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2índice

Capa e contracapa: concelho de Avis

Ficha Técnica

A Alma Alentejana Revista Cultural, não se responsabiliza pelas opiniões expressas pelos seus colaboradores

Propriedade: Alma Alentejana, Associação para o Desenvolvimento, Cooperação e Solidariedade SocialSede: av. Prof. Ruy luís Gomes, 13 - R/c - laranjeiro - 2810-274 almadaTelefone / Fax: 212 551 296 Email: [email protected]ção: av. Prof. Ruy luís Gomes, 13 - R/c - laranjeiro - 2810-274 Almada

Director coordenador: Joaquim AvóDirector editorial: luís MaçaricoPublicidade: Joaquim AvóColaborador Técnico: Hélio HeitorSecretariado e Distribuição: Joaquim Avó e Hélio HeitorTiragem: 2000 exemplaresFotolito, produção gráfica e paginação: a Triunfadora, artes Gráficas, lda.

A Palavra ao Presidente da associação Joaquim avó ......... ..... 3

À Escala Humana luis Maçarico ................................. 5

A GENTE E O SOCIALoutras Dinâmicas .......................... 7

LOCAISArronches, a Terra onde as Pedras falam .............................................. 9

Santana de Cambas, uma Freguesia da margem esquerda do Guadiana ................ 12

Concelho do Seixal ....................... 14

COISAS DE ANTEONTEMas Minas de Manganês de Castro Verde ................................ 16

Mineiro, aos mineiros de aljustrel, do lousal, de S. Domingos e de todo o mundo ...................................... 20

ARTEFestas de Papel, a arte efémera do alentejo. o caso do Redondo ..... 26

Festas do Povo de Campo Maior, vistas com os olhos da alma ........ 30

FOTOGRAFIAos segredos do olhar ................... 34

MEMÓRIAComo conheci o alentejo ............ 40

os Feirantes ................................. 41

Saudades de passado já distante e até de um sapato voador ............. 44

HOMENAGEMRogério Ribeiro, uma força viva incessante ............................. 48

ENTREVISTAManuel Coelho, Presidente da Câmara Municipal de avis ............ 58

VII JOGOS FLORAIS DA ALMA ALENTEJANA 2007 ....................... 50

DESENVOLVIMENTOFórum alentejo 2015, por uma Região da nova geração ............... 74

ACTIVIDADES DESENVOLVIDAS .. 77

ACTIVIDADES A DESENVOLVER ... 78

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A PALAVRA AO PReSidenTe dA ASSOciAÇÃO

Estimados leitores

Passado que foi um ano desde a úl-tima edição, aqui estou mais uma vez dando-vos a conhecer o decor-rer desta etapa que apesar de algu-mas dificuldades, estamos certos que com a dedicação, compostura e querer destes ór-gãos sociais temos conseguido cumprir o que havíamos proposto tanto de âmbito cultural como social. Vamos continuar a apostar no que está por realizar e temos fundadas espe-ranças de que a breve trecho e com o habitual apoio de várias entidades, das quais destaca-mos a Câmara Municipal de almada e de vá-rias Freguesias do nosso Concelho, podere-mos afirmar-nos como Instituição Particular de Solidariedade Social virada para o futuro.Começamos por agradecer ao Professor Joa-quim Saial a sua colaboração na feitura desta nossa revista cultural, pela grande qualidade que introduziu tanto temática como gráfica, mais elaborada, mais diversificada e qualitati-va, que através do seu saber fez escola.

Queremos também agradecer a todos os co-laboradores que nos enviaram os seus textos, destacando um deles que, antes de ir apanhar o avião se deslocou a esta associação para fa-zer a sua entrega e que tanto têm contribuído para o enriquecimento desta nossa revista

que queremos cada vez mais cul-tural, informativa e afirmativa da nossa identidade cultural, espe-cialmente nas vertentes histórica, recreativa e artística, literária, mo-numental, musical e etnográfica.

Agradecimento ainda a toda a equipa que as-segurou a redacção, a fotografia, o grafismo e a sua distribuição. um especial agradecimen-to às entidades (públicas e privadas) que via-bilizaram este projecto participando com es-paços publicitários que, além de nos ajudarem à edição de cada número, trouxeram o colori-do da amizade com um abraço solidário que muito nos motivou.

Realizou-se recentemente o 14º. Congresso alentejo XXI com o tema “Caminhos do Futu-ro” e que consideramos momento alto na vida da sociedade alentejana e que esperamos contribua efectivamente para que o alentejo seja uma região mais justa, mais desenvolvida e que de modo decisivo seja peça importante para o desenvolvimento do País. apesar de sermos uma região com imensas potenciali-dades (Barragem do alqueva, Porto Intercon-tinental de Sines, aeroporto de Beja, entre outras), são projectos de grande relevo para o presente e para o futuro de um Alentejo com uma nova economia que ultrapasse finalmen-te o contexto económico latifundista e de ca-

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pitalismo agrário primitivo, que há decénios tem paralisado e impedido o seu progresso. Verifica-se um acentuado envelhecimento e desertificação entre meados de 1990 e 2007, o que é uma contradição pois os citados pro-jectos deveriam dar origem a muitos postos de trabalho e que logicamente deveria atrair mais alentejanos às suas terras de origem.

Debateu-se muito a Regionalização concluin-do-se que será a única solução para esta pro-víncia (um terço de Portugal), aliás como con-firmação da consulta através do referendo sobre a regionalização os Alentejanos na sua grande maioria foram bem firmes responden-do “sim”. Conclui-se ainda que o alentejo é tão grande e com tantas potencialidades que é chegado o momento da nossa completa afirmação, mostrando que somos capazes de contrariar o destino que nos querem impor e de darmos um valioso contributo para o de-senvolvimento do país e o caminho certo para a estabilidade, a coesão e solidariedade no Alentejo.

Não obstante os constrangimentos e tristezas que esta crise global provoca no Alentejo, o nosso povo nunca vira a cara à luta enfrentan-do essas dificuldades sempre com um sorriso, cantando enquanto trabalha, património que nunca poderemos perder, acreditando que o dia de amanhã será sempre melhor que o de hoje.

Despeço-me com um abraço amigo a todos os colaboradores desta revista e a todos os que contribuíram e contribuem para o reforço da Alma Alentejana e consequentemente para o engrandecimento do Alentejo.

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À eScALA HUMAnA...

Nesta edição da Revista de Cultura da Alma Alentejana o novo director editorial recebe o teste-munho de um homem culto, fra-terno e generoso, que conseguiu levantar a fasquia do bom gosto e da qualidade desta publicação, que já tinha uma imagem de marca, até um nível que im-põe responsabilidade redobrada, na aborda-gem e na apresentação dos assuntos, que não foram escolhidos ao acaso.a Festa e o Trabalho são o grande fio condutor destas páginas, com colaborações novas, de autores que se estreiam neste percurso e de outros que regressam, todos com uma sabe-doria partilhada, que nos lembra a necessida-de de festejar a Vida e de salvaguardar memó-rias e conhecimentos ligados ao mundo laboral dos campos e das minas.Em tempos de dificuldades, nesta curva aper-tada do planeta, com carências várias (ener-géticas, alimentares, da falta de cumprimento dos direitos humanos mais básicos, das con-sequências de inúmeros e fatais desastres na-turais, que são em parte resultado da imposi-ção de uma política ultraliberal, em que o lucro é o supremo objectivo e a natureza só serve para servir esses desígnios), no alente-jo, a crise também deixa mazelas.a desertificação não parou, com a esperança inicialmente gerada por Alqueva. A agricultu-

ra está nas mãos de grupos es-trangeiros, que ocuparam posi-ções anteriormente detidas por latifundiários absentistas ou pre-potentes.Ao escrever estas linhas, pretendo

contribuir para que se reflicta sobre o futuro, que todos os dias se vai esboçando nos pas-sos, nos gestos, nas ideias que brotam dentro do quotidiano das nossas cidades, vilas, al-deias, lugares. Na alma da nossa gente.uma das respostas incontornáveis é continu-armos a lutar por dias melhores, pois como diz o povo, “a esperança é a última a morrer”.outra das saídas deste momento complicado da Humanidade é “fazer das tripas coração” e celebrar o privilégio de respirarmos, numa terra de cantares únicos, de sítios ímpares, de gente que não há assim em mais lugar ne-nhum.a Festa surge pois em vários textos, encomen-dados a antropólogos, a poetas e pintores, que com um olhar atento nos brindaram, der-ramando colorido e mensagens de encanta-mento, que se renovam em dias especiais, por ruas e recantos, onde a música do pandeiro ou o sorriso de uma idosa a recortar papel mágico, enriquecem o texto.É preciso resistir, com os prodígios da arte po-pular, com a sabedoria de pessoas que pare-cem saídas de livros clássicos, mas estão aí

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todos os dias, são reais e admiráveis, dando-nos uma tremenda força pelos seus exemplos de tenacidade e criatividade.Amar o Alentejo é também enaltecer o que tem de bom, através das mãos fazedoras de sonhos, que permanecem na paisagem, irra-diando luz.o sol não está só no campo de sedes, mas na pegada e na fala.nesse sentido, saúdo os colaboradores deste número da Revista de Cultura Alma Alenteja-na e todos os leitores, associados ou não, des-ta associação, bem como a figura carismática do Presidente da Direcção, das mulheres Can-tadeiras e do empreendedor Hélio Heitor, pelo seu desempenho, em prol do Alentejo, engrandecendo a representação desse sul mí-tico, com uma participação entusiasmada. Também eles, encontrando no caminho quan-tas adversidades, enfrentando-as com o can-te, a feira, a festa, o sorriso, souberam chegar aqui.Insistindo em serem seres humanos, com sonhos, que não se vergam à sombra e conti-

nuam a caminhar, num território de brasas, rumo ao sonho maior de ser livre como o ven-to. O vento da mudança que ninguém conse-guirá parar.

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A genTe e O SOciAL

Outras Dinâmicas

Paulo Mota

ao longo destes doze anos de existência a alma alentejana tem sido um exemplo de empreen-dedorismo ao nível da intervenção social no Concelho de almada. Desde de 1996 que se tem verificado um salto não só quantitativo, mas também qualitativo dos serviços presta-dos por esta Instituição. Serviços esses que além dos tradicionais apoios sociais, como são disso exemplo o Serviço de apoio Domiciliário ou os dois Centros de Dia, há que referir os gru-pos de Cavaquinhos, de Danças Sevilhanas e especialmente o coro feminino das Cantadei-ras, que têm dado outra “alma” aos seus parti-cipantes, maioritariamente idosos.

No entanto, aquilo que se pretende com este artigo não é falar de temas já sobejamente fa-lados em anteriores ocasiões. Hoje, venho fa-lar-vos de outras dinâmicas. Estas estão intima-mente associadas a projectos que a Alma Alen-tejana pretende concretizar, que passam pela criação de um espaço que albergue diversas Respostas Sociais, como um lar para Idosos, uma Creche e um Jardim de Infância e que tenha como espaço comum uma Quinta Peda-gógica. um outro projecto desta Instituição, é um estudo sobre a implementação de um Ser-viço de apoio Domiciliário na Freguesia do Pra-gal. Finalmente, e não menos importante irei falar-vos do Projecto Gente com alma.

Em primeiro lugar, a necessidade da criação das Respostas Sociais de lar de Idosos, Creche e Jardim de Infância, resultam de múltiplos factores. Por um lado, sabe-se que a população concelhia está envelhecida e carente de apoios

que permitam a satisfação das suas necessida-des, tentando preservar a sua autonomia e in-dependência. Por outro lado, também sabe-mos que o número de instituições pertencen-tes à Rede de Solidariedade é diminuto, predo-minando os Particulares, que muitas vezes não oferecem o mínimo de condições exigidas para a manutenção da dignidade do idoso. Tem-se também conhecimento que algumas Fregue-sias, como por exemplo a Charneca da Capari-ca, que foi a Freguesia que mais cresceu em dez anos, não dispõe de nenhum equipamento da Rede de Solidariedade para a Primeira In-fância. Sabe-se também que de acordo com o Diagnóstico Social do Concelho de almada (2002), duas linhas de intervenção para o De-senvolvimento Social, passavam pelo aumento do número de estabelecimentos de apoio à Primeira Infância, mas também pela criação de estruturas de apoio à Terceira Idade. Tendo en-tão estes indicadores como referências, está a ser elaborado um projecto onde estas duas fai-xas etárias, possam estar em conjunto, parti-lhando experiências, que poderão ser de cres-cimento para uns, mas também de rejuvenes-cimento para outros, como são disso alguns exemplos já existentes no nosso Concelho, mas também aquilo que já se passa um pouco por essa Europa fora.

De seguida, o projecto de criação de um Servi-ço de apoio Domiciliário na Freguesia do Pra-gal, resulta da observação feita nesta Fregue-sia, onde julgamos existirem vários indivíduos, sobretudo idosos, em situação de dependên-cia. Para a justificação da criação deste serviço,

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está a ser elaborado pela equipa técnica da alma alentejana (Dr. Paulo Mota e Dr.ª Joana Carvalho), um estudo sociológico que possa comprovar aquilo que nós achamos ser indis-pensável na Freguesia do Pragal. Por outras palavras, a implementação da Resposta Social de apoio Domiciliário no Pragal. Para tal, serão efectuadas entrevistas semi-directivas às insti-tuições inseridas no meio envolvente, mas também serão aplicados inquéritos por ques-tionário aos fregueses do Pragal.

Por último resta-nos falar um pouco do projecto Gente com alma. aqui o que preten-demos, é publicar histórias de vida de diversos utentes da nossa Instituição, previamente au-torizados por estes, sob a forma de texto, mas também através da captação de imagens. Com este projecto, pretendemos dar a conhecer ao meio envolvente quem são as nossas gentes, quais são os seus percursos de vida, o que sen-tem, o que desejam, o que ambicionam. Por outras palavras, será um documento físico

transmissor de saberes e experiências. Para le-varmos este projecto até bom porto, necessi-tamos do apoio de diversas instituições, que possam financiar esta ideia, pois o grande ob-jectivo é a edição de um livro, mas também a criação de DVD’s, que documentem estas his-tórias.Como o leitor poderá concluir, estas dinâmicas, que sabemos ambiciosas, só poderão passar à prática se existirem instituições que as “patro-cinem”. Para tal estão a ser feitos os contactos com as entidades competentes, mas fica sem-pre aberta a porta a novos contributos, para que se passe do sonho à realidade.

Utentes do Centro de Dia do Laranjeiro

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Vigiando o vasto casario, claro e luminoso, ro-deado de verde olival, a torre da igreja matriz de Nossa Senhora da Assunção surge recorta-da no azul de fundo. É esta a imagem que guar-damos quando nos está mais próxima a vila de arronches - um contraste de tons que parecem vibrar à medida que o olhar se desdobra numa múltipla dimensão que transmite serenidade e luz.Terra raiana, com cerca de 2100 habitantes, entre Elvas e Portalegre, onde as planícies cir-cundantes apresentam os relevos característi-cos do norte alentejano, Arronches encontra nos seus monumentos, nas suas tradições e na sua música a expressão das suas gentes. Para além das duas igrejas – Nossa Senhora da Assunção e do Convento de Nossa Senhora da luz, ambas datadas do século XVI, as popula-ções podem orgulhar-se, também, das inúme-ras moradas antigas com portais e janelas góti-cas e manuelinas, do Edifício da antiga Cadeia

Arronches, a Terra onde as Pedras Falam

Aspecto actual da vila

- do Barroco século XVII, da ponte do Caia - sé-culo XV, e das suas fontes edificadas no século XVIII – a fonte de Elvas e a fonte do Vassalo. acerca desta última costuma dizer-se, por aquelas paragens, que visitante que beba água do Vassalo estará “condenado” a retornar ami-úde àquela vila. A criação e a matança do porco preto são dois dos seus usos mais seculares. As Festas de S. João, onde se constroem altares para o Santo Padroeiro e se enfeitam as ruas com flores de papel, a gastronomia de onde se destacam o lacão1 assado e a saborosa carpa com poejos são bons exemplos da tradição de que os ar-ronchenses se podem envaidecer. E as “saias”, manifestação musical tão característica da zona raiana do alentejo norte, têm, nesta ter-ra, um singular acompanhamento musical. “nesta vila as pedras falam”2 - afirma um dos elementos do Grupo de Pedrinhas de arron-

Ana Isabel Carvalho

LOcAiS

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ches – com certeza um grupo que prima pela originalidade dos seus instrumentos. Existindo desde os anos oitenta, o Grupo de Tocadores de Pedrinhas de Arronches tem vindo a reno-var-se e, da sua formação original, já só se en-contram dois elementos – são eles que têm sabido transmitir o “engenho e a arte” de tocar pedras. É na ribeira que banha a vila, bela e altiva na sua brancura, que procuram as pedras lisas e alongadas, desenhadas pelas águas que afluem do Rio Caia. Retomando uma antiga tradição daquela região, fazem delas os seus instrumen-tos. Num movimento, veloz e sequenciado, os dedos dos executantes batem nos seixos pro-duzindo a sonoridade ímpar com que, habitu-almente, acompanham a sua música tradicio-nal. “Eu tenho esta pedra desde que estou no Gru-po das Pedrinhas e ainda não encontrei nenhu-ma que a substituísse - cada pedra tem o seu som mas se juntarmos as três formam um som único”3 – assegura um dos seus mais antigos elementos. “o ti Carlos Maurício e o Fonseca são pessoas que têm sabido ensinar os jovens felizmente não estamos em vias de extinção –

temos sete jovens a aprender e a tocar”4. Muitas são as vezes em que associam ao som obtido das pedras o dos “guizos” que colocam em volta do pulso, o do ferrinhos, o da harmó-nica ou mesmo o das castanholas, tornando mais rica a composição e o acompanhamento das alegres e típicas “saias”. É com o grupo fol-clórico da terra que tocam exprimindo um con-vite para a festa mais importante da vila: Come sardinhas assadas/Bebe vinho e come pão/Se pensares em vir a arronches/Visita-a p’lo S. João. Durante os cerca de vinte anos de existência, os nove elementos têm percorrido o país e al-guns lugares fora de portas como França, Espa-nha e Canadá em espectáculos de divulgação da arte de que tanto se orgulham. “Só aprende quem tem ouvido, isto não se aprende por mú-

1 Última parte da perna do porco, coberta com um tempero especial e assada no forno.2 Sic Noticias - Roteiro de Fim de Semana – Transmissão no Jornal da Noite, 12.04.2008, disponível em http//sic.aeiou.pt/online/noticias/programas/ir/Artigos3 Sic Noticias - Roteiro de Fim de Semana – Transmissão no Jornal da Noite, 12.04.2008, disponível em http//sic.aeiou.pt/online/noticias/programas/ir/Artigos 4 Idem

Fonte do Vassalo

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Grupo de Tocadores de Pedrinhas

sica – temos muito gosto, gosto muito de tocar as pedras e sentimo-nos vaidosos – somos iné-ditos, ninguém mais toca pedras.”5

Inspirados, com certeza, no branco e preto dos seus trajes e nas suas viagens cantam as suas “saias” desta vez apenas ao som das pedras:avoa como andorinhas/Por terras de Portugal/Este grupo das pedrinhas/Já não há quem o igualeas saias “modas só cantadas entre homens e mulheres nas mondas, na ceifa, na sacha, na apanha da azeitona; ou cantadas e bailadas nos bailes das localidades (…) e ainda quando os rapazes iam “às sortes” eram “modas de de-safio acompanhadas de pandeiro e adufe”. Hoje em dia podem ter acompanhamento de harmónio, concertina, viola ou recoreco6, mas quando, em Campo Maior, as festas do povo nos embriagam com cor e som, nas noites ain-da quentes de alguns Setembros, predominam, tradicionalmente, os pandeiros (ou pandeire-tas) enfeitados de borlas e fitas multicor. Considera armando leça que “Embora estas modas coreográficas se nos deparem do Sabu-gal a Évora, ou na região abrantina, é no alto Alentejo ao rimar do pandeiro que elas são mais castiças (…) Como expressão músico etnográfica, os corais são para o Baixo alentejo como as saias para o Alto Alentejo.”Acerca do povo desta região e da sua música Joana Munõz afiança “… vamos encontrar no alto alentejo homens e mulheres a cantar …

no gozo das diferenças (…) Povo bailadeiro, a comprová-lo nas “saias”, como desafio e com desafio, a deitar fora o que se quer esquecido (…) as modas, uma festa de todas as horas e de todas as bocas, desde que se aprendia a falar (…) Homens e mulheres ensinando a mocidade a inventar a esperança.”“Quanto ao futuro o Grupo das Pedrinhas de arronches vai continuar a trabalhar de forma a manter a tradição e a dignificar arronches.”7 Para além da autenticidade e da originalidade do som é, também, na forma sábia como este grupo transmite aos seus jovens esta singular arte de fazer música com pedras, que reside a sua genialidade. Também eles ensinam os mais novos “a inventar a esperança.”não sei se será pelas gentes, as tradições, o som único do Grupo das Pedrinhas, as recorda-ções das estadias, em épocas de aromas esti-vais, em que, de dia, apenas os banhos na ri-beira suavizam a canícula e de noite, a frescura é trazida numa cadeira de bunho encostada à parede caiada, ou se será pela água “feiticeira” do Vassalo – a verdade é que regresso sempre àquela vila.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASLeça, Armando (1942) Música Popular Portuguesa, Edito-

rial Domingos Barreira, Porto.Munõz, Joana (1998), Campo Maior – Memórias das mi-

nhas raízes, Edição de Autor.

RECURSOS DA WEBwww.rtsm.pt/cultural.htm

www.evora.net/associarte/tradicional_popular_popu-lar.htm

cantoalentejano.comwww.cm-arronches.pt

sic.aeiou.pt/online/noticias/programas/ir/Artigos

AGRADECIMENTOEmiíio Moitas

5Ibidem 6Texto publicado no Diário do Alentejo, de 11 de Maio de 2001, dis-ponível em http://cantoalentejano.com/novidades7Texto escrito sobre o Grupo no site da Câmara Municipal de Ar-ronches

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Santana de Cambasuma Freguesia da margem esquerda do Guadiana

José Rodrigues

numa das nossas visitas a Mértola, aproveitá-mos para dar um saltinho a Santana de Cam-bas, onde assistimos à apresentação de um li-vro editado pela Junta de Freguesia, e que tem como titulo “ Memórias do Contrabando em Santana de Cambas “ da autoria do antropólo-go luís Filipe Maçarico.Em conversa com José Rodrigues, presidente da Junta de Freguesia desde 1997, ficamos a saber que a freguesia tem 174 Km2 e apenas 870 eleitores, faz fronteira com a vizinha Espa-nha através da ribeira do Chança e se estende desde a bonita localidade do Pomarão até Vale do Poço, povoação esta que pertence metade

a Mértola a outra metade a Serpa.Das muitas apostas que a Freguesia tem para fixar a população, e atrair visitantes, contam-se entre outras, 3 pequenos museus em constru-ção, apoiados pelo programa leeder+ , e que são: o museu do contrabando, a forja do ferrei-ro e o espaço museológico ao ar livre alusivo ao caminho de ferro Mina /Pomarão, por onde era transportado o minério das antigas minas de S. Domingos, via Guadiana para Inglaterra e outros países da Europa.Verificamos ainda que a freguesia tem duas IPSS, o Centro Social dos Montes altos, que conta com 27 camas, e o Centro de apoio a

Vista de Santana de Cambas

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Idosos de Moreanes com um lar em constru-ção para 25 camas, cujas obras estão quase concluídas, tendo esta ainda uma horta bioló-gica com 2 hectares de regadio, cujas hortíco-las e frutos se destinam ao consumo da insti-tuição.na área dos equipamentos turísticos, conta ainda a freguesia de Santana, com 3 equipa-mentos na área do turismo rural; são eles: Monte do Guizo, Monte do alhinho e Monte da Bela-Vista com um total de oferta em cerca de 35 camas.Diz-nos ainda José Rodrigues, que tiveram ini-cio há poucos dias as obras de ligação da Fre-guesia a El Granado (Espanha), cuja ponte clas-sifica de muito importante, que trará certa-mente uma mais valia ao concelho de Mértola, pois a vila de El Granado fica a 10 km do Poma-rão e Huelva a 60 km.Por todas estas razões, insiste o nosso entrevis-tado, que vale a pena visitar a freguesia de Santana de Cambas, em passeio pedonal, ou

BTT, tendo a Junta para o efeito, 25 bicicletas disponíveis para quem as queira utilizar, atra-vés dos trilhos do contrabando, ou do circuito do minério, antigo trilho do comboio da Mina ao Pomarão, ou até de barco, uma vez que a associação Defesa do Património de Mértola, disponibiliza uma embarcação com 40 lugares para passeios no rio.

Horta Biológica

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Concelho do Seixal

Anabela Pereira

LOcAiS

TuRIsMo FluvIAl e NáuTICA de ReCReIo

o concelho do Seixal detém uma extensão ribeiri-nha de aproximadamente 38 km nos quais a Baía do Seixal, que atendendo à sua dimensão e confi-guração, proporciona um porto natural de abrigo para barcos de recreio e actividades desportivas e de lazer associadas à água, como a canoagem e vela, entre outras dinamizadas pelas associações náuticas existentes, com o apoio da autarquia.

a Baía do Seixal é já igualmente escolhida por muitos nautas portugueses e estrangeiros para ancorarem os seus barcos, aproveitando as facili-dades naturais existentes e os serviços prestados pelos estaleiros que ainda laboram nas imedia-ções deste recurso fluvial.

Partindo desta riqueza natural e das suas poten-cialidades, o Município promove uma política de

desenvolvimento sustentável do cluster “turismo fluvial e náutica de recreio”. assim, projecta-se a instalação de equipamentos ambientalmente sustentáveis e que preservem o ecossistema ca-racterístico da área, nomeadamente ao nível de fundeadouros, núcleos e portos de recreio, cais de acostagem, serviços de apoio, entre outros equipamentos e serviços privilegiando a recupe-ração e revitalização de estaleiros navais, núcleos urbanos antigos e património edificado existente

PAsseIos No TeJo e MuITA ANIMAção No seIxAl Nos PRóxIMos Meses

a Baía é também o cenário ideal para um passeio no Tejo a bordo do Bote de Fragata Baía do Seixal, a partir do qual se pode desfrutar da paisagem que mostra o património do concelho ao longo das suas margens. o verão traz também ao Seixal o Festival de Ve-Baía do Seixal

Quinta da Fidalga

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rão, um conjunto de Festas Populares que acon-tecem pelas seis freguesias do concelho e que apresentam muita animação, com música de vá-rios estilos, bailes e animação de rua. a Mostra de artesanato do Seixal, que vai para a sua 15.ª edi-ção acontece este ano de 20 a 29 de Junho, e con-ta com mais de 70 expositores.

As Quintas Senhoriais e o património são tam-bém motivo para visitar o Seixal. São exemplo a Quinta da Fidalga, com os seus jardins, que convi-dam ao passeio e ao descanso, a antiga Fábrica Mundet e o núcleo naval do Ecomuseu Munici-pal.

Fórum e Jardim

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As Minas de Manganês de Castro Verde

Miguel Rego

a febre do “ouro” que assolou toda a região do alentejo, a partir de meados do século XIX, vem introduzir uma alteração extraordinaria-mente profunda na realidade cultural, social e económica das terras transtaganas. A estrutura quase medieval que sustenta o alentejo agrí-cola e latifundiário trazido pelos novos ventos do liberalismo, vê-se de repente acossada pe-los novos ricos que desenvolvem processos de exploração mineira em afloramentos metálicos que se multiplicam como cogumelos, em espe-cial, por toda a faixa em quarto de lua que se estende desde alcácer do Sal até ao Chança, entrando Andaluzia dentro.

Deste fenómeno espantoso que chega até aos nossos dias, sobressaem três ou quatro gran-des projectos, em particular, ligados à explora-ção do cobre, do enxofre, do zinco, do ferro e de algum ouro. Mina de S. Domingos, aljustrel, Cercal, Canal Caveira e lousal são, normalmen-te, as minas mais referidas. Pelo seu impacto na região e no país. Pela sua longevidade. Pelo papel social, cultural e económico que tiveram nas regiões onde se desenvolveram.

Estes grandes empreendimentos estiveram e estão definitivamente ligados à revolução in-dustrial a que se assiste na Europa de Norte. Daqui saía o minério que enriquecia socieda-des de capitais, não apenas estrangeiras (veja-se o caso de alonso Gomes) e que, escandalo-samente, alimentavam a Europa calvinista.

Mas todo este fenómeno não está devidamen-te estudado. Em particular, no que concerne às

minas exploradas em toda a nossa região, em particular as de manganês, e que serviram para o acelerar das novas tecnologias do ferro e do aço.

Desse período sobram ainda resquícios nebu-losos na memória oral das nossas gentes, mui-tas delas ligadas ao funcionamento de algumas dessas minas de manganês, que é imprescindí-vel e urgente registar, o mais rápido possível, antes que desapareçam. Em jeito de episódio, refira-se a importância da mulher no funciona-mento destas minas que, em alguns casos,

Ferragudo - Corta nº 2 - Balde despejando sôbre vagona

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eram mais de metade dos activos que labora-vam nas pequenas minas de manganês.

Esta longa introdução serve, apenas e só, para chamar a atenção para esta realidade que pou-cos investigadores têm acautelado, na pers-pectiva de rapidamente se ir ao encontro dos poucos resquícios que ainda restam vivos.

o concelho de Castro Verde de há muito que se encontra ligado à exploração mineira. E não apenas pelo funcionamento da Mina de neves-Corvo. Desde a pré-história. Mas com particu-lar ênfase no período moderno. É essa realida-de que aqui trazemos hoje. uma fatia impor-tante do património de Castro Verde, sintetiza-do na enumeração de todas aquelas ocorrên-cias minerais de manganês que preencheram a vida desta comunidade.

1. a Mina de Manganês do Ferragudo é, natu-ralmente, a mais conhecida, até porque o seu

funcionamento cessou há cerca de meia cente-na de anos. Propriedade dos Herdeiros de alonso Gomes, era particularmente rica em psilomelana e pirolusite. Ali se produziam cer-ca de 110 toneladas. o transporte do minério fazia-se, até agosto de 1945, por carros de tracção animal até à estação de Castro Verde – almodôvar, a 21 kms. o primeiro registo foi efectuado a 5 de Maio de 1859, por José Diogo e Felizberto José Colaço e foi publicada a porta-ria dos direitos dos descobridores legais a 10 de Março de 1864. a 20 de Junho de 1864 são transferidos os direitos legais para alonso Go-mes. o Catálogo Descritivo da Secção de Mi-nas, publicado em 1889, diz que esta é a mais importante de todas as minas de manganês do Baixo-alentejo, tendo iniciado a lavra em 1875. 2. Mina do Cerrinho alto. Situada junto ao ge-odésico do Ferragudo, é uma mina importante e com altos teores de manganês. Em 1899, um relatório de J.C.H. Pattinson, do laboratory

Ferragudo - Grupo de tromeis e quebrador Dodge

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new Castle on Tyne, refere o “carregamento de 1631 toneladas de carbonato de manganês, com um teor de 50,41%”.3. Mina de Manganês da Cova da Moura. Re-presenta a continuação, para nordeste, das minas de Ferragudo e Filipeja. O registo foi efectuado por antónio lobo de aboim Inglês, a 21 de outubro de 1915, mas havia sido explo-rada em torno de 1868. Para além do minério de manganês encontram-se cristais de pirite, cubos de galena, alguns vestígios de malaqui-te, óxidos de ferro e barita. os anos de maior tonelagem na exploração são1933 – 25,500 ton.; 1934 – 110,300 ton.; 1942 – 72,223 ton.; 1943- 41,900 ton..4 - Mina do Zambujeiro. Com trabalhos antigos (anos 60 e 70 do século XIX), ainda funcionava em 1947.5 - Mina do Cerro do lírio. a mina tem dois re-gistos em duas áreas distintas. Em nome de Eduardo José dos Santos, de 27/1/1941, no terreno de Maria Romano Colaço e, um outro

registo, em nome de armando lopes de aboim Inglês, de 15/4/1941, na propriedade de João Pereira Janeiro. Funcionaram em pleno entre 1941 e 1945, calculando-se que foram retira-das cerca de 200,000 toneladas de manganês, em particular pelo método de rapina.6 - Mina da achada. Durante a II Guerra Mun-dial funcionou em regime de rapina.7 - Mina do Cerro da Maré. a funcionar desde meados do século XIX, tem o primeiro registo a 10/9/1873. Foi explorado posteriormente, já no século XX, pela Sociedade de Minérios do Sul de Portugal.8 - Mina da Rocha. o reconhecimento desta mina feito por João Batista Schiappa de azeve-do a 30/9/1869.9 – Mina da Caçoeira. Funcionou pelo menos desde 22/7/1871 até 1880.10 – Mina dos Cerros altos. a mina tem traba-lhos desde meados do século XIX (1860?). a 26/9/1867 já se falava na exploração desta mina. Requerimento para exploração a

Ferragudo - Lavaria (Grupo de gigos)

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21/10/1915 por a. aboim Inglês. a 13/1/1942 Eduardo José dos Santos pede a concessão da mina. Entre 1942 e 1944 tem uma lavra activa e são retiradas 2.947,252 toneladas de miné-rio. Tal quantidade justifica-se por uma política de lavra de rapina. 11 - Mina de S. Pedro das Cabeças. Já a funcio-nar a 30/1/1866, tem auto de demarcação a 3/10/1866. Fraco em manganês, é mais rica em ferro. nos anos de 1942 e 1943 tem muitos trabalhos em regime de rapina.12 - Mina do Cerro Beturiano. Também identi-ficada como Mina do Cerro do Seixo. Descobri-dor legal foi Diogo Gonçalves lavrador, a 15/1/1883, que cede a exploração a alonso Gomes a 2/7/1885. a lavra é suspensa cerca de 1898/1899.13 – Mina da Herdade do Canal. Mina explora-da anteriormente a 1870. Foi apresentado um plano de lavra a 26/9/1871. 14 - Mina da Herdade da Cachia. afonso lopes Conde e Francisco antónio afonso têm os di-reitos de descobrimento legal antes de 4/5/1889. a 16/6/1943 é feita a adjudicação da concessão à Sociedade Mineira do Sul de Portugal. 15 - Mina da Herdade da Misericórdia. Reque-rimento a 8/5/1920 para concessão de explo-ração de uma mina de chumbo, por António lobo aboim Inglês. no período da II Guerra Mundial saem daqui as seguintes quantidades de minério: 1942 – 365,400 toneladas de Man-ganês (Mn) e 196,050 de Bário (Ba); 1943 – 11,400 ton. de Mn e 220,000 de Ba; 1944 – 172,500 ton. de Mn e 10,000 de Ba; 1945 – 0 Mn e 22,000 de Ba.16 - Mina do Cerrinho alto. Registo em 1887 por João Guerreiro, Francisco Peres e antónio Contente. a 30/12/1888 é feito o pedido de concessão. É abandonada em finais do século XIX.17 - Mina do Cerro alto dos Penedões. Reque-rimento para exploração a 1/5/1868, por Manuel Simão. 18 – Mina do Moinho da Samarra. É requerida a sua exploração por alonso Peres Conde antes

de 3/5/1869. Terminou a sua exploração à vol-ta de 1880 e daqui foram retiradas pelo menos 3 toneladas de minério.19 – Mina da Herdade das Cochilas. Registo a 6/1/1863 por antónio Madeira.20 - Mina do Cerro do Curralinho. Requerimen-to a 4/3/1880 e portaria de concessão a 11/10/1880, a favor do descobridor legal, José da Costa. a 18/10/1880 este faz cessão de di-reitos a alonso Gomes. Deixou de funcionar em volta de 1898/189921 – Mina da Herdade do Penedo. Requeri-mento a 29/5/1859, por antónio Silva. os di-reitos passam para alonso Gomes a 4/11/1860. 22 – Mina do Cerro da Vigia. Funcionava antes de 1880. Plano de lavra apresentado a 7/5/1881, por Rufino Basílio, obtendo a con-cessão a 21/3/1881

Acabo de escrever este apontamento pouco depois da morte de Alfredo Saramago. Este Alentejo perdeu uma das suas vozes memórias mais ricas e lúcidas. Tinhas que ir a enterrar no Cemitério dos Prazeres. Já sentimos a tua falta. Até já.

Localizações aproximadas

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Francisco Colaço

Ser mineiro é ser filho e neto de mineiro ao longo de várias gerações, é ter nascido e cresci-do no meio do vaivém incessante das locomo-tivas a vapor e da poeira do minério.É acostumar-se ao barulho ensurdecedor e ca-denciado dos trituradores e ao som inconfun-dível das máquinas de extracção, simbiose da musicalidade da vibração dos cabos e da rota-ção dos tambores e poleias, súbita e ciclica-mente interrompida pelo estrondoso ruído da queda do minério nas toldas, seguido dos to-ques do martelo sinalético.É contemplar, nas manhãs geladas de Inverno, o fumegar enigmático do poço, envolvendo o imponente malacate com vapores sulfurosos, que exalam o cheiro característico da contra-mina.

É ouvir as frequentes e assustadoras explosões ocorridas na pedreira, ou sentir apenas, como um verdadeiro abalo sísmico, o estremecimen-to do solo, provocado pelos rebentamentos no fundo da mina. É ter acompanhado a mãe até à boca do poço, transportando a cesta de verga com a magra refeição quente que o pai tomará lá no fundo e de que repartirá as sobras com os seus compa-nheiros roedores de clausura. É viver rodeado por uma paisagem lunar for-mada por montanhas de escoriais cinzento-es-verdeados salpicados pelos tanques e regatas de água-forte, que, serpenteando pelas suas vertentes, numa sinfonia de murmúrios, vai ali-mentar o labirinto de canais da cementação, onde a sucata de ferro, como num gesto mági-

Mineiroaos mineiros de aljustrel, do lousal, de S. Domingos e de todo o mundo

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co de alquimia, sofre a sua transformação numa massa pastosa de cobre. É sentir-se soli-dário com os companheiros de infortúnio, que, debaixo de um sol abrasador, como verdadei-ros forçados, descalços, no meio dos canais de água-forte, executam, à semelhança dos sali-neiros, a duríssima faina da remoção das natas. É contemplar todo este cenário inóspito, onde apenas carrasqueiros e troviscos crescem, mas ao mesmo tempo admirável, que se estende mais a jusante, onde a água-forte, depois de despojada dos seus elementos mais ricos, prosseguindo o seu curso, vai desembocar numa bacia de retenção que reflecte uma to-nalidade em constante mutação, que vai do vermelho-acastanhado ao azul-esverdeado, contrastando com o céu azul recortado pelo esvoaçar sereno das cegonhas: estranha ence-nação que tem como pano de fundo a mira-gem de um castelo fantasmagórico represen-tado por um emaranhado de estruturas metá-licas de torres e planos inclinados, revestidos por chapas onduladas de zinco enferrujadas, de onde emerge uma densa nuvem de poeira cinzenta, proveniente da trituração e crivagem da pirite. É ter brincado aos mineiros, num precoce de-safio ao perigo, explorando poços e canhas de minas abandonadas, percorrendo esconderi-jos de justiceiros como o mítico Zdoro Bruto e

sonhando com os seus feitos heróicos, muni-dos que eram de gasómetros fabricados com latas de conservas e alimentados com carbore-to verdadeiro.É manter registado na memória o trágico fim de uma dessas aventuras, que teve como pro-tagonistas dois filhos de mineiros, nascidos no histórico bairro de Vale d’Oca, os quais, incons-cientemente, ao descerem a um poço abando-nado, à procura de ninhos, pereceram asfixia-dos com gás carbónico acumulado no fundo. É todo o alvoroço angustiante sofrido por uma população inteira traumatizada.É ter vislumbrado ao fundo do túnel de acesso ao poço de extracção silhuetas de mineiros, marchando em fila indiana, perceptível na li-nha desenhada pelas luzes bruxuleantes dos gasómetros, vultos que de repente se transfor-mam, à luz do Sol, em corpos enlameados, de rostos farruscos e prematuramente envelheci-dos.É habitar nos bairros construídos à porta da mina pelos patrões estrangeiros com sobejos da mais-valia extorquida ao suor das toupeiras humanas, que escavam, dia a dia, ano após ano, complexos labirintos de galerias e poços; bairros humildes, constituindo por vezes ver-dadeiros guetos, formados por filas rectilíneas de casas baixinhas e de ruas pavimentadas

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com escória, onde a miséria e a solidariedade, de mãos dadas, estão presentes sempre. É habituar-se a ouvir, à noite, através do tabi-que dos quartos, o tossir aflitivo e cavernoso do pai ou do avô minados pela fatídica silico-se.É viver cronometrado pelo silvo estridente do búzio da central eléctrica, que assinala o final e a retoma do trabalho, sobrepondo-se ao tim-bre das badaladas funéreas do relógio da torre da Igreja Matriz.É ter assistido, junto ao malacate, aos momen-tos dramáticos e penosos que antecediam a subida da jaula transportando as equipas de socorro e os acidentados do fundo da mina, no meio dos gritos lancinantes de mulheres com xailes negros à cabeça, seguidos de cortejos fú-nebres dum povo inteiro, cabisbaixo, silencio-so, resignado com a fatalidade, mas corajoso,

ao som de passos graves.É também, como escape da miséria e da revol-ta recalcada, partilhar, com toda uma comuni-dade, a alegria de poder gritar livremente “mi-neiro ... mineiro!”, incitando os seus ídolos do Sport Mineiro, em tardes solarengas de domin-go, no velhinho campo de Vale d’Oca; ou, en-costado ao balcão da venda com outros com-panheiros, afogando mágoas e tristezas da sua miserável condição, entre copos de três, em melodiosas modas do genuíno cante alenteja-no, exprimindo com natural espontaneidade sentimentos de revolta e de luta.É reviver os imemoriais festejos da Degolação de São João Baptista, onde romeiros vindos de todo o alentejo procuravam, nas águas termais das minas de S. João do Deserto, curas milagro-sas para todos os seus achaques. Ou igualmen-te, imbuído de fé ou simplesmente por respei-to, participar nas festas em honra de Santa Bárbara, transportando o andor da sua padro-eira até à boca da mina, no meio do estrelejar de foguetes, morteiros e de acordes graves da filarmónica. É ter presenciado a insólita desci-da da Santa até ao fundo da mina de Algares, na esperança de que a sua bênção protegesse aquele local dos perigos sempre iminentes. É aprender a nadar e a mergulhar nas águas lodosas da Represa em tardes escaldantes de Estio e refrescar-se à sombra dos frondosos plátanos, adormecendo ao som do coaxar das rãs e do canto alegre e infatigável das cigarras, inebriado pelo perfume do rosmaninho, da es-teva e do poejo, sob o bailado estonteante de gráceis libelinhas cor de cobre e de asas ígneas, esvoaçando e poisando alternadamente nos juncos, indiferentes aos gestos ritmados das lavadeiras, debruçadas sobre as pedras poli-das, alinhadas ao longo da borda de água, es-fregando e torcendo sem cessar os míseros trapos já puídos de tanto uso e de tantas lava-gens.É ainda preservar a consciência da sua condi-ção de explorado, nunca se resignando peran-te a adversidade nem se curvando à arrogância e à opressão. É ter orgulho de pertencer a uma

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classe que ao longo de gerações deu sobejos exemplos de coragem e de luta por melhores condições de vida e pela liberdade, por vezes até com o sacrifício da própria vida. É jamais esquecer as imagens revoltantes da prisão de camaradas à saída do poço de algares, após heróica greve estoicamente mantida, ao longo de vários turnos, em condições desumanas, no interior da mina, ou cenas de repressões san-grentas, à calada da noite, de manifestações pacíficas nas ruas de aljustrel.É ser filho de mulheres corajosas que sempre estiveram ao lado dos companheiros, no sofri-mento, na dor, na luta, no afecto e na generosi-dade. É sentir, enfim, o pulsar da mina e é iniciar, pre-cocemente, como um destino inevitável, a aprendizagem de mineiro. E, com tudo isto, é fazer parte integrante do imaginário e da identidade cultural de uma co-munidade mineira ancestralmente martiriza-da, que obstinadamente teima continuar a existir, lutando pela reabertura da mina, contra os efeitos perniciosos da globalização.

in Revista Alentejana n.º 23 da Casa do Alentejo, Abril/Maio/Junho 2002

velho MINeIRo

Há muitos anos ainda moçoLhe negaram a escola e a oficinaEm Algares desceu no velho poçoFoi trabalhar para o fundo da mina

Foi pinche nos primeiros diasCubas de água carregavaCorrendo por túneis e galeriasSabe Deus como ele andava

Assim andou alguns meses do anoE esse foi o primeiroDepois o mandaram para o relhanoEle com outro companheiro

Lá tomavam muitas empreitadasTrabalhavam anos a fioRetirando velhas portadasIam enchendo o vazio

E sempre, sempre trabalhandoConfiante e crente na fé divinaAos poucos se foi habituandoAo ambiente do fundo da mina

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Como eram diferenciadosEle e outros companheirosForam depois intimadosPara trabalharem como safreiros

Enfrentando duras tormentasQue executavam com esforçoEmpurrando pesadas vagonetasColocando-as à boca do poço

Assim e por não dar jeitoNão queria ser safreiroNão estava satisfeitoEle queria ser mineiro

Trabalhou durante tantos anosAdquirindo experiência e valorFoi mestre de vias, mestre de canosPor fim foi entivador

No piso cem foi arreateiroConduzindo mulas pelas arreatasLá no fundo ligou bombas, foi bombeiroNas galerias limpou regatas

Trabalhou na arreaçãoDurante quase um ano inteiroDepois foi com satisfaçãoPromovido a mineiro

Nas frentes na extracção do mineralAvançando sempre de seguidaE nesse trabalho infernalViu companheiros perderem a vida

Foi um tempo de vida duraDe tantos anos, tantos diasPor lutar contra a ditaduraLá foi preso para Caxias

Foi uma greve muito faladaNo País e em todo o mundoPelos mineiros bem organizadaParalisou todo o turno lá no fundo

Quando voltou da prisãoDa empresa foi despedidoPor defender a razãoContinuou a ser perseguido

Assim cumprindo sua sinaSuas ambições se perderamE no fundo da velha minaOs seus sonhos lá morreram

Hoje velho e cansadoA saúde complicada e sériaVive muito mal, está reformadoTem uma pensão de miséria

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IX Semana Cultural do Laranjeiro5 a 12 de Julho 2008

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5 de Julho - 21.30 horas na Praceta Diogo Couto

6 de Julho - 16.00 horas no Salão de Festas do CIRL

7 de Julho - 21.30 horas no Mercado Velho do Laranjeiro

7 de Julho - 21.30 horas nas instalações da Junta de Freguesia

8 de Julho -14.00 horas no Salão de Festas do CIRL

9 de Julho - 21.30 horas nas instalações da Junta

10 de Julho - 21.30 horas na EB1 Nº2 do Laranjeiro

11 de Julho - 21.30 horas naEB1 nº 2 do Laranjeiro

12 de Julho - 21.30 horas na Praceta Diogo Couto

Espectáculo Musical “Canto da Terra”

Teatro de Revista “A Professora Sofre”

Concerto Juvenil com os Picnoise

Inauguração da Exposição de Joalharia de Bruno Prekatado

Baile “Vamos Dançar ...!!” com Ricardo Alcaide

Colóquio “A Dieta Mediterrânica”, com Prof. Manuel

Carrageta

Recital de Poesia

Espectáculo Musical “Grupos da Nossa Terra”

Espectáculo de Folclore

Aproveitamos para saudar toda a comunidade Alentejana, desejando-

lhe no período de retemperamento que se aproxima, umas boas e

merecidas férias.

A Junta de Freguesia de Laranjeiro

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26ARTe

luis Maçarico

Festas de PapelA arte éfemera do Alentejo. O caso do Redondo

pel recomeçaram, após um período de declínio, conforme disse D. Marianita, para quem “foi em 1975, em agosto, que se fez a primeira festa... aquilo que nós instintivamente tínhamos feito, não era parecido com Campo Maior...não é tirar prestígio a Campo Maior mas nós fazemos com temas!” (depoimento em Julho de 1997).

no alentejo, em Campo Maior, como no Redon-do, mas também em Santiago do Cacém,Cuba e São Teotónio, permanecem, nos meses estivais, de quatro em quatro, de dois em dois anos, ou de doze em doze meses, festejos (Festas do Povo, Ruas de Papel, Mastros) onde os enfeites substantivos são essencialmente recortes de pa-pel, cumprindo-se uma tradição, ancestral ou re-inventada.Segundo os testemunhos, quer no Redondo (1838) como em Campo Maior (1893), a génese destes eventos remonta ao século XIX.

Sendo a arte do papel recortado uma das mais genuínas manifestações da arte Efémera, pre-sente até em festas da Beira Baixa, como as de Santa luzia, Eurico Gama assegura que esse saber tem a sua raíz nos conventos onde a doçar-ia era acompanhada de belíssimos ornamentos de papel recortado. Por seu turno, Eugénio Frei-tas afiança que essa arte nasceu “no decorrer de todo o século XVIII e na primeira metade do XIX” em toda a Europa.

Os inúmeros documentos recolhidos sobre a Fes-ta do Redondo e a memória de algum trabalho no terreno, guardado num diário de campo, em Julho e agosto de 1997, permitem revisitar o evento, decorrida uma década sobre a ob-servação participante então desenvolvida... os registos locais, citados na Internet e em jor-nais como o “Diário de notícias”, apontam o ano de 1838 como sendo o início das primeiras ornamentações, o que afasta a ideia destas fes-tividades se instituírem enquanto concorrência às festas do Povo de Campo Maior. as ruas de pa-

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Vinte anos depois, o evento reforçou a sua eficá-cia. nos dias 19 e 20 de Julho e 3 de agosto de 1997 apreciei a sensibilidade do povo redon-dense em festa, escutando vários protagonistas, como Dona Jacinta, que justificou assim a essên-cia dos festejos: “Como isto era muito morto, não havia divertimento...fizeram esta festa, para dar mais vida à vila!” Para aquela senhora, a festa realizou-se pela pri-meira vez em 1979, organizada pelo Grupo dos Amigos do Redondo. a Dra. lígia Calapez informou então que cada rua tinha um tema, apenas conhecido pela Câmara (que coordena, para não se repetirem).numa loja, guardam-se macacos, bananas, pal-meiras, tudo executado em papel de seda.“Desde Janeiro que a gente trabalha nisto”, diz uma das moradoras, empenhada em florir com

caprichos de papel vistoso, a sua rua. As fanta-sias que surgem da imaginação e do labor destas artesãs espontâneas, alquimistas de um prazer efémero, têm os seus segredos.“Fomos mesmo a um quintal, onde havia uma bananeira seca, e temos ido lá ver...e também vi-mos numa revista!, revela a líder do grupo, que é costureira.

Dona Marianita acrescenta que “primeiro era uma Comissão de Festas e enfeitavam-se as ruas principais...eram só homens! Mas casaram, foram para lisboa, Évora...outros enviuvaram e deixaram de fazer as festas. Era em honra de nossa Senhora de ao pé da Cruz (Calvário)...até que surge o Grupo Pró-amigos, ainda só com homens. no Grupo de amigos do Redondo é que já havia senhoras...Cada rua tem uma pessoa responsável! nos primeiros anos foi quase

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voluntário...as pessoas é que compravam o ma-terial! Depois, a Câmara dispôs-se a fornecer o material. Pessoas envolvidas, ao todo, é incal-culável. Há moradores que não pertencem à rua, que também estão a trabalhar em casa...” Respondendo aos que dizem que não têm jeito, acrescenta: “Eu até tenho o hábito de dizer: “to-dos juntos é que sabemos tudo!”E Dona Zezinha remata: “o que é que nos leva a fazer isto? as pessoas que vêm, gabam e nós fica-mos satisfeitos!”

o resultado deste esforço foi notável. naquele ano, o deslumbre de formas e cores cativou os visitantes: uma artéria ostentava tulipas e moinhos da Holanda, outra mostrava cisnes embelezando a rua enramada, noutra ainda a exuberância de uma selva acentuava através de riquíssimos por-menores onde se insinuava o exotismo da temáti-ca, havia ainda a rua da fábula do capuchinho ver-melho e uma pista de desportos de Inverno, com bonecos de neve e esquiadores, aproveitando uma rampa, e uma adega com talhas enormes e mesas de convivas, e ainda um largo a regorgitar de salero com esbeltas sevilhanas...

Por todo o lado a criatividade imperava, exibindo à saciedade a diferença (ou complementaridade) com as ruas floridas de Campo Maior, que não dispensam quadras de poetas populares e as tradicionais saias, cantares tradicionais do Norte Alentejano.

Para leite de Vasconcellos, “as tradições popu-lares manifestam o modo como o povo encara actualmente a Natureza e como vive na Socie-dade.” nesta pequena abordagem, pretendeu-se demonstrar a riqueza da cultura popular, que se evidencia nas nossas terras, durante o Estio, época mais propícia a estas manifestações fes-tivas, dependentes dos favores do clima e que geralmente estão associadas a ritos ancestrais de celebração das colheitas.

na sua sabedoria, mesmo durante períodos de constrangimentos, as populações souberam sempre contornar tempos mais complicados, respondendo à adversidade com a celebração da alegria.a identidade dos lugares robustece-se na evo-cação de tradições que são património colectivo.o povo sabe resistir às crises, através da criativi-dade festiva, que constitui uma pausa na rotina e uma superação de problemas. Enfrentando as dificuldades, com o colorido das ruas onde moram, garantem a continuidade e repõem a genuinidade dos primórdios.a festa confirma esse regresso às origens, como diz Mircea Eliade, sendo também um contributo para abarcar o presente.

A Comunidade repete o ritual, para conferir sentido à sua caminhada, reforçando sociabili-dades. a Festa é a expressão mais conseguida do relacionamento entre vizinhos, projectando para o exterior uma imagem de marca que atrai visitantes e dinamiza o turismo, favorecendo o desenvolvimento local.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Freitas, Eugénio da Cunha e “Arte do Papel”, in “A Arte Popu-lar em Portugal”, Verbo, Vol. I, pp. 235-263.

Gama, Eurico (1966) “A Arte do Papel Recortado”, “Revista de Etnografia”, vol. II, T2 Outubro 1966, pp. 339-354.

Moniz, Manuel Carvalho (1997) “Os papéis recortados”, in “Da Arte Popular Alentejana”, “Cadernos de Etnografia-3”

Câmara Municipal de Évora, pp. 49-61.Ribeiro, Emanuel (1933) “A Arte do Papel Recortado em Por-

tugal”, Imprensa da Universidade de Coimbra.Vasconcellos, Leite “Tradições Populares de Portugal”,

INCM.

Agradecimentos: Ana Isabel Carvalho, Jorge Cabral e Paula Guimarães

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Rosa dias

Festas do Povo de Campo MaiorVistas com os olhos da Alma...

rei no Alentejo é carregado aos ombros, dos lin-dos rodapés pintados a rigor, onde por tradição sobressai o azul Alentejo roubado ao céu, e o amarelo oca, mais parecendo saias coloridas, enfeitando as belas ruas da Vila.Há ainda a realçar algumas portas pintadas, que teimam em manter uma tradição que já vai longe. as cortinas de riscas, mais parecem mantilhas co-brindo os ombros das portas mais antigas.Os batentes e as aldrabas ainda se encontram

Falar de Campo Maior é sempre um desafio, ao qual eu me entrego de alma e coração.Quando falo de minha terra as raízes vêm ao de cimo, onde existe um orgulho que me impele a falar. Se por um acaso a palavra me faltasse, eu cantá-la-ia em minha poesia, como já aconteceu muitas outras vezes.Entre prosa e rimas, passo a descrever a bela Vila raiana de Campo Maior.Seus monumentos ali estão, como guardiães, para que a história não deixe de se contar.Suas casas apalaçadas ainda ostentam beleza e altivez.as casas mais modestas reclamam por justiça.Nas frontarias o branco caiado, impera, e como

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aqui e ali; Assim como as belas sacadas em ferro ferrujado, vestígios dum passado, nem sempre valorizado.o povo camponês comunga entre si, um jeito de falar, muito característico das gentes raianas povo simpático, e hospitaleiro.Quando esta junção se dá, a alegria extravasa, e aí, a festa acontece.Festa centenária das flores de papel, que no jeito e na arte, são únicas no nosso país.O momento mais alto destas manifestações surge, como que por magia em fins de agosto princípios de Setembro. E sempre, quando o povo quer.Enfeitam-se as ruas das mais variadas e lindas flores de papel colorido, dando assim a ideia dum lindo jardim em flor.a plantação deste, deve-se a este povo artista, que durante meses a fio, trabalha com amor e afinco para que o resultado seja de deslumbre aos olhos do visitante.as festas do povo de Campo Maior; são um tra-

balho comunitário, e só desta forma o resultado pode ser assim, belo e seguro.O povo se alegra, o visitante pasma, os poetas cantam.

Rainha Santa IsabelFez do pão Rosas sem fimE nós com simples papelPlantamos este jardim

as mulheres encarregam-se do trabalho mais minucioso e delicado a confecção das flores, e a decoração das ruas.os homens, esses têm o trabalho mais pesado.Abrem buracos nas calçadas, colocam os paus, amarram arame, esticam as cordas de metros e metros, onde já foram coladas as franjas ou as flores de papel recortadas ao gosto de cada um e sempre sobre a orientação da cabeça de rua. Cabeça de rua? Sim.Assim se chama quem toma a dianteira sobre

Rua em Campo Maior

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todo o trabalho de cada rua florida.ainda a cargo dos homens está todo o trabalho de carpintaria e montagem, como por exemplo as entradas das ruas, janelas, portões, a parte da electrificação, tudo o que tenha a ver com o es-queleto, que irá suportar as belas flores de papel.O trabalho dos idosos também é muito apre-ciado, pois são eles que com sua experiência su-pervisionam todas as etapas, vão aconselhando, dando ideias, desde a dobra do papel, ao corte e recorte, de cada pétala, de cada folha, que se cola, se enrola, se torce, se ajeita até que o produ-to final nos mostra uma verdadeira obra prima.As crianças são também, elementos imprescindíveis deste trabalho.Como? Bom, como na gíria se diz. “o trabalho da criança é pouco, mas quem não o aproveita é louco”.Ainda que pouco, possam fazer, não podemos es-quecer, que vão ser elas as transmissoras, deste saber e arte, para as gerações vindouras, e só as-sim as Festas do Povo de Campo Maior não se perderão no tempo.E é com o trabalho de todos, que chega enfim o momento mais esperado.a noite da enramação, as mulheres continuam

correndo de um lado para o outro num azafame que só visto, como quem anda arrumando a casa para a chegada das visitas. E com cravos e rosas, com flores aos montõesSe alindam janelas, se enfeitam portões. As festas do querer, sem o cansaço sentir Levam meses a fazer, e noites sem se dormirE numa manhã de Setembro, a Vila acorda mais belaCom a camponesa sorrindo, debruçada na janela.E esta vila raiana é enfeitada a rigorCom lindas flores de papel, e belos poemas de amorVêm emigrantes, Espanhóis, Franceses e InglesesGente de todas as raças, às festas dos camponeses E o forasteiro que entrar, neste recanto floridoVai na certa relembrar, que o tempo não foi perdido.

E depois de tanta briga, o jeito que este povo tem de dizer que está feliz, é cantando e‘ balhando’ bailando.Mas a alegria é grande demais, não cabe nos

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corações, não cabe nas casas, como tal vem para a rua, e aí sim, ela se solta.As mulheres em grupos fazem rodas, formam bailes, cantam as saias; as cantigas; são simples quadras feitas no joelho, bem ao gosto do povo, as cantadeiras convidam com simpatia quem queira entrar na roda, fazem-se acompanhar das formosas pandeiretas enfeitadas de pequenos guizos, e de fitas coloridas. E Com bates certeiros na palma da mãoPandeireta segue o tom da cançãoE um povo sem guerraAssim canta a terraAssim louva o pãoE o som que soar, outro vai chamarO das castanholas em seu repenicar.

E a Vila sai do pousio.

Que pode ir de quatro a cinco anos. Para depois entrar no bulício ansiado e tão desejado. Quem tiver ocasião de passar por Campo Maior, durante a semana das Festas do Povo fica sem dúvida deslumbrado com tanta beleza.

E já no rescaldo, o meu povo amado embora cansadoDá graças a Deus, de mais uma vez, cumprir o seu fadoFado de arte e jeito, com que foi prendadoUm Campo Maior por Deus abençoado.

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Os Segredos do Olhar

Foto Rosário Fernandes - Mértola

Rosário FernandesRui Cunha

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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Montemor

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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Elvas

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Fotos Rui Cunha-RCL banco de imagens© - Évora

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Maria elisa santos

Sou beirã. Nasci e cresci nas faldas de uma serra, tendo por horizonte os agrestes penhascos onde a custo brotava alguma vegetação.na nossa linguagem comum, dizíamos que só se viam barrocos. E era verdade.As casas e ruas, à base de granito, faziam das povoações lugares escuros e sombrios e as pes-soas, por sua vez, não eram menos sombrias e também duras, tal como a pedra.Tudo era frio e cinzento a maior parte do tempo, ou branco e gélido quando o céu desabava em nevões que ainda mais nos ensimesmavam e nos atormentavam a vida.As marcas de se ter nascido e crescido num ambi-ente assim, persistirão para sempre.Mas, não é sobre essa parte da minha existência que me dispus a escrever.Era ainda muito jovem quando, no final da déca-da de 60, me mudei definitivamente para lisboa.Até essa altura, do Alentejo só conhecera episó-dios da reconquista, as manchas, alaranjada e amarela, com que no mapa eram representados o alto e o Baixo alentejo e uma simpática e ale-gre professora de Economia Doméstica, de que se dizia ser de Évora. Digo “se dizia” porque, não sendo ela a professora da minha turma, pouco sabíamos da sua vida, a nós bastava-nos saber que a cada intervalo, ela lá estava para nos fazer girar a todas na grande roda formada no átrio do primeiro andar das instalações provisórias da Escola Comercial e Industrial, cantando as suas canções, tão novas para nós! Porém, tamanha alegria e vontade de viver não chegaram talvez para vencer a agrura gelada da terra onde fora parar e assim, sem mais nem menos, um dia “es-bofeteou-nos” a todos com o seu suicídio.

Passaram mais de quarenta anos e a “bofetada” ainda me dói.Foi no meu primeiro emprego, em lisboa, que “cheguei” ao alentejo pela mão de uma colega de Moura. o alentejo era, afinal, muitíssimo mais do que aquelas manchas no mapa. O Alentejo era a planície a perder de vista, era o horizonte aberto, era o campo imenso de espigas amarelas e papoilas vermelhas, era o casario baixo e bran-co bordeado de azul nas portas e janelas, era o sol, era o calor, era um outro modo de estar, de cozinhar, de nomear, de falar... era um outro mundo.E eu gostei muito de começar a descobrir esse outro mundo.De Moura, a minha colega teve artes de me fazer “ver” todos os seus recantos e de me encantar com as histórias felizes e alegres da sua infância e adolescência; muitas dessas histórias mais me pareciam por vezes saídas da sua imaginação fértil do que da sua vivência real, mas pude constatar, em várias ocasiões, que não havia fan-tasia nelas. Creio que se formou então na minha cabeça a ideia de uma espécie de relação causa efeito: o alentejo como fonte geradora de bem-estar. Ideia que mais se reforçou quando mais tarde conheci de facto algumas terras alentejanas e fiz outras amizades por lá. amizades que hoje muito prezo.

Curiosamente, ou talvez não, ainda hoje não conheço Moura. Quem sabe um dia!Mas fecho os olhos e vejo Moura como quiseram que eu a visse e … como gosto ainda que por lá vejo!

Como Conheci o Alentejo

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MeMóRiA

António Galvão

Os Feirantes

lembro-me, com aquela típica saudade dos velhos tempos, já preenchidos de memórias longínquas, da antiga Feira de Setembro em Moura, minha terra natal, e da sua presença ir-resistivelmente mágica.

uma semana antes de abrir oficialmente ao pú-blico, chegavam de todos os lados personagens ambulantes, com os mais diversos apetrechos de montagens, fossem tendas, carrocéis, circos ou quermesses.

Assim, depois da abertura, quem entrasse no arco da Porta nova, vindo da Estação Ferroviária, ou do outro lado, do jardim dos “Mal-encarados”, iria fazer uma viagem fantástica, rodeado por passadeiras laterais, de mantas multicores, ces-tos, capotes e de fragâncias aromáticas de pêros, figos, alfarroba, pinhoada, água-mel e outras gu-lodices.

A rua do Fôjo era o canal maravilhoso que permi-tia o acesso ao coração da Feira e, no pavimento de terra batida surgiam as barracas de brinque-dos, artefactos e outras bijuterias que toda a gente desejava comprar.Ao fundo, apareciam então, como por encanto, no reino dos sonhos, um, dois e às vezes até três circos, que iriam fazer as delícias de meninos e adultos.

Mais para o lado esquerdo erguiam-se os car-rocéis, as respectivas pistas de automóveis, os desejáveis “comes-e-bebes” ,as barraquinhas das setas e tirinhos e para os mais ousados as meni-nas de engate. Do lado direito ficava a “curraleira”

do gado com os tradicionais negócios de ocasião entre aldeões, vilões e ciganos.

A minha avó, costumava alugar, durante o tempo em que os feirantes permaneciam em Moura, um pequeno quarto com porta independente para a rua da Esperança, e que mesmo não levando caro lhe fazia um geitão nesses tempos de carências.Por mim, sei que também rejubilava de alegria sabendo que estavam ali ao meu lado alguns artistas, lindas raparigas e às vezes até me ofere-ciam bilhetes para assistir aos espectáculos e para dar umas voltinhas nos carrocéis e automóveis.

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Porém, quando chegava o derradeiro momento da partida e, depois das contas feitas, a minha avó tinha que voltar a caiar as paredes do quar-to, porque entretanto os hóspedes, em relação a higiene e salubridade tinham pouco cuidado, mas, mesmo assim, eu ficava ansioso à espera de outra feira de Setembro, que me voltaria a trazer a festa e o convívio com aquela gente que afinal também eram bastardos da vida.

o Mundo mudou, o recinto da feira é outro, mais moderno , é certo, mas sem o toque da fantasia da minha infância. Os feirantes são outros, por-ventura mais higiénicos, (a aSaE anda aí), mas talvez mais predispostos a problemas de injustiças sociais, violências, e, de qualquer modo, o quarto da minha avó, assim como ela, desapareceu para sempre.

Junta de Freguesiada

Cova da Piedade

o executivo da Junta de Freguesia de Cova da Piedade convida todos os “fregueses” e aqueles que nos quei-ram visitar, para as Festas de Nossa Senhora da Piedade que se realizam em Setembro nos dias 12, 13 e 14.

Certos que nos encontraremos para aquele abraço fraterno e solidário.

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Seixal•20 a 29 de Junho Arrentela•9 a 13 de Julho

Fernão Ferro•19 a 27 de Julho

Aldeia de Paio Pires•30 de Julho a 3 de Agosto

Amora•13 a 17 de Agosto Corroios•22 a 31 de Agosto

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Saudades de um passado já distante e até de um sapato voador...

Rosário Fernandes

Há ainda um mundo muito rico, mas oculto em cada recanto da nobre terra alentejana. Desco-bri-o logo em criança. um mundo de saberes e de poesia natural. De beleza que teima em subsistir numa cada vez mais alterada paisagem, fruto das inevitáveis transformações das sociedades e do tempo. As memórias de uma criança alentejana de há 30 anos são muito diferentes das de uma criança da actualidade, é óbvio, mas há um certo património material e imaterial que ainda se con-serva, constituindo manancial para deleite de to-dos nós, tanto naturais como visitantes. Neste rol, estão incluídas as recordações que guardamos como um valioso tesouro, mas, por vezes, só mais tarde nos apercebemos do seu significado.

um destes dias visitei a aldeia onde vivi os primei-ros anos da minha infância. Aninhada na encosta do maciço de S. Mamede, a freguesia de Carrei-ras (Concelho de Portalegre), continua a exibir o seu belo casario branco, no meio dos sobreiros de um verde escuro muito próprio. Nos vales, embaixo, vêm-se extensos bosques de carvalhos, vestígios vindos talvez de um passado celta, onde esta árvore era sagrada. Marcas naturais que tei-mam em permanecer, apesar de já muito esque-cidas pelas novas gerações. O interior da aldeia mudou muito à semelhança do que aconteceu a tantas outras localidades onde o poder local democrático foi o motor de transformação da paisagem e símbolo da modernidade, dotando milhares de povoações rurais com infraestruturas

Vista da freguesia de Carreiras

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básicas, como sejam esgotos, água canalizada, electricidade, arruamentos, entre outras melho-rias.o tempo é a medida de todas as coisas, já diziam os gregos antigos na sua sabedoria milenar, acu-mulada ao longo de muitas e muitas gerações e povos que com eles se cruzaram.Continua válida essa fórmula nos nossos dias. Por isso, existe tam-bém a memória, como uma forma de resgatar factos passados, uma tentativa de os cristalizar, de não os deixar cair no esquecimento, no ocaso final...

Também as nossas infâncias vão ficando cada vez mais longínquas e brumosas, verifico agora com este retorno às Carreiras, onde os lugares em que vivi estão irreconhecíveis, fruto tanto do tempo, que sem apelo nem agravo segue o seu percurso de transformação, como da mão humana, sem-pre ansiosa por modificar, tornar mais aprazível e confortável.

nesta freguesia eu iniciei o ensino básico. atraves-sava-a diariamente até à escola, por entre ruas estreitas cobertas de calçada irregular, cheias de curvas e contracurvas, muros de pedra a separar hortas e casas, ervas e plantas desordenadas que teimavam em crescer e florir a cada Primavera. nas poucas tabernas existentes, juntavam-se os homens, enquanto as mulheres preferiam as lo-jas. Eu, criança adorava passear-me entre os dois mundos, ora pela mão do meu pai, ora da minha mãe. Sempre sabendo que haveria algo delicioso para mim nalgum destes sítios.

aqui um saquinho de amendoins, acolá um ge-lado ou até uns rebuçados efervescentes que faziam cócegas na língua e de que já não recordo o nome. Traziam no seu interior como brinde gravuras de animais, automóveis e aviões que eu colecionava com esmero. Da padaria, onde uma grande máquina redonda amassava a farinha de forma enérgica e constante, saía cheiro a pão quente e lá havia também as boleimas (bolo da massa do pão, quadrado, com recheio de canela ou maçãs e cobertura em açúcar caramelizado)

que eu tanto apreciava. E, na minha timidez natu-ral, ao percorrer a aldeia, esforçava-me por sau-dar todos com o habitual: Bom dia vizinha Chica, Boa tarde, ti’ Manel...

Filha única e miúda solitária, o meu fascínio maior era contudo a natureza, mais do que as gentes típicas de aldeia. aí era o meu reino encantado que percorria horas e horas, esquecida até do lanche para preocupação de minha mãe que me chamava (ela utilizava a expressão “brádar”), vezes sem conta e eu nem me apercebia. aflita, ela procurava-me por toda a horta e no final ouvia um raspanete. Por vezes voava mesmo um sapato em minha direcção, do qual eu me escapava num ápice. o bando de bichos, cães e gatos, a quem o passeio sabia a entusiasmante brincadeira, nessas alturas do sapato voador, procuravam também de imediato abrigo na “socha”, a cabana de pedra com cobertura de giestas, localizada junto à casa, que outrora servira para guardar o rebanho de

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cabras pertença dos meus avós. Só regressavam ao páteo após acalmar a ira da minha mãe.Hoje esse sapato, que na altura tanto me afligia, já não voa, muito menos percorre caminhos e nunca imaginei que um dia o recordaria com nostalgia. Tudo se esfumou, inexorável,no tempo. até a famosa Farinha 33 da caixa verde e branca!! nem mesmo a amorei-ra junto ao quarto da minha avó já subsiste e semelhante fim teve também a bela cerejeira grande, onde eu subia e me deliciava com fru-tos redondos, vermelhinhos e sumarentos. O poste de telefone de madeira, onde eu adorava encostar a cabeça para ouvir uma amálgama de sons esquisitos e por vezes até vozes, foi sub-stituído por um novo. Mais adiante, a frondosa figueira que segurava o meu balouço apodreceu e dela não restam quaisquer vestígios.

Desapareceu inclusive a esguia e alta nespereira que por ocasiões de Primavera perfumava tudo

ao seu redor, onde gerações de aves fizeram os seus ninhos. A primeira vez que descobri um, tinha ovos quentes que eu tirei cuidadosamente para mostrar ao meu pai. logo fui instada a de-volvê-los de imediato à procedência com o aviso expresso de nunca mais tentar tal proeza. Devolvi-dos ao ninho, qual não foi o meu espanto quando daí a algum tempo testemunhei a aparição de uns quantos biquinhos amarelos no seu interior. Fui espreitar, sem tocar em nada e vi uns quantos recém-nascidos depenados e de olhos grandes, de início fitando-me com receio, mas depois com as boquitas abertas solicitando comida.

Deixei-os e fui contar a novidade aos meus pais que me explicaram o ciclo da vida daquelas criaturas e aconselharam a não visitá-los com frequência para os pais não os abandonarem em definitivo com medo da minha presença. Cumpri à letra e foi com alegria que mais tarde os con-templei voando, ainda que de início desajeitada-

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mente, pela horta.Mas, os domínios da minha curiosidade tinham à sua frente um vasto reino para descobertas: a horta e os campos adjacentes, com sua vasta gama de animais, plantas, odores, árvores e ro-chas. um manancial verdadeiramente encanta-dor, entremeado pelo melodioso canto de um conjunto de exímios músicos que enchiam os ares de alegria. Eram melros, rouxinóis, pintas-silgos, gaios, cucos, mejengras, cotovias, chapins, picanços, pica-paus (ai o que eles adoravam de-bicar a madeira do poste do telefone!!), e mesmo os inevitáveis pardais, rivalizando todos eles com o som do acordeão que meu pai tinha por hobby tocar.

Com a minha avó e também com a minha mãe, aprendi a conhecer muitas plantas, cada uma de-las com sua utilidade própria, ora ornamental, ora comestível, ora inclusive medicinal. as Borragens, por exemplo, eram fritas em farinha e ovo, depois comidas às refeições. a Erva de S. João, a Erva-dos-Cavalinhos e os Rabos-de-Raposa destinavam-se a chás. os Poejos utilizavam-se na açorda, mas era de evitar as Catarinas-Queimadas que provo-cavam a morte aos coelhos, e também as Figuei-ras-do-Inferno, que tinham fama de ser veneno-sas em conjunto com as Cebolas-albarrãs.

Eu gostava particularmente das Madressilvas cheirosas, das Malvas-Reais e das Centaúreas azuis que utilizava nas minhas brincadeiras para “barbear” os bonecos, pois as suas pequenas pétalas agudas picavam ligeiramente ao serem encostadas ao rosto. Deliciava-me também com os Figos da Índia, madurinhos, redondos como porquinhos alentejanos em tempo de engorda. Era preciso cuidado com os espinhos e tinha de se saber o ritual próprio para descascá-los, que começava cortando-se a parte superior e seguin-do-se um golpe ao longo do fruto para separar em duas metades a casca.

Ah, poderia estar horas aqui recordando, como todos nós, episódios que marcaram de forma positiva a minha infância, a minha alma alen-tejana. até estórias de fantasmas, bruxas e mouras encantadas que aprendi com os idosos da freguesia, mas o meu texto já vai bastante longo. Deixo-vos portanto encarregues de uma tarefa: no silêncio das vossas casas evocarem também vós as memórias que ainda guardam de outrora e saborearem emoções há muito escondidas nas profundezas das vossas mentes. Vale bem a pena, acreditem!!

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Rui Pereira

um percurso individual de uma enorme profun-didade, que se destaca no panorama artístico contemporâneo. Rogério Ribeiro deixa-nos uma obra extraordinária e infindável, com o seu cunho aberto e sincero de quem abre a sua imaginação ao mundo que o instiga a agir, a actuar, a querer interagir com ele. Como refere ana Isabel Ribeiro, no catálogo da exposição de desenho e pintura em Beja, “…pode falar-se, a propósito da obra de Rogério Ribeiro, de um forte sentido humanista, presente desde o início da sua actividade. É uma pintura de incessante questionamento sobre o Homem, o seu lugar no Mundo, numa constante gestão de tensões polarizadas, simbolicamente, no amor e na Morte mas que, afinal, traduz um prazer imenso que o pintor tem no seu trabalho, nele encontrando uma forma de cumprir-se na Vida.”a exposição de pintura e desenho de Rogério Ribeiro, que decorreu no ano de 2002, no Museu Jorge Vieira e na Galeria dos Escudeiros, será sem-pre um acontecimento com significado histórico, uma honra para o Museu e para o Município de Beja. nesta grande exposição o autor apresentou trabalhos dos anos noventa e do início do novo século. no Museu Jorge Vieira o desenho a tinta-da-china e na Galeria dos Escudeiros grandes telas de pintura em acrílico e óleo tornaram os espaços deslumbrantes e grandiosos com a colossal obra. o desenho exposto na galeria do Museu repre-sentará sempre um reencontro simbólico de dois amigos: o pintor Rogério Ribeiro e o escultor Jorge Vieira, com percursos próprios de grande profundidade e com uma obra do desenhado constante. o desenho está patente, directa ou indirectamente, na construção de qualquer obra dos dois mestres. A linha riscada no papel surge,

em ambos os casos, como um apelo natural do pensamento que fica assim registado esponta-neamente. no conjunto das obras expostas, Rogério Ribeiro, dá-nos a conhecer cenas do real, da vida das pes-soas, dos homens, das mulheres mostrando-nos, também, o sonho, o imaginário da narrativa e da fábula. Facilmente encontramos sinais de opti-mismo, de esperança e de ser possível o sonho de infância – brincar descalço e liberto de vestes, máscaras que irrompem, sorrisos e olhares que nos transportam numa viagem ao universo puro, mais transparente. O desenho, o traço com uma intensidade singular, surge como um sustentácu-lo indispensável na forma de articular e expressar o acto do criador livre. E que belos desenhos, por exemplo, as ilustrações fantásticas, a tinta-da-chi-na, realizadas em 1983 para o álbum “Revolução de 1383-1385”! a representação fabulosa dos momentos da revolta popular…. onde as formas das figuras são como um prenúncio da própria existência humana - a vida e a morte; a resistên-cia ou a capitulação; a luta pela emancipação ou a resignação; o povo e os senhores mandantes;

Rogério Ribeirouma força viva incessante

Desenho no Livro Revolução 1383 - 1385

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os explorados e oprimidos e os exploradores: são os temas fundamentais da obra. Poder-se-á dizer que o desenho, nesta obra, é um exemplo ex-celso que exprime bem a intensidade dramática tangível: o poder e a força das mãos que agar-ram os instrumentos do trabalho - a foice e o ancinho, e que se convertem em armas da re-volta retratada nos rostos da multidão. o autor ao figurar, ao longo desta obra, grandes planos, aproximações e afastamentos de cena, parece tudo ter feito para que possamos “presenciar” e “viver” os acontecimentos históricos! na dimen-são, sem paralelo, da sua obra podemos também encontrar pontes claras relacionadas com as ideias de reportagem, de cinema ou de teatro… o seu desenho também entra pela expressão da acção temporal e espacial, criando imagens diver-sas num conjunto cénico e dinâmico. A entrega à representação, através do desenho, atinge con-tornos palpáveis de grande força sensorial que se transforma, inevitavelmente, em apelo genuíno à existência plena - pintar e riscar com o impulso rebelde dum Ícaro que quer voar, ultrapassando

as barreiras e os limites do medo e da injustiça! O Ícaro de Rogério Ribeiro é, sem dúvida, a luta contra a indiferença perante o mundo que nos ro-deia – voar para compreender e conhecer novos

Quadros parauma exposição

Ícaro

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lugares, novas mentalidades, novas atitudes. o Mestre e a constatação sublime da transmissão da intensidade do gesto da pincelada, ou do risco a carvão! os contornos das figuras surgem, ora mais, ora menos, salientes e carregadas e, muitas vezes, a cor emerge com grande luminosidade, acentuando frequentemente o dramatismo cénico nas suas telas, ou simplesmente no pa-pel. Em “Quadros para uma exposição” o artista é o protagonista: o cerne da própria tela. Nesta obra deparamo-nos com o mundo do Mestre: o atelier, os materiais e a matéria que se entranha no suporte pintado; a presença dos pincéis, das espátulas, das paletas de cor, da tela que espera pela intervenção do autor. Desta obra emana algo de mágico: o refúgio do artista povoado pelo seu imaginário vivo – os seus modelos, os seus per-sonagens reais, míticos, imaginados ou recriados; no espaço do artista os modelos de represen-tação passeiam-se fora da tela, fora do mundo, mas dentro da mente do Mestre; são seres que se movimentam para fora do limite dos contor-nos da própria obra e que parecem co-habitar, lado a lado, com o criador; vemos anjos, homens, mulheres que por aqui passam… alguns esprei-tam o artista? E nós? Estaremos nesta tela? Tudo gira em redor de um centro, um universo plástico ilimitado!na verdade é muito difícil, impossível mesmo, expressar por palavras a dimensão da sua obra, mas também do homem e da sua trajectória in-dividual de uma riqueza incomensurável. Rogério Ribeiro é a configuração do Mestre, do pensa-dor, do pedagogo, do ideólogo, do construtor do

inimaginável. É uma referência única para mui-tos dos que se reviam na sua acção constante -. um homem de causas nobres, um lutador insubmisso, mas solidário. ao escrever estas pa-lavras, restringi-me a um pressuposto - o Rogério Ribeiro passou e marcou a minha vida... Mas passou também por terras do Alentejo, em espe-cial por Beja, onde deixou uma obra pública que emana a sua gigantesca humanidade! Rogério Ribeiro está a passar por aqui…E permanecerá no tempo presente e futuro!

o luGAR dA áGuA Museu ARqueolóGICo dA RuA do seMbRANo, beJA

No espaço museológico da rua do Sembrano, num ”lugar da Água”, banhos romanos, nasceu uma bela peça plástica, um mural de azulejos que vai buscar o sentido da fonte, como elemento da génese, da pureza e transparência: a nascente da água e da mulher como o gérmen que brota a vida; onde se vêem também os homens peixe na festa dos banhos, do mergulho e do nadar, onde muitas mãos se tocam e penetram na dádiva azul. As cores de grande leveza, dos azuis aos ocres, e os rosas, salientam alegria serena descrita na sua narrativa. a pincelada livre, como uma queda de água, expressa a ideia de liberdade. Com esta obra – o lugar da Água – assinala uma presença plástica extraordinária que valorizou, consequen-temente, o património artístico da Cidade de Beja.

Painel no Museu do Sembrano

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MeMoRIAl à MulheR AleNTeJANA,PARque dA CIdAde de beJA

a última obra de arte pública executada por Rogério Ribeiro, foi edificada em terras do alente-jo - Memorial à mulher alentejana -, um obelisco em prisma triangular, cujas faces estão revestidas a azulejo, tendo cada um deles um rosto e um nome no feminino. Nomes que se somam a os outros nomes e que se somam ao nome de Cata-rina, no centro visual da obra, também ela repre-sentada num azulejo a azul e a cor amarelo seara, a recortarem a sua silhueta. Esta obra, que se en-contra no Parque da Cidade de Beja, é a memória da luta de um povo que um dia aspirou a viver num lugar mais justo e fraterno. A pertença da nossa terra é de todos, e a terra a quem a tra-balha é o mote desta luta, em que as mulheres revelaram a sua força, coragem e vontade de transformar o mundo da seara – o latifúndio. Este é um trabalho que representa a força da união, o somatório de parcelas de azulejos/mulheres que constroem uma escultura mural sólida que é um todo humano colectivo!

AlGuNs MoMeNTossIGNIFICATIvos duMAvIdA PReeNChIdA

Rogério Ribeiro nasceu em Estremoz a 31 de Março de 1930. Viveu a sua infância em terras alentejanas. no início dos anos 40 deslocou-se para lisboa com a família. Fez o ensino básico na escola primária do Bairro das Colónias e fre-quentou o liceu Gil Vicente, na Graça, para onde se deslocava utilizando o “eléctrico operário”. É liberto das acções da Mocidade Portuguesa por influência do pai e a colaboração do médico do liceu, que alegou questões de saúde. Iniciou nesta altura as suas actividades no movimento estudantil. Em 1946, para não perder o ano lec-tivo, mudou-se para uma escola particular em Xabregas (D. Balbina) próximo de casa, e que foi determinante na formação da sua individu-alidade. Foi aqui que conheceu o professor Ger-mano Soromenho Neves, de quem passou a ser um amigo. Passou a apoiar a instalação de bibliotecas e a organização de actividades em diferentes sociedades recreativas. Foi o seu pri-meiro contacto com o MuD Juvenil. Findo o 5º ano do liceu, matriculou-se por vontade de seu pai, no Instituto Comercial de lisboa, no Curso de Económicas e Financeiras. Aqui conheceu outro professor, José Júlio de Andrade Santos, que desempenhou um papel fulcral nas suas opções futuras. Com ele, foi dispensado dos exercícios e ficava na sua mesa a apreciar belos álbuns, então inacessíveis do cidadão comum: impressionistas como Degas, Cézanne e muitos outros. Nesta al-tura, 1948, o seu pai foi colocado na Cidade da Horta (Faial) tendo Rogério Ribeiro permanecido em lisboa. Esta nova realidade gerou, de alguma forma, o ampliar do seu espaço de liberdade: passou a ir ao Chiado, diariamente, travando contacto com algumas tertúlias; e participou em diversas acções contra o regime (distribuição de panfletos, jornadas de luta…). Traçou aqui a mu-dança do seu destino, pedindo transferência para a Escola de artes Decorativas de antónio arroio, onde foi aluno de abel Manta. Com a ajuda do escultor José Dias Coelho, que o preparou para a

Memorial à Mulher Alentejana

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admissão e ofereceu apenas, em troca, uma ami-zade que se sustentaria para sempre, ingressou na Escola Superior de Belas-artes de lisboa, onde fez a sua formação académica em pintura. Em 1949, fez a sua primeira viagem a Paris onde conheceu Cipriano Dourado, com quem co-laborou em pinturas para o Pavilhão Português na Festa de l’Humanité. na década de 50, no atelier de Júlio Pomar, conheceu alice Jorge, Vasco da Conceição, Mar-ia Barreira, e lima de Freitas. Foi convidado a participar na 5ª Exposição Geral de artes Plásticas (lisboa, Sociedade nacional de Belas artes - 1950) sendo esta, a sua primeira participação numa exposição colectiva. Forma o seu primeiro atelier com Cipriano Dourado. Cumpre o serviço militar na Póvoa do Varzim onde nos tempos livres desenha intensamente esboços que retratam o mundo laboral das mulheres desta região: base inspira-dora dos seus trabalhos de pintura e gravura.neste período o convívio e participação em ter-túlias com escritores e artistas, grande parte dos quais neo-realistas, possibilitaram-lhe amplos conhecimentos, imprescindíveis na sua definição plástica mais figurativa; neste enquadramento, realizou ilustrações para autores como Fernando namora e alves Redol, e participou activamente na vida cultural da SnBa. no final dos anos 50, terminou a licenciatura em pintura, na Escola de Belas-artes de lisboa e foi sócio fundador da So-ciedade Cooperativa de Gravadores Portugueses – GRaVuRa (1958). Dedicou-se intensamente à gravura, realizando então múltiplas exposições individuais e colectivas - Madrid, lisboa, Paris, Roma e Göteborg. Realizou ainda nesta etapa dois painéis cerâmicos: um para a Fábrica de Fermen-tos Holandeses (Porto) e outro para a Estação da avenida do Metropolitano de lisboa.Na década que se segue, iniciou a carreira de docente como professor de pintura e tecnologia (1961), a convite do professor lino antónio, na Es-cola de artes Decorativas antónio arroio (lisboa) do qual será afastado posteriormente devido às suas opções políticas.Em 1964 desenvolveu os seus primeiros

trabalhos no âmbito do design gráfico e arqui-tectura de interiores e, mais tarde, funda a So-ciedade “Protótipo” que idealizava objectos de equipamento. Mantém a sua participação em exposições colectivas, nacionais e internacionais, de gravura, tapeçaria, e cerâmica.na década de 70, no período da “Primavera Marcelista”, ingressou como assistente da cadeira de pintura da Escola Superior de Belas-artes de lisboa (1971). Deu continuidade ao trabalho desenvolvido no campo do design de interiores. Esta é uma década que alterou o rumo do seu trabalho, com a Revolução de Abril a gerar movi-mentos de intervenção artística e cívica de van-guarda. Foi membro fundador do Movimento Democrático dos artistas Plásticos. na escola Superior de Belas artes assumiu a coordenação do grupo que impulsionou a criação do Curso de Design Industrial e de Equipamento; foi represen-tante do seu Conselho Científico e Membro do Conselho Directivo. Realizou, por esta altura, as cerca de 50 ilus-trações do livro “até amanhã, Camaradas” de Manuel Tiago: trabalho que constituiu um marco significa-tivo no seu per-curso individual - num tempo em que o país respirava uma atmosfera de liberdade plena na busca do seu caminho - onde o artista se con-fronta, também ele, com a neces-sidade de partici-par na construção da mudança...

Ilustração do Livro “Até Amanhã Camaradas”

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Ilustração do Livro “Até Amanhã Camaradas”

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Este conjunto de ilustrações foi exposto pela pri-meira vez, em 1977, na Festa do “avante” – FIl. Foi também o autor do projecto original do actual espaço da Festa do Avante, que ainda hoje per-dura com grande impacto cultural e democrático no país. Realizou exposições individuais de pin-tura, que dão visibilidade à sua breve trajectória pela arte abstracta e prenunciam um retorno ao figurativo; participou em diversas exposições colectivas, no país e no estrangeiro, maioritaria-mente de gravura e tapeçaria. A década de oitenta traduziu-se na participação num vasto conjunto de exposições individuais e colectivas. Produziu as ilustrações para o livro da Revolução de 1383-85, a partir dos textos do cronista Fernão lopes e de antónio Borges Coelho, onde são patentes, uma vez mais, as preocupações com as temáticas de índole social. Foi professor de iniciação à pintu-ra no ar.Co (1981-1984) e Presidente do Conselho Científico da ESBal. Entre 1981-1985 é membro da Direcção da SnBa.Iniciou uma colaboração regular com a Galeria nasoni - Porto, que manteve até inicio dos anos 90. Prosseguiu o seu trabalho na área da Museo-logia, coordenando projectos dos Museus na-cional de arte antiga, Fortaleza de Peniche e do Museu do neo-realismo de Vila Franca de Xira.Foi responsável pelo projecto da Galeria Munici-pal de Arte de Almada, tendo desempenhado as funções de Director Técnico e artístico.os primeiros anos da década de noventa ficaram marcados por trabalhos de pintura e desenho que, embora tenham tido um carácter celebrativo, estão manchados de tristeza: período de pon-deração e de reflexão sobre o passado histórico recente – olhar o presente com a necessidade de repensar o futuro à luz dos acontecimentos políti-cos internacionais. Por esta altura realizou uma visita a Cabo Verde, integrada num Projecto de Reaproveitamento do Campo de Concentração do Tarrafal, com o fim de transforma-lo em Me-morial – este projecto devolveu ao seu trabalho a reconciliação com a cor e presenteou-o com a dimensão lúdica da pintura. Em 1996 retomou um intenso trabalho na azule-jaria, em obras públicas - painéis de grandes di-

mensões, tanto para o Pais (almada e lisboa) como para o estrangeiro (Chile e Japão). neste período participou em múltiplas e diversas ex-posições colectivas e individuais, nacionais e in-ternacionais; e ilustrou, neste mesmo período, a Praça da Canção, de Manuel alegre. Foi também consultor do Gabinete de reabilitação urbana da Câmara Municipal de lisboa (Projecto – a Cor de lisboa); e iniciou o Projecto Museológico da Casa da Cerca – Centro Contemporâneo (almada).Na entrada do novo milénio passou a professor associado da Faculdade de Belas-artes da uni-versidade de lisboa (2000) – ano das Comemo-rações dos 25 anos dos Cursos de Design. Integrou a Exposição o azulejo em Portugal no Século XX (Rio de Janeiro). o ano de 2000, de entre outros acontecimentos, ficou marcado por uma grande exposição – Ícaro (lisboa e Por-to), que incorporou novos elementos plásticos, apresentados em dois grandes grupos – “Ensaiar voar” e “ousar a viagem” e ainda um terceiro – “labirinto”, que invoca o Minotauro. Em 2001 apresentou trabalhos preparatórios para o painel Cerâmico do Cine-teatro lagoense Francisco d’amaral almeida (S. Miguel). Construiu ainda – as asas de Ícaro, no laranjeiro (uma das onze esculturas para as onze Freguesias do Con-celho de almada, nas Comemorações dos 25 anos do Poder local, organização da Câmara Mu-nicipal de almada).Em 2002 expôs desenho e pintura no Museu Jorge Vieira e na Galeria dos Escudeiros – Beja. No ano seguinte iniciou a preparação de um pai-nel de azulejo de grandes dimensões, encomen-dado no âmbito do Viver Beja – Pograma Pólis, intitulado o lugar da Água – no Museu arque-ológico da Rua do Sembrano. No mesmo ano e nos subsequentes ilustra diversas obras, entre as quais, a Flor da utopia (2003), de urbano Tavares Rodrigues; Triunfo do amor Português de Mário Cláudio (2004); Youkali (2005) e Crónicas de Fernão lopes (2007) de antónio Borges Coelho; e o ano de 1993 de José Saramago (2007). Em 2008 Rogério Ribeiro cria a sua última obra públi-ca: “Memorial à Mulher alentejana” – edificada no Parque da Cidade de Beja

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Capa e Contracapa do seu Livro

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Capa e Contracapa do seu Livro

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AA - O Concelho de Avis assume um papel de relevo no Alentejo, como também no País. Em linhas gerais, como caracteriza este Concelho do ponto de vista social, cultural e económico?MC - o Concelho de avis situa-se no Distrito de Portalegre, tem uma área de 606 Km2 e, de acor-do com os Censos 2001, tem 5.197 habitantes que se distribuem pelas 8 Freguesias (alcórrego, aldeia Velha, avis, Benavila, Ervedal, Figueira e Barros, Maranhão e Valongo).Do ponto de vista social, à semelhança do que sucede no Distrito de Portalegre, no Alentejo e em todo o Interior do País, o Concelho de avis é afectado pelos fenómenos do envelhecimento e da diminuição populacional e, devido à forte di-minuição do peso do sector primário, viu crescer a sua taxa de desemprego, agravada nos últimos

tempos pela situação de grave crise que afecta o País.no plano económico, o sector primário ainda ocupa uma percentagem considerável da popu-lação e nos sectores secundário e terciário domi-nam as micro e pequenas empresas. É impor-tante salientar o investimento que tem vindo a ser registado no Concelho nas áreas da vitivinicul-tura, da olivicultura e do turismo. a este nível, entre outros investimentos, desta-cam-se os cerca de 7,5 milhões de Euros que a Her-dade Fonte Paredes (HFP) efectuou no Concelho ao longo dos últimos anos, através da aquisição de 400 hectares para plantação de vinha, de que resultam 10 marcas que se encontram no mer-cado, tendo sido algumas delas galardoadas em certames nacionais e internacionais e exporta-

Manuel CoelhoPresidente da Câmara Municipal de avis

Vista aérea de Avis

enTReViSTA

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das para mais de 15 países. Em Maio passado, foi inaugurada a Adega da HFP, dotada das mais modernas tecnologias e equipamentos, onde se pretende produzir vinho com práticas inovadoras mas baseadas em técnicas ancestrais.a olivicultura, aproveitando a excelente qualidade dos solos e condições climatéricas, é também uma área que tem conhecido um importante crescimento, baseado, sobretudo, na qualidade dos produtos, oriundos de terras de excelência, sendo que alguns dos azeites produzidos no Con-celho possuem a Denominação de Origem Pro-tegida (DoP) de “azeites do norte alentejano”, o que constitui um reconhecimento das suas cara-cterísticas únicas e da sua elevada qualidade. Em Avis estão a surgir também alguns impor-tantes investimentos na área do turismo. a nível cultural, o Concelho de avis possui traços de uma cultura popular muito marcada que se manifesta activamente através do folclore, da música e da poesia popular, da gastronomia e de diversos outros elementos que o Município de avis e o tecido associativo local, em parceria, ten-tam manter vivos através de projectos e eventos que procuram assegurar uma oferta cultural vari-ada para a população local e para os visitantes, ao longo do ano.

AA - Considerando que o Concelho de Avis é o menos populoso, em comparação com os Con-celhos limítrofes, que medidas estão previstas para inverter esta situação, de forma a combater o despovoamento?MC - a afirmação de que o Concelho de avis é menos populoso que os Concelhos limítrofes não

corresponde inteiramente à verdade. O Concelho faz fronteira com os Municípios de Ponte de Sôr, Mora, Sousel, alter do Chão e Fronteira. É clara-mente menos populoso que o Município de Pon-te de Sôr mas tem um número de habitantes não muito diferente dos Concelhos de Mora e Sousel e maior do que Fronteira e Alter do Chão.não deixa, no entanto, de ser verdade que, tal como sucede com a maioria dos Concelhos do interior do País, o Concelho de avis é afectado pelo despovoamento, tendo por isso adopta-do medidas em várias áreas para promover a fixação da população, sobretudo as camadas mais jovens. Entre as medidas implementadas pela autarquia, destacam-se, na área da habitação, a realização de loteamentos municipais em todas as Freguesias, em que são vendidos lotes para auto-construção, em zonas devidamente infras-estruturadas, a preços simbólicos, adoptando-se critérios de atribuição que procuram favorecer a atribuição a pessoas mais jovens e com menor poder económico.A pensar nos jovens, com idades compreendi-das entre os 12 e os 30 anos, o Município de avis criou o “Cartão do Jovem Munícipe”. Trata-se de um cartão de acesso gratuito, destinado a jovens residentes e recenseados no Concelho (quando maiores de 18 anos) e que confere benefícios no acesso a bens e serviços: desconto de 20% nas taxas relativas à construção, reconstrução, rea-bilitação, alteração, ampliação ou demolição de imóveis, com excepção das taxas devidas pelas operações de loteamentos e obras de urbaniza-ção; desconto de 20% na aquisição de lotes nos loteamentos municipais para habitação própria

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e permanente; desconto de 75% na aquisição de lotes para a instalação de actividades económi-cas; desconto de 20% nos bilhetes de cinema no auditório Municipal “ary dos Santos”; desconto de 20% nos bilhetes de entrada nas Piscinas Municipais; desconto até 50% no acesso a activi-dades promovidas pela Autarquia; descontos em estabelecimentos comerciais e outras entidades aderentes. A autarquia tem vindo a desenvolver um im-portante trabalho no domínio social, nomeada-mente, no apoio à infância, por exemplo através da criação de uma rede de ludotecas Municipais, de frequência gratuita, que oferece às crianças das 8 Freguesias do Concelho, com idades compreen-didas entre os 3 e os 12 anos de idade, espaços lúdico-pedagógicos onde podem ocupar os seus tempos livres com actividades que promovem a convivência com outras crianças e contribuem para o seu desenvolvimento social e intelectual. Todas as ludotecas, à excepção da que se situa na sede de Concelho, foram criadas ao longo dos

últimos 4 anos e pretendem ser também pólos dinamizadores das Freguesias, envolvendo a comunidade local nas suas actividades e partici-pando activamente em iniciativas promovidas pelo Município de avis, como as Marchas Popu-lares ou a Feira Franca. as ludotecas Municipais funcionam ao longo de todo o ano, sendo que durante o período escolar estão abertas ao seu jovem público entre as 14:00 e as 19:00 e, du-rante os períodos de férias escolares, vêem o seu horário de funcionamento alargado, de forma a corresponder melhor às necessidades dos seus frequentadores de palmo e meio.os jovens são, sem dúvida, um alvo prioritário das políticas de fixação de população, por isso têm vindo a ser desenvolvidos projectos que os en-volvem de forma a olharem para o Concelho com outros olhos, valorizando mais as suas diversas potencialidades. um desses projectos é o “Jovens em Movimento”, destinado aos jovens do Con-celho com idades compreendidas entre os 16 e os 25 anos, que vai já na sua quarta edição e que

Feira Medieval

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promove a ocupação saudável das férias de Verão, ao mesmo tempo que pretende desenvolver o espírito de cidadania e de participação cívica dos jovens na comunidade, bem como contribuir para a manutenção, recuperação e divulgação do Património do Concelho de avis, nas suas várias acepções. O projecto decorre de Junho a Setem-bro, contemplando três períodos de actividades em que os jovens podem optar por uma das 7 áreas temáticas: ambiente e Protecção Civil, ar-queologia, Cultura Popular, Desporto e Tempos livres, Património Histórico e Museologia, Sócio-Educativa e Turismo. as actividades realizam-se em períodos de 5 horas diárias e os participantes terão direito a seguro de acidentes pessoais, da responsabilidade da autarquia; a transporte, quando necessário, e a uma bolsa horária.o “avis é Cool” é um outro projecto do Município destinado aos jovens do Concelho e que decorre ao longo do Verão. Este projecto é constituído por um conjunto de workshops e muitas outras actividades, integradas em temáticas como: desporto, dramaturgia, energias renováveis, informática, arqueologia, museologia e literat-ura. Através do envolvimento dos jovens nestas actividades pretende-se levá-los a olhar para o Concelho numa outra perspectiva, valorizan-do-o.De forma a assegurar a dignificação e a melho-ria da qualidade de vida dos estratos sociais mais carenciados do Concelho de Avis, a autarquia criou o “Passe Social”: um instrumento de intervenção social baseado no princípio da discriminação positiva que procura colmatar a inadequação das respostas sociais nacionais às necessidades manifestadas pela população local, promovendo a erradicação da pobreza e da exclusão social e, simultaneamente, contribuindo para o desen-volvimento económico, social e cultural da popu-lação local. Podem beneficiar do Passe Social os interessados que apresentem o respectivo re-querimento, que residam e sejam recenseados no Concelho há, pelo menos, um ano, que sejam pensionistas, reformados ou portadores de um grau de deficiência igual ou superior a 60%, e cujo rendimento mensal per capita do agregado

familiar seja igual ou inferior a 75% da Retribuição Mensal Mínima Garantida. os portadores do Passe Social têm direito a: desconto de 50% na factura relativa ao consumo de água para fins domésticos até ao limite de 3 m3 por beneficiário, bem como em todas as tarifas indexadas ao con-sumo de água; desconto de 50% nos bilhetes de cinema no auditório Municipal “ary dos Santos”; desconto de 50% nos bilhetes de entrada nas Pis-cinas Municipais; desconto até 50% no acesso a actividades promovidas pela autarquia; apoio à melhoria das condições habitacionais básicas nos termos e condições do Regulamento de Apoio à Recuperação da Habitação no Município de avis, com as necessárias adaptações; apoio à melhoria das acessibilidades na residência do beneficiário, com base num relatório dos serviços municipais competentes que avaliará a pertinência, a viabi-lidade técnica da execução e o valor da obra; e comparticipação, na parte não apoiada pelo Es-tado, nas despesas com a aquisição de medica-mentos ou deslocações para exames, consultas,

Igreja do Convento

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tratamentos ou outros similares em ambulâncias, carreiras públicas ou táxis oriundos do Concelho.o Município de avis tem procurado também manter uma política de constante apoio às asso-ciações, colectividades e IPSS’s do Concelho, uma vez que, por estarem inseridas no contexto das comunidades locais, estas possuem uma visão mais precisa das necessidades das população e uma capacidade de intervenção mais eficaz. o apoio a estas entidades ocorre sob diversas for-mas, quer através de subsídios e outros apoios a iniciativas e projectos próprios, quer através da comparticipação em investimentos relevantes.uma vez que o desporto é também uma impor-tante forma de reforço dos laços entre a popu-lação, ao promover a troca de experiências entre pessoas de todas as idades, pode considerar-se que o “Viva o Desporto – Jogos Concelhios” é também uma iniciativa que, ano após ano, ao

longo de vários meses, proporciona ocasiões de convívio entre a população, envolvendo, em mé-dia, entre 15 a 20% dos habitantes.numa perspectiva genérica, ao longo do ano realizam-se no Concelho um alargado conjunto de incitavas de carácter cultural que procuram promover o envolvimento e a animação da população local mas também captar a atenção de turistas e despertar neles a vontade de aqui se fixarem.a nível económico, tem-se procurado contribuir para a fixação de população e de investimento, quer por parte de potenciais investidores lo-cais, quer por parte de investidores externos, de forma a valorizar a economia local e contribuir para a criação de postos de trabalho. Este apoio concretiza-se através de um conjunto de medidas que passam pela criação de pequenas zonas de actividades económicas em todas as Freguesias, com especial destaque para a sede de Concelho, para onde está a ser preparada uma nova fase de expansão da Zona Industrial, sendo que os terrenos nestas áreas têm preços simbólicos e o Município de avis prescindiu de aplicar valores máximos de IMI e de Derrama, como forma de incentivo à fixação de investimento.Para garantir condições de habitabilidade para a população mais carenciada foi criado o Regula-mento de Apoio à Recuperação de Habitação no Concelho a que podem recorrer os candidatos inseridos em agregados familiares com rendi-mentos per capita não superiores a 60% da Re-tribuição Mínima Mensal Garantida, que residam no Concelho de avis há pelos menos 3 anos. os beneficiários deste programa podem usufruir de apoio técnico na elaboração de projectos e acompanhamento das obras, fornecimento de materiais e isenção de taxas, de forma a conferir às suas casas melhores condições de habitabili-dade.De uma forma geral, áreas como a cultura, o desporto e a qualidade ambiental merecem tam-bém uma especial preocupação por parte da autarquia, uma vez que constituem condições in-dispensáveis para assegurar um nível de vida com qualidade para a população, o que é um factor

Pelourinho

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muito importante para a fixação da mesma.

AA - Numa perspectiva económica, quais os principais projectos para o futuro?MC - no ano em que se assinalam 50 anos da inauguração da Barragem do Maranhão, a al-bufeira do Maranhão assume-se, cada vez mais, como um elemento central da estratégia de desenvolvimento económico traçada para um futuro próximo, quer por parte da autarquia quer por parte da iniciativa privada, tendo sempre presente a necessidade de apostar numa estraté-gia de desenvolvimento sustentável, capaz de valorizar as mais valias locais e, simultaneamente, manter o respeito pelo seu equilíbrio, sobretudo a nível ambiental.a albufeira do Maranhão, a riqueza do património natural, as paisagens, o vasto património edifica-do, a herança cultural e a inexcedível capacidade de acolhimento da população do Concelho de

Avis fazem com que o turismo seja uma das suas maiores potencialidades, tanto mais viável quan-to se regista uma tendência para uma procura crescente de destinos de férias alternativos à ha-bitual oferta de “sol e praia” e que estejam dis-poníveis ao longo de todo o ano. neste sentido, Avis é uma boa opção, quer para quem procura desfrutar de uns dias de repouso num local que une o património edificado, uma oferta cultural diversificada, uma boa gastronomia e a tranquili-dade de um recanto moldado pela natureza, quer para quem procure umas férias mais activas, uma vez que a albufeira do Maranhão e o Concelho em geral apresentam excelentes condições para a prática de modalidades como o remo, o windsurf, a canoagem, a pesca, o BTT, o TT, etc. a localização geográfica de avis pode também ser considerada uma vantagem, já que numa zona relativamente central no país, a menos de 2 horas de viagem de lisboa, ou seja, suficientemente perto para uma

Edifício da Câmara Municipal de Avis

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escapadinha mas ao mesmo tempo, suficiente-mente longe da rotina do dia-a-dia.Tem existido um grande investimento municipal em projectos que visam a criação de uma maior atractividade em relação à albufeira do Mara-nhão e ao seu aproveitamento a nível turístico, na sequência do Plano de ordenamento da albufeira do Maranhão, que a autarquia elaborou em devi-do tempo. Fruto deste investimento, o Complexo do Clube náutico de avis constitui hoje um dos principais pólos de lazer da região. A intervenção realizada neste espaço passou pela requalificação da praia fluvial e da respectiva envolvente, bem como pela profunda requalificação do Parque de Campismo da albufeira do Maranhão que, de-pois da remodelação da rede de abastecimento de águas e esgotos, da construção da central elevatória, dos edifícios de apoio (recepção, pos-to médico, bar e sala de convívio), bem como do parque infantil, de um novo bloco de balneários que inclui sanitários/balneários adaptados a pes-soas com deficiências motoras, e de 10 aparta-mentos (5 T0 e 5 T1), abriu as portas em agosto de 2006 como um dos melhores do País.neste momento o Complexo do Clube náutico constitui um dos melhores cartões de visita do Concelho, uma vez que reúne um conjunto de infraestruturas que oferecem aos visitantes con-dições para uma estadia inesquecível: praia flu-vial, parque infantil, solário, restaurante, piscinas, parque de merendas, parque de campismo e

hangar náutico.apesar do Complexo do Clube náutico se situar a apenas 1 Km da Vila de avis, existe também uma aposta na criação de uma relação de maior proximidade face a este espaço tão emblemático, nomeadamente através das diversas actividades que ali são desenvolvidas e da criação de uma ciclovia, já existente na Vila, mas que em breve se irá estender até ao Clube náutico.Além dos projectos municipais enquadrados numa estratégia sustentável de valorização da albufeira do Maranhão, a autarquia tem procura-do apoiar algumas intenções de investimento já manifestadas, bem como aquelas que venham a surgir. a este nível, é inevitável a referência ao Avizaqcua Team Center, um projecto privado que teve início em 2004 com o objectivo de criar um centro de estágios de remo, adaptado às neces-sidades de atletas e equipas de alta competição. Deste projecto vai nascer um hotel de 4 estrelas, com capacidade para 60 hóspedes, situado numa herdade com 47 hectares e com acesso directo ao plano de água, que irá abrir ao público no segundo trimestre de 2009. apesar de o Herdade da Cortesia Hotel não estar ainda em funciona-mento, através do Avizaqcua Team Center, ao lon-go dos últimos anos passaram por avis centenas de atletas e equipas de elite do remo a nível mun-dial, como as selecções olímpicas da noruega, da Suécia ou da Dinamarca ou campeões olímpicos como o sueco lassi Karonen, o norueguês olaf Tufte ou o neozelandês Mahe Drysdale. ano após ano atletas e equipas regressam a Avis para re-alizar os seus estágios de Inverno, registando-se uma afluência cada vez maior naquele que é apontado por técnicos e atletas como um dos melhores locais da Europa e mesmo do Mundo para a prática de remo.Na decisão de apoiar este projecto, além do con-tributo importante para a dinamização da prática desta modalidade na albufeira do Maranhão e da projecção internacional das suas potenciali-dades, o Município de avis teve em consideração que se trata de um importante investimento no Concelho que, directa e indirectamente, irá criar postos de trabalho e que, apesar do aspecto ar-Clube Naútico

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rojado dos edifícios em construção, se encontra perfeitamente enquadrado na paisagem e em simbiose com o ambiente envolvente.o potencial da albufeira do Maranhão para a prática de desportos náuticos e em particular de remo é também evidenciado pelo facto de diversas equipas nacionais a escolherem para a realização de estágios e de provas, organizadas em parceria com a autarquia, como é o caso do Troféu de Remo Mestre de avis, prova inter-asso-ciações, que vai já na segunda edição. a própria Federação Portuguesa de Remo já manifestou interesse em colocar avis no calendário nacional da modalidade.noutras perspectivas, o desenvolvimento económico do Concelho de Avis passa também pelo usufruto das excelentes condições naturais, pela variedade da fauna e da flora, associadas ao clima, influenciado pela proximidade da al-bufeira do Maranhão, que propicia a prática da agricultura e uma aposta crescente na produção e comercialização de produtos locais, concebidos à base de produtos naturais e seguindo receitas tradicionais, como é o caso do mel, das compotas e dos licores. Tal como já foi referido, nos últimos

tempos registaram-se, a este nível, importantes investimentos na vitivinicultura e na olivicultura, existindo uma forte aposta por parte dos investi-dores numa presença cada vez mais marcante nos respectivos mercados.Em suma, temos como objectivo a criação da marca Avis. Face à realidade cada vez mais dinâmica e global, torna-se premente implemen-tar uma estratégia forte de marketing territorial capaz de promover o Concelho de Avis, de forma integrada, nas suas diversas vertentes.

AA - Têm vindo a ser criadas novas infra-estrutu-ras para as áreas sociais, culturais e desportivas. Que equipamento e serviços se encontram dis-poníveis?MC - a criação, manutenção e melhoramen-to das infraestruturas para as áreas sociais, culturais e desportivas são indispensáveis para garantir o bem-estar da população, por isso existe, por parte do Município de avis, uma forte sensibilidade que se traduz numa preocupação constante a este nível.Como já foi referido, além dos projectos de apoio social a jovens e idosos, foi criada uma rede de

Barragem do Maranhão

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sete ludotecas Municipais que oferecem às cri-anças do Concelho um serviço gratuito onde desenvolvem actividades lúdicas e pedagógicas que contribuem para o seu desenvolvimento in-telectual e social.as Escolas do Primeiro Ciclo do Ensino Básico de avis, Benavila e Ervedal foram recentemente alvo de obras de melhoramento que procuraram dotar estes espaços de melhores condições para acolher um número cada vez maior de alunos devido ao encerramento de algumas das escolas do Concelho.Entre as principais infraestruturas de natureza cultural do Concelho de avis encontram-se o auditório Municipal “ary dos Santos”, que além de sala de cinema constitui um equipamento polivalente que acolhe iniciativas culturais diver-sas e o Museu Municipal de avis | Etnografia e arqueologia, situado na Sala do Capítulo do Con-vento de S. Bento de avis, o qual tem promovido exposições temáticas temporárias e desenvolve um importante trabalho de recolha, conservação e divulgação do património etnográfico do Con-celho.a par do Espaço Internet de avis, a funcionar desde 2005 e do projecto que se encontra em desenvolvimento para a construção da nova Biblioteca Municipal em avis, foi inaugurado no mês de abril o Pólo da Biblioteca Municipal e Espaço Internet de Benavila, que permite uma descentralização no acesso à Cultura e às novas tecnologias da informação e da comunicação junto da população que não reside na sede de Concelho.na área desportiva, tal como referido, existe uma grande aposta na promoção dos desportos náuticos, pelo que a profunda intervenção no Complexo do Clube náutico foi o maior inves-timento realizado pela autarquia a este nível, bem como a também já mencionada Ciclovia que em breve se irá estender até este espaço de lazer. A população e os visitantes podem também usufruir de espaços como as Piscinas Municipais ou o Pavilhão Gimnodesportivo Municipal. neste momento está a ser preparada a requalificação dos diversos espaços desportivos do Concelho,

que se estendem por todas as Freguesias, de modo a criar melhores condições para acolher as diversas iniciativas através das quais se pretende promover a actividade física entre a população. De referir que existem, em 7 das 8 Freguesias do Concelho, Piscinas/Tanques de aprendizagem de natação, destinados a crianças e jovens que aí têm possibilidade de aprender e aperfeiçoar-se na prática desta modalidade bem como divertir-se e refrescar-se durante os quentes dias de Verão.uma vez que algumas das 8 Freguesias do Con-celho distam da sede de Concelho quase 20 Km e a rede de transportes públicos é nitidamente in-suficiente para assegurar a mobilidade da popu-lação, pretende iniciar-se em breve um plano que permita colmatar esta lacuna.

AA - Ainda em matéria cultural qual o trabalho desenvolvido pela autarquia e a sua conse-quente relação com os diferentes agentes cul-turais existentes no Concelho?MC - a autarquia desenvolve um trabalho muito alargado em matéria cultural, quer através da preservação do património histórico e cultural, quer através da organização de iniciativas que procuram manter vivas as tradições herdadas, es-tabelecendo uma ligação entre passado, presente e futuro, que espelha e consolida a identidade local. neste contexto enquadra-se o trabalho desenvolvido, por exemplo, pelo Museu Munici-pal, que se dedica à recolha, tratamento e divul-

Clube Naútico

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gação de elementos da etnografia local, através de mostras temáticas temporárias que além de pretenderem envolver a população local através da evocação de personalidades e de temas com que se identifiquem, bem como dar a conhecer aos visitantes a cultura do Concelho.a autarquia não pode deixar de reconhecer que os diversos agentes culturais existentes no Con-celho desempenham um papel de extrema im-portância na dinamização da cultura local. Neste sentido, e de forma a incentivar o trabalho que desenvolvem, a autarquia criou um Regulamento de apoio ao associativismo a que as associações e colectividades locais podem candidatar-se, através da apresentação do respectivo plano de actividades anual, de forma a poderem receber os necessários apoios financeiros e de outra natu-reza, que permitam concretizar as suas iniciativas e projectos próprios.O reconhecimento do importante papel desem-penhado pelas associações e colectividades no Concelho reflecte-se também na estreita co-laboração existente entre estas e o Município de Avis e que se traduz na integração daquelas nas iniciativas organizadas por este ou mesmo na co-organização de outras, como é o caso da Feira Medieval, da Feira Franca, do “Viva o Desporto – Jogos Concelhios”, entre muitas outras.

AA - Avis tem um importante património histórico. Dada a sua importância referencial pelos diferentes aspectos histórico-culturais e gastronómicos que os mesmos representam, qual o papel da autarquia na sua preservação e divulgação?MC - avis, pelo papel de destaque que teve na História de Portugal possui uma elevada di-versidade a nível patrimonial, com diversos monumentos classificados como monumentos nacionais ou de interesse público, muitos dos quais são propriedade do Estado ou da Igreja e em relação a esses o nosso papel tem, no fundamen-tal, procurado ser um papel de sensibilização para a importância da sua recuperação, preservação e disponibilização de meios próprios de apoio.na área de competência do Município de avis têm

vindo a ser levadas a cabo diversas intervenções de requalificação do espaço público, nomeada-mente das áreas circundantes a esse património, situado no Centro Histórico, onde se destaca as obras já realizadas na envolvente da Muralha, no largo Dr. Manuel lopes Varela ou no largo Dr. Sérgio de Castro e aquelas que deverão ter início nos próximos dias no Jardim Passeio do Mestre e no largo do Convento. não sendo possível inter-vir no processo de restauro dos monumentos, o Município de avis procura contribuir para a sua valorização através destas intervenções, devida-mente enquadradas no Plano de Pormenor de Salvaguarda e Valorização do Centro Histórico, que entrou em vigor em Março do presente ano, e que visa requalificar e revitalizar esta zona da Vila, nomeadamente pelo incentivo à reutiliza-ção de imóveis degradados e devolutos; man-ter o equilíbrio estético do conjunto edificado, através da definição de regras que condicionam as obras a realizar e os materiais a utilizar por parte dos particulares nos edifícios e no espaço público; promover a fixação de novos habitantes e reordenar a circulação viária e o estacionamen-to, de forma a eliminar as barreiras arquitectóni-cas e permitir uma maior fruição dos espaços.Não obstante a importância da regulamentação e das obras realizadas e projectadas para o Cen-

Muralha e Torre

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tro Histórico, a revitalização deste espaço passa também, em grande parte, por fazer desta zona uma área de vivência quotidiana de habitantes e visitantes. Para o efeito, o Município tem procura-do desenvolver um alargado conjunto de mani-festações de natureza cultural e desportiva que têm como palco o cenário histórico de avis, como é o caso da Feira Medieval ou das provas integra-das no calendário da Taça de Portugal de BTT.A autarquia tem vindo também a adquirir alguns imóveis que pela sua envergadura e valor sim-bólico que encerram em si mesmos são merece-dores de projectos de recuperação, de forma a que, mantendo a sua traça original, possam ser revitalizados através da instalação de comércio, serviços ou equipamentos de uso público.avis irá dispor de uma oferta cultural ainda mais enriquecida com a criação do Centro de Estudos arqueológicos e do Centro Interpretativo da or-dem de S. Bento de avis, que irão dedicar-se ao aprofundamento dos estudos dos respectivos elementos históricos, bem como o Fórum Cul-tural, que se prevê avançar ao longo do actual Quadro de Referência Estratégica nacional, no âmbito do qual foram já apresentadas diversas candidaturas, no plano imaterial, em conjunto com outros agentes e entidades europeias.

AA - De que forma é que o património natural do Concelho de Avis é importante e qual o papel da autarquia na sua preservação?

MC - o Concelho de avis tem o privilégio de dispor de um património natural único, caracterizado pela diversidade da fauna e da flora, existindo um grande empenho na sua preservação. Existem mesmo algumas áreas que, pelas suas características, se encontram integra-das na Rede natura 2000. A autarquia tem, sem dúvida, um papel muito importante na preservação deste património, não só através de intervenções directas e regula-mentares mas também através de acções de sen-sibilização junto da comunidade e das entidades locais, de forma a fazer delas agentes conscientes da necessidade de protecção de algo que é de todos.O empenho na preservação ambiental valeu, já este ano, ao Município de avis a atribuição do Galardão “ECo XXI” pela Fundação para a Educação ambiental em Portugal - associação Bandeira azul da Europa, que traduz o nível de reconhecimento das preocupações ambientais e iniciativas desenvolvidas pelos municípios em prol das boas práticas relativas às políticas de sustentabilidade local, com especial ênfase para a vertente da educação, no âmbito da implemen-tação da agenda 21 local. o Município de avis foi o único Município do Distrito de Portalegre e um dos dois da região do alentejo a serem distin-guidos, graças à avaliação do seu desempenho, através de um conjunto de 23 indicadores de sus-tentabilidade, designadamente em áreas como a Promoção da Educação ambiental, a Participação e agenda local 21, o ordenamento do Território e ambiente urbano, a Qualidade da Água para Consumo Humano, População Servida por Sis-temas de abastecimento de Água, População Servida por Sistemas de Drenagem e Trata-mento de Águas Residuais, Valorização do Papel da Eficiência Energética na Gestão Municipal e Agricultura e Turismo em Espaços Rurais, entre outros, com base na validação criteriosa da infor-mação enviada àquela associação, e constitui o ponto de partida para o fortalecimento de acções continuadas que visam a elevação da sua quali-dade ambiental.A preservação do património natural pressupõe BTT em Avis

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também a sensibilização para o seu valor, nome-adamente através do estreitamento dos laços com o mesmo. neste sentido, pode considerar-se que os esforços desenvolvidos pelo Municí-pio de avis no sentido de proporcionar uma maior dinamização da albufeira do Maranhão, designadamente através da criação de infraestru-turas de lazer e de apoio aos desportos náuticos nas suas margens e da promoção de actividades ao ar livre que beneficiam das características locais para a sua realização, como é o caso de provas BTT, constituem também medidas de sal-vaguarda desta imensa riqueza com que a natu-reza dotou Avis.

AA - Dada a situação estratégica, quais são as perspectivas do Concelho a nível turístico, num futuro próximo?MC - Conforme tivemos oportunidade de afirmar anteriormente, o turismo é, sem dúvida, uma das maiores potencialidades do Concelho e uma das áreas que merecerá um maior investimento num futuro próximo, quer através de iniciativas públi-cas como privadas, sendo que o Município de avis continuará a tentar captar e apoiar novos investi-mentos privados nesta área, desde que baseados em princípios de desenvolvimento sustentável.O património histórico, a riqueza e beleza natu-rais, as actividades culturais, a gastronomia e os

desportos são alguns dos elementos que cativam os turistas que não ficam também indiferentes às infraestruturas criadas para que possam usufruir em pleno daquilo que o Concelho de Avis tem para lhes oferecer.ao longo dos últimos anos, em resultado da es-tratégia de promoção desenvolvida à escala das possibilidades da autarquia e à constante melho-ria da oferta, tanto em termos de infraestruturas como a nível de alojamento, temos assistido ao crescimento do número de turistas que visitam e escolhem avis como destino de férias. Espera-se que a curto-médio prazo, a oferta turística do Concelho, aliada ao aumento da ca-pacidade de alojamento e à continuação de uma estratégia concertada de promoção, contribuam para um maior aumento da procura mas sobre-tudo para o reconhecimento da qualidade da oferta. Não se pretende apostar no desenvolvi-mento de um turismo de massas mas sim num turismo de qualidade, adaptado à capacidade de alojamento do Concelho, mas que seja capaz de garantir uma taxa de ocupação elevado ao longo de todo o ano, tendo como principal objectivo a satisfação dos turistas, para que regressem e partilhem a sua experiência positiva com outras pessoas, pois essa é a melhor forma de divulgar aquilo que temos para oferecer.

Igreja Matriz

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70Vii jOgOS FLORAiS dA ALMA ALenTejAnA - 2007

MODALIDADE QUADRA 1.º prémio

Gabriel Raminhos (concorreu sob o pseudónimo Realista)

Há quem do pouco que almejaPartilhe sempre o que tem...Mas, muitos, do que sobeja,Nunca dão nada a ninguém!

MODALIDADE POEMA1º. prémio

José da Silva Máximo(concorreu sob o pseudónimo Saudoso)

O Meu Lápis Tenho um lápis com que faço Dos meus versos um borrão;É um grande amigalhaçoEm qualquer ocasião.

Tenho pena de gastá-loPor ser tão meu amiguinho;Sempre que vou afiá-loPerco dele um bocadinho.

os golpes que já lhe dei,Sen queixas foi suportado;Nada me diz, mas eu seiQue aos poucos o vou matando...

De cada vez que o seu bicoSe desfaz na minha mão,Eu confesso, bem que ficoSofrendo por compaixão.

Era esbelto, era fino,Escrevia com perfeição;Agora é tão pequeninoQue nem o acho na mão.

Sempre que nele pegavaFazia quadras bem feitas;Era ele quem me ajudavaA fazer rimas direitas.

Tenho de o abandonarTão reduzido ele está!Já deu o que tinha a dar,Já deu tudo, mais não dá!

Deu o seu todo escrevendo;- Muitos versos escreveu!Pouco a pouco foi morrendo,Foi p´ra isso que nasceu!

É o fim que tudo temDesde que no Mundo entre;Qualquer dia vou tambématrás do lápis p`ra sempre!

Quando isso acontecer,após chegar o meu fim,Fiquem os versos p`ra ler,Feitos por ele e por mim!

MODALIDADE CONTO1.º prémio

José António Claro Nunes(concorreu sob o pseudónimo Arlindo Fragoso)

Variações em Ré Menor

Ouça, caro amigo jornalista, eu percebo bem a sua crucial função e sempre a favor da liber-dade de imprensa, mas far-me-á o obséquio de pedir ao distintíssimo fotógrafo que o acompanha para não desgastar a máquina á

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Animação nos VII Jogos Florais

conta deste meu rosto engelhado. (até um quase septuagenário tem ainda uma pontinha de vergonha, mesmo nestes tempos de crise).porque não julgue que se toma uma resolu-ção destas como quem emborca um traçado na tasca do olegário, está longe de ser seme-lhante coisa.

(a rapariga ucraniana que ele colocou a aviar ao balcão, uma amazona com os seios em for-ma de pêra, sob o chamariz de mais dois de-dos de conversa, induz qualquer mortal a reincidir naquela mistela).na verdade, vendo poucos diários desporti-vos, agora, no meu modesto quiosque, deri-vado quer ás edições electrónicas, quer ás exibições apagadas da equipa do Benfica, e o preço do tabaco parece acompanhar a cadên-cia galopante do barril do petróleo, vá-se lá estabelecer uma qualquer conexão macro-económica, motivo pelo qual o que me vai ainda valendo são as peripécias da vida amo-rosa da senhorita Elsa Raposo, Deus a conser-ve por muitos e bons anos, estampada nas

revistas cor-de-rosa. (o repórter caríssimo ponha-se a pau, que se o seu estimado periódico começar a ganhar a vidinha, na TV Sete Dias, a escrever manchetes, para gáudio dos leitores, sobre a saúde dos canídeos de alguma vedeta do jet quatro).ao final da tarde, o enredo imutável de ver a Suzete – com uma reformazita que só dá tro-peçar em tudo quanto é cadeira e a não con-seguir escamar um barbo sem pôr em risco o reduto precário das falanges.- Vale bem a pena andar a fazer o tratamento de laser!

Deixe-me, enfim, retirar uma senha, dá para perceber que há outras dezenas de colegas de infortúnio, quiçá médicos, engenheiros, advo-gados, muita gente da alta, isto de modo a en-viar que algum deles dê um golpe nesta fila para o atendimento, onde é que eu ia no meu raciocínio? ah, sim, não temos filho algum que nos possa valer, uma vez que a nossa Ana Pau-la faleceu nos idos de 1985, num acidente ro-doviário.

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(foi nessa altura que a Suzete, na se-quência de um período de depressão nervo-sa, descobriu, ao afectuar uma bateria de exa-mes, que era diabética)o glaucoma a apoderar-se de ambas as vistas da Suzete, a princípio de uma forma sibilina- Já não vejo bem para conduzir de noite... para a frente, vá que não vá... Mas de lado...para, ultimamente , em guerra declarada, lhe estreitar cada vez mais o campo visual, sem condescendências, de tal sorte que a reputa-da especialista do Hospital de Santa Maria, verificando que a pressão intra-ocular conti-nua a aumentar de forma inexorável,afiançou, tano quanto se pode descodificar a partir do hamurabi do vocabulário médico, que a perda visual causada pelo glaucoma será irreversível e está por dias a cegueira dos dois olhos- Receio, dona Suzete, que a trabeculectomia laser não esteja a conseguir estimular a aber-

tura da malha e a permitir um aumento do escoamento do humor aquoso.E eu, amigo jornalista, ciente que a sobrinha da Clotilde, que vive na Rua dos Remédios, havia recuperado quarenta por cento da visão, num hospital de Havana, quando aqui, neste rectângulo á beira-mar encalhado, con-sideravam que o caso estava perdido, ponha-se no meu lugar, a fzer aritméticas de elástico repuxado para prolongar o dinheiro do dia-a-dia, sabendo também que se não ligasse o nú-mero da Cofidis nenhuma outra instituição da praça me emprestava um cêntimo para a via-gem, compreende, e a precisar de mais algum pecúlio extra, por causa das despesas de esta-dia em Cuba. (pouco outro temos de nosso e de que nos possamos desfazer).Já a entrar em desespero, virei-me para as duas guitarras que o meu saudoso tio Fernan-do me deixou em legado, omnipresentes na

Entrega de prémios

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prateleira da sala com o seu ar patusco de fi-dalguia, algo que jamais pensara alienar e que teria dado ainda em vida, á ana Paula, se ela se encontrasse entre nós- Tu não ponhas as guitarras no prego por minha casa, Armindo!...em bom rigor, nunca consegui distinguir o bordão de primas do bordão de toeiras, nem afiná-las convenientemente, estavam sem uso adequado, mas estas guitarras que ora carrego, caríssimo jornalista, acompanharam em tempos a senhora dona Maria Teresa de Noronha, quando ela actuava, na Emissora Nacional, no programa apresentado por D.João da Câmara, emagine só o meu tio, com um ar concentrado e a careca luzidia, a dedi-lhar as notas do `nossa Fado` ou do `pombali-nho`, suponho que conheça esses temas. (verifico que o prezado fotógrafo que o acompanha, pela sua t-shirt, é mais fã dos Xutos e Pontapés).A Suzete a tropeçar em cada degrau da Esca-dinha dos Remédios, a chocar toda patareca contra um agente da PSP, que por sorte a co-nhecia dos tempos das limpezas, em pleno Campo das Cebolas, e eu, que quando posso deixo o filho da vizinha a tomar conta do quiosque, sem outra solução senão a de lhe dar a mão como um imberbe assolapadamen-te enamorado, aquilo em que nos tornamos, não é verdade? , mas já decidido, decidido de

vez, a confiar ao prestamista as guitarras. (o qual, estou certo, nem quererá sa-ber do facto de estar a avaliar as cúmplices da voz timbrada da Baté, que era como o meu tio carinhosamente tratava a senhora dona Maria Teresa).Raios me empisquem se alguma vez consegui distinguir o bordão de primas do bordão de toeiras, há quem chame terceiras ás toeiras, são demasiadas cordas, os tornozelos da Su-zete a embirrem com a mesinha do hall de en-trada, numa profusão de cacos e vidros, de-pois com a porta do frigorífico, e eu, cheio de vergonha, comprieende, embora caixas dos instrumentos, a rezar a Santa Bárbara para não topar com nenhum cliente do quiosque e a aguardar pela minha vez, nesta fila. (já só tenho cinco companheiros á minha frente)apenas lhe peço, caríssimo, que respeite o meu anonimato na reportagem a publicar e que solicite ao amigo fotógrafo que se desin-teresse da minha carantonha, posso até, quem sabe, retribuir o favor, apresentando-lhes a ra-pariga ucraniana da tasca do olegário, com outro vagar, com outra esperança, com outros modos, na volta de Cuba.

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Fernando santosCarlos sezões

o Fórum alentejo 2015 é um movimento informal de cidadãos, de carácter geracional, que procura mobilizar jovens alentejanos para os desafios do desenvolvimento sustentável do alentejo, nas suas diversas vertentes económicas, sociais, am-bientais e culturais.

A NossA MIssãoo Fórum alentejo 2015 pretende promover a informação, o debate e a discussão sobre os problemas estruturantes, estratégias de desen-volvimento e iniciativas concretas para esta Região, na consciência de que este é um mo-mento determinante para o sucesso das actuais e futuras gerações.

vIsão esTRATéGICAPretendemos contribuir para o desenvolvimento de uma visão estratégica a 10 anos, pensando sempre no longo prazo e não em perspectivas efémeras, imediatistas e tradicionalistas. Este fórum será o catalizador desta visão, contribuin-do com Conhecimento, Inovação, Competências e capacidade de Comunicação e Mobilização de vontades e esforços.

obJeCTIvos do FóRuM AleNTeJo 2015- Promover o debate e o conhecimento das questões estratégicas do desenvolvimento junto da população do Alentejo;- Facilitar consensos e influenciar decisores sobre as opções estruturantes da região;- Formar futuros quadros dirigentes e gestores que possam, com as competências adquiridas, contribuir para um melhor aproveitamento das nossas vantagens competitivas.

oRGANIzAção de eveNTos CoNFeRêNCIAs TeMáTICAs Já ReAlIzAdAs

“o alentejo na Europa – 20 anos depois”“Empreendedorismo no alentejo: criar e ino-var!”“Por um Turismo de Excelência no alentejo”“Tecnologias e Teletrabalho – uma nova oportu-nidade de desenvolvimento!”“Desafios e oportunidades do alentejo Cultural”

Fórum Alentejo 2015Por uma Região da nova geração

deSenVOLViMenTO

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A suA exIsTêNCIA, MIssão e objectivos baseiam-se nas seGuINTes PReMIssAs

- Forte preocupação sobre o futuro da região e sobre a necessidade de caminhar para um novo modelo de desenvolvimento.- Vontade de contribuir de forma activa para um debate aberto, construtivo e participado sobre os desafios que se colocam à região.

o que Nos PReoCuPA- Passados 20 anos sobre a adesão de Portugal à CEE, decorridos 3 Quadros Comunitários de apoio, investidos muitos milhões de Euros, a região alentejo continua longe do nível de vida das regiões mais desenvolvidas da união Euro-peia. - o alentejo está em perda demográfica desde meados do século passado, tem uma população cada vez mais envelhecida e o mais preocupante é que não consegue reter a população mais jovem e mais qualificada, hipotecando o seu futuro. - a história e a geografia não podem continuar a ser desculpas …- num contexto global em que as regiões com-

petem e/ou cooperam umas com as outras, que assumem as suas próprias estratégias de desen-volvimento adaptadas às suas necessidades e potencialidades, que reforçam a sua autonomia e capacidade de intervenção, o alentejo continua a ter dificuldades em definir o seu rumo.

que desAFIos se ColoCAM Ao Modelo de deseNvolvIMeNTo ReGIoNAl

- Ter uM PRoJECTo DE DESEnVolVIMEnTo Do alEnTEJo, em vez de ter muitos projectos de desenvolvimento dispersos pelo Alentejo.- Integrar as dimensões de sustentabilidade e ino-vação no modelo de desenvolvimento.- Dar prioridade ao capital humano e capital social em relação ao capital físico.- assumir uma governação regional mais autóno-ma, mais capacitada e mais articulada.

que AleNTeJo queReMos eM 2015- Queremos um alentejo com um território mais atractivo, com sectores de actividade mais com-petitivos, com recursos humanos mais qualifica-dos, com populações com melhor qualidade de vida.

Conferência organizada em Évora sobre 20 anos do Alentejo na Europa

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- Queremos um alentejo com mais emprego, melhor para investir, que aposte na inovação e na criatividade, que seja um mosaico de destinos turísticos de qualidade, que se adapte a mundo global que premeia a capacidade de planear e agir com audácia e irreverência.- Queremos ter um novo regionalismo activo no Alentejo, que defenda os interesses e neces-sidades da Região, que valorize a identidade e a cultura como factores de mobilização, que per-mita criar vozes e lideranças para uma Região que quer um melhor rumo para o seu futuro.- Queremos um modelo de desenvolvimento regional sustentável que permita ao alentejo caminhar para um futuro mais próspero, com mais oportunidades para os seus cidadãos e que

possa atingir o rumo da convergência europeia em matéria de qualidade de vida. - Queremos um alentejo que se afirme enquanto região de excelência, que valorize os seus recur-sos, os seus territórios, as suas identidades, as suas dinâmicas económicas, os seus agentes e as suas populações.- Queremos uma região alentejo que contribua para o desenvolvimento de Portugal, que produ-za riqueza, que crie empregos, que se afirme num todo nacional em que a união das diversas reali-dades regionais e metropolitanas, traga mais co-esão, melhor competitividade e maior sustenta-bilidade.

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AcTiVidAdeS deSenVOLVidAS

JANEIRO

18 e 19 – apresentação da Peça “alentejanos de Todo o Mundo”, no salão da Cooperativa Piedense24 a 27 – Fim de Semana Alentejano no Centro Cultutal e Recreativo do alto do Moinho, com ex-posição e venda de produtos alentejanos e actu-ação do Grupo de Cavaquinhos e de Cantadeiras da Alma Alentejana

FEVEREIRO

24 – Integrado nas comemorações do 80º. ani-versário da Junta de Freguesia da Cova da Pie-dade actuação do Grupo de Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana.

MARÇO

8 e 16 – Integrado nas comemorações do “Dia Internacional da Mulher” actuação do Grupo de Cavaquinhos e das Cantadeiras da Alma Alente-jana e exposição de trabalhos dos utentes desta associação31 -apresentação do 25.º Boletim informativo da Alma Alentejana28/29/30 – Fim de Semana Alentejano na Junta de Freguesia da Charneca da Caparica, com ex-posição e venda de produtos Alentejanos, ani-mação cultural com Grupos Musicais, de Musica Popular Portuguesa e actuação das Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana

ABRIL

6 – Visita cultural a avis e actuação do Grupo das Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alente-jana

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20 – Visita cultural a Castro Verde com actuação do Grupo de Cavaquinhos e de Cantadeiras da Alma Alentejana na Aldeia de Sete e Almeirim27 – Visita cultural a Almodovar com actuação do Grupo de Cantadeiras na Igreja Matriz e de Cavaquinhos da Alma Alentejana

MAIO

1 – Participação na “Festa da Maia” a convite da Junta de Freguesia da Cova da Piedade, com decoração do Coreto e confecção de doçaria alu-siva a esta festa5 A 12 – Férias de um grupo de utentes da Alma alentejana na Fundação Bissaya Barreto na Tor-reira – Ovar6 – Participação da alma alentejana no concurso de doçaria da aRPIlF – assoc. Reformados Pen-sionista e Idosos do laranjeiro e Feijó25 – Visita cultural a Alqueva 30 – lançamento do livro “Horizontes da Poesia” de Euclides Cavaco e Noite de Fados no Centro de Dia do Pragal31 – Preparação dos VIII JoGoS FloRaIS da alma alentejana, este ano tendo como Patrono “Kali-

das Barreto”31 DE MAIO e 1 DE JUNHO – Fim de Semana no Clube Desportivo de Vale Flores, com exposição e venda de produtos alentejanos e actuação do Grupo de Cantadeiras e de Cavaquinhos da alma Alentejana

JUNHO

21 – Integrado no 21º. Encontro de Cantares alentejanos promovido pelo Clube Recreativo do Feijó, actuação do Grupo das Cantadeiras da Alma Alentejana27 a 6 – 10ª. Feira alma alentejana, na Escola D.antónio da Costa em almada, com exposição e venda de produtos alentejanos e animação cul-tural diária de Grupos Corais e Musicais do alen-tejo e alguns da Margem Sul

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AcTiVidAdeS A deSenVOLVeR

JULHO

9 – Integrado na Semana Cultural do laranjeiro realização de colóquio com Prof.Dr. Manuel Car-rageta sobre saúde e dieta mediterrânica.

JULHO

– Em data a definir lançamento da 21ª. Revista Cultural da Alma Alentejana em Avis.19 – Espectáculo do orfeão universitário do Por-to, na Sociedade Musical Trafariense a partir das 21,30 horas e a actuação do Grupo das Cantadei-ras da Alma Alentejana19 – Participação na Festa amarela promovida pela Câmara Municipal de almada, com forneci-mento de refeições, exposição e venda de produ-tos alentejanos e actuação do Grupo das Canta-deiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana20 – Visita cultural a Almodôvar com actuação do Grupo das Cantadeiras e de Cavquinhos da alma Alentejana

SETEMBRO

9 – Visita à VI Feira agropecuária Transfronteiriça de Vale do Poço – Mértola26 – Concerto de Musica lirica no Centro de Dia do Pragal, a partir das 21, 30 horas12, 13 e 14 – Participação nas Festas em honra de Nossa Senhora da Piedade, a convite da Junta de Freguesia, com exposição e venda de produtos alentejanos e actuação do Grupo de Cantadeiras e de Cavaquinhos da Alma Alentejana

OUTUBRO

12 – Encerramento dos VIII Jogos Florais com ce-rimónia de entrega de prémios e animação cul-tural na Sala Pablo neruda do Forum Municipal Romeu Correia, em Almada17 – Colóquio sobre saúde no Centro de Dia do laranjeiro cujo tema será a diabetes31 – lançamento do Boletim Informativo da alma alentejana nº. 26.

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