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1 1 Aos textos, com prazer! Sensibilizado, o GELING - Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Linguagem, FACED/UFBA - agradece o convite formulado pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia, gesto que a ele confere lugar distinto e de reconhecimento do argumento com que debate sobre leitura e produção de texto na perspectiva literária. Foi, entre textos, com textos e palavras que integramos ao grupo que fez acontecer o TAL. Atento ao poder fundador da linguagem, da linguagem verbal e ao gosto que desenvolve pelas palavras, pela sua invariável presença nos nossos encontros e na nossa convivência, materializando quereres e saberes, é que o GELING as toma, na sua potência, para louvar, celebrar, festejar os dias e as noites de atividades do Projeto! Com essa expectativa e com a de oferecer a todos os participantes palavras com as quais possam engendrar, de modo justo, projetos que assegurem a emancipação dos sujeitos que se educam nos espaços diversos que a Pedagogia pode ocupar, constituindo-os amplos espaços que abriguem um tipo singular de alegria, a “alegria cultural”, o GELING voltou à Casa das Palavras. Casa, construída com esmero por Galeano, o escritor uruguaio que, por vezes, nos visita, nos presenteando com suas “Palavras Andantes”. Ali foram encontradas certas palavras: palavras ocas, prepotentes, arrogantes, banais, graves, preconceituosas, inatuais, opositoras, palavras opressoras. É certo que foram encontradas outras palavras, almejando uso pleno, concreto, determinado: palavras otimistas, alegres, eficientes, exigentes, humanas, emotivas, exemplares, sinceras, dóceis, fraternas, flexíveis, ruidosas, brilhantes, eloquentes, efusivas, felizes, cooperativas, amigas, includentes, realizadas, audaciosas, enfim, palavras potentes. Essas, generosamente, se mostraram disponíveis para vocês e prometeram, sempre que necessário, pular todas as linhas, saltar das folhas, se refugiar em telas, renascer das teclas e fazer do TAL uma festa de palavras lidas, faladas, declamadas, musicadas, encantadas. Todas a favor da emancipação dos estudantes da educação básica de cada cidade que, no seu conjunto, conforma o estado da Bahia. Prometeram, ainda, saudar José Carlos Capinan, convidado especial que ao TAL se integra, por sua arte, pelo que dela ressoa na Pedagogia para que a realizemos, sob forma de versos, de prosas e de melodias. 13 12 Professoras do grupo GELING no TAL. Coordenação e Vice-coordenação do GELING - Dinéa Maria Sobral Muniz e Mary de Andrade Arapiraca.

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Page 1: Aos textos, com prazer! 1 Professoras do grupo … · Professoras do grupo GELING no TAL. Coordenação e Vice-coordenação do GELING - Dinéa Maria Sobral Muniz e Mary de Andrade

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1Aos textos, com prazer!

Sensibilizado, o GELING - Grupo de Estudo e Pesquisa em Educação e Linguagem, FACED/UFBA - agradece o convite formulado pela Secretaria da Educação do Estado da Bahia, gesto que a ele confere lugar distinto e de reconhecimento do argumento com que debate sobre leitura e produção de texto na perspectiva literária. Foi, entre textos, com textos e palavras que integramos ao grupo que fez acontecer o TAL.

Atento ao poder fundador da linguagem, da linguagem verbal e ao gosto que desenvolve pelas palavras, pela sua invariável presença nos nossos encontros e na nossa convivência, materializando quereres e saberes, é que o GELING as toma, na sua potência, para louvar, celebrar, festejar os dias e as noites de atividades do Projeto!

Com essa expectativa e com a de oferecer a todos os participantes palavras com as quais possam engendrar, de modo justo, projetos que assegurem a emancipação dos sujeitos que se educam nos espaços diversos que a Pedagogia pode ocupar, constituindo-os amplos espaços que abriguem um tipo singular de alegria, a “alegria cultural”, o GELING voltou à Casa das Palavras. Casa, construída com esmero por Galeano, o escritor uruguaio que, por vezes, nos visita, nos presenteando com suas “Palavras Andantes”.

Ali foram encontradas certas palavras: palavras ocas, prepotentes, arrogantes, banais, graves, preconceituosas, inatuais, opositoras, palavras opressoras. É certo que foram encontradas outras palavras, almejando uso pleno, concreto, determinado: palavras otimistas, alegres, eficientes, exigentes, humanas, emotivas, exemplares, sinceras, dóceis, fraternas, flexíveis, ruidosas, brilhantes, eloquentes, efusivas, felizes, cooperativas, amigas, includentes, realizadas, audaciosas, enfim, palavras potentes.

Essas, generosamente, se mostraram disponíveis para vocês e prometeram, sempre que necessário, pular todas as linhas, saltar das folhas, se refugiar em telas, renascer das teclas e fazer do TAL uma festa de palavras lidas, faladas, declamadas, musicadas, encantadas. Todas a favor da emancipação dos estudantes da educação básica de cada cidade que, no seu conjunto, conforma o estado da Bahia.

Prometeram, ainda, saudar José Carlos Capinan, convidado especial que ao TAL se integra, por sua arte, pelo que dela ressoa na Pedagogia para que a realizemos, sob forma de versos, de prosas e de melodias.

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Pré-modernismo e contexto socialAnderson Oliveira dos Santos

Entra Antônio Conselheiro (ar pensativo). Depois chegam: Euclides, Lima, Monteiro, Augusto, Graça.

EUCLIDES: Amigos, convidei-os para juntos olharmos a realidade do nosso país. Idealizá-lo apenas nas criações literárias não irá, de modo algum, libertar a oprimida nação.

MONTEIRO: É verdade, mas como fazer essa mudança drástica? Aqui há um aglomerado de problemas, que vão além do social, político, cultural e humano.

GRAÇA: Contudo, não deve haver fronteiras mais sólidas que a humanidade. Que todo ser humano constitui, é preciso acreditar na pessoa humana, acreditar num futuro melhor, mais justo!

AUGUSTO: Não, não podemos enquadrar todo indivíduo nesse conceito de humanidade, há muitos vermes que se vestem, falam, usam como humanos, e não trazem consigo o princípio básico da humanidade: o respeito ao outro.

LIMA: Belas palavras! Mas enquanto disputamos o melhor português, há pessoas reais que convivem todos os dias com a fome, a miséria, o preconceito real. E tudo graças à capacidade humana de discernir o negro do branco; o pobre do rico, mas não enxerga o humano do lado dos desfavorecidos.

ANTÔNIO: Senhores, se expusermos todos os problemas, não causaremos impacto. Temos que focalizar o mais abrangente, o que atende aos mais necessitados. Sugiro que cada um exponha o problema que julgue mais urgente que, resolvido ou amenizado, venha ajudar o maior número possível de brasileiros.

EUCLIDES: Bom, eu acredito que o pior problema do Brasil encontra-se no sertão nordestino.

JOÃO: Oh! Meu Deus, já perdemos nosso pezinho de mio, os granzim de feijão bicharo tudo. Não temo mai nada nessa vida. Só a cadela Piaba e a vaca Miana.

O que é, muié?

MARIA: Nada não, omi.

JOÃO: Como nada, muié, se tu tá com essa cara prálida e arbatida como da vaca Miana e triste como o cachorro Piaba?

MARIA: Oh! Meu véi, eu to é cu'ma fome que mim dói inté a alma, faz é tempo qui nóis não imbrulha o istombo e nem um gole d'água pra matar a sede.

(os dois se abraçam e choram tristes)

FOME: Ai, mainha, tá com fominha, é? Vai ter que me aguentar, porque existe uma rainha neste país, sou eu.

SEDE: Êpa... Calma aí, perua! Quem é você para dizer que reina no meu país?

FOME: A toda-poderosa. Sou a fome. E você, quem é?

SEDE: Ora quem sou? A rainha das rainhas, meu bem: a sede. Te mete!

FOME: Você pode até existir, mas eu ocupo lugar de destaque. Aqui são produzidos 41% a mais de alimentos que o total da população, que é de 191 milhões, aproximadamente, e ainda assim, eu reino.

SEDE: Hum, grande coisa! Porque o Brasil possui 12% de água doce do planeta, mas desse total o Nordeste tem apenas 3%. Olha esses pobres coitados, não têm uma gota d'água. Ainda bem, porque senão me matariam.

FOME: Então, vamos dividir a glória, nós duas imperamos.

SEDE: Somos assim: existimos, mas as pessoas fingem que não nos veem.

(todos saem: Maria e João tristes e elas felizes)

GRAÇA: Podemos abordar também a imigração alemã no Espírito Santo.

LIMA: Desculpe-me, caro amigo, mas os brancos, mesmos os estrangeiros, sempre tiveram seu espaço neste país.

(neste momento, entram Taís e Nara conversando, quando passa um “home branco”)

NARA: Eh, papá, que delícia, um deus grego! Que pele branquinha! Parece um anjo.

TAÍS: Cruz credo!!!!!!!! Se esse é anjo, o deus grego, o sapo sempre foi o príncipe lindo das estórias. (passa o “home” negro)

TAÍS: Isso sim é uma beleza divina, não por ser grega, mas original em qualquer lugar do mundo.

NARA: Eu, hein? Só gosto de carvão pro churrasco. E só final de semana. O cheiro de fumaça, então!... Me dá náuseas. Olha o cabelo, tenho alergia a esponja de aço.

NEGRO: Desculpe-me, mas falou comigo?

NARA: Além de negro, é surdo.

TAÍS: Que é isso, Nara?! O ser humano não é reconhecido pela cor da pele, mas pela humanidade e, só por essa condição, ele merece respeito. Peça desculpas. (Taís desdenha)

NEGRO: Chega! Chega! Já sofremos demais neste país. Fomos arrancados de nossa pátria, transportados nos porões dos navios como ratos imundos, trabalhamos duro para construir esta nação que nos humilha, nos

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condena a uma vida refreada de sonhos, respeito, liberdade. Somos humanos. Gente que pensa, que sente, chora com o desemprego, com a injustiça e a frieza de suas almas limpas de humanidade. Somos gente! Somos gente! Somos gente!

(o negro sai orgulhoso de si e as meninas com ar reflexivo)

MONTEIRO: De fato, o negro é muito injustiçado neste país, mas nos subúrbios do Sudeste há uma concentração ainda maior, injustiçada.

EMERSON: Olha o doce! Olha o doce! Compra, moço! Compra, senhora, é pra ajudar minha mãe.

ALAN: Que nada, seu bandidinho! É pra você usar drogas e comprar armas pra matar pessoas de verdade, não vermes como você!

ALAN: Por que tanto ódio, senhora? Não lhe fiz nada.

VALKÍRIA: Você existe. Isso é o bastante pra te odiar.

ALAN: Ninguém nasce pobre porque quer! (baixa a cabeça e chora)

MEL: Olá, menino! Como se chama?

ALAN: Alan.

MEL: Por que choras?

ALAN: Por tantas coisas... só não tenho motivos pra sorrir.

MEL: Por quê?

ALAN: Moça, moro na favela, tenho seis irmãos, meu pai morreu no tráfico de drogas e eu, pra não entrar nesse mundo sem volta, estudo à noite, à tarde tomo conta de meus irmãos e pela manhã enfrento uma realidade pior que a do morro. Lá existe fome, drogas, violência, mas todos são tratados por igual. Aqui eu sou o pior dos miseráveis. O mais desprezível.

MEL: Poxa, como você sofre! Mas você será um grande homem, a educação lhe trará recompensas, mas por enquanto eu vou ajudá-lo. Graças a Deus, tenho recursos, vou empregar sua mãe, que terá um salário digno e você e seus irmãos vão estudar para mudar a realidade de vida de outras pessoas que sofrem injustiças.

ANTÔNIO: Senhores, todos os problemas têm suas vítimas. Por isso, precisamos combater a injustiça. O preconceito e a miséria que atrofiam a felicidade deste povo, que luta todos os dias para se manter vivo e honesto e que tenta com o sorriso vencer as barreiras históricas da desigualdade.

MONTEIRO: Gente, os grandes gênios e heróis desta nação nunca fomos nós que fazemos parte da história oficial, e, sim, o povo, que vive todos os dias a verdadeira história.

LIMA: É verdade, e todos eles são exemplos.

GRAÇA: De quê?

NARA E TAÍS: SUPERAÇÃO!

FOME E SEDE: PERSISTÊNCIA!

ALAN E MEL: SOLIDARIEDADE!

JOÃO E MARIA: ESPERANÇA!

NEGRO: CORAGEM!

TODOS: BRASILEIROS!

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TemeriasElielson dos Santos Rios

Temeria eu as trevas

Se não andasse nas sombras

Se não visse nela a beleza da noite

E o encanto das auroras

Temeria eu o veneno da serpente

Se não provasse o amargo da solidão

O vazio e o silêncio da tristeza

Que ferem este meu coração

Temeria eu a fúria da natureza

Se eu não percebesse a tua beleza

Se não olhasse a primavera

E as flores de sua grandeza

Sim, eu temeria o que era mau

Da solidão às trevas

Da vingança à noite

Do vazio à tua perda

Sim, eu temeria.

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Canção da vidaEdemilson Brito dos Santos

Necessária para todos... Valorizada por menos.

É um amor verdadeiro, sem medir condições.

É uma aventura? Uma paixão de festa?

É um acorde sem ritmo? É um tempo perfeito.

“Poucos sorriem”... Muitos choram na trajetória do canto.

Há quem dança no ritmo, outro no ritmo desencontra.

Há quem mesmo sem ritmo traz sentido nesta dança.

Há quem grita, e não é ouvido.

Há quem é ouvido sem gritar.

Há quem no início já chega ao fim.

Há quem cante toda a música, e o faz cantar também.

Há um sorriso enganador, uma lágrima verdadeira.

Há uma tristeza na dança, uma alegria encantadora.

Supere os arranjos... Valorize a melodia...

Tire os supérfluos...

Cante e dance a canção da vida.

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PassarinhoDamilly Freires da Silva

Queria ser um passarinhoQue gostasse de voarQue saísse do seu ninhoQue pudesse passearEncontrar um arco-írisCom todas as suas coresPoder brincar com o ventoPoder brincar com as floresQueria abraçar as nuvens,Branquinhas como algodão,Viajar para o espaçoConhecer Marte e Plutão.Quando sentisse medo,Nas estrelas ia me esconder,E bem pertinho da lua, iria adormecer.Iria seguir uma pombinha,Que para a cidade ia me levar,Pousava numa pracinha,E ficava a esperar,Que uma velha senhora,Viesse me alimentar.Ao chegar o pôr do sol,Voltaria para o meu ninho,Brincando com os meus amigos,E recebendo carinho,Pois essa é a minha vida,A vida de um passarinho.

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Mel que adoça a alma Danyella Simões dos Santos Souza

O céu estava nublado e os pingos da chuva batiam com força na janela, enquanto olhos cor azul cerúleo fitavam o aguaceiro lá fora. Estava sentada, penteando os longos cabelos negros, que contrastavam com sua pele pálida e seus olhos claros. A tarde de sábado parecia caminhar lentamente e a chuva fazia lembrar-lhe de sua infância. Adorava ficar em casa nos dias chuvosos, mesmo que também gostasse de estudar e sair, mas era um privilégio poder ter aquele momento só para ela.

A casa estava vazia. Levantou-se de onde estava sentada, colocou o pente sobre a penteadeira, pegou um caderninho dentro de uma gaveta e, naquele momento, ela iria se dedicar a uma de suas paixões: escrever.

Notou que restavam poucas folhas e que, brevemente, precisaria de outro caderno. Sentou-se no meio de sua cama e sentiu-se serena. Seu quarto tinha tons róseos e sua cama estava forrada por um cobertor com detalhes florais. Ao folhear seu caderninho, veio em sua mente a imagem de dois olhos cor de mel que ela conhecia muito bem. Foi o dono desses olhos que a inspirou a escrever a maioria dos poemas que havia naquele pequeno caderno. Lembrou-se de quando era novata no colégio, há dois anos, e não conhecia ninguém. Ele foi o primeiro a falar: “Bem-vinda, Clarinha! Eu sei que pode parecer estranho, mas, se precisar de qualquer coisa, pode contar comigo!”

Depois de ter dito isso, abriu um sorriso resplandecente, que, só em pensar nisso, Ana Clara corava um pouco. Adorava ser chamada de “Clarinha” por ele. Mesmo que toda sua família a chamasse daquele jeito, com ele era diferente. Ele era a razão dela acreditar em si mesma. Sempre teve baixa autoestima e o garoto dos olhos cor de mel era seu sustento. Mesmo que ele não soubesse, esse era o segredo que Ana Clara nunca revelara a ninguém, somente para seu “caderno de confidências”, se é que podemos chamá-lo assim.

A chuva continuava forte, porém agradável. Envolvida por suas lembranças, ela sentiu suas pálpebras pesarem. Tentou lutar contra o sono, mas acabou adormecendo, acalantada pelo doce som dos pingos de chuva na janela.

Depois de algum tempo, Ana Clara começou a sonhar. No sonho, ela parecia estar em um ambiente familiar. As paredes eram rosadas e tudo estava no seu devido lugar. Logo ela percebeu que estava no próprio quarto. Levantou-se e fitou, por alguns segundos, uma cesta com pãezinhos de mel, sobre a penteadeira.

- “Marcelo...” – sussurrou o nome de seu amor secreto, enquanto olhava os pãezinhos de mel e se lembrava dos lindos olhos do garoto.

- “Seus olhos... sua voz... tudo em você adoça minha alma... me faz feliz.” – falava baixinho como se tivesse medo de alguém ouvir.

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Por impulso, ela se trocou rapidamente e vestiu um vestidinho branco acima do joelho. Olhou pela janela e viu que não chovia mais. As nuvens estavam se dissipando, mas o sol não ameaçava aparecer, e o ar estava agradável. Então, Ana Clara ficou mais confiante. Pegou a cesta de pães de mel e saiu em direção à casa de Marcelo.

Durante o caminho, ela pensava em algo para dizer a seu amado. A casa dele ficava a três quarteirões dali, e, quando Ana Clara estava prestes a bater na porta, pensou: “Já sei! Posso entregar essa cesta de pãezinhos e agradecer pela ajuda que ele sempre me deu na escola”. Um pouco trêmula, ela bateu levemente na porta e de lá de dentro da casa escutou alguém gritar “Já vai!”.

Ana Clara estava com a cabeça baixa, olhando para o chão, quando viu um corpo à sua frente: era ele. Marcelo estava com os cabelos castanhos molhados, como se tivesse acabado de sair do banho. Usava uma calça de moletom e alguns pingos de água que lhe caíam sobre o ombro e molhavam seu peito nu davam a ele um ar sedutor.Ela imediatamente ficou rubra. Não estava acostumada a ver um homem sem camisa na sua frente. Marcelo, ao ver Ana Clara com uma cesta na mão, não entendeu nada. Para quebrar o silêncio, ele foi o primeiro a falar:

- “Você? Aqui? O que aconteceu?”

Essas três perguntas fizeram Ana Clara se entristecer. Não queria ser um incômodo. Ele, percebendo que havia sido frio demais com sua colega, tentou soar mais suave:

- Pãezinhos de mel? Isso é pra mim, Clarinha? – Marcelo se aproximou do rosto de Ana Clara para falar, e ela estava embriagada pelo aroma refrescante que exalava da boca do rapaz.

Um pouco tímida, ela se pronunciou:

- Na verdade é. Eu vim aqui agradecer por você sempre me ajudar e me apoiar, eu também queria saber... – Ana Clara foi interrompida por uma garota loira, muito bonita, por sinal.

- “Ah, não fica aí batendo papo, Marcelo. Entra logo, meu amor!”

A menina loira tinha uma voz bastante aguda. Combinava perfeitamente com a altura dela, já que não era muito alta.

Ana Clara, vendo aquela situação, entendeu tudo. Provavelmente, a garota loira era namorada de Marcelo. Ela, com rapidez, entregou a cesta de pães a ele e saiu correndo até sua casa, o mais rápido possível, para que Marcelo não visse os pequenos cristais de lágrimas que se formavam nos seus serenos olhos. Foi nesse momento que ela acordou. Lembrava-se perfeitamente do sonho que tivera, mas não se lembrava de conhecer nenhuma garota loira e baixinha. O sonho era tão real, mas a suposta namorada de Marcelo era fruto da sua imaginação fértil. Levantou-se da cama e sobre a penteadeira não havia nenhuma cesta com pãezinhos. Somente uma caixinha de música. Revoltada, sentou-se na cadeira acolchoada da penteadeira, pegou seu caderninho e se pôs a escrever:

“Olhos de mel,

Sorria para mim.

Será que não vê,

Que estou aqui?

Olhos de mel,

Olhe pra mim.

Será que percebe,

Que olhos de cerúleo velam por ti?”

Por um momento, ela parou de escrever e olhou-se no espelho. Não se achava feia. Na verdade, era muito bonita. Os longos cabelos pretos que iam até a cintura lhe caíam sobre os ombros, seus olhos azuis combinavam com sua pele branquíssima e as paredes do quarto emprestavam a ela o tom rosado para suas bochechas. Parou de se olhar no espelho e voltou a escrever:

“Olhos de mel,

Você vai chorar,

Quando a dama dos fios dourados partir?”

Ana Clara enfureceu-se. Falava para si mesma: “Ótimo! Acabei de chamar minha rival imaginária de dama dos fios dourados!” Rasgou o poema que fizera e o jogou na lixeira. Não queria mais ficar em casa. Vestiu uma calça jeans e um blusão azul. Pegou algum dinheiro para comprar uma caixa de bombons. “Chocolate é mais informal e todo mundo gosta” pensava, enquanto escrevia um bilhete para entregar a Marcelo junto com os chocolates:

“Você pode me achar boba,

Pode ser que nem me queira,

Não aguento mais guardar isso só pra mim,

O que eu quero,

É que você responda sim.

Por que... EU TE AMO!”

Dobrou o papel ao meio e no verso da folha escreveu:

“Seus olhos

São como mel,

Que adoçam minha alma”.

Ana Clara

Guardou o bilhete no bolso e saiu de casa confiante. Tinha certeza de que tudo daria certo. Caminhava a passos lentos até a casa do seu amado, já que não tinha pressa. Não chovia mais. No céu, se via um belo crepúsculo e tudo colaborava para que aquele fim de tarde fosse perfeito. Seus lábios estavam desejosos para ter Marcelo e dar-lhe beijos lascivos, sua pele transpirava ao pensar no leve toque dos seus lábios com os dele, o ar estava quente e gostoso, as nuvens estavam alaranjadas e os pássaros pareciam formar uma sinfonia. Foi como se aquele entardecer fosse preparado especialmente para que uma garota de olhos cerúleos se declarasse ao amor de sua vida.

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Dezembro, 1961

Filipe de Almeida Góes

... De ver o teu corpo num pano cigano e sentir o teu cheiro que mora nas abas do meu paletó.De quando eu, todo plateia, vejo da cama quando tu vagarosamente te pintas com cores, com cores de quase luxo e diante da mentira do espelho és Narciso e és Orfeu.De te ver abrir as portas do armário e tirar dele tuas armaduras de guerra dizendo:- O azul ou o vermelho? Qual te faz mais gosto?Bem... Decerto que o azul era por demais decotado, mas o tom era doce e compadecia, já o vermelho, como todos sabemos, tinha mangas rendadas e compridas, mas a cor denunciava todo e qualquer pecado, e ainda que todas as noites me fizesse maquinalmente escolher entre os dois, surgias sempre da pequena cabina com o velho vermelho satânico e desbotado.E assim passariam as nossas noites. Tu, iludida, a me fazer de tolo.Eu, o tolo que tu querias, pediria-te apenas os olhos de fúria emprestados, sim, Ana, os pequenos olhinhos de fúria, para que, com eles, eu fizesse toda sorte de gozo, para que, com eles, eu me ressarcisse na noite e no tempo de tua ausência. De Vicente à Ana.

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Eu poeta tu poesia Alefe de Castro Dourado

Hoje fugi de tudo que penso e sou...

Hoje não sou poeta nem poema,

Não declamei a minha poesia,

Não tenho verso nem rima,

Como outrora em outros dias.

Em tudo havia versos,

Era fácil a rima em tudo que tu dizias,

A cada gesto e sorriso teu,

Enchia-me a alma de alegria.

A vida era poema,

E era para você a minha poesia,

Tu eras a razão de tudo que eu tinha.

Mesmo assim, você se foi

E levou junto o que não podia.

Parte de mim não existe mais,

Agora são palavras no silencio,

O grito ecoa no pensamento,

O que a boca não diz.

Tu calaste a minha voz,

Tu mudaste o que eu sentia,

Tu só não levaste junto a ti,

A rima da minha poesia.

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Versos disfarçados Társis Nascimento da Silva

É tudo o que posso fazerNão posso mudar o lugarEu posso mudar o que souE assim tudo renovar

As lutas são só aquecimentoBatalhas irão começarEu não quero ser o sargentoSou apenas mais um militar

A guerra não é o fimSó é a última etapaUm passo para a liberdadeQue só começa ao fim da batalha

Não gosto de campo minadoMas sou uma mina douradaA felicidade é tudoPor isso não penso em nada

Esses versos são só disfarcePra falar de um amor maiorPreste atenção, chegue mais pertoPerceba que o assunto é um só

Falo da amada escolaFalo das etapas que passeiFalo das etapas que virãoE dos caminhos que andei

É tudo o que posso fazerO amor em versos disfarçarE um dia quem sabe verBatalha e guerra em paz se tornar

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10Um lugar diferenteAna Vitória Ribeiro Santos

Aqui, moram as mil maravilhas!Aqui, mora o Nosso Senhor.Uma cidade tão lindachamada São Salvador.

Quem mora aqui,não precisa saber versar.Basta olhar as rimasque em cada canto há.

E só assim vai entenderque oxente é censura eque tu é você!

Café é cafezinho.Mãe é mainha.Pai é painho.

Ônibus é busu.Se passar na Liberdade,não esqueça do Curuzu.

Um lugar diferenteé sempre bom conhecer.E saber que o Pelourinho...Lugar bom de viver!

Lá tem dança que é lutae muito tema de canção.Uns chamam de capoeirae outros de sedução!No Mercado ModeloVai sempre encontrarmuita gente elegante,muita paz e amor!Da saída do mercadoaté o elevador.

No dia de Todos os Santostodo mundo quer rezar.Aquilo, que mal o levae tudo de bem o traz.Quem é que nunca pediua proteção dos Orixá?

A moqueca aqui,um prato bem apreciado.Não importa se é marisco,camarão ou dourado.

E lá se vai homem.Retira a rede do mar.Pena que nada fisgou,mas ele já deve saberdo dia da pesca e do pescador.

Depois se deita na areiapara poder descansar.E olhar as embarcaçõesde lá do meio do mar.

Quem parar no Rio Vermelho,pode até acreditarque outro navio Negreiroé capaz de chegar.Jamais trazendo dor,apenas alegria,pois cada um já vaichegar com uma carta de alforria.

Agora vou lhe dizerde um lugar ainda oculto,porque ninguém presta atençãonas pessoas do subúrbio?

Lá tem festa e tem foliae criança pode brincar,se o vizinho bate a laje,o restante vai ajudar.

O nosso pagoderitmo pra quem gosta de mexerda Baixa do Fiscal a Paripevocê precisa conhecer...

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Zé da Silva Patrício Almeida Silva

Poderia acontecer em São Paulo ou na BahiaCom o filho de qualquer um José, uma Maria,Mas foi com o Zé da Silva nascido no interiorQue desde pequeno dizia: mamãe vou ser doutor.

Sua mãe o aconselhava: estuda que você consegue,Tamanha foi sua alegria ao entrar para primeira sérieCalçava chinelos de dedo, pois sapatos ele não tinha, Mas tinha muita vontade de ajudar sua mãezinha.

Quando menos esperava aos doze anos sucedeu,Para o espanto do Zé da Silva, seu velho pai faleceu.Ele abraçou sua mãe e ali fez uma promessa:Nunca mais vamos passar uma tristeza como essa.Mas as coisas não saíram como ele planejou,Pois era muito sofrida a vida no interior.Teve que deixar os estudos, para poder trabalhar,Não aguentava mais ver sua mãezinha chorar.

Era só um Zé da Silva sem nome nem identidade,Mas como toda gente sofrida não lhe faltava dignidade.Trazia esperança na vida e uma fé no coração,Por isso toda a noite proclamava uma oração.

Depois de muitos anos, sem ao menos descansarTomou uma decisão: voltar a estudar.A sua velha mãezinha muito o encorajouEstava muito feliz que forte o abraçou.

Passados alguns anos de estudos e dedicaçãoEle estava finalmente com seu diploma na mão.E era só um Zé da Silva, nascido no interior,Que não desistiu dos seus sonhos e agora é doutor!

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12O caipira estudanteEdemilson Brito dos Santos

O caipira estudantePassa por dificuldadesPois o que encontra na escolaNão é a sua realidadeVive perdido no mundoSem saber o que é verdade.

Na sua vida de roceiroAprendeu a “trabaiá”Mas quando chega na escolaTem alguém a reclamarDizendo-lhe todo diaNão é assim que deve falar.

Se ele fala bom-dia, “fessôra”Já vem logo a correçãoÉ bom-dia, professoraFale com mais dicçãoE desse momento em dianteA aula não presta não.

Senta no seu cantinhoSe sentindo excluídoTem vontade de falarMas não se sente instruídoE tudo que a professora falaNão fica bem-entendido.

Não há bom entendimentoTem vergonha de se expressarSe fala do jeito que sabeÉ condenado a calarSe fica quieto no seu cantoA professora vem perguntar:

Que mal te aflige, menino?Por que tanta melancolia?É preciso dizer o que sentePara sair dessa agoniaE estar de bem com a vidaSeja de noite ou de dia.

O coitado do caipiraComeça a se encorajarDiz, fessôra, eu num sou esse bestaQui a sinhora tá a pensarQui só presta pra burro de cargaE ajudá meu pai prantar.

Lá na roça sô sabidoFaço tudo direitimCapino e faço roçadoDe tudo sei poquimPego inté no machadoE tiro mi madurim.

Intendo do crimaE tombém da vegetaçãoConheço todo o segredoDo meu quirido sertãoSei inté quando vai chuverE quando vai ter verão.

Num sei muito dessas coisaQui insina aqui na escola, nãoMas na roça sô dotoCom diproma e tradiçãoPur que intendo de tudoQue se passa no sertão.

Sertanejo é cabra da pesteCumu todo mundo dizEu se arrastei agoraInté empinei o narizA sinhora escute bemQui vai ser minha aprendiz.

Quando o mandacaru infuloraE arapuá faz méIsso é um bom sináPur que vem chuva a granéMas tombém no sertãoTem sinal qui ninguém qué.

Se a cuã canta pertim de casaVou pra capela rezáPur que é sina de agôroE é preciso ispantáRezar crem-Deus-PaiE fazer o pelo siná.

Se o galo canta fora de horaÉ disastre e preocupaçãoÉ mocinha qui vai fugiCom trama e inrolaçãoInganano o pai e mãeE tombém os seus irmãos.

É isso mermo, fessôraEntoce disabafeiVô sair daqui mais leveNum sei se vorto outra veisVô pra minha querida roçaPur que lá sô um burguêis.

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Essa é mais uma históriaQue revela o preconceitoEstendido ao caipiraQue tem o seu próprio jeitoE encontra pessoas que dizemQue ele não sabe falar direito.

Para esse tipo de pessoaDeixo aqui o meu sermãoÉ preciso respeitar a culturaCom toda sua variaçãoSeja em qualquer instânciaNa língua ou religião.

Xô todos os preconceitosAté logo, racialVai te embora, linguísticoInté mais ver, socialEntendemos que é preciso

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O novo corcunda de Notre-Dame

Lília Hendi Souza Silva

situações quase nossas, os segredos nos permitiam vigiar as portas dos outros, mesmo que parecessem discretos e infinitamente ocultados. Era tudo muito rotineiro na rua das Andorinhas. Os carros passavam enfileirados sempre nos mesmos horários. Senhoras aposentadas conversavam em seus passeios, e crianças corriam no jardim que ficava próximo à ladeira dos coqueiros.Diziam que uma família morava no topo da ladeira. Ninguém sabia o nome deles, pois nunca se socializaram com o restante da vizinhança. Só os avistávamos de longe. Pareciam sérios e mórbidos, com os seus carros de luxo, roupas pretas engomadas e sapatos de verniz. Entre partidas misteriosas, voltas cautelosas, todos os segredos pairavam sobre eles.Desconfiava-se bastante e sempre se dizia que eles tinham algo a esconder. Alguns encaravam aquela família como seres de outro universo perdidos nesse mundo. E eu nem sabia o que dizer.Certo dia, resolvi subir a ladeira dos coqueiros. Logo vi a casa, que parecia mais um casarão movido pelos silêncios que vinham de dentro. As portas eram belas, com enfeites circulares e fechaduras douradas. Havia um gramado verde que parecia ser bem cuidado. As janelas eram retangulares e grandes com os mesmos enfeites dourados. De repente, avistei alguém em uma das janelas. Parecia estar curvado como se as suas costas fossem escandalosamente altas. No mesmo instante, apareceu uma senhora e fez sinal para que ele saísse da janela rapidamente.Fiquei intrigado. Não deu para observar o garoto porque a senhora o havia tirado de lá muito depressa. A curiosidade tomou-me o corpo de forma investigativa e me deu a energia necessária para buscar respostas. Se fosse necessário, correria quilômetros para desvendar este mistério.De volta ao espaço real, afrouxei as reflexões. Preferi observar por um tempo, em vez de pensar demais naquilo que não me traria respostas. De repente, voltei os olhos para as janelas. Lá estava o garoto novamente, desta vez sem a senhora. Estava ofegante e tinha nos olhos o pânico do prisioneiro que acaba de fugir da prisão. Certamente, havia conseguido escapar daquela mulher.Avistei aquela imagem. Era através dos vidros que eu observava e estes não impediam que eu tivesse uma visão assustadora. O corcunda parecia ter herdado todos os traços da feiúra: como nariz pontudo, verrugas na face, sobrancelhas grosseiras e desordenadas, mãos cabeludas, dedos longos, olheiras e corpo excessivamente malfeito. A sua idade parecia indecifrável, e eu não ousaria arriscar.Os segundos passavam.Ele olhava para mim com uma expressão séria e penosa, encarando-me curiosamente. De repente, eu quis chegar perto e ouvir a sua voz. Quem sabe não conseguiria um diálogo?No momento em que iria haver a tão esperada aproximação, ouvi gritos de dentro do casarão. O silêncio havia desaparecido de forma brutal e pessoas começaram a aparecer no local onde estava o corcunda.

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Pegaram-no com força pelos braços e pernas e eu consegui ouvir palavras como “esquisito”, “feio”, “horrível” e um sonoro “quem você pensa que é para querer se aproximar de alguém tão diferente de você?”Eu não conseguia acreditar e em vez de denunciá-los, preferi apagar aquilo da mente. Percebi que nós, seres humanos, fugimos das dores e, ao mesmo tempo em que temos a intenção de ajudar, somos egoístas.Fui embora.Nunca mais voltei à ladeira dos coqueiros; também, preferi não contar sobre o corcunda a ninguém. As pessoas disseram que, com o tempo, foram vendo cada vez menos a família misteriosa até pararem de ver definitivamente. Deviam ter mudado de cidade para acabar com as especulações das pessoas que moravam na rua das Andorinhas.

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Quem sou... Ester da Silva Ricarte Lima

Eu sou o amor, a flor do campo, a chama que arde no peito.

Eu sou, Daniel, Esthefany, Júnior e serei Samuel Victor.

Eu sou família, pai, mãe, irmãos e, mais ainda, Luciene.

Não sou mentira, nem inveja, e muito menos falsidade.

Sou coragem, sou amiga e muita felicidade.

Eu sou bife acebolado com arroz branco e batata frita,

Sou lasanha ao molho branco e vermelho e ainda pizzaiollo

Eu sou o amanhecer, o escurinho do cinema.

Eu sou a viagem, a sinceridade e, muitas das vezes, a realidade.

Eu sou vinte e sete de março todos os anos,

Sou cantora, música, música e música.

Eu sou a escola, a igreja, a casa, a bíblia

Eu sou a pé, a bicicleta, sou o chocolate marrom, principalmente o batom.

Eu sou mais eu.

Eu sou tudo de bom e nada de mal.

Eu sou o infinito.

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Estudante viajante

Luziane Souza Pereira

Chove. A chuva fina é uma cortina cobrindo o solEscorrega no barroAnda à espera do carroA chuva escorre na caraEnquanto espera o “pau-de-arara”Que chega e para.

Sobe e senta e se contenta com a paisagemViaja sem passagem e a paisagem é linda!Se o sol está quente, o calor que se senteÉ ainda maior que o do corpo da gente pingando suor.É o coração suando!

Na volta, todo corpo se entorta para ver o pôr do sol.Todo corpo se entortando e o carro virando na curva.O almoço revirando no estômago.Aos tombos o corpo se acostuma e nem está mais sentindo

Quando não há chuva, há a poeira cobrindo.Mas a vida está indo. O carro está indo...A viagem é curta e a vida mais ainda.A viagem é a vida.A vida do estudante-viajante.A vida se enche de felicidadeAo ver a cidade chegar.Grato pela oportunidade de estudar!

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Censurado sou...Alberto Kaíque Medeiros Rodrigues

Me calaramMe mataramExpulsaram de mimNão me deixaram ser.

O meu medo, o meu amor...Minha forma de expressar,Minha forma de amar,O meu ser, o meu...

Deixando as cicatrizesFazendo as marcasCalando a dor da almaCalando as vibrações do pensar...

Censurado por ser quem souMas eu sinto...Eu sinto que seiSinto que sou, que sei quem sou.

Tenho que ser eu mesmoSempre o mesmoLamentavelmente, eu sou assim...

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Retratos da vida Rogério de Jesus Santana

Eta, vida sofrida!Pela justiça e a lei esquecido, sofro meu viverPor falta de escudo, estudo, não mendigo amorVivo revoltado sou mal compreendido.

Sem destino certo, tomo caminho erradoPor uma bituca, que deixa quem a prove birutaAcabo espancado, preso, humilhado...Em seguida só me resta lutar.

Meu Deus! Queimei meus trocadosLevei a culpa do fazendeiroQue em minhas mãos fez riamba chegar Não quero fugir à culpa, sei que estou errado.

Pra lá fui arrastado, de fato Mas se tivesse dinheiro, não seria espancado…Seria internado, bem-tratadoE… até paparicado.

De volta à real: açoites de um funcionárioQue vive com um mísero salárioO abuso de autoridade o leva a errarInverte o papel de cuidar: quer matar.Será que somos irmãos?Nossa epiderme é igualSei não…Vejo que um distintivo faz diferencial.

Fui arrancado de casa logo cedoAntes dos quinze desconheci o medoAnos depois viramos parceiros

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De minha mãe (África) sabia pouco: dormiaOuvi que é linda e majestosaTem filhos por todo mundo: é grandiosaSenti um amor intenso: acordei.

Por isso fiz aquela perguntaPois vejo um irmão fraco, acostumado à escravidãoObedecendo aos mandos do senhorzinho “Sistema”Sonha ainda ser “Capitão do mato”, desconhece sua raiz.

Mas dele não guardo raivaE sei que a Mama também nãoMandela também perdoouQuem o levou pra prisão.

Ouvi falar de ZumbiDesse dá orgulho falarMerece ser eternamente lembradoPelos irmãos não se cansou de lutar.

Como Cristo pereceuMas conseguiu no braçoA tinta Áurea almejada Que marcou e mudou nossos laços.

Hoje vivemos ligadosPela história…Pelas lembranças…Pelos traços sanguíneos…

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Valeu, Zumbi, grande guerreiroImbuído do poderoso Jah lutou até a morteEm nome da liberdade de um povoPara nunca mais deixar-se escravizar.

Eta, vida sofrida! Mas vale a pena lutarSou afro de orgulho virilSaiba você e outros mais:A minha Mama é a ÁFRICA e o BRASIL é o meu pai.

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Deus lhe pague! Marco Antonio Lacerda Abreu

Eu nunca pensei exatamente como seria se fosse rico, ir para o colégio de carro com meus pais de manhã cedo e ainda sorrindo, simplesmente eles ficarem completamente contentes só pelo pequeno fato de eu estudar, se preocuparem pelo mínimo motivo de não me esforçar nos estudos, mesmo tendo mil preocupações. Mas não tive tempo de sonhar.Era sol de meio-dia, estava sentado no chão em frente a minha casa, com a barriga lotada de arroz e farinha. Eu não estava sozinho, um grupo de idosos ouvia a rádio, enquanto eu pegava carona junto com eles. Toda rádio nunca deixa escapar um assunto de política, e toda vez que toca nesse assunto sempre escuto dizer:— Sempre fazem ao contrário do que falam, e quando fazem é tão pouco... - reclamou minha avó enquanto ouvia a rádio.Mas até que eu concordava, sempre pergunto dentro de mim por que eles só tomam alguma atitude antes de ganhar. Por que não deixar para fazer isso quando forem eleito? Mas consegui descobrir.

♦ ♦ ♦Lembro-me muito bem do dia cinco de setembro. No bairro onde morava nunca se ouviu tanto barulho quanto aquele dia. Passavam carros de som frequentemente, as senhoras saíam de suas casas de pau a pique e ficavam na porta escutando o pequeno discurso do tal candidato. Quando não era um discurso, era uma pequena paródia musical que tocava falando seus objetivos políticos pelo ritmo, enquanto isso as crianças dançavam felizes. Confesso que fui uma delas.Passei o dia inteiro sem comer nada, mainha prometeu que hoje comeríamos o dobro, mas não tinha nada para comer. Minha barriga revirava de fome enquanto olhava as estrelas. Meus quinze irmãos já estavam dormindo e minha mãe estava sentada na porta da frente. Devia ser meia noite, quando escutei um barulho de carro. Os olhos de mainha se arregalaram, senti que a sua preocupação estava por fim quando ela se levantou correndo. Eu estranhei a sua atitude e segui segurando a mão dela. A pressa era tão grande que ela me pegou pelo colo e saiu correndo no meio da rua empoeirada, cheia de buracos.Depois de alguns minutos, estava num beco escuro lotado de gente esperneando. Muitos rostos presentes eu reconhecia, outros não fazia a mínima ideia de quem eram. Mas percebi que o tal barulho de carro que eu escutei era justamente aquele carro que retirava cestas básicas e entregava aos moradores. Eles entravam em desespero quando viam retirando os mantimentos e iam alongando a fila indiana. Minha mãe, em desespero, empurrava aqueles que estavam na nossa frente para chegar o mais perto possível do tal carro — e conseguimos — eles nos viram e nos puxaram bem mais perto.

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— Aqui está, senhora, dentro da cesta tem um santinho, se pretende que eu acabe com a fome de muita dessa gente ainda e continue o que estou começando... — disse um homem bem-educado que sorria tão aberto que não sentia sinceridade nele.Mainha olhou nos olhos dele, estendendo as suas mãos calejadas de enxada, recebendo a cesta logo que me colocou no chão.— Deus lhe pague, meu filho! — agradeceu sorrindo, contente, mostrando seus poucos dentes ainda não dominados pela cárie.Juro que senti um sorriso ambicioso que soltava o tal homem, parecia que estava satisfeito em ter ouvido aquelas palavras simples e tão humildes. Naquela hora queria decifrar o porquê de tanta satisfação, mas não consegui. Foi tão rápido o sorriso dele, que logo após se desmanchou antes de beijar minha bochecha. Não gostei, devia me sentir honrado por um futuro prefeito beijar o meu rosto, um rosto de qualquer, mas não senti.Cinco horas da manhã podia já sentir o cheiro do feijão, quando acordei. Levantei do chão e fui abraçar minha mãe com um sorriso grato. Na verdade, além de estar com fome, não aguentava mais comer arroz puro. Sei que devia agradecer a Deus por estar comendo alguma coisa. Passei junto com minha família comendo o dia inteiro, o dia inteiro não foi. Às dezenove horas já não tinha nada mais para comer. Deu meia-noite, uma hora, duas horas da manhã e eu e mainha não escutamos nenhum barulho na rua, desistimos e fomos dormir.Depois de um ano, finalmente o homem que beijou meu rosto se tornou prefeito, ele criou tal projeto comunitário oferecendo cartões com uma quantidade financeira para auxilio alimentar e escolar. Isso foi ótimo, não morri de fome, tenho agora vinte e três anos. Comecei a trabalhar como faxineiro de um shopping e com esse mísero salário, afundei minha cara nos livros. Comprava-os para que, de noite, pudesse estudar. Só hoje descobri o porquê do tal sorriso ambicioso do homem candidato das cestas básicas. Ele queria mesmo era que minha família dependesse dele para o sustento, e não para que um membro da família a sustentasse. Sem a dependência, nós não reconheceríamos as atitudes dele, por isso ele lançou aquele sorriso ambicioso, que quanto mais as pessoas o agradeciam pela esmola mais votos ele teria a seu favor. Somente hoje fui entender por que não devemos só olhar o presente e, sim, o futuro.Estou lutando para que eu consiga crescer, aprender mais e mais, já que o tal homem político não investiu na educação para que cedo eu pudesse estar estudando e hoje já estar formado. Pena, antes desejava estar com a barriga cheia, só a barriga, hoje estou querendo encher minha mente de informações. Meu nome? Pra quê? Ninguém dá a mínima para escritor, em breve saberá de mim quando eu for presidente.

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As crianças do Brasil Tamires de Lima Sousa Santos

Salve, salve! Minha genteQuero me apresentar,O meu nome é TamiresE tenho muito pra falarPor isso peço atençãoNa hora de me escutar.

Os meus versos não são de amorNem tampouco de paixãoSão versos de alguém tristeE com dor no coração.

Pois vejo crianças largadasPor este mundo, jogadasSem carinho ou atençãoDormindo a céu abertoEm algum lugar desertoOnde a cama é o próprio chão.

Criadas sem pai nem mãeVivendo sozinhas, vagandoPedindo pra todos os santosPara parar de sofrerPois nenhuma delas é culpadaE nem pediu pra nascer.

Exploração, morte e tragédiaÉ lição que o mundo ensinouPois não tiveram oportunidadeDe serem alguém de verdadeEssa é a verdadeira faceDe quem nunca estudou.

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Algumas sem opçãoDe não ter o que comerVivem com um canhão na mãoNo meio da multidãoSó para roubar um pãoPra de fome não morrer.

Muita gente fala que elasSão o futuro da naçãoMas na hora de dar o exemploNão dão sua contribuiçãoFazendo com que se espelhemEm um bando de ladrão.

Mas cadê a sociedadeQue tanto fala em ajudar?E os políticos que prometemEssa questão melhorar?Será que fazem alguma coisaOu só falam por falar?

Por isso quero pedir, Meu Senhor e minha Senhora,Que nunca abandone seu filhoNem sequer por uma horaE sem esquecer a liçãoPeço de joelhos no chãoColoque seu filho na escola.

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Mundo real Elissandra Azevedo de Oliveira

Fácil é poetizar o mundoCom rimas e versos perfeitosDifícil é a realidadeÉ aceitar, na verdadeSeus problemas e defeitos.

Tanto desmatamentoTanta poluiçãoO homem está sem limitesSem limites é sua ambição.

Não pensam no futuroTem rude comportamentoNão cuida do que ainda existeSão almas sem sentimentosAssim o futuro de muitosLágrimas e sofrimentos.

Diariamente nos jornaisNa manchete, violênciaInocentes perdem a vidaPara a iniquidade e imprudência.

E a juventude de hojeEstá ou não preocupada?Uns pensam no futuroOutras já são desligadasEntão, qual sua maioriaAtivas ou alienadas?

Uns entram no mundo das drogasBrincam com a própria sorteE sem perceber eles assinamSua própria sentença de morte.

Em cada canto do mundoHá preconceito, corrupçõesNas ruas, fome e miséria Desigualdades, ambiçõesAtitudes desumanasPara com muitos de várias nações.

E assim tocam a vidaEm busca da felicidadeTentam sobreviverSuperando dificuldades.

Mas, diante de tais desordensO mundo ainda tem riquezasGente que luta e sonhaHonestas, sem avarezaTerras de maravilhasRelíquias de grandes belezas.

O mundo é um enigmaA vida um mistérioAmbos tão preciososE muitos não levam a sério.

Faça a diferençaNunca deixe de sonharLute pelos seus sonhosAme e ensine a amarNão destrua, construaSempre é tempo de recomeçar.

Esse é o nosso mundoOnde há o bem e o malMundo a qual muita genteÉ movido pelo real.

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Brasil rural Joelma Santos Ferreira

Boa tarde, minha gente!Com muita satisfação,Venho até este evento,Para esta apresentação.Seja o que Deus quiser,Represento CaetitéDe todo meu coração.

Sou filha de um pedreiro,Poeta e trovador.Herdei dele o mesmo dom,E por isso aqui estou.Eu também sou sertanejaE que Jesus nos proteja,Na santa paz do senhor.

Eu rimo Brasil rural,Falando de norte a sul,Rimo quem desbrava a terra,No cabo do Guantambu.Rimo leste e oesteE o sofrido nordesteSertão de mandacaru.

Estou vivendo o presente,O futuro a Deus pertence,Quem trabalha ele ajuda,Quem luta na vida vence.Não maltrate um lavrador, trate-o com amor:

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Vivemos em um paísPossuidor de riquezas,Mas se o Brasil é tão rico,Por que há tanta pobreza?Gente passando fome,Vivendo nas ruas, com fome,Ô, meu Deus, quanta tristeza!

Tratados como animaisO nosso povo brasileiroTodo dia enfrenta lobosNa pele de um cordeiro.E os nossos governantesSempre bem-vestidos e elegantes,Só pensam em nosso dinheiro.

Às vezes eu me pergunto,Onde é que nós vamos parar?De leste a oeste e de norte a sul,Tem sempre alguém a queixar,Que é marginalizado.Muitas vezes deixado de ladoPor pessoas que dizem governar.

O que meu pai me ensinaPresto bastante atenção.Admiro o sertanejo,Que tenha calo na mãoÉ um esteio da nação.

Aqui manifestei,A minha insatisfaçãoEspero que os governantesTomem alguma decisão,Traga a essa gente sofridaUma melhor expectativa de vidaMudando essa situação.

Quero agradecer a todos,Que promovem esse eventoDando-me a oportunidadePara mostrar o meu talento.Agradeço à minha irmã,Meu futuro de amanhã,Nasce aqui neste momento.

Meus parabéns, Caetité!Pelo povo varonilE também um forte abraçoPara a classe estudantil.Vamos vencer a batalhaE receber a medalha,Futuro do meu Brasil.

Adoro o canto dos pássaros,Murmúrios de cachoeira.O nome da escritoraJoelma Santos FerreiraTudo que eu faço é com féEu nasci em Caetité,Terra de Anísio Teixeira.

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Moderno mundo Aline Souza da Conceição

Olhem! Vejam só!Tem um mendigo na rua.Enquanto o homem,pensa em voltar à lua.

Cadê? Cadê a flor que estava ao chão?Ninguém viu?Os homens passaram apressados.Os homens robôs com pastas na mãoe não viram a flor que estava ao chão.

Como já dizia Raul: “Parem o mundo que eu quero descer”Como podem uns viverem tão beme outros não terem nada pra comer?

O que foi? O que há meu rapaz?Pais e filhos não se falam mais?Os homens emudecem,os excluídos padecem.

A voz se cala...Ninguém se fala...É o mundo moderno?É o moderno mundo?

Tem gente fazendo castelo. É bonito! É belo!Mas e a verba quem forneceu?Foi o seu? Foi o meu?Ainda temos preconceito, ainda temos corrupção!Ainda temos muitos problemas sem solução!

As indústrias são as vilãs da vezmas elas, quem foi que fez?O capital que move, é o mesmo que envolve,que seduz, que te reduz...a uma máquina humana, que não ama.

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Chegada do primeiro caminhão em Santana Mariana Silva de Oliveira e Marianne Silva Guimarães

O que nós vamos narrarAgora pra vocêsPode até causar espantoDe tanta estupidezDesse povo quando viu O carro pela primeira vez.

Quando aqui em Santana,Chegou o primeiro caminhão,Eu me lembro muito bemFoi trazido por “Mané Chorão”,Um grande comercianteDesta nossa região.

Ele ficou por dois mesesEm Sítio do Mato, guardado,Esperando abrir a estradaQue estava de mato fechado,Onde só carro de boi Passava por todo lado.

Zequinha viu a surpresaNa cara de Dona MariaQuando disse pra elaLá na lavanderiaQue o negócio barulhentoChegaria noutro dia.

Assim que a estrada abriu,Lá vem “Seu Mané Chorão”Com dois motoristas do RioConduzindo seu caminhão,Causando maior alvoroçoEm toda população.

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Naquela noite, a ruaEstava cheia de genteTodos sentados à portaEsperando ansiosamenteAchando que na madrugadaChegaria de repente.

Quando entrou pela cidade,O povo desesperadoFechava a porta das casas,Com medo do bicho danado.Apenas alguns curiososEspiavam com muito cuidado.

Zé da Pinga não acreditavaNaquilo que estava vendo,Desceu a ladeira, coitado,Com o corpo todo tremendo,Sem entender realmenteO que estava acontecendo.

Quando viu a confusão Neuza de Chiquinho de Dó,Em tamanho desespero,Saiu correndo com um pé só Meteu a cara no chãoE ficou cheia de pó.

Uma velhinha da Rua dos CanelasTinha sopro no coração,Acabou tendo um enfartoPor causa do caminhão.Coitada, não aguentouA tamanha confusão.

Quando o garoto entrou em casaLogo soltou um grito,Quando viu a sua mãe Derramando no maridoO café quente da hora,Quando avistou o bicho.

Valei-me, Senhora Santana!As mulheres aos prantos diziamÉ o mundo que está acabando.Valei-me, Virgem Maria!Nunca pensei nessa vidaViver tamanha agonia.

Homens metidos a valentePegaram logo o facãoPra matar o bicho “zoadento”E assim salvar o povão.Mas ficaram assustados,Quando viram Mané Chorão.

Seu Manoel então explicouQue aquilo era um caminhão trazendo progresso à cidadeE a toda população.Quase ninguém acreditavaE continuava a aflição.

O carro foi transportadoPara garagem do pai de BelAté que o povo parasseDe fazer tanto escarcéuPor causa do ChevroletQue havia caído do céu.

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Aos poucos, a populaçãoFoi dele se aproximando E logo seu Mané ChorãoCom paciência explicando,Que aquele objeto era um carroE o povo se acostumando.

Aqueles mais corajososJá queriam de carro andarPra sentir a sensação E também o bem-estarPara mostrar a todosQue o medo com eles não há.

Ao invés de mercadoriaO carro foi carregar genteE todos entusiasmadosE cada dia mais contenteEntenderam que era o progressoQue se fazia presente.

Um menino da cidadeChamado “Tõe Pescoção”Passou o dia inteirinhoCorrendo atrás do caminhãoÀ tardinha, ao chegar em casa,Levou uma surra de “corrião”.

E logo, em poucos dias,O povo da nossa cidadeAgradecida a DeusPela grande novidadeE seu Manoel muito contenteE cheio de vaidade.

Quando então o comércioComeçou a desenvolverE as mercadorias, mais rápido,Começaram a aparecerO povo então comentavaNossa cidade vai crescer.

E realmente cresceu,Veio a civilização,Com a chegada de outros carros,Inclusive do caminhão Que agora era recebidoCom grande satisfação.

E assim seu Mané Chorão,Homem forte e destemido,Teve esta ampla visãoDe trazer o desconhecido,E assim virar um heróiDeste povo tão querido.

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Belezas que são finitas Marisa Pinto Soares da Conceição

Eu pensei em escrever um poema de amorMas vi que eles não teriam valorDepois eu quis escrever um poema de saudade,Mas resolvi falar sobre a realidadeEntão eu escrevi:

A lua e as estrelas,A luz do sol, que sem reclamar,Ilumina e aquece os nossos dias,As ondas do mar.São coisas que nos permitem um bem-estar imensoQuando paramos para contemplar.

Deitar na grama verde,Olhar uma nuvem no céu passar,Um passarinho ou borboleta voar,Um beija-flor, um bem-te-vi,Um bem-te-vi...

Bem te vi é o canto de um pássaroQue com toda beleza nos deseja:Tenham um bom dia!Quem não para e escuta a voz do vento,Quem não para e escuta a voz da chuva,A voz das folhas que dançam sem parar...Não sabe o que perdendo está!

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A natureza nos ensina muitas coisasBasta simplesmente parar e escutar...

Escutar...Silêncio profundo...Silêncio...Escutar agora,O que a natureza te diz?

Venho com este poemaDe um grande problema falar

Se não pararmos de matar a naturezaUm silêncio, que nada nos dirá,Reinará!Contemple o que é belo de verdadeAntes que...Antes que seja tarde!

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Um saci na cidade Paula Jane Lima Almeida e Rafaela Rocha Navarro dos Santos

Vinha ele cabisbaixo, desiludido com o que encontrara. Decidiu mudar de vida e ir para a cidade. Todos os seus amigos tentaram convencê-lo a desistir. O Curupira foi o mais insistente.

- Não vá, meu amigo. Lá as coisas não são como aqui!- Estou decidido! - exclamou ele.Então seguiu. Ao chegar, encontrou a primeira barreira. Todos usavam blusas nas ruas. Era

o único “mal” vestido, apenas de short vermelho. Optou por não dar atenção para este detalhe e continuar. Ia com a cabeça cheia de planos, imaginando sua boa vida de agora em diante. Pensava em trabalhar, comprar um quitinete e, quem sabe, até se casar... Mas, foi interrompido por um guarda que disse:

- Aonde pensa que vai, moleque? Aqui não é seu lugar.Feliz e sonhador respondeu:- Estou procurando emprego! Cheguei hoje à cidade!O guarda o olhou por inteiro, observou cada detalhe e retrucou:- Ora, menino, pensa que me engana, é? Procurando emprego, com essa roupa? Ou melhor,

sem roupa, pois este shortinho mais parece roupa de dormir. Sem falar neste gorro vermelho ridículo! Faça-me o favor! Ainda, por cima, é aleijado! Onde está sua outra perna? Saia daqui, seu negro safado!

Ele ficou muito furioso. Encostou debaixo de uma marquise; pegou seu cachimbo. Fumava tentando se acalmar, pensando no que iria fazer para se vingar do guarda. Tanta era sua fúria que falava sozinho:

- Quem ele pensa que é? Sempre me vesti assim, ninguém nunca me rejeitou por isso na floresta. Mas eu vou aprontar com ele... Ah! se vou ... E, ainda, ousou me chamar de aleijado! Sou o Saci, se tivesse as duas pernas não seria eu! E o meu gorro? Sempre o usei, e meus amigos me aceitavam.Enquanto ele estava lá fumando seu cachimbo e reclamando sozinho, as pessoas que iam passando o olhavam e atravessavam a rua, ora por medo, ora por preconceito. Até que uma mulher chamou o guarda:- Seu guarda, seu guarda! Venha até aqui, rápido! Tem um daqueles neguinhos favelados fumando crack!

O guarda apressou-se e, quando o viu, disse:- Não acredito que é você de novo. Mandei que fosse embora e você não foi, né? Já sei o

que você quer. Vou te encher de pancada, nego teimoso. O guarda o pegou pelo braço e começou a bater nele. Ele gritava desesperado querendo

se explicar, mas não foi ouvido. Quando o Saci já não tinha mais forças e sangrava muito, foi que o

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guarda parou de espancá-lo e o levou até o delegado:- Delegado, encontrei este moleque nas ruas fumando crack. Olhe as roupas dele; o gorrinho típico

de marginal. Não tem uma perna, deve ter sido em troca de tiro com a polícia...O delegado olhava para ele com desprezo. Perguntou:- Tem algo a declarar?- Sou o Saci! É um engano! Não fumava droga. Minha roupa sempre foi esta e minha perna é assim

desde sempre. Por favor, me soltem. Voltarei à mata, aqui não é lugar para mim. Ninguém me respeita! De onde venho, posso ser eu mesmo e aqui tenho que me vestir como vocês querem, fazer aquilo que querem...

O delegado fitava-o, continuamente. Depois de algum tempo, falou:- Olha garoto, vou deixar você ir, pois nunca o vimos por aqui antes, mas se te pegarmos outra vez...

Aí você tá frito! Vá, mas não pense que eu acreditei nessa conversa mole.O Saci saiu numa alegria danada. Estava louco para encontrar seus amigos e contar tudo. Falar de

como era ruim aqui na cidade, contar da falta de respeito deste povo, do preconceito que encontrou por ser negro e deficiente físico. A ansiedade era tamanha que nem olhou ao atravessar a rua e foi atropelado. O motorista partiu sem prestar socorro e, quando a ambulância chegou, isso quarenta minutos depois, já era tarde. O Saci estava morto.

O enfermeiro ligou para a polícia dizendo:- Mandem uma viatura aqui, na rua das Alamedas. Tem mais um daqueles negros da favela, morto.O policial do outro lado da linha respondeu:- Menos um!

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Um passeio por tua boca Larissa da Silva Santos e Thais Ferreira Santos Conceição

Na solidão da noite friaEncontro-me sem amorNa constância de todo diaConsigo vê-lo em uma flor.

O perfume das orquídeasTranspira a essência do teu suorNo ressoar da chuva eu sentiaQue já não estava tão só.

No sussurrar da brisa secaQuase então pude ouvirO estalar de todos os beijosQue não negaste outrora a mim.

No cintilar de um astro quentePerdido na noite silenciosaMe faz lembrar teus olhos negrosQue me fixavam naquela hora.

A calma noite se arrasta lentamenteA chuva fina sem curso segue, então, seu caminharA brisa cala seu canto de repenteE as orquídeas já se negam a transpirar.

Então, surge no horizonteO brilho da luz que vem me encontrarTrazendo a mensagem do astro quentePois logo será dia, onde por tua boca eu irei passear.

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A degradação do meio ambiente Ludmila Bianca Perreira da Silva e Jéssica Reis dos Santos

Vou agora contar um casoDo qual muita gente se esquecePor muitas partes do mundo Esse caso aconteceTodo mundo fala e falaMas ninguém se compadece.

Meu compadre, ouça sóPra depois não se esquecerQuem caminha contra o fogoAmanhã pode correrPois sem a natureza viva Todos podem morrer.

Vem de Deus tudo o que é bom,Cai nas mãos do homem e se degeneraA natureza agonizaMas o homem pisa nelaÉ por isso que lhe digoQue ninguém a considera.

Homens ricos e afamadosCheios de força e ambiçãoCortam árvores da AmazôniaE destroem a nossa naçãoFazendo da natureza seu capachoDestruindo mata, rio e ribeirão.

O homem está aíDevastando o “resto” da TerraDestruindo a fauna e a floraCom armas, máquinas e motosserraMas se pensa que é só issoNosso caso não se encerra.

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O ser humano insensatoSuja ainda todo o nosso chãoEstraga o ar que era tão puroE faz virar poluiçãoMas para isso, oh meu Deus,Qual será a solução?

A natureza pede socorroE precisamos de uma reaçãoPois se não cuidamos da TerraA existência será história de ficção.E sendo rico ou pobreOs homens não sobreviverão.

Meu amigo, meu irmão,Ouça a sua intuiçãoDesperte sua consciênciaE aja com o coraçãoDiga não à lei do moneyE condene a destruição.

E o leitor já sabe bemO que vai acontecerJá deve ter percebidoO que a gente vai perderO recado está mandadoVê se não vai se esquecer. Agora vou dar, enfim,Minha boa opiniãoEntão escute bem atentoO que diz minha versãoFaça sempre a sua parteEm prol da preservação.

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Histórias do Colem

Joseane dos Santos de Jesus

No ano de 2007Pois tinha muita vontadeMatriculei-me no ModeloCom 15 anos de idadeFoi grande a alegriaFoi tamanha felicidade

O professor JoellingtonEra um homem destemido eDizia pra nós assim:“meus alunos queridos,vocês devem estudarpara não terem prejuízos”

Eu fui aluna de ElianaCujo rosto lembra uma florMãe de Isabela e ArthuzinhoMulher de muito valorProfessora exemplarEnsinava com amor

Nos dias que se seguiramComeçaram os aperreiosOs professores e diretoraNunca mediram arrodeios eQuando eles se juntavamComeçavam os bombardeios

A diretora então,Resolveu se planejarPara vender os “bilhetinhos”,E o real de nós tirarConseguiu comprar o somE o auditório equipar

Na Ressaca JuninaMais dinheiro cobiçaramE dentro de poucos diasOutro plano iniciaramE para os pobres alunosMais bilhetinhos eles mandaram

A diretora para nos dar compensaçãoComeçou os jogos estudantisPara não haver confusãoDividiram-se as equipesFoi tamanha diversão

Ah, não posso esquecerDe nossa querida IolaQue mesmo quando cai,Aquela mulher não choraCorreu para a fotografiaEscorregou na mesma hora

E pra falar do final do anoSó me lembra a emoçãoTinha gente pra todo ladoFazendo recuperaçãoEu fiquei fora dessaPois não sou folgada, nãoEu dei duro o ano todoPra não ter reprovação

Vou acabar com isso logoPois não sou poeta nãoMas quero deixar um versoComo semente no chãoFiz estes inspiradosNaquilo que a gente sentePra distrair um pouco a vidaE desdobrar a minha mente.

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O rio

Mirna Silva Ribeiros

Eu nado num rioque parece não ter fundo

Eu nado num rio salgadocheio de tristezaonde a cada mergulho mal dadoengulo amargura

Eu nado num rioque não existe no mapanem do Brasil, nem do mundo

Eu nado num rioque ninguém nunca nadoumas cada um tem o seu

Eu nado num rioque existe no quintal da vidaEu nado num rioonde uns tentam me salvare outros me afogam

Eu nado num rio particulareu nado sempre em horas propíciasquando não há salvavidasEu nado num rio sem fimEu nado num rio de lágrimascujas lágrimas são só minhas...minhas e abstratasque se derivam de sofrimentoEu nado num rioonde nunca seiquando serei salva.

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Mirna, 15 anos, 1ª série do ensino médio Colégio Estadual Georgina de Mello Erismann, DIREC 02 – Feira de Santana.

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A Amazônia destruída

Nadyanne de Azevedo Machado

Floresta esplendorosaFloresce em teu seio vivazÓ, dama sensual majestosa!O homem nunca será capaz.

De contigo formar uma aliançaE o seu lindo reino não desmatarTu és a única esperançaPara a situação do Planeta mudar.

Rica em fauna e floraMãe do ouro negro febrilSua beleza é emanadaPelos cantos do Brasil.

Teu mato agitadoÉ como os meus cabelos ao ventoUm lugar mágicoDesenhado em meus pensamentos.

És tu que distribuiA energia do grande criadorO sol brilhante dia a diaVem do teu ventre de amor.

Amazônia brasileiraResponsável por desejos infernaisOs forasteiros te querem inteiraSaciados pela sede fugaz.

Nadyanne, 17 anos, 2ª série do Colégio Estadual de Paramirim, DIREC 23 – Macaúbas.

E pensar que antesTínhamos um tesouro escondidoHoje já não é como ontemO que restou está sendo destruído.

Choro por ti, bela floresta!Quero o verde de outroraMinha amada terraNão tem mais a mesma aurora.

Aos poucos desfalecidaA vida morre em silêncioNa lembrança humanistaSó restará o tormento.

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Memórias de um rebelde

Cleiton Neris de Oliveira

França, março de 1831, dia de inverno, monótono, o asfalto é molhado pela neblina. Nas ruas de Paris, o vácuo dá lugar a uma imagem agourenta e carrancuda. A maior parte dos parisienses partiu para o interior em busca de abrigo e paz; os que restaram se resguardam em suas casas e ali permanecem encurralados e aflitos. Oh, pátria minha, pátria de heróis que, impávidos, lutaram bravamente por justiça e morreram em batalha; que deram seu sangue por uma constituição, por uma república. Terra de jacobinos, terra de iluministas, de que valeram suas vidas? Marat, Robespierre, Rousseau? Que angústia profunda sentiriam em ter notícia que suas vidas de batalhas foram em vão, que o preço da revolução ainda não fora liquidado. Não se sabe ao certo quantas vidas serão necessárias para a instalação de uma república, o que sei e o que acredito é que ainda há esperanças de uma sublevação, e, por isso, lutarei com todas minhas forças contra a restauração do antigo regime. Seguíamos em direção à rua LA VERRERIE, em manifestação calorosa; gritos ecoavam pelas ruas da capital francesa, os cartazes impregnavam o nosso alvo com a expressão “abaixo a monarquia”. A revolta contra a restauração da monarquia tem raízes históricas, começando na revolução de 1789, quando houve a deposição da realeza e a instauração da república. Após alguns anos, Napoleão Bonaparte conquistara o poder. Mas depois da queda do império napoleônico, a casa Real de Bourbon, dos antigos reis monárquicos reconquistaram o trono. Os partidários de Napoleão e nós, os republicanos, adeptos dos ideais iluministas, não aceitamos e criamos a rebelião. — Avante, homens! — Exclamou o senhor Carjat, líder da multidão de manifestantes. Homem viril, decidido, trajava sempre trapos grosseiros e velhos, porém, seu olhar firme e seguro o enriquecia de honra e de poder de liderança. Confesso que, em diversas horas, eu o tinha como um porto seguro, como uma fonte de certezas; certezas que era meu dever tê-las, incondicionalmente. Mas havia dias em que o que viam meus olhos, massacrava as condições psíquicas e espirituais de ter certeza de nossas virtudes ou até mesmo de nossos argumentos. Este era o nosso quinto dia de protestos, mas não conhecíamos guerra pacífica. No último conflito com a guarda nacional, voltamos de luto, fomos vítimas de uma emboscada covarde. Três jovens foram executados, não os conhecia muito bem, nem mesmo os tinha notado na barricada, mas senti uma dor amarga e entorpecente ao ver os jovens mortos, repletos do vermelho sanguíneo, um deles com quatro tiros no peito. Me vi morto, senti a dor dos tiros por alguns minutos, era tão nossa a dor, estava tão próxima de nós. Quão grande é esta ironia que vivemos. Os nossos verdadeiros heróis morrem como criminosos, incompreendidos, indagados corrompidos e miseráveis. Enquanto os injustos, desumanos, narcisistas, monarquistas são homenageados e lembrados com júbilo por essa sociedade estúpida e hipócrita durante

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Cleiton, 16 anos, 2ª série do ensino médio do Colégio Estadual Mary Rabello, DIREC 13- Jequié.

gerações. A barricada está erguida, cerca de trezentos e cinquenta homens compõem a multidão de rebeldes. O frio aumenta, e os agasalhos levianos que me vestem tornam- se insuficientes. Meus lábios tremem, talvez não só de frio, talvez haja uma conexão de fatores, uma gotícula de suor cai sobre minha nuca, suor frio, suor de tensão. Vi Géricault correndo em minha direção. Géricault é meu irmão, o mais novo. Era vivo, alegre, entusiasmado, todos o admiravam. Aproximava-se. Iria dar-lhe um abraço apertado como era de nosso costume. Ele, atarantado, não permitiu e exclamou: — Eugéne, eles estão vindo! Descendo a Chaverrie, o governo havia concentrado forças! São noventa mil... noventa mil homens! Nesse momento fui impedido de ouvir o prosseguimento de seu discurso, uma bomba de impacto fulminante explodiu bem próximo onde estávamos. Ouviam-se muitos gritos, a fumaça tomou-nos a visão e, com isso, me vi completamente perdido. Abaixei-me e encostei-me à barricada, tentando me proteger, ouvi a marcha da guarda nacional; voltavam meus calafrios, o mesmo que me perturbara no último confronto. Ali nascia uma fobia, um trauma psicológico. — Gericault! Onde estás?! — Estou aqui — respondeu-me calmamente. Estava ao meu lado, mas a fumaça não me permitiu enxergá-lo. Ouviam-se tiros e, em seguida, os gritos dos companheiros atingidos. Estávamos inertes, as nossas armas eram apenas bastões, cajados e espadas. — Fique aqui, Géricault! Não saia! — Aonde vai?! — Não se preocupe, ficarei bem. Num ato de bravura inconsciente, levantei-me. A fumaça ainda inundava a Laverrie e nada se via. Olhava fixamente em linha horizontal e, pouco a pouco, a imagem de dor e melancolia ia se mostrando, se exibindo, causando pavor e pranto na plateia escassa que ora se encontrava nas calçadas, outrora nos barrancos e nas janelas. O espetáculo fervilhava. O ranger dos dentes dos rebeldes tornava explícita a indignação, e, com bravura, lutaram sem cessar diante da massa “azul, branco e vermelho” de policiais. Era uma desproporcionalidade desleal: mais de duzentos soldados por manifestante. Isso não nos abalou. Como se meu cérebro esnobasse o óbvio desfecho, saltei golpeando a massa, atingi o rosto de um senhor policial que caiu no chão e foi pisoteado pela multidão. Confesso: não gosto de ferir. Gosto de assistir, amparar, acolher. É difícil matar. Dos policiais, nada me angustia, nada me revolta. O preciso golpe de espada que fere o veterano soldado não o pertencia, pertence à majestade dos banqueiros, senhor Luiz Felipe Orleans. Pertence à Casa Real de Bourbon. A eles, sim, pertenciam todos nossos golpes de revolta. Vi o senhor Carjat sendo baleado no peito. Caiu desacordado. Seus sinais vitais anunciavam que ainda vivia. Dois rebeldes se encarregaram de levá-lo para um lugar acautelado. Rezo por sua recuperação, pois tenho este homem como referência; lutou como poucos, certamente não morrerá desta vez, já que Carjat nasceu para fazer estória. Alguns seres possuem brilho demais para a humanidade. Esses se destacam, são unanimidades e deixam sua marca, seus nomes durante séculos. Tornam-se mitos, lendas, imortais.

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Restaram apenas alguns rebeldes, talvez os mais rápidos, ou os menos ousados. Vi a longa distância os policiais pegarem Géricault; ele gritava aflito. O destino de um rebelde antimonarca nas mãos da guarda nacional é um só: a execução. Géricault sabe disso, não pude conter minha tormenta, atirei-me sem pensar em direção ao campo de concentração de soldados. Fui baleado na região do estômago e, após esse momento, já não me lembro de nada. Acordei em lugar desconhecido. Era obscuro, sombrio, fétido, não sinto mais o cheiro de guerra, o aroma das pólvoras do qual Paris já se habituara. As teias de aranha no ângulo do teto e as grades de formas hediondas nos pequeninos vitrôs tornavam o lugar um cenário temeroso. Avistei uma fita de luz à minha esquerda. Era uma porta; estava distante. Me movi lentamente em sua direção; percebi que minhas mãos e meus pés estavam atados. Arrisquei-me a sentar no chão, pressionei meu abdômen e senti uma dor desmedida no estômago. O tiro... tinha me esquecido... Notei movimentos no salão. Passos serenos e cautelosos rondavam pela área pequena da sala, mais pessoas estão aqui. Seriam estranhos? Feridos? Tive medo de tentar averiguar, permaneci deitado e calado. Estou preso obviamente pela guarda nacional. Penso em hipóteses por um otimismo imbecil: esperança, na ocasião que me encontro, é imprescindível. A porta se abre. Uma explosão de luz invade o salão de tijolos velhos, dezenas de rebeldes feridos estão atirados no chão, a maioria deles desacordados. Cinco soldados bem divididos no espaço da sala, armados e à espreita. Não restam mais esperanças.

O guarda da porta sussurra:— Levantem-se, maricas! — batendo o cabo da espingarda em alguns manifestantes que o

cercavam. Eles levantaram lentamente, com dificuldade, mancos, feridos, e alguns mutilados. Sete saíram. Logo após o sétimo homem sair, a porta foi fechada rapidamente como se não pudéssemos ter acesso à luz. Ouvia-se um coral lá fora. Vozes de desespero desatinado ecoavam forçadamente seguida de gritos de choro. Eram os heróis que incitavam: “Viva a república nova!”. Uma voz grave e firme soa exprimindo-os: “Fogo!”. Ouviam-se os tiros, sincronizados, aniquilando o pequeno coral. Preparam-se os rebeldes do salão, pois daqui sairá a próxima remessa de heróis.

O que pode pensar um homem convicto de que vai morrer? No seu funeral? Os tiros lá fora mal me deixam pensar; os disparos doem em minha alma, os gritos dos grandes homens, os cânticos, a ordem de disparo, todos reunidos, mal-ensaiados, acontecendo. Sinto-me cronometrado. Tenho apenas algumas horas. Preciso selecionar meus pensamentos, afinal, após ele, partirei para onde não sei, e ninguém sabe. Partirei para o maior mistério da humanidade.Tenho anseio pelo sangue dos monarquistas malditos, crápulas, miseráveis, narcisistas, autores de tamanha insolência. Um país, uma nação submissa a apenas um corpo, de carne, sangue, e equívocos. Prefiro a morte a ter que conviver com esse mal.

Turbilhões de memórias e recordações narcotizam meu cérebro. Penso, me diviso, me multiplico, me analiso. Qual é minha essência? Quem sou eu? Resmungos? Mentiras? Sonhos? Lembro-me do tempo em que não me incomodavam os absolutistas, que era feliz, que admirava o belo. Serei apenas mais um manifestante eliminado para o grande faturamento da Casa Real, como o agricultor elimina gafanhotos para uma boa colheita. 31

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Minha história a miúdo

Jailson Amâncio Nunes

Sou um cabra muito machoUm poeta nordestinoQue sofri quando meninoNa minha vida singelaFilho de Maria IstelaServa fiel do divino

Francisco Matias NunesQue hoje já falecidoFoi o meu papai queridoQue o inimigo matouMas o meu pai vacilouPorque não foi bom marido

Por causa da vaidadeTraindo a minha mãezinhaTrouxe uma sorte mesquinhaCom falsas amizadesPerdeu a felicidadePerdeu a vida que tinha

Quando eu era pequenoAs minhas irmãs queridasSem nenhuma despedidaSe separaram de mimPois aí vi tendo o fimDe uma vez só duas vidas

Foi na década de oitentaQue esse fato aconteceuTrês aninhos tinha euDe um posto estávamos vindoE quem vinha dirigindoTriste notícia nos deu

Jailson, 29 anos, 2ª série do Colégio Estadual Olavo Ferreira Neto, DIREC 15 – Juazeiro.

Em um posto de saúdeVeio um carro me buscarAlguém para avisarA eu e a minha mãezinhaQue desconfiada vinhaJá começou a chorar

Disse aquela doutoraQue guiando o carro vinhaQue no canal que ali tinhaMorreram duas meninasTodas duas pequenininhasEram minhas irmãzinhasA Salete, a VanusaQue morreram afogadasEstavam ali deitadasSem poder me dar carinhoE eu fiquei ali sozinhoMuitas lágrimas derramadas

Vendo elas ali paradasTodos lhe observavamE muitos nos consolavamPerguntei: estão dormindo?Vendo aqueles braços lindosQue antes me carregavamMinha mãe disse: estão,Mas não vão mais acordarEu comecei a chorarPorque elas nos deixaramDuas partiram, três ficaramE a tristeza no lar

Depois nasceu JailtonPra me fazer companhiaE pro lar alegriaJá começou a voltarComecei a me acostumarE vencer a melancolia

Depois nasceu FrancineteNo ano oitenta e seisNo dia trinta do mêsNão teve mais pranto algumPois onde só era umAgora já eram três

E dando à luz outra vezMinha mãe fez paradeiroO caçula e o derradeiroFoi Janeildo, e sóQuem cortou o umbigo foi vóE eu tava lá no terreiro

Quando já podia entrarEu parti bem de repenteE entrei todo contenteVendo a obra que Deus fezUm bebê de sete mêsEra um pingo de genteNem as bordas da orelhaEram ainda terminadasMas num é que o camaradaHoje tá um homem feitoCompleto sem um defeitoE todo cheio de armada

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Na década de noventaAí o bicho pegouMeu pai se desmantelouVirou raparigueiroCachaceiro e imbuaceiroE tudo desmoronou

Ele já fazia issoMas era mais controladoMas depois foi dominadoPelos laços do capetaAí a coisa ficou pretaPra quem tava do seu lado

São como favos de melOs lábios de meretrizComo um provérbio dizO que provar dessa sorteSeu troféu é a morteE seu fim não é feliz

No ano noventa e trêsEle vinha de uma festaE como o diabo não prestaUsou quem lhe deu três tirosE deu seu último suspiroCom as marcas do mal na testa

Já tinha vindo em casaMas logo já quis voltarMinha mãe tentou barrarMas ele não deu nem trelaLogo pulou a janelaE saiu para se acabar

Nunca carregue na vidaA fama de valentãoIsso não é profissãoPor causa da valentiaMeu pai Francisco MatiasFoi pra debaixo do chão

Por isso conto pra todosEsse caso que passouPorque a vida é um amorE a fé no nosso escudoQuem vive hoje ta com tudoQuem morreu ontem acabou

Ficou eu com treze anosPra criar os meus irmãosFazendo calo nas mãosE ensinando o bemPra não roubarem ninguémMas tornarem cidadãos

Nós fomos muito humilhadosMas demos a volta por cimaSempre as minhas rimasNos trouxe muita alegriaCom humor e poesiaLevantamos a autoestima

Às vezes com fome à noiteEu falava algo engraçadoE os meus irmãos coitadosOuvindo aquilo sorriamE ali adormeciamEsquecendo o mau estado

Muitas das vezes com fomeE em casa nada tinhaSe não somente farinhaE um pouquinho de salMas a fé que vence o malDentro do meu peito vinha

Para irmãos para escolaIa eu ou meu irmãoPorque sem ter condiçãoEra uma calça pra doisMas Deus preparou depoisPra um dos dois um calção

Às vezes íamos pro matoComer fruta de juáComia ate enjoarPorque não tinha o pãoNem pra deitar no colchãoNem lençol pra se enrolar

Os lençóis eram rasgadosAlguns pra forrar o chãoPedaços de papelãoE alguns sacos de náilonIsso pra quebrar o galhoNão tinha outra opção

A casa onde dormíamosEra bem deterioradaE às vezes de madrugadaAcordávamos molhadosE víamos no telhadoAs cobras empinduradas

Nos víamos correr no chãoLacraia e escorpiõesE em nossos coraçõesO medo de ser picadosMas por Deus éramos guardadosEm meio às aflições

Agora estamos criadosMinha mãe aposentadaNão tem mais falta de nadaE eu já estou casadoFeliz e abençoadoAo lado da minha amadaQuem antes comia puroHoje come com misturaO colchão é uma fofuraSem falar na roupa boaHoje não tô mais à toaNem há vida de amargura

A pasta não é mais o juáÉ creme dental do bomA música mudou de tomCristo me abençoouPra mim tudo preparouE ainda me encheu de dom

Meu filho vai ser artistaMeu pai sempre me diziaMas morreu antes do diaDe ver seu filho um poetaMesmo não sendo um profetaMe fez essa profecia

Hoje sou poeta e pintorSirvo a Deus, o criadorCom fé, virtude e fervorNa congregação dos justosO mal não me faz mais sustoPorque o bem me ganhouTenho uma esposa lindaQue é a minha princesaÉ repleta de belezaJoia rara que me encantaÉ um anjo, uma santaQue espanta minha tristezaAqui termino esses versosE a Deus tudo agradeçoNão sei se o que tenho mereçoMas quem ouvir meu cordelSabe que Deus é fielE faz do fim o começo.

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O amigo da onça

Zilma Ferreira da Silva

Cena aberta na floresta com o pássaro mágico dançando feliz em companhia da fada Zul. Os dois interagem com os animais que chegam para contemplar tamanha beleza. De repente, sentem a presença do perigo e ficam agitados.

* P. MITSA: Acalmem-se, nós estamos aqui, nada de ruim vai acontecer.

* FADA: Ó pássaro encantado... Sobrevoe a floresta e veja o que está acontecendo. * P. MITSA: É pra já! Voltarei em um instante...

* FADA: (Acariciar os animais e acalmá-los é meu desejo) não tenham medo Sr. Leão, lindo e valente, sabia que você é o Rei das Selvas! (a fada conversa com todos).

* P. MITSA: Pronto vai começar tudo outra vez.

* FADA ZUL: Fale Mitsa, o que você viu por lá?

* P. MITSA: Os caçadores estão de volta e dobraram o número de armas e cachorros – (Agitação)

* FADA ZUL: Não fale assim, não vê que está assustando os animais?

* P. MITSA: Desculpe, eles estão bem próximos daqui, o que faremos Zul?

* F. ZUL: Tive uma ideia (Chama a atenção dos animais para sua ideia). Meus amigos, chegou a hora, darei a vocês o Dom da Fala, poderão falar com os caçadores, dizer o quanto sofrem e pedir que poupem suas vidas, mas prestem atenção: no momento que passarem a agir de forma errada este dom lhes será tirado.

* P. MITSA: Oba! Vocês vão poder cantar e dançar.

* F. ZUL: Vamos pássaro encantado.

* P. MITSA: Por favor, deixe-me aqui, eles vão precisar da minha ajuda.

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Zilma, 48 anos, 2ª série do ensino médio do Centro Educacional Gilberto Viana, DIREC 14 – Itapetinga.

* F. ZUL: Está bem Mitsa, fique, mas você não poderá interferir em nada. Até breve meus amigos.

(Sai de Cena).

* LEÃO: Eh, no dia em que o homem entender que não se deve agredir a natureza e os animais, haverá uma grande festa no planeta Terra. (DESCE PARA A PLATEIA) – Como tem passado Senhor Coelho? Continua com a dieta da cenoura? Olha quem está aqui, o Senhor Jacaré! Fico feliz que os caçadores ainda não o capturaram (SAINDO DA CENA PARA A PLATEIA). Dona tartaruga sempre escondida, hein? * CAÇADOR – Pega Rex, olha lá uma onça! Tá na mira. Sai da frente Rex que vou pegar o bode.

* ONÇA – Socorro!... Socorro!

* REX – Ei! Dona Onça.

* ONÇA – Socorro! Socorro! (ONÇA E CACHORRO SE ESBARRAM)

* REX – Cala a boca onça barulhenta! Corre que o caçador vai te pegar...

* ONÇA – É... é ...Chiii... E Agora? * REX – Agora corra que lá vem bala. * CAÇADOR – (passa pela cena atrás do caçador). Vamos cachorro lerdo, quando voltar para casa te jogo para carrocinha e vai virar sabão. * REX– Por favor, não faça isso meu senhor!Prometo que agora em diante irei trabalhar direitinho. *CAÇADOR – Está certo. Agora vá atrás do bode que eu pego a onça, vá. *BODE – Vocês viram o caçador por aí? E o cachorro dele vocês viram? Pelas barbas do meu bigode! (Andando de um lado para o outro). Será possível que um bode velho não pode ter sossego na vida. Eu não estou me aguentando em pé. (senta no chão)

Sabem de uma coisa? O que eu mais queria era ter um cantinho sossegado para morar. Uma casinha, não precisava ser uma mansão, eu só queria um canto para construir minha casinha. (Olha ao lado e percebe um terreno).

Olha só! Que lugar lindo pra fazer minha casa, vou limpar aqui. (Limpa e o terreno e sai)Agora vou buscar algumas madeiras.

* ONÇA – (Entra correndo) Socorro!!!! Um caçador!

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* CACHORRO – (Entra correndo e esbarra na onça).

* ONÇA – Não vem não, que eu te pego! Olha que eu sou uma onça muito feroz, daquelas que devoram cachorrinhos.

* CACHORRO – Calma, Eu não vou te fazer mal, sou seu amigo.

* ONÇA – Não se mexa. Não confio em você.É um traidor, não tem vergonha neste focinho não?

* REX – Eu estou muito envergonhado, mas ele me força a fazer isso.

* ONÇA – Mentiroso! Toda semana você está aqui na floresta com os caçadores e outros cachorros da sua laia. Pensa que eu não te vejo, pensa!...

* REX – Dona Onça me dê uma chance.

* ONÇA – Não, não gosto de animais traidores.

* REX – A senhora não sabe, como é dura a vida de um cachorro vira – lata... Eu sempre vivi nas ruas, muitas vezes tive que dormir na chuva com fome, até que um dia o caçador me levou para morar com ele, mas em troca de casa e comida ele nos obriga a caçar.

* ONÇA – Não chore cachorrinho! Nossa! deve ser triste viver desse jeito, posso fazer alguma coisa para lhe ajudar?

* REX – Eu tenho uma idéia que não pode falhar...

* ONÇA – Fala, fala!* REX – Pois bem. Nós vamos ignorar o caçador. Quando ele aparecer, eu finjo que capturo você e quando ele se aproximar, os outros animais o cercam e pronto! Está preso o caçador.

* ONÇA – Nossa! Que medo. E se ele atirar com aquela espingarda?

* REX – Deixa comigo, vou falar com os outros animais. (Sai de cena).

* ONÇA – Ufa! Essa confusão me deixou muito cansada, tudo que eu mais queria era encontrar um lugarzinho para fazer uma casa e morar o resto da minha vidinha.(Anda de um lado para outro). Que lindo! Será que Deus está me ajudando, encontrei um terreninho! Aqui eu vou fazer minha casinha, e já está limpo. Espere! Já sei, vou pegar os gravetos.

* BODE – (Entra trazendo um feixe de lenha). Pronto! Eu ponho este aqui, e...

* REX – Sr. Bode...Ei! Sr... Aqui!

* BODE – Agora você está perdido, vou lhe mostrar com quantas chifradas se faz um cachorro quente.

* REX – Não vou machucá-lo, não tenha medo.

* BODE – Medo eu? Conheço seu tipo, você descobriu que sou faixa preta em capoeira.

* REX – Capoeira! O que é isso.

* BODE – Num sabe? É caratê com capoeira. Vem! Parte pra dentro que te faço um SUSHI.

* REX – Eu combinei com o s outros animais da floresta um plano para capturarmos o caçador. O senhor que ajudar?

*BODE – Espera! Eu estou ouvindo direito? Você, o cachorro traidor, resolveu passar para o nosso lado?

*REX – É isso mesmo. Chiii! Lá vem o caçador,Corra, Sr. Bode! (sai correndo).

* BODE – Vou pegar o resto das coisas e minha mudança. (sai de cena correndo quando ouve o barulho).Salve-se quem puder!

* ONÇA – (Entra arrastando um saco e um feixe de lenha. Joga o material no chão reclamando).Ai... Estou quebrada, mas tenho que trabalhar, pois a chuva não tarda. (percebe que a construção está pela metade). Minha Santinha protetora das onças desamparadas! Não é que Deus está me ajudando, olha só, a casinha já está quase pronta.(Termina a casinha). Pronto! Ah, me esqueci de um detalhe. (Sai).

* BODE – Não é que Deus está me ajudando! A casa já está pronta, perfeita. Vou tirar uma soneca (põe touca e pijama e tira um candeeiro velho e acende).Eh! Meu candeeiro velho, agora temos um lugar só nosso. (Entra na casa).

* ONÇA – Minha casinha linda,vou dormir. (Entra com um castiçal com uma vela rosa acesa). Entra sem perceber a presença do Bode. Repentinamente, começa a confusão).(Os dois se atracam na casinha e saem correndo).

* BODE – Socorro, Maria! Valei-me! Uma onça (corre para a plateia)

* ONÇA – Credo, um bode dormindo comigo, que nojo!Seu bicho fedorento, você contaminou minha casa e sujou meu pijaminha com sua pele de bode fedida.

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* BODE – (grita da plateia). Agora eu acabei de crer que DEUS está me ajudando. Faltou pouco para essa danada, me comer.

* ONÇA – Eu! Se enxergue, eu só como filé.

* BODE – (tomando coragem) Dona onça, o que a senhora está fazendo na minha casinha?

* ONÇA – Sua casinha?! Que audácia, essa casa é minha.

* BODE – Como sua? Se fui eu, quem limpou o terreno.

* ONÇA – Grande coisa, o terreno limpo sem minhas madeirinhas!* BODE – Grande coisa suas madeiras, sem minha mão de obra para começar.

* ONÇA – De que vale seu começo, sem meu acabamento?

* BODE – Eh, dona onça, o caso é complicado. Nós dois trabalhamos e demos conta da casa pronta. E agora?

* REX – (Entra correndo). Dona Onça, Sr. Bode, parem!Parem com essa discussão, o caçador se aproxima.

* CAÇADOR – (Em off) REX onde está você?

* REX – Então vamos ao plano. Lá vem ele seu Bode, já sabe o que fazer, eu ignoro ele fingindo que capturei, a onça e o Sr. vem por traz e... pau na cabeça dele. Aqui estão as cordas.

* ONÇA – O que eu faço?

* CACHORRO – Considere-se morta. Pensou que ia escapar?

* CAÇADOR – Muito bem Rex! Vou capturá-la viva, não quero estragar a pele, pois quero vendê-la por um bom dinheiro.

* ONÇA – (Cachorro, caçador, bode, trabalham numa interpretação de sobrevivência).

* BODE – Vem por trás e num descuido dominam o caçador.

* ONÇA – (De olhos fechados entra em pânico corre para a plateia)(O bode e o cachorro amarram o caçador e entra o Rei Leão).

* TODOS – Morte ao caçador, morte ao caçador!

* BODE – Silêncio, pois se aproxima o Rei Leão, salve o Rei!

* ONÇA – Sua majestade o Rei! Que honra, mas o senhor não estava vistoriando o outro lado da floresta?

* LEÃO – Sim, estava, mas encontrei com alguns animais que fugiam desesperados com a presença do caçador e resolvi voltar, e pelo visto cheguei a tempo de impedir que vocês cometam um grave erro.

* BODE – Sr. Leão, com todo respeito acho que o Sr. não imagina o que estamos passando por culpa deste homem que há horas tenta nos matar!

* ONÇA – Eu que o diga, estou com o coração saindo pela boca e como se não bastasse quebrei minha unha de estimação e arranhou meu CD DE CALYPSO!

* CACHORRO – Senhor Leão, não são só os animais da floresta que sofrem humilhação e maus tratos do homem. Nós que vivemos na cidade também sofremos. Somos presos em gaiolas, amarrados em correntes e jaulas.

* ONÇA – Muitos elefantes, leões e macacos são capturados e levados para trabalhar em circos. Lá, eles batem em nós e nos obrigam a pular, a atravessar rodas de fogo imensas. Isso não pode continuar. Morte ao caçador!!!

* BODE – Eh, Sr. Leão, sabe o que eles fazem com o elefante? Põe umas saias no pobre e o forçam a subir numa bola deste tamanho e ele tem que dançar.

* REX – E o coelho! Matam o pobrezinho, levam a carne para o açougue, da pele eles fazem bolsas, sapatos, até chaveiros!

* ONÇA – E na Páscoa eles falam que coelhos põem ovos.

* BODE – Eh!! Ovos de chocolate!

* LEÃO – Ah! Meus amigos, não sabem como isso me entristece, o homem agride a natureza a todo o momento, devasta as matas arrancando árvores e provoca queimadas que poluem o ar e nós os animais temos que viver assim lutando para sobreviver.

* BODE – O Senhor me perdoe, mas o caçador não vai sair vivo daqui não.

* CAÇADOR– Pelo amor de DEUS não me matem, pois tenho esposa e filhos. Deixe-me viver (todos olham para o Leão).

* LEÃO – Não posso permitir que vocês matem o caçador; meus amigos um erro não conserta o outro, vocês

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acham que matando este pobre homem conseguiremos resolver um problema que aflige o planeta?

* ONÇA – Não. Mas que a gente se livrando dele vai ajudar. Isso vai.

* BODE – Isso mesmo!

* LEÃO – Perfeito, matamos este homem hoje, amanhã outros caçadores virão, vamos matá-los também?* TODOS – Vamos.

* FADA – Parem! Como podem pensar desta maneira, não veem que estão errados? Estou triste com vocês.

* TODOS – (ficam desconfiados)

* FADA – (chora) Gosto tanto de estar na floresta. Porque aqui sim, encontra-se a paz, que é tão difícil na cidade, mas agora vejo que não merecem minha confiança.* TODOS – Merecemos sim.

* ONÇA – Não fique assim! Não chore.

* BODE – Diga o que fazer e nós acataremos.

* FADA - Está bem, deixarei vocês decidirem, mas ouçam a voz do coração.Senhor Leão, prossiga o julgamento, por favor, (Sai de cena).

* BODE – Diga-nos, ó majestade, o que faremos?

* LEÃO – Desamarre ele...

* TODOS – Desamarrá-lo?

* LEÃO – Sim Caçador, vamos libertá-lo para que possa refletir.

* CAÇADOR – Obrigado Sr. Leão. Prometo que nunca mais venho à floresta para matar os animais.

* LEÃO – Peço que, por favor, quando chegar à cidade, conscientize seus amigos, adultos e crianças, que os animais e a natureza são de fundamental importância para a sobrevivência do homem e que não nos maltratem.

* CAÇADOR – Eu vou falar com eles, vou contar a minha esposa e organizar um movimento de proteção aos animais e à natureza.

* LEÃO – Cachorro! Vá com ele.

* REX – Eu!... Não vou não, quero ficar aqui, ele vai me bater.

* ONÇA – Deixe ele conosco. Rex agora é nosso amigo!...

* LEÃO – Dona Onça, ele deve ir com seu dono, dessa forma teremos um amigo na cidade, sempre que precisar ele pode nos procurar. Vá Rex!

* REX – Eu vou... Mas com uma condição, quero ser tratado com respeito. Nada de jogar resto de comida no chão, daqui pra frente eu só como se for na tigelinha (vai saindo pela platéia falando) e tem mais... Meu nome...

* ONÇA – Qual é o problema agora Rex?

* REX – Não quero mais que me chamem de Rex, daqui pra frente quero que me chamem de Betoven (para o caçador). Diga Beethoven, se não eu não vou.

* CAÇADOR – Está bem, vamos Beethoven. (saem de cena)

* BODE – Vai, seu caçador esperto, dê uma de bonzinho para se salvar...

* ONÇA – Pare com isso, seu fedorento, o caçador agora é meu amigo.

* BODE – Tinha que ser mesmo seu amigo, tchau. Amigo da onça... É isso que ele é.

* LEÃO – Basta Sr. Bode, vamos acabar com esta confusão.

* ONÇA – Muito bem... Muito bem, Sr Leão, manda esse bode fedorento embora da floresta. Lugar de bode é longe da floresta, na roça preso no cercado.

* BODE – Eu não vou... Mesmo que o Sr. me mande ir embora, eu voltarei. Porque agora eu tenho residência fixa aqui.

* ONÇA – Essa casa não é sua, já disse.

* LEÃO – Esta casa é de vocês, os dois a construíram, e vamos resolver este problema.

* OS DOIS – Como?

* LEÃO – Quando a onça sair de noite para dar seu passeio, o bode entra na casinha para dormir e, quando o dia estiver amanhecendo o Bode sai para o pasto, e a onça volta para casa. Desta forma, o bode não vê a onça e a onça não vê o bode.

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* ONÇA – Mas Sr Leão, ele vai dormir na minha casinha?

* LEÃO – Perfeitamente.

* ONÇA – Que nojo! Vai ficar tudo fedido, esse bode é nojento, Sr. Leão.

* BODE – (chorando) Minha santinha protetora dos bodes desamparados, Dona Onça, por favor, me deixa ficar na casinha! Deixa!...

* LEÃO – Dona Onça?

* ONÇA – Está bem! Podemos morar juntos, pois não quero que ele saia por aí dizendo para todos os bichos da floresta que está sofrendo por minha culpa.

* LEÃO – Enfim, a paz. Agora fico tranquilo em saber que vocês agora ficaram amigos. Vou me retirar agora, pois tenho que cuidar da floresta. Até logo meus amigos (sai de cena)! (Onça e Bode ficam a sós)

* ONÇA – Olha, Sr Bode, estou feliz porque resolvemos nossos problemas, nunca mais quero brigar com o Sr e com ninguém aqui da floresta.

* BODE – E mais, vou ficar aqui de olhos e ouvidos bem abertos, afinal de contas, com onça não se brinca. Apesar dos pesares, agora eu também sou amigo da onça.

* ONÇA – E eu sou amigo do bode.

* BODE – Mas eu falei primeiro que sou amigo da onça.

* ONÇA – Sr. Bode,vamos chamar todo mundo para comemorar nossa amizade.

* BODE – Venham todos os bichos. (entram cantando fazendo a festa). Todos.Fada Zul - Pássaro Encantado!

FIM

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Amizade pura

João Paulo Costa dos Santos

Momentos de ternura

Palavras de afeto

É uma amizade pura

Gosto de ter você por perto

Foi bom te encontrar

Mudou minha vida

É bom poder contar

Com uma amiga

Tivemos nossas diferenças

Mas já passou

Temos nossas diferenças

Mas isso não atrapalhou

João Paulo, 15 anos, 1ª série do ensino médio do Colégio Estadual Polivalente de Itambé, DIREC 14 – Itapetinga.

Um sentimento puro

Um amor de irmão

É como se no escuro

Alguém te desse a mão

É como se o sol e a lua

Trocassem de lugar

Se as estrelas e a rua

Pudessem se tocar

Assim me faz sentir

Nossa amizade

Acredite em mim

Meu sentimento é sem maldade

Ouça o que digo

Pois é tudo verdade

Quero ser teu amigo

Até a eternidade.

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