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Ano XIII - N° 25 São Caetano do Sul Julho de 2002

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Ano XIII - N° 25 São Caetano do Sul Julho de 2002

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““FF ides-Honor-Labor. (Fé, Honra e Trabalho): três palavrasem latim abaixo do brasão encimado por quatro letras

brancas – I.R.F.M. – rodeadas de folhas verdes; um fundo ver-melho de chaminés fumegantes e um trem tracionado por umalocomotiva a vapor”

Isto foi mais que um logotipo, uma marca ou um desenho.Foi simplesmente o símbolo do maior parque industrial daAmérica Latina e representou em nosso país o que a famíliaRothschield significou para a Inglaterra e os Rockefellers paraos Estados Unidos da América.

O símbolo registrado em nossa capa foi feito em pintura so-bre ladrilhos e faz parte do acervo do Museu Histórico Munici-pal. Todavia, já era parte da paisagem industrial de São Caetanodo Sul desde 1913, uma vez que podia ser visto nas paredes daMatarazzo, nos rótulos dos produtos, nos vagões ferroviários,no uniforme dos operários e na memória do povo.

Retratá-lo em Raízes é uma homenagem aos milhares dehomens e mulheres sancaetanenses que, anonimamente, aju-daram a erguer este império industrial com Fé, Honra, e Trabal-ho, um exemplo para as novas gerações.

Capa e Arte – Neusa Schilaro Scaléa

RRAAÍÍZZEESS Julho/20022

Jornalista responsávelAlexandre Toler Russo(MTb 33212)

Coordenação geralSônia Maria Franco Xavier

RedaçãoFabíola Fioravante (digitalização de imagens)

José Roberto Gianello (pesquisa)

Maísa da Silveira (digitalização)

Maria Ap. M. Fedatto (secretaria e coordenação)

Paula Ferreira Fiorotti (assessoria)

Paula Sidelnik (digitalização de imagens)

ImagensAntônio Reginaldo Canhoni (fotografia)

Neusa Schilaro Scaléa (arte)

Programação Visual e Paginação EletrônicaMaria Antônia dos Reis-ME

Conselho EditorialAleksandar Jovanovic, Alexandre TolerRusso, Humberto Pastore, Jayme daCosta Patrão, João da Costa Faria, JoséRoberto Gianello, Maria Aparecida M. Fe-datto, Mário Del Rey, Mário Porfírio Ro-drigues, José de Souza Martins, SílvioJosé Buso, Sônia Maria Franco Xavier(presidente), Valdenízio Petrolli, YolandaAscêncio.

Fotolitos e ImpressãoProvo Distribuídora e Gráfica Ltda.

A revista está aberta à colaboração depesquisadores da História do ABC pau-lista. A seleção do material é de respon-sabilidade do Conselho Editorial. Origi-nais encaminhados à Redação não se-rão devolvidos, com exceção de fotogra-fias. Opiniões emitidas nos artigos sãode exclusiva responsabilidade de seusautores e não refletem, necessariamen-te, a opinião da revista.

Ano XIll - Número 25Publicação semestralDistribuição gratuita

ISSN 1415-3173Publicação da Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul

Julho de 2002

Avenida Goiás, 600 - TérreoCEP 09521-300 - São Caetano do Sul (SP)Fonefax (011) 4221-9008 e 4221-7420www.fpm.org.bre-mail: [email protected] [email protected]

Nossa Capa

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Editorial

BB uscando sempre a me-mória sob diferentes

enfoques e múltiplas per-spectivas, mas fiel às suasorigens, Raízes 25 abrenovos espaços em seuíndice para abrigar contex-tos regionais que historica-mente nos abrangem e quede alguma forma influencia-ram nosso passado.

São contribuições quevêm enriquecer o incessantegarimpar da memória com adescoberta de outros filõesde grande valor.

A diversidade das seçõesnos tem proporcionadonovos colaboradores queemprestam à revista carátermais abrangente nas pes-quisas.

Destacamos, também,neste número, a seção dos-siê, bastante elucidativa so-bre as a t ividades desen-volvidas pelo Grupo Mata-razzo, pr incipalmente aprimeira Indústria de Ener-gia (IMÊ), pioneira na refi-nação de petróleo no ABC.

Os primórdios do esporteem nossa cidade, em pre-cisos relatos, nos permitemrefletir sobre o difícil ca-minho que foi trilhado até obrilhante estágio atual.

Ficam nossos agradeci-mentos a todos que aqui co-laboraram.

O passado é imutável eresgatá-lo com fidelidade édever de todos. Porém, asdiferentes formas de fazê-losão privilégios da arte decada um.

Homenageando o futuro

Luiz Tortorello(*)

AA maior batalha não é contra assituações materiais adversas:

é contra as mentalidades precáriasque não reconhecem, no passado,os valores e princípios que nor-teiam uma comunidade, e que nãovêem, no futuro, o aprimoramentoe crescimento da própria qualidadehumana. Ambos os fatores estãointerligados de formatão intensa, que a fal-ta de um comprom-ete definitivamente ooutro.

Quando ideali-zamos a FundaçãoPró-Memória, em1991, nosso pensa-mento estava nosprimórdios de SãoCaetano do Sul, nasnossas firmes origensbeneditinas reforçadas pela imi-gração italiana de fins do séculoXIX e todas as que lhe seguiram.

Estava nos princípios e valoresde trabalho como meio de conquis-tar o que de melhor a vida podeproporcionar, espírito de luta e cor-agem ante quaisquer obstáculos edificuldades, inciativa e desprendi-mento em todas as ações para con-struir uma comunidade valorosa epioneira, aguerrida e eficiente, ale-gre e disposta a construir o futurosem jamais esquecer a generosi-dade e a solidariedade, sem o quenão podemos falar de qualidadehumana. Nossa comunidade real-iza esse princípio no seu dia-a-dia.

Em suas novas dependênciasno Complexo Educacional do En-sino Fundamental da AvenidaGoiás com a Rua Augusto de Tole-

do, a Fundação Pró-Memória inau-gura um novo ciclo de sua existên-cia, melhor estruturada e imple-mentada, e este número da revistaRaízes representa um marco natrajetória de nossa cidade. Abresua abrangência e representativi-dade ao abarcar também a região,resgata fatos e documentos legiti-madores do orgulho que temos denossa História e, como sempre,

nos faz refletir quesomente podemosconstruir com suces-so se os alicerces sãosólidos. Raízes, revista sim-ples e objetiva, traz amarca elogiável dojornalismo sério deretrospectiva e con-tribui, definitiva-mente, para nossaidentificação seja co-

mo comunidade, seja como fatorespermanentes de pioneirismo emnossa região, no Estado de SãoPaulo e em nosso país, pois é ex-emplo vivo e confiável da re-tratação do passado com vistas aostempos que virão. É uma home-nagem ao futuro.

Vale a pena ler. Ainda mais,vale a pena a identificação naturaldecorrente de suas matérias, arti-gos e reportagens, que reforçamnosso sentimento de pertencer auma comunidade líder no país.Parabéns aos autores e, especial-mente, parabéns aos leitores.

(*) O professor e jurista Luiz Tortorello, cri-ador da Fundação Pró-Memória, é prefeitode São Caetano do Sul em terceiro mandato,Presidente do Consórcio e da Câmara doABC, Coordenador do Grupo de TrabalhoLegislativo do Fórum de Segurança daGrande São Paulo e ex-Deputado Estadual.

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00005555 O Grupo Matarazzo nasterras do município

00007777 De Fábricas ReunidasPamplona a Indústrias ReunidasF. Matarazzo (1916)

José Roberto GIANELLO

00009999 A maravilhosa FábricaRayon

Mário Porfírio RODRIGUES

11111111 IMÊ – A primeira refinadora de petróleo do ABC

Pedro KENDE

22223333 Singerffrido Cavassani, o almoxarife do império

22227777 Maria Silvestre:costurando o passado

Sônia Maria Franco XAVIER

33330000 Jubileu de Ouro de formatura que marcou época:uma turma fadada a vencer

Carlos GERCHTEL

33336666 A Região do ABC no tempo dos bondes

André Luiz Balsante CARAM

44445555 O ABC Paulista. Da vilade João Ramalho até meados do século XVIII

Arlete Assumpção MONTEIRO

44448888 Fazenda do capitão João em Mauá

Silvia AHLERS

55550000 O patrimônio cultural de Paranapiacaba

Wilson Roberto Stanziani de SOUZA

55554444 Paranapiacaba e Educação Patrimonial

Suzana Cecília KLEEB

55556666 Trilhas de Paranapiacaba:uma história no caminho daMata Atlântica

Valdemar Campião JÚNIOR

55557777 No alto da serra se avista Paranapiacaba

Carlos da COSTA

55559999 Entre os filhos espanhóisde Santa Paula, Rodrigo Marques

66662222 Primeiro e segundo volumes da história da marcaTrentini: Lucillo e Cesare

Alexandre Toler RUSSO

66667777 Aprendizado sem as formalidades da sala de aula

77771111 Retrospectiva: OnzeSalões de Arte Contemporâneano município

Neusa Schilaro SCALÉA

77773333 São Caetano do Sul,cenário do primeiro filmebrasileiro de bonecos animados

77776666 A Fotografia e a Cidade II

77777777 Força feminina combate o câncer há 30 anos

77779999 Relato sobre a famíliaCapella na década de 30

Roberto CAPELLA

88881111 José Lozano: 60 anos como açougueiro na cidade

88885555 Família Gesellmann, 57 anos de São Caetano

Yolanda ASCENCIO

88888888 Museu Municipal,43 anos de história

Humberto Domingos PASTORE

99991111 Primórdios do futebol:Clube dos Amigos X Rio Branco

Narciso FERRARI

99993333 Arte de Silvana ajudou a premiar a cidade

José Teixeira GONÇALVES

99996666 Mestre Aurélio tem 60 anos de futebol na região

111100001111 Jogos Abertos do Interior: São Caetano sagrou-se campeão pelaprimeira vez em 1982

José Odair da SILVA

111100004444

111100008888

Fábrica de LouçasCláudia

ÍÍNDICENDICE

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O Grupo Matarazzonas terras do município

AA s instalaçõesdas Indús-

trias ReunidasFrancisco Matara-zzo, em São Cae-tano do Sul, eramconhecidas, den-tro desse império

familiar, como Grupo São Caetano.As fábricas reunidas aqui forma-vam o único grupo fechado da cor-poração, produzindo os mais diver-sos artigos. A prioridade, contudo,era a área química. Começou em1912, com uma caixotaria e umaserraria e, nesse mesmo ano, arren-dou, junto a Pamplona Sobrinho &Cia, as instalações em que vieram aproduzir velas, óleos vegetais, sa-bões, lubrificantes, graxas, gliceri-nas e estearinas.

A biografia do Conde FranciscoMatarazzo registra sua chegada aoBrasil com 21 anos de idade e nacondição de imigrante. Começou atrabalhar em Sorocaba, trocandomercadorias por animais e, em1890, fundou a firma Matarazzo &Irmãos, que deu origem à S.A.Indústrias Reunidas FranciscoMatarazzo. O imenso grupo que daíse originou sobreviveu até 1977,ano da concordata que pôs fim aomaior império industrial-familiarconstituído no Brasil.

É surpreendente analisar a histó-ria dessa empresa, principalmentepela sucessão de empreendimentose investimentos que ela provocavadentro de si mesma, gerando fábri-cas e indústrias como uma bola deneve de tamanho indefinido.Começou com uma fábrica de fari-nha de trigo. Esta provocou a mon-tagem de uma indústria de sacos,mais tarde transformada em fábrica

de tecidos populares, especialmentechita. O desenvolvimento das ativi-dades têxteis levou à compra de al-godão em caroço. Daí surgiu a idéiade aproveitamento das sementes dealgodão, lintel, torta e farelo. Estaoperação inspirou a manufatura deoutro subproduto da semente, apa-recendo uma fábrica de sabão para

lavagem. O sabão exigia quantidadesubstancial de sebo que, por suavez, servia para manipular estearinae glicerina. Desse modo, foi cons-truída a empresa de velas e refi-nação de glicerina. Mas era neces-sário encaixotar todos esses produ-tos e colocá-los nos mercados. Paratanto, foram montadas as serrarias

● 1854 – Nasce em 9 deMarço, em Castellabate,Província de Salerno,Itália.● 1881 – Desembarca noRio de Janeiro com a mu-lher, Filomena, e dois fi-lhos.● 1882 – Abre seu pri-meiro negócio no Brasil,uma venda em Sorocaba,no interior paulista.● 1891 – FranciscoMatarazzo muda-se para acidade de São Paulo, oque determinou a viradaem seus negócios. Fundaa Companhia Matarazzo com 43 sócios.● 1895 – Constrói a Vila Matarazzo, narecém-aberta Avenida Paulista, onde re-cebe o mundo político, empresarial e cul-tural de São Paulo e da Itália. ● 1897 – Funda a empresa Matarazzo &Irmãos.● 1900 – Inaugura o Moinho Matarazzo,o mais moderno da América Latina.Funda o Banco Commerciale Italiano diSão Paulo.● 1902 – Anexa ao moinho, nasce aMetalúrgica Matarazzo.● 1904 – Surge, ao lado do moinho e dametalúrgica, a Fiação e Tecelagem deAlgodão Mariangela, fazendo sacos paraembalar mantimentos e estampados pararoupas.● 1905 – Participa da fundação do BancoItaliano del Brasile.● 1906 – Nasce a fábrica Sol Levante, de

sabão e óleo, a partir douso de caroços de algo-dão.● 1910 – Começa a gran-de expansão do GrupoMatarazzo, que chega ater negócios noAmazonas, Maranhão,Mato Grosso, RegiãoSul, Chile e também im-portar arroz daConchinchina.● 1914 – Funda aSociedade Anônima doParaná, um frigorífico.● 1917 – Recebe do Reida Itália o título de conde

pelos serviços prestados durante aPrimeira Guerra Mundial. Nesse mesmoano, adquire a Companhia MetalGráphica Aliberti, ampliando o setor deestamparia e metais.● 1928 – Empossado presidente doConselho da Indústria de São Paulo, quemais tarde deu origem à Federação dasIndústrias do Estado de São Paulo.● 1930 – Como resposta à crise econômi-ca mundial, investe numa filial naArgentina, apostando no dinamismo domercado da região do Rio Prata.● 1934 – Grande Festa dos 80 anos doconde Francisco Matarazzo no pátio dafábrica com a presença de milhares defuncionários.● 1937 – Morre Francisco Matarazzo,que tem um enterro à altura de seu papelem vida, acompanhado por personalida-des e por centenas de seus operários.

Cronologia Conde Francisco Matarazzo (1854-1937)

Conde Francisco Matarazzo,em foto da década de 20

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O desenho esquemático mostra a localização das seções e instalaçõesda Matarazzo em São Caetano. Trabalho de Adriana de Souza, empesquisa de graduação universitáriafeita em 1995

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● 1912 – O grupo Matarazzo arrendaas quatro fábricas da antiga Pamplona,de sabões e óleos vegetais.● 1913 – Inicia as atividades da fábricade pregos.● 1915 – Ermelino Matarazzo inicia aimplantação em São Caetano do pri-meiro núcleo fechado de fábricas dogrupo Matarazzo.● 1922 – Início das operações da Fábri-ca de Curtumes.● 1924 – Demolidos os antigos pavi-lhões da Pamplona para a construção emontagem da Viscoseda – futuraFábrica de Rayon.● 1930 – É montada a Fábrica de Pa-

pel, Papelão e Celulose.● 1935 – É fundada a CerâmicaMatarazzo – Louças Cláudia.● 1936 – Começa a funcionar a Fábricade Àcidos.● 1938 – É inaugurada a I.M.Ê –Indústria Matarazzo de Energia –, pri-meira refinadora de petróleo do Estadode São Paulo.● 1939 – Inaugurada a Fábrica de Sul-fato de Alumínio.● 1948 – Inaugurada a Fábrica de SodaCáustica.● 1954 – Inaugurada a Fábrica de Ace-tileno.● 1955 – Inaugurada a Fábrica de Car-

bureto de Cálcio.● 1961 – Inaugurada a Fábrica de Áci-do Sulfúrico.● 1977 – Desativadas as Fábricas deRayon e Sulfureto.● 1981 – Fechadas as Fábricas de Clo-ro e B.H.C.● 1982 – Fechada a Fábrica de SodaCáustica.● 1995 – Os operários assumem a dire-ção da Cerâmica Matarazzo – LouçasCláudia.● 1997 – Parte do terreno da Matarazzoé utilizada para a realização da FestaItaliana, nos festejos de aniversário deSão Caetano.

Cronologia histórica das atividades do Grupo Matarazzo em São Caetano do Sul

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(São Paulo e Paraná), que deramorigem ao ramo de construção demóveis. As serrarias exigiam pregosos mais variados, de modo que foicriada a indústria desses artigos, quese desenvolveu e passou a forneceraos mercados nacionais. Aconteceu,entretanto, que os óleos exigiam la-tas. Fundou-se uma metalúrgica,com litografia, para todos os tiposde invólucros metálicos. OsMatarazzos montavam, ainda, usi-nas, destilarias e fábricas de tintas evernizes para caldeiras e pequenasmetalúrgicas.

O babaçu, o ouricuri, o amen-doim, o milho, o algodão, as ma-deiras, essências de vários tipos, ocaroço de algodão, a cana-de-açú-car, o ferro, o aço, o cimento, o pe-tróleo e inúmeras outras matérias-primas, encontram, no grupoMatarazzo, o fabricante certo (daí agrande diversidade de fábricas es-palhadas pelo Brasil).

Para se ter uma idéia do gigan-tismo da Matarazzo, na década de50 o conjunto das empresas ocupa-va uma área de aproximadamentedois milhões de metros quadrados.Empregava cerca de 30 mil operá-rios, três mil funcionários e mil téc-nicos, possuindo uma frota de na-vios, dez locomotivas com 200 va-gões e 900 veículos motorizadospara o transporte dos produtos.

Este dossiê procura enfocar ape-nas as atividades do grupo Ma-tarazzo na cidade de São Caetano doSul. A importância histórica, social eeconômica do império constituídopelo imigrante italiano na cidade,com destaque para a I.M.Ê – Indús-tria Matarazzo de Energia (iniciativapioneira no campo da energia e fun-cionando basicamente como uma re-finaria de petróleo. Foi criada em1936 como a primeira do Estado deSão Paulo e a segunda do Brasil,pois a pioneira foi instalada emUruguaiana, Rio Grande do Sul, em1932), foi extremamente relevante.

José Roberto GIANELLO (*)

NN o livro dos impostos de indús-trias e profissões do antigo

Município de São Bernardo, quecobre os anos compreendidos entre1893 e 1899, aparece o primeiro re-gistro do exercício fiscal da Fábricade Sabão Pamplona e Sobrinho,apontando o recolhimento de im-postos na cidade. A Pamplona, co-mo era popularmente conhecida,passava a ser uma das principaiscontribuintes do ainda Distrito deSão Caetano, ao lado do BancoUnião, com sua destilaria a vapor, eda Companhia Formicida Paulista.

Ainda em 1910, a Pamplona re-colhia impostos no Distrito de SãoCaetano, mas já sofria o assédioconstante dos emissários dasIndústrias Reunidas FranciscoMatarazzo, ávida em arrendar seuspavilhões industriais, absorver suaprodução de sabão, velas, graxas eóleos lubrificantes, com o objetivode criar, em São Caetano, o que se-ria o único grupo fechado de indús-

trias do nascente império Mata-razzo, no início do século, e umdos seus ramos industriais mais de-senvolvidos, principalmente naárea química.

A fábrica Pamplona já existia,desde 1876, na cidade de São Paulo.Seu proprietário, José CoelhoPamplona, transferiu as instalaçõespara São Caetano em 1896, nas ter-ras da antiga Fazenda São Caetano,dos monges beneditinos, e que fo-ram ocupados posteriormente pelasolarias do dr. Samuel Eduardo daCosta Mesquita, fabricante dos fa-mosos tijolos Paulista.

A área ocupada pela Pamplonaera de 40 mil metros quadrados. Em1901, trabalhavam na fábrica de 30a 40 operários, sendo a grandemaioria de estrangeiros. A fábricaPamplona passou por um grandedesenvolvimento industrial quandoMariano Paim Pamplona substituiuJosé Coelho Pamplona na direçãoda empresa.

Além da fábrica, a família Pam-plona controlava o nascimento dos

Balanço geral da Companhia Fábricas Pamplona, divulgado no Diário Oficial de Outubro de 1913

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De Fábricas Reunidas Pamplona a Indústrias Reunidas

F. Matarazzo (1916)

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primeiros loteamentos no Distritode São Caetano através da Compa-nhia Melhoramentos de São Cae-tano. Graças à força política que ti-nham junto ao antigo Município deSão Bernardo, conseguiram muitosbenefícios através das primeiras leisbaixadas no município. A lei 120,de 15 de Julho de 1912, denomina-va, entre outras, as ruas MarianoPamplona e Heloísa Pamplona, quepermanecem assim até hoje.

Com a chegada das indústriasMatarazzo, o poder político da famí-lia Pamplona começou a diminuir noDistrito de São Caetano. Em 1921,por exemplo, perdeu a concessão pa-ra a exploração do serviço de cons-trução da rede de água e esgoto.

Estava preparado, desde 1913, ocenário para a mudança do poder

econômico e político no Distrito deSão Caetano. Em 1916, registram-se ainda os impostos pagos pelaPamplona e recolhidos junto à anti-ga Prefeitura de São Bernardo. Em1917, a Pamplona deixa de figurarnos livros de impostos, substituídapela Matarazzo, que paga os váriosimpostos e o alvará de transferênciadas fábricas de sabão e óleo.

Em 20 de Outubro de 1913, érealizada uma assembléia geral or-dinária de acionistas da Pamplonacom o objetivo de verificar e apre-ciar as contas e operações realizadasdurante o ano fiscal, findo em 13 deJulho de 1913. Nessa reunião foidiscutida a necessidade de um au-mento de capital, através de em-préstimos, a fim de atender às novasinstalações de máquinas. Os direto-

res, no entanto, não achavam a oca-sião favorável para investimentos,principalmente por causa dos pro-blemas internacionais que aponta-vam para a eclosão da PrimeiraGuerra Mundial (1914–1918). A si-tuação da Pamplona tornou-se com-plicada sem os investimentos neces-sários durante o começo da IGrande Guerra. Simultaneamente, ogrupo Matarazzo já se fazia imporcom mais objetividade no arrenda-mento de suas instalações.

Na reunião realizada em 11 deAgosto de 1916, foi aclamado pre-sidente da assembléia de acionistasJosé Luiz Flaquer que, ao dar a pa-lavra ao acionista Mariano PaimPamplona Sobrinho, de imediato semanifestou sobre o interesse daS.A. Indústrias Reunidas F. Mata-razzo em arrendar todas as máqui-nas da Pamplona, terrenos e esto-ques de materiais pelo preço de780.000$000 (setecentos e oitentacontos de réis) em moeda correntee à vista, com juros de 8% ao ano.

A assembléia ficou dividida,quanto à proposta da Matarazzo,porque alguns sócios não aceitavamo abatimento de 30% sobre o valorda venda exigido pela Matarazzo.Votaram contra o arrendamento osacionistas Francisco Cuocco, NicolaPuglisi Carbone e Fernando Maggi.A favor da proposta, votaram os se-guintes acionistas: Mariano Paim

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Demonstração daConta de Lucros ePerdas daCompanhia FábricasPamplona, divulgadano Diário Oficial deOutubro de 1913F

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Proprietários, funcionários e operários da Companhia Fábricas Pamplona, em 1912, diante das instalações

industrias da empresa

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Na década de 70, ainda existiam as ruínas dos pavilhões da Pamplona dentro da Matarazzo, de acordo com

informações de antigos funcionários

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Pamplona Sobrinho, Laurentino deAzevedo, Serafini Constantino e se-nador José Luiz Flaquer (este votoupor si mesmo e como procurador deMaria Ascensão Coelho, viúva deManoel Coelho, e seus filhos).

Após calorosas discussões, foiresolvida a venda total da fábricaPamplona para o grupo Matarazzo.As condições eram as seguintes:importância a receber da SociedadeAnônima Indústrias Reunidas F.Matarazzo da Companhia Pam-plona – 780.000$000 (setecentoscontos de réis); juros de 8% ao anode primeiro até quinze do correntemês (dois contos setecentos e cin-qüenta mil réis: 2.750$000); saldoem conta de arrendamento em de-pósito no Banco de São Paulo e emCaixa (quarenta e dois contos, seis-centos e seis mil e cem réis:42.606$100); soma: oitocentos evinte e cinco contos trezentos e cin-qüenta e seis mil e cem réis:825.356$100.

A ata de venda da Pamplona foiaprovada em assembléia e assinadapelos seguintes acionistas: Arman-do Leal Pamplona, Nicola PuglisiCarbone, Fernando Maggi, JoséLuiz Flaquer, Maria de AscensãoCoelho, Serafim Constantino,Laurestino de Azevedo, FranciscoCuocco e Mariano Paim PamplonaSobrinho. Assim terminava a histó-ria de uma das primeiras indústriasde São Caetano, que ficou gravadana memória da primeira geração debrasileiros, descendentes dos colo-nizadores italianos de 1877. A JuntaComercial do Estado de São Pauloarquivou a ata da assembléia reali-zada no dia 14 de Agosto de 1916sob o número 2666.

Fontes: Diário Oficial da União

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(*) José Roberto Gianello é sociólogo e as-sessor cultural da Fundação Pró-Memória deSão Caetano do Sul

Mário Porfírio RODRIGUES (*)

EEm 1935 a maioria dos habi-tantes de São Caetano perten-

cia à classe trabalhadora e pou-quíssimos pensavam em classemédia. As famílias mais abastadaspossuíam propriedades, mas todostrabalhavam arduamente nas in-dústrias locais.

No meu caso, pertencente auma família humilde, os cinco ir-mãos freqüentavam o grupo esco-lar, porém, se fosse possível, de-veriam também trabalhar para aju-dar nas despesas de casa. Com no-ve anos e meio de idade, após sairdas aulas no Grupo EscolarSenador Flaquer, almoçava rapi-damente e trabalhava no períododa tarde, até às 19 horas, na bar-bearia do sr. Dante Néri.

A barbearia estava situada naRua 28 de Julho, por onde passa-vam os empregados da RayonMatarazzo, em direção ao portãoda fábrica, na praça ErmelinoMatarazzo. Os empregados, deambos os sexos, que trabalhavamem horário normal, regressavamdo trabalho no horário de almoço,quando eu começava a trabalhar.Eram centenas. Uma hora depois,passavam os que entravam às 14horas e trabalhavam até às 22 ho-ras. Mais algumas centenas depessoas. Nesse horário, a maioriaera composta por moças, jovens ebonitas, que cuidavam dos tearesque enrolavam os fios artificiais.

Com quase 11 anos de idadefui trabalhar nas oficinas dosIrmãos Perucchi, na Rua RioBranco, perto de minha residên-cia, mas sempre pensando em serum dia admitido nas IndústriasReunidas Francisco Matarazzo.

Em meu novo emprego ajuda-va os proprietários e os outros trêsempregados: Ângelo Pressinotti,Antônio de Almeida e VicenteGallo. O irmão mais velho, An-tônio, trabalhava mais na forja,consertando aros de carroças eferramentas, além de ferrar cava-los e burros. Eu mesmo o ajudeinesse trabalho várias vezes. O ou-tro irmão, José, se dedicava a bici-cletas: consertava, pintava, refor-mava e alugava as que possuía.Anos depois, José criou a In-dústria de Artefatos Cruzeiro, quefabricava algumas peças para bici-cletas.

Transcorridos dois anos, fuitrabalhar na Fábrica de LouçasAdelinas e, depois, já tendo com-pletado 14 anos de idade, tive omeu primeiro registro em carteiraprofissional nas IndústriasAliberti S.A. Nessa época, meu ir-mão trabalhava como apontadorna carpintaria das IndústriasMatarazzo e conseguiu um lugarpara mim de ajudante de carpin-teiro. A função do meu irmão eraanotar, diariamente, onde eramgastas as horas de cada emprega-

Antônio Mazzarolo, primeiro àdireita, seu amigo Antônio, o menino

Antônio Passarela, e JoãoPassarela. Jardim da Luz, 1930

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A maravilhosa Fábrica Rayon

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do. Isso para poder ser calculadoo custo de cada item produzido nacarpintaria.

Com Onofre Russo e mais umempregado preparávamos caixasde madeira. Cada semana ou dezdias ajudávamos o carpinteiro aserrar as tábuas nos tamanhos dascaixas. Nos dias seguintes montá-vamos e pregávamos as caixas,separando as tampas que o setorde expedição usava, após colocaros fios de raiom que eram despa-chados para os clientes. O chefedeste setor era o sr. FranciscoMessaros e o subchefe seu filhoJoão Messaros.

Era comum surgir um trabalhomaior para os carpinteiros, que noschamavam para ajudá-los. E íamoscom eles para o interior da fábrica.Lembramos de tanques enormes,feitos em madeira peroba, queeram montados no local definitivoe depois recobertos com placas dechumbo. Ácidos aí eram deposita-dos para a lavagem dos fios.Outras vezes eram reformas nasprateleiras dos almoxarifados ge-rais. Aos sábados à tarde fazíamosa limpeza da carpintaria e leváva-mos os retalhos de madeira e aserragem para serem usados comocombustível no setor de caldeira-ria, que fornecia calor para todasas secções do complexo industrial.

O sr. Antônio Mazzarolo, quetrabalhou nas Indústrias Mata-razzo de 1926 a 1955, era o chefedo setor de caldeiraria, que tinhacomo subchefe João Passarela,ex-lutador de boxe. Ambos apare-cem na foto tirada no Jardim daLuz, em 1930, aproximadamente,ladeando um amigo de nomeAntônio e o pequeno Nim(Antônio Passarela).

Esses trabalhos fora da carpin-taria permitiam que eu e os outrosajudantes ficássemos conhecendoquase todas as dependências docomplexo industrial.

Em São Caetano poucas eramas ruas calçadas com paralelepípe-dos. Em época de chuva, os san-caetanenses eram obrigados a an-dar sobre ruas lamacentas ou ficardentro de casa para não se suja-rem com o barro espirrado pelosveículos.

Eu estava maravilhado vendotodas as ruas largas cobertas deparalelepípedos e com calçadas decimento nas laterais - muito me-lhores do que as vias públicas -,

limpas e ordenadas. Havia respei-to e todos obedeciam aos avisos.Os horários de entrada e saídaeram rigorosamente cumpridos eos faltosos eram penalizados.Milhares de pessoas juntas, cadauma com a sua função, respeitan-do-se. Tudo funcionava como sefosse uma grande família.

Nessa época, ouvindo os ensi-namentos de meu pai, segui oexemplo dos meus irmãos e, ga-nhando já o suficiente para pagaros meus estudos, ingressei noLiceu Acadêmico São Paulo, quefuncionava à noite, na RuaPerrela, onde era a sede daSociedade Beneficente Príncipede Nápoles. Depois me transferipara a Escola Técnica de Co-mércio 30 de Outubro.

Em nove de Janeiro de 1942,com 16 anos de idade, conseguimeu primeiro emprego em escri-tório, como office-boy, deixandopara trás o meu bom patrão e amaravilhosa indústria Matarazzo,onde aprendi realmente os primei-ros ensinamentos necessários parainiciar minha gratificante vidaprofissional.

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Ano de 1939, OficinasIrmãos Perucchi, Rua RioBranco, 170. Na parte da

frente estava a fundição, acargo de Antônio Perucchi(fazia arcos para rodas decarroças, ferrava animais,burros, cavalos e outros).

Nos fundos do imóvelestava a bicicletaria queconsertava, reformava e

alugava bicicletas, a cargode José Perucchi. Da

esquerda para a direita:Ângelo Pressinotti, Mário

Porfírio Rodrigues, Antôniode Almeida e Vicente Gallo M

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Por

fírio

Rod

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(*) Mário Porfírio Rodrigues é fundador doRotary Club de São Caetano do Sul, doJornal de São Caetano, do HospitalBeneficente São Caetano e, atualmente, émembro do Rotary Club de São Paulo

Organograma do Grupo Matarazzo,destacando a Viscoseda São

Caetano – Fábrica Rayon

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IMÊ – A primeirarefinadora de petróleo do ABC

Pedro KENDE (*)

AA refinaria da IMÊ ficava locali-zada num terreno plano, na

margem esquerda do rio chamadodos Meninos e de frente para aAvenida Presidente Wilson. Ora, seisto é verdade, então esse terrenoestá hoje situado no Município deSão Paulo. É verdade que o Riodos Meninos é a divisa entre a mu-nicipalidade de São Paulo e a deSão Caetano do Sul. Antes da auto-nomia de São Caetano, seria a divi-sa com Santo André e, antes ainda,com São Bernardo. Por que, então,sempre se considerou a IMÊ comosituada em São Caetano?

A resposta é simples. O próprioengenheiro Takashi, espontanea-mente, em sua entrevista usava aexpressão Grupo São Caetano pa-ra se referir ao conjunto de fábri-cas da área. Ali se situavam a Fá-brica de Rayon, a Fábrica de SodaCáustica, a Fábrica de Ácido Clo-rídrico, a Fábrica de Ácido Sulfú-rico, a Fábrica de Celulose, o Ser-viço de Purificação de Água e arefinaria. Um simples divisor deterritório municipal não seria o su-ficiente para separar as unidadesdo complexo, que tinham serviçosmédicos, serviço de alimentação eoutras áreas de apoio tanto socialcomo logístico. Portanto, dentrodo espírito empresarial, uma divisade caráter apenas político e admi-nistrativo nunca seria suficientepara perturbar a estrutura montada.

O serviço de água, com tanquede decantação, filtros, bombas ereservatório de água purificada,era uma obra notável. Foi cons-truída para abastecer todo o com-plexo industrial do Grupo SãoCaetano e foi o causador indireto

da polêmica que surgiu, mais tar-de, quando esse serviço de purifi-cação de água causou exatamenteaquilo que se esperava, ou seja,um aumento da produção da refi-naria. Note-se bem, não um au-mento das instalações, mas apenasaumento de produção como resul-tado de melhoria de abastecimen-

to de água, sem os fatores poluen-tes que atormentaram os primeirosanos da refinaria.

Esse abastecimento de águapurificada não era exclusivo da re-finaria, mas servia a todo oGrupo São Caetano. Portanto,mais uma razão para a incorpora-ção ao dito grupo de uma unidadeque ficava em território de muni-cípio vizinho.

Ao se observar o aspecto topo-gráfico, notar-se-á que o terreno on-de ficava localizada a refinaria seencontra na vertente sul de uma en-costa, cuja parte alta ainda hoje éárea verde e, se não fosse a demar-cação fixada pelo Rio dos Meninos,ter-se-ia a impressão de que a divi-sa municipal corre pelo alto da VilaCarioca (daí a impressão que setem de estarmos já em SãoCaetano, antes mesmo de se chegarao vale do Rio dos Meninos).

Aliás, a Lei nº 38, de 12 deMarço de 1889, que elevou a mu-nicípio o districto de São Bernar-do, conservou as divisas existen-tes. Esses dados foram publicados

Vista geral dasinstalações

industriais daMatarazzo em

São Caetano. Nocanto inferior

esquerdo, vistaparcial da IMÊ.

Ano de 1945 Fun

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Portaria principal da fábricaMatarazzo, em São Caetano,

junto à Praça Ermelino Matarazzo.Ano de 1982

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no livro Álbum de São Bernardo,editado em Dezembro de 1936, e,entre outras coisas, menciona oslimites municipais, que agoratranscrevemos, respeitando a gra-fia e a pouca clareza: Com o mu-nicípio da Capital: Pelo alto doespigão que limita pelo lado direi-to do rio Ypiranga ao valle desterio e do rio dos Couros, desde oponto mais alto do serrote que fi-ca fronteiro à cabeceira do rioYpiranga, e onde termina a linhadivisória com o município deSanto Amaro, até o ponto mais al-to do serrote próximo à estradado Curral Pequeno, fronteiro àcabeceira do galho ocidental dorio dos Couros; e deste ponto, poruma linha recta, até à cabeceiradesse galho; em seguida por elleabaixo até a foz do rio dosCouros, e por este abaixo, até suafoz no rio dos Meninos; e, por esteabaixo, até sua foz no rioTamanduatehy; em seguida, poreste último e o rio do Oratorioacima até a cabeceira pelo alto doespigão que divide o valle do rioGuayó do rio Aricanduva até oponto mais alto do morro doCorreia, passando pelo pontomais alto do morro Pellado.

Ora, os limites de São Caetanocom a capital devem ter seguido,quando de sua emancipação emesmo antes dela, os mesmosmarcos lindeiros. Consequen-temente, mesmo com a retificação

do Tamanduateí e do Rio dosMeninos, os limites municipaisdevem ter-se conservado. Assim,só podemos atribuir ao aspecto so-cial e econômico o considerar aIMÊ como sendo parte de SãoCaetano. E contra fatos não será arealidade político-administrativaque prevalecerá.

Por outro lado, o historiadorJosé de Souza Martins, em suaobra Diário de fim de século, men-ciona que um certo dr. SamuelMesquita, cirurgião-dentista deSão Paulo, comprou, através deum testa-de-ferro, alguns lotes co-loniais, do Núcleo Colonial de SãoCaetano, por volta do ano de 1879(entre eles o lote de LuigiD’Agostini). Essas terras ficavamonde é hoje a Vila Carioca e foramincorporadas ao Município de SãoPaulo depois de 1883. Trata-seexatamente da área onde se locali-zaria, mais tarde, a IMÊ.

As terras de Samuel Mesquitaforam vendidas a Pamplona,Sobrinho & Cia., que para látransferiram sua Fábrica de Sabãoe Graxa, em 1896. Em 1916, todaa área seria adquirida porFrancesco Matarazzo, que nelamontaria algumas de suas fábricas(página 47 da obra citada). AFábrica de Sabão e Graxa foitransferida para a Água Brancaem 1920. Portanto, parte da áreada hoje Vila Carioca - onde ficavaa refinaria -, em algum tempo,com certeza, fez parte do NúcleoColonial de São Caetano. Por ou-tro lado, já que se trata de áreaperfeitamente plana e o Rio dosMeninos foi retificado várias ve-zes, é perfeitamente possível queseu leito original corresse mais aonorte. Nesse caso, as terras esta-riam em São Caetano.

De qualquer forma, como já foidito, social e economicamente arefinaria fazia parte do Grupo SãoCaetano, mesmo porque a área fo-ra parte do Núcleo Colonial deSão Caetano, antes mesmo queSão Bernardo se tornasse distrito.

EE NERGIANERGIA - - O mundo econômicosofreu, a partir de meados do sé-culo passado, uma transformaçãoradical. Foi a chamada RevoluçãoIndustrial, que fez com que a pro-dução artesanal, realizada em suamaior parte nas residências dos ar-

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Vista geral dasinstalações daIndústriaMatarazzo deEnergia (IMÊ),em SãoCaetano, nadécada de 50F

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Vagão-tanqueutilizado para

transportar óleocru do Porto de

Santos para arefinaria da IMÊ,em São Caetano

(década de 40) Fun

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tesões, passasse a ser executadaem ambientes maiores, em con-junto e sob a supervisão dos em-presários. Surgia a indústria.

O passo seguinte foi a criaçãode máquinas para reforçar a efi-ciência do trabalho manual com oauxílio de aparelhos, que obvia-mente necessitavam de força dife-rente da dos músculos dos operá-rios. Nesse tempo já se conhecia ovapor como força motriz, que exi-gia combustível para sua geração.O vapor impulsionaria também osmeios de transporte dos bens pro-duzidos nas recém-criadas indús-trias e proveria seus armazéns comas matérias-primas exigidas para aprodução, fossem elas de origemagrícola ou de extração mineral.

Por essa razão, a localizaçãodas indústrias teria que ser ao lon-go das ferrovias existentes.Construídas a partir das fontes deprodutos primários e em direçãoaos portos de exportação – ou ain-da em direção aos pontos finais deconsumo -, as ferrovias permitiamtambém o transporte dos operáriosde suas residências para o local detrabalho. Desse modo, a localiza-ção estava sempre vinculada àexistência de ferrovias.

Esse novo mundo complexo,com atividades interligadas sem-pre através da energia (no início ovapor), passou a exigir novas fon-tes de combustível ou outra formade energia, que até esse momentoera apenas o carvão mineral. Aextração de carvão foi a base dodesenvolvimento da indústria naInglaterra que, apesar de pobre emminério de ferro, era riquíssimaem jazidas de carvão fóssil. Estefoi o impulsionador da riqueza in-glesa. Muito rapidamente, a frotamercante inglesa passou a ser avapor e, com a velocidade de seusnavios, passou a dominar o co-mércio mundial.

Logo depois de implantada a

Revolução Industrial, um em-preendedor norte-americano, o co-ronel Drake, descobriu, naPennsylvania, em 1859, uma novafonte de combustível: o petróleo(já conhecido pela humanidade,mas nunca em volume tal queviesse a substituir com vantagemo carvão).

A vantagem do petróleo sobreo carvão era enorme. Não necessi-tava de minas, galerias, homensescavando. Bastava furar a terra eele surgia. Transportá-lo tambémera fácil. Bastavam tanques, canos,bombas e ele poderia ir para qual-quer lugar. O poder calorífico nãoera tão importante se comparadoàs outras características do com-bustível líquido que, ainda por ci-ma, permitia, de forma relativa-mente fácil, dele extrair derivados.

Sob o ponto de vista histórico,o tempo que decorreu entre o usodo carvão para a indústria, comogerador de calor com fins indus-triais, e a passagem da aplicaçãodo petróleo para os mesmos finsfoi muito pequeno. Afinal, o mar-co do início da indústria foi 1848e, onze anos depois, aproveita-seo petróleo como fonte de calor ba-rata. É historicamente um períodomuito curto.

Quarenta anos depois de im-

plantada a indústria petrolífera nosEstados Unidos, já o Peru perfura-va o seu primeiro poço. Isto em1900. Em 1901, o México entravano mundo da produção petrolífera.Em 1908, a Argentina encontravapetróleo. Em 1917, a Venezuela e,em 1922, a Colômbia.

Paralelamente, a partir dos em-preendimentos do inventorThomas Alva Edison, na área degeração de energia elétrica, imple-mentada pelos trabalhos de NikolaTesla, o introdutor da corrente al-ternada, passou a ser possíveltransformar energia elétrica a lon-gas distâncias. No entanto, a gera-ção de energia elétrica, no Brasil,ocorreu a partir da geração de va-por. Apesar de o país ter um po-tencial hidroelétrico fantastica-mente grande, a geração de ener-gia a partir de quedas d’água natu-rais ou de águas represadas exigiaum volume de capital que nenhumcapitalista brasileiro tinha. Dessaforma, foi adiado o avanço do paísnesse setor.

O transporte sofreu enorme re-volução, passando-se da traçãoanimal para os motores de com-bustão interna – diesel ou gasolina-, pois o preço unitário do veículoera baixo em relação ao trem.Qualquer empresário poderia

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Vista parcial daIndústria

Matarazzo deEnergia, em

plenofuncionamento,

na década de 50 Fun

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comprar um caminhão, mas nãoseria qualquer um que poderiaconstruir uma estrada de ferro.Assim nasceu o espírito rodoviá-rio no Brasil. Também era maisbarato e mais rápido abrir uma es-trada de rodagem neste imensoterritório. De qualquer maneira, aalimentação das ferrovias, ou dosportos, teria que ser feita com veí-culos pequenos, portanto, a ado-ção do automóvel e dos cami-nhões se processou muito rapida-mente. Para isso necessitava-se dederivados de petróleo.

Já em 1918 registra-se a exis-tência de uma certa Empresa deMinas Petrolíferas, realizandopesquisas no Brasil, sem muitosucesso. Mas, a partir de 1930,surgem várias empresas brasilei-ras buscando petróleo no territórionacional, sem, no entanto, ter mui-to sucesso (exceto em Alagoas,em meados dos anos 30, mas quetambém não chegou a ter caracte-rísticas comerciais).

Haviam surgido, depois de1930, várias empresas, entre elas aCompanhia de Petróleo Nacional,com sede no Rio de Janeiro; aque-la que trabalharia em Alagoas, aCompanhia Petrolífera Brasileira;a Companhia Brasileira dePetróleo Cruzeiro do Sul, que pro-curava petróleo na área de Tatuí; ea Companhia Petróleos do Brasil,liderada por Monteiro Lobato, quebuscava petróleo na área de Águasde São Pedro. A sonda de pros-pecção abandonada ainda está noterreno do Grande Hotel de Águasde São Pedro e lá pode ser vistacomo lembrança de gênio inventi-vo, mas de pouco sucesso empre-sarial. Aliás, as águas mineraisque lá existem são o fruto dasprospecções feitas sem sucessopara petróleo, mas com resultadoem águas sulfurosas, ferrosas e ra-diativas. De qualquer forma, de-ram algum resultado, pelo menos

para a saúde dos brasileiros.Porém, fatalmente, petróleo

surgiria no Brasil, em algum tem-po, e Matarazzo se preparou paraesse dia.

BBRASILRASIL - - Se a iniciativa foi do fun-dador, o conde Francesco, ou se foio seu sucessor, o conde Chiquinho,na realidade não é importante, poisnunca houve solução de continui-dade na condução dos empreendi-mentos. O fato é que Matarazzoagiu no tempo certo, pois, sob oponto de vista histórico, estava-se aapenas pouco mais de vinte anosda possibilidade da substituiçãodas fontes de energia.

Sabemos que a refinaria de SãoCaetano foi montada em 1934 ou1935, ativada como empresa em1938, entrou em operação em1939 e cessou suas atividadesaproximadamente em 1971 ou1972. Sabemos também que seuprocesso produtivo era diferentedaquilo que passou a ser o padrãoalguns anos mais tarde (provavel-mente por não ter outra tecnologiaà sua disposição, salvo a experiên-cia do engenheiro Fernandez, umargentino, que foi superintendente

da empresa por muitos anos e queprovavelmente foi o idealizadordo processo produtivo, graças àexperiência adquirida emComodoro Rivadavia, no sul daArgentina).

O processo de destilação porfrações poderia ser posto em práti-ca com equipamentos que tinhamcondições de ser fabricados noBrasil, possivelmente com os re-cursos que o próprio GrupoMatarazzo dispunha, sem necessi-dade de se importar um turn-keyjob, ou seja, um sistema completoque viria com tecnologia do exte-rior. Construir os seus própriosmeios fazia parte da política em-presarial dos anos 30 e particular-mente da de Matarazzo.

A criação da refinaria foi o re-sultado da política, vigente naque-la época, de verticalização dosempreendimentos, e teve o intuitode libertar as empresas do grupoMatarazzo da dependência dosdistribuidores de combustíveis.Estes eram filiais das grandes em-presas estrangeiras, que detinhamo monopólio da exploração, refi-no, exportação e distribuição dosderivados de petróleo e, com isso,tinham a possibilidade de influirsobre a indústria nacional.

Com a influência das idéias de-fendidas e propagadas porMonteiro Lobato, principalmente,e também de grande número deoutros intelectuais, adeptos doideal de criar no Brasil uma indús-tria petrolífera capaz de libertar opaís de sua grande dependência deenergia do exterior, tanto no cam-po dos combustíveis como no daenergia elétrica, monopolizada porempresas de capital externo, sur-gia o desejo de tornar o país inde-pendente em tudo o que fosse fon-te de combustível e de tecnologia.

Os industriais brasileiros colo-cavam-se na defensiva, talvez semo nacionalismo pregado tanto pela

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A unidade de fabricação de sodacáustica e hexacloro surgiu em 1948.Instalações do Grupo Matarazzo, em

São Caetano, ano de 1982

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esquerda como pela direita inte-gralista daqueles tempos, masmais para defender os seus pró-prios interesses.

Matarazzo não era um naciona-lista e nem mesmo defensor dequalquer linha política, mas eraum empresário, cuidadoso com asfontes de matérias-primas neces-sárias à sua produção. Assim, nasua visão, seria necessário assegu-rar todos os materiais envolvidosno processo industrial, desde asfontes de produtos primários atéequipamentos e insumos.

Derivados de petróleo eram in-sumos essenciais e ficar na depen-dência de Esso, Shell, Texaco eoutros seria perigoso, especial-mente considerando a política pra-ticada pelo Big Four (em tese umcartel que já havia, por intermédiode Henry Ford, tentado o mono-pólio da distribuição de derivadosde petróleo na Itália. Havia sidoviolentamente rejeitado pelo duceBenito Mussolini, de quemMatarazzo era grande admirador,assim como todos eram, naquelesanos de 1920 e 1930, graças aosêxitos obtidos na Itália no campoeconômico e no social).

Foi nesse ambiente que ocor-reu a idéia de iniciar o processo delibertação de suas empresas daeventual dependência do cartel.Diga-se de passagem que o títulode conde, hereditário, foi outorga-do a Francesco Matarazzo, peloRei da Itália, Vittorio EmanueleIII, pelos feitos humanitários deMatarazzo durante a PrimeiraGuerra Mundial em Nápoles e porsuas ações, no campo (interior),em favor dos imigrantes italianosem São Paulo.

Com a descoberta e exploraçãode jazidas petrolíferas naArgentina, Venezuela, México,Colômbia e Peru, delas participan-do sempre o Big Four, surgiu apossibilidade de importar direta-

mente desses países a matéria-pri-ma, o que seria mais barato do quecomprar os derivados, já que a im-portação, nos anos 20, por exem-plo, de gasolina, era feita em latase não em navios-tanque. Esse pro-cesso era caro, pois o frete era ode carga geral e ainda havia o cus-to da lata e do enlatamento. É ver-dade que por esse método se evi-tava o uso de vagões-tanque ou decarros-tanque, que não existiamou, se existissem, seriam em pe-queno número. Obviamente nãohavia oleodutos. De qualquer for-ma, a importação através de na-vios-tanque seria menos cara –ainda mais se fosse de óleo cru enão de derivados - a partir de al-gum porto venezuelano ou argen-tino, ou mesmo mexicano, a fimde diminuir a distância Brasil-Estados Unidos, naquele tempopraticamente o único exportadorde petróleo para o país.

Prospecção de petróleo, noBrasil, era um sonho acalentadopor vários empreendedores inde-pendentes. De todo modo, a cam-panha de alguns nacionalistas, pa-ra que o país passasse a ser umprodutor de petróleo, estava em

plena marcha e, não sendoMatarazzo muito afeito à minera-ção, restava-lhe preparar-se para aprimeira etapa industrial, seguinteà eventual produção nacional, quecertamente viria a existir, em al-gum momento.

Na etapa inicial, o óleo cru teriaque ser importado, mas poderia serde fornecedores diversos, daí osprimeiros passos no sentido da in-dústria independente de derivadosde petróleo, livre, tanto quantopossível, do cartel oligopolizado(mesmo que os exportadores vies-sem a ser, mais adiante, detentoresde alguns direitos de exploração).Poderiam ser até eventualmente li-gados ao mesmo cartel, mas commais independência que os distri-buidores dos derivados no Brasil.

No primeiro terço do séculoXX, montar uma indústria exigiacapacidade individual, muito maisque capital, pois a indústria demáquinas estava em seus estágiosiniciais no mundo inteiro.Matarazzo tinha à disposição imi-grantes, não apenas italianos -que buscavam de todo modo tra-balhar no grupo, mesmo sem se-rem chamados -, mas também for-tes contingentes de outros euro-peus, muito deles bastante capaci-tados, emigrados de seus países deorigem por conseqüência daPrimeira Guerra Mundial.

Entre esses havia homens trei-nados nas indústrias européias,mecânicos, forjadores, químicos,eletricistas, tecelões, vários delesaptos a produzir as máquinas queo complexo Matarazzo necessita-va. Portanto, melhor que importaros equipamentos, seria fabricá-losaqui, utilizando os conhecimentosdesses imigrantes. A refinariaMatarazzo, portanto, foi fruto decérebro importado e esforço da-quilo que já existia no complexoindustrial, como era a política em-presarial vigente.

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As instalações da Matarazzo, em São Caetano, possuíam tratamen-

to de água com estação própria. Ano de 1982

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Os equipamentos da refinariaforam feitos nas oficinas mecâni-cas existentes no conglomeradoMatarazzo e não importados, comoum todo, de algum fornecedor es-trangeiro (e que por isso teria in-fluência futura na área de produ-ção, já que a tecnologia adotada foia mais simples que se poderia en-contrar naquela época no mercado,mas que poderia satisfazer as ne-cessidades imediatas daquilo quejustificou a criação desse empreen-dimento). O início da implantaçãofoi em torno de 1934, tendo por ba-se a experiência Argentina, queera fisicamente a mais próxima eem que a influência do Know-hownorte-americano estaria mais dis-tante. Portanto, não foi um projetocompleto e houve a necessidade dese fazer vários acertos, mais tarde,com base no método prático detentativa, erro e correção.

A política de verticalização,hoje condenada em favor da altaespecialização e da técnica do justin time, além de outros métodosde economia de capital, era umanecessidade concreta. Quase todosos grandes empreendimentos dosanos 20 e 30 a praticaram. Quemquisesse vender farinha teria queter um moinho e possibilidade deter acesso à produção agrícola,além da tecelagem para a fabrica-ção dos sacos de embalagem, fro-ta de transporte própria, depósitosregionais, equipe de vendas, even-tualmente até banco para cobrançae financiamento de seus clientes.Assim foi com Simonsen, Jafet,Crespi, Renner e outros pioneiros.

O empresário teria que partirda terra nua e contar com homenscapazes, capacidade de organiza-ção, muita tenacidade e nada a es-perar de governos ou de financia-dores. Isto ajuda a explicar a verti-calização de todo o processo in-dustrial. Evidentemente, Mata-razzo estaria entre eles.

O processo de verticalizaçãopoderia começar pela fonte de ma-térias-primas, mineração ou agri-cultura e a industrialização doproduto próximo ao seu local deorigem, ou poderia ocorrer domeio existente para trás ou paradiante. Exemplificando: uma em-presa comercial partiria da vendade roupas, no início uma loja e,depois, uma cadeia de lojas. Oprincipal produto vendido exigiriacompras em larga escala de con-fecções. Nada mais natural quemontar uma indústria de confec-ções. Esta, por sua vez, necessita-ria de tecido, portanto, o lógicoseria montar uma tecelagem, cujaprincipal matéria-prima seria ofio. Daí a necessidade de se mon-tar uma fiação, cuja matéria-primaseria a lã, o algodão ou o linho e,dessa maneira, ter criação de car-neiros e plantação de linho ou dealgodão seria interessante. Ora,carneiro, além de lã, produz carne,o que leva à montagem de um fri-gorífico, e o linho, além da fibra,produz sementes das quais se ex-trai o óleo de linhaça, matéria-pri-ma para a produção de tintas, oque levaria a criar uma fábrica detintas e assim por diante.

O processo poderia ser inver-so, ou seja, o produtor agrícolacriar a indústria para valorizar asua produção e diminuir o custodo transporte do produto final,em menor volume e com maiorvalor. Se pensarmos em plantaralgodão, obteremos algodão empluma, para ser fiado, sementespara extração de óleo alimentício,torta para alimentação do gado elinter para a indústria de seda ar-tificial, por exemplo.

Outro aspecto seria o da segu-rança, ou seja, ter assegurado assuas fontes de insumos. Este fatorfoi de extrema relevância para osindustriais pioneiros, pois suasfontes, particularmente de energia,

tanto elétrica, monopolizada pelaLight & Power, de capital estran-geiro, como pelos combustíveis,nas mãos do truste dos Big Four.Portanto, a libertação do perigode se colocar à mercê de fatoresexternos ou mesmo de capitais es-trangeiros era uma necessidade es-tratégica.

Monteiro Lobato retrata, naobra O Poço do Visconde, só naaparência dirigida ao público in-fantil, essa possibilidade (inclusi-ve chamando, no livro, pelo nomede Atarip, anagrama de pirata, oconcorrente estrangeiro, símbolodo capitalismo selvagem, cujaatuação ainda não era restrita pelalegislação mas, como dissemos,não era o nacionalismo o que con-duzia a política de Matarazzo, esim a segurança estratégica em-presarial).

A legislação viria depois, comos decretos regulamentadores daimportação, refino e distribuiçãode petróleo, com a criação doConselho Nacional de Petróleo(CNP), em 1938, que ao invés deacelerar o processo de industriali-zação e de prospecção, criaria di-ficuldades para os empreendimen-tos privados do setor.

Apesar de ficar garantida aoempreendedor privado a manuten-ção do seu negócio, a legislaçãocriou barreiras para a expansão emodernização das instalações, li-mitando sua capacidade de produ-ção e impedindo sua moderniza-ção. A criação da Petrobrás viria,mais tarde, em 1953, colocar a páde cal sobre as pretensões da ini-ciativa privada do setor petrolífero.

PPRODUÇÃORODUÇÃO - - De acordo com a le-gislação, tanto da ditadura comodo governo constitucional, as refi-narias não poderiam aumentar suacapacidade de produção, para nãoconcorrer com a Petrobrás, maspoderiam manter a sua capacidade

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instalada. Essa exigência só foi es-tabelecida após a criação do CNP,portanto em 1939.

Abriu-se uma enorme discus-são jurídica, pois a autorização deAgosto de 1939 deixava de men-cionar a limitação à capacidadeinstalada. Na realidade, nem mes-mo mencionava o volume de pro-dução. Este conceito só foi criadoa partir da idéia de monopolizar opetróleo. Com a criação daPetrobrás, a quem foi dado o mo-nopólio da importação de petróleoe a produção de derivados, ex-cluindo qualquer concorrente, ex-ceto as refinarias em funcionamen-to na data da Lei 2004. A dita leitambém proibia a ampliação dacapacidade das refinarias existen-tes. O que não ficava claro seria oque significava capacidade de-monstrada através dos dados deprodução efetivamente realizada?

Esse foi o estopim de uma de-manda judicial que se prolongouaté o fim da refinaria e, provavel-mente, até quando finalmente aIMÊ foi adquirida pela Petrobráspara ser fechada, pois era mais fá-cil aumentar ligeiramente a produ-ção da Refinaria de Cubatão e,com isso, acrescentar o volume deprodução da IMÊ à sua produçãototal, de forma a tornar desneces-sária sua existência.

Houve entendimentos variadosem torno de capacidade nominal,capacidade efetiva, capacidadeautorizada, mas, de qualquer for-ma, a primeira autorização, a fa-mosa número 71, não mencionavaa questão da capacidade, mas ape-nas a existência da refinaria e suapermissão para funcionar. Maistarde surgiria a figura da quantida-de a ser produzida.

De fato, esse volume a ser refi-nado estava muito mais vinculadoao problema do orçamento cam-bial do Brasil, que fixava quotasde importação, já que a IMÊ im-

portava petróleo para processar,do que propriamente sua concor-rência contra a Petrobrás. O volu-me de produção da IMÊ, dentrodo contexto nacional, ou mesmoapenas dentro do Estado de SãoPaulo, era muito pequeno, dificil-mente alcançando um por centodas necessidades estaduais decombustível, portanto muito longede constituir-se em perigo comer-cial à Petrobrás.

Em termos práticos, a produ-ção de qualquer empresa está es-treitamente ligada à capacidade decomercialização, pois o dimensio-namento dos estoques, seja de ma-téria-prima, seja de produto aca-bado, planejamento de transpor-tes, planejamento financeiro, polí-tica de pessoal e toda a estratégiaempresarial dependem primordial-mente da inserção no mercado fi-nal. Este planejamento não pode-ria ser vinculado a leis que nãofossem as de mercado, sob penade inviabilizar qualquer empreen-dimento.

Qualquer empresário sabe, eMatarazzo sabia muito bem, queuma empresa não pode ficar es-

tagnada. Precisa constantementeaperfeiçoar sua qualidade ou seuvolume de produção (de preferên-cia ambos). Durante muitos anos,Matarazzo lutou contra a enormequantidade de leis e regulamentosque cerceavam o combate normalcontra dificuldades técnicas, co-merciais e econômicas, dandomais trabalho a advogados e peri-tos do que a engenheiros e técni-cos que, entrementes, continua-vam em sua tarefa de melhorar aprodução, tanto em qualidade co-mo em quantidade.

Aparentemente, a refinaria deMatarazzo foi concebida para pro-cessar 500 barris de petróleo pordia, isso na sua entrada em opera-ção comercial em 1938 ou 1939.Mais tarde, por ocasião da legisla-ção que fixava os volumes a seremprocessados, já estava com capaci-dade para refinar mais de 1000barris de petróleo por dia. Nenhumdesses volumes foi atingido, maispor razões comerciais e econômi-cas - ou quiçá técnicas -, do quepor capacidade de produção. En-tretanto, o Conselho Nacional dePetróleo mandou uma delegaçãode técnicos realizar estudo, isto em1958, para verificar qual era a ca-pacidade de refino da IMÊ.

Este estudo foi executado portrês engenheiros: engenheiro ci-vil Erik Arnoud Barreto Laufer,engenheiro químico Paulo Ri-beiro e engenheiro químico JoséMurilo Montelo Paraíso. Tra-balharam, de 18 a 23 de Se-tembro de 1958, nas instalaçõesda Indústria Matarazzo deEnergia – IMÊ, tendo apresenta-do o relatório em 26 de Fevereirode 1959. Os técnicos fizeram umestudo de todo o processo, desdeo transporte da matéria prima atéo armazenamento dos produtosfinais, incluindo observações so-bre o estado dos equipamentos.Foi considerado o período de

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Ramais ferroviários internos daMatarazzo. Ajudavam no recebimento

e expedição de produtos químicos.Ano de 1982

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1953 a 1957 (inclusive) e tam-bém o ano em que se estava rea-lizando o estudo, isto é, 1958 (-mês de Setembro). As conclu-sões desse estudo fizeram comque o Conselho Nacional dePetróleo fixasse o volume de re-fino da IMÊ, isto é, autorizasseo que a refinaria poderia produ-zir, a fim de atender à legislação.

O período estudado iniciava-seem 1953, ano da criação daPetrobrás e do seu monopólio,portanto, o que estivesse para trásnão seria tão importante, pois aautorização de 1939 não fixavavolumes ou produção. A legisla-ção posterior, ligada ao problemacambial, é que fixaria volumes evalores de importação.

O quadro constante do relató-rio de Fevereiro de 1959 era o se-guinte:

Como se pode observar, a pro-dução média diária se conservouestável nos cinco anos observa-dos. No período, estudado foramprocessados: em 1953, 184.936barris; em 1954, 220.920 barris;em 1955, 233.182 barris; em1956, 257.141 barris; e em 1957,230.495 barris. Esses volumescorresponderiam às necessidadesda IMÊ e do grupo Matarazzo, ouseriam a capacidade possível deprodução, já que os indicadores semostram razoavelmente constan-tes neste período bastante longo.

No tempo do estudo feito poresta equipe do Conselho Nacionalde Petróleo, ou seja, em Setembrode 1958, a média diária ultrapas-sava 1.050 BPDO. Nos seis diasque durou a vistoria, o rendimentomédio foi o seguinte:

Esta composição de produtosdemonstra que os combustíveis,tanto automotivos como os indus-triais, assinalados com *, eram amaior parte do resultado operacio-nal. Produtos de comercialização,como solventes e querosene, quepoderiam ser vendidos à clientelade revendedores, eram a parte me-nor. A frota de veículos e as in-dústrias do complexo Matarazzoconsumiriam a maior parte da pro-dução, sendo que o óleo diesel eratotalmente consumido e a gasolinaapenas parcialmente, pois uma pe-quena parte era comercializada.Assim, o desejo de aumentar aprodução estava, evidentemente,vinculado à expansão industrial dogrupo Matarazzo.

Tanto isso é notável, que a ca-pacidade de armazenamento dederivados pouco ultrapassava umasemana de produção. No períodoestudado, ou seja, de 17 a 22 deSetembro de 1958, havia um esto-que de apenas de 2.417 barris degasolina, 3.429 barris de óleodiesel, 121 barris de querosene e754 barris de solvente. Note-seque o solvente era para comercia-lização, portanto dependente devendas diretas, enquanto que ga-solina e óleo diesel, combustíveisautomotivos, seriam consumidos,em sua maior parte, e rapidamen-te, pela frota própria.

Durante a semana de observa-ções diretas, os peritos do Con-selho Nacional de Petróleo cons-tataram falhas, perfeitamentenormais em qualquer indústria,como por exemplo defeito emum dos alambiques, falta de va-

por, por defeito, em uma das cal-deiras e, muito curiosamente, osdefeitos decorrentes da poluiçãodo Rio dos Meninos: problemasnas bombas de sucção e corrosãonos encanamentos de água e re-frigeração.

O estudo de 1958 fala aindado processo de produção, quenão previa o cracking, ou seja,não tinha a flexibilidade necessá-ria para processar o petróleomais pesado, pois havia sidoidealizado em 1934 ou 35 paratrabalhar com petróleo leve, quenaquela época seria procedenteda Venezuela, do tipo denomina-do Recon. O petróleo brasileiro,que se revelou, em sua maioria,mais pesado, ainda era desconhe-cido. O processo de produção erao de topping, ou seja, por alam-biques paralelos, trabalhando porlotes batches, para o que o petró-leo venezuelano era perfeitamen-te adequado. É preciso lembrarque a Venezuela era o terceiromaior produtor de óleo cru domundo, só perdendo para osEstados Unidos e para a entãoUnião Soviética.

Mesmo assim, considerandoque a capacidade da refinaria foisendo melhorada ao longo do tem-po, por meio de erros e acertos,muito característico da tecnologiabrasileira e do pioneirismo dos in-dustriais nacionais, o aumentogradativo da capacidade de produ-ção tem que ser atribuído à tecno-logia e ao esforço pessoal da equi-pe da IMÊ.

Esta foi a conclusão dos técni-cos do CNP: com um pouco maisde esforço e diminuição dos de-feitos existentes, a produção po-deria ser mantida na média deprocessamento de 1.050 BPDOs.Portanto, não poderiam autorizaros 1.300 BPDOs que Matarazzopretendia, mas algo em torno de1.050 ou 1.100.

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1953 663 BPDO* em 279 dias1954 727 BPDO* em 304 dias1955 709 BPDO* em 327 dias1956 737 BPDO* em 349 dias1957 682 BPDO* em 338 dias*Barris por dia de operação

Solvente Leve BGV 3,07%Gasolina 50,28%*Super Solvente Paulista 2,15%Querosene 3,32%Óleo Diesel 21,15%*Óleo Combustível 17,04%*Perdas 2,97%Cru processado 100,00%

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A solução dada pelo CNP foiautorizar, não os 1.050, talvez1.100 barris preconizados pelostécnicos, mas apenas 900 BPDOs.Curiosa solução! Essa sentençafoi dada não tomando por base oestudo técnico e sério, efetiva-mente realizado por profissionaisbastante isentos, mas tomandopor base um critério político, qui-çá considerando um problemacambial ou de qualquer outra na-tureza. Evidentemente, a IMÊ foiprejudicada.

Matarazzo não descansou.Continuou a lutar contra a realida-de industrial, ou seja, fazendoaquilo que qualquer empresárioconsciente faz: eliminar os erros.Assim foi feito e o resultado é quea produção alcançou o nível dese-jado, pois a técnica exige o me-lhor resultado operacional, e não alegislação. Em 1967, foi enviadanova delegação do CNP para veri-ficar o que estava ocorrendo naIMÊ, pois se insistia no pleito daautorização de 1.300 barris por diade operação.

Nessa época já estavam funcio-nando no Estado de São Paulo arefinaria da Petrobrás, emCubatão (Presidente Bernardes), eas de Capuava e São Caetano, dainiciativa privada, com a capaci-dade total de 150.000 BPDOs.Todas juntas, incluindo os 1300BPDOs da IMÊ, representavamperigo mínimo de concorrência.Portanto, a solução salomônica dedar apenas uma parte daquilo quefora pleiteado era risível.

1968 - 1968 - Uma nova comissão deestudos teve como participantes oengenheiro químico Aluísio JoséDaou, que foi o relator deste no-vo documento, e novamente osengenheiros químicos PauloRibeiro e José Murilo MonteiroParaíso, que já haviam feito avistoria em Setembro de 1958 e

agora retornavam, dez anos de-pois. Pelo menos poderiam vercom os próprios olhos eventuaismodificações. Imaginava-se umrelatório isento e objetivo, execu-tado por profissionais conscien-tes. Infelizmente, prevaleceu oaspecto político e o ConselhoNacional de Petróleo, apesar doóbvio parecer, não autorizou oaumento de produção obtido gra-ças a esforços industriais e me-

lhoria das condições ambientais.O que a IMÊ fez foi eliminar

os danos produzidos pela corrosãodevido à poluição do Rio dosMeninos e criar um sistema de re-frigeração, em círculo fechado, deforma a ter a água reciclada, evi-tando devolver a carga de águacom temperatura elevada ao Riodos Meninos. E só. Este expedien-te simples fez com que a produçãofosse elevada para mais de 1.300BPDOs. Só que esse fato se cho-caria com o monopólio comercialda Petrobrás, e daí...

Aliás, o novo sistema de refri-geração era o aproveitamento deum sistema de purificação deágua feito para todo o Grupo São

Caetano e que abastecia a Fábri-ca de Rayon, a Usina de SodaCáustica, a de Ácido Clorídrico,a Fábrica de Celulose, enfim, to-do o Complexo Industrial Mata-razzo da área de São Caetano.Lógico que a refinaria obteve be-nefícios provenientes dessas me-lhorias.

Aliás, o sistema de purificaçãode água era uma obra de sanea-mento exemplar e totalmente pri-vada, pois o seu resultado se diri-gia exclusivamente para as empre-sas do Grupo São Caetano das in-dústrias Matarazzo.

Os estudos, dessa vez, foramalém das observações de 1958,pois agora se tratava de pilhar emflagrante delito aquele empresárioque se havia atrevido a desafiar ogoverno, melhorando a sua em-presa, racionalizando seus méto-dos, desenvolvendo a sua tecnolo-gia e, com isso, aumentando a suacapacidade de produção.

Os peritos descobriram que,em sete anos, isto é, de 1960 até1966 (inclusive), a refinaria daIMÊ havia processado cerca de215 mil barris a mais do que lheera permitido, pois operou, emmédia, sempre mais do que os900 barris por dia de operaçãoque lhe haviam sido concedidos.Portanto, caberiam sanções. Omínimo seria pagar à Petrobrás olucro excedente obtido ou dimi-nuir a produção para menos de900 barris diários durante um cer-to tempo (para deixar de ganhar olucro ilicitamente obtido).

É evidente que Matarazzo nãoficaria de braços cruzados. Passoua lutar na Justiça pelo direito deproduzir mais e mais racional-mente, o que é o papel do empre-sário em qualquer sistema econô-mico ou político.

DDADOSADOS – – Os dados levantados pe-la Comissão de 1968 foram:

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Instalações da fabricação de sodacáustica, utilizada na preparação da

viscose. Ano de 1982

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Como se pode observar, o pro-cessamento teve uma elevaçãogradativa até 1953, ano da Lei2004, quando se estabilizou du-rante os quatro anos seguintes.Porém, no estudo feito em 1958, aprodução havia se elevado a maisde 1.000 BPDOs, e isto foi cons-tatado pela comissão técnica deentão, ocasião em que autorizou oprocessamento de 900 BPDOs.Não encontramos dados de 1959,mas os sete anos posteriores acu-saram o seguinte:

Como se percebe, a média deprocessamento diária foi além damédia autorizada, de forma que sepode verificar, segundo os cálculosdos peritos do CNP o refinamentode 215.102 barris a mais. Por essarazão, deveria haver castigo. Oempresário concessionário deveriaindenizar o concedente dentro doraciocínio monopolista estatal.

PPROCESSOROCESSO -- Matarazzo entrou naJustiça Federal contra o ConselhoNacional de Petróleo, em petiçãoassinada pelo advogado LuizGonzaga Belluzzo, em cinco deMarço de 1968. Obviamente, tudolhe foi negado, mas Matarazzonão podia se conformar. Foi a estaaltura dos acontecimentos que,num encontro de negócios comAlberto Soares Sampaio, o ideali-

zador da Refinaria de Capuava,portanto um concorrente, mas dainiciativa privada, o condeChiquinho comentou os proble-mas que vinha tendo com o CNP ecom a Petrobrás. Presente na reu-nião estava o engenheiroFernando José Clark XavierSoares, membro da equipe daRefinaria União. Surgiu então aidéia de se utilizar peritos inde-pendentes para explicar na Justiçao estranho aumento da produçãoda IMÊ.

O engenheiro Fernando Soares,hoje aposentado e residente emSão Paulo, teve a gentileza deconceder entrevista em que rela-tou sua participação nos eventosque se seguiram. O engenheiroFernando Soares não trabalhou naIMÊ, mas conheceu seu processoprodutivo para poder executar otrabalho que lhe seria confiado.

Soares Sampaio ofereceu osserviços do engenheiro FernandoSoares, mas, como este era fun-cionário de Capuava, e isto pode-ria gerar dúvidas sobre sua inde-pendência profissional, decidiu-seutilizar o nome de Barrett S. Duff,que era um consultor norte-ameri-cano da empresa que havia monta-do a Refinaria União, emCapuava, e que terminou por assi-nar o laudo. Este laudo indepen-dente provava que nenhum acrés-cimo havia sido feito na refinariada IMÊ, portanto, não houve des-respeito à legislação, com outros enovos equipamentos, nem acrésci-mo na capacidade, mas apenas amelhoria no sistema de refrigera-ção e o uso mais racional dosmesmos equipamentos que fize-ram aquela instalação ter maior emelhor produção.

Os honorários de FernandoSoares e Barrett Duff estavamvinculados ao que hoje se chamataxa de sucesso, ou seja, recebe-riam de acordo com o volume da

nova concessão obtida. Não rece-beram seus honorários, pois, antesque a decisão final fosse dada noprocesso, houve a aquisição daIMÊ pela Petrobrás. Depois disso,foi fechada definitivamente.

Os equipamentos foram suca-teados e o pessoal operacional dis-tribuído pelas outras empresas dogrupo Matarazzo, sem demissões,exceto alguns poucos empregadosantigos, que aproveitaram a oca-sião para se aposentar.

O levantamento final do equi-pamento existente a ser desmonta-do foi tarefa do engenheiroTakashi Shiraige, funcionário daIMÊ de 1968 até o fim das ativi-dades da refinadora (Shiraigue en-tão passou para a Fábrica deRayon). De seu depoimento co-lhemos muitos dados.

O engeneheiro Takashi for-mou-se em Engenharia Químicano Paraná, sua terra de origem, eveio para São Paulo em busca detrabalho. Em 1968, não havia ne-nhum problema para se conseguirum emprego. Após a terceira en-trevista, tendo sido uma delas feitana Praça do Patriarca, no principalescritório das IndústriasMatarazzo, 15 dias depois de suachegada a São Paulo, estava admi-tido na IMÊ.

O engenheiro Takashi nem selembra das outras empresas ondetentou colocação. Trabalhar paraMatarazzo, fora o orgulho profis-sional de fazer parte do grandecomplexo industrial e a oportuni-dade de lidar com petróleo eaprender técnicas novas, deu a es-se profissional condições de traba-lho incomuns na época. Fala dissocom enorme orgulho.

Havia um restaurante, junto àFábrica de Rayon, com condiçõesde fornecer 9 mil refeições diá-rias, a preço subsidiado, para to-dos os empregados do que era en-tão chamado de Grupo São

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1960 1.185 BPDO em 325 dias1961 937 BPDO em 324 dias1962 937 BPDO em 333 dias1963 953 BPDO em 334 dias1964 984 BPDO em 339 dias1965 1.004 BPDO em 340 dias1966 1.004 BPDO em 297 dias

1950 488 BPDO em 338 dias1951 501 BPDO em 337 dias1952 567 BPDO em 336 dias1953 663 BPDO em 279 dias1954 727 BPDO em 304 dias1955 709 BPDO em 329 dias1956 737 BPDO em 349 dias1957 682 BPDO em 338 dias

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Caetano. Assistência médica lo-cal, com quatro médicos presentesconstantemente, além do convêniomédico, extensivo às famílias, noHospital Matarazzo, em SãoPaulo, eram incentivos para evitarturnover. Portanto, comia-se bara-to e havia assistência médica pra-ticamente grátis.

Os salários eram pagos noBanco Matarazzo, onde os saldosdas contas ficavam aplicados eterminavam por resultar em ganhoextra, algo muito além do simplesdécimo terceiro salário, pois os ju-ros pagos estavam sempre acimados de mercado. Os empregadostinham orgulho e prazer de traba-lhar para Matarazzo. Ninguém erademitido, a não ser por falta muitograve, o que era raro. O quadro darefinaria era de aproximadamente200 pessoas em 1968 e manteve-se estável até o fechamento.

A refinaria trabalhava 24 horaspor dia, em três turnos, e destilavafrações. Primeiro vinham os deri-vados mais leves: o solvente, de-pois a gasolina, em seguida outrotipo de solvente; em seguida oquerosene, depois o óleo diesel epor fim o óleo combustível. O re-síduo sólido era descarregado doúltimo alambique. Cada etapa erarefinada em um alambique, numtotal de oito. Do projeto inicial aofechamento sempre foram oitoalambiques.

PP RODUÇÃORODUÇÃO - - O produto de cadaetapa de destilação era removidopor bombas diretamente para ostanques de armazenagem relativosa cada produto e o resíduo, após ofracionamento, passava para oalambique seguinte, por gravida-de. Cada fração destilada ia para oseu local de armazenamento e oprocesso prosseguia. Assim, o pri-meiro alambique era o mais alto eo de número oito ficava pratica-mente no nível do piso. O asfalto,

resíduo final e não mais fracioná-vel, ia para um nível inferior aopiso e era removido, quase seco,por pás. Na seqüência era ensaca-do. Esse asfalto se destinava a in-dústrias, particularmente de pilhase baterias, e não à pavimentação.

Solventes eram comercializa-dos, bem como o querosene, en-quanto óleo diesel e óleo combus-tível seriam usados pelas empre-sas de Matarazzo. A gasolina, emsua maior parte, era consumidapela frota das indústrias do imi-grante italiano. Uma parte, porém,era comercializada, tendo atémarca própria: Cruzeiro do Sul.

Como o processo não era con-tínuo e exigia controle permanentede temperatura, esta era controla-da por pirômetros ópticos e o pro-duto, em cada etapa, passava porlaboratório para o controle de qua-lidade. Os documentos de controleeram bastante precisos, pois fa-ziam-se pelo menos duas observa-ções diárias, rotineiramente. Oproduto também era constante-mente analisado pelo laboratórioquímico.

Todo o complexo era coberto,já que os alambiques passavam oresíduo de destilação por gravida-de, o que aumentava a segurançado trabalho, mesmo que os equi-pamentos fossem extremamentesimples. A única etapa realmenteperigosa era a manipulação do te-traetilato de chumbo, o aditivo an-tidetonante usado na época por to-dos os refinadores de petróleo domundo. O próprio transporte ofe-recia perigo de intoxicação. Narealidade, a operação do chumbotetraetílico era a tarefa mais arris-cada da refinaria. Tinha que serfeito por operário especialmentetreinado e devidamente protegidocom vestimenta de segurança. Apartir da eliminação do chumboteatraetílico, por consenso mun-dial, o aditivo passou a ser o ál-

cool anidro, que provinha do pró-prio Grupo Matarazzo.

O aquecimento dos alambiquesera feito por maçaricos de fogo di-reto, alimentados pelo óleo com-bustível produzido na própria refi-naria. O controle dos maçaricosera também feito por meio de pirô-metros ópticos. Nas refinariasmais modernas, a pirometria é au-tomática e feita por contato de doismetais com coeficientes de dilata-ção diferentes um do outro, de for-ma que a dilatação diferenciada in-dica a temperatura atingida. A pi-rometria óptica se baseia na cor dachama, que dá a temperatura dofogo, e isso exige observaçãoconstante, com mais mão-de-obraespecializada. Evidentemente, naépoca da concepção do projeto in-dustrial tais recursos não existiam.No entanto, os produtos eram deexcelente qualidade, nunca tendohavido reclamações dos usuários,tanto internos como externos.

Todos os equipamentos foramproduzidos pela caldeiraria, tam-bém do Grupo Matarazzo, e queficava na Água Branca, bairro deSão Paulo, onde se localizavamtambém outras unidades deMatarazzo, exceto, evidentemente,motores, bombas e acessórios es-peciais, comprados de terceiros ouimportados sempre a partir da con-cepção inicial do processo de refi-no que, como já foi dito, foi tododesenvolvido in loco. O engenhei-ro Takashi diz, com muito orgulho,que o seu aprendizado na área depetróleo foi todo feito na IMÊ,tanto que, depois da desativação,ele foi trabalhar naquilo que seconvencionava chamar de GrupoSão Caetano, mais especificamen-te na Fábrica de Rayon, e nuncamais trabalhou com petróleo. Maistarde foi para os escritórios cen-trais da Praça do Patriarca para odesenvolvimento de novos proje-tos. A indústria não pode estagnar!

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Para a desmontagem dos equi-pamentos foi necessária a demoli-ção de parte dos edifícios. Dessemodo, a demolição do todo foiapenas um passo para transformaraquele local em terreno vazio.Hoje nada resta das edificações. Olocal está sendo usado como de-pósito de veículos danificados ouabandonados e é gerido pelo DSV,órgão de trânsito do Município deSão Paulo. A placa indicativa deque aquele local fazia parte doGrupo Matarazzo ainda está lá,um tanto deteriorada, mas visível.

FFECHAMENTECHAMENTOO –– Evidentemente, amatéria-prima não poderia serqualquer uma. A refinaria não es-tava preparada para trabalhar competróleo pesado. Diga-se que o pe-tróleo brasileiro, descoberto ini-cialmente apenas na Bahia, era pe-sado e, para dele se obter deriva-dos leves, seria necessário destila-ção contínua, com equipamentopara o procedimento do cracking.As duas outras refinarias da áreade São Paulo, isto é, Cubatão eCapuava, foram montadas visandoao craqueamento e, portanto, pas-síveis de trabalhar com petróleode qualquer tipo, tanto nacionalcomo o importado, o que aindaocorre hoje.

A IMÊ teria que continuar tra-balhando com petróleo importado.É claro que, na época da monta-gem inicial, em 1934, não existiapetróleo brasileiro, de forma que,quando o engenheiro Fernandeztrouxe sua tecnologia para a áreade São Caetano, ela era baseadano petróleo disponível, ou seja, ovenezuelano.

Até 1960, a Venezuela era oterceiro produtor de petróleo domundo, perdendo apenas paraEstados Unidos e União Soviética.Como a distância para o Brasil eramenor, o frete seria mais conve-niente, barateando o preço.

A partir do monopólio da im-portação pela Petrobrás, as difi-culdades para importar o petróleotipo Recon, que os EstadosUnidos não exportavam, fizeramcom que a Venezuela se tornasse aúnica fonte. Apenas algumas ve-zes importou-se petróleo russo.Essa restrição ao tipo de petróleoa ser importado, provavelmente,deve ter sido uma das razões paraas dificuldades da IMÊ em obtersua matéria-prima, já que o mono-pólio, gerido pelo governo federal,exigia certas manobras de políticaeconômica nas importações.Portanto, vincular todo um pro-grama de importações às necessi-dades de uma única empresa cau-saria problemas para os negocia-dores da estatal que, além de pre-ços e condições de pagamento, te-riam que discutir as especificaçõesdo óleo cru. Por isso a IMÊ eraum estorvo para esse tipo de nego-ciação.

Matarazzo estava habituado anegociar por contra própria. Aprópria Fábrica de Rayon, que erao fulcro do Grupo São Caetano, ti-nha a sua própria fábrica de sodacáustica e de ácido clorídrico - apartir de sal transportado do RioGrande do Norte - dimensionadapara atender às necessidades daindústria, já que a matéria-primaessencial para o rayon, ou seja, olinter de algodão, provinha de usi-nas próprias, abastecidas por plan-tações particulares de algodão.

O enegenheiro Takashi foi paraa indústria têxtil para trabalhar emexpansão e modernização. Ora, aIMÊ, engessada por leis e regula-mentos, não poderia se expandir enem mesmo melhorar, pois preci-sava de beneplácito do CNP parase expandir. Daí o desejo de secontornar as limitações e permitiro aumento de produção, o que ogoverno não estava permitindo.Isso seria intolerável para qual-

quer empreendedor. A última ten-tativa foi o processo final e o pa-recer dos peritos contratados peloconde Chiquinho, já citados ante-riormente. Quando nem isso fun-cionou, o fim estava selado.

EEPÍLOGOPÍLOGO - - Sem dúvida alguma, aprimeira refinaria de petróleo doEstado de São Paulo pode ser con-siderada a primeira refinaria doABC pelo simples fato de que foium dos empreendimentos impul-sionadores da indústria dessa área,que hoje é o grande centro indus-trial do Brasil.

O pioneirismo dos valentes co-lonos que transplantaram, para es-te lado do Oceano Atlântico, acultura do Velho Mundo, forne-ceu, em primeiríssimo lugar, capa-cidade de trabalho magnificamen-te aproveitada e incentivada poroutros pioneiros empreendedores.Isso criou riqueza e deu origem aum novo país, gerando novos bra-sileiros, dos quais só podemos nosorgulhar.

Foi possível criar uma empre-sa pioneira, que só não se desen-volveu mais porque foi freada emseu ímpeto criativo pela rede bu-rocrática que reafirmou mais umavez que o Brasil cresce de noite,enquanto os burocratas dormem.Qual teria sido o desenvolvimentonormal da IMÊ? Provavelmente omesmo desenvolvimento que ti-veram outras empresas, que ad-quiriram no correr do tempo no-vas tecnologias, modernizaramseus métodos, através dos resulta-dos gerados pela iniciativa. Afinalfoi isto que ocorreu em todas asempresas bem-sucedidas, onde ofator humano era levado em con-sideração.

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(*) Pedro Kende, bacharel em História pelaPUC – Pontifícia Universidade Católica doRio de Janeiro

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Singerffrido Cavassani,o almoxarife do império

EE u trabalhei 36 anos noMatarazzo (...) Vinte e cinco

anos na Rayon (...)Passei para aLouças, onde fiquei quatroanos(...) Fui para a Geon doBrasil e fiquei lá nove anos (...)Quando chegou a minha hora, eufalei: “Agora chega!” (...) Podiater continuado, porque não preci-sava sair. Mas chegou meu tempode serviço, então a gente comple-tou e é isso aí!

Singerffrido Cavassani, nascidono dia 18 de Maio de 1917, aindamenino começou a trabalhar nasIndústrias Reunidas FranciscoMatarazzo. Iniciou como office-boy nas instalações do BairroFundação e aposentou-se nasLouças Cláudia, ramo do GrupoMatarazzo no campo de louças eafins. Ao todo foram 36 anos li-dando com expedição de materiais,isto é, controle de almoxarifado.Vinte e cinco anos na Fábrica deRayon (fios de seda), nove anos naGeon do Brasil (firma americanacomprada por Francisco Mata-razzo. Localizava-se na RuaGuarapiranga , São Paulo, e fabri-cava resina para pneus) e quatroanos nas Louças Cláudia. Aposen-tou-se com 50 anos.

Comecei como office-boy, de-pois fui escriturário e então vireiencarregado de almoxarifado(...) Lá na Rayon (...) Eles traba-lhavam com fio de seda (...) Nocomeço chamava Visco SetaMatarazzo (...) Eles diziam assim(...) Depois passou a Visco Fio,depois Fábrica de Rayon (...)Mas sempre o mesmo fio, o mes-mo artigo (...) Os nomes é quemudaram.

Cavassani comenta que haviamuitos operários na fábrica. Otrabalho era feito em três turnos:das seis da manhã às duas da tar-de, das duas da tarde às dez danoite, das dez da noite às seis damanhã. As mulheres que trabalha-

vam na indústria tinham comodeixar os filhos no berçário.Dispunham de 15 minutos paraamamentar as crianças e, no casode não terem leite, a indústria for-necia a bebida. Eu mesmo chegueia cuidar do berçário (...) Tinhaque controlar uns 20 berços, mas,na ocasião das “safras”, chegavaa uns 40.

No almoxarifado, SingerffridoCavassani devia controlar a en-trada e a saída dos utensílios aliexistentes ou dos que fossem so-licitados. Muitas vezes trabalha-va até nove ou dez horas da noi-te, uma vez que era obrigado aesperar a chegada dos produtosnecessários ao almoxarifado.

Portariaprincipal daVisco-Seda,

fábrica daMatarazzo

instalada emSão Caetano

para fabricar ofio de raiom.

Década de 30 Fun

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Singerffrido Cavassani em depoimento à Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul. Março de 2002

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Nos 25 anos em que esteve naRayon, sua função foi essa (ex-cluindo os anos iniciais, em quetrabalhou como office-boy e es-criturário). Durante esse tempo,presenciou vários eventos, tevecontato com Francisco Mata-razzo e observou de perto o fun-cionamento do império construí-do pelo imigrante italiano.

O conde (...) Ele saía na pra-ça, que não era calçada, era tu-do grama (...) Ali era um campi-nho pra gente bater bola quan-do moleque (...) Ele chegava demanhã, os operários tudo emvolta, sentados (...) Não tinharefeitório na época (...) Cadaum trazia (...) Aquele monte debanana, laranja, né!? ( . . . )Porque coisa de pobre é isso daí(...) Ele olhava, assim, aquelasmarmitinhas, e falava: “Vocês éque são felizes, não eu”(...)Oconde era um pouco doente, nãopodia comer de tudo.

O refeitório foi construídoposteriormente. Logo no início,operários e executivos comiamem locais distintos. Isso mudouquando Matarazzo contratou umitaliano encarregado de supervi-sionar o andamento das coisasna Fábrica de Rayon. Cavassanicomenta:

Era o “Colete de aço”(...)Esse era o apelido dele (...) Eraum italiano durão (...) Era oMussolini escrito! (...) Bom, o re-feitório era dividido em etapas(...) Aqui é só empregado, lá é sópatrão (...) Era bandejão (...)Quinta-feira era macarrão sópara os chefes e arroz, feijão ecarne de pescoço para os operá-rios (...) Rapaz, o italiano demo-liu tudo (...) Todos os “boxes”(...) Aí todo mundo começou acomer junto.

Macarrão, carne, arroz, feijão,tudo era fornecido pelo GrupoMatarazzo. Com efeito, o empre-

Funcionários da RayonMatarazzo

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Vista aérea dasIndústriasReunidasFranciscoMatarazzo, BairroFundaçãoF

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Equipe defuncionários daLouças Claudia Le

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Entrada da Rayonna PraçaErmelino

Matarazzo, emfrente ao Busto do

Conde FranciscoMatarazzo.Singerffrido

Cavassani é oprimeiro da direita

para a esquerda Fun

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sário italiano visava à auto-sufi-ciência de suas indústrias. Dessemodo, uma unidade supria a ou-tra. Por exemplo, se houvesse ne-cessidade de soda cáustica para obeneficiamento dos fios de seda,então soda cáustica deveria serproduzida. Primeiro a soda cáus-tica vinha do Japão (...) Era amelhor soda cáustica do mundo(...) Mas, depois, o Matarazzo re-solveu fazer ele mesmo a sodacáustica,.

Francisco Matarazzo, no to-cante aos fios de seda, chegoumesmo a trazer da Ásia alguns bi-chos-da-seda e dar início, emCampinas, a uma produção defios naturais.

O xodó do conde, em Cam-pinas, foi o fio de seda natural(...) Do casulo (...) Bicho-da-seda(...) Ele trouxe do Japão (...)Gastou um dinheirão pra come-çar a fazer todas essas coisas (...)Olha, a Matarazzo fabricava detudo: óleo, farinha de trigo (...) OÓleo Sol Levante, de algodão le-gítimo, era feito lá em Catanduva(...) Os outros alimentos acho quefaziam na Fazenda Amália, tam-bém no interior (...) Até refinariade sal o conde tinha (...) E tam-bém navios para transportar o sallá do Rio Grande do Norte atéSantos (...) O sal ele usava parafazer soda cáustica.

A soda cáustica era apenasparte do processo de confecçãodo fio de seda. Singerffrido Ca-vassani explicou que seções dife-rentes, dentro da fábrica, faziampartes distintas do fio. Tinha, porexemplo, onde lavava com água esoda pra tirar a ferrugem do fio(...) Depois ia pras estufas, parasecar (...) Depois era beneficiadoe então era mandado pra outrasunidades. Em realidade, a Fábricade Rayon não produzia tecidos.Isso ficava a cargo de outros ra-mos do grupo. Mas ele fabricava

Os desenhos daslouças fabricadas

pela Louças Claudiaem São Caetanoeram escolhidos

pela condessaMariangela.

Década de 40 Fun

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A chaminé das LouçasClaudia tinha 72 metros de

altura e era a mais altaconstruída pela

Indústria Matarazzo Fun

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A Fábrica de LouçasClaudia ocupava área de 20.000 m2 eempregava mais de miloperários nos anos 40.A produção era de 45.000peças por ano

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Funcionáriosda RayonMatarazzoLe

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só o tecido (...) Não fabricavaroupa (...) Dizia que dava muitotrabalho, muita mão-de-obra (...).

Os executivos que controla-vam todo esse império eram, nogeral, estrangeiros. Cavassani fri-sou que poucos brasileiros tive-ram a oportunidade de ocuparcargos de chefia (ao menos nasunidades em que trabalhou). Eu-ropeus ou pessoas politicamenteinfluentes tinham precedência.

Teve um espanhol, cunhado doGarcez (Lucas Nogueira Garcez,governador de São Paulo no iní-cio dos anos 50), que foi lá traba-lhar (...) Cara fino, boa gente,mas não sabia nada.

Problemas como esses, contu-do, não impediam o funciona-mento das coisas no dia-a-dia. Asquestões de ordem prática depen-diam da ação de operários e en-carregados de seção. SingerffridoCavassani, na Rayon, supervisio-nava a entrada e a saída de merca-dorias.

Lá dentro tinha um estoquepara abastecer a fábrica intei-ra(...) Rolamento, fio, enfim, tudo(...) Se entregava uma peça estra-gada, a gente tinha que ter con-trole (...) Esse almoxarifado daRayon abastecia a Louça (LouçasCláudia), a Geon, a Fábrica deSoda (...).

O conhecimento obtido duran-te o tempo em que esteve naRayon foi fundamental para osanos de trabalho na Geon doBrasil e nas Louças Cláudia. Defato, Singerffrido Cavassani apo-sentou-se trabalhando com con-trole de almoxarifado. Durante 36anos, todo o material que susten-tava as firmas de Matarazzo naGrande São Paulo passou pelasmãos e pelo crivo do morador doBairro Fundação (Pesquisa e tex-to realizados pelo Serviço deDifusão Cultural da FundaçãoPró-Memória).

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Grupo defuncionários das

Indústrias ReunidasMatarazzo

em 1938 Fun

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Carteirinha de Assistência

Médico-Hospitalar A. A. Matarazzo

de Pedro L. Blum,filho de Venezia

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Grupo de operáriosda Fábrica de Sabão e VelasMatarazzo ao lado da Matriz Velha deSão CaetanoF

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Escritório da IndústriaMatarazzo em Janeirode 1928. AccácioNovaes, era oadministrador da Fábrica RayonF

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Sonia Maria Franco XAVIER (*)

II eda Maria Fio-retti, 52 anos,

moradora de SãoCaetano do Suldesde seu nasci-mento. Verifican-do meus álbuns de

fotografias e tudo que recebi demeus pais e avós, resolvi retratar,através dos mesmos, a grande per-sonalidade de minha avó MariaSilvestre. Foi uma pessoa muitoatuante e de notoriedade em SãoCaetano do Sul pelo admirável tra-balho que desenvolveu na cidadeem prol da população mais carente.Trabalhava bastante, participava dediferentes atividades sociais e políti-cas, comandava movimentos de be-nemerência e foi mulher de desta-que para a época. Através destasfotos, acredito poder documentaruma atividade que envolveu muitasmulheres desta cidade num cenáriobem diferente de nossos dias.

Maria Silvestre era filha deimigrantes italianos que vierampara São Paulo no ano de 1895.Não encontrando facilidade paraaqui se instalarem, foram encami-nhados para uma fazenda em SãoSimão, onde se estabeleceram co-mo agricultores. Não era bem estaa vida que procuravam. Acredi-tavam em grandes oportunidades

na nova terra. Uma certa decep-ção acompanhou os primeirosanos de vida desta brava gente,lembra-se Ieda.

Sua avó contava que um seu ir-mão mais velho havia permanecidona Itália e tinha se tornado umgrande músico: o maestro daOrquestra Sinfônica de Milano.

Maria Silvestre nasceu em SãoSimão, onde passou a infância,muito simples, brincando e desfru-tando de grande liberdade entre ár-vores, animais e outras crianças.Nessa época, as crianças tinhampor hábito desenvolver suas ativi-dades e brincadeiras sempre numprocesso de imitação dos adultos.Brincar na terra, plantar, cozinhar,costurar roupas para bonecas depano e jogar com bolas de meia.Era assim que se divertiam.

Foi para a escola, onde recebeuorientação que correspondia aocurso primário. Nessa época, aindaadolescente, começou a trabalharem uma oficina de costura. Lá de-senvolveu o gosto pela profissão decostureira.

Maria Silvestre,São Paulo,ano de 1936

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Miss Natal (alunada escola) de São

Caetano do Sul,década de 50. Aeleição era feita

por meio de votosvendidos como se

fossem rifas. Aarrecadação era

revertida aospobres

Maria Silvestre:costurando o passado

Formatura das alunas do Curso de Corte e Costura, ano de 1956. Da esquerda para a direita: Yolanda Cassoni, 2-?, 3-Ana Beloni, 4-?, 5-?, 6-Maria

Silvestre, 7-Astolphina Silvestre Vezza, 8-Terezinha Esplendor

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Casou-se com Antônio LuizGregório e teve dois filhos: Leda eJosé Acácio. Permaneceram emSão Simão até quando a filha co-meçou a apresentar sérios proble-mas de saúde. Corria o ano de1930 e Maria Silvestre não vacilou.Mudou-se para São Paulo, com afilha, para tratá-la junto a especia-listas. Isso durou alguns anos, pe-ríodo em que desenvolveu diferen-tes trabalhos. Organizou escola dealfabetização, curso de taquigrafiae curso de corte e costura.

Em 1940, casou-se pela segun-da vez (Pascoal Rozzi foi o segun-do marido). Vieram morar em SãoCaetano do Sul. Compraram umaampla casa na Rua Manoel Coelho,número 387, onde hoje está locali-zada a Imobiliária BBC – Imóveis,recentemente demolida. Como acasa era muito grande, serviu demoradia e de sede para a EscolaAmericana de Corte e Costura.

Maria Silvestre contou com aajuda de Yolanda Cassoni e NaideZago Colonhezi para desenvolveras atividades do curso. As aulasiniciaram-se em 1948, com duasturmas de 30 alunas em cada perío-do. Uma à tarde e outra à noite.

Havia na época grande interessepor atividades que tornassem a mu-lher produtiva, sem sair de casa. Asmoças deveriam saber costurar. Aescola passou a ser um local ondemulheres da sociedade se reuniame, mesmo depois que terminavam ocurso, ali continuavam colaboran-do para desfrutar do ambiente agra-dável e amigo. As alunas confec-cionavam roupas durante o apren-dizado, distribuindo-as aos maishumildes na época de Natal.Nasceu, então, a idéia de ampliaressas atividades de filantropia eMaria Silvestre buscou recursosjunto às indústrias e empresas dacidade. Durante muito tempo, fo-ram feitas grandes distribuições nofim de cada ano. Todas as pessoas

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Baile deFormatura das

alunas da Escolade Corte e

Costurarealizado no

Clube Comercialem 1952. Da

esquerda para adireita: Otélia,

Naide, Idelzita,Edi e Maria de

Lurdes Marinho.Ao centro,professora

Yolanda Cassoni Ieda

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Noite de formaturadas alunas do Curso

de Corte e Costurado ano de 1955. Da

esquerda para adireita, ao fundo:

Yolanda, ?, ?, Idelzita,Naide Colonhezi,

Orminda. Na frente,em pé, Gerson

Silvestre (mestre decerimônia), AngeloRaphael Pellegrino

(paraninfo), OswaldoSamuel Massei(prefeito), Maria

Silvestre (diretora daescola) e Pascoal

Rozzi (proprietário eesposo da diretora) Ie

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Ano de 1952. Nafrente, asprofessoras doCurso de Corte eCostura: YolandaCassoni, MariaSilvestre eRaimunda Zaparolli.Ao fundo, as alunasIe

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carentes recebiam roupas e ali-mentos. Brinquedos eram distribuí-dos para as crianças.

Outra grande festa que organi-zavam era para comemorar o tér-mino dos cursos. Além da soleni-dade de entrega de diplomas, coma presença de autoridades civis, po-líticas e religiosas da época, haviatambém um grande baile nos sa-lões do Clube Comercial. A esco-lha da rainha da escola também sefazia com uma grande festa. Essasatividades perduraram até meadosda década de 60, quando o comér-cio cresceu, a concorrência aumen-tou e a saúde de Maria Silvestre foise abalando.

A família era pequena. Dois fi-lhos, Leda e José Acácio, que lhederam os netos Maria Vilma e Ieda(filhos de Leda com Luiz Fioretti),e Maria de Lourdes, Maria Dalva,Ricardo e Eduardo (filhos de JoséAcácio Gregório e Maria Apare-cida Gregório). Contava sempreem sua casa com os serviços deMaria Custódia, que cuidava dosafazeres domésticos.

Maria Silvestre era enérgica efoi o carro-chefe da família.Ensinou suas quatro netas a costu-rar e presenteou cada uma comuma máquina de costura. Gostavade ler e de estudar. Criou um méto-do para facilitar o ensino de corte ecostura: Art Modas ManualTécnico. Conforme análise da neta,trata-se de método completo, poisensina todas as variações de corte,costura, etiqueta e culinária. Foicandidata a vereadora e participoude muitas atividades na cidade.Faleceu em quatro de Janeiro de1978, deixando filha, genro e netasem São Caetano do Sul.

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Rua Manoel Coelho,387. Distribuição decestas de Natal, ano

de 1956 Ieda

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Formatura dasalunas do Curso deCorte e Costura, anode 1955. Ao centro,João JacobLorenzini, à direita,Maria Silvestre e àesquerda YolandaCassoni. Acerimônia foirealizada no ClubeComercialIe

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1952, Rua ManoelCoelho. Fila daspessoasaguardando adistribuição dascestas de Natalfeitas pela EscolaAmericanaIe

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(*) Sônia Maria Franco Xavier é professora deFilosofia e História, foi diretora do MuseuHistórico Municipal e, atualmente, é presiden-te da Fundação Pró-Memória de SãoCaetano do Sul

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Jubileu de Ouro de formatura quemarcou época: uma turma fadada a vencer

Carlos GERCHTEL (*)

11 951 – Ano da Colação deGrau. Curso: Técnico em

Contabilidade.Estabelecimento de ensino:

Escola Técnica de Comércio deSão Caetano.

2001 – Ano especial para de-terminado número de condiscí-pulos que estão se reencontrandopela terceira vez no transcorrerdos últimos 50 anos. Remanes-centes de um grupo estudantilque se sobressaiu no passado,reunindo-se para relembrar e dardestaque a este proeminente epi-sódio, revelando um aspecto fes-tivo, de congraçamento para en-grandecer e valorizar a própriavida com muito entusiasmo.

Cinqüenta anos são decorri-dos. Cinqüenta anos de tentati-vas, algumas bem-sucedidas, ou-tras não atingindo o objetivo.Cinqüenta anos de atividadescorrespondendo plenamente aosanseios de jovens talentosos,unidos pelos mesmos sonhos, osmesmos ideais, com desejos deprogredir junto com o municípioque justamente acabava de con-seguir a sua autonomia, depoisde uma árdua luta travada porabnegados cidadãos sancaeta-nenses. Iniciava-se, naquele anode 1949, uma nova e difícil eta-pa, não só para a cidade, mastambém para o futuro daquelesrapazes e moças.

A responsabilidade tornara-semaior, tanto para um lado comopara o outro, pelas dificuldadesem transpor os obstáculos quesurgiam constantemente, semqualquer possibilidade de solu-

ção imediata, principalmente pa-ra o município. Eram os primei-ros passos que estavam sendodados, de uma caminhada longae espinhosa.

São Caetano começava, na-quele período, a usufruir dospróprios recursos e prosperarcom muita rapidez. Tinha vidaprópria para seguir o seu desti-no. Despontava com bons augú-rios mais uma fulgurante estrelaque iria luzir imensamente naconstelação bandeirante, o quese confirmou posteriormente.

Naquele mesmo ano uma no-va turma estava principiandoseus estudos intermediários, daqual eu fazia parte, num cursomuito solicitado na época, re-cém – criado pela única escolaexistente: o de Contabilidade.Na verdade, a Escola Técnica

de Comércio de São Caetanoera a única a manter o ginasialbásico no lº ciclo e o Curso deContabi l idade no 2º c ic lo .Nenhuma outra escolha erapossível.

Estava entrando numa áreacompletamente desconhecida elogo percebi os primeiros entra-ves para acompanhar meus no-vos colegas e atingir o mesmonível deles (eu havia adquiridoalgumas informações no 1º ciclodo ginasial tradicional, porém,sem ter tido o mínimo conheci-mento da parte técnica inerenteao curso). Não possuía nenhumanoção de contabilidade, não sa-bendo nem mesmo o significadode débito e crédito. Estive a pon-to de desistir por não poder assi-milar o novo currículo devida-mente.

Ai entrou o espirito solidáriode alguns companheiros, que seprontificaram a me ajudar, se euassim o quisesse. Só desse modotive a chance de entrosar-mecom eles e participar das aulasnormalmente. Não foi uma tare-fa fácil, reconheço.

Devo frisar que, para se che-gar ao ponto desejado, houvemomentos de sacrifício que exi-giram enorme esforço e muitapaciência. Com o passar do tem-po, acabei ajustando-me perfei-tamente bem à nova condição, oque me possibilitou completar ocurso calmamente, sem nenhumempecilho.

A primeira grande barreiraestava sendo ultrapassada. Pre-valeceu mais uma vez a perseve-rança, a vontade, a persistência eo apoio dos colegas de classe na

Genésio Carlos Alvarengarecebendo certificado. Na mesa, da

esquerda para a direita: CelsoMarchesan, Dionísio Martins(paraninfo), Antonio Russo

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Julho/2002 RRAAÍÍZZEESS31

hora certa. Naquele instante degrande dificuldade, não conside-rei nada do que foi citado acima,apenas levei em conta a nova ex-periência como mais um desafioque deveria sobrepujar, custasseo que custasse. Sabia que nadairia me impedir de atingir meuspropósitos. Lutaria até o fim.

Porém hoje, já mais traqueja-do, estou dando o devido valor,mostrando-me grato aos verda-deiros amigos que surgiram parafacilitar o trajeto por mim esco-lhido, amigos que, mesmo de-pois de meio século, continuamtão ou mais afetuosos. Quandose tem amor no coração, espiritofraternal, tudo se torna mais fá-cil e o respeito mútuo acaba sesobrepondo, quaisquer que se-jam as circunstâncias.

PP R E PR E P A R AA R A T I VT I V O SO S – – Como saudaresta data tão s ignif icat iva?Pomposamente? Com manifes-tações efusivas? Sob posturamoderada, porém, sincera? Ouempregando palavras singelas,contudo, vindas do fundo do co-ração?

A forte emoção causada peloencontro com pessoas que hámuito tempo não via; a maneiracomo fui recebido na residênciade cada um - aliás com muita de-ferência; o ânimo que se apossoude todos; a felicidade que se es-tampou no semblante e no ínti-mo dos mesmos; o sentimentode pesar demonstrado pela perdade alguns; e a frustração pelo fa-to de não poder juntar todo opessoal ao mesmo tempo - o queseria muito bom, se fosse possí-vel - já prova cabalmente quenada está perdido, que aindaexistem condições para boas re-lações e que a compreensão, aestima e o bom senso devempredominar entre nós, simplesseres humanos. Temos que apro-

veitar do melhor jeito estas van-tagens especiais e, acima de tu-do, nos contentar com as oportu-nidades que nos são oferecidas.Não podemos negar que a corte-sia, a afeição, a fala amiga, ameiguice com que comumentesomos recebidos pelas pessoas,de um modo geral, e em particu-lar pelas que nos são queridas,nos fazem muito bem, propor-cionando-nos serenidade, per-cepção suave, cheia de encanta-mento e luminosidade. Enfimuma sensação de paz.

Não há quem não precise pelomenos de um pouco de cada umdos gestos acima referidos parase sentir gente e, naturalmente,parte da sociedade. Isso não de-pende de posição social, capaci-dade intelectual ou situação fi-nanceira. O essencial é viver fe-liz, dentro das normas, e desfru-tar das maravilhas que a vidaconcede. Este reencontro é omaior exemplo de felicidade.

Só o fato de termos sido favo-recidos por este beneplácito paranos rever através da vontade di-vina supera toda e qualquer ri-queza material que se possa ima-ginar, pois dinheiro algum pode-rá pagar este estado de espírito,

esta ligação sensibilizante, esteinstante tão sublime.

SS A U D A D EA U D A D E – – Infelizmente, paranossa tristeza, alguns já partirame não poderão dar o prazer dapresença, mas, de alguma forma,deixaram boas lembranças, hon-rando sobremaneira o grupo e,mesmo ausentes, estarão semprenas nossas memórias. Nomes co-mo Alberto Abib, FranciscoSaes de Amo, Genésio CarlosAlvarenga, Henrique BaldarenaTobá, Issa José Jorge Sabha,José Lauer, Lúcia de Ramos,Luiz Colognesi, Maria deLourdes Camba, OsvaldoSobreira, Valter Ventura conti-nuarão em nossos corações e di-ficilmente serão esquecidos.Com certeza devem estar sendopreparados para cumprir novas enobres missões, agora no ladoespiritual.

Para aqueles que não pude-ram ser localizados, como An-tônio Fernandes Peres, AntônioTeixeira de Mello, Genésio deAbreu Teles, José Gomes,Paulino Faria Machado, Osvaldode Paula Ramos, Wilson Vieirade Vasconcelos, Sérgio de Brito,Umberto Mandarino e Aparecida

Formandos eseus familiares

na missa decomemoração

do 10ºaniversário de

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de Lourdes Furlaneto, fazemosquestão de deixar menção hon-rosa. Aonde quer que estejam,recebam as nossas homenagens eas nossas saudades. Nem por is-so deixarão de ser lembrados e,mesmo de longe, continuarão fa-zendo parte da nossa grande fa-mília. Esperamos encontrá-losalgum dia, gozando ótima saúdee em condições satisfatórias nomodo de viver. Outros nomesdignos de nota: Ademar da SilvaMoreira, Assad Abunjara, DavidDias de Oliveira, Joana Mar-kowski, João Moreto, MariaFalchero, Osvaldo Dario, Os-valdo Emiliano Gonçalves. Alu-nos que iniciaram o curso conos-co, mas que, por alguma razão,não terminaram com a nossa tur-ma, também estão sendo men-cionados, pois, até um certoponto, percorreram o mesmo ca-minho, com os mesmos transtor-nos, só não chegando à meta fi-nal por particularidades.

Quando me dispus a prestaresta homenagem, em virtude docinqüentenário da colação degrau, conhecia, de antemão, adificuldade da missão. Seriacomplicado visitar um por um,sem dizer que muitos não iriamser encontrados. De alguns, in-felizmente, receberíamos a notí-cia do falecimento. Mesmo as-sim, comecei a tarefa com dis-posição para, no mínimo, obterdados e recordar fatos, o que mepossibilitou completar o traba-lho com êxito.

Todos com quem mantivecontato foram solícitos, gentis,não deixando de demonstraruma memória fantástica e facili-tando as coisas ao revelarem ca-sos por mim desconhecidos ouesquecidos. O sentimento frater-no para evidenciar os mesmoslaços afetivos, a mesma harmo-nia, a mesma atenção após 50

anos também foi confirmado in-tegralmente.

De fato, este é um grupo forado comum. Alegre, brincalhão,bagunceiro - todavia atuandocom seriedade nos momentosadequados -, uma turma que deuenorme trabalho para a diretoriada escola, temos de admitir, em-bora tenha sido identicamentemotivo de orgulho para estamesma diretoria. Uma plêiade deestudantes abençoados, apesardos pesares.

Pessoas da estirpe de An-tônio Amaro, Ângelo Padovan,Anselmo Manzini , AntôniaBurato Manzini , Alberto deCastro, Epifânio Valverde,Francisco de Paula Lopes, Or-lando Malateaux, Nair Jose-phina Quaglia, Maria Paparella,Osvaldo Dametto, Primo Bor-sato, José Paschoal , MateusAldecôa, Loris Benito Balbo,Santarel l i , Raul Gardezani ,Vacius Rutkauckas, não podemsair jamais do nosso convívio,da nossa mente e, creiam, per-manecerão eternamente dentrodos nossos corações.

Usando termos contábeis, nobalanço da vida posso dizer, semmedo de errar, que houve um lu-cro fabuloso. O ativo superou opassivo e o saldo credor foi su-perior ao saldo devedor. Nãoposso me queixar.

II NDISCIPLINANDISCIPLINA - - Às vezes a bal-búrdia imperava e éramos puni-dos severamente. Nem assim ocomportamento melhorava. Anossa sala de aula era de fatoterrível, bastante indisciplinada.Não havia como controlá-la.

Uma vez, em mais um ato deindisciplina que determinou apresença do diretor, agindo comprecipitação, por não ter enten-dido o pedido do mesmo, levan-tei-me rapidamente, como que

assumindo a culpa sozinho. Oscompanheiros, porém, permane-ceram sentados, o que me dei-xou intrigado. Imaginem, eu,pensar estar agindo como um he-rói e acabar sendo consideradocomo um traidor. Ao notar queestava só, sentei-me constrangi-do. Na realidade, eles estavamcertos e eu errado.

Quando soube do ridículo aque estava me expondo e da re-primenda que estavam preparan-do para mim - da qual eu não meesqueceria por um longo tempo-,qual não foi o meu alívio. Ufa!Escapei de uma boa! Ainda bemque tomei a decisão sensata aosentar-me incontinenti, ou seja,sem perda de tempo.

Fomos suspensos por trêsdias. Muito embora não apre-ciasse tal punição, cumpri pon-tualmente o castigo me ligandodefinitivamente com a classe,não sem antes me penitenciarcom ela. Por um triz não jogueipor terra tudo que havia amea-lhado com muito denodo, o con-ceito positivo e a confiança quefinalmente depositaram na mi-nha pessoa. Foi um sufoco, masvaleu a pena.

Sendo um forasteiro, natural-mente teria que arcar com oônus do noviciado. Não foi fácila minha adaptação. Tive que fa-zer das tripas, coração e me des-dobrar com afinco para poder seraceito. Aos poucos fui me aco-modando até que obtive o alme-jado. Modestamente falando,com merecimento.

Quebrar um tabu mantido porprofessores que nunca davam anota máxima foi o primeiro dosprivilégios. Para eles, a nota no-ve era a maior. Não obstante, nãotiveram outra escolha a não serreconhecer, pela primeira vez,que alguém estava merecendo al-go a mais do que eles estavam

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acostumados a conceder. Foramsubjugados pelas excelentes pro-vas de um aluno que visava ape-nas provar a sua capacidade.

Para o professor de Matemá-tica, Rubens Ducatti, uma dasavliações do aluno foi reputadacomo das mais perfeitas, pelaclareza das resoluções (a des-peito da sujeira). Convém sa-lientar que a prova foi uma dasmais porcas, rabiscada em ex-cesso, com fiapos de borrachacobrindo as várias tentativas pa-ra se chegar ao resultado dasquestões com exatidão. A que-bra foi comentada com muitaemoção, pelo próprio professor,ao justificar a sua surpreendentee rara decisão.

Ministrar aulas para os filhosde alguns ex-colegas foi o se-gundo grande privilégio. Tive aimensa honra de participar naformação intelectual dos filhosde Mário Paparella, Francisco dePaula Lopes, Valter Ventura,Genésio Carlos Alvarenga, in-troduzindo nesta leva os filhosdo professor Vicente Bastos e deCelso Marchesam.

CC ULULTURATURA - - Como era de praxenaquele tempo, todo colégiocostumava conservar um grêmioestudantil para as práticas espor-tivas, culturais, sociais e recrea-tivas. Com tal finalidade, foifundado o Centro Estudantinode Cultura, em que tivemos par-ticipação ou como diretor ou co-mo associado. Uma inovaçãoimplantada pelo grêmio - por si-nal bem ousada – foi o reforçoescolar para os alunos em recu-peração (as chamadas aulas de2ª época, dadas pelos alunosmais avançados). Por ter sidoum dos encarregados e sentindo-me bem na função, procureiexercê-la da melhor maneirapossível, com muita responsabi-

lidade. O desempenho foi razoá-vel e serviu como estímulo paraa escolha da carreira de profes-sor. Aquele foi o primeiro passopara o magistério.

Outros ilustres personagensfizeram parte daquelas atividadesextracurriculares. Cidadãos quese tornaram famosos e de grandeprojeção, no decorrer dos anos,colaborando muito para o desen-volvimento cultural, social e po-lítico de São Caetano do Sul.

Quem não ouviu falar deAntônio Russo, Nicolau Delic,João Semenoff, Antônio Porfíriode Andrade, Francisco de Al-meida Claro, André Leone, RaulSiqueira Diogo, Waldemar Gia-notti, René Crepaldi, José deAlmeida Geraldo, Ivo Fattori,Rubens da Costa Patrão, Her-nani Syllos Lima, Plínio Turco,Valentino Chies, Raimundo daCunha Leite etc...? Foram im-portantes contemporâneos, na-quela romântica fase da nossajuventude, com quem tivemos afelicidade de conviver e dos

quais guardamos ótimas recor-dações, preservando uma cor-dialidade que se estende até osatuais dias.

II DÉIADÉIA - - Mais da metade do anoletivo de 1951 já havia passado enada ainda estava delineado paraa festa de formatura. Não existiaplano algum esboçado e o di-nheiro recolhido era insuficientepara fechar contratos. Tudo esta-va por fazer.

Com receio de um fracasso, odiretor Vicente Bastos nos ad-vertiu do pouco tempo que resta-va e pediu mais empenho nacampanha de arrecadação. Eraimprescindível um maior dina-mismo. Resolvemos, então, em-bora tardiamente, aplicar um sis-tema que pudesse garantir as pri-meira despesas. Várias sugestõesforam apresentadas, sendo esco-lhida a sugerida pelo colegaLoris Balbo Santarelli . Tevegrande sucesso e culminou comuma renda que excedeu ao exi-gido. Pudemos pagar todos oscompromissos sem maiores atri-bulações, sobrando ainda umsaldo que usamos para gastosnão previstos. A idéia luminosaapresentada pelo Balbo, queconsistiu em rifar um aparelhode TV, prêmio muito requisitadopor ser uma grande novidade(ainda mais porque estava ex-posto na vitrina da Casa Qua-glia, famosa loja de artigos mas-culinos de propriedade do pai danossa colega Nair Quaglia), foide grande valor, um êxito ines-perado. Superou a mais otimistadas expectativas.

Foram alugados o Cine Pri-max para a colação de grau e osalão do São Caetano EsporteClube para o baile (ao som deBatista e sua orquestra). Comoinovação, em vez do tradicionalterno preto, usamos terno bran-

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Francisco Saes de Amo recebendocertificado. Na mesa, da esquerdapara a direita: Celso Marchesan,

Dionísio Martins (paraninfo), AntonioRusso(apresentador), (?)

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co - com gravata borboleta gre-ná - no ato da entrega dos diplo-mas. Até um álbum de fotogra-fias foi possível elaborar, abran-gendo todos os alunos da classe.No final, cada um ganhou umálbum.

Após a entrega dos certifica-dos, era costume da diretoriapremiar os alunos que se desta-cavam, dando-lhes a possibilida-de de pertencer ao corpo docen-te. Havia carência de profissio-nais do ensino e o Ministério daEducação e Cultura autorizava acontratação de professores esta-giários.

Por ter sido um dos primeirosda turma, eu esperava ser um de-les. Alguns que se distinguiramforam indicados e, para minhaamarga frustração, fiquei de fo-ra. Meu nome não constava narelação. Fui ignorado por com-pleto. Estava excluído dos pla-nos da escola e, portanto, semnenhuma chance de ser contrata-do por ela.

Que decepção! Que desalen-to! Sonhando alto e vendo tudose desmoronar! Não me confor-mava com aquela injusta delibe-ração. Confesso, estava arrasa-do, totalmente arrasado, semvontade para nada. Que sensa-ção de derrota! Como gostariade fugir daquele local e curtir o

meu aborrecimento longe de tu-do e de todos!

De repente, fui chamado parareceber um presente. Sim, umreles presente de um tio que medeveria ser motivo de satisfaçãoe consolo. Normalmente, seriauma inesperada e generosa sur-presa, mas, naquele instante, euainda estava sob o efeito do aba-lo sofrido e, por isso, sem dispo-sição para aceitar nada. Estavamagoado demais!

Com a minha tristeza trans-formando-se em revolta, resolvinão atender ao chamado. Seriacomo um protesto pela injustiçaque estavam cometendo. Silên-cio total! Novamente ouvi o cha-mado. Não tinha intenção deacolher o pedido, fossem quaisfossem as conseqüências. Não ti-nha mais nada a perder.

Mais uma vez foi solicitada aminha presença e nenhuma mo-vimentação foi notada. Perma-necia impassível, sem a menorintenção de subir ao palco parareceber a indesejável recompen-sa. Sequer ameaçava levantar-me da poltrona. O impasse esta-va estabelecido. Murmúriossurgiram no auditório e o am-biente, antes calmo, começou aficar tenso. Expectativa geral!Iria ou não ?

Finalmente, por insistência

dos outros diplomados, acabeicedendo. Para ser claro, fui for-çado por eles. Na marra, comose diz na gíria popular, entretan-to, bastante contrariado, o quese podia ver em meu semblantefechado, que causava espantoaos convidados. Ninguém che-gou a tomar conhecimento dareal razão do meu estranho com-portamento.

Querem saber qual foi o meuquase rejeitado galardão? Aabertura de uma conta bancáriacom uma quantia razoável. Nãoera o que eu realmente queria.Aguardava outra coisa que so-mente me foi oferecida 14 anosmais tarde: a oportunidade detrabalhar no colégio. Tencionavaunicamente dar aulas. Pretensãoaté que modesta, vocês não con-cordam comigo?

CC OMEMORAÇÕESOMEMORAÇÕES - - Em 1961, ti-vemos a primeira sensação agra-dável ao festejar o décimo ani-versário da formatura, mandan-do rezar uma missa, na MatrizSagrada Família, em honra aofato. Menos da metade da turmaesteve presente. Todavia, emcompensação, alguns trouxeramesposas e filhos, o que deu umcaráter diferente ao evento (co-mo se nota numa das fotos queilustra esta reportagem).

O Jubileu de Prata tambémfoi comemorado com muito arre-batamento, isto em 1976, já comuma adesão maior. Além da mis-sa, tradicionalmente celebradanesses eventos, aconteceu, apóso término da mesma, uma rápidareunião no adro da igreja, ondecada um dos presentes relatoupormenores da própria vida nodecurso dos 25 anos.

Essa simples solenidade con-tou com o comparecimento dodiretor Vicente Bastos e de al-guns professores, homenageados

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Noite da entregados certificados,realizada noCine Primax emNovembro de1951F

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em jantar que encerrou com bri-lhantismo a festa. Reunimo-nosno Binder Restaurante, em SãoBernardo do Campo.

Talvez, para a nova solenida-de, não possa ser repetido omesmo esquema das duas ante-riores (o peso dos anos, as con-dições físicas não tão propícias,enfim, diversas dificuldades po-dem atrapalhar os planos), mastenho certeza absoluta de quenão faltará o calor humano, a de-lícia do novo encontro, de umaencantadora e divertida reunião,relembrando as famosas tertúliasque tanto influenciaram as nos-sas vidas e a rememoração dosbelos momentos que robustece-ram profundamente uma coexis-tência de ternura, de acatamento,de tolerância entre autênticos ir-mãos, na mais profunda acepçãodo vocábulo.

Como concluir esta narração?Estará sendo omitida algumacoisa? O que mais pode ser ditopara exaltar de vez este conjuntode requintados indivíduos?Outras ocorrências poderiam serdestacadas para enaltecer aindamais, como se já não bastassemos encômios anteriormente pro-feridos com exatidão, a todos osmembros da turminha. Afinal,estivemos presentes em todos os

setores, com personalidade,hombridade, dignidade, compe-tência, dando exemplos extraor-dinários, marcando absoluta-mente a nossa passagem. Em to-das as intervenções fomos feli-zes, mostrando habilidade nasdecisões, cooperando com muitozelo e, nas horas críticas, procu-rando resultados positivos paraos problemas.

Da mesma forma, no setor es-portivo foi mantida a escrita.Utilizando somente os elementosda sala de aula, montamos um ti-me de futebol com capacidadetécnica suficiente para nos imporaos adversários, muitos deles ca-tegorizados, confirmando o pres-tígio adquirido e conservandouma união inteiramente solidifi-cada sem nenhuma contestação.

Que turma deslumbrante!Que grupo maravilhoso! Que co-legas de valor! Que companhei-ros notáveis! Por melhores quepossam ser os elogios, ainda fal-tarão palavras, meras palavras,para legitimar tudo o que estásendo descrito. E elas certamen-te não serão encontradas facil-mente.

Enquanto isto, para todos oscomponentes da segunda turmade formandos, em regozijo aoqüinquagésimo aniversário da

colação de grau, vamos bradarcom todas as forças do nossoser: Amigos para todo o sempre!

MM E N S A G E ME N S A G E M – – Vamos, antes demais nada, agradecer a Deus pe-las dádivas e por poder usar oque temos de melhor dentro denós. Só desse modo podemos en-cerrar nosso ciclo com os braçosabertos para as boas causas, comalegria nas nossa realizações,com paz nas nossas ligações afe-tivas, com a voz da razão pre-ponderando, com brio no nossomodo de agir, com honorabilida-de pelas ações dignas, com aconsciência tranqüila pelo de-sempenho como íntegros mem-bros da comunidade, dedicando-nos com muita firmeza ao cres-cimento da cidade. Atualmente,vendo a pujança do município,podemos orgulhosamente dizer,em alto e bom tom :

- Fizemos a nossa parte! Fo-mos úteis para a sociedade!

Nada foi em vão! Enfim , vi-vemos!

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(*) Carlos Gerchtel foi professor do Institutode Ensino de São Caetano do Sul e doCentro Interescolar Municipal ProfessoraAlcina Dantas Feijão

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Frente e verso do convite de formatura da turma de técnicos em Contabilidade da Escola Técnica de Comércio de São Caetano. Ano de 1951

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A Região do ABCno tempo dos bondes

André Luis Balsante CARAM (*)

AAEmpreza Immobiliaria deSão Bernardo, organizada

pelos irmãos Hippolyto PujolJunior e Ernesto Pujol, foi a pri-meira empresa de transporte co-letivo da história da viação pú-blica de São Bernardo. Pioneiraem trazer os primeiros bondesque serviram a região na décadade 1920, a implantação destesistema flexibilizou o fluxo demercadorias e passageiros entreos principais agrupamentos ur-banos de São Bernardo: a Vilade São Bernardo, o Bairro daEstação (que deu origem à Vilade Santo André) e o Distrito deSão Caetano. Procuraremosmostrar não só a importânciadeste sistema de transporte queconectou estes principais cen-tros de interesse da região, in-clusive o núcleo de São Cae-tano, como também avaliar odesenho urbanístico elaboradopara os loteamentos abertos pe-la empresa, cujos princípiosadotados encontram similitudesnos conceitos de cidades-jardinsidealizados por Ebenezer Ho-ward, uma novidade para o pa-drão da época em termos deplanejamento urbano.

O deslocamento entre osprincipais centros de atividadeseconômicas do país, antes dainstalação do trem, era feito ba-sicamente por estradas, percor-ridas sobre o lombo dos burrosou por carroças. Muitos dos ca-minhos existentes foram abertospor tropeiros que historicamen-te exerceram um papel relevan-te na unificação de vários aglo-

merados urbanos e fazendas dointerior à cidade de São Paulo.O Caminho do Mar, criado parafacilitar o acesso entre o litoral,também passa pela região deSão Bernardo e nas terras doTijucuçu. Conforme Reis Filho,foi a primeira trilha aberta pe-los portugueses no sul do Bra-sil[1]. Por aí já se nota a impor-tância de se resgatar os traçoshistóricos das primeiras vias decirculação.

Fora as estradas, as vias flu-viais também foram preponde-rantes para a ligação de váriosnúcleos regionais. Como no ca-so da Fazenda São Caetano,fundada por monges benediti-nos, que utilizavam o canal doRio Tamanduateí para escoar,até a cidade, sua produção detelhas e artefatos cerâmicos pa-ra comercialização e construçãodo Mosteiro de São Bento.

A primeira mudança real-mente significativa na forma de

transporte ocorreu com a im-plantação da Estrada de FerroSão Paulo Railway, inauguradaem 1867, que ligou Santos aJundiaí e influiu diretamente nacidade de São Paulo e em SãoBernardo. Foi a grande novida-de da época que mudou radical-mente a escala de deslocamen-to. A construção da estrada deferro visava atender interessesda economia agrária exportado-ra do país, que perdurou até asprimeiras décadas do séculoXX. Isto significou não só a in-serção da região de São Ber-nardo no contexto socioeconô-mico da cidade de São Paulo,mas a inserção do próprio paísna nova ordem mundial. A cida-de de São Paulo foi a que sofreumaior impacto com a ferrovia.Há muito tempo a cidade já eraconsiderada um entreposto depassagem para vários caminhose estradas. Com o advento daferrovia, São Paulo ampliou

Primeiro loteamento desenhado pela Empreza Immobiliaria, dividido em sete bairros-jardins, para construção de moradia popular, operária e zona industrial

servida por ramais da Estrada de Ferro São Paulo Railway

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suas atividades comerciais etornou-se o centro capitalista dopaís. Não só uma série de arti-gos e novidades aportava emSão Paulo por meio da ferrovia,mas aos poucos a cidade foitentando reproduzir todo ummodo de vida baseado nos pa-drões europeus, que influencia-ram o modo de elaborar a arqui-tetura e o urbanismo.

Na região de São Bernardo,decretado município em 1889, oimpacto da ferrovia também te-ve seus reflexos. Existiam nestaregião vários núcleos em pro-cesso de formação e crescimen-to. Além do núcleo de SãoCaetano, que na época pertenciaa São Bernardo, também se des-tacavam dois importantes pólosde desenvolvimento com fun-ções muito distintas: a Vila deSão Bernardo, onde se localiza-vam a sede da região, reparti-ções públicas e administrativas,e o Bairro da Estação, que con-centrava as atividades comer-ciais e industriais e que futura-mente viria a ser o Distrito deSanto André.

São Caetano era um pequenonúcleo de modestas dimensõesterritoriais, que crescia em tor-no da Igreja Matriz Velha e da

antiga estação ferroviária, lo-cais onde se concentravam amaioria da população, o comér-cio e as principais edificaçõesdo período. Economicamente,este núcleo centrava suas ativi-dades na fabricação de produtoscerâmicos - tradição que am-pliou fama herdada dos padresbeneditinos. O Bairro da Es-tação também passava por pro-cesso de transformação seme-lhante ao de São Caetano. Seuespaço físico era tão pequenoquanto o daquele núcleo, pois oseu sistema viário não passavade cinco ruas e uma rede de es-tradas que o ligavam a outrosnúcleos regionais e a SãoPaulo[2].

Devido às faci l idades dotransporte ferroviário, à existên-cia de abastecimento elétrico, àsimunidades fiscais e aos terre-nos oferecidos a preços baixos,tanto o Bairro da Estação quan-to São Caetano, que eram bene-ficiados pela linha de trem, tor-naram-se zonas de forte concen-tração industrial. No caso deSão Caetano, as indústrias ins-talaram-se próximas às várzeasdos r ios Tamanduateí e dosMeninos (fortes elementos com-positivos da paisagem), por se-

rem fontes ricas de matérias-primas e recursos hídricos tantopara o abastecimento localquanto para o funcionamentodas mesmas.

Num contexto mais amplo, aindustrialização da região deSão Bernardo e da capital pau-lista foi resultado de conjuntomaior de transformações asso-ciado à acumulação de capitalgerada pelo complexo econômi-co agrário-exportador, pelos no-vos ideais republicanos e pelaentrada de investidores estran-geiros, principalmente britâni-cos, mediante a importação demaquinário e serviços que ati-varam a economia às custas deuma mão-de-obra imigrante quetambém aportava no país com osonho de melhores condições devida. Em 1904 o investimentobritânico no exterior iniciousua ascensão espetacular (...) Acorrente principal do capitalbritânico dirigiu-se ao Canadá,à Argentina e mais uma vez aosEstados Unidos, ao Brasil e aoChile (...) Ferrovias, cais, utili-dades públicas, telégrafos ecarris urbanos, mineração,plantações, companhias de hi-poteca fundiária, bancos, com-panhias de seguro e comércioforam os objetos favoritos do“boom” de investimentos[3]. Asfábricas, com suas longas jorna-das de trabalho monitoradas pe-lo rígido horário, impulsiona-vam o crescimento da classeoperária, que se tornava umaquestão social emergente noscentros urbanos.

Os núcleos de São Bernardo,principalmente São Caetano e afutura Vila de Santo André, àmedida que se expandiam fisi-camente, seja no número de in-dústr ias ou habi tantes , em-frentavam maiores problemas,urbanos, sobretudo no tocante à

Loteamento Nova Petrópolis, em São Bernardo, o segundo desenhado pela Empreza, com ruas sinuosas seguindo a topografia do terreno. Note as várias praças

e áreas verdes planejadas no loteamento

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moradia, saneamento básico eaos transportes. O espaço urba-no foi ref le t indo não só astransformações socioeconômi-cas, políticas, culturais da épo-ca, mas também os problemasdecorrentes do seu crescimentodesorganizado, que cada vezmais salientava as diferençassociais entre os pobres e os ri-cos.

A municipal idade de SãoBernardo, dentro das suas limi-tações, tentava controlar e regu-lamentar a expansão desordena-da das vilas, principalmente emrelação ao Bairro da Estação,onde uma série de medidas foiimplementada visando a ade-quá-lo à estatura socioeconômi-ca que tinha obtido. E por estarazão foi transformado em dis-trito e denominado, por razõeshistóricas, de Santo André.

As indústrias instaladas naregião representavam o progres-so econômico que as vilas al-cançavam. Geravam empregos,mercado de trabalho e ativavama economia da região. Mas namesma proporção que aumenta-va a quantidade de indústrias naárea urbana, crescia também ademanda por novas habitações,principalmente moradias popu-lares, em vista ddo crescimentode áreas acortiçadas que, conse-qüentemente, ocasionavam aproliferação de doenças e ondasde epidemia. Era o custo pagopela rápida modernização porque passaram a maioria dos cen-tros urbanos. Sendo assim, no-vas áreas de ocupação e novosbairros tinham que ser criados.

Nas áreas em expansão urba-na, que representavam um ricofilão de investimentos imobiliá-rios, as companhias e empresasparticulares voltadas para pres-tação de serviços urbanos co-meçaram a despontar. Além do

mais , não raro as empresasimobil iárias contavam comisenções ou outros privilégiosconcedidos pelo poder público,sobretudo para a construção decasas populares, uma vez que amoradia dos trabalhadores, emespecial o operariado, faziaparte da questão social, cujaresolução, além de atender ademanda, envolvia sanear as ci-dades para diminuir as possibi-lidades de expansão de epide-

mias[4].Dentre as companhias que

contribuíram para o progressodas vilas de São Bernardo, aEmpreza Immobiliaria de SãoBernardo foi uma das primeirase principais que atuou naquelaregião. Instalou os primeirosbondes que circularam na re-gião, ligando os principais pon-tos, e também implantou lotea-mentos, com princípios urbanís-ticos modernos para época, fun-damentais para estruturar o fu-turo crescimento das áreas emtorno de Santo André, SãoCaetano e a sede do município.

EE M P R E Z AM P R E Z A II M M O B I L I A R I AM M O B I L I A R I A - - AEmpreza Immobiliaria de SãoBernardo estabeleceu-se na re-gião num momento bastante

propício. As vilas de São Ber-nardo estavam em processo decrescimento, tornando o merca-do de terras um negócio promis-sor. Fora de São Bernardo, em-presas e companhias imobiliá-rias, muitas das quais ampara-das por capital estrangeiro, fir-mavam-se em várias cidades de-senvolvendo trabalhos de urba-nismo e comercialização de lo-tes e edificações. Em muitos ca-sos, estas companhias foramresponsáveis pelo planejamentourbanístico de cidades e lotea-mentos que surgiram nos anosposter iores a 1920. Em SãoPaulo, destaca-se a atuação dacompanhia City of São PauloImprovements and FreeholdLand Company Limited, respon-sável pela elaboração e implan-tação de vários bairros-jardinsque serviram de modelo paramuitas empresas.

No entanto, percebe-se clara-mente que essas imobiliárias re-presentaram de certa forma aparticipação do capital privadona construção da cidade e naimplantação de melhorias urba-nas (serviços de viação, sanea-mento) que resultaram num pla-nejamento ordenado dos espa-ços e num novo modo de ocupara cidade. Processo semelhanteocorreu em relação aos primei-ros planos rodoviários. De fato,Nestor Goulart Reis Filho apon-ta a participação da iniciativaprivada, na construção e explo-ração comercial das rodovias edo transporte de cargas e pas-sageiros, a chamada “indústriade transporte por automóveis”.Boa parte daquela demanda,principalmente nos lugares maisdistantes, teria sido até entãoatendida com esse tipo de parti-cipação, principalmente nasfrentes pioneiras, nas regiõesmais afastadas[5].

Propaganda mostrando as vantagensdos novos bairros

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As cidades em processo deconstrução e expansão urbanaeram áreas propícias ao surgi-mento de empresas prestadorasde serviços urbanísticos, atravésde concessões expedidas pelospróprios órgãos públicos, numapareceria entre iniciativa priva-da e pública. Sabemos tambémque os irmãos Pujols, eram pro-prietár ios de terras em SãoBernardo e em São Paulo, au-mentando assim as pressupostasrazões para iniciarem projetosnaquela região. No f inal de1921, fundaram a Empreza Im-mobiliaria de São Bernardo ,constituída sob a forma de so-ciedade civil entre HippolytoGustavo Pujol Júnior e ErnestoPujol, com propósito de: urba-nização de grandes áreas deterrenos em São Bernardo (...),a venda de terrenos e a edifica-ção popular, liquidáveis por pe-quenas prestações, a prazos decinco anos[6]. Objetivos que fo-ram ao encontro direto dos an-seios da população, que neces-sitava de novas áreas destinadasà moradia.

Dessa forma, a empresa ini-ciou suas atividade quando ain-da os seus engenheiros percor-riam o campo, levantando a to-pografia da vastíssima extensãode terrenos que ela resolveraurbanizar no próspero subúrbioque lhe dá o nome – a vender osprimeiros lotes dos seus novosbairros , apenas lançados àpressa nas primeiras plantas le-vantadas, atendendo assim àsinúmeras solicitações da clien-tela espontânea, que desde logoa procurou[7]. A implantação dosbondes está associada aos negó-cios da empresa em melhor ser-vir os loteamento e a futura co-mercialização dos lotes. Porémas preocupações foram além dasimples solução imediatista dos

interesses especulativos, pois oserviço dos bondes atendeu ànecessidade precípua na ligaçãoentre as vilas de São Bernardo,que estavam se desenvolvendo,resolvendo assim interesses tan-to da municipalidade quantodos investidores.

NN OVOV OO UU RBANISMORBANISMO - - No séculoXIX, a Revolução Industrial foium processo que marcou o rit-mo econômico das principaiscidades européias. Na corridapelo desenvolvimento econômi-co gerado pelo abrupto cresci-mento das indústrias e do capi-tal, as cidades foram se trans-formando num ambiente hostile de péssimas condições de vidae higiene. Nas fábricas a situa-ção não era diferente. As exten-sas jornadas de trabalho, a pre-cariedade das instalações e ossalários baixíssimos aviltavamo operariado, que não tinha ou-tra escolha a não ser sujeitar-seao sistema.

Em Londres, o surto de epi-demias e os cortiços adensadosde população miserável prolife-ravam no ambiente urbano econtrastavam com os majesto-sos parques e palacetes configu-rados em outras partes da cida-

de. Sobre esse assustador qua-dro de desigualdades sociais, ospensadores da época se debru-çavam em busca de soluçõesqualitativas que revertessem oprocesso, principalmente em re-lação à cidade: o seu desenho, adistribuição ordenada das fun-ções e a questão da moradia pa-ra o operariado. A solução des-ses problemas seria o caminhopelo qual se suplantariam osmales da cidade industrial e oseu péssimo sistema de estrutu-ra urbana - o mote dos proble-mas da época.

Muitos foram os teór icosidealizadores de novas socieda-des como solução dos proble-mas urbanos. Destacamos aquia figura de Ebenezer Howard,idealizador do conceito de cida-de-jardim, que visava sobretudorestabelecer a dignidade dascondições de moradia e traba-lho. A proposta não se tratavade uma simples intervenção noambiente urbano construído,nem mesmo uma representaçãoidealista de uma sociedade utó-pica, mas a concepção direta deuma nova cidade moldada nosmais profícuos fundamentos so-ciais através de um urbanismoconsistente que mesclava as

O bondinho dosPujols, que

circulou em SãoCaetano, Santo

André e SãoBernardo na

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vantagens dos ambientes urba-nos (trabalho, áreas indústrias,empregos, comércios) com osbenefícios que o campo propor-cionava. O conceito que fomen-tou o novo padrão urbanísticointegrava, de modo racional, osbenefícios do campo e às vanta-gens da cidade através de siste-ma de avenidas-bulevares ra-diais e perimetrais que ligariamos pontos extremos da cidade àrede ferroviária regional. Os es-paços públicos e áreas em tornodas residências seriam permea-dos por vegetação abundante,celebrando a tradição inglesados parques naturalistas – lugarde descanso e reflexão. O pla-nejamento adequado das vias decirculação, que se harmoniza-riam com a topografia do terre-no, incluía também sistema desaneamento que garantiria a sa-lubridade adequada da cidade. Equando a cidade-jardim (a prin-cípio planejada para 32.000 ha-bitantes) atingisse a densidadede população limite, uma outracidade seria construída, criandoassim uma constelação de cida-des-jardins ligadas entre si poruma rede de transporte e viasconectoras.

O modo de viabilização téc-

nica e econômica seria concreti-zado pelas relações baseadas nocooperativismo, onde o solo ur-bano-rural seria um patrimôniocoletivo dos próprios morado-res, gerenciado pela municipali-dade local da cidade-jardim. Nacidade-jardim, o solo urbano dealguma maneira é socializado,mas não constitui uma proprie-dade do Governo Central, nemé por ele gerido, submetendo-sesomente às suas leis e tributa-ção. Howard reduz o tamanhodo seu estado à municipalidade,pois não acreditava na atuaçãodo Estado inglês, produto do li-beralismo, como também nãocontava com a atuação doEstado socialista controlandotodas as atividade. A municipa-lidade, por sua vez, é controla-da de perto pelos habitantes[8].Em suma, estas foram as cir-cunstâncias e as preocupaçõesde Howard quando idealizou acidade-jardim, que seria umasolução às mazelas das socieda-des aviltadas pelas baixas con-dições urbanas que a era indus-trial tinha causado. As cidadesde Letchworth (1902) e Welwyn(1920) são exemplos cabais dosprincípios de Howard, mostran-do que era possível transpor pa-

ra o plano prático o modelo ci-dades-jardins.

O modelo de Howard incor-porou várias influências urba-nísticas e conceitos positivosdas experiências passadas. Suassoluções foram inovadoras epráticas, tornando-se referênciado urbanismo moderno e pau-tando o planejamento das cida-des nas primeiras décadas doséculo XX. Como em SãoPaulo, onde a Companhia Cityconstruiu muitos bairros-jardinscentrados nas idéias urbanísti-cas de Howard. Uma novidadepara os padrões paulistas, mastambém um instrumento da pu-jança inglesa sobre a culturabrasileira. De qualquer forma,os bairros-jardins construídospor aquela companhia represen-taram a transposição daquelemodelo para o Brasil, aplicadopela primeira vez de modo pio-neiro no Jardim América(1919), um exemplo seguidopor várias outras companhiasque atuavam no mesmo perío-do. A exploração deste métodochegou a uma situação que foibem definida por Dácio Ottoni:Os bairros dos abastados setransformaram em modelo, pelomenos em nome, para inúmerosloteamentos da cidade: JardimMíriam, Jardim Campo Limpo,Jardim Ideal, Jardim Fraterni-dade, Jardim Felicidade... Umincauto, ao ver o guia da cida-de com seus 1.200 bairros-jar-dins, se deslumbraria com a suapossível enorme área verde.Chegou-se ao máximo da cor-ruptela de uma idéia[9].

LL O T E A M E N TO T E A M E N T O SO S - - Na década de1920, a Empreza Immobiliariacriou vários loteamento do tipobairro-jardim. A primeira árealoteada pela Empreza com-preendia uma gleba de 6 mi-

Gravura deGustave Doré(1876),mostrando ashabitaçõesacortiçadas dacidade industrialinglesaF

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lhões de metros quadrados entrea Estação de São Bernardo (noDistrito de Santo André) e a Es-tação de São Caetano. Divididoem sete bairros, este loteamentofoi parcelado em três áreas comfunções distintas:

Bairros de habitação bur-guesa - reservados às pequenaspropriedades de recreio ou vil-legiatura – Bairro Jardim,Bairro Campestre e BairroUtinga;

Bairros de habitação prole-tária – reservados à edificaçãopopular para o operariado daCapital e dos importantíssimoscentros industriais de São Ber-nardo e São Caetano – BairroOperário, Bairro de Santa Ma-ria e Bairro da Saúde;

Bairro Industrial – reserva-do, em longa faixa marginal àSão Paulo Railway, para a edi-ficação industrial e comercialde usinas, armazéns, entrepos-tos, etc., que necessitam de des-vios particulares das linhas daEstrada Ferro[10].

Já o segundo loteamento, oNova Petrópolis, nasceu com otítulo de cidade-jardim e foicriado próximo à sede de SãoBernardo, no f inal de 1925,compreendendo uma área demais de três milhões de metrosquadrados. A propaganda daépoca mostrava as vantagensdeste loteamento que se desti-na, graças à excelência do cli-ma local (altitude 950 metros)e às facilidades de comunica-ção com as cidades de Santos eSão Paulo, à formação de umaestação climatérica de primei-ra ordem, para o refúgio dapopulação de Santos, durante oterrível verão dessa cidade[11].

Além da comercialização doslotes, a Empreza fomentava opovoamento dos bairros atravésda venda de habitações, seja por

empréstimos hipotecários oupor contratos prediais, a prazode 8 anos [12]. Até o f inal de1925, os principais melhora-mentos urbanos e serviços es-senciais estavam em processode execução ou quase todosconcluídos: arruamento, arbori-zação, iluminação elétrica, redede água e esgoto, a instalaçãode uma rede de tramways quepercorriam as glebas loteadas ea construção de cerca de 200 re-s idências de vár ios padrões(econômicas, populares e demédio porte), com dois ou trêsdormitórios, térrea ou assobra-dada, no intuito de promover afixação e o povoamento da área.

A tarefa de dirigir os traba-lhos técnicos e de desenhar asfuturas quadras provavelmenteficou sob os cuidados de Hip-polyto Gustavo Pujol Júnior,pois encontramos semelhançasem outros trabalho desenvolvi-dos por ele e no traço caracte-rístico de seus desenhos, comono Projeto de RemodelaçãoUrbana da Cidade de Lambari.O outro irmão, Ernesto Pujol,ao que tudo indica, era advoga-do e provavelmente se encarre-gava dos assuntos jurídicos ne-

cessários ao funcionamento em-presarial do empreendimento.Quando fundaram a Empreza,Pujol Júnior já era um destaca-do engenheiro civil e arquitetono meio técnico-científico, ten-do projetado obras de engenha-ria e arquitetura como o Reser-vatório da Mooca e o EdifícioGuinle, um dos primeiros arra-nha-céus da cidade de SãoPaulo, construído em 1912 coma tecnologia de concreto arma-do. A técnica propiciou a verti-calização dos grandes centrosurbanos e foi largamente estu-dada e aprimorada por PujolJúnior nos laboratórios da Es-cola Politécnica de São Paulo.Isto nos revela que a EmprezaImmobiliaria, ao criar seus bair-ros-jardins, estava em sintoniacom as tendências urbanísticasdesenvolvidas no país e no ex-terior. As cidades-jardins deHoward eram a síntese de vá-rios movimentos e idéias da so-ciedade européia do séculoXIX. Uma vez saído do planoteórico, este modelo fomentou abase do urbanismo no início doséculo XX, servindo de modelopara o planejamento de váriosbairros e cidades. Entretanto o

Planta do JardimAmérica, em

1941, da Cia Cityof São Paulo .

Projeto de 1919desenhado pelos

arquitetos BarryParker (1863-

1940) e RaymondUnwin (1867-

1947), os mesmoque trabalharamcom Howard na

concepção dacidade-jardim de

Letchworth(1902) F

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termo cidade-jardim ou mesmobairro-jardim acabou se tornan-do conceito geral utilizado paradesignar vários loteamentoscriados pelas empresas imobi-liárias, mas bastante diferentequanto aos princípios sociais ede cooperativismo que baliza-ram as cidades-jardins de Ho-ward, onde o solo seria proprie-dade da própria comunidade enão produto da especulação ca-pitalista.

No caso da Empreza Immobi-liaria, as duas glebas loteadasaproveitaram o lado técnico ur-banístico das idéias de Howard,principalmente no que tangia aodesenho urbano e à implantaçãodos loteamentos, onde vemosruas sinuosas que acompanhamo relevo do terreno; distribuiçãode áreas verdes e praças numaharmoniosa relação entre a po-pulação e a natureza; instalaçãode saneamento e infra-estruturabásica; ordenação dos espaçosem áreas próprias para habita-ção e trabalho (Bairro Indus-trial), servidas por rede de trans-porte e de circulação adequada,estruturados num urbanismoconsistente que direcionaria ofuturo crescimento urbano pró-

ximo às áreas loteadas. PP R I M E I R O SR I M E I R O S BB O N D E SO N D E S - - Anteriorao surgimento da EmprezaImmobiliaria, o transporte já eraquestão prioritária para o futurodesenvolvimento da região deSão Bernardo. De acordo comCaldeira, a população aumenta-va cada vez mais, com a im-plantação de novos centros deatividade no município. Cons-tituía problema muito sério afalta de transportes rápidos en-tre as várias povoações, peloque o vereador Sr. José AnnibalColleone propôs à Câmara, em6 de setembro de 1906, que seconcedesse privilégio à Light &Power Co. para a instalação delinha de bonds[13].

A instalação de uma linha debondes semelhantes aos existen-tes em São Paulo representou ograu de modernidade que o re-cém-criado município almejavaalcançar. No contrato firmadoentre a Light & Power e a muni-cipalidade ficou decidido que,junto com fornecimento deenergia, a empresa canadensedeveria, num prazo de três anos,instalar uma l inha de bonde(com tração elétrica) para servira região e ligá-la à cidade de

São Paulo. O ponto inicial seriano local mais conveniente naCapital e, passando pelas ime-diações de São Caetano e pelaEstação de Santo Bernardo, osbondes alcançariam a Vila[14].

Nota-se claramente a preocu-pação da municipalidade emtentar resolver não só o proble-ma dos transportes, mas tam-bém em prover a região com ainfra-estrutura básica necessáriaao crescimento e à expansão ur-bana. A rede de transporte entreas vilas de São Bernardo e suacomunicação com a capital pau-lista foram piorando, e o antigosistema de carros de praça , re-gulamentado pela municipalida-de no ano de 1895 para circularentre a Vila de São Bernardo eo Bairro da Estação, não davaconta da demanda.

Em 1907, a Light instala emSão Bernardo a primeira esta-ção elétrica que, partindo deSão Paulo, passava por SãoCaetano, atingia a Estação deSão Bernardo e chegava à Vilade São Bernardo. A instalaçãode energia foi um dos fatoresprimordiais que ativou o pro-cesso de industrialização da re-gião. Porém, a Light não cum-priu com o compromisso de ins-talação de bondes, abrindo as-sim precedentes para que outrosempreendedores se interessas-sem pelo negócio de transpor-tes. De acordo com o livro deMarly Rodrigues, foram envia-dos à Câmara de São Bernardovários pedidos solicitando avalpara implantação deste serviço.Entre eles o caso de FranciscoJardim do Nascimento, que pre-tendeu estabelecer uma linha deautomóveis ou outros meios detransporte elétrico ou a vapor,para passageiros ou mercado-rias. Mas o projeto não foi im-plantado. Outro empreendedor

Projeto de Pujolpararemodelaçãourbana dacidade deLambary (MG).Planejamentoracionalintegrado comruas sinuosasF

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foi Carlos Américo Barbosa deOliveira, que além do forneci-mento de linhas de bondes tam-bém requereria a concessão doprivilégio de exploração de for-ça e luz por 50 anos.

Em Outubro de 1921, o pre-feito Saladino Cardoso Francopromulga a Lei n. 218, em queconcede aos Doutores Hippo-lyto Gustavo Pujol Júnior eErnesto Pujol (...) privilégio pe-lo prazo de cinqüenta anos, deexploração, dentro das raias doMunicípio, dos serviços de umarede de viação municipal pormeio de tração a automóvel so-bre trilhos, com motores a es-sência (gasolina), benzina, ál-cool (ou sucedâneos) paratransporte de passageiros, car-gas ou bagagens[16]. Esta medidaentrou em conflito direto comos pr ivi légios concedidos àLight, cabendo aos Pujols umarenegociação, junto àquela em-presa, do direito de execuçãodos serviços de transporte.

Em Maio de 1923, a Empre-za inaugurou as l inhas SãoBernardo-Estação Circular eSão Bernardo-Estação/São Cae-tano. Esta última foi inauguradaapenas no trecho que partia daEstação de São Bernardo até oBairro Alto da Saudade, onde selocalizava a Capela do curan-

deiro São Vicente, bastante co-nhecido na história da cidade deSão Caetano. O bonde, além devalorizar as áreas loteadas, bus-cou caminhos que solucionas-sem o problema dos transportesentre os principais pontos de in-teresse da região. A linha entrea sede do município e a Estaçãosó foi inaugurada em 1925.

As automotrizes eram movi-das a gasolina e locomoviam-sesobre os trilhos. O motor eraFord bigode montado em SãoPaulo, à rua Barão de Limeira,onde em um velho galpão a fir-ma Cornalbas e Formiga Ltda.,foi encarregada a fazer as pri-meiras jardineiras. E os chassistinham sido aproveitados de umacervo desativado da Compa-nhia Campineira de TracçãoLuz e Força da cidade de Cam-pinas, que desde 1910, transfe-rira o sistema animal para tra-ção elétrica[17].

Conforme Jayme da CostaPatrão, os primeiros carros eramvagarosos e sempre apresentamproblemas quando muito lotadosou em dias chuvosos. Isto, noentanto, não invalida o méritoda iniciativa dos irmãos Pujols,que posteriormente substituíramestes carros por sistema maismoderno, importado das fábri-cas Renault e Campanhe (sic),

de Paris. Para melhor servir o sistema,

a Empreza mantinha uma ofici-na e abrigo situada no início daAvenida Industrial , junto aoatual Viaduto Pedro Dal’An-tonia (sic). E também uma esta-ção central para controle doshorários dos bondes.

Mesmo mantendo grandesinvestimentos na região e atuan-do em vários segmentos do ne-gócio imobiliário (o escritórioera dividido em três seções:Seção dos Terrenos, SeçãoPredial e Seção dos Tramways),a Empreza Immobiliaria funcio-nou por poucos anos e chegou aseu final por volta de 1929,quando foi atingida pela reces-são que tomou aquele ano e ar-rasou praticamente todos ossegmentos da economia. Alémdisso, sofreu concorrência gera-da pelas linhas de auto-ônibus eautomóveis que estavam se con-solidando no serviço de trans-portes na região, favorecendoainda mais a decadência daEmpreza. No final da década de1920, encerrou suas atividadese seu patrimônio foi adquiridopelo grupo Simonsen, que crioua Sociedade Imobil iár ia deSanto André.

De papel passado, os Simon-sen substituem os Pujol comoproprietários dos Bairros SantaMaria, Saúde e os demais deSanto André e São Bernardo en-tre 1936 e 1937. A aquisiçãodas áreas, pelos Simonsen, foifeita por arrematação no execu-tivo hipotecário movido porMurray Simonsen & Cia Ltda.contra a Empresa Imobiliáriade São Bernardo e outros[18].

Ademir Medici comenta quea Sociedade tinha uma preocu-pação muito mais comercial doque técnica. Manteve, pois otraçado dos loteamentos – que

Planta atual do Bairro Santa Maria em São Caetano do Sul. Urbanismo desenhado pela Empreza Immobiliaria na década de 1920

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somente sofreriam retalhamen-tos nas décadas seguintes.

Apesar de trafegar, por pou-cos anos, em São Caetano e naregião de São Bernardo, o bon-dinho do Pujol, como era cha-mado, e os trabalhos de urbanis-mo desenvolvidos pelo escritó-rio evidenciam a grandiosidadedo investimento e a importânciada Empreza na história da for-mação urbana das vilas de SãoBernardo.

A Empreza, fundada além dosimples interesse econômico,impulsionou o desenvolvimentourbano de São Bernardo. Seusinvestimentos centraram-se numcomplexo sistema imobiliárioem que o empreendedor detinhatodas as etapas do trabalho e deprodução dos espaços urbanos,ou seja, desde a aquisição dosterrenos até a implantação dainfra-estrutura. Esta posturaadotada pela Empreza estavaacima de muitas imobiliáriasque surgiram a mesma época,pois seus loteamentos não esta-vam associados apenas à divi-são de glebas e à comercializa-ção dos lotes, mas se ligavam auma proposta maior de planeja-mento urbano e ordenação docrescimento da cidade. Princi-palmente pela implantação dosprimeiros bondes da infra-estru-tura, que representam geralmen-te altos custos para escritórios.Além disso, o urbanismo adota-do, influenciado pelo esquemade bairros-jardins, foi uma no-vidade para época que a Em-preza soube muito bem implan-tar. Hoje esses loteamentos en-contram-se consol idados namancha urbana da cidade.

E os bondinhos, mesmo ten-do sido implantados para facili-tar a venda dos lotes, permiti-ram a expansão da cidade e li-garam as áreas em desenvolvi-

mento de São Bernardo, foramtambém um fator de progresso ede transformação da paisagem.Estes fatos mostram o quanto aEmpreza foi importante para odesenvolvimento urbano deáreas de São Caetano, SantoAndré e São Bernardo. Outrasempresas que surgiram depoisdela não tiveram o mesmo graude investimentos e o ideal dosprimeiros invest idores , mastambém são frutos da históriado passado, da história do tem-po dos bondes e também devemser pesquisadas, pois foramagentes do processo de forma-ção da história da cidade.

NOTAS

[1] Nestor Goulart Reis Filho. 1997.Op. Cit., p. 19.[2] Marly Rodrigues. 2001: Op. Cit.,p. 16.[3] Maurice Dobb. Apud Dácio Ottoni.p. 66.[4] Marly Rodrigues. 2001: Op. Cit.,p. 21.[5] Nestor Goulart Reis Filho. 1997:Op. Cit., p. 8-9.[6] E.I.S.B. 1926. Op. Cit., p. 7.[7] Idem. Op. Cit., p. 3.[8] Dácio Ottoni. 1996. Op. Cit., p.42.[9] Idem. Op. Cit., p. 71.[10] E.I.S.B. 1926. Op. Cit., p. 8-9.[11] E.I.S.B. 1926. Op. Cit., p.9.[12] Idem. Op. Cit., p. 15.[13] João Caldeira Neto. 1937. Op.Cit., s.p.[14] RODRIGUES. 2000: 14[15] Marly Rodrigues. Op. Cit., p. 15.[16] Apud. Henry Vernosi.1999. p.6.[17] Jayme da Costa Patrão. Op. Cit.,p. 21.[18] Ademir Medici. Op. Cit., p. 426.

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(*) André Luis Balsante Caram é arquiteto for-mado pela FAUUSP e pesquisador daFundação Pró-Memória de São Caetano doSul.

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O ABC Paulista. Da vila de JoãoRamalho até meados do século XVIIIArlete Assumpção MONTEIRO (*)

TTransferida aVila de Santo

André da Bordado Campo e suapopulação paraSão Paulo de Pira-tininga, em 1560,passaram as terras

da extinta vila ramalhense a ser umbairro paulistano: o bairro rural daBorda do Campo.

No decorrer do final do Qui-nhentismo, a Vila de Santo Andréda Borda do Campo não foi reer-guida. Pero de Magalhães Ganda-vo, descrevendo a terra brasileiraem História da Província deSanta Cruz, possivelmente escritana década de 1570, porque foi edi-tada pela primeira vez em Lisboa,em 1576, refere-se à Capitania deSão Vicente como sendo a últimacapitania da costa marítima brasi-leira. Comenta que nessa capitaniaexistiam quatro povoações: SãoVicente, Santos, Itanhaém e SãoPaulo. Não menciona Santo Andréda Borda do Campo, o que reforçaa idéia de que, durante o séculoXVI, não houve ressurreição davila de João Ramalho, a primeiravila serra acima, após sua destrui-ção, em 1560.

Outra que está a doze légoas pe-la terra dentro chamada Sam Pau-lo, que edificaram os Padres daCompanhia, onde há muitos vizi-nhos, e a maior partte delles, sãonascidos das Indias naturaes da ter-ra, e filhos de Portugueses[1].

Apesar do esforço e empenhodos jesuítas, o povoamento de SãoPaulo era lento.

O povoamento do território

fazia-se devagar e cautelosamen-te por entre peripecias, sustos epezares[2].

No Planalto de Piratininga os je-suítas iam estabelecendo missões;os portugueses e mamelucos insta-lavam fazendas em locais distantesda vila, formando novos núcleos.

Os paulistas, assim isolados, fo-ram adquirindo autonomia e cadavez mais se tornavam ansiosos pordesbravar o vasto interior do conti-nente que os rodeava. Queriam sefirmar, tentar a sorte, ver as riquezascontadas em histórias e lendas. Ointerior os fascinava. Foi se desen-volvendo o orgulho de ser paulista,que os transformou em confiantes edesconfiados. Passaram a duvidardos agentes reais de São Vicente eSantos. Segundo Theodoro Sam-paio, no decorrer da segunda meta-de do século XVI, a população deSão Paulo de Piratininga contavacom 1.500 almas e aproximada-mente 190 fogos[3].

A distância dos órgãos reais edos donatários e seus representan-tes pode ter sido um empecilho pa-ra o crescimento de São Paulo nosseus primórdios. A autoridade dogoverno português – o capitão lo-co-tenente do donatário – ficavaem São Vicente, tendo a barreiranatural da serra. O governo maiorficava na Bahia, inacessível porterra e difícil por mar.

Isto explica o pouco desenvol-vimento de Piratininga e seus con-tornos (...)

Crescia o collegio dos padres,reformando os seus muros, reedifi-cando ou retocando a sua egreja[4].

Da pequena povoação de SãoPaulo saíam caminhos e estradaspara as aldeias e litoral. No decor-rer do Quinhentismo e do Seis-centismo, partindo-se de São Pau-lo, com destino ao litoral, existiam

João Ramalho – Óleo de J. WashtRodrigues – Museu Paulista

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Os Bandeirantes – Óleo de H. Bernardelli(reproduzido por F. Aquarone) –

Biblioteca Municipal de São Paulo

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dois caminhos para se chegar àserra: o Caminho Velho do Mar eo Caminho Novo.

A Câmara dizia, em 1620, queera caminho real (isto é, o princi-pal) muito antigo. Fora o caminhoque, vindo do mar, passava pelaantiga vila de Santo André daBorda do Campo, em território doatual município de São Bernardo, eia dar onde os jesuítas construíramsua capela, em 1554, em São Pau-lo. Era, na verdade, o que já no sé-culo XVI se chamava de CaminhoVelho do Mar, para diferenciá-lo doCaminho Novo, que vinha da vilapelo Ipiranga e com o qual se en-contrava, em algum ponto, entre oque é atualmente Rudge Ramos e ocentro de São Bernardo. Ou, maisprovavelmente, em São Caetanoatual (...)[5].

No final do século XVI, oCaminho Velho do Mar principiavana atual Rua do Carmo e descia avárzea para atravessar os lados daBorda do Campo. No percurso, pas-sava-se por um grupo de moradiasque existiam à beira de um riacho: oIpiranga. De acordo com Sampaio,por esses lados Braz Cubas possuíaterras. Parte delas foi doada para osreligiosos do Carmo, em 1594, paraconstruírem um convento.

Do pateo do Collegio partia nadirecção do sul o caminho velhodo mar pela actual rua do Carmo,descendo para a varzea, contor-nando-a (...) e antes de se perderno horizonte para os lados daBorda do Campo onde existiuSanto André (...)[6].

Além do Anhangabaú saía oCaminho Novo do Mar, que cruza-va a Mata do Caaguaçu (Mapa 10)e ia pela Várzea do Geribativa.

Ao término do Quinhentismo, aoredor de Piratininga cultivavam-semandioca, milho, feijão e criava-segado, inclusive para exportação. Ogado descia a serra, passando pelaBorda do Campo, para abastecer

São Vicente e seu comércio intensi-ficado pela união de Portugal com aCoroa espanhola.

Relata Theodoro Sampaio quea armada de Diogo Flores Valdez,por volta de 1582, vinha abastacer-se em São Vicente[7]. À medidaque o comércio no porto vicentinose firmava com as colônias doPrata, a rota de Piratininga para olitoral e deste para o planalto con-tinuava passando pelo Caminho daBorda do Campo.

O gado descia para o litoral pa-ra abastecer a marinha (...) O assu-car, o algodão, as caixas de marme-ladas, e até escravos eram artigosde commercio com Buenos-Ayres,de onde vinham tambem as pelles, alan e as rendas[8].

Desse modo, as terras da extin-ta vila de João Ramalho, atraves-sada pelo Caminho do Mar, logose transformaram em terras depassagem.

Na época de João Ramalho, parase chegar do litoral ao planalto exis-tia uma trilha de índios muito fre-qüentada pelos tamoios.

Era a antiga trilha que desciapelo vale do Rio Grande até o valedo Ururai (Mogi), ligando-se tam-bém com o vale do Paraíba[9].

A partir de 1560, os viajantespassaram a utilizar outro caminho,o Caminho do Padre José, difícil eperigoso devido às escarpas daserra. A utilização desse novo tra-çado foi determinada pelo Gover-nador-geral em razão da ameaçarepresentada pelos índios inimi-gos, que povoavam as terras da an-tiga trilha indígena.

Vários viajantes que percorre-ram o caminho da serra do final dosQuinhentos até os Oitocentos deixa-ram anotações que se transforma-ram em valiosas informações paraestudos e pesquisas.

O visitador da Companhia deJesus, padre Cristóvão de Gouvêa,acompanhado de Fernão Cardim,empreendeu, em 1585, viagem poresse caminho. Capistrano de Abreuaponta o relato que Fernão Cardimdeixou sobre tal viagem: O cami-nho é tão ingreme que às vezes ía-mos pegando com as mãos (...) opior que nunca vi (...)[10]. A viagemdemorou quatro dias.

Partindo de Santos, os viajantesutilizavam canoas para chegar aCubatão, passagem obrigatória nosopé da serra. Geralmente ali per-noitavam para iniciar a subida daserra pela manhã.

Foi o porto de Cubatão passa-gem obrigatória de todos que de-mandavam o planalto ou ultramaraté o primeiro quartel do séculoXIX (...) Piaçaguera no rio Mogi;pôrto das Almadias ou Santa Cruzno rio Perequê; pôrto Geral deCubatão; foram portanto todosportos de sopé da serra, pontos debaldeação, um substituindo o ou-tro, na medida em que se optavapor um caminho melhor para ini-ciar a penetração por terra, parao planalto[11].

Em Cubatão, nos meados do sé-

Anhanguera – Óleo de TheodoroBraga – Museu Paulista

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culo XVI, os jesuítas construíramum sobrado. Com o passar do tem-po, a propriedade transformou-seem fazenda de pouca produção – aFazenda Geral do Cubatão –, mas,em compensação, os jesuítas obti-veram da Coroa portuguesa a con-cessão para explorar o transportefluvial no Rio Cubatão [12]. AFazenda dos jesuítas, até 1759, foia propriedade de maior relevânciade Cubatão.

Com destino a São Paulo, apósgalgar a serra o viajante chegava àBorda do Campo.

Nos meados do século XVII, aBorda do Campo era um bairro deSão Paulo. Pouquíssimos e disper-sos moradores habitavam essa re-gião. Em 1656, registros apontamque foi nomeado um capitão deOrdenanças para o Bairro da Bordado Campo[13], o qual abrangia as ter-ras que vieram a formar a Freguesiade São Bernardo, atual GrandeABC Paulista [14].

Portanto, se considerarmos obairro da Borda do Campo do sé-culo XVI, este confrontava-se comas paragens do Ipiranga, Ibira-puera (depois Santo Amaro), Tiju-cuçu (depois São Caetano do Sul)e Caguaçu, também conhecido co-mo Mata Grande (depois SãoMiguel e Pilar Velho[15].

No decorrer dos Seiscentos eSetecentos, mesmo tendo os viajan-tes que vencer a serra à maneira deequilibristas, a rota Litoral-Planalto-Litoral continuou sendo feita peloCaminho do Mar, portanto, serpen-teando através da Borda do Campo.

Por volta de 1717, já se podiarealizar o percurso da serra a ca-valo, porém, apeando umas trêsvezes. Depois de três horas, ven-cia-se a subida da Serra de Para-napiacaba. Seguindo a trilha, opernoite geralmente era feito noRio dos Couros. No dia seguinte,prosseguiam a jornada pela Bordado Campo para entrar em Pirati-

ninga em torno de meio- dia.Orville A. Derby descobriu ma-

pa antigo da Capitania de SãoPaulo, Minas Gerais e Rio deJaneiro, na Biblioteca de Évora[16],com data anterior a 1718. Nele háuma descrição de como se processa-va a viagem de Santos a Piratininga.

Embarcasse em canoas, e se vayao pe da serra do cubatam pellamenhã, se sobe a serra, a qual hojeesta capaz de se sobir a cavallo ex-cepto em dous ou tres passos dondese apeyão os que não querem verem perigo; porque pa qualquer par-te onde escorregue se percepta infa-livelmente[17].

A descoberta do ouro nas MinasGerais resultou no despovoamentode São Paulo, acentuado pela utili-zação da rota do Vale do Paraíba pa-ra escoamento da produção atravésdo Porto do Rio de Janeiro. ACapitania de São Paulo estagnou.São Paulo despovoou-se de tal ma-neira que, em 1748, passou a seruma comarca do Rio de Janeiro. Arestauração se deu em 1765.

BIBLIOGRAFIA

ABREU, Capistrano de. CaminhosAntigos e Povoamento do Brasil. BeloHorizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora daUniversidade de São Paulo, 1988.DERBY, Orville A. Um Mappa Antigo dePartes da Capitania de São Paulo, MinasGeraes e Rio de Janeiro, vol. II, Revistado Instituto Historico e Geographico deSão Paulo (1789/1897), S.P., Typ. Aurora,1898.GANDAVO, Magalhães Pero de. Tratadoda Terra do Brasil, História da Provínciade Santa Cruz. Belo Horizonte: Itatiaia;São Paulo; Editora da Universidade deSão Paulo, 1980.MARTINS, José de Souza. O bairro deSão Caetano no censo de 1765. RevistaRaízes, Ano II, nº 3, São Caetano do Sul:Prefeitura de São Caetano do Sul, Julhode 1990.PERALTA, Inez G. O Caminho do Mar co-mo fator de localização, progresso e de-cadência de Cubatão – subsídios para aHistória de São Paulo, São Paulo: USP,FFLCH., História, 1971, Dissertação deMestrado.SAMPAIO, Theodoro. São Paulo dePiratininga no Fim do Século XVI. Revista

do Instituto Historico e Geographico deSão Paulo, vol. IV (1898-1899), S.P.,Typographia Andrade, Mello e Comp., s/d.

NOTAS

[1] GANDAVO, Magalhães Pero de.Tratado da Terra do Brasil, História daProvíncia de Santa Cruz. Belo Horizonte:Itatiaia; São Paulo: Editora da Uni-versidade de São Paulo, 1980, p. 91.[2] SAMPAIO, Theodoro. São Paulo dePiratininga no Fim do Século XVI. Revista doInstituto Historico e Geographico de SãoPaulo, vol. IV, (1898-1899), S.P., TypographiaAndrade, Mello e Comp., s/d., p. 259.[3] SAMPAIO, Theodoro, op. cit., p. 259.[4] Id. ib., p. 259.[5] MARTINS, José de Souza. O bairro deSão Caetano no censo de 1765. RevistaRaízes, Ano II, nº 3, São Caetano do Sul:Prefeitura de São Caetano do Sul, Julhode 1990, p. 12.[6] SAMPAIO, Theodoro, op. cit., p. 259.[7] SAMPAIO, Theodoro, op. cit., p. 276.[8] Id. ib., p. 276.[9] PERALTA, Inez G. O Caminho do Marcomo fator de localização, progresso edecadência de Cubatão – subsídios paraa História de São Paulo, São Paulo: USP,FFLCH, História, 1971, Dissertação deMestrado, p. 8.[10] ABREU, Capistrano de. CaminhosAntigos e Povoamento do Brasil. BeloHorizonte: Itatiaia; São Paulo: Editora daUniversidade de São Paulo, 1988, p. 43.[11] PERALTA, Inez G. op. cit. pp. 8 e 12.[12] "Os jesuítas alugavam canoas e bo-tes para o transporte fluvial entre Santos eCubatão e conseguiam ao menos manter-se graças aos lucros dessa operação".PERALTA, Inez G. op. cit., p. 17.[13] Atas da Câmara Municipal de SãoPaulo. vol. 2, 1637-1660, pp. 465-467,apud SANTOS, Wanderley. AntecedentesHistóricos do ABC Paulista: 1550-1892,**** op. cit., p. 47.[14] SANTOS, Wanderley, op. cit., pp.120/123.[15] SANTOS, Wanderley. AntecedentesHistóricos do ABC Paulista: 1550-1892,op. cit., 1992, p. 47.[16] DERBY, Orville A. Um Mappa Antigode Partes da Capitania de São Paulo,Minas Geraes e Rio de Janeiro, vol. II,Revista do Instituto Historico e Geogra-phico de São Paulo (17896/1897), S.P.,Typ. Aurora, 1898, pp. 197 a 219.[17] DERBY, Orville A., op. cit. p. 201.

(*) Profa. dra. Arlete Assumpção Monteiro édiretora-segunda-secretária do CERU –Centro de Estudos Rurais e Urbanos – USP,docente na Faculdade de Educação daPUC/SP, pesquisadora-colaboradora doCentro de Memória Unicamp/SP e membrodo Gipem

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Fazenda do Capitão João em Mauá

Silvia AHLERS (*)

QQ uatro de Junho de 1861.Nesse dia, em Pilar, na

Freguesia de São Bernardo,em casa de morada do capitãoJoão José Barboza Ortiz, esta-vam reunidos ele, seu vizinhoe primo Antonio Franco daRocha, Joaquim Lopez daSilva, Antonio Mauris Cava-lheiros e as irmãs do capitão,dona Escolást ica JoaquinaOrtiz e dona Catharina MariaOrtiz. Estas últimas passaramprocuração para o irmão ven-der suas terras. Por não sabe-rem escrever, assina por elas,ao rogo, Antonio Franco daRocha.

No dia seguinte, o Barão deMauá, representado por seuprocurador José Ricardo Wri-ght, iria concretizar mais umde seus negócios, is to é , acompra de duas grandes fa-zendas: Cagassu, do capitão ede suas irmãs, e Capuava, depropriedade do capitão João.

A A F E R R O V I AF E R R O V I A SS A N TA N T O SO S ––Jundiaí avançava serra acima.O Barão havia previsto terrí-veis desmoronamentos, mas osengenheiros ingleses iam su-bindo com ajuda dos patama-res e, em breve, iriam atingir oplanalto. As duas grandes fa-zendas ocupavam extenso ter-ritório, correspondendo hojeao que vai de Santo André aRio Grande da Serra. A sedeera bem próxima do Km 54,em Pilar, em frente à linha fér-rea, uma casa importante, doalto de seu terraplano, com

grossas paredes em taipa depilão, alpendre e sotão.

O capitão João era homeminfluente no lugar. Nascido em1797, filho do tenente Fra-cisco Barboza Ortiz e de donaJoaquina Conceição Ortiz, foicinco vezes juiz de paz a par-tir de 1846. Dono de outrosimóveis em São Paulo, resolvevender suas terras e as de suasirmãs, herdadas da mãe. Osterrenos iriam fazer parte deoutros planos e do recenteprogresso que São Paulo co-nhecia; entre eles, a constru-ção da ferrovia.

Joaquim Florindo de Cas-tro, tabelião, depois de anotaras palavras de praxe e receberas procurações das Irmãs Es-colásticas Joaquina e Catha-rina e também do Barão deMauá, sela o compromisso decompra e venda entre as par-tes. O preço? A primeira, Ca-

guassu, por quatorze contos equinhentos mil réis, a segun-da, Capuava, por oito contosde réis. A soma totalizou vintee dois contos e quinhentos milréis . O superintendente daCompanhia da Estrada deFerro Santos-Jundiaí, sr. JoãoJames Aulistin, assinou muitasescrituras de compra de terraspara a passagem do leito daferrovia.

Por que haveria o Barão decomprar duas fazendas tãograndes?

O fato é que, em 1863, oBarão vendeu suas ações daferrovia e logo iria se desen-cantar com o lugar. Quem ha-via previs to uma mina deprosperidade na região, aoapreciar o algodão nascendoespontaneamente às margensdo Rio Tietê, depois de per-correr algumas vezes a estradae acompanhar pessoalmente

Sede da Fazenda Capitão João, depois Fazenda Barão de Mauá, em taipa de pilão, alpendre e sótão. Demolida para a construção do viaduto Juscelino

Kubtischek de Oliveira – 1974, Mauá, São Paulo

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um pouco do trabalho, passoua ter dificuldades no empreen-dimento e acabou falindo.

Em 1867, a ferrovia é inau-gurada. Dentro de mais algunsanos as duas enormes fazen-das, com mata virgem, boamadeira e solo superior para acultura de cereais, juntamentecom outras propriedades me-nores, situadas hoje em terri-tór io da cidade de SantoAndré, compradas de ManoelLeandro Soares, capitão An-tonio Mariano, Maria das Do-res, Antonio José de Siqueira,Feliciano Antonio MarianoFagundes, José de Barros eJesuíno José Soares, entre ou-tros, passam a fazer parte damassa falida de Mauá & Cia esão arrematadas por AntonioQueiroz dos Santos em pri-meiro de Julho de 1892.Ninguém mais iria lembrar-sedo Barão. Bem, quase nin-guém. Na Pilar de então suafama iria continuar por muitosanos mais.

Em primeiro de Abril de

1883 é inaugurada a EstaçãoFerroviária Pilar, bem no cen-tro, entre as sedes de duasgrandes fazendas: do capitãoJoão e do Sítio Bocaina. Em1926, o nome da vila, agorapromovida a distrito de paz,muda para Mauá, em homena-gem ao pioneiro das ferrovias,e as terras da massa falida sãodivididas e loteadas progressi-vamente, formando uma partedo Grande ABC, na regiãometropolitana de São Paulo.

A sede dessa importante lo-calidade, depois de servir aoutras famílias, passa a fazerparte dos sonhos e pesadelosda infância de Ivone Noim.Seu pai, Roberto Noim, em-pregado da ferrovia por mui-tos anos, tomou conta das ter-ras que já haviam pertencidoao capitão João, no Km 54.

A ferrovia corta cinco dassete cidades do Grande ABC,com viadutos passando de umlado para o outro, mas sem amínima preocupação com nos-so patrimônio cultural. No dia

dois de Abril de 1974, os tra-tores iniciam a demolição dascasas vizinhas ao do senhorRoberto Noim. A construçãode taipa fica cai-não-cai, nabeira de um barranco, até queseus moradores se rendem.Em 15 dias constróem uma ca-sa no terreno em frente e a se-de é demolida.

Hoje, nesse local, quem en-tra na cidade de Mauá vê ossímbolos do Lions e do RotaryClub. Os carros passam rápidona avenida que recebe os no-mes de João Ramalho e, logoem seguida, capi tão João,atravessando a c idade deMauá. Acompanhando o leitoferroviário pelo lado esquer-do, segue para Ribeirão Pires,quando muda de nome paraHumberto de Campos. Do ca-pi tão João e sua fazenda?Restaram as placas indicativasao longo da avenida (Agra-decimento ao professor CarlosAlberto Cerqueira Lemos, quenos conduziu pelos caminhosda pesquisa).

Documentos Primários:

- 1º Tabelião de Notas da Capital deSão Paulo – Livros de Escrituras –1860 até 1867.- Planta da Fazenda denominadaBarão de Mauá – Terras Colonizaçãoe Migração – São Paulo – Nove deAgosto de 1867 – escala 1:5000 –Acervo: Ladir Thon- P lanta do lugar denominadoFazenda do Barão de Mauá – enge-nheiro João Borges Ferraz – 1887 –escala 1:10.000 – Acervo: Ladir Thon- Transcrições das cartas do Barãode Mauá – Inst i tu to His tór ico eGeográf ico do Rio de Janei ro –1860/1861/1862

Festa no alpendre da casa da Fazenda Capitão João, pouco antes da demolição, em 1974. Mauá, São Paulo

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(*) Silvia Ahlers é professora e diretora daCasa de Cultura de Mauá

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Wilson Roberto Stanziani de SOUZA (*)

AAVila de Paranapiacaba, lo-calizada no Município de

Santo André, possui, em seupatrimônio construído, exem-plares do final do século XIXque, reunidos, formam variadocaldeirão de arquitetura, equi-pamentos ferroviários e solu-ções urbanas de grande relevân-cia histórico-tecnológica. A vi-la, reconhecida estadualmente,encontra-se em processo de re-conhecimento nacional e muni-cipal como patrimônio cultural.

A Vila de Paranapiacaba estádividida em Parte Alta ouMorro, Pátio Ferroviário, VilaVelha e Vila Martin Smith ouVila Nova. Parte Alta ou Morroé uma área edificada em eleva-ção natural, habitada por anti-gos moradores de origem portu-

guesa, italiana e espanhola eforma núcleo construído em

terras devolutas, onde os habi-tantes negociam compra e ven-da de casas há muitos anos.Desse modo, o local desenvol-veu-se de forma espontânea,com ruas estreitas e sinuosas. OPátio Ferroviário reúne a linhado trem, as edificações de ma-nutenção e guarda dos veículosferroviários e também a Má-quina-Fixa. A Vila Velha, porsua vez, é o local onde se ini-ciou implantação irregular de-senvolvida pelos ingleses.Nessa região, podemos destacaro conjunto de edificações doHospital do Alto da Serra. Porfim, a Vila Martin Smith é onúcleo de moradia hierarquiza-da, com quadras disciplinadas ecasas construídas em lotes de-finidos, toda planejada pelosengenheiros da São PauloRailway.

O patrimôniocultural de Paranapiacaba

Vista geral daVila deParanapiacaba –Ano 1967Jo

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Cada vez mais estudada porpesquisadores, professores uni-versitários e estudantes, Para-napiacaba tem a vocação de serum modelo de preservação, jus-tamente pela sua variedade desituações, dando um tom de va-lorização que vem sendo trazi-do à tona cada vez mais comoforma de conservar e reconhe-cer todo esse bem. Toda a pe-culiaridade urbana da vila deveser vista com olhos cada vezmais esclarecidos e como sendoparte do processo de soluçãoque o homem criou para facili-tar e confortar sua vida dentrode um espaço desvendado paraabrir caminho ao transporte fer-roviário e desenvolver implan-tações de núcleos de moradia eserviços. Isso fez com que aVila de Paranapiacaba se tor-nasse símbolo de desenvolvi-mento da indústria cafeeira,uma vez que o café ia do inte-rior à baixada santista via trem,e de lá, por meio de navios,cruzava o mar rumo à Europa.Os empresários ingleses encon-traram, no Alto da Serra - atualParanapiacaba -, o local idealpara o abastecimento dos trensque deveriam subir a serra atra-vés do Sistema Funicular (achamada Serra Velha, inaugura-da em 1867, foi o primeiroSistema Funicular empregadopara transpor a Serra do Mar).

PPÁTIOÁTIO - - Dentro do conjunto fer-roviário da antiga São PauloRailway Co. , os edif ícios eequipamentos férreos existentesem Paranapiacaba são: relógioda estação; galpões; depósitos edemais instalações ferroviárias,que compõem conjunto repre-sentativo da arquitetura ferro-viária e dos equipamentos fer-roviários em São Paulo, in-cluindo o edifício e os equipa-

mentos remanescentes dosPlanos Inclinados.

Desse equipamento férreoexistente, temos a 4ª Máquina-Fixa, fabricada pela WilliamFairbairn & Sons, de Man-chester; e o Serra-Breque ouCarro-Freio, estacionado sobretrilhos assentados em dormen-tes do tipo panela de ferro fun-dido ou Sistema Greave. Todoslocalizados no 4º Patamar.

A Serra Nova, também cha-mada de Segundo Sis temaFunicular, foi inaugurada em1901 e possui conjunto deequipamentos que fazem partedesse patrimônio. Por isso te-mos o trecho correspondente aoultimo Plano Inclinado, entre o4º e o 5º Patamares; a 4ª e a 5ªMáquinas-Fixas e respectivosedifícios; a Casa de Caldeiras eseus equipamentos; o trecho daVia Permanente, incluindo oSistema de Cabos e Polias; oSis tema de Comunicação eSinal ização, I luminação eForça. Todos esses equipa-

mentos estão localizados entreo 4º e o 5º Patamares e estãopreservados como patrimôniocultural-tecnológico. São com-plexos e raros exemplares demecanismos utilizados em re-giões serranas.

No tocante aos veículos fer-roviários, temos três locobre-ques fabr icados pela Kerr-Stuart Ltd., de 1900, identifi-cados pelos números 02, 04, e11 (na verdade, trata-se, res-pect ivamente , dos números662, 664 e 671); quatro loco-breques fabricados pela RobertStephenson & Co., de 1901,identificados pelos números 14e 15, mas saídos da fábricacom os números 3066 e 3068 ;o locobreque identificado pelonúmero 17, do ano de 1903,cujo número de fabricação é3112; e o locobreque número20, de 1921, fabricado com onúmero 4035.

Os equipamentos rodantesutilizados pela SPR Co. consti-tuem acervo significativo para amemória ferroviária. Desta-camos a locomotiva a vapor nú-mero 15, bitola 1,60m, fabrica-da pela Sharp, Stewart & Co.Ltd, em 1862; a locomotiva avapor tipo Decauville, bitola0,60, número de fabricação1015, produzida pela Kerr &Stuart Co., de London/Stoke,em 1907; o carro de Pedro II,fabricado pela São PauloRailway Co. em 1879; o vagãofúnebre número 16, bitola 1,60,fabricado pela São PauloRailway Co. em 1907; dois va-gões - números 111 e 112 - parapassageiros de primeira classe.Ambos fabricados pela SãoPaulo Railway Co; e dois va-gões para passageiros de segun-da classe, números 188 e 451,também fabricados pela SãoPaulo Railway Co. Todos esses

Torre do Relógio Big-Ben, reconstruída após o incêndio da

Estação de Paranapiacaba em 1967 –Ano de 1999

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bens estão incluídos na Re-solução n-º 37, de 30 de Setem-bro de 1987, que tomba o patri-mônio cultural de interesse his-tórico, arquitetônico-urbanísti-co, ambiental e tecnológicoatravés da Secretaria da Culturado Estado de São Paulo.

SS MITHMITH – – A Vila Martin Smith,também conhecida como VilaNova, é parte de conjunto urba-nístico planejado para uso espe-cializado, isto é, trata-se deuma vila ferroviária. No intuitode manter os empregados porperto e facilitar a fiscalizaçãodo trabalho, os empresários in-gleses criaram moradias próxi-mas à empresa. Isso, em reali-dade, espelhava divisão hierár-quica resultante da RevoluçãoIndustrial. Com efeito, a hierar-quização subdividiu a implanta-ção da Vila Martin Smith emdiversas escalas arquitetônicase criou várias tipologias utili-zadas pelos funcionários deacordo com a situação traba-lhista dentro da empresa. Ochamado Castelinho, residênciaconstruída sobre uma elevaçãonatural, em ponto estratégico deonde se visualiza toda a Vila,representava a escala maiordesse conceito e isolava o enge-nheiro-residente do restante dosmoradores, criando melhorespossibilidades de fiscalização.

Entre as tipologias existen-tes, temos as Casas Isoladas deAlto Padrão, as Geminadas deDuas, as Geminadas de Três, deQuatro e de Cinco. Incluem-se,ainda, as Casas de Solteiros,que recebiam os ferroviários re-cém-chegados e soli tár ios.Todas essas residências são re-sultados de projetos bem-ela-borados e construídos princi-palmente à base de madeira, ge-ralmente pinho de riga, e telha

francesa (além do ferro dos tri-lhos utilizados como vigas).Dentro do conjunto de edifica-ções, temos ainda exemplaresde construções comerciais, co-mo o Antigo Mercado, que pos-sui sistema cruzado de ventila-ção através de óculos em suasentradas e venezianas em suaslaterais.

Há ainda as edificações des-t inadas ao convívio socia l .Exemplo disso é o Velho Lira,agremiação que reuniu aprecia-dores de musica e que, poste-riormente, uniu-se ao Clube deFutebol. Funcionaram juntos,na década de 30, nas depen-dências do edifício do UniãoLira Serrano, projetado e cons-truído especialmente para serum clube.

O grande edifício do UniãoLira Serrano também é bastantepeculiar, pois, mesmo manten-do, em relação ao conjunto davila, as mesmas característicasoriginais das outras edificações,apresenta soluções espaciaisbastante diversificadas. Exem-plo disso é o salão principal -

ao mesmo tempo quadra polies-portiva e salão de bailes, comcamarotes apropriados aos altosfuncionários da empresa - ,transformado em sala de cine-ma. Possui, também, outras de-pendências, como é o caso dasala de sinuca.

A Vila Martin Smith, cons-truída juntamente com a novalinha da estrada, é resultado deum planejamento urbano queincluiu ruas principais, ruas se-cundárias e vielas sanitárias,formando quadras em que asmoradias praticamente se pos-tavam encostadas umas das ou-tras. Esse grande tabuleiro dexadrez facilitava a fiscalizaçãodos ferroviários e de seus fa-miliares.

VV I L AI L A VV E L H AE L H A - - É um conjuntoque apresenta as edificaçõesmais antigas. É a base da infra-estrutura da ferrovia, principal-mente em relação à assistênciamedica, devido ao Hospital doAlto da Serra, constituído defarmácia, salas de cirurgia, ne-crotério e salas de consulta.

Vista geral da Vila de Paranapiacaba. A Torre do Relógio Big-Bem está no centro

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Além disso, há salas de interna-ção (antes destinadas ao alto es-calão da empresa), casa infecto-contagiosa (espaço de isola-mento), dependências de fun-cionários e lavanderia.

A implantação da Vila Velhaé totalmente irregular quanto alotes e ruas, tendo sido todasas edificações construídas emtorno do chamado Caminho doHospital Velho. É o conjunto deedificações mais antigo de todaa Vila de Paranapiacaba. Nessaárea existe também a Rua Di-reita, considerada a primeirarua construída na vila e onde seestabeleceram farmácias, coo-perativas, padarias etc. No fimdessa rua temos exemplares dasprimeiras moradias geminadas.

Como era comum a todas asedificações, as instalações sani-tárias eram externas e possuíamsistema de esgoto, construídopor canelados em pedra, que re-cebia águas - vindas do sistemade águas do que se denominahoje Parque das Águas – pormeio de canaletas que passa-vam por baixo das pequenasedificações dos sanitários.Funcionava como uma espéciede descarga: havia uma peque-

na caixa triangular, de ferro,acionada por uma torneira quea enchia de água. Quandocheia, derramava toda a água,como uma descarga, o que au-mentava o volume da corrente ecarregava os dejetos.

MM O R R OO R R O - - No Morro ou ParteAlta ocorreu ocupação espontâ-nea, desenvolvida em encostanatural voltada para o pátio fer-roviário (é comum, aliás, em ci-dades européias, encontrar-mosimplantações em elevações vol-tadas para o mar). As edifica-ções encontradas nesse núcleosão (algumas) térreas e (outras)assobradadas, com sacadas,mostrando assim influênciasportuguesas, italianas e até es-panholas. As ruas são estreitase sinuosas e, como que paraproteger e aproximar (o que defato aumenta a segurança), asedificações em alvenaria (oumadeira) e telhas de cerâmicaexpressam a tradição do sul daEuropa e estão associadas aoemprego do material técnico-construtivo adotado pelos in-gleses em Paranapiacaba. NaParte Alta concentraram-se asatividades comerciais de abas-

tecimento, parte integrante douniverso urbano instalado noAlto da Serra do Mar. Fun-cionavam aí os estabelecimen-tos comerciais, hotéis e pensõesque recebiam aqueles que vi-nham buscar emprego na SãoPaulo Railway.

No cume do Morro foi cons-truída a Igreja Bom Jesus deParanapiacaba. Esse procedi-mento, também verificado emoutras cidades brasileiras, re-presenta o domínio do catolicis-mo como principal expressãoreligiosa do povo.

MM E M Ó R I AE M Ó R I A - - A localização daVila de Paranapiacaba semprecriou certo isolamento geográ-fico, o que ajudou a limitar oempreendimento de novasconstruções na Mata Atlântica(hoje área de mananciais) .Talvez por isso a memória dosmoradores tenha se conservadocheia de histórias e lembranças.Daí, portanto, a necessidade dedesenvolver e manter projetocom vistas a registrar a memó-ria oral, o que viabilizaria oresgate de lembranças relativasà construção da estrada de fer-ro, a acidentes, a momentos dealegria e à curiosidade desper-tados pelos bailes de carnavalnos clubes, ao futebol...

Sobre a São Paulo Railway,sobre a Est rada de FerroSantos-Judiai e, por fim, sobrea Rede Ferroviária Federal,possuímos preciosos relatosfeitos por ex-ferroviários e fa-miliares, muitos dos quais hojemoram em outras cidades doABC.

(*) Wilson Roberto Stanziani de Souza é ar-quiteto, museólogo e gerente de projetos eassuntos patrimoniais da subprefeitura deParanapiacaba e do Parque Andreense

Casas demadeira da Vila deParanapiacaba.Estãolocalizadas emtrecho doMunicípio deSanto André –Ano de 1999F

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Paranapiacaba e Educação Patrimonial

Suzana Cecília KLEEB (*)

PParanapiacaba, vila ferroviáriade origem inglesa construída

na segunda metade do século XIX,é um tema desafiador. Memo-rialistas, estudantes, professores,artistas, pesquisadores já se dedi-caram ou se dedicam à sua com-preensão sob os mais diversos ân-gulos e à luz de diferentes metodo-logias e visões de mundo.

Mas qual o fascínio que a Vilade Paranapiacaba exerce, a pontode estimular a constante produçãode novos trabalhos e de novasabordagens? Será a neblina que,em muitos momentos, encobre e,subitamente, nos deixa ver frag-mentos de suas casas? Será a his-tória de luta que insiste em se fazerpresente, seja aquela, anterior, devencer a subida íngreme da Serrado Mar ou, a atual, pela manuten-ção do espaço-símbolo dessa con-quista? Será a condição peculiarde sua arquitetura organizada cui-dadosamente para produzir ummeio de transporte eficaz e rentá-vel aos propósitos da exportaçãocafeeira e aos interesses do capitalinglês? Ou, ainda, seriam as fasci-nantes memórias de operários fer-roviários e de suas famílias queconviveram com a diversidadecultural e peculiaridades daqueleespaço na Serra do Mar que, si-multaneamente, simbolizava localde trabalho, de moradia e de lazer?Várias suposições poderiam serenumeradas, mas talvez não en-

contraríamos uma resposta com-pleta.

A riqueza peculiar dessa Vilafaz dela um exemplo de patrimô-nio cultural como poucos. Para-napiacaba é sobrevivente de ummomento histórico que lançou asbases do desenvolvimento da re-gião e do Estado de São Paulo.Apesar da precariedade de suacondição atual, encontramos ele-mentos que respaldam aquele pe-ríodo. Ali também estão presentesmarcas da coletividade ferroviá-ria, com suas desigualdades econflitos, vivenciados durantemais de um século. E, se isso nãobastasse, Paranapiacaba está en-volta pela Serra do Mar que, alémda importância histórica, é umadas poucas áreas remanescentesda Mata Atlântica, caracterizadacomo uma das mais diversas domundo. Junto à Vila localizam-seo Parque Estadual da Serra doMar e a Reserva Biológica deParanapiacaba.

A manutenção e a valorizaçãoda condição de patrimônio culturalde Paranapiacaba dependem deações múltiplas que envolvam pla-nejamento e implantação de proje-tos de impacto ambiental e turísti-co, obras de recuperação e restaura-ção de bens imóveis e móveis,obras de infra-estrutura e projetosde caráter social, cultural e educati-vo, entre outras. São ações de mé-dio e longo prazo com as quais serápossível reerguer a estima e identi-dade de moradores e visitantes.

EEDUCAÇÃODUCAÇÃO - - Uma forma interes-sante e estimuladora para a pro-moção do reconhecimento dessepatrimônio cultural é o uso dametodologia de Educação Patri-monial. Aplicada no Brasil emmuseus e sítios históricos desde adécada de 1980, essa metodolo-gia visa à construção da cidada-nia através de uma relação diretacom o público.

Em linhas gerais, EducaçãoPatrimonial é entendida como...um processo permanente e sis-temático de trabalho educacionalcentrado no Patrimônio Culturalcomo fonte primária de conheci-mento e enriquecimento indivi-dual e coletivo. A partir da expe-riência e do contato direto comas evidências e manifestações dacultura, em todos os seus múlti-plos aspectos, sentidos e signifi-cados, o trabalho de EducaçãoPatrimonial busca levar as crian-ças e adultos a um processo ativode conhecimento, apropriação evalorização de sua herança cul-tural, capacitando-os para ummelhor usufruto destes bens, epropiciando a geração e a produ-ção de novos conhecimentos,num processo contínuo de cria-ção cultural[1].

Existem várias formas de abor-dagem que podem ser utilizadasem uma proposta de EducaçãoPatrimonial para um sítio históricocomo Paranapiacaba. Diversosmateriais de apoio também podemser adotados. Mas, sejam quais

O futuro não nos traz nada, não nos dá nada; nós é que, para construí-lo, devemos dar-lhe tudo (...) Mas para dar é preciso ter e não temos outra seiva senão

os tesouros herdados do passado e digeridos, assimilados, recriados por nós.Simone Weil

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forem a forma e os materiais utili-zados, deve-se estar atento paraque o grupo que irá participar dotrabalho educacional seja de faixaetária e maturidade semelhantes eque receba informações préviassobre o local. O que se pretende éque os participantes possam: ob-servar o espaço, tanto o todo co-mo os detalhes que o compõe; re-gistrar suas observações atravésde fotografias, desenhos, descri-ções orais ou verbais; explorar eanalisar as informações disponí-veis, tanto na visita ao local comoem outras fontes (bibliotecas, jor-nais etc.); e, após a discussão dosproblemas levantados, realizar ati-vidades de apropriação que envol-vam o grupo na recriação e inter-pretação das propostas apresenta-das (através de textos coletivos,peças de teatro, pinturas, escultu-ras, poesias etc.).

Os resultados de trabalhos de-senvolvidos a partir da metodolo-gia de Educação Patrimonial po-dem ser vistos em vários pontosdo país. A resposta é positiva tantoem comunidades que resguardamo seu patrimônio e suas relíquiasculturais como naquelas em queesta ação ainda não é feita de ma-neira consciente e sistemática.

EEXPERIÊNCIAXPERIÊNCIA - - Com o intuito decontribuir para o processo de va-lorização da herança cultural re-presentada pela Vila de Parana-piacaba, o Museu de Santo An-dré, da Secretaria de Cultura,Esporte e Lazer da Prefeitura deSanto André, vem desenvolvendoproposta de ação denominadaParanapiacaba, valorização dopatrimônio cultural começa nainfância. Estão envolvidas esco-las municipais, estaduais e parti-culares de ensino fundamental,para alunos de 1.ª a 4.ª séries,grupos do MOVA (Movimentode Alfabetização de Jovens e

Adultos) e agentes ambientais daSubprefeitura de Paranapiacaba eParque Andreense, da Prefeiturade Santo André.

A partir de nossa experiênciana orientação dada ao segmentoeducacional descrito no parágrafoanterior, pudemos detectar que ha-via carência de conhecimentos ede estratégias de atuação quando oassunto se relacionava a patrimô-nio cultural e, em especial, aParanapiacaba.

Além disso, acreditávamos queos professores poderiam, desde osprimeiros anos escolares da crian-ça, estimular a compreensão e oexercício do conceito de conserva-ção, seja do meio ambiente, dosbens culturais ou das memórias in-dividual e coletiva.

Queríamos, também, propormudança na forma como, na maio-ria dos casos, as visitas a Para-napiacaba eram feitas: uma excur-são para um lugar desconhecido eque despertava o interesse apenaspor ser diferente. Estávamos indouma vez na vida e, provavelmente,não voltaríamos mais. Assim, gos-taríamos que a Vila fosse aprecia-da em todos os seus contornos –cultural, ambiental, turístico, de la-zer –, mas de maneira mais cons-ciente quanto ao valor que ela re-presenta para a coletividade.

Foi realizado, inicialmente, umcurso de formação dedicado a pro-fessores e agentes ambientais, evi-denciando-se aspectos históricos,ambientais, arquitetônicos da Vilae aspectos teóricos referentes aoconceito de Patrimônio Cultural ede Educação Patrimonial. As ativi-dades práticas do curso levaram aoreconhecimento de patrimôniosculturais existentes no centro deSanto André e na própria Vila deParanapiacaba. Depois do curso,professores e agentes ambientaispassaram a ser, em seus locais detrabalho, multiplicadores do co-

nhecimento adquirido.Cada instituição envolvida no

projeto recebeu um kit de apoio avisitas a Paranapiacaba. Criadocomo um elemento facilitador narelação da criança com o conceitoabstrato de Patrimônio Cultural, okit procura instigar a atenção, a ob-servação, a memória e a criativida-de do grupo. Ele é formado por se-te jogos interativos que enfocamimagens e conteúdos relacionadosa Paranapiacaba e que podem serutilizados em vários momentos:antes da visita, como forma de co-nhecimento do que poderá ser vis-to na Vila; durante a visita, comoum fator de observação da realida-de; e depois da visita, como umelemento de avaliação. Os jogosnão possuem regras rígidas, sendoque estas podem ser criadas pelospróprios jogadores de acordo comos seus interesses.

Além da atividade lúdica e pra-zerosa do jogo, o Kit de Apoio àsVisitas permite ainda que outroscampos de conhecimento, comoLíngua Portuguesa, História,Geografia, Ciências, Matemáticaetc, possam ser aguçados. A pro-dução desse material contou comapoio e recursos financeiros daFundação Vitae e auxílio daAmusa – Associação Amigos doMuseu de Santo André.

Após quase um ano e meio detrabalho, pudemos observar osprimeiros resultados. Os alunosmostraram-se motivados a realizaras atividades, permitindo, assim,que os objetivos propostos fossematingidos. No tocante à observa-ção do espaço, valorizou-se a per-cepção da riqueza de detalhes quecompõem a Vila, e não apenas oconjunto urbano e natural. Os jo-gos do kit foram reforço impor-tante para a observação minuciosade detalhes que, no conjunto, te-riam talvez passado despercebi-dos. Em alguns casos, não houve

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a ida a Paranapiacaba, tendo sidoo kit utilizado em sala de aula. Noque diz respeito ao registro da ob-servação, alguns elementos mar-caram bastante as visitas (como éo caso do relógio, da passarela edo Castelinho, que foram dese-nhados de diferentes ângulos).Quanto à exploração e análise domaterial, em várias escolas criou-se espaço destinado a Parana-piacaba, composto de livros, re-vistas, artigos de jornais, fotogra-fias etc e que cresce a cada diacom novas contribuições de alu-nos e da comunidade. Em relaçãoà apropriação, a releitura da Vilafoi feita através de acrósticos(composições em que as letras ini-ciais de cada verso, lidas no senti-do vertical, formam uma palavraou frase), poesias, novos jogos,teatrinhos, exposições, maquetes eabaixo-assinados solicitando aconservação de Paranapiacaba.

Os professores e agentes am-bientais consideram-se, hoje, maiscríticos e atentos à cidade. Muitos,inclusive, tiveram o primeiro con-tato com o conceito de PatrimônioCultural e a história de Parana-piacaba no curso de formação. Ascrianças, por sua vez, têm realiza-do ações que visam desenvolverpostura conservativa frente ao pa-trimônio cultural e natural, alémde levar pais e comunidade a refle-tir sobre o destino da Vila, enxer-gada e assumida como herançacultural de todos.

A título de informação, os fru-tos iniciais desse trabalho foramapresentados no 1.º Seminário deIdéias sobre Educação Patrimo-nial em Santo André, realizadoem Dezembro de 2001. Estamos,agora, aguardando o tempo decolher o resultado da sementeque lançamos, isto é, esperamosver brotar indivíduo com atitudemais ativa frente ao meio em quevive e, justamente por isso, capaz

Trilhas de Paranapiacaba:umahistória no caminho da Mata Atlântica

Valdemar Campião JÚNIOR (*)

AA pós o descobrimento doBrasil, em 1500, os portu-

gueses começaram a ocupar todaa costa litorânea do país e impul-sionaram o desenvolvimento dolitoral sudeste paulista. Com a sa-turação da ocupação da faixa lito-rânea paulista com a agricultura(hoje a região de Santos), fez-senecessária a ocupação do planaltopara a expansão das áreas férteis.

Em torno de 1504, iniciam-seexpedições para o planalto paulistaatravés da Trilha dos Tupininquins- hoje chamada de Trilha do Valedo Rio Mogi -, que passava por on-de atualmente se encontra Para-napiacaba. Essa trilha foi usada atéaproximadamente 1560, quandohouve uma revolta dos índiosTupiniquins no intuito de proibir apassagem do homem branco poressa trilha. Paranapiacaba, aliás,surgiu, por volta de 1861, comocanteiro de obras da primeira ferro-via do Brasil.

Outro caminho histórico é aTrilha da Pontinha, utilizada paraa manutenção do reservatório deágua destinado ao abastecimento

das locomotivas a vapor. Trata-sede uma trilha de 1050 metros,com início na Estrada Velha deParanapiacaba e término na barra-gem d’água do Núcleo Tanque doGustavo, onde podemos encontrarrios e uma piscina natural.

Há também a Trilha da Co-munidade, outrora utilizada porsociedade alternativa que prega-va a profecia apocalíptica (era li-derada pelo sr. Ventura, refugia-do político da época da ditadu-ra). Nesta trilha podemos encon-trar um caminho de mata densae, no topo, exatamente onde fi-cava a comunidade, encontramospedras empilhadas.

Patamar é outra trilha que re-monta à época da ferrovia. Pelocaminho vemos o mecanismo queos trens usavam para subir e des-cer a serra no começo do século.As pontes que permitiam a liga-ção planalto-litoral localizavam-se em lugares muito elevados. Avista é magnífica, podendo-semesmo enxergar o mar.

(*) Valdemar Campião Júnior é engenheiroagrônomo e gerente de recursos naturais

de fazer uma leitura do mundoque o rodeia, levando-o à com-preensão do universo sócio-cul-tural e da trajetória histórico-temporal em que está inserido.Esse processo leva ao reforço daauto-estima dos indivíduos e co-munidades e à valorização dacultura brasileira, compreendidacomo múltipla e plural[2].

NOTAS[1] HORTA, Maria de Lourdes Parreira,GRUNBERG, Evelina, MONTEIRO,

Adriane Queiroz. Guia Básico deEducação Patrimonial, Brasília, IPHAN,Museu Imperial, 1999, p.6.[2] HORTA, Maria de Lourdes Parreiraet allii, op. cit. p.6.[3] O projeto Paranapiacaba, valoriza-ção do patrimônio cultural começa nainfância teve coordenação comparti-lhada com Eliana Marcon Tramontinaaté Dezembro de 2000.

(*) Suzana Cecília Kleeb, historiadora doMuseu de Santo André e coordenadora doprojeto Paranapiacaba, valorização do patri-mônio cultural começa na infância[3]

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Carlos da COSTA (*)

LL ocalizada em plena MataAtlântica, patrimônio na-

tural de grande importância nomundo, tombada pela Unesco,a Vila de Paranapiacaba tem,nos aspectos histórico, huma-no, arquitetônico e natural, abase para a transformação empólo de turismo sustentável.Quando os ingleses trouxerama ferrovia para o Alto daSerra, em 1860, em meio a ne-blina tão peculiar, não imagi-navam que, em pleno novomilênio, a torre do relógio daestação, o Castelinho (Centrode Preservação da Memória),o Funicular, o União LiraSerrana (Clube), as residên-cias com arquitetura portugue-sa da Parte Alta, a Capela de

São José da Boa Viagem e tu-do mais que cercava aquela

comunidade, tão importantepara o desenvolvimento dopaís, seria resgatado para queas pessoas pudessem apreciarturismo de alta diversificação.

Para que isso seja total erealmente viável, algumasobras estão sendo executadas:capacitação da própria comuni-dade para entendimento maiorsobre o Turismo (PNMT),(Sebraetec etc.); programas degeração de renda (Entrepostode Artesanato, Monitoria doParque das Águas etc.); elabo-ração de calendário de eventos(Festival de Inverno, resgate defestas tradicionais etc.); cria-ção do Conselho Municipal deTurismo e seu Fundo; Plano deDesenvolvimento para a Vila eArredores.

Claro que não podemos dei-xar de lembrar a grande voca-ção para o Ecoturismo. Nesse

No alto da serra seavista Paranapiacaba

Parte alta de Paranapiacaba, onde aparecem as casas de madeira, algumas com balcões. Ano de 1999

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Torre do relógio conhecido como Big-Bem e a antiga sala de manobras. Ao fundo a Capela de Paranapiacaba. Ano de 1999

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ponto, tomando todas as pre-cauções para que não haja ex-cessos, nossa mata, que abraçatoda a Vila, vem sendo palcode alguns esportes de ação.Assim, o chamado Turismo deAventura vem servindo de ins-trumento de conscientizaçãoaos menos avisados e preocu-pados com a preservação doParque Estadual (que, infeliz-mente, vem sofrendo as conse-qüências de anos e anos de

abandono e deficiência estru-tural em relação à recepçãodos visitantes na Vila).

O charme de se chegar aParanapiacaba de trem, co-mum até meados dos anos 90,hoje só é possível nos finaisde semana. Os horários sãorestritos, mas vale a pena sairda Estação de Rio Grande daSerra e sentir o gostinho doprincipal meio de transportedo século passado. Enfim, o

ambiente inglês, as trilhas, ostrilhos, cachoeiras, a mata, oscasarões, o artesanato, a pingade Cambuci e muito mais fa-zem com que Paranapiacaba(de onde se avista o mar, emtupi-guarani) entre na lista depasseios imperdíveis desseimenso Brasil.

Parte baixa de Paranapiacaba,onde se localiza as antigasresidências dos ferroviários. Anode 1999

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(*) Carlos da Costa, gerente de turismo –SPPPA/PMSA

Antigos trens tipo Cometaainda são guardadas no pátioferroviário de Paranapiacaba.

Ano de 1999

Instalações ferroviários junto aoinício da descida da serra emParanapiacaba. Ano de 1999

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RR odrigo Mar-ques, filho de

Francisco e Fran-cisca Marques, nas-ceu em 1921, noBrás, e, com me-nos de um ano deidade, mudou-se

para São Caetano. Dos quatro irmãos,Francisco, Martin e José haviam nas-cido na Espanha. A caçula, Ana, as-sim como Rodrigo, é brasileira. Du-rante boa parte da vida morou noBairro Santa Paula, reduto de espa-nhóis em São Caetano. A trajetória,da infância à aposentadoria, a históriados pais e a vida dos filhos que tevecom Matilde Marques são a base deseu relato.

Francisco Marques, o pai, chegouem São Paulo, com esposa e três fi-lhos, em 1911. De início, trabalhou naCompanhia de Gás de São Paulo, fir-ma inglesa responsável pelo abasteci-mento da cidade. É (...) ele trabalhouprimeiro lá na Rua do Gasômetro, naCompanhia de Gás (...) Eles traziamo carvão da Inglaterra, queimavam etiravam o enxofre (...) O gás enchia láe, então, distribuía para São Paulointeira. Antigamente, quando não ti-nha eletricidade, usavam lampião agás (...) Nas casas era sempre fogãode gás, mas gás de rua (...) Tinha umrelógio como o relógio de água. Ogás passava e marcava os metros cú-bicos que você gastava (...) Entãomeu pai trabalhou dez anos naCompanhia de Gás (...) Depois come-çou a modernidade, veio a eletricida-de (...) Bom, mas ele tava lá mais pa-ra construir, fazer a fábrica (...) Saiude lá e foi trabalhar no Viaduto SantaIfigênia.

Rodrigo Marques possui foto emque o pai aparece, junto com outros

imigrantes espanhóis, na construção doViaduto Santa Ifigênia. É (...) a maio-ria era espanhóis (...) trabalhando na-quela região (...) Meu pai trabalhouparece que cinco anos no ViadutoSanta Ifigênia (...) Era tudo em ferro(...) forjado lá mesmo (...) E você podever que não tem nenhum pingo de sol-da (...) Quando a obra foi concluída,Francisco Marques empregou-se emoutra construção. Ele foi trabalhar emoutro edifício (...), em São Paulo tam-bém (...) Os edifícios não usavam mui-to concreto, era tudo ferro (...) Aquelascolunas (...) Na hora em que estavamcolocando uma dessas colunas, ele eum outro caíram do quarto andar (...)Foi em 1924 (...) Então, eu pratica-mente me criei sem pai.

A Rua São Paulo, local em queRodrigo Marques, a mãe e os irmãosmoravam, era reduto de espanhóis emSão Caetano. Na frente da minha ca-sa (...) tinha o Manoel Padeiro, queera espanhol (...) Era padeiro (...)Inclusive ele foi padeiro num navio etal (...) Aí veio com a família e monta-ram uma padaria (...) Na esquina ti-nha o Caparrós, outro espanhol. Todomundo que é do ramo de calçados

por aqui se baseou no AntônioCaparrós. Ele que começou. É o maisantigo fabricante de calçados de SãoCaetano. Toda aquela esquina daRua São Paulo até a Rua Maranhão,aquele pedaço de quem vai do bairropara o centro, do lado direito, era tu-do dele. Ele tinha a fábrica, tinha de-pósito de material, tinha tudo lá.

Francisca Marques e os filhos cos-tumavam falar espanhol em casa. Alembrança da terra natal, em realida-de, era mantida não só pela língua,mas também por hábitos compartilha-dos por toda a comunidade espanhola.As pessoas freqüentavam as casasumas das outras (...) No Natal, os es-panhóis tinham o costume de saircantando e pedindo: "Me dá umagraça!" Então o pessoal preparava amesa com rosquinhas (...) Dentro decasa (...) De todas as casas (...) Eu,como era pequeno, ia atrás da tropa.Sobre as rosquinhas, acrescentou:Faziam uma rosquinha e punhamanis. Delicioso aquilo!

Dois aspectos da personalidadedos imigrantes espanhóis ficaram gra-vados na memória de RodrigoMarques: alegria e ironia. Antiga-

Entre os filhos espanhóis deSanta Paula, Rodrigo Marques

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mente, os postes, na Rua São Paulo,na Rua Maranhão, na Rua Amazo-nas, eram de ferro. Então, no fim doano, faziam uma festa e a molecadasaía batendo com o martelo nos pos-tes. Além disso, na época do carnaval,um grupo de músicos, entre elesAntônio Caparrós, vestia-se com rou-pas extravagantes e animava a região.Chamava Murga (...) Era um conjun-to de músicos (...) Chegavam a ir atéPiracicaba se apresentar(...) Foramem Jundiaí (...) Os caras todos vesti-dos de saco. Era o carnaval deles. Notempo do carnaval eles faziam isso.

A ironia ficava por conta dos ditosespirituosos proferidos no intuito depôr fim a situações incômodas. Eramuito engraçado (...) Os espanhóistêm queda por, vamos dizer, “dar es-petadas” nos outros. Então, porexemplo, vinha visita em casa. O su-jeito ficava demorando para ir embo-ra. Já tinha tomado café, outras coi-sas ... e tava fazendo hora. Então amulher dizia para o marido: “José,vamos nos deitar porque essa gentequer ir embora!”.

Tendo passado toda a infância nacidade, Rodrigo Marques recorda-sede vários locais e diversas situaçõesque marcaram a evolução de SãoCaetano. O Segundo Grupo Escolar,na Rua Monte Alegre, a precariedadeda infra-estrutura nos anos que ante-cederam a primeira administração, oscinemas e os rios em que se era possí-vel nadar foram alguns dos temasabordados.

Tinha o grupo escolar na RuaMonte Alegre. Eu ia de manhã. Fiz oprimário lá (...) A gente ia na escola elevava lanche. Era pão e manteiga(...) Para todas as crianças era pão emanteiga (...) ou então mortadela (...)O pão era feito em casa e a mortadelacomprada nas vendas. Em realidade,as pessoas, em geral, procuravamaproveitar tudo o que pudesse ser cul-tivado em suas propriedades. Antesde 1950 – e até mesmo depois – boaparte das casas possuía hortas e mes-

mo animais criados para servir de ali-mento. São Caetano ainda mantinhamuitas das características da antiga fa-zenda dos monges beneditinos.

Mas aqui era tudo brejo, tanto éque o pessoal, na Rua São Paulo, iapescar, nadar. Naquele brejo a gentenadava (...) Também me lembro que,quando eu era pequenininho, meupai usava, todos usavam, aqueleslampiões com querosene, com aquelepavio (...) E de manhã cedo a gentelevantava e tinha o nariz preto (...)Depois, em 1930, aí que ligaram aluz. Lá no centro já tinha luz (...),agora aqui na parte da VilaBarcelona, Monte Alegre, Cerâmicanão existia luz elétrica (...) Aí forampondo (...) e a água só veio no tempodo Pellegrino.

A diversão, nessa época, era o ci-nema. Rodrigo Marques, relembrandoo entretenimento de crianças e jovensnas décadas de 30 e 40, explicou co-mo a garotada fazia para conseguirentradas gratuitas. Naquele tempo ti-nha o Cine Park (...) Era do Lorenzini(...) Então, sabe o que eu fazia pra en-trar no cinema? Eu pegava filmesaqui do Cine Park, na Rua Maranhão(...), e ia correndo até a estação pralevar o filme lá no Cine Central (...)

O pagamento que a gente ganhavaera poder entrar de graça (...) O filmetinha quatro ou cinco rolos, então eraquatro ou cinco moleques que cor-riam de lá para cá (...) Porque era omesmo filme: passava lá e passavaaqui (...) Então nosso divertimentoera ir no cinema sábado e domingo(...) Passava aquelas fitas (...) Ben-Hur, A deusa de jade...

Certa vez, um comerciante localresolveu vender sorvetes no cinema.Obtida a permissão, colocou os pico-lés no carrinho e dirigiu-se a uma dassalas da família Lorenzini. Era oManuel Padeiro (...) Ele vendia docesque ele mesmo fabricava. Então umdia ele resolveu levar o sorvete e pe-diu lá pro Lorenzini (...) Ele tava le-vando o carrinho, a rua não era as-faltada (...) A molecada toda atrás(...) O carrinho tombou (...) Caíramtodos os sorvetes (...) Não chegou um!Coitado ...

Se os finais de semana eram dedescontração, os demais dias erampreenchidos com bastante trabalho.Assim que terminou o ginásio, Ro-drigo Marques iniciou estudos naEscola Técnica Getúlio Vargas, o queo habilitou a trabalhar como torneiromecânico nas Indústrias ReunidasFrancisco Matarazzo.

Depois, quando eu fiz o ginásio,fui estudar na Escola Técnica GetúlioVargas (...) Então estudei mecânica,torneiro. Estudei lá quatro anos.Depois, quando me formei, fui traba-lhar na Metalúrgica Matarazzo, naRua Caetano Pinto (em São Paulo)(...) Eles fabricavam latas (...)Aquelas latas de embalagem, lata de20 litros, lata de manteiga, latas demarmelada, aquelas redondas (...)Latas de sardinha (...) Então eu tra-balhei lá cinco anos (...) Mas eu mo-rava em São Caetano, ia de trem.

A Escola Técnica Getúlio Vargasera referência no campo de cursosprofissionalizantes. Carpintaria, mar-cenaria e outras atividades faziamparte do elenco de opções da institui-

Solado em poliuretano (PU) fabricadona firma Sicemar

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ção. Pra você ter uma idéia, os tornosem que os meninos aprendiam eramfabricados lá na Getúlio Vargas (...)Todos os professores de lá eram ouitalianos ou alemães (...) Todos con-tratados pelo governo (...) A GetúlioVargas foi quem produziu os primei-ros tornos do país.

Mesmo trabalhando, RodrigoMarques não abandonou os estudos.Buscando aperfeiçoamento, matricu-lou-se em curso de desenho e projetooferecido pela Protec. Os conheci-mentos adquiridos nessa época permi-tiram-lhe galgar posições nas empre-sas em que atuou posteriormente.

Depois saí da Matarazzo (...) OMatarazzo sempre foi de pagar pouco(...) Então eu pedia aumento pro che-fe e o chefe falava: “Não, nós esta-mos em crise...” O Brasil sempre es-teve em crise, 1930, 1932 (...) Foi naépoca da Revolução Consti-tucionalista, aliás, que RodrigoMarques conheceu a esposa Matilde.

Na Revolução de 32 houve umacrise muito grande (...) Aí eu fui traba-lhar numa fábrica de borracha lá naVila Carrão. Eu ia de São Caetano naVila Carrão! Eu pegava o trem até oBrás, do Brás pegava o bonde até aRua Antônio de Barros, da RuaAntônio de Barros pegava o ônibusaté a Vila Carrão (...) Trabalhei trêsanos lá (...) A firma chamava Ximenez(...) Fabricava borracha, galochas,fios (...) E a Matilde trabalhava lá.

Rodrigo e Matilde casaram-se em1946. Imediatamente mudaram-se pa-ra a Rua São Paulo, onde moraramaté a transferência para o Jardim SãoCaetano, no fim dos anos 70. O casaldividiu a casa com FranciscaMarques, que faleceu em 1967.Minha mãe morou conosco por 20anos (...) Eu fiz um quartinho pra ela,com banheiro (...) Vivemos felizes...

Já casado, Rodrigo Marques traba-lhou na Ford e, em seguida, passoupara a Volkswagem. Trabalhei dezanos na Ford do Ipiranga. Saí de láporque houve uma greve e eles man-

daram muita gente embora (...)Também trabalhei um pouco na Com-panhia Fabril Brasileira de Lonas,mas aí já entrei na Volkswagem comoferramenteiro (...) Lá na Volkswagemadquiri muita prática e muita técnica,porque eles dão curso e você vai su-bindo (...) Eu cheguei, como ferra-menteiro, no grupo máximo, isto é, o15 (...) Começa no sete e vai até o 15(...) Depois eu passei pro grupo espe-cial, de planejamento. Nessa função,Rodrigo Marques estava incumbidode pensar em maneiras de melhorar odesempenho dos carros, ainda que setratasse apenas de alterar um espelhoretrovisor. Então, no planejamento,um lá cisma uma coisa: “Vamos mu-dar o tanque de gasolina!” (...) En-tão tem que pensar numa solução. Epara modificar um parafuso no carrovocê não imagina o trabalho que dá.Por exemplo, antigamente, o espelhoretrovisor do Fusca era o próprio pi-no da porta (...) Um dia os engenhei-ros alemães disseram: “Pô, já tá evo-luído, vamos pôr uma outra porta!”(...) Bem, fazer o furo na porta tudobem, é só mudar um estampo lá...,mas para adaptar aquela porca ládentro, aí surgiu o problema (...) Teveque fazer uma porção de dispositivos,ir lá montar, e o pessoal usava a por-ca lá dentro, a outra entrava aperta-da (...) Quer dizer, qualquer mudançano carro é complicada (...) Por issoque existe o planejamento.

Rodrigo Marques não se queixavada remuneração na Volkswagem. Emrealidade, foi com o dinheiro poupadonos anos de trabalho na firma alemãque pôde criar os filhos e arcar com asdespesas da casa.

Quando eu entrei na Volkswagemeu ganhava seis salários mínimos.Depois foi subindo, subindo ...Cheguei a dez salários mínimos (...)Eu fazia muita hora extra (...) Alémdo salário extra, eu ganhava umaporcentagem por produção de dispo-sitivo de usinagem, dispositivo de me-dição (...) Eu tenho isso aqui (a casa

no Jardim São Caetano) com o que eujuntei na Volkswagem (...) Juntei di-nheiro e comprei o terreno (...) Vocêdava, vamos dizer, um tanto de entra-da e pagava o resto parcelado (...)Isso foi mais ou menos em 1978.

Quanto aos filhos, Sidney, LuísCarlos e Marcos, todos trabalham nafirma Sicemar, propriedade de Sidneye sócios. A fábrica é especializada emsolas de sapato, ramo em que o filhomais velho de Rodrigo Marques obte-ve o primeiro emprego.

Em 1950, o meu filho maior, oSidney, começou a trabalhar com oCaparrós ... com sapatos (...) Depoisele montou a fabriquinha dele lá nanossa casa, na Rua São Paulo (...) Aífizemos um salão grande, porque erano fundo, um barracão (...) Então fi-zemos esse salão e ele trabalhou ládez anos (...) Não fazia concorrênciaao Caparrós, porque o Caparrós fa-zia aquelas sandálias pra ... almofa-dada ... pro tempo do frio, né!? Meufilho fazia aqueles sapatos para ascrianças irem na escola (...) Depoisficou pequeno e ele comprou um ter-reno no fim da Rua Alegre. Aí tam-bém ficou pequeno e a fábrica mudoupara Ribeirão Pires (...) Ele ficou só-cio de uns portugueses e agora a fir-ma se chama Sicemar.

Rodrigo Marques, após sair daVolkswagem, trabalhou na empresa dofilho e, na seqüência, encerrou as ativi-dades. Vivendo tranqüilo, com a espo-sa, na casa que construíram no JardimSão Caetano, o filho de espanhóis sen-tiu-se impulsionado a relatar as recor-dações devido a episódio recente:

O último meu irmão que faleceu,faz um pouco, é o que tinha todos es-ses documentos que eu mostrei paravocê... Então a nora dele falou: “TioRodrigo, vem buscar as coisas do teuirmão porque eu vou me mudar dessacasa” (...) Fui lá e peguei (...) E agente se lembra de tanta coisa(Pesquisa realizada pelo Serviço deDifusão Cultural da Fundação Pró-Memória).

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Primeiro e segundo volumes da história da marca Trentini: Lucillo e Cesare

Alexandre Toler RUSSO (*)

AA marca italiana de bebidasTrentini tem em São Caetano

história protagonizada por doispersonagens: Lucillo e CesareTrentini, tio e sobrinho. Em 1924,depois de passagem pela Argen-tina, Lucillo Trentini deu início àprodução do vermute Trento ba-seando-se em fórmulas que lhehaviam sido enviadas da Itália pe-lo irmão Giuseppe, pai de Cesare.Tratava-se de fórmulas antigas,tradição passada de pai para filhodesde a Idade Média.

A família Trentini, proprietáriade terras em Mezzolombardo,Itália, sempre esteve ligada à pro-dução de vinho e outras bebidas.Os produtos elaborados na canti-na dos Trentinis eram exportadospara outros países da Europa.Giuseppe Trentini era quem maisdiretamente cuidava da produção,uma vez que possuía grande co-nhecimento prático no que diziarespeito à preparação de bebidas.Era um enólogo de fama mundial,afirmou Cesare. De todo modo, onegócio pertencia à família, sendoque todos tinham participação noslucros e nos prejuízos.

Nesse contexto nasce, no diaprimeiro de Setembro de 1918,Cesare Trentini, filho de Giu-seppe Trentini e Ida Casagranda(filha de um dos maiores constru-tores de ferrovias da Europa). Eunasci na época da derrocada dosexércitos austríacos (...) Meu nas-cimento foi um pouco teatral.Minha mãe, quando eu estavacom seis meses, deslizou na esca-

da e eu revirei dentro (...) Re-virando dentro, fiquei pronto pa-ra sair com os pés em vez da ca-beça. E, por causa disso, o doutordeveria intervir (...) Só que o mé-dico lá de Mezzolombardo estavabêbado e foi preciso correr atéoutro médico lá por perto (...)Então veio um médico militaraustríaco (...) Engraçado é que eunasci pelas mãos do inimigo, por-que nós éramos italianos da Áus-tria. Até o fim da Primeira GuerraMundial (1914-1918), a região doTrentino pertencia à Áustria.Muitos italianos, como minha avóEmília Castellini - que eu chamode “garibaldina” – e os seus fi-lhos, exigiam a anexação doTrentino à Itália.

Os primeiros anos da vida deCesare Trentini foram passadosem Mezzolombardo na compa-nhia dos pais, dos irmãos Romanoe Aleardo e do tio Lucillo. Eu fi-cava escutando o tio Lucillo tocarvioloncelo. Eu gostava muito.Lucillo, irmão de Giuseppe, eravioloncelista respeitado em toda aEuropa. Tendo estudado com osmelhores músicos da época, eraconsiderado um virtuose. Na ver-dade, ele estudou com o melhor

Depoimento de Cesare Trentini à Fundação Pró-Memória em Março de 2002

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Lucillo Trentini e o violoncelo,instrumento musical que tocava com

maestria. Ano de 1922

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músico da época, o professorFrancisco Serato, em Bologna.

Artista renomado, LucilloTrentini pouco ficava em Mezzo-lombardo. Em realidade, estavasempre viajando, tanto que, em1923, dirigiu-se à América doSul. De início, morou em BuenosAires, Argentina. O irmão dele, omeu tio Sanzio, tinha ido para aArgentina como veterinário.Chegou a dar aulas na Univer-sidade de Buenos Aires e voltou aMezzolombardo em 1919 (...) Edizia sempre que a Argentina erafantástica (...) Também nas artes,na música (...) Então meu tioLucillo foi para lá. Durante essetempo relacionou-se amorosa-mente com uma mulher. Ali en-trou a história da mulher e achoque desabou tudo (...) Eu achoque eles tiveram alguma desaven-ça na maneira de ver as coisas,no sistema de tratar (...) Aí eleveio para o Brasil.

No fim de 1924, Lucillo Tren-tini chegou a São Paulo e, em se-guida, transferiu-se para SãoCaetano. A princípio, buscousustentar-se financeiramente pormeio de sua arte, todavia, perce-beu que não poderia sobrevivercomo músico. Assim, envioucartas ao irmão Giuseppe, naItália, pedindo ajuda para iniciarprodução de bebidas em SãoCaetano do Sul.

Bom, então ele veio para cá,escreveu para meu pai e meu paidisse: “Eu sou um depositário defórmulas da família (...) Aqui, nóstemos a cantina, com 50 mil hec-tolitros, e não vamos fabricar li-cores agora porque estamos ne-gociando vinho (...) Então eumando as fórmulas (...) E serábom para ele, porque se a músicanão dá, isso vai dar” (...) Foi alique ele mandou as fórmulas e otio Lucillo começou o seu traba-lho lá na esquina da Maranhão

com a José Benedetti (então RuaMinas Gerais).

Lucillo Trentini, segundo rela-to do sobrinho, era homem de há-bitos simples e amante da tranqüi-lidade. Devido a isso, escolheuSão Caetano para morar. Ele tinhaescolhido São Caetano porquequeria um lugar tranqüilo, ondepudesse tocar música. No localem que vivia, instalou os equipa-mentos necessário para o inícioda produção de bebidas. Ele co-meçou com vermute, porque tam-bém vermute era tradição de fa-mília (...) Eles trabalhavam o ver-mute no sistema antigo, com oamadurecimento e inclusão de er-vas e raízes. Contratou alguns au-xiliares para agilizar os serviços.

O trabalho no laboratório re-cém-instalado mantinha-o ocupa-do durante a manhã. Depois doalmoço, o violoncelista ia paraSão Paulo, onde podia cultivar apaixão pela vida artística. Ele nãotinha esquecido a música, mas ti-nha trabalhado nas misturas deervas, raízes etc (...) Ao mesmotempo amava a cultura musical eia, quando era depois de uma,duas horas da tarde, para SãoPaulo viver sua vida (...) Tocava,tinha amizades (...) E acho que ti-nha também mulher (...).

Os muitos contatos em São

Paulo facilitaram a divulgaçãodas bebidas. Não demorou muitopara serem inseridas, na progra-mação de algumas rádios, propa-gandas dos produtos da marcaTrentini. Então meu tio desenvol-veu muito e tinha muitas ligaçõespor rádio (...) Naquele tempo te-levisão não tinha (...) Aí começa-ram as mensagens (...) Cada ho-ra, hora e meia, era propaganda.Além da divulgação via rádio,outdoors estavam espalhados porvárias regiões de São Paulo (de1941 a aproximadamente 1965).Depois, quando a estrada de fer-ro ainda era Railway (...), aí ti-nha reclame em todas as estações(...) Tinha reclames por toda a li-nha, de Jundiaí até Santos (...)Tinha reclame na Anchieta, emSão Vicente, no centro de Santos(...) Eu falo de 1940, 41.

De 1924 a 1957, ano em quemorreu, Lucillo Trentini amplioua venda de bebidas graças ao tinocomercial e à honestidade de-monstrada junto ao público consu-midor. Quando o sobrinho Cesarechegou a São Caetano, depois doenterro do tio, pôde perceber queele era quase um mito (...) Era ohomem que tocava violino (...) Naverdade era violoncelo, mas opessoal dizia violino (...) Era mui-to querido pelas pessoas.

Pátio externo daIndústria Trentini

na Rua RioGrande do Sul,

nº 963. Emfrente ao

caminhão damarca Bogward,

à esquerda KekoPerim e à direita

Lucillo Trentini.Ano de 1951 C

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No dia 15 de Agosto de 1957,Cesare Trentini recebeu a notíciada morte de Lucillo. Eu e meu tioQuinzio tínhamos sido convida-dos para o casamento do filho daminha prima, em uma grande fa-zenda perto de Veneza (...) Nósficamos hospedados na casa...No mesmo quarto (...) Quandofomos dormir, ele disse: “Devocomunicar-te uma coisa grave:morreu o tio Lucillo”. Então fa-lei: “Madonna... mas eu tinhafalado para ele voltar para cá...”Passaram-se algumas semanas eo tio Quinzio voltou a falar co-migo: “Eu acho que o tio Lucilloachou um herdeiro lá no Bra-sil”(...) Então digo: “Não, olha,o tio Lucillo, em 1940, mandouuma carta para o meu pai (...)Ele fez um testamento em 1940(...) Não sei onde está, mas seique ele fez”.

Lucillo Trentini havia nomea-do Giuseppe Trentini e filhos co-mo herdeiros. Giuseppe tinhamorrido em 1943, de forma quecabia a Cesare e a Romano –Aleardo, que fazia parte do gru-po de acrobatas Diabos Verme-lhos , de Rimini, morrera em1939 num acidente aéreo – ocontrole dos negócios no Brasil.No entanto, existia um empeci-lho: Cesare e Romano estavam

na Itália, ao passo que outro pa-rente, interessado na herança,morava em São Paulo.

Este outro meu primo, Ítalo, fi-lho do tio Sanzio, tinha já manda-do publicar que ele era o herdeiro(...) Ele e um outro amigo sempreescreviam para Milão dizendoque tinham procurado o testa-mento e não tinham achado nada(...) Mas nem por isso ele deixoude dizer que era o herdeiro.

Segundo Cesare Trentini, oprimo Ítalo já conhecia o conteú-do do testamento, isto é, a nomea-ção de Cesare e Romano comoherdeiros, desde o dia 14 deAgosto de 1957, data da morte deLucillo Trentini. Todavia, enviavacartas à Itália dizendo que não sa-bia onde estava o documento.Desconfiado, Cesare Trentini veioao Brasil e procurou AprígioGuimarães, responsável pelo car-tório em que estava o testamento.Na oportunidade, Trentini soubeque o desígnio de Lucillo fora li-do na ocasião de sua morte. Dessemodo, teve certeza de que o pri-mo sabia da situação e estava ten-tando passá-lo para trás.

Quem ajudava o meu tio aquiera o André Zanetti. Foi ele queescondeu os documentos do tioLucillo quando o meu primo e umoutro entraram no escritório da

fábrica e arrombaram as gavetas(...) O André era homem de con-fiança, nomeado testamenteiro nopróprio testamento de meu tio (...)Na verdade, o meu primo queriaas fórmulas dos produtos e di-nheiro. A situação, no entanto, foicontornada e Cesare Trentini, jun-tamente com o irmão, assumiu aempresa.

Cheguei aqui e fiquei dois me-ses, porque depois devia voltar(...) Tinha o escritório de advoca-cia (...) Tinha muita coisa parafazer na Itália (...) Processos in-ternacionais etc (...) E então, nes-ses dois meses que estive poraqui, por carta recomendei a meuirmão de seguir uma linha de éti-ca, porque também no comérciotem que ter ética.

Na Itália, Cesare Trentiniexercia diversas atividades. Pos-suía escritório de advocacia emVia Fontana, 18, Milão, escreviaem revistas jurídicas e, além dis-so, colaborava, duas ou três vezespor semana, com o escritório deMário Rotondi, célebre advogadoitaliano que também lidava comprocessos internacionais (em rea-lidade, Cesare era assistente deMário Rotondi na UniversidadeBocconi, em Milão). Dessa for-ma, deixou que o irmão ficasse noBrasil e tocasse os negócios.

Romano Trentini, portanto,instalou-se na Rua Rio Grande doSul, 963. Este era o novo endere-ço da fábrica. De fato, o próprioLucillo Trentini, em 1948, perce-bendo que as instalações iniciais,na esquina das ruas Maranhão eMinas Gerais, haviam ficado pe-quenas para atender à crescenteprodução de bebidas, adquiriupropriedade na então Rua Bahia –depois denominada Rio Grandedo Sul -, para onde transferiu aempresa.

Então ele mudou para lá. Elearranjou tudo direitinho e, em

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Estoque dosprodutos damarca Trentinina área internada fábrica. Anode 1990C

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1948, veio para a Rua Rio Gran-de do Sul (...) Em 1950, comprouum caminhãozinho, um Bogward,porque tinha dificuldades para le-var toda a mercadoria a Santos(...) Se consumia muito em Santose no interior (...) Então o cami-nhãozinho serviu para transportee também para fazer propaganda(mensagens gravadas eram trans-mitidas por alto-falante instaladono automóvel).

Posteriormente, quando CesareTrentini passou a dirigir sozinho aempresa, o local foi ampliado.Aqui cresceu quando eu construílá embaixo (...) Os pipões e as pi-pas passaram para lá (...) Nãoera um espaço muito grande, masera suficiente.

Cesare Trentini precisou tomaras rédeas da fábrica devido à ina-bilidade do irmão no trato com afreguesia. Intervenção imediataera necessária, caso contrário, aempresa corria o risco de quebrar.Sendo assim, transferiu-se, em1962, para o Brasil. O escritório,em Milão, deixou aos cuidados deum amigo. Entretanto, semprevoltava à Itália, por alguns meses,para acompanhar o andamentodos negócios.

Eu com a Liliana (LilianaPilati), minha convivente, chega-mos aqui, mas fomos para oOthon Palace (hotel de SãoPaulo) (...) O Romano moravaaqui na Rio Grande do Sul (...)Logo tomei conhecimento dosproblemas (...) A clientela deveser tratada com respeito, expli-cando, em caso de erro, receben-do reclamações etc. Aí eu decidique era o momento de tomar co-nhecimento muito mais a fundoda firma e fazer a clientela (...)Recuperar a clientela (...) E recu-perei. Tanto é verdade que saí-ram, também, entrevistas na tele-visão (...), minha presença nos re-clames (isso foi na década de 60).

Um dos lugares em que as be-bidas de Cesare Trentini tinhamgrande aceitação era a baixadasantista. O motorista FranciscoPerin (Keko Perin) descia a serra,com o caminhão cheio de produ-tos, de quatro a cinco vezes porsemana. E quando se descia eraum contato atrás do outro. E aténas ilhas a gente entregava bebi-das (...) Em 1963, começamos ausar a Kombi.

Em Santos, contudo, CesareTrentini enfrentou graves proble-mas. Ainda no tempo em queRomano participava do negócio(depois Cesare comprou a partedo irmão), a marca Trentini esta-va sendo pirateada

Era 1958. Um dia chegueiaqui às dez horas da noite e faleipara o Romano: “Nós vamos saire vamos em Santos, porque os ba-res e tudo quanto estão abertos(...) Estão pirateando até as gar-rafas” Pagavam pela garrafagravada “Trentini” o dobro dopreço de uma garrafa comum (...)Chegamos em um bar e eu disse:“Pode pegar uma garrafa deTrentini, de Ferro Cálcio Quina,por favor?” Eles chegaram com agarrafa ... Tinha um rótulo com aparte de trás muito parecida coma nossa. Também estava gravadoo nome “Trentini” na parte de

trás da garrafa (...) Aí foi queimplantei o processo e seqüestreias bebidas.

Para não prejudicar os donosdos bares, que poderiam ter sidoenganados pelos piratas, CesareTrentini propôs acordo aos co-merciantes: “Eu não acho vocêsresponsáveis por isso, porque opirata vem a vocês e fala:‘Querem ganhar mais?’ (...)Quem não quer ganhar mais?Então vamos fazer assim: eucompro este produto pelo mesmopreço que você comprou. Tereembolso, mas você deve com-prar duas caixas a mais”. Dessamaneira, se os negociantes tives-sem adquirido, por exemplo, duascaixas de produtos pirateados,Cesare Trentini comprava as cai-xas de bebidas falsas e vendiaduas de artigos legítimos. Os fal-sificadores foram descobertos eprocessados.

A partir de 1962, Trentini deuinício à tentativa de reerguer a fa-brica. Os esforços estenderam-seaté o final da década de 70. Nessaépoca, o advogado italiano foisurpreendido por modificaçõesna legislação brasileira referentea bebidas. A gradação alcoólicados aperitivos foi elevada e al-guns produtos da marca Trentini,tradicionalmente de baixa grada-

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Salão decurtimento e

engarrafamentodos produtos damarca Trentini. C

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ção, ficaram comprometidos. NaEuropa, a tradição é o produtormandar no grau alcóolico do seuproduto. No Brasil, são os usinei-ros a mandar e também aquelesfabricantes que querem não en-velhecer o produto, mas vendê-lode um dia para o outro (...) Que asaúde do consumidor se dane!(...)Aí era impossível que voltassea baixa gradação (...) Eu pareiporque falei: “Isto é contrário ànossa filosofia!” (...) Tentei até1978,1979, aí então eu pratica-mente parei (...) Voltei à Itália,mas conservei o direito de produ-ção (...) Não produzia, mas direi-to de produção eu tinha. Os pro-dutos já prontos estavam enve-lhecendo.

Ao retornar para a Itália,Cesare Trentini deixou a cargo dealguns conhecidos o pagamentode impostos. Para sua surpresa,taxas não foram pagas, a fábricasofreu três assaltos e um pedidode fechamento foi feito junto àPrefeitura.

Infelizmente, os amigos muitasvezes te chamam de amigo e teenterram (...) Eu mandava dinhei-ro para esses amigos pagarem osimpostos e até mesmo emprestavadinheiro a eles (...) De repente,recebi a notícia de que eu estavaem dívida com a Prefeitura (...)

Emprestei milhares de dólares,sem juros, e me devolveram cru-zeiros (...) Em 1983, aconteceu oprimeiro furto (...) No segundo, osinvasores destruíram algumascoisas, pegaram os seis volumesda “História do Brasil” que eu ti-nha, roubaram uma sanfona ita-liana de 120 baixos e tambémuma balança analítica que era dolaboratório do meu pai e tinhavindo da Itália (...) Na terceiravez, colocaram pedaços de ma-deira em cima das janelas e por-tas, para todo mundo pensar quea fábrica estivesse abandonada(...) Chegaram até mesmo a pediro fechamento da firma junto àPrefeitura.

Cesare Trentini começou real-mente a suspeitar de que estavasendo traído quando, em Milão,recebeu a visita de um padre bra-sileiro encarregado de fazer-lheproposta para a compra da fábricade bebidas em São Caetano.

Me mandaram na Itália tam-bém um padre (...) Chegou lá noescritório falando: “O senhortem lá um terreno?” Eu falei:“Tenho um terreno ... também noParaná” (...) “Não”, disse o pa-dre, “eu falo daquele...” Digoeu: “Não é terreno, é fábrica!”(...) “Então, o senhor quer ven-dê-lo? Porque estou encarregado

de receber sua autorização paraa venda...”. Depois que soubedos três roubos, Cesare Trentiniteve a certeza de que estava sen-do enganado pelas pessoas emque confiava.

O retorno ao Brasil foi neces-sário. Em primeiro lugar, quitouas dívidas junto à Prefeitura e, em1987, voltou a produzir.

Em 1989, eu comecei a apron-tar a produção dos novos produ-tos (...) Em 1990 eu recebi a per-manência (...) Permanência...,quer dizer, para ter a possibilida-de de pedir as análises (...) Paradesenvolver a firma.

No início da década de 90, amarca Trentini foi novamentepirateada. O processo, dessavez, envolveu algumas firmas edemorou para chegar ao fim.Mesmo tendo obtido parecer fa-vorável, Cesare Trentini teveproblemas com um advogadoque fazia parte do caso e nova-mente entrou na Justiça. Confioque justiça será feita para obem do Brasil, dos muitos enga-nados e ludibriados que nempossibilidade têm de defender-se, mas também no interessedos consumidores enganadoscom as marcas piratas que comfacilidade são deferidas, vio-lando as leis nacionais e inter-nacionais e marcando o Brasilcomo abrigo do marcotráficodas marcas mais famosas domundo, prejudicando os consu-midores. O italiano, entretanto,continua fabricando e vendendoos produtos, ainda que em me-nor quantidade. Ferro CálcioQuina, Amargo de Ruibarbo eFernet estão envelhecendo naspipas da fábrica. Outros produ-tos estão amadurecendo.

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(*) Alexandre Toler Russo é jornalista

Lucillo Trentini,na área internada fábrica, juntoaos produtospreparados paraa expedição.Ano de 1954C

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Aprendizado sem asformalidades da sala de aula

EE m 1999, ap ro fesso ra

Cibele Mendesorganizou, naEscola Munici-pal de EnsinoInfantil Inês dosRamos, progra-

ma – Projeto Arte – cujo objetivoera aproveitar as artes plásticaspara transmitir conteúdos didáti-cos aos alunos. A princípio, limi-tava-se ao ensino infantil, sendoque os participantes tinham ida-des variando entre três e seisanos. A iniciativa foi bem recebi-da por pais e professores, atrain-do inclusive a atenção da mídia.No ano seguinte, o plano inicialfoi ampliado, envolvendo nãoapenas as artes plásticas, mastambém teatro, música e literatu-ra. Além disso, estendeu-se ocampo de atuação para os ensinosfundamental e médio.

Atualmente, oito pessoas inte-gram o que se transformou noProjeto O Brasil e a Mídia. CibeleMendes, as arte-educadoras Rosa-ne Acedo e Cecília Aranha, o per-cussionista Jorge Marciano, o atortiteriteiro Celso Ohi, o coreógrafoEduardo Caetano, o multiplicador(aluno selecionado por destacar-se nas atividades ministradas emsua escola. Faz parte do planeja-mento o aproveitamento dessesjovens) e grafiteiro Mário deOliveira Vargas Júnior e a multi-plicadora Milena Marcolino reali-zam, em diferentes colégios, ofi-cinas de história, teatro (fanto-ches), música (percussão), coreo-grafia, grafite e artes plásticascom três horas de duração. O tra-balho de crianças e jovens chegou

a ser exposto na Galeria No.Tre,em Berlim.

- Tudo começou, de forma tí-mida, na EMEI (Escola Muni-cipal de Ensino Infantil) Inês dosRamos (...) A gente não tinha ne-nhuma pretensão de estar levan-do pra fora, só que percebemos oenvolvimento das crianças eaprofundamos fazendo uma mos-tra (...) Chamou a atenção da mí-dia e aí a coisa foi tomando umoutro volume, né!? (...) Quandosurgiu tinha o nome de ProjetoArte. Foi feito com as crianças doensino infantil, de três a seisanos. Levei alguns autores até láe eles informaram o pessoal, par-ticiparam etc. No final, teve amostra de arte, onde todos os alu-nos colocaram as suas obras (...)Aí foram os pais e outras escolasverificar o trabalho deles. Porcausa disso, tive a idéia de tam-bém estar trabalhando com o en-sino fundamental e o ensino mé-

dio. Foi daí que surgiu o ProjetoO Brasil e a Mídia, relatou CibeleMendes, mentora da iniciativaeducacional.

Apesar da rapidez com que oProjeto Arte transformou-se noProjeto O Brasil e a Mídia, háduas etapas bem distintas, interli-gadas por um processo que mar-cou a ampliação da idéia inicial.No começo, apenas artistas plásti-cos de São Caetano – como Fa-brizio Dell’Arno, Vera Cavalcantie outros – cuidavam das ativida-des. Conforme o plano tomou fô-lego, Cibele Mendes buscou, jun-to ao Ministério da Cultura, apoiopara a continuidade do trabalho.A Lei Rouanet, que beneficia aCultura, permitiu o patrocínio deO Brasil e a Mídia. O dinheiroprovém de uma parcela dos im-postos das empresas transferida àpromoção cultural.

A gente começou trabalhandocom artistas da cidade, artistasplásticos (...) Aos poucos é que osprofissionais atuais foram che-gando, através de contatos. Porexemplo, a Rosane Acedo foi con-vidada para a mostra de arte dosalunos do Inês dos Ramos e ficouapaixonada (...) Quando eraProjeto Arte nós fizemos na raçamesmo. Cada artista doou seutempo. Aí foi mandado para oMinistério da Cultura (...) Agoraé um projeto beneficiado pela LeiRouanet (...) Então a gente vaiver qual empresa vai nos subsi-diar. Você recebe uma carta doMinistério e aí vai atrás da em-presa, com essa carta, para queela reverta uma parte do impostode renda.

Entretanto, mesmo na época

Equipe que foi a Berlimrepresentando o Projeto

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do Projeto Arte, o trabalho deixoude ser estritamente local. Quandoeu falo em como ele era, oProjeto Arte, ele logo deixou deser só de São Caetano. Por exem-plo, nós já estivemos em diversoslugares, Rio Grande da Serra,Rio de Janeiro etc. Mesmo com aampliação do programa original,Cibele Mendes afirmou que SãoCaetano continuará sendo priori-dade. Agora ... é óbvio que eu voudar uma atenção maior para SãoCaetano do Sul. Inclusive porqueas escolas que eu coloquei noprojeto são escolas estaduais des-ta cidade. Algumas ONGs (orga-nizações não-governamentais) deSão Paulo também fazem partedas metas. A professora demons-trou interesse em passar um diana ONG O Aprendiz do Futuro,do Gilberto Dimenstein. Eles fa-zem um trabalho muito interes-sante por lá.

OO FICINASFICINAS – – As oficinas de artesão realizadas em diversas frentes– artes plásticas, música, teatro debonecos e literatura -, sendo queos alunos executam trabalhos naárea que mais lhes interessar. Oresultado final é apresentado paratodos os participantes.

- A gente chega e não sabe oque vai encontrar. Temos um nú-

mero limitado de vagas, por issopedimos para que eles se inscre-vam (...) Nunca sabemos qual se-rá o comportamento dos alunos(...) Apesar disso, eles escolhema área no momento da inscrição(...) Mas a primeira coisa feitacom o grupo inteiro é a literatu-ra. Então a gente diz: “Olha, es-sa literatura é ligada à arte, essaé ligada ao Brasil etc. E nós va-mos estar falando hoje sobre aAmazônia (por exemplo). O queé que acontece com a Amazônia?Então vocês vão encontrar diver-sas coisas. Depois, então, aquiloque chamar sua atenção vocêsvêm falar com a gente”. E elesdizem: “Pô, isso é legal, não seiquê” e, em cima disso, damosuma orientação. “Em que áreavocê vai atuar? Tá bom, agoraeu já sei, você já escolheu umadeterminada coisa que te “cha-mou a atenção”. Então vamos lápara a música (supondo que aárea musical tenha despertadomaior interesse no aluno). Aí oJorge tá preparado para estartrabalhando determinadas músi-cas ou até compondo uma juntocom eles (sempre sobre o tema)(...) Bem, depois fazemos um pi-quenique. Entre esse momentoda produção do aluno e o mo-mento da performance existe um

piquenique. E não é à toa que fa-zemos isso. É para que haja umcontato, uma coisa descontraída,que não fique muito formal. E aía gente come, bate um papo etal, até para estar preparando osalunos, porque eles são tímidos.Eles bagunçam, assim, em gru-po, mas na hora que você diz:“Vamos lá, agora vamos dan-çar!”, aí a coisa pega.

No caso do teatro, os alunosvão estar trabalhando tambémcom todas essas informações, ter-minando por criar marionetes.Vamos dizer, por exemplo, que otema seja a escravidão. Entãoeles vão fazer os personagens: oíndio, o negro etc. Dentro disso,o aluno vai estar trabalhando aHistória do Brasil (...) E é até le-gal que os personagens sejambonecos, porque, assim, os alu-nos ficam menos intimidados.Como eles ficam escondidos e osbonecos aparecem, eles curtempra caramba. Tanto que normal-mente pedem para estar vendo asfilmagens.

No tocante às artes plásticas, oprocedimento é o mesmo. Umavez informados sobre o tema, osparticipantes procuram desenvol-ver pinturas e trabalhos plásticosem geral. Atualmente, produçõescom grafite fazem parte das ofici-nas. A gente está usando o aeró-grafo (instrumento empregado napintura ou envernizamento, quefunciona mediante compressão doar). As crianças são avisadas e le-vam camisetas. Em cima de umaprodução que elas fazem em ras-cunho, chamada de máscara, pas-sam, com a orientação do grafi-teiro, que é o Mário VargasJúnior, tudo pra camiseta (...)Além disso, as arte-educadoras,Rosana Acedo e Cecília Aranha,estão trabalhando, ao mesmotempo, com quadros, telas etc.

Finalmente, há o momento em

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Vernissage –contou com apresença dospais e dediversosconvidados.Várias telas dascriançasbrasileirasforam vendidasnesta mostraC

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que tudo é exposto. Então todasas camisetas vão estar expostas,as telas produzidas, o pessoal vaiestar dançando, outros vão estartocando. E esse é um momentobonito, porque é sempre uma sur-presa. É surpreendente o que po-de ser feito num único dia.

DD I V U L G A Ç Ã OI V U L G A Ç Ã O – – Quando os pri-meiros passos foram dados, aindana EMEI Inês dos Ramos, a aten-ção da mídia local foi despertadapela mostra dos trabalhos realiza-dos nessa instituição de ensino. Àmedida que o projeto tomoumaiores proporções, jornais comoDiário do Grande ABC e Folhade São Paulo noticiaram o even-to. Também foi feita uma home-page na internet.

- A divulgação do projeto sedeu assim: primeiro foram feitos“releases” e a gente jogou pramídia (...) Depois foi feita uma“home-page”. Através dela, aca-bamos em Berlim. Com efeito, foimediante a web que uma brasilei-ra, dona de galeria de arte emBerlim, entrou em contato com oProjeto O Brasil e a Mídia. Umavez que desejava contar com ex-posições infantis em seu espaço,resolveu convidar os compatriotaspara a realização de uma mostra.A galerista, a Sônia Ventura, nosrecebeu lá no ano passado (...) Odinheiro das passagens e a quan-tia para a gente se manter vieramatravés de um patrocínio. Mas, naverdade, não foi muita coisa. Só apartir de agora, pela LeiRouanet, que teremos à disposi-ção um pouco mais de dinheiro(...) Bem, levamos para aAlemanha uma seleção de obrasescolhidas pelo artista plásticoFabrizio Dell’Arno (as produçõesselecionadas corresponderam auma atividade ocorrida na EscolaEstadual Professor AlfredoBurkart).

Uma vez em território germâ-nico, relatou Cibele Mendes,quiseram comprar o trabalho deum garoto brasileiro. As obrasdas crianças não estavam à ven-da, ou melhor, estavam à vendaapenas os quadros dos meninosque estavam lá (...) Mas uma de-terminada pessoa quis comprar atela de um menino do Burkartque não estava lá. Fiquei pensan-do: “Meu Deus, o que é que eufaço!? O menino não tá aqui pradizer e eu não sei qual é o víncu-lo dele com a tela. Como é queeu vou vender uma coisa assim?”Aí eu peguei e disse: “Não, poroutro lado, o adolescente vai fi-car superfeliz, pois, afinal decontas, é uma tela vendida emBerlim!” Então decidi: “Bom” -eu não tinha como telefonar parao Brasil naquela hora -, “tudobem, pode vender a tela”.Vendemos e aí eu trouxe metadedesse valor, entreguei, chamei ospais, fizemos todo um evento. É,o pessoal foi fotografado, saiuem jornais e tal (...) Metade dodinheiro foi para o garoto e a ou-tra parte ficou com a galeria.

Graças a Deus o menino adorou!A Galeria No.Tre avaliou a obraem 120 marcos.

Nova viagem à Europa deveráacontecer neste ano. A França é odestino, sendo que o objetivo é oaprendizado mútuo. Isso será pos-sível através da AssociaçãoJacarandá, grupo de franceses in-teressados na cultura brasileira,que convidou os membros doProjeto O Brasil e a Mídia parauma visita a Bordeaux. São fran-ceses que gostam da nossa cultu-ra, apreciam muito o samba e quefundaram essa associação paraestar ajudando os brasileiros quechegam na França (...) Quandomandei meu projeto para lá, por“e-mail”, falei: “Vocês me dãoum tempo que eu vou mandarpassar para o Francês”. Res-ponderam: “Não há necessidade.Pode mandar em Português por-que temos diversos membros quecompreendem o idioma”.Inclusive o presidente da As-sociação Jacarandá, o PatrickMossambert, fala fluentemente alíngua portuguesa. E também sa-be muito da nossa cultura. A gen-te tem que tomar cuidado paranão passar “carão”.

O contato com os francesesdeu-se por meio do sambista daequipe. Em realidade, o músicopertencia à ONG Arte e Cida-dania, sempre em comunicaçãocom viajantes da França que vi-nham passar o carnaval no Brasil.Então ele falou: “Pô, seria super-legal, já que você vai trabalharcom samba, conversar com osfranceses (...) Aí ele fez essa pon-te, a gente se encontrou e eles to-param fazer esse intercâmbio.Dessa forma, os brasileiros esta-rão sendo recebidos na fazendado presidente da AssociaçãoJacarandá em Bordeaux (a via-gem, contudo, ainda depende daregularização de alguns documen-

Workshop com as criançasberlinenses

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tos). Durante a estadia em terrasfrancesas, estarão promovendo asoficinas de arte em escolas já con-tatadas pela AssociaçãoJacarandá.

Os franceses adoram samba.O pessoal da Associação, inclusi-ve, sai às ruas, na França, comfantasias e tal. Uma vez, até per-guntamos para eles: “Que fanta-sias vocês utilizam?” Ficamossabendo que eles tinham apenasuma fantasia. “Ô, gente, vamosmandar um monte pra vocês!”

Outro aspecto da ligação comos franceses é a viabilização daproposta das arte-educadorasCecília Aranha e Rosane Acedo.Ambas escreveram, em parceria,um livro sobre intercâmbio entrepaíses. Uma das idéias desenvol-vidas pelas autoras é a troca deinformações por meio de cartões-postais. Como a França está empauta, a proposta poderia envol-ver jovens e crianças brasileiras efrancesas.

- Seria interessante que ascrianças falassem a respeito deseus países através dos cartões-postais, comentou Cibele Men-des. Por exemplo: aparece aTorre Eiffel e o menino vai estarpassando para cá. Vai mandarum cartão-postal para uma crian-ça que ele não conhece. O que elevai dizer da torre? Como ele vaiexplicar e tal? (...) Do outro lado,o menino brasileiro pegaBrasília. O que é que ele vai di-zer? Qual é a história dessa cida-de? (...) A única orientação queeles vão receber é uma indicaçãopara as pesquisas. No mais, elespróprios terão que se virar (...)Cada um escreve na sua próprialíngua, porque a gente tem aquias autoras, que falam fluentemen-te o Francês, e eles têm lá váriosmembros da Associação Jaca-randá que conhecem a fundo oPortuguês.

PPERSPECTIVERSPECTIVASAS – – O contato com aFrança acabou por abrir portas anovas perspectivas. Mesmo nãotendo ainda sido concretizada aexcursão a Bordeaux, a divulga-ção que a Associação Jacarandáfez do evento na Europa desper-tou a curiosidade de outras insti-tuições. Desse modo, italianos deuma associação sediada em Romademonstraram interesse em pro-mover atividades conjuntas.Disseram que seria ótimo um in-tercâmbio conosco. Como a gentesó pode viajar uma vez por ano,de acordo com as normas doMinistério, se a gente for para aFrança agora, somente em 2003

poderíamos ir à Itália. Mas, dequalquer forma, seja em 2003 ou2004, provavelmente que iremosa Roma.

Além das realizações no exte-rior, algumas participações em ini-ciativas nacionais também servi-ram para divulgar o trabalho e tor-ná-lo requisitado. Foi o caso doProjeto Arará, coordenado porLuís Carlos Arade, funcionário dojornal carioca O Dia. Esse jornal,disse Cibele, tem um trabalho coma comunidade. Há profissionaisque lidam com dança, ballet etc. Eo professor Luís Carlos Arade,que é o diretor dessa parte cultu-ral, nos convidou para estar tra-balhando com as crianças da fave-la em que ele faz esse trabalho dedança. Então fomos até lá e fize-mos as oficinas de arte, com músi-ca, artes plásticas, teatro, literaturae executamos a performance numsegundo momento (...) E o que foimais legal ainda é que essas crian-ças já estavam acostumadas a rece-ber cultura (...) Eles foram super-receptivos, supercriativos, aliás,como é de se esperar do pessoal defavela (...) Fizemos um trabalhomuito bonito. E está tudo registra-do (Pesquisa e texto realizados peloServiço de Difusão Cultural daFundação Pró-Memória de SãoCaetano do Sul).

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Piqueniquerealizadodurante oworkshop C

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Galeria No.Tre, localizada em Berlim,Alemanha

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Retrospectiva: Onze Salões de Arte Contemporânea no municípioNeusa Schilaro SCALÉA (*)

OO s Salões de Arte de São Cae-tano do Sul ocorreram em um

momento de grande efervescência nouniverso artístico de São Paulo e doBrasil. O primeiro Salão, em 1967,nasceu no fértil terreno preparado pe-las Bienais Internacionais de SP (des-de 1951) e por espaços como MAM-SP (1946), MAM-RJ (1949) e MASP(1954) . Respirava-se nesse períodouma modernidade cujo aroma lem-brava a Semana de 1922.

Os salões surgiam quando aindase discutia a autenticidade ou inauten-ticidade da produção artística - ou daprópria cultura brasileira -, acusada dealienação e submissão eurocentrada(entre outras questões estéticas), e fo-ram importantes justamente por abrirespaços e criar condições de respon-der positiva ou negativamente a essase a outras inquietações. Os salões, emSão Caetano do Sul – fora, portanto,do circuito cultural da capital paulista-na -, possibilitaram o contato de pu-blico e artistas com os contemporâ-neos, suas propostas, técnicas e temas.A vanguarda abria caminhos, dentroda Arte Moderna, com rupturas quepossibilitaram a chegada à pós-mo-dernidade de forma menos traumáti-ca.

A produção que aqui podemos,hoje, com naturalidade, apreciar, de-ve-se não só à qualidade dos artistas ede suas obras, mas também aos críti-cos, curadores e produtores culturaisdos Salões, que tiveram a felicidadede realizar escolhas em período alta-mente fértil da Arte brasileira e colo-cá-las ao alcance de nossas vistas, porvezes antes mesmo da participaçãodos artistas nas Bienais internacionais.

Aracy Amaral, no catálogo (e li-

vro) da Mostra de Arte Brasileira, rea-lizada no Musée d’Art Moderne de laVille de Paris (entre 10 de Dezembrode 1987 e 14 de Fevereiro de 1988),escreve:

A década mais vibrátil para omeio artístico brasileiro, depois domodernismo, foi por certo os anos 60.Vários fatores contribuíram para issoe a emergência do movimento “pop”,com a liberação explosiva de quais-quer materiais e suportes para feiturade obras de arte, assim como os even-tos sócio-políticos mundiais e nacio-nais contribuíram decididamente pa-ra essa vaga de criatividade. Períodopor excelência das vanguardas ponti-lhadas de “happenings”, manifesta-ções de rua e ambientais (...) No cam-po das artes visuais essas atuações seestendem de 1963 (data do primeiro“Happening” com Wesley Duke Lee,que depois fundaria o Grupo Rex comResende, Fajardo, Nasser e Leiner)até 1971 (...)

Toda uma geração emerge dentrodo clima dos anos 60 nos dois gran-des centros do País, São Paulo e Riode Janeiro: Antônio Dias com uma fi-guração agressiva e dramática atin-gindo a tridimensionalidade:Gerchman, Antônio Manuel, Vergara,Escotégui, no Rio de Janeiro. Em SãoPaulo essa geração estaria represen-tada por Tozzi, Aguilar, AntônioHenrique Amaral, Nelson Leirner,Tomoshigue Husuno, MarceloNistsche (...) Sem se constituírem umgrupo mas com uma figuração ex-pressiva ou denunciadora de situa-ções contemporâneas (...) Para essesartistas que se lançavam em experi-mentação em arte ambiental, pintu-ras, serigrafias, objetos, ou manifes-tações de rua o mercado de arte pra-ticamente não existia.

O abstracionismo gestual, infor-mal, aparece como uma alternativaao rigor do geometrismo abstrato e sepoderia mencionar, entre outros artis-tas, Maria Leontina, Ianelli, Di Prete

Capa de catálogo e cartaz do 1ºSalão de Arte Contemporânea deSão Caetano do Sul, ano de 1967

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Capa de catálogo e cartaz do 3ºSalão de Arte Contemporânea deSão Caetano do Sul, ano de 1969

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e Sheila Branigan. Esse é também umperíodo (1960) de emergência de ar-tistas nipo-brasileiros, de São Paulo,nascidos no Japão porém formadosprofissionalmente no Brasil (...) Datadessa época o surgimento da gravuraabstrata brasileira (...) A implantaçãodo abstracionismo no Brasil com seusmarcos (...) Ateliê Abstração deSamsom Flexor nos fins dos anos 40,I Bienal em 1951 e Grupo Rupturaem 1952, em São Paulo, e no Rio deJaneiro a I Exposição Nacional deArte Abstrata, em 1953, e o GrupoFrente em 1954-56 (...) A partir deentão (surge) uma escola de gravado-res de primeira linha como EdithBehring, Fayga Ostrower, Ana BelaGeiger, Ana Letycia, Rossini Peres,entre outros de São Paulo comoDelamonica, Maria Bonomi e A H.Amaral - saída das escolas de ArteModerna da capital paulista e partin-do para centros diversos, como NovaIorque ou Paris, para sua radicação.

Se alguém pretende afirmar queos artistas presentes nos salões de SãoCaetano do Sul , através de suasobras, no momento de sua participa-ção não eram conhecidos ou reconhe-cidos, estará mal-informado e, talvez,mesmo sem intenção, irá desmerecero valor desses salões e também o doacervo que deles resultou.

As técnicas, os temas e os mate-riais diversificados presentes nasobras expostas nos Salões talvez jáprenunciassem, ao observador atento,

as características mais marcantes da-quele momento artístico: atemporali-dade; valorização das superfícies econseqüente perda de conteúdos; des-continuidade, ou seja, fragmentação e,portanto, ausência da monotonia(embora as várias mídias empregadaspudessem levar a procedimentos con-trários); e a intensa e constante preo-cupação com a instantaneidade. Essespressupostos pós-modernos levam auma situação paradoxal: haverá obri-gatoriedade de repertório anterior paraa leitura e fruição das obras? A frasenão há olhar inocente, isto é, nada hásobre a terra que os olhos já não te-nham visto, reafirma esse paradoxo:se já foi visto, há referência e ,se há

referencia, haverá interpretação.Dessa forma, a instantaneidade e a su-perficialidade estarão atreladas aoelenco de conhecimentos.

Se esses pressupostos pós-moder-nos parecem estagnantes e efêmeros,há em sua defesa um principio quenão abandona o fazer artístico, o des-temor à inovação e à premente neces-sidade, nada superficial, de criação.

Outro engano seria classificar es-tes trabalhos de datados. Pertencem,certamente, a um período - alguns tra-zem signos e símbolos -, mas ema-nam de vanguardas, são verdadeirosem sua experimentação e impregna-dos de soluções instintivas, permane-cendo na emoção estética, social oupsicológica que os induz. Têm, por-tanto, inerentes a si, a atemporalidade.

Nada mais produtivo e arejado doque poder, dentro dos tempos pós-modernos (e alguns até já classificamesse nosso momento de pós pós),percorrer um caminho que, se foi ár-duo para os artistas, para nós é grato ebastante elucidativo.

Muito oportuna - e seguramentesólida em intenções -, esta retrospecti-va, inaugurando um novo espaço ex-positivo, instigará o público a discus-sões e ampliará o repertório do visi-tante (fundamentos necessários àfruição artística).

Cumprem, assim, as instituições,sejam museus de arte, pinacotecas oucentros culturais, a nobre e necessáriafunção de ampliar o ambiente didáti-co e levar ao visitante não só respos-tas, mas também indagações.

Bibliografia

AMARAL, Aracy. Modernidade. Muséed’Art Moderne de la Ville de Paris: Ed.Hamburgo, Paris, 1987.BARBOSA, Ana Mae,/ SALES, HeloisaMargarido. O ensino da Arte e sua His-tória. Museu de Arte Contemporânea daUSP, SP, 1990.

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(*) Neusa Schilaro Scaléa é museóloga espe-cializada em Museus de Arte. Formada peloMAC da Universidade de São Paulo

Capa de catálogoe cartaz do VISalão de ArteContemporânea deSão Caetano doSul, ano de 1973F

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Capa de catálogo e cartaz do VSalão de Arte Contemporânea deSão Caetano do Sul, ano de 1971

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São Caetano do Sul, cenário do primeirofilme brasileiro de bonecos animados

OO artigo que se segue é umaadaptação das declarações

do advogado e historiador MárioDel Rey acerca de sua experiên-cia na criação de desenhos ani-mados. O depoimento foi colhi-do no início do corrente ano.

Aos 12 anos ganhei um livroespanhol que explicava como sefaziam desenhos animados.Neste livro havia uma páginacom todos os detalhes do gatoFélix (de Max Fleisher) para fa-zer animação, com desenhos pa-ra colorir. Tais desenhos foramreproduzidos e coloridos peloentrevistado. Nessa época,Mário já fazia curso de desenhoe pintura com um professor queatendia na Rua Baraldi (ao ladodo atual Bingo São Caetano). Sóalguns anos depois freqüentariaa Faculdade de Belas Artes deSão Paulo.

Aos 15 anos, sua paixão pelosdesenhos animados e história em

quadrinhos era total. Incentivadopelo pai, fez curso por corres-pondência junto a uma escolanorte-americana, aprendendodesde a feitura dos personagensaté técnicas de animação e fil-magem dos desenhos nos aceta-tos. Nessa época, tinha um so-nho: ser um Walt Disney brasi-leiro. Não parou de pesquisar o

assunto. Em 1963, o pai, Igná-cio, e o tio, Felippe, apresenta-ram-lhe José Vedovato. O cenó-grafo, famoso na Vera Cruz, eratambém cliente das lojas IrmãosDel Rey. Desse encontro nasce-ria o Del Rey Estúdios.

Mário Del Rey, além de se in-teressar pelos desenhos, aprecia-va também os filmes de bonecosanimados. E, como nesse casoeram necessários cenários emminiatura, além de técnicas deiluminação de cenas, as amiza-des e o conhecimento do sr. JoséVedovato foram fundamentais.Formou-se a parceria ideal.Felippe Del Rey também se as-sociou ao empreendimento, em-prestando aos bonecos sua habi-lidade em tornearia e modela-gem.

Para o entendimento do pro-cesso de produção de um filme,primeiramente temos que expli-car que um filme é feito de milha-res de fotogramas. Cada fotogra-ma é uma foto (por exemplo, deum braço). Na filmagem de umapessoa levantando um braço, os

O cineasta tchecoMilos Makovic

anima o filme Aúltima sentinela!.Destaque para o

detalhe do cenárioem miniatura e

para Milosmanuseando um

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Os bonecosutilizados nofilme Volta àEscola tinhamtamanho earticulaçõessemelhantesaos dosbonecosutilizados pelocineasta Trnkano filme A mãoM

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fotogramas passam numa veloci-dade de 24 quadros por segun-do. Se, no exemplo do braço, pa-ra levantá-lo rapidamente gasta-se um segundo, teremos 24 ima-gens do braço nas variadas po-sições, do início ao final do mo-vimento. O mesmo ocorre nosfilmes de animação. Era assimque se fazia antigamente, princi-palmente nos estúdios de WaltDisney (...) A Branca de Neve,ao gastar dois segundos para le-vantar o braço, requeria quefossem feitos 48 desenhos dobraço nas várias posições! (...)Mais tarde, com Hanna &Barbera, os desenhos foram re-duzidos e, no caso de um braçolevantando em dois segundos,eram feitos apenas 12 desenhos,sendo cada um filmado quatrovezes. Na velocidade que pas-sam os fotogramas, a sensaçãode movimento é praticamente amesma, só um pouco mais anti-natural, o que inclusive fica me-lhor para os filmes de animação.

Basicamente essa foi a técni-ca utilizada por Mário Del Rey.Todavia, em vez de desenhos emacetatos e cartolinas, eram utili-zados bonecos articulados, mu-dados de posição a cada quatrofotogramas, em cenários em mi-niatura, normalmente feitos deisopor e depois pintados pelasmãos habilidosas do cenógrafoJosé Vedovato.

O Del Rey Estúdios estabele-ceu-se em casa de propriedadede Felippe Del Rey, no BairroSanta Maria, em São Caetano.Nas dependências do imóvel,posteriormente ampliado com aconstrução de um galpão, foramfeitas experiências que culmina-ram na produção do filme Voltaà Escola.

No que tange a essa produ-ção, tenho o orgulho de afirmarque esse filme, Volta à Escola,

foi o primeiro filme de bonecosanimados brasileiros. (...) Foifeito em São Caetano do Sul,com exceção da montagem e so-norização, que foram feitas emSão Paulo.

Em princípio foram feitas vá-rias experiências de animação,especialidade de Mário, que ha-via feito curso e desenvolvidoestudos e pesquisas sobre o as-sunto. Depois veio a idéia de fa-zer história sobre uma bruxa quegostava de assustar crianças. Aícomeçou a entrar a parte do José

Vedovato, isto é, os cenários emminiatura. Felippe Del Rey en-carregou-se de fazer os bonecosarticulados.

Construímos muitas rodagensde cenas que davam para consti-tuir uma história. Aí, atravésdas amizades de Vedovato, fo-ram contatados Máximo deBarros, famoso editor de filmesque, com ajuda de Ana MariaPimentel, deu uma melhor se-qüência nas cenas, formandouma história educativa paracrianças (...) A gente dizia queera muito importante se aplicaraos estudos e não faltar nas au-las. A duração do filme é deapenas oito minutos, mas levoudois meses para ser feito (...)Foi no ano de 1964.

Na verdade, tratava-se de umfilme experimental oferecido àTV Excelsior (canal 9). A idéiaera fazer um seriado semanal. Adireção da emissora gostou dofilme e se interessou em compraruma série, no entanto, exigiampelo menos 15 filmes já prontos.Isso foi desanimador, na ocasião,devido aos altos custos para arealização de cada filme.

A relação do mercado dos fil-mes naquela época...(...) Existiaum seriado de aventuras espa-ciais norte-americano que pas-

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Recorte do jornalFolha de São

Paulo em que émencionando o

filme Volta àEscola. Em

destaque, a bruxada história M

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Correspondência enviada pelaSecretaria de Estado dos Negócios do

Governo, Comissão Estadual deCinema, elogiando o filme Volta à

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sava na TV brasileira (...) Já ha-via uma tradição sobre o assun-to (...) No tocante à história dasanimações, tudo começou nosEstados Unidos, em 1907, comJames Stuart Blackton, que fez ofilme Haunted Hotel, em que ob-jetos e móveis se mexiam atra-vés de animação. Em 1911,Ladislas Starevich, então diretordo Museu de História Natural deKovno, na Rússia, fez anima-ções tendo como modelos inse-tos. Animado com esse trabalho,foi para Moscou, na época ocentro da produção russa de fil-mes. Lá realizou, em 1911, o fil-me O gafanhoto e a formiga,prestigiado pelo Czar Nicolau II,e depois exibido em Paris. Foi oprimeiro filme russo exibido noexterior.

Os filmes de bonecos anima-dos têm uma grande tradição naEuropa Oriental, ali tendo sedestacado especialmente naPolônia e na antiga Tchecos-lováquia. Os nomes de JiríTrnka, Hermínia Týrlová, TeresaBadzian e Wasilewski são mun-dialmente famosos (...) Voltandoa falar da Del Rey Estúdios, de-pois da dificuldade em fazer umseriado para a TV Excelsior,

promovemos um comercial de te-levisão e também a apresenta-ção de um longa-metragem cha-mado Deus e o Diabo de VilaVelha (...) O Vedovato estava, naépoca, ocupado com uns cená-rios para o Mojica Marins (Zédo Caixão) (...) Cenários queeram feitos dentro de um ex-tem-plo (...) Eu comecei a fazer ex-periências com filmes de dese-nhos animados, no nosso estú-dio, e a fazer histórias em qua-drinhos na Rua Niterói, 20,Bairro Centro, São Caetano (fo-ram feitos dois gibis que não ti-veram muito sucesso). Nessaépoca, os integrantes do estúdioconheceram o ator Carlos Mi-randa (que fazia o seriado e osfilmes do Vigilante Rodoviário)e, em conjunto, trabalharam noprojeto de um filme que deveriaser protagonizado por Miranda.Além do material cinematográfi-co que possuíam, compraramuma filmadora inglesa Sinclair,que havia sido trazida ao Brasilpelo cineasta Cavalcanti.

Nesse filme contamos com aajuda das firmas Brasinca (ocarro Uirapuru, dessa firma, iater destaque no filme) e Rhodia(a atriz iria usar produtos Vali-

sère). Infelizmente, na época defechar o negócio houve uma cri-se automobilística e a idéia nãofoi para frente (...) Devido aoscontratempos e também ao in-gresso de Mário no curso deDireito, o estúdio foi desativado.Venderam tudo para a extintaTV Excelsior. O Vedovato conti-nuou sua carreira e hoje constade muitos dicionários de cineas-tas como diretor, produtor, cenó-grafo etc. (...) O Volta à Escola,apesar de ter recebido elogiosdo presidente da ComissãoEstadual de Cinema, em 1965, ede ter sido mencionado em vá-rios jornais, nunca vi ser citadoem qualquer livro sobre a histó-ria do Cinema nacional (. . .)Uma cópia parece que ficou coma Folha e não foi devolvida (...)Outra cópia parece que foi en-tregue à Cinemateca (...) Umaterceira cópia, com os negativos,foi entregue à Fundação dasArtes de São Caetano do Sul,ainda no tempo em que MárioDel Rey era um dos curadoresda instituição. Infelizmente, todoesse material foi extraviado(Pesquisa e texto realizados peloServiço de Difusão Cultural daFundação Pró-Memória).

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Foto-animação,com texto

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Parte da capa deum gibi da DelRey Estúdios

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A Fotografiae a Cidade II

AA s duas fotografias que ilus-tram este artigo oferecem

leitura que transcende a idadede ambas. Idade que pode serimediatamente calculada não sópelos trajes, mas também pelasposturas, distribuição das pes-soas nas cenas e, enfim, por to-da uma atmosfera característicade certo momento da vida cotid-iana da cidade.

Ambas foram realizadas porvolta de 1890 e retratam famí-lias. Pode-se até arriscar umpalpite: famílias de origem eu-ropéia. E há o cenário: simu-lação de janelas, cortinados,pinturas que dialogam intima-mente com móveis e objetos.

A admirável qualidade dailuminação neutraliza sombras.Tecnicamente diriamos que asluzes al tas , habi lmente dis-tribuídas, possibilitam climauniformemente adequado. Ates-tados de sensibilidade e técnicade ótimos profissionais.

Fotos de família foram sem-pre muito importantes. Dia e ho-ra eram marcados, preparavam-se as roupas, os homens com-pareciam ao barbeiro e as mul-heres caprichavam no penteado(a maquiagem era proibida asenhoras e moças). A sessão defotos dificilmente incluía maisde uma chapa. O preço de umachapa fotográfica (filme) erabastante alto, a sensibilidade pe-quena e, portanto, todos deveri-am ficar imóveis (fazendo po-ses) para não haver o risco dedesvio no foco ou de foto tremi-da. A partir daí, o trabalho dofotógrafo seria na revelação e noretoque físico ou químico.

Notem que, na foto B, háuma senhora, presumivelmentea mãe, de pé, à esquerda, e, sen-tados, dois filhos, sendo que umdeles ocupa a cadeira da direitae parece ser o primogênito.

Na foto A, pai e mãe estãosentados lado a lado, procedi-mento usual na maioria das fo-tos de família. Na foto B, a mãenão está no mesmo plano do fil-ho mais velho, que estaria sen-tado no lugar destinado ao pai.E o pai? Não está presente nafoto? Sim, está. Notem o detal-he da corrente – por certo deouro – que o rapaz traz no co-lete, sob o paletó. Dela pende afoto de um homem ausente fisi-camente. Evidentemente, a mãe

não está sentada ao lado do fil-ho mais velho (Freud teria ex-plicações mais complexas...),mas o posto do patriarca estáocupado por aquele que carregasua efígie.

Nossos registros, parcimo-niosos neste caso, não esclare-cem toda a história. Com efeito,talvez depoimentos de famil-iares possam vir a comprovarou desmentir essa leitura. Massão dados paralelos aos acon-tecimentos, implacáveis reg-istros fotográficos que param otempo e levam a devaneios nosmistérios da memória. (Pesqui-sa e texto realizados pelo Ser-viço de Difusão Cultural daFundação Pró-Memória)

Foto A

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Foto de detalhe

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Força feminina combate o câncer há 30 anos

AA história ofi-cial da Re-

de Feminina Re-gional de SãoCaetano do Sul,parte da Asso-ciação Paulistade Combate ao

Câncer, começou no dia 15 deAbri l de 1971. Se bem queantes dessa data já existia umforte grupo de senhoras sancae-tanenses que, de maneira anôni-ma e, em muitos casos, individ-ualmente, dedicavam tempo eesforços para arrecadar bens eobjetos encaminhados aoHospital do Câncer, em SãoPaulo.

Depoimentos diversos dãoconta da exis tência de umaprimeira tentativa de organiza-ção de uma entidade com essafinalidade. Tivemos a sugestãoque foi passada pela sra. Dami,presidente de uma rede femini-na que exis t ia na cidade deOsasco, à sra. Tosca Moretti, deSão Caetano do Sul. Até mesmouma reunião na casa da sra.Edna Lorenzini, na Rua 28 deJulho, 208, no Bairro Fundação,chegou a acontecer mas, devidoa diversas dificuldades, o proje-to não foi em frente.

Anos mais tarde, o dr. An-tônio Prudente - que havia fun-dado a Rede Feminina de Com-bate ao Câncer, em companhiada esposa, Carmem Prudente -veio até São Caetano, forte re-duto de voluntárias, a fim departicipar daquela que seria areunião que concret izar ia oant igo sonho. Essa reuniãoaconteceu no dia 15 de Abril de

1971, na residência da RuaMonte Alegre, 90, no centro deSão Caetano. Ali , por acla-mação, foi eleita para presidir anova entidade a sra. SantinaGiampietro Moretti. Na ocasião,recebeu de dona Carmemplenos poderes para representaro Hospital do Câncer na cidade.

DD I R E TI R E T O R I AO R I A - - A presidenteSantina convidou todas as mul-heres presentes à reunião paracomporem a primeira diretoria,que ficou assim constituída:vice-presidente, Zuleika Barile;secretária, Nelly Vilela; vice-se-cretária, Solange Sígulo; tesou-reira, Celestina Dal'Mas; vice-tesoureira, Ofélia Barile; direto-ra social, Olga Olson Meira; re-lações públicas, Vilma Silveirade Isais. Foram eleitas tambémas seguintes conselheiras: Cân-dida Fedato, Jandira Sot toMaior, Evani Cury Calil, IracyBrisola Munhoz, Judith PinaDal'Mas, Sílvia Arruda Santos,Maria de Lourdes Espósi to ,

Zilda S. Villas Boas, Lucy PugaPinto, Guiomar Lorenzini Luiz,Hilda Ghioto, Jandira Mancuso,Anésia Lorenzini Pucetti, Amá-lia Barutti, Irene Munhoz Emi-liani, Terezinha Pires, FláviaRicci, Neusa Faria, Olga Pina,Maria Braido, Elvira Braido,Mirian Falchero, Ivete Kirche,Ivone Cristoffi, Iracema Vin-cenzi e Josefina.

As informações aqui apresen-tadas estão na Ata da PrimeiraReunião da Rede FemininaRegional de São Caetano do Sul.Faz parte deste documento a in-formação de que cada associadacontribuiria com cinco cruzeiros(dinheiro da época) por trimes-tre. Além disso, as mesmas dev-eriam realizar, mensalmente,uma atividade com objetivo deangariar verbas. A primeira pro-moção programada foi um chá,realizado no dia 14 de Maiodaquele ano, nos salões doEdifício Di Thiene, localizadono mesmo endereço da primeirareunião: Rua Monte Alegre, 90.

Durante jantarfestivo do LionsClub de SCS –

Santa Paula, em26 de Abril de

1989, CarmemPrudente recebe

cheque dasmãos da entãopresidente da

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Lendo a ata da segunda re-união, ficamos sabendo que oevento rendera a quantia de 607cruzeiros. O montante, somadoà venda dos livros (Culinária eBebê), cuja arrecadação foi demil cruzeiros, destinava-se àsra. Carmem Prudente.

Consta ainda nessa ata quena reunião do dia 27 de Maio de1971 foram eleitas novas con-selheiras: Noêmia Crepaldi ,Dora Cipulo, Zuleika Pires ,Maria Mirtes Berner, IsauraRodrigues, Terezinha Pires ,Odete F. Paes, Yolanda Buso,

Elvira Camargo Gonçalves ,Maria Mechi, Verotti, MafaldaL. Cazella, Anastácia Gomes eIrene Buzon.

Esse encontro terminou coma presidente informando que anova ação seria uma chocolata-da nas dependências do Clubeda General Motors, no dia 17 deJunho.

Do terceiro documento destaata, destacamos a entrada demais a lgumas conselheiras:Helena Kakumo, Alzira Pires,Leila Dario Foroni, Neusa Fa-ria, Anália Barutti, Claire Netti

Cruz, Ivete Sperat i , JoremaPereira, Brasília B. de Petta eBella Pena. Naquele dia, oito deJunho, anunciaram que sairiamdo conselho as senhoras: IracyMunhoz, Terezinha Pires eFlávia Ricci.

A leitura das atas é um pas-seio por entre números e muitasrealizações. A cada mês um no-vo chá, um novo evento, maisarrecadação e mais doações aoHospital do Câncer. Todo esseesforço foi premiado. Graças aesse constante empenho, acon-teceram vários reconhecimen-tos para o grupo. Suas integran-tes receberam homenagens emforma de prêmios, como por ex-emplo no ano de 1997, quando,no Almoço Anual da RedeFeminina, que reuniu volun-tárias de todo o Estado, SãoCaetano do Sul foi agraciadopor ter sido a cidade que maisarrecadou bens em espécie .Esse prêmio foi conquistadopela adminis t ração da atualpresidente: Neusa Lacava (Pes-quisa e texto realizados peloServiço de Difusão Cultural daFundação Pró-Memória).

XIV Simpósioda RedeFemininaNacional, emRecife,Pernambuco,no período de14 a 17 deOutubro de1986. Naprimeira fila acomitiva de SãoCaetano do SulR

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São Caetano participou do 9º Encontro da Rede Feminina deCombate ao Câncer, no Hotel Serra Azul, em Gramado, RioGrande do Sul, período de 11 a 13 de Novembro de 1976

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Ao microfone, a atual presidente da Rede Feminina de Combateao Câncer de São Caetano do Sul, Neusa Lacava, durante o 16ºSimpósio Nacional da Rede que aconteceu em Blumenau, Santa

Catarina, no final de Agosto de 1990

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Relato sobre a famíliaCapella na década de 30

Roberto CAPELLA (*)

MM eus pais , João RobertoCapella e Adiléia Capella,

vieram de Portugal para o Brasilem 1915. Foram morar emOsasco, depois no Brás e, emseguida, em Mogi das Cruzes.Vieram para São Caetano do Sulem 1931. Meu pai alugou umachácara onde hoje é o pavilhãoda Antiga Cerâmica Americana.Naquela época só havia a fábri-ca de curtume, que fazia divisacom o Rio dos Meninos. A nos-sa chácara fazia divisa com ocurtume até a Rua Major CarloDel Prete. De um lado era a RuaConceição, do outro o terrenoda fábrica do Dal’mas, aindanão construída. Nosso pomarera muito grande, com mais de300 pés de frutas de várias qua-

lidades. Tínhamos também umachácara com plantação de ver-duras.

Meu pai possuía umas 30 ca-beças de gado e nós vendíamoslei te pelas ruas da cidade.Éramos em oito pessoas na fa-mília: meus pais e os f i lhosElias, Alberto, Mário, Lídia,Linda e eu, Roberto, o caçula.

Meu pai era leiteiro e percor-ria as ruas da cidade para a en-trega do leite. Ele ia com a car-roça entregar o leite, na parte damanhã, acompanhado de minhairmã Lídia. À tarde ia eu. Nossachácara fazia divisa, na RuaConceição, com o terreno da fa-mília Ferrari, que tirava areia ebarro do local para a fabricaçãode tijolos em sua olaria.

Passei minha infância todajunto à família Ferrari. Brin-cávamos, jogávamos bola, na-dávamos nas lagoas onde era ti-rado o barro. Praticamente cres-cemos juntos, eu e o NarcisoFerrari, o Toni, o Humberto, oRubens. E somos amigos atéhoje. Naquela época a vida eramuito dura, pois todos tínhamostarefas para ajudar no sustentoda casa.

Meu pai cuidava da chácara,entregava o leite e ajudava a en-garrafá-lo. Meus irmãos corta-vam o capim para o gado e aju-davam a tirar o leite e engarra-fá-lo. Nós tínhamos muito medoquando vinham os laçadores daPrefeitura para laçar o gado.

Ficamos mais ou menos 12anos na chácara. Depois, meupai vendeu tudo e comprou ter-reno na junção das ruas Con-ceição e Santo Antônio (hojeAvenida Senador Roberto Si-monsen). Montou um bar e mer-cearia, onde trabalhei durante

Roberto Capella no alto do Morro do Parente. Ao fundo, a

Rua São Paulo, em 1947

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Avenida Roberto Simonsen (antiga Rua Santo Antônio). Da direita para a esquerda:Roberto Capella, Oswaldo Naville, Orlando Zanai, Orlando Della Valle.

Aproximadamente 1947

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muitos anos junto com meu ir-mão Mário.

Estudei no Grupo EscolarBartolomeu Bueno da Silva, naRua Monte Alegre. Terminei ocurso e fui estudar na EscolaTécnica Getúlio Vargas, na RuaPiratininga, no Brás, onde meformei ferramenteiro. Trabalheina Ford por mais ou menos 11anos. Depois fui para a Volks-wagen, onde me aposentei. Ofutebol também teve momentosmarcantes em minha vida.Joguei no infantil do Ypiranga eno juvenil do Cruzada, juntocom Toninho Zaparolli, Amé-rico, Valter, Irineu etc. Depoisjoguei pelo Cruzeiro FC, dispu-tando o campeonato matutinoda cidade e enfrentando clubescomo Ipiranguinha, Tamoio,São Cristóvão, América, Nacio-nal, Bomsucesso e Comercial.Sinto muita saudade daquelaépoca, pois não havia tanta mal-dade nas pessoas. A gente sedava com toda a vizinhança.Quando um conhecido ficavadoente, logo era recebido portodos os amigos. Gostava muitode baile e costumava dançar noGuarani, no São Caetano, noLázio e no General Motors (on-

de encontrei uma namorada queé hoje minha esposa).

Crescemos e casamos. Meuirmão mais velho, Elias (faleci-do), casou-se com Antônia (fa-lecida), tendo os filhos Sidnéiae Sidnei . Meu outro i rmão,Alberto, casou-se com BrunaCavassani , tendo uma fi lha:Ivani. Meu irmão Mário casou-se com Esmeralda Ribeiro (fale-cida), tendo os filhos Ademir,

Eleni e Vlademir Capella, que édiretor de teatro.

Minha irmã Lídia casou-secom José Reinaldo, que era mú-sico e tocou no conjunto deFrancisco Petrônio. Teve doisfilhos: Neusa e Edélcio.

Minha irmã Linda casou-secom Irio Coppini e teve dois fi-lhos: Tânia, casada com JoãoA. Ferreira de Mattos, filho dasoprano Josefina Spagnuollo, eTelma, casada com CelsoPreniceto.

Eu, o caçula, casei-me comCarmem Cecília. Temos dois fi-lhos: José Roberto Capella, ge-rente de vendas, casado comRosane La Porizi e pai deAriane e Advair; e Vânia, casa-da com José Carlos Dias Reis,engenheiro e empresário, donoda firma Engelcad Alimentação.Os filhos do casal são Fernandoe Carlos Eduardo.

Este é um pequeno relato deminha família. Sinto muita sau-dade daquele tempo que nãovolta mais.

(*) Roberto Capella, aposentado, filho deJoão Roberto Capella e Adeléia Capella

Vista aérea da chácara onde morava afamília Capella, ao lado da IndústriaAgroquímica Dal’Mas. Ao fundo, ocurtume e em primeiro plano a Rua

Major Carlo Del Prete

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Chácara doFiorotti (Time deveteranos.Aproximadamente 1990). Dadireita para aesquerda:Odilom Cotrim,Escovinha,Wilson, Melani,Plínio, RobertoCapella, William.Agachado:OrlandoF

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Roberto Capella, à direita, e HélioNoville. Time do Cruzeiro

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José Lozano: 60 anos como açougueiro na cidade

NN asci em 23 de Agosto de1932, em São Caetano do

Sul, precisamente na Rua Riode Janeiro, na ant iga Vi laPaula, hoje Bairro SantaPaula. Meus pais eram espa-nhóis de Badajós e Granada(...) Joaquim Lozano e Henri-queta Perez Lozano. Meu paiera soldador e trabalhou mui-to tempo na Fichet, de SantoAndré, e também na constru-ção dos pavilhões industriaisda General Motors, no finalda década de 20. Éramos emseis irmãos: Antônio, Nena,

Joaquim, Manoel, Nélson eeu. Destes apenas o Antoniofaleceu, os demais foram cria-dos nesta casa da Rua Rio deJaneiro até a mudança da mi-nha famíl ia para a RuaSaldanha da Gama, em 1938,no mesmo bairro (...) Hoje es-sa rua chama MarechalDeodoro (...) Estudei o cursoprimário no Grupo Escolar daVila Barcelona, na AvenidaGoiás, onde hoje está locali-zado o Edi f íc io Marrocos,próximo à esquina da RuaTiradentes (...).

Comecei a trabalhar quan-do criança, apanhando car-vão-coque na linha do trempara vender para os ferreirosda cidade, que o utilizavampara aquecer as fornalhas eventoinhas utilizadas na fabri-cação de ferraduras para oscavalos. Eu saía pela cidadetambém para recolher vidros,latas velhas, ossos e engraxarsapatos (...) Chegava em umacasa, recolhia até dez pares desapatos (...) A maioria das fa-mílias já era conhecida e issofacilitava o meu trabalho (...)Lembro-me também que pe-neirei muita areia, na CasaLaranjeira, para construçãode casas (...) E ainda ajudavana entrega de material pelasvárzeas de Utinga, Camiló-polis (...) Tudo transportadoem carroças com tração ani-mal.

O meu primeiro emprego emaçougue começou na VilaPaula mesmo. Fui convidado,aos 12 anos de idade, pelo do-no de um açougue da Rua Ge-neral Osório e lá, de calçascurtas, comecei lavando as pa-redes e entregando carne a do-

José Lozano em depoimento à Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul no dia 19 de Março de 2002

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José Lozano, àesquerda, ematividade noaçougue dosLorenzinis, naAvenida CondeFransiscoMatarazzo.Década de 50. Àdireita, JoãoGomes, tambémfuncionário doaçougueJo

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micílio (...) Fiquei por ali du-rante mais ou menos quatroanos. Essa época coincidiucom o tempo da SegundaGuerra Mundial (...) Era difícilsobreviver (...) E eu tinha queentregar as carnes de madru-gada, pois, com a carênciadesse alimento, as filas que seformavam em frente ao açou-gue começavam à meia-noite eiam até a hora do almoço (...)Saía de bicicleta pela madru-gada, com qualquer tempo,chuva, frio, e as ruas eram to-das de terra, esburacadas, en-lameadas (...) E o que eu sofriade tombos não era brincadei-ra, principalmente nas valetasfeitas pelas rodas das carroças(...) Todos os açougues de SãoCaetano, na década de 40, re-cebiam carne do antigo mata-douro de Utinga, pertencente aJúlio Martinelli . Posterior-mente, a Cia. Swift do Brasiltomou conta do local.

Eram muitas as dificulda-des no tocante ao abasteci-mento de carne naquela época.De fato, as carnes frigorifica-da e enlatada perdiam posiçãona produção nacional devido àredução das exportações e àfalta de hábito do brasileiroem consumir esse tipo de ali-mento. A chamada carne ver-de e a carne de sol eram pro-dutos mais apreciados peloconsumidor interno. O proces-so de modernização do setorde carnes, no Brasil, foi muitolento em relação à aceitaçãodas carnes frigorificada e con-gelada. Isso explica a ascen-são, na época, dos matadoresmunicipais e dos charqueadoscom abatedouros de gado. Em1950, existiam no Brasil ape-nas 19 matadouros-frigoríficosem funcionamento. No Estadode São Paulo, apenas cinco ci-

dades possuíam esse tipo deestabelecimento: Barretos,Osasco, Cruzeiro, São Paulo eSanto André, onde se localiza-va o frigorífico da Swift (noBairro de Utinga).

Também o consumo de car-ne per capita do brasileiro, em1950, não era superior a 25quilos por ano (muito baixo secomparado com o da Ar-gentina: 115 quilos por ano).No Uruguai, a média era de 82quilos por indivíduo.

A carne da Swift, distribuí-

da em São Caetano, em toda aregião do ABC e também nacapital, era uma carne de boaqualidade (...) Parece-me queo abate diário chegava a milbois nessa época (...) As car-nes eram recebidas nos açou-gues em peças inteiras, limpas(...) Depois é que eram des-manchadas (...) E neste açou-gue fiquei mais ou menos qua-tro anos (...) Inclusive passeia tomar conta sozinho, pois omeu patrão tinha uma fábricade lingüiça em Amparo e cos-tumava se ausentar até pordez dias. Isto tudo eu já assu-mia aos 14 anos, atendendouma clientela diversificada deucranianos, alemães, eslavos(...) Todos moradores da VilaPaula.

O meu emprego subseqüen-te foi num açougue na RuaManoel Coelho, em um prédioconstruído pelo médico AldoArenella (...) Açougue do sr.Stevano ( . . . ) Fiquei ali umano, trabalhando com a espo-sa do proprietário (...) Logoem seguida, depois de um ano,deixei esse emprego e comeceia trabalhar na rede de açou-gues da famíl ia Lorenzini .Essa família possuía cincoaçougues: um na Rua 28 de

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José Lozano, à esquerda do carro, em frente ao Açougue

Bandeirantes, na Rua Rio Grande do Sul. Década de 60

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AvenidaFrancisco

Matarazzo, emfrente ao

açougue dosLorenzinis,

década de 50.Da direita para aesquerda: José

Lozano, JoãoGomes,

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Julho/2002 RRAAÍÍZZEESS83

julho; um na Travessa SãoJosé, perto da Texaco; um naJosé Paolone, dentro do Mer-cado Inca, uma novidade naépoca; e os dois últimos naAvenida Conde FranciscoMatarazzo: um em frente à ca-sa Weigand e o outro ao ladoda antiga capelinha de SantoOnofre, depois demolida. Essarede de açougues era dirigidapor João Jacob Lorenzini eFrugoli Lorenzini, que eramirmãos (...).

Nesse emprego – eu já ti-nha 18 anos -, sofri o maisgrave acidente da minha car-reira: ao cortar um pedaço decarne, metade dura e metademole, a faca, ao atingir a par-te mole da peça, deslizou e fe-riu minha perna na altura dofêmur. Não agüentei, chegueiquase a desmaiar (...) Mas fuisocorrido a tempo e voltei pa-ra o trabalho. Fora este aci-dente, tive apenas pequenoscortes nos dedos, sem maiorgravidade.

As exigências para o traba-lho de açougueiro, na época,eram rígidas ( . . . ) Neces-sitava-se da carteira de saúdeem dia, com exames médicosfreqüentes e periódicos, aocontrário de hoje, que não seexige mais nada (...) Fora daminha profissão não haviamuito tempo para diversão(...) Freqüentava os bailes doComercial, os cinemas da ci-dade (...) E alguma prática es-portiva.

O grande passo da minhacarreira, depois de trabalharpara a família Lorenzini, foiadquirir meu próprio açou-gue, na Avenida Goiás, emfrente à Escola Estadual Co-ronel Bonifácio de Carvalho,em prédio que foi posterior-mente demolido para a du-

José Lozano em seu açougue na Rua Rio Grande do Sul. Março de 2002.

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NN o dia 14 de Setembro de1953, o presidente da Câ-

mara Municipal de São Cae-tano do Sul, vereador ÂngeloCianfarani, iniciou polêmicacom o diretor da CompanhiaSwift do Brasil, Arnaldo LuizMartinelli, ao enviar-lhe ofíciocom votos de protesto contra adecisão da Swift em fornecercarne congelada à populaçãode São Caetano do Sul.

A diretoria da indústria fi-cou surpresa com o documen-to e prontificou-se a respon-dê-lo. A empresa explicouque o plano de abastecimentode carne, para o ano de 1953,atendia simplesmente ao arti-go décimo quinto, da portarian.º 1079, de 17 de Outubro de1952, que previa a estocagemde carne para o período com-preendido entre primeiro deAgosto e 31 de Janeiro dosanos de 1952 e 1953. Alémdisso, a Swift buscava dimi-nuir a preocupação dos san-caetanenses no que dizia res-

peito à qualidade da carnecongelada, explicando que oproduto possuía as mesmasgarantias da carne fresca notocante à questão sanitária.Para comprovar a qualidadeda carne congelada, a Swiftcolocou à disposição dos ve-readores de São Caetano doSul todas as notas taquigráfi-cas da mesa redonda realizadapelo Canal 3 de televisão. Dadiscussão haviam tomado par-te as maiores autoridades doassunto, com credenciais ne-cessárias para analisar, em to-da sua magnitude, a questão.

Com efeito, a mesa redon-da da PRF3 – TV Tupi-Di-fusora, realizada às 22 horasdo dia 14 de Julho de 1953,levara ao ar o tema A CarneCongelada. O programa foiapresentado por Ruy Rezendee Evaldo Dantes Ferreira econtou com a participaçãodos professores Alípio Cor-reia Neto e Walter Lesser,a lém dos doutores Walter

Fonseca, Cássio Botura eLeopoldo Groso Sobrinho.Apesar disso, a polêmica en-volvendo a carne congeladanão terminava. Outra mesa re-donda, dessa vez transmitidapor rádio, foi organizada. Em24 de Setembro de 1953, aRádio Cultura de São Paulo,por meio do apresentador V.Alves Assumpsão, convidavaos seguintes participantes pa-ra a discussão sobre carnecongelada: doutor Oto Pêce-go, professor Pascoal Muc-ciolo, doutor Walter Fonseca,doutor João Barrisom Vilares,doutor Justino Antunes deOliveira e doutor AnísioMachado Cézar.

Ambas as mesas-redondasforam calorosas e polêmicas.Guardadas as devidas propor-ções, no que diz respeito à na-tureza dos assuntos, pode-sedizer que os debates foramsemelhantes às discussões ho-je impulsionadas pelos ali-mentos transgênicos.

Carne congelada criou polêmicaem São Caetano do Sul no ano de 1953

plicação da avenida (...).Neste açougue que estou

hoje trabalho desde 1961. Onome “Açougue Bandeiran-tes” foi colocado pelo pro-prietário, sr. Avelino, que jápossuía o Bar Bandeirantes e,assim, batizou os dois estabe-lecimentos com o mesmo nome(. . . ) No Açougue Bandei-rantes, onde estou hoje, forne-ci carne para antigas famíliassancaetanenses , como osBraido, os Perrella e outros(...) Inclusive para o saudoso

padre Ézio Gislimberti (...) Apartir dos anos 70, a situaçãopara os açougueiros autôno-mos começou a ficar compli-cada devido ao aparecimentodos supermercados, da aceita-ção total da carne congelada,enfim, das mudanças dos há-bitos alimentares da popula-ção (...) A chegada dos free-zers domésticos, dos fornos demicroondas, o aparecimentodos restaurantes populares,tudo isso contribuiu para queo comércio varejista de carne

fosse diminuindo (...) E achoque, além de mim, deve havertalvez mais dois ou três açou-gues no estilo antigo em SãoCaetano.

Hoje estou aposentado (...)Recebo apenas R$ 504,00após trabalhar a vida toda co-mo açougueiro (...) Acho queo que tinha que fazer já fiz. Eaté mais do que era preciso(Pesquisa e texto realizadospelo Serviço de DifusãoCultural da Fundação Pró-Memória).

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Família Gesellmann, 57 anos de São Caetano

Yolanda ASCENCIO (*)

JJ osé Gesellmann, filho de JoãoGesellmann e Victoria, nasceu

na cidade de Kikinda, Iugoslávia,no dia 17 de Novembro de 1919.Imigrou para o Brasil, com a fa-mília, quando tinha apenas quatroanos de idade.

João e Victoria, os pais, natu-rais da Iugoslávia, imigraram, emépocas diferentes, para os EstadosUnidos, onde se conheceram e secasaram. Já com um filho, Matias,o casal Gesellmann voltou para aIugoslávia. Isso foi em 1913.Eram lavradores, cultivavam uvase produziam vinho. Nessa época,tiveram mais dois filhos: Martin eAntônio. Com três filhos peque-nos, João Gesellmann foi convo-cado para a guerra. Por dois anosfoi prisioneiro de guerra e porduas vezes tentou fugir. Na pri-meira tentativa, João foi captura-do. Na segunda, enfrentando mui-tas dificuldades, conseguiu chegarem casa, a pé e maltrapilho.

Na ausência do marido, Vic-toria cuidava dos filhos e da la-voura. Voltando João, a vida dafamília Gesellmann se normalizoue nasceram mais dois filhos: José(nosso entrevistado) e Cristina.

Depois da guerra, a vida foi setornando cada vez mais difícil.Assim sendo, a família Gesell-mann imigrou para a França e delá para o Brasil. Chegaram no na-vio Desma, que saiu do porto deCherburgo e ancorou no porto deSantos, SP, no dia 14 de Março de1924, às 13 horas. Ao que parece,a filha mais nova da famíliaGesellmann, Cristina, teria morri-do durante a viagem, uma vez quenão chegou ao Brasil e seu nomeconsta do passaporte.

No Brasil, a família Gesell-mann foi encaminhada para aimigração, em São Paulo. Comose recusasse a seguir para a fa-zenda, teve prazo de 24 horas pa-ra deixar a imigração. Já com afamília na rua, João ouviu dizerque a Antártica estava admitindoempregados. Foi até lá e conse-guiu trabalho, alugando uma pe-quena casa na Rua da Mooca, es-quina com a Rua Paes de Barros,atrás de um cemitério que haviano local.

No dia cinco de Julho de 1932,irrompeu a revolução (Tenentis-mo) e a família Gesellmann foiobrigada a deixar a casa que foiocupada pelos soldados. Trans-portados em vagões sujos, que le-vavam bois, João e sua famíliachegaram em Campinas, sendoalojados num hospital até o fimda revolução. Restabelecida a or-dem, João retornou com a famíliapara a mesma casa e continuoutrabalhando na Antártica. Em1934, o sr. João Gesellmann con-seguiu comprar terreno na RuaCassaquera, em São Caetano, on-de construiu uma pequena casapara a qual se mudou.

FamíliaGesellmann. Daesquerda para adireita, em pé:Antônio, Martin,Mathias, Rodolfoe José.Sentados:VictoriaGesellmann eJoão GesellmannF

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Casamento de Anton Franz com Anna

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TTRABALHORABALHO - - Enquanto os filhosmais velhos foram trabalhar, Joséficou com a mãe, mas tambémcontribuía para o sustento da casa.D. Victoria comprou uma vacaque produzia dez litros de leitepara comercializar. José punhacinco litros de leite em cada bolsae ia a pé até a estação, tomava otrem, descia na Estação da Luz e,também a pé, entregava o leite naRua Santa Efigênia.

Segundo nos contou, JoséGesellmann estudou muito pouco.Assim, por algum tempo, estevematriculado na Escola Sete deSetembro (na Avenida Goiás), emdois colégios religiosos da capitale na EE Dom Benedito. Conse-guiu chegar apenas até o terceiroano primário. Quando estudavaem São Paulo, ao perder o trem,José e os colegas vinham para ca-sa a pé, seguindo a linha do trem.

Por volta de 1933, o garotoJosé levava água da mina para ossoldados entrincheirados na fá-brica de cartuchos em troca decápsulas vazias que ele vendiacomo sucata. Em 1934, entrega-va marmitas de uma pensão paraos trabalhadores da GeneralMotors do Brasil por alguns cen-tavos e um lanche.

Com 14 anos de idade, JoséGesellmann foi trabalhar em

uma oficina na Avenida Paulista,onde aprendeu o ofício de funi-leiro. Segundo ele, tomava otrem até a Estação da Luz e ia a

pé até a Rua Maceió. Começavaa trabalhar às 6h45 da manhã.Como o patrão morava em fren-te, o garoto pegava a chave,abria a oficina e fazia a limpezaantes do expediente. O patrãoera muito enérgico, mas ensina-va bem. Até me dava umas pal-madas quando eu errava algumacoisa, diz o entrevistado.

Sempre para ganhar um poucomais, José Gesellmann trabalhavaaos sábados até meio-dia e, du-rante a semana, acompanhava amulher do patrão à feira para car-regar as compras.

Quando o jovem José Gesell-mann já estava bem treinado emseu ofício de funileiro, o patrãomudou-se para Piracicaba e a ofi-cina fechou. Nessa época, Josépassou a trabalhar na Empresa deÔnibus Alto do Pari, onde conser-tava radiadores. Em seguida,prestou serviço ao Expresso So-corro São Cristóvão, na AvenidaBrigadeiro Luiz Antônio.

Sempre em busca de melhorescondições de trabalho e de salá-rio, o sr. José Gesellmann passoupor muitos empregos: reforma depontes em Mogi-Guaçu; monta-gem de vagões de aço provenien-tes da Bélgica para o Nordeste;

Casa do casalna Rua Teffé,181, esquinacom a RuaSolimões. VilaSanta Maria,ano de 1950F

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Margarida Bauer e José Gesellmann,em 1945, antes do casamento

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Dezembrode 2001.Casa do

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conserto de navios em Santos(frota de dez navios do Mata-razzo). Trabalhou, ainda, semprepor algum tempo, na GeneralMotors do Brasil, Willis Overlanddo Brasil, Vemag, Toyota eMercedes-Benz.. Aposentou-seno dia 30 de Novembro de 1970.

Por volta de 1943, quando tra-balhava na General Motors doBrasil, José Gesellmann conheceuMargareth Bauer, irmã de umamigo, e dela se enamorou.

Margareth Bauer nasceu emViena, Áustria, no dia 18 deFevereiro de 1921. Seus pais,Anton Franz Bauer e AnnaSchmidt, ambos austríacos, imi-graram para o Brasil após aPrimeira Guerra Mundial. Trou-xeram três filhos: Antonin, Wi-lhelm e Margareth (esta com umano e meio de idade).

Segundo D. Margareth, seu

pai participou da guerra de 1914como oficial de cavalaria. Porfalta de alimentos, os soldadoscomiam os próprios cavalos e,sem cavalo, Anton passou para adivisão dos canhões, lutando naItália e Polônia.

Desembarcando em Santos,SP, no dia 14 de Novembro de1922, a família Bauer foi levadapara uma fazenda de café emSantana, SP, onde permaneceupor algum tempo. Em 1924, o sr.Anton Franz Bauer, já trabalhan-do no Frigorífico Armour, pas-sou a morar com a família, numacasa (também em Santana) alu-gada para várias famílias de imi-grantes. No mesmo ano, vítimada febre tifóide, o sr. Anton fale-ceu na Santa Casa de Miseri-córdia, deixando a esposa comtrês filhos pequenos.

Com a morte do marido, a sra.

Anna Schmidt tentou voltar paraa Áustria, mas não pôde fazê-lopor falta de recursos. Foi, então,que decidiu mudar para SãoCaetano, onde passou a trabalharnas Indústrias Reunidas FranciscoMatarazzo. D. Margareth noscontou que sua mãe, AnnaSchmidt Bauer, sempre enfrentan-do muitas dificuldades, enviuvouquatro vezes.

Voltando às lembranças da in-fância, D. Margareth nos contouque, aos sete anos de idade, so-freu um grave acidente, quei-mando-se com água fervendo.Segundo ela, passou três anosinternada no Hospital SantaCatarina, em São Paulo. Não po-dendo freqüentar a escola,Margareth aprendeu matemáticae português com as aulas do ir-mão mais velho.

FFAMÍLIAAMÍLIA – – José Gesellmann ca-sou-se com Margareth Bauer, emSão Caetano, no dia 29 de Se-tembro de 1945. O casal teveduas filhas: Tereza e Marlene.Tereza é solteira, mora com ospais e leciona alemão no Ins-tituto Goethe (Centro CulturalBrasil-Alemanha). Marlene, ca-sada com Dieter Henz Voos, mo-ra na Alemanha há 20 anos e nãotem filhos. Trabalha com expor-tação, numa empresa de utilitá-rios (caminhões, ônibus e moto-res marítimos).

Atualmente, o sr. José Gesell-mann, que se naturalizou em1980, continua morando com afamília, na Rua Teffé, 181,Bairro Barcelona, há 57 anos.Declara, alegre e simpático, queo Brasil é sua segunda pátria edeseja terminar seus dias em SãoCaetano do Sul.

Margarida Bauer,encostada atrásda mesa, noHospital SantaCatarina, aos 13anos de idade(após o acidentede queimadura).Ela trabalhava nohospital ajudandoas freiras - comoMadre Celestina -em diversostrabalhosF

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(*) Yolanda Ascencio, professora de línguas,pedagoga, escritora, advogada. Membro daAcademia de Letras da Grande São Paulo

Bodas de Ourodo casal José eMargarida, em

1995. Daesquerda para a

direita, José,Margarida,

Tereza, Marlenee Dieter Vools,

marido deMarlene F

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Museu Municipal,43 anos de história

Humberto Domingos PASTORE (*)

NN o dia 20 deAgosto de

1977, durante ascomemorações docentenário da fun-dação de SãoCaetano, o entãoprefeito Raimun-

do da Cunha Leite, atendendo aoclamor dos pesquisadores, abrianovamente as portas do museu dacidade, depois de quase duas déca-das de completo esquecimento. Épor essa razão que uma correnteformada por historiadores apontaque estamos comemorando, em2002, os 25 anos do museu, umavez que só a partir daquela data éque o órgão público tem funciona-do ininterruptamente.

Definir a real idade será portantomais uma eterna e gostosa discus-são. Confessamos que tambémapoiamos a comemoração atual dos25 anos, sem nos esquecermos, to-davia, da primeira tentativa de suaimplantação. E justamente para va-lorizar os fatos e as pessoas que es-tiveram envolvidas com a históriainicial é que fomos buscar, nas notí-cias veiculadas pela imprensa daépoca, os dados que bem explicamos caminhos percorridos até a cria-ção do museu.

Os relatos partem das indicaçõesde vereadores e seguem pelas repor-tagens que mostram os primeirosobjetos doados e as muitas solenida-des festivas que marcaram o evento.Chamamos a atenção para as se-guintes datas: Fevereiro de 1958,quando o vereador Urames Piresdos Santos apresentou na Câmara asugestão de se criar o Museu de São

Caetano; Outubro de 1959, quandohouve uma segunda indicação, des-sa vez feita pelo então vereadorWalter Braido; 30 de Novembro de1959, quando por decreto foi criadoo museu; 23 de Julho de 1960, datada inauguração oficial do museu; esete de Setembro de 1969, conside-rada a data da abertura para o públi-co em geral.

Valeria ainda relatar os fatos quelevaram ao fechamento do museu,antes mesmo de completar seu pri-meiro aniversário, mas essa seráobra para uma segunda pesquisa aser elaborada. Fiquem, por enquan-to, com o levantamento efetuadojunto à imprensa. São dados deli-ciosos para quem quer conhecermelhor a nossa cidade de 40, 50anos atrás. De posse dessas infor-mações, entrem na discussão.Afinal, o museu vai comemorar 25,42 ou 43 anos?

II MPRENSAMPRENSA - - Na última semana deOutubro de 1959, jornais como OEstado de São Paulo, a Folha doPovo, Jornal do Lar e o NewsSeller noticiaram, com destaque,que a Câmara Municipal de SãoCaetano do Sul aprovara indicação

do vereador Hermógenes WalterBraido pedindo para que o prefeitoOswaldo Massei estudasse a possi-bilidade de criação de um museumunicipal. Tratava-se de reiteraçãoda indicação que havia sido produ-zida anteriormente pelo vereadorUrames Pires dos Santos, emFevereiro de 1958.

O texto do jornal News Seller, de25 de Outubro de 1959, destacavaque: Outras cidades paulistas já to-maram medida idêntica para preser-var os remanescentes da sua evolu-ção cultural, embora sejam poucas.São elas: Atibaia, Ribeirão Preto,Mirassol e Campinas. São Caetanodo Sul é, pois, a quinta cidade emnosso estado a interessar-se pelacriação de um museu desta categoria.

O jornal Folha do Povo, em suaedição do dia 14 de Novembro de1959, noticiava a seguinte informa-ção: Ao que sabemos, vários obje-tos e peças já estão sendo recolhi-dos e as primeiras doações foramfeitas por dna. Maria Scaglia e pe-las famílias Perrella e Martorelli.Já o Jornal do Lar, na edição de 15de Novembro daquele ano, exem-plificava essas doações: fotos dasprimeiras décadas do século, feitas

Ano de 1981.Mostra a parte

interna da antigasede do museu,

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pelo sr. Scarazzato e pelo sr. JoãoScaglia Jr.; um exemplar do livretoPagine di veritá e di vita, de RenatoBelluci, editado em 1927, sobre ahistória de São Caetano do Sul; do-cumentos emitidos pela Prefeiturade São Bernardo; planta e desenhode uma casa em São Caetano, data-da de 1913; carta de habilitação dacondutora de veículos dona LuizaScarazzato. E ainda: duas fotos daparte interna da Estação da Luz,em 1911; tijolo de 1889, fabricadopor Silvério Perrella & Cia, com amarca SPC; tijolo de 1906, feito naolaria de João Domin, com a marcade JDC; e um terceiro tijolo, de1905, feito na olaria de T. DeNardi, com a marca TD.

CC RIAÇÃORIAÇÃO - - Com o título O Prín-cipe dos Municípios na vanguardahistórica – Sanciona o Prefeito acriação do Museu Municipal, oNews Seller, de seis de Novembrode 1959, citava a criação do MuseuMunicipal pelo Decreto 716 de 30de Novembro do corrente ano. Diziaainda que: a sua instalação far-se-áno local onde funcionou até poucotempo o Pronto-Socorro Municipal,na Rua Baraldi, esquina da Rua RioGrande do Sul, que para isso estásendo adaptado, dentro do possível,em respeito à técnica de museus. E

completava assim: O MuseuMunicipal funcionará nos diasúteis, exceto às segundas-feiras, das14 às 20 horas, e aos domingos, das9 às 12 horas.

A edição de 29 de Maio de1960, do News Seller, dizia que asreformas de adaptação da sede domuseu, na Rua Baraldi, 929, ha-viam sido concluídas no decorrerdaquela semana. E que: As vitrinasdo Museu, desenhadas cuidadosa-mente pelo sr. Milton Montelli, se-rão simples e funcionais, de acor-do com a técnica atual.

O Estado de São Paulo noticia-va, no dia sete de Julho de 1960,que no próximo dia 23, como parte

dos festejos do 83º aniversário dacidade, inaugurar-se-á o MuseuMunicipal de São Caetano do Sul.Será realizada, na ocasião, uma ex-posição da Pinacoteca Circulantedo Estado. Serão apresentados cer-ca de 30 quadros dos mais destaca-dos artistas nacionais, de todas asescolas e tendências, incluindo-seAlmeida Júnior, Portinari etc.

O Diário de São Paulo, de 24 deJulho de 1960, trouxe a seguinte pu-blicação: Tiveram início ontem osfestejos comemorativos do 83º ani-versário de São Caetano do Sul.Foram inauguradas a PinacotecaCirculante do Estado, a PrimeiraExposição Filatélica Regional, luzfluorescente na Praça ErmelinoMatarazzo, e teve lugar, à noite, aprova pedestre Fundação, num per-curso de cinco mil metros. Às16h00, na Rua Baraldi, esquina coma Rua Rio Grande do Sul, foraminauguradas as instalações doMuseu Municipal. No clichê (foto),flagrante desta cerimônia, vendo-seo sr. Pérsio Ribeiro Porto, represen-tante do secretário do Governo e oprefeito local, sr. Oswaldo SamuelMassei, quando desatavam a fitasimbólica..

Já o News Seller do dia 31 deJulho de 1960 citava que ...desde sá-bado, às 16 horas, até quinta feira,

Vinte de Setembro de 1980. Posse da professora Durvalina Soares Silva Rodriguescomo diretora do museu, cargo que pelos três anos anteriores pertenceu à professora

Mara Cerqueira Leite (ao lado de Floriano Leandrini, Naur Ferraz de Mattos, GildoVasconcelos, Bruno Mazati, Maria Dolores Massei, Francisco Amendola, José

Martineza e Joel Soares Guimarães)

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Fachada doentãoabandonadoPalacete DeNardi, sede atualdo museu, naRua MaximilianoLorenzini, 122,Bairro Fundação.Flagranterealizado porAlmir Pastore noprimeirosemestre de1982A

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às 22 horas, o museu já havia rece-bido mais de 1.600 visitas, o que dáa média superior a 260 visitantesdiários.

Este número foi considerado ex-pressivo na época, tanto que a im-prensa não se cansava de elogiar.Aliás, é justamente isso o que pode-mos compreender pelo título doNews Seller do dia sete de Agostode 1960: Em 9 dias – Mais de duasmil pessoas visitaram o Museu. Namesma oportunidade, a explicação:Em princípios do próximo mês de-verá ser aberto definitivamente àpopulação o Museu Municipal,constando de exposição retrospecti-va da vida de SCS. Peças autênti-cas, que abrangem os séculosXVIII, XIX e XX, poderão ser vistaspelo público.

Sobre esta inauguração, aFolha do Povo, de três de Setem-bro de 1960, publicou: No próxi-mo dia sete de Setembro, às 16hs., na Rua Baraldi, 929, a convi-te do prefeito Oswaldo Massei,haverá inauguração da ExposiçãoPermanente do Museu Municipalde São Caetano do Sul.

MM ARAR TINSTINS - - Nos principais meiosacadêmicos, o nome do emérito pro-fessor José de Souza Martins é res-peitadíssimo. Trata-se de escritoraplaudido mundialmente. Comopoucos sancaetanenses, soube valori-zar a história da terra de origem.Tinha pouco mais de 17 anos quandorealizou pesquisa que resultou emseu primeiro livro: São Caetano doSul em IV Séculos de História.Batalhador incansável, foi o idealiza-dor do Museu de São Caetano doSul. Seu nome é citado como histo-riador e responsável pela organiza-ção do museu no jornal O Estado deSão Paulo de oito de Setembro de1960. Isso foi um dia após a inaugu-ração do museu, definitiva para apopulação em geral.

O Rotary Club da cidade promo-

veu reunião festiva para comemorara chegada do museu. Naquela opor-tunidade, foi homenageada a sra.Luíza Garbelotto, que havia nascidoem São Caetano, um ano após a che-gada dos imigrantes colonizadores,ou seja, em 1878. O rotarianoUrames Pires dos Santos fez a entre-ga de uma telha, fabricada em 1912pela Cerâmica Privilegiada - que vi-ria a ser depois denominadaCerâmica São Caetano -, ao jovemJosé de Souza Martins, que passou aocupar o cargo de encarregado-con-servador do museu.

O Jornal do Lar, na publicaçãodo dia 11 de Novembro, apresentoureportagem sobre a inauguração ecitou que o prefeito Massei enalte-ceu o espírito tenaz e organizadordo novo encarregado, José S.Martins, que, como titular do mu-seu, convidou todos os presentespara um coquetel nas dependênciasdo Ginásio Estadual Bonifácio deCarvalho.

Enquanto o Jornal do Lar diziaque, a convite do prefeito, a fitasimbólica foi desatada pela sra.Laura Torres Bezerra, o News

Seller escrevia que a fita foi desata-da pela sra. Laura Torres deResende, acompanhada por dna.Tereza Barile, e que, após a bençãodas dependências pelo padre ÉzioGislimberti, aconteceu a entrega decertificados para as pessoas ou en-tidades que ofereceram peças histó-ricas ao museu.

RR ECONHECIMENTECONHECIMENT OO - - Com o título:Ratifica a Câmara criação doMuseu, o jornal News Seller infor-mou, no dia 16 de Outubro de 1960,que as Comissões da Câmara ti-nham aprovado o projeto doExecutivo. Parte do texto diz:Usando da palavra na ocasião, o sr.Orlando Souza, vereador e líderoposicionista, reconheceu a impor-tância do Museu para a populaçãode SCS, especialmente para os estu-dantes, dizendo que, acima dos inte-resses políticos, estão os interessesdo Município.

Reforçando a importância doacontecimento, o jornal ainda co-mentou: O projeto subiu ao plená-rio com pareceres favoráveis dasComissões de Educação e Cultura,Justiça e Finanças, obtendo inte-gral apoio da oposição.

O mesmo News Seller, que anosdepois se transformaria no Diário doGrande ABC, publicou, no dia 13 deNovembro de 1960: Cresceu, no de-correr desta semana, o número deentidades que promovem intercâm-bio de publicações com o MuseuMunicipal de SCS. E citou o Museude História Natural da Universidadede Kansas (EUA), o Arquivo Na-cional da República de Cuba, a cen-tenária Biblioteca Pública de Boston(EUA), além das correspondênciasmantidas com instituições científicasde vários países da América, Europae Ásia.

(*)Humberto Domingos Pastore é jornalista eatualmente dirige o Museu Histórico Municipalde São Caetano do Sul

Fachada do Museu HistóricoMunicipal. Ano de 1988

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Primórdios do futebol:Clube dos Amigos X Rio Branco

Narciso FERRARI (*)

CC harles Mi-ller, brasilei-

ro, nascido noBrás, filho de in-gleses, quandomenino foi envia-do pelos pais aestudar na In-

glaterra. No regresso a São Paulo,em 1884, trouxe consigo duas bo-las de futebol. Os primeiros en-saios tiveram lugar na Várzea doCarmo, entre um grupo de ingle-ses da Cia. De Gás, do LondonBank e da São Paulo Railway. Jáem 1888 surgiu o primeiro clubede futebol, o São Paulo AthleticClub, da colônia inglesa. Na se-qüência vieram o MackenzieCollege; o SC Internacional; o SCGermania, da colônia alemã (hojeEC Pinheiros); o CA Paulistano e aAA das Palmeiras.

Em São Caetano do Sul nãoexiste registro de quando surgiua prática do futebol, entretanto,sabe-se que, no início da décadade 1910, foram fundados, quasena mesma época, dois clubes: oRio Branco FC, de camisasazuis, e o Clube dos Amigos, decamisas brancas.

O primeiro mandava os jogosem campo nas proximidades daTexaco. O segundo mantinha seucampo na Rua Heloísa Pamplona,propriedade da família Miazzi, on-de hoje se localiza o Grupo EscolarSenador Flaquer.

Naquela época, havia poucoshabitantes na cidade e muita rivali-dade esportiva entre as famílias, ge-ralmente compostas por vários ir-mãos. Por exemplo: os irmãos

Manillis, Ferrucio e Silverio; os ir-mãos Zaninis, Joaquim e Nestor; asfamílias Roveri, Vecchi, Garbelotti,Perrella, Dalcin, Biaggi e outras.Normalmente, os membros de umamesma família torciam para ummesmo clube mas, em alguns ca-sos, cada membro da família torciapara um clube diferente.

Os diretores desses dois clubesqueriam viver em harmonia e, as-sim, propuseram jogo de futebolem que o perdedor deveria fundir-se ao vencedor. Assim, foi escolhi-da a data para o encontro decisivo,que terminou com a vitória doClube dos Amigos por 3 a 0. Operdedor, como ficara combinado,fundiu-se ao vencedor.

Essa versão não tem prova do-cumentada, entretanto, foi basea-da em depoimentos de membrosdas famílias pertencentes aos doisclubes. O certo é que, no dia pri-meiro de Maio de 1914, sexta-fei-ra, na residência do sr. PauloPerrella, situada na Rua Rio Bran-co, 44, sede do Clube dos Ami-gos, os dois clubes resolveramfundir-se. Cerca de 50 simpati-zantes, de ambas as equipes, en-

traram em acordo para o surgi-mento de nova agremiação.

Faltava o nome. Os oriundos deTreviso queriam o nome de sua ci-dade. Os do Vêneto e os deMântova, a mesma coisa. Foiquando surgiu a proposta do sr.Accácio Novaes, sugerindo o no-me de São Caetano Esporte Clube,aceito pela maioria. O primeiro jo-go da recém-surgida agremiaçãofora do distrito realizou-se emSanto André, contra o time da fa-mília Flaquer. Do resultado nin-guém se lembrava, mas da panca-daria todos se recordavam.

Na capital de São Paulo, o clu-be mais antigo e que também dis-putava a Liga Paulista de Futebol,fundada em 1901, era o C A Ypi-ranga (em 1906). Posteriormente, oS C Corinthians Paulista, do BomRetiro, de 1910. No interior, a AAPonte Preta, de 1900, e o EsporteClube Savoia, hoje Votorantim, deSorocaba. Além deles, podem serincluídos o Fortaleza e o Soro-cabano, de 1900, e a Internacionalde Bebedouro, de 1906. No Rio deJaneiro, o primeiro clube a surgirfoi o Fluminense, seguido por

Campo do São CaetanoEsporte Clube, em Maio

de 1944. Em pé, daesquerda para a direita:Daniel Perrella, Alcides

Beniti, Renato Lugli,Hermínio Marinotti,

Pires e o árbitro,Andolino Paolillo.

Agachados: Eurico,Enéas, Coador (Vicente

Braco), Hélio Navilli,Otávio Cavana e

Sebastião Rosa Alves.O mascote é Alexandre

Delso Melloni Nar

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Botafogo, América e Bangu. NoRio Grande do Sul, o clube de fute-bol mais velho do estado, o RioGrande, é de 1900. É também amais velha agremiação em ativida-de no Brasil.

Anteriores ao SCEC são aSociedade de Mútuo SocorroPríncipe de Nápoles, fundada em14 de Março de 1892 (não maisexiste), e a Sociedade BeneficenteInternacional União Operária deSão Caetano, fundada em 15 deNovembro de 1907.

Seguindo o exemplo do SCEC(maioria de descendência italiana),as colônias espanhola e italiana dolado de cima da estação fundaramo Monte Alegre FC, enfatizando ofutebol e o convívio social. OMonte Alegre surgiu em 20 deMaio de 1917, paralisando as ativi-dades na metade da década de1940. O campo ficava em frente aonde hoje está localizado o necro-tério do Hospital São Caetano. Asede social localizava-se na RuaJosé Benedetti, antiga Rua MinasGerais. Depois, o clube ressurgiucom o nome de CA Monte Alegre,em 23 de Agosto de 1950.

As indústrias existentes na cida-de mantinham seus times de fute-bol. O primeiro a surgir foi oCerâmica FC, fundado em 13 deMaio de 1925, cujo campo era den-tro da fábrica, na Rua Casemiro deAbreu. O Sport Clube FábricasReunidas Sant’Ana foi fundado emprimeiro de Fevereiro de 1933. OIAL - Indústria Aliberti Ltda surgiuem 23 de Junho de 1933, ao passoque e o General Motors EC, hojeADC General Motors, é de 20 deNovembro de 1935.

O CA Brasil, fundado em 1921,possuía camisas nas cores verde eamarela e tinha campo onde hojese localiza o colégio Edgar Alvesda Cunha, no Bairro Fundação.Teve participação direta no meioesportivo do bairro, assim como o

Tropical FC, fundado em 1924 eque mantinha seu campo onde hojese localiza o Clube Fundação.Possuía camisas azuis e, quandofoi extinto, deu origem ao Lázio,do mesmo bairro.

Também surgiram sociedadesrecreativas e culturais. A primeirafoi o Grêmio Instrutivo RecreativoIdeal, fundado em primeiro deJaneiro de 1922, e cuja sede, ini-cialmente na Rua Rio Branco, pos-teriormente passou para a RuaSanta Catarina (ressalte-se que esteclube foi dissolvido na década de1940, quando surgiu o ClubeComercial).

O Clube Sportivo Lázio, funda-do em primeiro de Maio de 1930,tomou o lugar da sede social doIdeal quando este transferiu as ins-talações para outro local. Tinha,além do futebol, teatro, recreação eeventos sociais. O GrêmioRecreativo Dramático DançanteGuarani, sediado na AvenidaSenador Roberto Simonsen, esqui-na com a Rua Castro Alves, fun-dado no início dos anos 30, e oSaldanha da Gama, cuja sede erana Rua General Osório, Vila Paula,praticavam artes dramáticas e pro-moviam encontros sociais.

A colônia alemã, não querendoficar para trás, fundou a SCE –Teuto Brasileiro no dia 26 deAgosto de 1929. A primeira sedefoi na Rua Piauí, em frente aoRestaurante Franz. Posteriormente,transferiu-se para a Rua AfonsoPena, 116, esquina com a RuaMarechal Deodoro (atualmente es-tá instalada na Rua WenceslauBrás, esquina com a Rua Piauí). Ocampo era na Rua Luiz Gama (on-de ficava o Lanifício São Paulo).Além do futebol, o Teuto primavapelos eventos sociais.

O CA Flor do Mar, fundado emsete de Novembro de 1938, prati-cava apenas o futebol. O campo daagremiação situava-se nas imedia-

ções da Texaco. Esse clube foi osucessor do CA Brasil, que usavaas mesmas cores na camisa: verdee amarelo.

Outros clubes são bem antigos eestão em plena atividade: AtléticoVila Alpina, de seis de Junho de1936; CRE Tamoio, de 15 de Maiode 1944; Vila Prosperidade FC, deprimeiro de Março de 1929; CAJabaquara, de 20 de Julho de 1944.Destacam-se ainda alguns clubesque não estão mais em atividade:Piratininga FC, de 21 de Março de1933, e CA Ipiranguinha, de 23 deAbril de 1939.

Não foi nada fácil saber a exis-tência de outros clubes da época,pois não há registros legais e simestatutos sociais de gaveta. Assimsendo, fizemos buscas na LigaSantoandreense de Futebol e naLiga Sancaetanense. Ambas nãopossuem documentos. O único clu-be com estatutos registrados emcartório – da capital, PrimeiroCartório de Registros de Títulos eDocumentos, propriedade deCarlos Alberto Aulicino – é o SãoCaetano EC, registrado no dia seisde Janeiro de 1931, 17 anos apóssua fundação.

Assim, baseado em depoimen-tos de fundadores desses clubes etambém no de Antônio AndolinoPaolillo, hoje com 93 anos, ex-árbi-tro de futebol da Liga Santo-andreense de Futebol e da de SãoCaetano do Sul, e ainda nas nossasparticipações, juntamente com anti-gos diretores do CA Brasil, quepromoviam, anualmente, no mês deMaio, festa de confraternização nachácara do sr. Francisco Marinotti,entendemos que o primeiro clubede futebol de São Caetano do Sulfoi o Clube dos Amigos, seguidopelo Rio Branco Futebol Clube.

(*) Narciso Ferrari, ex-presidente do SãoCaetano Esporte Clube

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Arte de Silvanaajudou a premiar a cidade

José Teixeira GONÇALVES (*)

SS ilvana é professora da Escolade Educação Especial Anne

Sullivan de São Caetano do Sul.Alcançou seu apogeu em repre-sentação de movimentos na artede dançar com pouca idade, ape-nas cinco anos. Tudo aconteceuhá muitos anos, por ocasião daabertura dos XXXI Jogos Abertosde Rio Claro, realizados a partirdo dia 16 de Outubro de 1966,portanto, há 35 anos atrás.

É necessário que se saiba que,nesse remoto passado, a organiza-ção e execução dos Jogos Abertosem uma cidade tinham elevadaimportância para o município es-colhido. A população local sentiaverdadeiro orgulho de ser a prefe-rida e a recepção às delegaçõesesportivas visitantes transforma-va-se em uma festa de alegria.Todos eram bem recebidos.

Vamos agora aos relatos dosfatos: nos dias 17 e 18 de Outubrode 1966, em pleno começo de se-mana, os principais jornais matu-tinos da capital paulista apresen-taram em suas páginas grandesreportagens, acompanhadas devistosas fotografias, sobre a aber-tura inicial dos Jogos Abertos deRio Claro, com destaque para odesfile de São Caetano do Sul,realçando a imagem da pequenabaliza Silvana, aparecendo em vá-rias posições. Cabe então exami-nar os comentários da imprensade São Paulo sobre os eventos deRio Claro.

Na primeira página do DiárioPopular de São Paulo, de 18 deOutubro de 1966, terça-feira, sobuma fotografia de meia página,

com o cabeçalho em letras garra-fais, Como fazer milagres apenascom um bastão. Na foto apareceua baliza Silvaninha, com o bastãona mão, dando uma estrela com oapoio de um único braço, na fren-te do desfile, no meio da rua.Ainda acompanhando a fotogra-fia, lia-se o seguinte comentário:Durante o desfile das delegaçõesque atualmente disputam o XXXI

Jogos Abertos do Interior, umagarotinha chamou a atenção detodos, constituindo-se no pontoalto da apresentação de sua cida-de, São Caetano do Sul. A pe-querrucha fez misérias com obastão, saltando, pulando, fazen-do acrobacias dignas de artistascircenses do maior renome. E issotudo com uma graça e desemba-raço incomuns principalmente emcriança de sua idade.

Longe de imaginar que comsuas magníficas apresentaçõesiria contribuir para que SãoCaetano do Sul, sua cidade, ven-cesse o desfile e recebesse o ricotroféu das mãos do governadorLaudo Natel, a garotinha estavafora do mundo, apenas concentra-da em suas acrobacias. Os aplau-sos foram repetidos e entusiasma-dos. Para ela, entretanto, apenasuma coisa parecia importar: jogaro bastão para o ar, colhendo-o emmanobra quase mágica, entre osdedos, para depois girá-lo. Nãobastasse isto, seguiam-se os saltosmortais, terminando com gracio-sos e bem ordenados gestos.

Silvana àfrente do

desfile doXXXI JogosAbertos do

Interior,realizado em

Rio Claro,ano 1966 Jo

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Baliza do desfile de Rio Claro, ano 1966

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Representou a pequena balizade São Caetano a juventude do es-porte brasileiro que então partici-pava dos Jogos Abertos. E deu au-la, para gente grande ver, de comogente pequena pode quase fazermilagres apenas com um bastão.

Vejamos a matéria a respeitodos Jogos Abertos publicada pelaFolha de São Paulo em 17 deOutubro de 1966. A delegação deSão Caetano do Sul apresentan-do-se realmente de forma supe-rior fez jus ao primeiro lugar quelhe atribuiu o júri. Entre as 280figurantes de sua apresentação, amais numerosa, constavam duasfanfarras, baliza, grupos aban-deirados, inclusive portando opavilhão de todos os Estados doBrasil e até um mascote, um ca-chorro pastor alemão.

Sob uma grande foto via-se amenina Silvana, desempenhandoo seu papel de baliza, com a cabe-ça para baixo, dando uma difícilparada com uma só mão, sendoque com a outra segurava o bas-tão. Logo após estavam os com-ponentes do desfile levando osímbolo das olimpíadas, os cincoanéis coloridos. Depois viriam asfanfarras.

A escolha do júri, colocando odesfile de São Caetano do Sul emprimeiro lugar nos Jogos Abertosde Rio Claro, foi totalmente cor-reta. A delegação da cidade doABC apresentou-se vistosa e commuito esmero. Mereceu a consa-gração da melhor desfilante. Ascidades de Jaú e Bauru, que tam-bém se apresentaram de forma achamar atenção, classificaram-seem segundo e terceiro lugares,respectivamente.

Eis o conteúdo da reportagemde Henrique Nicoline para aGazeta Esportiva de 18 de Ou-tubro de 1966. As mancheteseram atraentes: Vamos vibrar emRio Claro com os emocionantes

lances dos XXXI Jogos Abertosdo Interior; Rio Claro parou práver a banda passar. Em meia pá-gina, a Gazeta Esportiva apresen-tava uma bem dimensionada foto-grafia da baliza Silvana, dançan-do, manejando o bastão e ocupan-do o meio de uma rua de RioClaro, apinhada de espectadoresdos dois lados.

Vejamos o comentário do jor-nalista Nicoline:

Classificou-se em primeiro lu-gar a delegação de São Caetanodo Sul, merecendo destaque a me-nina Silvana Camargo Gonçal-ves. Destaco ainda as fanfarrasdo Instituto de Educação e doGinásio de Vila Barcelona, ambasda cidade de São Caetano do Sul(...) Os Jogos Abertos do Interiorsão um pouco de dança e de rit-mo, de harmonia e de graça. Sãoo prelúdio de uma delegação, aouverture de uma sinfonia em ca-dencia do esporte.

Vejamos então a revista san-caetanense Vida Estudantil, nº 5,de Dezembro de 1966, que emsua capa colorida estampou aimagem da menina Silvana, os-tentando seu uniforme de baliza,em pose característica, com a se-guinte transcrição:

Mereceu por nossa parte (res-

ponsável pela revista) apresentarcomo destaque principal a lindagarotinha que conta apenas comoito anos de idade. No entantovale a pena ressaltar que porocasião dos Jogos Abertos emRio Claro levados a efeito esteano (1966) ela fora o principalalvo de admiração por todos.Não houve quem não a olhassecom encanto e com doce sorrisomurmurando "que gracinha".Achamos por isso justo e com-preensível dar a ela todo o apoio,vindo então a ser nossa manchetedeste mês. Seus pais, professorJosé Teixeira Gonçalves e senho-ra Elvira Camargo Gonçalves, to-mados de profunda alegria, tive-ram o garbo de fazer notar quesua pequena filha havia sidomanchete de todos os jornais daCapital.

Para qualquer dúvida fica en-tão esclarecido que a Silvaninhajuntamente com as fanfarras deSão Caetano do Sul foram osprincipais personagens de RioClaro, por ocasião do XXXI Jo-gos Abertos do Interior. Nossaequipe deixa então a todos seusfamiliares os mais sinceros cum-primentos e parabéns. Não pode-mos deixar de enviar tambémnossos cumprimentos à professo-

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Silvana dandouma estrela

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ra Cleusa Escanho de Camargo,responsável pelo preparo da ga-rotinha no Curso de Ballet daPrefeitura Municipal de SãoCaetano do Sul.

Passamos a tratar, agora, dodesenvolvimento educacional damenina Silvana e de sua evoluçãoartística na infância e na adoles-cência. Sempre viveu em SãoCaetano do Sul. Terminou o cur-so primário no Instituto de EnsinoCel. Bonifácio de Carvalho, ocurso ginasial e o curso colegialno Colégio Edgar Alves daCunha. Freqüentou, depois, aEscola Superior de EducaçãoFísica (FEC), recebendo o seu di-ploma em 1979. Fez ainda umcurso de especialização denomi-nado Dança em Educação Física.

Esteve durante nove anos naEscola Municipal de Bailado deSão Caetano do Sul, direção daprofessora Cleusa Escanho deCamargo, pertencendo à primeiraturma de formandos. Recebeu odiploma das mãos do prefeitoHermógenes Walter Braido, em1974, com 16 anos.

Durante o período de 1965 a1974, Silvana e suas colegas,sempre com orientação e organi-zação da professora Cleusa Es-

canho, participaram de inúmerosacontecimentos artísticos relacio-nados à apresentação em conjuntode bailados infantis e, mais tarde,de adolescentes.

Também cabe um justo elogioà senhora Irany, dona de umaAgência de Publicidade, localiza-da na cidade, que representavavárias emissoras de televisão eque, muitas vezes, viabilizou aapresentação de Silvana e colegasem eventos festivos na cidade deSão Paulo e mesmo várias vezesna capital e no Estado do Paraná.

Houve a alegre presença des-sas meninas da Escola Municipalde Bailado em vários auditórios,entre eles: o antigo InstitutoNossa Senhora da Glória, noInstituto de Ensino de SãoCaetano do Sul; o auditório daIndústria Scânia Vábis; o TeatroPaulo Machado de Carvalho; aFeira das Nações (promoção doRotary Clube); entre outros.

Representaram a cidade deSão Caetano do Sul em eventosfestivos de outros estados, comono auditório da emissora de tele-visão de Curitiba. O conjunto es-tava também no auditório da tele-visão Tupi, apresentando-se porvários domingos no Circo das

Crianças, no Ibirapuera. Aindahouve eficiente participação doconjunto, no auditório da televi-são de Sílvio Santos, quando re-presentaram a cidade no progra-ma de grande sucesso Cidadecontra Cidade.

Como baliza de fanfarra,Silvana participou dois anos se-guidos do Concurso de Bandas,Fanfarras e Balizas, organizado erealizado pela televisão Excelsior,ganhando para a cidade, nos doisanos seguidos, o primeiro lugar.Recebeu como prêmio duas pas-sagens de avião para Brasília,com acompanhante e direito ahospedagem em hotel de luxo pordois dias. Cabe ainda aqui um vo-to de justo louvor para o jovemMilton Feijão Filho, que dirigia,na ocasião, as fanfarras.

Como professora de balé,Silvana trabalhou em várias esco-las e ainda tomou a iniciativa daprática de Ginástica RítmicaDesportiva (GRD) nos estabeleci-mentos em que lecionava, partici-pando inclusive de vários cam-peonatos da modalidade. Foi pro-fessora assistente da Cadeira deGinástica Feminina da FEC, com-ponente do Grupo de DançaProfissional Casa Forte, sob a di-reção do professor Edson Claro.Foi também sócia proprietária daAcademia Corpus Ginástica.Atualmente, trabalha na Escola deEducação Especial Anne Sullivan,de São Caetano, dando aulas es-peciais para alunos deficientes au-ditivos. Em 1982, casou-se comMarcos Laranjeira, tendo atual-mente dois filhos: Anna LíviaGonçalves Laranjeira, de 16 anos,e Luiz Felipe Gonçalves Laran-jeira, de 14 anos.

(*) José Teixeira Gonçalves foi diretor e pro-fessor de Geografia e História no ColégioEstadual Bonifácio de Carvalho e fundador ediretor do Ginásio do ABC

Da esquerdapara a direita,sua família: AnaLivia GonçalvesLaranjeira (filha),SilvanaGonçalvesLaranjeira,MarcosGonçalvesLaranjeira(esposo) e LuizFelipeGonçalvesLaranjeira (filho)Jo

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Mestre Aurélio tem 60 anos de futebol na região

FF alar da vida esportiva deAurélio Loureiro de Bastos

é um trabalho extenso e fasci-nante, pontuado sobretudo porsua paixão pelo futebol. De fa-to, lidou com o esporte durantea vida inteira. Na década de 30,esteve no Atlético Vila Alpina,clube de seu coração. Na se-qüência, dirigiu as equipes pro-fissionais do SAAD EsporteClube, do Santo André FutebolClube, isso sem contar as inú-meras seleções locais de SãoCaetano, de Santo André, dosjogos regionais, das ligas defutebol, dos torneios intermuni-cipais etc. Enfim, pode-se dizerque, nos últimos 60 anos, a bolade futebol rolou em São Cae-tano e região sob o olhar com-petente, apaixonado e discretode mestre Aurélio.

Em Setembro de 2001, aFundação Pró-Memória de SãoCaetano do Sul recebeu a visitade Aurélio Loureiro de Basto.Em companhia do jornalista eprofessor Nelson Perdigão, re-gistramos o depoimento sobresua vida no futebol local e re-gional. Foram mais de duas ho-ras de pura emoção, em que o

esportista nos contou toda a vi-da, pessoal e esportiva, desde ainfância pobre na Vila Alpinaaté os empregos na área comer-cial. Além disso, explicou comoconseguia conciliar a atividadecomercial com a ingrata tarefade técnico de futebol. Por meiode seu arquivo fotográfico, to-mamos conhecimentos das ima-gens que retratam a valorosaequipe do SAAD Esporte Clu-be, representante de São Caeta-no do Sul na 1ª divisão do fute-bol profissional da FederaçãoPaulista em 1974 e 1975. Tam-bém tivemos contato, atravésdas imagens, com o início doSanto André Futebol Clube

Campo doAtlético VilaAlpina, Rua

Herculano deFreitas, Bairro

Fundação,década de 50.

Ao lado, asinstalações da

Indústria deMóveis para

Rádios "Willo" Aur

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Aurélio Loureiro de Bastos em depoimento à Fundação Pró-Memória no dia 19 de Setembro de 2001

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Em 1961, o Atlético Vila Alpina foibicampeão da cidade e Aurélio

Loureiro de Bastos – no microfone, aolado do prefeito Anacleto Campanellae do vereador Jayme da Silva Reis -

discursou

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quando, sob a supervisão demestre Aurélio, o time do ABCfoi campeão paulista da 1ª divi-são (1975).

Aurélio Loureiro Bastos foicasado com Olímpia das NevesBastos , fa lecida em 20 deNovembro de 1999. Teve quatrof i lhos: Val ter, casado comMiriam Pires; Vilma, casadacom Warley Milton Orlando;

Vildete, casada com VladomirBalsamo (falecido) , e VeraLúcia , casada com NelsonMartins Soto. Tem oito netos eseis bisnetos.

Nasci em Portugal, na cida-de de Agueda, em 18 de Maiode 1921. Sou filho de HorácioLoureiro e Rosa Ribeiro deBastos. Meu pai, imigrante por-tuguês, já estava no Brasil des-

de 1927, quando aqui chegueicom minha mãe e irmãos emJulho de 1935, aos 14 anos (...)Fui direto para a Vila Alpina,bairro paulistano localizado nadivisa com São Caetano, juntoao Rio Tamanduateí. Nesta épo-ca, meu pai trabalhava no ser-viço de aterros sanitários e pos-suía uma tropa de 25 burros e20 carroças, com os quais mo-vimentava terras para este tra-balho (...) Meu primeiro empre-go foi na Louças Adelinas, dosr. Bastos Loureiro, onde fiqueidurante um ano (...) Depois metransferi para o comércio, tra-balhando de 1935 a 1939 no ar-mazém de secos e molhados dosr. Vicente Luiz Pina (...) Aju-dava na entrega de mercadoriapara os fregueses.

O gosto pelo futebol já semanifestava na minha infância,em Portugal, embora a minhaaldeia fosse distante das gran-des cidades (...) O futebol era omaior passatempo da criançadae acompanhávamos os princi-pais torneios de futebol no paíse na Europa ( . . . ) O ClubeAtlético Vila Alpina foi fundadoem seis de Junho de 1936. Nãofoi difícil incorporar-me ao clu-be e começar a participar daequipe juvenil, passando por to-das as divisões até chegar ao ti-me principal. Em 1946, com 25anos de idade, já estava exer-cendo a função de técnico etreinador, pois, desde 1942, ofutebol na região era dirigidopela Liga Andreense de futebol( . . . ) Seguindo as normas daépoca, não era estranho oAtlético Vila Alpina, emborapertencendo ao Município deSão Paulo, participar desta li-ga, pois o que prevalecia era aproximidade física do clube, in-dependente das divisas intermu-nicipais (...)

O Atlético Vila Alpina,em 1955, foi

tricampeão da LigaSancaetanense de

Futebol. Da esquerdapara a direita, em pé:

Vadão, Rubens,Romeu, Lilo, Tostãoe Dito. Agachados:

Catão, Miguel,Modesto, Cica e

Pavim. O mascote éValtinho, filho de

Aurélio Loureiro deBastos A

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No ano de 1953, oAtlético Vila Alpina foicampeão. Jogadores empé, da esquerda para adireita: Oswaldo, Geraldo,Walter, Vado, Alfredo,Gino, Romeu e Olívio.Agachados: Kalé, Miguel,Natalino, Cica, Dinho eDori. Massagista:Pascoal. Presidente:Eugênio Magnani (àdireita) e, à esquerda, odiretor esportivo AurélioLoureiro de BastosA

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Em 1957, o AtléticoVila Alpina recebeu odiploma de campeãoda Liga de Esportes deSão Caetano do Sul.Ao centro, AurélioLoureiro de Bastos. Àesquerda, naseqüência, João Anhê,radialista da RádioCacique de SãoCaetano, e Lázaro deCampos, presidente daLigaA

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Casei-me em 25 de Abril de1942, com Olímpia das Neves, econt inuei morando na Vi laAlpina (...) Trabalhei, então, noarmazém do meu pai até 1941,quando comecei a trabalhar naAnderson Clayton de SãoCaetano como conferente na se-ção de reprensagem de algo-dão, onde permaneci até 1945(...) O futebol até então era umaatividade que me ocupava nashoras vagas (...) Mas a paixãoera tão forte que eu já auxiliavao meu amigo Gijão na direçãotécnica do time (. . .) Ele eramais velho que eu (...) Em umdeterminado jogo ele chegoupra mim e disse: “Olha, vocêtem mais jeito pra essas coisasdo futebol do que eu. Fique vo-cê sozinho na direção”.

O campo do Atlét ico VilaAlpina estava localizado naRua Herculano de Freitas, noatual Bairro Fundação, em umaárea contígua à Indústria deMóveis para Rádios “Willo”(...) Sua inauguração aconte-ceu com todas as pompas e cir-cunstâncias no dia primeiro deJunho de 1952 e teve a presen-ça do prefeito de São Caetanodo Sul , dr. Ângelo RaphaelPellegrino. Também vieram ve-readores, um imenso público detorcedores e admiradores doclube (...) Não era possível, na-quela época, viver apenas dofutebol, principalmente amador,e em 1945 resolvi abandonar oemprego e comprar um bar naAvenida dr. Vicente Giacagline,onde imaginava sobraria maistempo para se dedicar ao fute-bol (...) Junto com o bar, resolvitambém trabalhar como cami-nhoneiro, em companhia domeu irmão, transportando ma-terial de construção, porque odesenvolvimento urbano doBrasil abria perspectivas para

este trabalho (...) Eu enfrentavamuitas dificuldades pelas péssi-mas condições das estradasbrasileiras, pois uma viagematé Porto Alegre, no RioGrande do Sul, levava sete dias,e havia apenas 50 quilômetrosde estrada asfaltada (...) E aatual BR 116 ainda não existia.Na volta de uma destas viagens,fui consultado pelos dirigentes

do São Caetano Esporte Clube,Francisco Marinotti e NarcisoFerrari, sobre a possibilidadede dirigir o time do São Cae-tano Esporte Clube, que passa-va por uma grande crise (...)Fiquei por cinco meses, sendosubstituído por Reynaldo Zanai,funcionário da Prefeitura deSão Caetano.

As minhas atividades profis-

No ano de 1971,em um jogo treino

do SAAD com oSão Paulo Futebol

Clube, AurélioLoureiro aparece

entre o técnicoOswaldo Brandão,seu ídolo e amigo,

e o goleiro doSAAD, Ronaldo A

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Seleção de futebolamador de São Caetanodo Sul em 28 deSetembro de 1969. Daesquerda para a direita,em pé: Alberto Antunes,Sérgio, Vitinho, Jacy,Ademir, Landola, Décio,Moacir, Fefe, Javali,Galvão e o técnicoAurélio Loureiro deBastos. Agachados:Bisorinha, Titi, Alceu,Airton, Espiga, Matias eo massagista HenriqueA

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Banco dosreservas doSAAD EsporteClube, em jogocontra o Marília,no EstádioAnacletoCampanellaA

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sionais continuavam paralelasà paixão pelo At lé t ico Vi laAlpina, onde exerci as funçõesde técnico e diretor geral de es-portes até 1960 (...) Nesse tem-po, o clube foi campeão munici-pal nos anos de 1953, 1954,1955, 1956, 1957 e 1959. Noano de 1958, quando o time nãofoi campeão, eu não dirigia otime, pois estava trabalhandocomo caminhoneiro (...)

Em 1961, abandonei os tra-balhos no bar e na estrada, ad-quirindo um estacionamento deautomóveis com autopeças, tro-ca de óleo, na Avenida CondeFrancisco Matarazzo (...) De-pois transferi para a Rua Her-culano de Freitas, 448 (...) Ven-di es te es tabelecimento em1979 (...)

Em 1964, o Atlético Vila Al-pina resolveu disputar o cam-peonato da 3ª divisão de Fu-tebol Profissional da FederaçãoPaulista de Futebol. Foi umaexperiência dramática, paraum time até então amador, ar-car com as despesas de trans-porte e alimentação dos atletas( . . . ) Usávamos o campo doGeneral Motors Esporte Clube(...) Desta época lembro-me darevelação de grandes jogado-res, como Natalino Barsori eMárcio Della Maggiora, quevieram a disputar campeonatospela Portuguesa de Desportos epelo SAAD Esporte Clube. Umoutro grande jogador reveladono Vila Alpina foi o Cica, nosanos 50, quando cheguei a le-vá-lo para treinar no SantosFutebol Clube, onde o Lula erao treinador (...) Infelizmente,uma contusão do jogador impe-diu que ele seguisse a carreirano Santos Futebol Clube daque-la época (...)

Após esta fase do AtléticoVila Alpina começaram as mi-

nhas relações profissionais como SAAD Esporte Clube, em1967, de uma forma inusitada.Gostava de acompanhar os trei-nos deste time e os jogos emSão Caetano. Após uma derrotado SAAD, contra a Ferroviáriade Botucatu, o presidente doclube, Felício Saad, me procu-

rou e convidou-me para dirigiro time. Estreei em Taubaté comuma derrota, mas, a partir daí,o time começou a crescer (...)

Durante a década de 70, mi-nha vida era dividida entre omeu estacionamento, o SAADEsporte Clube, o Santo AndréFutebol Clube e minha partici-pação nos esportes amadoresde São Caetano do Sul (...) NaComissão Municipal de Espor-tes e demais eventos patrocina-dos pela Prefeitura. Poderia re-sumir meu trabalho, na décadade 70, de uma forma didática eobjetiva, descrevendo-o da se-guinte forma.

PP R O F I S S I O N A LR O F I S S I O N A L – – No SAADEsporte Clube a minha primei-ra participação foi de 1967 a1968. Em 1970, retornei ao clu-be e fiquei até o final de 1972.Nesses três anos, o t ime fezgrandes campanhas. Em 1970,conseguimos o terceiro lugar nacompetição. Em 1971, a grandetragédia: a derrota para oMarília Atlético Clube, no Par-

Em 22 de Julho de 1972, o SAADjogou e ganhou dos Estudiantes de La

Plata por 2 x 1, em São Caetano. Otécnico Aurélio e o centroavante doSAAD, Arlindo Fazolim, exibem o

troféu

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Equipe do SAAD, em sua fase áurea, no início da década de 70. Em pé, da esquerdapara a direita: Ronaldo, Flávio, (?), Celso, Oscar e Zanetti. Agachados: Fernandes,

Nelson, Arlindo, Márcio e Valdir

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que Antarctica, pelo placar de1X0 ( . . . ) O gol foi marcadoquando faltavam nove minutospara o encerramento do jogo(...) O empate nos daria o títulode acesso à divisão principal docampeonato paulista. Em 1972,novamente uma campanha bri-lhante, mas sem acesso à elitedo futebol paulista, sendo quefomos os vencedores das duasfases do campeonato em quenão houve os jogos finais (...)Até 1981 voltei várias vezes adirigir o SAAD, alternando meutrabalho no Santo André Fute-bol Clube, onde fui campeão deacesso em 1975 e auxiliar téc-nico do Sebastião Lapolla naconquista do título em 1981.

Até 1960 minha vida foi de-dicada totalmente ao AtléticoVila Alpina. A partir daí, parti-c ipei intensamente da LigaSancaetanense de Futebol e daComissão Municipal de Espor-tes. Lembro-me de que fui cam-peão duas vezes da Copa JoãoRamalho e duas vezes da CopaPrimavera. Nos torneios inter-

municipais, com os municípiosdo Grande ABC, Santos, Cam-pinas, Jundiaí, fomos semprebem representados, principal-mente em um jogo em que em-patamos em 0x0 com Santos,que foi representado por um ti-me misto do Santos FutebolClube.

Na Prefei tura de SãoCaetano do Sul participei dogoverno Anacleto Campanella,no Departamento de Esportes(...) Na administração WalterBraido eu era vice-presidenteda Comissão Municipal deEsportes (...) Na administraçãodo Raimundo da Cunha Leitefui administrador do Paláciodos Esportes (...) Continuei nes-tas atividades até 1983, quandodeixei São Caetano e fui morarem Itanhaém, litoral paulista.

TT ÉCNICOÉCNICO -- Na minha vida pro-fissional, minha maior referên-cia foi Oswaldo Brandão, doqual era admirador e amigo. Eume baseava em seu trabalho enão vejo, até hoje, grandes dife-

renças em relação às normasatuais, a não ser na nomencla-tura. Por exemplo, de lateralpara ala, de quarto-zagueiropara volante (...) Naquela épo-ca jogava-se praticamente o 4 –4 – 2 e eu jogava o 4 – 3 – 3,mas voltava com o ponta-es-querda, coisas que os jornalis-tas não entendiam, pois nãoidentificavam o esquema tático,esquecendo-se de que cada par-tida é uma história diferente.

A preleção que se faz antesde cada jogo vai por água abai-xo se o time sofrer um gol nosprimeiros minutos de jogo.Posso me orgulhar de que, naminha carreira de técnico de fu-tebol, meu time sempre se clas-sificava no mínimo em quartolugar (...) Comparando minhaépoca com a de hoje, acho queo trabalho com os jogadores defutebol hoje é mais difícil, devi-do ao autoritarismo e à intran-sigência que existe no meio es-portivo (...) Quando o jogador émais orgulhoso e reivindicamuitas coisas e oferece poucas.

Concluindo este depoimento,quero deixar registrada aqui aminha posição sobre a fusãodos clubes amadores de futebolem São Caetano do Sul, realiza-da em 1973, na administraçãoWalter Braido. Este procedi-mento teve aspectos positivos enegativos. Os clubes ganharamestádios, vestiários, infra-estru-tura, mas perderam a identida-de histórica e tradicional quepossuíam. Eu próprio tive dedeixar o coração de lado e oamor que sempre t ive peloAtlético Vila Alpina e abrir mãodeste amor para extinguir gran-des clube amadores do futebolsancaetanense (Pesquisa e textoreal izados pelo Serviço deDifusão Cultural da FundaçãoPró-Memória)

Aurélio Loureiro de Bastos e família na comemoração das Bodas de Ouro de seucasamento, em 23 de Abril de 1992

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Jogos Abertos do Interior: São Caetano foi campeão pela primeira vez em 1982

José Odair da SILVA (*)

OO s Jogos Abertos do In-terior (JAI) são o princi-

pal evento esportivo do Es-tado de São Paulo e um dosmaiores da América Latina. Acompetição sempre contoucom a presença dos principaisatletas do Brasil, muitos delescom índices olímpicos.

A criação dos JAI foi umainiciativa de esportistas preo-cupados em contribuir com oaprimoramento técnico de di-versas modalidades e incenti-var o congraçamento das ci-dades do inter ior paul istaatravés do esporte.

O idealizador dos jogos foio esportista e professor Horá-cio BabyBarioni (1905-1967)que, com o apoio de empresá-rios e do poder público, lide-rou a pr imeira edição queaconteceu em 1936, na cidadede Monte Alto. Na ocasião,foram disputadas 18 modali-dades (atletismo, ciclismo, fu-tebol de salão, judô, natação,tênis de mesa, basquetebol,damas, ginástica olímpica, ca-ratê, pugilismo, voleibol, bo-

cha, futebol, handebol, malha,tênis e xadrez ).

Atualmente, as modalida-des continuam as mesmas. Ascategorias, porém, já somam31, envolvendo mais de dezmil atletas de 170 cidades. Ocrescimento foi tamanho quese fez necessária a prática dosJogos Regionais com caráterclassificatório, dividindo oEstado de São Paulo em oitoregiões esportivas.

Ao longo dos 65 anos decompet ição, a c idade quemais vezes venceu no geralfoi Santos, com 24 títulos.Em seguida, vêm Santo An-dré, com 12, Campinas, comdez, e Guarulhos e São Cae-tano do Sul, com seis títuloscada. A única cidade fora doestado a participar como con-v idada e ser campeã fo iUberlândia (MG), com umtr icampeonato gera l em1936, 37 e 38. A cidade ain-da sediou os JAI de 1937,única vez que os jogos foramrealizados fora do estado.

O recorde da cidade quemais vezes sediou os jogospertence a Santos, com seis

Depoimento de Antônio José dos Santos, Toninho dos Esportes, à Fundação Pró-Memória de São Caetano do Sul. Abril de 2002

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vezes. Depois vêm RibeirãoPreto com cinco e Araçatuba,Campinas, Rio Claro, Soro-caba e São José do Rio Pretocom quatro. São Caetano doSul se apresentou como sedeapenas uma vez, na edição denúmero 29, no ano de 1964.Na ocasião, Santos foi cam-peã e Santo André vice.

Também é de Santos amarca da cidade que mais ve-zes seguidas conquistou o tí-tulo geral: 13 vezes, entre1940 e 1952, e sete vezes en-tre 1962 e 1968. Depois apa-recem Guarulhos, com seisvezes entre 1990 e 1995, eSão Caetano do Sul com opentacampeonato conquistadoentre 1997 e 2001.

O grande sonho de AntônioJosé dos Santos, o Toninhodos Esportes, era sediar osJAI, ser campeão geral e en-cerrar com chave de ouro suagestão como presidente doCME (Comissão Municipalde Esporte). Af inal , umacompetição desse porte, pelasua história e importância,sempre traz, para qualquer ci-dade, prestigio e divulgaçãono mundo esportivo. Comohomem ligado ao esporte, elesabia disso. Era hora de retri-buir todo carinho que a cida-de lhe dera durante tantosanos. Nascido em RibeirãoPreto, chegou em São Cae-tano do Sul com um ano deidade e nunca mais perdeu ovínculo com a cidade.

A oportunidade apareceuno finalzinho do governo deRaimundo da Cunha Leite,que deu total apoio paraToninho dos Esportes inscre-ver São Caetano do Sul comocandidata a sediar os jogos de1982. Como ele mesmo diz :Eu estava preparado para ser

campeão dos Jogos Abertos eem São Caetano. Seria umaboa despedida, ser campeão esede, ninguém ganharia, te-nho certeza.

Participavam como candi-datas, além de São Caetanodo Sul, Lins, Mogi-Mirim eBauru. A eleição seria emPresidente Prudente, onde ascidades pleiteantes deveriamapresentar seus programas.Logo na chegada, o jornalistaJuares Soares, que trabalhavana Rádio Globo e lá estava

para fazer a cobertura da elei-ção das candidatas, entrevis-tou Toninho dos Esportes aovivo. Perguntado sobre o queestava fazendo em PresidentePrudente, ele respondeu, apai-xonadamente:

- Tenho um sonho. Além deganhar alguns títulos, gosta-ria de levar os JAI para SãoCaetano do Sul. A cidade éboa, tem apoio do poder pú-blico e estamos nos preparan-do há alguns anos para reali-zar esse sonho.Quando che-gou ao comitê dos jogos, a ci-dade já era favorita. A defesado município foi feita pelopróprio prefeito, Raimundoda Cunha Leite, o que causouboa impressão.

Mas corriam comentáriosde que o então governador doestado, Paulo Maluf , porquestões partidárias não dei-xaria São Caetano do Sul sera sede dos jogos abertos. Defato, a cidade era governadapor um prefeito do PMDB, aopasso que o governador erado PDS. Na verdade, PauloMaluf estava interessado emdisputar uma vaga na Câmarados Deputados e, portanto,não poderia admitir, como se-de dos JAI, um município que

Antônio José dos Santos, Toninho dosEsportes, na época em que presidiu aComissão Municipal de Esportes de

São Caetano do Sul (1977-1983)

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Solenidade deentrega dos troféus

pela ComissãoMunicipal de

Esportes de SãoCaetano do Sul, em

1982. Da direita paraa esquerda: Alberto

do Carmo Araújo(Giba), Rubens

Mancine, AntônioJosé dos Santos,

prefeito Raimundoda Cunha Leite,

vereador MaurícioHoffmann e

professor Vicentebastos A

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não lhe rendesse os votos al-mejados.

Os boatos tornaram-se rea-lidade quando foi descobertaa estratégia do governador defazer os delegados votarem nacidade de Bauru. Mas, porprincípios esportivos, Babá,ex-jogador do São Paulo FC erepresentante da cidade deMogi-Mirim, mesmo sendodo PDS votou em São Caeta-no. Foi o suficiente para levarconsigo alguns votos e fazerda cidade do ABC a eleita pa-ra sediar os JAI. Houve sur-presa e espanto, tanto do go-vernador como de sua equi-pe, quando foi anunciada a ci-dade sede.

A partir daí se iniciou, porparte do poder público, umgrande boicote contra SãoCaetano. Uma verdadeiraguerra de boatos foi veiculadana imprensa, como bem lem-bra Toninho: Foram falar pa-ra o Maluf que eu dizia que aabertura dos jogos seria feitapelo futuro governador Fran-co Montoro, que era do PMDB,o que não era verdade. Exis-tia, sim, uma euforia pela vi-tória, mas não se chegaria aesse ponto de provocação. Emresposta, o governador, ale-gando remanejamento orça-mentário, cortou a verba dedivulgação do evento e a ver-ba para a construção da pistade atletismo. Em seguida, li-cenciou-se para concorrer aoposto de deputado federal.

Em seu lugar assumiu JoséMaria Marin, que também eracandidato a presidente daFederação Paulista de Fute-bol. Como a cidade tinha di-reito a voto na Federação,Marin pediu a Toninho quevotasse nele e confessou quenada podia fazer, em relação à

verba para os jogos, por setratar de uma questão política.Admirado com a franqueza dogovernador em exercíc io,Toninho deu-lhe o voto.

Convidado a participar deum programa na Rádio Ban-deirantes, Toninho tornou pú-blico que a cidade estava so-frendo perseguição política. Adeclaração acabou tendogrande repercussão. Por fim,sabendo que continuaria sen-do atrapalhado pelo poder pú-blico, assinou uma carta re-nunciando ao direito de sediaro evento. Todavia, antes as-segurou a garantia de partici-pação da cidade nos JAI. Porindicação de José MariaMarin, os jogos seriam reali-zados em Rio Claro.

Mesmo tendo ganho a sim-patia da população do interiorpaulista, apresentado o me-lhor programa das cidadesconcorrentes, sido eleita de-mocrat icamente e ganho aconfiança dos demais municí-pios, além do apoio da im-prensa, São Caetano do Sulnão ser ia a sede dos 47 ºJogos Abertos do Interior. Acidade estava triste, mas nãoabatida. O que poderia ter si-do uma humilhante derrota setransformaria em uma esma-gadora e histórica vitória.

Ajudado por empresas co-mo Quimbrasil e Brasilit, queadotaram atletas, e pelo ClubePinheiros, que treinava os es-portistas de saltos ornamen-tais e ginástica, Toninho con-tinuou trabalhando. Parte deseu sonho ainda era possívelrealizar. Montou uma delega-ção com mais de 200 atletas,organizada por pessoas comoAurélio Loureiro de Bastos,Nelson Perdigão, Alberto doCarmo Araújo (Giba), o jor-

nalista Salvador Silva, WalterFigueira, Mauro Chekim eJesus Eugênio, e viajou paraRio Claro.

O resultado foi que SãoCaetano do Sul ganhou emsaltos ornamentais (masculinoe feminino), ginástica femini-na, tênis masculino, xadrez(masculino e feminino) e tê-nis de mesa feminino, obten-do o título de Campeã Geralao superar outras 44 cidades.Na verdade, o título foi umaresposta que mostrou a forçada cidade diante dos obstácu-lo criados para que ela nãofosse a sede dos jogos de1982, realizados em 1983.

A finalidade de um eventodesse porte é difundir o es-porte no seu mais alto nível,bem como realizar a confra-ternização entre os desportis-tas de todo o inter ior doEstado de São Paulo. Tambémconsiste em estimular na po-pulação a prática saudável doesporte. E isso São Caetanodo Sul soube respeitar até ofinal.

BIBLIOGRAFIA

História do Esporte, São Paulo,Abril , 1992.His tór ia do Pinhei ros, SãoPaulo, Edição do Clube, 1969.PULS, Maurício, O Malufismo,Publifolha, São Paulo, 2000.SINGER, André. Esquerda eDireita no eleitorado brasileiro,São Paulo, Edusp, 2000.WELFFORT, Francisco. O popu-lismo na política brasileira, Riode Janeiro, Paz e Terra, 1978.Diário do Grande ABC, CadernoSetecidades, p.2, 28 de janeirode 2002.

(*) José Odair da Silva, mestre em História econselheiro da Fundação Pró-Memória

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São Caetano ganha PinacotecaCC om o princi-

pal objetivode aproximar cri-anças e adolescen-tes do universo ar-tístico, foi inaugu-rada em São Cae-tano do Sul, no dia

18 de Abril, a Pinacoteca Municipal.Localizada no Complexo Edu-cacional do Ensino Fundamental, aPinacoteca, com cercade 380 metros quadra-dos, divide espaçocom a Biblioteca Mu-nicipal Paul Harris,com a Fundação Pró-Memória e com a Aca-demia de Letras daGrande São Paulo, emárea total de 1450 me-tros quadrados.

O prefeito LuizTortorello, diversasautoridades munici-pais, funcionários daPrefeitura e muitos alunos deescolas da cidade prestigiarama inauguração, que movimen-tou todos os espaços doComplexo com atividadesvoltadas ao público infanto-juvenil.

A Pinacoteca trouxe trêsexposições, que ficam emcartaz até o dia 16 de Agos-to. Retrospectiva. Onze anosde Salões de Arte em SãoCaetano do Sulreúne 55obras premiadas de artistasque part ic iparam dos 11Salões de Arte Contem-porânea realizados na cidadeentre 1967 e 1981.

Entre os 31 artistas partici-pantes, podemos destacarRubens Gerchman (Televisãoe Man/Woman), Sepp Baen-dereck (Glória), Hans Gru-

dzinski (Ilhas no Espaço, Peixes,Ilha e Sol e Nossa Senhora deTodos os Portos), Gregório Gruber(Obras I, II, III e IV), SinvalCorrea Soares (Coesão Superpostanº61, Pintura 60 e Pintura 70),Hannah Brandt (Folhas Soltas II),Cláudio Tozzi (Interferência I, II eII, Dissociação de Cores e LigaçãoTelefônica), Sérgio Niculitcheff(Vida) e Niobe Xandó (Quadro I).

A maioria dos artistas participantesdestes Salões continuam a produzirno Brasil e até mesmo no exterior.

Todos os Salões estarão repre-sentados por uma ou mais obras,que demonstram um período deprodução efervescente na arte bra-sileira, influenciado pelas Bienaisde São Paulo. São obras que cau-saram polêmica na época, pois re-presentavam embriões da pós-mo-

dernidade.A segunda exposi-

ção vem diretamentedo Museu de ArteContemporânea daUniversidade de SãoPaulo. O Toque Reve-lador: Retratos eAuto-Retratosfoi con-cebida para o atendi-mento de públicos es-peciais (pessoas por-tadoras de deficiên-cias sensoriais, físicase mentais) e inclusi-

vos (pessoas portadoras ou nãode deficiências).

A mostra reúne seis repro-duções de obras de artistascontemporâneos, organizadasseguindo um percurso visuale tátil, permitindo além daobservação das imagens, otoque nas reproduções em re-levo. Material multisensorialde apoio à compreensão, co-municação visual e publica-ções em tinta e braile acom-panham a exposição, além deum espaço para realização dejogos simbólicos onde o pú-blico poderá criar seu próprioauto-retrato.

Entre as obras de arte desta-caram-se também quatro es-culturas do artista Nino Ferraz,feitas em aço, formando a co-leção A Leveza do Aço.

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Pró-Memória fecha o ano com livro, revista Raízes e exposição de Natal

No dia 11 deDezembro, a Fun-dação Pró-Me-mória realizou olançamento darevista Raízes,edição número24, e do livro AEducação e osImigrantes Italianos,além da abertura da ex-posição O Natal está na Mesa.

O evento aconteceu no Salão de Exposiçõesda Fundação e contou com a presença de muní-cipes e diversas autoridades municipais, comoo prefeito Luiz Tortorello, muitos vereadores ediretores da administração.

O livro A Educação e os Imigrantes Italianos,da escritora Eliane Mimesse, retrata a construçãodo espaço escolar em São Caetano a partir do finaldo século XIX. A publicação, que integra o ProjetoEditorial da Fundação Pró-Memória, mostra deta-lhadamente o funcionamento das escolas, quais alu-nos freqüentavam e quem eram os professores.

NN AA TT ALAL - - Aberta no mesmo dia, a exposição ONatal está na Mesa, uma parcer ia com aAssociação dos Pintores da Arte do Fogo doGrande ABC (APAF-ABC), deixou o Salão deExposições no clima natalino.

A mostra reuniu mesas elaboradas com pe-ças de porcelana, vidro e faiança, pintadas porintegrantes da APAF, decoradas e enfeitadaspara o Natal. Oito mesas reuniram cerca de 60peças de porcelana, além de diversas obrasavulsas em exposição.

Museu passa por reforma e reformulação interna

O Museu His-tórico Municipalpermaneceu fe-chado para refor-ma nos meses deDezembro de 2001e Janeiro desteano. O casarão,

com mais de 100 anos, foi pintado interna eexternamente. A fiação elétrica foi trocada e otelhado reparado. Parte da calçada em frenteao prédio foi rebaixada para facilitar o acessode deficientes físicos.

NN OVOV OO VV ISUALISUAL - - Como o Museu possui maisde duas mil peças em acervo é necessário quehaja rotatividade entre as peças em exposição.Para isso, as salas passaram por uma significa-tiva mudança na disposição dos móveis, vitri-nes e objetos, visando a rever o maior númeropossível de novas peças.

Ficaram em destaque, assim, a miniatura deuma olaria, o espaço que reproduz um comér-cio do tipo secos e molhados e também a saladedicada aos primeiros vereadores e aos pre-feitos da cidade. Outra novidade é uma maque-te que reproduz o Palacete De Nardi, sedeatual do Museu.

Moradores dos bairros Fundação e Prosperidade recebem homenagem

Integrando oprojeto GovernoIt inerante, nosdias 15 e 22 deFevereiro, a Fun-dação Pró-Me-mória realizou oprojeto Memóriae Cidadania, umahomenagem aos moradores mais antigos dosbairros Prosperidade e Fundação, respectiva-mente.

Foram homenageados 21 senhores e senho-ras do Bairro Prosperidade e 26 do BairroFundação, que receberam, das mãos do prefei-to Luiz Tortorello e da presidente da FundaçãoPró-Memória, Sônia Maria Franco Xavier, umaplaca com seus nomes e com a seguinte frase:Homenagem àqueles que ajudaram a construira cidade.

Nas duas edições do Governo Itinerante, aFundação ainda apresentou exposições com-postas de fotos comparativas de pontos dosbairros, com imagens do passado e do presen-te, além de distribuir um folheto com fotos, omapa e a história dos bairros.

A primeira parte do projeto Memória e

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Cidadania encerrou-se no Bairro Fundação. Aúltima fase será a publicação de um livro comrelatos de vida de algumas destas pessoas queforam homenageadas durante todos osGovernos Itinerantes, em todos os bairros.

Comemoração do dia Internacional da Mulher

A FundaçãoPró-Memória deSão Caetano doSul part ic ipou,em conjunto como Departamentode Saúde e Vigi-lância Sanitária,de um evento emcomemoração ao Dia Internacional da Mulher,realizado no dia oito de Março, no TeatroSantos Dumont.

Ao lado da exposição de obras literáriasMulheres Escritoras do ABC, organizada pelaLivraria Alpharrabio, de Santo André, aFundação promoveu o lançamento na região dolivro Dicionário Mulheres do Brasil, de ShumaSchumaber e Erico Vital Brazi, da Editora Zahar.

MM USEUUSEU - - Pelas Mãos da Mulheré o nome daexposição que o Museu Histórico Municipalmontou para o Dia da Mulher. Esta mostra reu-niu vários objetos que já passaram pelas mãosde uma mulher, em diversos aspectos. Atravésdestes objetos foram retratadas a mulher bor-dadeira, a mulher que gosta de cozinhar, a mu-lher artista, a mulher que cuida de criança, amulher que se enfeita e a mulher que trabalha.

SSHOPPINGHOPPING - - De primeiro a dez de Março, fi-cou em cartaz no Shopping ABC a exposiçãoImagens de Mulher, um retrato da mulher sul-sancaetanense. São 21 imagens de mulheres,de famílias importantes, que contribuíram parao crescimento da cidade desde o início do sé-culo passado até a década de 1970.

Trezentas pessoas em caminhada histórica por São Caetano

Cerca de 300 pessoas participaram da 1ª

Caminhada daMemória de SãoCaetano do Sul,promovida pelaFundação Pró-Memória de SãoCaetano do Sul,em parceria como Departamentode Esportes e Turismo e com a Diretoria de Saúdee Vigilância Sanitária, no dia sete de Abril.

Com o objetivo de levar ao conhecimentoda população pontos que fazem parte da histó-ria da cidade, e também para comemorar o DiaMundial da Saúde, a caminhada se iniciou emfrente ao Museu Histórico Municipal e passoupor dez locais importantes. Antes de iniciarema caminhada, os participantes passaram por al-guns exames médicos rápidos em frente aoMuseu Histórico Municipal.

Autoridades municipais como a primeira-dama e presidente do Fundo Social deSolidariedade, Avelina Tortorello, acompanha-ram todo o trajeto.

Os pontos percorridos foram: IndústriasReunidas Francisco Matarazzo, Igreja SãoCaetano (Matr iz Velha), Escola EstadualSenador Fláquer, Rua Perrella, Ferrovia eCasas da Ferrovia, Viaduto dos Autonomistas,Praça Cardeal Arcoverde, Igreja Matr izSagrada Famíl ia e prédio da CâmaraMunicipal, local onde funciona a sede daFundação Pró-Memória.

Durante todo o percurso os participantes re-ceberam informações históricas sobre os lo-cais, como data da construção e outras curiosi-dades. Na chegada, uma aula de ginástica agi-tou crianças, jovens e adultos e uma bicicletafoi sorteada. Além disso, uma exposição con-tando com todos os pontos da caminhada, cha-mada Caminhos da Memória, pôde ser aprecia-da no Salão de Exposições da Pró-Memória.

Exposição sobre índio passou peloShopping ABC em Abril

De 15 a 29 de Abril, a exposição Índios - o iní-cio de uma históriaficou em cartaz no ShoppingABC, trazendo ao conhecimento de todos um pou-co da cultural indígena, a fim de valorizar o saberdos índios, tão resistente através dos tempos.

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Os 15 painéis com fotos e textos retratarama alimentação, a habitação, as festas, os hábi-tos , os rituais, o trabalho e o artesanato dastribos brasileiras Carajás, Araras, Kaiapós,Tucanos, Yanomami, Xavantes e Guaranis. Asfotos são de Vicent Carel l i , cedidas peloCentro de Trabalho Indigenista.

Imigração em dose dupla

De 14 de Maioa 12 de Julho, aFundação Pro-Memória reuniuduas mostras si-multâneas em seuSalão de Exposi-ções. Empresta-das pelo DEMA(Departamento de Museus e Arquivos doEstado de São Paulo) e pela AAPC (Associa-ção dos Artistas Plásticos de Colagem), asduas tratavam do tema imigração.

Os Imigrantes, produzida pelo DEMA, eraformada por 17 painéis com reproduções foto-gráficas de famílias, casamentos, crianças, jo-vens e adultos imigrantes. Portugueses, japo-neses, italianos, alemães, espanhóis, ingleses,poloneses, sírios e norte-americanos, que co-meçaram a chegar ao Brasil a partir de 1870,ilustraram a exposição.

Já a mostra Aquarela do Brasil - a imigra-ção em São Paulotrouxe trabalhos em cola-gem de 32 artistas, entre eles Rubens Ianelli,Niobe Xandó, João Generoso, Lena Buazar,Ivone Dêgelo e outros, sob a coordenação daAssociação dos Artistas Plásticos de Colagem.

Pró-Memória participou demanifestação pela paz

No dia 18 deMaio, a Funda-ção Pró-Memó-ria participou doSegundo Dia Me-tropolitano de Pre-venção da Vio-lência, em eventorealizado no Es-

paço Verde Chico Mendes. No estande daFundação, um painel denominado Tributo àPaz reuniu trabalhos de artistas das sete cida-des do Grande ABC em um protesto contra aviolência.

Exposição no Museu lembrou escravidão

Arte e Histó-ria reuniram-seem Liberdade?!A escravidão ne-gra em São Cae-tano do Sul, queo Museu Histó-r ico Municipalexibiu de 18 deMaio a 14 de Julho, não deixando passar embranco o mês dedicado à lembrança dos sofri-mentos e dos heróicos feitos da comunidadeafro-brasileira.

Liberdade?! A escravidão negra em SãoCaetano do Sulmostrou, além de documentose fotos que atestam o período de escravidão nacidade, trabalhos em telas e esculturas de 12artistas plásticos da região relativos ao tema.

Afonso Nitoli, André Motta, Carlos Zam-bom, Cristina Moraes, Edson Raposeiro, EdenCoppini, Ida Suzete, Márcia Cristina, Mionn,Olinda Metran, Roberto Bittencourt e TâniaTurcato prepararam obras especialmente para aexposição.

Falando de Amorno Shopping ABC

A exposição Falando de Amor– o AmorRomânticoficou em cartaz no Shopping ABCde cinco a 30 de Junho, como homenagem aomês dos namorados. Retratando o relaciona-mento amoroso ao longo dos anos, a mostraenfocou a produção cultural, os usos e compor-tamentos sociais dentro do tema.

Diversas manifestações do amor romântico,desde o início do século XX, foram apresenta-das: desde literatura, cultura, pintura e propa-ganda até artes cênicas e cinema.

Paula Fiorotti é jornalista

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1 - Time do Atlético Vila Alpina, em 1941,quando disputava o campeonato amador dacidade de Santo André. Relacionamos osnomes de dez jogadores: Jacó, Jijo, Vinte eSete, Divino e Pegaço, Eduardo, Jacó,Natalino, Brás, Ferrolho, (?), (?)

2 - Barraca de mascate em feira devariedades. Década de 40. Da esquerdapara a direita: Zelman Zaks, menino Bijo(apelido) e Boris Giersztel, pai de CarlosGerchtel

3 - Em Julho de 1964 era inaugurado obusto de Lauro Gomes de Almeida, ex-prefeito de Santo André, em frente aoginásio de esportes que levava o seu nomee ao lado do Estádio Municipal AnacletoCampanella. Da cerimônia participaram aviúva do ex-prefeito, dona Lavínia RudgeRamos (dona Nenê), e o presidente daCâmara dos Deputados, Pascoal RanieriMazzilli

4 - O prefeito Anacleto Campanella recebeem seu gabinete assessores e políticos noinício de sua segunda administração(quatro de Abril de 1961 a três de Abril de1965). Observa-se na parede o símbolo desua campanha eleitoral: uma enorme penade caneta acompanhada da frase"Confiante na vitória de AnacletoCampanella, uma homenagem". Daesquerda para a direita: Walter Andrade,Júlio de Mello, José Marim Saab, PauloPimenta, Anacleto Campanella, ConcettoConstantino, coronel Juventino Borges e ovice-prefeito Lauro Garcia. Ano de 1961

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1 - O Unidos Vôlei Clube, formado porjovens de São Caetano do Sul, participou

de um campeonato interclubes de voleibol,na cidade de Jundiaí, em 1959. Da

esquerda para a direita, em pé: NelsonPerin, Sérgio Nogueira, José Cláudio Piotto

(Zequinha), Eloy Afini, Luiz MuriloMantovani e Darmil Garcia Lopes (Sansão).Agachados: Valter Mariano e Ivo Pellegrino

2 - Estação Ferroviária de São Caetano doSul em flagrante de José Honório de Castro

no ano de 1968 (dois anos antes dademolição para a construção de uma nova

estação). Havia duas plataformas depassageiros e um pontilhão de ferro

fundido, usado pelos pedestres para atravessia, que unia os dois trechos daAvenida Conde Francisco Matarazzo

3 - Na esquina da Rua Oswaldo Cruz coma Rua Marechal Deodoro funcionou, em

1948, o Hospital Bartira, propriedade do dr.Souza Voto. Na década de 50, as

instalações passaram a ser utilizadas peloPronto-Socorro Municipal, desativado em1968. Hoje, no local, existe a Praça SãoCaetano Di Thiene. Ao fundo é possível

observar a Indústria Ferro Enamel,desativada na década de 70 e transferida

para São Bernardo do Campo

4 - Antigas instalações da IndústriaStearica Paulista, localizada na esquina da

Rua Santo Antonio com a AvenidaConselheiro Antonio Prado. Nos anos 70, a

Indústria Corona, fabricante de carroceriasmetálicas, ocupou o local. No início da

década seguinte, o prédio foi demolido paraa construção do terceiro módulo do atualTerminal Rodoviário de São Caetano. Ao

fundo, o Edifício Vitória

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1 - Em Dezembro de 1951, a Guarda-Noturna de São Caetano do Sul foioficialmente instituída em cerimôniaocorrida na antiga sede do Clube Ideal, naRua Santa Catarina, nº 97. Da esquerdapara a direita: Anacleto Campanella, Júliode Mello, Antônio Lojudice, (?), dr.Marcondes (delegado policial), BrunoBisquolo, (?) Santoro, Antônio Russo,Nelson Infanti e o chefe da guarda, cujoapelido era General

2 - Avenida Conde Francisco Matarazzo,1945. Recepção aos membros da ForçaExpedicionária Brasileira residentes emSão Caetano. Em meio à multidão, asfaixas políticas do Partido ComunistaBrasileiro. No térreo do sobrado à esquerdafuncionava o Bar Santos, propriedade dopai do jornalista esportivo Nelson Perdigão

3 - A Fundação Mc Ashan, ligada àempresa Anderson Clayton, e os Armazénsde Reprensagem de Algodão Fidelidadepromoviam, no início da década de 60, emSão Caetano do Sul, campanhasfilantrópicas de distribuição de materialescolar para crianças carentes. Um dosresponsáveis pelo trabalho era Argemiro deBarros Araújo, que viria a ser vice-prefeitode Walter Braido entre os anos de 1973 e1977

4 - A Casa dos 80 marcou época nocomércio varejista de roupas, em SãoCaetano, entre os anos 50 e 70. Todos osprodutos à venda tinham o preço reduzidoem oitenta centavos, o que agradava osclientes. A loja era dirigida por FranciscoNegrão, que trabalhava como ator emprogramas de televisão e, principalmente,em filmes realizados na CompanhiaCinematográfica Vera Cruz, de SãoBernardo do Campo. A loja localizava-se naAvenida Conde Francisco Matarazzo, juntoà estação ferroviária. Ano de 1968

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1, 1A - Um dos passatempos dajuventude sancaetanense, na década de

60, era voar em um ultraleve chamadoAuto-Giro. O Clube Aéreo de Auto-Giro

(CAAG), localizado na cidade, congregavaos simpatizantes do esporte e era dirigido

por Wladimir Romera. A área utilizada paraos vôos era próxima ao Rio dos Meninos,onde hoje existe a estação de tratamento

de esgotos da Sabesp. Ano de 1967

2 - Nesta peça publicitária de 1965, aBrasinca de São Caetano do Sul procurava

jogar com os conhecimentos dos leitoressobre a produção da empresa. Considerada

uma das maiores ferramentarias daAmérica Latina, possuía também

estamparia que produzia peças para todasas montadoras automobilísticas do Brasil.

Com a imagem do carro esportivo 4.200GT, apelidado de Uirapuru, em destaque no

anúncio, a Brasinca procurava esclarecerque não era apenas a montadora daquele

veículo (sensação do IV Salão doAutomóvel, em 1964)

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1 - O clube de futebol amador Atlético VilaAlpina, fundado em seis de Junho de 1936,apesar de estar localizado no Município deSão Paulo, sempre disputou oscampeonatos promovidos pela LigaSancaetanense de Futebol. No torneio de1959, sagrou-se campeão e comemorou oevento, com seus torcedores, na esquinada Avenida Conde Francisco Matarazzocom a Rua Herculano de Freitas, no BairroFundação

2 - Em 1959, este era o contingente militarsediado em São Caetano do Sul. Os oficiaisreuniam-se no edifício de número 251 daRua Rio Grande do Sul, onde hoje selocaliza o Banespa. Naquela época, ogrupo de militares sancaetanensespertencia à Força Pública do Estado de SãoPaulo, atual Polícia Militar

3 - Em Julho de 1959, o jornalista OttoDiringer, do Jornal de São Caetano,entrevistou Rosalina do NascimentoRibeiro, mãe da menina Neves Ribeiro. Agarota, que havia morrido muito jovem, eraconsiderada milagrosa pelo povo de SãoCaetano do Sul. Seu túmulo, no Cemitérioda Cerâmica, ainda é muito visitado

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1 - A Praça Ermelino Matarazzo, junto àsantigas instalações industriais da

Matarazzo, abrigou por muito tempo aestátua de São Caetano Di Thiene, hoje

localizada na torre da Igreja Matriz Velhade São Caetano. O menino ao lado da

estátua é Ademir João Perrella, filho deEmigdio Perrella, morador do local por

mais de 70 anos

2 - Vista aérea (1967) do antigo PaçoMunicipal e da Praça do Estudante, na

Avenida Goiás. O obelisco diante do prédiofoi demolido devido à duplicação da

Avenida Goiás

3 - Na década de 60 foram tomadas asprimeiras providências para a construção

da atual Escola Industrial Jorge Street. Asplantas dos futuros prédios estavam sendo

observadas por Marlene Picarelli (do FundoEstadual de Construção Escolar); João

Batista Pinto (relações públicas daPrefeitura municipal); Geraldo Puntoni (da

diretoria de obras públicas) e GiuseppeSabatine (chefe da seção de cadastro e

urbanismo de São Caetano do Sul)

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1 - Em 1957, os estudantes do cursoprimário precisavam preparar-se para ocurso ginasial através do chamado Cursode Admissão ao Ginásio. Era o caso dosalunos do curso de admissão do InstitutoSagrada Família. À direita, o professorEugênio Voltarelli. O aluno Domingo GlenirSantarnecchi, sentado na primeira fila, é odécimo primeiro da esquerda para a direita

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4 - A Sociedade Amigos do BairroFundação, em seu segundo aniversário(1965), organizou torneio de bocha vencidopelo São Cristovão Futebol Clube. Naoportunidade, João da Costa Faria (ladeadopelo padre Gil Eulálio, vigário da ParóquiaSão Caetano), diretor da agremiaçãovencedora, recebeu, das mãos do vice-prefeito Lauro Garcia, o troféu de campeão

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3 - O jornal paulista Fanfulla, bancadopela colônia italiana, em sua edição deprimeiro de Agosto de 1958 publicou, naprimeira página, matéria sobre os festejosdo 81º aniversário de São Caetano do Sul.Na ocasião, foi inaugurado,provisoriamente, um monumento aosimigrantes italianos na Praça CardealArcoverde, em frente a um coreto queexistia na época. Da esquerda para adireita: (?), José Martorelli, Luiz Martorelli,Antônio de Melo Neto, Walter Braido, VitórioDal’Mas, Paulo Reale, Wladomiro Ricocci,João D’Agostini, (?), João Dal’Mas, MárioPorfírio Rodrigues, o seu filho MárioRoberto Rodrigues, e Jordano Vincenzi

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2 - Praça do Professor, em 1958,localizada junto ao Ginásio Cel. Bonifáciode Carvalho e ao recém-construídoAuditório Santos Dumont, que tambémabrigava a sede do Centro Acadêmico 28de Julho. A Avenida Goiás possuía umaúnica pista para os dois sentidos do trânsitoe era calçada com paralelepípedos. Aofundo, as instalações industriais da GeneralMotors do Brasil

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1 - Em 1959, a equipe de futebolprofissional do São Caetano Esporte Clube

disputava uma de suas últimas partidaspelo campeonato paulista da 2ª divisão de

profissionais. Não demoraria muito e odepartamento de futebol da agremiação

seria extinto. O jogo foi realizado contra oUnião de Mogi das Cruzes, no estádio

Anacleto Campanella, e o resultado foi 1x1

2 - Em 1977, o Brasil, através da CBD –Confederação Brasileira de Desportes,

enviou vários treinadores para os EstadosUnidos a fim de ensinar futebol. Nelson

Perdigão, então professor das escolinhasde futebol da cidade, representou São

Caetano do Sul e São Paulo. Da esquerdapara a direita: Ted Arrows (dirigente

americano), Nelson Perdigão, Edvaldo A.Santa Rosa (campeão do mundo de 1958)

3 - Grupo de amigos reunidos junto aoCoreto da Praça Cardeal Arcoverde, em

frente à Matriz Sagrada Família, em 1951.Em pé, da esquerda para a direita:

Ermelindo Savioli, Vicente Zorzi, AntônioAlvarenga, Salim (apelido) e Oswaldo.

Sentados: Antônio, (?) e José Zorzi

4 - Avenida Guido Aliberti, na época desua abertura e recapeamento, no início da

década de 60. Tinha a função de ligar aAvenida Presidente Wilson, em São Paulo,

com o Km. 13 da Via Anchieta, em SãoBernardo do Campo. À direita, parte das

instalações industriais da Laminação SãoFrancisco, hoje desativada

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1 - O Banco de São Caetano do Sulinaugurou, em 1961, sua primeira agênciafilial na Avenida Goiás, esquina com a RuaTiradentes, na antiga Vila Paula (hoje BairroSanta Paula). Posteriormente, asinstalações abrigaram filiais do BancoBamerindus e, atualmente, comportam oBanco HSBC

2 - O Atlético Vila Alpina, fundado em seisde Junho de 1936, comemorou seu Jubileude Prata em 1961. Nesse ano, realizouevento comemorando a aquisição da sedeprópria. O prefeito Campanella, à direita,segura a flâmula do clube junto com overeador Jaime da Silva Reis

3 - O Parque Infantil 1º de Maio,construído em 1957, foi inaugurado peloprefeito Oswaldo Samuel Massei em 1958.O primeiro parque infantil de São Caetanolocalizava-se entre as Ruas Manoel Coelhoe Rio Grande do Sul. Em dez de Fevereirode 2001, na administração de Luiz OlintoTortorello, o estabelecimento de ensino foitransferido para a Rua Rafael CorreaSampaio, 584

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1 - Avenida Conde Francisco Matarazzo,em 1946, no trecho entre a estação

ferroviária e a Rua Heloísa Pamplona. Hojeno local está instalada a Rua 24 horas

2 - Em 1971 a Rua Aquidaban, no BairroFundação, teve as casas do lado direito,

sentido centro, demolidas para aconstrução do Viaduto Independência,

inaugurado em 1972. À direita, a antigasede social do SAAD Esporte Clube, e ao

fundo o prédio do Moinho Santa Clara

3 - Fachada de mercado que funcionou naRua Santa Catarina próximo à rede da

Eletropaulo. O casarão ao fundo foidemolido e, no local, hoje funciona a

agência bancária do HSBC. Ano de 1959

4 - Trecho da Rua Conselheiro Lafayette,no Bairro Barcelona, quando foi

pavimentada, no início dos anos 60. Emprimeiro plano, o quarteirão compreendidoentre a Avenida Goiás e a Rua Piratininga

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