anfibios

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1. INTRODUÇÃO Os anfíbios são animais vertebrados, ectotermos, terrestres e/ou aquáticos, que compartilham características derivadas como a estrutura da pele, presença de papilla amphibiorum, complexo opérculo-plectro, dentes pedicelados, presença de bastonetes verdes - provavelmente perdidos no decorrer da evolução, em Gymnophiona -, e estrutura do músculo levator bulbi. A Classe Amphibia é dividida em três linhagens: anuros (ordem Anura), salamandras (ordem Caudata) e cecílias ou cobras-cegas (ordem Gymnophiona). Todos são carnívoros, porém apresentam enorme variedade de modos de locomoção e principalmente reprodução, podendo ocorrer supressão do estágio larval, a viviparidade e cuidado parental de ovos e jovens (POUGH et. al., 1999). Figura 1. Principais grupos de anfíbios atuais. Grupos extintos estão assinalados por uma adaga (†). (Retirado de Pough et. al., 1999, A Vida dos Vertebrados, Atheneu, São Paulo.) No Estado de São Paulo, a ordem Caudata não é encontrada; esta restringe-se a uma única espécie, Bolitoglossa altamazonica, encontrada na Amazônia; a ordem Amphibia é representada no Estado, portanto, pelas outras duas ordens de anfíbios, Anura e Gymnophiona. Dentre estas, a ordem Anura é a mais abundante, com cerca de 180 espécies descritas, correspondendo a 35% da diversidade brasileira e 5% da diversidade mundial. (Feio et al., 1998; Haddad, 1998).

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anfibios

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  • 1. INTRODUO

    Os anfbios so animais vertebrados, ectotermos, terrestres e/ou aquticos,

    que compartilham caractersticas derivadas como a estrutura da pele, presena

    de papilla amphibiorum, complexo oprculo-plectro, dentes pedicelados, presena

    de bastonetes verdes - provavelmente perdidos no decorrer da evoluo, em

    Gymnophiona -, e estrutura do msculo levator bulbi. A Classe Amphibia

    dividida em trs linhagens: anuros (ordem Anura), salamandras (ordem Caudata)

    e ceclias ou cobras-cegas (ordem Gymnophiona). Todos so carnvoros, porm

    apresentam enorme variedade de modos de locomoo e principalmente

    reproduo, podendo ocorrer supresso do estgio larval, a viviparidade e

    cuidado parental de ovos e jovens (POUGH et. al., 1999).

    Figura 1. Principais grupos de anfbios atuais. Grupos extintos esto assinalados por uma

    adaga (). (Retirado de Pough et. al., 1999, A Vida dos Vertebrados, Atheneu, So Paulo.)

    No Estado de So Paulo, a ordem Caudata no encontrada; esta

    restringe-se a uma nica espcie, Bolitoglossa altamazonica, encontrada na

    Amaznia; a ordem Amphibia representada no Estado, portanto, pelas outras

    duas ordens de anfbios, Anura e Gymnophiona. Dentre estas, a ordem Anura a

    mais abundante, com cerca de 180 espcies descritas, correspondendo a 35% da

    diversidade brasileira e 5% da diversidade mundial. (Feio et al., 1998; Haddad,

    1998).

  • Segundo Fonseca et al. (2005), os anfbios so os animais mais

    ameaados entre os vertebrados; nos ltimos sculos, mais de 100 espcies j

    desapareceram e quase um tero das 5.743 espcies existentes so

    consideradas ameaadas de extino. A partir de 1989, notou-se um padro

    global no fenmeno de declnio populacional de anfbios (POUGH et. al., 1999), e

    desde ento esforos esto sendo unidos por cientistas de todo o mundo para se

    tentar encontrar as causas, alm de avaliar as conseqncias e determinar quais

    devem ser as medidas a serem tomadas para evitar prejuzos ainda maiores com

    a perda da diversidade. Algumas causas j foram apontadas como as possveis

    responsveis por esse declnio, como: superexplorao, destruio, alterao ou

    fragmentao de habitat, chuva cida, aumento da radiao ultra-violeta,

    introduo de espcies exticas, mudanas climticas, contaminao por

    substncias qumicas, doenas (em especial a quitridiomicose), deformidades ou

    ainda vrios desses fatores combinados (sinergismos) (STUART et. al., 2004;

    POUGH et. al., 1999; YOUNG, 2001; BECKER, 2007).

  • 2. CONSTATAO DO DECLNIO E ORGANIZAO DE ESFOROS 2.1. Histrico

    O desaparecimento de anfbios comeou a ser discutido no I Congresso

    Mundial de Herpetologia, realizado na Inglaterra, em 1989. Nesse evento, durante

    uma semana, entre apresentaes formais de seus estudos e conversas durante

    refeies e em corredores, cientistas de diversos pases perceberam que muitos

    deles haviam observado a diminuio, ou at mesmo o desaparecimento, de

    espcies que anteriormente eram abundantes. Percebeu-se ento um padro

    global para esse declnio. Em 1990, em decorrncia dessa descoberta, bilogos

    de todo o mundo reuniram-se novamente na Academia Nacional de Cincias dos

    Estados Unidos; nessa ocasio, foram relatados muitos casos de populaes de

    anfbios que estavam desaparecendo, muitas vezes sem nenhuma razo

    aparente (POUGH et. al., 1999). Segundo Stuart et. al. (2004), dados histricos

    indicam que o declnio comeou no incio da dcada de 1970 nos Estados Unidos,

    em Porto Rico e na Austrlia; constatou-se, posteriormente, a severidade do

    declnio: na Costa Rica, 40% da populao total de anfbios havia desaparecido,

    dentro de um curto perodo do final da dcada de 1980.

    2.2. Organizaes

    Para se tentar determinar quais so as causas do declnio de anfbios no

    mundo, comunidade cientfica formou uma fora-tarefa, denominada Fora-Tarefa

    para o Declnio Populacional de Anfbios (DAPTF - Declining Amphibian

    Populations Task Force), abrigada dentro da Comisso para a Sobrevivncia de

    Espcies da Unio Mundial para a Conservao (IUCN International Union for

    Conservation of Nature). As operaes foram direcionadas para a grande

    comunidade cientfica envolvida com a conservao, para tentar dar ao tema a

    ateno apropriada. Em junho de 2006, a DAPTF se uniu ao Grupo de

    Especialistas em Anfbios da IUCN (ASG - IUCN/SSC Amphibian Specialist

    Group) (informaes retiradas dos respectivos sites das organizaes citadas).

  • A IUCN criou uma Lista Vermelha, para determinar quais espcies esto

    correndo risco de extino, e em que grau. Os critrios adotado pela IUCN para

    se determinar as categorias de ameaa so mostrados na figura 2.

    Figura 2. Sistema adotado pela IUCN para determinar o risco relativo de extino. Esquema

    adaptado e traduzido do site da IUCN Red List. Foram mantidas as siglas originais. Original

    disponvel em:

    2.3. Situao no Brasil

    O Brasil, com ao menos 798 espcies, tem uma maior diversidade de

    espcies de anfbios do que qualquer outro pas do mundo, sendo seguido pela

    Colmbia (IUCN, 2009). A Mata Atlntica um dos domnios fitogeogrficos mais

    ricos em diversidade biolgica do planeta; considerado um dos vinte e cinco

    hotspots de biodiversidade, devido ao elevado grau de endemismos e alto grau de

    ameaa (Myers et al., 2000 apud Serafim et. al., 2008). Essa abundncia de

    diversidade de espcies no Brasil pode ser visualizada no mapa construdo pela

    Avaliao Global de Anfbios (GAA Global Amphibian Assessment) e

    disponibilizado pela IUCN (Fig.3):

  • Figura 3. Diversidade global das espcies de anfbios. Nota-se que o Brasil possuidor da

    maios diversidade de espcies de anfbios do mundo, com grande parte situado na regio de Mata

    Atlntica e da Amaznia. Retirado do site da IUCN, disponvel em:

    Segundo Silvano e Segalla (2005), em 1989 foi publicada no Brasil a

    primeira lista de espcies da fauna brasileira ameaada de extino que inclua

    anfbios; apenas uma espcie de anfbio, Paratelmatobius gaigae, constava desta

    lista. Outras oito espcies foram listadas em um anexo como insuficientemente

    conhecidas e presumivelmente ameaadas de extino (BERNARDES et al.,

    1990 apud SILVANO; SEGALLA, 2005). Silvano e Segalla (2005) citam ainda que

    dentre as espcies listadas, constavam Hyla izecksohni, hoje categorizada como

    criticamente em perigo e Phrynomedusa fimbriata, atualmente considerada extinta

    de acordo com os critrios e categorias da Unio Mundial para a Natureza IUCN

    (IUCN, 2001).

    Em maio de 2003, em comemorao ao Dia Internacional da Diversidade

    Biolgica, o Ministrio do Meio Ambiente publicou a Lista Da Fauna Silvestre

    Brasileira Ameaada De Extino. A elaborao da lista contou com a

    colaborao do Ibama, da Fundao Biodiversitas e da Sociedade Brasileira de

    Zoologia, com o apoio da Conservation International e do Instituto Terra Brasilis.

  • (IBAMA, 2009). O livro contendo essa lista foi publicado em 2005, e o Livro

    Vermelho, em 2008 (HADDAD, 2009).

    A B

    Fig. 4. A. Lista da Fauna Brasileira Ameaada de Extino, publicado em 2005 pela Biodiversitas;

    B. Livro Vermelho, publicado em 2008. Fotos retiradas da internet, disponveis em:

    e

    A lista inclui 627 espcies, sendo 160 aves, 154 peixes, 130 invertebrados

    terrestres, 78 invertebrados aquticos, 69 mamferos, 16 anfbios e 20 rpteis

    (IBAMA, 2009; AGNCIA EFE, 2008).

  • 3. O DECLNIO POPULACIONAL EM ANURA

    O Brasil possui segunda maior diversidade de espcies de anfbios, com

    789 espcies conhecidas pertencentes Ordem Anura (SBH 2008). Apesar da

    alta diversidade, na maioria dos lugares o levantamento da anurofauna no est

    nem perto de ser completado; e os estudos geralmente acabam sendo mais

    lentos que a destruio dos ambientes naturais (SERAFIM et. al., 2008). Com a

    crescente ameaa s espcies de anuros, necessrio que se tente conhecer ao

    mximo a diversidade existente, antes que espcies entrem em extino sem

    nem ao menos serem conhecidas.

    Dos 16 anfbios includos na Lista Vermelha publicada pelo Ministrio do

    Meio Ambiente, 15 so anuros. Os resultados obtidos, para Anura, para as

    categorias ameaadas foram: 09 espcies criticamente em perigo (CR), 03

    espcies em perigo (EN) e 03 espcies vulnerveis (VU). Alm dessas, 01

    espcie foi considerada extinta (EX), 01 quase ameaada (NT) e 90 com dados

    insuficientes (DD) (HADDAD, 2009).

    As espcies consideradas ameaadas esto relacionadas na Tabela 1.

    Famlia Bufonidae

    Melanophryniscus dorsalis (Mertens, 1933) Nome popular: Flamenguinho, sapinho-de-barriga-vermelha Categoria de ameaa: Vulnervel UF: RS, SC Melanophryniscus macrogranulosus (Braun, 1973) Nome popular: sapinho-narigudo-de-barriga-vermelha Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: RS

    Famlia Hylidae

    Hyla cymbalum (Bokermann, 1963) Nome popular: Perereca Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: SP Hyla izecksohni (Jim &Caramaschi, 1979) Nome popular: Perereca Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: SP Hylomantis granulosa (Cruz, 1988) Nome popular: Perereca-verde Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: PE

  • Phyllomedusa ayeaye (B. Lutz, 1966) Nome popular: Perereca-de-folhagem-com-perna-reticulada Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: MG Scinax alcatraz (B. Lutz, 1973) Nome popular: perereca Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: SP

    Famlia Leptodactylidae

    Adelophryne baturitensis (Hoogmoed, Borges & Cascon, 1994) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Vulnervel UF: CE Adelophryne maranguapensis (Hoogmoed, Borges & Cascon, 1994) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Em perigo UF: CE Holoaden bradei (B. Lutz, 1958) Nome popular: sapinho Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: MG, RJ

    Odontophrynus moratoi (Jim & Caramaschi, 1980) Nome popular: sapinho Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: SP Paratelmatobius lutzii (Lutz & Carvalho, 1958) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Criticamente em perigo UF: MG Physalaemus soaresi (Izecksohn, 1965) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Em perigo UF: RJ Thoropa lutzi (Cochran, 1938) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Vulnervel UF: ES, MG, RJ Thoropa petropolitana (Wandolleck, 1907) Nome popular: rzinha Categoria de ameaa: Em perigo UF: ES, RJ

    Tabela 1. Relao das espcies de anuros ameaadas, segundo a Lista Da Fauna

    Silvestre Brasileira Ameaada De Extino publicada pelo Ministrio do Meio Ambiente. Retirado

    do portal online AmbienteBrasil, disponvel em:

  • php3?base=./natural/index.html&conteudo=./natural/lista_anfibios.html>. Em acordo com o

    exposto na apresentao utilizada em aula.

    3.1. Causas do Declnio

    Desde que se comeou a buscar os motivos do declnio populacional global

    de anfbios, vrias causas j foram apontadas como possveis responsveis,

    isoladamente ou em conjunto, pelo problema.

    Em determinadas situaes, eventos locais parecem explicar o fenmeno;

    porm, em casos como o do sapo-dourado da Costa Rica, onde no h sinais de

    danos ambientais locais, essa explicao j no mais satisfatria, e parece ser

    necessria uma explicao global (POUGH et. al., 1999). Segundo os autores,

    fatores locais poderiam englobar alteraes de habitats produzidas por

    desmatamento, que se desdobram em muitas outras implicaes prejudiciais aos

    anfbios: destruio de microhabitats; liberao de substncias txicas em seu

    habitat; o envenenamento da gua; e at mesmo o gado, que pelas suas pegadas

    deixadas no solo que para muitas espcies pequenas ou recm-

    metamorfoseados podem se constituir de verdadeiras armadilhas , ou por

    esmagamento, podem matar indivduos que estejam pelo caminho. J como

    exemplos de explicaes mais globais, so citados dois fatores principais: a

    chuva cida e o aumento da radiao ultra-violeta incidente na superfcie

    terrestre.

    Fig. 5. O sapo-dourado, Bufo periglenes, um dos primeiros indicadores do declnio global de

    anfbios. Em 1988, somente oito machos e duas fmeas foram encontrados. Em 1989, encontrou-

    se apenas um macho, sendo este o ltimo registo da espcie. Foto de Charles H. Smith.

    Disponvel em:

  • Toledo et. al. (2003), citando revises de Beebee (1996) e Young et. al.

    (2000), aponta a constante degradao que os ecossistemas naturais vm

    sofrendo, especialmente em virtude de aes antrpicas, como sendo

    considerada o principal fator responsvel pelos declnios populacionais

    observados em diversas espcies de anfbios em escala global. Essa

    degradao implicaria em um dos fatores j mencionados: a alterao ou

    eliminao completa dos microhabitats especficos explorados pelos anuros.

    Outra proposta, muito recente, o da fragmentao de habitats, que

    ajudaria a explicar o porque de espcies de anfbios que tm larvas aquticas so

    aquelas com a maior incidncia de declnio populacional (BECKER et. al., 2007).

    Alm isso, uma proposta de causa que tem tido uma repercusso cada vez maior

    a de infeco por fungo, a quitridiomicose.

    Apesar de no se chegar a um total consenso, a grande maioria dos

    trabalhos consultados acaba relacionando, direta ou indiretamente, as causas do

    problema com as interferncias antrpicas no ambiente. Segundo Fonseca et. al.

    (2005), o desaparecimento das mais de 100 espcies de anfbios nos ltimos

    sculos ocorreu de forma mais acentuada nos ltimos 30 a 40 anos. Esse fato

    pode ser considerado um indicativo da relao estreita do declnio com as aes

    do ser humano.

    Trs causas principais foram selecionadas pela Avaliao Global de

    Anfbios (GAA Global Amphibian Assessment) para montar, a partir da Lista

    Vermelha da IUCN de 2008, um panorama geogrfico global das causas que

    estariam ameaando os anfbios nos diferentes lugares do mundo, incluindo as

    situaes em que mais de um fator tem influncia. O mapa obtido est na Figura

    6.

  • Fig. 6. Padro geogrfico das causas dominantes do rpido declnio em espcies de anfbios:

    super explorao (over-exploited - tons de azul); reduo de habitats (reduced-habitat - tons de

    verde); e declnio sem causa determinada (enigmatic decline tons de vermelho). Onde dois tipos

    de ameaas se sobrepe na mesma primeira clula, a cor referente ao tipo de ameaa com o

    maior nmero de espcies em rpido declnio naquela clula est indicado no mapa. Cores

    intermedirias so mostradas nos casos de mesmo nmero de espcies experienciarem dois tipos

    de declnio na mesma clula, como mostrado na legenda. Cores mais escuras correspondem a

    maior nmero de espcies em rpido declnio de qualquer tipo (no apenas do tipo dominante na

    clula em questo). Retirado e traduzido de Stuart et. al., 2004, disponvel em:

    Alm desse mapa, foi produzido ainda um grfico, com as mesmas trs

    causas principais de ameaa, dessa vez utilizadas como categorias para dividir as

    famlias com ao menos uma espcie em declnio segundo a causa majoritria do

    rpido declnio (Figura 7).

  • Fig. 7. Porcentagens e nmeros de espcies com rpido declnio populacional (rapidly declining

    species) em famlias de anfbios (com ao menos uma espcie em rpido declnio), divididas em

    grupos que refletem a causa majoritria do declnio: superexplorao (over-exploited); perda de

    habitat (reduced-habitat); ou declnio sem causa determinada (enigmatic decline). Retirado de

    Stuart et. al., 2004, disponvel em:

    Os principais fatores, provveis e confirmados, que tm sido mencionados

    mais os processos decorrentes deles que levam ao declnio populacional so

    apresentadas a seguir (Retirados de HALLIDAY, AmphibiaWeb, 2009 baseado

    em YOUNG et. al., 2001).

    3.1.1. Destruio, alterao ou fragmentao de habitat

    Processo: Estradas, espcies introduzidas ou outros fatores separam as populaes remanescentes de anfbios umas das outras.

  • A fragmentao de habitats (habitat split) como fator uma descoberta

    recente, que pode ser definida como uma desconexo induzida pelo homem entre

    habitat usados por diferentes estgios do desenvolvimento de uma espcie. Essa

    fragmentao fora os anfbios que vivem nas florestas, cujas larvas so

    aquticas, a se arriscar durante as migraes entre os habitats terrestre e

    aqutico (BECKER et. al., 2007). Os autores descobriram que, na Mata Atlntica

    brasileira, a fragmentao de habitat afeta negativamente as espcies com larvas

    aquticas, porm no as espcies com desenvolvimento terrestre, que podem

    completar seu ciclo de vida nas reas de floresta. Isso pode ser considerado uma

    evidncia de que os anuros morrem, em grande parte, nos perodos em que se

    deslocam para a reproduo em cursos dgua e em que as larvas e os recm-

    metamorfoseados tentam atingir o ambiente terrestre, para se estabelecer na fase

    adulta.

    3.1.2. Espcies introduzidas

    Processo: Espcies no-nativas predam ou compete com as espcies nativas de anfbios.

    Segundo Fonseca et.al. (2008), a introduo de espcies exticas em

    ambientes de espcies nativas pode ser considerada a segunda maior causa

    mundial de extino da diversidade biolgica, atrs apenas da destruio dos

    hbitats pelo homem.. Sem seus predadores naturais, esses animais acabam

    dominando o ambiente e as populaes de anfbios nativos acabam sofrendo com

    a predao por parte de peixes, rpteis e at mesmo outros anfbios, que no so

    seus predadores naturais, como o caso da R-touro (figura 8). Essa r, de

    origem norte-americana, que vem se espalhando por toda a Mata Atlntica, tem

    se mostrado uma grande ameaa s populaes nativas de sapos, rs e

    pererecas., afirmam os autores.

  • Fig. 8. R-touro (Rana catsbeiana), espcie extica introduzida na Mata Atlntica.

    3.1.3. Superexplorao

    Processo: Anfbios so removidos da natureza e vendidos como alimento, bichos de estimao ou para suprir o mercado mdico e biolgico.

    3.1.4. Mudanas climticas

    Processo: Os anfbios so extremamente sensveis a pequenas alteraes de temperatura e umidade. Mudanas nos padres climticos globais podem

    alterar o comportamento reprodutivo, diminuir as funes imunolgicas e

    aumentar a sensiblidade dos anfbios a contaminantes qumicos.

    medida que os efeitos catastrficos do aquecimento global vm se

    tornando cada vez mais claros, muitas espcies vm sendo foradas a se retirar

    de cena para sempre. Mudanas nos padres climticos, como a altitude mdia

    do banco de nuvens, podem transformar uma regio montanhosa originalmente

    mida em uma regio seca. No caso dos anfbios, as alteraes climticas podem

    mudar at mesmo a dinmica de muitas doenas que os infectam. Tomando um

    exemplo trgico, estima-se que quase 70% das 110 espcies de Atelopus, que

    so anfbios endmicos dos trpicos americanos, vm sofrendo drsticos

  • declnios populacionais associados a um surto de quitridiomicose promovido por

    mudanas climticas na regio estudada. (FONSECA et.al., 2008)

    3.1.5. Radiao UV-B

    Processo: Os nveis de radiao UV-B na atmosfera tem aumentado significativamente nas ltimas dcadas. Pesquisadores descobriram que a

    radiao ultra-violeta podem matar diretamennte os anfbios, causar efeitos sub

    letais, bem como um retardo nas taxas de crescimento e disfuno imunolgica, e

    funcionar de modo sinrgico com contaminantes, patgenos e mudanas

    climticas.

    3.1.6. Contaminantes qumicos

    Processo: substncias qumicas (ex. pesticidas, metais pesados, acidificao e fertilizantes base de nitrognio) podemter efeitos letais, sub letais,

    direta ou indiretamente, nos anfbios. Esses efeitos podem incluir morte,

    decrscimo das taxas de crescimento, anomalias comportamentais e no

    desenvolvimento, decrscimo no sucesso reprodutivo, enfraquecimento do

    sistema imunolgico e/ou hermafroditismo. Pought et. al. (1999) cita, entre as substncias que acabam afetando os

    habitats dos anfbios podendo causas a morte em larga escala, o cianureto

    utilizado para extrao de ouro, que envenena a gua superficial, e as pedras

    retiradas de minas, que lberam substncias txicas. Alm disso, h ainda muitos

    outros exemplos, como os poos de petrleo que espalham hidrocarbonetos

    txicos no ambiente.

    3.1.7. Doenas - Quitridiomicose

    Processo: Novas doenas ou maior suscetibilidade doenas j existentes levam adultos e larvas morte.

    Entre as causas apontadas relacionadas doenas, um dos maiores

    destaques para a quitridiomicose.

  • A quitridiomicose uma infeco pelo fungo Batrachochytrium

    dendrobatidis, cujo nome foi formalmente proposto por Langcore et. al., 1999.

    Neste trabalho, os autores afirmam que anuros mantidos em cativeiro, assim

    como os que viviam na natureza, da Amrica do Norte, Amrica Central e

    Austrlia estavam morrendo com uma infeco epidrmica causada por um fungo

    chytridiomyceto, no identificado at ento.

    O fungo j havia sido determinado como sendo da ordem Chytridiales,

    pertencente ao filo Chytridiomycota. As alteraes causadas na epiderme pelo

    Batrachochytrium dendrobatidis foram encontradas um ano antes, em anuros

    adultos doentes e mortos, coletados na Austrlia e no Panam, durante eventos

    de mortalidade em massa associados a declnios populacionais significativos

    (BERGER et.al., 1998). Na Austrlia e Amrica Central tambm foi encontrada a

    doena, associada mortalidade e morbidade de anuros tanto cativos quanto

    vivendo na natureza. Foi proposto ento que essa deveria ser uma das principais

    causas dos declnios populacionais de anfbios ocorridos pelo mundo.

    Um estudo revelou que anuros (Rana muscosa) infectados

    experimentalmente com B. dendrobatidis, mantidos em uma faixa de 17 a 22C e

    acompanhados durante todo o processo de metamorfose, desenvolviam a doena

    da mesma forma. Porm, a taxa de mortalidade pra aqueles mantidos em 17C foi

    de 95% passados 35 dias da metamorfose, enquanto que no grupo mantido em

    22C, apenas 50% dos indivduos morreram. Como ambas as temperaturas esto

    na faixa considerada ideal para o crescimento do fungo, os pesquisadores do

    estudo propuseram que a temperatura na verdade surte efeito sobre a resistncia

    do hospedeiro anuro ao fungo, e no sobre o fungo somente (ANDRE et.al.,

    2008).

    Alm da quitridiomicose, outras doenas podem causar grandes estragos

    em populaes de anuros, como aquelas causadas por vermes trematdeos,

    vrus e outros fungos (FONSECA et. al., 2008)

  • 3.1.8. Deformidades

    Processo: Houve um recente e global aumento de deformidades (ou m formaes) em populaes de anfbios.

    Fatores como a acidez podem acarretar em deformidades durante o

    desenvolvimento dos anfbios, desde ovos at larvas (POUGH et. al., 1999).

    Outro fator que causa deformidades o aumento no nmero de indivduos

    hbridos, resultado, talvez, da perda crescente de habitats devido a interferncias

    antrpicas e o consequente problema encontrado pelos animais no momento da

    reproduo, com poucos territrios adequados, e sobreposio de espcies que

    em outras situaes teriam seus processos reprodutivos separados espacial ou

    temporalmente.

    3.1.9. Sinergismos

    Processo: Mltiplos fatores podem agir em conjunto para causar a mortalidade ou efeitos sub letais.

    Segundo Pough et.al. (1999), a maioria dos declnios provavelmente

    refletem efeitos combinados, de diversos motivos: condies fsicas (acidez,

    radiao UV) podem interagir com fatores biolgicos. Anfbios estressados por

    fatores como chuva cida podem ter sua susceptibilidade a doenas e parasitas

    aumentada expressivamente. O problema desses mecanismos que, por sua

    complexidade, so de difcil identificao e de mais difcil ainda remediao.

    4. CONSEQNCIAS

    Na Mata Atlntica, encontram-se 280 espcies de anfbios, sendo que

    destas, 253 so endmicas (Myers et al. 2000 apud Serafim et. al., 2008). Com os

    fatores de ameaa, muitas espcies podem ter um rpido desaparecimento, por

    serem populaes que dependem altamente das condies especficas de seu

    habitat natural. O desaparecimento de poucas populaes, nesses casos, pode

    significar a extino de uma ou vrias espcies.

  • Segundo Stebbins e Cohen (1995), todos os anfbios, com exceo de

    muitas larvas de anuros, alimentam-se predominantemente de invertebrados,

    sendo que seu impacto sobre esse recurso alimentar altamente expressivo. Um

    bom exemplo, citado por Stebbins e Cohen, neste mesmo trabalho, para ilustrar

    esse fato, a estimativa feita pelos pesquisadores Bruce e Christiansen em 1976.

    Eles estimaram que as populaes de uma pequena lagoa do diminuto anuro

    Acris crepitans, de mil indivduos, em condies prximas s de seu estudo

    poderiam chegar a consumir 4,8 milhes de pequenos invertebrados por ano, em

    sua maioria insetos. Dessa forma, pode-se antever que uma das graves

    conseqncias no declnio populacional dos anfbios seria o aumento na

    populao de muitos grupos de invertebrados que deixaro de ser predados.

    Outra conseqncia ruim, mas de forma mais direta para o homem, seria a

    perda de recursos biolgicos valiosos, como as substncias qumicas existentes

    nas peles dos anuros, que tm grande potencial mdico e farmacutico. A perda

    da biodiversidade de todas as formas desastrosas, afinal, so milhares de anos

    de evoluo de carcactersticas que, com a extino, talvez nunca voltem a

    ocorrer.

    Inmeras conseqncias ruins poderiam ser listadas, a grande maioria

    culminando em espcies ameaadas de extino ou extintas, seja por um fator ou

    por outro, grande parte das vezes pelo conjunto de fatores. Nem todas as

    conseqncias podero ser avaliada de antemo, principalmente pela

    complexidade gerada pela relao de interdependncia do sistema como um

    todo.

    5. CONCLUSO

    A situao do declnio mundial de anfbios, principalmente no Brasil (e mais

    especificamente na Mata Atlntica e na regio amaznica), demanda ateno,

    esforos e medidas de urgncia. Muitas pesquisas ainda necessitam ser

    realizadas, tanto para montar um panorama cada vez mais acurado do processo

    de declnio, quanto para se descobrir formas de se contornar o problema.

  • Uma concluso evidente que o desmatamento, a interferncia antrpica

    de um modo geral, precisar ser reavaliada com mxima urgncia, para se evitar

    danos ainda maiores biodiversidade e ao ambiente. Um fato a ser enfatizado

    que, uma vez desequilibrado, o sistema por ser interdependente tender a se

    desorganizar cada vez mais, pois um fator pode ocasionar o agravamento ou a

    gerao de novos fatores de ameaa.

    Alm da remediao dos problemas causados pela atividade humana,

    acrescido da conscientizao para que no se causem novos desastres,

    necessrio que se conhea cada vez mais, se faa cada vez mais estudos sobre

    a biodiversidade, para se entender tambm os processos que ocorrem

    naturalmente, e que podem vir a ser, em maior ou menor proporo, igualmente

    desastrosos.

    Referncias:

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