andrei_uller_dissertacao.pdf
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC
CENTRO DE ARTES CEART - DEPARTAMENTO DE MSICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM MSICA - PPGMUS
ANDREI JAN HOFFMANN ULLER
PROCESSOS DE ENSINO DE VIOLO EM ESCOLAS LIVRES DE
MSICA: UM ESTUDO DE CASO DAS PRTICAS PEDAGGICAS DE
DOIS PROFESSORES
FLORIANPOLIS SANTA CATARINA
2012
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Ficha Elaborada pela Biblioteca Central da UDESC
U41p Uller, Andrei Jan Hoffmann Processos de ensino de violo em escolas livres de msica: um estudo de caso dasprticas pedaggicas de dois professores / Andrei Jan Hoffmann Uller, 2012. 174 p. : il. ; 30 cm
Bibliografia: p. 156-160 Orientadora: Profa. Dra. Regina Finck Schambeck Dissertao (mestrado) Universidade do Estado de Santa Catarina, Centro deArtes, Mestrado em Msica, Florianpolis, 2012.
1. Msica Instruo e Estudo 2. Violo Instruo e Estudo. I. Schambeck,Regina Finck. - II. Universidade do Estado de Santa Catarina, Centro de Artes, Mestradoem Msica. III. Ttulo.
CDD. 787.61007 20 ed.
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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC
CENTRO DE ARTES CEART - DEPARTAMENTO DE MSICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM MSICA - PPGMUS
ANDREI JAN HOFFMANN ULLER
PROCESSOS DE ENSINO DE VIOLO EM ESCOLAS LIVRES DE
MSICA: UM ESTUDO DE CASO DAS PRTICAS PEDAGGICAS DE
DOIS PROFESSORES
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Msica na subrea Educao
Musical como requisito parcial para obteno
do ttulo de mestre.
Orientadora: Regina Finck Schambeck
FLORIANPOLIS SANTA CATARINA
2012
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Para a minha companheira e esposa, JuscieleNicolladelli, e para meus pais.
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AGRADECIMENTOS
orientadora Regina Finck Schambeck, por aceitar o projeto e desenvolver parte de minhaautonomia.
Aos professores Srgio Figueiredo, Viviane Beineke, Jos Soares e Daniel Wolff, pelas sugestes.
Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CAPES, por conceder abolsa de estudos no perodo de um ano do mestrado.
Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior CAPES, por conceder abolsa de estudos, no perodo de um semestre, de intercmbio Brasil/EUA no curso dobacharelado.
A todos os professores do Programa de Ps-Graduao em Msica da UDESC.
A todos os professores da graduao em msica da UDESC.
Ao professor Renato Mr, pelas primeiras aulas de violo clssico e pelo seu incentivo.
A Mailon Bugmann e William Pofhal pela amizade.
Aos professores do bacharelado em violo, Andr Ferreira de Moura, Jlio Alves (MarshallUniversity) Luiz Mantovani, Alisson Alpio e Bruno Madeira, pela troca de ideias.
Aos colegas do mestrado e colegas do bacharelado pela partilha de informaes.
A Mrcia Porto, por sua bondade e ateno.
A Rafael Marciniak e Daniela Vieira, pela troca de ideias artsticas e pela amizade.
Aos demais integrantes da banda Rhestus, Marcos Diegel, Richard Schmidt, Alexsander Lehber eTiago Sestrem (hoje, ex-integrante), pela amizade.
A todos os colegas metaleiros do Vale do Itaja, pela amizade.
Msica, por sua existncia.
A todos que ajudaram, diretamente ou indiretamente, na realizao deste trabalho.
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Todavia, o conhecimento sensorial no onico critrio de verdade, pois a cincia,assim como a arte, conforme observaLanger, ocupa-se de smbolos. (MAYER,1976, p.590).
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RESUMO
Este trabalho teve como meta representar os processos de ensino de violo de dois professores emduas escolas livres de msica no municpio de Blumenau, estado de Santa Catarina. Procurou-se,tambm, investigar como esses professores avaliam a sua prpria atuao pedaggica. Abibliografia utilizada esteve embasada em textos que abrangem educao musical atravs doensino do violo e, como referencial terico, as concepes do professor de instrumento erelaes professor-aluno a partir dos pressupostos de Hallam (1998), Lehmann, Sloboda e Woody(2007). A metodologia utilizada para este trabalho foi de carter qualitativo atravs do estudo decaso. A investigao foi realizada com o apoio da reflexo sobre a ao proposta por Schn(2000). Para identificar os processos de ensino dos professores Marcelo e Wallace foramempregadas tcnicas de pesquisa em duas etapas. Na primeira etapa, foram realizadosquestionrios para identificar o perfil dos professores e o contexto onde atuam. Na segunda etapa,foram observadas e gravadas, em vdeo, seis aulas. A partir dessas observaes, o pesquisadorelaborou um roteiro de entrevista semi-estruturada com o objetivo de identificar como esses doisprofessores de violo percebem as suas prticas pedaggicas a partir da reflexo depois da ao.A anlise foi estruturada em duas sees. Na primeira, o olhar do pesquisador que destacapontos especficos das prticas pedaggicas dos professores investigados, indicando,principalmente, como resolvem questes relativas s tcnicas violonsticas, estudo doinstrumento, situaes de conflito, dificuldades de aprendizagem, entre outros. Na segunda seo, o olhar dos professores que guia o pesquisador para os aspectos considerados importantes sobreas aulas. A partir da anlise, observa-se que cada professor utiliza diferentes formas de serelacionar com seus alunos. Assistir aos vdeos gravados, possibilitou aos professores umareflexo sobre a ao e a reviso de alguns procedimentos utilizados nas prticas pedaggicas.Marcelo e Wallace, com base na observao das prprias aulas, apontam para mudanas noplanejamento, da forma como se comunicam com os alunos e tambm da abordagem e seleodos contedos a serem adotados em aulas de violo.
Palavras-chave: educao musical - violo - processos de ensino
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ABSTRACTS
This work has the goal to portray the guitar teaching processes of two teachers in two musicschools of Blumenau city, Santa Catarina State. Also, tried to investigate how this teachersevaluate their own pedagogical action. The bibliography used was based on texts that covermusic education through guitar teaching and as theoretical reference the conceptions ofinstrumental teacher and relations teacher-student proposed by Hallam (1998), Lehmann,Sloboda and Woody (2007). The methodology used for this work was qualitative by case study.The investigation was realized supported by the reflection on action purposed by Schn (2000).To identify the teaching processes of teachers Marcelo and Wallace were used researchtechniques in two stages. The first stage were realized questionaries to identify the teachersprofiles and the context where they act. In the second stage were observed and recorded in videosix lessons. By these observations the researcher structured a script of semi-structured interviewwith the goal to identify how these two guitar teachers perceived their pedagogical practice byreflection after action. The analysis was structured in two sections. In first is the researcher'sobservation that highlights specific points of pedagogical practices of investigated teachers,indicating, mainly, how solve questions relative to guitar techniques, instrument practicing,situations of conflict, learning difficulties, and others. In the second section are the teacher'sobservations that guides the researcher to aspects considered important on lessons. From analysisapparently that each teacher used different ways to relate with their students. Watch the recordedvideos allowed the teachers a reflection on action and a revise of some procedures used inpedagogical practices. Marcelo and Wallace by the observation of their own lessons, point tochanges in planning, the way how they communicates with their students and also the approachin contents selection to be used in guitar lessons.
Key-words: music education - guitar - teaching processes
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LISTA DE GRFICOS
Grfico 01: elaborado pelo autor segundo o ciclo instrucional de Price (1992)............................................................24
Grfico 02: professor de instrumento e opes de mercado.........................................................................................26
Grfico 03: elaborado pelo autor segundo a descrio de Schn sobre o processo da reflexo sobre ao..................29
Grfico 04: elementos representados em mtodos e pesquisas sobre o ensino do violo. (quadro elaborado pelo autor)
........................................................................................................................................................................................34
Grfico 05: levada rtmica 1 durante a cano Ser (Legio Urbana)...........................................................................65
Grfico 06: primeira verso levada rtmica 2.................................................................................................................71
Grfico 07: segunda verso levada rtmica 2.................................................................................................................72
Grfico 08: levada rtmica 1 e outra possibilidade de movimentao da m.d. utilizada na cano Hoje a Noite no
tem Luar (Legio Urbana)............................................................................................................................................102
Grfico 09: dedilhado 1 durante a cano Hoje a Noite No Tem Luar (Legio Urbana)..........................................104
Grfico 10: levada rtmica 3 durante a cano Creep (Radiohead).............................................................................114
Grfico 11: proposta de dedilhado 2 durante a cano Creep (Radiohead).................................................................115
Grfico 12: dedilhado 3 durante a cano Total Eclipse of the Heart (Glee)..............................................................117
Grfico 13: verso reduzida do dedilhado 3................................................................................................................117
Grfico 14: levada rtmica 4 durante a cano One More Time (Paralamas do Sucesso)...........................................127
Grfico 15: levada rtmica 4 alternativa para demonstrar a utilizao do som abafado..............................................129
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LISTA DE TABELAS
Tabela 01: elaborado pelo autor segundo a citao de Lehman, Sloboda e Woody sobre a pesquisa de Reid (2001). 16
Tabela 02: elaborado pelo autor segundo as representaes funcionais de Lehman, Sloboda e Woody (2007).........17
Tabela 03: elaborado pelo autor segundo as perspectivas da relao professor-estudante de Hallam (1998)............18
Tabela 04: elaborado pelo autor segundo as concepes da relao professor-estudante de Hallam (1998).............19
Tabela 05: elaborado pelo autor segundo as intenes pedaggicas apresentadas por Hallam (1998)....................22
Tabela 06: elaborado pelo autor segundo as perspectivas de ser professor de Santos (2011, p.46).........................24
Tabela 07: datas das observaes e gravaes............................................................................................48
Tabela 08: equipamentos utilizados para a coleta de dados...........................................................................49
Tabela 09: categorias estabelecidas para a entrevista semi-estruturada............................................................51
Tabela 10: coleta de dados atravs da gravao de aulas e gravao de entrevistas semi-estruturadas...................53
Tabela 11: tpicos de contedos ministrados pelo professor Marcelo da primeira semana com a aluna Suzana.......55
Tabela 12: tpicos de contedos ministrados pelo professor Marcelo da segunda semana com a aluna Suzana........56
Tabela 13: tpicos de contedos ministrados pelo professor Marcelo da terceira semana com a aluna Suzana.........57
Tabela 14: tpicos de contedos ministrados pelo professor Wallace da primeira semana com a aluna Teresa.........58
Tabela 15: tpicos de contedos ministrados pelo professor Wallace da segunda semana com a aluna Teresa.........58
Tabela 16: tpicos de contedos ministrados pelo professor Wallace da terceira semana com a aluna Teresa..........59
Tabela 17: nomes fictcios atribudos a escola e participantes de acordo com os critrios ticos de Creswell..........60
Tabela 18: principais referncias respondidas pelo professor Marcelo............................................................61
Tabela 19: principais referncias respondidas pelo professor Wallace.............................................................63
Tabela 20: tpicos assistidos da primeira aula pelo professor Marcelo............................................................65
Tabela 21: tpicos assistidos da segunda aula pelo professor Marcelo.............................................................67
Tabela 22: tpicos assistidos da terceira aula pelo professor Marcelo.............................................................82
Tabela 23: tpicos assistidos da primeira aula pelo professor Wallace............................................................97
Tabela 24: tpicos assistidos da segunda aula pelo professor Wallace...........................................................105
Tabela 25: tpicos assistidos da terceira aula pelo professor Wallace............................................................117
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SUMRIOINTRODUO.............................................................................................................................13
1 REVISO DE LITERATURA..................................................................................................16
1.1 FORMAO DO PROFESSOR ........................................................................................161.1.1 O Professor de instrumento .........................................................................................171.1.2 O Professor Reflexivo .................................................................................................33
1.2 ENSINO DO VIOLO .......................................................................................................391.2.1 Mtodos de ensino de violo........................................................................................391.2.2 Ensino individual de violo..........................................................................................431.2.3 Ensino coletivo de violo.............................................................................................441.2.4 Repertrio.....................................................................................................................48
2 METODOLOGIA......................................................................................................................50
2.1 O ESTUDO DE CASO........................................................................................................522.2 FONTES DE DADOS E DATAS DAS OBSERVAES E GRAVAES......................532.3 PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS................................................................54
2.3.1 Questionrio.................................................................................................................552.3.2 Entrevista semi-estruturada .........................................................................................55
2.4 CRITRIOS TICOS..........................................................................................................663 CONTEXTUALIZAO DOS PROFISSIONAIS INVESTIGADOS................................68
3.1 CONTEXTO DA ESCOLA DE MSICA ANDANTE...................................................683.2 PERFIL DO PROFESSOR MARCELO..............................................................................693.3 CONTEXTO DA ESCOLA DE MSICA PRESTO ..........................................................713.4 PERFIL DO PROFESSOR WALLACE..............................................................................72
4 PRTICAS PEDAGGICAS: DESCRIO DAS AULAS A.............................................74
PARTIR DO OLHAR DO PESQUISADOR..............................................................................74
4.1 PROFESSOR MARCELO AULA 1...................................................................................744.1.1 Levada rtmica 1 na cano Ser (Legio Urbana).....................................................744.1.2 Pestana .........................................................................................................................774.1.3 Analogia com a bateria.................................................................................................81
4.2 PROFESSOR MARCELO AULA 2 .................................................................................844.2.1 Cano Ser..................................................................................................................844.2.2 Sobre o violo com encordoamento de ao..................................................................864.2.3 Pestana..........................................................................................................................884.2.4 Estudo do aluno............................................................................................................904.2.5 Acorde e posicionamento dos dedos da mo esquerda................................................904.2.6 Postura apoiada na perna esquerda...............................................................................924.2.7 Ritmo novo...................................................................................................................94
4.3 PROFESSOR MARCELO AULA 3....................................................................................954.3.1 Cano O tempo no para............................................................................................954.3.2 Solo..............................................................................................................................964.3.3 Contagem do ritmo.......................................................................................................98
4.4 PROFESSOR WALLACE AULA 1..................................................................................1004.4.1 Ensino de um padro rtmico.....................................................................................100
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4.4.2 Tenso ocasionada pela cmera..................................................................................1034.4.3 Toque juntamente com o celular................................................................................105
4.5 PROFESSOR WALLACE AULA 2.................................................................................1094 5.1 Dedilhado...................................................................................................................1094.5.2 Aluna dedilhando e professor arpejando o acorde......................................................1104.5.3 Cano Total Eclipse of the Heart..............................................................................1114.5.4 Dedilhado...................................................................................................................1124.5.5 Capo tasto e toque juntamente com a reproduo do celular.....................................114
4.6 PROFESSOR WALLACE AULA 3..................................................................................1164.6.1 Escrita do acorde para canhoto...................................................................................1164.6.2 Cano One More Time.............................................................................................1184.6.3 Ritmo do Reggae........................................................................................................1194.6.4 Dois compassos para cada acorde..............................................................................1204.6.5 O som abafado............................................................................................................121
5 AS PRTICAS DE ENSINO: REFLEXO SOBRE A AO A.......................................123
PARTIR DO USO DE VDEO ..................................................................................................123
5.1 O VDEO, ELE ESTENDE ESSE PROCESSO DE REFLEXO: VDEO AULA 1(PROFESSOR MARCELO)....................................................................................................1235.2 ASSISTINDO AO VDEO MUDA ...: VDEO AULA 2 (PROFESSOR.....................130MARCELO).............................................................................................................................1305.3 O PLANEJAMENTO, A ORGANIZAO DA AULA, A EXPOSIO DOSCONTEDOS: VDEO AULA 3 (PROFESSOR MARCELO)............................................1345.4 A QUANTIDADE DE TEMPO: VDEO AULA 1 (PROFESSOR WALLACE)..........1385.5 EU ACHO QUE EU NO MUDARIA NADA: VDEO AULA 2................................143(PROFESSOR WALLACE)....................................................................................................1435.6 OBSERVAR DE UM OUTRO NGULO COMO QUE AS AES QUE O ALUNOPLANEJOU ENTRARAM EM PRTICA: VDEO AULA 3 (PROFESSOR WALLACE) ..................................................................................................................................................146
6 CONSIDERAES FINAIS..................................................................................................149
REFERNCIAS..........................................................................................................................156
ANEXOS......................................................................................................................................161
ANEXO 1 ................................................................................................................................162Carta de apresentao ao professor .........................................................................................162ANEXO 2 ................................................................................................................................164Termo de Consentimento.........................................................................................................164ANEXO 3.................................................................................................................................166Questionrio.............................................................................................................................166ANEXO 4.................................................................................................................................169Roteiro da entrevista semi-estruturada gravada.......................................................................169ANEXO 5.................................................................................................................................171Roteiro para os trechos dos vdeos reproduzidos.....................................................................171
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INTRODUO
O motivo que me levou a escrever este trabalho est baseado em minha prpria formao
musical. O violo foi o instrumento musical que escolhi para educar-me e tambm me educar
musicalmente, tendo minhas primeiras aulas aos nove anos de idade. Aps as primeiras
experincias com o violo, o meu interesse em desenvolver mais e melhor o meu desempenho
com o instrumento e a minha formao docente no parou. Participei de oficinas de msica,
workshops, masterclasses, festivais de msica, conclui o curso de Licenciatura em Msica em
2008 e, no momento, tambm curso, concomitante ao mestrado, o curso de bacharelado em
violo.
No perodo em que iniciei meus estudos na ps-graduao, posso citar, como muito
importante para a minha formao, o intercmbio com a Marshall University (EUA). Esta
experincia, de seis meses de durao, atravs da disciplina de Pedagogia do Violo, foi decisiva
para a escolha do tema de pesquisa, pois tive como atribuio ministrar aulas para os alunos de
bacharelado em violo daquela universidade. Como estratgia de ensino, o professor titular da
disciplina, nos EUA, usou, como recurso, a gravao em vdeo para posterior anlise de todos os
alunos da disciplina. Ao indagar o professor sobre esta estratgia e verificar na minha prpria
prtica pedaggica a contribuio da reflexo sobre a ao a partir do uso desses vdeos,
surgiram novas ideias, construes e planejamentos. A justificativa, pois, para a escolha dessa
temtica e desses procedimentos metodolgicos foi baseada nesta experincia e, portanto, o
trabalho realizado foi pautado na prtica de ensino de violo a partir do estudo de caso de dois
professores em escolas livres de msica na cidade de Blumenau/SC.
O violo talvez por ser um instrumento de fcil aquisio (VIEIRA, 2009, p.109), se
comparado ao piano, ao violino, ao saxofone, entre outros, determina a alta demanda por aulas
observada em escolas livres. Existe produo cientfica a respeito do estudo em educao
musical com foco no violo (TOURINHO, 1995, 2001, 2003, 2004; QUEIROZ, 2000; CORRA,
2000, 2001,2003, 2004; FIGUEIREDO; CRUVINEL, 2001; MACHADO; PINTO, 2002;
VASCONCELOS, 2002; NAVEDA, 2003; TIAGO; PERDOMO, 2004; MACHADO, 2004;
FIREMAN,2006; VIEIRA, 2009), em que cada autor foca uma investigao especfica: como o
ensino voltado para crianas, adolescentes, adultos e idosos com nfase no repertrio e o ensino a
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distncia, fazendo-o atravs de diferentes metodologias de ensino: ensino coletivo, individual e a
combinao das duas metodologias, assim como considerando-o nos seus mais variados
contextos: educao bsica, escolas tcnicas ou profissionalizantes, associaes, casa do aluno,
casa do professor, oficinas, cursos, projetos, cursos superiores e ambientes informais. Alm desta
produo terica, esto presentes na produo literria tambm os trabalhos de carter no
cientfico, autores considerados consagrados tanto em sua experincia instrumental como
pedaggica com violo (CARLEVARO, 1966, 1967, 1969, 1974, 1979; PINTO, 1978;
TENNANT, 1995; QUINE, 1990; GLISE, 1997).
A respeito da formao de professor, professor de instrumento e suas relaes professor-
aluno, temos as investigaes de (JORGENSEN, 2008; HENTSCKE; AZEVEDO; ARAJO,
2006; LEHMANN; SLOBODA; WOODY, 2007; HALLAM, 1998) e sobre a prtica reflexiva
para a formao docente (ZEICHNER, 2008; ANDR, 2009; LDKE, 2009; NVOA, 2009;
SCHN, 2000). No entanto, trabalhos visando aos processos de ensino de violo em escolas
livres de msica com a construo reflexiva das prticas pedaggicas dos prprios professores
constitui um tema que pode ser explorado.
O municpio de Blumenau possui escolas livres de msica, que so acessveis a diversos
tipos de pblico: crianas, adolescentes, jovens, adultos e idosos, sendo possvel a prtica de
diversas atividades musicais: prtica de bandas, aulas de instrumento musical especfico, coral,
teorias musicais, msica de cmara, orquestras, etc.
O presente trabalho teve como objetivo investigar com maior profundidade como
professores de violo atuam nestes ambientes educacionais e tambm as suas consideraes a
respeito de suas prprias prticas pedaggicas. Diante disto, surgiu a seguinte questo de
pesquisa: de que maneira o professor caracteriza o seu processo de ensino de violo a partir das
anlises de aulas gravadas atravs de vdeo? E foram delimitados os seguintes objetivos
especficos:
! Caracterizar como a reproduo do vdeo interfere no discurso e nos processos de ensinonas aulas de violo sob a perspectiva do professor.
! Descrever como o professor de violo avalia a sua prtica pedaggica em sala de aula.! Descrever qual a concepo do professor de violo sobre a metodologia de gravao de
vdeo como recurso didtico.
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! Caracterizar como a reflexo sobre a ao do professor de violo contribui para a suaformao.
A metodologia utilizada para o estudo esteve referenciada no carter qualitativo atravs
da estratgia de estudos de caso, buscando investigar a questo como os professores de violo
ensinam e como avaliam a sua prpria prtica pedaggica. Para responder a questo da pesquisa
foram empregadas as tcnicas de questionrio, registros das observaes, gravaes em vdeo das
aulas e entrevistas semi-estruturadas.
O trabalho est seccionado em quatro partes. A primeira parte corresponde reviso de
literatura dos referenciais relacionados com o tema. A segunda parte enfoca os procedimentos
metodolgicos adotados. A terceira parte retrata o contexto investigado e o perfil de cada
participante da pesquisa. E, por fim, a ltima parte descreve as aulas de cada professor as quais
foram gravadas em vdeo com referncia aos autores da reviso de literatura da primeira parte. E
tambm a relao com a literatura atravs das construes realizadas por cada professor atravs
de suas observaes das prprias prticas pedaggicas.
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1 REVISO DE LITERATURA
Mazzoti (2006) afirma que a reviso de literatura possui como meta iluminar o caminho
a ser trilhado pelo pesquisador (p.26). A nfase da autora est na busca do estado da arte, que
consiste em descobrir o que a rea de estudos a ser pesquisada j produziu e esta produo de
conhecimento (estado da arte) no um produto isolado, mas uma construo coletiva. Com
referncia s consideraes de Mazzoti, para discutir academicamente a rea de educao musical
voltada ao instrumento violo fez-se necessria uma reviso literria do quanto a educao
musical tem produzido para o ensino do violo. Para tanto, foram analisados textos publicados
na forma de comunicaes, psteres, em anais de encontros e congressos da Associao
Brasileira de Educao Musical - ABEM1 e, alm disso, foram analisadas dissertaes e teses
disponveis para consulta nas bibliotecas digitais.
1.1 FORMAO DO PROFESSOR
Os aspectos constituintes para a formao de um professor so diversos. Alm da sua
formao profissional atravs da obteno de ttulo, ou da sua formao atravs do estudo e
domnio da prtica instrumental, seus saberes podem estar relacionados aos conhecimentos
adquiridos atravs de materiais escritos, tais como livros, artigos, mtodos, jornais, dissertaes,
teses, da mesma forma associada a materiais no escritos, como assistir a palestras, seminrios,
workshops, oficinas, somando-se as experincias deste profissional ao longo de toda a vida
(JORGENSEN, 2008, p.5).
Hentschke, Azevedo e Arajo (2006) apresentam as concepes dos saberes docentes na
formao de professores, estabelecendo as reas de conhecimento que constituem esse saber. Para
as autoras, essas reas so categorizadas em disciplinares, curriculares, experincias, contedo,
entre outros. Deste modo, quando se discute sobre a formao do professor para o ensino de
violo e seus contedos tericos e prticos, abordam-se aos materiais escritos que tratem sobre o
ensino deste instrumento musical.
1A Associao Brasileira de Educao Musical - ABEM fundada em 1991 uma entidade representativa no queconcerne a produo textual de diversas regies do pas. Entre suas publicaes contempla pesquisas em andamento,pesquisas concludas ou relatos de experincia e artigos publicados na revista.
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1.1.1 O Professor de instrumento
Assim como a constituio das caractersticas de um grande performer no algo inato,
mas parte do seu desenvolvimento de experincias anteriores, o mesmo acontece com o professor.
Um excelente professor no nasce com as caractersticas prontas, mas quando o indivduo assume
a iniciativa pela busca do aperfeioamento de ensino (LEHMANN; SLOBODA; WOODY, 2007,
p.203).
Segundo Lehmann, Sloboda e Woody (2007), os professores considerados timos
possuem habilidades especficas que so diferentes das de um performer (p.185). Esta evidncia
passa a ser uma das razes pelas quais nem todo excelente instrumentista , consequentemente,
um bom professor. De acordo com os autores, o processo de ensino sofre influncias das
relaes que o professor estabelece com o estudante, existindo dois modelos genricos a respeito
da relao professor/estudante: mestre-aprendiz e mentor-amigo. O primeiro refere-se aos
professores que demonstram suas habilidades e suas experincias profissionais ao estudante.
Nesta relao, a comunicao caracterizada com direcionamento do professor para o estudante.
Este modelo, frequentemente, resulta em uma cpia direta pelo aluno do professor. O segundo
modelo caracteriza-se por uma grande comunicao entre professor e aluno. Neste caso, a relao
fica estabelecida em dois sentidos, ou seja, do professor para o estudante ou do estudante para o
professor. O professor procura facilitar as experimentaes musicais do estudante e oferecer
ideias musicais a serem avaliadas pelo mesmo. Este modelo faz com que o professor atenha-se,
com mais frequncia, s necessidades do estudante (p.187).
Os autores mencionados demonstram tambm que os professores ao ensinar msicas
especficas passam a gastar muito tempo instruindo sobre questes tcnicas, como a correo
rtmica, notas e movimentaes fsicas de execuo, e, somente depois, passam a orientar sobre
as questes expressivas da obra musical, tais como alteraes de dinmica, timbre, articulaes,
fraseados, etc. Ao citar Reid (2001), Lehmann, Sloboda e Woody (2007) demonstram uma
progresso hierrquica em cinco nveis em que os professores orientam os seus estudantes. A
tabela a seguir descreve cada um destes nveis:
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NVEL ESTGIO DESCRIO
Nvel 1 Instrumental Ensino sobre as habilidades fsicas e aspectos tcnicos deperformance.
Nvel 2 Elementos Ensino sobre elementos musicais como dinmicas, fraseados earticulaes.
Nvel 3 Significado Musical
Ensino sobre um significado musical interno da msica. Oestudante depende dos conselhos do professor quanto interpretao estilstica adequada para expressar o sentimentoapropriado de uma obra musical.
Nvel 4 Comunicao Orientao para o esforo do estudante na transmisso dosignificado para uma audincia.
Nvel 5 Expressar o significado O estudante encorajado a adicionar sua prpria expresso ousignificado pessoal em suas performances. Tabela 01: Elaborado pelo autor segundo a citao de Lehmann, Sloboda e Woody (2007) sobre a pesquisa de Reid
(2001).
Para Reid (2001, apud Lehmann; Sloboda; Woody), estes nveis so lineares, no sendo
possvel adicionar expresso em uma obra sem haver resolvido as questes tcnicas do nvel um
(p.190). Na concepo de Reid, professores de instrumento procuram fornecer habilidades
cognitivas musicais aos estudantes atravs de duas funes amplas. A primeira em que o
professor fornece modelos musicais sonoros ao estudante, ou seja, o professor toca um trecho
musical e solicita ao estudante ouvir e imitar o mais prximo possvel da execuo do professor.
Alm disso, o professor pode pedir que o estudante busque referncias em gravaes para
modelos sonoros. A segunda quando o professor oferece uma crtica especfica sobre as
performances do estudante. As crticas mais construtivas so aquelas que demonstram as
diferenas entre a interpretao do estudante e outra verso considerada como sendo de boa
qualidade. De acordo com Reid, professores experientes fornecem crticas detalhadas e no
somente comentrios genricos, tais como Muito bom!.
O treinamento destas habilidades faz com que o estudante possa construir a sua prpria
representao mental para uma performance musical, avaliando as suas prprias interpretaes.
Os autores Lehmann, Sloboda e Woody (2007) propem as seguintes representaes funcionais:
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REPRESENTAOFUNCIONAL DESCRIO
Imaginar um objetivo
A habilidade de representar mentalmente como uma pea musicaldever soar. Esta funo desenvolvida quando o estudantetrabalha com modelos sonoros.
Produo motora
Representaes mentais para a produo motora que ativam oestudante a executar os movimentos e respostas fsicas necessriaspara tocar um instrumento e saber como estes movimentos sosentidos. Nesta funo, a instruo de aspectos tcnicos e corporais crucial.
Monitorao prpria
A habilidade de conseguir ouvir e criticar as suas prpriasperformances. Nesta funo, o estudante geralmente conta com acrtica do professor, pois muita da ateno do estudante est naproduo sonora e no na monitorao do resultado sonoro.
Tabela 02: Elaborado pelo autor segundo as representaes funcionais de Lehmann, Sloboda e Woody (2007).
Hallam (1998) afirma que o reconhecimento da eficincia da educao deve ser entendida
a partir de metas de aprendizagens particulares. Em conformidade com a autora, as pessoas
conhecem relativamente pouco sobre como os professores de instrumento interagem com os seus
estudantes. No entanto, o que se sabe que a determinao do nvel de aprendizado do indivduo
est ligada diretamente com o relacionamento estabelecido entre professor-estudante e a natureza
do ensino (HALLAM, 1998, p.229). Trs estgios de desenvolvimento do professor, a sua
importncia e a relao professor-estudante so representados por Hallam:
ESTGIO DESCRIO
Estgio inicial
No estgio inicial, os professores exercem as suas atividades para situaes divertidas. Arecompensa caracteriza-se, neste estgio, com o objetivo de ocasionar interesse e envolvimento doestudante. A nfase est sobre uma atividade divertida e a explorao gerando interesse eentusiasmo.
Estgio 2
No segundo estgio, a focalizao est sobre a aquisio sistemtica do conhecimento edesenvolvimento de habilidades. A ateno em detalhes, indues para as habilidades tcnicas,vocabulrio da disciplina com suas normas e lgicas, prtica meticulosa e repetio caracterizam esteestgio.
Estgio 3O terceiro estgio caracteriza-se com o estudante comprometido a msica. Os estudantes soensinados por professores considerados especialistas no campo. A nfase nos detalhes substitudapara um desenvolvimento do amplo entendimento da msica.
Tabela 03: elaborado pelo autor segundo as perspectivas da relao professor-estudante de Hallam (1998).
No estgio inicial, conforme a autora, os professores precisam ser relativamente acrticos,
encorajando e entusiasmando o estudante para gerar um interesse e comprometimento com a
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msica. A estudiosa alerta sobre a provvel desistncia da criana das atividades de
aprendizagem se este estgio no for avaliado positivamente pelo aprendiz e, ainda, caso o
estudante do instrumento no se tornar comprometido quando o trabalho tornar-se difcil,
exigindo tcnicas e novas habilidades cognitivas (HALLAM, 1998, p. 231).
Segundo Hallam, a relao entre professor-estudante, no segundo estgio, muda para uma
atitude de respeito entre os pares. Esta relao estende-se atravs das aulas e o professor fornece
oportunidades em diversas atividades ao estudante, tais como recitais, concursos, cursos de vero,
encontros com outros profissionais e professores considerados exmios e outras oportunidades
para o estudo aprofundado. Hallam alerta para possveis resultados irreparveis se a criana
comear o seu aprendizado instrumental tardio, obtendo instrues inadequadas ou, por outro
lado, se forem registradas muitas mudanas de professor (HALLAM, 1998, p. 230).
O terceiro estgio descrito por Hallam est na relao professor-aluno, sendo que um
relacionamento pessoal j no to importante como no segundo estgio. A importncia est
sobre na dedicao msica e no desenvolvimento do trabalho em uma maneira pessoal.
Estudantes executam as obras musicais aos seus professores, sendo que a sua performance
analisada com o objetivo de modelar o processo adotado por profissionais e reavaliar as suas
performances. Os estudantes comeam a desenvolver os seus prprios modos de trabalho,
descobrindo e resolvendo os seus prprios problemas a ponto de alcanar a independncia em
seus julgamentos, trabalhando para a sua prpria satisfao e no a dos professores. Os
estudantes caracterizam-se, neste ponto, por estarem completamente imersos em seu trabalho. O
professor no terceiro estgio no apenas concentra-se sobre a performance musical do estudante,
mas influencia o desenvolvimento da personalidade do estudante, iniciando uma insero no
mundo dos valores musicais, apresentando-o a crculos profissionais e ajudando a entrar na
profisso.
Atravs de exemplos, Hallam demonstra como as atividades de ensino e aprendizagens
fazem parte de um processo natural do ser - humano. Os pais ensinando aos filhos variados
comportamentos sem recorrer instruo formal: como se vestir, como comer com talheres,
como os pais esperam que os filhos comportem-se. Crianas ensinam umas as outras como jogar
novos jogos. Adultos ensinam uns aos outros como comprar um carro, cozinhar, conseguir um
emprego, etc. Segundo a autora, o ensino em instituies, geralmente, acontece fora do contexto
em que a atividade normalmente empreendida (HALLAM, 1998, p.231).
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A pesquisadora enfatiza que no existe ensino eficiente sem relacionar com os objetivos
do aprendizado. E isto serve tambm para a instruo instrumental. As formas como os
professores ensinam refletem-se nos objetivos atingidos e mesmo quando estes objetivos esto
especificados, a metodologia utilizada para um efeito eficiente depender do estudante, do
contexto e do professor (HALLAM, 1998, p.231).
Para compreender a relao professor-aluno em aulas de instrumento que, segundo
Hallam, acontecem com maior frequncia de forma individual e fora de instituies educacionais,
a autora apresenta cinco concepes: a concepo de engenharia, a concepo de aprendizagem, a
concepo de desenvolvimento, a concepo de nutrio e a concepo de reforma social.
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CONCEPO PROFESSOR ALUNO
de engenharia
Concebe a sua a tuao como umtransmissor de conhecimento. Determina oque ir ser trabalhado como tcnicas,currculo, interpretao, repertrio, etc.Oprofessor fala em excesso o que no garanteresultados. Os professores tendem a usarpouco tempo com demonstraes de comotocar e h uma nfase sobre a tcnica emdetrimento de consideraes musicais.
O aluno no um participante ativo deseu aprendizado.Concebido comoreceptor passivo do conhecimento.Fala demasiada do professor geradesateno do estudante.
de aprendizagem
A c o n c e p o d e a p r e n d i z a g e m direcionada ao desenvolvimento doconhecimento e s formas de ser. Oprofessor pode reajustar pontos doprogresso do estudante. Por exemplo, se osobjetivos foram atingidos, o professor podeexigir um aumento da qualidade naperformance ou sugerir uma nova obramusical. Seis estratgias de professor soapresentadas: recrutamento, reduo degraus de liberdade, manuteno de direo,marcao de aspectos crticos, controle defrustrao e demonstrao.
O aprendiz inculcado a pensar nasmaneiras do mestre, onde o processoinicia sendo um participante perifrico.E m s e g u i d a , h a b i l i d a d e s s odesenvolvidas a medida que novosdesafios surgem associados com otrabalho. O estudante observa ashabilidades das pessoas e, aps, fazparte de atividades relacionadas com otrabalho. Caracteriza-se na maneiraque o indivduo consegue desenvolverhabilidades com os outros, sendo queno conseguiria desenvolver taishabilidades isoladamente.
de desenvolvimento
Os profissionais tornam-se praticantesreflexivos, que reflitam sobre os seustrabalhos fazendo mudanas necessrias emsuas atuaes profissionais. Profissionaislidam com momentos de incerteza,instabilidade, singularidade e conflitos devalores. Para exemplificar este tipo de situao,Hallam apresenta um momento em que oprofessor ensina uma habilidade tcnica aum estudante que possui dificuldade noaprendizado. Atravs desta dificuldadeapresentada pelo estudante, o professorelevar a sua conscincia sobre como lidarcom o elemento tcnico ensinado para,ento, explicar ao estudante. Durante oprocesso de reexaminar o modo como atcnica alcanada, pode alterar a maneiracomo o professor ensina e at mesmo aexecuo musical no futuro.
Hallam (1998), para este modelo, cita aproposta de Schn, que leva em contao desenvolvimento do intelecto, aautonomia e a independncia doestudante.
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de nutrio
Na concepo de nutrio, o ensino compreend ido como um processofacilitador para o aprendizado do estudante.A autora descreve o aspecto negativo domodelo, pois descobrir como se toca uminstrumento poderia levar uma vida inteira.
Est centrado no estudante e seuprprio autoconceito. O objetivo fazer com que o estudante estejae n v o l v i d o e c o n d u z a o s e uaprendizado. Hallam (1998, p.239)cita o exemplo de crianas que soativas construtoras do conhecimento eque qualquer envolvimento adultopassa a ser um impedimento para oaprendizado.
de reforma social
A concepo de reforma social concebe oensino como um desenvolvimento de umideal baseado sobre crenas particulares.Como exemplo, a autora refere a situaono ideal em executar msica barrocasomente com instrumentos barrocos.
A concepo de reforma, segundoHallam, procura mudar o que aspessoas (estudantes) so (p.241).
Tabela 04: Elaborado pelo autor segundo as concepes da relao professor-estudante de Hallam (1998).
A respeito das seis estratgias utilizadas pelo professor na concepo de aprendizagem, o
recrutamento consiste em encorajar o estudante ao interesse e ao comprometimento para a tarefa.
A reduo de graus de liberdade ocorre quando o professor reduz o nvel de complexidade de
uma tarefa e a faz manejvel (movimentar somente a mo esquerda ou movimentar somente a
direita). A manuteno de direo consiste em manter o estudante focado no objetivo. A
marcao de aspectos crticos caracteriza-se quando o professor destaca detalhes da tarefa. O
controle de frustrao consiste em reduzir a ansiedade do estudante atravs de conselhos que no
o preocupem. A demonstrao acontece quando o professor demonstra a soluo da tarefa e,
frequentemente, uma soluo idealizada.
Segundo Hallam, a estratgia de marcao de aspectos crticos a mais utilizada em aulas
de instrumento, sendo as demais raramente adotadas. Focando sobre esta estratgia, onde o uso
de instrues verbais recorrente, a autora categoriza quatro maneiras de comunicao
apresentados pelo professor ao marcar aspectos crticos, so elas: declarativa, comando, questes
e gestos no verbais.
Instrues declarativas e no verbais podem ser usadas quando o professor assume que o
conceito musical foi compreendido. Se o professor estiver incerto, a comunicao de comando
ou questo pode ser usada para verificar se o estudante compreendeu ou no. Caso o estudante
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demonstrar no ter desenvolvido a habilidade ensinada, a estratgia de reduzir a complexidade
ser apropriada.
O modelo de aprendizagem pode resultar em outras relaes entre professor-estudante a
ponto de restringir a autonomia e a independncia do estudante. Hallam demonstra esses
aspectos no exemplo de uma professora em que a relao entre professor-estudante esteve
baseada em confiana: devido ao excesso de confiana que os estudantes tinham sobre as
orientaes da professora. os mesmos reservavam-se de expressar as suas ideias e opinies, pois a
professora fornecia todas as sugestes e as solues. Outro aspecto apresentado esteve na grande
nfase sobre a tcnica e a realizao correta, com poucas oportunidades para a criatividade ou
expresses de emoo para a performance. Em continuidade, esto as intenes pedaggicas
descritas por Hallam (1998) na aprendizagem de uma nova obra musical:
INTENO PEDAGGICA DESCRIO
Iniciar com o ritmo Garantir que o tempo esteja exato e de acordo com o metrnomo se amarcao de andamento est registrada na obra musical
Observao das dinmicas Garantir que as dinmicas escritas sejam corretamente executadas
Enfatizar altura e tonalidade Garantir que o estudante est atento ao desdobramento da harmonia eentonao em relao a progresso harmnica
Enfatizar qualidade sonora Descobrir digitaes que fornecero uma sonoridade aceitvel
Apoio Encorajar o estudante a executar musicalmenteTabela 05: Elaborado pelo autor segundo as intenes pedaggicas apresentadas por Hallam (1998).
No tpico da concepo de desenvolvimento, de acordo como Hallam (p.239), possvel
ajudar os alunos jovens a desenvolver algum grau de independncia. A seguir, apresentam-se, de
forma resumida, os tpicos de desenvolvimento com atitudes dos professores para apoiar os
estudantes:
! a no terem medo do aprendizado e estarem preparados a enfrentar a tarefa por elesmesmos;
! a gostarem do aprendizado e ach-lo recompensador por direito prprio, e no apenaspara obter recompensas externas;
! estarem atentos as suas prprias facilidades e dificuldades como aprendizes;
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! estarem atentos as estratgias que eles tm disponveis para a realizao de qualquernmero de tarefas;
! estarem aptos a avaliar o que necessrio em uma tarefa;! no desistirem quando o momento torna-se difcil e ter ideias sobre como possam agir
nesta circunstncia;
! estarem aptos a avaliar o seu trabalho e serem crticos;! a desejarem melhorar os seus trabalhos; ! estarem atentos a importantes questes subjetivas na avaliao;! a questionarem o que eles esto fazendo e o porqu.
Em consonncia com Hallam (1998, p. 237), vrios professores de instrumento no se
consideram responsveis pelo desenvolvimento do intelecto dos seus alunos, mesmo em relao
ao conhecimento musical, mas apenas como professores de execues tcnicas. Apesar deste
fato, msicos profissionais alcanam altos nveis de desenvolvimento intelectual em relao
performance musical assim como estudantes considerados avanados. Tambm desenvolvem
extensivas habilidades metacognitivas e a independncia em seus aprendizados.
Em um estudo de aulas de piano, a autora evidencia trs estilos de aula individual:
1- Dirigido pelo professor;
2- Dirigido pelo estudante;
3- Centrado no estudante.
O primeiro estilo caracteriza-se pelo professor responsvel no controle e nas decises
sobre o que fazer (semelhante concepo de engenharia). No segundo, o estudante passa a ser
responsvel pelas decises, pelo controle e pela pergunta ao professor que oferece sugestes e
ajuda. O terceiro estilo est centrado nas emoes e nos interesses do estudante. Nos dois
primeiros estilos, o ensino empreendido na dependncia das preferncias e dos objetivos do
estudante. No terceiro, o professor caracteriza-se por ser sensvel as indicaes do estudante, do
que ele quer aprender e do modo em que prefere trabalhar a qualquer momento.
Alguns aspectos foram relatados para caracterizar o ensino centrado no estudante:
! maior participao verbal dos estudantes;! boa comunicao professor-estudante;
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! maior variedade de respostas dos estudantes;! aumento de satisfao;! maior interesse;! maiores atitudes positivas;! aumento da motivao;! ampliao do tempo gasto para praticar;! melhor conexo entre professor e estudante;! melhor progresso.
Apesar da forma de ensino centrada no estudante, a autora alerta que pequenas mudanas
sobre a maneira de ensinar podem oferecer maior controle sobre e melhorar a motivao e as
atitudes dirigidas a performance. De acordo com Hallam (1998, p. 240), para alguns estudantes,
esta mudana deve ser aplicada com cuidado, pois eles podem ter medo de assumir as suas
prprias responsabilidades e preferem que o professor esteja com o controle.
Se, para Hallam, a formao do professor de instrumento est pautada em concepes
sobre as mediaes de relaes entre professor e aluno e a importncia do processo reflexivo
destas prticas, Santos (2011), de outro modo, apresenta uma nova perspectiva de ser professor,
ou seja, alm de focar tambm a prtica reflexiva, destaca o papel do professor como
pesquisador:
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PERSPECTIVAS DE SER PROFESSOR DESCRIO
Professor instrumentista O professor considera-se primeiramente um instrumentista.
Professor reflexivo 1 O professor dispe de um pensamento reflexivo sobre a suaprtica.
Professor reflexivo 2O professor com postura na investigao reflexiva em quemelhora e responde questes sobre a sua prtica, mas noatravs de um projeto sistemtico de pesquisa.
Professor pesquisador
O professor no trabalha isoladamente, mas desenvolve umprojeto institucional com o objetivo de formular umproblema e, atravs da pesquisa, melhorar a prtica deensino em um determinado contexto.
Tabela 06: Elaborado pelo autor segundo as perspectivas de ser professor de Santos (2011, p.46).
Lehmann, Sloboda e Woody trazem as pesquisas de Taitt (1992), Goolsby (1996) e Byo
(1990) e ressaltam um aspecto que pode suceder a um ensino mais efetivo, tal como o
planejamento antecipado da aula ou o ensaio. Os autores destacam a importncia das prticas dos
professores habilidosos em relao aos novatos e enfatizam algumas diferenas de
comportamentos e estratgias adotadas por esses professores. Tambm salientam a importncia
do planejamento das atividades. Para os autores, o planejamento sequencial de atividades
articulado com os objetivos da aula so fatores primordiais para a instruo. Deste modo, os
professores considerados habilidosos dividem mais igualmente o tempo de aula para cada obra
musical a ser ensaiada. Outro aspecto citado pelos autores est na intensidade e na inflexo da
voz, gestos fsicos e expresses faciais. Professores habilidosos so os que aprenderam a
otimizar as suas falas com instrues verbais caracterizadas pela claridade, oferecendo
explicaes eficientes de conceitos isentos de quaisquer termos vagos. Esses professores tambm
questionam os estudantes e esta atitude de indagar permite checar o aprendizado.
Para Lehmann, Sloboda e Woody (2007), a maior distino entre os professores
habilidosos e novatos est em que os considerados habilidosos gastam menos tempo com
instrues verbais e, ao instruir para a preparao de uma obra musical, os professores menos
proficientes esto focados sobre as questes tcnicas, enquanto os mais proficientes enfocam
mais eficientemente a qualidade da emisso sonora, a entonao, o estilo e a expresso. Os
autores enfatizam que estudantes so mais atentos durante atividades que requeiram ativa
participao, especialmente fazendo msica, assim como so menos atentos durante as instrues
e as transies entre as atividades.
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As instrues verbais de msica que os professores fornecem podem ser divididas emduas categorias. A primeira atravs de imagens, metforas e analogias extramusicais. E a
segunda atravs de um direcionamento pertencente s propriedades sonoro-musicais concretas. A
respeito da primeira categoria, Lehmann, Sloboda e Woody (2007) atestam que professores de
msica usam amplas possibilidades de imagens extramusicais e metforas, especialmente quando
se referem ao movimento e ao sentimento. Estas instrues so utilizadas quando o professor
est trabalhando a expresso de uma obra musical com o objetivo de alcanar o som desejado e
invocar a emoo nos estudantes. Exemplos deste tipo de instruo podem ser descritos quando
um professor discursa o seguinte: toque esta frase musical com um sentido pesado de
ansiedade, toque isto [trecho musical] como se estivesse perdido o seu grande amor ou toque
este motivo como se fosse um berimbau, etc. No entanto, os autores alertam que o uso
excessivo deste tipo de instruo pode frustrar os estudantes, pois eles podem no entender ou
no conseguir aplicar ao contexto musical.
A segunda categoria de instruo acontece quando os professores discursam descrevendo
as propriedades de um modelo sonoro, tais como as duraes das notas, o tempo, a entonao, as
dinmicas, as articulaes, entre outros. Professores utilizam este tipo de instruo quando esto
lidando com aspectos tcnicos de performance, contudo, este modelo tambm possui utilidade
para trabalhar sobre a expresso, por exemplo, quando o professor solicita: aumente a
intensidade em direo ao segundo compasso.
As utilizaes de instrues verbais so apenas uma parte para um ensino efetivo. Os
autores afirmam que importante que os estudantes possam aplicar as instrues fornecidas pelo
professor em sua prpria prtica musical e que, em seguida, os professores forneam uma
resposta da tarefa executada. Lehmann, Sloboda e Woody (2007) citam a pesquisa em educao
musical de Price (1992), em que o mesmo prope um padro cclico e sequencial de instruo:
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Grfico 01: Elaborado pelo autor segundo o ciclo instrucional de Price (1992).
Segundo os autores, na etapa 1(um) em que o professor apresenta uma tarefa ao estudante,
a melhor instruo aquela que especifica claramente o que o estudante dever fazer. E discursar
somente sobre msica sem solicitar ao estudante executar uma tarefa seria uma instruo
desqualificada.
A etapa 2 (dois) exige a ativa participao do estudante, a ateno e o alcance de um
objetivo, visto que o estudante execute a tarefa solicitada. Esta etapa sugere que o aprendizado
musical est mais sobre o envolvimento do estudante com a msica do que sobre as informaes
ditas do professor.
A ltima etapa o ponto em que o ciclo instrucional completa-se. O professor oferece
uma resposta para a tarefa executada, corrigindo os possveis erros e avaliando a nova tentativa
do estudante em sua performance (p.197).
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1.1.3 Professor de violo
As opes de atuao de um professor de violo podem ocorrer em diversos contextos e
instituies educacionais, tais como unidade de educao infantil, escola de ensino fundamental,
escola de ensino mdio, escola profissionalizante de msica, organizaes no governamentais -
ONG, organizaes da sociedade civil de interesse pblico - OSCIP ou entidade de cunho
assistencialista ou filantrpico, escola tcnica ou profissionalizante, alm de ambientes informais
no institucionais.
Vieira (2009), em sua investigao, demonstra os diversos campos de atuao dos
professores de violo: academias particulares, casa do aluno, casa do professor, oficinas, cursos e
rede de ensino. O autor destaca ainda as diversas formaes desses profissionais que esto em
atividade. Em sua pesquisa, identificou profissionais com formao em variadas reas, foram
encontrados professores sem formao acadmica, musicoterapia (inconclusa), licenciatura em
educao musical, licenciatura em engenharia (inconclusa), bacharelado em violo e graduao
em letras. (VIEIRA, 2009, p.44).
Apesar do objetivo principal das licenciaturas, segundo a legislao - Resoluo CNE/CP
n. 1 -18 de fevereiro de 2002 -, seja formar o professor para a atuao na educao bsica, Vieira
(2009) apresenta evidncias de que existem outras possibilidades no mercado de trabalho para o
professor de violo, no se restringindo a atuar exclusivamente na educao bsica. O trabalho
de Vieira (2009) verificou professores que se tornaram docentes no por uma escolha pr-
determinada, mas a partir da prpria ao de ensinar. Para ele, muitos profissionais optaram pelo
magistrio:
[...] como decorrncia de um envolvimento mais amplo com o fazer musical, numamistura de necessidade pragmtica - o retorno financeiro obtido com as primeirasexperincias e suas possibilidades latentes de ampliao e ideal profissional, balizadopelo fazer aquilo que se gosta, ou seja, trabalhar com msica. (VIEIRA, 2009, p.56).
Estas possibilidades outras de atuao esto representadas por alguns participantes da
pesquisa de Vieira (2009) que atuam em mais de um ambiente profissional (p.45). Desse modo,
tornar-se professor de instrumento um sistema complexo, em que a sua formao pode comear
com as experincias anteriores atuao em sala de aula, ou mesmo durante a formao. Esse
um processo no qual o professor constri os seus saberes disciplinares pedaggicos e musicais.
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De acordo com as pesquisas com nfase na atuao do professor de violo, o mbito desta
atuao pode estar em diversos contextos de ensino. O grfico a seguir representa este sistema
descrito anteriormente:
Grfico 02: Professor de instrumento e opes de mercado.
Considerando que algumas instituies de ensino superior oferecem o curso de
licenciatura em msica e suas grades curriculares possuem disciplinas especficas para o ensino
do instrumento musical visando a formar o professor e licenci-lo para atuar no mercado - seja
este mercado situado nos seus mais diversos contextos sociais - foram consultadas bibliografias
que possuem como objetivo este tipo de formao, o professor de violo.
Outros materiais tambm fizeram parte do processo analtico, tais como textos
acadmicos que tratam do tema. A anlise destes materiais teve por objetivo o estabelecimento
de categorias, que serviram para transcrever os contedos tanto musicais como pedaggicos
trabalhados pelo professor durante a observao nos campos de pesquisa. De acordo com a
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reviso de literatura, a concepo do que ser professor de instrumento e aspectos sobre essa
profisso tambm merecem destaque.
Jorgensen (2008) inicia a sua obra com o tpico Professor e afirma ser importante
descobrir o que ser professor, assim como as funes que o professor pode ter na vida das
pessoas, acrescendo ainda como os prprios professores concebem estas funes. Devendo-se,
neste caso, observar que estes aspectos esto interconectados (JORGENSEN, 2008, p.1). Para a
autora, no basta afirmar ao aluno faa desta maneira, siga esta regra e estude este mtodo sem
questionar o porqu de se estar seguindo as atividades propostas e, por isso, ela critica estas
atitudes, considerando que so modos difceis para a prpria descoberta do indivduo. Da mesma
forma, Jorgensen (2008) tambm critica o fato de indivduos espelharem-se para serem iguais a
outros indivduos seguindo as regras, modelos e atitudes. Os modelos so construdos ao longo
da vida e no algo que pode se aprender rapidamente, afirma a autora.
Este conhecimento, segundo Jorgensen, construdo atravs da coleta de informaes e
tempo para a reflexo sobre elas. A autora alerta que adquirir informao no o mesmo que
desenvolver sabedoria, pois a sabedoria o que se sabe fazer com a informao, como processar,
avaliar e integrar o que compreendido como valioso dentro de uma experincia vivida. O
aspecto reflexivo que permite ouvirmos e deixarmos a voz interna ensinar (JORGENSEN, 2008,
p.5).
Atravs de uma perspectiva histrico-social, Vieira (2009) trata do conceito profisso e as
tentativas dos socilogos na delimitao fixa de um significado do prprio termo. O estudioso
apresenta concepes distintas e descobre que algumas delas, como a de Caria (2007), no
apresentam uma concepo satisfatria realidade brasileira dos professores de violo,
particularmente em sua pesquisa, pois, segundo Vieira:
Sua concepo no reconhece como grupo profissional aqueles professores de violo queno possuem curso superior, que desenvolvem toda ou parte de sua atividade dentro dainformalidade e/ou que tm o trabalho com as aulas de violo como renda complementar,conjuntamente com outras atividades, em especial as de msico performer (VIEIRA,2009, p.22).
No seria o caso para os professores participantes deste estudo. No entanto, como a
pesquisa de Vieira apresentou formaes distintas dos professores, incluindo formaes no ensino
superior em outras reas e tambm participantes sem formao acadmica - o autor considera
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mais apropriada a concepo de Franzoi (2006) a respeito do termo profisso. E esta concepo
expressa:
[...] resultado da articulao entre um conhecimento adquirido e o reconhecimento socialda utilidade da atividade que esse indivduo capaz de desempenhar, decorrente doconhecimento adquirido. Esse reconhecimento social dessa atividade se d atravs dainsero do indivduo no mercado de trabalho, correspondente ao conhecimentoadquirido. Estreitamente ligado a esse reconhecimento social e ao saber nele implicadoest o reconhecimento pelo sujeito que deles portador (FRANZOI apud VIEIRA,2006, p. 20).
A respeito da profisso professor, Vieira (2009) demonstra como foi constituda a
categoria. Atravs de uma mudana no controle do sistema de ensino da Igreja para o Estado a
partir do sc. XVIII, resultou a estruturao do corpo docente especializado. O carter da
profisso especializada passou a ser: uma atividade exercida por um corpo profissional
afirmado, reconhecido e fortemente apoiado na consistncia de um ttulo em forma de licena ou
autorizao legal (VIEIRA,2009,p.25). Est evidenciado, segundo Vieira, que esta alterao de
posio dos professores que passaram a agentes polticos constitui-se uma estratgia estatal
para um controle mais rigoroso sobre o sistema de ensino.
No caso presente, a opo pelo referencial do professor reflexivo ocorreu em virtude da
opo metodolgica deste trabalho em que o professor investigado tinha que analisar a sua ao
pedaggica a partir de aulas gravadas.
1.1.2 O Professor Reflexivo
Em consonncia com Zeichner (2008, p. 538), a concepo da prtica reflexiva tem
origem tanto na filosofia ocidental como na no-ocidental. O autor cita a obra de John Dewey e a
influncia que este exerceu na educao nos Estados Unidos da Amrica no incio dos anos de
1900. Contudo, foi a partir da publicao da obra de Schn que esta concepo influenciou a
prtica de educadores por todo o mundo. O envolvimento de Zeichner com a tentativa de formar
professores mais reflexivos sobre suas prticas teve incio em 1976. Para tanto, publicou o seu
primeiro artigo envolvendo a prtica reflexiva na formao docente em 1981. Segundo Zeichner,
ao principiar o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema, os estudantes possuam um
embasamento tcnico e estavam preocupados em passar o contedo de maneira organizada, no
levando a pensar no porqu ou no contexto em que ensinavam e de onde se originavam a
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estruturao dos currculos a primeira vez que utilizamos o termo 'ensino reflexivo' na
Universidade de Wisconsin pode ser vista como uma tentativa genrica e vaga de ajudar nossos
estudantes a se tornarem mais conscientes sobre as dimenses moral e tica do ensino [...].
(ZEICHNER, 2008, p.537).
O termo reflexo pode ser concebido como uma reao oposta viso dos professores
tcnicos que meramente fazem o que outras pessoas, fora da sala de aula, querem que eles
faam, e contra modelos de reforma educacional do tipo 'de cima para baixo', que envolvem os
professores apenas como participantes passivos.(ZEICHNER, 2008, p.539). O autor enfatiza
que a produo de conhecimentos no deve ser exclusivamente das instituies universitrias,
mas tambm atravs dos prprios professores que inovam as suas prticas atravs da reflexo e
constroem teorias que possam contribuir para um conhecimento de base comum sobre boas
prticas de ensino.
Zeichner menciona o reconhecimento nas prticas de bons professores relacionando-o
com o conhecimento-na-ao de Schn :
Da perspectiva do professor, isso significa que o processo de compreenso e de melhoriade seu prprio ensino deve comear da reflexo sobre sua prpria experincia e que otipo de saber advindo unicamente da experincia de outras pessoas insuficiente.(ZEICHNER, 2008, p.539).
Andr (2009) constata o quo recente so as pesquisas em processos reflexivos no Brasil.
O trabalho da autora retrata a produo acadmica de ps-graduandos na rea de educao entre o
perodo de 1999 e 2003 (baseados no Banco de Dados da CAPES) e tambm compara dados de
dissertaes e teses defendidas no perodo de 1990-1998 com os do perodo de 1999-2003.
Segundo a autora: Os processos reflexivos, que na dcada de 1990 despontavam como
referenciais promissores na formao dos docentes, firmaram-se definitivamente nos anos 2000
(ANDR, 2009, p.49).
Por seu turno, Ldke cita Schn como um dos responsveis pela mudana de direo no
pensamento educacional:
A enorme difuso das idias de Schn levou toda a comunidade educacional uma ondana direo da imagem de um professor mais ativo, crtico e autnomo em relao s suasescolhas e decises, contrariamente quela de aplicador de solues prontas, emanadasde esferas externas, sobretudo as marcadas como o selo da racionalidade tcnica.(LDKE, 2009, p.12).
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Esta constatao recente do professor reflexivo est tambm nas palavras de Nvoa
(2009) ao considerar que dois grandes grupos contriburam para produzir e vulgarizar um
consenso discursivo do que necessrio tomar para assegurar a aprendizagem docente e o
desenvolvimento profissional dos professores. (NVOA, 2009, p.4). Eis a descrio do primeiro
grupo:
O primeiro grupo inclui investigadores da rea da formao de professores, das cinciasda educao e das didticas, redes institucionais e grupos de trabalho diversos. Nosltimos quinze anos, esta comunidade produziu um conjunto impressionante de textos,que tem como marca o conceito de professor reflexivo e que fez uma viragem nopensamento sobre os professores e a sua formao. (NVOA, 2009, p.4).
O segundo grupo refere-se a especialistas que definem o currculo da formao de
professores e demais normas para o exerccio docente. No entanto, tais especialistas no se
caracterizam pelo domnio terico de uma rea cientfica ou profissional, sendo que tais cargos
ocupados deveriam ser de responsabilidade dos professores mais experientes. Nvoa (2009)
alerta que estes grupos contriburam para renovar os estudos sobre a profisso docente mais do
que os prprios professores. E critica ao afirmar que o excesso destes discursos esconde,
frequentemente, uma grande pobreza das prticas: Temos um discurso coerente, em muitos
aspectos consensual, mas raramente temos conseguido fazer aquilo que dizemos que preciso
fazer. (NVOA, 2009, p.6).
Schn (2000, p.29) utiliza o termo talento artstico profissional para referir os tipos de
competncia que os profissionais demonstram em certas situaes da prtica que so nicas,
incertas e conflituosas. O estudioso prope um exame cuidadoso para uma busca de
aprendizado deste talento artstico e chama de ensino prtico reflexivo como sendo: um ensino
prtico voltado para ajudar os estudantes a adquirirem os tipos de talento artstico essenciais para
a competncia em zonas indeterminadas da prtica. (SCHN,2000, p.25).
Atravs de exemplos de aes humanas - tais como um garoto atirando uma bola, uma
aluna do ensino mdio que resolva equaes biquadradas, um contador experiente que calcule um
balano complexo, Schn demonstra como possumos aes sem necessariamente sabermos
como descrev-los e explic-los verbalmente: De forma semelhante, aprendemos a executar
atividades complexas, como arrastar-nos, caminhar, fazer malabarismo ou andar de bicicleta, sem
poder dar uma descrio verbal, ainda que grosseiramente adequada, da nossa performance real
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(p.31). Para se referir a estas aes, Schn utiliza a expresso conhecer-na-ao, que so
performances fsicas, publicamente observveis. O ato de conhecer est na ao e revelado pela
prpria espontaneidade de execuo, mas nossa caracterstica a incapacidade de descrio
verbal detalhada sobre a prpria ao ocorrida. Apesar desta incapacidade de descrio verbal,
Schn afirma que, atravs da observao e da reflexo sobre nossas aes, possvel fazer uma
descrio do saber tcito que est implcito nelas. Essas descries dependendo da linguagem
utilizada sero de diferentes tipos e:
[...] qualquer que seja a linguagem que venhamos a empregar, nossas descries do atode conhecer-na-ao so sempre construes. Elas so sempre tentativas de colocar deforma explcita e simblica um tipo de inteligncia que comea por ser tcita eespontnea. (SCHN, 2000, p.31).
O autor prope duas formas de reflexo: a reflexo sobre a ao e a reflexo na ao. A
primeira corresponde ao ato de refletir aps a ao ter ocorrido, o que, segundo Schn, o modo
a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ao pode ter contribudo para um resultado
inesperado. E esta reflexo pode ocorrer aps o fato, em outro ambiente ou fazendo-se pausas no
meio da ao que consiste no parar e pensar. A segunda forma de reflexo d-se quando a
reflexo ocorre no meio da ao, sem interromp-la:
Em um presente-da-ao, um perodo de tempo varivel com o contexto, durante o qualainda se pode interferir na situao em desenvolvimento, nosso pensar serve para darnova forma ao que estamos fazendo, enquanto ainda o fazemos (SCHN, 2000, p.32).
O surgimento da correo de problemas e das surpresas desagradveis so caractersticas
que podem surgir durante a ao. Schn chama este processo de tentativa e erro, no entanto
alerta: [...] as tentativas no se relacionam aleatoriamente umas com as outras. A reflexo sobre
cada tentativa e seus resultados prepara o campo para a prxima. (SCHN, 2000, p.33). O autor
descreve uma sequencia do processo que envolve a reflexo na ao. O grfico a seguir procura
representar cada uma das etapas:
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Grfico 03: Elaborado pelo autor segundo a descrio de Schn sobre o processo da reflexo sobre a ao.
O primeiro quadro representado pelo conhecer-na-ao, em consonncia com Schn:
[...] pode ser descrito em termos de estratgias, compreenso de fenmenos e formas deconceber uma tarefa ou problema adequado situao. Conhecer-na-ao um processotcito, que se coloca espontaneamente, sem deliberao consciente e que funciona,proporcionando os resultados pretendidos. (SCHN, 2000, p.33).
No segundo momento, o chamar a ateno do indivduo que est agindo a caracterstica
predominante, pois as respostas de rotina produzem um resultado inesperado, que pode ser
agradvel ou desagradvel. Um estranhamento que no se encaixa nas categorias de nosso
conhecer-na-ao. Esta surpresa ocasionada pelo resultado inesperado, segundo Schn, o que
leva reflexo. Mesmo no havendo a necessidade da descrio verbal para a reflexo ocorrer,
conforme o autor, em alguma medida a reflexo consciente. O momento em que surgem
perguntas sobre o resultado inesperado como tambm o prprio pensamento - O que isso?
Como tenho pensado sobre isso? As perguntas geram o pensar crtico sobre o que levou a chegar
ao resultado inesperado, gerando novas estratgias de ao, s compreenses dos fenmenos ou
s formas de conceber os problemas.
E a ltima etapa o momento em que novas aes surgem (SCHN, 2000, p.33). De
acordo com a concepo de Schn, o trabalho est focado sobre o registro de um tipo de ao
explcita: a performance pedaggica e, no caso desta pesquisa, a performance pedaggica do
professor de violo.
De acordo com Pimenta (1997, p.2), a pesquisa sobre a prpria prtica resultado do
desenvolvimento da concepo do professor reflexivo. A ampliao da conscincia sobre a
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prpria prtica o fator necessrio para que as transformaes das prticas docentes ocorram. A
autora especifica, em continuidade, como isto ocorre:
O alargamento da conscincia, por sua vez, se d pela reflexo que o professor realiza naao [grifo de PIMENTA]. Em suas atividades cotidianas o professor toma decises,diante das situaes concretas com as quais se depara. A partir das quais constri saberes,na ao. Mas, sua reflexo na ao precisa ultrapassar a situao imediata. Para isso necessrio mobilizar a reflexo sobre a reflexo na ao. Ou seja, uma reflexo que seeleva da situao imediata, possibilitando uma elaborao terica de seus saberes.(PIMENTA, 1997, p.2).
O movimento que Pimenta chama de prtico-terico-prtico como resultado do
alargamento da conscincia faz com que se configure a criao de novos hbitos do professor,
nova cultura profissional e o desenvolvimento de um profissional autnomo. O conceito de
Schn (2000) da reflexo na ao e reflexo sobre ao valoriza o professor como sujeito, sendo
que o professor aprende (constri seus saberes-fazeres docentes), a partir da anlise e
interpretao da prpria atividade. (PIMENTA, 1997, p.9) e no o faz apenas como um simples
aplicador de tarefas. Acredita-se, neste particular, que a reflexo sobre a ao j ocorrida poder
ajudar a compreender os processos de ensino identificados pelos prprios professores ao
assistirem as suas prticas atravs do vdeo.
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1.2 ENSINO DO VIOLO
Uma das sugestes de Creswell (2007) para o pesquisador organizar a literatura sobre um
tpico estruturar um mapa que identifique tpicos de estudo sobre o assunto. Considerando
este tipo de organizao, em continuidade, so apresentados alguns dos principais elementos que
so discutidos por autores com relao prtica violonstica, mais especificamente, com relao
ao ensino de violo.
1.2.1 Mtodos de ensino de violo
Semelhante constituio de nossa prpria nao, em conformidade com Ballest (2009)
os mtodos de violo no Brasil colnia foram, em sua maioria, de origem estrangeira. Esta
importao dos mtodos de violo fez com que muitos fossem traduzidos para a lngua
portuguesa. Este cenrio est evidenciado a seguir:
No Brasil Colnia as publicaes vinham de Portugal, pois at a chegada da Corte eraproibida a impresso. Os primeiros mtodos de violo trazidos para o Brasil, ainda emfrancs, foram os de Carulli e de Carcassi. Em meados do sculo XIX o mtodo deCarcassi foi traduzido para o portugus por Rafael Coelho Machado. Somente em 1851foi escrito e impresso, no Brasil, o primeiro mtodo para violo, o Indicador dos acordespara violo tendo por fim adestrar em mui pouco tempo a qualquer individuo ainda semconhecimento de msica, no acompanhamento do canto e instrumentos, em Pernambucopelo msico amador Miguel Jos Rodrigues Vieira. (BALLEST, 2009, p.25-26).
O trabalho de Queiroz (2000) por sua vez, atravs de uma perspectiva histrica,
demonstra alguns dos principais mtodos e violonistas representados pelos eixos Itlia, Frana,
Espanha, Alemanha, Inglaterra, Viena. Sendo assim, o Brasil no s se caracterizou por certa
ausncia da cultura indgena como dominante na formao cultural do pas, como evidenciado
nas palavras seguintes: A cultura indgena considerada como irrelevante ou ausente porque os
Amerndios alegavam isolao voluntria ou sua incapacidade de resistir pedagogia colonial,
particularmente a dos Jesutas (BASTOS, 2005, p.214) (traduo minha)2, mas tambm por uma
ausncia de publicaes impressas originrias em terra brasileira.
O violonista Francisco Trrega Eixea, consoante Queiroz (2000), aparenta ter sido um dos
grandes influentes da tcnica violonstica, pois a sua concepo sobre o instrumento propagou-se
2 Indigenous culture is regarded as irrelevant or absent because of the Amerindians alleged voluntary isolation ortheir incapacity to resist colonial pedagogy, particularly that of the Jesuits (BASTOS, 2005, p.214).
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influenciando diversos nomes3 considerados importantes no meio com o passar dos anos. Um
deles foi Andres Segvia: A tcnica de Segovia foi baseada na de Trrega, sendo ampliada e
aperfeioada, atualmente designada por muitos como tcnica 'segoviana', que se tornou a base
para o trabalho de outros grandes violonistas do sculo XX. (QUEIROZ, 2000, p.19).
Um dos pedagogos violonistas brasileiros do sculo XX que reconheceu o trabalho de
Trrega foi Henrique Pinto. Em seu mtodo, o autor evidencia isto nas seguintes palavras:
[Francisco Trrega] iniciou toda a estrutura do pensamento contemporneo violonstico
(PINTO,1978, p.6) .
Os quatro cadernos do violonista uruguaio Abel Carlevaro, publicados nos anos de 1966,
1967, 1969 e 1974, esto divididos por foco de desenvolvimento tcnico. O primeiro volume
trata sobre a execuo de escalas ascendentes e descendentes. O segundo volume considera o
estudo tcnico da mo direita. E os dois ltimos volumes voltam-se para o estudo tcnico da mo
esquerda. Podemos notar que o autor optou por considerar esta diviso de desenvolvimento
tcnico focando isoladamente cada uma das mos, aspecto tambm manifesto por outros autores.
Em 1979, Abel Carlevaro publicou a sua segunda obra de ordem mais textual e explicativa com
relao aos princpios tericos do instrumento.
O violonista brasileiro Henrique Pinto, em seu mtodo de iniciao ao violo, publicado
em 1978, descreve tambm os princpios iniciais para o aprendizado do instrumento. Dentre os
assuntos abordados, esto o posicionamento do instrumentista e do instrumento, mo direita, mo
esquerda e uma srie de coletnea de peas em ordem progressiva de dificuldade tcnica. Outro
aspecto a notar que o autor considera o desenvolvimento tcnico das mos de forma isolada. O
outro volume publicado, no mesmo ano, como forma complementar ao primeiro volume,
apresenta outros assuntos, tais como conceito de tcnica, concentrao, relaxamento, leitura
primeira vista e breves descries biogrficas de alguns compositores.
O mtodo do violonista norte americano Scott Tennant, publicado em 1995, tambm
aborda as suas consideraes sobre a postura, aes da mo direita e esquerda. No entanto, o
msico amplia alguns tpicos dedicando um captulo para as tcnicas do violo flamenco.
Interessante observar a valorizao de Tennant pela arte do violo flamenco, sendo que o seu
3 [...] mesmo que Trrega no tenha deixado nenhum livro contendo seus ensinamentos, estes se solidificaramatravs de seus discpulos, entre eles: Daniel Fortea (1878-1953); Maria Rita Brondi (1889-1941); Emilio Pujol(1886-1980), que foi o responsvel pela divulgao de boa parte da obra de Trrega, sistematizando a tcnica domestre no seu mtodo Escuela Razonada de la guitarra que foi publicado em 1956; e Miguel Llobet (1878-1938),que segundo Dudeque, foi o mais famoso e preferido dos discpulos de Trrega. (QUEIROZ, 2000, p.18).
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mtodo remetido para a tcnica do violo clssico. Neste tpico, esto descritos algumas
tcnicas do polegar, como a alzapua por exemplo, e os rasgueados. Outros tpicos ampliados so
suas consideraes sobre a ansiedade que se manifesta antes de realizar uma performance, suas
sugestes para a prtica diria e algumas palavras sobre inspirao.
Hector Quine (1990) explana sua obra em fisiologia da tcnica, postura, brao e mo
direita, brao e mo esquerda, coordenao, tcnicas da interpretao e prtica. Para o autor, a
tcnica instrumental essencialmente controle (do som, volume, ritmo, tempo, legato, staccato,
dinmicas, registro, fraseados e articulaes) sempre orientado pela inteligncia musical, ao
contrrio da concepo de tocar o mais rpido possvel do que a coerncia musical sugere. Quine
afirma que a sua obra no um mtodo, mas prefere pensar como um guia prtico.
O Classical Guitar Pedagogy, de Anhony Glise (1997), dividido em trs livros, o
primeiro considerando os princpios da tcnica. O autor utiliza termos fisiolgicos da mo para
explicar as funes anatmicas. O segundo livro explica os princpios da pedagogia e o terceiro
enfoca a musicalidade. O estudioso observa diferenas entre a mo direita e esquerda de acordo
com as escolas do violo adotado, por exemplo, a escola de Segvia chamada de tcnica da
mo fechada, em que existe uma diferenciao de posicionamento e sonoridade entre o toque sem
apoio e apoiado. Segundo Glise, esta tcnica pode ter se originado no estilo flamenco de tocar,
no qual unhas longas so utilizadas para atingir maior volume e tambm percussivo para
acompanhar a dana. Na chamada tcnica de mo aberta, pouca diferena existe nas
movimentaes entre toque sem apoio e apoiado. E na distinta escola francesa, originria do
conservatrio de Paris, os violonistas utilizam o lado direito da unha para tocar as cordas.
A tese do violonista brasileiro Nicolas Lehrer de Souza Barros, defendida em 2008,
enfatiza o posicionamento e as movimentaes dos dedos da mo direita. Em conformidade com
o autor, este processo de movimentao dos dedos produto de mudanas ocorridas durante o
passar dos sculos. Atravs de uma pesquisa cronolgica, Barros descreve as mudanas
ocorridas como a execuo de dedillo e de dois dedos, sendo o dedillo uma influncia da
execuo do plectro, a disposio do 'p' 'i'4, inicialmente, com o toque do polegar para dentro
entre os alaudstas; em seguida, a mudana com a disposio do polegar para fora, a substituio
do polegar pelo 'm' surgindo, ento, o toque 'm'-'i', e, finalmente, a utilizao dos quatro primeiros
dedos 'p'-'i'-'m'-'a' at o emprego do dedo mnimo que conhecemos atualmente. Em sua pesquisa,
4 As letras citadas representam os dedos usados em digitaes da mo direita: 'p' polegar , 'i' indicador, 'm' mdio, 'a' anular e 'c' mnimo.
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o autor est focado sob os principais cordofones clssicos europeus dedilhados, como o alade
renascentista e barroco, vihuela, guitarra barroca e romntica e o violo moderno.
A seguir, uma sugesto de mapa referenciado com base nos estudos destes autores - Abel
Carlevaro (1975), Henrique Pinto (1978), Scott Tennant (1995), Hector Quine (1990), Anthony
Glise (1997) e Nicolas Lehrer de Souza Barros (2008) - alguns elementos que fazem parte de um
panorama amplo a respeito dos contedos tcnicos do violo:
Grfico 04: Elementos representados em mtodos e pesquisas sobre o ensino do violo. (Quadro elaborado peloautor)
Podemos notar, no grfico 4 (quatro), que h uma nfase maior para os assuntos que
correspondem s aes de mo direita e esquerda. Todos estes elementos no ato da performance
podem estar diretamente relacionados e/ou interdependentes. Este grfico apenas representa
alguns dos contedos tcnicos no ensino do violo. Devemos considerar tambm que existem
outros elementos presentes como o estudo do repertrio, esttica, metodologias de ensino na
educao infantil e adolescentes, etc.
preciso mencionar que autores enfocam especificamente determinadas faixas etrias que
envolvem desde crianas (FIGUEIREDO; CRUVINEL, 2001) a jovens e adultos (VIEIRA,
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2009). O foco destas pesquisas est relacionado com o como ensinar. Outros autores como
(CORRA, 2000, 2001,2003, 2004) direcionam as suas pesquisas para os processos de
autoaprendizagem. Alguns centram-se a respeito das metodologias de ensino (TOURINHO,
1995, 2001, 2003, 2004; QUEIROZ, 2000; TIAGO; PERDOMO, 2004), enquanto outros, sobre
grade curricular (NAVEDA, 2003). Devemos referir ainda que algumas pesquisas direcionam os
seus estudos exclusivamente sobre o repertrio (FIREMAN, 2006; MACHADO; PINTO, 2002)
para o ensino do violo, conforme trataremos a seguir.
1.2.2 Ensino individual de violo
Figueiredo e Cruvinel (2001) atravs de observaes e relatos das prticas em sala de aula
tratam sobre o ensino do violo entre crianas de cinco a oito anos de idade. As autoras
demonstram o quanto este assunto pode ser explorado, pois: O ensino do violo no Brasil,
direcionado a crianas de cinco a oito anos, constitui-se em um grande desafio para os
professores, devido escassez de metodolog