apelaÇÃo cÍvel nº 1.590.316-1, do foro central da … · ii - voto e sua fundamentaÇÃo...

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Documento assinado digitalmente, conforme MP n.° 2.200-2/2001, Lei n.° 11.419/2006 e Resolução n.° 09/2008, do TJPR/OE Página 1 de 28 APELAÇÃO CÍVEL 1.590.316-1, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA – 10ª VARA CÍVEL APELANTE: APARECIDO DOS SANTOS SILVA APELADOS: IRMANDADE SANTA CASA DE LONDRINA E FRANK YUJI KAYANO RELATOR: JUIZ SUBST. 2º G. CARLOS HENRIQUE LICHESKI KLEIN (EM SUBS. AO CARGO VAGO – DES. EDUARDO FAGUNDES) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO. CIRURGIA PARA A RETIRADA DE HASTE IMPLANTADA NO FÊMUR QUE OCASIONOU FRATURA ÓSSEA. EXIBIÇÃO DOS DOCUMENTOS DO PRÉ-OPERATÓRIO DISPENSÁVEL. DESLOCAMENTO DA HASTE E OCORRÊNCIA DA FRATURA QUE NÃO FORAM OBJETO DE CONTROVÉRSIA NOS AUTOS. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE NOVA PROVA PERICIAL. PRELIMINARES DE NULIDADE AFASTADAS. O HOSPITAL RESPONDE SOLIDARIAMENTE PELOS ATOS CULPOSOS PRATICADOS PELO PROFISSIONAL, CONFORME ARTS. 932 E 933 DO CÓDIGO CIVIL. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO POR DANOS CAUSADOS É SUBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 14, § 4º, DO CDC. OBRIGAÇÃO DE MEIO, NÃO DE RESULTADO. AUSÊNCIA DE PROVAS DE FALHA TÉCNICA DO PROFISSIONAL NA EXECUÇÃO DO PROCEDIMENTO. EXISTÊNCIA DE DEVERES ACESSÓRIOS À ATIVIDADE MÉDICA. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO QUANTO AO DEVER DE

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.590.316-1, DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA – 10ª VARA CÍVEL APELANTE: APARECIDO DOS SANTOS SILVA APELADOS: IRMANDADE SANTA CASA DE LONDRINA E FRANK YUJI KAYANO RELATOR: JUIZ SUBST. 2º G. CARLOS HENRIQUE LICHESKI KLEIN (EM SUBS. AO CARGO VAGO – DES. EDUARDO FAGUNDES) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ERRO MÉDICO. CIRURGIA PARA A RETIRADA DE HASTE IMPLANTADA NO FÊMUR QUE OCASIONOU FRATURA ÓSSEA. EXIBIÇÃO DOS DOCUMENTOS DO PRÉ-OPERATÓRIO DISPENSÁVEL. DESLOCAMENTO DA HASTE E OCORRÊNCIA DA FRATURA QUE NÃO FORAM OBJETO DE CONTROVÉRSIA NOS AUTOS. DESNECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE NOVA PROVA PERICIAL. PRELIMINARES DE NULIDADE AFASTADAS. O HOSPITAL RESPONDE SOLIDARIAMENTE PELOS ATOS CULPOSOS PRATICADOS PELO PROFISSIONAL, CONFORME ARTS. 932 E 933 DO CÓDIGO CIVIL. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. RESPONSABILIDADE DO MÉDICO POR DANOS CAUSADOS É SUBJETIVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 14, § 4º, DO CDC. OBRIGAÇÃO DE MEIO, NÃO DE RESULTADO. AUSÊNCIA DE PROVAS DE FALHA TÉCNICA DO PROFISSIONAL NA EXECUÇÃO DO PROCEDIMENTO. EXISTÊNCIA DE DEVERES ACESSÓRIOS À ATIVIDADE MÉDICA. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO QUANTO AO DEVER DE

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Apelação Cível nº 1.590.316-1 fls. 2

INFORMAÇÃO. FATO NÃO CONTROVERTIDO PELO RÉU. TERMO DE CONSENTIMENTO INFORMADO QUE NÃO VEIO AOS AUTOS. DEVER DE INDENIZAR VERIFICADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E, NO MÉRITO, PARCIALMENTE PROVIDO. VISTOS, relatados e discutidos estes autos de

Apelação Cível nº 1.590.316-1, da 10ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Londrina, em que são apelante APARECIDO DOS SANTOS SILVA, e apelados IRMANDADE SANTA CASA DE LONDRINA E FRANK YUJI KAYANO.

I - RELATÓRIO Trata-se de recurso de apelação interposto em

face da sentença proferida às págs. 602-614 dos autos nº. 0010408-65.2015.8.16.0014, de “ação indenizatória por erro médico c/c cautelar de exibição de documentos”, em que o douto juízo singular julgou improcedente a demanda, condenando, por corolário, o requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor da causa, ressalvada a suspensão de exigibilidade, nos termos do art. 85, §2º, do NCPC.

Inconformada, a parte autora interpôs recurso de

apelação (págs. 629-650), em que, preliminarmente: a) sustenta a nulidade da sentença, diante da ausência de apreciação do pedido de exibição de documentos formulado na inicial, notadamente para que sejam apresentados os exames e prontuários do pré-operatório e do pós-operatório; b) ainda

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pleiteando a anulação do decisum, defende ser necessária a realização de nova perícia, pois o laudo produzido em juízo desconsiderou documentos imprescindíveis para a adequada análise do estado de saúde do autor, bem como lançou conclusões parciais acerca dos prejuízos apontados na inicial; c) requer a apreciação do agravo retido de págs. 204-209. No mérito: a) sustenta que a sentença merece reforma, devendo ser reconhecido o erro médico cometido pelo profissional, pois os elementos coligidos aos autos, sobretudo a perícia e a prova testemunhal, corroboram as alegações delineadas na inicial; b) sendo reconhecido o erro médico, pugna pela condenação solidária dos réus ao pagamento das indenizações pleiteadas na inicial.

Devidamente intimados acerca da interposição

da apelação, ambos os réus apresentaram contrarrazões, o nosocômio réu às págs. 662-694 e, o médico, às págs. 686-704.

É a breve exposição. Vieram-me conclusos. II - VOTO E SUA FUNDAMENTAÇÃO Presentes os pressupostos de admissibilidade, tanto

intrínsecos quanto extrínsecos, conheço do recurso.

Ausência de Nulidade da Sentença – Prova Documental e Realização de Nova Perícia Prescindíveis para o Julgamento da Demanda Preliminarmente, a parte autora pleiteia o

reconhecimento de nulidade da decisão terminativa singular, com fundamento na ocorrência de cerceamento de defesa, pois houve o indeferimento da produção de prova documental que reputava imprescindível ao deslinde do feito, bem como houve o indeferimento de nova prova pericial.

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Contudo, não verifico nos presentes autos a

existência das aludidas nulidades, conforme será demonstrado a seguir.

Na inicial, o requerente pleiteia a exibição dos

seguintes documentos: “todos os exames realizados, sobretudo as radiografias feitas antes e após a primeira cirurgia ocorrida em 13/05/2013 e também as realizadas antes da cirurgia subsequente, bem como o prontuário clínico – atendimento no Pronto Socorro; exames laboratoriais e risco cirúrgico”. (pág. 31)

Ressalta que a produção das provas em questão

teria o escopo de demonstrar que, antes da cirurgia, o autor apresentava bom estado de saúde – apenas sentindo dores na perna – e, após o procedimento, sofreu fratura em seu fêmur, que acarretou o “encurtamento em 2 ou 3 cm de sua perna esquerda”. (pág. 32).

No entanto, analisando atentamente as razões

deduzidas pelas partes ao longo da demanda, verifico que os fatos em questão não são pontos controvertidos na presente lide, pelo que não é necessária a dilação probatória quanto a estes elementos.

É que, na peça exordial, o autor narra que

compareceu ao consultório do médico réu por sentir dores em sua perna esquerda, sendo-lhe indicada cirurgia para a retirada de haste fixada em seu fêmur.

Destaca que foi informado de que a cirurgia seria

simples e que o médico réu chegou a garantir que o paciente “entraria e sairia andando do Hospital”; porém, durante a realização de tal procedimento, houve fratura em seu fêmur, o que lhe ocasionou, posteriormente, o encurtamento da perna esquerda em cerca de 2 cm.

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Neste contexto, afirma que houve falha do

profissional quanto à escolha e execução do procedimento, bem como destaca que não foi informado dos riscos que envolviam a cirurgia. Ressalta, ainda, que o réu deixou de proceder ao acompanhamento do requerente no pós-operatório, o que agravou, ainda mais, as consequências da falha.

A causa de pedir delineada na inicial, portanto,

refere-se à existência de falha do profissional quanto à eleição e execução do procedimento cirúrgico para retirada de haste do fêmur do autor, bem ainda trata do descumprimento de deveres anexos a atividade médica.

Na contestação, por outro lado, o primeiro requerido jamais negou a ocorrência da fratura quando da execução da cirurgia – inclusive confirmou tal circunstância em seu depoimento pessoal –, de sorte que a tese delineada na peça de defesa se refere, tão somente, à inexistência de falha técnica do profissional, sendo asseverado que tal intercorrência é um risco ínsito ao procedimento cirúrgico.

Igualmente não se estabeleceu controvérsia sobre

o fato de que o autor possuía dores em sua perna esquerda antes do procedimento cirúrgico, até porque, se assim não fosse, sequer teria procurado o médico ortopedista, nem se questiona que, afora este problema, suas condições de saúde eram boas.

E, conforme preceitua o art. 334, inciso III, do

CPC/731, o fato tido nos autos como incontroverso não depende de prova, pois, como bem pondera Humberto Theodoro Júnior, “prova-lo seria inutilidade e pura perda de tempo, em detrimento da celeridade processual que é almejada como ideal do processo

-- 1 Vigente à época da instrução probatória.

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moderno. ”2

Neste particular, vale lembrar que incumbe ao juiz indeferir as diligências meramente protelatórias ou desnecessárias ao deslinde do feito, com o escopo de garantir uma duração razoável do processo, sem que tal medida configure cerceamento de defesa.

Em outras palavras, não é dado à parte produzir

toda e qualquer prova, mas tão somente aquela que, ao menos hipoteticamente, seja relevante à formação da convicção do julgador. E a prova sobre fato incontroverso, certo, admitido como verdadeiro, por certo não atende a este desiderato.

Portanto, como o quadro clínico do requerente,

antes e depois da cirurgia, não foi objeto de controvérsia, sendo admitido por ambas as partes tanto o deslocamento da haste, quanto a fratura do fêmur durante a cirurgia de retirada, é dispensável a produção de prova a este respeito, em que pese tenha sido pleiteada pelo requerente em sua inicial.

De outro lado, o autor igualmente sustenta ser

necessária a produção de nova prova pericial, alegando que o laudo de págs. 374-415 se mostrou “parcial, frágil, inexato e inconsistente em suas apurações e conclusões, eis que baseado nos dizeres do médico recorrido e não nos documentos requeridos cautelarmente na inicial”.

Ademais, o requerente afirma que a produção da

prova documental pleiteada na inicial (documentos do pré-operatório, prontuário ambulatorial, etc.) seriam imprescindíveis para a realização da perícia, pois a expert não teria condições de avaliar

-- 2 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. Vol. I. Rio de Janeiro: Forense, 2012. Pág. 440.

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a existência de falha do profissional sem que estivesse munida dos aludidos documentos.

Entretanto, analisando de maneira minudente as

informações trazidas no laudo, em conjunto com os demais elementos de prova dos autos, tenho que a tese acerca da nulidade da perícia igualmente não merece prosperar.

Em primeiro lugar, ressalto que os documentos

pleiteados cautelarmente não eram necessários para a realização da perícia pois, como exaustivamente demonstrado, se destinariam a comprovar fatos que não eram controvertidos nos autos, tais como o estado clínico do autor antes e depois da cirurgia.

Aliás, a própria perita afirmou expressamente

serem dispensáveis os aludidos documentos, senão vejamos: a) Ab initio, os documentos requeridos pelo autor na inicial (item IV) e infelizmente até o momento NÃO apresentados pelos demandados, são imprescindíveis e indispensáveis para realização da perícia in casu? Quais os prejuízos para a perícia caso não localizados tais documentos? Os documentos referentes aos atendimentos anteriores e posteriores à internação do Autor na Irmandade Santa Casa de Londrina (exames complementares, prontuário do Posto de Saúde de Primeiro de Maio-PR e prontuário da Clínica de Fraturas Souza Naves de Londrina-PR) seriam importantes, mas não foram imprescindíveis ou indispensáveis, considerando que os documentos médico-hospitalares referentes ao procedimento cirúrgico propriamente dito foram depositados em cartório e minuciosamente analisados por esta Perita.

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A verdade é que, inexistindo controvérsia acerca do deslocamento da haste – o autor não afirmou que houve equívoco do profissional quanto ao diagnóstico em questão – era plenamente possível que a expert, levando em conta esta circunstância, emitisse juízo de valor sobre a escolha do procedimento cirúrgico, indicando se era adequado ou não ao caso ora tratado, valendo lembrar que a mesma informação já havia sido prestada ao apelante em consulta realizada em 1º de Maio, como ele mesmo relata.

Nesse cenário, a prova pericial nos presentes autos

se destinaria a comprovar se, havendo o deslocamento da haste, a conduta adotada pelo profissional foi adequada, tendo em conta o tempo de calcificação do mencionado equipamento na perna do autor, o método utilizado, e a própria execução do procedimento.

E, nestes pontos, a prova pericial foi elaborada de

maneira meticulosa, abordando de maneira extremamente cuidadosa os aspectos técnicos que envolvem a lesão, bem ainda o caso concreto.

Com efeito, não verifico qualquer vício capaz de

eivar de nulidade o laudo produzido pela expert, de sorte que as impugnações a este respeito são mero e infundado inconformismo com as conclusões do laudo.

Nego, portanto, provimento ao recurso quanto ao

pedido de declaração de nulidade apontada. Agravo Retido (págs. 204-209) No recurso de apelação, o autor reitera o agravo

retido de págs. 204-209, interposto ainda na vigência do Código de Processo Civil de 1973, pelo que, com fundamento no art. 523, caput, do aludido diploma legal, conheço do recurso em questão.

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O instrumento recursal ora analisado desafia a decisão interlocutória, proferida nas págs. 187-192, na qual o douto magistrado singular afastou a responsabilidade objetiva do nosocômio réu pelos danos causados ao paciente operado em seu estabelecimento.

Desta feita, cinge-se a controvérsia tratada no

agravo retido acerca do regime de responsabilidade civil aplicável à hipótese, levando em conta que a demanda foi proposta em face do nosocômio e do profissional, mas decorre da conduta praticada por este último.

O regime de responsabilidade civil a ser aplicado

aos eventos danosos no âmbito das instituições hospitalares dependerá da natureza da atividade prestada pelo nosocômio, que pode ser de caráter essencialmente médica ou de outros serviços auxiliares, hospedagem, etc.

Às atividades assumidas diretamente pelo

complexo hospitalar – tais como serviços de quarto, hospedagem, fornecimento de equipamentos e salas cirúrgicas, alimentação, acompanhamento de enfermaria, etc. –, se aplica o regime da responsabilidade civil objetiva, posto que, não sendo ínsitas ao exercício da atividade de profissional liberal, atraem a aplicação do artigo 14, caput, do Código de Defesa do Consumidor.

De outro lado, os serviços de natureza médica,

por terem como nota característica o exercício da atividade do profissional da área médica – que, via de regra, possui obrigação de meio –, ensejam a aferição do dever de indenizar à luz do art. 14, §4º, da legislação consumerista. Nestas hipóteses, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deverá ser comprovada pela vítima do dano, exsurgindo, para a instituição, o dever de indenizar à luz dos arts. 932 e 933 do Código Civil.

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Nesse sentido, oportuno colacionar o julgado de relatoria do Exmo. Ministro Luis Felipe Salomão, proferido pelo Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos:

DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL POR ERRO MÉDICO E POR DEFEITO NO SERVIÇO. SÚMULA 7 DO STJ. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 334 E 335 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. REDIMENSIONAMENTO DO VALOR FIXADO PARA PENSÃO. SÚMULA 7 DO STJ. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TERMO INICIAL DE INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA. DATA DA DECISÃO QUE FIXOU O VALOR DA INDENIZAÇÃO. 1. A responsabilidade das sociedades empresárias hospitalares por dano causado ao paciente-consumidor pode ser assim sintetizada: (i) as obrigações assumidas diretamente pelo complexo hospitalar limitam-se ao fornecimento de recursos materiais e humanos auxiliares adequados à prestação dos serviços médicos e à supervisão do paciente, hipótese em que a responsabilidade objetiva da instituição (por ato próprio) exsurge somente em decorrência de defeito no serviço prestado (art. 14, caput, do CDC); (ii) os atos técnicos praticados pelos médicos sem vínculo de emprego ou subordinação com o hospital são imputados ao profissional pessoalmente, eximindo-se a entidade hospitalar de qualquer responsabilidade (art. 14, § 4, do CDC), se não concorreu para a ocorrência do dano; (iii) quanto aos atos técnicos praticados de forma defeituosa pelos profissionais da saúde vinculados de alguma forma ao hospital, respondem solidariamente a instituição hospitalar e o profissional responsável, apurada a sua culpa profissional. Nesse caso, o hospital é responsabilizado indiretamente por ato de terceiro, cuja culpa deve ser comprovada pela vítima de modo a fazer emergir o dever de indenizar da

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instituição, de natureza absoluta (arts. 932 e 933 do CC), sendo cabível ao juiz, demonstrada a hipossuficiência do paciente, determinar a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do CDC). (REsp 1145728/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 08/09/2011) E, compulsando os autos, verifico que a

reclamação não foi movida em decorrência de obrigações diretamente assumidas pelo hospital (tais como internação, equipamentos, enfermagem, exames, etc); o que o autor alega é o erro do profissional quanto à eleição e execução do procedimento cirúrgico empregado, bem como a inadequação quanto às condutas acessórias à atividade médica, tais como o dever de informação acerca dos riscos do procedimento, acompanhamento posterior ao ato cirúrgico, etc.

Logo, referindo-se a causa de pedir sobre erro médico, a responsabilidade do hospital é, em verdade, solidária à do profissional, de sorte que, apurado dever de indenizar deste, deverá o nosocômio réu responder solidariamente pelo ato do médico que nele oficia.

Com efeito, nego provimento ao agravo retido

interposto pelo requerente, consignando que a responsabilidade ora tratada é subjetiva quanto ao profissional e, somente se verificado o dever de indenizar deste, deverá o nosocômio réu responder solidariamente pelos danos.

Responsabilidade Civil do Profissional – Ausência de Culpa do Réu pela Fratura do Fêmur – Procedimento Adequado ao Caso – Omissão Quanto ao Dever de Informar – Danos Morais Verificados

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Preambularmente, reforçando as razões trazidas

no tópico anterior, destaco que a responsabilidade do médico, por se tratar de profissional liberal, é subjetiva, conforme preceitua o art. 14, §4º, do Código de Defesa do Consumidor.

Além disso, a aplicação do regime da

responsabilidade civil subjetiva na área médica é imperiosa, pois nem todo resultado adverso obtido decorre de erro do profissional, de sorte que a medicina, ainda na atualidade, possui diversas limitações – não havendo como garantir a cura para todas as mazelas existentes.

Dessa forma, o médico, ao oferecer os seus

serviços, deve colocar à disposição do paciente todo o seu conhecimento, buscando o melhor resultado dentro das circunstâncias fáticas que permeiam o caso concreto – porém, sem ter como garantir a cura.

A obrigação, portanto, é de meio, não de

resultado, como bem destaca Rui Rosado Aguiar: "A obrigação é de meio quando o profissional assume prestar um serviço ao qual dedicará atenção, cuidado e diligência exigidos pelas circunstâncias, de acordo com o seu título, com os recursos de que dispõe e com o desenvolvimento atual da ciência, sem se comprometer com a obtenção de um certo resultado.”3 Nesse mesmo sentido, tem-se o entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, senão vejamos: RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL.

-- 3 AGUIAR, Rui Rosado. Tratado de Responsabilidade Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 351).

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(...) 2. Na hipótese de prestação de serviços médicos, o ajuste contratual – vínculo estabelecido entre médico e paciente – refere-se ao emprego da melhor técnica e diligência entre as possibilidades de que dispõe o profissional, no seu meio de atuação, para auxiliar o paciente. Portanto, não pode o médico assumir compromisso com um resultado específico, fato que leva ao entendimento de que, se ocorrer dano ao paciente, deve-se averiguar se houve culpa do profissional – teoria da responsabilidade subjetiva. No entanto, se, na ocorrência de dano impõe-se ao hospital que responda objetivamente pelos erros cometidos pelo médico, estar-se-á aceitando que o contrato firmado seja de resultado, pois se o médico não garante o resultado, o hospital garantirá. Isso leva ao seguinte absurdo: na hipótese de intervenção cirúrgica, ou o paciente sai curado ou será indenizado – daí um contrato de resultado firmado às avessas da legislação. (REsp 908.359/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/08/2008, DJe 17/12/2008)

Especialmente tratando acerca da

responsabilidade médica do ortopedista, Miquel Kfouri Neto traz as seguintes considerações:

“O ortopedista – a exemplo de quase todos os demais médicos – contrai uma obrigação de meios, em relação ao seu paciente. Isso significa não existir uma imposição de curar sempre, de obter êxito em todas as intervenções, mas sim de aplicar os conhecimentos da ciência médica contemporânea, dispensar cuidados atentos e de qualidade ao paciente, enfim, de envidar os melhores esforços no sentido de atingir o resultado esperado, mas sem garantia plena de sucesso.” 4

-- 4 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 256.

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Com efeito, é fundamental perscrutar se houve ou não culpa por parte do réu Frank Yuji Kaiano, seja no momento da seleção e execução do procedimento, seja quanto ao cumprimento dos deveres acessórios à atividade médica.

Como já mencionado anteriormente, é

incontroverso nos autos que o autor compareceu ao consultório do réu, pois sofria com dores intensas e contínuas em sua perna esquerda.

Após realizados exames – o que também não foi

posto em dúvida nos presentes autos, tendo o requerente, inclusive, pleiteado a juntada das radiografias produzidas no pré-operatório – o médico réu verificou que havia ocorrido deslocamento na haste não bloqueada implantada no fêmur do autor há mais de 20 anos.

Diante do quadro acima mencionado, o Dr. Frank

Yuji Kaiano indicou a realização de procedimento para a retirada da aludida haste, que foi agendado para o dia 13 de maio de 2013.

Ocorre que, durante a cirurgia para a extração

da haste não bloqueada, houve nova fratura do fêmur do autor, que já se encontrava, há muito tempo, calcificada, o que ocasionou a necessidade de execução de um novo procedimento cirúrgico.

Todas estas informações podem ser encontradas

nos documentos depositados em juízos pelo autor às págs. 71, cujo teor foi posteriormente transcrito de maneira minuciosa na perícia, notadamente às págs. 381-389.

Dentro deste contexto fático, e considerado o

alegado erro médico apontado na inicial, o primeiro aspecto da conduta do profissional que deve ser avaliado é se, havendo o deslocamento da haste – fato esse incontroverso nos autos –, o

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requerido indicou o procedimento adequado. Para tanto, com o escopo de compreender a

natureza do procedimento realizado com maior profundidade, é relevante reportar às considerações encetadas pela perita acerca da cirurgia da retirada de haste, senão vejamos:

“A remoção do material de osteossíntese não é obrigatória, mas opcional. Alguns países do mundo como a Alemanha retiram as placas, no Brasil em geral ela é retirada somente quando a placa causa algum problema, devendo ser decidida em análise individual. Não a necessidade de troca. As hastes podem duram a vida toda. Se não há queixa de dor ou se a haste não está causando nenhum problema, não há indicação de retirá-la. Se está causando dor e este é o problema, a retirada da haste pode ajudar. Porém, é uma nova cirurgia e possui seus riscos. As hastes intramedulares podem ser removidas mediante nova cirurgia. Como são materiais metálicos intra-ósseos é recomendável removê-las a partir de 1 ano depois da consolidação óssea - após a consolidação e remodelação total da fratura. Em geral haste é retirada quando ocorre algum tipo de incômodo ou o organismo rejeita o material, em algumas situações, na criança, também retira-se o material de síntese. A retirada do material não é obrigatória e não pode ser retirada precocemente pois há o risco de refratura. Outro problema e que mesmo esperando dois anos, quando é preciso retirar o material de síntese o osso ainda está um pouco

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mais fraco e a região deve ser protegida de estresses maiores por algum tempo. Resumindo não há uma regra absoluta para retirada do material de síntese e em alguns casos as placas e hastes intramedulares permanecem por todo a vida no mesmo lugar, sendo a retirada reservada quando há algum problema ou complicação. ” (SIC) (pág. 339) E analisando a conduta do profissional, em

conjunto com as peculiaridades da causa, a expert judicial trouxe as seguintes considerações sobre a indicação do procedimento de retirada de haste no caso concreto:

a) se era indicada a cirurgia para a retirada da haste da perna do autor; Sim, porque o Autor tinha queixas álgicas na região de quadril e de coxa esquerdos e havia sido verificado, em exame de Rx, um deslocamento superior da haste intramedular não bloqueada de fêmur instalada vários anos antes (por fratura diafisária de fêmur esquerdo). O fato de a haste estar deslocada superiormente poderia trazer complicações articulares (coxo-femorais futuras) caso não fosse retirada. Estando o material intra-articular, a consequência poderia ser sinovite (inflamação da bursa articular), condrólise (lesão cartilaginosa) e dor. Não há qualquer evidência de que tal procedimento tenha sido mal indicado pelo Réu no caso em tela. (Pág. 407).

Corroborando tais afirmações, em resposta ao

quesito “d” formulado pela parte autora, a expert ainda consignou que:

d) O autor poderia ter recebido outro tratamento para sanar ou minimizar as dores sentidas sem que houvesse a retirada da haste? Não.

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Não só pelas dores referidas pelo Autor, mas também pelo risco de lesão articular em quadril que pode ser causada pelo deslocamento da haste intramedular não bloqueada de fêmur. O material havia se deslocado causando dor e poderia estar intra-articular; a consequência poderia ser sinovite (inflamação da bursa articular) e condrólise (lesão cartilaginosa). (Pág. 412) Desta feita, a perícia judicial deixou claro que, no

caso de deslocamento de haste, se o paciente for afligido por dores, há, sim, indicação para o procedimento cirúrgico encetado pelo médico.

Ademais, a perita informou que,

independentemente da colocação da haste ter ocorrido há mais de 20 anos, o procedimento de retirada, ainda assim, era indicado, senão vejamos:

c) Considerando que o autor já possuía uma haste no osso de sua perna esquerda há mais de 20 anos, o procedimento cirúrgico (retirada da haste) indicado e realizado pelo médico demandado foi o mais adequado e pertinente para o autor? Se sim, favor explicar as razões de forma fundamentada. Se não, qual seria o tratamento mais indicado e pertinente para o paciente em questão? Sim, porque o Autor tinha queixas álgicas na região de quadril e de coxa esquerdos e havia sido verificado, em exame de Rx, um deslocamento superior da haste intramedular não bloqueada de fêmur instalada vários anos antes (por fratura diafisária de fêmur esquerdo). (pág. 412)

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Portanto, de acordo com as conclusões lançadas

no laudo pericial, não há como se afirmar que o procedimento cirúrgico indicado pelo réu não era adequado no caso concreto; muito pelo contrário, a perícia aponta para a necessidade de sua realização, sob pena de se agravar sobremaneira o estado de saúde do requerente.

Outrossim, igualmente não verifico culpa do profissional quanto à execução do procedimento, pois, conforme consignou a perita:

b) se é comum ou aceitável que, no procedimento de retirada da haste, haja a fissura do fêmur, como no caso, ou se tal fato deve ser atribuído à imperícia do médico; Embora seja incomum, devido às particularidades das cirurgias ortopédicas, pode ocorrer fratura óssea durante a retirada de um material de osteossíntese - haste intramedular de fêmur não bloqueada no caso em tela, caso a calcificação ao redor de tal haste esteja exuberante. Tal complicação não caracteriza, por si só, uma imperícia do médico. Desta feita, sendo um risco ínsito ao procedimento

cirúrgico, que varia de acordo com as peculiaridades do caso concreto, não se trata de erro grosseiro, razão pela qual não há como se presumir que a fratura do fêmur, por si só, decorreu de falha do profissional.

Neste sentido, vale reportar, novamente, às ponderações contidas na obra de Miguel Kfouri Neto, senão vejamos:

“A culpabilidade somente pode ser presumida na

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hipótese de ocorrência de erro grosseiro, de negligência ou de imperícia, devidamente demonstrados. Se os profissionais utilizaram de sua vasta experiência e dos meios técnicos indicados, como os habituais cuidados pré e pós-operatórios, somente uma prova irretorquível poderá levar `indenização pleiteada (...). ”5 Portanto, ao menos quanto à seleção e execução

do procedimento realizado, não houve conduta culposa do médico réu, pois a cirurgia para a remoção de haste era indicada para o quadro clínico do autor, e não existem indícios de que a fratura decorreu de negligência, imprudência ou imperícia do profissional.

E, vale dizer, em casos análogos ao ora tratado,

este Egrégio Tribunal de Justiça já pronunciou a respeito da ausência de culpa do profissional, como se pode observar da ementa colacionada a seguir:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - ERRO MÉDICO NÃO CONFIGURADO - CIRURGIA DE REMOÇÃO DE HASTE METÁLICA AFIXADA NO BRAÇO PARA CONSOLIDAÇÃO DE FRATURA DE ÚMERO - LESÃO DE NERVO RADIAL - IMOBILIDADE DA MÃO E INCAPACIDADE LABORATIVA PARCIAL - RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO MÉDICO - INDISPENSÁVEL À DEMOSNTRAÇÃO DE CULPA - ART. 14, § 4º DO CDC E 1545 DO CC - PERÍCIA MÉDICA NÃO APONTA NEGLIGÊNCIA, IMPERÍCIA OU IMPRUDÊNCIA DO PROFISSIONAL - OBRIGAÇÃO DE MEIO E NÃO DE RESULTADO - CARÊNCIA DE ELEMENTO INDISPENSÁVEL À CARACTERIZAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL - AUSÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR RECURSO PROVIDO (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 526446-6 - Curitiba - Rel.:

-- 5 RJTJRGS 146/340 apud. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 256.

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Rosana Amara Girardi Fachin - Rel.Desig. p/ o Acórdão: José Augusto Gomes Aniceto - Por maioria - - J. 12.11.2009) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTES OS PEDIDOS INICIAIS.1. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 1 - INTERPOSTO PELO RÉU AUREO SHIZUTO CINAGAWA. CIRURGIA PARA RETIRADA DE PLACA METÁLICA (IMPLANTE). OBRIGAÇÃO DE MEIO. IMPOSSIBILIDADE DE CONSTATAÇÃO DO DESGASTE DA ESTRUTURA DOS PARAFUSOS POR EXAMES PRÉ-CIRÚRGICOS. INOCORRÊNCIA DE ERRO MÉDICO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CULPA. LAUDO PERICIAL QUE CONSTATOU A ADEQUAÇÃO DO PROCEDIMENTO REALIZADO PELO MÉDICO. AUSÊNCIA DE IMPRUDÊNCIA, NEGLIGÊNCIA OU IMPERÍCIA. INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. IMPROCÊDENCIA DO PEDIDO INICIAL QUE SE IMPÕE. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 1 CONHECIDO E PROVIDO.2. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 2 - INTERPOSTO PELO AUTOR. MAJORAÇÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULO DE DANOS MORAIS E RECONHECIMENTO DO DANO ESTÉTICO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CULPA POR PARTE DO MÉDICO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 2 CONHECIDO E DESPROVIDO.3. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 3 - INTERPOSTO PELA RÉ UNIMED DE LONDRINA - COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO.3.1. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA.3.2. ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR. ACOLHIMENTO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL. RECURSO DE APELAÇÃO Nº 3 CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.4. REDISTRIBUIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA. AUTOR DECAIU EM TODOS OS PEDIDOS. (TJPR - 8ª C.Cível - AC - 1410893-7 - Região Metropolitana de Londrina - Foro Central de Londrina - Rel.: Luis Sérgio Swiech - Unânime - - J. 10.09.2015).

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APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS - CIRURGIA DE HÉRNIA INGUINAL REALIZADA NO LADO OPOSTO DO PREVIAMENTE COMBINADO ENTRE MÉDICO E PACIENTE - ALEGAÇÃO DE ERRO MÉDICO - PROVA PERICIAL E ORAL INEQUÍVOCAS, DEMONSTRANDO A NECESSIDADE DE OPERAR O LADO CONTRÁRIO NO MOMENTO DA OPERAÇÃO, DECISÃO COMUNICADA AO PACIENTE E ACEITA POR ESTE - AUSÊNCIA DE ERRO MÉDICO - PROCEDIMENTO CORRETAMENTE ADOTADO NO ATENDIMENTO DO PACIENTE - AUSÊNCIA DE CULPA POR PARTE DO MÉDICO/APELADO - RESPONSABILIDADE CIVIL NÃO CONFIGURADA - AUSÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR - SENTENÇA MANTIDA RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 9ª C.Cível - AC - 1326571-1 - Toledo - Rel.: José Augusto Gomes Aniceto - Unânime - - J. 14.05.2015). Quanto à alegada ausência de

acompanhamento pós-cirúrgico do autor, há que se ter em conta que o requerente era paciente do Sistema Único de Saúde, no qual é substancialmente restrita a possibilidade do médico acompanhar por longos prazos o seu paciente.

Assim sendo, em que pese seja lastimável esta

circunstância, não se pode atribuir ao réu responsabilidade pela falha do próprio sistema de saúde brasileiro.

Por outro lado, a responsabilidade do médico vai além, ultrapassa a mera realização de procedimentos cirúrgicos, diagnósticos, acompanhamentos clínicos, etc., havendo deveres acessórios que são inerentes à profissão, sejam eles legais ou, ainda, éticos.

Dentre as obrigações ínsitas à atividade médica,

está a de prestação adequada de informações ao paciente sobre

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os riscos decorrentes dos procedimentos prescritos, prestigiando-se a liberdade de escolha do enfermo a respeito da submissão, ou não, ao tratamento.

Nesse cenário, não é só o erro procedimental ou

clínico do médico que gera a sua responsabilização, a omissão do profissional quanto ao dever de informação dos elementos que cercam o procedimento pode ensejar danos ao paciente e, neste caso, havendo o nexo causal entre a omissão e o dano, exsurge o dever de indenizar.

Neste sentido, é pertinente reportar, novamente –

prestigiando a doutrina local, inclusive porque também reconhecida nacionalmente –, as lições de Kfouri Neto, como se vê a seguir:

“Na eventualidade de o dano ter sido causado por culpa do médico, normalmente torna-se irrelevante discutir a qualidade da informação – que é um dever secundário de conduta. Entretanto, quando a intervenção médica é correta – e não se informou adequadamente –, a questão se torna crucial. Poderá haver responsabilização pela falta ou deficiência no cumprimento do dever de informar, ainda que não se possa provar claramente ter havido culpa no descumprimento da obrigação principal.”6 Na espécie, o autor alega na inicial que não

recebeu qualquer informação acerca dos riscos do tratamento indicado, sendo-lhe dito pelo primeiro réu que era um procedimento simples e de rápida recuperação.

Já na contestação, o primeiro réu simplesmente

-- 6 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 43.

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deixou de contestar a omissão quanto ao seu dever de informação, bem como deixou de acostar aos autos o documento típico para comprovar que tais informações foram devidamente prestadas ao seu paciente, qual seja o termo de consentimento informado.7

Ou seja, o descumprimento do dever de

informação do réu é, também, questão incontroversa nos autos, devendo ser aplicada, neste ponto, a presunção de veracidade, nos termos do art. 341 do Novo CPC8.

Nesta linha, não há como elidir a culpa do

profissional pela omissão, tampouco o dano moral decorrente desta falha, consistente no estado de insatisfação e de irritação do paciente que adentrou à sala de cirurgia sem conhecer os reais riscos do procedimento, e acabou surpreendido com a nova fratura de seu fêmur, que lhe acarretou inúmeros transtornos à vida cotidiana.

E, ao negligenciar seu dever de informação, o

médico tolheu o direito de escolha de seu paciente, pois, se informado acerca dos riscos, teria a liberdade de se submeter, ou não (procurar outro médico, outro diagnóstico, outro centro médico, etc.), ao referido procedimento, o que certamente deve ser levado em conta para a mensuração do dano.

Portanto, embora a fratura sofrida pelo autor não

tenha decorrido de ato culposo do profissional, a ausência de informação acerca dos riscos da cirurgia causou ao requerente danos morais, que devem ser reparados. -- 7 Nas palavras de Miguel Kfouri Neto, citado na sentença, “o consentimento informado representa mais do que uma mera faculdade de escolha do médico, de dissenso (ou recusa) sobre uma terapia, ou mero requisito para afastar o espectro da negligência médica. A obtenção do consentimento representa o corolário do processo dialógico de recíprocas informações entre médico e paciente, a fim de que o tratamento possa ter início”. KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. p. 41. 8 Correspondente ao art. 302 do CPC/73.

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A indenização pelo dano moral deve ser

estabelecida em montante razoável, levando em conta as circunstâncias particulares do caso, as posses do causador do dano, a situação pessoal da vítima, a intensidade da culpa e a gravidade da lesão, evitando assim que se converta em fonte de enriquecimento ilícito, ou se torne inexpressiva a ponto de desencorajar o lesado a buscar a reparação e, por via oblíqua, estimular aquele que causa o dano, por dolo ou culpa, a prosseguir na prática lesiva.

A indenização, portanto, tem duplo objetivo:

compensar a dor causada à vítima (função compensatória) e desestimular o ofensor a cometer atos da mesma natureza (função pedagógico/punitiva), razão pela qual esse montante deve ser arbitrado segundo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Nesse sentido são os ensinamentos de Sérgio

Cavalieri Filho: “Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa, dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras mais que se fizerem presentes”. 9

-- 9 Programa de Responsabilidade Civil, 6. Ed. Malheiros Editora, 2006, p. 16.

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Visando averiguar tais elementos – razoabilidade e

a proporcionalidade – no caso concreto, mais uma vez, lanço mão das lições trazidas por Kfouri Neto, conforme segue:

“A soma indenizatória não seria fixada pela totalidade do dano, isoladamente considerado, como no caso de a lesão ter sido provocada por falha técnica ou deficiente atuação médico-cirurgião, mas sim diante da probabilidade de o paciente, caso tivesse sido convenientemente informado, não se submeter ao tratamento. O parâmetro seria, hipoteticamente, a decisão previsível e razoável de outro paciente, diante da mesma situação e bem informado. Também outros fatores seriam analisados, como o estado de saúde do paciente, prognóstico e gravidade do processo patológico, as alternativas terapêuticas existentes, a necessidade de intervenção médica, a natureza do risco e condições em que se deu a intervenção do tratamento (...)”.10 A lógica jurídica que informa o aludido raciocínio é

oriunda da analogia entre a hipótese tratada e a teoria da perda de uma chance, de sorte que é necessário investigar até que ponto a ausência da informação ensejou ao paciente prejuízo, consistente na perda da chance em realizar o melhor tratamento, mas não só. Não se olvide o sofrimento ao qual foi submetido com a surpresa da nova fratura de seu fêmur.

Por consequência, conclui-se que a fixação do

quantum indenizatório, em caso de omissão quanto ao dever de

-- 10 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. P. 49.

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informação, deve levar em conta os seguintes critérios: “a) a existência de outras terapias menos perigosas ou desprovidas de potencialidade lesiva; b) se, à luz do que comumente ocorre, outro paciente, em idênticas condições, teria consentido, após inteirar-se dos perigos inerentes à intervenção; c) se tais riscos, não informados eram comuns ou excepcionais. Após, incumbiria ao julgador mensurar as consequências concretas da falta de consentimento, arbitrando reparação consentânea. Fundamental é que o juiz avalie a distinção entre duas hipóteses – falta de informação e nexo etiológico com o dano sofrido pelo paciente –, a fim de que resulte bem definida, no julgado, qual a fonte originária da reparação. ” 11 Para se fixar o valor da indenização, portanto,

deve ser levado em consideração que: a) a perícia atestou que o procedimento em questão era adequado ao caso concreto; b) o deslocamento da haste poderia ensejar prejuízos maiores ao autor; c) a fratura em casos como o ora tratado é excepcional.

À luz dos mencionados requisitos, fixo a

indenização pelo dano moral em decorrência da falta de informação deve ser fixada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente desde a data do arbitramento e acrescidos de juros de mora desde a data da citação.

E, como já delineado anteriormente, a

responsabilidade por suportar a mencionada indenização é solidária

-- 11 KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade Civil do Médico. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. P. 49.

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entre o médico e o nosocômio réu, que antes de disponibilizar suas instalações, deveria averiguar e certificar-se do cumprimento das normas acerca do cumprimento do dever de informar.

Ademais, como não se verifica o nexo causal entre

a omissão no dever de informação e os demais danos apontados pelo autor, nego provimento ao recurso quanto às demais pleitos e indenizações.

Ônus de Sucumbência Alterado significativamente o desfecho da

demanda, devem ser redistribuídos os ônus de sucumbência, certo que os pedidos formulados na inicial foram julgados parcialmente procedentes, sendo os réus condenados, solidariamente, a indenizar os danos morais causados pela omissão do primeiro requerido.

Assim sendo, levando em consideração a

relevância econômica do pedido (se comparado com aquilo que o autor deixou de ganhar), condeno a parte autora ao pagamento de 80% das custas processuais, devendo os réus suportar o remanescente (20%).

Ademais, fixo os honorários advocatícios em 15% sobre o valor da condenação, a serem suportados pelos requeridos, mantidos, no mais, os honorários fixados aos procuradores das requeridas, no percentual de 12%, ressalvada, quanto ao requerente, a suspensão da exigibilidade, nos termos do art. 98, §3º, do NCPC.

Conclusão Diante do exposto, voto no sentido de conhecer e

negar provimento ao agravo retido interposto pelo requerente e conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação interposto pelo autor, para condenar os requeridos, solidariamente,

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ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização por danos morais, corrigidos monetariamente desde a data do arbitramento e acrescidos de juros de mora desde a data da citação, redistribuindo, por corolário, os ônus de sucumbência.

É como voto. III - DECISÃO ACORDAM os Desembargadores integrantes da

Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao agravo retido e conhecer e dar parcial provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto acima relatado.

O julgamento foi presidido pelo Excelentíssimo

Desembargador GUILHERME FREIRE DE BARROS TEIXEIRA, sem voto, participaram da sessão de julgamento acompanhando o voto do Relator as Exmas. Desa. ÂNGELA KHURY e Juíza Substituta em Segundo Grau ELIZABETH NOGUEIRA CALMON DE PASSOS.

Curitiba, 16 de fevereiro de 2017. CARLOS HENRIQUE LICHESKI KLEIN Juiz Substituo em 2º Grau – Relator (brb)