longo destes últimos anos, Sinara foi minha assessora na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da AL/RS. Não apenas pela admiração que tenho por ela, mas, fundamentalmente, pela concordância com suas teses, recomendo vivamente seu trabalho a todos aqueles interessados em uma análise mais aprofundada do Estatuto. Para facilitar o acesso a sua tese, tomei a decisão de publicá-la, na íntegra, nesta página.

Marcos Rolim

O Estatuto da Criança e do Adolescente - importância e limites

Já se assinalou, suficientemente, o quanto o ECA expressa uma mudança de paradigma. Particularmente, temos sustentado junto à opinião pública a importância deste diploma legal contrastando-o com o paradigma antigo da " situação irregular" o que se torna decisivo face à extraordinária ignorância das disposições do próprio Estatuto; desconhecimento que, assinale-se, não é encontrado apenas entre as pessoas do povo, mas também entre inúmeros operadores do direito e, seguramente, entre a maioria dos políticos deste país. De tudo o que se possa dizer a respeito das alterações introduzidas pela Lei do ECA, penso que poderíamos sintetizar as mudanças preconizadas - e, ainda hoje, não garantidas - em torno de três grandes temas:

1) Alteração de conteúdo - crianças e adolescentes como titulares de direitos

2) Alteração de método - substituição do assistencialismo pela sócio-educação

3) Alteração de gestão - descentralização e participação popular

Uma mudança de paradigma envolve a transposição de um ambiente conceitual. Um paradigma é um ambiente onde os conceitos existem em uma determinada estrutura. A mudança de paradigma exige uma outra estrutura conceitual e, normalmente, a emergência de novos conceitos. Dito de uma forma mais simples: a mudança de paradigma exige um pensar diferente. Resulta daí que as mudanças de paradigma só podem ser concebidas enquanto processos de reforma cultural. Na base das dificuldades para uma efetiva aplicação do ECA no Brasil encontraremos a ausência desta reforma cultural. Experimentamos, então, uma permanente tensão entre as normas e sua efetividade. Não raro, veremos o antigo paradigma surgir ali onde já não seria possível tolerá-lo, ou onde já se imaginava um terreno " conquistado".

Este é o processo que vislumbramos hoje nas relações sociais e na ação do Estado diante do ECA. Por óbvio, as leis não são suficientes para a transformação da sociedade. Elas expressam , mais propriamente, a dupla condição de instrumento e caminho, no sentido de " empoderarem" os agentes que demandam pelo direito e autorizarem uma expectativa de regulação de situações conflitivas. A lei justa contribui para a transformação social, senão pelas garantias que introduz, pelos símbolos que constrói. O ECA é um exemplo destas possibilidades. No movimento atual de defesa dos direitos da criança e do adolescente no Brasil, adquire o caráter

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de uma bandeira de luta simbolizando um projeto de sociedade fundado nos Direitos Humanos e no interesse primordial de crianças e adolescentes.

É este mesmo caráter, não obstante, que favorece uma visão acrítica e fetichista da legislação o que termina por dificultar uma análise mais profunda dos seus limites enquanto instrumento de transformação social. Tomo como referência desta exposição, o trabalho desenvolvido por uma grande amiga minha, com quem tive o prazer de trabalhar na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do RS, Sinara Porto Fajardo. É ela quem assinala:

" A garantia dos direitos dos adolescentes em conflito com as normas jurídicas não é violada apenas nas fases de execução das medidas sócio-educativas devido às péssimas condições das entidades de internação; nem tampouco pelo escasso empenho na implementação de medidas abertas e semi-abertas. Há uma ambiguidade básica no próprio modelo de justiça juvenil desenhado no ECA, que expõe uma questão tampouco resolvida no plano internacional, que é a tensão produzida entre um caráter penal e garantista, por um lado e entre um caráter mais pedagógico e flexível, por outro. Em realidade, o que temos é a vigência de um sistema onde, em regra, não são oferecidas nem garantias, nem educação, nem proteção."

Podemos destacar pelo menos 4 grandes temas a partir dos quais se desenvolvem significativas ambigüidades:

1) Representação do Estado em relação aos direitos fundamentais:

Qual o modelo de Estado que a positivação dos direitos fundamentais autoriza? O que se imagina, a partir do ECA - e da própria C.F. - é um Estado conceitualmente afeto ao Bem Estar Social. Como se sabe, estamos muito longe disto no Brasil e, ao que tudo indica, caminhando em sentido oposto.

2) Proteção da infância e juventude X "controle social"

· proteção a partir da violação da infância

· medida Sócio Educativa a partir da violação da segurança

3) O conceito de proteção integral

· não há clareza quanto aos métodos de proteção - enfoque intervencionista, tutelar, que se contrapõe ao conceito de criança e adolescente como sujeitos de direitos.

4) O modelo de justiça juvenil

· Equilíbrio catastrófico entre o pedagógico e o penal

· Pedagógico e não garantista - duração indeterminada das medidas

· Garantista e não pedagógico - direito de não falar qualquer coisa que prejudique sua defesa- direito de mentir. Há um hibridismo de modelos no ECA: pelo discurso,

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afirma-se um modelo de bem estar; pela prática, um sistema protetor e de justiça. Os riscos destas ambiguidades:

O protecionismo com ênfase terapêutica reforça a estigmatização do adolescente. Sempre que o delito é tomado como expressão de uma patologia, obteremos consequências claramente não garantistas na execução das medidas. Por outro lado, se o discurso educativo é, no mais das vezes, uma expressão retórica e alienada produzida pelo próprio sistema, o que teremos é a concretização de uma falácia pedagógica introduzida pelo ECA segundo a qual a sócio educação indeterminada é caminho para a reintegração social.

Paralelamente, reforça-se o espaço para a legitimação de uma visão penalista estreita pela qual se imagina que a repressão seja uma resposta concreta aos conflitos sociais. Na justiça juvenil brasileira, então, nos parece correto afirmar que a ambiguidade principal , tanto aquela presente no texto legal, quanto na prática da execução das ditas medidas sócio educativas, dá-se entre as dimensões do pedagógico e do penal.

As medidas sócio-educativas contrapõe-se à noção de pena, pelo menos no que diz respeito ao seu sentido retributivista, tendendo à uma ênfase retórica de conteúdo pedagógico que não se reflete na prática. Sobre o caráter pedagógico do modelo, o ECA é claro como quando, por exemplo, no inciso VI do artigo 122 define a internação em estabelecimento educacional como medida sócio-educativa. Note-se: "em estabelecimento educacional" (!) Alguém aqui pode conceber um estabelecimento educacional com celas, com guardas, com desnudamentos para revistas, etc ?

Ora, a privação da liberdade, se imposta e realizada com base no ECA, é medida sócio-educativa e não condição para a mesma. Ao não cumprir-se a Lei, entretanto, surge a necessidade de justificar a privação de liberdade como meio para se concretizar o conteúdo educacional nunca efetivado da medida imposta. Essa distorção resulta também justificadora de medidas cada vez mais repressivas em termos de segurança das unidades.Várias violações de direitos emergem destas ambiguidades, entre elas:

1 ) sentenças baseadas em "antecedentes criminais" (sic)

2) a duração indeterminada das medidas sócio-educativas, o que viola os princípios da proporcionalidade, legalidade e segurança jurídica.

3) Laudos técnicos baseados mais no comportamento do que nos objetivos definidos individualmente;

4) Medicalização ou psiquiatrização do conteúdo das medidas;

5) Coisificação do adolescente infrator, etc.

Estas características - extremamente funcionais à ineficácia da execução das medidas sócio-educativas - terminam por reforçar o alarme social, abrindo espaços para o retorno de modelos superados. O que temos, então, é um discurso legitimador

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do ECA que desconsidera a fragilidade ou mesmo a inexistência de garantias quando da sentença e quando da execução. A ênfase garantista do processo é contraditada pela ênfase comportamentalista no julgamento e pela ênfase repressiva na execução. O discurso pedagógico legitima o modelo simbolicamente enquanto a prática repressiva e terapêutica constituem a realidade mesma a partir do objetivo do controle social.

A demanda punitiva:

Todos os indicadores disponíveis estão a demonstrar um aumento em nosso país daquilo que costumo denominar a "demanda punitiva". Firma-se na opinião pública um sentimento cada vez mais sólido de que é preciso punir mais, que as leis tem sido brandas e complacentes com os criminosos, que deve-se colocar mais policiais nas ruas, que deve-se construir mais presídios, etc. Neste caldo cultural, cresce o apelo em favor da redução da idade penal. Por certo, este resultado seria inconcebível não fosse o persistente trabalho de desinformação assegurado pelos grandes meios de comunicação com relação ao próprio ECA.

Em verdade, não temos sequer condições reais de estabelecer a dimensão verdadeira da insegurança pública que atormenta os cidadãos. De um lado, há a "sensação de insegurança" , experiência de angústia ou pavor vivida como realidade cada vez mais amplamente; de outro, há a insegurança efetiva que só pode ser medida a partir dos riscos de vitimização. Como não temos, no Brasil, rigorosamente, pesquisas de vitimização, não sabemos, ao certo, as dimensões do problema. O que sabemos, pelos dados disponíveis, é que a violência sobre crianças e adolescentes constitui um fenômeno cuja radicalidade e importância deveria ultrapassar em muito as preocupações públicas manifestas quanto ao tema da "violência juvenil". Entretanto, as projeções simbólicas em torno da idéia do "adolescente perigoso" se tornaram muito mais fortes do que aquelas que deveriam se difundir a partir da idéia do "adolescente em perigo", o que em si mesmo assinala uma inversão desprovida de qualquer base empírica. De novo, aqui, percebe-se o quanto a ficção pode contar mais do que a realidade. Seja como for, é hora de nos unirmos em torno de ações concretas junto à opinião pública que esclareçam as pessoas a respeito do ECA e que barrem o caminho para a redução da idade penal. Uma larga campanha de coleta de assinaturas em todo o Brasil contra a tese da redução da idade penal seria uma iniciativa da maior importância política.

Precisamos de uma Lei de Execução de Medidas Sócio Educativas ?

O debate em curso sobre a necessidade de uma Lei de Execução de Medidas Sócio Educativas precisa ser travado a partir de dois pressupostos fundamentais: primeiro, o de que as partes envolvidas no debate possuem argumentos relevantes e que ambas buscam os mesmos objetivos; segundo, a idéia de que o próprio debate deve orientar-se pelos interesses primordiais dos adolescentes em conflito com a Lei.

A polarização construída até agora pela polêmica introduz uma enorme facilidade em ceder à simplificação. Pior do que isso, o debate pode degradar-se em uma disputa destrutiva com a reprodução de posturas sectárias e intolerantes. Ora, a diferença

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deve ser saudada e recebida como um bom sinal. É preciso, então, estar atento aos argumentos apresentados a favor e contra a necessidade de uma Lei de Execução das Medidas Sócio Educativas, recolhendo o que de melhor eles têm oferecido. Entendo que a possibilidade de uma Lei de Execução de conteúdo fortemente garantista assinalaria um avanço considerável na aplicação do ECA. Em verdade, garantias nomeadas detalhadamente em uma Lei podem, na medida em que restringem a margem de discricionariedade de Juizes e Promotores, por um lado e de administradores e técnicos, por outro, democratizar o próprio sistema de justiça juvenil em nosso país constrangendo a prática de inúmeras arbitrariedades que vitimam os adolescentes em conflito com a lei. Por certo, o ante projeto apresentado pelo Desembargador Amaral e Silva está longe de se constituir em uma referência para uma boa e justa lei. Cabe-lhe o mérito de ter apresentado à discussão pública a primeira proposta. Sua proposta, todavia, não merece acolhida por incorporar disposições equívocas e sustentar medidas de natureza repressiva em si mesmas inaceitáveis como o isolamento disciplinar, a suspensão de visitas ou o uso de algemas.

Os argumentos sustentados contra a necessidade de uma Lei de Execução das Medidas Sócio Educativas podem ser agrupados em dois grandes eixos: primeiramente, em torno da idéia de que o ECA já estabelece todas as garantias, bastando, portanto, aplicá-lo. Este argumento não me parece sustentável. Em verdade, o ECA deixou de nomear inúmeras garantias aos adolescentes em conflito com a lei permitindo, a partir de seus princípios gerais, uma ampla margem de interpretação pelo que, por decorrência, legitima-se o arbítrio. Na segunda linha, há os argumentos que se agrupam em torno da idéia de que uma Lei de Execução significaria, na prática, a introdução de um "direito penal juvenil" no Brasil, pelo que se agrediria o cerne do próprio Estatuto. Verifica-se, aqui, uma tendência bastante significativa de se disputar doutrinariamente a prevalência de esquemas abstratos em detrimento dos esforços por centralizar o debate em torno das pessoas mesmas. Não me parece relevante saber se a "proporcionalidade" é um princípio adstrito ao direito penal, ou se a "prescrição" é compatível com as finalidades pedagógicas do ECA. O que me parece relevante saber é se regras orientadas por estes princípios podem ser boas ou não para os adolescentes em conflito com a lei.

TEXTO 3 : AMAZÔNIA E QUESTÕES INDÍGENAS. Ten.-Brig.-do-Ar SÉRGIO XAVIER FEROLLA – Ministro do STM

A questão indígena, em face de algumas perguntas que nós acreditávamos que já estavam respondidas, voltou à ordem do dia - integrar ou segregar o índio? Até há poucos anos a política era de integração, e foi essa política que vigorou ao longo da história do Brasil. Nós nos orgulhamos de sermos formados de uma mistura, uma mescla de povos de 3 raças; sempre nos orgulhamos disso, porque houve sempre a integração. Hoje há tendência de segregar o índio, a pretexto de preservar a sua cultura, manter uma janela, mantê-lo numa vitrina é mais ou menos a linha da FUNAI.

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Isso ainda está se discutindo: que extensão deve ter uma terra indígena, por que a área ianomâmi é tão grande ? Por que a área do alto Rio Negro dos tucanos é enorme? Quais os critérios para demarcar uma reserva indígena? São questões ainda não respondidas. E, por que não são respondidas? Eu lhes asseguro, sem medo de errar: sentimos, pela vivência na Amazônia, a pressão enorme de Organizações Não Governamentais, para que não se chegue a uma decisão. Ainda no tocante ao índio e à preservação do meio ambiente, as ONGs têm um papel exageradamente acentuado quanto a explorar ou não as riquezas de uma terra indígena. A Constituição de 88 diz que as áreas muito grandes podem ser exploradas, mas declaram que isso precisa ser regulamentado. A regulamentação até agora não existe, embora o assunto esteja sendo discutido objetivamente no Congresso Nacional.

Vários senadores e deputados, sentindo o problema, mudam muito a sua maneira de pensar. Um deles era o presidente da Comissão de Meio Ambiente, e com toda a pressão que sofre sobre o assunto: (permitir ou não exploração de riquezas em terras indígenas), mostrou que encara o prob1ema favoravelmente à exploração. Só para nós termos uma idéia, no território nacional, 11% são terras indígenas; 83% de todas as terras indígenas estão na Amazônia. Aí nós temos 144 mil índios, de um total de 326 mil existentes no País.

A população indígena no Brasil é pouco mais de 1% de nossa população, mas estes 1% dispõem de 11°% do território. É muito importante para nós vermos a influência de terras indígenas nos Estados. No Acre, no Amapá e no Tocantins é muito pequena. No Amazonas 21% do Estado são terras indígenas; praticamente 20% do Pará são terras indígenas e Roraima não existe como Estado. Está inviabilizado, como unidade federativa de direito e de fato, porque somente em terras indígenas tem quase 58% de seu território. Agregando as áreas preservadas (áreas de proteção ambiental), sobra pouquíssimo para o Estado conduzir uma atividade econômica. A tendência é piorar. No momento nós estamos com um conflito muito grande na área do Iurabutã que é bem lá ao norte junto com a fronteira da Guiana, onde pretendem transformar várias áreas isoladas em uma só. Os políticos de Roraima, a começar pelo governador, estão lutando tenazmente contra tal tendência. As áreas indígenas constituem, na Amazônia um conjunto maior que Portugal, Espanha, Alemanha, Bélgica e Majorca.

A FUNAI e outras organizações ligadas ao problema índio na Amazônia, cada uma vê seu problema isoladamente. O Poder público, seja federal, seja estadual, terá sempre muitas limitações para conduzir atividades sócio-econômicas, e não há como integrar a Amazônia sem conduzir atividades sócio-econômicas. O que desejam os 7G (sete grandes) e as ONGs é que a Amazônia seja preservada exatamente como ela está; não se derrube uma árvore, não se mate um jacaré (crime inafiançável), e permaneça como patrimônio da humanidade ! É nossa grande preocupação, essa expressão chamada "patrimônio da humanidade". Ela está consolidando cada vez mais, a nível internacional, a cobiça e a tendência à intervenção.

Nós fizemos um jogo, sobrepondo diversas áreas para vermos o problema corno um todo. Começamos com os corredores ecológicos na Amazônia, em número de cinco, sobre eles jogando-se as Áreas de Proteção Ambiental verifica-se que a maioria delas cai nos corredores, só que os corredores ampliam

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enormemente essas áreas e criaram locais onde não existiam áreas de proteção ambiental; sobre elas joguemos as reservas indígenas e as terras indígenas. Ver-se-á então o que sobrou da Amazônia. Eu gostaria de destacar que no quadro atual já se formou um corredor de isolamento ao longo da nossa fronteira, e o Estado pouco vai chegar aí, porque quem domina, quem comanda, e exerce pressão em cima disso, são Organizações Não Governamentais. E o pobre índio é o homem essencialmente rnanobrado, seja por um lado seja pelo outro.

A Constituição determina que tenhamos uma faixa de 150 quilômetros ao longo da fronteira e tudo isso está sendo observado ( muito mais do que 150 km de largura na fronteira já temos nesse corredor que está se formando). Quando nós jogamos as reservas minerais conhecidas em cima das áreas de restrição verificamos que elas não estão sempre em cima dessas áreas supostas intocáveis. Qual a razão? Porque não há interesse em que nós sejamos parceiro eficiente na produção de minérios a nível internacional. Se entrarmos com o nosso enorme potencial iremos baixar preços, competir ("congelamento" independente de nossa vontade, mas um congelamento de fato, a nível internacional, dos nossos recursos). Na região dos 6 lagos temos a maior reserva de nióbio do mundo, o mineral do próximo século. São 90% das reservas conhecidas de nióbio do mundo e nós não o podemos explorar !!

Em Carajás e Urucu, as pressões demográficas são mais que óbvias. Logo após a Guerra de Secessão americana, foi feita nova proposta ao Imperador Pedro II para que permitisse que excedentes populacionais fossem aceitos na Amazônia. Proposta também feita a Jânio Quadros para aceitar considerável contingente de indianos. Entre Palmeira do Javari e Assis Brasil são 1.470 km, um absoluto vazio sem qualquer presença do Estado. Entre Bonfim e Clevelândia são 1.600 km, e ali também o govemo não está presente.

TEXTO 4: A REEDIÇÃO DO HOLOCAUSTO 

* Manuel Cambeses JúniorCoronel-Aviador da Reserva da Força Aérea.

Ansioso para que o assentamento na Terra Santa ocorresse de forma pacífica, o mundo deixou-se engabelar pela retórica de Israel e ignorou, durante bom tempo, os seus atos. Os anos noventa do século passado foram testemunhas de uma fervorosa expansão dos assentamentos israelenses nas zonas palestinas, tanto por parte do Partido Trabalhista como por parte do Likud.

Uma década depois dos acordos de Oslo, duplicou-se o número de colonos judeus e reduziu-se a distância entre qualquer área palestina vigiada e a presença israelense, a aproximadamente nove quilômetros.

A macabra política de governo promovida pelo líder israelense Ariel Sharon, de transformar a Terra Santa em um campo de concentração para os palestinos, bem como o histórico comentário do consagrado escritor português José Saramago, de que essa malfadada política reflete “o espírito de Auschwitz”, induzem a que se reabra o debate sobre a acusação de que o Estado de Israel, lamentavelmente, está perpetrando um verdadeiro holocausto contra o povo palestino.

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Na execução da política de perseguição e extermínio empreendida pelos nazistas contra a população judia, período da História que ficou conhecido como Holocausto, temos que diferenciar três etapas principais que se realizaram com objetivos e métodos diferentes: primeiramente, o movimento fascista, ocorrido na Alemanha, entre 1923 e 1933; em segundo lugar, o Estado fascista pré-bélico e, finalmente, o período compreendido entre 1939 e 1945, ou seja, durante o transcorrer da Segunda Guerra Mundial.

Na primeira fase, Adolf Hitler escreveu o seu livro Mein Kampf, que acabou proporcionando a base ideológica ao Partido Nacional Socialista Alemão do Trabalho (NSDAP), fundado em 1920. Os judeus e o bolchevismo passam, a partir daí, a ser encarados como “eixos do mal” das desgraças nacionais alemãs. Ademais, a superioridade racial germânica e a necessidade de conquistar outras nações para dispor de um Lebensraum (espaço vital) suficiente, formaram o alicerce ideológico do nascente movimento que pretendia derrubar o Estado liberal para, num passo seguinte, apossar-se do poder.

Com relação ao programa de dominação israelense, podemos inferir que não existe nada de novo em relação ao que já foi registrado anteriormente pela História. O uso propagandista de uma estrutura binária ideológica – o bem e o mal -, para influenciar e manipular a população é uma forma bastante conhecida e sobejamente utilizada por líderes mundiais, em diversas ocasiões. Os Estados, os partidos políticos, os demagogos e as elites dominantes sempre utilizaram esse arquétipo de pensamento para impor seus interesses.

O racismo, por sua vez, é a apologia mais funcional para todo projeto antiético, desde a justificativa grega da escravidão e a submissão terrorista da população indígena americana, até o Holocausto judeu e os inesperados êxitos eleitorais de Adolf Hitler na Alemanha.

O uso político-sociológico-eleitoral do anti-semitismo judeu termina com a conversão do movimento nazista, em janeiro de 1933, em Estado fascista. De um incipiente movimento coadjuvante à instalação de uma cruel ditadura, os fatos ocorreram celeremente, metamorfoseando a nação alemã em um complexo ideológico-jurídico estatal, destinado a cumprir duas funções principais: excluir a população de descendência judia da proteção da constituição e, conseqüentemente, permitir a apropriação de suas riquezas.

A “arianização” das propriedades judias, ou melhor, a apropriação indébita de fábricas, bancos, estabelecimentos comerciais e demais valores produtivos da classe empresarial com descendência judia, bem como a marginalização de profissionais judeus em cargos de administração pública, atividades educacionais, médicas e jurídicas, entre outras, liquidou com a incômoda competição que anteriormente havia com os capitalistas alemães e permitiu o enriquecimento parasitário do Partido, de vários estabelecimentos bancários, de “camaradas nazistas” bem colocados e de instituições do Estado.

O desmesurado crescimento do Estado nazista exigia enormes fundos e, evidentemente, a expropriação dos ativos judeus constituía o caminho mais rápido para satisfazer as necessidades econômicas do leviatã, produzindo a primeira onda de “limpeza étnica” promovida pelo Holocausto.

Na Alemanha, a exclusão social-jurídica do povo judeu foi acelerada, no ano de 1933, com a legislação que obrigava a população definida como judia a

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ostentar uma estrela amarela (estrela de David) em suas vestes quando saíam de suas casas. Tal discriminação racista foi institucionalizada, inicialmente, pela Igreja Católica na Idade Média, quando, juntamente com o estabelecimento dos guetos judeus, o Vaticano decretou que a população judia deveria portar um boné amarelo ao transitar pelas ruas.

A terceira fase do Holocausto tem início com a invasão da Polônia pelas tropas de Hitler, e, em 1942, os nazistas resolvem aplicar a “solução final” à população judia européia, ou seja, a sua eliminação física. As técnicas de matança utilizadas anteriormente, como a fome, as enfermidades e os fuzilamentos, não foram suficientes para atender aos ímpetos do ditador, razão pela qual se planejou a aniquilação em massa com a fria lógica ditada pelos próceres do Partido. O campo de concentração de Auschwitz, onde milhares de seres humanos foram mortos pela inalação de gases tóxicos e posteriormente cremados, constituiu o paradigma dessa insana e macabra ação.

Ao estabelecermos parâmetros comparativos entre o projeto de dominação nazista de Adolf Hitler e o sionista de Ariel Sharon, verificamos existirem evidentes diferenças. O Estado sionista, obviamente, não emprega campos de extermínio em massa, não pratica uma política de genocídio e não constitui um Estado fascista, mas sim, uma democracia burguesa liberal. Entretanto, os elementos coincidentes entre ambos os projetos são igualmente evidentes: a essência das políticas de Hitler e Sharon estão calcadas, fundamentalmente, no expansionismo bélico. O Lebensraum de Hitler era o leste da Europa e, o de Sharon, a Palestina.

A apropriação deste espaço vital aos palestinos se realiza mediante a “limpeza étnica” dos territórios ocupados pela força militar. Os métodos utilizados para tal fim são, essencialmente, os mesmos empregados pelas forças de ocupação de Hitler, ou seja, a destruição da base econômica do povo palestino; seu confinamento em grandes guetos amuralhados - dos quais não podem entrar ou sair sem a permissão dos conquistadores - o uso sistemático de assassinatos políticos, execuções extra-judiciais, torturas, destruição de propriedades e castigos coletivos, entre outros.

A bem da verdade, é importante enfatizar que a política estabelecida por Ariel Sharon com relação ao povo palestino, viola os preceitos do direito internacional estabelecidos pela Organização das Nações Unidas, e ferem os princípios mais elementares da sadia convivência internacional.

O núcleo ideológico do sionismo, representado por Ariel Sharon e que é compartilhado por amplos setores do Partido Trabalhista, fundamenta-se na noção de “povo eleito” e da “Grande Israel” bíblica. Esses são, fundamentalmente, os equivalentes teológicos que se equiparam à ideologia da “raça superior” e do Lebensraum dos nazistas.

Da mesma maneira que, no século passado, as potências ocidentais não empreenderam nenhum esforço coletivo no sentido de impedir o extermínio histórico dos judeus, a política sionista conta, na atualidade, com o explícito apoio do Governo estadunidense, da silente posição da União Européia e da inação da imprensa mundial. Evidentemente que, sem esse imprescindível apoio, a odienta e criminosa política de Ariel Sharon com relação à Palestina não estaria sendo implementada.

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Israelenses e palestinos parecem ter olvidado que a sadia convivência entre vizinhos e a inter-relação econômica é um fator sinérgico e impulsionador do crescimento e demonstração de maturidade política. Lamentavelmente, estão agindo na contramão da História e, conseqüentemente, devem aprender a conviver com a idéia da própria extinção como parte de uma realidade cotidiana.

 

TEXTO 05: DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS

Preâmbulo

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo;

Considerando que o desconhecimento e o desprezo dos direitos do Homem conduziram a atos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade e que o advento de um mundo em que os seres humanos sejam livres de falar e de crer, libertos do terror e da miséria, foi proclamado como a mais alta inspiração do Homem;

Considerando que é essencial a proteção dos direitos do Homem através de um regime de direito, para que o Homem não seja compelido, em supremo recurso, à revolta contra a tirania e a opressão;

Considerando que é essencial encorajar o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações; Considerando que, na Carta, os povos das Nações Unidas proclamam, de novo, a sua fé nos direitos fundamentais do Homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres e se declaram resolvidos a favorecer o progresso social e a instaurar melhores condições de vida dentro de uma liberdade mais ampla;

Considerando que os Estados membros se comprometeram a promover, em cooperação com a Organização das Nações Unidas, o respeito universal e efetivo dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais;

Considerando que uma concepção comum destes direitos e liberdades é da mais alta importância para dar plena satisfação a tal compromisso:

A Assembléia Geral proclama a presente Declaração Universal dos Direitos Humanos como ideal comum a atingir por todos os povos e todas as nações, a fim de que todos os indivíduos e todos os órgãos da sociedade, tendo-a constantemente no espírito, se esforcem, pelo ensino e pela educação, por desenvolver o respeito desses direitos e liberdades e por promover, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional, o seu reconhecimento e a sua aplicação universais e efetivos tanto entre as populações dos próprios Estados membros como entre as dos territórios colocados sob a sua jurisdição.

Artigo 1° - Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.

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Artigo 2° - Todos os seres humanos podem invocar os direitos e as liberdades proclamados na presente Declaração, sem distinção alguma, nomeadamente de raça, de cor, de sexo, de língua, de religião, de opinião política ou outra, de origem nacional ou social, de fortuna, de nascimento ou de qualquer outra situação. Além disso, não será feita nenhuma distinção fundada no estatuto político, jurídico ou internacional do país ou do território da naturalidade da pessoa, seja esse país ou território independente, sob tutela, autônomo ou sujeito a alguma limitação de soberania. Artigo 3° - Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.

Artigo 4° - Ninguém será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos escravos, sob todas as formas, são proibidos.

Artigo 5° - Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

Artigo 6° - Todos os indivíduos têm direito ao reconhecimento, em todos os lugares, da sua personalidade jurídica.

Artigo 7° - Todos são iguais perante a lei e, sem distinção, têm direito a igual proteção da lei. Todos têm direito a proteção igual contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.

Artigo 8° - Toda a pessoa direito a recurso efetivo para as jurisdições nacionais competentes contra os atos que violem os direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição ou pela lei.

Artigo 9° - Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado.

Artigo 10 - Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja eqüitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.

Artigo 111- Toda a pessoa acusada de um ato delituoso presume-se inocente até que a sua culpabilidade fique legalmente provada no decurso de um processo público em que todas as garantias necessárias de defesa lhe sejam asseguradas. 2- Ninguém será condenado por ações ou omissões que, no momento da sua prática, não constituíam ato delituoso à face do direito interno ou internacional. Do mesmo modo, não será infligida pena mais grave do que a que era aplicável no momento em que o ato delituoso foi cometido.

Artigo 12 - Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e

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reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.

Artigo 13°-1- Toda a pessoa tem o direito de livremente circular e escolher a sua residência no interior de um Estado. 2- Toda a pessoa tem o direito de abandonar o país em que se encontra, incluindo o seu, e o direito de regressar ao seu país.

Artigo 14° 1- Toda a pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar e de beneficiar de asilo em outros países. 2- Este direito não pode, porém, ser invocado no caso de processo realmente existente por crime de direito comum ou por atividades contrárias aos fins e aos princípios das Nações Unidas. Artigo 15° 1- Todo o indivíduo tem direito a ter uma nacionalidade. 2- Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade nem do direito de mudar de nacionalidade.

Artigo 16° 1- A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça, nacionalidade ou religião. Durante o casamento e na altura da sua dissolução, ambos têm direitos iguais. 2- O casamento não pode ser celebrado sem o livre e pleno consentimento dos futuros esposos. 3- A família é o elemento natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção desta e do Estado.

Artigo 17° 1- Toda a pessoa, individual ou coletiva, tem direito à propriedade. 2- Ninguém pode ser arbitrariamente privado da sua propriedade.

Artigo 18° Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos.

Artigo 19° Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão.

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Artigo 20° 1- Toda a pessoa tem direito à liberdade de reunião e de associação pacíficas. 2- Ninguém pode ser obrigado a fazer parte de uma associação.

Artigo 21° 1- Toda a pessoa tem o direito de tomar parte na direção dos negócios, públicos do seu país, quer diretamente, quer por intermédio de representantes livremente escolhidos. 2- Toda a pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas do seu país. 3- A vontade do povo é o fundamento da autoridade dos poderes públicos: e deve exprimir-se através de eleições honestas a realizar periodicamente por sufrágio universal e igual, com voto secreto ou segundo processo equivalente que salvaguarde a liberdade de voto.

Artigo 22° Toda a pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social; e pode legitimamente exigir a satisfação dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis, graças ao esforço nacional e à cooperação internacional, de harmonia com a organização e os recursos de cada país.

Artigo 23° 1- Toda a pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do trabalho, a condições eqüitativas e satisfatórias de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2- Todos têm direito, sem discriminação alguma, a salário igual por trabalho igual. 3- Quem trabalha tem direito a uma remuneração eqüitativa e satisfatória, que lhe permita e à sua família uma existência conforme com a dignidade humana, e completada, se possível, por todos os outros meios de proteção social. 4- Toda a pessoa tem o direito de fundar com outras pessoas sindicatos e de se filiar em sindicatos para defesa dos seus interesses.

Artigo 24° - Toda a pessoa tem direito ao repouso e aos lazeres, especialmente, a uma limitação razoável da duração do trabalho e as férias periódicas pagas.

Artigo 25°- 1- Toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar e à sua família a saúde e o bem-estar, principalmente quanto à alimentação, ao vestuário, ao alojamento, à assistência médica e ainda quanto aos serviços sociais necessários, e tem direito à segurança no desemprego, na doença, na invalidez, na viuvez, na velhice ou noutros casos de perda de meios de subsistência por circunstâncias independentes da sua vontade. 2- A maternidade e a infância têm direito a ajuda e a assistência especiais. Todas as crianças, nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozam da mesma proteção social.

Artigo 26° 1- Toda a pessoa tem direito à educação. A educação deve ser gratuita, pelo menos a correspondente ao ensino elementar fundamental. O ensino elementar é

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obrigatório. O ensino técnico e profissional dever ser generalizado; o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade, em função do seu mérito. 2- A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como o desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz.

Artigo 27° 1- Toda a pessoa tem o direito de tomar parte livremente na vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar no progresso científico e nos benefícios que deste resultam. 2- Todos têm direito à proteção dos interesses morais e materiais ligados a qualquer produção científica, literária ou artística da sua autoria.

Artigo 28° - Toda a pessoa tem direito a que reine, no plano social e no plano internacional, uma ordem capaz de tornar plenamente efetivos os direitos e as liberdades enunciadas na presente Declaração.

Artigo 29° - 1- O indivíduo tem deveres para com a comunidade, fora da qual não é possível o livre e pleno desenvolvimento da sua personalidade. 2- No exercício deste direito e no gozo destas liberdades ninguém está sujeito senão às limitações estabelecidas pela lei com vista exclusivamente a promover o reconhecimento e o respeito dos direitos e liberdades dos outros e a fim de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar numa sociedade democrática. 3- Em caso algum estes direitos e liberdades poderão ser exercidos contrariamente e aos fins e aos princípios das Nações Unidas.

Artigo 30° - Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada de maneira a envolver para qualquer Estado, agrupamento ou indivíduo o direito de se entregar a alguma atividade ou de praticar algum ato destinado a destruir os direitos e liberdades aqui enunciados.

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