apatridia e o sistema internacional de proteção aos apátridas um estudo de casos no Âmbito da...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNISEB TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO BACHARELADO EM DIREITO APATRIDIA E O SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO AOS APÁTRIDAS: UM ESTUDO DE CASOS NO ÂMBITO DA CORTE EUROPÉIA DE DIREITOS HUMANOS Nicole Cardoso Paganini Orientador: Leopoldo Rocha Soares RIBEIRÃO PRETO 2013

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Trabalho de Conclusão de curso, que pretendeu analisar a questão da apatridia, desde suas origens, à luz do direito internacional dos direitos humanos, do sistema regional europeu e das legislações internas dos países sob a jurisdição da Corte Européia de Direitos Humanos, apontando para os problemas existentes na prática da efetivação do direito humano à nacionalidade.

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNISEB

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

BACHARELADO EM DIREITO

APATRIDIA E O SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO AOS

APÁTRIDAS: UM ESTUDO DE CASOS NO ÂMBITO DA CORTE EUROPÉIA DE

DIREITOS HUMANOS

Nicole Cardoso Paganini

Orientador: Leopoldo Rocha Soares

RIBEIRÃO PRETO

2013

II

NICOLE CARDOSO PAGANINI

APATRIDIA E O SISTEMA INTERNACIONAL DE PROTEÇÃO AOS APÁTRIDAS:

UM ESTUDO DE CASOS NO ÂMBITO DA CORTE EUROPÉIA DE DIREITOS

HUMANOS

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao

Centro Universitário UNISEB de Ribeirão Preto,

como parte dos requisitos para obtenção do grau

de Bacharel em Direito.

Orientador: Leopoldo Rocha Soares

RIBEIRÃO PRETO

2013

Ficha Catalográfica

P129a

Paganini, Nicole Cardoso.

Apatridia e o sistema internacional de proteção aos apátridas: um

estudo de casos no âmbito da Corte Européia de Direitos Humanos.

Nicole Cardoso Paganini. - Ribeirão Preto, 2013.

149 f. il..

Orientador: Prof. Me. Leopoldo Rocha Soares.

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Centro

Universitário UNISEB de Ribeirão Preto, como parte dos

requisitos para obtenção do Grau de Bacharel em Direito sob a

orientação do Prof. Me. Leopoldo Rocha Soares.

1. Apatridia. 2. Nacionalidade. 3. Direitos humanos. I. Título.

II. Soares, Leopoldo Rocha.

CDD 342

III

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Aluno: Nicole Cardoso Paganini Código: 6367 Curso: Direito Semestre/Ano: 10º/2013 Tema: Apatridia e o sistema internacional de proteção aos apátridas: um estudo de casos no âmbito da Corte Européia de Direitos Humanos Objetivos pretendidos: Analisar a questão da apatridia, desde suas origens, à luz do direito internacional dos direitos humanos, do sistema regional europeu e das legislações internas dos países sob a jurisdição da Corte Européia de Direitos Humanos, apontando para os problemas existentes na prática da efetivação do direito humano à nacionalidade.

_____ / _____ / __________ _______________________________________

Leopoldo Rocha Soares

Professor Orientador _____ / _____ / __________ _______________________________________

Nicole Cardoso Paganini

Aluna _____ / _____ / __________ _______________________________________

Paulo Henrique Miotto Donadeli

Coordenador do Curso

_____ / _____ / __________ _______________________________________

Prof. Reginaldo Arthus

Vice-Reitor

IV

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

FORMULÁRIO DE AVALIAÇÃO – FATCC Tema do Trabalho: Apatridia e o sistema internacional de proteção aos apátridas: um

estudo de casos no âmbito da Corte Européia de Direitos Humanos.

Data de apresentação: _____ / _____ / __________

Horário: __________

Local: _____________________________________

Comissão Julgadora:

1) Professor Orientador: _____________________________________________________

2) Professor da Área: ________________________________________________________

3) Professor Convidado: ______________________________________________________

V

Folha de Pontuação:

Fatores de Avaliação Pontuação (0.0 a 2.0)

1. Atualidade e relevância do tema

2. Linguagem técnica utilizada em relação ao tema e

aos objetivos, e competência lingüística.

3. Aspectos metodológicos e formais de editoração

do trabalho escrito – seqüência lógica e coerência

interna.

4. Revisão Bibliográfica utilizada em relação ao

tema pesquisado.

5. Apresentação oral: segurança e coerência em

relação ao trabalho escrito.

Média: __________ ( ______________________________________________________ )

Assinatura dos membros da comissão julgadora:

1) _____ / _____ / __________ _______________________________________________

2) _____ / _____ / __________ _______________________________________________

3) _____ / _____ / __________ _______________________________________________

VI

Dedico à minha mãe, meu pai e minha prima,

pelo enorme apoio, incentivo e inspiração.

VII

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus pela minha vida e pelas oportunidades que tem

colocado em meu caminho.

Agradeço aos meus pais, Octacílio Paganini Júnior e Claudia Maria Rodrigues

Cardoso Paganini, pelo imenso amor e apoio durante todos esses anos. Sem eles, sequer

estaria aqui hoje.

Agradeço à minha prima, Tatiana de Almeida Freitas Rodrigues Cardoso, minha

mentora e exemplo na área do Direito Internacional, pelas idéias e pelo enorme incentivo.

Agradeço a toda minha família, pelo carinho que sempre me deram, sobretudo durante

esta etapa da minha formação.

Agradeço a todos os professores desta instituição que contribuíram para minha

formação acadêmica, ao que sempre serei grata.

Agradeço ao meu orientador, Prof. Ms. Leopoldo Rocha Soares o qual procurou me

ajudar do melhor modo possível, sendo imprescindível para a conclusão deste trabalho.

Agradeço aos membros da Banca Avaliadora, pela oportunidade de apresentar, na data

de hoje, esta pesquisa que venho desenvolvendo.

Por fim, agradeço aos meus amigos, por toda paciência que têm tido comigo.

VIII “Nossa verdadeira nacionalidade é a

humanidade”.

H. G. Wells

IX

PAGANINI, Nicole Cardoso. Apatridia e o sistema internacional de proteção aos apátridas: um estudo de casos no âmbito da Corte Européia de Direitos Humanos. Trabalho de Conclusão de Curso. Curso de Direito. Centro Universitário UNISEB. Ribeirão Preto, 2013. (149 f.)

RESUMO Este trabalho teve como intuito contribuir para a construção teórica acerca do tema, tão pouco explorado na literatura jurídica brasileira e mundial, com uma pesquisa bibliográfica acerca da condição de apatridia, sobretudo no âmbito da atuação da Corte Européia de Direitos Humanos. Primeiramente, é feita uma análise acerca da construção histórica dos Direitos Humanos, para então chegarmos ao conceito de nacionalidade e, por fim, à sua privação, sendo esta a condição de apatridia. Buscou, também, este trabalho, ressaltar a gravidade das condições de vida dos apátridas, mesmo em países desenvolvidos. Palavras-chave: Apatridia – Nacionalidade – Direitos Humanos

X

PAGANINI, Nicole Cardoso. Statelessness and the international system of protection towards the stateless persons: a case study within the range of the European Court of Human Rights. Completion of course work. Course of Law. UNISEB University Centre. Ribeirão Preto, 2013. (149 f.)

ABSTRACT This essay had the intention of contributing to the theorical construction around this theme, so weakly explored in brazilian and worldly juridical literature, with a bibliographical research concerning the condition of statelessness, mainly within the acting range of the European Court of Human Rights. Firstly, an analysis about the historical construction of the Human Rights is made, so then we may get to the concept of nationality and, finally, to it’s privation, that being the condition of statelessness. This essay has also seeked to highlight the severity of the life conditions of the stateless persons, even in developed countries. Keywords: Statelessness – Nationality – Human Rights

XI

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS ............................................................................................. XIII

LISTA DE QUADROS ..........................................................................................................XV

LISTA DE ILUSTRAÇÕES ................................................................................................ XVI

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................1

1. Do Direito Humano a uma Nacionalidade ........................................................................ 3

1.1. Da Edificação dos Direitos Humanos ................................................................................. 3

1.1.1. Da Origem Histórica ........................................................................................................ 5

1.1.2. Acepções Doutrinárias ................................................................................................... 14

1.2. A Nacionalidade Enquanto Direito Humano .................................................................... 16

1.2.1. Nacionalidade Originária e Derivada .............................................................................21

1.2.2. Conflito Positivo e Negativo ..........................................................................................30

2. O Apátrida e sua Tutela Jurídica ..................................................................................... 34

2.1. Noções Elementares de Apatridia ..................................................................................... 34

2.1.1. Identificando o Apátrida: Origens e Conceito ............................................................... 35

2.1.2. O Conflito Entre a Apatridia e o Direito Humano à Nacionalidade .............................. 42

2.2. Os Sistemas de Proteção ao Apátrida ............................................................................... 43

2.2.1. No Âmbito Internacional ............................................................................................... 44

2.2.2. No Âmbito Europeu....................................................................................................... 75

3. A Apatridia na Corte Européia de Direitos Humanos: Uma Análise Prática ..............88

3.1. Caso Kurić e Outros v. Eslovênia ..................................................................................... 89

XII

3.2. Caso Karassev e Família v. Finlândia ............................................................................... 93

3.3. Caso Kaftailova e Outros v. Letônia ................................................................................. 95

3.4. Caso Caso Okonkwo v. Áustria ........................................................................................ 98

CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 101

REFERÊNCIAS................................................................................................................... 102

ANEXOS............................................................................................................................... 114

XIII

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACNUR: Alto Comissariado das Nações Unidas para

Refugiados CEDH: Corte Européia de Direitos Humanos

CEN: Convenção Européia sobre a Nacionalidade

CIA: Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos

CIDH: Corte Interamericana de Direitos Humanos

CIJ: Corte Internacional de Justiça

CRFB: Constituição da República Federativa do Brasil

CTPS: Carteira de Trabalho e Previdência Social

DIDH: Direito Internacional dos Direitos Humanos

DUDH: Declaração Universal dos Direitos Humanos

DUDHC: Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão

EC: Emenda Constitucional

ECR: Emenda Constitucional de Revisão

ERT: Equal Rights Trust

OIM: Organização Internacional de Migrações

OIT: Organização Internacional do Trabalho

ONU: Organização das Nações Unidas

PIDCP: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

PIDESC: Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e

Culturais SEDH: Sistema Europeu de Direitos Humanos

SGDH: Sistema Global de Direitos Humanos

XIV

TPJI: Tribunal Permanente de Justiça Internacional

URSS: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas

XV

LISTA DE QUADROS

Quadro 01 – Estados-Parte da Convenção de Haia de 1930: Assinaturas, Ratificações, Acessões e Ressalvas ............................................................................................................... 45

Quadro 02 – Estados-Parte da Convenção Sobre o Estatuto dos Apátridas de 1954: Assinaturas, Acessões, Sucessões e Ratificações .................................................................... 57

Quadro 03 – Estados-Parte da Convenção para a Redução dos Casos de Apatridia de 1961: Assinaturas, Acessões, Sucessões e Ratificações .................................................................... 66

Quadro 04 – Número de Apátridas de Acordo com o País de Residência em 2012 ................72

Quadro 05 – Estados-Parte da Convenção Européia de Nacionalidade ...................................85

XVI

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 01 – Progresso de Pedidos de Acessão nas Convenções sobre a Apatridia ................. 68

Figura 02 – Progresso de Adesões Definitivas às Convenções sobre a Apatridia .................. 69

Figura 03 – Mapa-Múndi de Estados-Parte das Convenções sobre a Apatridia em 2013 ....... 70

Figura 04 – Mapa Europeu de Estados-Parte das Convenções sobre a Apatridia em 2013 .... 76

1

INTRODUÇÃO

Há muito que se conhece a existência da condição de apatridia. Desde os idos das

sociedades clássicas existem os heimatlos, pessoas sem pátria, as quais sempre foram

deixadas à margem da sociedade.

Embora o conceito de nacionalidade seja demasiado antigo; sendo certo que desde que

existe tenha falhas em sua abrangência; sua proteção, e a própria proteção aos Direitos

Humanos, é deveras recente. De fato, enquanto muitos consideram como marco inicial de uma

proteção mais concreta aos Direitos Humanos a Magna Carta, assinada pelo rei João Sem-

Terra em 1215, a proteção pontual à nacionalidade só viria contida no art. 15º da Declaração

Universal dos Direitos Humanos (DUDH) de 1948.

Embora, após a DUDH, outros dispositivos até mesmo mais específicos tenham

surgido para a proteção do direito à nacionalidade e, também, para a proteção ao apátrida e

erradicação da apatridia, este é um problema do qual o mundo ainda padece, atingindo,

inclusive, os chamados países de primeiro mundo.

Isto posto, questiona-se: o que tem sido feito para prevenir e solucionar os casos de

apatridia? Quais os mecanismos existentes para tanto? Qual é a atual tendência dos

julgamentos envolvendo casos de apatridia no âmbito da Corte Européia de Direitos

Humanos? Os julgamentos e convenções têm contribuído, de forma eficaz, à efetivação do

direito humano a uma nacionalidade?

No primeiro capítulo, será traçado primeiramente um histórico da evolução dos

direitos humanos, estendendo-se até o advento do direito a uma nacionalidade. Após, serão

apresentadas as espécies de nacionalidade e, por fim, serão tratados os conflitos de

nacionalidade, para situar as origens da apatridia.

No segundo capítulo, a figura do apátrida será propriamente apresentada, igualmente

serão apresentadas as ferramentas jurídicas hábeis à sua proteção, bem como exposta a real

condição em que tais indivíduos atualmente se encontram.

2

No terceiro capítulo, serão apresentados casos concretos de indivíduos apátridas

submetidos a julgamento pela Corte Européia de Direitos Humanos, os quais buscam ver seus

direitos garantidos, inclusive o direito a uma nacionalidade.

Para desenvolver esta pesquisa, foi utilizado o método da revisão bibliográfica,

buscando na literatura nacional e estrangeira elementos que pudessem compor este trabalho

sem, contudo, ter a intenção de esgotar tão vasto tema.

O presente trabalho busca, portanto, trazer à luz a figura do apátrida, tão pouco

explorada na literatura jurídica, e demonstrar quão séria é a condição de apatridia, sendo esta

realmente merecedora de maiores atenções por parte, sobretudo, dos juristas e dos governos

de Estados Nacionais.

3

CAPÍTULO 1

DO DIREITO HUMANO A UMA NACIONALIDADE

Embora o conceito de nacionalidade seja tão antigo quanto a noção de direitos

humanos, tendo ambas surgido na Grécia antiga, a nacionalidade enquanto direito humano só

veio a ser garantida pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948.

Contudo, a nacionalidade é ponto básico da relação de pertencimento entre um

indivíduo e a sociedade na qual ele se insere, motivo pelo qual esta passou a ser protegida

pelo Direito Internacional dos Direitos Humanos no século XX. Como ressalta Arendt (1989,

apud ACNUR, 2005):

Ser privado da nacionalidade é como ser privado da pertença ao mundo, é como retornar ao estado natural, como homens das cavernas ou selvagens... O homem que não é nada mais que um homem perdeu aquelas qualidades que tornaram possível para outras pessoas o tratarem como igual... Pode viver ou morrer sem deixar vestígios, sem ter contribuído em nada para o mundo comum.

Se faz, aqui, portanto, necessária, a apresentação da construção histórica do Direitos

Humanos, do seu advento à sua internacionalização, para então compreender como a

nacionalidade, a ser oportunamente estudada, passou a integrá-los.

1.1. Da edificação dos direitos humanos

Os direitos humanos podem ser conceituados, segundo Luño (1999, apud PICCIRILLO; SIQUEIRA, 2009) como sendo:

4

[...] un conjunto de facultades e instituciones que, en cada momento histórico, concretan las exigencias de la dignidad, la libertad y la igualdad humana, las cuales deben ser reconocidas positivamente por los ordenamientos jurídicos a nivel

nacional y internacional1.

Assim, postula-se que, numa visão positivista, os Direitos Humanos equivaleriam às

garantias mínimas de igualdade, liberdade e dignidade da pessoa, em determinado momento e

contexto histórico-social.

Acerca deste mesmo tema, completa Bobbio (2008), os direitos do homem são mal

definíveis, variáveis e heterogêneos, visto que são o fruto de uma complexa e, até meados do

século XX2, vagarosa evolução; tendo nascido como direitos naturais universais, tendo se

desenvolvido em direitos positivos particulares a cada sociedade para, então, afirmarem-se

como produto da evolução histórica, positivados universalmente através dos tratados e

convenções3 (PIOVESAN, 2005).

Cabe, neste momento, diferenciar os conceitos de direitos humanos e direitos

fundamentais, tão comumente confundidos na doutrina.

Ora, enquanto os direitos humanos são, como será demonstrado adiante, fruto de uma

evolução histórica, constituindo-se em direitos inerentes à própria condição de humanidade,

os direitos fundamentais seriam, por natureza, os direitos humanos positivados por uma ordem

jurídica vigente, inerentes àqueles que estariam sob a égide desta ordem. Nesse

direcionamento, ensina Canotilho (1998, apud PICCIRILLO; SIQUEIRA, 2009):

As expressões direitos do homem e direitos fundamentais são freqüentemente utilizadas como sinônimas. Segundo a sua origem e significado poderíamos distinguí-las da seguinte maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos; direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza humana e daí o seu caráter inviolável, intertemporal e universal; os direitos fundamentais seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.

1 Um conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico, solidificam as exigências da

dignidade, da liberdade e da igualdade humana, as quais devem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos em nível nacional e internacional (tradução livre). 2 Mais precisamente, após 1945, com o fim da II Guerra Mundial.

3 Ainda assim, explica Campos (2002, p. 66) que, mesmo entre aqueles direitos considerados básicos, haveria alguns que se sobrepujavam aos demais, devendo ser aplicados a todos os homens, insdistintamente e sob quaisquer circunstâncias. É uma posição doutrinária; entretanto, para os termos deste trabalho, a discussão de ponderação de entre direitos humanos não será aprofundada.

5

Entretanto, mais específico é o entendimento de Mazzuoli (2010, apud BAGATINI,

2012) que, em sua obra, ensina:

Os direitos humanos são, por sua vez, direitos inscritos (positivados) em tratados ou em costumes internacionais. Ou seja, são aqueles direitos que já ascenderam ao patamar do Direito Internacional Público. [...] Direitos fundamentais é expressão mais afeta à proteção constitucional dos direitos dos cidadãos. Liga-se, assim, aos aspectos ou matizes constitucionais (internos) de proteção, no sentido de já se encontrarem positivados nas Constituições contemporâneas.

Assim, conclui-se que o conceito de direitos fundamentais possui fundamento no

direito interno de um Estado constituído, enquanto que o conceito de direitos humanos

fundamenta-se no direito internacional. Entendimento este compartilhado por célebres

doutrinadores, tais como Höffe (2000, apud BAGATINI, 2012) e Sarlet (2008, apud BAGATINI, 2012).

Por sua vez, destaca Sarlet (2008, apud BAGATINI, 2012) que não se pode olvidar a

íntima relação entre direitos humanos e direitos fundamentais na atualidade. Isto se deve ao

fato de que grande parte das Constituições formuladas após o fim da II Guerra Mundial

buscaram inspiração na DUDH e demais documentos internacionais de proteção aos direitos

do homem, positivando internamente os postulados internacionais.

Portanto, os chamados direitos fundamentais são uma construção da era moderna, mais

precisamente do Direito Constitucional nos Estados nacionais. Todavia, segundo a imensa

maioria doutrinária, a origem da noção de direitos humanos se deu no contexto da antiguidade

clássica. Vejamos.

1.1.1. Da origem histórica

É sabido que a noção de direitos inerentes ao homem é deveras antiga, tendo se

edificado paulatinamente ao longo da história, até que fosse atingida a concepção de Direitos

6

Humanos que hoje possuímos. De fato, Moyn (1973, p. 12), nos faz um breve resumo do

início de tal processo de edificação:

The classic case begins with the Stoic thinkers of Greek and Roman philsophy and proceed through medieval natural law and early modern natural rights, culminating in the Atlantic revolutions of America and France, with their Declaration of

Independence of 1776 and Declaration of the Rights of Man and Citizen of 1789.4

Evidencia-se, assim, que a origem da noção de direitos humanos remonta à Grécia

antiga, no âmbito da gênese da escola do Direito Natural.

Segundo a concepção de Aristóteles, como explanado por Comparato (2008), as leis

que não representavam as particularidades de cada povo, não tendo sido por estes

promulgadas, eram chamadas “leis comuns”. Estas leis seriam, em tese, reconhecidas

universalmente pelo senso comum, não tendo sido elaboradas por ninguém em específico.

Nelas estariam inseridos os direitos básicos da humanidade.

Assim, na sociedade grega, estas leis comuns, oriundas no Direito Natural, imbuíam-se

de caráter divino, posto que emanavam dos próprios deuses, mestres do universo e criadores

da humanidade. Este caráter celestial das leis naturais se vê bem ilustrado na passagem da

obra de Sófocles (2005, pp. 30-31), Antígona:

CREONTE

(Ao guarda) Podes ir para onde quiseres, livre da acusação que pesava sobre ti! (A Antígona) Fala, agora, por tua vez; mas fala sem demora! Sabias que, por uma proclamação, eu havia proibido o que fizeste?

ANTÍGONA

Sim, eu sabia! Por acaso poderia ignorar, se era uma coisa pública?

CREONTE

E apesar disso, tiveste a audácia de desobedecer a essa determinação?

ANTÍGONA

4 O caso clássico se inicia com os pensadores estóicos das filosofias grega e romana e prossegue pelo direito

natural medieval e início do direito natural moderno, culminando com as revoluções atlânticas da América e da França, com suas Declaração de Independência de 1776 e Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. (tradução livre)

7

Sim, porque não foi Júpiter que a promulgou; e a Justiça, a deusa que habita com as divindades subterrâneas, jamais estabeleceu tal decreto entre os humanos; nem eu creio que teu édito tenha força bastante para conferir a um mortal o poder de infringir as leis divinas, que nunca foram escritas, mas são irrevogáveis; não existem a partir de ontem ou de hoje; são eternas, sim! E ninguém sabe desde quando vigoram!

Tais decretos, eu, que não temo o poder de homem algum, posso violar sem que por isso me venham a punir os deuses! [...]

Conforme se observa, nesta passagem apontada, Antígona era acusada por Creonte, a

despeito de seu decreto proibitivo, de ter enterrado seu irmão Polinice. Antígona, por sua vez,

afirma que desrespeitou o decreto pois era lei humana, posta, sendo que, em oposição, a lei

que determinava o funeral dos mortos era uma lei divina, natural, não escrita por ninguém,

imemorial, irrevogável e superior.

Mais tarde a sociedade romana reconheceu esta mesma concepção de Direito Natural,

internalizando-a em seu próprio ordenamento sob a denominação de ius gentium, o “direito

das gentes”. Uma vez livradas tais leis não escritas de seu caráter religioso ou divino (outrora

nestas imbuído, sobretudo quando de seu “advento” na sociedade grega, como exposto

anteriormente), concluíram os filósofos da época que sua origem não poderia ser outra, senão

a própria natureza humana (COMPARATO, 2008).

Nos ditames de Bobbio (2008), em princípio, os Direitos Humanos, que se

encontravam prescritos em tais normas naturais, seriam poucos e básicos, tais como o direito à

vida, à sobrevivência e à propriedade. Entretanto, destaca-se que a proteção a estes direitos

era precária, e diferia de acordo com a origem, nível social e, até mesmo, sexo do indivíduo

objeto destes.

Após a queda do Império Romano do Ocidente, em 453 d.C., surge o sistema feudal.

Iniciou-se a Alta Idade Média, que perdurou por aproximadamente quinhentos anos, tendo

sido este um período marcado por violações aos ditos direitos naturais do ser humano por

parte das cortes reinantes, tendo em vista que vigia o sistema absolutista o qual, por sua

própria natureza, garantia total e absoluto poder ao governante, podendo este agir livremente

de acordo com sua discricionariedade.

No período que se seguiu, a Baixa Idade Média, o sistema feudal iniciou seu declínio.

Surge então, mais precisamente no dia 21 de junho de 1215, o primeiro instrumento de

proteção aos direitos inerentes ao ser humano, muito embora, nesta época, sua aplicação se

8

restringisse a um pequeno conjunto de nobres ingleses, vassalos de Sua Majestade, o Rei João

Sem-Terra.

A Magna Carta, promulgada por este rei da Inglaterra é, inclusive, a base da atual

Constituição inglesa e, por conseqüência, de todo o constitucionalismo que veio a se

desenvolver nos sistemas jurídicos contemporâneos (FERREIRA FILHO, 1999, p. 11).

Embora este documento limitasse o alcance de sua proteção a seleto recorte da

soeciedade inglesa, ela consistia no primeiro mecanismo de controle do poder real,

representando um forte golpe ao absolutismo irrefreado. Note-se, destacadamente, o conteúdo

do art. 39 do referido texto:

39. No freemen shall be taken or imprisoned or disseised or exiled or in any way destroyed, nor will we go upon him nor send upon him, except by the lawful

judgment of his peers or by the law of the land.5

O artigo destacado demonstra, com clareza, a limitação ao poder punitivo do Rei,

determinando que todo inglês livre fosse julgado por seus iguais e pela Law of the Land, a Lei

da Terra, direito este imemorial da tradição legal da Inglaterra.

Ainda no contexto inglês, após a Magna Carta surgiram, ainda, a Petition of Rights, de

1628, a qual, dentre diversas disposições, apresentava a insatisfação do povo frente à

tributação excessiva imposta pela monarquia e às privações arbitrárias de liberdade

(FERREIRA FILHO, 1999; LEWIS, 2003, apud FLORES, 2012); e a Lei do Habeas Corpus,

de 1679, a qual tornou norma posta, garantindo-lhe maior efetividade, um instituto que já

existia na tradição jurídica da Inglaterra, o qual visava à proteção da liberdade pessoal frente

às prisões ilegais (MIRANDA, 2007).

A Bill of Rights, de 1689, foi o próximo instituto criado no contexto britânico, sendo

este o mais completo sistema de proteção aos direitos inerentes ao ser humano até então

escrito. Ela institui a tripartição de poderes entre Executivo, Legislativo e Judiciário,

impedindo que a monarquia interferisse abusivamente nas determinações do parlamento

(FERREIRA FILHO, 1999; SCHWARTZ, 1979, apud FLORES, 2012). Ademais, propugnou

5 Nenhum homem livre deverá ser aprisionado ou privado de suas terras ou exilado ou de qualquer modo

destruído, nem iremos avançar sobre ele ou mandar avançarem sobre ele, exceto por julgamento legítimo por seus iguais ou pela Law of the Land. (tradução livre)

9

a proibição da imposição de penas cruéis ou desumanas aos condenados pela justiça e pelo

julgamento pelo Tribunal do Júri (COMPARATO, 2008).

Durante o século que se seguiu, o mundo passou por diversas tranformações,

sobretudo no âmbito intelectual europeu, com a ascenção e afirmação do pensamento

iluminista francês e do liberalismo inglês, os quais defendiam a limitação do poder real pelas

determinações legais, oferecendo maior segurança jurídica aos súditos. Segundo as idéias

destas correntes filosóficas, não era mais o tempo do império do Rei, mas sim do império da

Lei.

Neste contexto da ascenção do iluminismo na Europa, mais precisamente no ano de

1776, ocorria, do outro lado do oceano, a Independência das Treze Colônias inglesas na

América do Norte, onde foi proclamada a Declaração de Direitos da Virgínia

(COMPARATO, 2008).

Esta declaração foi absolutamente inovadora ao declarar, em seu art. 1º, que todos os

homens, indistintamente, seriam iguais em liberdade e independência. Nenhuma outra carta de

direitos, ou qualquer lei anteriormente escrita sobre o tema, jamais havia proclamado tal nível

de igualdade entre indivíduos.

Ademais, apresentou outros dois ineditismos: a liberdade de imprensa, anunciada no

art. 12, e a liberdade religiosa, inserida no art. 16 (LEITE, 2009, p. 336). Dentre outros

direitos também nela contidos, encontram-se os direitos à vida e à felicidade (MONDAINI,

2006, apud FLORES, 2012). Entretanto, esta declaração restringia seu alcance aos

americanos, tal qual as leis inglesas anteriormente expostas somente atingiam aos britânicos.

A primeira carta de direitos cuja proclamação não se restringia exclusivamente aos

nacionais ou cidadãos de determinado Estado surgiu na França, em 1789 (HERKENHOFF,

1999, apud FLORES, 2012). A Declaração de Direitos do Homem6 e do Cidadão

7, com seus

ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, originados das idéias iluministas, fator

determinante da derrocada do absolutismo francês e a ascensão do Estado Liberal

(MAGALHÃES, 2000, apud FLORES, 2012).

6 Homem, aqui, na acepção restritiva da palavra, indicando indivíduo do sexo masculino. A igualdade total de direitos das mulheres só viria mais tarde na história.

7 Em 1791, foi elaborada também a Declaração de Direitos da Mulher e da Cidadã, por Olympe de Gouges, posto que entendeu que a declaração de 1789 esquecera-se das mulheres em sua luta pela igualdade de direitos (CASTRO, 2007). O projeto foi apresentado à Assembléia Nacional Francesa, tendo sido rejeitado. Dois anos mais tarde, foi morta a tiros em Paris, por conta de suas idéias.

10

A DUDHC determina, tal como ocorre na Declaração de Direitos da Virgínia, que

todos os homens nascem iguais em liberdades. Entretanto, enquanto a Declaração da Virgínia

restringia esse entendimento aos seus nacionais, a DUDHC, como já afirmado, acabou por

estender o alcance de tal afirmação a todos os homens, e não somente aos franceses. Entre as

demais disposições, a DUDHC afirma, também, que o homem possui certos direitos naturais e

imprescritíveis, tais como a propriedade e a segurança (OLIVEIRA, 2000).

Entretanto, embora a DUDHC tivesse esta dimensão universalista de garantia de

direitos do homem, ela, como afirma seu próprio nome, também definia direitos para o

cidadão e, nesse âmbito, garantia direitos exclusivamente para o citoyen, o cidadão francês

(LEBRETON, 2001; VASAK, 1980, apud FLORES, 2012). Este documento, conforme nos

explica Comparato (2008), foi utilizado como documento-base para a elaboração de todas as

constituições francesas até 1830. O autor também destaca que, na constituição francesa de

17918, surgem os primeiros esboços dos direitos sociais.

Neste mesmo contexto histórico, salienta-se que, enquanto na Europa e, até mesmo,

nas Américas, já se vislumbrava uma certa evolução no respeito aos Direitos Humanos, na

África estes ainda não encontravam qualquer respaldo. Tal fato se deve ao neocolonialismo

europeu sobre aquela região, o qual cometia atrocidades imensuráveis, dividindo territórios

entre os países colonizadores de acordo com sua própria conveniência, e não a das populações

locais9; abusando da mão-de-obra ali existente, sem contudo fornecer-lhes tratamento digno,

fosse no trabalho, fosse em termos de condições de vida junto à sociedade10

.

Foi somente em 1864 que surgiu o primeiro documento de caráter e alcance

verdadeiramente internacionais acerca de direitos humanos: a Convenção de Genebra.

Esta Convenção teve por escopo diminuir os danos gerados por um conflito bélico,

fosse no tocante aos soldados que dele participava, fosse no tocante aos civis que pudessem

ser afetados por este. Ressalta-se que a Cruz Vermelha foi criada por esta mesma Convenção,

com a finalidade de ser o órgão neutro que se atentaria ao cuidado dos atingidos pela guerra.

8 Cujo preâmbulo é a própria DUDHC.

9 Em verdade, muitas tribos historicamente inimigas foram reunidas em determinada parcela de território, o qual deveriam partilhar sob o comando das potências neocolonialistas européias. Isto, no futuro, viria a gerar notáveis conflitos, como a Guerra Civil Etíope (que culminou com a independência da Eritréia), e a Guerra Civil de Ruanda (famosa disputa entre a população dominante de Hutus e as minorias Tutsis, que matou milhões de indivíduos no final do século XX).

10 Atente-se para o mais famoso exemplo de política segregacionista do mundo, o Apartheid, instituído na África do sul pela população branca, os boers.

11

De acordo com Comparato (2008), este foi o marco inaugural do chamado Direito

Humanitário.

O Direito Humanitário, como já indicado, e de acordo com o pensamento de Piovesan

(2005), foi o primeiro marco relevante no processo de internacionalização dos Direitos

Humanos. Na definição de Buergenthal, destacada pela autora, o Direito Humanitário

constitui o componente de direitos humanos na lei da guerra, o qual busca fixar limites à

atuação estatal em conflitos bélicos, primando pela supremacia do respeito aos Direitos

Humanos. Esta foi a primeira afirmação de caráter internacional em termos de limitação das

liberdades e autonomias dos Estados.

Vale destacar que a Convenção de Genebra de 1864 tratava, exclusivamente, de

combatentes e civis atingidos por conflitos bélicos terrestres. As determinações foram

estendidas, posteriormente, a conflitos marítimos (1906) e a prisioneiros de guerra, o que

ocorreu com o final da I Guerra Mundial, em 192911

.

Em 1917 surge, pela primeira vez na história, uma Constituição verdadeiramente

pautada pela preocupação com os problemas sociais. Tratava-se da Constituição Mexicana,

surgida da Revolução Mexicana de 1910, a qual foi pioneira, dentre outras disposições, de

acordo com Oliveira (2000), em vetar a reeleição presidencial, garantir a reforma agrária e

elencar garantias de ordem trabalhista e previdenciária. Destaca Magalhães (2000, apud FLORES, 2012) que é notável que se tenham reconhecido tais direitos no México já em 1917,

pois na Europa ocidental e nos EUA tais direitos só vieram a ser reconhecidos finda a I

Guerra Mundial.

Concomitantemente ocorria a Revolução Russa, a qual findou o sistema czarista, ainda

absolutista, e instaurou um governo popular (HERKENHOFF, 1994, apud FLORES, 2012).

No ano seguinte, este governo proclamou a Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e

Explorado a qual, tal como a Constituição Mexicana, também se dedicava à proteção de

direitos sociais (OLIVEIRA, 2000).

Com o final da I Guerra Mundial, em 1919, é criada na Alemanha a Constituição de

Weimar, a primeira nesta parte do mundo a preocupar-se com a proteção aos direitos sociais

11

A versão atual da Convenção de Genebra data de 1949, acrescendo a proteção aos civis em tempo de guerra. Foi, ainda, até a presente data, acrescida de três protocolos, dois datando de 1977 e um datando de 2005.

12

inerentes ao ser humano. Também foi o primeiro dispositivo a garantir a educação pública

(COMPARATO, 2008).

Ainda em 1919, também no âmbito da Europa ocidental, é criada a Liga das Nações12

,

sendo esta a precursora da atual ONU. Nas palavras da ilustre professora Flávia Piovesan

(2005, apud FLORES, 2012), a função deste órgão era a de “promover a cooperação e

segurança internacional, condenando agressões externas contra a integridade territorial e

independência política dos seus membros”. Ademais, a Liga das Nações é, segundo a

professora, o segundo importante marco no processo de internacionalização dos Direitos

Humanos. Esta posição é corroborada por Bowett (1982, apud FLORES, 2012).

Além de suas principais funções, já descritas, ressalta Magalhães (2000, apud

FLORES, 2012) que a Liga das Nações também trazia disposições sobre Direito do Trabalho,

gerando assim certo nível de compromisso internacional por parte dos Estados, no tocante ao

respeito e preservação dos direitos do ser humano (PIOVESAN, 2005, apud FLORES, 2012).

Entretanto, em relação especificamente às proteções relativas à dignidade mínima no

ambiente de trabalho, foi criada, também no início da década de 20 do século passado, a OIT,

sendo este, de acordo com Piovesan (2005, pp. 112-113), o terceiro marco de relevância na

internacionalização dos Direitos Humanos, expondo:

Vale dizer, o advento da Organização Internacional do Trabalho, da Liga das Nações e do Direito humanitário registra o fim de uma época em que o Direito Internacional era, salvo raras exceções, confinado a regular relações entre Estados, no âmbito estritamente governamental. [...] Tais institutos rompem, assim, com o conceito tradicional que situava o Direito Internacional apenas como a lei da comunidade internacional dos Estados e que sustentava ser o Estado o único sujeito de Direito Internacional.

Contudo, em meio a esta aceleração na evolução da proteção destes direitos, ocorrida

entre o final do sec. XIX e início do sec. XX, inclusive por parte dos Estados nacionais,

eclode a II Guerra Mundial, a qual promoveu uma série de graves violações a determinados

direitos que, de certa forma, já se encontravam em processo de consolidação. Relata Piovesan

(2005, apud FLORES, 2012) que somente o nazismo enviou, aproximadamente, 18 milhões

12

Também chamada, por alguns, de Sociedade das Nações.

13

de indivíduos aos campos de concentração, grupo este composto por judeus, ciganos,

comunistas e homossexuais; e destes, 11 milhões não sobreviveram à guerra.

Quanto à época da II Guerra Mundial, merecem destaque os relatos da celebrada

autora Hannah Arendt, a qual, em sua obra-prima As Origens do Totalitarismo (1989),

descreve com vivacidade e ênfase as atrocidades às quais o povo judeu era submetido na

Alemanha nazista.

Ao fim da II Guerra Mundial, com a queda dos regimes totalitários, a Europa

encontrava-se parcialmente destruída, tanto em sua dimensão estrutural quanto populacional.

À sombra de tal barbárie surge uma nova iniciativa por parte dos Estados para a promoção da

paz e preservação dos direitos humanos. É elaborada, então, em 1945, a Carta das Nações

Unidas (FERREIRA FILHO, 2011; COMPARATO, 2008; PIOVESAN, 2005; OLIVEIRA,

2000, apud FLORES, 2012), instituindo-se a organização que, até hoje, representa a proteção

dos direitos humanos em nível global.

Em 1948, a Assembléia Geral da recém-instituída ONU elaborou, em um marco

histórico, a Declaração Universal dos Direitos Humanos. Aqui, os Direitos Humanos,

propriamente ditos, finalmente adquirem, de modo definitivo, os caracteres de indivisibilidade

e universalidade (OLIVEIRA, 2000; HERKENHOFF, 1994, apud FLORES, 2012), e também

vieram reafirmados os direitos já prescritos pela Carta das Nações Unidas, tais como a

proteção das liberdades individuais e a responsabilidades do Estado perante o indivíduo

(MORAES, 2011, apud FLORES, 2012). Como destaca Bobbio (2008, apud CAMPOS,

2002): “[...] pelo menos, serão os direitos do cidadão daquela cidade que não tem fronteiras,

porque compreende toda a humanidade; ou, em outras palavras, serão os direitos do homem

enquanto cidadão do mundo.”

Nasce, aí, o chamado Direito Internacional dos Direitos Humanos. Nas palavras de

Rezek (2000, p. 225): “até a fundação das Nações Unidas, em 1945, não era seguro afirmar

que houvesse, em direito internacional público, preocupação consciente e organizada sobre o

tema dos direitos humanos”.

Válido ressaltar, aqui, que é no âmbito da DUDH que, finalmente, o direito à

nacionalidade ascende, mais precisamente em seu art. 15, à condição de direito humano.

14

A partir da DUDH, o cenário internacional de proteção aos direitos humanos foi

ganhando força, através das proclamações de convenções internacionais de proteção a

Direitos Humanos específicos. Destacam-se, aqui, o Pacto Internacional dos Direitos

Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e

Políticos (PIDCP), ambos de 1966 (REZEK, 2000), os quais, juntamente com a DUDH,

formam a chamada Carta de Direitos Humanos da ONU (OLIVEIRA, 2000).

Desde então, diversas convenções vêm sendo firmadas no sentido de garantir direitos

humanos nas mais diversas esferas, tanto no sistema global (âmbito da ONU) quanto dentro

dos sistemas regionais, posteriormente instituídos (sistema americano, sistema africano e

sistema europeu).

A partir daqui, o foco desde estudo volta-se à análise do direito à nacionalidade.

1.1.2. Acepções doutrinárias

A nacionalidade, enquanto conceito, pode ser apresentada tanto sob um ponto de vista

sociológico quanto sob um ponto de vista puramente jurídico (SANTOS, 2005).

Sob um ponto de vista mais sociológico encontramos o posicionamento de Silva

(2007, apud SANTOS, 2005):

Nacionais seriam todos que nascem num ambiente cultural, geralmente expressos numa língua comum, atualizado num idêntico conceito de vida e dinamizado pelas mesmas aspirações de futuro e ideais coletivos.

Observa-se que, para Silva, o conceito de nacionalidade nasce da relação cultural entre

um indivíduo e seu povo de origem, a qual ocorre, em teoria, independentemente as

determinações de um Estado juridicamente constituído.

15

Em orientação semelhante, posiciona-se Mello (2000, apud FLORES, 2012): “nacionalidade corresponde ao conjunto de indivíduos que possuem a mesma língua, raça,

religião e possuem um querer viver em comum13

”.

Complementarmente, afirma Campos (2002, p. 69), a nacionalidade sob a égide da

sociologia seria o pertencimento a uma Nação, uma entidade humana coletiva, e não a um

Estado, organização político-jurídica.

Entretanto, como nos elucida Flores (2012), este posicionamento, que se ancora em

fatores como raça ou religião para a definição de uma nacionalidade, é amplamente

desaconselhado pela doutrina, inclusive por autores como Tenório (1962), Del’Olmo (2009), Dolinger (2008) e Mello (1970).

Por outro viés, grande parte da doutrina referencia o conceito de nacionalidade sob um

olhar mais jurídico. Observem-se alguns exemplos.

De acordo com Pontes de Miranda (1935, apud SANTOS, 2005): “nacionalidade é o

vínculo jurídico-político de Direito Público interno, que faz da pessoa um dos elementos

componentes da dimensão pessoal do Estado”. Posicionamento este adotado por Batiffol

(1949, apud FLORES, 2012) e Carvalho (1950, apud FLORES, 2012).

Ainda, elucida Rezek (2000, p. 178):

Nacionalidade é o vinculo político entre Estado soberano e o indivíduo, que faz deste um membro da comunidade constitutiva da dimensão pessoal do Estado. Importante, portanto no direito das gentes, esse vínculo político recebe, entretanto uma disciplina jurídica de direito interno (...).

Em sentido semelhante, expõe Moraes (2002, apud SANTOS, 2005): “nacionalidade é

o vínculo jurídico-político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo

deste indivíduo um componente do povo, da dimensão pessoal deste Estado”.

Sob o mesmo viés, posiciona-se Del’Olmo (2009, apud FLORES, 2012): “trata-se de

vínculo jurídico-político, social e moral que segue princípios instituídos pelo Estado, mas

admitidos pelo Direito Internacional.”

13

Grifo no original.

16

É, ainda, a definição fornecida, acerca do conceito de nacionalidade, pela Corte

Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em sentença de julgamento prolatada em 1999

(ACNUR, 2005, p. 9): “elo político e jurídico que vincula uma pessoa com um determinado Estado, que a compromete para com este com laços de lealdade e fidelidade e que lhe confere

o direito à proteção diplomática daquele Estado”.

Conclui-se, portanto, que a imensa maioria da doutrina é consonante no sentido de

conceituar nacionalidade como sendo um elo jurídico entre indivíduo e um Estado, admitido

no Direito Internacional, sendo este vínculo um gerador de diversos direitos e obrigações

frente ao Estado em questão.

1.2. A nacionalidade enquanto direito humano

Já na condição de direito humano posto, a nacionalidade, reitera-se, surgiu em 1948,

com a DUDH, mais precisamente em seu art. 15. Ainda, como afirmado pelo ministro

Warren, da Suprema Corte Americana, em voto prolatado no ano de 1958 (SALIBA, 2010, p. 41), ela se constituiria no “direito humano básico, pois é o direito a ter direitos”.

Entretanto, como todo direito humano, ela é fruto de uma evolução histórica, sendo

que as origens do instituto da nacionalidade, como também já exposto, remontam à

Antiguidade Clássica, mais precisamente a determinadas cidades-estado da Grécia, como, por

exemplo, Atenas.

De fato, neste ponto, faz-se necessária uma diferenciação entre dois institutos

comumente confundidos: a nacionalidade e a cidadania.

Nestas sociedades o advento das instituições jurídico-sociais da época se deu como um

reflexo de seus costumes e tradições. As sociedades grega e romana foram, de fato, não só as

primeiras sociedades onde foi reconhecido o conceito de nacionalidade, mas também as

primeiras sociedades humanas das quais se possui registro histórico de uma real distinção

entre os conceitos de nacionalidade e cidadania.

Na cidade-estado de Atenas, de fato, era considerado como sendo cidadão todo aquele

indivíduo que tivesse uma opinião válida nas decisões tomadas acerca das temáticas tocantes

17

ao governo e direcionamento da polis. Esse grupo, portador de direitos políticos, era

extremamente reduzido, excluindo, por exemplo, mulheres e escravos. Assim sendo, eram

cidadãos apenas os homens livres nascidos naquela localidade.

Aqui, cabe destacar a explanação de Fustel de Coulanges (1998, p. 155):

Se quisermos definir os cidadãos dos tempos antigos por seu atributo mais essencial, é necessário dizer-se que cidadão é o homem que observa a religião da cidade. É o que honra os mesmos deuses da cidade. É aquele para o qual o arconte ou o prítane oferece o sacrifício de cada dia, que tem o direito de se aproximar dos altares, que pode penetrar no recinto sagrado em que se realizam as assembléias, que assiste às festas, que acompanha as procissões e participa dos panegíricos, que se assenta nos banquetes sagrados, e recebe a parte que lhe cabe das vítimas. Assim esse homem, no dia em que foi inscrito no registro dos cidadãos, jurou que renderia culto aos deuses da cidade, e que combateria para defendê-los. Eis os termos usados: ser admitido entre os cidadãos dizia-se em grego pelas palavras meteínai tõn hierõn: entrar na partilha das coisas sagradas.

Contudo, mulheres e escravos nascidos na polis ateniense não deixavam de ser

membros de tal sociedade. Carregavam sua mesma herança cultural, cultuavam os mesmos

deuses e perpetuavam seu próprio legado. Com efeito, não deixavam de ser nacionais de

determinado local, embora não possuíssem plenitude de direitos, como os cidadãos.

Em Esparta, por sua vez, a sociedade era dividida, basicamente, em três degraus:

esparciatas, períoikoi e heílotes. Destes, embora todos fossem nacionais, apenas os esparciatas

possuíam cidadania. Nesse sentido, expõe Godoy (1999, p. 310):

A cidade era dominada pelos espartanos, detentores dos direitos de cidadania, que governavam a pólis autorizados por Licurgo (o legislador lendário). Os espartanos descendiam dos primeiros conquistadores. Dedicavam-se aos negócios do Estado e eram impedidos de comerciar. O nascimento era o critério que identificava a nacionalidade e que firmava a cidadania: cidadão era o descendente do cidadão, linha ascendente que remontava aos privilégios da conquista originária. Os periecos (períoikoi) eram livres, praticavam atividades de indústria e comércio, mas não eram cidadãos; não descendiam dos primeiros conquistadores. Eram livres, porém submissos. Os hilotas (heílotes) eram donos de situação jurídica similar à do escravo. Presos à terra, não detinham nenhum direito político.

A sociedade romana antiga não muito se diferenciava das cidades-estado gregas, neste

contexto.

18

Roma, na antiguidade, era dividida, basicamente, em três castas sociais: patrícios (os

quais descendiam do grupo fundador de Roma), plebeus (os quais descendiam de

estrangeiros) e escravos. Destes grupos, apenas os patrícios possuíam cidadania, ou seja, o

real direito do exercício de todos os direitos civis, políticos e, até mesmo, religiosos

(BERNARDES, 1995).

Essa condição perdurou, restando inalterada até a elaboração da Lei das Doze Tábuas,

a qual estendeu aos plebeus uma determinada parcela de direitos.

Contudo, tal como ocorria no contexto ateniense, mesmo aqueles que não eram

considerados cidadãos romanos, e desta feita não usufruíam de todos os direitos, eram

considerados nacionais, desde que nascidos dentro dos territórios de Roma.

Ora, é de se pensar que, tendo em vista o fato de a distinção entre nacionalidade e

cidadania ter surgido em momento tão distante na história do direito, esta teria apenas

evoluído até os dias de hoje, tornando-se cada vez mais definida. Esta, porém, não é uma

afirmação da verdade absoluta, haja vista que permeada por diversos retrocessos.

É fato que, atualmente, a maior parte das nações no mundo reconhece ao menos

alguma forma de distinção entre os conceitos de nacionalidade e cidadania. Contudo, existem

sociedades que, ainda hoje, não admitem a existência de diferenças entre os referidos

institutos.

Com efeito, tal inexistência de distinção pode ser verificada, em alguns casos, até

mesmo na estrutura idiomática de certos grupos. Um claro exemplo é o caso da Finlândia,

onde a palavra kansalaisuus pode ser traduzida tanto como “nacionalidade” quanto como

“cidadania” (LINTINEN; PANNUNZIO-LINTINEN, 2010).

É fato que a Finlândia não sofreu uma influência direta da tradição greco-romana, ou

até mesmo romano-germânica, no âmbito do direito, até uma época relativamente recente

(contexto da primeira dominação de uma Suécia cristã sobre o país, durante o século XIII) e,

possivelmente, este é um dos grandes fatores pelos quais não há real diferenciação destes dois

conceitos neste grupo em específico.

Entretanto, como já dito, para outros regramentos jurídicos, de diversas nações no

mundo (inclusive para o direito brasileiro) existe uma separação entre estes conceitos tão

comumente confundidos.

19

Nos ditames de José Afonso da Silva (2007, p. 319), nos é brilhantemente explanada a

distinção existente no ordenamento pátrio entre estas duas instituições de direito:

No Direito Constitucional brasileiro vigente, os termos nacionalidade e cidadania, ou nacional e cidadão, têm sentido distinto. Nacional é o brasileiro nato ou naturalizado, ou seja, aquele que se vincula, por nascimento ou naturalização, ao território brasileiro. Cidadão qualifica o nacional no gozo dos direitos políticos e os participantes da vida do Estado (arts. 1º, II, e 14). Surgem, assim, três situações distintas: a do nacional (ou da nacionalidade), que pode ser nato ou naturalizado; a do cidadão (ou da cidadania) e a do estrangeiro, as quais envolvem, também, condições jurídicas distintas.

Ademais, completa Ituassú (1986, apud SANTOS, 2005):

Enquanto a nacionalidade é o vínculo, a cidadania é a qualidade do indivíduo para, na forma do direito interno e atendida as exigências estabelecidas, ter o uso e gozo dos direitos políticos, cuja infração sujeita a sua perda, sem [contudo] excluir o laço nacional.

Dolinger (2008, apud FLORES, 2012) explica, ainda, que a cidadania representa

conteúdo adicional à nacionalidade, imbuída de caráter político, possibilitando ao indivíduo o

exercício de determinados direitos como, por exemplo, o sufrágio.

Há, ainda assim, certa divergência doutrinária acerca do tema no Brasil, como é

possível verificar da explanação de Marinho (1950, apud FLORES, 2012):

Portanto, nacionalidade e cidadania são a mesma coisa e têm a mesma significação gramatical, jurídica e política. Aquele que, por naturalização, adquire a cidadania num Estado, não obtém apenas a “subordinação legal”, mas, sim, a condição de nacional desse Estado. Urge combater, com energia, a orientação oposta, porquanto ela instila a confusão e abre, entre nacionais e cidadãos do mesmo Estado, num abismo que se não justifica.

Em sentido semelhante, Ballarino (2002, apud POZZATTI JUNIOR, 2009) se

posiciona que nacionalidade seria sinônimo de cidadania, sendo que tratar-se-ia do vínculo de

pertencimento entre indivíduo e seu Estado. Em consonância, posiciona-se a ACNUR (2005,

20

p. 4), defendendo que, para o direito internacional, nacionalidade e cidadania seriam conceitos

indistintos, consistindo no “direito a ter direitos” já anteriormente referenciado.

Este é, contudo, posicionamento minoritário na doutrina pátria, tanto na área

constitucionalista quanto internacionalista. Nesse sentido, Mazzuoli (2011, apud FLORES,

2012) e Lenza (2010, apud FLORES, 2012), respectivamente:

Pode-se considerar a nacionalidade como sendo o elo jurídico-político que liga o indivíduo a determinado Estado e a cidadania como a condição de exercício dos direitos constitucionalmente assegurados [...]. A cidadania, assim considerada, consiste na consciência de participação dos indivíduos na vida da sociedade e nos negócios que envolvem o âmbito do seu Estado[...].

Nacionalidade é o vínculo jurídico-político que liga um indivíduo a determinado Estado, fazendo com que esse indivíduo passa a integrar o povo desse Estado e, por conseqüência, desfrute de direitos e submeta-se a obrigações. [...] Cidadania tem por pressuposto a nacionalidade (que é mais ampla que a cidadania), caracterizando-se como a titularidade de direitos políticos de votar e ser votado. O cidadão, portanto, nada mais é do que o nacional que goza de direitos políticos.

Idêntica posição a adotada por Nogueira (2009), o qual comclui que, para o direito

brasileiro, a cidadania é uma decorrência da nacionalidade, no aspecto em que um indivíduo

só poderá exercer a cidadania, no Brasil, sob a condição de ser nacional.

A nacionalidade se faz essencial à condição humana na atualidade, visto tratar-se de

condição essencial à fruição dos direitos garantidos por um Estado; com efeito, nas palavras

de Pagliarini (2012, p. 3), “nacional de um Estado é quem a este está ligado por uma

vinculação jurídica que se chama nacionalidade; por esta razão, quem não for nacional será

estrangeiro”.

O estrangeiro é termo que naturalmente denota certa discriminação. Nos ditames do

autor supracitado, consiste em “Alienígena. O outro. Indivíduo de nacionalidade diversa

daquela do Estado em que se encontra ou vive. Coisa vinda do exterior ou de Estado nacional

distinto daquele em que ela se encontra. Forasteiro, exógeno”.

De fato, o autor traz, em sua obra, o exemplo da Bíblia Sagrada, a qual indica, em

diversos trechos, que o estrangeiro seria, além de alienígena, aquele que não aceitava o Deus

de Israel. Estas passagens denotam a clássica percepção negativista do estrangeiro a qual,

como já apontado, foi reforçada ao final do século XIX.

21

Ao apátrida, contudo, sublinha Pagliarini (2013, p. 4), “as eventuais terras que os

acolhem os tratam de um modo pior que o dedicado aos estrangeiros”. Assim, resta atestada a

situação de extrema hipossuficiência reservada a estes indivíduos, objetos do presente estudo.

Cabe destacar o que é dito por Oppenheim (1911, apud DOLIDZE, 2011): “the rules

of international law relating to diplomatic protection are based on the view that nationality is

the essential condition for securing to the individual the protection of his rights in their

international sphere”14

. Assim, torna-se imprescindível que a anacionalidade seja suprida

para que os indivíduos desfrutem de mínimas condições de dignidade.

1.2.1. Nacionalidade originária e derivada

Verificada a necessidade de aferição de nacionalidade a todos os indivíduos, cabe

analisar os modos pelos quais a nacionalidade pode ser conferida.

Como citado por Silva (2007), há duas espécies de nacional reconhecidas pelo

ordenamento jurídico brasileiro: o nato e o naturalizado.

Esta é, também, uma distinção muito comum no direito de diversos povos na

atualidade. Na medida em que as migrações se tornam cada vez mais comuns, para que um

indivíduo possa usufruir de seus direitos em sua plenitude na nova área que venha,

porventura, a habitar, deve haver a possibilidade de adquirir a nacionalidade de tal localidade.

A naturalização, ou nacionalidade derivada, pode ser conceituada, segundo Tenório

(1962, apud FLORES, 2012), como “todas as formas que estabelecem os atos aquisitivos de

uma nacionalidade não originária”. De fato, como esclarece Lenza (2010, apud FLORES,

2012), são derivadas todas as formas de aquisição de nacionalidade que não derivem de

critérios de territorialidade ou sangue (como serão expostos, a seguir).

Cabe diferenciar os conceitos de naturalização e mudança de nacionalidade. Enquanto

a primeira representa a aquisição de uma nova nacionalidade, sem que haja a perda daquela

que o indivíduo já possuía, a segunda representa efetiva mudança de nacionalidade do

14

As regras do Direito Internacional relacionadas à proteção diplomática estão baseadas na visão de que a nacionalidade é a condição essencial para assegurar ao indivíduo a proteção de seus direitos em sua esfera internacional (tradução livre).

22

indivíduo, o qual perde aquela(s) que ora possuísse em prol da aquisição de nova

nacionalidade (DOLINGER, 2008; DEL’OLMO, 2009; MAZZUOLI, 2011, apud FLORES,

2012).

Há diversos modos de aquisição da nacionalidade derivada (naturalização), variando

de acordo com o ordenamento jurídico local. Países como, por exemplo, a Alemanha,

Finlândia, Holanda e Peru admitem a naturalização por casamento, o jus matrimonii15

ou jus

conubii16

. Há, também, países como o Haiti, Panamá e Rússia, que admitem a naturalização

com uso do critério de jus laboris, ou seja, local da atividade profissional do indivíduo

(VALÉRIO, 2012). Existe, ainda, o jus domicilli, pelo qual atribui-se nacionalidade àquele

indivíduo que habite determinado local com animus de permanecer, por tempo incerto. É o

critério predominante de atribuição de nacionalidade no Vaticano (SILVA, 2008, apud FLORES, 2012).

Note-se que o jus domicilli é um critério considerado prioritário pelo Direito

Internacional na concessão de nacionalidade ao apátrida, em respeito ao direito fundamental à

nacionalidade, tal como definido no art. 15 da Declaração Universal dos Direitos Humanos

(MELLO, 2004, apud MOTA, 2002).

Vale ressaltar o caso peculiar de Israel, que admite a naturalização pelo critério do

simples retorno do imigrante judeu ao país (VALÉRIO, 2002). Este último merece destaque

visto tratar-se de critério único no mundo em termos de naturalização. Nos termos da Lei de

Retorno, de 1950:

1. Every Jew has the right to come to this country as an oleh(1)

.

2. (a) Aliyah shall be by oleh's visa.

(b) An oleh's visa shall be granted to every Jew who has expressed his desire to settle in Israel, unless the Minister of Immigration is satisfied that the applicant

a. (1) is engaged in an activity directed against the Jewish people; or

15 A alteração/perda de nacionalidade via casamento foi alvo de diversas críticas, visto ter gerado inúmeros casos de apatridia entre mulheres (caso o país do marido não admitisse a naturalização via jus conubii), sobretudo até 1930, com o advento da Convenção de Haia Sobre a Nacionalidade a qual, embora não tenha sanado a questão por completo, traz em seu texto uma disposição declarando que a mulher só poderia perder a nacionalidade que possuísse caso adquirisse a do marido (IRVING, 2012).

16 Cabe destacar que, de acordo com Twomey (1994, apud CAMPOS, 2002), tanto o jus matrimonii quanto a aquisição de nacionalidade por adoção integrariam o chamado jus communicatio, tratando-se de espécie de aquisição originária de nacionalidade, e não de forma derivada.

23

b. (2) is likely to endanger public health or the security of the State.

(1)

Translator's Note: aliya means immigration of Jews, and oleh (plural: olim) means a Jew immigrating, into Israel.

17

Esta lei, como pode verificar-se, determina que qualquer judeu que retorne a Israel, e

não represente perigo público, é um candidato a receber a nacionalidade israelense.

Esta determinação poderia ser tomada por um ato voluntário de aquisição de outra

nacionalidade, podendo gerar, assim, algum problema frente a determinadas leis de

nacionalidade, inclusive podendo causar a perda da nacionalidade prévia do indivíduo, ao

menos conforme interpretação literal da lei brasileira. Entretanto, conforme noticiado no

jornal Correio da Manhã de 26/07/1957, o STF decidiu em sentido contrário, no caso do

Mandado de Segurança impetrado em 1957 por Anna Adelina Chaitchik, a qual havia

adquirido a nacionalidade israelense nos termos da Lei do Retorno, tendo declarado que não

havia sido expresso o desejo da sra. Chaitchik em abandonar a nacionalidade brasileira,

determinando que esta se conservasse, mesmo frente ao evento da naturalização israelense.

A aquisição de nacionalidade derivada pode, de acordo com o ordenamento jurídico

local, ser facultativa ou impositiva (MARINHO, 1956; DOLINGER, 2008, apud FLORES,

2012). Pode, também, ser naturalizado tanto o indivíduo portador de uma ou mais

nacionalidades originárias, quanto o apátrida. Nesse liame, Del’Olmo (2001, apud FLORES,

2012):

A naturalização consiste na atribuição da nacionalidade de um Estado à pessoa até então detentora da condição de nacional de outro país, ou mesmo sem nacionalidade. É uma concessão que pode ser usada por quem já formou elos afetivos ou geográficos com o Estado ao qual vai unir-se juridicamente.

17

1. Todo judeu possui o direito de vir a este país como um oleh. 2. (a) Aliyah deverá ser pelo visto de oleh. (b)

Um visto de oleh deverá ser garantido a todo Judeu que tenha expressado seu desejo de fixar-se em Israel, a não ser que o Ministério da Imigração esteja certo de que o aplicante: (1) esteja engajado em atividade diretamente contra o povo Judeu ou; (2) tenha probabilidade de representar risco à saúde pública ou à segurança do Estado. Nota do tradutor: Aliyah significa imigração de Judeus, e oleh (plural: olim) significa um Judeu imigrando para Israel (tradução livre).

24

A naturalização poderá ser, ainda, expressa ou tácita (ANDRADE, 1978; TENÓRIO, 1962; MARINHO, 1956; STRENGER, 2000; DEL’OLMO; KAKU; SUSKI, 2011, apud FLORES, 2012).

A naturalização tácita não representa, ao contrário da expressa, ato de vontade do

indivíduo-objeto. Enquanto a naturalização expressa, comumente, é fruto de um processo

jurídico ou administrativo, cabendo ao Estado analisá-lo e concedê-lo ou não, de acordo com

sua discricionariedade (TENÓRIO, 1962; ANDRADE, 1978, apud FLORES, 2012), a

naturalização tácita comumente é fruto de mudanças políticas locais ou na situação pessoal do

indivíduo, como no caso do jus conubii (FLORES, 2012).

No Brasil, os critérios de aquisição da nacionalidade derivada estão definidos entre os

arts. 110 a 123, da Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro), e o art. 12, II, “a” e “b” da CRFB/88.

Cabe destacar que, para o ordenamento brasileiro, segundo os ditames do Art. 12, II, § 2º, da CF/88: “A lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados,

salvo nos casos previstos nesta Constituição”.

Ressalte-se, também, que embora a naturalização seja amplamente admitida no

mundo, o Uruguai é o único país que a veda (FLORES, 2012).

O critério para aquisição de nacionalidade originária, por sua vez, é bem mais simples.

Enquanto que a naturalização reserva uma infinidade de possibilidades, a nacionalidade

originária é consideravelmente mais restritiva em suas formas de reconhecimento.

Como nos esclarece Raluy (1955, apud Glasenapp, 2008): “La atribuición originaria

de nacionalidad se realiza sin que intervenga para nada la vontad del adquirente,

naturalmente incapaz a la sazón para emitir declaraciones de voluntad18

”.

Há, de fato, dois critérios mundialmente difundidos de aquisição da nacionalidade

primária. São esses o jus soli (territorial) e o jus sanguinis (descendência).

O critério jus soli, segundo Glasenapp (2008) diz respeito ao local de nascimento de

determinado indivíduo; ou seja, a pessoa adquire a nacionalidade daquele território no qual

nasceu, independentemente das origens de sua família.

18

A atribuição originária de nacionalidade se realiza sem que intervenha para nada a vontade do adquirente, naturalmente inadequado para emitir declarações de vontade (tradução livre).

25

O autor ainda informa que Rodas (1990), citando Pontes de Miranda (1935), afirma

que o critério territorial para aferição de nacionalidade já se encontrava presente nas

Ordenações Filipinas (1603), livro II, título LV:

Das pessoas que devem ser havidas naturais destes Reinos: “Para que cessem as dúvidas, que podem suceder sobre quais pessoas devem ser havidas por naturais destes Reinos de Portugal e Senhorias deles, para efeito de gozarem dos privilégios, graças, mercê e liberdades concedidas aos naturais deles”, ordenou-se que as pessoas que não nascerem “nestes Reinos e Senhorias deles” não fossem havidas por naturais deles, posto que neles morem e residam, e casem com mulheres naturais deles, e neles vivam continuadamente, tenham domicílio e bens.

De fato, é pacífico na doutrina que este critério de aferição de nacionalidade teria

surgido durante a Idade Média, como um caractere da sociedade feudal, em uma tentativa de

manter o indivíduo ligado à terra onde nascera (DOLINGER, 2008; DEL’OLMO, 2009; MELLO, 2004; TENÓRIO, 1962, apud FLORES, 2012).

Esse critério é mais comumente adotado em países do chamado “novo mundo”, ou

seja, países da América e da Oceania, conquistados e fortemente colonizados pelas potências

européias entre os séculos XV e XVIII. Isso se deve ao fato de as legislações de tais países

possuírem uma tendência a tentar acolher o migrante do melhor modo possível, incentivando

sua colonização e desenvolvimento, de modo a criar sua própria população nacional (DEL’OLMO; KAKU; SUSKI, 2011, apud FLORES, 2012). Como exemplo de países que

adotam prioritariamente o critério jus soli podemos destacar o Brasil, o Canadá e os EUA.

Assim, aduz Santos (2009):

A tradição jus solis dos países-destino de migrantes, especialmente verificada nos Estados americanos é tendente a integrar o imigrante a quem acolhe no seu próprio processo civilizatório, quer facilitando as naturalizações, quer impingindo-lhe a nacionalidade por benefício legal, quer criando mecanismos atrativos para o imigrante estrangeiro fixar raízes e contribuir com a construção das nações do Novo Mundo.

Por sua vez, o critério jus sanguinis não leva em consideração o local de nascimento

de determinado indivíduo, mas sim sua hereditariedade, ou seja, a origem de seus genitores e

26

de sua família. Nesse sentido, destaca Santos (2009), descarta-se o local de nascimento da

pessoa.

As origens do critério jus sanguinis para aferição de nacionalidade remontam à

antiguidade, tanto nas sociedades clássicas, como grega e romana, quanto nas orientais, como Egito, povo hebreu e Índia (DEL’OLMO, 2009, apud SANTOS, 2009).

De fato, destacam os autores, o jus sanguinis encontra-se expressamente posto no

Código de Manu, antigo compêndio de leis escrito na Índia em data incerta, entre os séculos II

a.C. e II d.C, o qual estabelece, dentre outras disposições, o tradicional sistema de castas. Em

meio a estas disposições, sobretudo as encontradas no Capítulo X, pode verificar-se a

presença do critério hereditário, ou de sangue, para aferição do grupo ao qual determinado

indivíduo pertenceria. Anote-se:

8. From a Brahmana a with the daughter of a Vaisya is born (a son) called an Ambashtha, with the daughter of a Sudra a Nishada, who is also called Parasava.

11. From a Kshatriya by the daughter of a Brahmana is born (a son called) according to his caste (gati) a Suta; from a Vaisya by females of the royal and the Brahmana (castes) spring a Magadha and a Vaideha.

12. From a Sudra are born an Ayogava, a Kshattri, and a Kandala, the lowest of men, by Vaisya, Kshatriya, and Brahmana) females, (sons who owe their origin to)

a confusion of the castes.19

Na atualidade, o critério do jus sanguinis é mais comumente adotado nos países

emigratórios do chamado velho mundo, ou em países com cultura tradicionalista mais

consolidada (SANTOS, 2009), tais como a Itália, a Alemanha e o Japão.

Vale ressaltar que, em vários países, há um limite de gerações para atribuição de

nacionalidade segundo o critério do jus sanguinis. É o caso, por exemplo, como cita Flores

(2012), de Alemanha e França. Isto ocorre, possivelmente, em razão do fato de que, com o

passar das gerações, os descendentes dos nacionais destes países tendem a perder contato com

19

8. De um Brahmana com a filha de um Vaisya nasce (um filho) chamado de Ambashtha, com a filha de um

Sudra um Nishada, que é também chamado Parasava. 11. De um Kshatriya pela filha de um Brahmana nasce (um filho chamado) de acordo com sua casta (gati) um Suta; de um Vaisya por mulheres da realeza e (castas) Brahmana, florescem o Magadha e o Vaideha. 12. De um Sudra nascem um Ayogava, um Kshattri, e um Kandala, os mais inferiores dos homens, de mulheres Vaisya, Kshatriya e Brahmana, (filhos que devem sua origem a) uma confusão das castas (tradução livre).

27

os costumes e tradições de seus antepassados, não fazendo mais sentido algum mantê-los,

após certo transcorrer geracional, atrelados a determinado Estado com o qual não mais

possuem qualquer vínculo, de qualquer natureza (DEL’OLMO, 2001, apud FLORES, 2012).

Entretanto, por outro lado, há os países que não impõe o limite geracional, desde que reste

comprovada a origem da família do solicitante, como é o caso da Itália (SGARBOSSA, 2012,

apud FLORES, 2012).

Malgrado os sistemas puros venham existindo há séculos, os países, sobretudo nos

dias atuais, vêm cada vez mais rendendo-se à adoção do chamado sistema misto ou eclético

(DOLINGER, 2008, apud FLORES, 2012), uma combinação dos critérios jus soli e jus

sanguinis. Nos dizeres de Strenger (2000, apud FLORES, 2012): “Estados que adotam uma

via intermediária, consistente em combinar o jus sanguinis e o jus soli, permitindo o exercício

da vontade ao interessado, que poderá em certa fase da vida eleger a nacionalidade preferida”.

Ensina, ainda, Mello (2004, apud SANTOS, 2009):

O sistema misto combina os dois sistemas enunciados acima. É o adotado na Colômbia, EUA, etc. Na verdade, o que se pode concluir é que praticamente nenhum Estado adota o jus solis ou o jus sanguinis de modo exclusivo. Todos abrem exceções ao sistema que adotam como regra geral.

Também, no art. 6º da Convenção Européia sobre Nacionalidade (CEN), ratificada por

20 países (dados de 22/08/2013), é claramente sugerida a adoção de tal critério. Note-se,

inclusive, que existe, na alínea “b” deste dispositivo, uma determinação expressa visando à

proteção de indivíduos que, de outro modo, se veriam na situação de apatridia (mais

precisamente relativamente aos foundlings20

, recém-nascidos abandonados e encontrados em

determinado território nacional).

De fato, na atualidade, inclusive como um método de prevenção à apatridia, os países,

embora adotem, certamente, um destes sistemas em nível prioritário, adotam o outro em

caráter complementar. Dentre os Estados que dão preferência ao jus soli, com caracteres de

jus sanguinis, estão Guatemala, Cuba, El Salvador, Equador e México. Já, quanto aos países

20

Diferencia-se o conceito de foundling, criança sobre a qual nada se sabe e que é encontrada em determinado local após ter sido abandonada por seus pais desconhecidos, dos conceitos de runaway, aquele que fugiu de casa, e do de órfão, aquele cujos pais são falecidos. Definições dos dicionários Merriam-Webster Online e Dictionary.com, tradução livre.

28

que se inclinam ao jus sanguinis, com hipóteses de jus soli, estão Bulgária, Costa Rica, Grécia

e Haiti (STRENGER, 2000, apud FLORES, 2012).

No caso, por exemplo, do Brasil, no art. 12, I, da CRFB/88, onde, enquanto adota-se o

jus soli na alínea “a” (“os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais

estrangeiros...”), como regra geral, o jus sanguinis aparece com caráter subsidiário nas alíneas “b” e “c” (“os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira...”).

Relativamente à perda de nacionalidade, de acordo com os arts. 7º e 8º da CEN, há

dois modos, cada qual abrangindo determinado número de hipóteses, de perda de

nacionalidade: perda ex lege (por iniciativa de um Estado-parte) e perda por iniciativa do

indivíduo. Note-se que, aqui, não há diferenciação entre a nacionalidade originária ou

derivada.

O dispositivo quanto à perda ex lege, no art. 7º, aponta que um Estado-parte não pode,

em regra, determinar em sua legislação interna, que haja a perda automática de nacionalidade

dos indivíduos sob sua responsabilidade, exceto em certos casos. O rol descrito nos incisos é

taxativo.

a. voluntary acquisition of another nationality;

b. acquisition of the nationality of the State Party by means of fraudulent conduct, false information or concealment of any relevant fact attributable to the applicant;

c. voluntary service in a foreign military force;

d. conduct seriously prejudicial to the vital interests of the State Party;

e. lack of a genuine link between the State Party and a national habitually residing abroad;

f. where it is established during the minority of a child that the preconditions laid down by internal law which led to the ex lege acquisition of the nationality of the State Party are no longer fulfilled;

g. adoption of a child if the child acquires or possesses the foreign nationality of one

or both of the adopting parents.21

21

a. aquisição voluntária de outra nacionalidade; b. aquisição da nacionalidade do Estado-parte por meio de

conduta fraudulenta, informação falsa ou ocultação de qualquer fato relevante atribuível ao aplicante; c. serviço voluntário em uma força militar estrangeira; d. conduta seriamente prejudicial aos interesses vitais do Estado-parte; e. falta de elo genuíno entre o Estado-parte e o nacional habitualmente residindo no exterior; f. quando esteja estabelecido durante a menoridade de uma criança que as condições elencadas pelo direito interno que conduziram à aquisição ex lege da nacionalidade do Estado-parte não se encontram mais preenchidas; g. adoção de uma criança se a criança adquire ou possui a nacionalidade estrangeira de um ou ambos os pais adotantes.

29

Não há obrigatoriedade na admissão de tais hipóteses pela legislação interna de

qualquer país, como se aduz da leitura do caput do inciso 1 do referido artigo, mas sim uma

liberalidade da norma internacional para que tais hipóteses sejam adotadas.

O art. 8º, por sua vez, determina, em seu inciso 1, que cada Estado deverá permitir que

seu nacional renuncie à nacionalidade, contanto que este não esteja sob risco de apatridia.

Entretanto declara, em seu inciso 2, que o Estado pode determinar, em sua legislação interna,

que tal ato de vontade, a renúncia expressa, só possa ser exercido por nacionais vivendo,

habitualmente, no exterior.

O direito brasileiro fala em duas hipóteses de perda de nacionalidade: a perda-punição,

também chamada perda-sanção, a qual ocorre da prática de atividade nociva ao interesse do

Estado e é objeto de divergência doutrinária quanto à sua juridicidade entre Miranda e

Marinho, conforme aponta Dolinger (2008, apud KLUGE, 2007) e a perda-mudança, que

ocorre da aquisição voluntária de outra nacionalidade, após procedimento administrativo

(LENZA, 2006, apud KLUGE, 2007).

A primeira encaixar-se-ia, por analogia, caso a Convenção Européia aqui se aplicasse,

nas hipóteses do art. 7º, pois a mesma se dá pelo cancelamento da naturalização em vista a

sentença judicial que declare atividade nociva ao interesse da sociedade; já a segunda hipótese

seria compatível ao disposto no art. 8º, por dizer respeito à naturalização voluntária.

Note-se que há países que admitem a reaquisição da nacionalidade perdida como, por

exemplo, Bélgica, Bolívia, Brasil, Bulgária, China, Cuba, Dinamarca, EUA, Grécia, Itália, Irã,

Turquia e Uruguai (VALÉRIO, 2002). Com efeito, também a CEN traz, em ser art. 9º, um

dispositivo facilitador da reaquisição de nacionalidade perdida.

No caso específico do Brasil, conforme posicionamento do STF e da doutrina

majoritária, com nomes como Dolinger e Marinho, determina-se, ainda, que aquele que

recuperar a nacionalidade brasileira, a terá recuperado em seu status quo ante, ou seja, o

brasileiro nato voltará a ser brasileiro nato, e o naturalizado voltará a ser naturalizado. Há,

contudo, uma corrente minoritária, defendida por nomes como Miranda e Rezek, que afirmam

que a nacionalidade readquirida possui efeitos de naturalização (KLUGE, 2007).

30

1.2.2. Conflitos positivo e negativo

Em virtude da pluralidade de modos de aquisição de nacionalidade, quer originária,

quer derivada, podem surgir os chamados conflitos de nacionalidades. Estes conflitos são

ocorrências onde, de acordo com critérios adotados por dois ou mais países, um indivíduo

poderá não ter direito a qualquer nacionalidade, ou poderá ter direito a várias (CUNHA

JÚNIOR, 2012).

Nesse sentido, Andrade (1978, apud FLORES, 2012): “A diversidade existente nas

legislações ao regulamentarem a aquisição e perda da nacionalidade, gero dois tipos de

conflitos: o positivo e o negativo”.

O chamado conflito positivo, plurinacionalidade ou polipatridia ocorre quando, de

acordo com os critérios de aquisição de nacionalidade de dois ou mais países, determinado

indivíduo poderá fazer jus a mais de uma nacionalidade (MELLO, 2004; TENÓRIO, 1962; STRENGER, 2000; DEL’OLMO, 2001, apud FLORES, 2012), sem que, contudo, a aquisição

da segunda nacionalidade não implique no cancelamento da primeira (DEL’OLMO, 2001; DOLINGER, 2008; MIRANDA, 1935, apud FLORES, 2012).

Hee Moon Jo (2001, apud FLORES, 2012) expõe um exemplo de ocorrência de tal

conflito: "se uma pessoa, filha de pai com nacionalidade coreana, cujo país adota o critério do

jus sanguinis, nasce no Brasil, que adota o critério do jus soli, adquire duas nacionalidades”.

É, também, o que acontece, por exemplo, com alguns brasileiros descendentes de

italianos, visto que o Brasil adota, primariamente, o jus soli (art. 12, I, “a”, CRFB/88), e a

Itália, o jus sanguinis (art. 1º, “a” L. 91/1992).

No caso, tal conflito positivo de nacionalidade acabará por gerar a figura do

polipátrida, ou seja, o indivíduo possuirá vínculo jurídico-político com mais de um Estado.

Cunha Júnior (2012, p. 793) ressalta que esta condição é extremamente favorável à pessoa,

permitindo, além das óbvias facilidades em mobilidade internacional, possuir dois ou mais

Estados zelando, ao mesmo tempo, por seu bem-estar, podendo usufruir de todos os

benefícios por estes garantidos.

Entretanto, há entendimento em sentido diverso na doutrina. De acordo com Mello

(2004, apud FLORES, 2012) e Andrade (1987, apud FLORES, 2012), podem ocorrer

31

dificuldades em se determinar a proteção diplomática do indivíduo, bem como questões

relativas ao exercício de serviço militar.

Atualmente, o critério de ponderação quanto a qual proteção diplomática será aplicada

ao polipátrida é fornecido pela Convenção de Haia sobre Certas Questões Relativas a

Conflitos de Legislação de Nacionalidade, de 1930 (FLORES, 2012). Vale destacar o

conteúdo dos arts. 4º e 5º:

Article 4.

A State may not afford diplomatic protection to one of its national against a State whose nationality such person also possesses.

Article 5.

Within a third State, a person having more than one nationality shall be treated as if he had only one. Without prejudice to the application of its law in matters of personal status and of any conventions in force, a third State shall, of the nationalities which any such person possesses, recognise exclusively in its territory either the nationality of the country in which he is habitually and principally resident, or the nationality of the country with which in the circumstances he appears

to be in fact most closely connected.22

Observe-se, contudo, que o Brasil, ao ratificar tal convenção, no ano de 1931, fez

reservas em relação a certos artigos, inclusive ao art. 5º, sob a justificativa de dificuldade de

aplicação, devido a conflitos com princípios-base da legislação interna. Entretanto, o Brasil é

signatário do Código de Bustamante, o qual dispõe sobre o conflito de nacionalidades em seu

art. 10 (FLORES, 2012), ora vejamos:

Artículo 10. A las cuestiones sobre nacionalidad de origen en que no esté interesado el Estado en que se debaten, se aplicará la ley de aquella de las nacionalidades

discutidas en que tenga su domicilio la persona de que se trate.23

22 Artigo 4: Um Estado poderá não conceder proteção diplomática a um de seus nacionais contra um Estado cuja nacionalidade tal pessoa também possua. Artigo 5: Em um terceiro Estado, uma pessoa possuindo mais de uma nacionalidade deverá ser tratada como se só tivesse uma. Sem prejuízo à aplicação de sua lei em assuntos de condição pessoal e de quaisquer convenções em vigor, um terceiro Estado deverá, das nacionalidades que qualquer pessoa nessas condições possua, reconhecer exclusivamente em seu território ou a nacionalidade do país no qual o indivíduo é habitual e principalmente residente, ou a nacionalidade do país com o qual, devido às circunstâncias, o indivíduo aparente estar, de fato, mais intimamente relacionado (tradução livre).

23 Artigo 10: Às questões sobre nacionalidade de origem em que não esteja interessado o Estado em que se debatem, se aplicará a lei de aquela das nacionalidades discutidas em que tenha seu domicílio a pessoa de que se trate (tradução livre).

32

Destaca ainda Jo (2001, apud FLORES, 2012), que o Brasil não possui qualquer

norma de direito interno relacionada à resolução de questões relativas a conflitos positivos de

nacionalidade.

Por sua vez, se certo indivíduo pode vir a possuir mais de uma nacionalidade, ele

também poderá ser privado de possuir uma. E, a isto, denomina-se conflito negativo de

nacionalidade (GUERIOS, 1936).

O chamado conflito negativo de nacionalidade poderá ocorrer quando dois ou mais

estados, através de suas legislações de nacionalidade, não reconhecerem possuir qualquer

vínculo com determinado indivíduo, nascendo este sem qualquer nacionalidade. De fato,

como bem esclarece Batiffol (1949, apud FLORES, 2012), aqui a questão não se refere, como

no caso do conflito positivo, a um conflito de leis propriamente dito, mas sim à ausência

destas.

Isso teria ocorrido, por exemplo, no caso de filhos de pais brasileiros, que não

estivessem a serviço do Estado brasileiro, que houvessem fixado residência na Alemanha, por

menos de oito anos, entre os anos de 1994 e 2000.

Pela CRFB/88, à época, vigorava a redação do art. 12, I, “c”, dada pela ECR 03/94, a

observar:

Art. 12. São brasileiros:

I - natos:

a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país;

b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;

c) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira; (g.n.)

Nota-se que havia o critério de que o filho de brasileiros, nascido no exterior, seria

obrigado a retornar ao Brasil, para que então pudesse optar pela nacionalidade brasileira.

33

Esta situação foi alterada com o advento da EC 54/07, a qual alterou a redação da

alínea “c” para a que conhecemos atualmente, qual seja, “os nascidos no estrangeiro de pai

brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira

competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer

tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira”.

Quanto à legislação alemã vigorante àquela época, uma lei cuja redação datava de

1913, esta primava pelo jus sanguinis, pouco se importando com local de nascimento do

indivíduo. De fato, nas palavras de Brubaker (1992, apud HOWARD, 2008), o intuito da lei

era criar uma “comunidade de descendência”, fechada aos estrangeiros nascidos em solo

germânico.

A legislação de nacionalidade alemã foi somente flexibilizada em 2000, com a nova

redação da Staatsangehörigkeitsgesetz24

, visto que houve certo movimento pressionando pela

reforma da legislação anterior, completamente ultrapassada, primando agora pela adoção de

um critério misto de aferição de nacionalidade, em detrimento do jus sanguinis puro

anteriormente adotado.

Portanto, uma criança, filha de pais brasileiros, nascida em território alemão na época

destacada, ver-se-ia em situação extremamente desamparada, visto não encontrar amparo para

aquisição de nacionalidade por parte de nenhum dos dois Estados envolvidos25

.

O conflito negativo poderá ocorrer, ainda, quando a pessoa, no transcorrer de sua vida,

for privado das nacionalidades que possua (FLORES, 2012).

Nasce, aí, a figura do anacional, heimatlos, sem-pátria, apólida ou apátrida.

24 Lei de Nacionalidade (tradução livre).

25 Casos semelhantes a este foram a origem do famoso movimento dos “Brasileirinhos Apátridas”, criado, sobretudo, por pais de crianças e jovens que, por força da antiga redação do art. 12, I, “c”, da CRFB/88, frente às legislações dos países em que nasceram, encontravam-se completamente desamparados em seu direito à nacionalidade, em flagrante violação ao disposto pelo art. 15 da DUDH.

34

CAPITULO 2

O APÁTRIDA E SUA TUTELA JURÍDICA

A apatridia é um problema mundial. De acordo com dados da ONU existem, na

atualidade, aproximadamente onze milhões de apátridas espalhados por inúmeros países

(ACNUR, 2005). De fato, se todos os apátridas do mundo fossem reunidos para constituir um

novo país, formariam o 78º país mais populoso do mundo (CIA, 2013).

Embora a apatridia esteja distribuída de modo extremamente desigual ao redor do

globo, ela existe em todos os continentes, de acordo com dados da ACNUR (2005). Nos

ditames de Zen (2007, apud FLORES, 2012):

A apatridia é problema cada vez mais grave no mundo em que vivemos, em especial pelas fortes correntes de emigração. A apatridia acarreta sérios prejuízos ao indivíduo que não tem reconhecidos direitos políticos, não recebe proteção internacional de Estado algum e é tratado como estrangeiro não importa onde esteja.

Entretanto, embora o problema seja grave e os números sejam alarmantes, superando

inclusive a população de países como Hungria, Suíça, Suécia, Noruega e Finlândia, o assunto

é muito pouco discutido, e a tutela jurídica dirigida especificamente ao apátrida é

incrivelmente escassa.

É o intuito deste estudo trazer alguma luz sobre este tema; é oportuno, portanto,

apresentar algumas noções básicas.

2.1. Noções elementares de apatridia

35

A expressão “apatridia”, utilizado na língua portuguesa, possui origem etimológica no

grego (a = sem; patrída = pátria). Entretanto, o termo teria sido, segundo Del’Olmo (2001,

apud FLORES, 2012), traduzido para o português através do francês, apatridie.

Como explanado anteriormente, o apátrida é o indivíduo que não possui qualquer

nacionalidade, seja porque nasceu em situação na qual nenhum Estado reconheceu vínculo

para com ele, seja porque, no decorrer de sua vida, foi extirpado das nacionalidades que veio a

possuir.

Esclarece Del’Olmo (2009, apud FLORES, 2012):

A principal fonte da anacionalidade está na existência dos dois sistemas utilizados pelos Estados na atribuição originária da nacionalidade. Assim, criança nascida em país que adota o jus sanguinis, de pais oriundos de Estado que privilegia o jus soli, não terá nacionalidade. Outra fonte é a legislação de países totalitários permitindo a supressão da nacionalidade por motivos políticos ou raciais.

Nos elucida Hannah Arendt, brilhantemente, que aqueles muitos indivíduos privados

de sua nacionalidade pelo estado totalitário (no caso, o nazista) acabaram por se ver numa

situação jurídica pior do que a de um criminoso, pois não possuíam qualquer direito – sequer,

o próprio direito a ter direitos. (ARENDT, 1989, apud PESSOA, 2004).

Este trabalho passará, a partir de agora, concluída a parte introdutória necessária, a

tratar exclusivamente do apátrida.

2.1.1. Identificando o apátrida: origens e conceito

Para melhor compreensão dos temas a serem, a partir de agora, tratados, cabe aqui

fazer uma rápida diferenciação entre “refugiados” e “asilados”, e destes em relação aos

“apátridas” pois, embora sejam conceitos intimamente relacionados, apresentam diversidade

conceitual significativa do ponto de vista teórico.

36

O asilado é o indivíduo abarcado pelo instituto do asilo26

, proteção essencialmente

política, sendo aquele que busca proteção de Estado estrangeiro por estar efetivamente

sofrendo perseguição de natureza política, incluindo-se, aqui, crimes de opinião e ligados à

segurança nacional que não configurem delitos de direito penal comum (ANNONI, 2002,

apud AMARO; DIAS, 2010). Destaca-se, entretanto, que embora o instituto do asilo tenha

origens no sistema global de proteção aos direitos humanos, mais especificamente no art. 14

da DUDH, é, como bem aponta Piovesan (2001 apud KIM, 2006), um instituto típico do

sistema interamericano, mais precisamente no âmbito da América Latina, sendo sustentado

pelas Convenções de Havana, de 1928, Montevidéu ,de 1933 e Caracas, de 1954 (SCAGLIA,

2009, apud AMARO; DIAS, 2010).

Por sua vez, o refugiado é aquele que, por fundado temor de perseguição, seja de

natureza religiosa, racial, de nacionalidade, de gênero, de grupo social ou, inclusive, de

opinião política, ou por sua efetiva ocorrência, busca proteção, essencialmente humanitária,

por parte de um Estado estrangeiro (PIOVESAN, 2001 apud KIM, 2006). Nas palavras de

Kim (2006, p. 4), todo asilado é um refugiado, mas nem sempre a recíproca é verdadeira.

Finalmente, em relação ao apátrida, Cunha o define em seu dicionário jurídico (2005,

apud SCAGLIA, 2009), como sendo o “indivíduo que não é titular de nenhuma

nacionalidade, ou seja, é uma pessoa que não é considerado nacional por nenhum Estado”. No

mesmo sentido, segundo o art. 1º da Convenção da ONU Relacionada à Condição dos

Apátridas, de 1954, é fornecido o seguinte conceito:

1. For the purpose of this Convention, the term “stateless person” means a person

who is not considered as a national by any State under the operation of its law.27

Podemos, então, definir que, para o direito internacional moderno, o apátrida é aquele

cujo vínculo de nacionalidade inexiste ou não é considerado existente por qualquer Estado

nacional.

26

Cabe esclarecer que asilo político é gênero, contendo duas espécies reconhecidas pelo Direito atual: diplomático e territorial, sendo que o primeiro é apenas uma forma provisória de concessão de asilo, usualmente sendo deferida a estadia ao perseguido em representações diplomáticas, enquanto que o segundo trata-se da forma definitiva, sendo o perseguido instalado no próprio território do país concedente (SCAGLIA, 2009, apud AMARO; DIAS, 2010). 27

Para o objetivo dessa Convenção, o termo “apátrida” significa uma pessoa que não é considerada como um nacional por qualquer Estado sob os efeitos de sua lei (tradução livre).

37

Dado o conceito atual do gênero apátrida, cabe ressaltar que existem, em suma, duas

espécies destes, reconhecidas pela doutrina: o apátrida de facto e o apátrida de jure (FLORES,

2012).

Os apátridas de jure são aqueles que, desde que nasceram, são apátridas, visto que

nenhum Estado os considera, nem nunca considerou, nacionais (MILBRANDT, 2011;

ACNUR, 2012), de acordo com seus critérios de aferição de nacionalidade. O apátrida de jure

nunca conheceu a proteção estatal conferida a seus nacionais sendo, desde seu nascimento,

tratado e protegido apenas pelas legislações internas de seu país dirigidas aos estrangeiros

naquele território (ACNUR, 2005).

Por sua vez, o apátrida de facto é, como brevemente explanado anteriormente, aquele

que possuía uma nacionalidade, mas esta lhe foi privada pelo Estado ou, ainda que mantenha

sua nacionalidade, seu direito de exercício e os direitos conexos lhes são limitados por seu

Estado (MILBRANDT, 2011; ACNUR, 2012). Desta feita, o indivíduo encontra-se

efetivamente privado do exercício de sua nacionalidade, sendo considerado apátrida, ainda

que não seja, à literalidade, um. Esse conceito é apresentado no “A Study of Statelessness”,

um estudo elaborado pela ONU em 1949 (TRINH, 2004). Note-se, ainda, que o conceito de

apátrida apresentado no art. 1º da Convenção de 1954 é relativo ao apátrida de facto.

Aqui, nota-se possível colidência entre os conceitos de refugiado e apátrida, sobretudo

o de facto. Ressalta-se, contudo, que nem sempre o refugiado é um apátrida, ou vice-versa.

A figura do apátrida existe desde as origens do conceito de nacionalidade, sendo, em

tese, a anômala falta desta. Segundo a explicação de Mello (2004, apud FLORES, 2012): “Havia uma categoria de estrangeiros que entrava nela, a dos peregrini sine civitate. Por outro

lado, há os dediticii28

, sem gozar do jus civile e da proteção de uma lei nacional, muito se

aproxima do apátrida moderno”.

A apatridia, conforme ressalta Strenger (2000, apud FLORES, 2012), também ocorria

em Atenas, de modo que a nacionalidade poderia ser perdida por ato de vontade do indivíduo

ou como modo de punição.

28

Os dediticii, segundo a Enciclopédia Italiana Treccani, eram considerados os mais baixos dos homens livres, tratando-se daqueles que se renderam a Roma, após abandonarem as armas que, contra ela, haviam levantado. Os dediticii, de acordo com o Código de Justiniano, eram banidos da cidade de Roma e de um círculo de mais de cem milhas de seu centro, não podendo, jamais, adquirir a cidadania romana.

38

Na Idade Média, como já descrito, o critério predominante de aferição de

nacionalidade foi o jus soli, sendo que a condição de apatridia foi reduzida à prática

inexistência (FLORES, 2012), ao menos na Europa feudal.

Essa predominância perdurou até o século XIX, com a ascensão do nacionalismo

exacerbado (BRANCO, 2009), no contexto da Primavera dos Povos, onde diversos países

passaram a definir maiores diferenças entre nacionais e estrangeiros; muitos, inclusive,

voltaram a adotar o jus sanguinis, praticamente abandonado desde a Antiguidade Clássica,

como critério de aferição de nacionalidade, sobretudo no contexto das conquistas colonialistas

e imperialistas (APOLINÁRIO; JUBILUT, 2010, apud FLORES, 2012). Ademais, a livre-

circulação de pessoas entre territórios, até então predominante, foi limitada pelos direitos

internos (FLORES, 2012).

As perseguições, as fomes e as penas de exílio da época, fatores estes que obrigavam o

deslocamento de indivíduos, só contribuíram para a crescente intolerância e preconceito

característicos do início do século XX, culminando com as Guerras Mundiais, sendo

inevitável o ressurgimento da figura do apátrida (COMPARATO, 2008, apud FLORES,

2012).

O apátrida, como será demonstrado, até o final da II Guerra Mundial, não possuía reais

mecanismos de proteção aos seus direitos humanos em cenário internacional, ficando à mercê

das legislações internas de nacionalidade que, cada vez mais, à época, se enrijeciam na

Europa (PEREIRA, 2011, apud FLORES, 2012). Era apenas um não cidadão, um pária, não

fazendo jus a qualquer proteção ou, sequer, a quaisquer direitos (ALMEIDA; BITTAR, 2008).

Entretanto, embora ainda não existisse efetiva proteção específica num âmbito

internacional, a preocupação com a garantia de direitos aos apátridas e refugiados surgiu já no

contexto da Revolução Russa (1917) e do final da I Guerra Mundial (1914-1918)

(DUROSELLE, 1976; HOBSBAWN, 1995, apud FLORES, 2012), mais precisamente em

1919, com o estabelecimento da Liga das Nações (FERRO, 2004, apud FLORES, 2012).

A Convenção da Liga das Nações instituía, dentre outras disposições, uma função

coatora29

a um órgão internacional permitindo, pela primeira vez na história, uma intervenção

29

Cabe destacar que, de acordo com Kelsen (2007, apud PAGLIARINI, 2012), vigora em Direito Internacional o pacta sunt servanda, nos mesmos termos já consagrados pelo Direito Contratual.

39

de um organismo frente à soberania de um Estado, através da imposição sanções econômicas

ou militares aos países que infringissem as obrigações postas pela sociedade internacional

(FLORES, 2012). Umas destas obrigações seria a de minimizar os efeitos das guerras,

prestando auxílio aos indivíduos ora atingidos, tal como já previsto do ato constitutivo da

Cruz Vermelha, de 1863 (PEREIRA, 2011, apud FLORES, 2012).

Em tal momento histórico, sobretudo do colapso dos grandes impérios Austro-

Húngaro, Turco-Otomano, Russo e Britânico, e da já referida ascensão do nacionalismo, é

evidente que haveria certo prejuízo por parte de populações minoritárias e de Estados

enfraquecidos ou, até mesmo, extintos pela guerra e pela conseqüente remodelação do mapa-

múndi, sendo esta a principal origem, à época, de refugiados e apátridas.

Considerando-se o já apontado enrijecimento das normas diferenciadoras entre

nacionais e estrangeiros no âmbito dos Estados constituídos, foi surgindo uma maior

necessidade de apresentação de documentos para deslocamentos e viagens internacionais.

Ora, se um indivíduo não possuía necessidade, tampouco qualquer país aceitaria emitir

documentos válidos para estes, possibilitando seu deslocamento ou, até mesmo, que este

fixasse residência e exercesse labor. Com efeito, nos ditos de Flores (2012, p. 46), não

possuíam, estas pessoas, origem nacional legal.

Nesse contexto, surge uma figura de destaque na Liga das Nações; o representante da

Noruega, Dr. Fridtjof Nansen (BARBOSA; HORA, 2007, apud FLORES, 2012).

Nansen foi o indivíduo indicado para comandar o recém criado Alto Comissariado

para Refugiados, em 1921; órgão, este, originalmente destinado apenas à proteção dos russos

atingidos pela Revolução de 1917, mas que posteriormente veio a estender o alcance de seu

auxílio aos demais refugiados e dos apátridas (PEREIRA, 2011; ACNUR, 2012; ACNUR,

2012c, apud FLORES, 2012).

Em 1922, em uma de suas iniciativas mais célebres, o Alto Comissário criou o

chamado “Passaporte Nansen” (ACNUR, 2004), documento reconhecido por 52 países (ACNUR, 2012) e que permitia o trânsito internacional de refugiados e apátridas, autorizando

seu retorno ao país onde possuíam residência sem que pudessem ser barrados (BARBOSA;

40

HORA, 2007, apud FLORES, 2012). Pelas medidas que adotou frente ao órgão, o Dr. Fridtjof

Nansen chegou, inclusive, a ser agraciado com o Prêmio Nobel da Paz, em 192330

.

Durante a II Guerra Mundial, a situação já grave gerada pelos conflitos da aurora do

século passado piorou consideravelmente, sobretudo com as políticas de nacionalismo e,

sobretudo, racismo dos Estados totalitários, com destaque para a Itália fascista e Alemanha

nazista (MELLO, 2004; APOLINÁRIO; JUBILUT, 2010, apud FLORES, 2012).

Salienta-se que, particularmente na Alemanha, a situação tornou-se especialmente

séria, como relata Hannah Arendt em sua obra “As Origens do Totalitarismo” (1989). De fato,

embora os judeus da Alemanha preservassem sua nacionalidade, eles foram privados de sua

cidadania com a promulgação da Lei de Nuremberg de 1935; ficando, assim, completamente

alheios à proteção do Estado. Tornavam-se apátridas de facto (FLORES, 2012).

Com a perseguição aos grupos vulnerabilizados pelos Estados totalitários, diversas

pessoas procuraram fugir de seus países de origem, como uma tentativa de escapar aos

temidos campos de concentração e trabalhos forçados. Entretanto sujeitavam-se, por conta do

rompimento dos vínculos com seus países de origem, a processos de desnaturalização

(ARENDT, 1989), sendo efetivamente extirpados de suas nacionalidades. Tornavam-se,

assim, apátridas de jure (FLORES, 2012).

Tantos foram os deslocamentos de pessoas ocorridos àquela época que, a certo

momento, tornou-se incrivelmente difícil determinar a real origem destes indivíduos, ora

anacionalizados, tendo sido, então, criado o termo displaced persons31

para identificá-los.

Segundo Arendt (1989, apud FLORES, 2012), esta denominação foi criada unicamente com a

intenção de ignorar a condição de apatridia destes indivíduos, denominando-os, apenas, como

deslocados, não denotando a real gravidade de suas situações; mas reconhecendo, contudo,

que tais pessoas necessitavam de ajuda internacional para poder reconquistar seus status quo

ante de cidadãos e nacionais.

Enquanto desprotegidos por normas internacionais e ignorados pelo regulamento

interno, os apátridas representavam condição anômala ao direito, e por isso eram vistos, pelos

países, como “criminosos” (SILVA FILHO; PEREIRA, 2008, apud FLORES, 2012). Se, por

30 Inclusive, ressalta-se que, até hoje, existe uma condecoração concedida pela ACNUR àqueles que atuarem significativamente pela proteção dos refugiados denominada “Medalha Nansen”. Informações sobre os condecorados podem ser acessadas via website do órgão.

31 Pessoas deslocadas (tradução livre).

41

um lado, os países buscavam expulsá-los de seus territórios, quando não obtinham êxito em

fazê-lo acabavam por trancafiar estes indivíduos em prisões, de forma a condená-los não só a

penas que não mereciam, como também ao esquecimento. De fato, ressalta Arendt (1989,

apud FLORES, 2012):

O apátrida estava sujeito a ir para a cadeia sem jamais cometer um crime. Mais que isso, toda a hierarquia de valores existentes nos países civilizados era invertida nesse caso. Uma vez que ele constituía a anomalia não-prevista na lei geral, era melhor que se convertesse na anomalia que ela previa: o criminoso.

Contudo, ao passo que o indivíduo era preso desmotivadamente, simplesmente pelo

fato de sua existência constituir uma anomalia jurídico-social, este passava à mesma condição

que quaisquer outros presos, qual seja a condição de fora-da-lei, estando, finalmente, abarcado

pelo direito – ao menos, no sentido de ser submetido a julgamento e ter direitos mínimos

garantidos enquanto recluso (SILVA FILHO; PEREIRA, 2008, apud FLORES, 2012). Nesse

mesmo sentido, Arendt (1989, apud FLORES, 2012) também anota:

O mesmo homem que ontem estava na prisão devido à sua mera presença no mundo, que não tinha quaisquer direitos e vivia sob ameaça de deportação, ou era enviado sem sentença e sem julgamento para algum tipo de internação por haver tentado trabalhar e ganhar a vida, pode tornar-se um cidadão completo graças a um pequeno roubo. Mesmo que não tenha vintém, pode agora conseguir advogado, queixar-se contra os carcereiros e ser ouvido com respeito. Já não é refugo da terra: é suficientemente importante para ser informado de todos os detalhes da lei sob a qual será julgado. Ele torna-se pessoa respeitável.

Ao final da II Guerra Mundial, a questão dos refugiados e apátridas havia se tornado

demasiado grave para continuar passando despercebida pela comunidade internacional32

.

Observando isso, somada tal questão à gravidade e freqüente incidência das violações de

direitos humanos ocorridas durante a guerra, foi criada a ONU, em 1945, organismo

internacional sucessor da (agora extinta) Liga das Nações na missão de promover a paz

mundial. E foi com este intuito que, em 1948, este mesmo organismo proclamou a DUDH.

32

De acordo com dados levantados por Pereira (2011, apud FLORES, 2012), havia, à época, 40 milhões de indivíduos no mundo partilhando da condição de refugiados ou apátridas.

42

A DUDH contém, como já apontado anteriormente, disposição expressa acerca do

direito à nacionalidade; direito este que entra em conflito direto com a mera existência de

apatridia, e chamando atenção especial à necessidade de sua erradicação, visto tratar-se a

nacionalidade, agora reconhecidamente, de um direito básico do ser humano.

2.1.2. O conflito entre a apatridia e o direito humano à nacionalidade

Muito embora a apatridia não seja uma situação deveras incomum no mundo, como já

referendado, ela, em teoria, sequer deveria existir.

Sem ao menos analisar as convenções específicas acerca do apátrida e da situação de

apatridia, podemos encontrar, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948,

proclamada pela Assembléia Geral da recém-constituída Organização das Nações Unidas, o

direito a uma nacionalidade e à sua não-privação (REZEK, 2010, apud FLORES, 2012). Tal

passagem está anotada em seu art. 15, ora leia-se:

Artigo XV:

1. Todo homem33

tem direito a uma nacionalidade. 2. Ninguém será arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de mudar de nacionalidade.

Com o advento do chamado Direito Internacional dos Direitos Humanos, e a

conseqüente classificação da nacionalidade como um direito básico da condição humana

(VAN WAAS, 2009) integrada à sociedade, surge o óbvio conflito entre o que é e o que

deveria ser, em termos semelhantes àqueles apresentados por Kelsen em sua Teoria Pura do

Direito (2007).

Racionalmente, o homem chegou ao ponto no qual visualizou que a apatridia não

deveria ser, não deveria existir. Mas era, naturalmente no mundo, e portanto deveria ser

reduzida ou, ao menos, apaziguada em seus efeitos.

33

A palavra “homem”, aqui, cabe destacar, refere-se ao sentido amplo da palavra, indicando “ser humano”, e não indivíduo do sexo masculino.

43

É nesse sentido que o DIDH buscou amparar, em primeiro momento, o apátrida –

garantido o exercício dos direitos inerentes a qualquer ser humano, indistintamente, conforme

ilustram Almeida e Bittar (2008, apud FLORES, 2012):

No sistema do DIDH, o apátrida não perde seus direitos fundamentais, continua podendo exercer os seguintes direitos, em pé de igualdade com os nacionais do país no qual reside: liberdade de praticar sua religião e a educação religiosa de seus filhos, acesso aos tribunais, ensino elementar, assistência e socorro públicos, legislação do trabalho e seguros sociais. Na mesma situação dos estrangeiros, exerce direito de associação, emprego remunerado, trabalho autônomo, exercício de uma profissão liberal, moradia.

A DUDH foi apenas o primeiro passo para a institucionalização de normas de força

internacional para a proteção dos direitos da pessoa humana e, no caso, mais especificamente

dos apátridas.

2.2. Os sistemas de proteção ao apátrida

A apatridia, como já apontado, pode ter várias origens (ACNUR, 2001) sendo possível

apontar, como exemplos, a sucessão de Estados, as legislações matrimoniais, conflito entre

leis baseadas no jus soli com leis embasadas no jus sanguinis e imposição de regimes

ditatoriais (ZEN, 2007, apud FLORES, 2012), migração forçada (ACNUR, 2005), entre

outros.

Como já demonstrado, quando em condição de apatridia, o indivíduo se vê em uma

situação de extrema hipossuficiência, sendo-lhe negados direitos considerados básicos, como

por exemplo, possuir registro de nascimento, acesso à educação, acesso à saúde e

possibilidade de emprego (ACNUR, 2005).

Assim, é de se concluir que a aferição de nacionalidade constitui-se em condição

fundamental ao pleno exercício dos direitos humanos (ACNUR, 2013; SETFLAGE, 1997,

apud FLORES, 2012). Sem isto, são completamente marginalizados pela sociedade na qual se

inserem (ACNUR, 2005). De fato, relata o atual Alto Comissário da ONU para Refugiados, António Guterres, que a apatridia “cria um ciclo de marginalização, com dezenas de milhares

44

de crianças incapazes de ter acesso a serviços de saúde e educação ou de desenvolver uma

identidade como parte de uma sociedade” (ACNUR, 2012).

Entretanto, apesar de ser sabido que a apatridia é uma situação de extrema gravidade, a

qual priva o indivíduo de direitos básicos, ainda é forte a resistência por parte dos países em

aderir medidas uniformizadas de prevenção à apatridia (ZEN, 2007, apud FLORES, 2012).

2.2.1. No âmbito internacional

Como esclarecido por Walker (1981), cabe, em princípio, ao direito interno dos países

dispor sobre a nacionalidade e suas questões afetas.

Isto anotado, insta analisar o parecer consultivo emitido pela CPJI em 1923,

relativamente aos Decretos de Nacionalidade promulgados pela Tunísia e Marrocos naquele

mesmo ano: “A questão de saber se uma determinada matéria está ou não submetida à

jurisdição exclusiva de um Estado é uma questão essencialmente relativa: depende do

desenvolvimento das relações internacionais” (CPJI, 1923, apud FLORES, 2013).

Assim, é presumível que, embora as questões de nacionalidade sejam afetas ao direito

interno, os estados possuem a obrigação de cumprir com as determinações e acordos

assumidos em âmbito internacional, perante os demais países. Diversos Estados entenderam o

parecer da CPJI como uma limitação à sua competência interna e autonomia; contudo, este

ponto foi reforçado pela Convenção de Haia de 1930 (BATCHELOR, 1995; ACNUR, 2005,

apud FLORES, 2012).

Essa convenção, reitera-se, foi elaborada no contexto da Liga das Nações, e trata de

determinadas questões relativas ao conflito de nacionalidades, tanto positivo quanto negativo,

porquanto ambas são exceções à regra e poderiam gerar problemas ao indivíduo que se

encontrasse em condição de polipatridia ou apatridia. Dentre outras disposições, a Convenção

determina, em seu art. 1º:

Cabe a cada Estado determinar, segundo a sua própria legislação, quem são os seus cidadãos. Essa legislação será reconhecida por outros Estados na medida em que

45

seja compatível com as convenções internacionais, o costume internacional e os princípios de direito geralmente reconhecidos em matéria de nacionalidade.

Isto posto, resta concluir que os Estados devem definir quem são os indivíduos que se encontram sob sua proteção, observando as disposições de Direito Internacional e sempre respeitando-as. Ao longo deste último século, os Estados foram adaptando suas normas

internas para adequarem-se, de modo a privilegiar a proteção aos Direitos Humanos

(ACNUR, 2005). De fato, segundo Hansen (2009, apud DOLIDZE, 2011), o direito

internacional dos direitos humanos encontra maior força quando aplicado pelas cortes

internas.

Relativamente à assinatura, ratificação e ressalvas quanto à Convenção de Haia de

1930: Ratifications or definitive accessions

Belgium (April 4th, 1939)

Subject to accession later for the Colony of the Congo and the Mandated Territories.

Excluding Article 16 of the Convention.

Brazil (September 19th, 1931 a)

With reservations as regards Articles 5, 6, 7, 16 and 17, which Brazil will not adopt owing to difficulties with which it has to contend in connection with principles forming the basis of its internal legislation.

Great Britain and Northern Ireland (April 6th, 1934)

and all parts of the British Empire which are not separate members of the League of Nations.

Burma

His Majesty the King does not assume any obligation in respect of the Karenni States, which are under His Majesty's suzerainty, or the population of the said States.

Canada (April 6th, 1934)

46

Australia (November 10th, 1937)

Including the territories of Papua and Norfolk Island.

India (October 7th, 1935)

In accordance with the provisions of Article 29, His Britannic Majesty does not assume any obligation in respect of the territories in India of any Prince or Chief under his suzerainty or the population of the said territories.

China (February 14th, 1935)

Subject to reservation as regards Article 4.

Monaco (April 27th, 1931 a)

Netherlands (April 2nd, 1937)

Including the Netherlands Indies, Surinam and Curaçao .

Excluding the provisions of Articles 8, 9 and 10 of the Convention.

Norway (March 16th, 1931 a)

Poland (June 15th, 1934)

Sweden (July 6th, 1933)

The Swedish Government declares that it does not accept to be bound by the provisions of the second sentence of Article 11, in the case where the wife referred to in the article, after recovering the nationality of her country of origin, fails to establish her ordinary residence in that country.

Signatures not yet perfected by ratification Austria, Union of South Africa, China, Colombia (Subject to reservation as regards Article 10), Cuba (Subject to reservation as regards Articles 9 10 and 11), Czechoslovakia, Denmark (Subject to reservation as regards Articles 5 and 11), Egypt, Estonia, France, Germany, Greece, hungary, Iceland, Ireland, Italy, Japan (Subject to reservation as regards Articles 4 and 10 and as regards the words "according to its law" of Article 13), Latvia, Luxembourg, Mexico (Subject to reservation as regards paragraph 2 of Article 1), Peru (Subject to reservation as regards Article 4), Portugal, Salvador, Spain, Switzerland (Subject to reservation as regards Article 10), Uruguay, Yugoslavia (former). Actions subsequent to the assumption of depositary functions by the Secretary-General of the United Nations

Participant

Ratification,

Denunciation

Accession(a),

47

Succession(d)

Canada [15 May 1996 ]

Cyprus 27 Mar 1970 d

Fiji 12 Jun 1972 d

Kiribati 29 Nov 1983 d

Lesotho

Liberia 16 Sep 2005 a

Malta 16 Aug 1966 d

Mauritius 18 Jul 1969 d

Pakistan 29 Jul 1953 d

Swaziland 18 Sep 1970 a

Zimbabwe 1 Dec 1998 d

Fonte: ONU, 2013

É de se observar que poucos são os Estados-parte dessa Convenção e que, dentre estes,

apenas cinco ratificaram-na sem qualquer ressalva.

Enquanto a Convenção de Haia de 1930 dispõe que todo Estado é livre para definir

quem são seus nacionais, desde que respeitando as normas de âmbito internacional, a

Declaração Universal de Direitos Humanos veio a dispor, em 1948, como já referendado, que

a nacionalidade seria um direito básico de qualquer indivíduo, sendo vedada, por exemplo,

sua privação arbitrária (ACNUR, 2005).

A partir de então, observando-se o disposto pela Convenção de 1930, os Estados

viram-se obrigados a tentar garantir, através de eventuais adaptações em suas legislações

internas, o acesso à nacionalidade a quaisquer indivíduos, de modo a minimizar os conflitos

de nacionalidade, sobretudo os negativos.

48

A aferição de nacionalidade, contudo, não se dá de modo irrestrito na prática, mas sim

toma por base a existência de vínculo genuíno e efetivo34

entre pessoa e país. (ACNUR,

2005). Esse entendimento foi referendado, pela primeira vez, em um caso prático submetido à

apreciação da CIJ, sucessora da CPJI no âmbito da ONU, em 1955: o simbólico caso

Nottebohm35

. No âmbito desse caso, Liechtenstein não teve a procedência de sua demanda

reconhecida visto que a nacionalidade concedida ao Sr. Nottebohm não se constituía em

vínculo efetivo (CIJ, 1955), especialmente tendo em vista o fato de a família e os laços

comerciais deste terem remanescido na Alemanha.

Entretanto, é de se notar que a aplicação do Princípio da Nacionalidade Efetiva vai de

encontro ao disposto no art. 2º da Convenção de 1930, visto que este dispõe que qualquer

questão relativa ao reconhecimento se a pessoa é ou não nacional de determinado Estado seria

definida de acordo com as leis do referido Estado. Se a aplicação deste disposto tivesse sido

feita, à literalidade, possivelmente Liechtenstein teria visto sua demanda reconhecida no caso

acima apresentado.

Prosseguindo à análise dos demais dispostos da Convenção, verifica-se que os art. 3º,

4º, 5º e 6º prestam-se à resolução dos conflitos positivos de nacionalidade, elencando uma

série de casos e situações possíveis envolvendo o polipátrida, destacando-se o disposto pelo

art. 4º: “Um Estado não pode garantir a proteção diplomática a um de seus nacionais contra

um Estado cuja nacionalidade tal pessoa também possui”.

Esta norma resolve, automaticamente, o que poderia ser a origem de uma grande crise

diplomática, ao passo que determina que o indivíduo não poderá valer-se da proteção de um

Estado do qual seja nacional, frente a outro; evitando, assim, o enfrentamento direito de dois

países que buscariam, ao mesmo tempo, pautar seus atos de acordo com os postulados de

Direitos Humanos.

Por sua vez, o art. 7º merece atenção, posto que define a utilização da chamada licença

de expatriação. Anote-se:

34 Refere-se, este termo, ao Principle of Effective Nationality, o Princípio da Nacionalidade Efetiva, consagrado em Direito Internacional.

35 O caso Nottebohm tratou-se, na verdade, de uma disputa entre Liechtenstein e Guatemala, na definição da nacionalidade e, consequentemente, na determinação de qual proteção estatal seria conferida a Friedrich Nottebohm, indivíduo nascido na Alemanha em 1881, naturalizado em Liechtenstein em 1939 e residente na Guatemala entre os anos de 1905 e 1943 sem que, contudo, tenha adquirido a nacionalidade local (HANSMANOVÁ, 2011).

49

Na medida em que o direito de um Estado prevê a emissão de uma licença de expatriação, essa autorização não implica a perda da nacionalidade do Estado que emití-lo, a menos que a pessoa a quem é emitido possui outra nacionalidade ou a menos e até que ele adquire outra nacionalidade. Uma licença de expatriação caduca se o titular não adquirir uma nova nacionalidade no prazo fixado pelo Estado, que emitiu a licença. Esta disposição não se aplica no caso de um indivíduo que, no momento em que ele recebe a autorização de expatriação, já possui uma nacionalidade diferente da do Estado pelo qual a licença é emitida para ele. O Estado cuja nacionalidade é adquirida por uma pessoa a quem um visto de expatriação tenha sido emitido, notificará tal aquisição para o Estado que emitiu a licença.

Assim, é possível encarar o art. 7º como um dispositivo de prevenção à apatridia, no

caso de aquisição voluntária de uma nova nacionalidade, fazendo com que a nacionalidade

atual do indivíduo só lhe seja retirada quando da real efetivação da outra. Caso contrário, nada

ocorrerá, visto que a licença não possui o condão de extinguir automaticamente uma

nacionalidade.

Os arts. 8º a 11º dedicam-se à proteção da nacionalidade da mulher casada. Ressalta-se

o disposto pelo art. 8º, na medida em que determina que a mulher só perderá a nacionalidade

ao contrair casamento com estrangeiro sob a condição de adquirir a nacionalidade do marido;

evitam-se, assim, os casos de conflitos de leis que poderiam gerar apatridia36

.

Seguindo; os artigos 12º a 16º referem-se à proteção dos direitos da criança37

.

Destaque para o art. 14º, primeira parte e final:

Uma criança cujos pais são desconhecidos deve ter a nacionalidade do país de nascimento. Se a filiação da criança é estabelecida, a sua nacionalidade será determinada pelas regras aplicáveis nos casos em que a paternidade é conhecido. A criança abandonada é, até prova em contrário, presume-se que tenha nascido

no território do Estado em que o foi encontrado38

.

36

A proteção ao direito de nacionalidade da mulher nubente, por tratar-se de questão delicada e origem de diversos casos de apatridia foi, posteriormente, aperfeiçoada pela assinatura da Convention on the Nationality of Married Women, a Convenção sobre a Nacionalidade da Mulher Casada, de 1957. 37 Notadamente, para o Direito Internacional, “criança” é todo indivíduo menor de 18 anos de idade.

38 Grifei.

50

As disposições destacadas referem-se aos foundlings, crianças cujos pais são

desconhecidos, encontradas abandonadas em território de determinado Estado. Trata-se de

critério importantíssimo na prevenção de apatridia visto que, de outro modo, crianças que se

vissem em tal situação em territórios de países que adotam o critério jus sanguinis seriam,

inequivocamente, apátridas.

O art. 17º, por sua vez, regulamenta a aferição e manutenção de nacionalidade no caso

de adoção internacional. Vide:

Se a lei de um Estado reconhece que a sua nacionalidade pode ser perdida como resultado da adoção, esta perda será condicionada à aquisição pela pessoa adotada da nacionalidade da pessoa por quem ele é adotado, sob a lei do Estado de que este é um nacional relativa ao efeito da adoção sobre a nacionalidade.

Este disposto também volta-se à prevenção da apatridia, ora de possível ocorrência

devido a adoção por família estrangeira. A nacionalidade do adotando só será perdida se este

vier, necessariamente, a adquirir a nacionalidade do adotante.

Do art. 18º ao art. 28º são apresentadas as disposições finais da Convenção. Destaque

para o art. 21º, que dispõe acerca da competência para dirimir eventuais conflitos acerca da

aplicação das disposições deste documento:

Se surgir entre as Altas Partes Contratantes uma disputa de qualquer tipo relativa à interpretação ou aplicação da presente Convenção e se o diferendo não possa ser

satisfatoriamente resolvido pela diplomacia, deve ser resolvida em conformidade com os acordos aplicáveis em vigor entre as partes fornecendo para a resolução de disputas internacionais. Em caso de não haver tal acordo em vigor entre as partes, o litígio deve ser submetido à arbitragem ou liquidação judicial, de acordo com o procedimento constitucional de cada uma das partes na controvérsia. Na falta de

acordo sobre a escolha de outro tribunal, a disputa será submetida à Corte Permanente de Justiça Internacional, se todas as partes em litígio são partes do Protocolo de 16 de dezembro de 1920, relativa à Estatuto desse Tribunal, e se qualquer uma das partes em litígio não é parte do protocolo de 16 de dezembro de

1920, a disputa será submetido a um tribunal arbitral constituído em conformidade com a Convenção de Haia do 18 outubro de 1907, para a Solução Pacífica dos Conflitos Internacionais.

Em complemetaridade à Convenção, foi publicado também o Protocolo Acerca de

Certo Caso de Apatridia, o qual assim dispõe:

51

In a State whose nationality is not conferred by the mere fact of birth in its territory, a person born in its territory of a mother possessing the nationality of that State and of a father without nationality or of unknown nationality shall have the nationality

of the said State39

.

Ressalte-se o fato de que este foi o primeiro dispositivo internacional exclusivamente

voltado à proteção dos apátridas, embora traga apenas uma diretriz de medida passível de

adoção.

Merece atenção o fato de que esta Convenção foi instituída no âmbito da Liga das

Nações e, portanto, o órgão competente para dirimir os conflitos seria a CPJI. Contudo, com a

dissolução da Liga das Nações, a CPJI também foi dissolvida; entretanto, com a criação da

ONU, foi criada a CIJ, órgão que veio a suceder a CPJI em matéria de competência. Destaca

Marques (2013, p. 2):

Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial, em 1939, tanto a Sociedade das Nações (SDN), como a Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI) encerraram suas atividades. O Tribunal foi recriado em 1945, com a denominação de Corte Internacional de Justiça (CIJ) e entrou em funcionamento em 1946, na cidade de Haia, como principal órgão judiciário da ONU.

Desta forma, na ocasião de aplicação desta convenção nos dias atuais, e eventual

necessidade de dirimir conflitos dela originados, buscar-se-á a CIJ para exercer tal juízo.

Após a instituição da DUDH, e com o fim da II Guerra Mundial, como já referendado,

a situação dos apátridas passou a atrair certa atenção da comunidade internacional. De fato,

em 1947, conforme aduzido por Weis (1961), a Comissão de Direitos humanos da ONU já se

preocupava com a garantia mínima de direitos aos anacionais, buscando fornecer-lhes

proteção e documentação.

Em consonância com a crescente preocupação em relação à situação de tais

indivíduos, foi instituída, em 1954, a Convenção Sobre o Estatuto dos Apátridas.

39

Em um Estado cuja nacionalidade não é conferida pelo mero fato de nascimento em seu território, uma pessoa nascida em seu território de mãe que possua a nacionalidade daquele Estado e de um pai apátrida ou de nacionalidade desconhecida deverá ter a nacionalidade do referido Estado (tradução livre).

52

Esta Convenção é considerada pela doutrina internacional, o principal instrumento que

visa regulamentar a situação dos apátridas no mundo, assegurando que não sofram qualquer

tipo de discriminação injustificada e que gozem, ao menos, de garantias básicas em termos de

Direitos Humanos. Ressalte. Note-se, contudo, que a aferição de direitos mínimos aos

apátridas não supre, de forma alguma, a aferição de uma nacionalidade, entre os Estados-parte

da Convenção, ao menos no que concerne àqueles apólidas nascidos ou habitualmente

residentes no país em questão (ACNUR, 2005).

Como já previamente destacado, o art. 1º dessa Convenção acaba por referir-se ao

apátrida de facto, e não ao de jure. Anote-se, ainda, como destaca Flores (2012), que a

Convenção não se destina à proteção dos refugiados-apátridas, conforme consta de seu

preâmbulo, visto que estes já se encontrariam abarcados pela Convenção Sobre o Estatuto dos

Refugiados, de 1951. Atente-se:

As Altas Partes Contratantes, Considerando que a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos do Homem aprovada em 10 de Dezembro de 1948 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, afirmaram o princípio de que todos os seres humanos, sem distinção alguma, devem gozar dos direitos e liberdades fundamentais,

Considerando que a Organização das Nações Unidas manifestou em diversas ocasiões o seu profundo interesse pelos apátridas e se tem esforçado por lhes assegurar o exercício mais amplo possível dos direitos e liberdades fundamentais,

Considerando que a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 28 de Julho de 1951 só é aplicável aos apátridas que também são refugiados, não abrangendo, assim, muitos deles,

Considerando que é desejável regularizar e melhorar a condição dos apátridas através de um acordo internacional.

Ademais, atente-se para as exclusões anotadas pela segunda parte do art. 1º da referida

Convenção. Não se incluiriam sob sua proteção: indivíduos que se encontrem sob a proteção

da ONU através de órgão diverso da ACNUR; pessoas que, no Estado em que possuam

residência, tenham reconhecidos direitos e obrigações condizentes com a posse de

nacionalidade daquele país; e a pessoas sobre as quais haja fundadas razões para se crer que

tenham cometido crimes contra a paz, crimes de guerra, crimes contra a humanidade, crime

não-político grave fora de seu país de residência e antes de sua admissão àquele país, ou que

tenham sido culpados de atos contrários aos propósitos da ONU.

53

Até o art. 11º, a Convenção traz suas provisões gerais. Merecem destaque os arts. 3º e

4º, no que dispõe sobre não-discriminação e liberdades religiosas dos apátridas. Anote-se:

Artigo 3.º: Não Discriminação - Os Estados-Contratantes aplicarão as disposições desta Convenção aos apátridas, sem discriminação, por motivos de raça, religião ou país de origem. Artigo 4.º: Religião - Os Estados-Contratantes concederão aos apátridas que se encontrem nos seus territórios um tratamento pelo menos tão favorável como o concedido aos nacionais no que se refere à liberdade de praticar a sua religião e à liberdade de educação religiosa dos seus filhos.

De certa forma, os dispositivos acima anotados trazem reflexos de determinações

contidas na DUDH, mais precisamente em seus arts. 1º, 2º, 7º e 18º, apenas procurando

reafirmar direitos ora garantidos indistintamente à humanidade como um todo no âmbito

específico das pessoas apátridas, buscando atribuir maior efetividade à sua aplicação.

O art. 10º é deveras peculiar, posto que traz disposição específica acerca de deslocados

forçados oriundos da II Guerra Mundial. Leia-se:

Artigo 10.º: Continuidade de Residência – 1. Quando um apátrida tiver sido deportado durante a Segunda Guerra Mundial e transportado para o território de um Estado-Contratante e ali residir, a duração dessa estadia forçada será considerada como residência regular nesse território. 2. Quando um apátrida tiver sido deportado do território de um Estado-Contratante durante a Segunda guerra Mundial e tenha voltado a esse território antes da entrada em vigor desta Convenção, para ali estabelecer residência, o período que preceder e o que se seguir a essa deportação serão considerados como um período ininterrupto para todos os fins em que seja necessária uma residência initerrupta.

Deste modo, buscou-se sanar o problema da apatridia gerada pelo deslocamento

forçado, tema tão brilhantemente abordado por Hannah Arendt em sua obra (1989), como

anteriormente exposto.

Ademais, exponha-se o determinado pelo art. 7º desta Convenção, vez que determina

expressamente o tratamento mínimo ao qual os apátridas fazem jus:

54

Artigo 7.º: Dispensa de Reciprocidade - Salvas as disposições mais favoráveis previstas nesta Convenção, todo o Estado-Contratante concederá aos apátridas o mesmo tratamento que conceder aos estrangeiros em geral.

Assim, resta garantido aos apátridas em qualquer Estado-contratante e sob quaisquer

condições que não lhes será dispensado tratamento inferior àquele dirigido aos estrangeiros

naquele mesmo local. Este disposto traz certa segurança aos apólidas, posto que, muitas

vezes, lhes era reservado tratamento em patamares de extrema inferiorização frente ao

tratamento reservado ao estrangeiro por determinado Estado.

O capítulo II dessa Convenção, entre os arts. 12º e 16º, por sua vez, presta-se à

definição do status jurídico do apátrida. Encontram-se, aqui, disposições acerca de direitos de

propriedade, direito autoral, direito de associação, status pessoal e acesso aos tribunais. Esta

última merece destaque, vejamos:

Artigo 16.º: Acesso aos Tribunais – 1. No território dos Estados-Contratantes, todo o apátrida terá livre acesso aos tribunais (órgãos jurisdicionais). 2. No Estado-Contratante onde tenha sua residência habitual, todo o apátrida beneficiará do mesmo tratamento que os nacionais, no que diz respeito ao acesso aos tribunais, incluindo a assistência judiciária e a isenção da caução judicatum solvi. 3. Nos Estados-Contratantes que não aqueles em que não tenha a sua residência habitual, e no que diz respeito às questões mencionadas no parágrafo 2, todo o apátrida beneficiará do mesmo tratamento que um nacional do país da sua residência habitual.

Verifica-se, portanto, que quanto ao acesso às Cortes, os apátridas deverão gozar das

prerrogativas conferidas aos nacionais do Estado com qual possuam vínculo de residência

efetiva. Desta forma, no Estado em que possuam residência fixa, deverão ser tratados em

patamar de igualdade com quaisquer nacionais daquele país, e em Estados outros, deverá ser

tratado como estrangeiro proveniente do Estado em que resida.

O Capítulo seguinte, dos arts. 17º a 19º, reserva-se à tutela da atividade laboral

lucrativa: emprego remunerado, trabalho por conta própria e profissões liberais. Em todos

estes artigos, constam disposições no sentido de que todos os Estados-Contratantes

concederão aos apátridas ali residentes tratamento o mais favorável possível, e nunca em

qualidade inferior ao reservado ao estrangeiro.

55

Seguindo, o capítulo IV busca dispor acerca do bem-estar do apátrida. Aqui, relevante

fazer uma análise de alguns de seus artigos, a iniciar pelo art. 22º:

Artigo 22.º: Educação Pública – 1. Os Estados-Contratantes concederão aos apátridas o mesmo tratamento que aos nacionais em matéria de ensino básico. 2. Os Estados-Contratantes concederão aos apátridas um tratamento tão favorável quanto possível e, de qualquer modo, não menos favorável que o concedido aos estrangeiros em geral nas mesmas circunstâncias, quanto ao ensino, que não o básico e, em particulat, no que se refere ai acessi ais estudos, ao reconhecimento de certificados de estudos, diplomas e títulos universitários emitidos no estrangeiro, à isenção de direitos e taxas e à concessão de bolsas de estudo.

Averigúa-se que o apátrida, pela Convenção, possui garantido, ao menos, acesso à

educação básica40

. Aliando-se este disposto às garantias do capítulo anterior, conclui-se que

esta Convenção não só obriga ao fornecimento de garantias mínimas de trabalho, como

também obriga ao fornecimento de nível de educação mínimo para a inserção no mercado.

Quanto à assistência pública e seguridade social, os arts. 23º e 24º:

Artigo 23.º: Assistência Pública – Os Estados-Contratantes concederão aos apátridas que residam legalmente nos seus territórios o mesmo tratamento que aos seus nacionais em matéria de assistência e auxílio públicos.

Artigo 24.º: Legislação do Trabalho e Segurança Social – 1. Os Estados-

Contratantes concederão aos apátridas que residam legalmente nos seus territórios o mesmo tratamento que aos nacionais no que diz respeito às matérias seguintes: a) Na

medida em que estas questões forem regulamentadas pela legislação ou dependam

das autoridades administrativas: a remuneração, incluindo os abonos de família, quando esses abonos façam parte da remuneração, horas de trabalho, disposições

sobre as horas de trabalho extraordinárias, férias pagas, restrições ao trabalho no domicílio, idade mínima de emprego, aprendizagem e formação profissional,

trabalho das mulheres e adolescentes e gozo das regalias dos contratos coletivos de

trabalho; b) A segurança social (as disposições legais relativas aos acidentes de trabalho, doenças profissionais, maternalidade, invalidez, velhice, morte,

desemprego, encargos familiares e qualquer outro risco que, em conformidade com

a legislação nacional, esteja coberto por um sistema de seguro social), fica sujeita às seguintes limitações: i) Possibilidade de aplicação de disposições adequadas

destinadas a manter diritos adquiridos e direitos em vias de aquisição; ii) Possibilidade de disposições particulares prescritas pela legislação do país de

residência acerca de benefícios, ou parte deles, pagáveis exclusivamente pelos

fundos públicos, assim como dos subsídios pagos às pessoas, que não reúnem as condições de quotização exigidas para a atribuição de uma pensão normal. 2. O

40

Sendo que a educação básica, no Brasil, consiste do período compreendido entre o 1º e o 9º ano do Ensino Fundamental, conforme determinado pelo art. 3º da Lei 11.274/06, o qual altera a redação do caput do art. 32 da Lei 9.394/96. A matrícula do aluno se dá, segundo a mesma lei, compulsóriamente aos 6 anos de idade, o que veda tacitamente a prática do homeschooling, a educação em casa, no Brasil.

56

direito à indenização pela morte de um apátrida, em conseqüência de um acidente de trabalho ou de uma doença profissional, não será prejudicado pelo fato de o beneficiário desse direito estar fora do território do Estado-Contratante. 3. Os Estados-Contratantes tronarão extensivo aos apátridas o benefício de acordos que firmaram ou venham a firmar entre si, acerca da manutenção dos direitos adquiridos ou em vias de aquisição em matéria se segurança social, sujeitos unicamente às condições que se aplicam aos nacionais dos Estados signatários dos acordos respectivos. 4. Os Estados-Contratantes examinarão com benevolência a possibilidade de alargar aos apátridas, tanto quanto seja possível, os benefícios que derivam de acordos análogos que estejam ou venham a estar em vigor entre esses Estados-Contratantes e Estados não Contratantes.

Ao analisar estas duas determinações, concluir-se-á que os apátridas, preenchidas as

condições necessárias, poderiam, a princípio, fazer jus, por exemplo, aos benefícios de

auxílio-doença, aposentadoria, auxílio-reclusão, entre outros previstos pelas leis de Segurança

Social no Brasil, nos mesmos termos reservados aos nacionais, ressalvadas as exceções

descritas. Ademais, note-se que a indenização pela morte relacionada ao trabalho pode ser

paga ao dependente do apátrida, não levando-se em consideração se ele está, ou não, no

território do Estado onde ocorreu o falecimento.

Por sua vez, o Capítulo V contém normas acerca das medidas administrativas passíveis

de adoção, em casos relativos aos apátridas. É de suma relevância o contido nos arts. 27º e

28º, acerca da emissão de documentos ao apátrida, atente-se:

Artigo 27.º: Documentos de Identidade – Os Estados-Contratantes emitirão documentos de identidade a todos os apátridas que se encontrem nos seus territórios e não possuam documento de viagem válido.

Artigo 28.º: Documentos de Viagem – Os Estados-Contratantes emitirão aos apátridas que residam legalmente nos seus territórios documentos com os quais possam viajar fora desses territórios, a não ser que a isso se oponham razões imperiosas de segurança nacional ou de ordem pública; as disposições do Anexo a esta Convenção aplicar-se-ão igualmente a estes documentos. Os Estados-Contratantes poderão emitir um desses documentos de viagem a qualquer outro apátrida que se encontre nos seus territórios; e, em particular, examinarão com benevolência os casos de apátridas que se encontrem nos seus territórios e não estejam em condições de obter documento de viagem do país em que tenham sua residência legal.

A emissão de documentos é imprescindível à efetivação de diversas outros direitos

assegurados pela Convenção, como por exemplo o direito de livre-circulação previsto pelo art.

26º. Ademais, se considerarmos os dispostos relativos ao trabalho, os quais elevam o

57

apátrida à condição de igualdade, no mínimo, aos estrangeiros, verificaremos a imperiosidade

na emissão de documentos de identidade, tendo em vista o fato de não ser possível, em

condições normais, firmar contrato de trabalho formal, abrir firma ou, até mesmo, no caso do

Brasil, emitir CTPS, sem possui qualquer documento de identificação pessoal válido. Anote-

se, também, que a segunda parte do art. 29º não isenta o apátrida ao pagamento de taxa de

emissão de documentos de identidade e encargos administrativos, igualando-o ao nacional

inclusive quanto aos deveres.

Destaque também para o art. 32º, norma que visa verdadeiramente à erradicação da

apatridia:

Artigo 32.º: Naturalização – Os estados-Contratantes facilitarão, em toda a medida do possível, a integração e naturalização dos apátridas. Esforçar-se-ão em especial por apressar o processo de naturalização e por diminuir, em toda a medida do possível, as taxas e encargos desse processo.

Este dispositivo, de ímpar relevância na análise desta Convenção, pretende a total

integração do apátrida à sociedade em que se insira, primando pela aquisição da nacionalidade

derivada. É o único dispositivo neste texto capaz de, ao menos, reduzir os índices de apatridia

entre os Estados-parte.

A partir do art. 33º, até o art. 42º, são expostas as disposições finais do tratado.

Destaca-se o art. 39º, o qual determina que a entrada em vigor deste tratado se daria no

nonagésimo dia após o depósito do sexto instrumento de ratificação. Isto ocorreu na data de 6

de junho de 1960, por ocasião da ratificação apresentada pela França em 8 de Março daquele

mesmo ano (ACNUR, 2005).

A Convenção de 1954 apresenta, até o atual momento, 78 Estados-parte, o que

representa significativo avanço nos últimos anos41

. Anotem-se:

Participant Signature Accession(a), Succession(d), Ratification

41

Houve 13 adesões definitivas entre 2009 e 2013, conforme percebe-se comparando dados disponibilizados pela ACNUR (2005, pp. 59-60) e pela ONU (2013b).

58

Albania 23 Jun 2003 a

Algeria 15 Jul 1964 a

Antigua and Barbuda 25 Oct 1988 d

Argentina 1 Jun 1972 a

Armenia 18 May 1994 a

Australia 13 Dec 1973 a

Austria 8 Feb 2008 a

Azerbaijan 16 Aug 1996 a

Barbados 6 Mar 1972 d

Belgium 28 Sep 1954 27 May 1960

Belize 14 Sep 2006 a

Benin 8 Dec 2011 a

Bolivia (Plurinational State of) 6 Oct 1983 a

Bosnia and Herzegovina 1 Sep 1993 d

Botswana 25 Feb 1969 d

Brazil 28 Sep 1954 13 Aug 1996

Bulgaria 22 Mar 2012 a

Burkina Faso 1 May 2012 a

Chad 12 Aug 1999 a

China

Colombia 30 Dec 1954

Costa Rica 28 Sep 1954 2 Nov 1977

Croatia 12 Oct 1992 d

Czech Republic 19 Jul 2004 a

Denmark 28 Sep 1954 17 Jan 1956

Ecuador 28 Sep 1954 2 Oct 1970

El Salvador 28 Sep 1954

9 Fiji

12 Jun 1972 d

Finland 10 Oct 1968 a

France 12 Jan 1955 8 Mar 1960

Georgia 23 Dec 2011 a

Germany 28 Sep 1954 26 Oct 1976

Greece 4 Nov 1975 a

Guatemala 28 Sep 1954 28 Nov 2000

Guinea 21 Mar 1962 a

Holy See 28 Sep 1954

Honduras 28 Sep 1954 1 Oct 2012

Hungary 21 Nov 2001 a

Ireland 17 Dec 1962 a

Israel 1 Oct 1954 23 Dec 1958

Italy 20 Oct 1954 3 Dec 1962

Kiribati 29 Nov 1983 d

Latvia 5 Nov 1999 a

Lesotho 4 Nov 1974 d

Liberia 11 Sep 1964 a

Libya 16 May 1989 a

Liechtenstein 28 Sep 1954 25 Sep 2009

Lithuania 7 Feb 2000 a

Luxembourg 28 Oct 1955 27 Jun 1960

Madagascar [20 Feb 1962 a]

Malawi 7 Oct 2009 a

Mexico 7 Jun 2000 a

Montenegro 23 Oct 2006 d

Netherlands 28 Sep 1954 12 Apr 1962

60

Nicaragua 15 Jul 2013 a

Nigeria 20 Sep 2011 a

Norway 28 Sep 1954 19 Nov 1956

Panama 2 Jun 2011 a

Philippines 22 Jun 1955 22 Sep 2011

Portugal 1 Oct 2012 a

Republic of Korea 22 Aug 1962 a

Republic of Moldova 19 Apr 2012 a

Romania 27 Jan 2006 a

Rwanda 4 Oct 2006 a

Senegal 21 Sep 2005 a

Serbia 12 Mar 2001 d

Slovakia 3 Apr 2000 a

Slovenia 6 Jul 1992 d

Spain 12 May 1997 a

St. Vincent and the Grenadines 27 Apr 1999 d

Swaziland 16 Nov 1999 a

Sweden 28 Sep 1954 2 Apr 1965

Switzerland 28 Sep 1954 3 Jul 1972

The former Yugoslav Republic of Macedonia 18 Jan 1994 d

Trinidad and Tobago 11 Apr 1966 d

Tunisia 29 Jul 1969 a

Turkmenistan 7 Dec 2011 a

Uganda 15 Apr 1965 a

Ukraine 25 Mar 2013 a

United Kingdom of Great Britain and Northern 28 Sep 1954 16 Apr 1959

Ireland

Uruguay 2 Apr 2004 a

61

Zambia

1 Nov 1974 d

Zimbabwe 1 Dec 1998 d

Fonte: ONU, 2013

42

As recentes adesões representam um crescente interesse internacional em conferir

proteção ao apátrida, sobretudo após as campanhas que vêm sendo feitas pela ACNUR, para

aumentar o nível de atenção em relação à figura do apátrida e sua parca tutela jurídica

internacional e interna.

Cabe ressaltar, todavia, a ressalva feita por Flores (2012, p. 74): “[...] a Convenção de

1954 não altera a nacionalidade do indivíduo e nem obriga um Estado a admitir

apátridas em seu território43

. [...] ela fomenta a proteção dos apátridas pelos Estados e os

incentiva a integração dos indivíduos apátridas através da naturalização daqueles que se

encontram em território”.

Há, ainda, uma segunda convenção que destina-se exclusivamente à tutela da apatridia.

É a Convenção de 1961 para a Redução dos Casos de Apatridia.

Esta Convenção se direciona, como seu próprio nome explica, à redução da ocorrência

de apatridia, com foco no momento do nascimento da pessoa ora apátrida (BATCHELOR,

1995, apud FLORES, 2012). Assim se verifica já do art. 1º:

Artigo 1º: 1. Todo Estado Contratante concederá sua nacionalidade a uma pessoa nascida

em seu território e que de outro modo seria apátrida44

. A nacionalidade será

concedida: (a) de pleno direito, no momento do nascimento; ou (b) mediante requerimento apresentado à autoridade competente pelo interessado ou em seu nome, conforme prescrito pela legislação do Estado em questão. Nos termos do disposto no parágrafo 2 deste Artigo, nenhum requerimento poderá ser indeferido. Todo Estado Contratante cuja legislação preveja a concessão de sua nacionalidade mediante requerimento. Segundo a alínea (b) deste parágrafo, poderá também conceder sua nacionalidade de pleno direito na idade e sob as condições prescritas em sua legislação nacional.

2. Todo Estado Contratante poderá subordinar a concessão de sua nacionalidade segundo a alínea (b) do parágrafo 1 deste Artigo a uma ou mais das seguintes condições:

42 Atente-se, contudo, para o fato de que, embora haja uma significativa adesão da comunidade internacional a esta Convenção, 36 países apresentaram reservas quando de sua adesão (ONU, 2013b).

43 Grifei.

44 Grifei.

62

(a) que o requerimento seja apresentado dentro de um período fixado pelo Estado Contratante, que deverá começar não depois da idade de dezoito anos e terminar não antes da idade de vinte e um anos, de modo que o interessado disponha de um ano, no mínimo, durante o qual possa apresentar o requerimento sem ter de obter autorização judicial para fazê-lo; (b) que o interessado tenha residido habitualmente no território do Estado Contratante por período, fixado por este Estado, não superior a cinco anos imediatamente anteriores à apresentação do requerimento nem a dez anos ao todo; (c) que o interessado não tenha sido condenado por crime contra a segurança nacional nem tenha sido condenado. em virtude de processo criminal, a cinco anos ou mais de prisão; (d) que o interessado sempre tenha sido apátrida.

3. Não obstante o disposto nos parágrafos 1 (b) e 2 do presente Artigo, todo filho legítimo nascido no território de um Estado Contratante e cuja mãe seja nacional daquele Estado, adquirirá essa nacionalidade no momento do nascimento se, do contrário, viesse a ser apátrida. 4. Todo Estado Contratante concederá sua nacionalidade a qualquer pessoa que do contrário seria apátrida e que não pôde adquirir a nacionalidade do Estado

Contratante em cujo território tiver nascido por ter passado da idade estabelecida para a apresentação de seu requerimento ou por não preencher os requisitos de residência exigidos, se no momento do nascimento do interessado um de seus pais possuía a nacionalidade do Estado Contratante inicialmente mencionado. Se seus

pais não possuíam a mesma nacionalidade no momento de seu nascimento, a legislação do Estado Contratante cuja nacionalidade estiver sendo solicitada determinará se prevalecerá a condição do pai ou da mãe. Caso seja necessário requerimento para tal nacionalidade, tal requerimento deverá ser apresentado à

autoridade competente pelo interessado ou em seu nome, conforme prescrito pela legislação do Estado Contratante. Nos termos do disposto no parágrafo 5 do presente Artigo, nenhum requerimento poderá ser indeferido. 5. Todo Estado Contratante poderá subordinar a concessão de sua nacionalidade, segundo o parágrafo 4 do presente Artigo, a uma ou mais das seguintes condições: (a) que o requerimento seja apresentado antes de o interessado atingir a idade determinada pelo Estado Contratante, a qual não poderá ser inferior a 23 anos; (b) que o interessado tenha residido habitualmente no território do Estado Contratante por período, fixado por este Estado, não superior a três anos; (c) que o interessado sempre tenha sido apátrida.

É de se notar que há possibilidade de imposição de determinadas restrições, sob

algumas hipóteses, para a concessão de nacionalidade aos apátridas como, por exemplo, o

quesito etário, a residência efetiva, que o indivíduo não represente risco à segurança nacional

e que o indivíduo nunca tenha possuído qualquer nacionalidade.

O art. 2º desta convenção presta-se à proteção dos foundlings, ora anote-se:

Artigo 2º: Salvo prova em contrário, presume-se que um menor abandonado que tenha sido encontrado no território de um Estado Contratante tenha nascido neste território, de pais que possuem a nacionalidade daquele Estado.

63

A aferição de nacionalidade em virtude de nascimento a bordo de navio ou aeronave

encontra regulamentação no art. 3º:

Artigo 3º: Para o fim de se determinarem as obrigações dos Estados Contratantes nos termos da presente Convenção, o nascimento a bordo de um navio ou uma aeronave será considerado como ocorrido no território do Estado de cuja bandeira for o navio ou no território do Estado em que a aeronave estiver matriculada, conforme o caso.

Este dispositivo, contudo, representa certa problemática.

Embora pareça, à primeira vista, uma norma eficiente para se determinar o local de

nascimento, não há real perspectiva de resolução dos conflitos de nacionalidade que poderiam

ser gerados; sobretudo em relação ao conflito positivo, posto que evidentemente haveria, nos

casos dos países signatários desta Convenção, aplicação do art. 1º desta.

O artigo 4º propõe-se a regulamentar os nascimentos dados fora do território nacional

de um Estado-Contratante que adote o jus soli, para indivíduos que, de outro modo, se veriam

apátridas.

Artigo 4º: 1. Todo Estado Contratante concederá sua nacionalidade a qualquer pessoa que não tenha nascido no território de um Estado Contratante e que do contrário seria apátrida se no momento de seu nascimento um de seus pais

possuía a nacionalidade do primeiro destes Estados45

. Se seus pais não possuíam

a mesma nacionalidade no momento de seu nascimento, a legislação daquele Estado-Contratante determinará se prevalecerá a condição do pai ou da mãe. A nacionalidade a que se refere este Artigo será concedida: (a) de pleno direito, no momento do nascimento; ou (b) mediante requerimento apresentado à autoridade competente pelo interessado ou em seu nome, conforme prescrito pela legislação do Estado em questão. Nos termos do disposto no parágrafo 2 deste Artigo, nenhum requerimento poderá ser indeferido. 2. Todo Estado Contratante poderá subordinar a concessão de sua nacionalidade, segundo o parágrafo 4 da presente Artigo, a uma ou mais das seguintes condições: (a) que o requerimento seja apresentado antes de o interessado atingir a idade determinada pelo Estado Contratante, a qual não poderá ser inferior a 23 anos; (b) que o interessado tenha residido habitualmente no território do Estado Contratante por período, fixado por este Estado, não superior a três anos; (c) que o interessado não tenha sido condenado por crime contra a segurança nacional; (d) que o interessado sempre tenha sido apátrida

45

Grifei.

64

Os artigos 5º, 6º e 7º regulamentam a perda de uma nacionalidade como conseqüência

da aquisição de outra nacionalidade. De fato, todos os artigos são categóricos em afirmar que

a perda da nacionalidade previamente possuída fica condicionada obrigatoriamente à

aquisição de uma nova nacionalidade, salvo as exceções apresentadas pelos pontos 4 e 5 do

art. 7º:

Artigo 7º: (4) Os naturalizados podem perder sua nacionalidade pelo falo de residirem em seu país de origem por um período que exceda o autorizado pela legislação do Estado Contratante, que não poderá ser inferior a sete anos

consecutivos, se não declararem perante as autoridades competentes sua intenção de conservar sua nacionalidade. (5) Em caso de nacionais de um Estado Contratante nascidos fora de seu território, a legislação desse Estado poderá subordinar a conservação da nacionalidade, a partir do ano seguinte à data em que o interessado alcançar a maioridade, ao cumprimento do requisito de residência. Naquele

momento, no território do Estado ou de inscrição no registro correspondente. (6) Salvo nos casos aos quais se refere este Artigo, uma pessoa não perderá a nacionalidade de um Estado Contratante se tal perda puder convertê-la em apátrida, ainda que tal perda não esteja expressamente proibida por nenhuma outras

disposições da presente Convenção.

Os arts. 8º e 9º, por sua vez, disporão acerca da privação de nacionalidade, haja vista

que esta não poderá, jamais, ocorrer por motivos étnicos, religiosos, políticos ou de natureza

semelhante, e em regra não se dará quando resultar em apatridia do indivíduo, impedindo,

desta forma, que a pessoa acabe por encontrar-se em um limbo jurídico. Há, contudo,

exceções à esta segunda hipótese apresentada, presentes nos pontos 2 e 3 do art. 8º:

Artigo 8º: (2) Não obstante o disposto no parágrafo 1 deste Artigo, uma pessoa

poderá ser privada da nacionalidade de um Estado Contratante: (a) nos casos em que, de acordo com os parágrafos 4 e 5 do Artigo 7, uma pessoa seja passível de

perder sua nacionalidade; (b) nos casos em que a nacionalidade tenha sido obtida por declaração falsa ou fraude. (3) Não obstante o disposto no parágrafo 1 deste

Artigo, os Estados Contratantes poderão conservar o direito de privar uma pessoa de

sua nacionalidade se, no momento da assinatura, ratificação ou adesão, especificarem que se reservam tal direito por um ou mais dos seguintes motivos,

sempre que estes estejam previstos em sua legislação nacional naquele momento: a)

quando, em condições incompatíveis com o dever de lealdade ao Estado Contratante, a pessoa: i) apesar de proibição expressa do Estado Contratante, tiver

prestado ou continuar prestando serviços a outro Estado, tiver recebido ou continuar recebendo dinheiro de outro Estado; ou ii) tiver se conduzido de maneira

gravemente prejudicial aos interesses vitais do Estado; b) quando a pessoa tiver

prestado juramento de lealdade ou tiver feito uma declaração formal de lealdade a outro Estado, ou dado provas decisivas de sua determinação de repudiar a lealdade

que deve ao Estado Contratante.

65

Finalmente, o art. 10º aborda a questão de transferência de territórios entre Estados-

parte da Convenção, sendo estes obrigados a assegurar a não-geração de apatridia como

conseqüência deste feito:

Artigo 10º: (1) Todo tratado entre os Estados Contratantes que dispuser sobre a transferência de território deverá incluir disposições para assegurar que os habitantes do referido território não se converterão em apátridas como resultado de tal transferência. Os Estados Contratantes se empenharão em assegurar que tais disposições figurem em todo tratado desse gênero realizado com um Estado que não seja Parte na presente Convenção. (2) Na ausência de tais disposições, o Estado Contratante ao qual tenha sido cedido um território ou que de outro modo haja adquirido um território atribuirá sua nacionalidade aos habitantes do referido território que de outro modo se tomariam apátridas como resultado da transferência ou aquisição de tal território.

Do art. 11º ao art. 21º encontram-se as disposições finais da Convenção. Destaca-se,

dentre estes, o art. 14º, o qual delega a competência para dirimir conflitos à CIJ:

Artigo 14º: Toda controvérsia que surja entre Estados Contratantes referente à interpretação ou á aplicação da presente Convenção que não possa ser solucionada por outros meios poderá ser submetida à Corte Internacional de Justiça por iniciativa de qualquer das partes da controvérsia.

Ainda, como destaca Flores (2012), a Acta Final recomenda que os apátridas de facto

sejam, para efeitos de concessão e aquisição de nacionalidade, tomadas como apátridas de

jure, de modo a garantir maior efetividade na aplicação das normas ora dispostas pela

Convenção.

A Convenção de 1961 possui, até o presente momento, 53 Estados-parte, o que

também demonstra importante progresso através dos últimos anos46

, conforme também

ocorre com a Convenção de 1954. Vide os atuais membros:

46

Houve 16 adesões definitivas entre 2009 e 2013, conforme percebe-se comparando dados disponibilizados pela ACNUR (2005, p. 46) e pela ONU (2013c).

66

Participant Signature Accession(a), Succession(d), Ratification

Albania 9 Jul 2003 a

Armenia 18 May 1994 a

Australia 13 Dec 1973 a

Austria 22 Sep 1972 a

Azerbaijan 16 Aug 1996 a

Benin 8 Dec 2011 a

Bolivia (Plurinational State of) 6 Oct 1983 a

Bosnia and Herzegovina 13 Dec 1996 a

Brazil 25 Oct 2007 a

Bulgaria 22 Mar 2012 a

Canada 17 Jul 1978 a

Chad 12 Aug 1999 a

Costa Rica 2 Nov 1977 a

Croatia 22 Sep 2011 a

Czech Republic 19 Dec 2001 a

Denmark 11 Jul 1977 a

Dominican Republic 5 Dec 1961

Ecuador 24 Sep 2012 a

Finland 7 Aug 2008 a

France 31 May 1962

Germany 31 Aug 1977 a

Guatemala 19 Jul 2001 a

Honduras 18 Dec 2012 a

Hungary 12 May 2009 a

Ireland 18 Jan 1973 a

Israel 30 Aug 1961

7 Jamaica 9 Jan 2013 a

Kiribati 29 Nov 1983 d

Latvia 14 Apr 1992 a

Lesotho 24 Sep 2004 a

Liberia 22 Sep 2004 a

Libya 16 May 1989 a

Liechtenstein 25 Sep 2009 a

Lithuania 22 Jul 2013 a

Netherlands 30 Aug 1961 13 May 1985

New Zealand 20 Sep 2006 a

Nicaragua 29 Jul 2013 a

Niger 17 Jun 1985 a

Nigeria 20 Sep 2011 a

Norway 11 Aug 1971 a

Panama 2 Jun 2011 a

Paraguay 6 Jun 2012 a

Portugal 1 Oct 2012 a

Republic of Moldova 19 Apr 2012 a

Romania 27 Jan 2006 a

Rwanda 4 Oct 2006 a

Senegal 21 Sep 2005 a

Serbia 7 Dec 2011 a

Slovakia 3 Apr 2000 a

Swaziland 16 Nov 1999 a

Sweden 19 Feb 1969 a

Tunisia 12 May 2000 a

Turkmenistan 29 Aug 2012 a

68

Ukraine 25 Mar 2013 a

United Kingdom of Great Britain and Northern 30 Aug 1961 29 Mar 1966 Ireland

Uruguay 21 Sep 2001 a

Fonte: ONU, 2013

No que tange a ambas as Convenções relativas à apatridia, como meio de ilustração

desse crescente interesse dos Estados em aderir às suas disposições, observe-se o seguinte

gráfico, no tocante ao progresso dos processos de pedidos de acessão:

Fonte: ACNUR, 2010

Note-se, ainda, o seguinte gráfico, o qual relaciona o crescimento ao longo dos anos

nos número de Estados-parte de ambas as Convenções, comparativamente, e notadamente o

rápido aumento de adesões a partir de meados da década de 1990:

69

Fonte: ACNUR, 2010

Destaca-se, por fim, a distribuição mundial de países signatários das Convenções de

1954 e 1961, e países que sinalizaram intenções de adesão. Atente-se para o alto índice de

adesão definitiva na Europa, a grande sinalização de intenções a aderir na América do Sul e

África, enquanto que a Ásia mantém-se quase absolutamente inerte em relação à adesão:

70

Fonte: ACNUR, 2013a

Quanto à ação interna de alguns Estados diante do respeito aos tratados internacionais,

importante ressaltar alguns exemplos de medidas recentemente adotadas.

É mister ilustrar a atuação do Quirguistão. Em 1991 o país conquistou sua

independência com a quebra da União Soviética, sendo que diversos indivíduos cujas origens

remontam às demais ex-repúblicas soviéticas encontraram-se em situação de apatridia; de

fato, segundo estimativas da ACNUR, em 2010, ainda havia 20.000 apátridas neste país.

Entretanto, embora não signatário das Convenções, o governo têm se mostrado atencioso à

situação, procurando reduzir a apatridia do modo mais célere o possível (ACNUR, 2010).

Ainda, até 2012, alguns países, como por exemplo Egito, Indonésia (não signatários) e

Tunísia (signatário de ambas as Convenções), alteraram suas legislações internas, conferindo

às mulheres as mesmas prerrogativas que os homens já possuíam de transmitir sua

nacionalidade aos filhos (ACNUR, 2012). Mais recentemente, em 28/06/2013, também o

Senegal promoveu alterações semelhantes em sua legislação (ACNUR, 2013).

71

Outro caso que merece menção frente ao cenário internacional de minoração da

apatridia, embora não signatário das Convenções, é o de Bangladesh. Segundo dados da

ACNUR, aproximadamente 240.000 indivíduos da etnia Bihari, proveniente do Paquistão,

permaneceram vivendo em péssimas condições em Bangladesh por décadas, visto não serem

reconhecidos como nacionais. Essa situação, gerada pela independência do país frente ao

Paquistão em 1971, está sendo gradualmente melhorada, após o reconhecimento do direito à

cidadania bangladeshi por parte do Superior Tribunal de Dakha aos falantes do idioma Urdu,

cujo pai ou avô tenha nascido em Bangladesh e fosse residente permanente em 1971 ou que,

desde então, tenha permanecido com residência no país. Além disso, este país também

reformou recentemente a legislação de transmissão da nacionalidade pelo ramo feminino

(ACNUR, 2011).

Entretanto, embora haja iniciativas bem-sucedidas de redução da apatridia, nem todas

transcorrem tranquilamente. É o caso dos indivíduos de origem eritréia que habitam a Etiópia,

após o fim da guerra civil que assolou a região entre 1963 e 1993 e culminou com a

independência da Eritréia como país. Embora, no ano de 2003, a Etiópia tenha promulgado

uma lei que permitia aos 120.000 eritréios habitantes de seu território readquirirem a

nacionalidade etíope47

, ainda é grande a discriminação entre as populações, tornando a

relação entre os dois povos e países demasiado tensas, e pondo em risco os direitos adquiridos

com a aquisição de nacionalidade. Destaque-se que nenhum destes países é signatário de

qualquer das Convenções (ACNUR, 2011).

Contudo, o tratamento dado à questão dos apátridas no âmbito dos direitos internos é

variável. Enquanto países como Brasil, EUA, Espanha e México tratam do assunto a nível

constitucional, há países como Grécia e Portugal que cuidam do tema no âmbito do Direito

Civil e, ainda, países como Argentina e França que regulam a matéria com leis ordinárias de

direito público (FLORES, 2012).

Também, importante mencionar a ação direta da ACNUR na promoção de realocação

de indivíduos atingidos pela apatridia. Em 1992, por exemplo, aproximadamente 100.000

pessoas foram privadas de sua nacionalidade pelo Butão, país não signatário das Convenções,

por motivos étnicos – fato expressamente proibido pelo art. 9º da Covenção de 1961. Esses

indivíduos foram provisoriamente instalados no Nepal, também não-signatário, em campos de

47

Em oposição ao entendimento divulgado em 1993, no qual o país afirmou que todos aqueles que haviam votado no referendum pela independência da Eritréia e permaneceram no território da Etiópia haviam renunciado à nacionalidade etíope.

72

refugiados (ALMEIDA; BITTAR, 2008, apud FLORES, 2012). Entretanto, até o ano de 2010,

a ACNUR, em parceria com a OIM, já havia reassentado aproximadamente 40.000 destes

indivíduos em países como Reino Unido, Holanda, Noruega, Canadá e Austrália (ACNUR,

2010). Este programa continuará em andamento até que todos os refugiados-apátridas sejam

reassentados ou repatriados pelo Butão, caso a lei assim passe a permitir.

Anote-se, por fim, a tabela mais atual da ACNUR, datada de 2012, acerca do número

de apátridas no mundo, distribuídos por país:

Overview – Persons of concern to UNHCR

Year

Country / territory of residence

Stateless persons

2012 Albania 7,443

2012 Armenia 35

2012

Austria

542

2012 Azerbaijan 3,585

2012 Belarus 6,969

2012 Belgium 3,898

2012 Bosnia and Herzegovina 4,5

2012 Brazil *

2012 Brunei Darussalam 21,009

2012 Burundi 1,302

2012

Colombia

12

2012 Côte d'Ivoire 700

2012 Croatia 2,886

2012 Czech Republic 1,502

2012 Denmark 3,623

2012 Egypt 60

2012 Estonia 94,235

2012 Finland 2,017

2012 France 1,21

2012 Georgia 1,156

2012 Germany 5,683

2012 Greece 154

2012 Honduras *

2012 Hong Kong SAR, China *

73

2012 Hungary 111

2012

Iceland

119

2012

Iraq

120

2012 Ireland 73

2012 Israel 14

2012 Italy 470

2012 Japan 1,1

2012 Kazakhstan 6,935

2012 Kenya 20

2012 Kuwait 93

2012 Kyrgyzstan 15,473

2012 Latvia 280,759

2012 Liechtenstein 5

2012

Lithuania

4,13

2012

Luxembourg

177

2012 Malaysia 40,001

2012 Mexico 7

2012

Mongolia

220

2012

Montenegro

3,383

2012 Myanmar 808,075

2012

Netherlands

2,005

2012

Nicaragua

*

2012 Norway 2,313

2012 Panama *

2012 Philippines 6,015

2012 Poland 10,825

2012 Portugal 553

2012 Qatar 1,2

2012 Republic of Korea 179

2012 Republic of Moldova 1,998

2012 Romania 248

2012 Russian Federation 178

2012 Saudi Arabia 70

2012 Serbia (and Kosovo: S/RES/1244 (1999)) 8,5

2012 Slovakia 1,523

74

2012 Slovenia *

2012

Spain

36

2012

Sweden

9,596

2012 Switzerland 69

2012

Syrian Arab Republic

221

2012 Tajikistan 2,3

2012 Thailand 506,197

2012

The former Yugoslav Republic of Macedonia

905

2012 Turkey 780

2012 Turkmenistan 8,947

2012

Ukraine

35

2012 United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland 205

2012 Viet Nam 11,5

Fonte: ACNUR, 2012

Note-se que os dois únicos países que, atualmente, de acordo com os dados oficiais,

possuem mais de meio milhão de apátridas em seu território, quais sejam, Tailândia e

Mianmar48

, não são signatários de qualquer das Convenções relativas ao tema. A Tailândia,

contudo, de acordo com dados do mesmo órgão, firmou compromisso perante o Alto

Comissariado visando implementar reformas legislativas para reduzir e prevenir a apatridia,

bem como facilitar o acesso ao registro civil e emissão de documentos para estes indivíduos.

Com efeito, é possível verificar que todos os países no globo que possuem mais de

10.000 apátridas vivendo em seu território não são signatários de qualquer tratado relativo à

prevenção e redução da apatridia, à exceção da Letônia, terceira colocada no ranking de países

com maior número de apátridas.

48

Antiga “Burma”.

75

Frente a estes dados há que se chegar a duas conclusões: primeiramente, a apatridia

pode ser concretamente reduzida e prevenida por ocasião da adesão às Convenções, desde que

adequadamente incorporadas à ordem jurídica interna e aplicadas de modo eficaz no território

do Estado nacional; em segundo lugar, verifica-se um grave problema de real efetividade

desta Convenção em áreas críticas, como a Ásia, posto que diversos países com sérias

questões relativas a apátridas não sinalizam qualquer intenção em aderir aos postulados das

Convenções.

2.2.2. No âmbito europeu

No continente europeu, verifica-se a incidência de alguns casos específicos mais

graves em relação à apatridia: a sucessão de Estados, com a quebra da URSS e da Iugoslávia,

acabou por gerar problemas particularmente sérios em relação à nacionalidade de indivíduos

nos Bálcãs e no Báltico; a questão do povo Roma, popularmente identificados como ciganos,

de tradição nômade e que se deslocam entre países, sem que, em regra, vejam seus direitos

básicos reconhecidos por nenhum; e, finalmente, a problemática gerada pelos incessantes

fluxos migratórios, vindos, sobretudo, do norte da África e do Oriente Médio, e a xenofobia

enfrentada por tais migrantes não só por parte da população européia, mas também por parte

dos governos desses países.

Acerca das Convenções de 1954 e 1961 em relação à apatridia, atente-se para o mapa

ilustrativo da adesão européia:

76

Fonte: ACNUR, 2013b

Visualiza-se claramente que alguns dos países que mais recebem os fluxos migratórios

vindos da África são signatários apenas de um dos tratados. Ademais, destaca-se que a

Estonia, um dos países com situações mais graves em relação à apatridia, não é signatária de

qualquer dos tratados internacionais relativos ao tema.

A Europa possui, além dos elevados índices de adesão às Convenções previamente

analisadas dentro do SGDH, um sistema próprio de amparo e proteção aos direitos básicos do

indivíduo: o SEDH49

, representado em seu órgão máximo, a CEDH.

A CEDH é um órgão supranacional, que possui como função analisar conflitos

relativos a Direitos Humanos e dar soluções plausíveis, no âmbito europeu. Foi estabelecido

pela Convenção Européia de Direitos Humanos, no âmbito do Conselho Europeu, em 195050

.

49 Sendo, este, um dos três sistemas regionais de amparo aos Direitos Humanos existentes no mundo; os outros dois são o Sistema Africano e o Sistema Interamericano.

50 Muito embora esta Convenção tenha tornado-se efetiva em 1953, a Corte só foi criada em 1959, em caráter provisório. O caráter permamanente da Corte foi estabelecido em 1998.

77

Muito embora a Convenção Européia de Direitos Humanos não traga disposições

específicas acerca da proteção dos direitos do apátrida, ou normas acerca da aquisição e perda

de nacionalidade, a CEDH procurou proclamar, em momento posterior, instrumento

específico à tutela de tais assuntos. Trata-se da CEN, proclamada em 1997 na cidade de

Estrasburgo, a seguir analisada.

Seu primeiro capítulo, compreendendo os arts. 1º e 2º, traz as disposições gerais

quanto à Convenção. Destaque-se o art. 2º, o qual apresenta determinados conceitos

encontrados reiteradamente permeados nas demais disposições do texto ora analisado. Atenção, sobretudo, ao conceito contido no item “a”:

Artigo 2.º: Definições – Para os fins da presente Convenção:

a) «Nacionalidade» designa o vínculo jurídico entre um indivíduo e um Estado,

não indicando, contudo, a origem étnica desse indivíduo;51

b) «Pluralidade de nacionalidades» designa a posse simultânea, por um mesmo indivíduo, de duas ou mais nacionalidades;

c) «Menor» designa um indivíduo com menos de 18 anos de idade, salvo se, nos termos da lei aplicável ao menor, a maioridade for alcançada mais cedo;

d) «Direito interno» designa todo o tipo de disposições contidas no sistema jurídico nacional, incluindo a constituição, a legislação, os regulamentos, os decretos, a jurisprudência, as normas consuetudinárias e a prática, bem como as normas resultantes de instrumentos internacionais vinculativos.

O capítulo II trata dos princípios gerais relativos à nacionalidade. Leia-se o art. 3º,

notadamente o disposto pelo item 2, primeira parte:

Artigo 3.º: Competência do Estado

1 - Cada Estado determinará quem são os seus nacionais nos termos do seu direito interno.

2 - Tal direito será aceite por outros Estados na medida em que seja consistente com as convenções internacionais aplicáveis, com o direito internacional consuetudinário e com os princípios legais geralmente reconhecidos no tocante à nacionalidade.

51

Grifei.

78

Esta determinação pode nos remeter às previsões contidas nas convenções sobre a

apatridia e, até mesmo, ao célebre art. 15º da DUDH. Esta alusão confirma-se no conteúdo do

art. 4º:

Artigo 4.º: Princípios – As normas de cada Estado sobre a nacionalidade basear-se-ão nos seguintes princípios:

a) Todos os indivíduos têm direito a uma nacionalidade;

b) A apatridia deverá ser evitada;

c) Nenhum indivíduo será arbitrariamente privado da sua nacionalidade;

d) Nem o casamento ou a dissolução de um casamento entre um nacional de um Estado Parte e um estrangeiro, nem a alteração de nacionalidade por um dos cônjuges durante o casamento, afectará automaticamente a nacionalidade do outro cônjuge.

O art. 5º, inciso 1, também guarda certa relação com outras disposições, notadamente

com o art. 9º da Convenção de 1961. Por sua vez, o inciso 2 reflete determinação semelhante

à contida no art. 12, §2º, da CFRB/88, exceto pelo fato de não comportar, em análise literal,

exceções, vejamos:

Artigo 5.º: Não discriminação

1 - As normas de um Estado Parte sobre nacionalidade não conterão distinções nem incluirão qualquer prática que conduza à discriminação em razão de sexo, religião, raça, cor ou origem nacional ou étnica.

2 - Cada Estado Parte regular-se-á pelo princípio da não discriminação entre os seus nacionais, independentemente da nacionalidade ter sido adquirida por nascimento ou em qualquer momento subsequente.

O capítulo seguinte traz normas relativas à aquisição de nacionalidade. Notadamente,

as disposições gerais acerca do tema estão contidas no art. 6º:

Artigo 6.º: Aquisição de nacionalidade

1 - Cada Estado providenciará no sentido de o seu direito interno prever a aquisição da nacionalidade ex lege pelos seguintes indivíduos:

79

a) Menores cujo pai ou mãe possuam, à data do nascimento de tais menores, a

nacionalidade desse Estado Parte, salvo quaisquer exceções previstas pelo respectivo

direito interno no tocante a menores nascidos no estrangeiro. Relativamente a menores

cuja paternidade seja estabelecida por reconhecimento, decisão do tribunal ou

procedimento similar, cada Estado Parte poderá providenciar no sentido de o menor

adquirir a sua nacionalidade nos termos previstos pelo seu direito interno;

b) Recém-nascidos abandonados, encontrados no seu território, e que, de outro

modo, seriam apátridas52

.

2 - Cada Estado Parte deverá prever, no seu direito interno, a faculdade de aquisição da sua nacionalidade por menores nascidos no seu território e que

não adquiram outra nacionalidade quando do nascimento53

. Tal nacionalidade será concedida:

a) Por nascimento ex lege; ou

b) Subsequentemente, a menores que permaneceram apátridas, mediante pedido formulado à autoridade competente, por ou em nome do menor em

causa, segundo a forma prevista pelo direito interno do Estado Parte54

. A aceitação de tal pedido poderá ficar dependente de residência legal e habitual no seu território por um período imediatamente anterior à formulação do pedido não superior a cinco anos.

3 - Cada Estado Parte deverá prever no seu direito interno a faculdade de naturalização de indivíduos legal e habitualmente residentes no seu território. Ao estabelecer as condições para efeitos de naturalização, esse Estado Parte estabelecerá um período de residência não superior a 10 anos imediatamente anterior à formulação do pedido.

4 - O direito interno de cada Estado Parte permitirá a aquisição da sua nacionalidade pelos seguintes indivíduos:

a) Cônjuges dos seus nacionais;

b) Filhos menores de um dos seus nacionais aos quais seja aplicável a excepção prevista no artigo 6.º, n.º 1, alínea a);

c) Menores cujo pai ou mãe adquira ou tenha adquirido a sua nacionalidade;

d) Menores adoptados por um dos seus nacionais;

e) Indivíduos que tenham nascido no seu território e aí residam legal e habitualmente;

f) Indivíduos que residam legal e habitualmente no seu território há um determinado período de tempo com início antes de atingirem a idade de 18 anos, devendo tal período ser determinado pelo direito interno do Estado Parte em causa;

g) Apátridas e refugiados reconhecidos, legal e habitualmente residentes no seu

território55

.

52 Grifei.

53 Grifei.

54 Grifei.

55 Grifei.

80

Atenção especial para o ítem “b” do inciso 1, o qual aborda a temática dos foundlings,

nos mesmos parâmetros previstos pelo art. 14º da Convenção sobre Conflitos de

Nacionalidade de 1930 e do art. 2º da Convenção de 1961.

O art. 8º, já citado anteriormente, também contém expressa norma de prevenção à

ocorrência de apatridia, em seu inciso 1, disposição esta simétrica às apontadas nos arts. 5º a

7º da Convenção de 1961:

Artigo 8.º: Perda de nacionalidade por iniciativa do indivíduo

1 - Cada Estado Parte permitirá a renúncia à sua nacionalidade, desde que os indivíduos em causa não se tornem apátridas.

Ou seja, aduz-se que a perda de uma nacionalidade fica obrigatoriamente vinculada à

aquisição de outra, ressalvadas as exceções elencadas no art. 7º, 1, “b”, desta mesma Convenção, quais sejam, “aquisição da nacionalidade do Estado Parte mediante conduta

fraudulenta, informações falsas ou encobrimento de quaisquer fatos relevantes atribuíveis ao

requerente”.

No capítulo IV, são abordados os temas tocantes aos procedimentos relativos à

nacionalidade, delegando-se à esfera interna dos Estados-Contratantes dispor, com

razoabilidade, sobre o processamento de pedidos, decisões de concessão, conservação, perda e

recuperação, bem como sobre o direito a recorrer sobre estas decisões, e em relação às custas

do procedimento.

O capítulo V, por sua vez, dispõe acerca da pluralidade de nacionalidades, ou seja,

sobre casos nos quais ocorra o conflito positivo. Destaque para o disposto no art. 16º:

Artigo 16.º: Conservação de nacionalidade anteriormente adquirida

Nenhum Estado Parte fará da renúncia ou da perda de outra nacionalidade condição para a aquisição ou conservação da sua nacionalidade, nos casos em que tal renúncia ou perda não se mostre viável ou não possa ser razoavelmente exigida.

81

Tal norma proíbe expressamente que seja exigida a renúncia de uma nacionalidade

como condição para que se obtenha outra, caso isto não seja viável.

Assim, hipoteticamente, verifica-se que caso um indivíduo seja, por qualquer motivo,

proibido de abandonar sua nacionalidade de origem ele poderia, caso este país fosse signatário

da CEN, adquirir a nacionalidade andorrana, mesmo que a Lei de Nacionalidade de Andorra

proíba, expressamente, a dupla nacionalidade. Nas palavras da Exposição de Motivos da

referida lei:

[...] La tendència a fer coincidir la població de fet amb la de dret no juga solament em el sentit de l’adquisició de la ciutadania andorrana pels que neixen i viuen al país, sinó que, de manera simètrica, exigeix la pèrdua de la nacionalitat en cas

contrari, i la prohibició de la doble nacionalitat56

. [...]

Atente-se que Andorra é, notadamente, um dos países com lei de aquisição de

nacionalidade mais restritivas ainda em vigor, baseada quase que exclusivamente no jus

sanguinis. Considerando-se, também, que o país não é signatário de qualquer das convenções

em relação à nacionalidade e à apatridia, poderia este ser um local com elevados índices de

apatridia, caso não se tratasse de país tão pequeno e de difícil acesso57

.

De volta à análise da CEN, o capítulo VI aborda a problemática da sucessão de

Estados e nacionalidade.

Mazzuoli (2010) explana que as diretrizes do Direito Internacional na modernidade

voltam-se, preferencialmente, à aplicação da nacionalidade do novo Estado à população ali

residente; contudo, ficaria resguardado o direito à opção pela manutenção da antiga

nacionalidade. Destaca-se o caso relatado por Dérens (2007, apud DREBES, 2012), quanto à

criação do Kosovo onde, através do Plano Ahtisaari58

, foi oferecida aos sérvios habitantes da

localidade a opção de obter dupla nacionalidade, como um meio de evitar um possível êxodo

deste segmento populacional, bem como conter eventuais conflitos que pudessem surgir.

56 A tendência em fazer coincidir a população de fato com a de direito não só reproduz o sentido da aquisição da nacionalidade andorrana para aqueles que nasceram e vivem no país, mas, simetricamente, exige a perda da nacionalidade em caso contrário, e a proibição da dupla nacionalidade (tradução livre).

57 Andorra é um país montanhoso, localizado nos Pirineus ibéricos, o qual não possui ferrovias ou, sequer, aeroportos. Seu acesso se dá quase que exclusivamente através de estradas, partindo-se da França ou da Espanha.

58 O Plano Ahtisaari, ratificado pela declaração de independência do Kosovo, previa ao país uma edificação sob supervisão internacional, visto ser a única opção viável para garantir a estabilidade na região. Seu nome vem de seu propositor, o diplomata finlandês Martti Ahtisaari, Nobel da Paz em 2008.

82

O entendimento acima expressado encontra fulcro no art. 20º da Convenção:

Artigo 20.º: Princípios relativos a não nacionais – Os Estados Partes observarão os seguintes princípios:

a) Os nacionais de um Estado predecessor, habitualmente residentes no território cuja soberania for transferida para um Estado sucessor e que não tenham adquirido a sua nacionalidade, terão o direito de permanecer naquele Estado;

b) Os indivíduos referidos na alínea a) gozarão de tratamento igual ao dispensado a nacionais do Estado sucessor relativamente a direitos sociais e económicos.

2 - Cada Estado Parte poderá recusar emprego no funcionalismo público aos indivíduos referidos no n.º 1, se tal emprego implicar o exercício de poderes soberanos.

Já o capítulo VII procura definir as obrigações militares em caso de pluralidade de

nacionalidades. Esta espécie de disposição se faz necessária haja vista que diversos Estados

impõem a seus nacionais o serviço militar obrigatório59

; muito embora na Europa a tendência

atual volte-se ao banimento desta prática, países signatários como Áustria, Finlândia, Grécia e

Moldávia ainda aplicam a conscrição militar.

Acerca dos conflitos que poderiam se originar, o art. 21º:

Artigo 21.º: Cumprimento de obrigações militares

1 - Os indivíduos que possuam a nacionalidade de dois ou mais Estados Partes serão solicitados a cumprir as suas obrigações militares relativamente a apenas

um desses Estados Partes.60

2 - As formas de aplicação do disposto no n.º 1 poderão ser estabelecidas mediante acordos específicos a celebrar entre os Estados Partes.

3 - Salvo se de outro modo disposto num acordo específico celebrado ou a celebrar, são aplicáveis as seguintes disposições a indivíduos que possuam a nacionalidade de dois ou mais Estados Partes:

a) Qualquer desses indivíduos ficará sujeito a obrigações militares relativamente ao Estado Parte em cujo território resida habitualmente. Contudo, poderá optar livremente, até à idade de 19 anos, por cumprir as obrigações militares, como voluntário, relativamente a qualquer outro Estado Parte de que seja igualmente nacional, por um período total e efectivo igual, pelo menos, ao período de serviço militar activo exigido pelo anterior Estado Parte;

59 Notadamente, o Brasil é um exemplo.

60 Grifei.

83

b) Os indivíduos que residam habitualmente no território de um Estado Parte de que não sejam nacionais, ou no território de um Estado que não seja Estado Parte, podem optar por cumprir o seu serviço militar no território de qualquer Estado Parte de que sejam nacionais;

c) Os indivíduos que, em conformidade com as normas estabelecidas nas alíneas a) e b), cumpram as suas obrigações militares relativamente a um Estado Parte, conforme previsto pelo direito interno de tal Estado Parte, serão considerados como tendo cumprido as suas obrigações militares relativamente a qualquer outro Estado Parte ou Estados Partes de que sejam igualmente nacionais;

d) Os indivíduos que, antes da entrada em vigor da presente Convenção entre os Estados Partes de que sejam nacionais, tenham cumprido as suas obrigações militares relativamente a um desses Estados Partes, em conformidade com o direito interno desse Estado Parte, serão considerados como tendo cumprido as mesmas obrigações relativamente a qualquer outro Estado Parte ou a quaisquer outros Estados Partes de que sejam nacionais;

e) Os indivíduos que, em conformidade com a alínea a), tenham cumprido o seu serviço militar activo relativamente a um dos Estados Partes de que sejam nacionais e que, subsequentemente, transfiram a sua residência habitual para o território de outro Estado Parte de que sejam nacionais ficarão sujeitos à prestação de serviço militar na reserva apenas relativamente a este Estado Parte;

f) A aplicação do presente artigo não prejudicará, de forma alguma, a nacionalidade dos indivíduos em causa;

g) Em caso de mobilização por qualquer Estado Parte, as obrigações decorrentes do disposto no presente artigo não serão vinculativas para esse Estado Parte

O capítulo VIII, compreendido entre os arts. 23º e 24º, regulamenta a cooperação entre

os Estados-parte. Em linhas gerais, aqui encontram-se normas relativas à divulgação de

informações relativas à aquisição da nacionalidade de certo Estado, quando solicitado e de

acordo com as ressalvas relacionadas à proteção de dados, a outros países ou ao Conselho

Europeu.

A seguir, o capítulo IX dispõe quanto à da aplicação da convenção. Atenção para o

elencado pelo art. 26º:

Artigo 26.º: Efeitos da presente Convenção

1 - O disposto na presente Convenção não prejudicará o direito interno nem instrumentos internacionais vinculativos que estejam ou venham a estar em vigor, nos termos dos quais são ou seriam acordados direitos mais favoráveis às

pessoas no domínio da nacionalidade.61

2 - A presente Convenção não prejudica a aplicação: 61

Grifei.

84

a) Da Convenção de 1963 sobre a Redução dos Casos de Pluralidade de Nacionalidades e Obrigações Militares em casos de Pluralidade de Nacionalidades e seus Protocolos;

b) De outros instrumentos internacionais vinculativos, na medida em que tais instrumentos sejam compatíveis com a presente Convenção; nas relações entre os Estados Partes vinculados por tais instrumentos.

A partir do art. 27º, até o art. 32º, encontram-se as disposições finais da Convenção,

merecendo atenção o conteúdo do art. 27º, no que tange à assinatura e entrada em vigor deste

instrumento internacional:

Artigo 27.º: Assinatura e entrada em vigor

1 - A presente Convenção ficará aberta à assinatura pelos Estados membros do Conselho da Europa e pelos Estados não membros que tenham participado na sua elaboração. Tais Estados poderão expressar o seu consentimento em ficarem vinculados mediante:

a) A assinatura sem reserva de ratificação, aceitação ou aprovação; ou

b) A assinatura sujeita a ratificação, aceitação ou aprovação, seguida de ratificação, aceitação ou aprovação.

Os instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação serão depositados junto do Secretário-Geral do Conselho da Europa.

2 - A presente Convenção entrará em vigor, relativamente a todos os Estados

que tenham expresso o seu consentimento em ficarem vinculados por ela, no 1.º dia do mês seguinte à expiração de um prazo de três meses a contar da data em

que três Estados membros do Conselho da Europa tenham expresso o seu

consentimento em ficarem vinculados pela presente Convenção em

conformidade com o disposto no número precedente.62

3 - Relativamente a qualquer Estado que expresse subsequentemente o seu consentimento em ficar vinculado pela Convenção, esta entrará em vigor no 1.º dia do mês seguinte à expiração de um período de três meses a contar da data de assinatura ou de depósito do seu instrumento de ratificação, aceitação ou aprovação.

A CEN entrou em vigor em 1º de março de 2000, após a ratificação desta pela

Moldávia, em 30 de novembro de 1999.

Em relação às assinaturas e ratificações da CEN:

62

Grifei.

85

European Convention on Nationality: Status as of: 12/9/2013

Member States of the Council of Europe

Notes: a: Accession - s: Signature without reservation as to ratification - su: Succession - r: Signature "ad referendum".

R.: Reservations - D.: Declarations - A.: Authorities - T.: Territorial Application - C.: Communication - O.:

Objection

States

Signature

Ratification Entry into

Notes

R.

D.

A.

T.

C. O.

force

Albania 7/5/1999 11/2/2004 1/6/2004 X

Andorra

Armenia

Austria 6/11/1997 17/9/1998

X

X

1/3/2000

Azerbaijan

Belgium

Bosnia and Herzegovina 31/3/2006 22/10/2008 1/2/2009

X

Bulgaria 15/1/1998 2/2/2006

X

X

1/6/2006

Croatia 19/1/2005

Cyprus

Czech Republic 7/5/1999 19/3/2004 1/7/2004

X

Denmark 6/11/1997 24/7/2002

X

X

1/11/2002

Estonia

Finland 6/11/1997 6/8/2008

X

X

1/12/2008

France 4/7/2000

Georgia

Germany 4/2/2002 11/5/2005

X

X

1/9/2005

Greece 6/11/1997

Hungary 6/11/1997 21/11/2001

X

X

1/3/2002

Iceland 6/11/1997 26/3/2003 1/7/2003

Ireland

Italy 6/11/1997

Latvia 30/5/2001

Liechtenstein

Lithuania

Luxembourg 26/5/2008

Malta 29/10/2003

86

Moldova 3/11/1998 30/11/1999

1/3/2000

X

X

Monaco

Montenegro 5/5/2010 22/6/2010

1/10/2010

X

Netherlands 6/11/1997 21/3/2001

1/7/2001

X

Norway 6/11/1997 4/6/2009

1/10/2009

X

Poland 29/4/1999

Portugal 6/11/1997 15/10/2001

1/2/2002

Romania 6/11/1997 20/1/2005

1/5/2005

X

X

Russia 6/11/1997

San Marino

Serbia

Slovakia 6/11/1997 27/5/1998

1/3/2000

X

Slovenia

Spain

Sweden 6/11/1997 28/6/2001

1/10/2001

X

Switzerland

The former Yugoslav Republic 6/11/1997 3/6/2003

X

X

1/10/2003

of Macedonia

Turkey

Ukraine 1/7/2003 21/12/2006

1/4/2007

X

United Kingdom

Non-member States of the Council of Europe

States

Signature

Ratification

Entry into

Notes

R.

D.

A.

T.

C. O.

force

Belarus

Canada

Holy See

Kyrghyz Republic

United States of America

Total number of signatures not followed by ratifications: 9

Total number of ratifications/accessions: 20

Fonte: Conselho Europeu, 2013.

Note-se que cinco outros Estados, fora do Conselho Europeu, foram convidados a aderir à Convenção, mas nenhum o fez.

87

Quanto à atuação interna de Estados europeus em relação às Convenções do SGDH e

do SEDH, cabe analisar alguns casos particulares atuais.

De fato, recentemente, também Mônaco alterou sua legislação interna de modo a

garantir igualdade de gêneros na questão de transmissão da nacionalidade monegasca aos

filhos (ACNUR, 2012).

Ainda, Portugal, Bulgária, Moldávia e Ucrânia ascenderam à condição de signatários

de ambas as convenções sobre a apatridia entre os anos de 2012 e 2013. Ademais, a Hungria

retirou suas ressalvas em relação à Convenção de 1954, a Geórgia ascendeu à condição de

signatária desta, e a Lituânia ascendeu à condição de signatária da Convenção de 1961

(ACNUR, 2013). Em mesmo sentido, Bélgica, Espanha e Luxemburgo iniciaram

procedimentos para ascender à condição de signatárias da Convenção de 1961, e a Suécia

sinaliza pretensões de retirar as ressalvas possíveis realizadas à Convenção de 1954 (ACNUR,

2013).

O que se nota, no tocante à Europa, é que, embora se trate de uma região

“desenvolvida” do globo, apenas muito recentemente vêm sendo adotadas certas reformas, de

caráter urgente, no que tange à proteção do direito à nacionalidade, sendo que ainda há um

longo caminho a ser percorrido.

Interessante atentar para o fato de que, no ano de 2014, será realizado o 1º Fórum

Mundial sobre a Apatridia, na cidade de Haia, como parte das comemorações acerca dos 60

anos da Convenção de 1954. O Fórum terá, por objetivo, discutir os próximos passos a serem

adotados na caminhada pela erradicação da apatridia no mundo (ACNUR, 2013).

Firmado estes pontos, passa-se à análise de casos reais, submetidos à apreciação e

julgamento da CEDH, para que seja verificada a aplicação e real efetividade dos instrumentos

internacionais de proteção ao apátrida e ao direito à nacionalidade.

88

CAPÍTULO 3

A APATRIDIA NA CORTE EUROPÉIA DE DIREITOS

HUMANOS: UMA ANÁLISE PRÁTICA

Uma vez estabelecidas, ainda que brevemente, algumas bases doutrinárias acerca da

apatridia, passa-se agora à análise de alguns casos práticos, no âmbito da CEDH, como forma

de melhor compreensão e, por que não, ilustração no que tange à real situação dos apátridas

naquela parte do mundo, dita desenvolvida.

3.1. Caso Kurić e outros v. Eslovênia

Quando da existência da Iugoslávia, os indivíduos residentes em quaisquer das seis

repúblicas que a formavam eram nacionais da Iugoslávia. Contudo, como esclarece Bulajić (2005), a Iugoslávia concedia dupla cidadania a seus nacionais: uma iugoslava e uma adstrita

à republica na qual o indivíduo nascera. Entretanto, na posse da cidadania iugoslava, qualquer

iugoslavo poderia estabelecer residência fixa em qualquer das repúblicas que a compunham.

Este primeiro caso apresenta Mustafa Kurić63

e outros dez indivíduos, os quais

tiveram seus direitos limitados quando da quebra da Iugoslávia para a independência da

Eslovênia, como Estado sucessor, em 1991.

Consta do caso aplicado à Corte que, em 26 de fevereiro de 1992, a Eslovênia

arbitrariamente removeu ao menos dezoito mil pessoas dos registros civis de ex-iugoslavos

que residiam legalmente na Eslovênia.

63

Este caso também é conhecido como “Makuc and others v. Slovenia”. Contudo, após o falecimento do Sr. Makuc, o caso foi renomeado pela Corte.

89

Isso ocorreu porque, sob as leis do novo país, os iugoslavos de outras repúblicas que

ali residissem permanentemente (com autorização governamental, como era o caso dos

aplicantes) receberam prazo de seis meses, a partir de 25 de junho de 1991, para requerer a

nacionalidade eslovena. Note-se o art. 40, primeira parte, do Ato de Cidadania da República

Eslovena:

Article 40

The citizen of any other republic who had permanent residence in the Republic of Slovenia on the day of the plebiscite about the autonomy and independence of the Republic of Slovenia and actually lives in Slovenia, obtains citizenship of the Republic of Slovenia if he/she submits the request to the comunal body competent for internal affairs where he/she permanently resides, within six months from the

day this act is put into force64

.

Os aplicantes, por não terem cumprido com o solicitado dentro do tempo fornecido,

foram apagados dos registros, aproximadamente dois meses após o fim do prazo, tornando-se

apátridas e, por conseguinte, residentes ilegais da República da Eslovênia.

As conseqüências disto foram catastróficas para os aplicantes. Estes tiveram seus

documentos e passaportes cassados e destruídos. Batalharam para tentar manter seus

empregos e receber pensões. Não possuíam autonomia sequer para deixar o território daquele

Estado para procurar um lugar melhor para viver. De fato, o tratamento que recebiam era

inferior ao dedicado aos estrangeiros em território esloveno, sob a vigência do Ato de

Estrangeiros de 1999. Como nos elucida Zorn (2010, p. 35):

The narratives of the erased people reveal that the authorities first degraded them to the level of bare life by depriving them of legal identity and leaving them at the mercy of various repressive bodies (police persecution, deportation). On the other hand, various public institutions endangered their bare life through ethically blind administrative approaches. Medical and social security services blindly executed

64

Artigo 40: O cidadão de qualquer outra república que tivesse residência permanente na República da

Eslovênia no dia do plebiscito sobre a autonomia e independência da República da Eslovênia e de fato viva na Eslovênia, obtém cidadania da República da Eslovênia se ele/ela apresentar a requisição ao corpo comunitário competente para assuntos internos onde ele/ela resida permanentemente, dentro de seis meses do dia em que este ato tenha entrado em vigor. (tradução livre)

90

decisions taken by the repressive arm of the authorities (the Ministry of the

Interior).65

Por conta desta diferenciação entre o tratamento deferido aos ex-iugoslavos e aos

demais estrangeiros, colocando os primeiros em posição mais desfavorável, a Corte

Constitucional da Eslovênia entendeu, em 1999, que o artigo 81 do Ato de Estrangeiros era

inconstitucional, sobretudo por não definir quais eram as condições para que os “apagados”

adquirissem direito à residência permanente na Eslovênia.

Como resultado deste julgamento, a Eslovênia criou o Ato do Status Legal, ainda em

1999, como tentativa de retificar as falhas havidas em relação aos ex-iugoslavos apagados dos

registros públicos.

Contudo, quatro anos mais tarde, este ato também foi julgado inconstitucional, posto

que, dentre outras falhas, não regulava a situação dos indivíduos desde a data em que haviam

sido “apagados”, garantindo-lhes mais uma vez o status de residentes permanentes, ou sequer

atendia àqueles que haviam sido deportados por conta de terem se tornado ilegais à época. O

Ato do Status Legal foi, posteriormente, emendado para que suprisse as deficiências de que padecia66

.

Em 2006, os Kurić e outros indivíduos, após uma série de tentativas de obter seus

direitos reconhecidos através das cortes internas da Eslovênia, apresentaram seus casos,

conjuntamente, à CEDH, alegando quebra nos arts. 8º (respeito à vida privada e familiar), 13º

(direito a um remédio efetivo) e 14º (proibição da discriminação) da Convenção Européia de

Direitos Humanos.

Embora a Corte tenha julgado alguns dos aplicantes inadmissíveis67

, ela acolheu os

pedidos de Kurić e alguns outros indivíduos, relativos aos arts. 8º e 13º da Convenção68

.

O caso foi admitido para a Grande Câmara em 2010 e houve uma audiência em 2011.

65 As narrativas das pessoas apagadas revelam que as autoridades primeiramente as degradaram ao nível de mera vida por privarem-nas de identidade legal e deixá-las à mercê de vários órgãos repressores (perseguição policial, deportação). Por outro lado, várias instituições públicas ameaçaram sua mera vida através de aproximações administrativas eticamente cegas. Serviços de seguros médico e social cegamente executaram decisões tomadas pelo braço repressivo das autoridades (o Ministério do Interior). (tradução livre)

66 Em 2010, o Ato, emendado, foi considerado constitucional pela Corte eslovena.

67 A CEDH entendeu que, alguns deles, não poderiam mais alegar vitimização, posto que a retroação do direito de residência pemanente era um remédio adequado à sua situação.

68 A CEDH, entretanto, desconsiderou o pedido relativo ao art. 14º, por entender que este encontrava-se absorvido pelas razões do art. 8º.

91

No tocante às alegações apresentadas pelos aplicantes, a Eslovênia respondeu que

estes não se tratavam de “vítimas” como entendido pela Convenção Européia de Direitos Humanos, que os aplicantes não haviam levado à exaustão as vias remediais internas daquele

Estado, que a CEDH não possuía jurisdição temporal para ouvir aquele caso, e que a

Convenção não dispunha quanto aos direitos de cidadania ou residência permanente.

Note-se que houve, neste caso, uma série de intervenções de terceiros, sobretudo em

defesa dos argumentos apresentados pelos aplicantes. Um dos intervenientes mais notáveis foi

o Equal Rights Trust69

.

Em sentença, a Corte decidiu não apreciar os pedidos de quatro dos aplicantes: Sr.

Petreš, Sr. Jovanović, Sra. Ristanović e Sr. Dabetić, sendo estes dois últimos dispensados pelo

fato de a corte ter acolhido, a seu respeito, as alegações apresentadas pela Eslovênia de que

não teria sido exaurida a via interna.

Quanto aos demais aplicantes (Sr. Kurić, Sr. Mezga, Sr. Ristanović, Sr. Berisha, Sr.

Ademi e Sr. Minić), a CEDH conheceu de seus pleitos e lhes deu provimento. A Corte

reconheceu o direito destes em se proclamarem “vítimas” para os efeitos da Convenção,

entendendo que houve violação dos arts. 8º, 13º e, até mesmo, do art. 14º.

A Eslovênia, por fim, foi condenada a armar um esquema de compensação ad hoc,

dentro do prazo de um ano da publicação do julgamento. Ademais, caso não houvesse acordo

diferente dentro do prazo de três meses, a Eslovênia deveria pagar € 20.000,00 a cada um dos

aplicantes cujos pleitos foram conhecidos, a título de danos morais, acrescidos de quaisquer

taxas que lhes poderiam ser cobradas, e € 30.000,00 aos aplicantes em conjunto, acrescidos de

taxas, referentes aos custos e despesas processuais. Foram, também, instituídos juros de mora.

Embora, até a presente data, não tenha havido definição quanto ao status de

nacionalidade dos aplicantes, o que se espera, neste caso, é que a Eslovênia venha a

nacionalizar tais indivíduos, como medida de justiça. É, inclusive, uma tendência, como

apontada por Dedić (2003, pp. 35-36), a aplicação extensiva do Princípio da Nacionalidade

Efetiva em casos como este, ora anote-se:

69

A ERT é uma organização internacional independente, com sede em Londres, que propõe-se a combater a discriminação e promover a igualdade entre indivíduos. Age, inclusive, com atribuições de advocacia em Direitos Humanos.

92

The basic principle laid down by the International Court of Justice in the case of Nottebohm mentioned earlier was that a state is not obliged to recognize nationality granted to a person by another state if genuine and effective links between the person and that state do not exist. There are tendencied to extend this principle so as to include the obligation of the state to grant nationality to a person who maintains genuine and effective links with that state, as well as prohibition of depriving a person of his/her nationality if that person maintains genuine and effective link with

the state in question.70

Quanto às demais Convenções analisadas no presente trabalho, verificam-se claras

violações, por parte da Eslovênia, aos arts. 15º da DUDH, 1º da Convenção de 1930 (não-

signatária), 3º, 7º, 23º, 27º e 32º da Convenção de 1954 (signatária), 1º e 9º da Convenção de

1961 (não-signatária), 3º, 4º, 5º, 6º e 20º da CEN (não-signatária).

3.2. Caso Karassev e família v. Finlândia

Andrei Karassev nasceu na Rússia, à época da URSS. Em 1991 ele, sua esposa e seu

filho mais velho fugiram para a Finlândia, e solicitaram asilo.

Enquanto a família Karassev aguardava pela resposta do governo finlandês, em 1992,

nasceu Pasi Karassev, na municipalidade de Hollola, Finlândia. Por conta do fato de, à época,

seus pais serem considerados russos, sob o advento dos novos Estados sucessores da URSS,

Pasi não recebeu a nacionalidade finlandesa.

A solicitação de asilo dos Karassevs à Finlândia foi negada, em 1992, pelo Ministério

do Interior, e sua expulsão de volta para a Rússia foi ordenada. A família, então, apelou para a

Corte Suprema Administrativa da Finlândia.

A Corte remeteu o caso novamente à apreciação do Ministério do Interior, para que

fosse feita uma reavaliação. Concomitantemente, Pasi Karassev, representado por seus

genitores, ingressou com pedido de nacionalidade finlandesa.

70

O princípio básico apresentado pela CIJ no caso Nottebohm mencionado anteriormente foi que um Estado não

tem o dever de reconhecer a nacionalidade concedida a uma pessoa por outro Estado se elos genuínos e efetivos entre pessoa e Estado não existirem. Existem tendências a estender este princípio para que venha a incluir a obrigação do estado em conceder nacionalidade para uma pessoa que mantenha elos genuínos e efetivos com aquele Estado, bem como a proibição de privar uma pessoa de sua nacionalidade se aquela pessoa mantém elo genuíno e efetivo com o Estado em questão. (tradução livre)

93

O Ministério negou os pedidos elaborados pelos Karassev, declarando que Pasi e sua

família eram nacionais russos; seus pais e irmão haviam ingressado em território finlandês

fazendo uso de visto de turismo e, à época da entrada em vigor do Ato de Cidadania Russa, os

Karassev não eram residentes permanentes (legais) na Finlândia, mas na Federação Russa.

Desta forma, os pais e irmão de Pasi teriam tornado-se, automaticamente, russos, e ele

adquirira nacionalidade russa ao nascer, de acordo com os critérios jus sanguinis adotados

pelo país.

Em 1993 Andrei Karassev obteve emprego na cidade de Hamina, Finlândia, mas

tiveram direito de moradia recusado, pois não possuíam autorização de residência permanente

na Finlândia. Eles não recorreram desta decisão.

Contudo, posteriormente, em 1996, o governo da Rússia declarou, por meio de sua

embaixada em Helsinki, que não mais entendia os Karassevs como seus nacionais, incluindo-

se Pasi, visto que criaram novos laços com a Finlândia ao longo dos anos que transcorreram,

inclusive habitando seu território, já em 1992.

Desta forma, Pasi Karassev retirou sua requisição frente ao Ministério do Interior para

a aquisição de nacionalidade finlandesa, apresentando, então, pedido à Presidência da

Finlândia, para que declarasse que havia adquirido nacionalidade finlandesa ex lege ao nascer,

de acordo com a lei finlandesa, ora disposta:

9. Lapsi: Lapsi saa syntyessään Suomen kansalaisuuden, jos:

4) Lapsi syntyy Suomessa eikä saa syntyessään minkään vieraan valtion kansalaisuutta, eikä hänellä syntymänsä perusteella ole edes toissijaisesti oikeutta

saada minkään vieraan valtion kansalaisuutta.71

Ainda em 1996, a chefia do departamento de polícia do distrito de Hamina determinou

que a família deixasse o país dentro de um mês. Os Karassev, contudo, objetaram, visto ainda

estarem aguardando a determinação final acerca do pedido de nacionalidade de Pasi, e não

possuírem os documentos de viagem necessários.

71

9. Crianças: Uma criança adquire nacionalidade finlandesa ao nascer se: 4) A criança tiver nascido na Finlândia e não adquira nacionalidade de nenhum Estado estrangeiro ao nascer, e não possua direito secundário para adquirir a nacionalidade de nenhum estado estrangeiro. (tradução livre).

94

Naquele mesmo mês, foi garantido o direito de Pasi Karassev a freqüentar a creche

municipal, e de seu irmão a freqüentar uma escola pública na Finlândia. Ademais, o

departamento de polícia, acolhendo as objeções apresentadas pela família, postergou

indefinidamente sua expulsão do território finlandês.

Em 1997, foram concedidos passaportes de estrangeiro e permissões de residência

temporária na Finlândia aos Karassev, pelo período de um ano; posto que o Ministério do

Interior finalmente reconhecera que sua nacionalidade era incerta. Ademais, as autoridades

russas haviam afirmado que eles não seriam aceitos de volta em solo russo.

Ao longo daquele ano, a mãe da família obteve direito a auxílios governamentais

finlandeses em relação a seus dois filhos, a moradia e a emprego; tendo recebido, inclusive,

aumentos.

Em 1998, finalmente, a Presidência da Finlândia declarou, fazendo referência ao

julgamento dado pela Suprema Corte Administrativa, que os Karassev não eram nacionais

finlandeses.

Perante a CEDH, Karassev invocou violações aos arts. 8º e 14º da Convenção

Européia de Direitos Humanos, alegando inclusive a mora por parte das autoridades

finlandesas em garantir-lhe seus direitos, causando-lhe irreparáveis prejuízos.

O governo finlandês, por sua vez, declarou que, caso os aplicantes tivessem requerido

documentos e permissões de residência, estas lhes teriam sido conferidas, não havendo,

portanto, violação de direitos. No entanto, os Karassev não haviam ingressado com tais

pedidos, requerendo somente o reconhecimento à nacionalidade finlandesa de Pasi.

Em decisão quanto à admissibilidade do caso, como destaca Ersbøll (2007, p. 266), a

Corte declarou que, embora a Convenção Européia de Direitos Humanos não disponha

expressamente sobre os direitos de nacionalidade ou cidadania, estas questões podem ser

levantadas sob a égide de violações ao art. 8º, por conta do impacto gerado por tais privações

na vida pessoal do indivíduo. Contudo, não era o caso, visto que, embora a situação de

apatridia tenha ocorrido e seja uma questão a se solucionar (em respeito à DUDH), não houve

violação do direito prescrito no referido artigo.

Tampouco houve discriminação pelo falo de a família ter origem russa. Note-se que o

governo finlandês, embora tenha tentado reiteradamente expulsá-los de seu território, acabou

95

por solidarizar-se de sua situação, concedendo uma série de direitos sem que os Karassev,

sequer, houvessem pleiteado por estes.

Desta forma, após analisar o presente caso, a CEDH entendeu, por unanimidade, que,

no caso de Karassev e família v. Finlândia, a aplicação era inadmissível.

3.3. Caso Kaftailova e outros v. Letônia

A aplicante Natella Kaftailova nasceu em 1958 na Geórgia, então parte da URSS;

possuía, portanto, nacionalidade soviética. Em 1982, época em que residia na Rússia, casou-se

com um servidor civil do Ministério do Interior, também soviético, sendo que dois anos mais

tarde o casal deu à luz uma filha.

Em 1988, o marido da aplicante trocou o apartamento que possuía em Kazan (Rússia)

pelo direito de alugar um apartamento do Estado em Riga, Letônia. Obtida a autorização, a

família se mudou imediatamente.

Em março de 1990, Kaftailova cancelou seu registro oficial de residência em Volzhsk

(Rússia), onde até então estava registrada.

Em abril posterior, sem seu consentimento ou autorização, o marido da aplicante

registrou-a, e também se registrou, no mais recente endereço do casal, em Riga; tendo

descoberto o feito, Kaftailova teve seu registro não-autorizado removido do cadastro, em

junho do mesmo ano, sendo que quatro meses após o casal veio a se divorciar.

No ano seguinte, a URSS se rompeu, e Natella se viu na condição de apátrida.

Dois anos mais tarde, em 1993, lhe foi garantido o direito de alugar um quarto, outrora

obtido por seu ex-marido, em Riga. Em seguida, Kaftailova apresentou pedido frente ao

Departamento de Nacionalidade e Assuntos Migratórios do Ministério do Interior Letão,

solicitando o registro de seu nome como residente permanente da Letônia. Contudo, segundo

consta, a aplicante forneceu não o endereço no qual resida à época, mas aquele onde residiu

com seu ex-marido, anos antes. O endereço onde, outrora, havia sido, a contragosto,

registrada.

96

Inicialmente, a Letônia havia aceitado sua requisição; contudo, cinco meses depois,

seu registro foi revogado, sob a alegação de que o carimbo no passaporte de Kaftailova seria

falso. Em 1994, seu nome foi definitivamente removido do registro de residentes, o

julgamento que determinara seu direito ao aluguel do quarto foi revertido, e seus documentos

pessoais foram cancelados. A seguir, em 1995, o Departamento de Nacionalidade ordenou a

deportação da aplicante, sendo que ela e sua filha deveriam deixar o território letão

imediatamente.

Ressalte-se, aqui, que caso Kaftailova não tivesse cancelado seu registro de residência

em 1990, ela e sua filha teriam feito jus à autorização de residência permanente, nos termos

dos arts. 23, inciso 1, e 23-1, primeira parte, da Lei de Entrada e Residência de Estrangeiros e

Apátridas na República da Letônia, de 1992:

Article 23

Permanent residence permits may be received by:

1) minor or dependent children (also adoptees) of the Republic of Latvia citizen, non-citizen or a foreign citizen or stateless person who has received a permanent

residence permit72

;

[...]

Article 23-1

Permanent residence permits may be received by those foreign citizens who were registered (at the place of residence) on July 1, 1992 in the Republic of Latvia without a term limitation, if they are registered (at the place of residence) in the Republic of Latvia without limitation of a term at the moment of requesting the

permanent residence permit, and are registered in the Residents' Register. [...]73

Entretanto, apesar de diversas imposições de recursos administrativos e judiciais por

parte de Kaftailova, nenhuma de suas tentativas foi bem sucedida.

72 Permissões de residência permanentes poderão ser recebidas por: 1) menor ou crianças dependentes (também adotados) de um cidadão da República da Letônia, não-cidadão ou cidadão estrangeiro ou apátrida que tenha recebido uma permissão de residência pertmanente. (tradução livre)

73 Permissões de residência permanente poderão ser recebidas por aqueles cidadãos estrangeiros que eram registrados (em seu local de residência), em 1º de julho de 1992, na República da Letônia sem uma limitação de termo, se eles são registrados (em seu local de residência) na República da Letônia sem limitação de um termo no momento de requisição da permissão de residência permanente, e são registrados no Registro de Residentes. (tradução livre).

97

Em 2005, seu caso foi admitido na CEDH, a qual entendeu ser admissível a

regularização dos documentos pessoais de Kaftailova. A Corte emitiu, ainda, uma autorização

de residência permanente para a aplicante, sob a condição de que a mesma apresentasse os

documentos pertinentes para sua efetivação. Até a data do julgamento na CEDH, contudo, não

foram juntados aos autos os documentos necessários.

Perante a corte, Natella alegou que a Letônia havia ferido os preceitos postos pelo art.

8º da Convenção Européia de Direitos Humanos (respeito à vida privada e familiar), haja vista

a reiterada recusa em regularizar sua situação de residente permanente.

A CEDH, ao analisar o caso, apurou que a aplicante, que já habitava território letão

havia quase vinte anos, teria desenvolvido laços sociais e econômicos com o local, sendo que

a recusa por parte do governo da Letônia em regularizar a situação de Kaftailova como

residente permanente interferia, de modo evidente, em sua vida privada, causando-lhe

prejuízos imensuráveis. Entretanto, como a Corte esclarece, esta interferência teria se dado

dentro dos limites legais daquele Estado.

Embora Natella tivesse origem georgiana, e tivesse passado boa parte de sua vida na

Rússia (tendo, inclusive, sido residente registrada – embora ali não mais habitasse – até 1990),

estes aspectos não foram decisivos para a resolução de sua lide, posto que não havia

comprovação de que a aplicante tivesse mantido qualquer vínculo efetivo com estes países.

Desta forma, sobretudo tomando em conta o período entre a ordem de deportação e o

julgamento do caso, no qual a aplicante submeteu-se a situação de extrema insegurança

jurídica e vida precária, a CEDH entendeu que a Letônia havia cometido, sim, violação de

direitos. Isto porque, embora tivesse agido dentro de seus limites legais, o país não soube

dosar o objetivo de evitar a desordem (uma interferência essencial à manutenção de uma

sociedade democrática) e a proteção aos direitos básicos de vida digna da aplicante.

Ao final deste julgamento, Natella Kaftailova e sua filha receberam a nacionalidade

letã, deixando de ser apátridas.

Verifica-se, ainda, neste caso, violações explícitas aos artigos. 15º da DUDH, 27º e 32º

da Convenção de 1954, 6º e 20º da CEN, embora não tenham sido objeto do presente

julgamento.

98

A Letônia vem demonstrando certa preocupação com a redução dos casos de apatridia

em seu território, casos estes originados, sobretudo, da quebra da URSS, como ocorreu com

Kaftailova. O país dispõe, inclusive, desde 1995, de lei específica para tratar de casos

semelhantes, a Lei acerca do Estatuto dos Cidadãos da Antiga URSS que não possuam

Cidadania da Letônia ou de nenhum Outro Estado (BUZAJEVS et al, 2011). Esta lei vem

sendo gradualmente reformada e emendada, de modo a melhor atender a estes indivíduos.

Além do caso Kaftailova, segundo a base de dados HUDOC, ao menos outros doze

casos contra a República da Letônia, referentes a indivíduos apátridas, foram submetidos à

apreciação da CEDH, sendo dois dos mais famosos os casos Slivenko v. Latvia e Sisojeva v.

Latvia (VAN WAAS, 2008).

3.4. Caso Okonkwo v. Áustria

O aplicante Jude Okonkwo nasceu em 1963. Até o ano de 1995, era um nacional da

Nigéria, mas tornou-se apátrida.

Em 1985, o aplicante mudou-se legalmente para a Áustria, onde conheceu uma

austríaca com quem casou-se, em 1992. Tiveram duas filhas, uma nascida em 1992 e outra

nascida em 1994.

No ano de 1993, o aplicante apresentou pedido para adquirir a nacionalidade austríaca.

Entretanto, no ano de 1994, a Corte Regional Criminal de Viena condenou Okonkwo a

vinte meses de prisão, por tentativa de inserir em circulação um grande volume de narcóticos,

bem como outras ofensas menores correlatas. Por conta desse fato, em 1995, o aplicante teve

seu pedido de nacionalidade negado. Ademais, sob o escopo do Ato Austríaco de Estrangeiros

de 1992, foi emitida uma proibição ilimitada de residência contra o aplicante74

.

Okonkwo, contudo, já havia renunciado à nacionalidade nigeriana, com esperanças de

obter a austríaca. Restou, portanto, em situação de apatridia.

74

A Autoridade de Segurança Pública de Viena entendeu que esta proibição interferia no direito à vida familiar e privada do aplicante; contudo, tratava-se de medida necessária para a preservação da segurança e saúde públicas.

99

Em 1996, o governo austríaco prendeu o aplicante, com intuito de proceder à sua

expulsão do território nacional. Foi solicitado, então, à Embaixada da Nigéria, que emitisse os

documentos de viagem necessários para que Okonkwo deixasse a Áustria. Este pedido foi

negado pela autoridade nigeriana, sob a declaração de que o aplicante teria renunciado à sua

nacionalidade originária. Desta forma, Okonkwo foi solto, posto que sua expulsão não pode

ser levada a cabo devido à sua situação de apatridia.

Ainda no mesmo ano, o Painel Administrativo Independente de Viena entendeu que a

prisão do aplicante para sua expulsão houvera sido ilegal, posto que as autoridades austríacas

já conheciam de seu status de apátrida, o que tornava sua expulsão do território impossível,

em respeito às Convenções internacionais.

Okonkwo divorciou-se de sua esposa em 1996, mas continuou morando na Áustria.

Apresentou, então, após tentativas infrutíferas de recorrer às Cortes Administrativas e

Constitucionais da Áustria, o caso à apreciação da CEDH, sob a alegação de violação ao art.

8º da Convenção Européia de Direitos Humanos. Supostamente, o aplicante não poderia

casar-se novamente, devido à falta de passaporte.

Esta alegação é veementemente rebatida pelo governo austríaco, o qual afirma que a

falta de documento de viagem não preclui o direito a casamento na Áustria.

Considerando as alegações feitas pelo governo austríaco, bem como levando-se em

conta o tratamento que foi ofertado a Okonkwo, e ainda tomando por base o fato de que ele

não corre risco de deportação e, por conseguinte, de ser separado de família que ora venha a

constituir, a CEDH decidiu que o aplicante não se enquadra na qualidade de vítima como

disposto pelo art. 34 da Convenção. Assim, por unanimidade, foi declarada inadmissível a

aplicação.

Aqui, nota-se que, embora tenham sidos violados os postulados internacionais acerca

do direito à nacionalidade, a possuir documentação e de não se perder uma nacionalidade sem

a efetiva aquisição de outra, a negativa à concessão de nacionalidade àquele que atenta contra

o país, como ocorre no caso em tela, também encontra fulcro nos tratados internacionais de

prevenção e redução da apatridia. Assim, a Áustria aparentemente dirigiu tratamento digno ao

aplicante.

100

Segundo a base de dados HUDOC, outros dois casos relativos a apatridia, contra a Áustria, foram levados à apreciação da Corte.

101

CONCLUSÃO

Ao final deste trabalho, conclui-se que, muito embora o tema da apatridia venha

ganhando cada vez mais destaque junto à comunidade internacional, ainda há uma longa

caminhada pela frente, para que o direito à nacionalidade e seus direitos conexos sejam,

realmente, consumados nos quatro cantos do globo.

No tocante especificamente à Europa, foco do presente estudo, nota-se que, muito

embora a grande maioria dos países adote as provisões contra a apatridia e as aplique com

elevado grau de efetividade, ainda existem locais nessa parte do mundo com grande

incidência de indivíduos apólidas, sem que haja, sequer, sinalização por parte destes Estados

em adotar os postulados internacionais acerca do tema.

O que se propõe é que sejam feitas mais campanhas de concientização da população

sobre seus próprios direitos, e que seja melhorado o diálogo entre países e organizações

internacionais, sobretudo a ACNUR, acerca desta temática.

Por derradeiro, insta salientar que constitui-se grave falha o fato de a Convenção

Européia de Direitos Humanos não possuir postulado específico acerca do direito à

nacionalidade, posto que os aplicantes à Corte precisam sempre amparar-se em outros

dispositivos violados indiretamente pela infração ao art. 15 da DUDH. Assim sendo, no que

tange à nacionalidade, para adequada concretização desse direito no âmbito europeu, seria

imprescindível a adição de um artigo específico ao tema.

102

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114

ANEXOS

115

ANEXO A – EUROPEAN CONVENTION ON HUMAN

RIGHTS (CONVENTION FOR THE PROTECTION OF

HUMAN RIGHTS AND FUNDAMENTAL FREEDOMS)

Rome, 4 nov. 1950

THE GOVERNMENTS SIGNATORY HERETO, being members of the Council of Europe,

Considering the Universal Declaration of Human Rights proclaimed by the General Assembly

of the United Nations on 10th December 1948;

Considering that this Declaration aims at securing the universal and effective recognition and

observance of the Rights therein declared;

Considering that the aim of the Council of Europe is the achievement of greater unity between

its members and that one of the methods by which that aim is to be pursued is the

maintenance and further realisation of human rights and fundamental freedoms;

Reaffirming their profound belief in those fundamental freedoms which are the foundation of

justice and peace in the world and are best maintained on the one hand by an effective

political democracy and on the other by a common understanding and observance of the

human rights upon which they depend;

Being resolved, as the governments of European countries which are like-minded and have a

common heritage of political traditions, ideals, freedom and the rule of law, to take the first

steps for the collective enforcement of certain of the rights stated in the Universal Declaration,

Have agreed as follows:

Article 1: Obligation to respect human rights

116

The High Contracting Parties shall secure to everyone within their jurisdiction the

rights and freedoms defined in Section I of this Convention.

SECTION I: RIGHTS AND FREEDOMS

Article 2: Right to life

1. Everyone’s right to life shall be protected by law. No one shall be deprived of his

life intentionally save in the execution of a sentence of a court following his conviction of a

crime for which this penalty is provided by law.

2. Deprivation of life shall not be regarded as inflicted in contravention of this Article

when it results from the use of force which is no more than absolutely necessary:

(a) in defence of any person from unlawful violence;

(b) in order to effect a lawful arrest or to prevent the escape of a person lawfully detained;

(c) in action lawfully taken for the purpose of quelling a riot or insurrection.

Article 3: Prohibition of torture

No one shall be subjected to torture or to inhuman or degrading treatment or

punishment.

Article 4: Prohibition of slavery and forced labour

1. No one shall be held in slavery or servitude.

2. No one shall be required to perform forced or compulsory labour.

3. For the purpose of this Article the term “forced or compulsory labour” shall not include:

(a) any work required to be done in the ordinary course of detention imposed

according to the provisions of Article 5 of this Convention or during conditional release from

such detention;

(b) any service of a military character or, in case of conscientious objectors in

countries where they are recognised, service exacted instead of compulsory military service;

117

(c) any service exacted in case of an emergency or calamity threatening the life or

well-being of the com-munity;

(d) any work or service which forms part of normal civic obligations.

Article 5: Right to liberty and security

1. Everyone has the right to liberty and security of person. No one shall be deprived of

his liberty save in the following cases and in accordance with a procedure prescribed by law:

(a) the lawful detention of a person after conviction by a competent court;

(b) the lawful arrest or detention of a person for non--compliance with the lawful order

of a court or in order to secure the fulfilment of any obligation prescribed by law;8 9

(c) the lawful arrest or detention of a person effected for the purpose of bringing him

before the competent legal authority on reasonable suspicion of having committed an offence

or when it is reasonably considered necessary to prevent his committing an offence or fleeing

after having done so;

(d) the detention of a minor by lawful order for the purpose of educational supervision

or his lawful detention for the purpose of bringing him before the competent legal authority;

(e) the lawful detention of persons for the prevention of the spreading of infectious

diseases, of persons of unsound mind, alcoholics or drug addicts or vagrants;

(f) the lawful arrest or detention of a person to prevent his effecting an unauthorised

entry into the country or of a person against whom action is being taken with a view to

deportation or extradition.

2. Everyone who is arrested shall be informed promptly, in a language which he

understands, of the reasons for his arrest and of any charge against him.

3. Everyone arrested or detained in accordance with the provisions of paragraph 1 (c)

of this Article shall be brought promptly before a judge or other officer authorised by law to

exercise judicial power and shall be entitled to trial within a reasonable time or to release

pending trial. Release may be conditioned by guarantees to appear for trial.

118

4. Everyone who is deprived of his liberty by arrest or detention shall be entitled to

take proceedings by which the lawfulness of his detention shall be decided speedily by a court

and his release ordered if the detention is not lawful.

5. Everyone who has been the victim of arrest or detention in contravention of the

provisions of this Article shall have an enforceable right to compensation.

Article 6: Right to a fair trial

1. In the determination of his civil rights and obligations or of any criminal charge

against him, everyone is entitled to a fair and public hearing within a reasonable time by an

independent and impartial tribunal established by law. Judgment shall be pronounced publicly

but the press and public may be excluded from all or part of the trial in the interests of morals,

public order or national security in a democratic society, where the interests of juveniles or the

protection of the private life of the parties so require, or to the extent strictly necessary in the

opinion of the court in special circumstances where publicity would prejudice the interests of

justice.

2. Everyone charged with a criminal offence shall be presumed innocent until proved

guilty according to law.

3. Everyone charged with a criminal offence has the following minimum rights:

(a) to be informed promptly, in a language which he understands and in detail, of the

nature and cause of the accusation against him;

(b) to have adequate time and facilities for the preparation of his defence;

(c) to defend himself in person or through legal assistance of his own choosing or, if

he has not sufficient means to pay for legal assistance, to be given it free when the interests of

justice so require;

(d) to examine or have examined witnesses against him and to obtain the attendance

and examination of witnesses on his behalf under the same conditions as witnesses against

him;

(e) to have the free assistance of an interpreter if he cannot understand or speak the

language used in court.

119

Article 7: No punishment without law

1. No one shall be held guilty of any criminal offence on account of any act or

omission which did not constitute a criminal offence under national or international law at the

time when it was committed. Nor shall a heavier penalty be imposed than the one that was

applicable at the time the criminal offence was committed.

2. This Article shall not prejudice the trial and punishment of any person for any act or

omission which, at the time when it was committed, was criminal according to the general

principles of law recognised by civilised nations.

Article 8: Right to respect for private and family life

1. Everyone has the right to respect for his private and family life, his home and his

correspondence.

2. There shall be no interference by a public authority with the exercise of this right

except such as is in accordance with the law and is necessary in a democratic society in the

interests of national security, public safety or the economic well-being of the country, for the

prevention of disorder or crime, for the protection of health or morals, or for the protection of

the rights and freedoms of others.

Article 9: Freedom of thought, conscience and religion

1. Everyone has the right to freedom of thought, conscience and religion; this right

includes freedom to change his religion or belief and freedom, either alone or in community

with others and in public or private, to manifest his religion or belief, in worship, teaching,

practice and observance.

2. Freedom to manifest one’s religion or beliefs shall be subject only to such

limitations as are prescribed by law and are necessary in a democratic society in the interests

of public safety, for the protection of public order, health or morals, or for the protection of

the rights and freedoms of others.

Article 10: Freedom of expression

1. Everyone has the right to freedom of expression. This right shall include freedom to

hold opinions and to receive and impart information and ideas without interference by public

120

authority and regardless of frontiers. This Article shall not prevent States from requiring the

licensing of broadcasting, television or cinema enterprises.

2. The exercise of these freedoms, since it carries with it duties and responsibilities,

may be subject to such formalities, conditions, restrictions or penalties as are prescribed by

law and are necessary in a democratic society, in the interests of national security, territorial

integrity or public safety, for the prevention of disorder or crime, for the protection of health

or morals, for the protection of the reputation or rights of others, for preventing the disclosure

of information received in confidence, or for maintaining the authority and impartiality of the

judiciary.

Article 11: Freedom of assembly and association

1. Everyone has the right to freedom of peaceful assembly and to freedom of

association with others, including the right to form and to join trade unions for the protection

of his interests.

2. No restrictions shall be placed on the exercise of these rights other than such as are

prescribed by law and are necessary in a democratic society in the interests of national

security or public safety, for the prevention of disorder or crime, for the protection of health or

morals or for the protection of the rights and freedoms of others. This Article shall not prevent

the imposition of lawful restrictions on the exercise of these rights by members of the armed

forces, of the police or of the administration of the State.

Article 12: Right to marry

Men and women of marriageable age have the right to marry and to found a family,

according to the national laws governing the exercise of this right.

Article 13: Right to an effective remedy

Everyone whose rights and freedoms as set forth in this Convention are violated shall

have an effective remedy before a national authority notwithstanding that the violation has

been committed by persons acting in an official capacity.

Article 14: Prohibition of discrimination

The enjoyment of the rights and freedoms set forth in this Convention shall be secured

without discrimination on any ground such as sex, race, colour, language, religion, political or

121

other opinion, national or social origin, association with a national minority, property, birth or other status.

Article 15: Derogation in time of emergency

1. In time of war or other public emergency threatening the life of the nation any High

Contracting Party may take measures derogating from its obligations under this Convention to

the extent strictly required by the exigencies of the situation, provided that such measures are

not inconsistent with its other obligations under international law.

2. No derogation from Article 2, except in respect of deaths resulting from lawful acts

of war, or from Articles 3, 4 (paragraph 1) and 7 shall be made under this provision.

3. Any High Contracting Party availing itself of this right of derogation shall keep the

Secretary General of the Council of Europe fully informed of the measures which it has taken

and the reasons therefor. It shall also inform the Secretary General of the Council of Europe

when such measures have ceased to operate and the provisions of the Convention are again

being fully executed.

Article 16: Restrictions on political activity of aliens

Nothing in Articles 10, 11 and 14 shall be regarded as preventing the High Contracting

Parties from imposing restrictions on the political activity of aliens.

Article 17: Prohibition of abuse of rights

Nothing in this Convention may be interpreted as implying for any State, group or

person any right to engage in any activity or perform any act aimed at the destruction of any

of the rights and freedoms set forth herein or at their limitation to a greater extent than is

provided for in the Convention.

Article 18: Limitation on use of restrictions on rights

The restrictions permitted under this Convention to the said rights and freedoms shall

not be applied for any purpose other than those for which they have been prescribed.

SECTION II: EUROPEAN COURT OF HUMAN RIGHTS

Article 19: Establishment of the Court

122

To ensure the observance of the engagements undertaken by the High Contracting

Parties in the Convention and the Protocols thereto, there shall be set up a European Court of

Human Rights, hereinafter referred to as “the Court”. It shall function on a permanent basis.

Article 20: Number of judges

The Court shall consist of a number of judges equal to that of the High Contracting

Parties.

Article 21: Criteria for office

1. The judges shall be of high moral character and must either possess the

qualifications required for appointment to high judicial office or be jurisconsults of

recognised competence.

2. The judges shall sit on the Court in their individual capacity.

3. During their term of office the judges shall not engage in any activity which is

incompatible with their independence, impartiality or with the demands of a full-time office;

all questions arising from the application of this paragraph shall be decided by the Court.

Article 22: Election of judges

The judges shall be elected by the Parliamentary Assembly with respect to each High

Contracting Party by a majority of votes cast from a list of three candidates nominated by the

High Contracting Party.

Article 23: Terms of office and dismissal

1. The judges shall be elected for a period of nine years. They may not be re-elected.

2. The terms of office of judges shall expire when they reach the age of 70.

3. The judges shall hold office until replaced. They shall, however, continue to deal

with such cases as they already have under consi-deration.

4. No judge may be dismissed from office unless the other judges decide by a majority

of two-thirds that that judge has ceased to fulfil the required conditions.

Article 24: Registry and rapporteurs

123

1. The Court shall have a Registry, the functions and organisation of which shall be

laid down in the rules of the Court.

2. When sitting in a single-judge formation, the Court shall be assisted by rapporteurs

who shall function under the authority of the President of the Court. They shall form part of the Court’s Registry.

Article 25: Plenary Court

The plenary Court shall

(a) elect its President and one or two Vice-Presidents for a period of three years; they

may be re-elected;

(b) set up Chambers, constituted for a fixed period of time;

(c) elect the Presidents of the Chambers of the Court; they may be re-elected;

(d) adopt the rules of the Court;

(e) elect the Registrar and one or more Deputy Registrars;

(f) make any request under Article 26, paragraph 2.

Article 26: Single-judge formation, Committees, Chambers and Grand Chamber

1. To consider cases brought before it, the Court shall sit in a single-judge formation,

in committees of three judges, in Chambers of seven judges and in a Grand Chamber of

seventeen judges. The Court’s Chambers shall set up committees for a fixed period of time.

2. At the request of the plenary Court, the Committee of Ministers may, by a

unanimous decision and for a fixed period, reduce to five the number of judges of the

Chambers.

3. When sitting as a single judge, a judge shall not examine any application against the

High Contracting Party in respect of which that judge has been elected.

4. There shall sit as an ex-officio member of the Chamber and the Grand Chamber the

judge elected in respect of the High Contracting Party concerned. If there is none or if that

judge is unable to sit, a person chosen by the President of the Court from a list submitted in

advance by that Party shall sit in the capacity of judge.

124

5. The Grand Chamber shall also include the President of the Court, the Vice-

Presidents, the Presidents of the Chambers and other judges chosen in accordance with the

rules of the Court. When a case is referred to the Grand Chamber under Article 43, no judge

from the Chamber which rendered the judgment shall sit in the Grand Chamber, with the

exception of the President of the Chamber and the judge who sat in respect of the High

Contracting Party concerned.

Article 27: Competence of single judges

1. A single judge may declare inadmissible or strike out of the Court’s list of cases an

application submitted under Article 34, where such a decision can be taken without further

examination.

2. The decision shall be final.

3. If the single judge does not declare an application inadmissible or strike it out, that

judge shall forward it to a committee or to a Chamber for further examination.

Article 28: Competence of Committees

1. In respect of an application submitted under Article 34, a committee may, by a

unanimous vote,

(a) declare it inadmissible or strike it out of its list of cases, where such decision can

be taken without further examination; or

(b) declare it admissible and render at the same time a judgment on the merits, if the

underlying question in the case, concerning the interpretation or the application of the

Convention or the Protocols thereto, is already the subject of well-established case-law of the

Court.

2. Decisions and judgments under paragraph 1 shall be final.

3. If the judge elected in respect of the High Contracting Party concerned is not a

member of the committee, the committee may at any stage of the proceedings invite that judge

to take the place of one of the members of the committee, having regard to all relevant factors,

including whether that Party has contested the application of the procedure under paragraph

1.b.

125

Article 29: Decisions by Chambers on admissibility and merits

1. If no decision is taken under Article 27 or 28, or no judgment rendered under

Article 28, a Chamber shall decide on the admissibility and merits of individual applications

submitted under Article 34. The decision on admissibility may be taken separately.

2. A Chamber shall decide on the admissibility and merits of inter-State applications

submitted under Article 33. The decision on admissibility shall be taken separately unless the

Court, in exceptional cases, decides otherwise.

Article 30: Relinquishment of jurisdiction to the Grand Chamber

Where a case pending before a Chamber raises a serious question affecting the

interpretation of the Convention or the Protocols thereto, or where the resolution of a question

before the Chamber might have a result inconsistent with a judgment previously delivered by

the Court, the Chamber may, at any time before it has rendered its judgment, relinquish

jurisdiction in favour of the Grand Chamber, unless one of the parties to the case objects.

Article 31: Powers of the Grand Chamber

The Grand Chamber shall

(a) determine applications submitted either under Article 33 or Article 34 when a

Chamber has relinquished jurisdiction under Article 30 or when the case has been referred to

it under Article 43;

(b) decide on issues referred to the Court by the Committee of Ministers in accordance

with Article 46, paragraph 4; and

(c) consider requests for advisory opinions submitted under Article 47.

Article 32: Jurisdiction of the Court

1. The jurisdiction of the Court shall extend to all matters concerning the interpretation

and application of the Convention and the Protocols thereto which are referred to it as

provided in Articles 33, 34, 46 and 47.

2. In the event of dispute as to whether the Court has jurisdiction, the Court shall

decide.

126

Article 33: Inter-State cases

Any High Contracting Party may refer to the Court any alleged breach of the

provisions of the Convention and the Protocols thereto by another High Contracting Party.

Article 34: Individual applications

The Court may receive applications from any person, nongovernmental organisation or

group of individuals claiming to be the victim of a violation by one of the High Contracting

Parties of the rights set forth in the Convention or the Protocols thereto. The High Contracting

Parties undertake not to hinder in any way the effective exercise of this right.

Article 35: Admissibility criteria

1. The Court may only deal with the matter after all domestic remedies have been

exhausted, according to the generally recognised rules of international law, and within a

period of six months from the date on which the final decision was taken.

2. The Court shall not deal with any application submitted under Article 34 that

(a) is anonymous; or

(b) is substantially the same as a matter that has already been examined by the Court

or has already been submitted to another procedure of international investigation or settlement

and contains no relevant new information.

3. The Court shall declare inadmissible any individual application submitted under

Article 34 if it considers that:

(a) the application is incompatible with the provisions of the Convention or the

Protocols thereto, manifestly ill-founded, or an abuse of the right of individual application; or

(b) the applicant has not suffered a significant disadvantage, unless respect for human

rights as defined in the Convention and the Protocols thereto requires an examination of the

application on the merits and provided that no case may be rejected on this ground which has

not been duly considered by a domestic tribunal.

4. The Court shall reject any application which it considers inadmissible under this

Article. It may do so at any stage of the proceedings.

127

Article 36: Third party intervention

1. In all cases before a Chamber or the Grand Chamber, a High Contracting Party one

of whose nationals is an applicant shall have the right to submit written comments and to take

part in hearings.

2. The President of the Court may, in the interest of the proper administration of

justice, invite any High Contracting Party which is not a party to the proceedings or any

person concerned who is not the applicant to submit written comments or take part in

hearings.

3. In all cases before a Chamber or the Grand Chamber, the Council of Europe

Commissioner for Human Rights may submit written comments and take part in hearings.

Article 37: Striking out applications

1. The Court may at any stage of the proceedings decide to strike an application out of

its list of cases where the circumstances lead to the conclusion that

(a) the applicant does not intend to pursue his application; or

(b) the matter has been resolved; or

(c) for any other reason established by the Court, it is no longer justified to continue

the examination of the application.

However, the Court shall continue the examination of the application if respect for

human rights as defined in the Convention and the Protocols thereto so requires.

2. The Court may decide to restore an application to its list of cases if it considers that

the circumstances justify such a course.

Article 38: Examination of the case

The Court shall examine the case together with the representatives of the parties and, if

need be, undertake an investigation, for the effective conduct of which the High Contracting

Parties concerned shall furnish all neces-sary facilities.

Article 39: Friendly settlements

128

1. At any stage of the proceedings, the Court may place itself at the disposal of the

parties concerned with a view to securing a friendly settlement of the matter on the basis of

respect for human rights as defined in the Convention and the Protocols thereto.

2. Proceedings conducted under paragraph 1 shall be confidential.

3. If a friendly settlement is effected, the Court shall strike the case out of its list by

means of a decision which shall be confined to a brief statement of the facts and of the

solution reached.

4. This decision shall be transmitted to the Committee of Ministers, which shall

supervise the execution of the terms of the friendly settlement as set out in the decision.

Article 40: Public hearings and access to documents

1. Hearings shall be in public unless the Court in exceptional circumstances decides

otherwise.

2. Documents deposited with the Registrar shall be accessible to the public unless the

President of the Court decides otherwise.

Article 41: Just satisfaction

If the Court finds that there has been a violation of the Convention or the Protocols

thereto, and if the internal law of the High Contracting Party concerned allows only partial

reparation to be made, the Court shall, if neces-sary, afford just satisfaction to the injured

party.

Article 42: Judgments of Chambers

Judgments of Chambers shall become final in accordance with the provisions of

Article 44, paragraph 2.

Article 43: Referral to the Grand Chamber

1. Within a period of three months from the date of the judgment of the Chamber, any

party to the case may, in exceptional cases, request that the case be referred to the Grand

Chamber.

129

2. A panel of five judges of the Grand Chamber shall accept the request if the case

raises a serious question affecting the interpretation or application of the Convention or the

Protocols thereto, or a serious issue of gen-eral importance.

3. If the panel accepts the request, the Grand Chamber shall decide the case by means

of a judgment.

Article 44: Final judgments

1. The judgment of the Grand Chamber shall be final.

2. The judgment of a Chamber shall become final

(a) when the parties declare that they will not request that the case be referred to the

Grand Chamber; or

(b) three months after the date of the judgment, if reference of the case to the Grand

Chamber has not been requested; or

(c) when the panel of the Grand Chamber rejects the request to refer under Article

43. 3. The final judgment shall be published.

Article 45: Reasons for judgments and decisions

1. Reasons shall be given for judgments as well as for decisions declaring applications

admissible or inadmissible.

2. If a judgment does not represent, in whole or in part, the unanimous opinion of the

judges, any judge shall be entitled to deliver a separate opinion.

Article 46: Binding force and execution of judgments

1. The High Contracting Parties undertake to abide by the final judgment of the Court

in any case to which they are parties.

2. The final judgment of the Court shall be transmitted to the Committee of Ministers,

which shall supervise its execution.

3. If the Committee of Ministers considers that the supervision of the execution of a

final judgment is hindered by a problem of interpretation of the judgment, it may refer the

130

matter to the Court for a ruling on the question of interpretation. A referral decision shall

require a majority vote of two thirds of the representatives entitled to sit on the committee.

4. If the Committee of Ministers considers that a High Contracting Party refuses to

abide by a final judgment in a case to which it is a party, it may, after serving formal notice on

that Party and by decision adopted by a majority vote of two thirds of the representatives

entitled to sit on the committee, refer to the Court the question whether that Party has failed to

fulfil its obligation under paragraph 1.

5. If the Court finds a violation of paragraph 1, it shall refer the case to the Committee

of Ministers for consideration of the measures to be taken. If the Court finds no violation of

paragraph1, it shall refer the case to the Committee of Ministers, which shall close its

examination of the case.

Article 47: Advisory opinions

1. The Court may, at the request of the Committee of Ministers, give advisory

opinions on legal questions concerning the interpretation of the Convention and the Protocols

thereto.

2. Such opinions shall not deal with any question relating to the content or scope of the

rights or freedoms defined in Section I of the Convention and the Protocols thereto, or with

any other question which the Court or the Committee of Ministers might have to consider in

consequence of any such proceedings as could be instituted in accordance with the

Convention.

3. Decisions of the Committee of Ministers to request an advisory opinion of the Court

shall require a majority vote of the representatives entitled to sit on the committee.

Article 48: Advisory jurisdiction of the Court

The Court shall decide whether a request for an advisory opinion submitted by the

Committee of Ministers is within its competence as defined in Article 47.

Article 49: Reasons for advisory opinions

1. Reasons shall be given for advisory opinions of the Court.

131

2. If the advisory opinion does not represent, in whole or in part, the unanimous

opinion of the judges, any judge shall be entitled to deliver a separate opinion.

3. Advisory opinions of the Court shall be communicated to the Committee of

Ministers.

Article 50: Expenditure on the Court

The expenditure on the Court shall be borne by the Council of Europe.

Article 51: Privileges and immunities of judges

The judges shall be entitled, during the exercise of their functions, to the privileges and

immunities provided for in Article 40 of the Statute of the Council of Europe and in the

agreements made thereunder.

SECTION III: MISCELLANEOUS PROVISIONS

Article 52: Inquiries by the Secretary General

On receipt of a request from the Secretary General of the Council of Europe any High

Contracting Party shall furnish an explanation of the manner in which its internal law ensures

the effective implementation of any of the provisions of the Convention.

Article 53: Safeguard for existing human rights

Nothing in this Convention shall be construed as limiting or derogating from any of

the human rights and fundamental freedoms which may be ensured under the laws of any

High Contracting Party or under any other agreement to which it is a party.

Article 54: Powers of the Committee of Ministers

Nothing in this Convention shall prejudice the powers conferred on the Committee of

Ministers by the Statute of the Council of Europe.

Article 55: Exclusion of other means of dispute settlement

The High Contracting Parties agree that, except by special agreement, they will not

avail themselves of treaties, conventions or declarations in force between them for the purpose

of submitting, by way of petition, a dispute arising out of the interpretation or

132

application of this Convention to a means of settlement other than those provided for in this Convention.

Article 56: Territorial application

1. Any State may at the time of its ratification or at any time thereafter declare by

notification addressed to the Secretary General of the Council of Europe that the present

Convention shall, subject to paragraph 4 of this Article, extend to all or any of the territories

for whose international relations it is responsible.

2. The Convention shall extend to the territory or territories named in the notification

as from the thirtieth day after the receipt of this notification by the Secretary General of the

Council of Europe.

3. The provisions of this Convention shall be applied in such territories with due

regard, however, to local requirements.

4. Any State which has made a declaration in accordance with paragraph 1 of this

Article may at any time thereafter declare on behalf of one or more of the territories to which

the declaration relates that it accepts the competence of the Court to receive applications from

individuals, non-governmental organisations or groups of individuals as provided by Article

34 of the Convention.

Article 57: Reservations

1. Any State may, when signing this Convention or when depositing its instrument of

ratification, make a reservation in respect of any particular provision of the Convention to the

extent that any law then in force in its territory is not in conformity with the provision.

Reservations of a general character shall not be permitted under this Article.

2. Any reservation made under this Article shall contain a brief statement of the law

concerned.

Article 58: Denunciation

1. A High Contracting Party may denounce the present Convention only after the

expiry of five years from the date on which it became a party to it and after six months’ notice

contained in a notification addressed to the Secretary General of the Council of Europe, who

shall inform the other High Contracting Parties.

133

2. Such a denunciation shall not have the effect of releasing the High Contracting

Party concerned from its obligations under this Convention in respect of any act which, being

capable of constituting a violation of such obligations, may have been performed by it before

the date at which the denunciation became effective.

3. Any High Contracting Party which shall cease to be a member of the Council of

Europe shall cease to be a Party to this Convention under the same conditions.

4. The Convention may be denounced in accordance with the provisions of the

preceding paragraphs in respect of any territory to which it has been declared to extend under

the terms of Article56.

Article 59: Signature and ratification

1. This Convention shall be open to the signature of the members of the Council of

Europe. It shall be ratified. Ratifications shall be deposited with the Secretary General of the

Council of Europe.

2. The European Union may accede to this Convention.

3. The present Convention shall come into force after the deposit of ten instruments of

ratification.

4. As regards any signatory ratifying subsequently, the Convention shall come into

force at the date of the deposit of its instrument of ratification.

5. The Secretary General of the Council of Europe shall notify all the members of the

Council of Europe of the entry into force of the Convention, the names of the High

Contracting Parties who have ratified it, and the de-posit of all instruments of ratification

which may be effected subsequently.

DONE AT ROME THIS 4TH DAY OF NOVEMBER 1950, in English and French, both texts

being equally authentic, in a single copy which shall remain deposited in the archives of the

Council of Europe. The Secretary General shall transmit certified copies to each of the

signatories.